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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO “A VEZ DO MESTRE” PÓS-GRADUAÇÃO EM FINANÇAS E GESTÃO CORPORATIVA
O PAPEL DA OPEP NO MERCADO INTERNACIONAL DE PETRÓLEO
Orientador: Celso Sanchez
Rio de Janeiro/2003
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO “A VEZ DO MESTRE” PÓS GRADUAÇÃO EM FINANÇAS E GESTÃO CORPORATIVA
O PAPEL DA OPEP NO MERCADO INTERNACIONAL DE PETRÓLEO
CELINALVA DAS GRAÇAS GONSALVES DE SOUZA
Monografia de apresentação como requisito parcial para a obtenção do grau de especialista em Finanças e Gestão Corporativa.
Rio de Janeiro/2003
RESUMO
O mercado internacional de petróleo, ao longo do século XX, foi
cenário de grandes disputas pela apropriação da renda petrolífera entre os
países hospedeiros e as companhias internacionais.
Os países exportadores, possuidores das maiores jazidas de petróleo
do mundo, depois de décadas de exploração, decidiram se organizar em
1960. O principal objetivo da organização, chamada de Organização dos
Países Exportadores de Petróleo (OPEP), era apropriar-se das receitas
petrolíferas.
Essa organização teve um papel decisivo na transformação da
indústria petrolífera mundial, passando por momentos de muito poder, como
nos choques de 1973 e 1979, e outros de pouca influência, como no choque
de 1986.
Esta monografia trata do desenvolvimento dessa organização, desde o
início das desavenças, entre os principais atores deste mercado, no pós-
guerra, até os dias atuais, através de uma análise histórica e de economia
política.
SUMÁRIO
RESUMO ___________________________________________________________ 05 INTRODUÇÃO _______________________________________________________ 07
CAPÍTULO I – O MERCADO PETROLÍFERO, NO PÓS-SEGUNDA GUERRA MUNDIAL E A CRIAÇÃO DA OPEP _______________________________________ 09 I.1 Ricardo e o Conflito pela Renda Petrolífera _______________________________ 09 I.2 O Princípio do Fifty-Ffty ______________________________________________ 12 I.3 A Criação da OPEP _________________________________________________ 15 I.4 A Primeira Fase da OPEP ____________________________________________ 20 I.5 A Nova Fase da OPEP _______________________________________________ 23 CAPÍTULO II – OS CHOQUES DO PETRÓLEO, NAS DÉCADAS DE 70 E 80, E A REESTRUTURAÇÃO DA INDÚSTRIA PETROLÍFERA ________________________ 28 II.1 A Crise de 1973 ____________________________________________________ 28 II.2 O Significado do Embargo e da Quadruplicação do Preço Mundial do Petróleo __ 34 II.3 O Pós-Crise de 1973 ________________________________________________ 38 II.4 A Crise de 1986 ____________________________________________________ 40 II.5 O Pós-Crise de 1979 ________________________________________________ 42 II.6 A Crise de 1986 ____________________________________________________ 45 CAPÍTULO III – A OPEP E AS PRINCIPAIS MUDANÇAS NO MERCADO PETROLI- FERO MUNDIAL NA DÉCADA DE 90 _____________________________________ 49 III.1O Mercado Petrolífero na Década de 90 ________________________________ 49 III.2 A Transição Pós-Petróleo e a OPEP: A Questão das Reservas ______________ 51 III.3 A Evolução da Produção ____________________________________________ 57 III.4 a Evolução da Demanda ____________________________________________ 60 CONCLUSÃO ________________________________________________________ 64 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS _______________________________________ 65 ANEXO : ESPAÇO CULTURAL __________________________________________ 67
INTRODUÇÃO
A proposta deste trabalho é analisar o papel da OPEP, na evolução e
nas mudanças da estrutura do mercado internacional de petróleo, desde o
período pós-guerra até os dias atuais, incluindo tendências para o futuro.
A análise inicia-se com a introdução da teoria da determinação da renda
de Ricardo, para explicar a base dos conflitos, entre as nações hospedeiras e
as companhias internacionais de petróleo, as majors. Essa teoria aponta
elementos objetivos que contribuem para o entendimento da força econômica
crescente dos países que possuem as melhores jazidas de petróleo no mundo,
e, nesse sentido, menores custos.
Já na década de 70, ocorreram as maiores vitórias da OPEP. Primeiro o
choque de 1973, onde esta organização reduziu significativamente a sua
produção diária de petróleo fazendo com que o preço do barril chegasse a
quadruplicar.
Em 1986 ocorreu o "contra-choque" do petróleo, em que o mercado se
tornou favorável ao comprador. O crescimento da oferta de petróleo extra
OPEP fez com que a oferta ultrapassasse a demanda e os preços entrassem
em queda. A OPEP agiu de forma defensiva e com o objetivo de reconquistar
mercados consumidores.
Atualmente a demanda mundial está em crescimento, mas em uma taxa
bem inferior a das décadas de 60 e 70. A oferta extra OPEP está, praticamente,
no seu ápice, e a tendência é de progressiva queda nos próximos anos,
aumentando ainda mais a taxa de participação da OPEP na oferta mundial, o
que a coloca com mais poder de influência nesse mercado, dado que controla
atualmente 77,8% das reservas, com especulações de aumento progressivo
durante esse século XXI.
Portanto, depois de anos, agindo, defensivamente, a fim de recuperar
mercado, a OPEP se vê com um futuro garantido devido à escassez em outros
locais, o que gradativamente vai elevar o seu poder de influenciar o mercado e
controlar o preço de acordo com os seus interesses.
Para explicar essa evolução, o capítulo I trata da estrutura do mercado
petrolífero mundial, desde o pós-guerra, com os primeiros movimentos
individuais dos países exportadores e a posterior fundação da OPEP, em 1960,
até o início da década de 1970, antes da primeira grande crise.
O capítulo II trata desde os choques de 1973 e 1979 até o "contra-
choque" de 1986, com seus respectivos períodos pós-crise, e suas principais
causas e mudanças no mercado e na estrutura da indústria petrolífera mundial.
Finalmente, apresentaremos uma reunião das principais conclusões
referentes à participação da OPEP nesse mercado, a atual conjuntura,
tendências para o futuro e possíveis conseqüências, através de uma análise
econômica. Essa análise se baseou em dados da British Petroleum e do EIA-
DOE (Governo dos Estados Unidos).
CAPÍTULO I - O MERCADO PETROLÍFERO, NO PÓS-SEGUNDA GUERRA MUNDIAL, E A CRIAÇÃO DA OPEP
David Ricardo, em sua obra “Princípios de Economia Política e
Tributação” (1821), desenvolveu o conceito que permite explicar a disputa pela
renda petrolífera entre as nações detentoras de jazidas e as companhias de
petróleo. Esse conceito foi o de rendimento como algo distinto dos lucros
normais de uma atividade econômica. Seu estudo concreto envolvia grãos na
atividade agrícola, mas poder-se-ia aplicar, também, ao petróleo dos países
exportadores que se organizaram na OPEP.
A crescente consciência de que a generosa dotação da natureza podia e
devia ser transformada em instrumento econômico e político de
desenvolvimento é o tema desenvolvido neste capítulo.
I.1 Ricardo e o Conflito pela Renda Petrolífera
A teoria de determinação da renda de Ricardo baseia-se em duas
hipóteses. A primeira supõe que as terras são diferentes em sua fertilidade e
podem ser ordenadas a partir da mais fértil para a menos fértil. A segunda
propõe que a concorrência sempre iguala a taxa de lucro dos capitalistas que
arrendam as terras dos proprietários (Terra, 1999).
