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O modelo sindical brasileiro é corporativista, pós-corporativista
ou semicorporativista ?
Renato Rua de Almeida, advogado trabalhista, professor de
direito do trabalho da Faculdade de Direito da PUC-SP e doutor em direito pela
Faculdade de Direito da Universidade de Paris I (Panthéon-Sorbonne), membro da
ANDT e do IBDSCJ.
Respondi a esta pergunta formulada pelo coordenador do 52º
Congresso Brasileiro de Direito do Trabalho, promovido pela Ltr. Editora e realizado
em São Paulo de 25 a 27 de junho de 2012, professor Amauri Mascaro Nascimento, a
quem rendi minhas homenagens, durante minha participação no 7º Painel sobre O
Modelo Sindical Brasileiro, com as lições tiradas de sua vasta obra sobre direito
coletivo do trabalho, em especial do Compêndio de Direito Sindical, editado pela LTr.
Editora, São Paulo, mencionado ao longo da presente exposição, certamente a obra
mais completa entre nós a respeito da matéria.
Acrescentei minhas próprias reflexões extraídas de longa
experiência como advogado trabalhista e de sindicatos de trabalhadores, e também
como professor da disciplina de direito coletivo de trabalho oferecida no curso de pós-
graduação stricto sensu da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo.
Basicamente a noção do corporativismo sindical advém do fato
de serem os sindicatos entes de direito público e, por essa razão, controlados pelo
Estado para atingir seus objetivos políticos (cf. Arion Sayão Romita, Sindicalização por
categoria, Revista LTr., São Paulo, março de 1995, vol. 59, nº 3, págs. 295-309).
É oportuno lembrar que essa noção aplica-se não apenas aos
chamados sindicatos profissionais, mas também aos sindicatos patronais, uma vez que,
sendo a principal aspiração do Estado corporativo a harmonia entre as classes sociais,
era imprescindível a criação de um modelo sindical simétrico representando
trabalhadores e empregadores e que fosse por ele, Estado, controlado.
No entanto, a análise presente terá por foco o sindicalismo
profissional, pela sua importância histórica, política e social no Brasil.
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Essa noção foi adotada pela Carta del Lavoro do Estado fascista
italiano.
Ela foi igualmente seguida no Brasil pelo Estado Novo que
resultou da Constituição de 1937, e, especialmente, pelo Decreto-lei n. 1.402, de
5/7/1939, que regulou a sindicalização brasileira inspirada na organização corporativa
italiana.
Por definição constitucional, a partir da Constituição de 1937, o
sindicato brasileiro exerceu funções delegadas do Poder Público, e, no dizer de Oliveira
Viana, em sua obra Problemas de Direito Sindical, editada pela Max Limonad, Rio de
Janeiro, “toda vida das associações profissionais passará a gravitar em torno do
Ministério do Trabalho: nele nascerão; com ele crescerão; ao lado dele se
desenvolverão; nele se extinguirão”.
De fato, a criação de sindicato dependia do rígido quadro de
enquadramento sindical elaborado pela famigerada Comissão de Enquadramento
Sindical, da adoção de um estatuto padrão e da expedição pelo então denominado
Ministério do Trabalho da carta sindical. Uma vez gestado o sindicato no seio do
Ministério do Trabalho, este exercia ampla interferência na sua vida, especialmente no
controle das eleições sindicais. Finalmente, o Ministério do Trabalho podia intervir
administrativamente nos sindicatos, afastando diretorias e nomeando juntas
governativas, e, inclusive, cassando a carta sindical, sobretudo quando
ideologicamente a direção sindical fugisse das diretrizes políticas governamentais.
Portanto, o modelo sindical brasileiro era perfeitamente
corporativista, isto é, controlado e instrumentalizado pelo Estado, contrariando
frontalmente o modelo sindical democrático, consagrado pela Convenção n. 87 de
1948 da OIT, sobre a liberdade sindical.
O conceito de liberdade sindical, do qual deriva o modelo sindical
democrático, foi examinado pelo grande filósofo humanista e cristão do século XX,
Jacques Maritain, inspirador da Declaração Universal dos Direitos do Homem da ONU
de 1948, em sua obra Os Direitos do Homem e a Lei Natural, editado pela Livraria Agir
Editora, Rio de Janeiro, quando afirma que “a liberdade sindical deve ser entendida
como a liberdade dos trabalhadores de se agruparem nos sindicatos de sua escolha,
bem como a autonomia dos próprios sindicatos, que devem ser livres de se
organizarem como eles preferirem sem que o Estado os possa unificar à força ou os
controlar”.
É interessante observar que tanto a Declaração Universal dos
Direitos do Homem da ONU, como a Convenção n. 87 da OIT, sobre a liberdade
sindical, são diplomas de 1948.
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Portanto, nada melhor do que se valer do conceito do filósofo
Jacques Maritain sobre a liberdade sindical, uma vez que, em razão de sua vasta obra
sobre filosofia política, ele inspirou, como visto, a Declaração Universal dos Direitos do
Homem da ONU, e, certamente a própria Convenção n. 87 da OIT, já que este
organismo internacional pertence à ONU.
Com o advento da Constituição de 1988, inspirada por sua vez,
ainda que parcialmente, na Convenção nº 87 de 1948 da OIT, sobre a liberdade
sindical, o professor Amauri Mascaro Nascimento entende que, em razão do disposto
no artigo 8º, inciso I, do texto constitucional, “o sindicato brasileiro não deve mais ser
visto como corporativista”, por ter conquistado autonomia em relação ao Estado, uma
vez que a lei não poderá exigir autorização prévia do Estado para a fundação do
sindicato, salvo o registro no atualmente denominado Ministério do Trabalho e
Emprego, cujo ato administrativo é vinculado e não discricionário - conforme decisão
do STF -, sendo vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção
administrativas na vida sindical.
