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1 O IMPACTO DO CPC 02-MOEDA ESTRANGEIRA SOBRE OS RESULTADOS CONTÁBEIS DAS EMPRESAS BRASILEIRAS – UM ESTUDO DO CASO EMBRAER 1. Introdução O dinamismo econômico oriundo da globalização, vivido hoje, que permite as empresas financiarem a expansão e manutenção de seus negócios a um baixo custo através do mercado de capitais, passou também a exigir que as mesmas divulguem informações cada vez mais sólidas e transparentes, obrigando-as a investir em profissionais qualificados e em mecanismos que garantam a qualidade da informação. Segundo Palácios (2010), a convergência da contabilidade a padrões internacionais veio para ficar, trata-se de um processo irreversível e que não se destina somente às empresas abertas e companhias de grande porte. Visando o suporte e orientação ao mercado, foi criado, através da resolução CFC nº 1.055/05 o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), cujos objetivos são o estudo, o preparo e a emissão de Pronunciamentos Técnicos sobre procedimentos de Contabilidade e a divulgação de informações dessa natureza, o que abriu caminho para emissão de normas pela entidade reguladora brasileira, permitindo a centralização e uniformização do seu processo de produção, levando sempre em conta a convergência da Contabilidade Brasileira aos padrões internacionais e as melhores práticas contábeis. O CPC emitiu e emite diversos pronunciamentos, dentre eles o CPC 02 (Efeito das Mudanças nas Taxas de Câmbio e Conversão das Demonstrações Contábeis) que é correlacionado à norma internacional IAS 21 e tem como objetivo instruir sobre “como registrar transações em moeda estrangeira e operações no exterior nas demonstrações contábeis de uma entidade no Brasil, registrar as variações cambiais dos ativos e passivos em moeda estrangeira e como converter as demonstrações de uma entidade de uma moeda para outra.”(COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS, 2007) O presente trabalho tem por objetivo estudar e compreender, como, e em que dimensão os métodos de

O IMPACTO DO CPC 02 SOBRE OS RESULTADOS CONTÁBEIS DAS EMPRESAS BRASILEIRAS - UM ESTUDO DO CASO EMBRAER

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O IMPACTO DO CPC 02-MOEDA ESTRANGEIRA SOBRE OS RESULTADOS CONTÁBEIS DAS EMPRESAS BRASILEIRAS – UM ESTUDO DO CASO EMBRAER

1. Introdução

O dinamismo econômico oriundo da globalização, vivido hoje, que permite as empresas financiarem a expansão e manutenção de seus negócios a um baixo custo através do mercado de capitais, passou também a exigir que as mesmas divulguem informações cada vez mais sólidas e transparentes, obrigando-as a investir em profissionais qualificados e em mecanismos que garantam a qualidade da informação.

Segundo Palácios (2010), a convergência da contabilidade a padrões internacionais veio para ficar, trata-se de um processo irreversível e que não se destina somente às empresas abertas e companhias de grande porte. Visando o suporte e orientação ao mercado, foi criado, através da resolução CFC nº 1.055/05 o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), cujos objetivos são o estudo, o preparo e a emissão de Pronunciamentos Técnicos sobre procedimentos de Contabilidade e a divulgação de informações dessa natureza, o que abriu caminho para emissão de normas pela entidade reguladora brasileira, permitindo a centralização e uniformização do seu processo de produção, levando sempre em conta a convergência da Contabilidade Brasileira aos padrões internacionais e as melhores práticas contábeis.

O CPC emitiu e emite diversos pronunciamentos, dentre eles o CPC 02 (Efeito das Mudanças nas Taxas de Câmbio e Conversão das Demonstrações Contábeis) que é correlacionado à norma internacional IAS 21 e tem como objetivo instruir sobre

“como registrar transações em moeda estrangeira e operações no exterior nas demonstrações contábeis de uma entidade no Brasil, registrar as variações cambiais dos ativos e passivos em moeda estrangeira e como converter as demonstrações de uma entidade de uma moeda para outra.”(COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS, 2007)

O presente trabalho tem por objetivo estudar e compreender, como, e em que dimensão os métodos de contabilização, utilizados para registro dos valores referentes à variação cambial, afetam o resultado da Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. - EMBRAER, e se contribuem, à diferença entre o lucro divulgado à NYSE1 (Formulário 20-F SEC) e o lucro divulgado à BM&FBovespa2.

1 NYSE abreviação oficial da Bolsa de Valores de Nova York, New York Stock Exchange, localizada em Manhattam, Wal Stret, onde são negociadas ações de empresas norte-americanas, ADR´s de empresas estrangeiras, etc..2 BMF&Bovespa, abreviação oficial da Bolsa de Valores, Mercados e Futuros de São Paulo, empresa privada de capital aberto, que atua na intermediação de operações do mercado de capitais brasileiro, onde são negociadas ações, contratos de futuro, opções, etc..