As rendas de situação são definidas por Ricardo nos termos de rendas
diferenciais. Estas são observadas, na produção agrícola, e resultam das
diferenças de fertilidade do solo e localizados próximos aos centros urbanos
possuem custos menores. Essas diferenças são, de certa forma, naturais, ou
inerentes, e definem custos que são externos ao processo de produção, sob os
quais o agricultor pouco pode agir, a não ser mudar-se (Dutra, 1996).
Imaginemos dois proprietários, sendo um possuidor de campos muito
mais férteis que o outro. Ambos vendem os grãos, pelo mesmo preço, no
mercado consumidor, porém os custos de produção daquele que possui os
campos mais férteis são muito menores dos custos incorridos por aquele que
possui campos menos férteis. Este último talvez tivesse lucros, mas o primeiro,
não só tem lucros como, também, algo muito mais importante, os rendimentos.
Esses rendimentos, que são sua remuneração extra, derivam da qualidade
específica de suas terras, que é resultado de generosa dotação da natureza
(Yergin, 1992).
O petróleo é mais um desses legados da natureza. Sua presença
geológica nada tem a ver com o caráter ou a conduta daqueles que são donos
do solo em que jaz, ou com determinado regime político dominante na região
onde foi encontrado.
Essa dotação também gera o rendimento, que pode ser definido como a
diferença entre o preço de mercado e os custos de produção, acrescido de
custos adicionais, como transporte, processamento, distribuição e alguma
reposição do capital.
Assim, o princípio a pautar as negociações estabeleceu que o
rendimento ou a renda a ser apropriada pelo país exportador fosse definido a
partir da diferença entre o preço de mercado e os custos de produção,
acrescidos de uma margem para custos adicionais e para a reposição do
capital. Os países produtores queriam ficar com esse rendimento, já que não
havia acordo pré-definido, para essa questão.
Ambos apresentariam reivindicações legítimas. O país hospedeiro
detinha a soberania, sobre o petróleo, em seu solo. Já o petróleo teria pouco
valor, se a companhia estrangeira não tivesse arriscado seu capital e
empregado sua experiência e técnica, para descobri-lo, produzi-lo e colocá-lo
no mercado.
O país hospedeiro era o proprietário, a companhia uma simples
possuidora, que deveria pagar uma renda pré-negociada. Mas, e se, pelos
esforços e riscos do possuidor, fosse feita uma descoberta, e o valor da
propriedade aumentasse substancialmente, deveria o possuidor continuar
pagando a mesma renda estabelecida nas condições iniciais, ou ela deveria ser
aumentada pelo proprietário? Este é o grande divisor da indústria petrolífera:
uma descoberta valiosa significa um proprietário insatisfeito. Isto porque o
proprietário sabe que o lucro do possuidor é muito maior do que o necessário
para mantê-lo produzindo e, dessa forma, deseja uma parcela dos rendimentos.
Essa disputa pelos rendimentos, no pós-guerra, não ficou restrita
exclusivamente à área econômica, mas, também à área política. Para os
proprietários, a luta estava ligada aos temas da soberania, construção da
nação e da defesa nacionalista contra os exploradores do país, que
prejudicavam o desenvolvimento e negavam a prosperidade social,
corrompendo a classe política e agindo de maneira arrogante e superior. Os
estrangeiros eram vistos como a personificação do colonialismo (Yergin, 1992).
Do ponto de vista das companhias, a percepção do problema era
completamente diferente. Elas assumiram os riscos e escolheram aplicar capital
e esforços, num certo país, e assinaram contratos negociados, que lhes
conferiram certos direitos. Tinham gerado riqueza onde não havia nada.
Deveriam ser recompensadas pelos riscos que haviam assumido. As
companhias acreditavam que estavam sendo exploradas por ganância e
irresponsabilidade do poder constituído local.
Existia uma outra dimensão política para essa disputa. Para os países
consumidores industrializados, o acesso ao petróleo era uma vantagem
estratégica, essencial para sua economia e capacidade de crescimento, e,
também, elemento fundamental na estratégia nacional. Além disso, o petróleo
era uma grande fonte de tributação, tanto diretamente pelos impostos, sobre o
consumo, como pela alimentação da atividade econômica como um todo,
promovendo o crescimento econômico. Para o país produtor, o petróleo
também significava poder, influência, expressão e status, todos eles
anteriormente inexistentes.
Um bom exemplo da nacionalização da indústria do petróleo se deu no
México. A nacionalização do petróleo mexicano1 representou o exemplo mais
significativo, em escala mundial, de intervencionismo direto do Estado contra o
que, em 1938, se denominou cartel internacional do petróleo. Daí concluiu-se
que para se implantar uma política nacional de petróleo é preciso que a nação
esteja politicamente preparada, e o país capacitado, econômica e tecnicamente,
de modo a poder eleger livremente o seu estatuto do petróleo (Marinho Jr.,
1989).
I.2 – O Princípio do Fifty-fifiy
Os países produtores de petróleo do Oriente Médio, limitados quanto aos
seus conhecimentos técnicos e de capitais, e carentes de uma independência
política, chegaram a um estágio de autodeterminação política e econômica na
década de 50.
1 No México, o Presidente Lázaro Cárdenas expropriou as 17 companhias norte-americanas e européias de petróleo. O Estado interveio diretamente na economia do petróleo, através de sua empresa, a Petróleos Mexicanos – Pemex, assumindo o controle integrado da exploração.
Entraram, os países da OPEP, para a Organização das Nações Unidas
(ONU), e participaram de diversos trabalhos de nacionalidade e de igualdade,
reconhecendo o “direito inalienável que o Estado soberano tem de dispor
livremente de suas riquezas e de seus recursos naturais, de acordo com os
seus interesses nacionais de desenvolvimento2”.
Algumas condicionantes econômicas levaram os países produtores do
Oriente Médio, juntamente com a Venezuela, a manterem a opção pelo controle
indireto de suas fontes de produção.
Eles consideraram excessiva a carga de responsabilidade de uma
intervenção direta, na economia do petróleo, diante da impossibilidade de
mobilizarem os recursos necessários, tais como capital de risco, empréstimos e
tecnologia para implantar e desenvolver a indústria nacional de petróleo.
Os governos incorriam em muitos riscos, quando não dispunham de
condições e mercados, para escoar a produção nacional, já observados em
outras ocasiões. Desta forma, as, companhias tiveram que conviver com menos
poder, em contraposição ao poder crescente de controle dos países produtores,
em relação a planos de produção e a preços.
A evolução da estrutura da indústria de petróleo, conferindo aos países
hospedeiros maior controle sobre seus recursos naturais, encontrou barreiras
no sistema concessionário, proporcionando aos países de ingresso cada vez
mais benefícios, num processo de modernização na fiscalização e na gestão.
O controle indireto do Estado se confundiria com a intervenção direta
estatal, quando ações entre as companhias concessionárias e os governos dos
países produtores passaram a ser empresariais e comerciais.
2 Resolução 1.803 (XVII) da ONU, de 14 de dezembro de 1962.
O exemplo mais típico do sistema concessionário ocorreu na Venezuela.
Se a nacionalização mexicana representa a intervenção direta do Estado contra
o poder econômico das grandes companhias da indústria mundial de petróleo,
na Venezuela ocorreu o controle indireto do governo.
