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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI GABRIELLA CRISTINA MOURA DOS SANTOS O MEIO AMBIENTE NA TELEVISÃO: A TRANSAMAZÔNICA EM PROGRAMAS JORNALÍSTICOS DA REDE GLOBO ENTRE 1970 E 2011 SÃO PAULO 2016

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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI

GABRIELLA CRISTINA MOURA DOS SANTOS

O MEIO AMBIENTE NA TELEVISÃO: A TRANSAMAZÔNICA

EM PROGRAMAS JORNALÍSTICOS DA REDE GLOBO ENTRE 1970 E 2011

SÃO PAULO 2016

GABRIELLA CRISTINA MOURA DOS SANTOS

O MEIO AMBIENTE NA TELEVISÃO: A TRANSAMAZÔNICA EM PROGRAMAS JORNALÍSTICOS DA REDE GLOBO

ENTRE 1970 E 2011

Dissertação de Mestrado apresentada à Banca Examinadora, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre do Programa de Mestrado em Comunicação, área de concentração em Comunicação Audiovisual da Universidade Anhembi Morumbi, sob a orientação da Profa. Dra. Sheila Schvarzman.

SÃO PAULO 2016

FICHA CATALOGRÁFICA

S235m Santos, Gabriella Cristina Moura dos

O meio ambiente na televisão: a transamazônica em programas jornalísticos... / Gabriella Cristina Moura dos Santos. – 2016. 61f.: il.; 30 cm. Orientadora: Sheila Schvarzman. Dissertação (Mestrado em Comunicação) – Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, 2016. Bibliografia: f.61. 1. Comunicação. 2. Televisão. 3. Programa jornalístico. 4. Meio ambiente. 5. Transamazônica. I. Título. CDD 302.2

GABRIELLA CRISTINA MOURA DOS SANTOS

O MEIO AMBIENTE NA TELEVISÃO: A TRANSAMAZÔNICA EM PROGRAMAS JORNALÍSTICOS DA REDE GLOBO DE

1970 E 2011

Dissertação de Mestrado apresentada à Banca Examinadora, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre do Programa de Mestrado em Comunicação, área de concentração em Comunicação Audiovsual da Universidade Anhembi Morumbi, sob a orientação do Profa. Dra. Sheila Schvarzman.

Aprovado em ----/-----/-----

Profa. Dra. Sheila Schvarzman

Profa. Dra. Sênia Bastos

Profa. Dra. Maria Ignês Carlos Magno

"Quero ficar vivo para salvar a Amazônia."

Chico Mendes

AGRADECIMENTOS

Agradeço e dedico este trabalho à memória de minha avó, Odete Moura dos

Santos, uma pessoa zelosa, carinhosa e alegre.

Agradeço também aos meus pais, Denisar Murilo Moura dos Santos e Gildete

Chaves da Silva Santos, que me ensinaram a sempre continuar em qualquer estágio

da vida, inclusive nos estudos.

Agradeço ao meu marido e companheiro, Luiz Gustavo Miotti dos Santos, que

tem me incentivado desde o início deste projeto. Sua paciência de samurai é digna de

lembrança, pois foram muitos os dias em que estive reclusa para pesquisa e produção

da dissertação. Agradeço também a todos os cafés fortes feitos de madrugada e suas

palavras de incentivo.

Gostaria de lembrar e de agradecer aos amigos de mestrado Valdeci Gama,

Rafael Navarro, Juliana Midori, Anderson Gonçalves, Felipe Romagna e Nayara

Vasconcelos pelas dicas, ajuda e incentivo ao longo do trabalho.

Gostaria de agradecer aos professores do Programa de Pós-Graduação da

Universidade Anhembi Morumbi por sua dedicação e, em especial, à Profa. Dra. Laura

Canepa, nossa coordenadora, por seu empenho.

Minha gratidão aos esforços do Globo Memória e ao Centro de Documentação

da Rede Globo (CEDOC) que disponibilizaram os programas dos anos de 1970 a 2000

sobre a Transamazônica veiculados no Globo Repórter. Um agradecimento especial

a Juan Manuel Guadelis Crisafulli, que fez a intermediação com o CEDOC e me

auxiliou quando visitei o Rio de Janeiro para consultar os arquivos.

Agradeço a minha professora orientadora Dr.a Sheila Schvarzman. Seu

trabalho com paciência, entusiasmo e sabedoria será muito lembrado.

Agradeço também a banca de qualificação e da dissertação, formada pelas

professoras Sênia Bastos e Maria Ignês Carlos Magno, que ajudaram no

aprimoramento e melhoria da dissertação.

Resumo

Essa dissertação estuda as representações do meio ambiente tendo por foco as imagens da Rodovia Transamazônica, um grande projeto do Regime Militar (1964-1985), registradas em programas jornalísticos da Rede Globo entre 1970, quando começou a ser construída, até 2011 quando foi produzido o último programa sobre o assunto. Esse tema foi escolhido em razão do significado da Amazônia para o planeta – é considerada o “pulmão do mundo” – e pelo enorme impacto ambiental que a Transamazônica provocou e continua a provocar. Tudo isso fez da Transamazônica um elemento de forte apelo e cobertura midiática servindo de propaganda oficial que mostrava que rasgar a imensa floresta seria a solução dos problemas nacionais. O recorte cronológico contempla desde os primeiros até os últimos programas do Globo Repórter que abordam o assunto. Palavras-chave: Globo Repórter. Transamazônica. Meio ambiente. Amazônia, Ditadura Militar. Representações do meio ambiente na televisão.

Abstract

The purpose of this dissertation is to study the representations of the environment through the Transamazônica Highway images built in news programs of TV Globo between 1970, when it began to be built until 2011. This period was chosen because the target is the Globo Repórter programs that has programs on the subject since 1970, the last in 2011. The choice of this theme was because of the significance of the Amazon to the globe – “lungs of the world” – and the enormous environmental impact of the Transamazônica -meant and still means. Moreover, it was a great project of military regime, 1964-1985, with wide media coverage and official propaganda showing that tear the immense forest would be the solution of national problems.

Keywords: Globo Repórter. Transamazônica. Environment. Amazônia. Military dictatorship. Environmental representations on television.

Lista de figuras

Figura 1 – O primeiro Globo Repórter, dirigido por Paulo Gil Soares, abordou os índios Oglagla

Sioiux. .................................................................................................................................. 32

Figura 2 – Programa 60 Minutes, realizado em formato de revista, serviu de inspiração para o

Globo Repórter. ................................................................................................................... 34

Figura 3 – O slogan “Brasil ame-o ou deixe-o” era impregnado em várias mídias. Acima, álbum

de figurinhas com propaganda nacionalista. ........................................................................ 35

Figura 4 – Caco Barcellos divulga reportagem que identifica mortos políticos, exibida no Globo

Repórter. .............................................................................................................................. 41

Figura 5 – Globo Repórter assume novo rumo e valoriza programas turísticos. .................. 42

Figura 6 – Documentário da BBC critica a Rede Globo. ...................................................... 44

Figura 7 – Governo de Médici apostou na propaganda para divulgar obras. Acima, filme da

Agência Nacional (AN). ........................................................................................................ 50

Figura 8 – Médici fotografado com a primeira árvore derrubada para a construção da

Transamazônica. ................................................................................................................. 51

Figura 9 – Bodansky mostra Transamazônica. .................................................................... 54

Figura 10 – Postos abandonados na rodovia. ...................................................................... 54

Figura 11 – Motorista reclama de Transamazônica.............................................................. 55

Lista de abreviaturas e siglas

AN – Agência Nacional

Cedoc – Centro de Documentação da Rede Globo

CFC – Clorofluorcarbono

Conama – Conselho Nacional do Meio Ambiente

DDT – Diclorodifeniltricloretano

Pnuma – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

ODM – Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

OMC – Organização Mundial do Comércio

ONU – Organização das Nações Unidas

Sumário

Introdução ............................................................................................................................ 13

Capítulo 1 Breve panorama histórico sobre o meio ambiente .............................................. 19

1.1 Os primeiros conceitos de natureza desde a época dos gregos até os dias de hoje .. 19

1.2 O meio ambiente no cenário contemporâneo ............................................................. 26

1.3 A preocupação ambiental na mídia ............................................................................ 27

1.3.1 Primeiro período: limites do crescimento (1962-1972) ......................................... 27

1.3.2 Segundo período: movimento verde (1987-1992) ............................................... 28

1.3.3 Terceiro período: globalização (1999-2002) ........................................................ 31

Capítulo 2 O Globo Repórter ............................................................................................... 32

2.1 O início do Globo Repórter nos anos 1970 ................................................................ 32

2.2 O Globo Repórter nos anos 1980 ............................................................................... 38

2.3 O Globo Repórter nos anos 1990 ............................................................................... 40

2.4 O Globo Repórter nos anos 2000 ............................................................................... 44

Capítulo 3 A Transamazônica no Globo Repórter ................................................................ 47

3.1 A Transamazônica nas telas do Globo Repórter ........................................................ 48

3.2 Amazônia: mito e realidade ........................................................................................ 51

Considerações finais............................................................................................................ 57

Referências bibliográficas .................................................................................................... 60

Introdução

Essa dissertação estuda as representações do meio ambiente tendo por foco

as imagens da Rodovia Transamazônica, um grande projeto do Regime Militar (1964-

1985), registradas em programas jornalísticos da Rede Globo entre 1970, quando

começou a ser construída, até 2011 quando foi produzido o último programa sobre o

assunto.

Para realizar este estudo, selecionamos programas do Globo Repórter, uma

vez que o recorte da investigação mira programas de viés jornalístico. Para ampliar o

estudo, localizamos outros materiais como o programa Amaral Netto, o repórter, de

1975, e o Globo Repórter, de 2011.

O objetivo do trabalho é analisar como o meio ambiente é mostrado durante o

período selecionado para o estudo. Queremos mostrar como a questão do meio

ambiente emerge do tema da construção e do desenvolvimento da gigantesca

rodovia, construída a partir de 1970 com o propósito de ligar a região Norte ao restante

do país e, assim, promover seu desenvolvimento. O projeto previa que a estrada

atingisse mais de 4 mil quilômetros e ligasse os estados da Paraíba, do Ceará, do

Piauí, do Maranhão, de Tocantins, do Pará e do Amazonas. Pelo projeto original, a

rodovia chegaria até o Acre, porém a última cidade da rota é Lábrea, no Amazonas.

Observamos de que forma as imagens, por meio de um curta-metragem de oito

minutos da Agência Nacional, mostram a rodovia. Abordamos a imagem veiculada

pela propaganda oficial, de 1970, que mostrava o então presidente Emílio Garrastazu

Médici visitando as obras da rodovia com o intuito de divulgar a ideia de progresso e

de um Brasil grande. Essas eram as imagens dos programas Globo Repórter

(Amazônia: mito e realidade), de 1974, Amaral Netto, o repórter, de 1975 (Brasil:

ontem, hoje e amanhã), igualmente encampadas pelo Globo Repórter. No entanto, ao

longo do tempo e das consequências da construção da rodovia, o que se viu não foi

o progresso, mas a destruição, como é possível conferir em programas a partir dos

anos 1990.

Por sua importância nos anos 1970, quando estava se estabelecendo como um

programa de grande interesse jornalístico e pela qualidade de suas reportagens,

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selecionamos estudar os programas do Globo Repórter dedicados ao tema da

Transamazônica. Para tanto, realizamos nossa pesquisa na Memória Globo1.

A trajetória da pesquisa foi se ampliando de acordo com o que era procurado.

Iniciamos pelas consultas à web e logo percebemos que o material era insuficiente,

pois quase não havia registros da Transamazônica no Globo Repórter em sites de

armazenamento de programas televisivos como o YouTube, em sites sobre a

Amazônia ou em blogs. O habitual era encontrar programas que tratassem apenas da

Amazônia no Globo Repórter. Por essa razão, cada programa foi assistido para

detectar a presença da Transamazônica. Pela dificuldade de encontrar registros, o

assunto teve de ser esmiuçado; para ilustrar a situação, um dos programas estava em

um site japonês que armazenava programas brasileiros para japoneses e brasileiros

que viviam no Japão assistirem.

No decorrer da investigação, encontramos no próprio site do Globo Repórter,

que disponibiliza alguns programas antigos, um registro de 1974 sobre a Amazônia,

porém estava incompleto. Desta maneira, recorremos ao Centro de Documentação

da Rede Globo (CEDOC), que enviou mais títulos do Globo Repórter em que aparecia

a Transamazônica. Para dar prosseguimento à pesquisa, fomos ao Rio de Janeiro

para assistir e estudar os programas dos anos 1970, 1980 e 1990. Dois dos

programas, um de 1998 e outro de 2011, foram obtidos por meio da equipe de redação

atual, que trabalha nos estúdios do Globo Repórter em São Paulo. Especialmente, o

programa de 12 de janeiro de 1984, Globo Repórter: Viagem pela Transamazônica,

foi concedido pelo próprio diretor, Jorge Bodansky.

