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1 O Modelo de Tomada de Decisão de Compra para o Consumidor Infantil Autoria: Aline Regina Santos, Jane Iara Pereira da Costa, Carlos Eduardo Freitas da Cunha, Olga Regina Cardoso Resumo O comportamento do consumidor é tema amplamente estudado e as descobertas neste campo direcionam o planejamento de marketing de diversas empresas. O consumidor infantil, em específico, vem gradativamente ganhando destaque como área de estudo e mercado. No Brasil, porém, este é um campo ainda incipiente, com poucas pesquisas científicas publicadas. Neste sentido, o presente trabalho busca descrever o comportamento da criança consumidora na decisão de compra, identificando elementos que influenciam o processo decisório. Foram selecionadas como sujeitos de pesquisa 12 crianças com idade entre sete e oito anos. As crianças fazem parte de famílias do tipo nuclear (tradicional), matriculadas numa amostra de quatro escolas particulares da cidade de Blumenau, Santa Catarina. Fez-se uso de pesquisa qualitativa, com aplicação de entrevistas em profundidade. Entre as conclusões alcançadas destaca-se o fato de que crianças são telespectadoras assíduas, sofrendo influência de propagandas, amigos e estratégias promocionais como o uso de brindes. Neste sentido, alerta- se para o discernimento ético ao desenvolver pesquisas e elaborar estratégias para este público alvo. 1. INTRODUÇÃO Acompanhando a necessidade de sobrevivência e sucesso no mercado competitivo atual, cada vez mais empresas investem tempo e recursos para entender o comportamento de seus consumidores, de forma a atender seus anseios e satisfazê-los em maior e melhor qualidade do que os concorrentes. Schiffman e Kanuk (2000) afirmam que os benefícios desses estudos são inúmeros, pois, ao buscar entender o comportamento do consumidor, é possível prever algumas atitudes e realizar planejamentos de marketing mais assertivos, aumentando a vantagem competitiva no mercado. Os autores destacam também que, além de beneficiar as empresas, as pesquisas neste campo são relevantes também para os próprios consumidores, que se beneficiam de percepções acerca de suas próprias decisões, tornando-os consumidores melhores e mais sábios. Entretanto, cabe salientar a existência de diferentes tipos de consumidores, os quais formam segmentos de mercado específicos. Cada segmento tem características, motivações, percepções e atitudes que os diferem dos demais. Além de ser significativamente amplo, o campo do comportamento do consumidor é também de natureza mutável, visto que interage com ele o ambiente social, a cultura, os movimentos no mercado, a estrutura familiar e diversos outros fatores (SCHIFFMANN, KANUK, 2000). Este estudo busca focar em um segmento dos grupos de consumo: o consumidor criança, que constitui uma aposta estratégica em virtude do peso econômico que tal mercado representa, igualmente pelo papel de influenciador que exerce junto de sua família, e, sobretudo, por seu comportamento como futuro adulto (McNEAL, 1992; MONTIGNEAUX, 2003). Montigneaux (2003) diz que nos últimos 30 anos, os conhecimentos sobre a infância se multiplicaram, muitas vezes, graças aos estudos realizados por psiquiatras e psicólogos. Esse saber foi difundido entre o grande público e deu à criança a legitimidade de ser reconhecida como é, com suas necessidades e desejos. As crianças de hoje estão crescendo em um mundo de consumo e, pelos três ou quatro anos já têm algumas marcas de preferência

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O Modelo de Tomada de Decisão de Compra para o Consumidor Infantil

Autoria: Aline Regina Santos, Jane Iara Pereira da Costa, Carlos Eduardo Freitas da Cunha, Olga Regina Cardoso

Resumo O comportamento do consumidor é tema amplamente estudado e as descobertas neste campo direcionam o planejamento de marketing de diversas empresas. O consumidor infantil, em específico, vem gradativamente ganhando destaque como área de estudo e mercado. No Brasil, porém, este é um campo ainda incipiente, com poucas pesquisas científicas publicadas. Neste sentido, o presente trabalho busca descrever o comportamento da criança consumidora na decisão de compra, identificando elementos que influenciam o processo decisório. Foram selecionadas como sujeitos de pesquisa 12 crianças com idade entre sete e oito anos. As crianças fazem parte de famílias do tipo nuclear (tradicional), matriculadas numa amostra de quatro escolas particulares da cidade de Blumenau, Santa Catarina. Fez-se uso de pesquisa qualitativa, com aplicação de entrevistas em profundidade. Entre as conclusões alcançadas destaca-se o fato de que crianças são telespectadoras assíduas, sofrendo influência de propagandas, amigos e estratégias promocionais como o uso de brindes. Neste sentido, alerta-se para o discernimento ético ao desenvolver pesquisas e elaborar estratégias para este público alvo. 1. INTRODUÇÃO

Acompanhando a necessidade de sobrevivência e sucesso no mercado competitivo atual, cada vez mais empresas investem tempo e recursos para entender o comportamento de seus consumidores, de forma a atender seus anseios e satisfazê-los em maior e melhor qualidade do que os concorrentes. Schiffman e Kanuk (2000) afirmam que os benefícios desses estudos são inúmeros, pois, ao buscar entender o comportamento do consumidor, é possível prever algumas atitudes e realizar planejamentos de marketing mais assertivos, aumentando a vantagem competitiva no mercado. Os autores destacam também que, além de beneficiar as empresas, as pesquisas neste campo são relevantes também para os próprios consumidores, que se beneficiam de percepções acerca de suas próprias decisões, tornando-os consumidores melhores e mais sábios. Entretanto, cabe salientar a existência de diferentes tipos de consumidores, os quais formam segmentos de mercado específicos. Cada segmento tem características, motivações, percepções e atitudes que os diferem dos demais. Além de ser significativamente amplo, o campo do comportamento do consumidor é também de natureza mutável, visto que interage com ele o ambiente social, a cultura, os movimentos no mercado, a estrutura familiar e diversos outros fatores (SCHIFFMANN, KANUK, 2000). Este estudo busca focar em um segmento dos grupos de consumo: o consumidor criança, que constitui uma aposta estratégica em virtude do peso econômico que tal mercado representa, igualmente pelo papel de influenciador que exerce junto de sua família, e, sobretudo, por seu comportamento como futuro adulto (McNEAL, 1992; MONTIGNEAUX, 2003).

Montigneaux (2003) diz que nos últimos 30 anos, os conhecimentos sobre a infância se multiplicaram, muitas vezes, graças aos estudos realizados por psiquiatras e psicólogos. Esse saber foi difundido entre o grande público e deu à criança a legitimidade de ser reconhecida como é, com suas necessidades e desejos. As crianças de hoje estão crescendo em um mundo de consumo e, pelos três ou quatro anos já têm algumas marcas de preferência

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(WOLFMAN, 2005), sendo não mais observadores passivos, mas participantes ativos no processo de consumo (WIMALASIRI, 2004).

