O Ouro das Gerais

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    O OURO DAS GERAIS

    Depois de muito procurar, os sertanistas de So Paulo finalmente

    descobriram ouro no interior da colnia portuguesa. Em 1694, Bartolomeu

    Bueno de Siqueira encontrou amostras do precioso metal na serra de

    Itaberaba, no atual Estado de Minas Gerais. A notcia da descoberta logo se

    espalhou pelo territrio, transps o oceano e chegou Europa. A partir de

    ento, colnia e reino foram tomados por uma febre incontrolvel, que conduziu

    milhares de pessoas em direo s minas, em busca do metal que

    proporcionava riqueza instantnea a quem o encontrasse.

    Como consequncia, em menos de um sculo, entre 1690 e 1780, a

    populao da colnia deu um salto espantoso: de 300 mil habitantes chegou a

    2500000. O mesmo aconteceu nas Gerais (denominao antiga da regio),

    onde as primeiras amostras de ouro foram colhidas. De rea modestamente

    povoada no final do sculo XVII, em 1780 cerca de 400 mil pessoas j haviam

    se instalado na regio. Com o desenvolvimento da minerao, a sociedade

    colonial passou por uma srie de mudanas importantes, tornando-se mais

    urbana e complexa.

    1. PAULISTAS E EMBOABAS.

    Quanto mais a noticia da existncia de ouro na colnia se difundia, mais

    a populao da regio das minas aumentava. Como isso, acirravam-se as

    disputas por lotes de terra (ou datas) que a Coroa portuguesa concedia para a

    prospeco e a lavra do metal. Era evidente o agravamento da situao, devido

    ausncia de rgo do Estado capazes de arbitraras disputas. Sob esse clima

    de instabilidade, os conflitos pareciam iminentes. E o mais grave acabou

    eclodindo entre 1708 e 1709: a Guerra dos Emboabas.

    Desde a descoberta anunciada por Bartolomeu Bueno de Siqueira, em

    1694, os paulistas eram maioria na regio das minas. Foram eles que criaram

    os primeiros ncleos de explorao do ouro e, por isso mesmo, julgavam ter

    direito especiais sobre o territrio. Da a encarar os exploradores vindos de

    outras capitanias da colnia e do reino como intrusos foi um passo. Muitos dos

    aventureiros que chegavam regio usavam botas de cano alto e logo

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    enfrentavam a intolerncia dos paulistas, que, com a inteno de ridiculariz-

    los, chamavam-nos de emboabas, palavra de origem tupi que significa ave

    com penas at os ps.

    Em 1708, um dos lderes dos emboabas, Manuel Nunes Viana, colocou-

    se frente de uma tropa fortemente armada e conseguiu expulsar os paulistas

    da regio de Sabar. O ato representou uma declarao de guerra. Os

    paulistas revidaram, promovendo sucessivos ataques a acampamentos

    emboabas, mas no tiveram xito. Em um dos confrontos, os paulistas, em

    desvantagens, aceitaram se render em troca da liberdade proposta pelos

    emboabas. Mas era uma emboscada: trezentos homens foram mortos e seus

    corpos atirados ao rio, que ficaria conhecido como o rio da morte. Em razo do

    episdio, o local em que se deu o cerco passaria para a histria como o nome

    de Capo da Trao. O confronto s teria fim em 1709, graas interveno

    do ento governador do Rio de Janeiro, Antnio de Albuquerque Coelho de

    Carvalho. Sem os privilgios desejados, os paulistas se retiraram da regio.

    Muitos deles decidiram ir para o oeste, onde mais tarde descobririam novas

    jazidas de ouro nos atuais territrios de Gois e de Mato Grosso.

    2. A ADMINISTRA O DAS MINAS.

    Para contornar as constantes hostilidades e administrar as zonas de

    minerao, o governo portugus criou, em 1709, a capitania de So Paulo e

    Minas do Ouro, que seria desmembrada em 1720, dando origem s capitanias

    de Minas Gerais e de So Paulo. Outra providencia tomada pelo governo de

    Lisboa foi a criao, em 1702, da Intendncia das Minas, rgo encarregado da

    administrao da zona mineradora e subordinada diretamente Coroa.

