O Ensino Do Urbanismo Na Europa e o Processo de Bolonha

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O Ensino do Urbanismo na Europa e o Processo de Bolonha

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  • Dossier 2 Ensino do Urbanismo e a Declarao de Bolonha

    O Ensino do Urbanismo na Europa e o Processo de Bolonha (Semanrio, 24 maro 2006) Mrio Moutinho

    O Ensino do Urbanismo e o Processo de Bolonha (In Quem tem medo de Bolonha ) Prof. Doutor Mrio C. Moutinho

    O Ensino do Urbanismo na Europa e o Processo de Bolonha Associao Europeia das Faculdades de Urbanismo reconhece o princpio dos 1 e 2 ciclos (3+2) para o ensino especfico do Urbanismo e do Ordenamento do Territrio Mrio Moutinho

    To importante quanto a definio dos nveis de ensino, ou a adopo do novo sistema de crditos (ECTS), que so as manifestaes mais visveis e faladas do processo de Bolonha, a oportunidade nica que tm agora as universidades portuguesas para repensarem as suas actividades, afirmando-se como recursos para o desenvolvimento do Pas. Mas para isso seria necessrio, com sentido de responsabilidade, reconhecerem a existncia, mesmo que tardiamente de reas de formao novas ou em mudana, ou mesmo noutros stios h muito consolidadas.

    nesta perspectiva que a reunio da Associao Europeia das Faculdades de Urbanismo (AESOP)18 que teve lugar em Bratislava na passada semana, deve ser entendida como um marco fundamental para a reforma / consolidao do ensino do Urbanismo

    18 Associao internacional fundada em Dortmund, na Alemanha em 1987, com o objectivo de representar as faculdades de urbanismo actuando no desenvolvimento do ensino e da investigao nesta rea disciplinar. Actualmente rene 160 universidades e departamentos de Urbanismo e Ordenamento do Territrio em 35 pases.

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  • na Europa. Ficou reconhecido que a estrutura desta formao deve assentar no princpio dos dois ciclos de estudo a saber: Licenciatura de 3 anos seguida de Mestrado de 2 anos. Esta orientao sustenta os recentes novos cursos de Urbanismo, j reformulados no quadro de Bolonha, um pouco por toda a Europa sendo apresentados como exemplo o trabalho desenvolvido nalgumas das principais universidades europeias tais como: Technische Universitt Hamburg, Oxford Brookes University, Technische Universitt Wien, Universit degli Studi di Roma La Sapienza, Stockholm University School of Planning. Em todas estas universidade o ensino do Urbanismo assumido como uma rea disciplinar perfeitamente consolidada e j se encontra reformulado de acordo com Bolonha.

    A Universidade Lusfona de Humanidades e Tecnologias tambm apresentou a adequao a Bolonha da sua anterior Licenciatura em Urbanismo e Ordenamento do Territrio respeitando a estrutura do 1 ciclo (Licenciatura) com a durao de 3 anos, seguida pelo 2 ciclo (Mestrado) com a durao de 2 anos

    Em todas elas trata-se de cursos especficos de Urbanismo cujos planos de estudo se referem sem qualquer dvida aos documentos de orientao sobre esta matria produzidos desde h vrios anos por diferentes entidades europeias.

    Lamentavelmente a maioria das universidades portuguesas

    mantm-se at darem sinal contrrio, alheadas deste processo julgando que o Urbanismo e o Ordenamento do Territrio so assuntos marginais da Arquitectura, da Geografia ou da Engenharia Civil apesar de ser flagrante o resultado catastrfico que esta atitude tem causado ao Pas. Das universidades no chegaram s Cmaras ou Administrao Central ou ao exerccio da profisso liberal, os quadros necessrios e devidamente qualificadas que o Pas precisava e continua a precisar.

    Obstinadamente por submisso s Ordens e aos compadrios acadmicos as Universidades no do sinal de vida quanto criao de formao especfica em Urbanismo, que mais no fosse pela simples razo que o Pas est num caos urbanstico total e num grau quase irreversvel de desordenamento territorial. Antes preferem remendar os cursos de Arquitectura, de Geografia ou de Engenharia civil com cadeiras avulso e variantes. Uma especie de golpe de magia para formar com um s curso duas profisses. E agravando a situao, estas medidas no so feitas tendo em vista um desempenho mais qualificado como Arquitectos,

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  • Gegrafos ou Engenheiros civis, mas com o tino dos futuros licenciados exercerem a profisso de Urbanistas para a qual no obtiveram evidentemente a necessria formao especfica !!!

