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Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e
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O EFEITO DE UM FATOR SOCIAL NO USO DE LEXIAS
DIRIGIDAS ÀS MÃES
Norma da Silva Lopes (UNEB)1
Lucélia de Souza dos Reis Santos (UNEB)2
RESUMO: Este artigo aborda a correlação entre a variável social <idade> e a lingüística <função
sintática> e o uso de lexias dirigidas às mães na cidade de Jequié-Bahia. Pesquisou-se a utilização das
formas nominais mãe, mamãe, mainha, minha mãe e “outra” em diferentes faixas etárias. Os
pressupostos teórico-metodológicos adotados são os apresentados por William Labov (2008 [1972]), no
campo da Sociolinguística Variacionista. Os resultados mostram que a lexia mainha, popularmente
conhecida como um traço da fala baiana, ocorre principalmente entre os mais velhos, e as lexias mãe e
minha mãe estão sendo mais utilizadas pelos jovens, são, por isso, possíveis substitutas da lexia mainha
na comunidade.
PALAVRAS-CHAVE: Lexias dirigidas às mães; Idade; Variação; Jequié.
ABSTRACT: This article discusses the correlation between the social variable of age and the use of lexis
directed to mothers in the city of Jequie-Bahia. As such, we investigated the use of nominal forms: mãe,
mamãe, mainha, minha mãe e other forms in different age groups. The theoretical and methodological
assumptions adopted are those of Variationist sociolinguistics (LABOV, 2008 [1972]). The results show
that the lexia mainha, popularly known as a trace of speech Bahian, occurs mainly among older speakers,
and the lexias mãe and minha mãe are used more by young people, and are therefore possible substitutes
for the lexia mainha in the speech community.
KEYWORDS: Lexias directed to mothers; Age; Variation; Jequié.
1 Palavras iniciais
A sociolinguística é uma das vertentes da linguística que tem como objetivo o
estudo da língua em situação de uso. Silva-Corválan (2001, p.1) define sociolinguística
como “o estudo daqueles fenômenos linguísticos que têm relação com fatores do tipo
social. Esses fatores sociais incluem os diferentes sistemas de organização política,
1 Professora titular da UNEB, professora regular do Programa de Estudo de Linguagens –
PPGEL/UNEB. 2 Mestre egressa em 2013 do PPGEL/UNEB.
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econômica e social de uma sociedade.”3 A variação social é uma das correntes da
sociolinguística que investiga as diferentes maneiras de falar das pessoas com respeito
às organizações sociais nas quais estão inseridas; essas variações podem ser
correspondentes a diferentes faixas etárias, classes sociais, grau de escolaridade, sexo,
etnia ou grupo profissional.
Este texto trata de estruturas lexicais dirigidas às mães na cidade de Jequié,
Bahia, faz reflexões acerca da relação entre a escolha dessas estruturas, a <idade do
falante> e a <função sintática> e analisa a implicação dos usos com a mudança
linguística. A pesquisa teve como objetivo principal identificar restrições linguísticas e
sociais envolvidas na escolha das lexias. Analisaram-se a frequência e o peso relativo
da variável social <idade> e a variável linguística <função sintática> na utilização das
variantes. Para a análise estatística foi utilizado o programa de regras variáveis
VARBRUL.
O estudo oportuniza o conhecimento de um fenômeno linguístico ainda não tão
explorado por outros pesquisadores da Sociolinguística e possibilita o conhecimento do
caráter variacionista das lexias utilizadas pelos falantes ao se dirigirem às suas mães.
O texto se compõe de quatro seções, além da Introdução e das Referências. Em
A relevância do fator etário na ocorrência de um fenômeno linguístico, fazemos uma
abordagem acerca da importância da variável social faixa etária no entendimento dos
processos linguísticos. Na segunda seção, apresentamos brevemente o cenário físico e
social onde ocorreu a presente pesquisa. Em A ocorrência de lexias dirigidas às mães
em Jequié-Bahia o texto se volta à apresentação e discussão dos resultados a partir do
estudo estatístico dos dados coletados na pesquisa. Para concluir, apresentam-se as
Considerações finais de nossa pesquisa em que finalizamos as discussões, expondo
nosso parecer sobre o estudo empreendido e sobre os conhecimentos construídos,
oportunizados por todo o trabalho realizado.