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2. Revisão Bibliográfica

O presente trabalho inicia-se com uma breve revisão de diversos estudos acerca da convergência da contabilidade brasileira as normas internacionais. Artigos, trabalhos de conclusão de curso, livros, teses, etc., os quais buscam compreender, através de “abordagens globais ou parciais3”, os impactos pertinentes à adoção dos padrões internacionais de contabilidade.

Analisá-los nos permitiu observar que à diferença entre o lucro reportado pelas empresas brasileiras à NYSE (Formulário 20-F SEC) e o reportado à BMF&Bovespa é uma constante.

A EMBRAER, assim como diversas empresas brasileiras, reportou à NYSE (Formulário 20-F SEC) lucro superior ao informado à BMF&Bovespa, Gray (1980-1988) observou que esse fato é freqüente e ocorre devido às diferenças entre as normas brasileiras, BR GAAP, e as normas americanas, US GAAP.

“Nesse trabalho4 Gray (1988) classifica o Brasil (juntamente com França, Itália, Espanha e Argentina), os quais, em comparação com os países de influência anglo-americana, se caracterizam por um menor espaço para julgamento do profissional do exercício da contabilidade, um maior formalismo e uniformidade na aplicação das normas, pouca transparência nas informações e um maior grau de conservadorismo na mensuração do resultado. Mais especificamente, o conservadorismo na mensuração do lucro decorreria de uma contabilidade mais voltada para o fisco, nesses países, ao contrário da ênfase no investidor em países de influência anglo-americana, nos quais se desvincula a contabilidade para o investidor da contabilidade para o fisco.” (SANTOS, 2010)

As constatações de Gray (1980 – 1988) e também dos estudos revisados, estudos estes sucintamente descritos e explicados nos próximos tópicos, são o norte deste trabalho.

2.1. Convergência das Normas Contábeis Brasileiras às Normas Internacionais

Lemes e Carvalho (2007) publicaram o artigo “Comparabilidade entre o resultado em BR GAAP e U.S. GAAP; evidências das companhias brasileiras listadas nas bolsas norte-americanas”. Trabalho orientado pela seguinte questão: Quais são as diferenças informais no lucro apresentado de acordo com os BR GAAP e os U.S. GAAP, nos anos de 2000 a 2005, e qual a magnitude destas diferenças?

3 “Abordagens globais ou parciais” referem-se ao fato de quê alguns trabalhos estudam o impacto da adoção das normas internacionais de contabilidade na sua totalidade, outros analisam apenas o impacto da adoção de parte destas normas.4 O Trabalho de Gray acima citado é: GRAY, S. J. Towards a theory of cultural influence on the development of accounting systems internationally. Abacus, v. 24, n. 1, p. 1-15, 1988.

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Através de seus estudos objetivavam identificar o nível de comparabilidade entre os resultados divulgados pelas empresas brasileiras, de acordo com os BR GAAP e com os U.S. GAAP, que emitem ADRs, Nível II e III, utilizando do Índice de Comparabilidade de Gray para tal análise. Estudaram uma amostra composta por 30 empresas, listadas nas bolsas de valores norte-americanas, especificamente na Bolsa de Valores de Nova Iorque (NYSE – New York Stock Exchange) e na NASDAQ (National Association of Securities Dealers Automated Quotation System), que negociam ADRs dos níveis II e III.

Concluíram que o resultado da maioria das empresas estudadas, 21 das 30 companhias, apresenta diferenças em um nível de materialidade de 15% e consideraram relevante o fato que 16 das empresas, apresentaram um percentual virtualmente maior do lucro divulgado no Brasil em relação ao lucro divulgado nos EUA, contrariando a crença amplamente divulgada de que as empresas brasileiras são conservadoras no reconhecimento de despesas e receitas.

Santos e Calixto (2010) estudaram os impactos do início da harmonização contábil, (Lei 11.638/07) nos resultados das empresas abertas. As autoras buscavam descobrir se como ocorreu em outros países, à convergência as IFRS trás benefícios de liquidez, menor custo de capital, maior valorização e atratividade as empresas brasileiras no mercado de capitais.

O foco central de seus estudos é a hipótese apontada por Gray (1980), que propôs o Índice de Conservadorismo visto que previu que sistemas contábeis de tradição eurocontinental como o do Brasil tendem a apresentar lucros menores diante dos sistemas de influência anglo-americana, como são os US GAAP e o IFRS, hipótese confirmada por outros estudos.