Com todos esses fatores, o consumidor infantil atualmente apresenta-se em destaque não apenas em pesquisas acadêmicas. Ele movimenta um valor financeiro considerável, compra com seu próprio dinheiro, influi nas compras familiares e exige meios e linguagens de comunicação próprias para atingi-lo (McNEAL, 1992). Baseado na pesquisa The Kids Market para os Estados Unidos, Waldman (2006) calcula que o poder de compra das crianças só tende a crescer. Estima-se que, em 2010, elas movimentarão cerca de 21 bilhões de dólares anuais em compras e seus pais gastarão em torno de 143 bilhões com seus cuidados. Ou seja, as crianças estão mais ricas e mais bem informadas, possuem voz ativa dentro do contexto familiar e consomem mais do que qualquer geração passada, na mesma faixa-etária, jamais consumiu (GUNTER; FURNHAM, 2001). É neste cenário que se fundamenta a razão de ser desta pesquisa: um trabalho que aborda o universo infantil no processo de consumo, com foco na tomada de decisão, visando contribuir para os estudos sobre a criança como mercado consumidor. É um estudo pertinente à área empresarial e social, e abrange assuntos como comportamento do consumidor, marketing e psicologia. 2. COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR

O comportamento do consumidor, nas palavras de Schiffman e Kanuk (2000, p.5)“é o estudo de como os indivíduos tomam decisões de gastar seus recursos disponíveis (tempo, dinheiro, esforço) em itens relacionados ao consumo. Sendo assim, esse comportamento engloba o que os consumidores compram, por que eles compram, quando compram, onde compram, com que freqüência essa compra é efetuada e com que freqüência eles usam o que compram.

Solomon (2002) corrobora com os autores citados anteriormente e completa que o estudo do comportamento do consumidor envolve as etapas acima, porém para satisfazer as necessidades e desejos do consumidor. Sheth, Mittal e Newman (2001) preferem a denominação de comportamento do cliente, justificada por eles como uma abordagem mais ampla, que vai além daquele que consome o produto. Eles destacam que o cliente pode desempenhar três papéis: o de comprador, aquele que efetivamente busca o produto no mercado; o papel de pagante, financiando a compra e como usuário, aquele que consome ou utiliza o produto ou recebe os benefícios do serviço.

Em função de sua amplitude, o campo de comportamento do consumidor comporta ainda outras definições, como a de Blackwell, Miniard e Engel (2005, p.06) que entendem o comportamento do consumidor como “atividades com que as pessoas se ocupam quando obtêm, consomem e dispõem de produtos e serviços”. Uma das premissas fundamentais do moderno campo do comportamento do consumidor é a de que as pessoas muitas vezes compram produtos não pelo que eles fazem, mas sim pelo que eles significam. (SOLOMON, 2002, p.29). Com isso, entende-se que o papel que um produto representa vai além da tarefa que ele desempenha. Isto reflete que o campo do comportamento do consumidor é complexo e há uma série de fatores que permeiam e influenciam esta área de estudo.

O estudo do comportamento do consumidor comporta assuntos relacionados aos fatores motivacionais que influenciam o indivíduo, bem como suas necessidades, desejos, atitudes e personalidade. Leva ainda em consideração o estilo de vida, fatores como estágio de vida, renda, crenças, gênero, culturas e subculturas, entre outros aspectos (SOLOMON, 2002; BLACKWELL, MINIARD e ENGEL, 2005; SCHIFFMAN e KANUK, 2000).

Assunto igualmente abordado na área trata do processo decisório de compra, ou seja, as etapas que antecedem e sucedem o processo da compra. John Dewey apresentou em 1910

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os cinco estágios da reflexão, que nortearam as teorias da tomada de decisão do comportamento de consumo (BRUNER, POMAZAL, 1988). Dewey (1953) apresenta a evolução do pensamento e da reflexão em direção a uma ação, dividida em cinco estágios: 1) uma dificuldade encontrada; 2) definição da dificuldade; 3) sugestão de uma solução possível; 4) elaboração racional de uma idéia e, 5) verificação da idéia.

Além de Dewey, outros autores também desenvolveram modelos de processo decisório, porém possuem como premissa os estágios apresentados pelo autor. O modelo utilizado neste estudo é o apresentado por Blackwell, Miniard e Engel (2005), envolvendo sete etapas principais: reconhecimento da necessidade, busca de informações, avaliação de alternativas pré-compra, compra, consumo, avaliação pós-consumo e descarte. Como citam esses autores ninguém realiza uma compra sem que haja um problema, uma necessidade ou um desejo e como as pessoas solucionam esses problemas que levam à compra é o que busca entender o estudo do processo de decisão do consumidor. Os autores lembram ainda que os consumidores, durante o processo decisório de compra, são influenciados por diversos elementos, conforme se observa na Figura 1.

Figura 1: Modelo de Tomada de Decisão Completo

Fonte: BLACKWELL, MINIARD, ENGEL, 2005, p.86.

De acordo com os autores, a tomada de decisão do consumidor é influenciada e moldada por diversos fatores e determinantes que se encaixam em três categorias: (a) diferenças individuais, (b) influências ambientais e (c) processos psicológicos. (BLACKWEEL, MINIARD, ENGEL, 2005). Sendo os primeiros aqueles relacionados às características específicas do indivíduo, tais como recursos financeiros, de tempo, bem como sua personalidade e estilo de vida. O ambiente que cerca o consumidor também exerce influencia sobre seu processo de compra, como acontece em famílias, por exemplo. Finalmente, o processo psicológico, caracterizado pelo processamento da informação, aprendizagem e mudança de comportamento, constitui-se como mais uma forma de influência no processo decisório de compra.

E o consumidor infantil? Como ocorre seu processo decisório? Que fatores influenciam sua decisão relacionada ao consumo? Estes pontos são apresentados no tópico a seguir.

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3. COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR INFANTIL McNeal (1992) argumenta que a criança vista como consumidora é um grande fenômeno. Segundo o autor, esse fenômeno iniciou quando elas começaram a serem ouvidas e terem seu próprio dinheiro para gastar. Uma das grandes contribuições dos estudos de McNeal (1964, 1992, 1993, 1998), foi o estabelecimento do consumidor infantil dentro de três mercados: consumidor primário, consumidor influenciador e futuro consumidor. Ou seja, o consumidor infantil forma um mercado multidimensional, sendo que para o autor, para cada mercado deve-se considerar as características demográficas desse consumidor.

O consumidor primário é a criança como consumidora na forma de pagante e usuária. Consideram-se as necessidades deste grupo consumidor, desejos e autoridade para gastar de seus próprios recursos (McNEAL, 1992). A segunda classificação, como consumidor influenciador, McNeal (1992) destaca a forte influência que as crianças exercem nas compras dos pais. Isto pode ser observado principalmente em produtos infantis, mas também em produtos e serviços destinados a toda família. E a criança classificada como um futuro consumidor é vista como o consumidor potencial na sua vida adulta. Ao se relacionar com uma marca na infância, há maiores chances dessa marca tornar-se preferência na vida adulta (Montigneaux, 2003). 3.1. Influência da faixa etária na tomada de decisões

Autores afirmam que o comportamento das crianças no processo de compra sofre variações conforme a faixa etária da criança. Para John (1999), da infância até adolescência mudanças importantes ocorrem no modo de pensar das crianças, assim como no seu conhecimento e na maneira de se expressarem como consumidoras. A autora identificou três estágios, condizentes com o desenvolvimento cognitivo e social da criança: o estágio perceptivo, o estágio analítico e o estágio reflexivo.

O estágio perceptivo ocorre entre os três aos sete anos. Esta etapa é caracterizada pelo imediatismo. O conhecimento sobre consumo é baseado por uma única dimensão ou atributo, sendo representado pela observação. As decisões são feitas numa base de informações limitada, baseadas em uma única característica, como o tamanho, por exemplo.