3 “El estudio de aquellos fenómenos lingüísticos que tienen relación con factores de tipo social. Estos
factores sociales incluyen: los diferentes sistemas de organización política, económica social y geográfica
de una sociedade.”
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2 A relevância do fator etário na ocorrência de um fenômeno linguístico
A língua é um fenômeno variável. Essa é uma afirmação generalizada e que se
enquadra no contexto de qualquer língua em situação de uso. O mundo apresenta um
complexo número de línguas, como o inglês, o português, o espanhol, as línguas
africanas, indígenas, dentre muitas outras. E cada uma dessas línguas pode variar
conforme o local onde é usada, o nível econômico do falante, o grupo social ou até
mesmo a situação da fala.
Dentro desse contexto, podemos nos restringir a língua portuguesa falada no
Brasil e perceber que há diferenças na linguagem utilizada pelo baiano e pelo paulista,
por exemplo. Limitando-nos à Bahia, poderemos encontrar diferenças no falar de
pessoas de Salvador (capital) e pessoas de Jequié (interior do estado); e, além disso,
ainda podemos encontrar diferenças no falar de moradores de uma mesma cidade. No
entanto, essas diversificações nos usos linguísticos desses falantes de regiões distintas
ou até mesmo de igual região não as impedem de estabelecer uma comunicação
compreensiva.
Ao discutir acerca do fenômeno da mudança, Naro (2010) mostra a importância
do fator etário nos usos linguísticos. Geralmente, segundo esse autor, existem pessoas
que, apesar de viverem cotidianamente juntas, apresentam formas linguísticas
diferentes, muito condicionadas às diferenças de idade - como na relação entre pai e
filho, por exemplo. Porém, o mais interessante nessa observação é que esse uso de
formas linguísticas distintas não impede o sucesso da comunicação entre esses falantes.
Segundo o autor, muitos usos estão em processo de mudança linguística e as formas
inovadoras tendem a ser adotadas por todos os indivíduos envolvidos na comunicação.
Partindo do pressuposto de que, nos estudos sociolinguísticos, a língua deve ser
considerada a partir de seu uso na comunidade ou grupo, o indivíduo também tem sua
parcela de contribuição na decisão de mudar ou não mudar sua forma de falar. Dessa
forma, Naro (2010, p.44) levanta o seguinte questionamento: Até que ponto a língua
falada pelo indivíduo pode mudar com o decorrer dos anos? Segundo o autor, existem
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duas posições teóricas voltadas a esse questionamento: a primeira, clássica, postula que
“o processo de aquisição da linguagem se encerra mais ou menos no começo da
puberdade e que a partir desse momento, a língua do indivíduo fica essencialmente
estável” (p.44). Assim, segundo essa teoria, após essa fase ocorre o que se chama de
bloqueio dos dispositivos cognitivos, os quais possibilitariam a manipulação da
faculdade da linguagem do indivíduo, e as estruturas linguísticas tornadas conhecidas e
utilizadas pelo indivíduo não poderiam mais sofrer mudanças significativas.
Considerando essa teoria clássica, a língua falada por um indivíduo adulto tem
por base as estruturas que ele adquiriu até os 15 anos de idade. Dentro dessa discussão
insere-se o estudo realizado por Labov na ilha de Martha‟s Vineyard acerca da
centralização do núcleo do ditongo /aw/. A pesquisa foi realizada em tempo aparente,
método que utiliza indivíduos de diferentes faixas etárias.