É de se registrar que esta conquista foi fruto da luta dos
trabalhadores de uma conhecida fábrica de cimento em Perus, na periferia de São
Paulo, e dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema, que, depois de
terem sofrido seus respectivos sindicatos intervenções administrativas, com o
afastamento dos diretores – o então sindicalista Lula era o presidente do Sindicato dos
Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema-, reconquistaram as direções
sindicais, em decorrência, entre outros fatores, de denúncias por violação da liberdade
sindical apresentadas contra o governo brasileiro perante o Comitê de Liberdade
Sindical da Organização Internacional do Trabalho em Genebra. Tais denúncias foram
formuladas com base em parecer jurídico por mim elaborado e depois publicado como
artigo intitulado “Da intervenção administrativa em sindicato - A estrutura da CLT em
face das normas internacionais”, Revista LTr., São Paulo, de setembro de 1974, nº 38,
págs. 794-798.
As referidas denúncias foram apresentadas perante a
Organização Internacional do Trabalho, mesmo não tendo ainda o Brasil ratificado a
Convenção n. 87 de 1948 da OIT sobre a liberdade sindical e proteção do direito de
sindicalização, em razão de estar esse procedimento previsto pelo Comitê de
Liberdade Sindical, uma vez que o princípio da liberdade sindical consta da
Constituição da OIT e a representação tripartite é essencial à própria existência desse
organismo internacional da ONU.
Mas, mesmo por essa razão, o professor Amauri Mascaro
Nascimento entende que “não se pode ainda falar em avanço do modelo de
organização sindical brasileiro de corporativista para pós-corporativista”, como se já
tivéssemos alcançado a plena liberdade sindical preconizada pela Declaração Universal
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dos Direitos do Homem, de 1948, em seu artigo 23, 4º, e pela Convenção n. 87 da
OIT, também de 1948, sobre a liberdade e proteção do direito de sindicalização.
Com efeito, a Convenção n. 87 da OIT, em seu artigo 2º,
prescreve que trabalhadores e empregadores, sem distinção de qualquer espécie,
terão o direito de constituir, sem prévia autorização, organizações de sua própria
escolha e, sob a única condição de observar seus estatutos, a elas se filiarem.
Aliás, a Convenção n. 87 de 1948 da OIT, ainda não ratificada
pelo Brasil, certamente por contrariar interesses poderosos, é considerada como o
primeiro tratado internacional que consagrou formalmente uma das liberdades
fundamentais do homem (cf. Nicolas Valticos, Droit international du travail, Dalloz,
Paris).
Para ressaltar a importância da liberdade sindical na atualidade,
a OIT, em sua Declaração sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho e
seu Seguimento, adotada em 1998, a elege como tal ao lado do efetivo direito de
negociação coletiva – aliás este direito é a principal consequência da liberdade sindical
-, da eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório, da efetiva
abolição do trabalho infantil e da eliminação da discriminação em matéria de emprego
e ocupação.
Por essa razão, o professor Amauri Mascaro Nascimento afirma
que “o atual sistema sindical brasileiro é semicorporativista ou neocorporativista, na
medida em que mescla elementos que identificam um sindicalismo de liberdade
sindical com resíduos de corporativismo”.
Esses resíduos existem em função da unicidade sindical, prevista
pelo artigo 8º, inciso II, da CF/88, e são representados pelo quadro de enquadramento
sindical previsto pelo artigo 577 da CLT - reconhecido como válido pelo STF -, e pelo
sistema de categoria a priori, embora abalado com novos sindicatos não previstos no
quadro oficial, porque este se mostra desatualizado face à realidade profissional e
sindical no Brasil.
Em resumo, diz ainda o professor Amauri Mascaro Nascimento
que atualmente possuímos “um sindicalismo semicorporativista ou neocorporativista
tendo como característica mais importante a existência de sindicatos como pessoas
jurídicas de direito privado atuando em um modelo de unicidade sindical”.
Aliás, o modelo de unicidade sindical convive com um pluralismo
perverso, em decorrência da pulverização dos sindicatos provocada pela figura do
desmembramento das categorias sobretudo profissionais, com vistas à arrecadação da
contribuição sindical obrigatória.
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A questão da unicidade sindical prevista pelo artigo 8º, inciso II,
da Constituição de 1988, significa a vedação da criação de mais de uma organização
sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica na
mesma base territorial, sustentada compulsoriamente pela contribuição sindical
prevista pelo artigo 8º, inciso IV, do mesmo texto constitucional, é certamente o
grande empecilho para que o nosso sistema ou modelo de organização sindical avance
para um pós-corporativismo, isto é, de plena liberdade sindical, à luz da Convenção n.
87 de 1948 da OIT, em especial pelo seu artigo 2º, que, como já visto, prevê o direito
de se constituir sindicato de livre escolha.
Ademais, a unicidade sindical contraria ainda uma vez o filósofo
Jacques Maritain, em sua obra O homem e o Estado, editado pela Livraria Agir Editora,
Rio de Janeiro, quando afirma que “o elemento pluralístico é inerente a toda sociedade
verdadeiramente política”, ou como declaram Jean-Maurice Verdier, em sua obra
Syndicats, da editora Dalloz, Paris, e Alain Supiot, em sua obra Le droit du travail, da
editora PUF, Paris, que “a pluralidade é o corolário da liberdade sindical”.
A propósito, a unicidade sindical prevista no artigo 8º, inciso II,
da Constituição Federal de 1988, conflita com um dos princípios fundamentais da
República Federativa do Brasil, constituída em Estado Democrático de Direito
brasileiro, que é o pluralismo político, consubstanciado no artigo 1º, inciso V, do texto
constitucional, vale dizer o pluralismo de todo organismo social como corolário da
democracia, como de resto é garantido às demais associações civis, pela dicção do
artigo 5º, inciso XVII, do mesmo texto constitucional.
Como consequência, a unicidade sindical faz com que o sindicato
brasileiro seja muito pouco representativo e distante do local de trabalho (cf. Cristiana
L. W. Sarcedo, Representatividade sindical e negociação coletiva, LTr. Editora, São
Paulo).
Ademais, esse nosso modelo de unicidade sindical, sustentado
pelo sistema da categoria a priori e pela contribuição sindical compulsória, resulta-nos
um sindicalismo monopolista autoritário, com a perpetuação no poder do grupo
dominante (não há limite legal no exercício do poder sindical como existe na
representação dos empregados na CIPA), pelo que a alternância do poder -
característica da representação democrática - não ocorre na prática, e, quando há
sucessão, esta caracteriza-se por uma quase hereditariedade (cf. Renato Rua de
Almeida, Visão histórica da liberdade sindical, Revista LTr., São Paulo, março de 2006,
nº 70, págs 363-366).