No final dos anos 40 e início dos anos 50, os países exportadores de
petróleo fizeram exigências às empresas que tinham as concessões de
exploração do petróleo em seus países. O objetivo principal que se tinha era o
de deslocar receitas oriundas das companhias de petróleo e dos cofres dos
países consumidores, que as taxavam, para os cofres dos países exportadores
de petróleo. Havia uma disputa pela renda do petróleo e, ao mesmo tempo,
pelo poder (Yergin, 1992).
O primeiro país a entrar nessa luta foi a Venezuela. Depois de longas
negociações incorridas de 1945 a 1948, entre o governo venezuelano e as
companhias concessionárias estrangeiras, foi sancionada a Lei do Imposto
sobre a Renda.
Essa lei era baseada no postulado do fifty-fifty. Ele foi um marco divisório
na história da indústria petrolífera. Nela, as taxas e os royalties poderiam ser
aumentados, até o ponto em que a parcela do governo se igualasse aos lucros
líquidos das empresas, na Venezuela.
Em troca, as questões relativas à validade das concessões seriam
postas de lado. O direito para as concessões seria consolidado, e sua vigência
estendida, além de criarem novas oportunidades de exploração. Ou seja, era
introduzido, na indústria petrolífera, o princípio fiscal de divisão igualitária do
governo nos lucros das companhias.
A concorrência proveniente da produção farta e barata do Oriente Médio
foi se tornando uma grande ameaça à Venezuela. Assim, os venezuelanos
decidiram difundir os benefícios do princípio do fifty-fifty para a região que
ameaçava os seus negócios, o próprio Oriente Médio.
Em 1950, a companhia Aramco, que tinha a concessão de exploração,
na Arábia Saudita, autorizou as negociações, para uma revisão completa, na
sua concessão. Em dezembro de 1950, após complexas negociações, a
Aramco e a Arábia Saudita assinaram um novo acordo, tendo como ponto
central o princípio venezuelano do fifty-fifty. Depois foi a vez do governo do
Kuwait, seguido pelo Iraque, por Bahrein e pelo Qatar. Eles também adotariam
a divisão igualitária nos lucros, que, em pouco tempo, se consagrava como
fórmula universal de tributação dentro do sistema concessionário da década de
50 (Marinho Jr., 1989).
O contato direto com os países industrializados ensinou os países do
Oriente Médio a tomarem consciência do crescente grau de dependência dos
países consumidores, em relação ao abastecimento de petróleo3, colocando-
lhes a perspectiva de se libertarem da condição de explorados. Tal perspectiva
seria realizável se se apropriassem corretamente os recursos provenientes das
receitas petrolíferas, que em 1955 correspondiam a 40% do orçamento do Irã, a
54% do Iraque, a 71 % da Arábia Saudita e a 97% do Kuwait (Marinho Jr.,
1989).
I.3 - A Criação da OPEP e seus Antecedentes
O amadurecimento político-econômico dos países produtores seguiu-se
ao revigoramento do nacionalismo na estrutura da indústria internacional de
petróleo.
3 Nessa época o Oriente Médio supria 85% dos mercados europeus (Marinho Jr., 1989).
Este foi sacudido na década de 50 por turbulências nas relações
internacionais, quando os governos dos grandes países consumidores, por
duas vezes, intervieram militarmente no Oriente Médio para assegurar suas
posições e estratégias petrolíferas.
A primeira foi a incursão anglo-franco-israelense contra o Egito, em 1956,
em represália à nacionalização do Canal de Suez, determinada pelo Presidente
Nasser. A segunda foi a intervenção anglo-americana, no Líbano e na Jordânia,
em seguida à Revolução Iraquiana de 1958. Em ambos os casos o controle de
suprimento de petróleo esteve em perigo e foi preciso agir de forma
emergencial.
Conseqüências muito importantes adviriam da Crise de Suez, de 1956.
As potências ocidentais certificaram-se que deviam intensificar a diversificação
das fontes alternativas de produção e entenderam que a vulnerabilidade do
suprimento do Oriente Médio era o transporte, que vindo do Canal de Suez,
representava 43% do movimento exportador do Oriente Médio, e estava sob
ameaça de bloqueio egípcio.
Por outro lado, os produtores de petróleo concluíram que o preço do
petróleo continuava sendo determinado pelas companhias de petróleo, como
ocorreria com a baixa tendência do mercado internacional, a partir de 1959
(Marinho Jr., 1989).
Dessa forma, os países produtores se conscientizaram da necessidade
de formularem uma política nacional de petróleo de acordo com os seus
anseios nacionais de desenvolvimento econômico e progresso social. Eles
aprenderam que não havia clima para a confrontação direta e isolada. O
nacionalismo, no que dizia respeito ao petróleo, se ergueria de forma pacífica,
de acordo com as tradições jurídicas dos direitos minerais e sem criar riscos de
retaliação por parte das grandes potências.
Em agosto de 1960, sem nenhum comunicado direto aos exportadores, a
Standard Oil of New Jersey anunciou redução superior a US$ 0,14 por barril,
sobre o preço bruto do Oriente Médio, uma redução em torno de 7%. As outras
companhias a seguiram, mas sem nenhum entusiasmo, e até alarmadas. Não
se pode deixar guiar por pressões do mercado em uma indústria tão essencial a
tantos governos. Era preciso ser extremamente cuidadoso com tais medidas.
Com essa medida, a Standard Oil of New Jersey havia provocado uma
significativa redução nas receitas dos países exportadores.
As companhias de petróleo logo se deram conta de que a redução
unilateral dos preços foi um erro terrível. Em setembro de 1960, representantes
dos maiores países exportadores, Arábia Saudita, Venezuela, Kuwait, Iraque e
Irã, reuniram-se em Bagdá. Em 14 de setembro, o grupo havia concluído o seu
trabalho. Haviam formado uma nova organização com a finalidade de enfrentar
as companhias intencionais de petróleo. Ela foi chamada de Organização dos
Países Exportadores de Petróleo4.(OPEP).
Os principais objetivos da OPEP, no momento da sua fundação,
refletiam, na sua essência, uma atitude defensiva dos países-membro em
relação à política de preços imposta pelas companhias internacionais.
Seus objetivos consistiam em: i) coordenar e unificar as políticas
petrolíferas, para salvaguardar os interesses dos países-membro, individuais ou
coletivos; ii) criar e desenvolver meios para garantir a estabilização dos preços
do petróleo, nos mercados internacionais, evitando flutuações; iii) assegurar
receitas estáveis aos países produtores, assim como suprimentos eficientes,
econômicos e regulares, para os países consumidores; e iv) garantir um justo
retorno ao capital investido na indústria petrolífera.
4 Mais tarde seriam admitidos: Qatar (1961), Indonésia (1962), Emirados Árabes Unidos e Bahrein (1967), Argélia (1969). Nigéria (1971) e Gabão (1975).
A criação da OPEP representou o primeiro ato coletivo de afirmação da
soberania, por parte dos exportadores de petróleo, e o primeiro momento
decisivo nas relações econômicas internacionais em direção ao controle dos
Estados sobre os recursos naturais (Yergin, 1992).
Apesar de toda a movimentação, no entanto, a recém-criada OPEP não
aparentava ser muito ameaçadora para as grandes companhias petrolíferas.