    E isto, apesar do reconhecimento da urgente necessidade de regulamentar esta profisso, expresso por todos os Partidos em Reunio Plenria da Assembleia da Repblica de Dezembro de 2004, em consequncia da interveno da Associao Profissional dos Urbanistas Portugueses (APROURB), e em relao qual o actual Governo tambm no faz o que lhe competia. Como noutras situaes fazem-se de mortos para ver se escapam s suas responsabilidades !!!

    Pensam que assim que vo arranjar trabalho para a metade dos 13.000 arquitectos desempregados (!!!) mesmo sabendo-se que h mais 9000 jovens a frequentar cursos de arquitectura e por conseguinte tambm a caminho do desemprego. Dentro de 5 anos, basta fazer as contas, em Portugal haver perto de 20.000 arquitectos. Ao menos sero desempregados, mas Arquitectos ()

    No seria mais que tempo para que as Universidades pblicas (subsidiadas) contrariando submisses corporativas inaceitveis, criassem finalmente os cursos de Urbanismo que o Pas tanto precisa, no quadro de Bolonha (3+2+3), de acordo com as orientaes europeias sobre os contedos programticos e a exemplo daquilo que de bem se est fazendo por toda a Europa?

    Mas por este caminho, e nesta rea to carente, bem pode o Senhor Ministro Mariano Gago ficar espera da to falada, mas tambm to mal amada Inovao nas nossas universidades.

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  • O Ensino do Urbanismo e o Processo de Bolonha In Quem tem medo de Bolonha Prof. Doutor Mrio C. Moutinho Coordenador da Licenciatura em Urbanismo da ULHT

    Grande parte, seno a maior parte, do interesse da Declarao de Bolonha reside exactamente no novo ordenamento cientfico que esta pode provocar nas nossas instituies de ensino. Ensinar bem, certamente, mas sobretudo, se se ensinar o que o Pas necessita

    A declarao de Bolonha pode certamente representar a

    ocasio privilegiada de estabelecer novas regras para o ensino do Urbanismo19 em Portugal. por demais evidente o atraso do nosso pas em termos de formao superior nesta rea:

    Por ser quase inexistente face s necessidades do Pas

    Por estar no essencial alheada das orientaes europeias sobre o ensino do Urbanismo

    Por no corresponder complexidade dos problemas urbansticos que afectam o nosso Pas

    Por estar enfeudada a corporativismo contrrios ao desenvolvimento do Pas

    19 Utilizamos por princpio o termo Urbanismo devido a sua origem latina, tal como a nossa lngua, (Urbanstica em italiano, Urbanisme em Francs, Urbanismo em Castelhano). Planeamento Urbano provem da utilizao corrente nos Pases anglfonos da expresso Town planning, apesar de cada vez mais nesses pases aparecer o termo Urbanism, como na nova corrente que se desenvolve nos EUA denominada por New Urbanism .No deixa de ser significativo que o novo Dicionrio da Lngua Portuguesa Contempornea da Academia das Cincias de Lisboa, publicado em 2001,consagre os termos urbano, urbanista, Urbanstica, e outros no sentido que lhes dado pelo Conselho Europeu dos Urbanistas e pelo Ministrio do Trabalho e Solidariedade na sua Caracterizao das Profisses publicada em 1997

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  • Por estar voluntriamente confundida com outras disciplinas provocando a desinformao entre alunos e pais de alunos e a sociedade em geral

    Ora a alterao desta situao passa pela necessidade das

    universidades compreenderem que o Urbanismo no uma formao residual no mbito de outras matrias. No so certamente as magras horas de aulas no fim dos cursos de Eng. Civil, Arquitectura ou Geografia, nem os Cursos de Introduo ao Urbanismo de 40 horas promovidos pela Ordem dos Arquitectos, que se podem substituir a um consistente plano de estudos de 1 e de 2 e 3 ciclos de formao, nas mltiplas e complexas reas do Urbanismo.