Entre os sete e os 11 anos a criança, segundo John (1999), vivencia o estágio analítico. Neste, muitas mudanças acontecem, sendo o período que acontece o maior desenvolvimento em termos de aprendizado sobre comportamento e habilidades de consumo. Há um conhecimento mais sofisticado sobre as atividades do mercado, marcas e propaganda. A criança é apta também a analisar diversos aspectos ou atributos de uma marca ou produto, como também fazer generalizações de acordo com uma experiência vivenciada. Com isso a tomada de decisão torna-se mais aprimorada, com estratégias que analisam um conjunto maior de informações. As crianças desse estágio são também mais flexíveis, porém a habilidade de se adaptar e de considerar o ponto-de-vista de terceiros, permitem que sejam mais astutas em negociar seus desejos de consumo.

O terceiro estágio, reflexivo, ocorre entre os 11 aos 16 anos. Este estágio é caracterizado pelo desenvolvimento mais intenso em diversas dimensões do desenvolvimento social e cognitivo. O conhecimento sobre o mercado é mais profundo e a estratégia de decisão envolve inúmeras perspectivas, uma habilidade de raciocínio mais apurada e reflexiva e maior capacidade de adaptação.

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3.2. Necessidades e motivações infantis Além da faixa etária, faz-se necessário entender os aspectos psicológicos do

consumidor infantil que influenciam a tomada de decisão. Segundo pesquisa desenvolvida pelo canal CARTOON NETWORK (2000), que procurou entender o universo infantil no Brasil, as crianças apresentam suas necessidades e motivações baseadas em uma escala própria, com tópicos diferentes ao proposto por Maslow. Isto porque este é um público com características singulares, e suas necessidades se encontram em sintonia com seu desenvolvimento cognitivo e social. Esta escala, com cinco níveis, abrange as necessidades de segurança, socialização, identidade, poder/controle e diversão (nesta ordem, do nível mais baixo ao mais alto). De acordo com a pesquisa, a segurança significa, antes de tudo, proteção para a criança. Ela obtém essa segurança em três meios: na família; dentro de sua casa, mais precisamente no seu quarto; e com o dinheiro, que representa o poder de compra e garante uma vida de conforto. A socialização, por sua vez, é um valor que cresce em importância, à medida que a criança se desenvolve. Dentro desse processo, ela convive com amigos e professores e introduz no seu universo as gírias e a busca pela popularidade. O estudo também afirma ser dos maiores desafios da criança o estabelecimento da sua identidade, pois apesar de gostarem de ser crianças para poder brincar, não querem ser tratados como crianças.

Outro nível de necessidade é o poder e controle, observado na importância que a criança dá não só a brinquedos e roupas, mas a itens de tecnologia e tudo o que o dinheiro possa comprar. Finalmente, a diversão é internalizada como a lei máxima. É o mecanismo pelo qual as crianças expressam suas emoções, se relacionam, aprendem a se adaptar às regras e também sobre os comportamentos próprios de cada sexo. Nota-se que na escala de necessidades do consumidor infantil não se encontram as necessidades fisiológicas. Isto porque, uma grande parcela das crianças que responderam a pesquisa, não precisa se preocupar em buscar a alimentação, sendo que as refeições e o alerta para fazê-las, são geralmente controlados pelos pais e responsáveis (CARTOON NETWORK, 2000). 3.3. Influência de fatores externos na decisão de compra Moschis e Moore (1979) constataram que a família é a mais importante fonte de informações no que tange as decisões do consumidor. No entanto, Gunter e Furnham (1998) citam a publicidade como a principal fonte de idéias para as crianças, principalmente a publicidade televisiva. Caron e Ward (1975) já haviam iniciado esse pensamento dizendo que com o aumento da idade as crianças aprendem a usar uma maior variedade de meios de comunicação como fonte de informação.

Hansen e Hansen (1999) constataram que 44% das crianças geralmente buscam informações sobre produtos com as pessoas próximas, como grupo de amigos e com a família. A segunda maior fonte de informação é a televisão, sendo que mídias alternativas como a internet, ainda representam um percentual baixo, mencionada por 5,8% das crianças. No entanto, McNeal (1992) aborda outras fontes como: crianças mais velhas, que se tornam referências e catálogos. Cabe ressaltar que propagandas também exercem influência sobre o consumidor infantil, conforme relata Duff (2004). Segundo o autor, para as crianças entre sete e onze anos, a propaganda tem a função de informar, apresentar novos produtos e dar detalhes sobre eles. No entanto, confirma que as crianças também sabem que a intenção da propaganda é vender esses produtos. No geral, as crianças têm uma atitude positiva com relação à propaganda, sendo também considerada uma forma de entretenimento. A confiança que uma criança tem em relação a uma propaganda, segundo Duff (2004) varia de acordo com a

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categoria do produto e a relação que a criança tem com a marca. Esta confiança também pode ser abalada por uma má experiência ou decepção. Além da propaganda, outro forte elemento influenciador da decisão de compra infantil é a presença de brindes em produtos. Lawrence (2004) aborda que as promoções, principalmente as que dão algum tipo de brinde para as crianças, costumam ter um forte efeito nas vendas. O autor cita que os brinquedos que acompanham os cereais matinais, por exemplo, se tornou praticamente obrigatório, pois as crianças já esperam por ele. Para Lawrence (2004), as crianças entre sete e oito anos de idade possuem uma grande atração por promoções deste tipo, sendo que a presença do brinde pode influenciar diretamente na escolha do produto. Igualmente chama a atenção do público infantil o uso de personagens licenciados, que são facilmente identificados. As crianças compreendem a marca por suas representações visuais e, segundo Dammler e Motz (2002), não há como esperar que elas entendam valores abstratos ou a imagem da marca, como no público adulto. Os autores dizem que, no mundo das crianças, ou é oito ou é oitenta. Ou elas gostam muito de uma marca ou a ignoram profundamente, no entanto, elas têm um grande interesse em descobrir novos produtos. 4. METODOLOGIA

Esta pesquisa visou compreender os aspectos da tomada de decisão de compra do

consumidor infantil, em especial fatores que influenciam este segmento. Trata-se de uma pesquisa exploratória-descritiva, de caráter qualitativo. Para compor a amostra não probabilística foram escolhidos como sujeitos de pesquisa 12 crianças com idades entre sete e oito anos, pertencentes a famílias do tipo nuclear (modelo padrão, com mãe, pai e filhos), residentes na cidade de Blumenau, Estado de Santa Catarina.

A escolha pelos sujeitos de pesquisa seguiu a proposta de segmentação de Kurnit (2004) e Piaget (1996). O primeiro propõe subdivisões em duas grandes faixas, crianças e adolescentes, sendo as crianças aquelas entre seis e oito anos. Com relação à Piaget (1996), utilizou-se a Teoria do Estágio, que define o desenvolvimento cognitivo do ser humano em quatro estágios. Segundo o autor, dos sete aos onze anos as crianças entram no estágio de operações concretas, marcado pela capacidade da criança em estabelecer relações, coordenar pontos de vista diferentes e integrá-los de modo lógico e coerente.