Concluíram que houve um aumento médio do lucro de 2007 em 8,1% e uma diminuição média de -7% em 2008, o que contraria a hipótese formulada por Gray. Ressaltam, porém, que o baixo grau de compliance das empresas brasileiras, em relação à adoção das novas normas e os efeitos da crise financeira global sobre as empresas influenciaram os resultados obtidos na pesquisa. Frisam que, isolando as empresas que apresentaram alto comprometimento com a adoção das novas normas e excluindo os custos apontados como provenientes dos impactos da crise financeira, ou seja, simulando um cenário econômico e de mercado “ideal”, a hipótese de Gray se confirma.

Cia e Santos (2008) aprofundaram a investigação iniciada por Santos et al (2007)5 sobre empresas brasileiras, que comparou os resultados apresentados ao mercado nacional, orientados pelas normas contábeis brasileiras e os resultados apresentados ao mercado americano, que seguem as normas contábeis USGAAP, sob a ótica da teoria do Índice do Conservadorismo de Gray (1980, 1988) e concluiu que há inconsistências quanto ao conservadorismo nos resultados das mesmas, quer ao longo do tempo, quer entre as empresas analisadas.

A pesquisa abordou o problema:

“Qual o impacto esperado no lucro das empresas brasileiras com a harmonização contábil internacional, ensejada pela Nova Lei das S/As? Mais especificamente, a relevância das diferenças entre as

5 A investigação iniciada por Santos et al teve seus resultados publicados no artigo: SANTOS, E. S. et al. US GAAP x normas brasileiras: Há diferenças significativas no valor do lucro reportado pelas empresas brasileiras com ADRs na NYSE? In: ENANPAD, XXXI, 2007, Rio de Janeiro. Anais do XXXI ENANPAD. Rio de Janeiro: ANPAD, 2007, p 1-15.

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normas contábeis, brasileira e americana, apontada na literatura, se reflete nas duplas demonstrações das emissoras de ADRs, em particular, nos ajustes ao resultado BRGAAP/USGAAP reportados no Formulário 20-F da SEC? Que ajustes mais ocorrem? Quais geram maior impacto no lucro? Como tais ajustes se comportam ao longo do tempo? Até que ponto esses ajustes esclarecem inconsistências entre empresas e no tempo, observadas em estudos anteriores?” (CIA e SANTOS, 2010)

O objetivo foi estimar o impacto esperado no lucro das empresas brasileiras a partir da harmonização da contabilidade as normas internacionais, tendo como proxy as diferenças entre as práticas contábeis brasileiras e a americana. Consideram que é necessário observar que a diferença entre o padrão IFRS e o USGAAP é pequena, tanto que a partir de 2007 a SEC passou a aceitar o padrão IFRS para as empresas estrangeiras listadas nas bolsas americanas.

Os resultados ajustados, pois posterior a apresentação os mesmos eram republicados nos anos seguintes com alterações e correções, referentes ao período de 2001 a 2006, de 30 empresas listadas na BMF&Bovespa e com ADRs na NYSE foram à base do estudo, que foi analisada através de instrumentos de estatística descritiva e do teste não paramétrico de sinais por postos de Wilcoxon. A utilização de tal base contribuiu para superar a discrepância e as inconsistências mencionadas por Santos et al (2007).

Confirmaram a previsão teórica do conservadorismo, bem como estimaram um novo patamar de lucro, aproximadamente 9,5% superior ao atual, a ser ensejado pela presente transição para o padrão internacional. Observam que o estudo é limitado pela indisponibilidade de dados, que a utilização das séries históricas USGAAP não se configura como proxy perfeita dos IFRS e que o resultado do estudo limita-se as empresas brasileiras sujeitas à adoção do padrão internacional, visto o fato de que apenas 15 empresas publicaram tabela de reconciliação do lucro.

2.2. O CPC 02 Impactos Pertinentes a sua Adoção

Silva e outros (2007) estudaram os métodos utilizados para conversão de demonstrações contábeis em moeda estrangeira adotados no Brasil através da comparação das regras impostas pela norma CVM 28/86, as regras impostas pela norma norte americana SFAS 52 e as regras impostas pela norma internacional IAS 21 (correlação as normas do CPC 02).

Os autores simularam, utilizando os dados econômicos do período de 2000 a 2005, os resultados de uma empresa multinacional brasileira fictícia com investimentos societários no exterior, aplicaram posteriormente as regras de conversão impostas por cada uma das três normas citadas no parágrafo anterior e compararam os números obtidos.

Concluíram que a norma adotada pelo Brasil, CVM 28/86, era defasada, pois, além de não apresentar conceitos fundamentais como o de moeda funcional e de apresentação, trata dos efeitos cambiais da conversão das demonstrações contábeis da mesma maneira, independentemente do método utilizado. Observaram também, que os critérios de conversão

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do SFAS 52 e IAS 21 tornam possível uma avaliação mais adequada da rentabilidade de investimentos societários no exterior e do resultado da investidora, visto que não há impacto no resultado de equivalência patrimonial provenientes dos efeitos cambiais decorrentes da conversão.