O resultado mostrou o uso de formas linguísticas mais conservadoras pelos
falantes mais velhos enquanto que os falantes mais jovens estavam utilizando mais a
forma centralizada. Além disso, a pesquisa de Labov revelou também uma situação
complexa, ocorreram diferenças na pronúncia da variante pesquisada, tanto no interior
de cada grupo, como entre os diferentes grupos de 80 anos ou mais, 60 anos e 30 anos.
Constata-se, então, que não é apenas a idade o único fator social a influenciar a
fala do indivíduo. Sabe-se que, ao longo da vida, o indivíduo participa de diferentes
realidades, nas quais outras dimensões sociais influenciam o seu modo de falar.
Portanto, a teoria clássica que preconiza a estabilidade da língua após a idade de 15 anos
deve ser considerada com cuidado pois a mudança ou a estabilidade linguística do
falante vai depender também de outras questões, relativas a experiências e interesses das
pessoas. Jovens e velhos podem apresentar um comportamento linguístico parecido,
diferente de pessoas da faixa etária intermediária como ocorreu na supracitada pesquisa
de Labov. As pressões sociais aumentadas ou diminuídas em cada idade, as exigências
do mercado de trabalho, os valores dos grupos aos quais pertencem, são alguns dos
contextos que devem ser considerados.
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3 Comunidade da pesquisa
A cidade onde aconteceu a pesquisa localiza-se a uma distância de 360 km da
capital, Salvador – Bahia. Conta com uma população de 151.895 habitantes, conforme
dados de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Ocupa uma
área territorial de 3.227 km² e possui uma densidade demográfica de 47,07 hab./km². O
município faz divisa com a Mata Atlântica ao leste e caatinga a oeste, possui um clima
ameno e agradável em determinadas regiões e quente e seco em outras, e, no verão,
chega a apresentar temperatura de 48ºC.
De acordo com Araújo (1997), a história da cidade de Jequié está muito
relacionada aos acontecimentos no vale do Rio de Contas. O rio nasce na Serra das
Trombetas – município de Rio de Contas, na Chapada Diamantina, percorre diversas
cidades, dentre elas Jequié, e deságua no mar, no município de Itacaré. Segundo Rios
(1992, p. 07), o nome Rio de Contas originou-se no período da mineração, tempo em
que mineradores e cobradores do quinto ouro reuniam-se às margens do rio a fim de
acerto de contas. O rio de Contas tem como afluentes os rios Antônio, Gavião e
Gongogi. É cortado pelos rios Jequiezinho, Preto da Costa e Preto do Criciúma.
Segundo Rios (1992, p. 165), nos períodos compreendidos entre 1859 a 1860 e entre
1879 a 1900, o Nordeste foi muito castigado por secas, razão que obrigou muitas
famílias de diversas regiões nordestinas a aportarem nesse povoado, banhado pelo Rio
de Contas.
Desse modo, o território foi local de passagem e habitação de pessoas de
diferentes etnias: negros, índios, mineiros, italianos, árabes e nordestinos. A vinda dessa
população contribuiu para a formação do povoado e depois para a formação da cidade.
Tais pessoas trouxeram consigo sua cultura e os falares de suas regiões. O contato e o
entrecruzamento das características dessas diferentes pessoas contribuíram para
formação da cultura e surge a hipótese de que podem ter condicionado usos linguísticos
hoje existentes na cidade de Jequié.
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4 Análise da ocorrência de lexias dirigidas às mães em Jequié-Bahia
Essa pesquisa foi realizada na região urbana de Jequié. O perfil do informante
foi de pessoas que nasceram e sempre moraram na cidade e que não passaram mais que
um terço do tempo de sua vida fora da cidade. Selecionaram-se 16 (dezesseis)
informantes, distribuídos igualmente em dois grupos etários diferentes: 10 – 14 anos
(faixa 1); 18 – 30 anos (faixa 2); dentre eles, 08 (oito) homens e 08 (oito) mulheres.