    Por outro lado, o poder poltico comea finalmente a assumir as suas responsabilidade pois a Assembleia da Republica (facto histrico na Poltica Portuguesa) acaba de aprovar em Plenrio e por unanimidade no passado dia 9 de Dezembro a deciso de regulamentar a profisso de Urbanista luz das orientaes europeias sobre a questo (formao, competncias e deontologia), por urgncia e necessidade de dotar o Pas de quadros Urbanistas devidamente qualificados.

    Tendo presente este contexto vamos tentar caracterizar a situao actual do ensino do Urbanismo em Portugal no quadro do Processo de Bolonha. Para tal utilizaremos dois documentos que por razes diversas vo balizar a nossa reflexo. Trata-se Parecer sobre transparncia das denominaes dos cursos, publicado no Dirio da Republica de 28 de Fevereiro com o N 3/2004 e os Relatrios produzidos pelos Coordenadores da implementao do Processo de Bolonha a nvel nacional, por rea de conhecimento. nomeados pelo MCES.

    No caso do ensino do urbanismo estamos ainda longe de vivermos uma situao minimamente conforme ao importante ao Parecer sobre transparncia das denominaes dos cursos

    Este documento aponta para a necessidade urgente da tomada de medidas quanto ao esclarecimento da denominao dos cursos, to necessria para o bom e sustentado entendimento entre estabelecimentos de ensino, alunos, pais de alunos, mundo empresarial, Ordens e Associaes profissionais e sociedade em geral.

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  • Tambm traduz a insatisfao da adequabilidade das formaes com as necessidades efectivas do Pas no presente, equacionando esta questo tambm em termos de desenvolvimento futuro.

    As recomendaes apresentadas nesse parecer, aplicam-se plenamente frgil e confusa estrutura do ensino em Portugal na rea do Urbanismo, que por isso, necessita de ser reavaliada de forma global.

    So particularmente significativas as seguintes recomendaes desse parecer:

    Recomendao b) Assegurar o respeito pelos mnimos exigidos pelas directrizes que existam da Unio Europeia ou das organizaes profissionais internacionais para as respectivas reas cientficas;

    A experincia demonstra que os actuais profissionais

    (Arquitectos e Engenheiros civis, Gegrafos) que lidam com as questes urbansticas, tm actuado muito aqum das necessidades dos elevados padres de qualificao, geralmente utilizados na Unio Europeia

    Com efeito os curricula destes cursos, no correspondem ao que as orientaes do Conselho Europeu dos Urbanistas 20aconselha, para a qualificao de profissionais da rea do Urbanismo, no sendo pertinente esperar que estas profisses actuem para l das competncias que lhes so prprias, as da Arquitectura, da Engenharia Civil ou da Geografia.

    Tambm no so tidas em considerao as orientaes das organizaes internacionais para a promoo do Ensino e da Investigao no domnio do Urbanismo entre as quais mencionamos a ttulo de exemplo:

    AESOP - Association of European Schools of Planning, fundada com o objectivo de representar os interesses das escolas de Urbanismo europeias e promover o desenvolvimento do ensino e

    20 No recm-publicado Dicionrio de Urbanismo de Celson Ferrarri, Professor na Universidade Mackenzie de So Paulo referido que Esta profisso tende, nos pases desenvolvidos, a ganhar autonomia, separando-se das de suas origens: arquiteto, engenheiro, economista, gegrafo, socilogo etc. Dicionrio de Urbanismo de Celson Ferrarri, Disal editora, So Paulo 2004.

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  • da investigao na rea do planeamento regional e urbano. Tem actualmente 165 universidades afiliadas nas quais se leccionam cursos superiores nas reas do Urbanismo e do Planeamento do Territrio.