Santana (2006) apresentou o estudo: “As semelhanças e Diferenças na Escolha da Moeda Funcional Gerando diferentes Métodos de Tradução – Caso CVRD e ARACRUZ”, onde objetivava verificar quais os motivos que levaram duas empresas brasileiras, que exportam grande parte da sua produção, a escolherem moedas funcionais diferentes. O mesmo realizou sua análise através da comparação dos motivos que influenciaram a escolha das empresas brasileiras e os pré-requisitos para escolha de moeda funcional listados no SFAS 52.

O trabalho do autor teve como norteadoras as normas do CPC 02, que orientam sobre escolha da moeda funcional, abaixo descritas:

- moeda que mais influencia os preços de vendas de bens em serviços (geralmente é a moeda na qual os preços de venda para seus bens e serviços estão expressos e são liquidados);

- moeda do país cujas forças competitivas e regulações mais influenciam na determinação dos preços de venda para seus bens e serviços;

- moeda por meio da qual são originados recursos das atividades de financiamento (exemplo: emissão de títulos de dívida ou ações);

- moeda por meio da qual os recursos gerados pelas atividades operacionais são usualmente acumulados;

“Quando os indicadores acima estão mesclados e a determinação da moeda funcional não é um processo tão óbvio, a administração deve se valer de julgamento para determinar a moeda funcional que representa com maior fidedignidade os efeitos econômicos das transações, eventos e condições subjacentes. Como parte dessa abordagem, a administração deve priorizar os indicadores primários do item 9 antes de levar em consideração os indicadores enumerados nos itens 10 e 11, os quais são fornecidos para servirem como evidência adicional para determinação da moeda funcional da entidade. .”(COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS, 2007)

Concluiu que a escolha das empresas, que exportam grande parte da produção por métodos distintos, deu-se não em vista de optar pelas melhores práticas contábeis, mas sim por aspectos econômicos, ligados aos lucros e aos preços dos ADR, negociados, na bolsa de Nova York.

Eggers (2010) através de estudo de caso, que teve como objeto uma transportadora com sucursal uruguaia, buscou entender as conseqüências da aplicação das normas do CPC 02 e, também, fornecer subsídio a empresas e profissionais para implantação do mesmo.

Observa que a utilização do método de conversão das demonstrações contábeis, apresentado no Manual de Contabilidade Societária, torna o processo de adequação ao CPC 02 mais simples, visto a lógica das etapas da conversão demonstradas no mesmo.

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Conclui, em concordância com o estudo apresentado no XXXI encontro da ANPAD por Silva e outros (2007) que a norma brasileira anteriormente vigente, CVM 28/86, estava defasada pela falta de conceitos primordiais, como de moeda funcional e por tratar as variações cambiais proveniente da conversão das demonstrações como resultado do período em que ocorreram. Observa ainda, que o CPC 02 permite a visualização, separadamente, do resultado de variação cambial e do resultado do investimento, do negócio.

2.3. Compreensão dos Impactos Provenientes da Implantação do IFRS

Os resultados dos diversos estudos, acima analisados, demonstram que algumas normas utilizadas no mercado brasileiro estavam defasadas, como a CVM 28/86. Sugerem também que, a aplicação de teorias como a do Índice de Conservadorismo de Gray (1980) ao mercado de capitais brasileiro deve ser aprofundada, devido à contradição dos resultados obtidos em estudos sobre o tema, que tiveram como base informações de companhias brasileiras.

Três estudos, dentre os analisados, têm a Teoria de Gray (1980-1988) como hipótese orientadora, dois a confirmam, um refuta. O presente trabalho segue a linha dos mesmos, porém, através da comparação entre o lucro reportado pela EMBRAER a NYSE, com o lucro reportado pela mesma a BMF&Bovespa, busca não somente confirmar ou refutar tal teoria, mas concomitantemente, compreender o quão a diferença entre a moeda funcional e a moeda de apresentação contribuem para que o resultado reportado ao mercado brasileiro seja menor que o reportado ao mercado americano.

3. Procedimentos Metodológicos

O estudo, aqui realizado, deu-se através de um estudo de caso,

“técnica de pesquisa cujo objetivo é o estudo de uma unidade que se analisa profunda e intensamente. Considera a unidade social estudada em sua totalidade, seja um indivíduo, uma família, uma instituição, uma empresa, ou uma comunidade, com o objetivo de compreendê-los em seus próprios termos” (MARTINS, LINTZ, 2007).