    Ao mesmo tempo, instituiu-se o Regimento das Minas do Ouro, que

    passou a regulamentar a atividade. De acordo com esse regimento, os

    depsitos aurferos deviam ser divididos em vrias datas (lotes).

    O descobridor da jazida tinha o direito de escolher primeiro dois lotes,

    deixando um terceiro reservado Coroa, que o revendia em leilo. Os lotes

    restantes eram distribudos entre os mineradores que demostrassem interesse

    em explor-los. O tamanho e o nmero dos lotes variavam segundo a

    quantidade de escravos que cada minerador possua.

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    Para ser minerador, bastavam poucos equipamentos. A maior parte do

    ouro da regio era aluvio, ou seja, encontrado no leito dos rios, nas encostas

    ou nas camadas superficiais da terra. Os mineradores com mais recursos,

    equipamentos e escravos podiam explorar as lavras, unidades de maior

    produo de ouro.

    Impostos e mais imposto s :

    Ao longo do sculo XVIII, a Coroa portuguesa buscou sistematicamente

    aumentar suas receitas por meio da arrecadao de impostos na regio

    mineradora. Os principais impostos foram o qu in to e a cap it ao. O quinto foi

    o tributo que mais desagradou populao, pois cada minerador era obrigado

    a pagar ao governo de Portugal a quinta parte do ouro extrado.Era calculado sobre a quantidade de escravos a servio do minerador.

    Com todas essas imposies, a sonegao de impostos e contrabandos de

    ouro tornaram-se praticas comuns. Para controlar a situao, 1719, a Coroa

    proibiu a circulao do ouro em p, fcil de ser contrabandeado, e determinou

    a instalao de Casas de Fundio em toda a regio das lavras. Nesses

    estabelecimentos, o ouro era transformado em barras e recebia o selo real, ao

    mesmo tempo em que se cobrava o quinto.

    Os impostos cobrados sobre a produo do ouro contribuam para cobrir

    as enormes despesas da corte portuguesa. Mas Portugal exigia cada vez mais,

    pois boa parte da riqueza extrada da colnia era utilizada para pagar os

    dficits de sua balana comercial, principalmente com a Inglaterra. Assim, a

    partir de 1734, a Coroa portuguesa passou a exigir que a soma de impostos da

    regio das minas atingisse a quantidade mnima de 100 arrobas anuais (1500

    quilos). No entanto, depois de 1770, a produo de ouro comeou a declinar.

    Com isso os mineradores encontravam cada vez mais dificuldade em cumprir a

    exigncia dos portugueses. Diante do impasse, a Coroa instituiu a derrama,

    arrecadao forada dos quintos em atraso.

    3. MINERA O E MESTIAGEM.

    A grande maioria dos trabalhadores que extraam ouro e diamantes nas

    reas das minas era formada por escravos. O trabalho, extremamente penoso,

    devia ser realizado nos leitos de rios ou no interior de galerias profundas. As

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    pssimas condies de trabalho provocavam doenas frequentes, o que fazia

    com que a vida til de um escravo fosse muito curta. Por isso, a importao de

    africanos cresceu muito no sculo XVIII. Considerando-se as caractersticas da

    atividade, os mineradores davam preferencia aos escravos do sexo masculino,

    o que provocou forte desequilbrio entre homens e mulheres na regio das

    minas. Em alguns aspectos, a sorte da populao escravizada era melhor nas

    minas do que nos engenhos. Nas zonas de minerao, por exemplo, podia-se

    obter a liberdade (alforria) com mais facilidade do que na rgida sociedade

    aucareira. Segundo o historiador Russel-Wood, enquanto nos anos 1735-

    1749 os escravos alforriados eram responsveis por menos de 1,4% da

    populao de origem africana, em1786 representavam 41,4% dessas pessoas

    e 34% da populao total das minas.

