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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI PETRONIO JOSUÉ DOMINGOS DA SILVA Ó PAÍ Ó: EM BUSCA DE UMA ROTA DISCURSIVA Uma produção orientada para a Transmediação SÃO PAULO 2010

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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI

PETRONIO JOSUÉ DOMINGOS DA SILVA

Ó PAÍ Ó: EM BUSCA DE UMA ROTA DISCURSIVA

Uma produção orientada para a Transmediação

SÃO PAULO

2010

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PETRONIO JOSUÉ DOMINGOS DA SILVA

Ó PAÍ Ó: EM BUSCA DE UMA ROTA DISCURSIVA

Uma produção orientada para a Transmediação

Dissertação de Mestrado apresentada à Banca Examinadora, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre do Programa de Mestrado em Comunicação, área de concentração em Comunicação Contemporânea da Universidade Anhembi Morumbi, sob orientação da Profa. Dra. Sheila Schvarzman.

SÃO PAULO 2010

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S582p Silva, Petrônio Josué Domingos da

Ó pai ó: em busca de uma rota discursiva – uma produção orientada para a transmediação / Petrônio Josué Domingos da Silva. – 2010.

108f.: il.; 30 cm. Orientador: Sheila Schvarzman. Dissertação (Mestrado em Comunicação) – Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, 2010. Bibliografia: f.90-92.

1. Comunicação. 2. Seriados de Televisão. 3. Pelourinho. 4. Televisão - Seriado. 5. Transmediação. I. Título CDD 302.2

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PETRONIO JOSUÉ DOMINGOS DA SILVA

Ó PAÍ Ó: EM BUSCA DE UMA ROTA DISCURSIVA

Uma produção orientada para a Transmediação

Dissertação de Mestrado apresentada à Banca Examinadora, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre do Programa de Mestrado em Comunicação, área de concentração em Comunicação Contemporânea da Universidade Anhembi Morumbi, sob orientação da Profa. Dra. Sheila Schvarzman.

Aprovado em 08/04/2010

________________________________ Profa. Dra. Sheila Schvarzman

________________________________ Prof. Dr. Gino Giacomini Filho

________________________________ Prof. Dr. Gelson Santana Penha

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DEDICATÓRIA

Aos professores do Mestrado em Comunicação da Unive rsidade Anhembi Morumbi que souberam como me mostrar o caminho;

À meus pais, minha família que com paciência e amor estiveram do meu lado, me apoiando e incentivando;

Aos amigos e todos aqueles que fizerem parte deste sonho, a tanto acalentado.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pois reconheço suas mãos em minha vida, por toda minha existência; A meus pais, pelo dom da vida, por acreditarem que eu poderia;

A minha esposa Rosangela e minhas filhas Rachel, Ana Beatriz e Lívia, a quem eu

amo e que dão significado a minha vida;

Em especial, meu agradecimento e minha admiração a minha orientadora,

professora Dra. Sheila Schvarzman; pela competência, empenho, e carinho com que

me conduziu durante esta pesquisa, a quem terei uma eterna dívida de gratidão;

A todos os docentes do Mestrado em Comunicação, em especial agradeço aos

meus queridos professores, Rogério Ferraraz, Maria Ignês Carlos Magno, Vicente

Gosciola, Gelson Santana, Gino Giacomini pessoas com quem compartilhei dois dos

melhores anos de minha vida;.

À coordenadora do curso, professora Dra. Bernadette Lyra, que com seriedade, e

respeito soube conduzir este curso com excelência;

Aos colegas de classe e todos aqueles que passaram pela minha vida ou ainda

estão e que de alguma forma deixaram sua contribuição.

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SUMÁRIO

RESUMO......................................................................................................................i

ABSTRACT..................................................................................................................ii

INTRODUÇÃO...........................................................................................................01

1. CAPÍTULO 1 – Ó PAÍ, Ó .- DA PEÇA AO FILME 1.1 Contexto Histórico.....................................................................................05

1.1.2 A peça.........................................................................................09

1.1.3 Olodum..e o Bando de Teatro.....................................................15

1.1.4 Experimentando novos atores: o amálgama dos intérpretes.......19

1.2 - Ó Pai, Ó: o filme.....................................................................................29

1.2.1 O que é o filme? ..........................................................................27

1.2.2 O processo de transmutação.......................................................42

1.2.3 Um filme não pensado para a TV?...............................................53

2. CAPÍTULO 2 – Ó PAÍ, Ó .- O SERIADO

2.1 – O Seriado................................................................................................56

2.2 - As minisséries e os Seriados.................................................................60

2.3 – A idéia da migração pela coprodução....................................................68

2.4 – Guel Arraes e os processos de transmediação......................................71

2.5– Desdobramentos de uma transposição: uma narrativa transmidiática ..74

2.5.1 – Ó PAÍ Ó como uma narrativa transmidiática............................79

2.5.2 – Receptividade...........................................................................81

2.6 – Qual a importância de Ó Pai Ó?.............................................................83

CONCLUSÃO............................................................................................................88

REFERÊNCIAS..........................................................................................................90

ANEXOS 1.................................................................................................................93

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INTRODUÇÃO

Em outubro de 2008, a Rede Globo levou ao ar o seriado1 Ó Pai, Ó, baseado

no filme homônimo que provinha das telas do cinema para a televisão. Em seus três

momentos – a peça2, o filme e a série – Ó Pai, Ó aborda de um modo geral, a

realidade interna dos cortiços do Pelourinho, que até os anos 80 era estigmatizado

como zona de prostituição e marginalidade. Além do problema da moradia, as

produções abordavam o trágico tema do extermínio de menores, denunciando a

exclusão social, a prostituição, o antagonismo religioso, e acima de tudo a expulsão

dos moradores do Pelourinho. Além de mostrar a realidade vivida dentro dos

cortiços no Pelourinho, mostra também a própria descaracterização e sucateamento

da cultura afro-descendente que ali cresceu e floresceu, e que busca uma

identidade.

Realizado fora do eixo Rio - São Paulo, Ó Paí, Ó,(o filme e o seriado)

exploram as ruas do Pelourinho, mostrando uma Bahia que transpira com

personagens apimentados bem ao gosto do baiano, e que exala alegria em todos os

momentos. Ó Pai, Ó, escrito em 1992, quando ocorreram reformas urbanísticas com

vistas à remodelação do Pelourinho como um incremento ao turismo, o que por

conseqüência ocasionaria a remoção ou expulsão de seus habitantes, sobretudo

pobres e majoritariamente negros. A peça, que teve sua primeira montagem em 92,

quase como um manifesto político contra essas ações oficiais, terminara por

contribuir para que essas mudanças levassem em conta nichos culturais

importantes como o grupo Olodum, por exemplo, envolvido diretamente com a peça

1 A primeira temporada do seriado Ó Pai Ó, ocorreu entre 31/10/2008 até 05/12/2008, sendo que sua segunda temporada ocorre um ano depois, em novembro de 2009. 2 Texto esgotado, Cf.: www.teatrovilavelha.com.br/espbando.html, acessado em 15/11/2009.

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e que não foi expulso do Pelourinho por exemplo. Dado o sucesso da peça, e a

consolidação do próprio Olodum e das manifestações africanas ligadas ao

Pelourinho, o enredo da peça transforma-se no ano de 2007 em um filme com boa

repercussão na Bahia. Aproveitando-se de todos os eventos, aproveitando-se do

carisma de Salvador e o Pelourinho, do grupo Olodum e de uma série de atores

vindos da Bahia, começavam a se consolidar também na região Sudeste. Ó Paí Ó

transforma-se em mais uma série brasileira, e que mais tarde seria escolhido entre

cinco outros programas brasileiros3 que representariam o Brasil na categoria

comédia indicados a receber o Emmy Internacional, que é o Oscar da TV americana

a produções feitas fora dos Estados Unidos. A série, composta de seis episódios

autônomos, levados ao ar todas as sextas-feiras, um ano depois, já está na sua

segunda temporada. Analisar essas diferentes migrações de formatos e de

conteúdo, centrando nossa atenção no seriado televisivo é o nosso objetivo nesse

trabalho. Para tanto procuraremos abrir o trabalho explicando o contexto histórico.

A obra revela uma nova Bahia sem os coronéis e as baianas fogosas, tão

característicos das obras de Jorge Amado. Contemporânea e ativa, esta nova Bahia

ainda carrega os mesmos entraves sociais que marcaram sua história durante

décadas. A comédia substitui o romance nas diversas situações, atestando a poder

do ser humano de rir da própria miséria; talvez como uma nova forma de mostrar a

Bahia.

Em todos os seus elementos discursivos(música, cenário, abertura, cenas,

tramas), Ó Pai, Ó, parece fazer um celebração a baianidade e sua capacidade de

3 Os programas que concorreram juntamente com Ó Pai Ó foram: “Caminho das Índias”(2009) telenovela de Glória Perez, “O natal do menino imperador”(2009) de Péricles de Barros, na categoria Infantil, “ Maysa: quando fala o coração”(2009)minissérie de Manoel Carlos e “Mamonas assassinas: por toda minha vida”(2009) escrito por Maria Camargo, na categoria artes; todos produzidos pela Rede Globo de Televisão.

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resistência ali impostos e a preservação de suas raízes. Reúne elementos

característicos da cultura baiana como as baianas do acarajé (na própria imagem do

personagem Baiana), a crença no candomblé,(vivida pelo personagem Raimunda)

artistas, travestis(vivido por Yolanda), grupos afros(representado por Roque e sua

música), prostitutas(Psilene), malandros(nos personagens de Boca e Queixão) e

crianças abandonadas(ilustrada por Cosme e Damião), numa construção de

identidade local. Estes elementos que caracterizam a baianidade podem ser vistos

como uma representação da vida do baiano que, em tese, difere do resto da nação.

Para Roque Pinto(2001), a noção de baianidade se constitui, basicamente como a:

“... representação quase caricatural de uma suposta cultura

singular, espontânea, criativa, musical, etc – e vendável como um

produto turístico que atende a um segmento específico de consumo.”

(PINTO, 2001, p. 4).

O título Ó Pai Ó, que no linguajar baiano quer dizer “ olhe para isto, olhe”, nos

chama a atenção para o que está acontecendo na Bahia atual. Aquela Bahia

idealizada e construída pela literatura nos diversos livros de Jorge Amado, bem

como nas pinturas de Aldemir Martins e Di Cavalcanti, talvez já não exista mais;

evidenciando o fato de estar passando por transformações significativas. Em seus

três diferentes modos de abordagem, Ó Pai, Ó revela narrativas diferenciadas a

partir do ponto de vista de Márcio Meireles autor da obra teatral, Monique

Gardenberg responsável pelo filme e Guel Arraes, Jorge Furtado, Mauro Lima,

Carolina Jabor, Olivia Guimarães, e o próprio Bando de Teatro Olodum nos seis

episódios da série, revelando o grau de pertinência e envolvimento com a obra

original, ou seja, o quanto essas produções são iguais ou diferentes da obra

original. O objetivo do trabalho é investigar e analisar as formas de representação

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de Ó Paí, Ó ; buscando entender o trânsito da obra em diferentes suportes – cinema

e televisão – como um fluxo decorrente da convergência das mídias, tendo como

foco específico o seriado, onde a pesquisa evidencia que não há apenas um viés

analítico no conteúdo do seriado, uma vez que outros modos de análise são

possíveis. Este trabalho se propõe a estudar Ó Pai, Ó como um processo contínuo

de apropriação, adaptação e migração do teatro para o cinema e do cinema para a

televisão, uma vez que, segundo Henry Jenkins(2008) isto envolve tanto a forma de

produzir quanto a forma de consumir os meios de comunicação. Pois “o que

estamos vendo hoje é o hardware divergindo, enquanto o conteúdo

converge.”(JENKINS, 2008, p. 41). Objetiva mais especificamente estudar o seriado

como uma obra ficcional narrativa e sua relação com os contextos sócio-culturais e

históricos bem como seu desdobramento do cinema para a televisão.

O presente trabalho é uma elaboração baseada na análise da narrativa

televisual e no levantamento de fontes primárias durante e depois de sua veiculação

em outubro de 2009. Se isso permitiu ao pesquisador ser antes de tudo o

telespectador tomado pela novidade, mostrou seus limites na área acadêmica uma

vez que inexistiam outros trabalhos específicos sobre a obra, permitindo um diálogo.

No que concerne a transversalidade de produções audiovisuais, ou seja, pelos

diferentes canais de veiculação, foi possível encontrar bibliografia abundante.

Muitas partes da pesquisa é o fruto de um trabalho de observação, pois a pesquisa

aconteceu enquanto a obra ainda era exibida. Tanto o filme, quanto o seriado,

proporcionaram ao pesquisador a experiência vivida por qualquer telespectador, e

as impressões deixadas por ambos, ficam aqui registradas a luz do conhecimento

de alguns teóricos no assunto.

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CAPÍTULO I

Ó PAÍ, Ó - DA PEÇA AO FILME

1.1 Contexto Histórico

Para compreender o trânsito das representações nas diferentes formas

narrativas de Ó Pai, Ó que tem por ação inicial a expulsão dos moradores do

Pelourinho o que levaria à sua descaracterização sócio-cultural e histórica,

precisamos entender o que era o Pelourinho em meados 1992, quando surge a

peça e como ela ganha projeção a partir da transformação urbana e social sofrida na

época, não como uma conseqüência natural de emancipação, desenvolvimento e

progresso do local, mas como algo que foi imposto.

A peça Ó Paí, Ó, escrita e dirigida por Márcio Meireles4 (1992), e encenada

pelo Bando de Teatro Olodum, conseguiu chamar atenção porque questionava o

projeto de reforma e restauração do centro do Pelourinho atribuída à administração

de Antonio Carlos Magalhães5. O motivo para isso é que quando tomou posse como

governador do Estado da Bahia (1991), ACM havia definido em campanha política

que a prioridade de sua administração seria o incremento à indústria do turismo,

como um fator de expansão e crescimento da capital e do estado da Bahia. Sua

proposta era a recuperação do conjunto arquitetônico tombado pela UNESCO,

localizado no Pelourinho, em meados da década de 60. Tal intervenção deveria

salvaguardar a trama social, evitando a expulsão dos habitantes do local e que

mediante os gastos provocados pelas obras de reestruturação, restauração e

manutenção, os habitantes deveriam receber alguma indenização pelo transtorno.

4 Secretário de Cultura da Bahia, diretor e gestor teatral, criador do grupo Bando de Teatro Olodum 5 Antonio Carlos Magalhães foi governador da Bahia durante os períodos de 1971 à 1974, de 1979 à 1983 e de 1991 à 1994.

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Em sua visitação de avaliação do potencial do Pelourinho, ficou nítido para

Parent6 que um grande problema seria considerar a intervenção no Pelourinho sem

considerar a população que ali vivia. Para ele, a intervenção deveria prever e

contemplar a preservação dos habitantes em seus locais de origem. Apesar das

recomendações de Parent e das normas internacionais para este tipo de

intervenção, a administração do governo de ACM caminhava na direção contrária,

pagando a cada morador a “ justa medida”(A Tarde, 28/07/1993:5) pela

desocupação do local. Para a retirada de todos, buscou-se adequar o perfil de cada

família à índices financeiros de forma que representassem o valor calculado de

indenização de cada família; alegou-se também que aquela população era

incompatível com o desenvolvimento turístico e com a revitalização local, por não

terem condições de manter tal empreendimento.(FOLHA, 1994).

A preservação dos monumentos históricos brasileiros começou a ser discutida

nas primeiras décadas do século XX e na década de 1930, com base no conceito de

função social da propriedade, foi promulgada a primeira lei nacional de proteção ao

patrimônio, o Decreto-lei número 25 de 30 de novembro de 1937. Esta lei dizia que

todos e qualquer imóvel existente no país, cuja conservação fosse de interesse

público, quer pela vinculação com fatos memoráveis da história brasileira, quer pelo

valor arqueológico, etnográfico, bibliográfico ou artístico, poderiam ser integrados ao

patrimônio nacional. Para isso foi criado em 1937 o Serviço do Patrimônio Artístico

Nacional – SPHAN (atual IPHAN), incumbido de inventariar e registrar

manifestações que representassem a cultura brasileira.

6 Michel Parent era consultor da UNESCO enviado ao Brasil em 1967 para consolidação do tombamento do Pelourinho.

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No Brasil, foi adotado o modelo francês na preservação do patrimônio cultural

e antes da criação do SPHAN, existia o Museu Histórico Nacional que era

responsável pela fiscalização dos monumentos e objetos históricos. Criado em

1922, ano do centenário da Independência do Brasil, destinava-se “ a guardar e

expor as relíquias de nosso passado, cultuando a lembrança de nossos grandes

feitos e de nossos grandes homens”7. O museu teve sua estrutura alterada em 1934,

e passou a abrigar a Inspetoria dos Monumentos Nacionais que seria o embrião do

SPHAN. Segundo Márcia Sant´Anna, o patrimônio histórico nacional consiste no

conjunto de bens móveis e imóveis cuja conservação fosse de interesse público,

quer pela sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu

excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico.

(SANT´ANNA, 1995, p. 83 )

No ano de 1967, a pedido do Brasil, a UNESCO, enviou seu representante

Michel Parent para formular uma política para a conservação do patrimônio

brasileiro. A cidade de Salvador impressionou-o de tal forma que propôs o

tombamento de todo seu centro, destacando as possibilidades de exploração “

turístico cultural” afirmando que se a cidade instituísse uma política de preservação

que impedisse a degradação física e social do centro histórico, este poderia vir a ser

“ a principal atração urbana da América do Sul.”( SANT´ANNA, 1995, p. 148-150 ).

A declaração de Antonio Carlos Magalhães de que estava disposto a colocar

recursos do estado para recuperar três ou quatro quarteirões, de modo a tornar o

7 DUMANS, Adolpho. A idéia da criação do Museu Histórico Nacional. Anais do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro, v. 29, 1997. p. 29.

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Pelourinho um cartão postal da Bahia (A tarde, 15 de março de 1992:3), fez com que

o IPAC8( Instituto do Patrimônio Artístico Cultural) divulgasse o projeto de

restauração do Pelourinho fundamentado em uma metodologia na qual se

preservaria a “ volumetria” (fachada) do conjunto, sem a obrigação de manter a

originalidade das instalações internas, barateando assim as obras. A desocupação

para início das obras, provocou a retirada de aproximadamente 350 famílias. A sua

primeira etapa recuperou 104 imóveis onde habitavam 1154 pessoas. As famílias

que foram retiradas de lá agora tinham duas opções que eram: receberiam uma

ajuda e mudariam para outro local, ou esperariam a reforma dos imóveis e

receberiam os imóveis de volta se conseguissem comprovar “ condições para arcar

com os custos do aluguel.” (A TARDE, 1992, p. 3).

Aos poucos o Pelourinho foi sendo modificado e ganhando uma cara nova e

diferente. Surgiam lojas, restaurantes, praças, etc. e a ação do governo ganha

notoriedade nos meios de comunicação e ganha aprovação da elite pela

recuperação do local e o sucesso do projeto que veio a ser motivo de orgulho para

muitos baianos em detrimento daqueles que foram expulsos. Milhões foram gastos e

o deslocamento de 95% dos moradores que lá residiam, agora daria lugar não mais

a residências, mas sim a exploração comercial e atividades de entretenimento de

turistas. O Pelourinho com seus imóveis restaurados, foi inaugurado em março de

1993. O patrimônio histórico e artístico agora estava garantido. Privado de seus

moradores o Pelourinho transformou-se em uma vitrine para ser apreciada pelos

turistas. Durante o dia não se vê mais vida, a não ser a comercial. A noite, a boemia

8 A lei número 12 de 30 de dezembro de 1980 transformou a antiga Fundação do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia – FPACBa numa autarquia sob a denominação IPAC- Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia, estando vinculada a Secretaria da Cultura tem como uma de suas atribuições o tombamento de patrimônios culturais.

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é policiada, “ o Pelourinho se transformou em um cenário(...), um teatro onde se

representa Salvador para turistas”. (AZEVEDO, 1994, p.138).

Como forma de crítica, surge então Ó Pai, Ó pensada por Márcio Meireles

junto com o grupo Olodum, grupo musical atingido também pela cirurgia renovadora.

Ao dar corpo e voz a essa população posta á margem, a peça coloca em cena uma

série de personagens característicos daquela região. Ao fazê-lo, deu forma artística

a novos atores sociais que pela ficção transformam-se em tipos que representavam

a Bahia dos anos 1990. Provavelmente é mais a essa galeria de tipos e menos à

salvaguarda cultural do Pelourinho em 1990 que as Séries Brasileiras da TV Globo

miravam ao transformar Ó Pai Ó num seriado. Vamos aqui procurar acompanhar

essas várias transformações desse acontecimento histórico, social e cultural, tendo

por foco a sua transformação em série televisiva.

1.1.2 A peça

No seu surgimento, a peça Ó Pai Ó( 1992), desenvolvia uma história em torno

de alguns habitantes do Pelourinho. Seus personagens, advindos de outra peça

como Essa é a nossa praia - que foi o primeiro espetáculo do grupo - agora voltavam

aos palcos, assumindo novos tipos. No palco, a peça era ambientada em um cortiço

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onde se instalava uma loja, um bar e algumas famílias que conviviam no mesmo

espaço. A peça discutia problemas como religiosidade, discriminação, pobreza,

extermínio de menores, exploração entre outros temas. Quando surgiu no teatro, o

Bando conquistou imediatamente um público tanto da classe média que não se

identificava com a linguagem acadêmica da Escola de Teatro da UFBA, quanto a

um público de classe baixa que não vai ao teatro, o Bando costumava ir aonde o

público estava, - em escolas públicas e na periferia da cidade – e conquistou

também segmentos de um público formado por aqueles que elaboram e fazem

reverberar um discurso de condenação do racismo e da desigualdade racial.

“ Era mais do que teatro o que propunha o “Bando…”. Para os brancos ou quase brancos estampava a conivência dos mesmos com os privilégios que o racismo lhes oferece, mesmo aqueles anti-racistas. Para os negros estampava cenas, dramas e pequenos ardis anti-racistas ou conformistas que os colocavam indireta ou diretamente no palco. Os negros se viam ali cruamente muitas vezes.”9

Já na sua segunda montagem(2001-2002) o elenco da peça sofre alterações10

uma vez que alguns dos atores saíram o grupo, como é o caso do personagem

Marcelo( Dedé Maurício). Sua saída fez com que desaparecesse seu personagem

na trama. Outros, como a personagem Dona Maria e o Bêbado, por exemplo, foram

substituídos e outros ainda foram assumidos ou absorvidos por outros atores que

permaneciam na peça. Alguns destes personagens não foram criados na peça

original, mas surgiram a partir de substituições e acúmulo de papeis, ou vieram de

outras peças como Bai bai Pelô e Esta praia é nossa, e que juntas, com Ó Paí, Ó,

compunham o que conhecemos como a Trilogia do Pelô.

9 Cf.:http://mundoafro.atarde.com.br/?p=446, acesso em 21/10/2009. 10 Cf.: http:// www.teatrovilavelha.com.br/teatro/bando/bando.htm, acesso em 23/10/2009.