3.1. A Entidade Estudada

A entidade objeto desta pesquisa, cujo caso será estudado, é a EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A., uma sociedade por ações, com sede na cidade de São José dos Campos, Estado de São Paulo, Brasil, que tem como objetivo social o desenvolvimento, a produção e comercialização de jatos e turboélices para aviação civil e de defesa, de aviões

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para uso agrícola, de partes estruturais, de sistemas mecânicos e hidráulicos, serviços aeronáuticos e atividades técnicas vinculadas á produção e manutenção aeroespacial.

Escolhemos a EMBRAER por se tratar de uma multinacional, cuja moeda funcional é o dólar norte americano, a moeda de apresentação o real brasileiro, com fluxo de caixa múlti cambial, ações cotadas na Bolsa de Valores de Nova York (NYSE) e Bolsa de Valores de São Paulo (BMF Bovespa), sujeita à convergência as normas internacionais de contabilidade e, portanto, adoção do CPC 02, pronunciamento técnico objeto deste estudo.

3.2. Teoria Do Conservadorismo de Gray e suas Implicações

O desenvolvimento do trabalho foi orientado, inicialmente, pela Teoria do Conservadorismo desenvolvida por Gray (1980-1988), o qual, embasado em análises de demonstrações contábeis de empresas de diversos países e, portanto sujeitas a diferentes legislações e normas contábeis, concluiu que: empresas de países que adotam normas contábeis de tradição euro-continental como o Brasil tendem ao conservadorismo ao mensurar seu resultado, visto o foco no reporte ao fisco, enquanto empresas de países que adotam normas de tradição anglo-americana tendem a reportar resultados maiores, visto o foco no investidor.

A Teoria de Gray é válida não somente para empresas de países distintos, mas adicionalmente a empresas que tenham ações negociadas em mercados diferentes, situação da EMBRAER, conforme constatado em diversos estudos. Optar pela negociação de suas ações na NYSE obrigou a companhia a divulgar suas demonstrações concomitantemente no Brasil e EUA seguindo as normas brasileiras BR GAAP e as normas americanas US GAAP.

3.3. Análise dos Dados

A base analisada é composta pelas demonstrações contábeis da EMBRAER publicadas entre 2005 e 2010 na BMF&Bovespa e na NYSE. A base foi dividida em duas amostras, denominadas A e B, abaixo descritas:

- Amostra A: demonstrações referentes aos anos de 2005, 2006 e 2007, elaboradas de acordo com as normas BR GAAP no Brasil e US GAAP nos EUA, apresentadas à BM&FBovespa e NYSE, respectivamente;

- Amostra B: demonstrações referentes aos anos de 2008, 2009, e 2010, elaboradas de acordo com as normas internacionais IFRS no Brasil e US GAAP nos EUA, apresentadas à BM&FBovespa e NYSE, respectivamente.

Inicialmente comparamos os resultados apresentados pela empresa ao mercado americano com o apresentado ao mercado brasileiro nas demonstrações da amostra “A”, visando validar ou refutar a Teoria de Gray (1980-1988).

Por conseguinte ajustamos os resultados apresentados ao mercado brasileiro, adicionando aos mesmos os ganhos/perdas provenientes da conversão das demonstrações

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contábeis dos investimentos no exterior, e os comparamos aos resultados apresentados ao mercado americano. Os mesmos métodos aplicados à amostra A foram aplicados à amostra B.

As análises acima descritas permitiram confirmar/refutar a Teoria de Gray, mensurar o impacto das perdas/ganhos provenientes da conversão de demonstrações contábeis sobre o resultado da companhia e, por final, avaliar os impactos da convergência às normas internacionais de contabilidade sobre o resultado da companhia.

4. Análise comparativa dos Índices de Lucratividade da EMBRAER referentes à Amostra A.

A tabela 1 contém os índices de lucratividade6 da EMBRAER, calculados a partir dos dados apresentados pela Companhia à NYSE, em suas demonstrações contábeis, através dos formulários 20-F. Demonstrações estas, elaboradas de acordo com as normas contábeis norte americanas, US GAAP, referentes aos anos de 2005, 2006 e 2007 e, portanto, expressas em dólar norte americano, moeda funcional da empresa.

Tabela 1 - Índices de Lucratividade EMBRAER (Dados Formulário 20F - NYSE)

AnoNYSE - Formulário 20F

Receita Líquida U$ Lucro Líquido U$ Ativo Total U$ PL U$ (%) Rec. = Lucro ROA2005 $ 3,829,907,000.00 $ 445,719,000.00 $ 6,932,445,000.00 $ 1,620,254,000.00 11.64% 6.43%2006 $ 3,759,519,000.00 $ 390,140,000.00 $ 7,097,741,000.00 $ 1,874,281,000.00 10.38% 5.50%2007 $ 5,245,200,000.00 $ 489,300,000.00 $ 8,065,900,000.00 $ 2,249,500,000.00 9.33% 6.07%

Média >>> 10.45% 6.00%Fonte: EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Dados publicados em: http://secfilings.nyse.com/files.php?symbol=erj&fg=24 (Formulário 20-F) e em: http://ri.embraer.com.br/Embraer/Show.aspx?id_canal=K5KOjk5x3zUjS7cwZKOlMA.

