O Papel Da Filosofia Do Direito Em Tempos de Crise - Migalhas de Peso

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  • 8/19/2019 O Papel Da Filosofia Do Direito Em Tempos de Crise - Migalhas de Peso

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    05/08/2015 O papel da F ilosofia do D ir eito em tem pos de cr ise - M igalhas de Peso

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    O papel da Filosofia do Direito em tempos de crise

    Eduardo C. B. Bittar *

     A Filosofia do Direito tem uma longa história de luta por sua afirmação, que remonta aosesforços seissentistas dos jusnaturalistas como Grotius, Pufendorf e Suarez, na Europa, e,

    mais especificamente no Brasil, desde os ensinamentos novecentistas colhidos da primeira

    aula de Direito proferida em solo nacional pelo Conselheiro Brotero sobre o direito divino do

    povo. Mas, quando se tem de ressaltar a relevância da prática filosófica, enquanto exercício

    do pensar, do julgar e do avaliar, deve-se retomar uma lição de filosofia da história de Hegel,

    a quem se atribui a sistematização da Filosofia do Direito, para considerar que não há

    pensamento fora do tempo histórico: “A filosofia é a apreensão de seu tempo pelo

    pensamento. Portanto, é tão insensato imaginar que alguma filosofia possa transcender seu mundo presente,

    como que um indivíduo possa desprender-se de seu tempo e saltar por cima dele”. Se assim é, avaliar a

    relação entre nossos tempos e o papel da Filosofia do Direito é uma tarefa inescapável da própria auto-

    compreensão do pensamento por si próprio.

    Quando se trata de avaliar a presença da Filosofia do Direito no plano da crítica dos tempos que correm sob

    os nossos olhos, marcados pela falência do modus  moderno de vida e crença, bem como pela simultânea

    emergência de uma crise permanente de matrizes estruturais da sociedade, da política, da economia, da

    soberania, da moral, da religião e dos padrões de ação individual, pode-se considerar a relevância de batizar 

    estes tempos sob o rótulo da pós-modernidade. A conveniência da expressão está em seu próprio amorfismo

    conceitual, pois a sensação carreada pelo seu conceito coincide com a percepção dos tempos em que

    vivemos. Quando se ancora sob na expressão pós-modernidade a identidade de um tempo, é porque de fato

    se percebe que sua ambigüidade traduz a exata idéia do que se passa nestas circunstâncias.

    Vive-se em tempos favoráveis à anestesia do pensamento, da reflexão, em função dos diversos convites à

    dispersão, à apatia, à indiferença, ao individualismo fruidor, à viciação comum nos mecanismos decomunicação, nas táticas de sedução pelo consumo, na tara coletiva pela posse de bens de afirmação sócio-

    econômica, na automatização e homogeneização dos padrões de ação profissional, etc. Mas, no lugar de se

    pensar na renúncia do filosofar, ante os pesares práticos, ante as experiências históricas mais recentes, ante

    as mudanças operadas dentro da própria concepção dos saberes, deve-se mesmo perceber neste processo

    de re-arranjo  de sentido para as coisas (incluindo fatos, valores e saberes), uma reviravolta em

    processamento, no sentido de um evolver das concepções em rumo.

    Ora, a marcha que segue adiante deve ser estagnada para que se possa, por meio da parada reflexiva,

    aquilatar os prejuízos e ganhos do processo, o que só faz com que se engrandeçam as tarefas do pensar 

    filosófico, em especial da Filosofia do Direito  que cuida de um objeto de investigação tão caro à estruturação

    do convívio social e tão fundamental para a delimitação do sentido de justiça, valor este que, segundo Bobbio,

    possui o equivalente peso de significação para a sociedade, como a idéia de liberdade tem para o indivíduo

    (Bobbio, Igualdade e liberdade, 1997, p. 75).