Elas se recusaram a reconhecer a sua existência. As companhias
argumentavam que a organização não tinha sentido econômico e insistiram em
negociar diretamente com os países produtores, havendo maior capacidade
conciliadora. Ou seja, elas resistiram, enquanto puderam, em adotar as
resoluções da OPEP como base das negociações, entre as partes5.
Havia motivos para a OPEP ter pouco a mostrar em seus primeiros anos
de existência. Com exceção do Irã, as reservas ainda pertenciam, por contrato,
às companhias concessionárias, limitando dessa maneira o controle dos
países-membro. Além do mais, o mercado mundial de petróleo estava com
excesso de oferta, e os países exportadores eram concorrentes e tinham de se
preocupar em manter seus mercados consumidores a fim de garantir seus
rendimentos. Portanto não poderiam, ainda, isolar as companhias de que tanto
dependiam para ter acesso aos mercados6.
Enquanto vigorava uma fase favorável ao mercado comprador na década
de 60, desenvolveram-se consideráveis mudanças estruturais, na indústria
internacional do petróleo, que adubariam o terreno para a confrontação
5 As grandes companhias de petróleo evitaram ao máximo fazer negociações diretas com a OPEP durante a maior parte da década de 60. Dessa forma a própria OPEP continuou a ser um ato secundário (Yergin, 1992). 6 Durante a década de 60, o contexto mundial foi marcado pela descolonização e pelo surgimento de questões e controvérsias acerca do Terceiro Mundo. Assim, as questões de soberania do mundo do petróleo, que foram tão básicas na formação da OPEP em 1960. foram acalmadas nos anos seguintes. Isso aconteceu à medida que as companhias satisfaziam os países exportadores em suas exigências por receitas maiores, ao pressionar para cima a produção.
estrutural de um cartel de países produtores e um cartel de companhias
internacionais. Como as regras do jogo estavam mudando, e se as estratégias
eram outras, as relações entre as companhias internacionais e os governos dos
países produtores também tinham que se recompor para se ajustar às
condições de abastecimento e de preço dos novos tempos (Marinho Jr., 1989).
Os países produtores, tão cedo conseguiram tornar viáveis os seus
projetos de justa remuneração pela exploração controlada de seus recursos
nacionais, conseguiram também fortalecer o seu organizado poder político para
atingir uma conjuntura de valorização do petróleo. Nesse sentido, com a
descoberta de petróleo na Líbia, por volta de 1961, as companhias começaram
a exploração e a produção em quantidade muito alta.
No entanto, nesse país, a receita que o governo obtinha do petróleo seria
equilibrada com o preço real de mercado para seu petróleo, que era mais baixo
do que os outros preços tabelados. Isso significava que o petróleo líbio seria
mais lucrativo do que o petróleo dos outros países. Esse era um motivo para
qualquer companhia elevar sua produção na Líbia.
Essa onda de petróleo líbio afetou fortemente os preços mundiais,
gerando pressões para a queda, que havia se iniciado depois da Crise do Suez.
Mais da metade da produção de petróleo líbio estava nas mãos de companhias
independentes, que não possuíam mercados próprios e também não
enfrentavam nenhuma barreira. O aumento da produção, que detinham, acabou
forçando as companhias independentes, que atuavam na Líbia, a avançar rumo
ao mercado da Europa e tentar vender seu petróleo a qualquer custo. Não
apenas na Europa, mas em todo mundo, havia mais petróleo, para suprir os
mercados, do que a demanda. O resultado disso foi uma competição acirrada.
Assim, entre 1960 e 1969, o preço de mercado do petróleo teve uma queda de
22%, que, corrigida pela inflação, era maior ainda, em torno de 40%. O petróleo
estava disponível para todos e pelo preço mais baixo (Yergin, 1992).
Foi nesse cenário que em 1965, a OPEP, transferindo sua sede de
Genebra para Viena, ganhou o reconhecimento oficial do governo austríaco
como entidade internacional (Marinho Jr., 1989).
I.4 - A Primeira Fase da OPEP
A história da indústria internacional de petróleo na década de 60 é a
história da OPEP para se impor como organismo internacional. Isso na
condição de cartel dos países exportadores de petróleo, como é, na década de
70, a saga dos países produtores para vencer as últimas resistências das
grandes companhias internacionais e atingir determinados objetivos políticos e
econômicos de controle da indústria petrolífera.
Para melhor entender o papel da OPEP, é preciso entender a
complexidade dos conflitos entre os governos do Oriente Médio pela hegemonia
política da região. Tais conflitos refrearam a lucratividade e a expansão das
companhias de petróleo e influenciaram, decisivamente, nos destinos da OPEP
e nos rumos da crise energética, que eclodiriam ao longo da década de 70.
O papel da OPEP na década de 60 pode ser considerado menor. A
OPEP teve um aumento do seu poder de barganha e de intervenção dos países
produtores, mas não foi um importante fator com respeito às mudanças
estruturais que se formaram nessa década e que se formariam no futuro. Na
década de 70, porém, o crescente poder de barganha dos países-membro da
OPEP foi o fator seminal dos abalos estruturais que prenunciaram o limiar de
uma nova era da indústria do petróleo.
A razão principal da aparente inoperância ocorreu devido às relações de
mercado, que era essencialmente do comprador, com preços baixos, e em que
a competitividade do petróleo independente, que pressionou os preços para
baixo, em especial na Europa, obrigou a OPEP a desempenhar uma posição
defensiva nos primeiros anos de sua existência.
Assim, a OPEP concentrou-se em estabilizar os preços e evitar sua
queda ou flutuação, conforme as suas aspirações econômicas e seus objetivos,
desde a sua fundação. Outro motivo foi o de deixar ao sistema concessionário a
tarefa de fixar os preços conforme o senso comercial das companhias de
exploração de petróleo. Tanto um motivo quanto outro descartou o uso da
unidade política e econômica dos seus membros, em favor da civilidade,
racionalidade e senso de fair play das companhias de petróleo, que
convenceram os países envolvidos de que as receitas petrolíferas deviam
depender do mercado livre (Marinho Jr., 1989).
Os resultados da OPEP nos 10 primeiros anos de sua criação foram
modestos ou até mesmo limitados, conseguindo restaurar os níveis de preços
de 1958 apenas em 1971.
Não se pode subestimar a estabilização dos preços com os ganhos
obtidos na área fiscal, descaracterizando o royalty com crédito, para efeito de
imposto de renda, e eliminando os descontos comerciais das companhias
independentes. Se a OPEP falhou em atingir o ideal, ela aprendeu na
experiência a se contentar com o possível, sem perder de vista os fatores
conjunturais externos, para que eles atuassem sempre a seu favor.
Outra causa do alcance relativo de resultados, na fase de gestação da
crise energética, estaria na sua própria estrutura e organização. Ela reunia 13
membros da maior diversidade de credo político-ideológico, o que foi
surpreendente, pois não diminuiu o senso de unidade e solidariedade de seus
membros, todos iguais perante o seu estatuto.
Nos primeiros anos, as suas decisões eram demoradas e previa longas
discussões preliminares, até se chegar à pauta da conferência, que requeria a
unanimidade de votos. As companhias de petróleo só tinham a ganhar com
esse sistema organizacional e decisório, minando o poder coletivo de barganha
da OPEP com propostas de última hora, obviamente inaceitáveis. Contudo, não
foi por falta de iniciativa que não se alcançou um imediato resultado no domínio
dos preços na década de 60.