Por fim, o modelo de unicidade sindical imposto pela
heteronomia da norma constitucional, sem as alternativas pluralísticas que ensejariam
uma saudável concorrência pela representação sindical e, em decorrência, uma
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verdadeira representatividade, é repelido pela jurisprudência da OIT como
antidemocrático e contrário à liberdade sindical, que só admite o monopólio de
representação sindical de fato, isto é, a unidade sindical resultante da opção livre,
democrática e coletiva dos trabalhadores (cf. Ericson Crivelli, A reforma sindical no
Brasil e a jurisprudência da OIT em matéria de liberdade sindical, Revista LTr., São
Paulo, janeiro de 2004, nº 68, págs. 7-21).
Por essas razões, o nosso modelo é neocorporativista ou
semicorporativista, ou ainda, se permitirem, corporativista fora do Estado.
Esse modelo sindical enseja, como lembra o constitucionalista
português, José Carlos Vieira de Andrade, em sua obra Os direitos fundamentais na
Constituição portuguesa de 1976, editada pela Edições Almedina, Coimbra, que “nas
relações privadas de poder, quando uma entidade disponha de poder especial de
caráter privado sobre outros indivíduos, pode ocorrer a violação dos direitos
fundamentais desses indivíduos”, e exemplifica com os poderes dos sindicatos sobre os
trabalhadores representados, quando excluem ou omitem determinados
trabalhadores de sua proteção. Essa exclusão ou omissão de determinados
trabalhadores da proteção sindical enseja a violação da liberdade sindical, como
direito fundamental, desses trabalhadores excluídos ou omitidos pelos sindicatos que
os representam.
Dois exemplos de violação dos direitos dos trabalhadores pelos
próprios sindicatos que os representam ocorreram recentemente em razão da ação
negativa, de um lado, de alguns sindicatos dos bancários da CUT e, do outro lado, da
ação também negativa dos sindicatos dos metalúrgicos da Força Sindical do Estado de
São Paulo.
Com efeito, nos anos de 1990, alguns sindicatos dos bancários
filiados à CUT e espalhados pelo Brasil, sob a liderança do Sindicato dos Bancários de
São Paulo, passaram a celebrar anualmente acordos coletivos de trabalho com o
Banespa, que era à época uma sociedade de economia mista, estipulando o
pagamento da PLR (Participação no Lucros ou Resultados) aos empregados em
substituição ao recebimento de duas gratificações anuais previstas no Regulamento do
Pessoal. Essas duas gratificações anuais eram pagas cada uma delas semestralmente e
no valor cada qual de um salário mensal.
Ora, os empregados aposentados, por força da norma
regulamentar interna, também recebiam as duas gratificações anuais.
Ocorre que os sindicatos não tiveram o cuidado de
expressamente fazer constar nos acordos coletivos de trabalho que os aposentados
continuariam a receber as duas gratificações anuais, ou, pelo menos, teriam o direito
ao recebimento da PLR em sua substituição.
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Aproveitando, ao que tudo indica, da omissão em relação aos
aposentados, o Banco Santander, que sucedeu o Banespa, deixou de pagar aos
aposentados tanto as duas gratificações anuais, porque foram substituídas pela PLR,
como também a própria PLR, que, por definição, é, em princípio, devida somente ao
pessoal da ativa.
De fato, inicialmente por meio de negociação coletiva e,
posteriormente, por força da Lei n. 10.101, de 19 de dezembro de 2000, a PLR é
devida, em princípio, ao pessoal da ativa.
Essa alteração negociada é explicada porque o Banespa se
encontrava em processo de privatização, o que o tornaria mais atraente para ser
comprado por um custo menor de encargo trabalhista.
De fato, a substituição das gratificações anuais pela PLR
implicava redução dos custos da folha de pagamento, pois, na conformidade do artigo
3º, da Lei n. 10.101/2000, a PLR não constitui base de incidência de qualquer encargo
trabalhista.
Esses acordos coletivos de trabalho anuais foram aprovados em
assembleia geral dos empregados do Banespa, porque os aposentados presentes
representavam uma oposição minoritária em relação aos empregados da ativa. A
aprovação pela maioria representada pelos empregados da ativa deveu-se à
expectativa de manterem seus empregos com a privatização que de fato veio a ocorrer
por conta do descalabro administrativo do Banespa.
A propósito, é preciso lembrar que o Banespa, antes da
privatização, sofrera intervenção do Banco Central, sendo federalizado, em razão de
sua situação de insolvência e das dívidas contraídas pelo Estado de São Paulo junto à
União.
Ademais, no início dos anos de 2000, esses mesmos acordos
coletivos de trabalho firmados com o Banco Santander, após a privatização do Banespa
ocorrida em 2001, passaram a estipular que os reajustes salariais anuais previstos
pelas convenções coletivas de trabalho celebradas com os sindicatos patronais da
categoria econômica dos banqueiros fossem substituídos por determinadas vantagens
que, na verdade, só interessavam ao pessoal da ativa, deixando, mais uma vez, os
aposentados desprotegidos e agora sem o reajuste salarial da complementação da
aposentadoria.
Com efeito, em troca dos reajustes salariais anuais da categoria
profissional dos bancários, o pessoal da ativa do Banco Santander, sucessor do
Banespa, passou a ter estabilidade no emprego e a receber corrigido o pagamento de
verbas de natureza indenizatória, tais como licença-prêmio e quinquênio, e também o
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pagamento corrigido de vantagens como auxílio-creche e auxílio-alimentação, sem
integração na base salarial e nos direitos trabalhistas.
Ora, essas alterações negociadas em relação à substituição dos
reajustes salariais pela estabilidade no emprego em particular, além da correção de
verbas de natureza indenizatória e de outras vantagens, interessavam aos chamados
empregados da ativa, porque eles se encontravam, com a privatização recente,
temerosos de um plano de demissão voluntária, como, aliás, ocorrera anteriormente à
época do Banespa.
No entanto, essas novas condições negociadas coletivamente,
em substituição aos reajustes salariais, como visto, mais uma vez não beneficiaram os
aposentados, já que compreendiam vantagens tipicamente devidas ao pessoal da
ativa.