Foram utilizados três instrumentos para levantamento de dados: (i) entrevista
D24; (ii) ficha de situações; (iii) ficha do informante. A entrevista D2 foi realizada com
a participação do informante acompanhado por sua mãe5; neste caso, ao entrevistador
coube a função de indicar determinados temas a serem conversados ou contados pelos
dois, a mãe e o informante. Após a entrevista, foi dada ao informante uma ficha de
situações diversificadas, na qual ele preencheu as lacunas propostas com as diferentes
formas de tratamento dirigidas às mães por ele nas diferentes situações diárias. Para a
análise estatística, tomou-se o pacote VARBRUL6.
A investigação constituiu-se inicialmente da observação de uma variação
eneária, pesquisando a utilização de cinco lexias utilizadas pelos falantes jequieenses:
mãe; mamãe; mainha; minha mãe e “outra”7. Na coleta de dados, foram identificadas
350 ocorrências totais dessas variantes, como mostrado abaixo:
4 Diálogo entre dois informantes.
5 Mãe do informante equivale tanto a genitora quanto a mãe adotiva do informante.
6 Programa de regras variáveis que realiza estudos estatísticos, possibilitando a visualização de
porcentagens e de pesos relativos de cada fator das variáveis controladas no estudo. 7Representa a ocorrência de outras formas nominais diferentes de mãe, mamãe, mainha e minha mãe.
Geralmente essa variante é o antropônimo ou alcunha da mãe do falante, além disso, foram encontrados
os nomes: mãenhê; brodinha; bebê; rapaz; filha e coroa.
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Tabela 01. Panorama geral das ocorrências das lexias.
LEXIAS % DADOS / TOTAL
MAINHA 32% 112/350
MÃE 29% 101/350
MINHA MÃE 26% 90/350
MAMÃE 7% 24/350
“OUTRA” 7% 23/350
Conforme disposto no Gráfico 1, a lexia mainha aparece em 32% das
ocorrências das variantes na fala dos participantes. É a variante com maior porcentagem
na Tabela 1. Em segundo lugar aparece a lexia mãe com 29% das ocorrências. Em
terceiro, encontra-se a forma nominal minha mãe com 26% das ocorrências. Em último
lugar, e com a porcentagem equiparada, aparecendo em 7% das ocorrências, as lexias:
mamãe e “outra”.
32
29 26
7 70%
10%
20%
30%
40%
Mainha Mãe Minha mãe Mamãe "Outra"
Gráfico 1: frequência total das lexias (%)
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De acordo com o Gráfico 1, apesar da existência de outras formas nominais de
tratamento para se dirigir às mães, a forma mainha é apenas um pouco mais recorrente
na fala dos entrevistados que as outras formas, pois observa-se a proximidade da
porcentagem da ocorrência da lexia mainha (32%) às porcentagens de ocorrência das
lexias mãe (29%) e minha mãe (26%). É nesse contexto que se insere a importância da
análise da atuação das variáveis sociais e linguísticas.
Para possibilitar uma análise mais apurada, que apresente, além de percentagens,
pesos relativos, buscou-se fazer análises binárias, em que se opôs cada lexia às demais.
A seguir, apresenta-se a análise de cada uma delas. Nesse artigo, observa-se o
comportamento das variáveis independentes <faixa etária> e <função sintática>.
4.1 Lexia Mãe em oposição às outras variantes analisadas conjuntamente
Ao analisar a atuação das variáveis independentes com relação à lexia mãe,
contrapondo-a as outras lexias pesquisadas, em uma análise binária, o programa de
regras variáveis – VARBRUL – selecionou as variáveis função sintática e faixa etária,
discutidas a seguir.
Tabela 02. Condicionamento da função sintática na escolha da lexia mãe.