Os autores que mais fundamentaram o trabalho foram Ana Cauquelin, que estuda a

paisagem da região amazônica, Magno Michell Marçal Braga, que aborda o panorama

dos nordestinos que foram morar ao longo da Transamazônica, o estudioso e

pesquisador mais popular do país, José Bonifácio de Andrade e Silva, que já traz

ideias vanguardistas sobre ecologia e artigos sobre meio ambiente na obra Pensar o

meio ambiente: bases filosóficas para a educação ambiental, que nos ajudaram a

construir o histórico sobre o conceito de meio ambiente. Também tivemos o suporte

do trabalho de Heidy Vargas, que contribuiu com o entendimento sobre a história e

principais fatos do Globo Repórter.

1 Local onde ficam armazenados os arquivos da Rede Globo. O Cedoc (Centro de Documentação da Globo) fica no Rio de Janeiro, no bairro Jardim Botânico.

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Incluímos também, à guisa de comparação e por sua importância para o

período, um informativo da Agência Nacional e uma emissão do programa Amaral

Netto, o repórter. Com o passar do tempo e as mudanças históricas na política

nacional e na própria concepção de meio ambiente, o tema da rodovia foi praticamente

desaparecendo das telas. Assim, optamos por encerrar com o último programa do

Globo Repórter, de 2011, que abordou o tema.

O caminhar pelas diferentes décadas, pelas mudanças políticas e na

concepção de meio ambiente vão sendo construídas nas imagens, ao mesmo tempo

que muda também o próprio jornalismo televisivo, que perdeu o caráter mais

documental e investigativo dos anos 1970, transformando-se em um jornalismo de

entretenimento, como o Globo Repórter se tornou. Os programas que encontramos

sobre a temática da Transamazônica refletem essas mudanças de tratamento que

procuraremos abordar.

Foram eles:

1) 1970 – Filme da Agência Nacional sobre o início das obras;

2) 30/09/1974 – Globo Repórter: Amazônia: mito e realidade;

3) 1975 – Amaral Netto, o repórter: Brasil: ontem, hoje e amanhã;

4) 1981 – Globo Repórter: Amazônia: a pátria da água;

5) 1982 – Globo Repórter. Amazônia: o último Eldorado brasileiro;

6) 12/01/1984 – Globo Repórter: Viagem pela Transamazônica;

7) 13/12/1991 – Globo Repórter: Desperdício de verbas em obras públicas;

8) 21/08/1998 – Globo Repórter: Viagem pela Transamazônica;

9) 02/12/2011 – Globo Repórter: O preço do progresso.

Os anos 1970, 1980, 1990 e 2000 foram tempo marcantes para o meio

ambiente brasileiro, cada um com a sua característica e pautas de época. Se a década

de 1970 marca, justamente, o surgimento do grande projeto de uma estrada que

rasgaria o território do norte e nordeste, terras ainda por explorar, que enriqueceriam

e ligariam o país – temas caros aos militares e de grande impacto midiático, sabemos

que esse foi também o momento mais sangrento e arbitrário da ditadura militar. Assim,

o reverso disso era a aposta no progresso divulgado em publicidade e filmes

institucionais. Todos os olhares do país deviam estar voltados para o desenvolvimento

da região Norte em razão da construção da Transamazônica.

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Ela é mostrada em um dos programas do jornalista Amaral Netto, na década

de 1970, pelo viés de marketing governamental.

Em 1974, no Globo Repórter, Amazônia: mito e realidade, a região também é

abordada de forma institucional.

Na década de 1980, localizamos os programas do Globo Repórter de 1981,

Amazônia, a pátria da água; de 1982, O último Eldorado Brasileiro, e de 1984, Viagem

pela Transamazônica. Neste, já se observa a mudança do discurso sobre o meio

ambiente, verificando-se certa preocupação com os danos ambientais e ausência

daquele caráter desenvolvimentista dos anos 1970.

Nos anos 1980, temos uma movimentação em relação a assuntos ligados ao

meio ambiente. Em 1982, houve a publicação da Carta Mundial da Natureza, fazendo

alusão, pela primeira vez, ao termo sustentabilidade, nesse ano acontece também a

Convenção de Monte Bay, que tratava sobre o Direito do mar2.

No Brasil, o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) apresenta uma

resolução estabelecendo diretrizes para a Educação Ambiental. Em 1988, a

Constituição Brasileira destaca a necessidade de promover a Educação Ambiental em

todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio

ambiente.

Para os anos 1990, o Globo Repórter produz uma matéria de caráter crítico,

veiculando-a em 13/12/1991, cujo tema era o Desperdício de verbas públicas na

construção da Transamazônica, que custou mais de US$ 2 bilhões. Em contrapartida,

o programa mostra caminhões atolados na lama, já que grande parte da rodovia não

havia sido asfaltada, permanecendo assim até hoje. Mostram-se ainda imagens de

destruição da floresta, evidenciando que o mundo verde foi afetado.

Ainda na década de 1990, no Globo Repórter de 1998, abordam-se as

consequências para a população que se mudou para as margens da estrada com a

expectativa de manter uma agricultura de subsistência, o que não se concretizou, pois

o solo é frágil e inadequado à agricultura, com isso, a maioria teve que retornar aos,

estados nordestinos de origem.

2 Conjunto de normas que regula o território marítimo, destacando que a humanidade sempre buscou

o mar, muitos povos surgiram diante do mar e ainda subsistem dele extraindo recursos naturais. Diante de sua importância para a sociedade, legislações específicas foram criadas para cada assunto relativo ao Direito do mar.

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No contexto brasileiro, na mesma época dos programas, acontecem alguns

eventos importantes sobre meio ambiente, entre eles a Rio-92. O ano de 1992

registrou no dicionário do meio ambiente termos como “efeito estufa”, “turismo

ecológico” e “desenvolvimento sustentável”. A maior conferência sobre meio ambiente

realizada pela Organização das Nações Unidas até aquele momento, a Rio-92,

ganhou muita visibilidade.

Na Transamazônica, os caboclos da região perto de Altamira, usando

critérios de vegetação, puderam identificar solos com pH acima de 6,0,

quase a ausência de saturação de alumínio e relativamente altos

teores de macronutrientes. Esses solos excelentes existiram em

menos de 8% da região e indicam a exatidão dos critérios

etnoecológicos aplicados à agricultura amazônica por populações

locais. Por outro lado, os critérios usados por pessoas foraneas

identificaram os solos mais típicos da região e apresentaram

problemas aos colonos. (SANTOS; VIEIRA, 1987, apud MORIN, 1977,

p. 3)

Em 2011, no programa O preço do progresso, verifica-se um discurso

preocupado com o desequilíbrio do meio ambiente. O olhar para a sustentabilidade

está mais perceptível e a linha editorial mostra as possíveis catástrofes e a extinção

de animais que podem ocorrer quando a construção de usinas hidrelétricas inundarem

parte da Transamazônica. Depois de quase 40 anos, após as reportagens dos anos

1970, vemos um tom desafiador, crítico, preocupado com os danos ambientais,

diferente das matérias do começo dos anos 1970.

Observamos atualmente o florescer do ecologismo não só como

movimento social, mas como movimento histórico. O ecologismo

tem servido como uma espécie de portador de novos valores, que

têm dado sentido à ação de diferentes grupos sociais, inclusive de

diferentes movimentos sociais. Vem articulando aspirações,

tendências e vontades, num espectro que compreende desde

setores do empresariado até ações pessoais, movimentos

alternativos etc. (GRÜN, 2009, apud PÁDUA, 1992, p. 109)

Nos anos 2000, o Met Office, importante instituto de meteorologia, indicou que

a década de 2000-2010 foi a que registrou maiores temperaturas em 160 anos. O

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estudo mostrava que isto foi causado, principalmente, devido à elevação das

emissões de gases que causam o efeito estufa na atmosfera3.

Para que possamos observar o tratamento dado ao meio ambiente em

programas jornalísticos da TV Globo – enfocando a Transamazônica entre 1970 e

2011, faremos, no primeiro capítulo, uma breve introdução à noção de meio ambiente,

abordando as transformações históricas pelas quais esse conceito passou desde a

sua configuração como natureza e paisagem a partir do século XVII até meados dos

anos 1980, quando a nova noção começa a se sedimentar. No capitulo dois,

apresentaremos o Globo Repórter, o seu formato e breve histórico na TV aberta

brasileira, de forma a entender o enfoque dado aos programas aqui apresentados e

sua abordagem.

Já no capítulo três, recortaremos a rodovia Transamazônica nos programas da

Rede Globo e em sua relação com o período histórico em apreço. Abordaremos a

Transamazônica por meio da observação dos programas já apresentados, e iremos

compará-los em conjunto com filmes institucionais realizados pela Agência Nacional,

que mostravam o começo das obras e, posteriormente, a sua inauguração.

3 As informações foram divulgadas em Copenhague no segundo dia da reunião da ONU, que procurou

buscar um acordo de redução de gases estufa em substituição ao Protocolo de Kyoto, que expirou em 2012.

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Capítulo 1 Breve panorama histórico sobre a ideia de meio

ambiente

Ao tratar do meio ambiente a partir da Amazônia e das intervenções da

Transamazônica entre os anos de 1970 e 2011 e sua representação nos programas

jornalísticos da TV Globo, é necessário introduzir a história dessa noção: o que é o

meio ambiente, ou como se chegou a definir o que já foi chamado de natureza,

paisagem como meio ambiente. Assim, devemos percorrer um pouco dessa trajetória.

Cauquellin (2007) observa que a paisagem não é, como se pensa, algo visual,

mas, sim, a apresentação sob a forma de um poder que aparece através do discurso.

A paisagem, “Não se ‘diz’ sob a forma figurativa da paisagem visual, mas vem a se

apresentar sob a forma de um poder, cuja descrição é da ordem do discurso, não da

sensibilidade” (CAUQUELIN, 2007 p. 51).

Conforme Cauquelin (2007), o objeto deste estudo é observar a constituição de

um discurso sobre o objeto meio ambiente, tendo por foco a Amazônia através dos

programas televisivos do Globo Repórter selecionados desde os anos de 1970 até

2011. É sobre a desconstrução de algo que, por séculos, apareceu como dado – a

natureza, a paisagem – algo da ordem do visual, que Cauquelin vai abordar e indicar

os caminhos que podem t conduzir o nosso trabalho. Sendo a paisagem uma

construção, então ela é um discurso. É sobre esta relação que não se desvincula da

sua representação conceitual e das linguagens que a expressam – a literatura, a

pintura, as mídias modernas – e que chamam a atenção Cauquelin –, que vamos nos

deter.

1.1 Os primeiros conceitos de natureza desde a época dos gregos até os

dias de hoje

Sobre o meio ambiente, temos alguns importantes conceitos. De acordo com

GRÜN (2006), o conceito de meio ambiente existe desde os gregos, passando pelos

medievais, modernos e até os contemporâneos. Os movimentos culturais de cada

época ajudam a esclarecer as percepções que os filósofos têm sobre a natureza.

20

Até 600 a.C., os gregos utilizavam a mitologia para explicar a natureza. Depois,

os pré-socráticos (624-548 a.C.) deixaram de explicar a natureza por meio da

mitologia. O primeiro filósofo de que se tem registro é Platão, depois Aristóteles.

Ambos são considerados filósofos da natureza, porque investigavam as questões de

forma científica. Estudaram como é feito o mundo. Acabaram com a visão mítica e

religiosa da natureza que era comum na época grega e assimilaram uma forma

científica de pensar. A maior parte do que se tem registrado destes filósofos é

encontrada nos escritos de Aristóteles, Platão, Simplício e Diógenes Laércio (século

III d.C.). Isto colaborou com uma forma de pensar mais racional.

Posteriormente, na Idade Média, Culleton (2006) mostra a presença de filósofos

e teóricos árabes, judeus e cristãos em sua maioria que influenciaram no conceito.

Mas, apesar da diversidade, é possível destacar dois momentos importantes sobre a

natureza na Idade Média.

O primeiro momento, entre os séculos V e XV, de acordo com Culleton (2006),

é mais teológico, desenvolvido pelos padres da Igreja Católica, entre os quais se

destaca Santo Agostinho, cujo conceito de natureza se resume a uma livre criação de

Deus no tempo, ou seja, a criação da natureza se deu de acordo com a vontade de

Deus.

O segundo momento é a partir da virada do segundo milênio, depois do século

XV, com a introdução de textos de Aristóteles pelos árabes na Europa e a fundação

das primeiras universidades em Paris, Oxford e Bolonha. Nestes centros, inicia-se a

difusão de estudos dos livros sobre a natureza de Aristóteles (século 1 a.C.). “Diante

deste fato, houve a familiarização com o pensamento e conceito greco-árabe”

(CULLETON, 2006, p. 44).

Já no século XVI, a Europa, que na época era o “centro do mundo”, atravessa

uma etapa de sua formação histórico-cultural em que se completa a transição da

mentalidade medieval feudal para a perspectiva da modernidade mercantilista.

Segundo Severino (2006), ocorria uma revolução cultural em todas as dimensões

humanas comandada por uma revolução epistemológica, responsável pelo projeto

iluminista da modernidade que começa a se instaurar. Neste cenário, observa-se a

defesa da centralidade do mundo, como natureza física, e do homem no seu interior.

Trata-se agora de um conceito de cosmocentrismo e de antropocentrismo, mudanças

que levam a um deslocamento de Deus do centro da realidade, configurando uma

crítica ao teocentrismo medieval.