    APERAU - Association pour la Promotion de l'Enseignement et de la Recherche en Amnagement et Urbanisme agrupa 25 universidades que promovem o ensino do Urbanismo em pases de francfonos: Frana, Canad, Blgica, Marrocos e Lbano

    APSA - Asian Planning Schools Association uma associao de escolas similar AESOP, criada em 1993 em Hong Kong. Agrupa universidades e institutos do Bangladesh, Hong Kong, ndia, Indonsia, Japo, Coreia, Malsia, Singapura, Sri Lanka, Filipinas, Paquisto, Republica Popular da China, Taiwan, Tailndia e Vietname

    ACPS - Association of Collegiate Schools of Planning uma associao Norte Americana de universidades leccionando na rea do Urbanismo e do planeamento regional e urbano, dedicando-se ao conhecimento das dinmicas do desenvolvimento urbano e regional e progresso do ensino do Urbanismo e do Planeamento Regional.

    ANZAPS - Australian and New Zealand Association of Planning Schools que uma rede de docentes de Urbanismo para a troca de ideias, competncias e tcnicas de formao, investigao promovendo as relaes internacionais com outras escolas de Urbanismo

    ANPUR .- Associao Nacional de Ps-graduao e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional que congrega programas universitrios de ps-graduao e entidades brasileiras que desenvolvem ensino e/ou pesquisa no campo dos estudos urbanos e regionais e do planejamento urbano e regional e cujas finalidades principais abrangem: o incentivo ao estudo, ao ensino e pesquisa nesse campo do conhecimento; a divulgao de informaes e a troca de experincias referentes a essas reas de actuao; a promoo de reunies cientficas objectivando o intercmbio de informaes entre os integrantes das instituies associadas e, tambm, com outras associaes congneres, nacionais e estrangeiras

    ALEUP - Asociacin Latinoamericana de Escuelas de Urbanismo y Planeacin que rene universidade da Argentina, Mxico e Venezuela e tem por objectivo o estimulo para o desenvolvimento e melhoramento dos mtodos de ensino em

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  • Urbanismo e desenho urbano no mbito local, e o planeamento ambiental e territorial no mbito regional.

    APUCU- Associao dos Programas Universitrios Canadianos em Urbanismo a qual agrupa 18 Universidades com 24 de formao em ordenamento e Urbanismo reconhecidos pelo Instituo Canadiano de Urbanistas, com o objectivo de promover a excelncia do ensino da investigao e a prtica do planeamento.

    AAPS- Association of African Planning Schools, Associao reunindo 17 universidades em 8 pases.Africa do Sul, Botswana, Zmbia, Tanzania, Ghana, Uganda, Nigria e Knia.

    GPEAN- Global Planning Education Association Network que a instancia a nvel mundial que rene as organizaes acima mencionadas Enfim referncia deve ser feita ao recm-criado Frum Lusfono para o Ensino do Urbanismo que nasceu da articulao da Universidade Lusfona de Humanidades e Tecnologias com a Universidade Estadual da Bahia nas quais funcionam Licenciaturas especficas denominadas de Urbanismo. As instituies acima referidas apenas ilustram o facto, de que a promoo do ensino do Urbanismo uma preocupao partilhada mundialmente e que, no estando sujeita a uma qualquer ortodoxia, muitos pases e universidades tm procurado de acordo com as suas tradies de ensino, formar profissionais com elevada qualificao no domnio do Urbanismo, no respeito pela diversidade de abordagens, da formatao dos cursos e entendimentos dos diferentes processos sociais. Recomendao d) Manter aberto espao a novos cursos emergentes do desenvolvimento cientfico ou da induo de novo conhecimento;

    Grande parte, seno a maior parte, do interesse da Declarao de Bolonha reside exactamente no novo ordenamento cientfico que esta pode provocar nas nossas instituies de ensino. Ensinar bem, certamente, mas sobretudo, se se ensinar o que o Pas necessita qualquer que seja o ponto de chegada que se procura.21

    21 Mrio Moutinho, Implementao da Declarao de Bolonha: O caso do Urbanismo, in Quem tem medo da Declarao de Bolonha? A

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  • A complexidade crescente da deciso urbanstica nas sociedades modernas no se compadece com restritos nveis de qualificao especfica. Tanto a nvel terico como a nvel dos recursos tecnolgicos envolvidos, a cincia urbanstica apresenta-se hoje como uma rea do saber em permanente mudana, face aos desafios da qualificao e da sustentabilidade urbanstica.