Outro critério utilizado para a definição dos respondentes foi o tipo de unidade familiar a que as crianças pertencem. Embora atualmente existam diversos tipos de núcleos familiares, o do tipo nuclear, também chamado de família clássica, ainda é maioria no Brasil, sendo que no ano 2002 era representado por 55,4% das famílias (IBGE, 2002). Este critério foi elaborado para diminuir o número de variáveis e pelo fato das famílias clássicas ainda serem maioria, principalmente com crianças dessa faixa etária (IBGE, 2002). Aspecto considerado também foi a classe social das famílias, cujo foco da pesquisa são as com crianças matriculadas em escolas particulares da cidade de Blumenau, Santa Catarina. A determinação da escola do tipo particular se deve ao fato que a classe social não é uma variável independente, e sim foco da investigação, definida pelo seu acesso ao universo do consumo.

A coleta de dados foi feita por meio de busca de dados secundários e da obtenção de dados primários, que ocorreu entre os meses de agosto e setembro de 2006. Os dados primários foram obtidos por meio de entrevista semi-estruturada com os sujeitos da pesquisa, acompanhados de suas respectivas mães. Na elaboração do roteiro de entrevista semi-estruturada buscou-se focalizar em campos diretamente ligados ao processo de tomada de decisão de compra, objetivo do presente estudo.

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O modelo de tomada de decisão adotado como base da pesquisa é o apresentado por Blackweel, Miniard e Engel (2005). Este modelo baseia-se nas cinco premissas básicas elaboradas por Dewey (1953) em 1910, que norteou este campo de estudos, porém com o acréscimo de influências externas no início do processo. Foi apontado como de relevância para o estudo a relação com a marca, considerada por si só um atributo de escolha (BAHN 1986).

Para a análise dos dados coletados utilizou-se a técnica de análise de conteúdo de documentos e entrevistas, segundo a abordagem de Flick (2004) e Vergara (2005). Sendo assim, após a coleta de dados o material foi transcrito, pontuado os tópicos mais importantes e condizentes com o processo de consumo e categorizado conforme os tópicos estabelecidos como determinantes no processo de tomada de decisão, respaldado pelo modelo de Blackwell, Miniard e Engel (2005). A análise foi baseada em cada uma das três categorias que influem o processo de decisão, sob a ótica do modelo utilizado, assim como no processo simples de tomada de decisão. Deste modo foi possível observar como a criança consumidora se comporta no ambiente de consumo e em cada etapa do processo de decisão. 5. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS Neste tópico, inicia-se a apresentação de uma síntese das entrevistas. Os temas das entrevistas foram aqui agrupados como “ida ao supermercado”, “percepção de marcas e personagens”, “estímulos externos”, “influencias ambientais” e “recursos (dinheiro)”. 5.1. Ida ao supermercado/ shopping As crianças foram questionadas sobre a ida ao supermercado e shoppings centers, se ocorre, com que freqüência, se costuma comprar, se gosta, etc. A síntese das respostas é apresentada no quadro a seguir. Na primeira coluna, tem-se a identificação da criança, com respectivo gênero (menino/a) e idade da mesma.

Criança Nº Síntese da entrevista CRIANÇA 01 Menino, 7

Vai ao mercado e shopping com os pais. Conhece o nome dos supermercados e lojas que freqüenta. Pede coisas, sendo mais interessado por carrinhos.

CRIANÇA 02 Menina, 7

Vai ao mercado e shopping com os pais e gosta de ir junto. Sabe o nome do mercado e lojas que freqüenta. Pede por caderno, figurinhas e guloseimas (supermercado) e brinquedos, McDonald’s e Bob’s (shopping). A mãe não compra sempre.

CRIANÇA 03 Menino, 8

Vai sempre ao supermercado com a mãe e gosta de ir junto. Ajuda a mãe a fazer as compras. Às vezes pede um carrinho. Não é sempre que a mãe atende o pedido. Vai às vezes ao shopping e conhece algumas lojas – pede por brinquedos.

CRIANÇA 04 Menino, 7

Vai ao mercado com os pais, mas só algumas vezes. Pede por produtos no mercado, como chiclete, bala, e salgadinho (este com brinquedo dentro). Não é sempre que ganha. Vai ao shopping com pouca freqüência e gosta de ir na loja que vende os carrinhos Hot Wheels, mas não lembra o nome da loja.

CRIANÇA 05 Menina, 7

Vai ao supermercado com os pais. Gosta de ver os brinquedos, e pede por eles. No supermercado pede salgadinho, ou é a própria mãe que pega. Também vai ao shopping e conhece os nomes das lojas, pede por brinquedos como a boneca Barbie e lanche no McDonald’s (não pode ser similar).

CRIANÇA 06 Menino, 7

Não vai muito ao supermercado com a mãe, mas gosta de ir junto. Quando ele vai, pede algo, como chiclete Trident, salgadinho, bolacha e chocolate. Vai ao shopping, conhece o nome das lojas. No shopping gosta de ir ao cinema, parque e tomar sorvete.

CRIANÇA 07 Menina, 7

Vai sempre no mercado junto com os pais. Gosta de ir e de ajudá-los com as compras. Quando está com vontade de comer alguma coisa, pede algo, que eles podem negar dependendo do preço. Pede frutas para fazer suco, e iogurte. Não pede salgadinho. Vai ao shopping, conhece as lojas, gosta de ir com os pais. Pede McLanche Feliz por causa do brinquedo.

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CRIANÇA 08 Menino, 7

Vai ao supermercado com a mãe. Gosta de ir junto e de ajudá-la com as compras. Pede brinquedos e guloseimas, que acompanham brindes. Vai ao shopping, conhece as lojas, gosta de ir na Havan por causa do parquinho. Pede McLanche Feliz por causa do brinquedo.

CRIANÇA 09 Menino, 8

Vai ao supermercado com a mãe e gosta bastante. Geralmente pede balas e chicletes Babaloo. Pede suco de laranja da marca Santal. Gosta do chocolate Willy Onka, do filme A Fantástica Fábrica de Chocolate. Vai ao shopping, gosta de ir no cinema e loja de brinquedo.

CRIANÇA 10 Menina, 7

Vai somente às vezes ao mercado com os pais. Não gosta muito de ir junto porque tem que ficar ajudando e nem sempre a mãe a deixa ficar no Cantinho das Crianças. Raramente vai ao shopping, mas quando vai, gosta de ir ao parquinho.

CRIANÇA 11 Menina, 7

Vai ao supermercado com os pais e gosta de ir. Pede Sucrilhos (com brinde), sorvete, biscoitos e picolé. Os pais compram, se ela se comportar. Vai muito ao shopping porque os pais possuem loja. Gosta dos jogos eletrônicos e da loja de brinquedos.

CRIANÇA 12 Menina, 7

Vai ao supermercado com os pais e gosta de ir junto. Às vezes compra alguma coisa. Gosta de escova de dente de personagem e pasta de dente da Tandy. Gosta de produtos com brindes. Vai bastante ao shopping. Gosta de ir à Renner olhar sapatos, nas Lojas Americanas, na loja brinquedos Meninos e Meninas, ao cinema e fazer um lanche.

Quadro 2: Ida ao supermercado e shopping Fonte: Dados primários, 2006.