VARIÁVEL Dados/Total - % Peso relativo
FUNÇÃO SINTÁTICA
VOCATIVO 143/242 – 41% .76
SUJEITO 02/90 – 2% .04
Com relação à variável função sintática, entende-se, por meio da Tabela 02, que
o uso da lexia mãe é mais recorrente em função vocativa. Constata-se uma distinção
considerável entre o peso relativo da função vocativa (.76) e o peso relativo da função
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sujeito (.04). Infere-se, então, que a função vocativa favorece o aparecimento da lexia
mãe. Quanto ao uso da lexia mãe com outras funções, não houve qualquer ocorrência na
fala dos indivíduos pesquisados. Dessa forma, conclui-se que essa forma é usada
basicamente em chamamento e, em outros contextos, ocorrem outras formas.
Tabela 03. Efeito da faixa etária na escolha da lexia mãe.
VARIÁVEL Dados/Total - % Peso relativo
FAIXA ETÁRIA FAIXA 1 74/165 – 47% .67
FAIXA 2 27/187 – 15% .35
Com relação à faixa etária, o grupo 1, formado pelos mais jovens, se mostrou
muito mais usuário da lexia mãe (P. R. .67) que os falantes do grupo 2 (.35). Assim, por
apresentar peso relativo consideravelmente maior, caracteriza-se o condicionamento
etário da faixa 1 para a maior utilização da variante mãe, ou seja, na comunidade
estudada, essa lexia parece ser a variante inovadora. Pode-se chegar à conclusão que a
variação da forma sofre restrições da faixa ETA e da função sintática, sendo utilizada
mais em chamamento e pelos jovens, dando indicação de que, futuramente, essa forma
pode ser, no futuro, a escolhida pelos falantes de Jequié (v. gráfico 2).
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4.2 Lexia Mamãe em oposição às outras variantes analisadas conjuntamente
Na análise binária da lexia mamãe em oposição às outras variantes, o Programa
VARBRUL não selecionou nenhum das variáveis em evidência nessa abordagem: faixa
etária e função sintática. O pequeno número de ocorrências dessa lexia pode ter sido a
razão para explicar a não seleção. No Gráfico 1, verifica-se a porcentagem de
ocorrência do nome mamãe igual a 7%. Depreende-se, então, que o uso dessa palavra
pode estar condicionado a situações especiais de comunicação, sendo necessário, pois,
que, em estudos posteriores, se façam observações da ocorrência dessa lexia em
diferentes situações comunicativas.
4.3 Lexia Mainha em oposição às outras variantes analisadas conjuntamente
O programa também fez a análise binária da lexia mainha contra todas as outras
variantes pesquisadas e selecionou as variáveis: função sintática e faixa etária, como
mostrado nas Tabelas 03 e 04, a seguir.
0,67
0,35
0
0,2
0,4
0,6
0,8
1
FE 1 FE 2
Gráfico 2: Efeito da Faixa Etária sobre a escolha da
lexia mãe em Jequié (P. R.)
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Tabela 03. O favorecimento da função sintática na escolha da lexia mainha
VARIÁVEIS Dados/Total - % Peso relativo
FUNÇÃO SINTÁTICA VOCATIVO 83/242 – 34% .53
SUJEITO 26/90 – 29% .43
Os dados da Tabela 03 mostram uma diferença, não muito grande, entre os pesos
dos fatores: vocativo (.53) e sujeito (.43), no entanto, para o programa, a variável
contribui para a escolha da variante: a função sintática „vocativo‟ favorece levemente a
lexia mainha (apesar de ter peso relativo muito próximo ao ponto neutro), enquanto a
função „sujeito‟ a desfavorece. A função „complemento‟ tem poucos dados.
Tabela 04. Efeito da faixa etária na escolha da lexia mainha.
VARIÁVEIS Dados/Total - % Peso relativo
IDADE FAIXA 2 90/187 – 48% .73
FAIXA 1 21/165 – 13% .25
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A atuação da variável faixa etária se mostrou determinante na utilização da
forma nominal mainha. A diferença entre os pesos relativos das duas faixas etárias é
muito grande (.48). Diante dos dados mostrados no Gráfico 5, é possível constatar que o
fato de o indivíduo pertencer ao grupo etário 2 (.73) favorece a utilização da variante
mainha, enquanto que os mais jovens tendem a não utilizar essa lexia (.25).