Abaixo, demonstrados na tabela 2, os índices de lucratividade da EMBRAER calculados a partir dos dados apresentados pela empresa à BM&FBovespa, em suas demonstrações contábeis, através de seu relatório anual. Demonstrações estas, elaboradas de acordo com as normas contábeis brasileiras, BR GAAP, referentes aos anos de 2005, 2006, 2007 e, portanto, expressas em real brasileiro, moeda de apresentação da empresa.

Fonte: EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Dados publicados em: http://secfilings.nyse.com/files.php?symbol=erj&fg=24 (Formulário 20-F) e em: http://ri.embraer.com.br/Embraer/Show.aspx?id_canal=K5KOjk5x3zUjS7cwZKOlMA.

6 Os Índices de Lucratividade presentes nas tabelas deste estudo são: % Receita = Lucro (percentual da receita que se transforma em lucro líquido); ROA – Return on Assets, Retorno sobre o Ativo Total (Lucro líquido após os impostos/Ativo Total da Companhia), ROE – Return on Equity, Retorno sobre o Patrimônio Líquido (Lucro líquido após os impostos/Patrimônio Líquido da Companhia.

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Comparativamente dispostos, na tabela 3, os índices de lucratividade calculados em cima dos dados apresentados à NYSE e à BM&FBovespa respectivamente, demonstrados também, nas tabelas 1 e 2.

Tabela 1 - Índices de Lucratividade Embraer (Dados Formulário 20F - NYSE)

AnoNYSE - Formulário 20F

Receita Líquida U$ Lucro Líquido U$ Ativo Total U$ PL U$ (%) Rec. = Lucro ROA2005 $ 3,829,907,000.00 $ 445,719,000.00 $ 6,932,445,000.00 $ 1,620,254,000.00 11.64% 6.43%2006 $ 3,759,519,000.00 $ 390,140,000.00 $ 7,097,741,000.00 $ 1,874,281,000.00 10.38% 5.50%2007 $ 5,245,200,000.00 $ 489,300,000.00 $ 8,065,900,000.00 $ 2,249,500,000.00 9.33% 6.07%

Fonte: EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Dados publicados em: http://secfilings.nyse.com/files.php?symbol=erj&fg=24 (Formulário 20-F) e em: http://ri.embraer.com.br/Embraer/Show.aspx?id_canal=K5KOjk5x3zUjS7cwZKOlMA.

A análise dos dados das tabelas 1, 2 e 3, nos permite observar que os índices de lucratividade ((%) Rec. = Lucro, ROA, ROE), calculados em cima dos dados apresentados à NYSE, são, em média7, superiores em 43,38%, 47,48% e 76,16%, respectivamente, aos índices calculados em cima dos dados apresentados à BM&FBovespa, “média geral8” 55,67%.

Concluímos pautados na análise acima, a qual constata que a rentabilidade da empresa calculada a partir dos dados apresentados à NYSE é superior a calculada em cima dos dados apresentados à BM&FBovespa, que é válida a Teoria do Conservadorismo de Gray (1980 – 1988).

4.1. Análise comparativa dos Índices de Lucratividade da EMBRAER ajustados, referentes à Amostra A.

Calculamos, abaixo demonstrados, tabela 4, os índices de lucratividade da EMBRAER, a partir do lucro líquido apresentado pela mesma à BM&FBovespa, ajustado (adicionamos ao mesmo o resultado referente à conversão de demonstrações contábeis dos investimentos no exterior).

Fonte: EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Dados publicados em: http://secfilings.nyse.com/files.php?symbol=erj&fg=24 (Formulário 20-F) e em: http://ri.embraer.com.br/Embraer/Show.aspx?id_canal=K5KOjk5x3zUjS7cwZKOlMA.

7 Fórmula de cálculo: (Média do índice calculado a partir dos dados apresentados à NYSE – média o índice calculado a partir dos dados apresentados à BM&FBovespa)/Média o índice calculado a partir dos dados apresentados à BM&FBovespa. A mesma foi aplicada à cada índice.8 Fórmula: Média dos resultados obtidos com a utilização da fórmula descrita na nota 7.

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A seguir, tabela 5, comparação dos índices apresentados na tabela 4 aos da tabela 1.

Fonte: EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Dados publicados em: http://secfilings.nyse.com/files.php?symbol=erj&fg=24 (Formulário 20-F) e em: http://ri.embraer.com.br/Embraer/Show.aspx?id_canal=K5KOjk5x3zUjS7cwZKOlMA.