Os dados sobre a ida ao supermercado mostram que a maioria das crianças

entrevistadas gosta de acompanhar os pais nas compras e já mostram suas preferências, sendo produtos com brindes e brinquedos apontados por oito das 12 crianças (66%). Os dados igualmente indicam que a maioria das crianças entrevistadas (91%) solicita produtos ao acompanhar (ou não) os pais nas compras em supermercados. Neste sentido, a ida ao supermercado já indica uma possibilidade de compra dentre os itens desejados pelos filhos (brinquedos, guloseimas, alimentos). Com relação à ida ao shopping, esta parece freqüente para a maioria dos entrevistados, que apontaram a loja de brinquedos, cinema e lanches como principais atrativos do passeio. Muitos indicaram conhecer o nome das lojas, bem como locais de preferência, como McDonald’s.

5.2. Percepção de marcas e personagens Questionou-se a cada criança se sabia o que era uma marca, que marcas ela considerava “legal” e usava (roupas, higiene pessoal, brinquedos) e qual o personagem preferido. Uma síntese das respostas é apresentada a seguir. Criança Nº Síntese da entrevista CRIANÇA 01 Menino, 7

Não se recorda dos nomes e/ou marcas dos produtos que consome. Seu personagem preferido é o Relâmpago McQueen, do filme Carros. Ele tem o carrinho Relâmpago McQueen, do filme Carros e material escolar da marca Hot Wheels.

CRIANÇA 02 Menina, 7

Não conhece a palavra marca, mas relativo a brinquedos pede por Barbie e Polly. Quanto à higiene pessoal, falou em xampu Crescidinhos e pasta de dente Colgate e Barbie. Pede pela bolacha recheada Cartoon. Sua personagem preferida é a Barbie. Outros artigos de marca citados: Barbie, Rebeldes e Sandy.

CRIANÇA 03 Menino, 8

Comentou não prestar muita atenção em marcas. Disse que escolhe o biscoito pelo sabor, tênis pela cor, brinquedo preferido são bichos de pelúcia. Citou ter carrinhos da Hot Wheels e que gosta do xampu Crescidinhos. Seu desenho preferido é Padrinhos Mágicos. Não possui produtos dos Padrinhos Mágicos porque esses personagens não são muito conhecidos. Porém se houvessem produtos deles, ele os queria.

CRIANÇA 04 Menino, 7

Gosta de brincar de carrinhos da Hot Wheels e com o Max Steel. Gosta quando tem desenho de personagem na embalagem (entre um salgadinho sem desenho e um com o Batman, ficaria com o do Batman). De personagens, gosta do Batman e Robin. Gosta de produtos que tenham o Batman desenhado. A mochila de aula é do Homen-Aranha.

CRIANÇA 05 Menina, 7

Sabe o que é a marca de um produto. Conhece marcas de tênis de linha infantil, como Klin e Patotinha. Seu personagem preferido é o grupo Rebeldes e tem produtos da banda, como: três bolsas, penal, fotos e a boneca de uma das integrantes.

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CRIANÇA 06 Menino, 7

Tem uma relação bem especial com a marca Adidas. O pai trará da Alemanha diversos produtos da marca para presenteá-lo, como: boné, camiseta, tênis, luva e meia. É a sua marca preferida. Sabe o que é marca e conhece várias ligadas ao vestuário esportivo como: Adidas, Nike, Puma e Penalty, de calçado infantil, como Klin e de pasta de dente, como Colgate. Seu personagem favorito é o Avatar.

CRIANÇA 07 Menina, 7

Sabe o que é marca e sabe diferenciar o nome do produto com o da fabricante, no caso Nescau e Nestlé. Não lembrou de nenhuma marca de roupa ou tênis. Pensando um pouco disse que tem um tênis com um determinado símbolo que ela desenhou no papel. Era o símbolo da Nike. Tem várias bonecas Polly e Barbie.

CRIANÇA 08 Menino, 7

Conhece vários nomes e marcas de carro, como: Picasso, Chevrolet, Opala e Golf. Sabe várias marcas das roupas que usa, como: Tigor (Tigor T. Tigre), Tommy e Ralph Lauren, que ele tem uma blusa com desenho de escorpião. Dentre as roupas, a marca preferida é Tigor. Ele acha que é a mais legal. Gosta de ir à loja desta marca. Conhece também varias marcas de tênis, como: Puma, Hot Wheels e Nike. Diz que o da Hot Wheels é o mais legal. Gosta de tudo que é da Hot Wheels. Seus personagens preferidos são o Relâmpago McQueen e o Hot Wheels. Tem também a sandália da Hot Wheels e o chinelo do Carros. Gosta quando vem brinde no produto.

CRIANÇA 09 Menino, 8

Sabe o que é marca. Diz que Santal é a marca do suco de laranja. Brinquedo ele pede pela marca, como Lego e Hot Wheels. Não conhece marca de produtos eletrônicos. Sobre itens de higiene pessoal, conhece a marca Colgate, que usa. Conhece a marca do xampu, Crescidinhos, que a mãe comprou. Seu personagem preferido é o Relâmpago McQueen, do filme Carros. Ele tem uma camiseta e um short desse personagem. Gosta quando aparece o personagem em produtos.Também gosta quando um produto vem brinde.

CRIANÇA 10 Menina, 7

Sabe o que é marca, e diz que é o nome da fábrica que faz o produto. Sobre marcas de bebida, lembrou dos refrigerantes Guaraná, Coca-Cola e Fanta, mas não toma refrigerante porque não gosta. Sobre roupa, falou a marca Riffel, mas não usa porque é roupa masculina e de adulto. Lembrou também da Hering e da Dzarm. Gosta das roupas da Hello Kitty. O personagem preferido é a Hello Kitty.

CRIANÇA 11 Menina, 7

Sabe o que é marca, mas disse que não estava muito concentrada para dizer o nome de marcas. Gosta de roupa da Barbie. Gosta das bonecas Princesas Disney. Sobre itens de higiene pessoal citou o xampu Crescidinhos, que ela viu na tevê, mas não usa. Usa a pasta de dente do Bob Esponja, que é ela quem escolhe. Experimentou a pasta de dente da Barbie e não gostou. Não vai mais usar. Seu personagem preferido é a Barbie.

CRIANÇA 12 Menina, 7

Sabe o que é marca. Conhece marcas de alimentos, como: Ades, Kapo, Trakinas, Neston, cereal Fruitloops da Kellog´s, iogurte Parmalat, Guaraná e Coca-Cola. Sabe reconhecer a marca do brinquedo, e não apenas o nome de um produto, ou seja, sabe que a boneca Polly e Barbie são da marca Mattel. O personagem preferido é a Polly, mas gosta também do Carros. Tem produtos da boneca Polly. Gosta de produtos que venham com brinde.

Quadro 3: Percepção de marca e personagens Fonte: Dados primários, 2006. Os dados apontam que a maioria das crianças entrevistadas sabe o que é uma “marca”, sendo que todas citaram marcas de produtos e/ou de fabricantes. Sete das 12 crianças entrevistadas (66%) indicaram ter ou desejar produtos de seus personagens preferidos. Entre as marcas mais citadas figuraram: Polly, Barbie e Rebeldes (para meninas); Hot Wheels, Relâmpago McQueen/ Carros (entre os meninos); e xampu Crescidinhos e Guaraná e Coca-cola (meninos/ meninas). Há indício de que personagens influenciam na decisão da escolha de produtos, bem como a presença de brindes. 5.3. Estímulos externos Neste tópico, foi questionado à criança sobre sua exposição à mídia, mais precisamente a televisão, no intuito de verificar quais programas as crianças assistem. Ainda, questionou se a criança, além dos programas/ canais de TV, assiste também propagandas e se acreditam nas mesmas.