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Na peça Essa é a nossa praia (estreada em 1991 e remontada em 2004),

segundo Marcos Uzel(2003) tinha como inspiração o antagonismo religioso entre

os evangélicos e os adeptos do candomblé. Este antagonismo entre religiões

acompanha a maioria dos episódios do seriado Ó Pai, Ó e é um dos pilares de

discussão da produção, além da descriminação racial e o negro que milita sua

causa:

"Em Essa é nossa praia, ganharam inspiração dramatúrgica temas como os choques culturais entre a igreja evangélica e os adeptos do candomblé; o militante negro engajado na luta contra a discriminação racial; a ideologia do embranqueci mento, (...); a importância das associações de mulheres na batalha por melhores condições de vida; a maternidade e a relação conjugal; o tráfico de drogas, a marginalidade e a prostituição; o sonho de ser artista, (...); a violência e a corrupção policial; o bate-boca cotidiano da vizinhança; e o dia-a-dia suado do gari que queria ter um salário mais digno para poder dar uma vida melhor aos seus filhos". (UZIEL, 2003, P. 55)

Já na peça Bai bai Pelô(1994), Marcos Uzel definiu:

"O diretor Marcio Meirelles (...) costurou a peça com elementos da tragédia clássica, como o coro, as premonições, as coincidências, os acasos, o destino social e o herói, sem abrir mão de uma certa comicidade (mais seca em relação às outras peças da trilogia), considerando que a tragédia não precisa, necessariamente, ir ao encontro do drama psicológico." (UZEL, 2003, p. 89)

Foi somente na sua terceira montagem(2007) que a peça Ó Paí, Ó, toma uma

dimensão que até então não havia alcançado, quando ganha uma adaptação para

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o cinema através da cineasta Monique Gardenberg. É interessante destacar aqui

que as três peças que compõem a Trilogia do Pelô(Bai bai Pelô, Esta praia é

nossa, e Ó Paí, Ó), desde a sua criação e suas remontagens até o presente

momento já haviam passado por diversas alterações. Este trabalho não se atém a

determinar se a obra atual é a mesma que surgiu no ano de 1992, uma vez que

sofreu processos de adaptação, perdeu personagens, houve alterações de papéis,

mudou-se o roteiro, etc. Mas é interessante ressaltar que, provavelmente a obra

atual já não é a mesma como imaginada pelo seu autor devido às diversas

mudanças. Seria possível afirma que após tantas mudanças sofridas, a obra tenha

passado pelo processo de descaracterização? Pelo menos na transmutação da

peça para o filme encontramos várias lacunas. A inserção ou subtração de

personagens pode ser um exemplo disso. Em entrevista para o jornal A

Tarde(2008), Monique descreve algumas dessas alterações:

“ O personagem do Boca (Wagner Moura) não existia na peça e foi criado para o filme. Já o Roque, vivido por Lázaro Ramos, é a mistura de duas personagens que tinham na peça, a Mary Star, que era uma menina do interior que vinha para tentar fazer sucesso como cantora, mas ela era totalmente ignorante. E a graça dela estava na sua ignorância. E também o Severino, um lixeiro que gostava de Roberto Carlos. Em ambos os casos, eram personagens muito ignorantes e no caso de Roque eu dei a ele um pouco de erudição, na medida em que ele quer ser cantor e compositor.”11

Em sua temporada no Rio de Janeiro que datam de 04/12 à 21/12/2008, o

Bando reapresentou algumas de suas peças de sucesso entre elas Áfricas( peça

voltada para o público infanto-juvenil), Ó Pai, Ó, Cabaré da Rrrrraça e Sonho de

uma noite de verão, sendo que a peça Ó Pai, Ó foi uma releitura da peça exibida em

11 Cf. entrevista de Monique Gardenberg em www.atarde.com.br/cultura/noticia.jsf?id=740786, acesso em 21/11/2009.

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2000, época em que o bando completava 10 anos de atuação.12 Talvez essa

mobilidade ou inconstância que surge em cada apresentação das peças, seja

uma característica própria do Bando uma vez que usam de muitas improvisações

nos diálogos, além do próprio bando ser responsável muitas vezes pela redação

final dos episódios, no caso do seriado. Quando questionado a respeito do

andamento de Ó Pai, Ó e seus próximos capítulos no formato de seriado na Rede

Globo, Marcio Meireles autor e diretor da peça, disse:

“ No meio de 2006 começou a conversa sobre a série. Mesmo antes de fechar contrato, começamos a trabalhar com a possibilidade, criar personagens que não estavam na peça nem no filme. E cheguei a trabalhar em um ou dois episódios no processo de improvisação, de reconstrução e de discussão. Os outros acompanhei mais de longe. Então eu conheço os roteiros e eles têm alternância, tem alguns mais dramáticos, uns mais políticos, uns mais românticos, então minha expectativa é boa. Agora a expectativa diante da regionalização das produções audiovisuais, acho que também é um esforço ligado ao Estado.”13

A peça Ó Pai, Ó é então, o grito do excluídos, daqueles que foram colocados

a margem, daqueles que não foram inseridos nesta transformação ocorrida no

Pelourinho, na visão de Márcio Meireles. Foi uma forma de protestar e dar essa

visão, aos moradores do Pelourinho. Encenado em palco, provavelmente com uma

montagem e cenários rústicos, contava com pouco espaço para mostrar ou fazer

uma alusão ao verdadeiro tratado do que vem a ser a peça como registro histórico

da questão do Pelourinho. Embora no palco o cenário da peça se restringisse ao

cortiço, que abrigava ao mesmo tempo os moradores, a loja de seu Jerônimo e o bar

de Neusão, a peça apontava para os problemas que estavam fora do cortiço: a

intervenção do governo no Pelourinho, a questão do racismo, etc.

12 Cf.: http: //oglobo.globo.com/cultura/rioshow/mat/2008, acesso em 29/01/2010. 13 Idem

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A peça permaneceu durante um bom tempo em cartaz, mas com o tempo foi

perdendo lugar para as demais peças que surgiam e que evoluíam junto com o

grupo. Embora tenha surgido em 1992, o tema e a proposta continuam atuais. Foi

somente na sua terceira remontagem ( 2007 ) que a peça Ó Paí, Ó, toma uma

dimensão que até então não havia alcançado, quando ganha uma adaptação para o

cinema através da cineasta Monique Gardenberg. Devido ao surgimento do filme e

da polêmica criada em torno da obra, a peça Ó Pai, Ó também volta aos palcos com

o Bando de Teatro Olodum caracterizando uma retroalimentação entre os formatos.

1.1.3 Olodum e o Bando de Teatro

Descendente de grupos afros como o Ilê Aiyê, Filhos de Gandhi e outros, que

eram movimentos negros que lutavam pela emancipação do negro nos diversos

setores da sociedade, o Olodum surge na luta contra a discriminação, buscando

assegurar os direitos civis, fomentando e estimulando a auto-estima e emancipação

dos negros a nível de Bahia e Brasil. Seu objetivo era preservar, valorizar e expandir

a cultura afro-brasileira tornando populares os temas da história africana vinculados

a história do negro no Brasil, constituindo um passado de identidade das duas

nações. O Olodum tinha, enquanto bloco, o objetivo de entreter os habitantes do

Pelourinho. A partir desse movimento, a musicalidade do carnaval da Bahia ganha

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força com os ritmos oriundos da tradição africana, cubana e de outros ritmos,

favorecendo o reconhecimento de uma identidade peculiar baiana,

predominantemente negra. Posteriormente seu discurso muda e então passará a ter

uma postura mais engajada em questões sócio-raciais e religiosas. Apesar de não

haver predileção política, era comum presenciar os “ showmícios “ nas campanhas

políticas.

Criado oficialmente em 25 de abril de 1979, o Olodum, é uma Organização

não Governamental (ONG) do movimento negro brasileiro, um bloco-afro do

carnaval baiano, surgido num período carnavalesco como opção de lazer e

entretenimento aos moradores do Pelourinho, que permitia e garantia aos mesmos

uma forma organizada de diversão. A palavra Olodum é de origem yorubá e no ritual

religioso do candomblé significa "Deus dos Deuses" ou "Deus maior", Olodumaré,

que não representa um orixá, e sim, o Deus criador do universo e dele senhor. O

Olodum prega que o negro não é necessariamente aquele que tem traços

fenotípicos característicos, e sim aquele que abraça a luta pela valorização da

negritude.

Os sindicatos começam a partir de 1981 a dar apoio ao Olodum e são

realizadas as primeira atividade relacionadas ao movimento negro na Bahia. A partir

daí precisou-se rever os ideais, metas e objetivos do grupo que apesar de se dizer

apartidário começava a participar de comícios políticos e após quatro anos, seus

diretores já estavam aderindo a diferentes partidos políticos. Os diretores não

queriam mais apenas um bloco carnavalesco e adotaram a África negra como fonte

temática. No auge do sucesso o Olodum começa a lutar por mais verbas públicas e

direciona-as às organizações afro-brasileiras. As mudanças se dariam também em

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toda a forma de expressão uma vez que não mais retratariam a África e sim a Cuba

e Jamaica, sua cultura, seu povo e sua música o que viria a originar o samba-reggae

que se tornou característico do Olodum.

Fundado em 1990, sob a direção de Marcio Meirelles e Chica Carelli, o Bando

de Teatro Olodum, ou simplesmente o Bando como é mais comumente chamado,

tem seu teatro fortemente marcado pela cultura Afro-brasileira. Depois de algum

tempo o Bando de Teatro Olodum se desligou do bloco-afro, se fixando no Teatro

Vila Velha que passou por uma reforma devida a ocupação do Bando, sendo

revitalizado em meados de 1994. Já em 1998 foi reinaugurado, tornando-se local

permanente do grupo até os dias atuais. Focado nas questões do negro brasileiro

em seus diversos aspectos, o Bando, desenvolve uma linguagem própria em um

formato de teatro experimental negro. Ao longo desses anos de existência, a partir

das improvisações de seus atores e da reflexão sobre a realidade sócio-cultural do

negro no Brasil, Marcio Meirelles desenvolveu uma dramaturgia atual e voltada as

questões sociais.

Num primeiro momento, o Bando focou o Pelourinho retratando este bairro

estigmatizado como zona de marginalidade até a sua reforma nas três peças que

formam a Trilogia do Pelô. (“Essa é a Nossa Praia”, “Ó Pai Ó” e “Bai bai Pelô”).

“ Damos vós a essa gente que não está em nenhum palco. E não

abrimos mão do humor, que faz parte da cultura da Bahia:

mesmo o povo sofrido e excluído sempre tem auto-gozação.” 14

Na peça O novo mundo, o grupo incursiona no universo sagrado do

Candomblé. Já na peça Zumbi(1995) voltou-se para a realidade da perifieria da

14 Cf.: http://oglobo.globo.com/cultura/rioshow/mat/2008/12/04/bando-de-teatro-olodum-estreia-pai-no-teatro, acesso em 22/10/2009.

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metrópole, em meio às celebrações pelos 300 anos de Zumbi dos Palmares.

Enquanto Xirê/Erê pra toda a vida, abordou a Chacina da Calendária, no primeiro

espetáculo de dança do Bando. Cabaré da Rrrraça(1997), o maior sucesso do

grupo, até então, em cartaz há 10 anos, aborda a discussão racial, numa

combinação de desfile de moda com talk-show.

Outra peça: Relato de uma guerra que não acabou(2002) é resultado de uma

pesquisa junto a comunicade dos subúrbios sobre a greve da Polícia Militar e suas

consequências. O grupo montou textos clássicos, imprimindo a sua estética, como

Woyzeck de Buchner e Medeamaterial, protagonizada pela atriz Vera Holtz e com

música de Heiner Goebbels, a Ópera de três mirréis e, mais tarde, a Ópera de 3

reais, duas versões do clássico de Bertold Brecht. Um tal de Dom Quixote(1998) que

reinaugurou o Teatro Vila Velha e o Sonho de uma noite de Verão(1999).

Em 2003 o grupo montou textos de João Augusto, fundador do Teatro Vila

Velha, para o espetáculo Oxente, Cordel de novo? O Muro(2004) texto inédito da

dramaturga Cacilda Povoas, fruto da oficina de dramaturgia do Royal Court Theatre.

E Auto-retrato aos 40, em comemoração de 40 anos da fundação do teatro. O grupo

vem participando de diversos eventos representativos das artes cênicas no Brasil e

no exterior. Com o espetáculo Xirê/Erê pra toda a vida , participou do LIFT, London

Internacional Festival of Theatre. Representou o Brasil na estação da Cena

Lusófona,em Coimbra.

Participou das comemorações da Semana de Teatro em Angola, a convite do

Ministério da Cultura de Angola. Participou da Copa da Cultura(2006), evento do

Ministério da Cultura, representando o Brasil na Alemanha no Festpiele in

Ludwigshafen com a nova versão de Sonho de uma noite de verão. No Brasil, o gruo

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participou do Festival de Inverno de Belo Horizonte, do Festival de Arte Negra(MG),

do Carlton Dance Festival, da Mostra Arte da África, Teatro no Centro Cultural

Bando do Brasil(RJ), da Mostra Latino-Americano de Teatro de Grupo, realiada pela

Cooperativa Paulista de Teatro, do Projeto de Circulação da Caixa, patrocinada pela

Caixa Econômica Federal, em Brasília entre outros. O Bando de Teatro Olodum tem

sido reconhecido por representar uma estética inovadora e brasileira, como

comprova a escolha da peça Cabaré da Rrrraça realizada pelo Itamaraty para ser

apresentado a diplomatas de 16 países africanos e o fato de ter sido selecionado

pelo Projeto Cena Aberta dos Ministérios da Cultura e do Trabalho. Sob a direção da

cineasta Monique Gardenberg o Bando ou parte de seus integrantes participam de

Jenipapo(The Interview)no ano de 1995, e somente mais tarde, no ano de 2008

começariam a gravar as primeiras cenas de Ó Paí, Ó, o filme e depois Ó Paí, Ó, o

seriado para a Rede Globo.

1.1.4 Experimentando novos atores: o amálgama dos i ntérpretes

Durante muito tempo, nas telenovelas e minisséries, o telespectador observou

que “o Brasil nunca foi um paraíso da democracia racial”(ARAUJO, 2000). Sempre

relegados a papéis secundários e quase ao anonimato, os negros viam e eram

vistos de forma distorcida e discriminada na teledramaturgia brasileira. Sua

representação diminuta e quase imperceptível nos meios de comunicação dava a

dimensão da visão estereotipada que se tinha de tais indivíduos. A contribuição do

negro na formação e construção da população bem como a cultura brasileira tem

sido ignorados ou retratados de modo negativo:

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“ Ao caracterizar o negro de modo estereotipado, a telenovela traz, para o mundo a ficção, um imaginário que permeia as relações entre brancos e negros no Brasil; revela o universo presente nessas relações, atualiza crenças e valores pautados por esse imaginário que não modernizou as relações interétnicas na nossa sociedade.” (ARAUJO, 2000:13).

No seriado Ó Pai Ó o ponto forte é a atuação de atores que na sua maioria

são negros, vemos um elenco onde a predominância negra é inquestionável. Entre

atores como Stênio Garcia, Mateus Nachtergaele, Wagner Moura e tantos outros,

destacou-se na opinião pública o Banco de Teatro Olodum. Com uma atuação

considerável, o Bando conseguiu ficar no mesmo pé de igualdade com os atores já

consagrados pela crítica. Provindos do teatro, o grupo experimentou sua atuação

frente as câmeras no filme e depois na televisão. Sua experiência e a forma como

dão realismo aos personagens surge desde o momento em que saem em campo e

pesquisam sobre seus personagens, seja nas ruas estreitas do Pelourinho, nos

bares, nos prostíbulos, não importa. A decisão de usar atores não-profissionais, que

remete ao movimento neo-realista italiano (Roberto Rossellini fazia isso em 1945,

situação visto também no cinema russo), é um grande trunfo do cinema, pois estes

atores dão ao filme uma credibilidade, um censo de realidade nem sempre obtido de

outra forma. André Bazin dizia que:

“ Não é a ausência de atores profissionais que pode caracterizar historicamente o realismo social do cinema, tampouco a escola italiana atual, mas precisamente, porém, a negação do princípio de vedete e a utilização indiferente de atores profissionais e atores ocasionais.”( BAZIN, 1991, 238).

Essa foi uma estratégia extremamente esperta, pois os mesmos atores que

encenam a peça, estão também no filme. O filme fala de negro, personagens que

de outra maneira nunca seriam protagonistas, estariam sempre como coadjuvantes

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ou talvez figuração. Pela primeira vez você tem um filme que tem isso exposto de

uma forma nacional. De um elenco que migra do teatro para as telas do cinema e

depois para as telas da TV, seria natural uma exposição exacerbada, uma

encenação meio teatralizada com a voz muito projetada e as vezes com trejeitos e

gesticulações próprios do teatro. Os atores do Bando por muitas vezes, comentavam

sobre sua nova experiência de fazer filmes e de como estava sendo sua atuação

diante das câmeras, que difere muito de atuar em frente ao público. No palco,

quando se está atuando, é possível ter um retorno de imediato, pois o público

esboça seus sentimentos de aceitação, negação, riso, tristeza, etc.

Mas diante da câmera, não se tem este retorno de imediato o que dificulta a

atuação. Não se pode atuar esperando um retorno imediato do público, porque o

público não está lá. Comentando a esta diferença, a atriz Jamile Alves que está

desde 2002 no Bando de Teatro, e faz o papel da professora no filme, comentou que

“...no palco, a resposta do público é imediata. Na tevê, a gente demora a ver o

resultado”; assim como Jorge Washington, membro do Bando de Teatro Olodum e

intérprete de Matias, um vendedor ambulante de cafezinho que é militante das

causas negras, fala das diferenças em relação ao teatro:

“Monique (Gardenberg) falava muito pra gente, pedia pra diminuir a carga dramática, para ser mais econômico na interpretação, já que no teatro tudo é grandioso, no cinema, tem que fazer menos, mas, quando vê na tela, a gente entende por que ela pede.”15

15 Depoimento de Jorge Washington Cf.: www.atarde.com.br/cultura/noticia acesso em 21/10/2009

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Lázaro Ramos, começou no Bando em 1995, depois do que atuou em

diversas novelas como, por exemplo, Cobras e lagartos(2006), Duas caras(2007) e

filmes como Jenipapo(1995) da própria diretora Monique Gardenberg, Madame

Satã(2002), O homem que copiava(2003), Meu tio matou um cara(2004) e também

atuou em diversas montagens do grupo, como Sonho de uma Noite de Verão, Já

Fui! e Ó Paí, Ó, entre tantas outras. Apesar de não integrar oficialmente o Bando,

Lázaro diz que:

“Eu não assumiria como responsabilidade do Ó Paí, Ó representar a baianidade. A série representa um grupo de pessoas que vive num lugar determinado, numa situação determinada. Isso é uma novidade e é autêntico, já que veio das ruas em 1990, devido ao longo trabalho do Bando”16

Atualmente, a indústria audiovisual parece ter aberto concessões sem

precedentes a diversidade racial. Com a volta do Bando(no seriado da TV), além de

Tais Araújo, atriz negra como protagonista na novela das nove(Viver a Vida, 2009) e

Camila Pitanga também negra na novela das seis(Cama de Gato, 2009) da Rede

Globo, mostram como os negros parecem conquistar seu espaço da

teledramaturgia.

“ Eu queria, se possível, que todos os atores fossem baianos. (...)Então, através dessas quatro figuras (Lázaro Ramos, Wagner Moura, Stênio Garcia e Dira Paes), o bando pode conviver com pessoas habituadas a fazer cinema, a trabalhar com um tipo de interpretação mais próxima ao naturalismo do cinema do que a maneira de se exprimir do teatro, sempre com a voz muito projetada. O Bando é um grupo que trabalha com a voz muito projetada. Então teve todo um trabalho de reeducação que era pedir para os mesmos atores falarem os mesmos diálogos, mas de outra maneira.”17

16 Depoimento de Lázaro Ramos, conforme www.atarde.com.br/cultura/notícias, acesso em 09/12/2009. 17 Cf. entrevista concedida por Monique Gardenberg em www.atarde.com.br/cultural/noticias, acesso em 18/10/2009.

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Na adaptação do teatro para o cinema, Ó Pai, Ó se agiganta e como um

divisor de águas mostra de uma lado, seus admiradores e de outro seus críticos. Se

antes a produção teatral era pedra, uma vez que fazia a crítica ao sistema de

governo a tomada do Pelourinho, a expulsão dos moradores, agora como uma

produção cinematográfica se torna vidraça, passível de toda e qualquer crítica.

1.2 Ó pai, ó: o filme

A peça Ó Paí, Ó, só se tornou nacionalmente conhecida quando a cineasta

Monique Gardenberg se apropriou do tema e a transforma em filme homônimo no

ano de 2007. Monique Gardenberg é considerada por muitos como uma artista

multimídia, com atuações na música, dança, videoclipe, teatro e cinema. Filha de

mãe baiana e pai judeu polonês, Monique nasceu em Salvador-BA, em 1958,

vivendo dos quatro aos 15 anos em Santos-SP, após o que voltou para Salvador.

Em 1975, mudou-se para o Rio de Janeiro, formando-se em economia pela

Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em 1982, fundou, com sua irmã, Silvia

Gardenberg, a Dueto Produções, na qual produziria eventos culturais, entre eles a

co-produção com a Rede Globo na produção de Ó Paí Ó.

Monique já produziu eventos culturais como o Free Jazz Festival, o Carlton

Dance Festival, além de shows do porte de Madonna, Rolling Stones e Elton John.

Com uma curta experiência no cinema, lançou Jenipapo (Drama, 96 min) em 1996,

seu primeiro longa-metragem selecionado para o Sundance Film Festival e os

Festivais de Toronto e Roterdã. Fez seu segundo longa chamado Benjamin(2004)

com roteiro baseado no livro homônimo do compositor e escritor Chico Buarque.

Depois de ter visto a peça Ó Pai Ó em cartaz (1994), Monique Gardenberg sabendo

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da desistência de Caetano Veloso que pretendia transformar a peça em filme,

Monique decidiu se aventurar a fazê-lo:

“.... eu quis fazer, mas não encontrava o caminho. Em 2005, eu fui à Bahia e voltei com muita vontade de falar da minha terra, que me emociona muito. Tomei coragem, reli a peça diversas vezes e comecei a tentar imaginar cenas. A primeira coisa que me impus foi explicar na primeira cena o que é Ó Paí, Ó. Quando consegui criar a cena, veio um estímulo imenso.”18

A diretora por vezes, confessou o seu temor de adaptar a peça para o cinema.

De fato, o lançamento do filme foi cercado de muito preconceito dos críticos e da

mídia em geral por conta de vários eventos com propósito de promover o filme, o

que contribuiu para que a obra sofresse preconceito, o que levou a diretora a

comentar:

“ Não mudamos o nome, muita gente mudaria. Teve um artigo no "O Globo" (...), dizendo que o filme está fadado ao fracasso por causa do título. Nada foi concedido nesse sentido artístico, eu fiz da maneira mais legítima e fiel que eu pude fazer. Não concordo com esse pensamento, lamento e acho uma pena porque só demonstra um pensamento pequeno que eu conheço que tem na Bahia, na minha família, nos meus amigos. Enquanto as pessoas pensarem pequeno não vão sair do lugar. ”19

O marketing agressivo do filme, serviu para chamar atenção do público para o

cinema nacional. Particularmente em Ó Pai Ó, o lançamento do filme era composto

pela poderosa produção de Paula Lavigne20, o apoio da Globo Filmes e até um trio

elétrico em pleno domingo de Carnaval em Salvador com chamada direta para o

18 Cf.: http:// www.terra.com.br/istoegente/396, acesso em 26/11/2009. 19 Cf.: entrevista de Monique Gardenberg em.. www.atarde.com.br/cultura/noticia.jsf?id=740786, acesso em 21/11/2009.