Observamos, através da análise dos índices apresentados na tabela 5, que após ajustar os resultados apresentados à BM&FBovespa, a rentabilidade calculada a partir dos dados apresentados à NYSE continua superior à rentabilidade calculada a partir dos dados ajustados, porém a diferença reduz se de 43,38% para 17,83%, de 47,48% para 20,27% e de 76,16% para 44,40%, a média geral de 55,67% para 27,50%.

Conforme constatado, através da análise dos dados da tabela 5, o resultado referente às conversões de demonstrações contábeis de investimentos no exterior corresponde, em média, por 50% da diferença entre os índices de lucratividade calculados a partir dos dados apresentados à NYSE e os calculados a partir dos dados apresentados à BM&FBovespa.

4.2. Análise comparativa dos Índices de Lucratividade da EMBRAER referentes à Amostra B.

A tabela 6, similar a tabela 1, contém os índices de lucratividade da EMBRAER, calculados a partir dos dados apresentados pela Companhia à NYSE, em suas demonstrações contábeis, através dos formulários 20-F. Demonstrações estas, elaboradas de acordo com as normas contábeis norte americanas, US GAAP, referentes aos anos de 2008, 2009 e 2010 e, portanto, expressas em dólar norte americano, moeda funcional da empresa.

Fonte: EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Dados publicados em: http://secfilings.nyse.com/files.php?symbol=erj&fg=24 (Formulário 20-F) e em: http://ri.embraer.com.br/Embraer/Show.aspx?id_canal=K5KOjk5x3zUjS7cwZKOlMA.

Abaixo, demonstrados na tabela 7, similar a tabela 2, os índices de lucratividade da EMBRAER calculados a partir dos dados apresentados pela empresa à BM&FBovespa, em suas demonstrações contábeis, através de seu relatório anual. Demonstrações estas, elaboradas

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com as normas internacionais de contabilidade, IFRS, referentes aos anos de 2008, 2009, 2010 e, portanto, expressas em real brasileiro, moeda de apresentação da empresa.

Fonte: EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Dados publicados em: http://secfilings.nyse.com/files.php?symbol=erj&fg=24 (Formulário 20-F) e em: http://ri.embraer.com.br/Embraer/Show.aspx?id_canal=K5KOjk5x3zUjS7cwZKOlMA.

Comparativamente dispostos, na tabela 8, os índices de lucratividade calculados em cima dos dados apresentados à NYSE e à BM&FBovespa respectivamente, demonstrados também, nas tabelas 6 e 7.

Fonte: EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Dados publicados em: http://secfilings.nyse.com/files.php?symbol=erj&fg=24 (Formulário 20-F) e em: http://ri.embraer.com.br/Embraer/Show.aspx?id_canal=K5KOjk5x3zUjS7cwZKOlMA.

Os índices de lucratividade da companhia calculados a partir dos dados apresentados à NYSE são, em média, superiores aos calculados apresentados a partir dos dados apresentados à BM&FBovespa, em 14,62%, 14,18% e 21,15% respectivamente, média geral 16,65%.

Abstendo-nos aos dados de 2009 e 2010, podemos observar que os índices de lucratividade da companhia são bem próximos. A diferença entre os mesmos é, em média, de 0,87%, -8,12% e -8,39% respectivamente, ressaltamos que o ROA e o ROE, calculados a partir dos dados apresentados ao mercado brasileiro, são superiores aos mesmos índices calculados a partir dos dados apresentados ao mercado americano.

Analisar as tabelas 6, 7 e 8 nos permite concluir que a adoção das normas internacionais de contabilidade, IFRS, pelo Brasil, trouxe maior uniformidade entre as demonstrações contábeis divulgadas pela companhia à BM&FBovespa e as divulgadas à NYSE, propiciando aos investidores de ambos os mercados visão similar da situação econômico financeira da empresa.

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4.3. Análise comparativa dos Índices de Lucratividade da EMBRAER ajustados, referentes à “Amostra B”.

Abaixo demonstrados, tabela 9, os resultados da companhia apresentados à BM&FBovespa nos anos de 2008, 2009 e 2010 aos quais adicionamos o valor referente a variação da conta Ajustes Acumulados de Conversão.

2008 6.25% 4.58% 17.38% 3.65% 1.99% 6.99%2009 8.71% 5.39% 16.61% 8.62% 6.06% 18.67%2010 6.44% 4.12% 11.03% 6.40% 4.29% 11.50%

Médias 7.13% 4.70% 15.01% 6.22% 4.11% 12.39%

14.62% 14.18% 21.15% 16.65%Fonte: EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Dados publicados em: http://secfilings.nyse.com/files.php?symbol=erj&fg=24 (Formulário 20-F) e em: http://ri.embraer.com.br/Embraer/Show.aspx?id_canal=K5KOjk5x3zUjS7cwZKOlMA.