Portanto, os aposentados ficaram durante seis anos sem
reajustes em sua complementação de aposentadoria, já que foram cinco anos de
negociação coletiva em que se estabeleceu a substituição dos reajustes salariais da
categoria dos bancários pelas vantagens devidas ao pessoal da ativa.
É verdade que, antes da privatização do Banespa ocorrida em
2001, este oferecera aos aposentados a opção para reajustar a complementação da
aposentadoria pelo índice do IGPDI previsto pelo Banesprev, - fundo de pensão dos
empregados -, mas 95% de um total de quase 10 mil aposentados optaram por
permanecer com o reajuste salarial da categoria profissional dos bancários, como
previsto pela norma regulamentar interna, mesmo porque a opção pelo reajuste da
complementação da aposentadoria pelo índice do IGPDI do Banesprev implicava a
renúncia a algumas vantagens, entre elas o recebimento das duas gratificações anuais.
Ademais, os 95% dos aposentados não esperavam que, com a
privatização em 2001 do Banespa pelo Banco Santander, os acordos coletivos de
trabalho a partir de então firmados os excluíssem de qualquer reajuste salarial em sua
complementação de aposentadoria, impondo-lhes um cruel congelamento salarial.
De fato, na conformidade da norma regulamentar, o reajuste da
complementação de aposentadoria paga inicialmente pelo Banespa e depois da
privatização pelo Banco Santander, seu sucessor trabalhista, dependia, pela norma
regulamentar interna, do reajuste salarial efetivamente recebido pelo pessoal da ativa.
Portanto, como o pessoal da ativa teve os reajustes salariais
anuais substituídos por vantagens que lhes eram próprias, os aposentados nada
receberam de reajuste salarial e sofreram, como visto, um congelamento da
complementação de aposentadoria implicando a perda de 65% do poder aquisitivo, se
comparado com os índices de reajuste salarial da categoria bancária.
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Ora, mais uma vez em relação aos aposentados, houve uma
omissão da parte dos sindicatos dos bancários filiados à CUT na negociação coletiva
com o Banco Santander, sucessor do Banespa, quando deveriam reivindicar lhes fosse
garantido o mesmo índice do IGPDI do Banesprev aplicado para o reajuste da
complementação da aposentaria daqueles 5% que por ele optaram, sem implicar
qualquer renúncia dos direitos previstos pela norma regulamentar.
Como ocorrera na aprovação da substituição das gratificações
anuais pela PLR, aqui também a maioria nas assembleias sindicais era formada pelos
empregados da ativa do Banco Santander, sucessor do Banespa, que aprovaram os
acordos coletivos de trabalho prevendo a substituição dos reajustes salariais da
categoria profissional pelas vantagens por eles auferidas, apesar da oposição dos
aposentados, que, como visto, nada receberam em troca e sofreram injusto
congelamento da complementação da aposentadoria.
A complementação de aposentadoria dos aposentados - sem que
até hoje tenha sido restabelecida a defasagem anterior – passou a ser reajustada
recentemente por exigência da Lei Complementar n. 109/2001 (sobre o regime da
previdência privada), que obrigou o Banco Santander a aplicar a todos os aposentados
os índices de reajuste previstos pelo fundo de previdência chamado Banesprev, tendo,
para tanto, os aposentados optado entre os índices do INPC e do reajuste salarial este
decorrente da negociação coletiva entre os sindicatos dos bancários e a Febraban,
órgão sindical patronal representante dos banqueiros.
Diante dessa situação, os aposentados viram-se na necessidade
de se valerem de sua associação civil para a defesa de seus direitos individuais
homogêneos perante a Justiça do Trabalho.
As associações civis têm legitimidade reconhecida
constitucionalmente (artigo 5º, XXI, da CF/88), podendo, quando expressamente
autorizadas, representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente.
Por sua vez, a Lei da Ação Civil Pública n. 7.347/85 e a Lei do
Código de Defesa do Consumidor n. 8.078/90 prescrevem a legitimidade das
associações civis, legalmente constituídas e autorizadas, para o ajuizamento de ações
civis públicas em defesa dos direitos e interesses individuais homogêneos de seus
filiados.
A associação civil dos chamados aposentados do Banespa
(AFABESP) ingressou com várias ações civis públicas, por mim patrocinadas, perante a
Justiça do Trabalho, buscando a reparação para os aposentados em razão da perda do
recebimento das gratificações semestrais e em razão do congelamento da
complementação de aposentadoria.
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Algumas dessas ações ainda tramitam perante a Justiça do
Trabalho, sendo que a específica sobre pagamento das gratificações anuais foi julgada
procedente quanto ao mérito em todas as instâncias da Justiça do Trabalho, estando
sub judice perante o STF.
A Afabesp obteve o reconhecimento de sua legitimidade
concorrente aos sindicatos dos bancários para defesa dos direitos individuais
homogêneos de seus representados e substituídos, em decisão memorável da 2ª
Turma do TST, nos autos do processo TST-RR-424/1998-036-02-00, em que se pleiteou
o restabelecimento do pagamento das gratificações semestrais, tendo como relator e
então presidente da Turma, ministro Vantuil Abdala, decisão esta mantida pela SDI-1
do TST (processo n. ED-E-ED-RR-42400-13.1998.5.02.00336 e processo n. ED-E-ED-RR-
424/1998-036-02-00.6), sendo relator o ministro Augusto César Leite de Carvalho.
Essa decisão histórica do TST consagrou uma interpretação mais
democrática a respeito da aplicação do artigo 8º, inciso III, da Constituição Federal de
1988, isto é, contrária à outra interpretação mais restritiva no sentido de que tal
representação fosse exclusiva dos sindicatos, sob pena de violação do princípio da
unicidade sindical, previsto pelo artigo 8º, inciso II, do mesmo texto constitucional.
Ademais, a representação concorrente da associação civil em
defesa dos interesses individuais homogêneos, de natureza particular ou concreta dos
representados e substituídos - por já estarem os direitos reclamados previstos no
ordenamento jurídico -, em nada conflita com o princípio da unicidade sindical,
porquanto a exclusividade da representação sindical permanece quando se trata da
defesa dos interesses coletivos em sentido estrito dos trabalhadores, de natureza geral
ou abstrata, visando à melhoria das suas condições sociais, por meio da negociação
coletiva de trabalho (artigo 8º, inciso VI, da CF/88) e dos dissídios coletivos de natureza
jurídica ou econômica (artigos 114, § 2º da CF/88, e 857 da CLT).