    O estado actual generalizado de desorganizao urbanstica, que atinge todo o Pas, tem certamente como origem, pelo menos em parte, a generalizada ausncia de formao no domnio especfico do Urbanismo, tanto no Ensino Superior, como no Ensino Secundrio.

    Lamentavelmente vivemos um tempo onde se reduz o entendimento do espao urbano s suas expresses mais elementares: o limite o loteamento, o passeio do arruamento, o lancil de um hipottico ou adiado parqueamento ou a megalomania dos PDM elaborados para uma populao imaginria de 35 milhes de portugueses !!!.

    A cincia do Urbanismo para grandes sectores da sociedade portuguesa e para algumas associaes profissionais uma cincia desnecessria, marginal ou um subproduto da Arquitectura, de uma Geografia em busca do seu lugar ou da Engenharia Civil, porque se desconhece em geral, porque se desconhece a sua utilidade, porque se desconhecem as suas potencialidades, porque h que preservar privilgios, porque existem inrcias profundas.

    E por ser desnecessria, fcil de entender que para largos sectores da sociedade, tambm no tem de ser ensinada/aprendida, no tem que fazer parte do debate pblico.

    A. O ensino do Urbanismo em Portugal est no essencial desfasado dos documentos que orientam a poltica europeia neste domnio traduzida na Agenda Urbana da Unio Europeia de 1997, na Carta de Aalborg dita de Carta da Sustentabilidade das Cidades Europeias de 1994, ou no relatrio sobre as Cidades Europeias

    declarao de Bolonha e o Ensino Superior em Portugal. Org. Fernando Santos Neves. Sebastio Feyo de Azevedo, Victor Crespo, Antnio Teodoro, Joo Vasconcelos Costa, Anslio Pato de Carvalho, Manuel Damsio, Manuel Pinto de Abreu, Mrio Moutinho, Fernando Cavaco, Manuel da Costa Leite, Lisboa, Edies Universitrias Lusfonas, Abril de 2005.

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  • Sustentveis de 1996 bem como dos programas europeus de investigao cientfica orientados para as questes dos espao urbano europeu em permanente mudana.

    Recomendao e) Reavaliao das designaes existentes, em funo dos contedos e das competncias, distinguindo os contedos de formao graduada, e de complemento de formao ou ps- graduao;

    Existem actualmente em funcionamento vrios cursos que

    fazem apelo denominao Urbanismo. Com excepo do Curso de Urbanismo da ULHT que expressamente reconhece as orientaes do Conselho Europeu de Urbanistas, patente o desacerto das denominaes e a confuso que se estabelece entre Arquitectura, Ambiente e Geografia facilmente detectvel pela anlise dos contedos programticos, objectivos pretendidos e condies de acesso. Desse desacerto so exemplo os cursos de Arquitectura de Gesto Urbanstica, Arquitectura do Planeamento Urbano e Territorial, Curso de Engenharia do Ambiente e Urbanismo, Arquitectura e Urbanismo, Licenciatura em Geografia variante Urbanismo, Mestrado em Qualificao da Cidade, Mestrado em Arquitectura do Territrio !!!.

    Refira-se o reconhecimento pela Ordem dos Arquitectos, como cursos de Arquitectura, dos cursos de Arquitectura de Gesto Urbanstica e do Curso de Arquitectura do Planeamento Urbano e Territorial leccionados na Faculdade de Arquitectura-UTL. No entanto a prpria Faculdade de Arquitectura reconheceu-os como cursos de Urbanismo e no de Arquitectura, pois entendeu que fossem avaliados na qualidade de Cursos de Urbanismo, tal como se constata no Relatrio-Sntese da Comisso de Avaliao Externa de Julho de 2003.

    Quanto ao outro documento acima mencionado tambm

    ressaltam aspectos que no podem deixar de preocupar todos aqueles que desejam mais e melhor ensino de Urbanismo em Portugal.