20 Paula Mafra Lavigne, além de atriz é uma produtora cultural tendo como trabalhos a produção de “ Lisbela e o prisisoneiro”(2003) dirigido por Guel Arraes, “Benjamin”(2003) de Monique Gardenberg, “Meu tio matou um cara”(2004) de Jorge Furtado, “2 filhos de Francisco”(2005) de Breno Silveira e “O coronel e o lobisomen”(2005) de Maurício de Farias, entre outros.

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jornalístico Fantástico. Reafirmando a origem de Ó Pai Ó, para aqueles que

questionavam se a obra era uma obra puramente baiana, a diretora se auto afirma

como diretora do cinema novo baiano: “ me orgulho em dizer que faço parte, talvez,

de um movimento muito forte do novo cinema da Bahia. Mas se não me quiserem,

tudo bem”.21

O filme Ó Paí, Ó, produção conjunta da Dueto Filmes e Globo Filmes, conta

a história dos moradores de um cortiço no centro histórico do Pelourinho, em

Salvador. Embora na peça, a trama se dê pela revolta dos moradores, cuja única

arma é a crítica ao Estado representado pelo governador Antonio Carlos Magalhães;

no filme, a adaptação de Monique Gardenberg deixou de lado essas disputas e

focou o dia a dia dos moradores, traçando assim as aventuras e desventuras dos

moradores do Pelourinho e graves problemas sociais. A concepção formal do filme

se baseou em tomadas rápidas, quase frenéticas, sem espaços para devaneios e

reflexões. Carregando no sotaque e atuação teatral, os personagens parecem

tornar-se caricaturais, de uma Bahia idealizada. A idéia era, “... um retrato

irreverente e musical de uma Bahia pop e contemporânea.”22 A esta série de

eventos e ações, o que não faltou foram duras críticas ao filme:

“ Parece existir em Ó Paí Ó, um filme melhor querendo sair de dentro da confusão que é o resultado final, onde moradores do Pelourinho com amores, decepções e alegrias parecem transformados a tapa em figurantes de uma campanha agressiva da Bahiatursa para vender a Salvador carnavalesca no que ela tem de mais “ típico” – “suor”, “ amor”, “ calor”, “ paixão”, “axé”, “pelô”, “Bahia”, etc. Nada disso, claro, está na tela, uma vez que Ó Paí Ó, como boa parte da cultura feita no Brasil hoje, o cinema especilamente, é uma obra sem fricção, sem tensão ou comentários que nos levem a ver o interessantíssimo Brasil

21 Cf.: entrevista de Monique Gardenberg em.. www.atarde.com.br/cultura/noticia.jsf?id=740786, acesso em 21/11/2009. 22 Cf.: http: //tvglobo.opaio.globo.com/novidades, acesso em 02/02/2009.

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contraditório na tela. É uma coisa alegre e perdida com nada a dizer, uma ironia num filme onde tanta gente grita tanto.”23

Além da expectativa de como seria a recepção do filme em outras capitais,

uma das dúvidas suscitadas era se Ó Paí, Ó, podia ser chamado e reconhecido

como uma produção baiana?

“... Esse filme vai ser vítima de muito preconceito. Eu já sabia disso quando eu fiz e vou continuar enfrentando alguns preconceitos até na Bahia. Sou baiana, é o lugar que eu amo, um lugar que eu quis homenagear. O Paí, Ó é uma história feita por um grupo de teatro da Bahia, que se passa no Pelourinho, encenado por atores baianos, dirigido por uma diretora baiana e cuja equipe, se você for contar, tinha tantos baianos quanto cariocas e paulistas. Você condenar um filme ou você negar sua pátria a ele porque não usou a equipe da Bahia é um absurdo. Equipe de cinema é algo que você tem sua identificação, você trabalha com as pessoas que já tem um diálogo. Então quer dizer que se você grava em estúdio americano, como o da Universal, como o Caetano grava, não é mais baiano? Acho isso pobre, empobrece a Bahia e a nossa união. Estaremos sendo vítimas do mesmo preconceito que o filme expõe. É um preconceito ridículo, pensamento pequeno vindo de pessoas que trabalham com cinema, o que horrível. O outro aspecto disso que também é muito lamentável é um pensamento ainda meio "xiita" que a gente tem: acho que esse tipo de visão de preconceito contra a Globo e contra a produção sempre muito forte da Paula Lavigne não traz nada de bom para o cinema. No cinema, não basta você ter talento. Você precisa ter a propaganda para chegar até o público. Senão você morre na primeira ou na segunda semana como está acontecendo com a maioria

dos filmes brasileiros. “24

Ainda na linha de críticas lançadas ao filme, verificou-se uma aversão ao filme

por parte de muitos, principalmente dos baianos que se sentiram incomodados pela

exacerbação do filme em relação aos tipos caricaturais da Bahia moderna. O

discurso da baianidade do filme, para muitos, parece ter distorcido a realidade que

se vive lá. A malemolência que se esperava do elenco, foi mudada por um elenco

23 Cf.: http://cf.uol.com.br/cinemascopio/criticaf.cfm?CodCritica=1402, acesso em 02/04/2009. 24 Cf. entrevista concedida por Monique Gardenberg em.. www.atarde.com.br/cultura/noticia.jsf?id=740786, acesso em 21/11/2009.

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hiperativo, festeiro, sensual e dado ao vício. O sentimento de aversão ao filme

beira a rejeição pela forma como o filme retratou a Salvador.

“Salvador... não passa disso, de uma cidade que cheira a dendê, a folia e sensualidade excrachada, quase pornográfica. Se não fosse essa a idéia geral que o senso comum faz da capital, se não é essa a idéia que orgãos de turismo vendem de Salvador no exterior....como se justifica cenas como as da série Ó Paí Ó, ambientada em um Pelourinho que só existe na ficção? (...) Alguém lembre aos roteiristas da Globo que o Pelourinho, patrimônio hitórico e cultural da humanidade pela Unesco, coalhado de casarões, igrejas e outros prédios que contam um pedaço da história do Brasil...virou território do crack, da violência, da exclusão. (...) Boa parte do que surge por lá ajuda sempre a reforçar a idéia de festa, sensualidade, negriturde no que ela é atribuída em força física e potência sexual, mas destituída do reconhecimento de humanidade.”

De acordo com a crítica acima, pode-se perguntar como vender uma Bahia a

não ser pelos meios ou formas já conhecidos? Uma Bahia, onde a sensualidade e a

folia movimentam o povo, pois se a imagem for de violência, drogas e prostituição,

quem vai querer comprar? Das diversas formas de mostrar o Pelourinho, decidiu-se

mostrar um Pelourinho festivo, onde o sexo está aflorado na pele de seus

moradores e a musicalidade faz parte de todas as manifestações culturais, de

entretenimento ou reinvindicação. Mas apesar do Pelourinho ter sido mostrado

assim, o que ocorre lá é o mesmo que ocorria antes da restauração, ou seja,

continua uma zona de marginalidade, prostituição e violência, o que põe o filme Ó

Paí, Ó em xeque.

Talvez um total sentimento de repulsa explique esta aversão a produção do

filme Ó Paí Ó. O próprio nome do filme, é um convite ao telespectador para que

veja o que é, como está e o que se passa na Bahia. O filme, embora ficção, se torna

um registro de uma época e de um local. E aqui, especificamente, o filme não está

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preocupado com a estética da beleza, mas sim a dar voz ao povo que até então não

tinha essa oportunidade. Das tantas formas de retratar o Pelourinho, esta foi uma

delas. Mesmo assim o povo vem aos meios de comunicação e expõe seu

inconformismo com Ó Paí, Ó, pois para alguns, ao tratar da Bahia, a obra fez uma

leitura errada do local:

Ó Paí Ó, me envergonha como baiana. A baianidade do borogodó me envergonha. As ruas sujas e mal cheirosas de Salvador me envergonham. Fruto do descaso de sucessivos governos e tanto faz se é direita ou esquerda, todos são igualmente indiferentes e inoperantes, com excessão da maquiagem estratégica aqui e alí. A ditadura do axé, que transforma todo e qualquer ritmo que nasça na cidade, em periférico(pagode) ou alternativo, me envergonha. Lamento que das músicas de Caymmi e dos romances de Jorge Amado tenham sido extraídas, anuladas, deturpadas, pela competente propaganda oficial, toda humanidade, toda a miséria, toda a alegria, mas todas as lágrimas, toda a complexidade de relações sobrevivem, ou se modificam, a partir das antigas sociedade pautadas na mistura entre a casa grande e a senzala...É visão eurocêntrica, visão de quem se julga superior e que desmerece através da piadinha pronta, que reduz ao corpo e ao sexo todo um povo. Apesar de saber que é empreendimento utópico, lanço aqui o meu manifesto a favor de uma Salvador que transceda Ó Paí Ó.”25

25 Crítica feita a Ó Pai, Ó, conforme www.mardehistorias.wordpress.com/por-uma-salvador-para-alem-de-o-pai-o, acesso em 22/11/2009.

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1.2.1 O que é o filme?

O filme mostra os moradores de um cortiço localizado no centro histórico do

Pelourinho, e sua preparação para comemorar o último dia do carnaval quando são

pegos de surpresa por uma notícia inesperada. Dona Joana(Luciana Souza), que é

dona do cortiço e que nunca recebe os pagamentos do aluguel em dia, decide puní-

los, cortando o fornecimento de água do prédio. A falta d'água faz com que o

aspirante a cantor Roque (Lázaro Ramos); o motorista de táxi Reginaldo (Érico Brás)

e sua esposa Maria (Valdinéia Soriano); o travesti Yolanda (Lyu Arisson), amante de

Reginaldo; a jogadora de búzios Raimunda (Cássia Vale); a homossexual dona do

bar Neuzão (Tânia Tôko) e sua sensual sobrinha Rosa (Emanuelle Araújo); Carmen

(Auristela Sá), que realiza abortos clandestinos e ao mesmo tempo mantém um

pequeno orfanato em seu apartamento; Psilene (Dira Paes), irmã de Carmen que

está fazendo uma visita após um período na Europa; e a Baiana (Rejane Maia), de

quem todos são fregueses; se confrontem e se solidarizem diante do problema. Mas

fala ainda de outras questões. Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, Monique

Gardenberg afirma:

“... o filme é uma comédia com fundo sério, mostra o Carnaval

visto por baixo, e toca em pontos nevrálgicos do país, sem

perder o humor ( FOLHA, 30/03/2007)”.

No filme, existe total cumplicidade entre os moradores do cortiço. Esta

cumplicidade advém muitas vezes da intromissão de querer saber o que acontece

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com a vida dos demais moradores, que se revela ou que se vê através das frestas

nas finas paredes e através do assoalho do cortiço, que descortinam a vida alheia.

Até mesmo o falatório alto e despudorado, dentro do cortiço se torna um convite aos

outros moradores para opinarem sobre determinado problema. Todos compartilham

dos mesmos problemas, principalmente aqueles que dizem respeito ao cortiço,

como é o caso da antipatia e aversão pela síndica do prédio, Dona Joana. No início

do filme, durante os créditos iniciais, ouve-se ao fundo uma voz off de uma estação

de rádio, narrando que aquele seria o último dia do carnaval. A mesma voz do rádio

é intercalada por barulhos de batidas de martelo na madeira. Quando aparece a

primeira imagem, vemos que quem está ouvindo o rádio é Roque(Lázaro Ramos),

aspirante a cantor que dentro de sua oficina concerta carros de comerciantes

ambulantes.

Ao ouvir a musica “É D´oxum”(autoria de Jerônimo), Roque começa a

dançar, quando de repente entra na sua oficina Rosa(Emanuelle Araújo) que é

sobrinha de Neusão. Sem ser percebida Rosa observa Roque dançar de forma solta

e sensual. Roque percebe a presença da moça, automaticamente ele para de

dançar e pergunta em que pode ajudar; ao que a moça tira a roupa e deixando os

seios a mostra, e pede a ele que possa pintá-la para o desfile de carnaval. Neste

momento Roque olha para a câmera e, dando-nos a sensação de que estamos

presentes no local, exclama: Ó Pai, Ó (olhe para isso, olhe)!

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“ Eu comecei a esboçar um caminho quando eu escrevi a primeira cena do filme, que é quando a Emanuelle Araújo chega à oficina para pedir para ser pintada. Na verdade, eu tinha me perguntado como eu poderia explicar algo que no primeiro instante a pessoa entendesse o que é “Ó Paí, Ó”. Isso pra Bahia é muito fácil, mas para o resto do pais não é. Até hoje, as pessoas falam errado aqui, mesmo depois de assistir ao filme. Então eu queria uma cena que explicasse de cara isso. Eu achei divertida essa idéia porque imediatamente já estabelecia duas coisas: o tom da brincadeira, da safadeza que o filme ia ter, além da sensualidade do homem e da mulher negra. E traz também a música, outro elemento que eu queira que fosse forte. ”26

Os personagens de Ó Pai, Ó já vêm para as telas (cinema e televisão) com

longa experiência nos palcos da Bahia, sem contar que participam na elaboração da

trama. Suas improvisações nas gravações tornam as cenas mais naturais, fazendo

com que os personagens pareçam estereotipados mas não inverossímeis. No

decurso do filme é possível identificar alguns personagens que evocam os principais

pilares de argumentação da obra, tais como a baiana, o taxista, a evangélica, o

travesti, etc. Embora a obra seja um mosaico de personagens que caracterizam os

moradores da região, existem alguns personagens neste mosaico que parecem

saltar aos nossos olhos. São eles :

a) Psilene e sua vida pregressa: a prostituição

26 Cf. entrevista concedida por Monique Gardenberg em www.atarde.com.br/cultura/noticia.jsf?id=740786, acesso em 21/11/2009.

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Psilene(Dirá Paes) que chega de viagem que fez ao exterior. Toda

dissimulada, Psilene é ovacionada pelos moradores do Pelourinho pelo fato de ter

vindo de fora, principalmente por Reginaldo que se sente atraído por ela. No

primeiro momento, o telespectador percebe que ela carrega um certo segredo com

ela. Sempre que questionada sobre sua vida lá fora e sobre seu marido, Psilene

descreve-os com muito glamour, mas não se tem idéia do porque dela estar aqui no

Brasil e se sua viagem é breve. Mas ao final do filme, pode-se entender que Psilene

havia saído do Brasil como tantas outras mulheres como uma mercadoria para o

mercado de prostituição de mulheres.

Numa conversa entre Lúcia, que trabalhar no antiquário de seu Jerônimo, e

Psilene, que acabara de chegar da Suíça, surge à pergunta, sobre o que era preciso

para ir para o exterior. Lúcia fala de em seus esforços para sair do país, como curso

de inglês, pelo passaporte que já havia tirado e até tinha tomado banho de folha

sem sucesso, ao que Psilene responde: “... repare nega, para ir para o estrangeiro

você não precisa de nada disso, não precisa nem falar inglês; e sabe por quê?

Porque gringo gosta ó... de bunda, de peitão, sabe um peito com muito silicone.” Ao

que baiana interrompe a conversa e pergunta a Lúcia se ela já não estava indo

embora. Depois que Lúcia sai, Psilene comenta com Baiana: “... mas que menina

mais despreparada hein Baiana? Sabe o que ela vai fazer no estrangeiro? Vai lavar

prato para o gringo, servir de babá para os filhos do gringo, abrir as pernas pro

gringo, e depois que ele comê, comê, comê, vai mandar a carcaça de volta aqui pro

Brasil, isto quando manda, porque se não, ela tem que ficar lá ó, trabalhando,

trabalhando, trabalhando pra ver se junta uns trocados como prostituta pra poder

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voltar pro seu país.” Ao que Baiana pergunta: “... e apôs me diga nega, porque tu

voltou?”

Neste momento há um silêncio, pois Psilene percebe que ao fazer aquela

crítica acabara de se denunciar como aquelas que foram para fora e que não deram

certo, talvez precisando juntar uns trocadinhos para voltar para seu país. Já no final

do filme, numa conversa com dona Joana, Psilene conta mais sobre sua vida e

dona Joana, muito esperta, consegue em seus comentários deixar o telespectador

por dentro da vida pregressa de Psilene, quando exclama: “ ... isso é que é, a mulher

vai pro estrangeiro e volta um mulambo desse.... jê taime vie mon amour!”

Embora tendo sua vida destruída pela aventura no exterior, Psilene volta à

sua vida pregressa no último dia de carnaval com Reginaldo com quem tem um caso

e a última cena que se tem dela é quando ela se perde no meio da multidão. O

personagem Psilene não faz parte do seriado.

b) Dona Joana – A religião confrontada

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Dona Joana( Luciana Souza) é o ponto central das divergências entre os

moradores do cortiço. Por ser a proprietária, vive neste mesmo cortiço com seus

dois filhos Cosme e Damião e aguarda o retorno de seu marido que há mais de um

ano está viajando e não se sabe quando volta. Crente fervorosa, dona Joana

costuma repreender tudo que é ou está errado em nome de Jesus, principalmente

aquilo que vem do candomblé, ao qual tem total aversão. Encontramos no relato de

dona Joana um confronto direto dos evangélicos contra aqueles que são do

candomblé, religião predominante na Bahia.

Apesar dos nomes dos filhos, Cosme e Damião, serem entidades do

candomblé, é possível encontrar os mesmos Cosme e Damião no catolicismo,

religião predominante no país, que parece ser um contra censo.

Outro fato que irrita dona Joana, e que as vezes é motivo de bate boca, é o

fato de seu cortiço abrigar a mãe de santo Raimunda (Cássia Vale), a quem dona

Joana chama de feiticeira. Segundo a própria mãe Raimunda, não faz macumba,

mas presta consultoria espiritual. Pode-se considerar um grande contra senso ou

uma grande provocação da diretora Monique Gardenberg, quando traz a questão da

religiosidade vivida e a religiosidade aparente. Uma produção que descreve a Bahia

onde a religião que fica mais evidente é a dos evangélicos, pois devido à

personalidade forte de dona Joana sua religião se sobressai acima do candomblé.

Quando a religião interfere no convívio das pessoas, estas mesmas pessoas

se deixam revelar através de suas vidas, suas ações, seus relacionamentos.

Arnaldo Jabor(2007) descreve que é possível perceber em Ó Pai, Ó esta

abordagem imposta pelos evangélicos ao povo baiano, construindo templos

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milionários com o dinheiro dos pobres. Em Ó Pai, Ó é possível ver através das

visitas que o pastor da igreja faz a casa de dona Joana levando o recibo da doação

já preenchido, o que não configura uma ação espontânea, mas sim algo imposto.

Para Jabor(2007) “... é um absurdo que em nome da Democracia não se possa

impedir esses assaltos, a ignorância popular, pelo menos poderiam proibir a exibição

de cultos violentos, brutais, demoníacos na televisão, isso talvez pudesse ser

impedido pela democracia.” (JABOR, 2007)

c) Cosme e Damião – o extermínio de menores

O relato triste de Cosme(Vinícius Nascimento) e seu irmão Damião(Felipe

Fernandes) é de um peso considerável no final do filme o que levou a comoção e a

reflexão. Os filhos de dona Joana, Cosme e Damião poderiam ou deveriam ter outro

fim, uma vez que sofriam uma marcação serrada por parte da mãe. Mas precisavam

ilustrar os dois lados da moeda, que ilustra bem as vidas dos meninos que

peregrinam as ruas do Pelourinho. Um desses lados é o do abandono e

marginalização da infância. O outro lado é a do extermínio dos menores que

cometem pequenos delitos como assaltos a estrangeiros e aos estabelecimentos

comerciais e que precisam ser tirados de circulação para não espantar os turistas no

Pelourinho revitalizado. O papel vivido por Stênio Garcia(seu Jerônimo), dono de um

antiquário, vai contra a vida desregrada de Cosme e Damião. Quando este

comerciante pede ao policial para “ dar um susto” nos meninos de rua que andavam

atrapalhando seus negócios, um engano colhe duas vidas inocentes por ironia do

destino. Mais do que mostrar a alegria do Carnaval, a alegria do povo, o filme

mostrou também como a violência e os problemas enfrentados por menores

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delinqüentes tem início nas ruas do Pelourinho. Embora tenham sido assassinados

por engano pelo guarda local numa perseguição, Cosme e Damião, os dois filhos de

dona Joana, voltam a fazer parte do elenco no seriado.

d) Roque e Boca: racismo

Considerada uma das melhores cenas do filme, Ó Pai Ó traz uma cena

memorável e digna de registro quando mostra o confronto de Roque(Lázaro Ramos)

e Boca(Wagner Moura) no que diz respeito ao racismo. A cena acontece na oficina

de Roque que tinha sido contratado por Boca para consertar alguns carrinhos que

usaria para o comércio ambulante. No dia marcado para entrega dos carrinhos,

Boca alegou não ter o dinheiro para o pagamento do serviço realizado por Roque.

Começa então uma discussão onde Roque diz a Boca que sem pagamento ele não

entregaria os carrinhos. Irritado, Boca começa a ofender a Roque chamando-o de

negro. Boca vai aumentando seu tom de voz, repetindo várias vezes até gritar: “...

você é negro!” O preconceito vivido e presenciado em todos os povos, tem sido

tema polêmico em todos os tempos e agora volta à tona nesta cena de Ó Pai, Ó.

Monique Gardenberg explica porquê a cena de racismo foi colocada de forma tão

aberta e tão pontual:

“A idéia do Boca surge justamente para expor o racismo que muitas vezes está escondido, pelo menos disfarçado, enquanto você não cruza uma linha. Se aquela pessoa não cruza a linha então ele é aceito e tolerado. Se ele cruza a linha e apresenta qualquer contrariedade ao estabelecido, aí pronto: o racismo explode com força total. É um assunto tão delicado que muitas vezes até abordá-lo fica sendo perigoso. Mas eu achei que era importante nesse filme. A gente

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está falando de uma população mais pobre, portanto quase toda negra ou mestiça. Era importante colocar isso às claras.”27

A cena atinge seu clímax, quando Roque, já muito alterado sai em defesa da

raça negra, questionando Boca a respeito da igualdade entre brancos e negros:

“... já suportei demais o seu escárnio; suportar é a lei da minha raça. Negro não tem olhos? Negro não tem mão? (...) Negro não tem sentido? Não come da mesma comida? Não sofre das mesmas doenças, Boca? Não precisa de remédios? Quando a gente sua, não sua o corpo tal qual um branco, Boca? Quando vocês dão porrada na gente, a gente não sangra igual, meu irmão? Quando vocês fazem graça a gente não ri? Quando vocês dão tiro na gente(...) a gente não morre também? Pois se a gente é igual em tudo, também nisso vamos ser!” 28

Na verdade o personagem Boca, interpretado por Wagner Moura não existia

na peça teatral, sendo criado para o filme. Já o personagem Roque(Lázaro Ramos),

surgiu da mistura de Mary Star que era uma menina do interior que vinha para tentar

fazer sucesso como cantora, mas ela era totalmente ignorante. Juntamente com

outro personagem que é Severino, um lixeiro que é fã de Roberto Carlos. Em

ambos os casos, tanto Mary Star, onde a graça estava na ignorância e Severino

eram pessoas simples, sem cultura chegando a ser ignorantes, o que é o oposto de

Roque. A diretora dá a Roque um pouco de erudição, um vez que ele quer ser

cantor. Roque gosta de ler, gosta de escrever e sempre cita frases bonitas e

inteligentes para seus amigos.