A propósito da diferença da natureza jurídica dos interesses nas
relações individuais daqueles interesses nas relações coletivas, Mozart Victor
Russomano, em sua obra Princípios Gerais de Direito Sindical, Editora Forense, Rio de
Janeiro, afirma que “nas relações individuais, os interesses em jogo, harmonia ou
confronto são, sempre, particulares ou concretos; enquanto, nas relações coletivas, se
situam os interesses gerais ou abstratos de uma ou mais de uma categoria”.
Nessa mesma linha de raciocínio, António Monteiro Fernandes,
em sua obra Direito do Trabalho, editada pela Editora Almedina, Coimbra, examinando
a autonomia coletiva profissional (dos sindicatos) e as convenções e acordos coletivos
de trabalho dela resultantes, afirma que eles estabelecem “normas abstratamente
endereçadas aos membros destes grupos”, em atendimento ao que denomina
“interesse colectivo profissional” (interesse coletivo em sentido estrito), que “não se
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reduz aos mero somatório dos interesses individuais dos membros do grupo”, uma vez
que estes últimos nada mais são do que os interesses individuais homogêneos.
Vê-se, portanto, que, embora passassem a ter a concorrência da
associação civil na defesa dos interesses individuais homogêneos dos aposentados do
antigo Banespa, hoje sucedido pelo Banco Santander, em virtude da exclusão de seus
direitos da proteção sindical, os sindicatos dos bancários filiados à CUT preservaram o
poder sindical nas eleições gerais, já que estes aposentados representavam minoria
contrária no seio da categoria profissional dos bancários.
Por outro lado, os sindicatos dos metalúrgicos do Estado de São
Paulo, filiados à Força Sindical, tendo à frente o Sindicato dos Metalúrgicos de São
Paulo, celebraram convenções coletivas de trabalho com sindicatos representantes das
empresas dos mais diversos grupos econômicos metalúrgicos da poderosa Fiesp
(Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), excluindo da estabilidade dos
acidentados até a aposentadoria os trabalhadores portadores de doença profissional,
equiparada pela lei previdenciária ao acidente de trabalho.
Esse direito era assegurado há 20 anos, desde as convenções
coletivas de trabalho de 1978-1979 até as convenções coletivas de trabalho de 1998-
1999, tanto aos trabalhadores metalúrgicos vitimados de acidente de trabalho típico
como àqueles portadores de doença profissional.
No entanto, a partir das convenções coletivas de trabalho de
1999-2001, permaneceu na norma coletiva apenas a estabilidade do acidentado até a
aposentadoria para o trabalhador vítima de acidente de trabalho típico (cláusula 26-
Garantia ao Empregado Afastado do Serviço Militar por Enfermidade ou Por Acidente
do Trabalho Sem Perda de Capacidade Laboral, da convenção coletiva de trabalho de
1999-2001 abaixo mencionada), ficando os portadores de doença profissional com
uma estabilidade provisória de 33 meses após o evento (cláusula 27-Garantia
Temporária de Emprego ao Empregado Portador de Doença Profissional ou
Ocupacional, da convenção coletiva de trabalho de 1999-2001 abaixo mencionada), o
que, na verdade, implicou uma ampliação da estabilidade provisória de 12 meses
prevista pelo artigo 118, da Lei n. 8.213/1991, mas totalmente desvantajosa para esses
trabalhadores, pois poderiam ser despedidos sem justa causa após o decurso do
período estabilitário.
Aliás, essa modificação normativa resultou também prejuízo para
muitos trabalhadores despedidos sem justa causa, embora portadores de doença
profissional, que, por força da Orientação Jurisprudencial n. 41 da SDI-1 do TST, já
tinham incorporado em seus contratos individuais, em razão do princípio da
ultratividade, o direito à estabilidade do acidentado até a aposentadoria.
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Esses trabalhadores despedidos sem justa causa, muitos deles
faltando em média de 5 a 10 anos para se aposentarem, tiveram que ajuizar
reclamações trabalhistas pleiteando sua reintegração no emprego, como ocorreu em
Guarulhos, em razão de ter uma empresa metalúrgica multinacional denominada
Visteon despedido em massa dezenas de trabalhadores acometidos de doença
profissional, embora protegidos pela estabilidade normativa do acidentado, sob o
pretexto de que na ocasião perdera o fornecimento de peças e acessórios para a
empresa automobilística Honda, sua cliente, mantendo, no entanto, ao mesmo tempo,
em seu quadro de empregados, outros trabalhadores não acometidos de doença
profissional.
Aliás, essas despedidas vêm sendo declaradas nulas por violarem
a estabilidade do acidentado prevista pela norma coletiva, em razão do princípio da
ultratividade, como também por serem discriminatórias, nos termos da Lei n.
9029/1995, em reclamações trabalhistas por mim patrocinadas perante as Varas de
Trabalho de Guarulhos (como exemplos cf. processos nº 00766200641802000 e nº
008685009620065020318, ambos da 8ª Vara do Trabalho de São Paulo).
Essa mudança significativa e prejudicial para esses trabalhadores
metalúrgicos portadores de doença profissional ocorreu por força de previsão de
cláusula normativa das convenções coletivas de trabalho, ao passo que outra cláusula
normativa dos mesmos instrumentos coletivos previa o recebimento pelos sindicatos
profissionais de uma contribuição assistencial e anual em torno de 12% calculada
sobre a folha de pagamento, observado determinado teto salarial, das empresas
metalúrgicas das respectivas bases territoriais dos sindicatos patronais, a ser por elas
paga, em razão da participação na negociação coletiva dos diversos sindicatos
metalúrgicos das mesmas bases territoriais.