21

Nessa época, surge Francis Bacon (1561-1626), considerado fundador da

ciência moderna, que reflete o movimento do período que determinava o domínio da

natureza pelo saber, a fim de converter o conhecimento em algo útil e proveitoso para

a vida dos homens. Neste sentido, observa-se o nascimento do conceito e da prática

do uso da natureza de maneira infinita a favor do homem. Bacon sustentava o

argumento de que o conhecimento científico daria à humanidade o poder sobre a

natureza, gerando, assim, a prosperidade, o progresso social e o bem-estar humano.

Ele pregava para os cientistas a necessidade de adotarem uma meticulosa atenção

aos fatos da natureza, buscando, por meio de testes e experimentos, a confirmação

sobre a regularidade dos fenômenos naturais.

O filósofo francês do século XVII, René Descartes (1596-1650) é considerado

o pensador que revolucionou as bases do pensamento moderno. De acordo com Grün

(2006), a principal obra de Descartes, O discurso do método, influenciou sobremaneira

a nossa relação com a natureza. Descartes foi o precursor em propor uma física

matemática aplicada à natureza. As consequências deste pioneirismo são enormes

para o desdobramento da nossa atual relação com o meio ambiente. A objetividade

cartesiana, de acordo com Grün (2006), fez com que esquecêssemos a possibilidade

de pensar na história e colocou o homem europeu e branco na patente de dono e

senhor da natureza. Para Descartes e para o Iluminismo, era preciso deixar de lado a

tradição. Em O discurso do método, ele faz ataques ao humanismo e à tradição.

Além disso, as fábulas levam a imaginar como possíveis muitos

eventos. Mas, mesmo as histórias mais fiéis, se não mudam nem

acrescentam valor às coisas para torná-las mais dignas de serem

lidas, pelo menos omitem quase sempre as circunstâncias mais vis

e menos ilustres, do que resulta que o resto não parece tal qual é,

e que aqueles que regem os seus costumes pelos exemplos que

deles extraem estão sujeitos a incorrer nas extravagâncias dos

paladinos de nossos romances e a conceber projetos que estão

além de suas forças. (DESCARTES, 2006, apud GRÜN, 1998, p.

35)

Em contrapartida a René Descartes, Baruch Espinosa (1632-1677)

preocupava-se em criticar dentre os novos conceitos que surgiam o controle sobre a

natureza. Ele questionava a forma dominadora de tratá-la de acordo com a vontade

do homem. “Ele tinha uma visão unificadora que integra o homem ao cosmos, de

modo que, para refletir sobre ética, despotismos e democracia, ele fala de Deus,

22

natureza e paixões” (SAWAIA, 2006, p. 79). Segundo Sawaia (2006), Espinosa

combateu o antropocentrismo semeando a reflexão contemporânea sobre a relação

entre o homem e a natureza, no mesmo tempo que a ciência cria um sistema de

avassalamento e destruição ambiental no século XVII.

Para dar mais suporte à linha histórica sobre o conceito de natureza até chegar

ao que se entende por meio ambiente na atualidade, é importante destacar o filósofo,

teórico, político, escritor e uma das principais personalidades do Iluminismo e um dos

precursores do romantismo, Jean-Jacques Rousseau.

[...] a superfície da terra elevava minhas ideias a todos os seres da

natureza, ao sistema universal das coisas, ao ser incompreensível

que abarca tudo. Então, com o espírito perdido nessa imensidão,

eu não pensava, não raciocinava, não filosofava mais; me sentia

com um tipo de voluptuosidade, oprimido pela força desse universo,

me abandonava com encantamento à confusão dessas grandes

ideias; gostava de me perder em imaginação no espaço; meu

coração confinado nos limites dos seres, se encontrava ali muito

apertado, me sufocava no universo e queria me lançar ao infinito.

(ROUSSEAU, 2006, apud SAWAIA, 2003, p. 90)

Hermann (2006) mostra que Rousseau indica na natureza um conceito

filosófico estruturante. Neste sentido, a natureza é o elo entre empreender uma

reforma moral e outra, intelectual da sociedade, que permite projetar a vida com

liberdade e igualdade. Mesmo sem conhecer o futuro com suas consequências

destrutivas para a natureza, Rousseau concebeu a ideia de uma nova mentalidade a

respeito das relações do homem com o ambiente. Sua contestação radical à

Revolução Industrial (1760) aponta como o domínio desenfreado sobre a natureza

provoca as moléstias do homem, o egoísmo, a hipocrisia, a escravidão e as

desigualdades sociais (Hermann, 2006, p. 94).

No Brasil, no momento em que o pensamento de Rousseau é muito influente,

temos as primeiras representações de natureza retratadas por artistas portugueses,

franceses e ingleses que eram contratados pela Corte Portuguesa, no século XIX,

para representar as paisagens. De acordo com Schwarcz (2008), eles fizeram os

primeiros registros da natureza do Brasil.

No Brasil, no século XVII, precisamente, em 1823, José Bonifácio de Andrada

e Silva (1763-1838) escreve artigos que denotam sua preocupação ambiental. Nos

seus escritos, ele observa que o homem não tem feito nada pela natureza. Em seu

23

texto, de 1823, ele condena as machadadas desenfreadas e a prática das queimadas

nas florestas.

Como, pois, se atreve o homem a destruir, em um momento e sem reflexão, a obra que a natureza formou em séculos, dirigida pelo melhor conselho? Quem o autorizou para renunciar a tantos e tão importantes benefícios? A ignorância, sem dúvida. [...] Destruir matas virgens, como até agora se tem praticado no Brasil, é crime horrendo e grande insulto feito à mesma natureza. Que defesa produziremos no tribunal da Razão, quando os nossos netos nos acusarem de fatos tão culposos? (CALDEIRA, 1823, apud SILVA, 2002, p. 41-42)

Na época do Brasil Imperial, as observações ambientais de Andrada e Silva

são vanguardistas considerando-se o contexto de então, provavelmente sua formação

acadêmica no espírito iluminista contribui para sua visão à frente de seu tempo. Ele

aborda temas como a fronteira agrícola em expansão, a abundância de recursos

naturais, a exuberância de uma natureza virgem e faz reflexões sobre a ecologia. Dias

(2013), em seu artigo “Escritos ambientalistas de José Bonifácio”, afirma que é

possível pensar nas origens dos estudos da ecologia política brasileira com José

Bonifácio. Suas propostas sociopolíticas já foram muito analisadas, porém sua

preocupação em inaugurar um novo tipo de relacionamento do homem com a

natureza no Brasil tem permanecido esquecida.

Por volta de 1840, Karl Marx (1818-1883), em suas obras de economia e

filosofia, estabelece uma concepção de natureza como uma unidade complexa e

dinâmica, auto-organizada em seu movimento, que é contraditório. Conforme Loureiro

(2006), a perspectiva marxista pensa em transformar os comportamentos, atitudes e

aspectos culturais, ou seja, pensa em mudar o conjunto das relações sociais em que

estamos inseridos.

[...] assim como a sociedade mesma produz o homem enquanto

homem, assim ela é produzida por meio dele. A atividade (Tätigkeit)

e a fruição, assim como o seu conteúdo, são também os modos de

existência segundo a atividade social e a fruição social. A essência

humana da natureza está, em primeiro lugar, para o homem social;

pois é primeiro aqui que ela existe para ele na condição de elo com

o homem, na condição de existência sua para o outro e do outro

para ele; é primeiro aqui que ela existe como fundamento da sua

própria existência humana, assim como também na condição de

elemento vital da efetividade humana. É primeiro aqui que a sua

existência natural se lhe tornou a sua existência humana e a

natureza [se tornou] para ele o homem. Portanto, a sociedade é a

24

unidade essencial completada (Vollendete) do homem com a

natureza, a verdadeira ressurreição da natureza, o naturalismo

realizado do homem e o humanismo da natureza levado a efeito.

(MARX, 2004, p. 106-107, apud LOUREIRO, 2006, p. 127)

Nancy Mangabeira (2006), em seu artigo sobre Martin Heidegger (1889-1976),

um dos principais filósofos do século XX, afirma que ele influenciou também o

pensamento ecológico.

Para isso, é necessário compreender a dinâmica de uma civilização

que reduziu todos os seres – e finalmente até o próprio ser humano

– à condição de objetos para a afirmação do sujeito humano que,

tomado por uma busca insaciável de poder e controle, se erigiu não

só em mestre e senhor da natureza, mas em centro ontológico do

real. Heidegger dirá que é esta compreensão do Ser como

objetividade que possibilitará que a racionalidade tecnológica seja

usada para oprimir a natureza e os outros homens. Uma vez que o

ser humano esquece que sua vocação existencial é de ser “a casa

do ser”, ou o canal através do qual o cosmos pode se presentificar

de novas maneiras, então o próprio homem pode ser visto como

mero objeto cuja exploração se justifica na busca de mais e mais

poder. (MANGABEIRA, 2006, p. 158)

Lev Semionovich Vygotsky (1896-1934) acreditava que, por meio do trabalho,

o ser humano, ao transformar a natureza, imprimiu-lhe uma dimensão humana. Pelo

trabalho, aconteceu a passagem do biológico ao social, do natural ao humano-cultural,

porque a atividade humana é mediada socialmente. Portanto, o ser humano não só

se adapta à natureza, mas também tem o desejo de transformá-la. Segundo Molon

(2007), essas teorias de 1917 abordam o trabalho da “hominização”, ou seja, como o

ser humano se constitui pelo trabalho.

Neste sentido, pode-se verificar que a noção de meio ambiente, nos escritos

de Vygotsky, ocorre de relações dinâmicas e de interações que foram resultados das

atividades do homem e da natureza.

Com Vygotsky, observamos as transformações produzidas nas relações dos

sujeitos com o meio natural e o que foi construído como o que constitui o meio

ambiente.

Carvalho (2006) observa que a filósofa alemã Hannah Arendt discute as

diferenças entre o conceito de história e natureza entre os antigos, particularmente os

gregos e os pensadores da época moderna. Em sua obra O conceito de história,

25

antigo e moderno, Arendt mostra que, para os gregos antigos, não existia a ideia de

natureza como a entendemos hoje. O que compreende todos os seres e coisas vivas

no mundo, conforme os gregos, é a physis4. A physis engloba tudo que vem a existir

por si mesmo, sem a ajuda dos seres humanos. Por exemplo, tudo que existe para

sempre e que não necessita da lembrança do humano para a existência futura. Todas

as criaturas vivas, incluindo a humanidade enquanto espécie fazem parte desse “para

sempre”.

De acordo com a explicação de Arendt, a physis é o local da ordem, da

regularidade, do movimento perpétuo e da inteligência que se revelam fora do

humano. Com este sentido, ela explica que os gregos querem saber como as coisas

vêm a existir, porém não duvidam de sua existência.

Há duas palavras no mundo grego que nomeiam diferentes

sentidos da palavra vida: Zoe e Bios. Zoe designa o simples fato de

viver, fato comum a todos os seres vivos. Nomeia a condição da

vida biológica, que não é a vida do sujeito político, mas apenas a

vida reprodutiva. Bios, por sua vez, designa a forma ou maneira de

viver própria de um grupo. Por exemplo, pode designar a vida

contemplativa (bios theoreticós), a vida de prazer (bios

apolausticós) ou a vida política (bios politicós). Em todo caso, é

sempre uma vida qualificada. A existência biológica do ser humano,

enquanto animal de uma espécie (humana), partilha da condição

da vida como Zoe. A existência do indivíduo humano, contudo, para

além de sua condição de Zoe, participa também da dimensão da

vida como Bios, na medida em que se constitui como uma história

identificável do nascimento à morte, retilínea, irrepetível e mortal,

que secciona transversalmente o ciclo repetitivo da vida biológica e

do ser para sempre, e cujos feitos podem se tornar imortais.

(CARVALHO, 2006, p. 194)

Arendt afirma que a relação entre physis, existência humana e história muda

na modernidade. Na passagem do tempo antigo grego e clássico para o romano e

cristão, uma transformação importante é denotada. Juntamente com a decadência do

mundo clássico grego, perdem-se o conceito e a noção sobre a physis. Aparece então

4 Physis é uma palavra de origem grega. Deriva de um verbo que significa fazer nascer, fazer brotar, fazer crescer, produzir. Os filósofos gregos pré-socráticos pregavam que physis é o elemento primordial da natureza, eterno e em perene transformação. O fundo eterno, perene, imortal, de onde tudo nasce e para onde tudo volta, é invisível para os olhos do corpo e visível somente para o olho do espírito, para o pensamento. A filosofia pré-socrática afirma que, embora a physis seja imperecível, ela dá origem a todos os seres infinitamente variados e diferentes do mundo, seres que, ao contrário do princípio gerador, são perecíveis ou mortais.

26

o conceito de natura, a palavra romana da natureza que já não tem mais o sentido

holístico da physis e, sim, de uma civilização romano-cristã.