    O que se percebe, portanto, é que, num contexto de transformações, de emergência do pragmatismo, de

    dominância das consciências pelo imediatismo, de subserviência das mentalidades em relação aos

    O papel da Filosofia do Direito em tempos de crise

    Eduardo C. B. Bittar 

     A Filosofia do Direito tem uma longa história de luta por sua afirmação, que remonta aos esforços seissentistas dos jusnaturalistas

    como Grotius, Pufendorf e Suarez, na Europa, e, mais especificamente no Brasil, desde os ensinamentos novecentistas colhidos

    da primeira aula de Direito proferida em solo nacional pelo Conselheiro Brotero sobre o direito divino do povo.

    segunda-feira, 8 de agosto de 2005

    Quarta-feira, 5 de agosto de 2015

    CADASTRE-SE   FALE CONOSCO

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    imperativos de consumo, de decréscimo do  poder-de-dizer-a-verdade  pelas ciências, de intensificação da

    presença das leis do mercado na construção das políticas públicas, que deve se re-afirmar   o destaque da

    atividade do pensar filosófico, como uma prática de saber profundamente comprometida com as aflições

    humanas. Como exercício humanístico  é que se reascende, como desdobramento de uma prática ético-

    teórica, a mentalidade do porquê do agir filosofante. Num certo sentido, pensar, num mundo com estas

    características, é já agir   na contra-marcha da simples aceitação dos fatos.

    Isto importa em dizer que pensar a tarefa da Filosofia do Direito é pensar, neste momento, sobretudo o seu

    papel social no meio em que se encontra, vale dizer, pensar a sua inserção na ‘realidade fenomenal’, como

    modo e método de, se imiscuindo na realidade social, possa na fluidez heraclitiana dos fatos, perceber a

    possibilidade de ação que possui, ao atuar criticamente sobre uma realidade marcada pela injustiça social,

    pela oneração de certas classes nos custos sociais, pela corrupção e pela perda do sentido do que é comum.

    Se clima e atmosfera conspiram contra o aparecimento deste compromisso, pouco importa, porque, mais uma

    vez (de Sócrates a Nietzsche, de Platão a Foucault), trata-se de resistir a simplesmente viver condicionado

    pelos fatos, para, como ensina Celso Lafer (Lafer, A legitimidade na correlação direito e poder, Miguel

    Reale: estudos em homenagem a seus 90 anos, Porto Alegre, ps. 95/ 105), insculpir um modo de vida em

    que se vive  o próprio  pensar , para inventar (e inventariar) pelo pensamento, novos horizontes de

    possibilidades e ações contra-fáticas.

    Se são muitos os desafios destes tempos, no entanto, as metas da disciplina não são de difícil identificação,pois se pode reproduzir a lição de lucidez de Arthur Kaufmann, que, em sua aula de despedida da

    Universidade de Munique, retrata todo o sentido da tarefa jusfilosófica desafiada pelos tempos pós-modernos:

    “De este modo queda expuesta, en resumen, la filosofía del derecho de la posmodernidad ¾puesto que en

    suma se presenta en la posmodernidad¾, ¿ qué exigir de ella? La filosofía del derecho de la época

    posmoderna debe estar determinada por la preocupación por el derecho y esto siginifica preocupación por 

    hombre; aún más: la preocupación por la vida en general en todas sus formas.”

    “El deseo manifiesto de mi conferencia de despedida sobre el tema Filosofía del derecho posmoderno, fue

    la reanimación de una filosofía del derecho de contenido  que se preocupe de los verdaderos  problemas, de

    las cuestiones decisivas y hoy conciernen realmente a los hombres y a la humanidad: paz, alimento

    suficiente para todos, vida segura, problemas de la energía nuclear, la biotecnología, la genética humana...¿no son estos acaso problemas de la filosofía del derecho, de la doctrina sobre la justicia? ¿No se requiere

    en todas partes por lo que se denomina justicia social y bienestar común? ¿Y a quién corresponde su

    cuidado? En primer lugar por cierto, los filósofos del derecho” (Arthur Kaufmann, La filosofia del derecho

    em la posmodernidad , 1998, ps. 72 e 73).

     ____________ 

    *Livre-Docente e Doutor, Professor Associado do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da

    Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Professor Titular de Filosofia do Direito e Coordenador de

    Propedêutica da Faculdade de Direito da Fundação Armando Alvares Penteado. Professor e Pesquisador 

    do Programa de Mestrado em Direitos Humanos do UniFIEO

     ____________ 

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