A propósito, prevê a cláusula 68-Participação Sindical nas
Negociações Coletivas, da convenção coletiva de trabalho, de 1999-2001, celebrada
entre a Federação dos Metalúrgicos do Estado de São Paulo os diversos Sindicatos
Metalúrgicos do Estado de São Paulo, entre eles os grandes Sindicatos de São Paulo e
Mogi das Cruzes, de Guarulhos e de Osasco, e os sindicatos patronais SINDIPEÇAS,
SINDIFORJA e SINPA, representantes das diversas empresas das respectivas categorias
econômicas, a seguinte redação, aliás mantida basicamente nas convenções coletivas
de trabalho dos períodos posteriores:
“As empresas, às suas expensas, recolherão diretamente para a
respectiva Entidade Sindical Profissional dos empregados, abrangidos por esta
CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO, a título de participação sindical nas
negociações coletivas, equivalente a 12% (doze por cento), em duas parcelas de 6%
(seis por cento), conforme deliberação das respectivas assembleias e nas condições
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abaixo explicitadas ...”, que compreendem a incidência sobre a folha de pagamento,
respeitado determinado teto salarial.
Ora, essa previsão de financiamento sindical pela norma coletiva
implica flagrante violação da Convenção 98 de 1949 da OIT, ratificada pelo Brasil, que,
em seu artigo 2º, § 2º, veda expressamente que as organizações de trabalhadores
sejam também mantidas por recursos financeiros dos empregadores ou das
organizações de empregadores, constituindo-se, na verdade, conduta antissindical e
violadora da liberdade sindical dos trabalhadores representados (cf. Luciano Martinez,
Condutas antissindicais, Editora Saraiva, São Paulo).
A propósito, o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo chegou a
ingressar na Justiça do Trabalho com ações de cumprimento (artigo 872, parágrafo
único, da CLT), visando à cobrança da referida contribuição assistencial das empresas
inadimplentes. Essas ações foram julgadas improcedentes na primeira instância da
Justiça do Trabalho em São Paulo e tiveram confirmadas as decisões pelo TRT da 2ª
Região-São Paulo, porque foi entendido que tal cobrança era inconstitucional por
violação do artigo 8º, inciso VI, da Constituição Federal de 1988, já que a presença
obrigatória dos sindicatos na negociação coletiva implica também dever de negociar,
bem como por violação do artigo 2º, § 2º, da Convenção 98, de 1949, da OIT, como
visto ratificada pelo Brasil (cf. procs. TRT/SP 02769.2003.056.02.00-7 e TRT/SP
02476.2003.039.02.00-4, ambos da 6ª Turma, com os acórdãos da lavra da
desembargadora e relatora Ivani Contini Bramante).
A denominação dessa cláusula normativa (Participação Sindical
nas Negociações Coletiva) foi mantida nas convenções coletivas posteriores, em torno
de dois períodos seguidos, passando a ter nova denominação nas convenções coletivas
dos períodos posteriores (Contribuição para Treinamento e Requalificação Profissional,
Apoio à Recolocação de Pessoal e Ações Sociossindicais), menos afrontosa, mantendo-
se até o momento, mas com o mesmo espírito de conduta antissindical resultante do
financiamento sindical profissional por empresas empregadoras.
Portanto, vários sindicatos dos bancários da CUT no Brasil
mantiveram o poder e os sindicatos dos metalúrgicos da Força Sindical no Estado de
São Paulo receberam a contribuição financeira patronal.
Teriam sucumbindo às tentações respectivamente do poder e do
dinheiro, os chifres do Diabo, como dizia o saudoso frade dominicano João Baptista
Pereira dos Santos, do conhecido Convento Santo Alberto Magno, situado no bairro
das Perdizes, em São Paulo, em sua obra intitulada Os chifres do Diabo – Capitalismo e
comunismo, editado em 1964 pela Livraria Sal, São Paulo ?.
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Na obra do Frei dominicano João Batista Pereira dos Santos, a
busca desenfreada e fria do poder foi perseguida ao longo da história pelo comunismo
e a busca ambiciosa e impiedosa do dinheiro pelo capitalismo.
Na paródia presente, é de se perguntar se a busca do poder teria
sido engendrada pelos vários sindicatos dos bancários da CUT, em âmbito nacional, e a
busca do dinheiro pelos sindicatos dos metalúrgicos do Estado de São Paulo
pertencentes à Força Sindical.
Vê-se, desta forma, que os sindicatos de trabalhadores
brasileiros exercem um poder de representação sem legitimidade, por força da
unicidade sindical e por serem sustentados pela contribuição sindical compulsória,
hoje orçada em R$1.6 bilhões de reais anuais, além, em alguns casos, pelo
financiamento pago pelas empresas, em prejuízo dos trabalhadores representados, e,
ainda, por repasses do Ministério do Trabalho e Emprego de verbas para o custeio de
programas de educação dos trabalhadores.
A propósito, apesar da natureza parafiscal da contribuição
sindical, a teor da inteligência do artigo 149 da Constituição Federal de 1988, a sua
aplicação pelos sindicatos não vem sofrendo nenhum controle externo, a não ser
internamente dos próprios órgãos colegiados sindicais.
É de se lembrar que o então presidente Lula, ao sancionar a Lei
n. 11.648/2008, que criou as centrais sindicais, houve por bem vetar a emenda
aprovada pelo Congresso Nacional no sentido de que as contas sindicais deveriam ser
fiscalizadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
O pretexto do veto foi de que, com o controle das contas pelo
TCU, haveria interferência do Estado na vida sindical, o que conflitaria com o disposto
no artigo 8º, inciso I, do texto constitucional, quando, na verdade, o veto é
contraditório, já que, sendo a contribuição sindical de natureza parafiscal, o interesse
público – acima do interesse corporativo sindical - exige que o sistema tributário
nacional faça o controle da destinação desse tributo. Ademais, é sabido que, sendo o
atual modelo de organização sindical brasileiro semicorporativista, e não de plena
liberdade sindical, ele convive com esse resquício corporativista, que compreende o
bônus do dinheiro público fácil e também deveria compreender o ônus do seu controle
público externo.