“ O filme no fundo está falando disso. A gente aborda diversas condições delicadas de forma muito cômica e divertida, mas está o tempo inteiro tocando em assuntos complicados. A grande beleza de O Pai, Ó é que você é conduzido ao riso o tempo inteiro, no entanto aquela obra toda é para lhe causar espanto diante do seu próprio

27 Cf. entrevista concedida por Monique Gardenberg em www.atarde.com.br/cultura/noticia.jsf?id=740786, acesso em 21/11/2009. 28 Trecho do diálogo entre Roque e Boca, no Filme Ó Pai, Ó.

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riso.” 29

Na visão do telespectador, o racismo pode acontecer em níveis diferentes e

de formas diferentes, mas o que se viu no filme é uma demonstração clara e

abusada de preconceito racial, que quando visto, pode levar a reações diversas:

“Estava lá o “Bando…” com vários destaques individuais além de Lázaro Ramos. Surpreendentemente, os atores brancos globais eram coadjuvantes.(...) Agora na televisão, como vi no cinema, vi um bom elenco, novamente os atores brancos como coadjuvantes e mais do que um seriado de denúncia do preconceito e discriminação racial. É claro que sinto falta na TV como senti falta no cinema e sentia no teatro, de um texto, de uma crítica mais elaborada ao racismo e de uma encenação que explore mais, do ponto de vista dramatúrgico, as possibilidades dos talentosos artistas que compõem o “Bando…”. Algo que obrigue os atores, logo os baianos e os brasileiros a transgredir a caricaturesca “baianidade”. 30

Tanto no filme quanto na minissérie, a questão do preconceito racial vivida por

Roque e outros personagens negros, equivale ao preconceito religioso, vivido por

dona Joana e Mãe Raimunda onde uma é evangélica e outra faz parte do

candomblé. A antipatia e o antagonismo, tão bem demonstrados pelos

personagens de Ó Pai Ó, nos dá uma noção do que a palavra preconceito quer

dizer.

e) Boca e Queixão: inversão de valores

29 Cf. entrevista de Monique Gardenberg, em www.atarde.com.br/cultural/noticias, acessado em 18/10/2009. 30 Cf. www. mundoafro.atarde.com.br/?p=446, acesso em 12/12/2009.

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Geralmente vemos produções audiovisuais, onde o negro, quase sempre é

posto como vilão da história. Em Ó Pai, Ó encontramos dois vilões onde, apesar de

serem brancos, atuam como os vilões da história; parece ocorrer uma inversão de

valores. A diretora Monique Gardenberg talvez não tenha tido a intenção, mas

colocou na obra, personagens brancas para os papéis de vilão. No filme

conhecemos Boca(Wagner Moura), sem nenhuma referência familiar ou ocupação

definida. Vive tentando angariar pessoas para a prática de pequenos delitos e

contravenções.

Boca, apesar da pele branca, aparece como o vilão da história, papel este que

muitas vezes, ficou relegado aos negros. Ele é a antítese do bom moço;

encontrando em Neusão, a dona do bar, a única pessoa com que pode desabafar. É

através de Neusão que descobrimos que o verdadeiro nome de boca é Moisés. Num

segundo momento, com a saída de Boca da história, surge Queixão. Branco e de

cabelo ensebado, baixa estatura e queixo fortemente projetado para frente, Queixão

é o maluco beleza e tem a total antipatia dos moradores do cortiço por ele. Queixão

vive também de negócios escusos. Sempre cobiçou o bar de Neusão, colocou até

um comércio ilegal para concorrer com o bar de Neusão; conseguiu para Roque

algumas formas fáceis de ganhar dinheiro, pirateou o primeiro CD que Roque

acabara de gravar, etc.

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A diretora pontuou bem o racismo vivido por Roque e Boca , e a repulsa

que os moradores do Pelourinho tinham por Boca e Queixão. Os dois marginais,

Boca e Queixão, no seu tempo e do seu jeito, conseguem mostrar sua vocação para

as coisas erradas. Todos os problemas no filme, inclusive Boca e Queixão, o lado

mal da história, são mostrados de forma a fazer rir. Embora na história possam

transitar diferentes gêneros, a comédia foi a forma que a diretora encontrou para a

obra transmutada, ou seja, da adaptação da peça para o cinema. Em sua palavras:

“Você ri, mas quando acaba o filme você diz: é triste. Isso é que é o grande barato de Ó Paí, Ó. A tristeza pode até ser causada pelo desfecho, mas o desfecho faz você chorar pelo filme inteiro. Pelo sonho de Roque, pela ilusão de poder de D. Joana. A reação das pessoas é o que tem me deixado mais feliz. ”31

Desprovido de crítica social, - o que para muitos chega a ser a negação

daquilo que o Bando sempre pregou - a peça traz comicidade, politicagem,

contradições e conflitos o que não acontece no filme. O filme traz o personagens

preocupados com aqui e agora, sem grandes ambições:

“De qualquer forma, Ó, Paí Ó parece um herdeiro pop daquela tradição dos Centros Populares de Cultura, da UNE, que está na origem do Cinema Novo. Só que essa estética, como se sabe, foi recuperada pela TV Globo sob uma feição mais domesticada. O “povo” é filmado com simpatia, a música é bonita e Salvador respira pura energia. Às vezes Ó Paí Ó resvala e parece comercial da Bahiatursa, mas se recupera em cenas que nada têm de “turísticas”. Enfim, é um produto híbrido que, por isso mesmo, nos faz experimentar sentimentos contraditórios em relação a ele. Vai dar certo em termos de público? Não sei, porque Ó, Paí Ó expõe, no fundo, uma idéia de “brasilidade”, um sentimento difuso e positivo do País (sem esconder sua tragédia social) que já não consta mais da agenda da classe média, o principal público-alvo do cinema.”32

31 Cf. www.atarde.com.br/cultura/noticia acessado em 22/11/2009. 32 Cf.: blog.estadao.com.br/blog/zanin/?title=o_pai_o&more=1&c=1, acessado em 19/10/2009.

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A diretora Monique Gardenberg alegou o baixo orçamento e o curto espaço de

tempo para a produção do filme como uma justificativa para as criticas recebidas

pelo filme feito e enfatizou que o grande desafio do cinema (nacional) é conseguir

chamar atenção para seu filme em meio a uma avalanche de produção estrangeiras.

Sua estréia nos cinemas foi precedida de muita expectativa e de uma agitação

anormal e apreensão, por não ser considerada por muitos como uma produção

baiana. A isto a diretora rebate:

“Eu acho isso um pensamento estreito. Esse filme vai ser vítima de muito preconceito. Eu já sabia disso quando eu fiz e vou continuar enfrentando alguns preconceitos até na Bahia.”.... Ó Pai, Ó é uma história feita por um grupo de teatro baiano, que se passa no Pelourinho, encenado por atores baianos, dirigido por uma diretora baiana e cuja equipe,... tinha tantos baianos quanto cariocas e paulistas. Você condenar um filme ou você negar sua pátria a ele porque não usou a equipe da Bahia é um absurdo. ”33

Lançado no mesmo dia, o filme americano 300(2007) baseado numa história

em quadrinhos homônima de Frank Miller e transmitido em mais de 550 salas de

160 cidades do Brasil. De acordo com dados divulgados pela Warner, ocupou o

topo do ranking dos filmes mais vistos nos cinemas brasileiros. Durante o final de

semana que foi sua estréia o número de expectadores ultrapassou a 600 mil, o que

gerou uma arrecadação de 5,4 milhões enquanto que ‘Ó Pai, Ó que estreou em 100

salas de cinemas, ocupou a terceira posição, levando aos cinemas uma média de

50 mil expectadores. O distribuidor Marco Aurélio Marcondes, da Europa Filmes,

responsável pela distribuição do filme brasileiro, disse que a produtora já sabia do

33 Cf. www.atarde.com.br/cultura/noticia acessado em 22/11/2009.

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risco de concorrer com a esperada estréia americana, mas que "o filme tem boca –a

-boca muito forte. Foi um risco calculado".34

Esse risco calculado provavelmente incluia o conhecimento ou pelo menos a

intensão da produção do desdobramento do filme num seriado na TV. A despeito da

data do lançamento, o filme sofreria uma transposição para a TV, embora ficaram

algumas lacunas que na migração do cinema para o TV, a obra Ó Paí, Ó precisaria

ser revisto para poder dar continuidade a obra.

1.2.2 O processo de transmutação

Dá-se o nome de transmutação, a toda e qualquer adaptação de texto literário

para o cinema ou televisão, pressupondo, segundo Balogh(2009) “... a passagem de

um texto caracterizado por uma substância da expressão homogênea - a palavra -

para um texto no qual convivem substâncias da expressão heterogêneas, tanto no

que concerne ao audiovisual, quanto no que concerne ao sonoro.”.

“ Portanto, essa passagem determinará de qualquer forma uma relativização do sentido, que inevitavelmente produzirá novos sentidos, possibilitando novas interpretações. Enfim, surgirá uma nova obra cuja autonomia, enquanto obra estética, se constituirá como o principal critério de valor para que a obra adaptada seja considerada como tal, ou seja, será a condição de que o produto adaptado para a linguagem televisual (ou mesmo cinematográfica) se sustente por si só dentro de suas características específicas enquanto produto televisual.”( BALOGH, 2009, p. 317).

34 Cf.: http: //cinemacomrapadura.com.br, acessado em 22/11/2009.

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Na transmutação da obra Ó Pai, Ó para a televisão, vemos algumas

descontinuidades do filme, resultando assim numa outra obra, com mesmo título,

situações semelhantes e mesmo elenco fixo com algumas variantes. Uma vez que

surge uma nova obra a partir desta adaptação, essas transmutações mantêm ou não

um distanciamento da obra original, sendo intituladas obras baseadas, inspiradas

em, livremente baseada, etc., sendo que esta relação é a graduação de

distanciamento e envolvimento com a obra original.

Umberto Eco(2006), em um de seus apontamentos sobre a televisão, faz uma

análise do papel da televisão e do cinema no que diz respeito a transmissão direta e

como isto influenciou o cinema. O autor descreve que o cinema se habituara a

construir uma imagem que procurava ser totalmente fiel ao texto literário,

necessário para construir um personagem capaz de criar uma identificação com o

espectador.

Em outras palavras, as obras tinham um alinhamento narrativo do essencial,

com início, meio e fim. Com a transmissão direta, proporcionada pela televisão, a

forma de contar os fatos passava pela mudança de levar ao espectador as imagens

de um fato no momento em que ocorria. Não havia mais a sequência de início, meio

e fim. O fato de levar ao ar as imagens de um acontecimento onde não se tem

controle do que acontece ou interferência de quem capta as imagens com a câmera,

dava a sensação de autenticidade, despertando assim uma maior credibilidade do

espectador. O cinema então, fazendo uso desta técnica, procura mostra uma obra

de ficção bem mais parecida com a realidade. A partir daí, Eco relata a respeito do

equívoco em que muitos incorriam, de afirmar que toda e qualquer transmissão

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direta televisiva constituía uma representação fiel e verdadeira do fato ocorrido.

Segundo ele:

“... tudo que acontece, enquadrado pelas câmeras de TV, já dirigidas segundo uma escolha das angulações dos campos, aparece, diante do diretor de TV, em três ou cinco monitores, e dessas três ou cinco imagens o diretor escolhe a que deve ser mandada ao ar, instituindo, assim uma “montagem”, o que vale dizer um “interpretação” e uma “escolha”.(ECO, 2006, p. 328).

Embora a característica específica da televisão em transmissão direta seja a

de relatar com base numa provocação imediata da realidade e segundo exigência de

representação simultânea, todavia a operação que o diretor de TV desempenha

pode muito bem identificar-se com o relato, com a elaboração de um ponto de vista

pessoal sobre os fatos. Esta forma de racionalizar, montar e interpretar as imagens

está totalmente relacionada à questão da adaptação de textos literários para a

televisão e o cinema. Em toda adaptação, ao mesmo tempo em que repete algo do

texto inicial, seleciona de forma a incluir ou excluir elementos do seu objeto na

configuração de um novo texto. No processo de transmutação observa-se que para

entender um texto como tradução e ou adaptação de outro, algo do primeiro deve se

manter no segundo. É nesta transposição da adaptação que se verificam os

elementos que se transferem de um sistema semiótico para outro. Numa adaptação

fílmica, personagens, fala dos personagens, o enredo, e ações dos personagens e

as demais funções narrativas se transpõem do livro para o filme ou seriado.

Ao tratar da transmutação, Umberto Eco(2007) observa as representações de

signos em matéria diferente como um caso de parassinonímia35, que seria encontrar

35 Casos específicos de interpretação nos quais, para esclarecer o significado de uma palavra ou enunciado, recorre-se a um interpretante expresso em matéria semiótica diversa, ou vice-versa.

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noutro sistema algo que remeta ao mesmo objeto do texto fonte. Peirce(2003) define

o signo como algo que é determinado por um objeto, o qual representa, e determina

um interpretante, que também é signo e que intermedeia a relação do primeiro com

o segundo. É da natureza do signo, portanto, representar e determinar novas

representações, traduções contínuas que dêem sequência ao processo a que

chama de semiose. Todo processo de tradução e ou adaptação, portanto, enquadra-

se numa semiose, e , no caso das traduções intersemióticas, num tipo particular de

semiose que pressupõe uma mudança de matéria. A adaptação de um texto para o

cinema, por exemplo, incorpora leituras ou convenções interpretativas desse texto

que não estão no texto, mas em seu uso

Entretanto, conforme argumenta Eco, Peirce utiliza o termo “ tradução” em

sentido figurado, assumindo tradução como sinédoque de interpretação. A tradução

depende da ação de um tradutor; não é uma semiose natural, mas sim fruto da ação

interpretativa de um sujeito e , nesse sentido, envolve uma leitura e uma forma de

expressão que são próprias dele. Além disso a transmutação de matéria muda a

natureza dos signos, que passam a representar seus objetos de outra forma,

podendo assim, manter com eles diferentes tipos de relação; a tradução ou

adaptação de um texto escrito para imagem ou som, mais do que isso, tenta

incorporar ao signo o objeto que representa.

Uma adaptação sempre é precedida por interpretação, e que estas

adaptações ou transmutações – semioses que envolvem mudança de matéria –

inevitavelmente interferem na recepção da obra. Peirce afirma que “ o corpo do

signo modifica-se lentamente, mas seu sentido inevitavelmente cresce, incorpora

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novos elementos e descarta antigos”( PIERCE, 1998, p. 264). A semiose, então

promove uma constante transformação dos signos, que agregam novos sentidos no

decorrer de suas representações. Em outras palavras, todo texto, portanto

estabelece uma rede de outros textos com os quais se relaciona e que ficam

virtualmente conectados a ele, interferindo em novas leituras.

Ele considera que toda adaptação pressupõe uma tomada de posição crítica,

além de impor uma interpretação, essas adaptações muitas vezes falam mais ou

menos do que o texto fonte, caracterizando uma nova obra. Caracterizando-se como

semiose, a análise das traduções intersemióticas requer atenção aos fluxos sígnicos

e interpretativos decorrentes da transmutação de um texto para outra matéria.

a transmutação de matéria agrega significado ou torna relevantes conotações que não o eram originalmente. Pode-se objetar que cada texto solicita do próprio leitor modelo certas inferências e que não há nada de mal se, ao passar de matéria para matéria, essas inferências são explicadas. Mas é preciso contra-argumentar que, se o texto original propunha alguma coisa como inferência implícita, ao torná-la explícita o texto foi certamente interpretado, levado a fazer “ a descoberto” algo que originalmente ele pretendia manter como implícito(ECO, 2007, p. 382)

Para Eco(2007), uma adaptação de uma obra literária para o cinema não é

apenas uma representação do texto literário; na transmutação, a adaptação tem

como meta produzir o mesmo efeito no seu público que o texto original produziu no

seu leitor. Há de se ressaltar que qualquer adaptação, por mais que resulte numa

nova obra, entendida como fruto de uma ação de criatividade que vai além do texto

fonte, ela mantém algo deste texto. Sendo esta nova obra, uma representação fiel,

uma transmutação ou uma mera “transmigração do tema”.

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“Adaptar implica recompor uma narrativa a partir da sua trama principal,

manter as tramas secundárias mais importantes, manter tema e premissa, bem

como essência dos perfis dos personagens centrais.”(CAMPOS, 2007, p. 299)

Como na televisão ocorre um fluxo ininterrupto de programação e cada programa é

fracionado inúmeras vezes em capítulos e episódios, intermediados pelos

comerciais, exige, em geral, uma estratégia de expansão narrativa e discursiva da

obra.

“ O filme adaptado deve preservar em primeiro lugar a sua autonomia fílmica, ou seja, deve-se sustentar como obra fílmica, antes mesmo de ser objeto de análise como adaptação. Caso contrário, corresponderá ao que se costuma chamar significativamente de tradução servil ou meramente ilustrativa.” ( BALOGH, 2005, p. 53).

Esta autonomia, quando se está fazendo a transmutação de uma obra, é

produzida através da inserção de diálogos, roteiros e situações de acordo com a

visão do diretor. Fazendo jus ao que afirma Balogh, o filme Ó Pai, Ó se distancia do

texto literário, preservando assim sua autonomia fílmica. Traz para as telas, cenas

de uma Bahia vista pelas lentes da diretora que embora sendo baiana, viveu maior

parte de sua vida longe da Bahia, fato que resultou em pesadas críticas a sua obra.

Ainda sobre adaptações, Balogh nos diz:

“ Adaptações soem explicitar nos próprios créditos a sua condição de obra resultantes do que podemos chamar de uma relação intertextual. Por vezes o cineasta que adapta se dá inclusive ao luxo de dar uma matiz de gradação para o processo de tradução intersemiótica realizado. (...) “ Qualquer que seja a gradação explicitada nos créditos, ela irá sempre diferenciar o filme adaptado do filme de roteiro original”.( BALOGH 2005, P. 48).

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Dentro desta autonomia, a diretora fundiu personagens, criou novos

personagens e subtraiu alguns, criou eventos e situações que deram consistência ao

filme. Sobre a experiência de transformar a peça em filme, a diretora diz:

“Foi difícil. Eu tive medo, tentei fazer isso duas vezes antes e desisti porque Ó Paí, Ó, é uma peça muito verborrágica. Acho que o cinema é mais pleno justamente quando ele não usa nem a palavra para se comunicar. Com o som e a imagem, você diz tudo.”... eu tinha me perguntado como eu poderia explicar algo que no primeiro instante a pessoa entendesse o que é Ó Paí, Ó. Isso pra Bahia é muito fácil, mas para o resto do país não é. Então eu queria uma cena que explicasse de cara isso. Eu achei divertida essa idéia porque imediatamente já estabelecia duas coisas: o tom da brincadeira, da safadeza que o filme ia ter, além da sensualidade do homem e da mulher negra. E traz também a música, outro elemento que eu queira que fosse forte. “36

Segundo Balogh(2005), uma adaptação pode surgir de várias formas; sempre

se referindo a obra original como alicerce ou base. Ela diz:

Na prática, se reconhece como adaptado o filme que “ conta a mesma história” do livro no qual se inspirou, ou seja, a existência de uma mesma história é o que possibilita o “ reconhecimento” da adaptação por parte do destinatário. Situar o ponto de partida da análise nas estruturas narrativas tem a vantagem de delimitar de imediato o nível superficial como o ponto incoativo do percurso metalinguistico.( BALOGH, 2005:55)

Cabe aqui uma reflexão para que possamos ver, na análise do filme Ó Paí,

Ó, pondo em questão qual é o foco do filme, pois não mostra o descontentamento

do povo pela expulsão do Pelourinho. Em busca de uma rota discursiva, parece que

o filme realmente ressalta e enobresse a baianidade em detrimento do Pelourinho, e

das mudanças que ali ocorreram; objeto central de todas as tramas de Ó Paí, Ó.

36 Cf. entrevista concedida por Monique Gardenberg em www.atarde.com.br/cultura/noticia.jsf?id=740786, acesso em 21/11/2009.

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A intervenção e a retirada dos moradores descaracterizou o Pelourinho tal

como era antes da revitalização, surgindo um outro Pelourinho. Após a restauração

dos imóveis, a intenção era de que, seriam devolvidos aos seu antigos proprietários

por aluguel ou venda, a preços mais acessíveis, equivalentes aos praticados pelo

mercado. O IPAC pretendia tornar a área apropriada para habitação, ou em outras

palavras, adequando o homem ao espaço e o espaço ao homem, o que não

aconteceu. O próprio IPAC detectou que “aquela população não teria condições de

preservar, por seus próprios meios, o patrimônio que habitava”(IPAC, 1992).

A justificativa dada pelo IPAC foi que a desocupação era necessária, visto que

aquela população era incompatível com o desenvolvimento do turismo e com a

preservação do imóvel. Consideravam pessoas sem condições econômico-culturais

de preservá-los, e reconheceu a marginalização imposta à população, sem deixar de

frisar que “ marginal tem que ser tratado pela polícia ou órgãos assistênciais, não

pelo patrimônio histórico, ... não pode haver romantismo: marginal não pinta a casa

e joga fezes na rua”.( FOLHA DE SÃO PAULO, 1994).

Privados de seus moradores, o Pelourinho transformou-se em uma vitrine

para ser apreciada pelos turistas. Durante o dia não se vê mais vida, a não ser a

comercial. A noite, a boemia é policiada, pois o Pelourinho se tornou um teatro onde

se representa Salvador para turistas. É possível ver, no filme, cenas onde a

personagem Baiana(Rejane Maia) só pode vender em sua banca, quitutes como

acarajé, vatapá, e outros, não podendo vender bebidas como refrigerantes,

cervejas, etc., precisando estar devidamente trajada com os trajes da baiana

tradicional sob pena de ser multada caso isto não aconteça.

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Vemos também os guias turísticos locais falando um inglês sofrível ao

demonstrar os bens culturais tombados no Pelourinho; vemos ainda a oficina de

Roque, o antiquário de seu Jerônimo e o bar de Neusão onde acontece a maioria

das cenas, demonstrando que o Pelourinho é sinônimo de comércio. As cenas se

passam exclusivamente dentro do bar de Neusão, ou dentro da oficina de Roque, ou

dentro do próprio cortiço, com poucas tomadas retratando o estado atual do

Pelourinho. Com tomadas rápidas, uso constantes de close up e diálogos num

sotaque soteropolitano, o enredo gira em tormo de suas vidas e problemas

corriqueiros.

É justamente este tom de brincadeira que Monique dá a Ó Pai, Ó que o torna

diferente, uma vez que a Bahia nunca foi retratada desta forma. Este tom de

safadeza perdeu sua leveza e a sensualidade está bem mais aflorada do que outras

épocas em outras produções. O elemento música, também muito explorado no filme

e na série, deram uma cara de “musical” ao filme, onde Roque entoa canções vez

ou outra.