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Criança Nº Síntese da entrevista CRIANÇA 01 Menino, 7

Assiste tevê todo dia. Não sabe o que é propaganda, ou não reconhece essa palavra. Diz que os produtos aparecem no desenho. Ao desejar alguma coisa, iria primeiro buscar informações na tevê. Mais provavelmente no canal Cartoon Network.

CRIANÇA 02 Menina, 7

Assiste muita tevê. Comentou apenas dos canais fechados. Sabe o que é propaganda e acha que nem sempre ela fala a verdade. Chama a mãe para ver propaganda. Conheceu a boneca Princesa Grace(e pediu) porque passou na tevê, ela não tinha visto na loja. Também queria o tênis da Barbie, que viu na tevê.

CRIANÇA 03 Menino, 8

Assiste bastante tevê. Assiste os comerciais. Não troca para não perder o que estava vendo.

CRIANÇA 04 Menino, 7

Assiste muita tevê, todos os dias. Assiste desenho. Gosta do canal Discovery Kids e não lembra dos outros canais. Assiste os comerciais, mas acha que eles são um pouco chatos. Entretanto, gosta dos comerciais de brinquedos. Acha que a propaganda sempre fala a verdade. Nem sempre chama a mãe para ver um comercial. Assiste o comercial algumas vezes antes de pedir pelo produto.

CRIANÇA 05 Menina, 7

Assiste tevê todos os dias. Seus canais preferidos são: Cartoon Network, Discovery Kids, Jetix e Disney (Disney Channel), sendo que este último ela só assiste na casa da prima porque ela não tem esse canal em casa. Assiste os comerciais e narrou um comercial dos bonecos Téo e Téia, que ela pediu para o Natal. Acha que a propaganda sempre fala a verdade, porque ela viu esses bonecos na casa da amiga e eles eram iguais ao que a propaganda mostrava. Lembrou de outras propagandas. Quando ela vê uma propaganda e gosta do produto, pede para a mãe ou a chama para ver o comercial.

CRIANÇA 06 Menino, 7

Assiste tevê, mas não muito. Gosta de assistir Cartoon Network e Discovery Kids. Seu programa preferido é a Turma do Barney. Assiste propaganda, mas não deixou claro se gosta.

CRIANÇA 07 Menina, 7

Assiste tevê todos os dias, mas só quando não tem nada para fazer, pois prefere brincar. Gosta dos canais Cartoon Network e Discovery Kids. Gosta do programa Lazytown, dos desenhos Billy e Mandy e Hi Hi Puffy Ami Yumi. Troca de canal durante o intervalo comercial, mas assiste a propaganda se for de um brinquedo interessante. Às vezes pede um brinquedo que viu na propaganda. Acha que a propaganda sempre diz a verdade. Quer a sandália da Hi Hi Puffy Ami Yumi, que viu na tevê. Ainda não viu a sandália de perto.

CRIANÇA 08 Menino, 7

Assiste tevê. Seus programas favoritos são Jim no Mundo da Lua e o desenho Backyardigangs. Assiste as propagandas, mas não sabe direito o que é propaganda (não reconhece a palavra). Chama a mãe para ver quando passa alguma coisa que ele quer. Assistiu a propaganda do xampu Crescidinhos.

CRIANÇA 09 Menino, 8

Assiste tevê todos os dias. Agora os pais iriam mudar isso, assistir dia sim, dia não, mas ainda não começou. Gosta de assistir o canal Nickolodeon. Algumas vezes assiste às propagandas e algumas vezes muda de canal. Não gosta de todas as propagandas. Propaganda legal é de um brinquedo novo que foi lançado, ou de um filme novo. Chama a mãe para ver uma propaganda que acha interessante. Acha que a propaganda sempre diz a verdade. Viu a propaganda do xampu na tevê.

CRIANÇA 10 Menina, 7

Assiste tevê todos os dias e gosta dos canais Cartoon Network, Discovery, Kids e o Jetix. Assiste os comerciais, mas não gosta. Depois diz que gosta de alguns. Gosta do comercial da Hello Kitty que é exibido no canal Cartoon Network. Ouve a rádio Atlântida. Diz que a propaganda nem sempre fala a verdade, por causa do brinquedo gira-trança, que não funciona como a propaganda mostrou.

CRIANÇA 11 Menina, 7

Assiste muita tevê, todos os dias. Sempre assiste os comerciais. Acha que a propaganda nem sempre fala a verdade, mas não soube explicar o motivo. Chama a mãe para ver alguma propaganda que gosta.

CRIANÇA 12 Menina, 7

Assiste tevê quando não tem nada para brincar ou quando está cansada. Gosta dos canais Discovery Kids, Nickolodeon e Cartoon Network. Assiste as propagandas. Quando não gosta de uma propaganda é porque o brinquedo em si não é legal. Acha que a propaganda sempre fala a verdade. Procura por produtos na Internet.

Quadro 4: Estímulos externos Fonte: Dados primários, 2006. Sobre os estímulos externos, fica evidente o poder da televisão. Todos os entrevistados indicaram assistir televisão, sendo que 75% (nove crianças) indicaram o fazer com muita intensidade ou todos os dias. Quase todos os entrevistados (91%) comentaram assistir as propagandas, sendo que relataram acreditar no que é exposto durante os comerciais (41%).

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Ficou evidente também que a televisão funciona como fonte de informação para decisão de escolha das crianças, principalmente em relação a brinquedos. Outro ponto de destaque são os canais de televisão citados pelas crianças: canais infantis, disponíveis apenas por assinatura. No entanto, algumas crianças (25%) indicaram que nem sempre acreditam no que é exposto na propaganda. Experiências de promessas feitas na propaganda e não cumpridas foram lembradas pelas crianças. 5.4. Influências ambientais Procurou-se durante a entrevista identificar se a criança sofria a influência de amigos ou parentes na escolha de seus produtos ou marcas de preferência. Uma síntese das respostas é apontada a seguir. Criança Nº Síntese da entrevista CRIANÇA 01 Menino, 7

Não sabe o que é ser popular e não sente influência dos amigos. Considera que a opinião dos pais é mais importante do que dos amigos.

CRIANÇA 02 Menina, 7

Acha a opinião dos amigos mais importante que a dos pais.

CRIANÇA 03 Menino, 8

Diz que não dá bola para o que os amigos têm e que não liga para o que eles dizem, mas no jogo rápido (técnica de coleta de dados) disse que a opinião dos amigos é mais importante que a dos pais e que a dele próprio.

CRIANÇA 04 Menino, 7

Quando um amigo tem uma coisa legal, que ele não tem, eles brincam juntos. Acha a opinião dos amigos importante, mas não mais que a dos pais.

CRIANÇA 05 Menina, 7

Acha importante a opinião dos pais, mais do que dos amigos. Porém considera a opinião dos amigos importante e quando um amigo tem algo diferente que ela gostou, ela pede para a mãe.

CRIANÇA 06 Menino, 7

Diz que não liga quando um amigo aparece com algo novo. Acha mais importante a opinião dos pais, do que dos amigos. Conhece novos produtos por meio das lojas e com os amigos. Já deu dinheiro para um amigo comprar um álbum de figurinha e trazer para ele, porque não sabia onde comprar.

CRIANÇA 07 Menina, 7

Quando alguma amiga tem algo legal, comenta com mãe. A opinião das amigas é importante, mas não mais importante que a da mãe.