    Para muitos historiadores, a minerao criava oportunidades de o

    escravo reunir quantidade de dinheiro suficiente para comprar sua liberdade.

    Outro aspecto que acabou favorecendo a populao mais pobre foi atividade

    artstica desenvolvida nas vilas mineiras, criando um canal de ascenso social.

    A construo de igrejas com todas as obras adicionais empregava

    entalhadores, escultores e pintores, geralmente de origem humilde e mestia.

    No por acaso, o mais conhecido artista da poca foi o mestio Antnio

    Francisco Lisboa, o Aleijadinho. No campo da musica, a maioria dos

    compositores e instrumentistas tambm era proveniente das camadas mais

    pobres da populao.

    4. UMA SOCIEDADE URBANA.

    A minerao de ouro e, mais tarde, a de diamantes provocaram

    profundas transformaes no perfil econmico, poltico, social e cultural da

    colnia. Com a atividade mineradora, a economia passou a contar com um

    novo polo dinmico, organizado em funo da prospeco, extrao e

    circulao e comercializao dos metais preciosos. O comrcio cresceu e a

    circulao de riquezas e de mercadorias aumentou. Intensificou-se tambm o

    t rf ic ode escravos. Pouco a pouco, a sociedade se tornou mais complexae

    diversificada, com a formao de novos grupos sociais.

    Outro aspecto que marcou essa poca foi integrao das capitanias,que acabaram formando uma rede de abastecimento para servir a regio

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    mineradora. As capitanias do Nordeste e do sul, por exemplo, forneciam carne

    para alimentar a populao das Gerais. O Sul tambm vendia muares (mula de

    carga) aos mineradores, que os empregava como meio de transporte. De So

    Paulo, as Gerais compravam diversos gneros alimentcios. O comrcio

    intenso que se estabeleceu entre as capitanias, e a zona de minerao acabou

    favorecendo a abertura de diversas estradas, que cortavam o territrio de norte

    a sul para o escoamento das mercadorias.

    Ao mesmo tempo, surgiram novas cidades, como a Vila do Ribeiro de

    Nossa Senhora do Carmo, futura Mariana; a Vila Rica de Albuquerque, ou

    simplesmente Vila Rica, atual Ouro Preto; vila Real de Nossa Senhora da

    Conceio de Sabar; So Jos del-Rei, futura Tiradentes: e varias outras. Nas

    cidades mineiras havia mais mobilidade social do que na sociedade das reas

    aucareiras. O intercambio cultural tambm era intenso, resultado da

    constituio de grupos de intelectuais formados por poetas, escritores,

    advogados e profissionais liberais. Muitos deles se tornariam depois severos

    opositores do sistema colonial.

    5. APOGEU CRISE DA MINERA O.

    O auge da produo aurfera ocorreu entre 1730 e 1760. A partir dessa

    data, a produo de ouro comeou a decrescer. A populao mineira voltou-se

    ento para as atividades complementares que haviam se desenvolvido em

    pequena escala na regio, notadamente a agricultura e a pecuria.

    Para a colnia como um todo, a diminuio das atividades mineradoras

    levou ao renascimento agrcola, com valorizao das atividades tradicionais,

    que durante a febre da explorao de ouro e de diamantes, ficaram relegada a

    segundo plano. Para Portugal, entretanto, comeava outro perodo de

    dificuldade, particularmente nas dcadas 1760 e 1770.

    Mais uma vez, a sada encontrada pela Coroa foi aumentar a explorao

    da colnia. Na verdade, o ouro e os diamantes levados da Amrica portuguesa

    no garantiram o desenvolvimento da economia portuguesa. Em Portugal, o

    ouro se esvaa rapidamente, pois era utilizado em obras suntuosas, como a

    construo de palcios e o embelezamento de igrejas, alm de ser gasto para

    promover as festas da nobreza. A maior parte do metal acabava sendo

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    transferido para outros pases, sobretudo a Inglaterra para pagamento do

    dficit da balana comercial.