Quatro anos foram necessários para a Comissão Econômica da OPEP
sedimentar uma estratégia que viabilizasse a aspiração de unificação política
dos países-membro e persuadisse a conferência a usar táticas negociais mais
políticas. Mesmo porque se tornara cada vez mais difícil conter os sentimentos
nacionalistas de confrontação unilateral de certos países-membro, de
resultados comprovadamente eficazes no passado, impacientes com as
medidas das companhias internacionais.
A Comissão Econômica demonstrou que tinha chegado o momento de os
governos negociarem suas pretensões de forma global, simultânea, e em
regime de urgência. Em 1968 os países-membro lançaram seu principal
manifesto político. Nele eles reivindicaram que podiam: i) invocar o princípio da
mudança de circunstâncias para rever acordos de concessões; ii) rescindir
unilateralmente os acordos de concessão, caso o concessionário não iniciasse
a exploração nos prazos previstos; iii) fixar unilateralmente os preços de
referência, prevendo-se uma atualização em relação aos preços dos produtos
manufaturados, e iv) adquirir uma participação, no capital da companhia
concessionária, em bases razoáveis.
Além da fixação unilateral dos preços de referência, a pretensão de que
pudessem participar das antigas concessões foi posta em pauta, pela primeira
vez, pelos países produtores. Seu objetivo dominou as relações entre os
governos produtores e as companhias internacionais, na década de 70, com a
opção: nacionalização ou participação acionária.
I.5 - A Nova Fase da OPEP
As últimas resoluções da OPEP emolduram a época de transição da
indústria mundial de petróleo, quando o poder de decisão foi passando cada
vez mais para as mãos dos seus países-membro, apesar das desavenças
internacionais entre si (Marinho Jr., 1989).
Pressões de toda a parte atuaram mais ou menos em sincronia no
contexto da indústria mundial do petróleo. Quanto à demanda, as necessidades
energéticas aumentaram, em razão do desenvolvimento industrial ter-se
expandido acima do previsto, do progressivo abandono das minas de carvão,
dos atrasos acumulados dos programas das centrais nucleares, da escassez de
gás natural nos Estados Unidos e da rápida expansão da procura de óleo de
baixo teor de enxofre.
A taxa de crescimento da demanda mundial de petróleo era crescente7,
variando entre 6 e 8% ao ano ao longo da década de 60, chegando à marca
dos 9,47% em 1968, e ao seu ápice no ano de 1969, quando essa taxa de
crescimento ultrapassou a barreira dos 10%. Outro ponto importante foi a
duplicação da demanda mundial de petróleo em 10 anos, entre 1961 e 1970.
Do lado da oferta, as quantidades disponíveis foram sendo reduzidas
pelo efeito somatório da expropriação no Iraque, do movimento de 7 Calculado a partir de dados do International Energy Annual 2000.
nacionalização na Argélia, da ruptura acidental e depois voluntária na Síria, que
prejudicou as exportações da Arábia Saudita, e do contínuo fechamento do
Canal de Suez, juntamente com a estratégia de baixa na produção da Líbia.
No final de 1970, a crise do abastecimento tinha-se agravado mais pela
ameaça de possível colapso de fornecimento do Oriente Médio, que repercutiria
especialmente no mercado americano. Nos Estados Unidos, a preocupação
maior era que faltasse óleo combustível no inverno, notadamente na sua costa
leste, sob os efeitos de uma crise energética regional.
Esse foi o momento encontrado pelos países-membro da OPEP para
deflagrarem a ofensiva de caráter global, estimulados pela Venezuela, que
elevou unilateralmente a taxa de imposto de renda de 52% para 60%, com
efeito retroativo, e em seguida, pela Líbia, que imediatamente aumentava o
preço de referência do barril. Estava criado o clima de emergência propício a
mais uma conferência da OPEP, em dezembro de 1970. Dessa conferência
resultou mais uma resolução, um verdadeiro marco histórico na evolução do
relacionamento entre os países produtores e as companhias internacionais.
Essa conferência conclamou os países-membro a negociar, global e
imediatamente, com as companhias internacionais para obter: i) a uniformidade
dos preços de referência em todos os países produtores, pelo alinhamento ao
maior preço de referência vigente, que na época era o líbio; ii) a eliminação
imediata de qualquer desconto; iii) a elevação do percentual de imposto sobre a
renda de 50% para 55% e iv) o aumento geral e uniforme dos preços de
referência, bem como a indexação desses preços em relação aos preços
industriais mundiais, com o objetivo de manter um poder de compra constante
para a aquisição de bens e equipamentos.
Os países consumidores, conscientes da necessidade de se
estancaressa escalada de reivindicações e sob a crença de uma escassez de
energia, aceitaram a intermediação das companhias petrolíferas. Essas se
organizaram para compor uma frente de negociações.
As companhias de petróleo se mostraram dispostas a aceitar os novos
preços de referência, corrigidos anualmente, na base de um índice que poderia
ser tanto o da inflação mundial como outro critério similar. Por outro lado, as
companhias se recusavam a admitir qualquer alta nos percentuais vigentes do
imposto de renda, que era de 55%, qualquer pagamento de efeito retroativo e
qualquer obrigação de reinvestimento no país produtor.
As posições foram claramente definidas, quer da parte dos países
produtores, articulados em blocos regionais dentro da OPEP, com seu status
internacional finalmente reconhecido, quer do lado das companhias apoiadas
pelos seus respectivos governos.
Com o esgotamento dos prazos finais fixados pela OPEP para se firmar
um acordo definitivo, foi convocada às pressas mais uma conferência
extraordinária da OPEP, em Teerã. Em clima de ameaças, de suspensão de
fornecimento e de pressão política reiniciaram-se as negociações. Finalmente,
com o apoio total do governo norte-americano, as companhias internacionais
concordaram em elevar os preços. Foi assinado o Acordo de Teerã com
validade de 5 anos e referente exclusivamente às entregas de petróleo
provenientes de seis países8 do Golfo Árabe.
Esse foi o início da primeira crise internacional do petróleo. Os lucros das
companhias estavam sendo seriamente prejudicados pela rigidez da
fiscalização, na produção, e pelo aumento dos custos devido à inflação e à
instabilidade dos preços dos produtos. Entretanto, os países árabes tiveram um
8 Eram eles: Abu Dhabi (atual Emirado Árabes Unidos), Arábia Saudita, Kuwait, Irá, Iraque e Qatar.
grande aumento de suas receitas petrolíferas9. Esse foi um grande começo
para os países produtores do Golfo e, também, o fim de uma era de energia
barata, oferecida a preços de expansão de consumo (Marinho Jr., 1989).
Na prática, esse acordo propiciou o aumento do preço de referência.10
Em contrapartida, os países produtores do Golfo Pérsico se comprometeram a
não reivindicar, em quaisquer circunstâncias, novos aumentos dos preços de
referência às companhias internacionais, nem pleitear compromissos
financeiros suplementares durante os cinco anos de vigência do acordo
(Marinho Jr., 1989).
Após a conclusão desse acordo, a atenção se voltava para as
negociações com a Líbia, já que nenhum compromisso tinha sido firmado em
relação aos terminais do Mediterrâneo Oriental e aos oleodutos que escoavam
a produção da Arábia Saudita e do Iraque. O governo líbio modificou a sua
atitude em razão dos resultados alcançados pelo Acordo de Teerã e do apoio
que recebeu dos países-membro da OPEP.