CRIANÇA 08 Menino, 7

Acha a opinião dos amigos importante, mas não mais que a dos pais.

CRIANÇA 09 Menino, 8

Acha que a opinião dos pais e dos amigos são igualmente importantes. Repara nos amigos e algumas vezes pede algo que eles têm. Quando quer alguma coisa fala com o pai e com a mãe. Pede presentes para o pai ou mãe de aniversário, Natal e Dia das Crianças.

CRIANÇA 10 Menina, 7

Quando quer alguma coisa, primeiro conversa com o pai. Considera-se parecida com a amiga e, quando esta tem algo diferente, ela pede também. Veste-se igual à amiga. Conversa com a amiga sobre os brinquedos que quer comprar, ou sobre alguma outra novidade. A última conversa que teve com a amiga foi sobre o brinquedo Gira-trança. Ela viu na tevê, só que o brinquedo não funciona. Considera a opinião dos pais mais importante que a dos amigos. Acha que ser popular é ir para a escola com o cabelo diferente, ou com um acessório diferente. Depois se contradiz e diz que os amigos não reparam nessas coisas.

CRIANÇA 11 Menina, 7

Acha importante a opinião dos pais, mais do que dos amigos. Quando pede por algum brinquedo a mãe fala para ela colocar na data, ou seja, pedir de aniversário, Natal ou Dia das Crianças.

CRIANÇA 12 Menina, 7

Acha importante a opinião dos pais, mais do que dos amigos. Às vezes, quando gosta de algo, pede para uma data, mas depois não quer mais e escolhe outra coisa. Quando quer algo, pede primeiro para a mãe. Quando vê que a amiga tem um produto legal, conversa com a mãe, que geralmente se esforça para conhecer o produto.

Quadro 5: Influências ambientais Fonte: Dados primários, 2006.

De acordo com os dados coletados, a maioria das crianças entrevistadas (66%) considera a opinião dos pais como sendo a mais importante. Alguns (16%), por sua vez, indicaram a opinião dos amigos mais importantes. Outro fator de destaque é o comportamento

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das crianças com relação à comunicação sobre a escolha ou desejo de aquisição de um produto, normalmente feito aos pais. Ainda, nota-se que as datas festivas (como aniversário, Natal e Dia das Crianças) indicam uma possibilidade de aquisição de produto (geralmente brinquedo), sendo estas, desta maneira, o reconhecimento de uma necessidade de compra. Outro fator que estimula a necessidade de compra da criança é a visualização do objeto de desejo por outra criança (geralmente um amigo/a). 5.5. Recursos financeiros Neste item, procurou-se identificar como as crianças recebiam dinheiro e como elas gastavam. Além, noções do que significa um produto “caro” ou “barato” foram igualmente captadas na entrevista, conforme apresentado no quadro a seguir. Criança Nº Síntese da entrevista CRIANÇA 01 Menino, 7

Ganha dinheiro do pai e da mãe, e o gasta com brinquedo. Considera barato de cinco reais para baixo e caro de dez reais para cima. Pede, mas sabe que os pais analisam o preço.

CRIANÇA 02 Menina, 7

Entende o conceito de promoção. Ganha dinheiro dos pais e dá avó. Coloca o dinheiro no cofrinho para gastar na praia, em itens de R$1,99 e picolé. Mas também gasta antes, principalmente nas lojas de preço único de R$ 1,99. Considera barato um brinquinho ou um colar, e coisas que custem entre um ou dois reais. Considera caro uma televisão, som, fogão e guarda-roupa. Diz que olha o preço ao pedir um brinquedo.

CRIANÇA 03 Menino, 8

Considera barato os produtos de um real, e caro, de quarenta reais para cima. Ganha mesada, mas faz tempo que a mãe não deu mais. Ganha cinco ou 10 reais por mês. Também ganha dinheiro da avó, mas quando é uma data especial e ela não sabe o que comprar. Ela já chegou a dar cem reais, que ele gastou com brinquedo. Tem cofrinho e economiza para comprar algo mais caro. Diz que não sabe direito o que é promoção, só sabe que baixa o preço e, que assim, gasta menos dinheiro.

CRIANÇA 04 Menino, 7

Diz que não entende muito o que é promoção, mas acha que está barato. Considera caro um produto como uma televisão ou um sofá e barato, um carrinho da Hot Wheels. Algumas vezes ganha dinheiro da mãe, em troca de ajudar em algumas tarefas. Não olha o preço dos produtos.

CRIANÇA 05 Menina, 7

Ganha moedas dos pais. Acha que barato é algo de um ou dois reais e, caro seria um computador ou notebook. Diz que a câmera do computador custa cento e nove mil reais. Queria uma boneca no valor de R$ 299,00 de Natal, mas trocou por uma de R$ 109,00, por orientação da mãe. A de R$ 109,00 ela não considera cara. Diz que sabe o que é promoção, porém não consegue explicar o que é.

CRIANÇA 06 Menino, 7

Ganha dinheiro da avó e de presente de familiares em datas especiais. Quando está na Alemanha e ganha dinheiro lá, coloca no banco. No Brasil o valor é dividido: metade ele gasta e outra metade dá para a mãe colocar no banco. Gasta com bala. Olha o preço só algumas vezes.

CRIANÇA 07 Menina, 7

Ganha dinheiro esporadicamente. Se for em moeda, coloca no cofrinho e se for nota, compra alguma coisa no R$ 1,99. Não sabe o que é promoção. Não ganha mesada, mas acha que seria legal ganhar dinheiro toda a semana.

CRIANÇA 08 Menino, 7

Ganha dinheiro do avô e moedas da mãe. Está guardando para comprar um capacete para andar de skate.

CRIANÇA 09 Menino, 8

Ganha R$ 3,00 do pai, por semana. Está juntando para comprar um lego e tem R$ 8,00. Algumas vezes compra carrinho de Hot Wheels que custa R$ 5,00. Já comprou com a mesada um Lego que custou R$ 32,00. Juntou a mesada com a do irmão. Olha o preço quando vai comprar. Quando é mais caro, pede para alguma data, como aniversário ou Natal. Algumas vezes ganha um presente fora de hora. Ele considera um produto caro um tênis da Nike ou da Adidas, e um produto barato um tênis parecido com o que estava usando. Diz que promoção é uma nova invenção. Gosta quando um produto vem brinde.

CRIANÇA 10 Menina, 7

Ganha mesada, cinco reais por mês. Gasta a mesada com bala, salgadinho e também guarda um pouco para comprar coisas, mas ainda não sabe o que. Olha o preço dos produtos quando está comprando com o dinheiro da mesada. Considera a boneca Polly um produto caro e um pirulito, um produto barato. Vai ao McDonald´s, que acha mais ou menos caro. Mas não vai

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com muita freqüência. Pede o McLanche Feliz. CRIANÇA 11 Menina, 7

Ganha mesada da mãe. Coloca em um cofrinho em casa e numa conta no banco. Gasta com algumas coisas também. No momento da entrevista, perguntou para a mãe se podia tirar o dinheiro da conta para comprar um brinquedo, mas não sabia qual brinquedo. Queria apenas comprar alguma coisa. Considera que os produtos caros são os produtos mais legais. O McLanche Feliz não é tão barato, é um pouco caro. Quando vai à loja Meninos e Meninas (loja de brinquedos, situada no shopping) não olha o preço dos produtos.