    Recentemente o MCIES produziu um dos mais desinformados documentos sobre o ensino do Urbanismo. Estamos a referir o documento preparado pelo grupo para a Arquitectura integrado na vasta equipa de 23 Coordenadores por reas de conhecimento

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  • encarregados de elaborar os pareceres relativos a cada uma das reas22 com vista implementao do processo de Bolonha

    Na falta de orientaes consistentes por parte do Ministrio o Grupo para a Arquitectura tratou a formao do Urbanista como sendo uma especialidade da Arquitectura e o grupo de Cincias Humanas assumiru que a Geografia englobava a Geografia Fsica e Estudos Ambientais, Geografia Humana e Planeamento Regional, Geografia humana e Planeamento Urbano, Cartografia e SIGS. (!!!) No pois de admirar que este grupo reconhecesse, que o Arquitecto Urbanista enquanto que especialidade resultava de uma tendncia equivocada do papel do Arquitecto. E mais dizia: Convm, no entanto, observar que o Urbanismo enquanto que cincia que estuda os processos urbanos, no se confunde com o Arquitecto Urbanista e que a este, como criador integrado em equipas multidisciplinares para estudos de planificao urbana, compete a coordenao dos processos de desenho para a criao das formas. Mas paradoxalmente afirmava no entanto, que os principais actos do Arquitecto Urbanista tm como campo preferencial a dimenso urbana dos problemas arquitectnicos o que colocou todo este argumentrio longe portanto da dimenso cientfica/disciplinar do Urbanismo Para um documento que deveria contribuir para a caracterizao dos perfis e competncias de formao e para a caracterizao geral dos cursos 23 o resultado a totalmente inconsistente e desorientador.

    22 Ver o documento Enquadramento da misso dos Coordenadores da implementao do Processo de Bolonha a nvel nacional, por rea de conhecimento, http://www.mctes.pt/docs/ 23 Os objectivos a atingir deveriam contemplar Perfis e competncias de formao: Perfis para exerccio profissional ou para empregabilidade (incluindo actividade acadmica de I&D). Competncias gerais e especficas, pessoais e acadmicas, associadas aos perfis identificados. Enquadramento das necessidades da Sociedade, com a estrutura e durao de ciclos aprovada pela Lei de Bases, em matria de competncias, capacidades e conhecimentos. Competncias e qualificao profissionais vs perfil formativo, de cada um dos dois sub-sistemas do ensino superior. Caracterizao geral dos cursos: Definio e estabelecimento, pelo MCIES, com respeito pela autonomia dos estabelecimentos de ensino superior, de contedos curriculares,

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  • Felizmente que no da nossa responsabilidade deslindar o emaranhado de tais argumentaes

    Mas devemos admitir que, se o Urbanismo uma cincia que estuda os processos urbanos, cuja formao est balizada por importantes documentos europeus e nacionais e que a formao do arquitecto est tambm balizada por directiva Europeia, o bom senso deveria extrair destas constataes que a formao de Arquitectos uma coisa e que a formao de Urbanistas e Engenheiros outra24. Mas tal no transparece no documento do grupo de trabalho nomeado pelo Ministrio. Se nem o Ministrio demonstra um domnio devidamente fundamentado, tambm no de admirar que as prprias universidades andem ao sabor dos interesses corporativos de algumas profisses.

    pois urgente alterar esta situao na medida em que o territrio uma componente da vida finita e um recurso essencial para o desenvolvimento do Pas.

    Devemos pois alargar o debate e tomar todas as iniciativas que ajudem a desenvolver o ensino qualificado do Urbanismo em Portugal.

    Esperamos o dia em que o ensino do Urbanismo seja reconhecido com transparncia pelo tecido universitrio em Portugal, no quadro do desenvolvimento de toda a Europa.

    nomeadamente, de curriculum nacional mnimo, para cada ciclo de formao e para cada rea cientfica e em funo das competncias a adquirir. Racionalizao na designao de cursos. 24 A Directiva 85/384/CEE, de 10 de Junho de 1985, refere explicitamente entre as capacidades que a formao do Arquitecto deve assegurar: conhecimentos adequados em matria de urbanismo, o conhecimento dos problemas de concepo estrutural, de construo e de engenharia civil relacionados com a concepo dos edifcios e conhecimentos no domnio da legislao. Mas isto no significa que a formao em Arquitectura seja suficiente para formar Juristas, Engenheiros e naturalmente Urbanistas. (!!!) como deixa entender a ambiguidade com que a Ordem dos Arquitectos trata estes assuntos