4.4 Lexia Minha mãe em oposição às outras variantes analisadas conjuntamente
Quanto à análise binária realizada contrapondo a lexia minha mãe a todas as
outras variantes pesquisadas, o programa também selecionou as variáveis: função
sintática e faixa etária.
0,25
0,73
0
0,2
0,4
0,6
0,8
1
Faixa 1 Faixa 2
Gráfico 3: Efeito da faixa etária na escolha de mainha em
Jequié
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Tabela 05. Condicionamento da função sintática na escolha da lexia minha mãe
VARIÁVEL Dados/Total - % Peso relativo
FUNÇÃO SINTÁTICA SUJEITO 54/90 – 60% .99
VOCATIVO 22/242 – 9% .12
Na Tabela 05 encontra-se uma diferença acentuada entre os valores dos pesos
relativos do fator „Vocativo‟ (.12) e do fator „Sujeito‟ (.99). Portanto, constata-se que a
lexia minha mãe tem um condicionamento muito mais forte de aparecer na função de
sujeito e muito menor na função de vocativo. Como o número de dados relativos a
„complemento‟ foi muito pequeno (14/17), os resultados não puderam ser considerados,
ficando a concorrência entre as funções sujeito e vocativo.
0,12
0,99
0
0,5
1
1,5
Vocativo Sujeito
Gráfico 4: Efeito da função sintática na escolha da variante
minha mãe em Jequié
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Tabela 06. Efeito da Faixa etária na escolha da lexia minha mãe
VARIÁVEL Dados/Total - % Peso relativo
FAIXA ETÁRIA FAIXA 1 51/165 - 31% .67
FAIXA 2 40 /187 - 21% .35
Com respeito à faixa etária, nota-se que essa variável social também foi
determinante para o uso da forma nominal minha mãe. A faixa 1 obteve o peso relativo
.67 e a faixa 2 obteve o peso relativo .35. Diante desses números, conclui-se que o fato
de o falante pertencer a faixa 1 favorece a utilização da lexia minha mãe. Essa forma
nominal demonstra ser inovadora, pois seu uso se concentra entre os mais jovens, assim
como a forma mãe, já discutida. Nota-se que as duas formas, mãe e minha mãe têm uso
complementar. Embora as duas sejam preferência dos mais jovens, mãe é utilizada na
função vocativo e minha mãe na função sujeito.
0,67
0,35
0
0,2
0,4
0,6
0,8
Faixa 1 Faixa 2
Pes
o r
ela
tiv
o
Gráfico 5: Efeito da faixa etária sobre a escolha da
variante minha mãe
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4.5 lexia “Outra” em oposição às demais variantes analisadas conjuntamente
Com relação à análise binária da variante “outra” contra todas as outras, vale
ressaltar que essa variante representa a ocorrência de outras lexias, diferentes das
formas pesquisadas: mãe, mamãe, mainha e minha mãe. Essas outras formas foram
encontradas na realização, pelo falante filho, do antropônimo da mãe ou cognome, além
disso, foram encontrados os nomes: rapaz; filha; bebê; mãenhê; maminha; brodinha e
coroa. Para o estudo binário entre a variante “outra” e a ocorrência das variantes
predefinidas, o programa selecionou a variável função sintática.
Tabela 07. Efeito da Função sintática na escolha da lexia “outra”.
VARIÁVEL Dados/Total - % Peso
relativo
FUNÇÃO SINTÁTICA
VOCATIVO 22/242 – 9% .52
SUJEITO 1/90 – 1% .44
Como mostrado na Tabela 07, a função vocativo, com peso relativo .52 não
favorece nem desfavorece (situa-se no ponto neutro) a utilização pelo falante de outras
lexias para dirigir-se à mãe, diferentes das lexias tradicionais. Mas a função „sujeito‟
desfavorece a utilização de outras formas nominais de tratamento pelo falante.