A tradução latina de natura está na origem etimológica e cultural do que

entendemos hoje por natureza, que, diferente da physis, é desprovida de inteligência

e vida e é incapaz de manter seus próprios movimentos. Segundo Arendt, nessa visão,

quem controla a lei da natureza é uma ordem divina que está fora deste mundo. A

existência natural não é mais um grande organismo vivo, mas tem a coordenação de

organismos regidos por um Deus Criador ou um Senhor da Natureza. Os romanos-

cristãos acreditavam que os seres humanos criados por Deus são imortais, enquanto

a natureza é mortal. Invertem-se, então, os valores gregos, para os quais a physis era

eterna e a vida do humano era finita. De acordo com Arendt, a ideia de natureza

romano-cristã prepara, através dos séculos, um contexto cultural para a chegada da

Revolução Industrial e sua perspectiva de um Deus que possui o “relógio” da natureza.

1.2 O meio ambiente no cenário contemporâneo

A partir de 1892, o geógrafo francês Elisée Reclus ajudou a construir o conceito

de geografia geopolítica que conhecemos hoje, assim como o de ecologia, por meio

de sua obra de Uma geografia dos Estados, do comércio e da guerra (COSTA, 2008,

p. 31). Para escrevê-la, viajou por vários países, para obter o conhecimento empírico

e por ser exilado político. Ele também passou pelo Brasil.

O geógrafo tem um discurso inovador. Não olha apenas a relação do homem

com o meio, mas as relações entre os homens como fato importante no entendimento

da geografia.

Reclus tem consciência ecológica e fala dos riscos da depredação, por isso é

chamado5 de ecologista e considerado precursor do conceito de desenvolvimento

sustentável.

Contemporaneamente, tomando como base o livro Rumo a ecossocieconomia,

do economista ambiental Ignacy Sachs (2007), o meio ambiente abrange, por um lado,

5 Miriam Hermi Zaar é geografa e fez mestrado em desenvolvimento regional e urbano estudando Élisée Reclus. Em seu artigo para a revista de Geo Crítica, da Universidade de Barcelona, ela afirma que outros autores contemporâneos consideram Reclus um vanguardista do conceito de desenvolvimento sustentável.

27

os recursos naturais que têm quantidades finitas na Terra e, por outro lado, a

qualidade do ambiente. A qualidade do ambiente é muito importante para a qualidade

de vida. Ela também condiciona a disponibilidade e a qualidade dos recursos

renováveis. Os recursos renováveis são aqueles que se renovam na natureza, como

a água, os cardumes de peixes, entre outros. Mas se piorar a qualidade do meio

ambiente, com a poluição, por exemplo, a renovação desses recursos essenciais para

a vida pode ficar comprometida (Cunha, 2008).

A definição da Organização das Nações Unidas (ONU) para o meio

ambiente enfatiza o habitat do homem. O meio ambiente teria três

subconjuntos: o meio natural; a tecnoestruturas criadas pelo

homem, ou seja, as cidades, os transportes, as refinarias dos

oleodutos, e o meio social, as relações não só entre os grupos

humanos, mas as relações entre esses grupos. (CUNHA, 2008, p.

43)

1.3 A preocupação ambiental na mídia

O estudo Good News and Bad, produzido em 2002 pelas ONGs SustainAbility

e Ketchum para o Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), traz

a perspectiva histórica da pauta sobre sustentabilidade e aponta três ondas na

cobertura jornalística sobre meio ambiente e sustentabilidade, conforme veremos a

seguir.

1.3.1 Primeiro período: limites do crescimento (1962-1972)

Seu marco inicial teria sido o livro Primavera silenciosa, da jornalista norte-

americana Rachel Carson, lançado em 1962 nos Estados Unidos da América (EUA)

e que ganhou repercussão internacional. Trata-se de uma denúncia sobre a

contaminação dos Grandes Lagos dos EUA pelo popular DDT6, veneno agrícola de

baixo custo, com efeito cumulativo não previsto nos organismos vivos.

O reforço da tendência teria vindo com os relatórios do Clube de Roma, grupo

de formadores de opinião criado em 1968 pelo empresário italiano Arillio Peccei, que

produziu o estudo Os limites do crescimento em 1972. Ele mostrou como ficaria o

6 Diclorodifeniltricloretano.

28

ambiente dali a 100 anos, caso prosseguisse o crescimento econômico a qualquer

custo. Com o documento, foi realizada a 1ª Conferência das Nações Unidas sobre o

Meio Ambiente Humano, em 1972, em Estocolmo (Suécia), que votou pela criação do

Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).

Enquanto isso no Brasil em ritmo de “milagre econômico”, o governo militar

ficou na defensiva. Circulava a ideia de que as nações avançadas usariam as

restrições ambientais para impedir o desenvolvimento dos países subdesenvolvidos.

Apesar disso, em 1973, a presidência da República criou a Secretaria Especial do

Meio Ambiente, dentro do Ministério do Interior.

Em 1973, ocorre o primeiro choque do petróleo. Matérias jornalísticas

enfatizaram as questões ambientais no mundo todo, o que acarretou cobertura

internacional, sobretudo a partir dos anos 1980, de problemas ecológicos globais e

grandes desastres ambientais, incluindo o desmatamento das florestas tropicais e a

descoberta do buraco na camada de ozônio na estratosfera, cujo principal agente

danoso era o gás industrial clorofluorcarbono (CFC).

Entre os grandes acidentes industriais, destacaram-se os vazamentos de gás

da Hofman-La Roche, em Seveso (Itália, 1976), da Union Carbide, em Bhopal (Índia,

1984) e o acidente nuclear de Chernobyl (Ucrânia, 1986). No Brasil, em 1987, houve

o acidente com o césio 137, em Goiânia (GO), com forte repercussão.

1.3.2 Segundo período: movimento verde (1987-1992)

Em 1987, deu-se o lançamento do relatório Nosso futuro comum, pela

Comissão Brundtland, da ONU, coordenada por Gro Brundtland, primeira-ministra da

Noruega. O documento focou em problemas urgentes e complexos ligados à

sobrevivência humana, como o aquecimento global, ameaças à biodiversidade e à

camada de ozônio, salientando a relação entre a questão socioeconômica (combate

à miséria) e a ambiental, enfatiza ainda a responsabilidade para com as futuras

gerações. A grande repercussão do relatório acarretou a realização, cinco anos

depois, da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e

Desenvolvimento (Eco-92), no Rio de Janeiro. O ápice desse movimento foi, segundo

o estudo, o período 1988-1991, quando a mídia acompanhou temas como a poluição,

o “esverdeamento” da política, a mobilização de ambientalistas e questões globais

como chuvas ácidas e destruição das florestas.

29

Em 1988, no Brasil, a nova Constituição Federal formula um capítulo exclusivo

sobre o meio ambiente (Artigo 225). E, acompanhando a escalada do tema na mídia,

multiplicou-se o número de repórteres e de cadernos especializados, bem como de

programas sobre meio ambiente nos meios de comunicação. Segue abaixo trecho da

Constituição Federal.

Constituição Federal

Capítulo VI VI - DO MEIO AMBIENTE (ART. 225)

Texto do Capítulo Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Lei nº 7347, de 24.7.1985, que disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (VETADO) e dá outras providências. Lei nº 7802, de 11.7.1989, que dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins, e dá outras providências. Decreto nº 98.816, de 11.1.1990, que Regulamenta a Lei n° 7802, de 1989. Lei nº 9605, de 12.2.1998, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Lei nº 9.985, de 18 de junho de 2000, que Regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III, e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências.

§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:

I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;

Lei nº 8974, de 5.1995, que regulamenta os incisos II e V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas para o uso das técnicas de engenharia genética e liberação no meio ambiente de organismos geneticamente modificados, autoriza o Poder Executivo a criar, no âmbito da Presidência da República, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, e dá outras providências.

30

III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;

Lei nº 8974, de 5.1995, que regulamenta os incisos II e V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas para o uso das técnicas de engenharia genética e liberação no meio ambiente de organismos geneticamente modificados, autoriza o Poder Executivo a criar, no âmbito da Presidência da República, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, e dá outras providências.

VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

Lei nº 4771, de 15.9.965, que institui Código Florestal. Lei nº 5197, de 3.1.1967, que dispõe sobre a proteção a fauna (Código de Caça). Decreto-Lei nº 221, de 28.2.1967, que dispõe sobre a proteção e estímulos a pesca.

§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.

Decreto-Lei nº 1985/40 – Código de Mineração, com redação dada pelo Decreto-Lei nº 227, de 28.2.1967.

§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.

§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.

Terras devolutas: ver Decreto-Lei nº 9760, de 5.9.1946, arts. 1º, 5º, 164 e seguintes, 175 e seguintes, Leis nºs. 6383, de 6.12.1976, 6925, de 29.6.1981, Decreto-Lei nº 1414, de 18.8.1975 e Decreto 87620, de 21.9.1982.

§ 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida

em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.

31

1.3.3 Terceiro período: globalização (1999-2002)

O estudo identifica o confronto de ativistas contra a Organização Mundial do

Comércio (OMC) durante sua reunião em Seattle (EUA), em 1999, como início do

novo auge do tema na mídia, desta vez com ênfase na globalização. No ano de 2000,

o lançamento pela ONU dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) estimula

a abordagem da questão socioambiental, relacionando o local ao global. No Brasil,

vale lembrar, realizou-se em 2001 o 1º Fórum Social Mundial em Porto Alegre, que

reforçou a tendência e estimulou a repercussão na mídia.

O atentado ao World Trade Center, em 11 de setembro de 2001 (em Nova York,

EUA), teria tirado o foco das questões socioambientais globais para as ameaças do

terrorismo. No entanto, sob impacto dessa “onda”, a reunião da OMC em Doha

(Catar), no final de 2001, destacou países menos desenvolvidos.

Realizado antes da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento

Sustentável (Rio+10), promovida em Johannesburgo (África do Sul), em 2002, esse

evento estimularia uma retomada, talvez temporária, da pauta socioambiental, com

foco na sustentabilidade.

Como vamos abordar os programas televisivos O Globo Repórter, é importante

observar seu histórico e a evolução do seu formato. A rodovia Transamazônica é o

tema a partir do qual examina-se de que forma o olhar sobre o meio ambiente foi se

constituindo na Rede Globo por meio desse programa, que também mudou ao longo

dos 40 anos de sua existência.

32

Capítulo 2 O Globo Repórter

Enfocaremos imagens construídas na Rede Globo através de o Globo Repórter

de 1970 a 2011 e de outras imagens de cunho jornalístico sobre o meio ambiente.

Como já citado, o recorte do trabalho é a rodovia Transamazônica, que foi

idealizada no governo Médici no começo dos anos 1970, um governo ditatorial e

autoritário que, segundo sua retórica, produziu um “milagre econômico”. Assim, vamos

observar como então se apresentava o Globo Repórter. De que forma se estrutura e

como, ao longo do seu desenvolvimento, foi se transformando de acordo com as

mudanças na história do país e na concepção do próprio telejornalismo.

2.1 O início do Globo Repórter nos anos 1970

O primeiro Globo Repórter foi ao ar em 3 de abril de 1973, às 23 horas. Foi

anunciado como parte da programação da Terça Global7. O programa foi criado com

o propósito de analisar com mais profundidade os principais acontecimentos

jornalísticos nacionais e internacionais do mês, que, por uma questão de tempo, não

eram minuciosamente detalhados nos telejornais. O programa de estreia teve temas

variados: eleições na Argentina, Uruguai e Chile, a revolta dos índios Oglala Sioux,

Emerson Fittipaldi e escolas de samba.

Figura 1 – O primeiro Globo Repórter, dirigido por Paulo Gil Soares, abordou os índios Oglagla Sioiux. Fonte: Globo Play.

7 Programa que exibia shows, entrevistas, reportagens e documentários, sempre uma vez por mês,

toda terça-feira, por volta das 23 horas (VARGAS, 2009).

33

Heidy Vargas (2009) observa que o programa surgiu em um momento de

indefinição do Globo Shell Especial. A partir de setembro de 1971, a TV Globo decidiu

seguir o exemplo da televisão norte-americana e apresentar, com o patrocínio da

companhia multinacional Shell, uma série de 20 documentários especiais abordando

vários aspectos da realidade brasileira. Entre os temas tratados estavam saúde,

alimentação, educação, habitação, arquitetura e urbanismo, turismo, comunicação,

cinema, música popular, o projeto Rondon e a construção da Transamazônica. Este

último foi perdido em um incêndio que ocorreu no Centro de Documentação da Globo.

“No final do ano de 1972, o patrocínio da Shell do Brasil foi suspenso e houve uma

estagnação na produção dos programas” (VARGAS, 2009).

Então, Paulo Gil Soares8 teve a ideia de produzir um documentário com

imagens, entrevistas e documentos históricos. A ideia fez sucesso e José Bonifácio

de Oliveira Sobrinho (Boni)9, pediu que Soares assistisse ao 60 Minutes, programa de

1968 da CBS News. Soares contou em entrevista que:

Em 1973, foi programado um novo jornalístico e numa reunião

[Boni] me pediu para ver um cassete do programa americano 60

Minutes que poderia ser um formato que se queria. A partir da

experiência do Globo-Shell Especial, insisti que poderia fazer um

programa de jornalismo aprofundado com formato documentário.