    6. CENTRO OESTE.

    Iniciada na regio do atual Estado de Minas Gerais no final do sculo

    XVII, a atividade mineradora tambm proporcionou a ocupao de territrios

    situados alm do meridiano de Tordesilhas, no atual Centro-Oeste brasileiro. A

    exemplo do que ocorreu nas Gerais, os pioneiros dessa ocupao foram os

    paulistas, que depois da Guerra dos Emboabas penetraram no interior

    procura de ouro. Em 1719, Pascoal Moreira Cabral descobriu amostras do

    precioso metal na regio do atual Estado de Mato Grosso do Sul.Seis anos depois, Bartolomeu Bueno da Silva tambm encontrou

    indcios da existncia de ouro em terras do futuro Estado de Gois. Essas

    descobertas provocaram o afluxo de muitas pessoas regio e a formao de

    ncleos populacionais que daria origem s cidades de Cuiab (1727), Vila Boa

    (1739) e Vila Bela da Santssima Trindade do Mato Grosso (1752). Em 1744,

    criou-se a capitania de Gois, desmembrada de So Paulo, com sede em Vila

    Boa (atual cidade de Gois) e, quatro anos mais tarde, a capitania de Mato

    Grosso. Nessa mesma poca, descobriram-se diamantes nas duas capitanias.

    Com o incio da explorao de minerais preciosos no Centro-Oeste, logo

    se organizaram em So Paulo expedies para transportar pessoas e

    mantimentos at a regio. Conhecidas por mones, a principal caracterstica

    dessas expedies era a utilizao do transporte fluvial. Seu ponto de partida

    era normalmente a vila de Porto Feliz, no interior de So Paulo. Navegando os

    rios Tiete, Paran e seus afluentes, as mones estabeleciam a ligao entre

    So Paulo e Cuiab. Extremamente difcil, a viagem demorava cerca de cinco

    meses e era realizada, em geral, uma vez por ano.

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    SISTEMATIZAR OS ESTUDOS1

    1. A descoberta do ouro atraiu multides para a regio das minas. Um problema

    srio, porm aguardava essa populao: a fome. Explique as causas desse

    problema.

    2. A regio das minas foi palco de vrios movimentos de protesto dos

    mineradores. Elabore um comentrio sobre a Guerra dos Emboabas e a Revolta

    de Vila Rica.

    3. Durante o sculo XVII, a Coroa estabeleceu vrias formas de cobrana de

    impostos. Explique o que era o quito e a importncia das Casas de Fundio

    para sua cobrana.

    4. A minerao do ouro no teve impacto apenas nas regies em que o metal foi

    encontrado. Tambm alterou a dinmica econmica de outras capitanias.

    Descreva os efeitos da economia do ouro sobre o restante do Brasil.

    5. Na corrida pelo ouro das Gerais, populaes de vrias partes se deslocaram

    para a regio. Os conflitos no tardaram a estourar. Qual foi o mais srio deles?

    Quem se enfrentou nesse conflito e por qu?

    6. Que relao pode-se estabelecer entre a formao de novas cidades na regio

    mineradora, a construo de igrejas, a maior mobilidade social e o

    desenvolvimento da produo cultural.

    Material elaborado pelo Prof. Elicio Lima para sistematizar situaes de ensino-aprendizagem na sala de aula. A intertextualidade desse trabalho se estabelece no dialogoentre as obras: Histria: Volume nico: Divalte Garcia Figueiredo. 1. ed. So Paulo: tica, 2005. Histria global volume nico: Gilberto Cotrim. 8. ed. So Paulo: Saraiva, 1995.

    Histria Sociedade & Cidadania: Alfredo Boulos Jnior. 1 ed. So Paulo: FTD 2013. Material referenciado pelos Parmetros curriculares Nacionais e proposta curricular doEstado de So Paulo (Feitas algumas adaptaes e grifos para facilidade o processo didtico ensino aprendizagem - 2016). Sequencia didtica, 14. Segundo ano do EnsinoMdio.

    O OURO DAS GERAISSituao de aprendizagem 14Histria - Prof. Elicio Lima

    N Srie Data

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