Em abril de 1971, após difíceis negociações, foi assinado o Acordo de
Trípoli entre o governo líbio e, separadamente, com cada companhia de
petróleo. Esse acordo aumentou de 50% para 55% o imposto sobre a renda e
elevou o preço de referência em US$ 0,52, assim como impôs outras vantagens
inerentes à privilegiada posição geográfica da Líbia, com o compromisso das
concessionárias de reaplicarem, na região, uma parcela dos lucros na pesquisa
de outras jazidas. Em contrapartida, as empresas obtiveram do governo líbio a
9 O Irã, por exemplo, teve uma receita extra de US$ 100 milhões e a Arábia Saudita de US$ 1.200 milhões em 1970 e US$ 2.160 milhões em 1971, o Kuwait teve uma elevação de US$ 895 milhões para US$ 1.395 milhões. 10 O preço de referência fiscal foi afetado por um aumento uniforme de US$ 0,33 por barril, com reajustes sucessivos de US$ 0,50 a partir de junho de 1971, e a cada início de ano, de 1971 a 1975.
garantia de que não haveria modificação das condições financeiras por um
período de cinco anos, tal como previsto no Acordo de Teerã.
Dessa forma, a Líbia teve o apoio de seus parceiros da OPEP para
conduzir sozinha as negociações com as companhias de petróleo, que não
hesitaram em transferir as exigências para o consumidor final, incidindo sobre
ele os aumentos de preços muito superiores aos aumentos de seus próprios
custos, sob o apoio do governo norte-americano.
Os países exportadores, progressivamente, ao obter maior controle
sobre as empresas petrolíferas, por meio de participação ou estatização total,
conseguiram conseqüentemente um maior controle sobre os preços.
Ao invés de aumentar os rendimentos, apenas aumentando o volume,
para colocar mais barris no mercado, o que provocava apenas a queda dos
preços, as empresas buscaram preços mais elevados. O resultado foi o sistema
de preços submetidos a negociações entre as empresas e os países
exportadores. A iniciativa de forçar a subida dos preços, cabia agora aos países
hospedeiros.
CAPÍTULO II - OS CHOQUES DO PETRÓLEO, NAS DÉCADAS DE 70 E 80, E A REESTRUTURAÇÃO DA INDÚSTRIA PETROLÍFERA
No início da década de 70, havia se estabelecido um equilíbrio entre a
oferta e a demanda. O petróleo barato havia possibilitado um grande
desenvolvimento econômico, porém isso era difícil de se manter. A demanda
era crescente e era preciso desenvolver mais suprimentos, o que significava o
fim da capacidade de manter reservas. Pouco tempo depois, o equilíbrio entre a
oferta e a demanda já estava prejudicado.
Neste capítulo são examinados os fatores e eventos, em particular os
choques de preços da década de 1970, que conduziram a grande influência da
OPEP na indústria petrolífera mundial, bem como a evolução que a levou a
retornar a uma posição defensiva com o "contra-choque" do petróleo de 1986.
II.1 – A Crise de 1973 No final de 1970, havia 3 milhões de barris por dia de capacidade
excedente no mundo, sendo a maior parte concentrada no Oriente Médio. Em
1973, a capacidade adicional estava reduzida a menos da metade, em menos
de 1,5 milhões de barris por dia, que significava aproximadamente 3% da
demanda total. Depois de novos cortes de produção, feitos pelos países árabes,
a capacidade de produção excedente estava reduzida a apenas 500 mil barris
por dia.
Nessa época, a dependência dos países industrializados do Ocidente
mais o Japão, em relação ao petróleo como fonte de energia, era muito grande.
o Japão tinha uma dependência de 90% e os países da Europa Ocidental entre
60% e 80%. Desta forma, o embargo chegou como um choque.
Em 1973 o petróleo havia se tornado essencial, para as economias
industriais do mundo, e circulava com muita escassez. Desde o pós-guerra,
nunca a situação entre a oferta e procura havia sido tão apertada. Tratava-se
de uma situação, onde qualquer pressão poderia precipitar uma crise em
proporções mundiais (Yergin, 1992).
A demanda continuava aumentando nos primeiros meses de 1973. Nos
Estados Unidos, a produção nacional, mesmo protegida por cotas de produção,
não poderia acompanhar a sua demanda. Dessa forma, o Governo Nixon abolia
o sistema de cotas a fim de dividir proporcionalmente os suprimentos
disponíveis.
O primeiro elemento a por em causa a estabilidade foi a decisão norte-
americana de suspender a conversibilidade do dólar em ouro. Isso equivalia à
desvalorização da moeda norte-americana, que tinha o efeito imediato de
diminuir o poder de compra dos países membro da OPEP, cujos preços de
referência eram cotados em dólar. Para as companhias de petróleo que
acreditaram nos acordos e pagaram para assegurar a estabilidade, a
desvalorização causou um novo impasse que só seria resolvido através de
novas negociações.
Com isso as companhias internacionais e os países-membro da OPEP
reiniciaram as negociações, para fixar o percentual de aumento a ser acordado,
para compensar as perdas, estimadas em US$ 153 milhões pelos países
produtores, já que os acordos previam um ajustamento anual. Da reunião de
janeiro de 1972 resultou o Acordo de Genebra, em que os preços foram
ajustados em 8,49%. O segundo Acordo de Genebra, em junho de 1973, por
motivo da segunda desvalorização do dólar, levou a um reajuste de 6,1% sobre
os preços de referência de abril de 1973. Mais importante que o aumento foi a
aceitação da proteção do preço do petróleo, preservando o poder de compra do
"petrodólar”11.
Convivendo com a desvalorização do dólar, estavam para surgir grandes
mudanças na indústria internacional do petróleo. Isso ocorreu principalmente
em função das relações financeiras e econômicas dos novos centros de poder,
sem que condições políticas pudessem vulnerar os sistemas de transferência
então vigentes. Embora a segurança do suprimento fosse garantida pelo
sofisticado mecanismo do comércio internacional de petróleo, sob a base dos
Acordos de Genebra, a ordem política do petróleo estava ameaçada, na medida
em que cresciam temas como a nacionalização, a participação acionária e o
fortalecimento da OPEP.
Superando a inexperiência do passado, em outubro de 1973, a
politização do petróleo ganhou consistência e solidariedade, integrando-se na
conjuntura internacional como arma de pressão dos países árabes. Para se
obter o petróleo árabe, além de aumentar o preço de referência, era preciso
cobrar um preço político.
Em 1973, as importações dos Estados Unidos alcançaram 6,256 milhões
de barris por dia contra 4,741 milhões de 197212. Isso elevou o preço de tais
suprimentos.
Quando toda a demanda mundial emergiu, diante do limite de suprimento
disponível, os preços de mercado excederam os preços oficiais (Yergin, 1992),
invertendo a situação em que, por muito tempo, como reflexo do excesso de
suprimentos, os preços de mercado permaneciam abaixo dos preços fixados.
11 Denominação informal das receitas em dólar recebidas pelos países da OPEP com a exportação de petróleo e de seus derivados. 12De acordo com o Petroleum Supply Annual 1999.
Entre 1970 e 1973 o preço de mercado do barril de petróleo havia
dobrado. Os lucros dos países exportadores subiam, assim como a participação
das empresas nos rendimentos. Em outubro de 1973, com a decisão de
aumentar o preço fixado do petróleo em 70%, para US$ 5,11 o barril, alinhava-
se aos preços de um mercado em crise (Yergin, 1992).