Por essa razão, nesse final de 2012, são 10.038 sindicatos de
trabalhadores com registro ativo no Ministério do Trabalho e Emprego (esse número
representa 67,71 % de um total de 14.826 sindicatos, dos quais 4.788 são sindicatos
patronais, isto é, 32,29 % do total, lembrando-se que os sindicatos patronais também
são favorecidos pela contribuição sindical compulsória), dando a falsa impressão de
que os trabalhadores brasileiros estariam muito bem representados pelo grande
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número de sindicatos em atividade, quando se sabe que esse número está relacionado
à ferrenha disputa pelo volume da arrecadação da contribuição sindical compulsória e
pelo repasse de verbas públicas para programas de educação (cf. Suely Caldas, O
arcaísmo sindical, O Estado de São Paulo, 10/12/2012, B2 Economia).
Felizmente, a fúria arrecadatória dos sindicatos brasileiros tem
sido refreada pela atuação exemplar do Ministério Público do Trabalho, no exercício
de suas prerrogativas em defesa da ordem jurídica, do regime democrático e, em
particular, dos interesses sociais e individuais indisponíveis dos trabalhadores de não
verem seus salários sofrerem descontos de contribuições sindicais, quando não filiados
ao respectivo sindicato da categoria profissional, salvo a contribuição sindical
obrigatória por estar prevista em lei (artigo 8º, inciso IV, in fine, da CF/88).
Em última análise, a proteção dos trabalhadores não filiados a
sindicatos de não sofrerem descontos para contribuições sindicais em seus salários
encontra fundamento no artigo 8º, inciso V, da CF/88, que garante a liberdade
individual de filiar-se ou desfiliar-se a sindicato.
De fato, o Ministério Público do Trabalho tem sido implacável na
defesa desse direito fundamental do trabalhador, ingressando com ações anulatórias
ou ações civis públicas, quando pleiteia a anulação de cláusulas normativas de
convenções ou acordos coletivos de trabalho que prescrevem a obrigatoriedade do
desconto de contribuições sindicais de trabalhadores não filiados ao sindicato da
respectiva categoria profissional.
Foi, sem dúvida, como resultado sobretudo das medidas judiciais
tomadas pelo Ministério Público do Trabalho que, primeiramente a Justiça do
Trabalho, por força do Precedente Normativo 119 e da Orientação Jurisprudencial 17
da SDC, ambos do TST, e, posteriormente, o STF, por força da Súmula 666, chegaram à
conclusão de que “a contribuição confederativa de que trata o art. 8º, IV, da
Constituição, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo”.
Essas medidas judiciais do Ministério Público do Trabalho fizeram
com que a Justiça do Trabalho, pelo TST, também se posicionasse com fundamento
igualmente no Precedente Normativo 119 e na Orientação Jurisprudencial 17 da SDC,
no sentido de que a chamada contribuição assistencial prevista em instrumentos
normativos coletivos só alcançasse os filiados ao sindicato respectivo, não atingindo os
salários dos não-sindicalizados.
Mas, por outro lado, em sentido oposto ao adotado pelo
Ministério Público do Trabalho em defesa da liberdade sindical, alguns Tribunais do
Trabalho, em especial o de São Paulo, insistem em manter o poder normativo da
Justiça do Trabalho, afastando os sindicatos de sua principal função, que é a
negociação coletiva, malgrado a exigência do comum acordo como pressuposto
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processual para o ajuizamento do dissídio coletivo de natureza econômica, previsto
pelo artigo 114, p. 2º, do texto constitucional.
Portanto, esse comportamento de alguns Tribunais do Trabalho
acaba favorecendo a manutenção do poder sindical sem legitimidade no Brasil, em
prejuízo dos trabalhadores representados, uma vez que os sindicatos não se esmeram
em lutar por uma verdadeira representatividade em função da negociação coletiva, já
que as normas coletivas são garantidas pelo poder normativo da Justiça do Trabalho.
A afirmação do pressuposto processual do comum acordo para o
ajuizamento do dissídio coletivo de natureza econômica faria com que a decisão
normativa do conflito tivesse natureza de arbitragem pública, correspondendo
efetivamente ao exercício do poder jurisdicional da Justiça do Trabalho.
Atenderia, desta forma, à dicção do artigo 114, § 2º, da CF/88,
com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 45 de 2004, ao dispor que à Justiça
do Trabalho, ao apreciar e julgar o dissídio coletivo de natureza econômica, compete
decidir o conflito e não estabelecer normas e condições como constava do texto
constitucional anterior.
Ademais, o comum acordo como pressuposto processual para o
ajuizamento do dissídio coletivo de natureza econômica não implica a concordância
das partes quanto ao mérito, mas apenas a busca da solução jurisdicional para decidir
o conflito, uma vez que cada parte apresenta sua proposta final, a ser arbitrada
publicamente pela Justiça do Trabalho.
Essa posição de alguns Tribunais do Trabalho, em insistir na
manutenção do poder normativo da Justiça do Trabalho – na verdade extinto (cf.
Pedro Carlos Sampaio Garcia, O fim do Poder Normativo, Justiça do Trabalho:
competência ampliada, LTr. Editora, São Paulo, e Renato Rua de Almeida, Visão
histórica da liberdade sindical, Revista LTr., março de 2006, ano 70, nº 3, págs. 363-
366) -, parte da interpretação equivocada de que o pressuposto processual para o
ajuizamento do dissídio coletivo de natureza econômica seria inconstitucional por
violar o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional previsto pelo artigo 5º,
inciso XXXV, da Constituição Federal de 1988, quando, na verdade, trata-se de apenas
mais um pressuposto processual a ser atendido ao lado de outros, sem impedir o
direito propriamente dito de ajuizamento da ação (cf. Andréa Presas Rocha, Manual de
Competências da Justiça do Trabalho, Elsevier, Rio de Janeiro).
A propósito, o Parecer n. 5.026 do Procurador Geral da República
já foi exarado pela improcedência nos autos do processo da Ação Direta de
Inconstitucionalidade de n. 3.432-4/600-DF, em que se pleiteia a declaração de
inconstitucionalidade do pressuposto do comum acordo para o ajuizamento do
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dissídio coletivo de natureza econômica, previsto pelo artigo 114, § 2º, da Constituição
Federal de 1988, aguardando-se a decisão final do STF.
Em conclusão, pelas razões acima expostas, a resposta à
pergunta formulada no 52º Congresso Brasileiro de Direito do Trabalho promovido
pela LTr. Editora, por seu coordenador, professor Amauri Mascaro Nascimento, deve
ser dada no sentido de que o modelo sindical brasileiro é semicorporativista ou
neocorporativista, ainda distante do modelo pós-corporativista ou da liberdade
sindical plena consagrada internacionalmente.