Buscar semelhanças entre os personagens de Ó Pai, Ó de Marcio Meireles e

os personagens de Monique Gardenberg pode ser uma coisa complicada devido as

alterações feitas por conta da adaptação para o cinema. Já compará-los com os

personagens de outras produções, como por exemplo Gabriela(1975) de Jorge

Amado, tentando entender se Ó Pai Ó, se valia da qualidade de uma obra voltada ao

regionalismo, pode resultar num esforço infrutífero, uma vez que além do tempo que

separa tais produções, o formato se diferencia. Escrita por Walter George Durst e

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dirigida por Walter Avancini, a novela foi uma adaptação do romance de Jorge

Amado, Gabriela, cravo e canela. Após o sucesso da novela, foi lançado o filme

homônimo em 1983, com a direção de Bruno Barreto com Sônia Braga interpretando

Gabriela e Marcello Mastroianni interpretando o personagem Nacib Saad. Podemos

encontrar em Gabriela uma Bahia revestida de inocência no papel de

Gabriela(Sonia Braga) e seu Nagib( Armando Bogus), um romance bem ao estilo da

época.

“ A gente costuma ver a Bahia principalmente através de adaptações de Jorge Amado. São arquétipos mais antigos da baianidade. Eles permanecem, mas já estão revestidos pelo contemporâneo. Em Ó Paí Ó, a gente vai rever personagens, mas em novas roupagens. A força desse trabalho está no fato de os tipos, ou quase todos, terem sido criados pelo Bando Olodum. Isso traz muita autenticidade.” 37

Para Eco, a adaptação refere-se a mundos possíveis. “ Interpretar não é

traduzir”. A adaptação apresenta esta margem de infidelidade em relação a um

núcleo de suposta fidelidade que é o texto original, mas que a decisão acerca da

posição do núcleo e a amplitude das margens depende dos objetivos que se quer

alcançar.

Já para Jorge Furtado a transmutação revela uma das mais evidentes

diferenças entre a linguagem audiovisual e o texto literário, pois toda a informação

dever ser visível e audível. Cada leitor, imagina a sua própria cena, pois o escritor

nos informa aquilo que ele julga ser necessário e o leitor imagina o resto. Já o

cineasta precisa fazer grande parte do trabalho pois precisa dar vida, cor, som, etc.

ao texto literário. O cinema é um trabalho coletivo, ao contrário do texto, quase 37 Depoimento de Matheus Nachtergaele, conforme http: //www . flick.com/photos/angar/2986409078, acesso em 13/12/2009.

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sempre expressão de um indivíduo. A linguagem cinematográfica, ao contrário do

texto, é intuitiva, pois ninguém precisa ser alfabetizado para entender o filme. O

cinema, ao contrario da literatura, é um evento, um ritual para o qual se sai de casa

para assistir, um ritual compartilhado com outros espectadores. Com relação ao que

ficou oculto ou implícito no texto literário e que o cinema tem este poder de trazer ao

público, o Furtado nos diz:

“...o cineasta precisa imediatamente tomas essas decisões, adiadas pelo autor. Lendo, cada leitor cria as suas próprias imagens, sem custos de produção ou limites de realidade. É natural que se decepcione quando veja as imagens criadas pelo cineasta e diga: gostei mais do livro.”38

1.2.3 Um filme não pensado para a TV ?

Ó Paí, Ó, - o filme - parece não ter sido pensado para a TV, ou em outras

palavras, não se pretendia ter uma continuidade em forma de série televisiva. A idéia

surge a partir de histórias e personagens dentro do filme que tem seu fim, ou

conclui seu propósito no mesmo, não havendo assim maneiras de dar continuidade

numa possível série televisiva. A idéia de que o filme foi uma experiência para que

depois a obra fosse veiculada no estilo minissérie ou seriado, ficou comprometida,

pois surgem algumas descontinuidades.

Estas descontinuidades surgem quando temos, por exemplo, a morte de

Cosme e Damião no filme, e que voltam a aparecer no seriado. A lacuna da

38 FURTADO, Jorge. 10ª. Jornada Nacional de Literatura, RS, 2003.

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descontinuidade dos personagens Psilene e Rosa, a sobrinha de Neusão, que

participam do filme e não estão no seriado, sem nenhuma referência a ausência

delas. Mesmo a mudança com a saída do personagem Boca(Wagner Moura) que

foi substituído por Queixão(Mateus Nachhtergaele) que é outro personagem criado

por Monique como forma de evitar o fim da trama. Ainda temos o personagem

Negócio Torto(Cristóvão da Silva) que tinha certa dificuldade para falar no filme, mas

que aparece totalmente mudo no seriado.

O seriado Ó Pai Ó, valeu-se do direito de alternar, substituir, trocar e agregar

em diferentes momentos, atores ao elenco de forma a substanciar a obra sem fazer

perder o significado. No seriado, atores foram especialmente convidados para

participar de cada episódio, como é o caso de Virginia Rodrigues(Bioncé) bem como

Aline Nepomuceno( Dandara) em Mãe e Quenga, Preta Gil(Magda) que interpreta

uma piriguete(mulher fácil) em Fiéis e Fanáticos, Cristóvão da Silva( Negócio Torto)

no episódio Negócio Torto, Virginia Cavendish(Hipólita) em Brega, e tantos outros.

Estas alterações e substituições faz com que a passagem do filme para o

seriado tenha estas descontinuidades. Se houvesse intensão de uma continuidade

da obra após o filme, tais fatos deveriam deixar um caminho a explorar em obras

posteriores. Quando se compara o filme e alguns episódios do seriado, não se

consegue estabelecer uma sequência lógica, devido a estas descontinuidades.

O discurso que dizia: “ dê passagem à alegria, nem que seja por um dia” 39

deixava entender que o filme encerrava alí a sua historia. Este “um dia”, dizia

39 Comercial de Ó Pai, Ó, veiculado pela Rede Globo durante as semanas em que o filme estava em cartaz nos cinemas.

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respeito ao último dia de carnaval narrado no filme, onde os habitantes do

Pelourinho, e em particular os moradores do cortiço estavam para brincar o

carnaval, até a água ser cortada, o que desencadeou toda a trama. Todos os

personagens são vistos desde as primeiras horas do último dia de carnaval e o filme

se constroe a partir daí, mostrando cada personagem, envolvidos com muita

música, sensualidade, racismo e indiferença.

As cenas foram filmadas em película 16 mm em locações reais de uma

arquitetura antiga e irregular no Pelourinho que “... serviu de fonte de inspiração para

a construção narrativa e cênica do seriado.”40 Cada episódio era único, diferente do

filme, “que era uma obra mais aberta”.41 Neste, transitavam diferentes situações de

humor, sempre exibidos a cada sexta-feira entre os dias 31/10 a 05/12 / 2008. O

próprio Guel Arraes que juntamente com Jorge Furtado, eram responsáveis pela

redação final do seriado, em um depoimento havia declarado que o que

caracterizava seu trabalho era tentar fazer obras populares e que “captassem o

espírito do brasileiro para diverti-lo”42. Isto faz entender o porque do seriado ter o

humor bem mais anárquico, zombador e irreverente . Da adaptação de sua peça

para a televisão, Márcio Meirelles, diretor do grupo de teatro, disse em entrevista

que o Bando de Teatro Olodum, negociou com a televisão a adaptação da série:

“Guel Arraes e Jorge Furtado fizeram o roteiro dos episódios e mandaram para o

Bando de Teatro Olodum, que retrabalhou as histórias. O discurso da série é

diferente daquele da peça, afinal tem que ser adequado ao discurso da Globo sem

prejudicar o discurso do Bando”.43 Uma vez que, em todas as fontes consultadas,

40 Cf.: www.memoriaglobo.com.br acessado em 21/10/2009. 41 Cf.: www.atarde.com.br/cultura/noticia acessado em 21/10/2009. 42 OLIVERIA SOBRINHO, José Bonifácio de. 50 anos de TV no Brasil. Globo : São Paulo, 2000. 43Cf.: www.irohin.org.br/onl/clip.php?sec=clip&id=4032, acessado em 21/10/09.

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em nenhum momento é citada o verdadeiro motivo que levou à migração do filme

para a televisão em formato de seriado, cabe levantar as prováveis hipóteses que

explicariam a transposição. Uma vez que o sucesso do filme ou sua projeção a nível

nacional, não justificaria tal investimento, fica a dúvida o que teria levado os

responsáveis pela transformação da produção fílmica em um seriado.

CAPÍTULO II

Ó PAI, Ó: O SERIADO

2.1 O seriado

Por que Ó Pai Ó, sucesso no teatro, sucesso relativo no cinema tornou-se um

seriado, numa rede de televisão de maior audiência no Brasil? Se não houve uma

premeditação de uso do material ficcional e dos atores, como visto no capítulo

anterior, o que explica a sua montagem? O que justifica a continuidade da obra em

formato de seriado ? Uma vez que este segundo capítulo focará mais

especificamente o seriado Ó Pai Ó, desde sua adaptação televisiva até a efetiva

receptividade, faz-se necessário entendermos como se dá esta adaptação para a

televisão, em detrimento da mesma obra já ter sido veiculada nas telas do cinema.

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As formas narrativas seriadas que conhecemos nos meios de comunicação se

originaram dos folhetins de autores românticos do século XIX. O folhetim, que surgiu

na França em meados de 1836, explica Marlise Meyer, designava então um lugar

preciso do jornal: o rez-de-chaussée (rés-do-chão), ou o rodapé que ficava na

primeira página dos jornais. Esses rodapés eram um espaço destinado ao

entretenimento. Nele, eram postas diversões escritas, como piadas, charadas,

receitas culinárias, receitas de beleza, e textos ficcionais, mas é somente em 1840

que ocorre a constituição definitiva do romance-folhetim como um gênero específico.

De acordo com Meyer:

“ Nasce assim o folhetim, e o resultado concreto foi, para o jornal um aumento de 5 mil assinaturas suplementares em três meses, (...) A partir de então, não se trata mais, para o romance-folhetim, de trazer ao jornal o prestígio da ficção em troca da força de penetração deste, mas, pelo contrário, é o romance que vai devorar seu veículo”(MEYER, 1996, p. 61).

Assim o folhetim nasce das necessidades jornalísticas, e todos os romances

passam as ser publicados nos jornais e revistas em folhetins, ou seja, em fatias

seriadas. Quando surgiu no Brasil, a televisão veio a ser o ponto de convergência de

toda a nação, uma vez que homogeneizava os diferentes perfis da nação brasileira.

A televisão adquiriu primazia como principal meio de veiculação da cultura e

principalmente entretenimento, em detrimento do rádio. Representava a

modernidade, para uma nação que agora se alimentava de imagens e sons. O

surgimento da televisão e sua ascensão gradativa, significaria a médio e longo prazo

o declínio do rádio, uma vez que grande parte de sua programação e de seus

profissionais migraria para a televisão, encontrando nela, uma acolhida considerável.

Compulsoriamente deslocados para as telenovelas, os dramaturgos, intérpretes e

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técnicos precisariam inventar ou adotar uma estratégia para a encenação e para seu

registro visual(SADEK, 2008, p. 34).

PALLOTTINI( 1998, p.24) entende que a televisão, em seu processo de

estruturação utilizou-se do teatro e cinema, e lhes acrescentou os recursos do rádio,

sem esquecer uma das mais ricas e permanentes fontes de matéria ficcional: a

literatura nos seus variados gêneros. Já para SADEK(2008), a televisão nasce com

uma vantagem ( se relacionada com o cinema) que é a sonoridade juntamente com

as técnicas de narrativas do rádio que dentro da televisão, cativaram o

telespectador.

Após a exibição do filme Ó Pai, Ó no cinema, chegara a vez da televisão

levar ao público a história do povo do Pelourinho, expulso da região para a

malfadada reforma e recuperação. A história migra para a televisão respeitando a

especificidade do meio televisivo em se tratando de formato, seguindo o trajeto de

tantas produções como O Auto da Compadecida(1999/2000) Cidade dos

homens(2002/2005), Antonia(2007), Carandiru(2003) e tantas outras que deixaram

uma marca indelével na história do audiovisual brasileiro.

À primeira vista, para quem acompanhou o seriado, parecia que os seis

capítulos iriam girar em torno de Roque(Lázaro Ramos) que sonha em tornar-se

cantor profissional e seu par romântico Dandara(Aline Nepomuceno) uma dançarina

sensual e garota de programa. Mas Roque além de continuar na sua empresa,

resolve gravar um CD de seu novo “hit” “Mercado Branco”. A gravação teria tudo

para dar certo e vender bem se não tivesse o envolvimento de Queixão(Matheus

Nasthergaele) que é o antagonista de Roque.

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Queixão é racista e chantagista, vive de contravenções, golpes e exploração

de outros menos afortunados. Ele é uma espécie de maluco beleza, vaidoso e

perigoso e sua atuação é mais de irritar os outros, chantageando a todos, que

preferem ceder as suas investidas. Menos violento e agressivo e mais cômico e

gozador, Queixão conquista a simpatia do telespectador, dando continuidade a

historia com naturalidade.

A trama social envolve ainda a dona do cortiço, dona Joana, que continua

tendo problemas com os filhos Cosme e Damião e principalmente em administrar o

casarão uma vez que se ocupa em ficar cuidando da vida dos moradores do cortiço.

Cosme e Damião, depois de terem um fim trágico no filme, entram em cena

novamente no seriado, assim como o marido de Joana; que aparece tentando

explorar a esposa e sendo confrontado por Queixão. Reginaldo(Érico Brás) é o

taxista, mulherengo e marido de Maria(Valdinéia Soriano) que vive desconfiada das

traições do marido; Yolanda(Lyu Arisson) a travesti que tem um caso com

Reginaldo, Neusão, que é uma homossexual, dona do bar onde acontece a maior

parte dos encontros dos personagens. Temos ainda Baiana, a quituteira de acarajés,

personagem símbolo da Bahia.

A série traz os mesmos cenários utilizados no filme. Possui uma abertura feita

exclusivamente para ela, com aquarelas de cores vibrantes que se sobrepunham,

dando a impressão de movimento, reproduzindo cenas do filme e do seriado, tendo

como musica de fundo Ó Pai, Ó de Caetano Veloso. Acostumados a acompanhar

as minisséries veiculadas pela Rede Globo, onde as narrativas se estendiam por

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dias e as vezes por semanas a fio, o público agora se depara com o seriado, onde

os capítulos não são seqüenciais, mas se extinguem no mesmo dia. Quando

questionado sobre como estava vendo os primeiros episódios do seriado na TV,

Márcio Meireles, autor da peça descreve:

A primeira impressão é meio esquizofrênica mesmo, porque é uma coisa que tem a ver comigo e, por outro lado, não tem a ver; faz parte de mim e, ao mesmo tempo, está meio distante. Está lá meu grupo, os atores que trabalham comigo, a partir de personagens que criamos juntos, de uma trajetória que foi gerada 18 anos atrás para contar uma história que já mudou, que é essa história do Pelourinho. E, de repente, eles estão lá na tela da televisão falando coisas que foram de certa forma geradas por mim, diretamente feitas no processo de criação, mas que eu tive que me afastar um pouco, com a Secretaria.44

2.2 Minisséries e Seriados

As minisséries sempre cumpriram um papel importante desde que surgiram

em meados dos anos 70. Por apresentarem uma modulação diferente das novelas

da época e pelo rebuscamento do tema e das obras adaptadas, tem garantido seu

espaço entre os diversos programas televisivos. As minisséries têm trazido para o

telespectador desde obras dos grandes nomes da literatura nacional como

estrangeira; até obras de narrativas de cunho político, social, cultural e regionalista,

apresentando temas variados e por vezes polêmicos.

“ Quando começamos a produzir as minisséries, queríamos um aprimoramento do que conseguíamos nas novelas. De certa forma, até hoje, as minisséries provocam uma realimentação, uma releitura da novela, porque somos obrigados a usar quase a mesma estrutura dramática, mas com um outro ritmo das cenas e da própria filmagem. Há uma melhora da qualidade, as minisséries tendo um ritmo parecido

44 Cf. depoimento de Márcio Meirelles disponível em www.plugcultura.wordpress.com/marcio-meirelles-responde.html

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com os primeiros capítulos de uma novela, com um acabamento melhor. De certa forma, no nosso século, a literatura começou a sofrer uma influência do cinema. Os autores passaram a escrever praticamente transformando seus livros em narrativa cinematográfica.”(FILHO, 2001)

Para entender a origem das minisséries e dos seriados, é preciso ir em busca

das telenovelas das 22 horas e das chamadas Série Brasileiras da Rede Globo. Elas

marcavam presença na programação em meados da década de 1970 no horário que

hoje é destinado às minisséries. O fim das novelas das 22 horas deu origem as

minisséries. As telenovelas das 22 horas mantinham algumas características

básicas: personagens e histórias mais elaboradas e algumas inovações de

linguagem e estrutura. A exemplo disso as novelas Ossos do Barão (1974) e O Bem

Amado (1977) que logo depois se tornou um seriado, fizeram parte desse tipo de

produções; e foi somente em 1983 com a novela ‘Eu Prometo’ que a Rede Globo

encerra as telenovelas do horário das 22 horas, substituindo-as pela minisséries,

seriados e unitários que eram os casos especiais.

A partir dos anos 80 a programação televisiva passava por alguns reveses por

conta de intervenções políticas, questões financeiras, tecnologia e concorrência

entre as emissoras. As transformações pelas quais passou, fez com que a emissora

revisse sua atuação e reformulasse seu procedimento, “ ... de modo que os

formatos e conteúdos sejam pensados a partir da necessidade premente de

ampliação da audiência, como é o caso de minisséries já concebidas para dar

origem a filmes, numa clara estratégia de diluição dos custos de produtos que

exigem alto investimento financeiro, técnico, temporal e humano.” (ROCHA, 2008,

p.106)

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Já nos anos 90, em meio a pressão e concorrência por índices de audiência,

surgem produções que acabam por legitimar sua hegemonia juntos às demais

emissoras de televisão. E na visão de alguns, um fator predominante desta guinada

foi, entre outros motivos, o trabalho e a criatividade de Guel Arraes e seu núcleo

dentro da Rede Globo. Guel Arraes se torna então um dos responsáveis pela

reconfiguração do cenário audiovisual brasileiro a partir da articulação das

produções televisiva e cinematográfica. De uma experiência adquirida ao longo dos

anos em suas diversas produções, “ possui um modus operandi nas diferentes

instâncias de produção e realização que consegue manter o já consagrado padrão

de qualidade da emissora, apesar da rigidez e voracidade com que a televisão se

alimenta de gêneros, formatos e conteúdos”(BALOGH, 2009, p. 316).

Nos seriados, por exemplo, a história é narrada em episódios independentes, com começo, meio e fim e não em capítulos, embora dentro de uma unidade. Sem ligação de continuidade, cada episódio conta uma história completa, fechada em si mesmo, tendo sempre como fio condutor o núcleo básico da série – seus personagens fixos.45 ( ALENCAR, 2002, p.66).

Produções recentes, atestam como o mercado audiovisual brasileiro tem se

diversificado por conta de novas tecnologias, formatos, etc. Esta diversificação pode

gerar produções aglutinadoras de tecnologias inovadoras que resultam em

produções cada vez mais consistentes. Entre elas estão as minisséries,

Antonia(2007), Caramuru: A Invenção do Brasil(1999), Carandiru: outras

histórias(2005), Auto da Compa decida(1999).

45 ALENCAR, Mauro. A Hollywood brasileira: panorama da telenovela no Brasil. Rio de Janeiro : SENAC, 2002.

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A minissérie Lampião e Maria Bonita(1982), considerada como a produção

inicial, dava início a uma nova proposta de formato de programa na Rede Globo: as

minisséries.46 A minissérie Lampião e Maria Bonita foi premiada com a medalha de

ouro no Festival de Filmes e Televisão de Nova York; além de ser reapresentada

nos anos de 1984, 1990 e 1991 foi vendida para Guatemala, Itália, Perú, Portugal e

Uruguai. Sua diferença em relação as novelas foi o trabalho de pesquisa

documentária, do local, costumes e ambientação da história. Nos anos seguintes

surgiram produções como ‘Anarquistas graças a Deus’(1984) uma adaptação do

livro de memórias homônimo de Zélia Gattai, O tempo e o Vento(1985) da trilogia

homônima de Érico Veríssimo, Tenda dos Milagres(1985) da peça homônima de

Jorge Amado, Grande sertão: Veredas(1985) baseada na obra homônima de João

Guimarães Rosa, O primo Basílio(1988) adaptação do romance homônimo de Eça

de Queiroz, Memorial de Maria Moura(1994) adaptada do romance homônimo de

Rachel de Queiroz, Hilda Furacão(1998) adaptação do romance homônimo do

escritor Roberto Drummond47, entre tantas outras.

No ano de 1999 porém, foi exibida pela Rede Globo, aquela que para alguns,

seria uma marco no audiovisual brasileiro que era a minissérie O Auto da

Compadecida( FECHINE, 2008, p. 193). Baseado na peça teatral homônima de

Ariano Suassuna, O Auto da Compadecida faz referência à pobreza e a vida sofrida

dos habitantes de Taperoá, no sertão paraibano, misturando regionalismo e

religiosidade. Em seus quatro capítulos, a minissérie O Auto da Compadecida trazia

consigo algumas inovações como por exemplo a forma de captação de imagens, 46 Conforme site de Memória da Rede Globo disponível em: http://memoriaglobo.globo.com/Memoriaglobo/ -.html > - acesso em 23/08/09. 47 Conforme site de Memória da Rede Globo disponível em: http://memoriaglobo.globo.com/Memoriaglobo/ -.html > - acesso em 23/08/09.

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material utilizado, montagem, exibição e principalmente a migração. Sua concepção

havia sido a de criar um único produto para dois suportes diferentes, ou em outras

palavras, era uma produção do tipo dois em um.

O Auto da Compadecida, segundo Fechine e Figueiroa(2009), pode ser

pensada por isso mesmo, como um processo de variação do idêntico. Feito em

módulos, seguindo um eixo paradigmático único de narrativa, que sofria alteração na

montagem( filme ou minissérie) a partir de arranjos e (re)arranjos de módulos.

“ O modo de organização em módulos, que observamos em O Auto da Compadecida...parece ser um procedimento inspirador para a produção no ambiente de uma TV digital interativa. (...) Por ora, um dos caminhos apontados por profissionais, aliam a pesquisa à produção de programas-piloto para a TV digital, é a roteirização baseada na lógica hipertextual, explorando distintos níveis de navegação. Cada nível de navegação corresponde a uma “camada” narrativa e, a cada nível, o telespectador poderá voltar ao primeiro, a partir do qual retorna ao modo de organização seqüencial do programa. Os espectadores que não desejarem uma fruição interativa podem, evidentemente, optar por se manterem apenas nesse primeiro nível, acompanhando o programa de modo linear como na televisão convencional” (FECHINE, 2008, p. 214).

Na transformação da minissérie ao filme, essas produções acionaram

diferentes formas de fruição. As séries ou minisséries brasileiras, já sedimentadas no

audiovisual brasileiro, fazem parte do gosto popular. MACHADO(2000) nos diz

existir 03 tipos de narrativas principais das quais a televisão se vale para manter

este ciclo ininterrupto de programação. As telenovelas, os teledramas e as séries ou

minisséries que se assemelham as novelas, com algumas variâncias. É comum ter

como característica inicial, um desequilíbrio estrutural a partir de onde se cria toda

uma rede de narrativas entrelaçadas, e de onde surge a evolução da história. Um

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olhar mais atento a Ó Paí, Ó, permite-nos apontar uma mescla dos outros dois

tipos de narrativas seriadas. Dos três tipos de narrativas apontadas por Machado,

tomaremos como exemplos as narrativas seriadas que são um protótipo básico que

se multiplica em variantes diversas ao longo da existência do programa. Segundo

Machado os seriados podem ser descritos como sendo:

“ ... cada emissão é uma história completa e autônoma, com começo, meio e fim, e o que se repete no episódio seguinte são apenas os mesmos personagens principais e uma mesma situação narrativa. Nessa modalidade, um episódio, via de regra, não se recorda dos anteriores nem interfere nos posteriores...”(MACHADO, 2004, p. 84).