O que pavimentou o preço político do petróleo árabe foram os problemas
militares na região do Oriente Médio com a Guerra do Yom Kippur, contra
Israel. A decisão de embargo coletivo foi anunciada em outubro de 1973.
Nesse embargo coletivo, cada país árabe se comprometia a reduzir
imediatamente sua produção, de um mínimo de 5%, e de mais 5% nos meses
subseqüentes, até que Israel se retirasse dos territórios ocupados desde 1967.
Alguns países anunciaram o corte de 10%, em vez de 5%. Essas reduções
assegurariam absoluto rebaixamento nos níveis de fornecimento disponíveis. A
oferta teria uma redução drástica. A expectativa de reduções mensais,
acrescida da diferenciação entre os países consumidores, devido à guerra,
maximizaria a incerteza futura.
O embargo assinalou uma nova era para o petróleo mundial. O petróleo
era agora um problema importante demais.
A partir de então, os países consumidores entenderam que desta vez o
embargo coletivo era para valer. Esse embargo levou o Ocidente a repassar os
inesperados 70% da alta dos preços para os consumidores, e até a realizar
lucros suplementares, como de fato correu diante desses acontecimentos. As
companhias americanas tiveram seus lucros aumentados de 40% até 150%, e,
na pior das hipóteses, ficaram inalterados.
O embargo do petróleo árabe tinha dois elementos. Um era composto
pelas restrições progressivas da produção que afetava todo o mercado, as
reduções iniciais e depois os 5% adicionais em cada mês. O outro elemento era
a total proibição da exportação de petróleo para países como os Estados
Unidos, fiel aliado de Israel, restrição depois estendida para outros.
Em meio aos cortes de produção, havia grande incerteza sobre quanto o
petróleo estava disponível, combinado com uma tendência para se exagerar a
perda. Isso tinha influência direta nos preços. Antes do embargo, o petróleo
disponível totalizava 20,8 milhões de barris por dia. No momento mais crítico do
embargo, era de 15,8 milhões de barris por dia, uma perda bruta de 5 milhões
de barris diários de abastecimento do mercado (Yergin, 1992).
Dessa vez não havia capacidade de reserva nos Estados Unidos, os
quais haviam perdido sua capacidade de influenciar o mercado mundial de
petróleo.
O aumento da produção em outros países significava que a perda líquida
de abastecimento em dezembro era de 4,4 milhões de barris por dia, cerca de
9% do total de 50,8 milhões que haviam estado disponíveis dois meses antes.
Seus efeitos tornaram-se ainda mais graves, devido à rápida taxa de
crescimento do consumo de petróleo do mundo, que era, em média, de 7,5% ao
ano.
Outra incerteza vinha do fato de os países exportadores de petróleo
pensarem em termos de rendimentos. Agora, com o preço do barril chegando
às alturas, os países exportadores poderiam reduzir mais os volumes e ainda
aumentar a sua renda total. Poderiam vender menos e ainda lucrar mais.
Poderiam tornar esses cortes permanentes e nunca mais devolver ao mercado
aqueles barris retirados dele, o que elevaria ainda mais os preços.
A era da escassez havia chegado. A perspectiva era de queda no
crescimento econômico, inflação e recessão das economias. O sistema
monetário poderia estar sujeito a grandes mudanças. A maior parte do mundo
desenvolvido sofreria um retrocesso significativo.
Em meio ao leilão de preços no mercado à vista, a reunião da OPEP, em
dezembro de 1973, decidiu pelo aumento dos preços para US$ 11,65. Dessa
forma o preço do barril quadruplicou em 1974.
Esse evento, marcado pela decisão unilateral da OPEP de quadruplicar
os preços, foi resultado dos limites dinâmicos da indústria petrolífera para
sustentar a lógica do mercado comprador, puxado pelo crescimento capitalista
mundial, principalmente nas décadas de 50 e 60. No início dos anos 70, a
demanda de petróleo estava se nivelando à produção existente, e o excedente
acumulado, nesses 20 anos, se aproximava da exaustão (Alveal e Pinto Jr.,
1996).
Com o ritmo de crescimento da demanda de petróleo mundial, antes de
1973, dois fatores no segmento de exploração e segmentação contribuíram
para essa evolução: i) o decréscimo de descobertas de jazidas; e ii) a
estagnação da produção interna de hidrocarbonetos nos Estados Unidos
(Alveal e Pinto Jr., 1996).
Nessa conturbada conjuntura, os países árabes continuaram a embargar
todos os suprimentos de óleo para países que tivessem posições pró-
israelenses. Dessa forma não deixaram dúvida de que, se a medida fosse mal
interpretada na Comunidade Européia, toda a Europa seria atingida. Ao final de
1973, concretizado o corte generalizado de 25% sobre o nível de setembro,
correspondente a 6 milhões de barris por dia, os preços do petróleo bruto
dispararam. Os países consumidores tiveram que conviver com a chamada
"chantagem árabe", de comprovada eficiência, já que os embarques do Golfo
só eram autorizados após rigorosa fiscalização dos conhecimentos da carga
dos petroleiros, identificando os destinatários beneficiados.
Os produtores árabes certamente subestimaram a decisão de novembro
de cortar um total de 25%. A Europa e o Japão começaram a encarar a
possibilidade de recessão de suas economias.
Diante dos efeitos colaterais não desejados da politização do petróleo, foi
decidido isentar tanto a Comunidade Européia como o Japão do corte adicional
de 5% programado para dezembro. Em termos absolutos, essa decisão
reconduziu a redução total dos suprimentos ao nível de 2,7 milhões de barris
por dia, em vez dos 4 milhões de barris por dia, previstos para janeiro. No curso
dos anos de 1974 e 1975, na Europa, nos Estados Unidos e no Japão, o
desenvolvimento econômico tornou-se quase sempre nulo ou negativo, de 1 %
a 2% (Marinho Jr., 1989).
Em termos geopolíticos, o embargo foi um ato que se beneficiou de
circunstâncias econômicas e requereu ação política em três frentes interligadas:
entre Israel e seus vizinhos árabes, entre a América do Norte e seus aliados, e
entre os países industrializados, principalmente os Estados Unidos, e os países
exportadores (Yergin, 1992). O fim do embargo só aconteceria em meados de
1974, com o fim das hostilidades entre árabes e israelenses. A partir da
separação das forças militares egípcias e israelenses, em janeiro de 1974, a
arma política do embargo foi perdendo sua força até ocorrer o consenso da sua
suspensão.
II.2 - O Significado do Embargo e da Quadruplicação do Preço Mundial do Petróleo
Os países produtores árabes se mostraram recompensados pela
conscientização da opinião pública, sobre a importância do mundo árabe para o
bem-estar da economia mundial, e pela mudança da política da Comunidade
Econômica Européia.
O longo embargo de cinco meses falhou, como estratégia, para forçar os
Estados Unidos e seus aliados a pressionarem Israel a evacuar as terras
árabes ocupadas. Mas, por outro lado, foi bem sucedido como instrumento
político, capaz de unificar os países produtores árabes, em torno de uma causa
comum, e valorizar seu produto de exportação. A politização do petróleo ainda
teve o mérito de chamar a atenção da opinião pública internacional para o
problema palestino no Oriente Médio.
Em termos de valorização, o preço do petróleo chegou a atingir, em
janeiro de 1974, a marca dos 470% de aumento, em relação ao ano anterior.