Boni topou a ideia e pediu que se fizesse um piloto. Fizemos, mas

ele não se convenceu de que aquele formato deveria ser usado de

imediato e ordenou que, nas primeiras experiências, num programa

de 43 minutos e quatro intervalos comerciais desenvolvêssemos

quatro temas diversos. (MUNIZ, 2009, apud VARGAS, 2001, p. 28)

Boni queria que o Globo Repórter fosse igual ao norte-americano 60 Minutes,

que tinha a característica de ser um programa dinâmico, com a presença de um

repórter que atuasse como um mestre de cerimônia e que abordasse mais de um

assunto. Em contrapartida, Soares desejava um programa em formato de

documentário, com imagens mais lentas, que priorizasse os entrevistados no contexto

da matéria, apresentando documentos históricos, sem a imagem do repórter, mas

8 Paulo Gil Soares (1935-2000) foi jornalista e cineasta. Dirigiu o documentário Memória do cangaço, e colaborou com Glauber Rocha em “Deus e o Diabo na Terra do Sol” e Terra em Transe. 9 José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, entrou na TV Globo em 1967, com pouco mais de 30 anos, e ajudou a montar as bases da programação e da rede de afiliadas. Nascido em 1935 em uma família ligada à música e ao rádio, Boni foi vice-presidente de operações da Globo até 1997 e, a partir de então, consultor da emissora até 2001. Desde 2003, é sócio da TV Vanguarda, retransmissora da Globo no interior de São Paulo.

34

apenas o áudio da voz, deixando a conclusão do programa para a reflexão do

telespectador.

Pouco convencida da proposta, a direção da emissora estava preocupada em garantir a audiência e considerava que isso só seria possível num programa multitemático, pela agilidade. Paulo Gil Soares concordou, mas não abriu mão do formato documentário e conseguiu fazer um programa com quatro temas, cada um com a duração de 10 a 12 minutos, sem a imagem do repórter. (VARGAS, 2009, p. 11)

Com o aproveitamento das duas ideias, tanto de Boni quanto de Soares, foi ao

ar o primeiro Globo Repórter. Esse formato permaneceu até 1983, dois anos antes do

término da ditadura militar.

Figura 2 – Programa 60 Minutes, realizado em formato de revista, serviu de inspiração para o Globo Repórter. Fonte: YouTube.

Mesmo com a ideia de um programa no formato norte-americano e moderno

para aquela época, no Brasil, o ano de estreia do Globo Repórter, 1973, vivia um

período sombrio: o auge do regime militar. O presidente Garrastazu Médici governou

até março de 1974 e impôs o mais repressivo e duro período da ditadura, que ficou

conhecido como os Anos de Chumbo. “Foi a época dos desaparecimentos de políticos

opositores, tortura e terrorismo. Imitando o slogan norte-americano, a propaganda do

governo criou o ufanista “‘Brasil, ame ou deixe-o’” (COSTA, 2011).

35

Figura 3 – O slogan “Brasil ame-o ou deixe-o” era impregnado em várias mídias. Acima, álbum de figurinhas com propaganda nacionalista. Fonte: Blog Book Bacana.

Médici dividiu seu governo em três áreas: militar, econômica e política e

nomeou Orlando Geisel como ministro do Exército para administrar a área militar do

país. O ministro da Fazenda da época, Delfim Netto, focou os investimentos na

agricultura e na indústria cedendo incentivos fiscais. Em abril de 1974, foi assinada

com o Paraguai a autorização para a construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu10. É

nesse momento que a oposição, como resultado da sangrenta repressão, se

desarticula:

Os grupos armados urbanos, que a princípio deram a impressão de desestabilizar o regime com suas ações espetaculares, declinaram e praticamente desapareceram. Esse desfecho resultou em primeiro lugar da eficácia da repressão, que acabou com os ativistas da luta armada e seus simpatizantes – a chamada rede de apoio, constituída sobretudo de jovens profissionais. Outra razão para o declínio foi o fato de os grupos armados isolarem-se da massa da população, cuja atração por suas ações era mínima, para não dizer nenhuma. (FAUSTO, 2004, p. 483).

O governo queria que tanto internamente quanto externamente se enxergasse

que o Brasil estava realizando mudanças e se modernizando. Para isso, mesmo sendo

críticos em relação à situação do país, os profissionais do Globo Repórter apostaram

10 Início em 1975 e término em 1982.

36

na qualidade de conteúdo e contrataram os melhores representantes do ramo

televisivo na área de audiovisual: Paulo Gil Soares, Maurice Capovilla e Eduardo

Coutinho. Verifica-se, nessa época, programas de cunho propagandístico do regime

militar, como o que aborda a Transamazônica, de 1974, mas há também

documentários críticos no Globo Repórter. São documentários que tentam seguir os

acontecimentos históricos brasileiros significativos, como, por exemplo, o Último dia

de Lampião, de 1975, do diretor Maurice Capovilla. O episódio de cunho jornalístico

foi realizado, no entanto, com cenas de reconstituição. Trata-se, portanto, de um

docudrama. Encontrados pelas volantes (a polícia que caçou o bando de Lampião por

anos), seus componentes foram mortos e suas cabeças expostas em praça pública.

E quem era Lampião? Independente do título de julgamento se era um bandido ou um

herói, Virgulino Ferreira da Silva era um líder de uma minoria no nordeste, que crescia

e ganhava fama a cada ato contra fazendeiros, coronéis e políticos, que detinham a

força, o dinheiro e o poder político. E o que se passava no país em 1975, mesmo ano

da produção e exibição desse programa sobre Lampião? Um governo repressor que

liquidava qualquer um que se opusesse a ele. Então, tem-se um programa sobre o

último dia de um subversivo.

Maurice Capovilla, por meio deste programa, criou um contraste velado com o

que acontecia no país. Ele expôs, por cerca de 45 minutos, em uma noite de terça-

feira, a história de Lampião. Um programa perturbador, mas esse viés não foi

percebido pelo censor, presença comum em todos os órgãos da mídia. Maurice

Capovilla foi um dos cineastas convidados a fazer parte do Globo Repórter e trouxe a

qualidade do seu trabalho para o programa, incluindo este sobre Lampião.

Não deixa de ser uma bela evidência: poucas vezes, como acontece na filmografia de Maurice Capovilla, é tão marcante dentro de uma obra a evolução interior, a necessidade constante de se refazer, de se reinventar a cada momento para apurar o foco. O cinema como aventura em marcha, como ocasião de descobertas: é como se cada filme fosse um ensinamento que se tira da vida, como se encerrasse uma lição, para autor e para espectadores. (TOSI, 2015)

Em 1978, realizou-se o programa Wilsinho Galileia, do diretor e roteirista João

Batista de Andrade11, que retrata a vida de Wilsinho Galileia, um assassino que matou

11 João Batista de Andrade (77 anos) é diretor e produtor de cinema e televisão. Também é roteirista e escritor. Começou no cinema ainda como estudante na Escola Politécnica da USP em 1963.

37

várias pessoas em São Paulo. O programa aborda a problematização da situação dos

jovens no país na época, de acordo com o comentário do apresentador Sérgio

Chapelin, em que se observa a influência de uma opinião a favor do governo. A

reportagem segue em tom assustador e apresenta entrevistas de vizinhos do rapaz

que escutaram tiros vindos de sua casa, resultado da sua morte pela polícia. Tem-se

mais uma vez a ação da ditadura para transformar em heróis os policiais, pois alguns

haviam sido mortos pelo bandido. Mas também eram os policiais que estavam por trás

do desaparecimento de ativistas presos sob sua responsabilidade.

Assim, nos anos 1970, havia programas em formato de documentário que

mostravam uma realidade que exaltava as realizações ou símbolos do governo, como

a ação da polícia, por exemplo. Entretanto, houve também programas dirigidos por

cineastas críticos da situação do país. Crítica confirmada em seus trabalhos

posteriores. Como a época era de censura prévia dos programas, os cineastas

precisavam se adequar. No entanto, as qualidades dos documentários realizados nos

anos 1970 registram que cineastas como Eduardo Coutinho, Maurice Capovilla e

Paulo Gil Soares deixaram sua história e filmografia de qualidade para o Globo

Repórter. Mesmo com tanta censura, a qualidade de seus trabalhos e características

próprias foram mantidas.

Apesar de toda a qualidade demonstrada em programas realizados por esses

cineastas, o Globo Repórter não deixou de ser também mais um meio de comunicação

propagandístico para o regime. Tanto que o governo Médici apostou na propaganda

para inflar os feitos do governo. “As facilidades de crédito pessoal permitiram a

expansão do número de residências que possuíam televisão: em 1960, apenas 9,5%

das residências urbanas tinham televisão; em 1970, a porcentagem chegava a 40%”

(FAUSTO, 2004).

Foi nesta época também que a Rede Globo se destacou na mídia e alavancou

seu nome e sua presença entre os telespectadores brasileiros. O governo firmou

parceria com esta rede de televisão para apresentar também as suas ações

desenvolvimentistas. Em 1968, havia surgido o programa Amaral Netto, o repórter

Abandonou o curso um ano depois em razão do golpe militar. A sua primeira obra foi o documentário Liberdade de imprensa, de1967, que traz sua marca de “cinema de intervenção”. Participou também do movimento do Cinema Marginal da Boca do Lixo, destacando-se a obra Gamal, o delírio do sexo, de 1969.

38

que, nos anos 1970, tornou-se a voz do progresso e do ufanismo, pois destacava as

obras e o crescimento do Brasil:

Por essa época, beneficiada pelo apoio do governo, de quem se transformou em porta-voz, a TV Globo expandiu-se até se tornar rede nacional e alcançar praticamente o controle do setor. A propaganda governamental passou a ter um canal de expressão como nunca existira na história do país. (FAUSTO, 2004).

2.2 O Globo Repórter nos anos 1980

Em 1983, o programa sofre uma transformação e começa a contar com a

participação de repórteres especiais que trabalhavam em outros telejornais da Rede

Globo, como o Jornal Nacional e outras atrações da época:

o jornalismo da Rede Globo começou a fazer reportagens especiais para o programa e paulatinamente a ocupar a programação para, em 18 de setembro de 1983, transformarem o Globo Repórter definitivamente num programa de repórteres, somente com reportagens especiais. (VARGAS, 2009)

Foi criado o Núcleo de Reportagens Especiais que fazia os documentários

semanais subdivididos em: Globo Repórter Atualidade, Globo Repórter Pesquisa,

Globo Repórter Futuro e, na última semana, Globo Repórter Documento. Para esta

nova demanda, o núcleo expandiu e foram criados mais três núcleos: um no Rio de

Janeiro e dois em São Paulo:

sendo que um era na produtora Blimp Film e outro era na produção de reportagens especiais da Rede Globo em São Paulo, esse novo núcleo foi criado com os jornalistas vindos do telejornal Hora da Notícia, TV Cultura, e da revista Realidade. (Vargas, 2009).

Nos anos de 1980, já temos um Globo Repórter preocupado com uma nova

classe média que surgia, fruto de programas econômicos do governo que

beneficiaram essas camadas em detrimento dos outros trabalhadores. Era o

conhecido “milagre econômico”. Mas o que queria essa nova classe média? A partir

destas indagações e da influência da TV americana, o Globo Repórter adotou um novo

modelo editorial.

Com a relativa abertura política dos anos 1980, a Rede Globo investiu em

programas históricos, como a Copa de 1954, O dia em que o Brasil chorou

(22/07/1980), A trajetória política de Getúlio Vargas (26/08/1980). A partir de 1982, já

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se vê um Globo Repórter que cobre os acontecimentos nacionais com mais

profundidade, como a rotina dos garimpeiros de Serra Pelada, ou os jovens cortadores

de cana que sonham com uma vida melhor ou também o dia a dia de uma mulher

boia-fria (Cortadores de cana sonham com uma vida melhor, 14/06/1984). Já no final

dos anos 1980, há matérias mais “esperançosas”, abordando brasileiros que

conseguem ter uma vida de sucesso apesar de uma infância sofrida (1983), ou

focando em entretenimento, como a herança dos japoneses no Brasil (A herança dos

japoneses no Brasil, 29/07/1988).

Acompanhando os programas do início dos anos de 1980, em que há episódios

do Globo Repórter que resgatam a história do país, principalmente as que ocorreram

nos anos 1950, vê-se que o Brasil precisa desse resgate histórico para levantar a

autoestima da população, uma vez que ocorria grave crise econômica, pois o “milagre

brasileiro” começava a cobrar suas dívidas. O Brasil teve de pedir ajuda ao Fundo

Monetário Internacional (FMI), em 1983, e uma das condições para concedê-la era

melhorar as contas externas do país. Após muitas dificuldades para o cumprimento

das cláusulas do FMI, finalmente, em 1984, o Brasil conseguiu a reativação da

economia (FAUSTO, 2004). Em 1985, deu-se o fim da ditadura militar e também falece

o ex-presidente do Brasil, símbolo da ditadura, Emílio Garrastazu Médici. De acordo

com Koifman (2001), ao longo de seu governo, a ditadura militar atingiu o auge. A

intolerância, a repressão e a censura às instituições civis foram monitoradas e

qualquer manifestação considerada estranha ou contrária era censurada e reprimida.