Num segundo caso, temos a narrativa seriada onde a única coisa que se

conserva nos vários episódios é a visão geral das histórias, o foco ou a temática.

“...um tipo de serialização em que a única coisa que se preserva nos vários episódios é o espírito geral das histórias, ou a temática, porém em cada unidade, não apenas a história é completa e diferentes das outras, como diferentes também são os personagens, os atores, os cenários e, as vezes, até os roteiristas e diretores”(MACHADO, 2004, p. 84).

Para esta independência de cada emissão, a terminologia adequada a ser

usada é de “ episódios “. O “episódio” está para seriado assim como “capítulo” está

para novelas e séries; pois possuem começo, meio e fim e independem uma da

outra, não importando a ordem de apresentação. A derivação dos episódios se dá

através de novas situações enquanto a audiência justificar a existência da obra. A

inserção de novos atores, a rotatividade dos roteiristas, a alternância das locações e

cenários e absorção de papéis por parte dos atores faz com que o seriado Ó Paí, Ó

tenha esta característica diferenciada.

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“ Entre as suas várias virtudes, o seriado se distingue pela sua imensa capacidade de transformação ( ele nunca é a mesma coisa a cada novo episódio ) e pela sua voracidade em “ deglutir ‘ antropofagicamente todos os outros formatos televisuais, para devolvê-los em seguida sob forma de paródia”(MACHADO, 2004, p.93).

Uma programação seriada implica, de certa forma, em uma simplificação do

trabalho, uma maior rentabilidade e um público cativo por um período maior de

tempo. Dos seriados do cinema, já dizia MACHADO(2000), que derivaram os

seriados de televisão, e que também do cinema veio o modelo básico de

parcelamento que influenciou a televisão e que é usado até hoje. Independente do

tipo de programa, a TV precisa apresentar um fluxo continuo e ininterrupto em sua

programação. Somente através do seriado é que existe esta envergadura para

alimentar com produções audiovisuais esta demanda diária de programação. O

seriado permite acompanhar a história ou resgatar o momento perdido, seja por

lapsos de atenção ou falta de tempo.

Comentando sobre este fluxo constante e ininterrupto, Balogh(2005) nos

chama atenção para o fato de haver a oferta constante e ininterrupta desta

programação gerando um número inimaginável de programas o que por sua vez

leva ao consumo. A este consumismo desenfreado a autora dá o nome de

voracidade televisiva.

“ Para alimentar a voracidade da TV, se criou uma forma industrial de produção: a serialidade.”....” Tal forma de veicular o sentido gera um algoritmo muito diverso de veiculação e apreensão do que do cinema, exibido num continum. Na produção do sentido, gera mecanismos alternos de ‘ suspensão’, manutenção e ‘ reatamento’ do sentido. A TV é pródiga nestes mecanismos.” ( BALOGH, 2005, p. 144).

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A programação horizontal ou a horizontalidade da programação segundo

Souza(2004) “... é a estratégia adotada pelas emissoras para estipular um horário

fixo para determinado gênero todos os dias da semana, com o objetivo de criar no

telespectador o hábito de assistir ao mesmo programa nesse horário...”, o que não

acontece nas emissoras abertas, pois nestas, a programação vem a ser um misto de

programação horizontal e vertical, onde os programas mudam de horário durante a

semana e são reapresentados de forma que atinge uma audiência diferente a cada

dia (SOUZA, 2004, p. 55).

AVANCINI (2004) observa que a televisão seriada está voltada para países

em fase de desenvolvimento (assim como a TV aberta está para países

desenvolvidos) e públicos desprovidos de condições financeiras, se tornando uma

questão cultural e econômica:

“... isso só é viável em sociedades de baixa renda, em países subdesenvolvidos, onde o povo não tem condições de optar por outras formas de entretenimento, Para o europeu ou o americano, existe uma diversidade de opções, pois há uma possibilidade de renda muito grande. Nos Estados Unidos, a novela não existe nos horários nobres, ou seja, das seis da tarde em diante, porque o público não quer se condicionar à obrigatoriedade de voltar a vê-la naquele mesmo horário. Mas existe a novela nas televisões de língua espanhola que pegam a massa de baixa renda na América, que são os porto-riquenhos, os cubanos que migraram. Neste caso, a novela passa no horário nobre, porque é uma massa sem poder aquisitivo, para qual só resta à televisão como divertimento. Então eles ficam disponíveis para a novela. No Brasil, enquanto tivermos essa situação, a novela vai prevalecer no horário nobre como o produto mais importante de comunicação, porque a grande maioria dos espectadores fica disponível para essa chamada programação horizontal – a telenovela” (AVANCINI 2004, p. 170).

Nos seis diferentes episódios veiculados pela Rede Globo, do seriado Ó Pai,

Ó, (a saber: Virado do avesso, Brega, Fiéis e Fanáticos, Negócio torto, Mãe e

quenga e Mercado branco) decidiu-se pela independência dos capítulos,

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característica própria de um seriado. Os seis episódios do seriado, escrito por Guel

Arraes e Jorge Furtado, responsáveis pela redação final, com a colaboração de

Monique Gardenberg e Mauro Lima, foram filmados em Salvador de junho a agosto

de 2008. O seriado contou com a contribuição dos atores do Bando de Teatro

Olodum, que incrementaram os diálogos com improvisações e que opinavam sobre

seus personagens tornando assim a produção mais natural. A esta abertura dada

aos atores para opinar sobre a obra, retratam o caráter colaborativo na forma de

trabalhar de Guel Arraes e seu núcleo.

2.3 A idéia da migração pela coprodução

Numa produção conjunta da Rede Globo de Televisão e a Dueto Filmes -

criada pela diretora Monique Gardenberg em 1982 - e que foi a mesma parceria na

realização do filme, lançou-se Ó Paí, Ó, a série, cujo o tema era o cotidiano dos

moradores do cortiço a partir do mesmo elenco fixo do filme com algumas

alterações. Estas parcerias ou co-produções tem uma razão de ser, uma vez que

amplia o conteúdo da emissora, procurando mostrar uma diversidade das

representações sociais em seus produtos , tendo como protagonistas, muitas vezes

os moradores das periferias. Utilizando-se dessas representações em suas novelas

e minisséries, a emissora procura reproduzir a realidade daqueles que consumem

seus produtos, procurando dialogar com os contrários, dando assim um estilo mais

plural a emissora.

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Desde o surgimento da televisão, a periferia ficou à margem, sendo representada de maneira romantizada (carnaval), estereotipada (novelas, programas de auditório e humorísticos) ou relegada ao universo da criminalidade (telejornais). Somente quando passaram a consumir mais fartamente produtos midiáticos e ganharam destaque em movimentos pela diversificação de conteúdos, os moradores das periferias ocuparam outros espaços, como as séries e os programas. Grande parte dessas produções foi desenvolvida por empresas que firmaram parcerias com a Globo. Elas contribuíram para uma variedade das formas de identificação e de construção narrativa das periferias nos media(MOREIRA, 2009, p. 213).

Para Carolina Jabor, que assina o episódio Virado do avesso do seriado Ó Pai

Ó, a produção permite que uma grande parcela dos telespectadores se reconheça

na TV:

“... o negócio é o equilíbrio na televisão. Caso contrário, você fica num universo elitista. O movimento de trazer a periferia para a TV é fundamental, até porque é a periferia que vê televisão. A pessoa pode se identificar com o que está vendo, o que é muito legal.” 48

Para Moreira(2009), a Rede Globo em resposta a uma grande demanda do

mercado por programas que mostrassem as populações menos favorecidas

economicamente “ ... surgiu quando a periferia nacional se transformou em um

cânone do espetáculo cultural. Para conquistar esta fatia da audiência,a Globo

precisou se adaptar.(...) Assim como nos filmes nacionais, as co-produções da

Globo se inspiraram nos temas e na linguagem dos documentários. O trabalho com

não atores, a ausência de marcações e a câmera solta( filmagens com câmera na

mão) colocam um pé dessas produções no documentário. Não foi a partir daí, no

entanto, que a periferia começou a aparecer na Globo”(MOREIRA,2009, p.213).

Grande parte das produções feitas em parceria resultou em produtos bem

articulados, de boa aceitação e reconhecimento nacional e internacional, uma vez 48 Depoimento de Carolina Jabor, Cf.: http: //www . flick.com/photos/angar/2986409078, acesso em 13/12/2009.

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que sua criação tem como propósito a construção de uma variedade de formas de

narrativas, uma maior penetração no mercado e o retorno financeiro. Podemos

deduzir que embora pareça que o filme não tenha sido pensado para ter sua

continuidade na TV, no formato de minissérie ou seriado, o simples fato de sido feito

em parceria entre a Rede Globo e a Dueto Filmes, nos leva a crer, embora em

nenhum momento tenha sido cogitado a possibilidade, que já havia o intento de

algum tipo de continuidade.

“A Globo Filmes faz parcerias com pequenos, médios e grandes estúdios e produtoras independentes de cinema, e oferece aos diretores a garantia da participação de atores das novelas da TV, além de anúncios, merchandising, promoções de vendas. O formato, e sobretudo a linguagem dos filmes muitas vezes reproduz o estilo, qualidade, linguagem e a teledramaturgia da Rede Globo. O grupo acredita na expansão dos conteúdos, e investe cada vez mais na união entre as suas empresas, e por isso criou um Modelo de Entretenimento comandado pelo executivo Manoel Martins, que integra Criação, e Produção. O foco da Rede Globo é ousar na convergência das mídias, mas não pode se acomodar – porque as outras emissoras perceberam que quem tiver poder nas outras mídias será o verdadeiro líder de audiência. Ela é, há anos, a líder de audiência no ranking de televisão aberta.”49

Respondendo a uma demanda do mercado, a Rede Globo acompanhou esse

movimento pela ampliação de conteúdos.

49 Cf.: http : www.cabecascaninas.wordpress.com/.../rede-globo-nas-novas-midias-ano-2009, acesso em 12/12/2009.

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2.4 Guel Arraes e os processos de transmediação

O seriado Ó Paí, Ó guarda relações com as séries de Guel Arraes. O humor

irreverente, escrachado e despudorado, marca registrada de Guel, ocupa seu

lugar na produção, o que elevou a obra ao gênero de comédia. Quando iniciou sua

carreira como diretor, Guel já tinha uma experiência anterior, pois tinha sido

assistente do diretor Carlos Manga50 que fez sucesso na época das chanchadas da

Atlântida . Segundo o próprio Guel , buscou-se retomar a tradição da chanchada na

teledramaturgia. Passaram, então a usar elementos e mecanismos, sobretudo sua

natureza paródica, recursos que, se no cinema, eram comuns, na televisão da época

eram impensáveis. Além disso, eles levaram para as novelas o estilo de comédia

maluca – gênero cinematográfico dos anos 30 – e deram a ela dimensão

metalingüística(FIGUEIRÔA, 2008, p. 152).

Depois de ter seu espaço consolidado dentro da Rede Globo, que é o núcleo

que recebe seu nome, Guel congregou inúmeros profissionais que vinham de

diversas áreas como cinema, teatro, jornalismo e televisão tendo como resultado um

dos principais produtos do audiovisual, que é o hibridismo de linguagens, chegando

à diluição de fronteiras entre o cinema e a televisão ( FIGUEIRÔA, 2008, p.153).

Segundo Fechine, a experiência brasileira de migração entre meios, tem seu

início em 1999, com a minissérie “O Auto da Compadecida”(1999) de Ariano

50 José Carlos Aranha Manga é roteirista e diretor de cinema e televisão; tendo iniciado sua carreira na Atlântida e a convite de Chico Anísio começou a trabalhar na Rede Globo onde permanece até os dias atuais..

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Suassuna(FECHINE, 2008, p.193). Com adaptação e direção de Guel Arraes, a

minissérie conta as peripécias de João Grilo e Chicó, na cidade de Taperoá, no

sertão da Paraíba. Sendo filmada em película de 35 mm é exibida pela Rede Globo

de Televisão como uma minissérie de quatro capítulos em janeiro de 1998, sendo

que um ano depois a mesma série é reeditada e exibida nos cinemas alcançando

grande sucesso. Com 100 minutos a menos do tempo total da minissérie, O Auto da

Compadecida chega aos cinemas e alcança um público de dois milhões de

expectadores apesar de já ter sido exibida gratuitamente na televisão. O desejo de

Guel e seu núcleo de extrapolarem o espaço da televisão foi o que fez com que se

perguntasse: “Por que não fazer os dois?” Para podermos entender as obras de

Guel Arraes no que diz respeito à migração e transposição entre meios, precisamos

entender que estes horizontes de transposição já era visível para ele como a

diluição de fronteiras entre cinema e televisão.

“ O experimentalismo é a tônica de sua produção. Seus programas, minisséries e filmes, entre uma gama de trabalhos por ele realizado, são sempre marcados pelo hibridismo e um teor que desconstrói os ritmos de linguagens e fórmulas consolidadas de certos meios e formatos de produção visual, com destaque para o aproveitamento de recursos metalingüísticos, algo que, nos anos em questão, era uma novidade na televisão”( FIGUEIROA, 2008, p. 155).

Para Guel, uns dos desafios a ser vencido, como profissional da televisão era

o curto tempo de vida das produções televisivas. Este provavelmente foi um dos

fatores que o levou a idealizar e criar um produto que tivesse uma maior

durabilidade ou tempo de vida. Este tempo de vida mais longo não se referia a uma

serialização das produções pois elas já existiam. Mas uma forma de estas

produções transitarem por suportes concorrentes e ao mesmo tempo paralelos e

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colaborativos em matéria de veiculação de produções: a televisão e o cinema.Em

depoimento, o próprio Guel declarou:

“Por outro lado, você fazia um programa, que dava um trabalho enorme, mas que também não tinha permanência. Passava na TV uma vez e nunca mais. (...). Nesse período, eu, o Jorge(Furtado) o João( Falcão) e o Pedro(Cardoso) discutimos muito se valia a pena fazer televisão. No cinema, as coisas repercutem e duram. Se você faz um programa de televisão inovador, sai uma notinha no jornal e depois se esquece. Na televisão, há repercussão, mas parece que as coisas não vivem, não ficam. O “ Auto “ surgiu quando a gente já estava começando a se cansar da TV. (...) Notamos que todas as adaptações que a gente fez de clássicos da nossa literatura, e que davam um trabalho de cão, não marcavam, ninguém lembrava direito porque o que fica, na televisão, são os programas levados ao ar por mais tempo (...). Foi quando eu pensei: caramba, tudo que a gente faz já é, de certo modo, cinema; nós estamos nos perdendo...Todo mundo já estava mais velho, não queria mais fazer trabalho em três dias, todo mundo queria fazer trabalho mais elaborado, se não houvesse mais espaço para isso, o caminho natural seria o cinema ou o teatro”(ROCHA, 2008, p. 123).

E por fim chegamos a Ó Pai, Ó, lançado inicialmente nos cinemas e que

posteriormente migra para a televisão onde Guel Arraes, juntamente com Jorge

Furtado, sob a direção de Monique Gardenberg, é responsável pela redação final.

Não há duvidas de que a transversalidade destas obras, do cinema para a TV e da

TV para o cinema são exemplos claros e precisos daquilo que chamamos de

Transmediação.

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2.5 Desdobramentos de uma transposição: uma narrati va transmidiática

A transposição é o termo aplicável para designar uma transcrição de

linguagem que altera não só o suporte lingüístico, mas principalmente o suporte de

veiculação. As ações de transposição tem se tornado uma ação mais freqüente e

tem demonstrado que tem dado certo a partir do momento em que o público entende

e procura acompanhar toda e qualquer produção que migra entre diferentes mídias.

Considerada como o ponto alto das experiências de transposição entre mídias, a

obra O Auto da Compadecida dá início a uma série de tentativas e projetos de fazer

com que as produções televisivas assim como as cinematográficas dialoguem mais

intensamente.

As ações de transposição realizada por Guel Arraes dividiu opiniões e causou

reações diversas por causa da introdução de uma produção que se dizia televisiva e

que foi transformada em produção cinematográfica ou vice-versa. Esta

transversalidade de conteúdos, trouxe à discussão, as fronteiras e limites da

televisão e do cinema. Para FIGUEIROA (2008) isso só fez ressurgir um impasse

conceitual originado na década de 90 quando se estabeleceu como correto,

princípios de especificidade dos meios por conta do crescimento de recursos

eletrônicos que davam às produções maior autonomia na captação e produção da

imagem cinematográfica, que até então pertencia ao cinema. Estas discussões, não

só se fundamentavam na obtenção da melhor imagem obtida através do suporte

película, mas também questões mais genéricas de ordem sociológica, econômica,

política, estética e outras que envolviam televisão e cinema. Como observa

Figueiroa:

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“Em meio à evolução contemporânea que a linguagem audiovisual tem conhecido, a tecnologia eletrônica e seu desdobramento digital, vem se mostrando a mais revolucionária: pela acessibilidade quanto a custo da sua obtenção, pela possibilidade facilitada de manipulação da obra e pelo contexto peculiar que esse meio possui. Atualmente, o cinema e a televisão acompanham essa revolução em que é possível perceber as conseqüências extraídas do simples fato de se poder ter equipamento portátil, relativamente acessível em termos financeiros, de se poder tratar as imagens digitalmente e de se poder manipulá-las infinitamente. A questão da revolução no meio audiovisual passa, obviamente, pelas possibilidades de manipulações lingüísticas e de retórica da imagem. A utilização da tecnologia digital, vem portanto abrindo perspectivas de uma imagem híbrida, na qual é cada vez mais difícil estabelecer o que é próprio do cinema e do vídeo” (FIGUEIROA, 2OO8, p. 149).

Com relação à direção de uma produção para cinema ou televisão, durante

uma entrevista, o diretor e roteirista de Ó Pai, Ó, Jorge Furtado companheiro de

Guel Arraes responde a pergunta sobre qual seria a diferença entre dirigir cinema e

televisão:

“A linguagem do cinema e da televisão é a mesma, a diferença é a maneira como se vê e não como se faz. A televisão é feita para um público enorme e muitas vezes desatento. O cinema atinge menos gente, mas é visto com grande atenção. Esta diferença faz com que o cinema seja (ou deva ser) mais sutil, mais profundo, mais rico em detalhes. A direção para o cinema tem que ser mais atenta a pequenos detalhes, pois todos são percebidos pelos espectadores que saiu de casa para ver o filme, pagou ingresso e assiste a tudo numa grande tela, numa sala escura”.51

De posição idêntica, Balogh (2005) comenta sobre as diferenças percebidas

entre o cinema e a televisão:

“Há todo um veio da crítica que se detém nas diferenças entre o cinema e a TV. Apontam-se diferenças tecnológicas, dado que o cinema é uma imagem fotográfica e a TV é eletrônica; diferenças de percepção e atitude de recepção, posto que no cinema a fruição se faz em ambiente escuro e próprio à concentração da atenção, enquanto que a TV é vista no ambiente doméstico, com luz e amplas possibilidades de dispersão da atenção. A tela do cinema é grande e

51 http://globofilmes.globo.com/Globofilmes/Imprensa, acesso em 21/08/2009.

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implica uma relação de distância e fascínio, enquanto a da TV é pequena e implica uma relação próxima, de familiaridade. A TV está muito mais adstrita a um quadro contextual de programação e previsão de gênero que o cinema, e assim por diante” (BALOGH, 2005, p.45).

No caso da TV, as minisséries e seriados têm uma melhor adequação, visto

que a programação tende a ser fragmentada em blocos de curta duração. Arlindo

Machado (2000) chama de serialidade a essa apresentação descontínua e

fragmentada sob forma de edições diárias, semanais ou mensais. Para que isto

aconteça, os enredos das narrativas são estruturados contendo capítulos e

episódios de acordo com a programação exibida, que por sua vez são separados em

blocos menores separados pelos intervalos para apresentação dos comerciais. A

existência destes “breaks” vem a ser providencial uma vez que toda a programação

se estende por um longo período, o que mantém o público preso a programação..

Na programação, o principal elemento é o horário de transmissão que cada

programa é levado ao ar o que criou o conceito de programação horizontal.

Segundo Machado(2000) é o gênero da programação que orienta todo o uso

da linguagem no âmbito de um determinado meio, pois é nele que se manifestam as

tendências expressivas mais estáveis e mais organizadas da evolução de um meio,

acumuladas ao longo de várias gerações de anunciadores. O autor questiona se

nossos conceitos de gênero já não seriam insuficientes para dar conta da

complexidade dos fenômenos, pois geralmente queremos colocar obras tão distintas

no mesmo pé de igualdade. Na verdade o estudo dos gêneros dos programas exige

a compreensão do desenvolvimento da televisão sob vários ângulos, aspectos e

perspectivas. Alguns gêneros postos na televisão brasileira, seja pela falta de

tecnologia, seja pela praticidade, seja pela improvisação ou até mesmo pela

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criatividade ou experimentação, acabaram por resultar em fórmulas de sucesso,

acabaram por resultar numa televisão que conhecemos como a televisão com a cara

do Brasil.

Em 2001, o núcleo Guel Arraes fez o remake do programa A grande família ,

criado por Oduvaldo Viana Filho, e que se tornou um dos seriados mais duradouros

da televisão. No ano de 2007, a série migrou para os cinemas com o título: A

Grande Família: O filme. O mesmo se dá com Caramuru – a invenção do Brasil,

onde Guel era responsável pela roteirização e direção, migrou da televisão e foi para

o cinema em 2001, numa remontagem da minissérie exibida pela Rede Globo no

ano de 2000. Em 2003, também com roteiro e direção de Guel Arraes a Globo

Filmes juntamente com Natasha Filmes, lançam o filme Os Normais , baseado na

minissérie homônima.

Ainda em 2005, surgia a série Carandiru – Outras histórias, inspirada no

filme

Carandiru (2003) de Hector Babenco, da adaptação do livro de Dráuzio

Varella, médico que relata sua convivência com os detentos em um dos maiores

presídios da cidade de São Paulo. O Coronel e o Lobisomem também migra para o

cinema(2005) depois de ter sido adaptado para a televisão no ano de 1994. Já na

ordem inversa, ou seja, do cinema para a televisão surgia em 2006/2007 a

minissérie Antonia, que surgiu do filme homônimo dirigido por Tata Amaral, na qual

se contava a história de um grupo de cantoras de rap, encabeçado por meninas da

Vila Brasilândia, periferia da zona norte de São Paulo, indo ao ar durante duas

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temporadas entre estes anos. Já Cidade dos Homens chega às telas do cinema no

ano de 2007, baseado no seriado homônimo exibido pela Rede Globo. E por fim

chegamos a Ó Pai, Ó, lançado inicialmente nos cinemas e posteriormente migra

para a televisão em formato de seriado e não como minisséries como de costume.