Viu-se como é difícil a mudança do modelo sindical brasileiro
semicorporativista ou neocorporativista, em razão dos fortes interesses que seriam
contrariados.
A propósito dessa dificuldade, o Conselho Federal da OAB
rejeitou, no processo nº 2007.29.01997-01, o pedido formulado por militantes
sindicais e advogados do Estado de São Paulo, com a minha participação, e apoiado
pelo professor Fábio Konder Comparato, que à época era presidente da Comissão de
Defesa da República e da Democracia da OAB, para que fossem autorizadas audiências
públicas tendo em vista a discussão sobre a possibilidade do patrocínio de envio ao
Congresso Nacional de proposta de emenda constitucional, nos termos do artigo 5º, §
3º, da Constituição Federal de 1988, para a aprovação da Convenção n. 87 de 1948, da
OIT, sobre a liberdade sindical, consagrada como liberdade pública e direito humano.
A decisão do Conselho Federal da OAB, ao rejeitar o pedido de
realização de audiências públicas – depois de mais de três anos de tramitação - foi no
sentido de não o conhecer por entender tratar-se de matéria que não seria da sua
competência, como se fosse possível aos advogados brasileiros deixar de discutir se a
norma constitucional brasileira positivou ou não como direito fundamental a liberdade
sindical consagrada como direito humano por tratados e convenções internacionais.
Por outro lado, o primeiro governo do então presidente Lula,
após instalar o Forum Nacional do Trabalho, do qual resultou uma proposta de
reforma sindical, enviou ao Congresso Nacional a Proposta de Emenda à Constituição-
PEC 369/05, dando nova redação aos artigos 8º, 11, 37 e 114 da Constituição Federal
de 1988.
A referida PEC 369/05 continua tramitando, depois de sete anos,
no Congresso Nacional, com parecer favorável de admissibilidade do relator, deputado
Moreira Mendes, encontrando-se à espera do parecer da Comissão de Constituição e
Justiça e Cidadania (CCJC).
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A última informação que se tem da tramitação da PEC 369/05 é
que ela foi devolvida a pedido da CCJC, em 26/10/2011, para o reexame da matéria
pelo relator.
Parece não haver vontade política governamental em apressar a
tramitação da PEC 369/05, talvez em razão da necessidade de formação da base
partidária de sustentação no Congresso, tida como heterogênea e certamente sem
consenso a respeito da questão sindical.
Essa situação ocorre em razão do nosso presidencialismo de
coalizão, que é fruto da disfunção político-partidária resultante do nosso sistema
eleitoral proporcional para as eleições legislativas, que não garante a maioria
parlamentar, como é garantida onde são adotados os sistemas eleitorais com o voto
distrital ou distrital misto.
A propósito, é sabido que atualmente o Ministério do Trabalho e
Emprego é ocupado pelo PDT, que, por sua vez, é ligado à Força Sindical,
tradicionalmente contrária à aprovação da Convenção n. 87 de 1948, da OIT, sobre a
liberdade sindical.
É de se esperar, no entanto, que a CUT, por sua vez,
efetivamente ponha em prática sua decisão colegiada tomada em 2012 de lutar, como
prioridade de sua atividade sindical, pela aprovação da Convenção n. 87 da OIT, sobre
a liberdade sindical (cf. artigo intitulado Liberdade enfraquece sindicatos de fachada,
de Artur Henrique, presidente nacional da CUT, publicado no jornal Folha de São
Paulo, 04/02/2012, opinião A3).
O acompanhamento da tramitação da PEC 369/05 no Congresso
poderia, por exemplo, fazer parte da estratégia da CUT.
Por fim, para que não fiquemos apenas na análise doutrinária do
anacronismo do modelo sindical brasileiro, bem como não fiquemos apenas
lamentando as dificuldades para sua modificação, é preciso provocar o Poder
Judiciário, para que - como na decisão que reconheceu a legitimidade concorrente das
associações civis perante a Justiça do Trabalho em relação aos sindicatos profissionais
na defesa dos interesses individuais homogêneos de seus representantes ou
substituídos -, possa fixar em suas decisões jurisdicionais novas alternativas ao
monopólio de representação sindical, exercitando mesmo um certo ativismo judicial, a
fim de que o modelo sindical brasileiro evolua do atual semicorporativismo ou
neocorporativismo para um modelo pós-corporativista.
Mas é preciso também esperar que os Tribunais do Trabalho, de
uma vez por todas, fuja do espírito corporativista, abandonando a ideia
originariamente pouco auspiciosa do exercício do poder normativo, e assuma uma
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postura realmente jurisdicional, ao acatar o comum acordo como pressuposto
processual para o ajuizamento dos dissídios coletivos de natureza econômica, de modo
que possa decidir o conflito com uma sentença normativa de arbitragem pública.
A recente eleição do ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho
para a Corregedoria-Geral do TST do próximo biênio poderia fazer com que a Justiça
do Trabalho passasse a exercitar suas atribuições verdadeiramente jurisdicionais nos
dissídios coletivos de natureza econômica, uma vez que ele tem posição doutrinária
firmada sobre a matéria ( cf. Ives Gandra da Silva Martins Filho, Manual esquemático
de direito e processo do trabalho, Saraiva, São Paulo) ?. Teria ele prerrogativa
institucional e condições políticas para tanto ?
Espera-se, ainda, que o Ministério Público do Trabalho continue
a exercer suas prerrogativas constitucionais e legais em defesa dos interesses sociais e
individuais dos trabalhadores quando violados pela ação sindical negativa.
Finalmente, pode-se esperar que a CUT realmente assuma a
defesa e a promoção da aprovação da Convenção n. 87 da OIT, sobre a liberdade
sindical ?
Seriam estas as alternativas mais viáveis para que a cidadania
brasileira possa esperar um processo de mudança para o modelo sindical pós-
corporativista, uma vez que uma nova Assembleia Nacional Constituinte para
promovê-la, completando a iniciada pela Constituinte anterior, estaria ainda muito
distante dos nossos horizontes ?.