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  • Para concluir de forma assertiva e na base do que foi exposto, julgamos que o ensino do Urbanismo em Portugal se deveria pautar por alguns princpios:

    A complexidade das questes do foro Urbanstico implica uma formao superior especfica a obter no quadro genrico de um 1 ciclo de estudos de 3 anos seguido do 2 Ciclo de 2 anos e do 3 ciclo de estudos de Doutoramento

    Os contedos da formao dos urbanistas e a natureza da actividade esto claramente enunciados em documentos europeus e nacionais que o bom senso aconselharia a ter em considerao com a maior seriedade

    A rejeio liminar de situaes resultantes do atavismo de Ordens e Associaes profissionais de outras reas cientficas alheias s necessidades do Pas.

    Enfim, todas estes princpios devero espelhar-se no Suplemento ao Diploma, pea fundamental do Processo de Bolonha e que para alm de um conjunto de informaes curriculares e institucionais, cuja anlise no se justifica neste texto, deve sobretudo apresentar com clareza as competncias que cada diplomado deve adquirir ao longo do seu trajecto Universitrio de 1 e 2 ciclos de estudo. Com base nas orientaes europeias sobre o ensino do urbanismo, no estudo dos documentos oficiais sobre a questo e no diagnostico das mais prementes necessidade nacionais em termos da Urbanstica, encontra-se actualmente em elaborao o Suplemento ao Diploma da Formao de 1 e 2 ciclos em Urbanismo na ULHT, com base no texto que aqui se transcreve, para reflexo e como contributo, para que to breve quanto possvel seja reconhecido o estatuto de maioridade cientfica, pedaggica e profissional do Urbanismo em Portugal. Suplemento ao diploma da formao de 1 e 2 Ciclos em Urbanismo na ULHT A qualificao dos diplomados em urbanismo envolve as reas do planeamento urbanstico, do planeamento fsico espacial, do ordenamento do territrio, do ordenamento e gesto a nvel urbano, rural e ambiental, sob os seus aspectos socioeconmicos e suas implicaes com vista qualidade Urbanstica e ao desenvolvimento sustentvel.

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  • A qualificao dos diplomados em urbanismo deve permitir 1-Identificar as necessidades presentes e futuras dos meios urbanos citadinos e rurais, pondo em evidencia as oportunidades, os desafios, as condicionantes e as ameaas ao seu desenvolvimento sustentado. 2-Propor, sob forma de polticas, de planos de ordenamento e de planos de urbanismo e demais instrumentos de gesto territorial existentes ou que venham a ser criados, as aces necessrias para desencadear, organizar e promover a qualidade urbanstica e o ordenamento sustentvel do territrio, apoiando-se nos resultados de avaliaes e de estudos de situao e prospectivos, tendo em considerao as diferentes escalas espaciais e as condicionantes socio-econmicas e culturais de cada situao e no seu contexto local, regional e mesmo internacional. 3-Coordenar e assegurar a mediao necessria para a implementao da boa gesto urbana 4- Controlar, conduzir e modificar os planos e as polticas em acordo com a evoluo das necessidades e dos recursos: 5- Gerir e avaliar os efeitos e as implicaes das transformaes urbansticas. 6- Manusear com segurana os recursos tecnolgicos modernos em particular os que so orientados para a prtica do urbanismo. 7- Assimilar e envolver na sua prtica profissional ou terica as contribuies feitas ao urbanismo pelas disciplinas e profisses afins 8- Assegurar a coordenao das equipas responsveis por elaborao de estudos e planos e projectos de planeamento do territrio e do urbanismo 9- Assegurar o controle da execuo de obras de urbanizao e de ordenamento do territrio 10- Assegurar a competncia e os mtodos para desenvolver de forma autnoma projectos de investigao cientfica Enfim para concluir, podemos lembrar um pequeno escrito de Ea de Queirs: Bom Deus, no! Eu no reclamo que o pas escreva livros, ou faa arte: contentar-me-ia que lesse os livros que j esto escritos, e que se interessasse pelas artes que j esto criadas. (1880) In: Ea de Queiroz, Cartas de Inglaterra, Lello & Irmo - Editores, Porto, s/d. P. 180.

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