Para FECHINE e FIGUEIROA(2009), as produções cross mídia podem ser

agrupados em dois distintos modos de classificação; considerando a captação de

imagens, manuseio e veiculação da obra, nos diferentes suportes. São eles: os

produtos remontados como é o caso de O Auto da Compadecida(1999) e A

invenção do Brasil’(2000) que num primeiro momento foram veiculados como uma

minissérie e depois foram remontados, a partir do próprio material, para o cinema

respeitando as especificidades de cada suporte. A re-edição do mesmo material

gravado, como resultado de variações de cenas gravadas em módulos e de acordo

com a ordenação ou seqüência com que são postos estes módulos, surge então

uma segunda produção.

No outro grupo estão o que eles chamam de produtos desdobrados, ou seja,

aqueles que ocasionam a continuação da história em outros episódios. Aí sim,

temos então o caso de Ó Pai, Ó, onde o filme dá origem a série. Seu

desdobramento se dá através da continuidade de algumas narrativas dentro do filme

que tiveram um prolongamento.

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2.5.1 Ó Paí, Ó como uma narrativa transmidiática

Dá-se o nome de Transmediação ou narrativa transmidiática ao

compartilhamento de narrativas ficcionais entre diferentes suportes midiáticos,

independente do sentido ou ordem que ocorram; “... se desenrola através de

múltiplos suportes midiáticos, com cada novo texto contribuindo de maneira distinta

e valiosa para o todo. Na forma ideal de narrativa transmidiática, cada meio faz o

que faz de melhor, a fim de que uma história possa ser introduzida em um filme, ser

expandida pela televisão, romances e quadrinhos; seu universo possa ser explorado

em games ou experimentado como atração de uma parque de diversões”(JENKINS,

2008, p. 135).

Para Jenkins(2008) criador do conceito de Transmedia storytelling (contar

histórias em várias mídias), a vazão no fluxo de produções aumenta a partir do

momento em que se tem uma diversidade de plataformas de contato.

Para alguns, este fluxo entre os meios não é algo recente, pois teria

começado desde as migrações “... do folhetim para o rádio, do rádio para a TV, da

TV para o cinema, do livro para TV etc. Para Lopes et al(2008) a produção no meio

audiovisual, “ configura-se na produção da teleficção a necessidade de envolver o

espectador por meio de conexões com as mais variadas mídias, numa tentativa de

seduzi-lo à interação com a trama em múltiplas condições, de participante,

colaborador e até de co-autor das ficções por meio da ampliação das possibilidades

de intervenções que a ele são apresentadas”(LOPES et al 2009, p. 395).

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Para Jenkis(2008) grandes partes dos programas audiovisuais estão sendo

planejados para maximizar elementos que exercem atração sobre os fãs; e esses

programas tendem a permanecer por mais tempo no ar, pois “cada vez mais, as

narrativas estão se tornando a arte da construção de universos, à medida que os

artistas criam ambientes atraentes que não podem ser completamente explorados

ou esgotados em uma única obra, ou mesmo em uma única mídia(JENKINS, 2008,

p. 158).

Ele nos fala de como os diversos pontos de contato – em se tratando de

mídias – seja televisão, seja cinema, ou outros meios, podem promover uma

produção, pois prolonga o relacionamento ou envolvimento entre obra e o

telespectador, continuando assim o seu tempo de vida. Em outras palavras, a

convergência pode se estender ou perpetuar, quanto maior for o numero de pontos

de contatos, da obra com o telespectador. Este permanecer mais tempo no ar, pode

significar produções que sofrem um processo de desdobramento da obra original,

gerando uma série.

“ ... a velha idéia da convergência era a de que todos os aparelhos iriam convergir num único aparelho central que faria tudo para você( à La controle remoto universal). O que estamos vendo hoje é o hardware divergindo, enquanto o conteúdo converge.”52

Para FECHINE(2009), a televisão e o cinema nacional tem exemplos claros

de narrativas transmidiáticas; tendo seu início sido marcado fortemente pelas

transposições feitas nas obras O Auto da Compadecida(1999) de Ariano Suassuna,

52 Cheskin Reseach, “ Designing Digital Experiences for youth” – Market Insigths Series, 2002, p.8-9 Apud JENKINS, 2008, p. 41.

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pelo diretor Guel Arraes quando lança o produto do tipo ‘ dois em um’; pensado e

criado para a televisão e para o cinema simultaneamente. A seu ver, ali se inicia

uma nova era no que diz respeito a transmidiação na produção audiovisual no

Brasil.(2009, p. 354). Tendo sido seguido pelas produções da série ‘ A invenção do

Brasil’(2000), que após ser exibida na televisão foi remontada, originando o filme

Caramuru: a invenção do Brasil’(2001). E o mesmo se deu com a série

Antonia(2007).

Nossas experiências transmidiáticas parecem estar aquém do conceito pleno

de transmídia. Uma vez que seus desdobramentos não alcançam a edição de

comics, games, não produzem super heróis, etc, pois na maioria dos casos as

minisséries e seriados não possuem conteúdo que originem estes desdobramentos.

Mesmo assim podemos dizer que, Ó Pai, Ó se enquadra nas experiências

transmidiáticas, pois transita livremente em suportes diferentes, seja do cinema para

a TV ou vice-versa.

2.5.2 Receptividade

Além da Bahia, onde o seriado alcançou altos índices de audiência, talvez por

retratar o Pelourinho e seus moradores em condições adversas, o mesmo não se deu

em outras regiões do país. Nos três primeiros episódios, o alcance foi de 39 pontos no

Ibope o que representa 865 mil pessoas53, chegando a alcançar 46 pontos54 ou seja, em

cada 10 televisores ligados, sete estavam ligados no seriado. Esses dados refletem uma

53 Cf. www.atarde.com.br/cultura/noticia acesso em 02/01/2010. 54 Cf. www.estadao.com.br/noticias/suplementos,o-pai-o-baianidade-da-ibope-htm. Acesso em 15/11/2009.

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maior aceitação em Salvador e não reflete, na mesma intensidade, o mesmo no sul e

sudeste. Em São Paulo, por exemplo, o índice foi de 20 pontos a média, chegando ao

pico de 24 pontos, e foi considerado uma boa média em relação a outros programas

levando em consideração o gênero e o horário. Apesar dos diferentes níveis de

aceitação a nível nacional, o seriado repercutiu de tal forma que recebeu a indicação

para representar o Brasil no recebimento do prêmio Emmy Internacional, concedido a Ó

Paí, Ó – o seriado – como o melhor programa de comédia no ano de 2008 - e gerou

uma segunda temporada que será gravada na Bahia e será baseado na peça teatral “O

inimigo do povo” do dramaturgo norueguês Ibsen e seus capítulos serão interligados

caracterizando o formato série.

Um dos fatores que pode explicar a popularidade e o alto grau de aceitação deve

ser a identificação do telespectador com as questões sociais abordadas em cada

episódio. De forma hilária, a série consegue levar a mensagem de que a sociedade

brasileira sofre dos mesmos males, em maior ou menor grau, independente dos traços

regionais e culturais. Do dia a dia do Pelourinho, o seriado trouxe para as telinhas (com

algumas alterações)55 os mesmos personagens que figuravam no filme, só que em

situações diferentes, pois a idéia era “... um retrato irreverente e musical de uma Bahia

pop e contemporânea”.56

Outra preocupação que se tinha e que se cogitava era se o seriado iria seguir a

mesma linha do filme ou se seria readaptado e teria uma cara mais sulista.

55 Como exemplo temos a substituição do personagem Boca, vivido por Wagner Moura, participou do filme e não podendo continuar na série precisou ser substituído por Mateus Nachtergaele no papel de Queixão, uma espécie de maluco beleza no drama. 56 Cf.: HTTP://tvglobo.opaio.globo.com/novidades,acesso em 02/02/2009.

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“É claro que sinto falta na TV como senti falta no cinema e sentia no teatro, de um texto, de uma crítica mais elaborada ao racismo e de uma encenação que explore mais, do ponto de vista dramatúrgico, as possibilidades dos talentosos artistas que compõem o “Bando…”. Algo que obrigue os atores, logo os baianos e os brasileiros a transgredir a caricaturesca “baianidade”. 57

Ó Pai Ó, encontrou uma boa acolhida nos lares brasileiros porque expõe uma

Bahia nunca vista da forma como foi no seriado. Ele é resultado de uma produção que

levou em consideração a sociedade contemporânea e seus desajustes. Segundo Hugo

Passolo(2009), a obra se destaca porque:

Vai além da denúncia da violência, triste e necessária, e mostra que os pobres, cheios de contradições e alegria, têm voz e vez. Não é simples ter essa visibilidade na Globo. É uma conquista. E, melhor, é feito com apuro técnico e visão artística sensível, importantes para nossa cultura. Quando tanto se fala no papel da televisão pública, a maior emissora privada do país dá um excelente exemplo de obras de ficção que têm qualidade e audiência significativas.58

2.6 Qual a importância de Ó Pai, Ó?

Depois de um estudo profundo da obra, pode surgir a pergunta: qual a importância

de Ó Pai, Ó? Qual o legado que ele deixa? Qual a contribuição que ele traz? Por trás de

suas cenas cômicas, existe todo um discurso de questionamentos que levam à reflexão.

A graça de ver Ó Pai, Ó está em poder mostrar no desdobramento da obra que é o

seriado, não a história de uma região que foi castigada pela expulsão dos moradores

devido ao mau uso do poder público, trazendo em seu lugar o império da indústria

57 Cf.: http://mundoafro.atarde.com.br/?p=446, acesso em 21/10/2009. 58Cf.: www.blogdavila.blogspot.com/2009/05/o-bando-na-folha/html acesso em 22/12/2009.

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cultural do consumo. Mas em sentido figurado, mostra a história do povo que foi

castigado pela expulsão de seus direitos para que surgisse no local, a cultura da

indústria do consumo. Ao invés de moradias temos agora o comércio, ao invés de

moradores, temos agora turistas.

Não há crítica social objetiva e direta tanto no filme quanto na série, o que

contraria o discurso da obra Ó Pai Ó na sua origem, apenas demonstrações de

descontentamentos. Do mecânico fogoso que aspira ser cantor passando pela baiana

do acarajé, a religiosa que vê no carnaval uma manifestação do diabo, a mau falada, a

parteira, os famosos (Globais) que lotam o carnaval da Bahia, a invasão dos

evangélicos, o falso candomblé, os guias turísticos, a violência nas ruas, e a

americanização do linguajar para poder receber os turistas desfilam livres e

superficialmente na produção de Monique Gardenberg.

A região, continua lá, enfeitada, castigada pelo abandono, maquiada, para inglês

ver. A importância de Ó Pai, Ó está em poder trazer à consciência da nação, a beleza

radical que floresce naquela região, do Pelourinho, de Salvador, da Bahia. A importância

está em conceber duas obras distintas( filme e seriado) como variações de um mesmo

tema, tão distantes e tão próximas, que se completam. Por que é importante? Em

depoimento á rádio CBN, Arnaldo Jabor descreve quais as contribuições de Ó Pai, Ó e o

porquê da necessidade de vê-lo.

“... porque mostra a radical beleza da Bahia de Salvador, da região mais

rica de nossa cultura – as áreas pobres - mais ricas de hábitos, da música,

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da liberdade, da africanidade revolucionária, da Bahia.” ( JABOR, 2009)

Onde a musicalidade não destoa das ações, pelo contrário, dá um certo ritmo a

liberdade de expressão e de vida. Nos reveses da vida vale tudo, inclusive misturar

samba com reggae, resultando em samba-reggae, axé; não importando se você é

Timbalada, filhos de Gandhi, Didá, ou Olodum. Não importa se adota como tema de

carnaval a Bahia ou Cuba, contanto que as cores de seus trajes reflitam a alegria e

liberdade que se conquista a cada dia.

Ó Pai, Ó pode emocionar pela reserva de humanidade que ele exibe, a

diversidade sexual, a malandragem poética, o calor da miscigenação; numa Bahia que é

o oasis da brasilidade em meio a essa descaracterização que a sociedade branca e

globalizada impõe. Ó Pai, Ó, traz em seu discurso possibilidades de manipulações

lingüísticas e de retórica da imagem dirimindo qualquer dúvida que existe uma Bahia

viva e que pulsa a cada manifestação popular. Que existe em cada episódio, um modo

diferente de ver e viver o Pelourinho, através do ponto de vista de cada personagem da

trama. Esta revisitação em cada episódio faz com que a Bahia seja vista de um

diferente ângulo.

Como o próprio nome já diz: Ó Pai, Ó!, olhe para isto, olhe para as diferenças,

olhe para a renovação que ocorre incessantemente, olhe para as mazelas, olhe para as

mudanças que não aconteceram, olhe para nossa incapacidade diante de tantos fatos,

olhe para os tantos “não” que a vida nos oferece. Ó PAI, Ó fala das regiões pobres,

desprovidas do conhecimento, desprovidas de vantagens e oportunidades. Fala da

dependência que temos uns dos outros enquanto vivermos cercados de problemas e

provações, pois é na diferença e na dificuldade que nos tornamos fortes enquanto

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estivermos unidos.

Ó Pai Ó, se tornou objeto de estudo uma vez que trouxe, implicações,

interferências e conseqüências econômicas, sociais e culturais .O seriado que, como já

visto, surgiu do desdobramento do filme homônimo, tem roteiro conciso onde os

diálogos tem um humor inteligente. Os roteiristas Guel Arraes e Jorge Furtado, aliados à

visão dos diretores de cada episódio como Carolina Jabor, Mauro Lima e Olivia

Guimarães sob a direção de Monique Gardenberg, dão à série uma linguagem

cinematográfica, a cada episódio, o que raramente ocorre em minisséries ou seriados

nacionais. Por ter se originado em teatro pelo Bando de Teatro Olodum, Ó Pai Ó, tem

sua tônica voltada as questões sociais, sendo posteriormente adaptado para cinema e,

depois, para série pela mesma trupe, o que dá indícios de que a produção cresce e se

transforma no sentido em que avança. Despreocupada de quem a protagoniza - pois a

atuação de Roque (Lazaro Ramos) se perde em meio a desenvoltura de tantos atores -

revela talentos, pois cada personagem parece ter sido desenhado para os atores uma

vez que é difícil determinar onde começa um e termina o outro.

Como já acontecera antes, a Rede Globo em seus processos de parceria e co-

produção, abre espaço para produções que voltam seu olhar para a sociedade,

principalmente em se tratando da periferia, como aconteceu com Cidade dos Homens,

Antonia, e tantos outros, mostrando uma brasilidade que era utopia até então, nos meios

audiovisuais. Ó Pai, Ó descortina cenas de um Pelourinho nada turísticas, onde seus

moradores são revelados ou representados através da trama daqueles que vivem no

cortiço. Suas situações humoradas não deixam de disfarçar o drama vivido ali, o que não

restringe o seriado ao mero entretenimento mais denuncia estes entraves de forma a

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levar o telespectador à reflexão.

Além disso, há algo muito importante desde o teatro que persiste no cinema e na TV. Vejo que a música, o carnaval é um personagem sem corpo que costura toda a encenação e aproxima aquelas vidas rasgadas. No filme e na TV, o carnaval e a música se diluem dramas e questões sociais, por outro lado, apresentam o preconceito e a discriminação racial como um dado constitutivo, espetacular e ordenador da vida daquelas pessoas, tão próximas da realidade soteropolitana. Nunca vi nada igual na Rede Globo de Televisão. Ó PAÍ Ó!59

Se permaneceram traços de continuidade nas adaptações da peça para o filme e

do filme para o seriado, foram os traços de desigualdade, preconceito, marginalização, e

do esquecimento . São produções autônomas e independentes. Essas desigualdades

dão a Ó Pai Ó, uma identidade única que é a de retratar a realidade como se apresenta

hoje, através do teatro, cinema e televisão e de ter podido retroalimentar estas mesmas

produções a partir de cada novo lançamento, ou seja o filme retroalimentou o teatro, e a

série por sua vez, retroalimentou o filme e o teatro também. De certa forma, o seriado Ó

Pai, Ó busca este resgate, resgate de um Pelourinho mais humano, mais igualitário, o

resgate da memória, da história, daqueles que já fizeram parte do Pelourinho.

CONCLUSÃO:

A partir do estudo de Ó Pai, Ó, pode-se perceber quão importante é

dimensionar os limites da experimentação e seus resultados, considerando as

migrações de obras audiovisuais entre diferentes suportes como experimentos

dentro de um processo de transmidiação. Antever o fluxo da criação de obras, tanto

televisivas ou cinematográficas e destiná-la a somente um veículo, de forma que

59 Cf.: http://mundoafro.atarde.com.br/?p=446, acesso em 21/10/2009.

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esta obra cumpra plenamente o propósito para qual foi criada. As obras criadas sem

os paradigmas da especificidade do meio, nascem livres dos traços da ética e da

estética tornando-se passível de transitar em diferentes suportes, valendo-se da

condição de híbridas. Um estudo de Ó Pai, Ó e de seus movimentos de

transmutação e transposição entre cinema e televisão, pode-se resultar nas

seguintes deduções:

• uma vez que a indústria televisiva descobriu que, através da serialização de suas

produções, prolongam a manutenção de uma relação com seus telespectadores,

intensificaram esta relação através das co-produções que ampliam seu leque de

produções como opções para os mais variados gostos. O seriado Ó Paí Ó surge

então como um desdobramento do filme homônimo vindo confirmar o propósito das

parcerias;

• a idéia de que os suportes não esgotam as possibilidade de veiculação de uma

obra, havendo assim a necessidade de migrarem para outros suportes, ocasionando

assim o desdobramento de Ó Paí Ó, do cinema para um seriado na TV;

• quanto maior forem os pontos de contato, mais necessidade tem a obra de

transitar entre os diversos tipos de mídias, seguindo o fluxo comum da

convergência, pois “ a experiência não deve ser contida em um único suporte

midiático, mas deve estender-se ao maior número possível deles.”(JENKINS 2008,

p.104). O longa metragem deu origem ao seriado, que por sua vez, gerou um DVD

tanto do filme quanto do seriado, como também o CD de músicas.

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• Uma vez que a obra, já na sua origem, tende a ser feita para ambos os suportes

(televisão e cinema ) deixam de existir as paradigmas e preceitos sobre as

especificidades do meio, valendo-se da condição de híbridas.

Pode-se entender Ó Pai Ó, como uma produção teatral criada por Márcio

Meireles que tem cunho político-ideológico e que através de Monique Gardenberg

passa pelo processo de transmutação para os meios audiovisuais. No cinema, não

alcança um reconhecimento esperado. Mas, apesar da polêmica em torno do filme,

o mesmo conseguiu chamar a atenção, pois sua abordagem provocou os mais

diferentes sentimentos, polarizados entre aceitação e repulsa . A transposição do

filme para a televisão ocorreu não como resultado de uma re-edição ou

remontagem de um material pronto mas de um desdobramento do original o que

resultou num seriado. Apesar deste cruzamento de mídias ter como objetivo único o

entretenimento, observa-se em Ó Pai, Ó a viabilização da mesma obra para

diferentes suportes, e principalmente o estreitamento das relações entre cinema e

televisão.

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PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. Trad. José Teixeira Coelho. São Paulo : Perspectiva, 2003. PEIRCE, Charles Sanders; HOUSER, Nathan. The essential Peirce: selected philosophical writings. Bloomington : Indiana University Press, 1998. PINTO, Roque. A Bahia reimaginada. Congresso Virtual de Turismo (NAYA), 2001. ROCHA, Maria Eduarda da Mota. Guel Arraes: leitura social de uma biografia. in Guel Arraes: um inventor no audiovisual brasileiro. CEPE : PE, 2008. SADEK, José Roberto. Telenovela: um olhar do cinema. Summus : São Paulo, 2008.

SANTAELLA, Lucia. Semiótica aplicada. São Paulo : Pioneira, 2004.

SANT´ANNA, Márcia. Da cidade-monumento à cidade-documento: a trajetória da

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SOUZA, José Carlos Aronchi de . Gêneros e formatos na televisão brasileira. São

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ANEXOS 1

SINOPSE DOS EPISÓDIOS DA SÉRIE Ó PAÍ, Ó

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Ó PAÍ Ó PRIMEIRO EPISÓDIO: Mercado Branco REDAÇÃO: Mauro Lima, Bando de Teatro Olodum REDAÇÃO FINAL: Guel Arraes, Jorge Furtado e Mauro Lima DIREÇÃO GERAL: Monique Gardemberg

O bar mais freqüentado do Pelourinho, em Salvador, é gerenciado por Neusão

(Tânia Toko), que vende fiado para seus clientes e amigos das redondezas. Com

uma lista enorme de contas penduradas, ela não consegue fechar o caixa do mês e

ainda tem que saldar um empréstimo que fez em uma financeira. Para piorar,

Queixão (Matheus Nachtergaele) resolveu vender bebidas no isopor na frente de

seu estabelecimento, e como mercado informal não paga imposto, ele está

vendendo com preços menores e roubando a clientela de Neusão. Desolada, a

proprietária se queixa com Roque (Lázaro Ramos) do mercado negro, e ele

rapidamente explica que quem está faturando alto é Queixão e que esse mercado,

na verdade, é branco. Inspirado nas falcatruas de Queixão, Roque compõe a canção

"Mercado Branco", que tem tudo para fazer sucesso nas rádios da cidade. O taxista

Reginaldo (Érico Brás) prontamente se candidata para ser empresário do amigo e

Queixão, que não perde uma chance em que pode se beneficiar, oferece o estúdio

de seu primo Arlindo Wallace (Gilberto Lima) para a gravação do CD. Porém, o

cantor não imagina que seu trabalho cairá nas mãos dos camelôs da cidade antes

mesmo de ser lançado. E adivinha quem está por trás da pirataria? Queixão. A vida

dos moradores do cortiço de Dona Joana (Luciana Souza) também não anda nada

fácil. A proprietária sequer contribuiu com a corrente de evangelização da igreja e o

Pastor (Lázaro Machado) foi cobrá-la em sua casa. Para saldar a dívida, cobra de

Yolanda (Lyu Arison) a parte pendente de seu aluguel. Pressionado por Yolanda,

Reginaldo pede dinheiro emprestado Maria (Valdinéia Soriano) e ela, a Baiana

(Rejane Maia), que está devendo um dinheirinho para a amiga.

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Ó PAÍ Ó SEGUNDO EPISÓDIO: Mãe e Quenga REDAÇÃO: Monique Gardemberg e Bando de Teatro Olodum REDAÇÃO FINAL: Guel Arraes, Jorge Furtado e Monique Gardemberg DIREÇÃO GERAL: Monique Gardemberg

Reginaldo (Érico Brás) está muito ocupado com uma cliente que perdeu sua

chave entre as pedras da praia de Ondina, em Salvador, e não consegue evitar que

seu táxi seja rebocado. Já prevendo a discussão com a esposa, o taxista chega em

casa de mansinho para não acordá-la, mas ela o espera com uma surpresa. Maria

(Valdinéia Soriano) está quase convencida das desculpas do marido, quando

Queixão (Matheus Nachtergaele) começa a gritar em frente ao cortiço que o táxi foi

rebocado, atrapalhando o entendimento do casal. Decepcionada, Maria vai embora

de casa, deixando o marido exatamente quando está prestes a dar à luz.

Com a ajuda de Paulo (Ricardo Bittencourt), Queixão consegue o seu carro de volta.

Como agradecimento, terá que marcar um encontro do amigo com Dandara (Aline

Nepomuceno), que não tira os olhos de Roque (Lázaro Ramos). O cantor também

está de olho no rebolado da morena e sofrerá bastante para tê-la em seus braços.