Foi o governo que mais torturou, matou e causou o desaparecimento de pessoas

presas ou perseguidas.

Já Ernesto Geisel, sucessor de Médici, governou até 1979. Este presidente

começou a dar indícios de que faria uma abertura política “lenta, gradual e segura”. “A

qual deveria levar o país, futuramente, a algum tipo ainda não claramente definido de

governo civil, o que pressupunha o fim do militarismo” (RIBEIRO, 2010, apud

MARQUES e REGO, 2005).

Outro movimento importante pressionava por eleições diretas, culminando no

movimento “Diretas Já”. Artistas, intelectuais, pessoas da Igreja, partidos políticos,

ativistas e população civil envolveram-se neste movimento pela volta à democracia,

pela participação da sociedade civil na escolha de seus governantes. No entanto,

apesar do movimento popular, o presidente ainda foi eleito indiretamente pelo

40

Congresso, o político mineiro Tancredo Neves que, no entanto, nem chegou a tomar

posse, sendo substituído pelo vice, José Sarney..

Em 1986, em vista das mudanças por que passava o país com o fim da ditadura

militar, o Globo Repórter passa por uma nova transformação, agora, com reportagens

mais longas. Nesse momento, o programa passou a assumir o formato idealizado por

Paulo Gil Soares: reportagens longas e detalhadas.

2.3 O Globo Repórter nos anos 1990

Os anos 1990 começam com reportagens impactantes. Em 12 de abril de 1991,

o programa mostrou uma matéria sobre a violência no estado do Pará. Isto mostra um

Globo Repórter mais uma vez retomando os assuntos que preocupam o país. Com a

direção de Jotair Assad, esse programa ganhou o Prêmio Rei de Espanha em 1992.

Já em 1993, a atração começa a adotar um único tema por edição.

A princípio, acreditávamos que, ao abordarmos três assuntos em um programa, estaríamos atingindo a três grupos distintos de telespectadores. Mas, na prática, a história é outra. Um grupo assiste à reportagem que interessa, muda de canal quando começa a outra e assim sucessivamente. Optamos, então, por explorar bem um tema apenas. E vem dando certo".

Palavras do editor-chefe, Jorge Pontual, ao jornal O Globo, em junho de 1993.

Um destes programas apresentou o assassinato da atriz Daniela Perez e denunciou

a violência contra a mulher no Brasil.

Em 1995, em 21 de julho, o Globo Repórter arrisca no editorial e pela primeira

vez na TV brasileira é exibida uma matéria sobre o desaparecimento de presos

políticos. A matéria é do jornalista Caco Barcellos, que acompanha trabalho da perícia

que identifica oito corpos de vítimas da ditadura militar em cemitérios clandestinos de

São Paulo. A reportagem havia sido feita cinco anos antes, porém foi ao ar apenas

quando ocorreu a promulgação da Lei dos Desaparecidos (1995). Isto quer dizer que

houve censura ao programa.

A prefeitura divulgou para a imprensa que seria aberta a vala. No dia 4 de setembro de 1990, às 8 horas da manhã, eu estava lá e creio que os jornalistas começaram a chegar ao meio-dia. A imprensa inteira divulgou este acontecimento na época com grande destaque. Eu produzi uma reportagem para o Jornal Nacional, que foi ao ar no mesmo dia. Mas o Globo Repórter só foi ao ar cinco

41

anos depois, em 1995, quando da discussão sobre a Lei dos Desaparecidos12. (BARCELLOS, 2000).

Figura 4 – Caco Barcellos divulga reportagem que identifica mortos políticos, exibida no Globo Repórter. Fonte: YouTube.

Essa reportagem não foi ignorada em 1990 quando Caco Barcellos concluiu

sua edição em agosto, sendo exibida no Jornal Nacional do mesmo ano. Em 1995,

com ela, o Globo Repórter ganhou o Prêmio Caixa Econômica Federal de Jornalismo

Social. Um ano depois, 1996, o programa ganhou outro prêmio, o Vladimir Herzog, na

categoria reportagem de TV, com outra matéria de Caco Barcellos sobre a versão

oficial dos fatos referentes ao atentado ao Riocentro13, ocorrido em 1981.

Pontualmente, ela foi mencionada no Jornal Nacional, por uma questão de hard news,

conceito jornalístico de matérias que devem ser veiculadas o mais rápido possível

para não perder o tempo de novidade. Só depois de alguns anos, foi retomada no

Globo Repórter em razão da Lei dos Desaparecidos, apresentando uma matéria mais

12 Lei n° 9.140, de 1995: Reconhece como mortas pessoas desaparecidas em razão de participação, ou acusação de participação, em atividades políticas, no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979 e dá outras providências.

13 O atentado ao Riocentro foi um ataque frustrado de bombas que seria realizado no Pavilhão Riocentro, no Rio de Janeiro, na noite de 30 de abril de 1981, em um evento comemorativo ao Dia do Trabalho, ainda durante a ditadura militar. As bombas seriam colocadas por dois militares, porém uma delas explodiu dentro do carro em que os militares estavam, no estacionamento do Pavilhão. A bomba que estava dentro do edifício explodiu antes do previsto, matando um militar e deixando o outro gravemente ferido. Este episódio marca a decadência do regime militar.

42

extensa e investigativa, na qual é clara a participação do regime militar naqueles

episódios.

Ainda em 1996, com o aumento da audiência das classes C e D, o Globo

Repórter passa a retratar assuntos mais abrangentes com o objetivo de despertar o

interesse dos telespectadores de todas as classes sociais, mas sempre mantendo o

alto nível da qualidade da informação. Assim, a partir dessa nova abrangência de

público, o programa começa a destacar mais assuntos relacionados à natureza e

ecologia, passando a divulgar as paisagens e a vida em lugares distantes de grandes

centros urbanos. O significado disso é que agora o público está com mais poder

aquisitivo, então telespectadores e mercado de mídia pedem programas que mostrem

o que há de melhor no Brasil para que se possa desfrutar. Nessa época, por exemplo,

há depoimentos de telespectadores que tomaram a iniciativa de viajar em razão de

terem assistido ao Globo Repórter. Isso estava de acordo com a situação econômica

que o país vivia.

Figura 5 – Globo Repórter assume novo rumo e valoriza programas turísticos. Fonte: YouTube.

Nessa nova mudança, percebemos indícios de preocupação com o meio

ambiente e as questões ecológicas começam a aparecer no Globo Repórter. Por

exemplo, o programa Chapada dos Guimarães (1996) não aborda apenas o turismo

43

da região, mas também as questões relativas à conservação ambiental. O programa

mostra pessoas que trocaram a cansativa e estressante vida em São Paulo pela

calmaria da natureza. Nas imagens, aparece um professor de São Paulo que mora na

Chapada dos Guimarães e construiu uma casa com cascas de árvores. Ele trabalha

como guia turístico. As imagens mostram seu dia a dia recebendo estrangeiros e

mostrando as belezas naturais no local. A situação mostrada no programa lembra o

que Hermann (2006) esclarece ao citar Jean-Jacques Rosseau e sua defesa da

natureza, em que ela é o elo entre empreender uma reforma moral e intelectual da

sociedade contra a voracidade da Revolução Industrial que devorava a natureza.

Rousseau afirma que o homem deve ter uma nova mentalidade em relação à

natureza, ou seja, uma relação de harmonia. E o que temos nesse programa? Um

profissional da capital paulista que, cansado da vida de São Paulo, vai à Chapada dos

Guimarães entrar em comunhão com a natureza.

Enquanto isso no Brasil, o início dos anos 1990 foi marcado pela figura de

Fernando Collor de Mello, o primeiro presidente eleito democraticamente, que ficou

conhecido como o “caçador de marajás”, representando a figura de quem combatia

os abusos dos funcionários públicos que favoreciam políticos e empresários.

Mesmo com apoio de uma grande rede de telecomunicações, a Globo, e com base sólida da direita do Brasil, Fernando Collor demonstrou nervosismo e insegurança nos debates presidenciais de que participou. De acordo com alguns historiadores, tinha planos mirabolantes e ideias vazias. (Araújo, 2006)

O apoio da Rede Globo a Collor fez com que, em 1993, a BBC de Londres

divulgasse um perturbador documentário chamado Muito além do Cidadão Kane que

questionava a relação de Roberto Marinho com a política brasileira e citava o

envolvimento de interesses econômicos com Fernando Collor de Mello, cuja família

era dona do canal que retransmitia a programação da Globo em Alagoas. Assim como

o personagem principal do filme Citizen Kane, de Orson Welles, o documentário

associava Roberto Marinho à manipulação das notícias a fim de influenciar a opinião

pública.

44

Figura 6 – Documentário da BBC critica a Rede Globo. Fonte: YouTube.

2.4 O Globo Repórter nos anos 2000

Em 2003, o Globo Repórter comemora 30 anos e os telespectadores são

convidados a participar de um programa, como forma de metalinguagem. A edição

(GLOBO REPÓRTER, 30 ANOS, 2003) mostrou as reportagens que inspiraram as

pessoas e transformaram suas vidas, ou seja, é uma metalinguagem como forma de

autopropaganda. Em 2005, a TV Globo comemorava 40 anos e foram mostrados os

bastidores do Globo Repórter no próprio programa, novamente como metalinguagem

e como forma de autopropaganda. O programa revelou como eram as produções de

entretenimento e acompanhou o trabalho dos jornalistas. Foi a primeira vez que o

programa mostrou os telespectadores que acompanhavam o Globo Repórter. Desta

forma, o programa mostrou que “deu certo” durante aqueles anos. É como se

estivesse prestando contas para o telespectador e se autovangloriando.

Em 2008, o Globo Repórter comemorou 35 anos com novo cenário e pauta

interativa. O site Memória Globo mostra que agora o telespectador, através da página

do programa na internet, pode escolher o tema do programa. O assunto da primeira

reportagem escolhida foi Saúde e qualidade de vida. A reportagem tratava do aumento

de pessoas obesas no Brasil. Em 2010, Glória Maria estreia no programa e, em 2011,

o cenário mais uma vez é reformulado, apresentando ambiente mais interativo. As

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telas de fundo são touch screen e o apresentador pode andar pelo cenário. Estas

mudanças pretendem mostrar o quanto o programa estava mais descontraído e

seguia uma tendência norte-americana para capturar o público jovem. Cerca de 66%

do público da internet assiste a vídeos com notícias, superando trailers de filmes,

videoclipes musicais e esportivos, de acordo com estudo divulgado pela Online

Publisher Associations. A forma de entretenimento está ocupando o lugar da

informação.

Desde então, a partir de 2000, os assuntos polêmicos, já citados neste capítulo,

como a reportagem de Caco Barcellos sobre os desaparecidos políticos e também a

vida de Lampião, vêm perdendo força, dando uma noção superficial dos fatos. Brasil

(2002) acredita que os temas fortes, coerentes e perigosos foram se tornando cada

vez mais raros. Depois da saída de cineastas e jornalistas do Globo Repórter, como

Paulo Gil Soares, Washington Novaes e Jorge Bodanzsky entre os anos 1980 e 1990,

por exemplo, o último programa a mostrar uma questão polêmica foi veiculado em

janeiro de 2000, abordando a prostituição em Alagoas, que envolvia muitos políticos

do estado.

Minutos antes da exibição do programa, um apagão deixou a região às escuras. Instantes mais tarde, quando a luz voltou, o sinal da Globo permaneceu misteriosamente fora do ar. Uma vistoria, no dia seguinte, revelou que ocorrera sabotagem. De quem foi a culpa? “Para mim, são todos suspeitos”, afirma o delegado Oldemberg Paranhos, que investiga o blecaute. (DUARTE, 2000)

Isto significa o quanto a Rede Globo se mostrou vulnerável e favorável a

políticos, mais uma vez, pois, levando em consideração as citações de Duarte,

conclui-se que houve manipulação e graves interferências políticas na região, uma

vez que faltou eletricidade em todo o estado no dia que a reportagem foi exibida em

todo o país.

Em 2002, uma eleição democrática levou ao poder um representante do Partido

dos Trabalhadores, Luiz Inácio Lula da Silva, próximo a posições da esquerda, mas

tentando compor com todos os segmentos sociais. Ele foi reeleito em 2006. Em

meados dessa década, o país consegue superar suas dívidas externas e, com

reservas em caixa, recebe do Fundo Monetário Internacional o título de “credor”,

mantendo sua economia estável apesar da gravíssima crise internacional de 2008.

Enquanto isto, a China também cresce economicamente e é um importante parceiro

nacional, como noticia a mídia brasileira.

46

A visita do papa Bento XVI ao Brasil também marcou este período. A

descoberta do pré-sal também foi uma grande esperança para o crescimento e a

autonomia do país, assim como a produção de biocombustíveis.

Rodrigues (2008), que mapeou e analisou O Globo Repórter até 2008, mostra

que, em 2000, as aventuras na natureza foram tema de mais de 50% dos programas.

“Nem todos os programas são filmados no Brasil, algumas vezes, a equipe vai até

outros países, e outras vezes, os programas são comprados prontos de produtoras

internacionais” (RODRIGUES, 2008).

A predominância da natureza nos programas, de acordo com o que foi exposto

no capítulo 1, se deu pela onda de globalização que abrange os assuntos ambientais.