CRIANÇA 12 Menina, 7

Não ganha mesada, mas ganha dinheiro de vez em quando do pai, mãe, avó ou bisavó. Quando ganha dinheiro compra alguma coisa ou, se não acha nada legal, guarda para comprar mais tarde. Já fez uma compra sozinha, com a mãe olhando de longe. Geralmente pede ajuda para a vendedora para ver se o dinheiro dá e não confere o troco. Considera um produto caro uma calça, blusa ou brinquedo e um produto barato um item de R$ 1,99. Diz que promoção é quando está mais barato.

Quadro 5: Recursos financeiros Fonte: Dados primários, 2006.

Com relação aos recursos financeiros, destaca-se que todos recebem dinheiro, seja na forma de mesada ou esporádica. Os valores variam de cinco a dez reais mensais, sendo que as crianças geralmente gastam seu dinheiro com guloseimas e itens de R$1,99. São compras que as crianças acreditam de pouco valor. Produtos caros, na opinião das crianças são brinquedos, eletrodomésticos, roupas, entre outros. Ainda, muitas crianças (41%) afirmaram analisar os preços na escolha de um brinquedo. 6. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS E CONCLUSÃO O mundo das crianças é um universo muito diferente da realidade do adulto, assim como o processo de tomada de decisão de compra. A criança tem suas próprias necessidades e motivações, são influenciadas por determinados fatores externos, além de apresentar restrições de recursos que diferem do mundo adulto. Este trabalho buscou realizar uma pesquisa teórico-empírica com fins de contribuir para o entendimento da tomada de decisão do consumidor infantil. Partiu-se inicialmente do modelo proposto por Blackweel, Miniard e Engel (2005), com o intuito de verificar quais influências ambientais, estímulos e diferenças individuais se enquadram à realidade infantil.

De acordo com o modelo de Blackweel, Miniard e Engel (2005), o primeiro passo no modelo de tomada de decisão de compra é o reconhecimento da necessidade. No universo infantil, esta etapa é desencadeada por diversos motivos, como a visualização do produto em ambientes como shoppings e supermercados, conforme observada na entrevista da criança 05: “Vai ao supermercado com os pais. Gosta de ver os brinquedos, e pede por eles.” Observar amigos com produtos que despertam o interesse também influenciam a decisão de compra da criança, observado com clareza na entrevista da criança 12: “Quando vê que a amiga tem um produto legal, conversa com a mãe, que geralmente se esforça para conhecer o produto”. A busca por informações, segundo passo na tomada de decisões segundo o modelo de Blackweel, Miniard e Engel (2005), foi identificado na pesquisa através de informações coletadas em propagandas, canais infantis, conforme relatado pela criança 01: “Ao desejar alguma coisa, iria primeiro buscar informações na tevê. Mais provavelmente no canal Cartoon Network.” Corrobora assim, com os trabalhos de Gunter e Furnham (1998) e Caron e Ward (1975), os quais evidenciam a influência dos meios de comunicação e propaganda nesta etapa de decisão de compra. Evidencia-se, neste estágio, o poder da televisão. Todos os entrevistados indicaram assistir tevê, sendo que 75% das crianças relataram o fazer com muita intensidade ou todos os dias. Destaca-se também que 91% dos entrevistados comentaram assistir as propagandas, sendo que 41% relataram sempre acreditar no que é exposto durante os comerciais.

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Na etapa seguinte, de avaliação das alternativas, a pesquisa mostrou que as crianças sofrem influências de produtos com brindes, motivo de preferência apontado por oito das doze crianças entrevistadas, confirmando os estudos de Lawrence (2004). Ainda, produtos que contêm a imagem de personagens preferidos também influenciam a decisão, conforme indicado por 66% das crianças entrevistadas, as quais comentaram ter ou desejar produtos de seus personagens preferidos. Dammler e Motz (2002) afirmam que o uso de personagens licenciados tende a chamar a atenção das crianças, pela fácil identificação e lembrança. No momento da compra, quarta etapa no processo decisório, o comportamento das crianças entrevistadas modificou conforme o valor dos produtos. Produtos de baixo valor financeiro, como guloseimas e itens de R$ 1,99 são comprados com dinheiro recebido de pais e avós na forma de mesada ou de maneira esporádica. Já produtos como brinquedos ou roupas são pedidos diretamente aos pais. De acordo com os dados, os recursos financeiros fazem parte da análise no momento da compra, tendo visto que algumas crianças indicaram ter o hábito de olhar o preço do produto ao pedi-lo aos pais. Conforme abordado no estágio de desenvolvimento infantil, tal comportamento é compatível com o que John (1999) comenta sobre a fase analítica, que compreende dos sete aos 11 anos. Não foram coletados dados específicos sobre o consumo, porém se infere que o consumo, no caso de brinquedos, ocorre nos momentos de lazer da criança. Ainda, muitos brinquedos podem promover a utilização em conjunto com outras crianças, como também individualmente. Já no caso da avaliação pós-consumo, um dos relatos indicou a capacidade crítica da criança, conforme se observa na entrevista da criança 11 “Usa a pasta de dente do Bob Esponja, que é ela quem escolhe. Experimentou a pasta de dente da Barbie e não gostou. Não vai mais usar”. Para Duff (2004), a confiança de uma criança num determinado produto pode ser abalada por uma má experiência ou decepção, como no caso, resultando até na recusa do produto. Dados sobre o descarte não foram avaliados. Pesquisas sobre o consumidor infantil são de fundamental importância, dado ao fato do consumidor infantil ser tanto consumidor primário, influenciador e futuro consumidor (McNEAL, 1992). Neste estudo, foram observados fatores que influenciam o comportamento de crianças e como esta combinação de fatores interfere no processo de decisão de compra infantil. No entanto, cabe ressaltar a importância do posicionamento ético ao tratar do desenvolvimento de estratégias de marketing visando este mercado. Schiffman e Kanuk (2000) consideram antiético o uso de estratégias de marketing que buscam manipular o comportamento infantil, pelo fato do mesmo desprover de capacidade crítica e analítica, tal como o adulto. Esta preocupação é corrente, uma vez que na presente pesquisa detectou-se que 41% dos entrevistados acreditam que o conteúdo das propagandas é sempre verdadeiro. No entanto, produtos de boa qualidade, voltados ao segmento infantil, podem ser oferecidos com maior valor agregado se o comportamento das crianças como consumidoras for conhecido. Inclusive, o estímulo de produtos saudáveis, como frutas e verduras, por exemplo, pode ser auxiliado com o vínculo de personagens ou oferta de brinde. Ainda, reforça-se a importância de ofertar produtos de qualidade, de acordo com a preferência do consumidor infantil, uma vez que experiências ruins podem acarretar em rejeição da marca ao longo da vida do consumidor. Por fim, cabe ressaltar algumas das contribuições do presente artigo. Entre elas, aponta-se o referencial teórico apresentado, elaborado a partir de atual literatura da área, em sua maioria de origem estrangeira. Também, atenta-se sobre as inferências realizadas a partir da pesquisa empírica, que apesar de não passível à generalização, permitem trazer à luz questionamentos sobre o comportamento de consumo infantil e estratégias aplicáveis ao mesmo, beneficiando tanto a comunidade acadêmica, como a gerencial. Finalmente, o artigo apresenta com originalidade assunto pouco discutido no meio acadêmico brasileiro, abrindo espaço para novas pesquisas e discussões.

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