5 Considerações finais
O estudo empreendido mostrou a idade como uma variável social determinante
para o aparecimento da lexia mãe, sendo os informantes da faixa 1 (10 – 14 anos) os
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indivíduos que mais a utilizaram. Com respeito ao fator linguístico, a função vocativa
favorece a ocorrência dessa variante.
A função sintática vocativo apresentou pesos relativos altos para o uso das lexias
mainha e mãe. A idade atuou também como uma variável importante na ocorrência
dessas variantes, modificando, de certa forma, uma hipótese inicial da pesquisa. Os
dados coletados mostraram que falantes mais jovens, da faixa 1 (10 – 14 anos) usam a
lexia mainha com uma frequência e peso relativo tão baixos que tornou possível afirmar
a diminuição acentuada do uso dessa forma nominal por essa comunidade: o fato de a
variante mainha ter menor peso relativo entre falantes mais jovens pode indicar
diminuição de seu uso entre esses falantes8. Ao lado dessa redução de mainha, há uso de
mãe como vocativo entre os mais jovens. Em contrapartida, os falantes da faixa etária 2
(18 a 30 anos) utilizaram de modo favorável essa variante, permitindo concluir que o
fato de o falante pertencer a faixa etária de falantes mais velhos condiciona a utilização
da lexia mainha.
As ocorrências da lexia minha mãe caracterizaram um fato inovador na fala dos
indivíduos da cidade de Jequié. Os dados coletados mostraram-na como uma forma
muito utilizada pelos falantes da cidade e sua ocorrência foi condicionada pela função
sintática sujeito. A faixa etária também foi importante para essa variante, havendo um
condicionamento da faixa 1 (10 – 14 anos) para o uso da forma minha mãe. A variante
mainha ainda é utilizada nesse grupo etário 1, contudo em menor frequência que as
variantes: mãe e minha mãe.
De modo geral, a pesquisa registrou o uso recorrente das lexias: mãe; minha mãe
e mainha, contudo a escolha de cada uma dessas variantes mostrou-se condicionada a
atuação de variáveis sociais e linguísticas, em que o uso de cada variante pelos falantes
aumenta ou diminui de acordo a sua idade, ou ainda por questão estrutural. As
variantes: mamãe e “outra” ocorreram com menor frequência na fala dos indivíduos,
fato que configura talvez o uso dessas lexias em situações especiais de comunicação.
8 Mas, outros estudos em tempo real, com dados de sincronias diferentes, são necessários para concluir a
respeito dessa possível tendência de mudança.
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Estudos posteriores devem ser feitos em tempo real, para confirmar as tendências
observadas no estudo em tempo aparente ora apresentado: se realmente a mudança
ocorrerá ou se simplesmente constata-se uma variação estável.
Referências
ARAÚJO, Emerson Pinto de. A nova história de Jequié. Salvador: GSH Editora, 1997.
IBGE. Jequié – Bahia. Monografia – Nº 467, ano 1970. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1> Acesso em 20 de julho de 2012
às 15:00h.
MORENO FERNÁNDEZ, Francisco. La variación sociolinguística. Las variables
sociales. In.: MORENO FERNÁNDEZ, Francisco. Principios de sociolingüística e
sociologia del lenguaje. Barcelona: Editorial Ariel, 1998.
NARO, Anthony Julius. O dinamismo das línguas. In.: Maria Cecilia Mollica e Maria
Luiz Braga, (org.). Introdução a sociolinguística: o tratamento da variação – 4ª Ed. –
São Paulo: Contexto, 2010.
SILVA-CORVALÁN, Carmen. Lengua, variación y dialectos In: SILVA-
CORVALÁN. Sociolinguística y pragmática del español. Washington D.C.:
Georgetown University Press, 2001.
RIOS, Dermival R. (org.) Jequié: síntese histórica e informativa. Jequié: Gráfica
Sudoeste Ltda. 1992
Recebido Para Publicação em 24 de junho de 2014.
Aprovado Para Publicação em 25 de julho de 2014.