Em 2000, o que pode ter influenciado foi o lançamento dos Objetivos de

Desenvolvimento do Milênio, que discute assuntos sobre meio ambiente. O Brasil foi

importante nesta questão. Ele sediou, em Porto Alegre (RS), o 1° Fórum Social

Mundial que reforçou a tendência e enfatizou a importância de questões ambientais

na mídia. Isto aconteceu em 2001. Outro fato que prova a permanência de assuntos

predominantemente ambientais no Globo Repórter foi a reunião da OMC em Doha

(Catar), no final de 2001, que ressaltou assuntos ambientais em países considerados

subdesenvolvidos.

47

Capítulo 3 A Transamazônica no Globo Repórter

No Brasil dos anos 1970, sob o regime militar, há grande necessidade de

mostrar altos índices de crescimento econômico. A retórica do regime militar, instalado

desde 1964, constrói a imagem de um país que cresce graças à força e ao poder dos

militares. O Brasil recebia grandes investimentos estrangeiros e as grandes obras

públicas tinham como meta alavancar economicamente o país, de acordo com a

propaganda governamental.

Dentro deste contexto, Braga (2011) afirma que o projeto da Transamazônica,

na retórica e na propaganda governamental, traria a “redenção” ao povo brasileiro,

principalmente para o Norte e Nordeste.

A rodovia Transamazônica (BR 230) foi idealizada durante a gestão do

presidente Emílio Garrastazu Médici (1969-1974) dentro do Plano de Integração

Nacional (PIN). É considerada uma das grandes obras do governo e também um dos

maiores “elefantes brancos” das obras brasileiras.

É a terceira maior rodovia do Brasil, só perdendo para a BR 116 (Régis

Bittencourt, Dutra, Rio-Bahia) com 4.489 km de extensão e a BR 101 com 4.125 km.

Começa na cidade de Cabedelo na Paraíba e passa pelos estados do Ceará, Piauí,

Maranhão, Tocantins Pará e Amazonas.

A Transamazônica foi projetada para unir o norte ao restante do país e tornar

possível, através do cultivo de terras com a derrubada da floresta, criar zonas de

plantio para populações carentes, sobretudo os nordestinos. Tratava-se de criar uma

nova fronteira agrícola e populacional resolvendo os problemas das secas. Foi

inaugurada em 27 de agosto de 1972. O projeto original previa uma estrada com 8 mil

quilômetros de extensão ligando o Brasil ao Peru e ao Equador. Depois, o projeto foi

reformulado e a pretensão era construir quase cinco mil quilômetros, finalizando a

pista na cidade de Benjamin Constant, no Amazonas. Entretanto, por falta de estrutura

e problemas na data de entrega, a rodovia atualmente tem 4.125 km e termina na

cidade de Lábrea, no Amazonas.

Durante a sua construção, os trabalhadores ficaram completamente isolados e

sem comunicação durante meses. As notícias sobre as pessoas que lá trabalhavam

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só chegavam caso alguém conseguisse se deslocar a alguma das cidades próximas.

A maioria chegava nas obras de avião, que utilizava pistas precárias.

A visão sobre a Amazônia como uma região pitoresca e inatingível ficou no

passado. Ela passou a ser considerada o “celeiro do mundo” e começou a receber

muitos colonos. O final dos anos 1960 e começo de 1970, a região da estrada sofreu

ocupação mais forte e intensa, “servindo como uma vereda aberta ao nordestino para

a colonização do enorme vazio demográfico e o início da exploração de potenciais até

então inacessíveis” (MIRANDA, 1981). A construção ocorreu em várias regiões

simultaneamente, e, em outubro de 1971, o primeiro trecho foi entregue.

3.1 A Transamazônica nas telas do Globo Repórter

Passaremos agora à análise dos programas que enfocaram essa região em

diferentes momentos. Como já explicamos anteriormente, nosso objeto de estudo é o

Globo Repórter, no entanto, como só foi possível localizar uma emissão a partir de

1974, abrimos nossas considerações com dois produtos de datas significativas e que

tinham viés de propaganda: um filme da Agência Nacional (1970), produzido por John

Edward Borring, e o programa Amaral Netto, o repórter, que embora fosse da TV

Globo e em formato jornalístico, apresentava conteúdo pela ótica oficial e com olhar

positivo às iniciativas do governo. É interessante lembrar que Amaral Netto era

deputado federal naquele mesmo momento e pertencia, é claro, à Arena, o partido

governista.

Se 1970 marca justamente o surgimento do grande projeto de uma estrada que

rasgaria o território do norte e nordeste, terras ainda por explorar e enriquecer e ligar

o país – temas caros aos militares e de grande impacto midiático –, sabe-se que esse

foi também o momento mais sangrento e arbitrário da ditadura militar. Assim, o reverso

disso era a aposta no progresso divulgado em publicidade e filmes institucionais.

O filme da Agência Nacional (1970)14 mostra o início dos trabalhos de

construção da rodovia Transamazônica, apresentando imagens de homens com

14 A Agência Nacional (AN) era uma agência de notícias que surgiu em 1° de março de 1937, durante o governo de Getúlio Vargas. Tinha o objetivo de divulgar as ações da gestão federal e as notícias de interesse público, além de veicular a publicidade dos órgãos governamentais. Até 1939, a AN era um serviço realizado pelo Departamento Nacional de Propaganda e Difusão Cultural, substituído pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) em 27 de dezembro de 1939. Estes departamentos eram submetidos ao Ministério da Justiça.

49

tratores derrubando árvores e outros com facões entrando na mata. Há também

imagens do presidente Emílio Garrastazu Médici com a primeira árvore derrubada

para o começo das obras. A primeira árvore derrubada foi motivo de orgulho para o

governo nacional e foi mostrada no filme oficial. Derrubar a floresta naquele momento

era progresso!

O discurso do filme da Agência Nacional sobre a inauguração das obras é cheio

de metáforas e comparações exageradas. “A região da Amazônia era tão isolada

quanto as regiões polares”, dizia o narrador. As imagens acompanham o discurso

exagerado e aparecem muitos tratores destruindo a floresta e derrubando árvores.

Todas as imagens da destruição estão acompanhadas com música clássica em tom

solene. O narrador cita as palavras do presidente sobre isto: “Fazer andar o relógio

amazônico que ficou muito parado no passado”. O nordestino também é lembrado no

filme. A região é exaltada como o Eldorado brasileiro que pode ser desbravado e

colonizado pelo nordestino e o que se vê ainda são tratores derrubando árvores e

deixando a terra plana. No filme, é enfatizado que a região é rica em vales férteis e

promissoras jazidas minerais.

Entretanto, Baena (1983) afirma que o solo da Amazônia é pobre em minerais

e, por causa disto, não só causou a saída dos nordestinos, anos mais tarde, como

também justificou o insucesso de empreendimentos agropecuários.

É importante esclarecer que enquanto o governo federal preocupava-se com a

construção da rodovia Transamazônica derrubando árvores em 1970, na contramão

dos fatos que aconteciam no Brasil, o mundo se preocupava com as questões

ambientais. O livro Primavera silenciosa (1962), da jornalista Rachel Carson foi

sucesso de vendas. Seu conteúdo é uma denúncia contra a contaminação dos

Grandes Lagos dos Estados Unidos pelo veneno agrícola mais popular e de mais

baixo custo da época, o DDT. A denúncia ganhou repercussão internacional. Outra

ação marcante no início dos anos 1970 foi o relatório do empresário italiano Arilio

Peccei: Os limites do crescimento. Ele mostrou como ficaria o ambiente dali há 100

Na época, a AN tinha uma função importante, pois era fornecedora de material para o rádio, que até então era de maior alcance no país. A AN trabalhava em parceria com a Rádio Nacional. O produto mais popular da AN era a Voz do Brasil. Todas as rádios foram – e quase todas ainda são – obrigadas a transmitir o programa em todo o país. Mesmo com a queda do presidente da época, Getúlio Vargas, e a redemocratização em 1945, a Agência Nacional foi mantida e a Rádio Nacional virou a Radiobras. Em 1979, a AN foi transformada na Empresa Brasileira de Notícias. Em 1988, a EBN foi extinta e absorvida pela Radiobras, sendo a razão social alterada para Empresa Brasileira de Comunicações.

50

anos, caso prosseguisse o crescimento econômico a qualquer custo. Com base no

documento, foi realizada a 1a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente

Humano, em Estocolmo (1972). Na contramão do início da onda ambiental, o Brasil

se atrasa e ainda caminha para o lado da destruição. A natureza a favor do homem.

Era isto que Francis Bacon pregava no século XVI. Mesmo sendo um conceito de

quatro séculos atrás.

Figura 7 – Governo de Médici apostou na propaganda para divulgar obras. Acima, filme da Agência Nacional (AN). Fonte: YouTube.

51

Figura 8 – Médici fotografado com a primeira árvore derrubada para a construção da Transamazônica. Fonte: YouTube.

Ainda nos anos 1970, a rodovia é mostrada no programa do Amaral Netto, o

repórter: Brasil, ontem, hoje e amanhã (1975), enfatizando os tratores derrubando

árvores, as serras elétricas, os homens com facões abrindo caminhos e a expectativa

do nordestino de deixar a sua região seca para colonizar a Amazônia. O ponto alto

deste programa é a conquista da Amazônia. Conquista. Um substantivo usado várias

vezes para definir a conquista do Império Inca por espanhóis, a conquista do Brasil

pelos portugueses... Isso mostra que a conquista da Amazônia tem o mesmo sentido,

já que os casos citados também se caracterizaram por destruição e devastação.

Mostrar facões e serras elétricas cortando árvores eram ações positivas, pois

demostravam força, podemos até dizer que seria a mesma “força” com que o governo

da época achava que administrava o Brasil. A força que destruía árvores era a mesma

que destruía famílias, devido ao sumiço de pessoas durante a ditadura militar.

3.2 Amazônia: mito e realidade

Passaremos agora à observação do Globo Repórter tendo em mente seu

formato e sua linha editorial, que apresentamos anteriormente. Em 1974, o Globo

Repórter, Amazônia: mito e realidade (1974) aborda a região de forma institucional. O

programa tem o patrocínio e apoio do governo do estado do Amazonas e do

Departamento de Turismo e Promoções, um dos principais entrevistados é o político

52

e professor Artur Reis. O programa enaltece as belezas naturais e a simpatia do povo

manauara. O tom é patriótico, pois convida todo o povo brasileiro a conhecer o estado

amazonense. Aparecem imagens de cruzeiros chegando cheios de turistas de

diversos tipos, desde cidadãos do sul até padres que tiveram folga da paróquia. No

entanto, o engenheiro de Estradas e Rodagens do Amazonas, Paulo Fábio, tem

apenas uma breve participação de um minuto. Ele diz que se sente orgulhoso de fazer

parte de um progresso como este, mas, em contrapartida, sua equipe teve problemas

com a insalubridade e a febre amarela, e ainda ressalta que todos estão sofrendo

muito com as doenças, o que está prejudicando o andamento e o tempo de entrega

do trabalho. Mas ele “conserta” o suposto problema, ressaltando que o governo

amazonense tem dado todo o suporte necessário para os profissionais. Enquanto ele

fala, não aparece nenhuma imagem, apenas ele mesmo falando com o repórter na

frente da câmera. Ocorreram muitos casos de mortes de operários e de agricultores

por doenças e acidentes. Dá-se a entender que, mesmo com toda a precaução de

mostrar apenas o que é belo no Amazonas, parece que o engenheiro está tão

saturado que não esconde mais os problemas que enfrenta na construção da rodovia.

Prova disto é a sua expressão cansada, séria e apática enquanto concede a

entrevista, porém ele não esquece do dever de ser nacionalista em prol do

desenvolvimento e se diz honrado em estar participando de uma construção como

esta. “As forças de repressão buscaram ocultar as notícias sobre enfermidades na

Transamazônica, pois ela era parte fundamental dos grandes empreendimentos que,

segundo a ditadura, contribuiriam para alçar o Brasil ao posto de potência mundial”

(Souza, 2015, p. 1).

Entre 1974 e 1981, não há mais nenhum programa do Globo Repórter sobre o

tema, ao mesmo tempo que o formato do Globo Repórter também passa a mudar.

Como já exposto anteriormente no capítulo 2, a linha editorial dá preferência para

casos reais na história brasileira e resgata personagens que conviveram com estas

pessoas, como Lampião, Getúlio Vargas e outros.

Ainda sob o regime militar (1964-1985), o programa de 1981 do Globo Repórter,

Amazônia: a pátria da água, parece não estar preocupado com a censura. O programa

especial aborda os rios do Amazonas. Em uma linguagem literária, o diretor do

programa, Washington Novaes, convida o poeta manauara Thiago de Mello para

narrar todo o programa em forma de poesia. Os trechos dos poemas não são

românticos e, sim, críticos. Ele critica a falta de saneamento, as crianças de barriga

53

grande com vermes e também as que faleceram em função do cólera. Nesse

momento, aparecem imagens de crianças com barriga inchada em frente a uma casa

que fica à beira ou dentro do rio. Não se tem mais a glória amazônica dos anos 1970,

porém as imagens e a discussão das consequências de um progresso que chegou

sem ordem. Nesse programa, não há menção da Transamazônica, pois o objetivo é

mostrar apenas a água, todavia a ausência do tema chama a atenção, pois ainda vive-

se o período militar e surpreende um programa apontar os erros de um governo que

apenas pensou em desenvolvimento sem planejamento. E silencia sobre a grande

estrada e a destruição que veio junto com ela.