Comparativamente dispostos, tabela 10, estão os índices de lucratividade da companhia calculados a partir dos dados apresentados à NYSE, tabela 6, e os índices calculados a partir dos resultados apresentados à BM&FBovespa ajustados, tabela 9,

Tabela 10 - Resumo Comparativo dos Índices de Lucratividade

AnoNYSE Formulário 20-F BM&Fbovespa - Relatórios Anuais

(%) Rec. = Lucro ROA ROE (%) Rec. = Lucro ROA ROE2008 6.25% 4.58% 17.38% 15.97% 11.07% 39.60%2009 8.71% 5.39% 16.61% -5.89% -3.93% -12.69%2010 6.44% 4.12% 11.03% 3.84% 2.30% 6.85%

Médias 7.13% 4.70% 15.01% 4.64% 3.15% 11.25%Fonte: EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Dados publicados em: http://secfilings.nyse.com/files.php?symbol=erj&fg=24 (Formulário 20-F) e em: http://ri.embraer.com.br/Embraer/Show.aspx?id_canal=K5KOjk5x3zUjS7cwZKOlMA.

Os dados da tabela 10 permitem observar que os índices de lucratividade calculados a partir dos dados apresentados à NYSE são, em média, 53,74%, 49,26% e 33,35% superiores aos calculados a partir dos dados resultados apresentados à BM&FBovespa ajustados, média geral de 45,45%.

A adição da variação do saldo da conta Ajustes Acumulados de Conversão aos resultados da companhia apresentados à BM&FBovespa tornou os índices de lucratividade da mesma, referentes ao período de 2008 a 2010 próximos aos referentes ao período de 2005 a 2007, corroborando a constatação da análise do item 4.1., deste trabalho.

A análise acima nos permite concluir que é relevante a contribuição dos métodos de contabilização da variação cambial, constantes do CPC 02, à uniformização dos dados divulgados aos investidores. Concomitantemente, assim como Silva e outros (2007), constatamos que a norma CVM 28/86 estava defasada, visto o fato de não definir moeda funcional, moeda de apresentação e ainda distorcer os índices de lucratividade da companhia.

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5. Conclusão

O presente estudo, pautado em diversas análises, valida assim como os trabalhos de Cia e Santos (2008) e de Santos e Calixto (2010), a teoria do Conservadorismo de Gray (1980 – 1988).

Corrobora a afirmação acima, o fato de quê, os resultados apresentados pela EMBRAER à NYSE, através de suas demonstrações contábeis, elaboradas de acordo com as normas contábeis americanas US GAAP, de tradição anglo americana são superiores aos resultados apresentados à BM&FBovespa, através de suas demonstrações contábeis elaboradas de acordo com as normas contábeis brasileiras BR GAAP, de tradição euro continental, até 2007 e posteriormente de acordo com as normas internacionais de contabilidade IFRS.

A adoção das normas internacionais de contabilidade pelo Brasil reduziu, porém não eliminou a diferença entre os resultados da companhia, acima citada. Cerca de 50% da diferença, referente aos anos de 2005, 2006 e 2007, é explicada pelo resultado de conversão de demonstrações contábeis de investimento no exterior, conforme constatado neste trabalho no item 4.2., o qual era contabilizado de acordo com a norma CVM 28/86.

Ressaltamos, pautados nas análises deste estudo, a relevância do tratamento dispensado aos valores referentes à variação cambial resultante da conversão de investimentos no exterior. Corrobora esta constatação o fato de quê adicionar aos resultados da companhia, divulgados à BM&FBovespa entre 2008 e 2010, o valor referente a variação da conta ajustes acumulados de conversão, torna os índices de lucratividade da empresa próximos aos do período de 2005 a 2007.

Consideramos, assim como vários autores estudados, que é benéfica ao Brasil a adoção das normas internacionais de contabilidade. As mesmas permitem aos investidores, em escala global, analisar, pautados em dados claros, a situação econômica e financeira das empresas brasileiras.

O alcance dos resultados do presente trabalho é limitado pelos seguintes fatores: impossibilidade de conciliação do saldo da conta ajustes acumulados de conversão; indisponibilidade de dados; reduzido período de análise; quantidade de empresas analisadas; impactos da crise financeira de 2008 sobre o câmbio.

Sugerimos a futuros estudos, buscar compreender, decompor, a diferença entre os resultados apresentados pelas companhias brasileiras à NYSE e os resultados apresentados à BM&FBovespa, pois, constatamos neste trabalho e observamos nos estudos que nos nortearam que a composição desta diferença é uma incógnita.

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