Ó PAÍ Ó TERCEIRO EPISÓDIO: Negócio Torto REDAÇÃO: Guel Arraes, Jorge Furtado e Bando de Teatro Olodum

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REDAÇÃO FINAL: Guel Arraes, Jorge Furtado DIREÇÃO: Olivia Guimarães DIREÇÃO GERAL: Monique Gardemberg

A recuperação do Centro Histórico de Salvador, que começou no Pelourinho,

continuará com a reforma dos casarões localizados em seus arredores. O

engenheiro contratado para fazer o orçamento de uma pousada avisa que, a

princípio, a construção será no cortiço de Dona Joana (Luciana Souza), que está na

área delimitada no projeto de reurbanização. Preocupados, os inquilinos procuram a

proprietária para convencê-la a não vender o imóvel e, em troca, prometem pagar os

aluguéis em dia.

Aproveitando o desespero dos moradores, ela escreve os dez mandamentos do

prédio, que devem ser respeitados por todos. Entre eles, consta que ninguém pode

entrar no prédio depois das dez da noite. Maria (Valdinéia Soriano) adora a novidade

e acredita que a norma pode ser a solução para os constantes atrasos do marido

Reginaldo (Érico Brás). Na iminência de serem despejados, os moradores ainda se

sensibilizam com a história de Negócio Torto (Cristóvão da Silva), que veio do

interior para tentar a vida na cidade e acabou como mendigo. Seu Gerônimo (Stênio

Garcia), porém, defende que o desabrigado deve sair do local para preservar a

imagem do bairro e garantir seu faturamento com os turistas que visitam a região.

Roque (Lázaro Ramos), por sua vez, protesta quanto ao posicionamento radical do

comerciante e deixa claro que o amigo faz parte da realidade do país. Para surpresa

de todos, os moradores recebem uma carta de despejo, pois o imóvel foi vendido.

Porém, Dona Joana não fez o negócio, nem assinou papel algum. Agora, resta

saber quem é o responsável por tamanha confusão.

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Ó PAÍ Ó QUARTO EPISÓDIO: Fiéis e Fanáticos REDAÇÃO: Bando de Teatro Olodum REDAÇÃO FINAL: Guel Arraes e Jorge Furtado DIREÇÃO GERAL: Monique Gardemberg

Maria (Valdinéia Soriano) descobre, por meio de Mãe Raimunda (Cássia

Valle), que o orixá de seu bebê que está para nascer Michelângelo é Exu e, devido

ao preconceito ligado a ele, ela prefere consagrá-lo a Ogum. Para isso, ela deve

homenagear o santo de alguma forma e, após sonhar com seu filho envolto em

vermelho e preto, ela decide vesti-lo com essas cores no batizado. Ao saber da

promessa, Reginaldo (Érico Brás) se desespera, pois prometeu ao avô que seu filho

seria torcedor do Bahia e, portanto, não pode vestir as cores do Vitória, que são

justamente o vermelho e o preto. Porém, se depender de Neusão (Tânia Toko), seu

afilhado será sim um torcedor fanático do Vitória. O campeonato está chegando e

Neusão e Reginaldo fazem suas promessas para ajudar a garantir a vitória de seus

respectivos times. Reginaldo desconfia que a comerciante optou por não beber e,

diante disso, tenta fazê-la ter uma recaída para que seu time perca. Ela, por sua vez,

percebe que o taxista sedutor está se privando de flertes e acredita ser este o seu

sacrifício pelo Bahia. Para induzi-lo a romper com a promessa, Neusão apresenta

Magda (Preta Gil) a Reginaldo, que tenta resistir ao charme da morena. No dia do

jogo, todos se reúnem no bar de Neusão, inclusive Magda, que não desistirá do

taxista até os 45 minutos do segundo tempo.

Ó PAÍ Ó QUINTO EPISÓDIO: Brega REDAÇÃO: Guel Arraes, Jorge Furtado, Mauro Lima, Bando de Teatro Olodum

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REDAÇÃO FINAL: Guel Arraes e Jorge Furtado DIREÇÃO: Mauro Lima

DIREÇÃO GERAL: Monique Gardember O cortiço está sem luz e, para consertar o disjuntor, Dona Joana (Luciana

Souza) avisa que são R$ 250 por família. Como ninguém tem dinheiro para arcar

com a despesa, a saída pode estar nas mãos de Reginaldo (Érico Brás). O taxista

conheceu uma produtora que está na cidade para fazer um documentário sobre

bregas para um veículo estrangeiro. Hipólita (Virgínia Cavendish) procura por um

casarão colonial com janelas abertas e movimentos na calçada, algo tipicamente

baiano, e pronuncia as palavras mágicas: “dinheiro não é problema”. Dito isso,

Reginaldo marca com a jovem e corre para produzir o brega mais incrível que o

Pelourinho já viu.

Reunidos no bar de Neusão (Tânia Toko), os moradores do cortiço discutem as

vantagens e desvantagens de transformarem suas casas em um prostíbulo. Baiana

(Rejane Maia) é a primeira a se opor, argumentando que passou a vida inteira

lutando para ser respeitada para agora se expor ao ridículo. Roque (Lázaro Ramos),

porém, consegue convencer os vizinhos, argumentando que se os gringos pensam

que podem retratar o Brasil sem conhecê-lo de verdade, esta é a hora de mostrar

que eles não sabem de nada mesmo. Para despistarem Dona Joana, eles contam

com a ajuda de Cosme (Vinícius Nascimento) e Damião (Felipe Fernandes), que

farão o possível para manterem a mãe no culto evangélico. E, para que todos

saibam como se comportam as profissionais de um brega, Reginaldo contrata uma

professora (Suzana Pires) para ensiná-los. Tomadas todas as providências

necessárias, só resta contar com a sorte para que nem Hipólita, nem Dona Joana,

desconfiem da mentira. O episódio ‘Brega’ foi ao ar na sexta-feira, 28 de novembro,

sob a direção de Mauro Lima.

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Ó PAÍ Ó SEXTO EPISÓDIO: Virado do Avesso REDAÇÃO: Guel Arraes, Jorge Furtado e Bando de Teatro Olodum REDAÇÃO FINAL: Guel Arraes, Jorge Furtado DIREÇÃO: Carolina Jabour DIREÇÃO GERAL: Monique Gardemberg

Em um show no bar de Neusão (Tânia Toko), Roque (Lázaro Ramos) se

despede dos amigos e agradece pelo apoio que o ajudou a alcançar o sucesso.

Convidado por uma produtora para fazer uma turnê de três meses e, acreditando ser

essa a grande chance de sua vida, Roque também dá adeus a Dandara (Aline

Nepomuceno), propondo um relacionamento aberto e deixando para a morena o

apartamento em que moravam juntos. Porém, a secretária que ligou para o cantor

fez uma grande confusão: era para ligar para “o cantor de rock” e não, “o cantor

Roque”. Decepcionado, o baiano volta para casa e pede refúgio a Dandara, que se

diverte com a situação. Envergonhado, Roque se esconde em própria sua casa para

que todos pensem que ele está viajando pelo Brasil. Enquanto isso, Dandara ensaia

um show com Bi-Negão (Márcio Vitor), provocando o ciúme do namorado. Neusão

convida Yolanda (Lyu Arisson) para trabalhar em seu bar temporariamente.

Analisados os prós e contras do emprego, eles resolvem se casar, já que cônjuge

não é empregado e, por isso, as despesas seriam menores. A cerimônia acontece

no bar mais famoso do Pelourinho, com direito a chuva de arroz e uma produção

impecável. O casal planeja morar junto e adotar uma criança. Empolgada, Neusão

liga para o amigo Roque para contar a novidade e ele diz que está no meio de um

show, mas deseja felicidades para o casal. Revoltada com o cinismo de Roque,

Dandara avisa que vai desfilar com Bi-Negão pela cidade, para que ninguém pense

que ela está sozinha, enquanto seu namorado viaja.

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ANEXOS:

FICHA TÉCNICA - Ó PAI, Ó : PEÇA TEATRAL Ó PAÍ Ó – PEÇA TEATRAL TÍTULO ORIGINAL: Ó Pai, Ó DIREÇÃO:Márcio Meirelles CO-DIREÇÃO: Chica Carelli DIREÇÃO DE PRODUÇÃO: Chica Carelli COREOGRAFIA: Zebrinha MÚSICA E DIREÇÃO MUSICAL: Jarbas Bittencurt MÚSICOS: Maurício Lourenço e Nine ILUMINAÇÃO: Rivaldo Rio

ELENCO:

Arlete Dias Auristela Sá Cássia Valle Cell Dantas Clésia Nogueira Ednaldo Muniz Elane Nascimento Érico Brás Fábio Santana Geremias Mendes Jamile Alves Jorge Washington Leno Sacramento Merry Batista Rejane Maia Rédson Reis Robson Mauro S.L. Laurentino Telma Souza Valdineia Soriano.

Atores Convidados – Edvana Carvalho Lyu Árison Luciana Souza Tânia Toko

FICHA TÉCNICA - Ó PAÍ, Ó: O FILME

• Título original :Ó Paí, Ó

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• Gênero :Comédia • Duração :01 hs 38 min • Ano de lançamento :2007 • Site oficial :http://www.opaio.com.br • Estúdio :Dueto Filmes / Europa Filmes / Globo Filmes • Distribuidora :Europa Filmes • Direção : Monique Gardenberg • Roteiro :Monique Gardenberg, baseado na peça teatral de Márcio Meirelles • Produção :Augusto Casé, Paula Lavigne e Sara Silveira • Música :Caetano Veloso e Davi Moraes • Fotografia :Eduardo Miranda • Direção de arte :Vera Hamburger • Figurino :Bettine Silveira • Edição :João Paulo de Carvalho e Giba Assis Brasil

ELENCO:

Lázaro Ramos (Roque) Stênio Garcia (Seu Jerônimo)

Wagner Moura (Boca) Luciana Souza (Dona Joana)

Dira Paes (Psilene) Érico Brás (Reginaldo) Tânia Tôko (Neuzão da

Rocha) Emanuelle Araújo (Rosa)

Rejane Maia (Baiana) Lyu Arisson (Yolanda) Valdinéia Soriano (Maria) Jorge Washington (Mattias) Cássia Vale (Mãe

Raimunda) Auristela Sá (Carmem)

Virgínia Rodrigues (Bioncê) Edvana Carvalho (Lúcia) Leno Sacramento

(Raimundinho) Cristóvão Silva (Negócio

Torto) Vinícius Nascimento

(Cosme) Felipe Fernandes (Damião)

Cidnei Aragão (Peixe Frito) Mateus Ferreira da Silva (Mateus)

Nauro Neves (Lord Black) Merry Batista (Dalva) Natália Garcez (Lia) Tatau (Tatau) Telma Souza (Feirante) Lázaro Machado (Pastor) Jamile Alves (Professora) Gustavo Mello (Guarda) Nívea Pita (Fiel possuída) Anselmo Costa (Radialista -

voz)

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FICHA TÉCNICA - Ó PAI, Ó: A SÉRIE Redação: Episódio 01 (Mercado Branco) – Mauro Lima e Bando de Teatro Olodum;

Episódio 02 (Mãe e Quenga) – Monique Gardenberg e Bando de Teatro Olodum;Episódio 04 (Fiéis e Fanáticos) – Bando de Teatro Olodum; Episódio 05 (Brega) – Guel Arraes, Jorge Furtado, Mauro Lima e Bando de Teatro Olodum; Episódio 06 (Virado do Avesso) – Guel Arraes, Jorge Furtado e Bando de Teatro Olodum

Redação final: Jorge Furtado, Guel Arraes e Mauro Lima Direção: Mauro Lima Direção geral: Monique Gardenberg Abertura: BRABO. TV Produção musical: Luiz Brasil Produção musical assistente: Teca Macedo Sound designer: Episódio 01 (Mercado Branco) – Beto Ferraz; Episódio 02 (Mãe e

Quenga) – Beto Ferraz e Armando Torres Jr; Episódio 04 (Fiéis e Fanáticos) Beto Ferraz; Episódio 05 (Brega) - Beto Ferraz; Episódio 06 (Virado do Avesso) - Beto Ferraz Sound designer assistente: Malu Souza

Edição de diálogos: Episódio 01 (Mercado Branco) – Nathalia Rabczuk e Simone Alves; Episódio 02 (Mãe e Quenga) – Nathalia Rabczuk; Episódio 04 (Fiéis e Fanáticos) – Nathalia Rabczuk e Simone Alves; Episódio 05 (Brega) – Nathalia Rabczuk e Simone Alves; Episódio 06 (Virado do Avesso) – Nathalia Rabczuk e Simone Alves

Mixagem: Paulo Gama Foley: Episódio 01 (Mercado Branco) – Helena Duarte; Episódio 02 (Mãe e Quenga) –

Cauê Custódio; Episódio 04 (Fiéis e Fanáticos) – Helena Duarte; Episódio 05 (Brega) – Helena Duarte; Episódio 06 (Virado do Avesso) – Helena Duarte

Áudio: Natal Cerqueira Equipe de áudio: Episódio 01 (Mercado Branco) - Natan Cerqueira; Episódio 02 (Mãe

e Quenga) - Kesser Jones; Episódio 04 (Fiéis e Fanáticos) - Natan Cerqueira; Episódio 05 (Brega) - Natan Cerqueira; Episódio 06 (Virado do Avesso) – Kesser Jones

Som direto: Paulo Ricardo Nunes Colorista: Ely Silva Finalização: Casablanca Montagem: Episódio 01 (Mercado Branco) - Marcelo Morais; Episódio 02 (Mãe e

Quenga) - Natara Ney; Episódio 04 (Fiéis e Fanáticos) - Natara Ney; Episódio 05 (Brega) - Marcelo Morais; Episódio 06 (Virado do Avesso) - Natara Ney

Assistente de montagem: Wel Dutra Coordenação de pós-produção: Alexandre Rocha Maquinista: Amaro Campos Maquinista assistente: Marcos Diógenes Eletricista: Júnior Malta Eletricista assistente: Gambis

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Microfonista: Vampiro Assistente de vídeo : Daniel Carvalho Assistente de câmera : Jorginho Alves, Fabrício Tadeu Lima, Pedro Serrão, Silvano Guglielmoni e Rachel Câmara Caracterização : Pablo Maquiagem : Wilson D’Argolo Assistente de maquiagem : Noêmia Melo e Mirian Figurino : Cao Albuquerque e Bettine Silveira Equipe de apoio ao figurino : Fernando de Jesus e Gabriela Joppert Figurinista assistente : Valéria Stefani Equipe cenotécnica : George Augusto, Gilson Oliveira Souza, Gilvan de Jesus Correia,

Osvaldo de Souza, Paulo Eliodoro e Róseo Galdino de Souza Cenotécnicos: Marcelo Araújo Correia, Adriano Passos e Bruno Matos Cenotécnicos assistentes: Valdir dos Santos, Welber Pereira, Igor Mascarenhas,

Dinaílton Ribeira dos Santos, Felipe Cipriani, José Carlos de Jesus e Márcio Santos

Equipe de apoio à arte: Aildo Santos, Alan Jackson, Pinheiro da Silva, Antonio Carlos,

Antônio Dias dos Santos, Clara Carsale, Cleiton Oliveira, Daniel Vaz, Gildete Souza Cidreira, José Nilton Vaz, Luis Rafael Alves, Misael Lima, Pablo Ramos, Renan Dias e Santiago

Contra-regra: Farinha Contra-regra assistente: Joaquim Produção de objeto: Dan Rodrigues Produção de objetos assistente: Alice Barreto Produção de arte: Ana Luisa Aouad Produção de arte assistente: Stella Campos Platô: Paulão Costa Platô assistente: Rodrigo Conceição Produção de locação: Cirlene Vita Assistentes de produção: Mara Junqueira, Carol Villela, Cláudia Freitas e Emanuela

Campos Coordenação de produção: Regina Monteiro Produção de elenco: Daniela Vignoli e Delmário Pesquisa musical: Pedro Tourinho Coreógrafo: Zebrinha Continuidade: Episódio 01 (Mercado Branco) - Fernanda Colin e Alessandra Sampaio;

Episódio 02 (Mãe e Quenga) - Fernanda Colin; Episódio 04 (Fiéis e Fanáticos) - Fernanda Colin; Episódio 05 (Brega) - Fernanda Colin e Alessandra Sampaio; Episódio 06 (Virado do Avesso) – Fernanda Colin

Assistentes de direção: Episódio 01 (Mercado Branco) - Rafael Salgado, Luiz Henrique Campos e Rodrigo Gameiro; Episódio 02 (Mãe e Quenga) - Michele Matalon, Clarice Philigret, Claudia Castro, Luiz Henrique Campos e Rodrigo Gameiro; Episódio 04 (Fiéis e Fanáticos) - Michele Matalon, Clarice Philgret, Claudia Castro, Luiz Henrique

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Campos e Rodrigo Gameiro; Episódio 05 (Brega) - Rafael Salgado, Luiz Henrique Campos e Rodrigo Gameiro

Direção de arte: Kiti Duarte e Hélcio Pugliese Direção de fotografia: Episódio 01 (Mercado Branco) – Pedro Molinos; Episódio 02

(Mãe e Quenga) – Dudu Miranda; Episódio 04 (Fiéis e Fanáticos) – Dudu Miranda; Episódio 05 (Brega) – Pedro Molinos; Episódio 06 (Virado do Avesso) – Dudu Miranda

Produção: Augusto Casé Produção executiva: Rômulo Marinho Direção de produção: Bia Caldas

ELENCO:

Aline Nepomuceno – Dandara Auristela Sá – Carmem Cássia Valle – mãe Raimunda Cristóvão da Silva – Negócio Torto Edmilson Barros – Delegado Edvana Carvalho – Lúcia Elane Nascimento – Suellen Érico Brás – Reginaldo Felipe Fernandes – Damião Gilberto Lima – Arlindo Wallace Hermila Guedes João Miguel – Mário Jorge Washington – Mattias Lázaro Machado – Pastor Lázaro Ramos – Roque Leno Sacramento – Raimundinho Luciana Souza – dona Joana Lyu Arison – Yolanda Matheus Nachtergaele – Queixão Merry Batista – Dalva Nanda Costa – quenga de Reginaldo Oswaldo Mil – policial Carlos Preta Gil – Magda Rejane Maia – Baiana do Acarajé Ricardo Bittencourt – Paulo Stênio Garcia – seu Jerônimo Suzana Pires – Sarah Tânia Tôko – Neuzão Valdinéia Soriano – Maria Vinícius Nascimento – Cosme Virginia Cavendish – Hipólita

FICHA TÉCNICA

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Ó PAI Ó – PEÇA TEATRAL 1a. Montagem Texto Marcio Meirelles / Bando de Teatro Olodum Direção Marcio Meirelles / Chica Carelli Cenário Marcio Meirelles Figurino Bando de Teatro Olodum Coreografia Leda Ornelas Músicas Ó pai, ó! (Aloísio Menezes, Marcio e João Meirelles), Deixa-me lá (Valmir Brito), Jeito de dançar (Jauperi), Swing Olodum (Reny Veneno), Protesto Olodum II (Reny Veneno, Pierre Onassis e Tonho Copque) Arranjos para percussão Neguinho do Samba Iluminação Jorginho de Carvalho Direção de produção Maria Eugênia Milet Elenco: Aloísio Menezes (Maicolgel) Anativo Oliveira (Peixe Frito) Arlete Dias (Mary Star) Armando Costa (Raimundinho) Cássia Valle (Dona Raimunda) Dedé Maurício (Marcelo, personagem que desapareceu com a saída do ator) Edvana Carvalho (Lúcia) Eliete Miranda (Dona Maria - ações do personagem foram assumidas por Pissilene e por Berna Rosa, personagem criado em Bai bai pelô) Floriano Barbosa (Bêbado, personagem substituído por Moncherri, com a saída do ator e, com a saída da atriz, algumas ações foram adaptadas para Pissilene) Gerimias Mendes (Gereba) Jorge Washington (Seu Matias) Fábio Santos (Seu Severino)

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Laudio Dourado (Guarda) Luciana Souza (Dona Joana) Merry Batista (Professora) Nauro Neves (Lord Black) Orlando Martins (Ratinho, personagem substituído por Malhado) Nilton Rangel Gomes (Seu Reginaldo) Raquel Rodrigues (Afilhada de Neuzão) Rejane Maia (Baiana) Rivaldo Rio (Pintor) Sérgio Braga (Yolanda) Tânia Toko (Neuzão da Rocha) Tânia Oliveira (Carmem) Valdinéia Soriano (Maria) Substituições Auristela Sá (Berna Rosa, personagem que substituiu Dona Maria) Cristóvão da Silva (Guarda) Jubiracy Machado (Raimundinho) Lázaro Ramos (Seu Severino) Leda Ornelas (Lúcia) Mazé Silva (Moncherri, personagem de Essa é nossa praia que substituiu o Bêbado) Nauro Neves (Yolanda) Nildes Vieira (Carmem) Ronilson Oliveira (Raimundinho) Rony Cássio (Yolanda) Sérgio Amorim (Malhado, substituiu o personagem Ratinho) Suzana Mata (Pissilene, personagem criado posteriormente, substituiu e incorporou ações de Dona Maria e de Moncherri) Participação Banda Mirim do Olodum

FICHA TÉCNICA Ó PAÌ Ó – PEÇA TEATRAL 2a. Montagem Texto

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Marcio Meirelles / Bando de Teatro Olodum Direção Marcio Meirelles / Chica Carelli Cenário Marcio Meirelles e Gaio Figurino Bando de Teatro Olodum Coreografia Zebrinha Músicas Canto do mundo (Caetano Veloso), Ó pai, ó! (Aloísio Menezes, Marcio Meirelles e João Meirelles), Sopping do Pelô (Ray Gouveia) e Michael no Pelô e Caco de vidro (Jarbas Bittencourt) Direção musical Jarbas Bittencourt Iluminação Rivaldo Rio Direção de Produção Lázaro Ramos Elenco Aline Menezes (Afilhada de Neuzão) Aloísio Menezes (Maicolgel) Anativo Oliveira (Peixe Frito) Arlete Dias (Mary Star) Auristela Sá (Berna Rosa, substituída na segunda temporada pelo personagem Dona Maria) Bárbara Borga (Neuzão da Rocha) Cássia Valle (Dona Raimunda) Cristóvão da Silva (Guarda e percussão) Edinaldo Muniz (pintor e percussão) Edvana Carvalho (Lúcia) Érico Brás (Lord Black e percussão) Gerimias Mendes (Gereba) Jorge Washington (Seu Matias e percussão) Lázaro Machado (Yolanda) Leno Sacramento (Seu Severino e percussão) Luciana Souza (Dona Joana) Luís Fernando Araújo (Marcelo, personagem que desapareceu a partir da segunda temporada, e percussão) Mariana Freire (Professora) Nildes Vieira (Carmem e percussão)

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Nilton Rangel (Seu Reginaldo) Rejane Maia (Baiana) Suzana Matta (Pissilene) Valdinéia Soriano (Maria) Vinício Nascimento (Raimundinho e percussão) Substituições Fábio Santana (Peixe Frito) Jorge Washington (Seu Matias incorporou falas e ações de Marcelo) Luís Fernando Araújo (Guarda) Merry Batista (Dona Maria e Professora) Participação da Confraria da Bazófia Arnaldo Almeida (voz) Jarbas Bittencourt (teclado e voz) João Lins (voz) Ray Gouveia (voz) Músicos convidados João Meirelles (guitarra) Pedro Meirelles (baixo)