A falta de planejamento afeta o meio ambiente e também a identidade do índio.

O diretor Jorge Bodanzky, ainda dentro do período militar, em 1976, desafia o governo

vigente e dirige o filme Iracema: uma transa amazônica. O filme é uma crítica ao

governo que constrói a rodovia Transamazônica e faz uma analogia com a

descendente de índio, Iracema, uma índia que vai perdendo a identidade e se

deteriorando até cair na prostituição, assim como a rodovia, cuja construção começa

com vigor, mas resta inacabada e sem planejamento. A única esperança de Iracema

era a volta de seu amante caminhoneiro que ela considerava o mais rico

economicamente, Tião Brasil Grande. Ele leva Iracema em grande parte da sua

viagem no caminhão, mas se cansa dela e vai embora, largando-a em outro prostíbulo

sujo. Assim, como a rodovia Transamazônica, Tião Brasil Grande representa o

governo federal que, depois de se aproveitar dos recursos naturais de um meio

ambiente limpo, abandona uma estrada suja e sem estrutura. Ao final do filme,

Iracema reencontra Tião Brasil Grande e pergunta: “Tião, eu estou feia ou bonita,

desde a última vez que me conheceu?”, “Está feia, está até sem dente”, responde

Tião, que vai embora em seu caminhão. Assim como Iracema sem dentes e

abandonada, a rodovia Transamazônica estava sem asfalto e foi deixada pelo

governo.

Depois de seis anos do filme, em 1982, o Globo Repórter convida Bodansky,

para dirigir o Último Eldorado brasileiro. Este programa é importante, pois, assim como

o filme Iracema, uma transa amazônica, mostra as consequências impactantes da

construção da Transamazônica. Mostra os caminhões atolados na lama da rodovia

em razão da falta de pavimentação e a dificuldade de transitar por grandes buracos

em locais de asfalto precário e desgastado. O programa veicula a primeira entrevista

com um caminhoneiro. Ele diz que a malária é o principal problema da região e as

54

pessoas acabam desistindo de ficar. Em seguida, mostra uma família de colonos do

sul que mora às margens da rodovia. “Já tive malária umas cinco vezes”, diz Leonida

Albino, a matriarca de uma família formada por três homens, dois filhos e o marido.

“Fui para Humaitá tratar da malária, quando cheguei em casa, os dois meninos estão

com ela também”, diz o pai da família Vitelo Albino. Além da malária, Leonida Albino

também mostra a terra que não é fértil. A intenção da família ao se mudar para o

Amazonas era se dedicar à agricultura. O programa também mostra que não são

apenas os nordestinos que chegam para tentar uma nova oportunidade, famílias do

sul do país também sobem o mapa do país para melhorar de vida na Amazônia. Um

dos pontos altos do programa é a perda de identidade do índio. A construção da

rodovia deslocou tribos indígenas, cujos membros se transformaram em empregados

de fazendeiros, perdendo sua terra, seus costumes e sua identidade.

Figura 9 – Bodansky mostra Transamazônica. Fonte: Arquivo pessoal.

Figura 10 – Postos abandonados na rodovia. Fonte: Arquivo pessoal.

55

Figura 11 – Motorista reclama de Transamazônica. Fonte: Arquivo pessoal.

Em 1984, o Globo Repórter fez um programa apenas sobre a Transamazônica

no estilo road trip. Nele, o jornalista Hermano Henning encontra mais uma vez índios

que reclamam da diminuição de terras. “Nossa aldeia virou um cercadinho”, diz um

índio apinajé. As agrovilas, locais que o governo construiu, são mostradas e o

abandono já é evidente. Os colonos do sul, mais uma vez, são os principais

habitantes, porém tratam o local com descaso, pois a terra não tem fertilidade.

Em 1991, findo o regime militar e vivendo sob a Nova República, o jornalista

Caco Barcellos apresenta Desperdícios de verbas em obras públicas e mostra que a

construção da Transamazônica recebeu mais de dois bilhões de dólares. Ele mostra

ainda que até aquele momento árvores centenárias estavam sendo derrubadas e não

havia fiscalização e denuncia a extensa matança de animais silvestres. Ele também

diz que milhares de colonos do nordeste e do sul haviam ido embora e as agrovilas

estavam totalmente abandonadas, com mato alto crescendo.

O questionamento econômico é evidente em um indicativo de que é preciso

acabar com o desperdício, pois é a época do governo de Fernando Collor de Mello,

que assumiu a presidência em 1990, combinando com o título que Collor recebeu de

“caçador de marajás”.

Já em 1998, em Viagem pela Transamazônica, o tom mudou. Trata-se agora

de incentivar o turismo. O programa segue a nova proposta formatada para o Globo

Repórter de seguir uma linha mais de entretenimento e viagens para abranger as

classes C e D, que assistiam ao programa. O repórter viaja pela estrada mostrando

as onças pintadas e outros animais. Apesar de todas as rotas de natureza que são

mostradas na rodovia, o programa se detém no único nordestino que sobrou no local.

Mesmo que seja de maneira superficial, isto vem ao encontro do que está

acontecendo no meio ambiente no mundo. Nos anos 1990, figuras públicas mundiais,

como a primeira ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland, estão focadas em

problemas urgentes ligados à sobrevivência humana e à biodiversidade.

De certa forma, pode-se dizer que não foi o Estado que politizou o

ambientalismo, mas o ambientalismo que se politizou

gradativamente para alterar, ou mesmo obter influências sobre as

formas tradicionais de governar e atender às demandas

provocadas pelos problemas ambientais [...] reside nas

56

capacidades de articular fatores emocionais e argumentos

racionais, pensamento e ação, numa intensidade que outras

mobilizações sociais raramente conseguem. Mesmo aqueles

partidários do ambientalismo que se consideram “apolíticos, nem à

esquerda nem à direita, mas a frente” colaboram, talvez sem saber

que eram portadores de uma nova visão e sensibilidade da política,

para a disseminação de ideias e valores verdes que propiciaram

posicionamentos tanto nas escolhas pessoais como a mobilização

de ações coletivas que levaram a um crescente esverdeamento das

políticas públicas. (RONCAGLIO, 2012)

Depois de 1998 até 2011, a Transamazônica desaparece como tema

jornalístico, como estrada. Vamos encontrá-la novamente em 2011, pois a partir

desse ano foi concebido o programa O preço do progresso, que não está mais

preocupado em fazer propaganda sobre colonizar, desenvolver e trazer

nordestinos para a Amazônia, mas em abordar a necessidade e as consequências

da produção de mais energia. Novamente, estamos diante de um momento em

que o meio ambiente será transformado de maneira violenta e “antinatural”, se

pensarmos na ideia original de natureza, se pensarmos em Francis Bacon – o

homem decide inundar a própria floresta. Isso foi abordado num programa de 2011.

Vejamos como foi essa abordagem e de que maneira se fala do meio ambiente.

Nesse programa, verifica-se o olhar diante do assunto que mais habita os

noticiários mundiais e brasileiros, a sustentabilidade, em razão do projeto que

previa a inundação de parte da Transamazônica, ameaçando a vida de animais

nativos, como o menor pássaro do Brasil, chamado caçula. Como observa Annie

Cauquelin:

A primeira e mais facilmente perceptível ampliação vem daquilo que

parece mais próximo da paisagem: o meio ambiente físico.

Desolado, degradado, poluído, sobrecarregado, ele chama por

socorro imediato, saneamento e reabilitação. Como esse meio

ambiente deplorável se apresenta sob a forma de paisagens

igualmente desoladas, assistimos a uma identificação entre meio

ambiente e paisagem. A preocupação ecológica, com efeito, vem

se enxertar no interesse pela paisagem, e “meio ambiente” se torna

uma palavra-chave. (CAUQUELIN, 2007, p. 09)

4

6

57

Considerações finais

Conseguimos mostrar que, nos últimos 30 anos, as reportagens sobre a rodovia

Transamazônica mudaram de enfoque e se transformaram em críticas: crateras que

“engolem” caminhões, caminhoneiros que ficam atolados e esperam tratores para

desatolar seus veículos, chegando a esperar ajuda por dois dias ou até mais, greves

de caminhoneiros que não levam os alimentos para o mercado varejista, pois querem

condições melhores de rodagem, e assim por diante. A partir das imagens dos

programas do Globo Repórter, vimos que estas realidades não mudaram. Pelo

episódio Amazônia, o último Eldorado, do diretor Jorge Bodansky, de 1982, ainda

dentro do período militar (1964-1985), observamos um enfraquecimento em vários

fatores. Enfraquecimento de um governo federal que não consegue mais barrar as

críticas às suas obras. Enfraquecimento da censura efetuada pelo governo, que não

freou esses programas, pois no regime militar, esse era um dos órgãos mais

importantes. E, no cenário ambiental abordado pelo programa, que é o que mais nos

interessa, Bodansky expõe um enfraquecimento do meio ambiente por meio das

imagens. As fraquezas são expostas também com os índios enfraquecidos e sem

identidade. Uma rodovia enfraquecida que não possui mais moradores em suas

proximidades. E uma selva enfraquecida, sem árvores. Ironicamente, o programa

mostra que uma parte da travessia da estrada deve ser feita por avião, pois a mata

fechou um trecho da rodovia.

A única imagem positiva sobre a rodovia foi veiculada durante a construção,

nos anos 1970, com o filme da Agência Nacional, propaganda do governo, exaltando

o começo das obras, mas ainda assim diante de um regime autoritário que controlava

com seu departamento de censura o que saia na imprensa.

No cenário ambiental, com a construção da Transamazônica, o Brasil caminha

contra uma corrente mundial que discute soluções de preservação do meio ambiente.

A preocupação em 1972 é que se o planeta continuasse com o ritmo de devastação

daquele momento, o mundo seria um caos dali a 100 anos. Contrariando este

pensamento, o governo ficou na defensiva e divulgava ideias de que as nações

avançadas restringiriam o crescimento econômico de países subdesenvolvidos

alegando riscos nas questões ambientais.

58

Além da ação gravíssima de destruir o meio ambiente, o governo federal dos

anos 1970 enfrentou outra consequência grave: malária e febre amarela. Estas

enfermidades não estavam nos planos do governo militar que incentivava o

deslocamento de nordestinos para aquela área desabitada do Brasil. Ainda dentro do

regime, na reportagem do Globo Repórter de 1982, encontram-se imagens e

entrevistas com uma família de colonos que não aguenta mais as misérias e doenças

de uma terra infértil e ingrata. “Peguei malária umas cinco vezes”, diz a mãe Leonida

Albino. A família inteira sente-se enganada por um governo que fez uma propaganda

enganosa de uma terra próspera e disponível à agricultura. Essa e outras famílias

manifestaram o desejo de retornar a seus locais de origem. O Globo Repórter mostra

isto para nos dizer que não deu certo o que foi planejado em meados da década de

1970 e, ao mesmo tempo, para indicar que “estamos cansados desta administração

que não deu certo”, mesmo sentimento da população no início dos anos 1980, com a

gestão do governo vigente.

As famílias voltam para a terra natal. Em 1998, o Globo Repórter mostra o único

nordestino que sobrou em um trecho que antes era habitado por vários de seus

amigos. “Às vezes nem tenho feijão para dar aos meus filhos”, diz o único nordestino

sobrevivente, dono de um bar vazio nas margens da rodovia, que comenta seu

infortúnio observando imagens de uma estrada deserta e de um bar decadente sem

portas mostradas pelo Globo Repórter.

De acordo com essas imagens, percebemos que temos um Brasil nos anos

1970 que vai contra a corrente mundial em relação à preservação do meio ambiente,

tanto que quando aparecem ambientalistas no país, eles são hostilizados ou são

vistos com um olhar estranho em relação à normalidade do país.

Vimos que o Brasil começa a acertar os ponteiros com o meio ambiente e a se

preocupar com ele a partir dos anos 1980, como mostram os programas de 1982 até

2011, pois o cunho jornalístico é de preocupação e também ecológico. Prova disto é

que o Rio de Janeiro sedia em 1992 um dos mais importantes eventos sobre a

discussão dos caminhos a serem trilhados pelo meio ambiente, a Eco-92. Com isso,

temos uma vertente que vem crescendo a cada década, tanto que hoje já falamos em

jornalismo ambiental nas grades disciplinares das universidades. O setor empresarial,

apesar da isenção nos impostos, cresce com o apoio ao meio ambiente e a

responsabilidade social, embora também seja agente poluidor, assim como a

expansão das cidades e do mercado imobiliário, que leva à destruição do verde e à

59

crescente desambientação do meio ambiente. Por meio dos programas observados

dos anos 1970 até 2011, vimos que temos um longo caminho a percorrer para reduzir

o desmatamento desenfreado, porém já temos uma luz no fim do túnel com o

constante interesse da mídia e de outros setores nas questões ambientais.

60

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