Pela primeira vez na história, os 31 países da OPEP assumiram o papel
principal no mecanismo de formação de preços, até então um privilégio das
majors e dos países desenvolvidos, grandes consumidores13.
O favorável contexto de reversão de um mercado comprador para um
mercado vendedor foi o grande responsável pelo deslize do poder de decisão
das companhias internacionais para os países produtores de petróleo.
Isso de nada adiantaria, se os países produtores não estivessem
preparados, política e economicamente, para assumir juntos o poder de decisão
e agir individualmente ou coletivamente, tirando partido do favorável contexto
internacional e do laissez-faire do governo norte-americano. Merece todos os
créditos por ter consolidado o senso de unidade e solidariedade dos países-
membro bem como ter viabilizado o embargo do petróleo árabe como arma
política, pondo fim à ilusão de que a crise era passageira.
Sem os movimentos revolucionários nacionalistas do Iraque, Argélia e
Líbia, sem a pregação altista da tributação venezuelana, sem a substituição da
estratégia de negociar racionalmente, e sem a revitalização da liderança da
13 Daí as receitas petrolíferas terem triplicado tão rapidamente, saltando de US$ 7.694 milhões em 1970, para US$ 21.105 milhões em 1973 (Yergin, 1992).
Arábia Saudita, em prol do fortalecimento da unidade do sentimento árabe, era
pouco provável que o ano de 1973 terminasse como um marco histórico,
prenúncio de uma nova ordem internacional na indústria mundial do petróleo.
Ou ainda que sem a OPEP, individualmente, cada país-membro estivesse na
posição de tomar as decisões certas e maximizar suas receitas petrolíferas
como efetivamente ocorreu nessa escalada.
O primeiro grande choque do petróleo encerrou o ciclo de uma era em
que os países industrializados podiam importar vastas quantidades de energia,
a baixo custo, em troca de produtos finais a preços inflacionados.
Os Acordos de Teerã, Trípoli e Genebra oficializaram a inversão dos
custos decrescentes para custos crescentes no mercado internacional do
petróleo. Isso comprovou que os países da OPEP acertaram rapidamente o
passo nos anos 70, ao contrário dos seus primeiros anos de existência.
Diante do comportamento das companhias internacionais de petróleo,
com o apoio dos setores públicos e privados norte-americanos, favoráveis a
uma alta de preços, os países-membro da OPEP se sentiram motivados a
cobrar-lhes o compromisso assumido de reinvestir uma parcela satisfatória dos
lucros nas áreas de produção. Assim os interesses se tornaram conflitantes. As
companhias viam nessa transferência de recursos, em favor dos países
produtores, uma perigosa ameaça ao controle da produção e ao sigilo comercial
de suas operações petrolíferas. Elas resistiram enquanto puderam.
Porém os países-membro da OPEP, organizados em empresas públicas
nacionais, desvendaram o nível de lucratividade das elites controladoras
internacionais, conhecendo o preço entre filiais e o preço das transações
internacionais. Dessa forma, conquistaram um espaço novo, no controle e na
fiscalização das operações petrolíferas, chegando ao epicentro da estrutura de
preços, tendo acesso ao verdadeiro preço de venda do petróleo bruto, até então
desconhecido.
A queda da resistência do cartel internacional do petróleo consagrou a
tomada do poder da OPEP, superando metas de crescente ambição. É bom
lembrar que o objetivo primordial dos países fundadores da OPEP consistia em
estabilizar o preço de referência e obter uma parcela financeira cada vez maior
das receitas provenientes do petróleo.
A última meta só foi atingida com a criação das empresas estatais da
OPEP ou com o processo de nacionalização14.
O país produtor adquiriu o direito nominal de determinar os níveis de
produção, como o poder de comercializar o seu petróleo diretamente com os
países consumidores. Dessa forma as elites controladoras internacionais viam
reduzidas as perspectivas de dominação e poder15.
Iniciou-se a nova ordem internacional da indústria de petróleo, dominada
por novas relações internacionais entre os países consumidores e os países
exportadores, estes, agora, individualmente fortes, e mais fortes ainda por
estarem regionalmente organizados. Chegava se a tempos de dependência,
com seus fluxos de movimentação de petróleo, antecipando que nenhum
acordo poderia regular ou resistir a uma situação de custos crescentes e de
novas turbulências no contexto internacional.
14 Esse objetivo foi sendo atingido pelo aprimoramento do regime tributário dos países hospedeiros no sistema concessionário. Somente depois de muito tempo surgiram outros objetivos, com o de determinar o preço do petróleo, bem assim os volumes a serem produzidos e comercializados. A fixação do preço pela OPEP e não mais pelas companhias de petróleo foi conseguida em 1971, quando os países produtores podiam trabalhar em associação com companhias privadas estrangeiras. 15 Como exemplo, tem-se a incapacidade do governo norte-americano, usando as majors, de não ter conseguido que a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico – OCDE, integrada pelos países da Comunidade Econômica Européia, pelos Estados Unidos, Canadá e Japão, se opusesse às reivindicações dos países produtores.
A OPEP abandonava sua estratégia defensiva de outrora e estabelecia a
era das decisões unilaterais
II.3 - O Pós-Crise de 1973
Durante boa parte da década de 70, entre 1974 e 1978, os países-
membro da OPEP influiriam sobre a política de relações exteriores e até sobre
a autonomia de alguns países do mundo. Esses anos foram conhecidos como a
"Era de Ouro da OPEP". Nessa época os países membro assumiram o controle
completo de seus próprios recursos e sustentaram árduas lutas com os
governos dos países grandes consumidores e, também, dentro da própria
OPEP, sobre o preço do petróleo. Esses embates dominariam as estratégias
econômicas e a política internacional por toda a década (Yergin, 1992).
Os rendimentos dos países exportadores aumentaram de 23 bilhões de
dólares, em 1972, para 140 bilhões de dólares, em 1977, acumulando grandes
superávits financeiros que provocaram o temor de que não pudessem gastar
todo esse dinheiro. Porém, os países da OPEP investiram em grandes
programas de industrialização, construção de infra-estrutura, e para expandir,
alocaram os recursos em subsídios para adquirir serviços, artigos essenciais e
de luxo.
Embora a OPEP fosse considerada um cartel, durante esse período, na
verdade, não o era. Um cartel é definido como uma associação de produtores
que regula os preços e a produção de uma determinada mercadoria. A OPEP
estava certamente tentando fixar os preços, mas não a produção. Não havia
cotas ou níveis de produção determinados. Assim, o mercado estava dominado
por um oligopólio desordenado. Nesse período, a maior parte dos exportadores
estava produzindo praticamente à plena capacidade. A única exceção era a
Arábia Saudita que controlava a sua produção para tentar alcançar o preço a
que se propunha (Yergin, 1992).
A principal preocupação dos países consumidores, entre os anos de
1974 e 1978, era se o preço do petróleo continuaria a subir ou permaneceria
estável. Diante do interesse em não perpetuar os ciclos de recessão e inflação,
que seriam estimulados por novos aumentos nos preços do petróleo, a OPEP
assumiu uma posição mais cautelosa. Temia que os preços mais altos e os
efeitos advindos desse fato pudessem dar início a um afastamento do consumo
de petróleo, para a conservação de energia e para outras fontes de
combustível, que poderiam modificar e reduzir o mercado de petróleo, a longo
prazo, e, portanto, diminuir o valor das suas reservas (Yergin, 1992).
O fato de o Irã ter se juntado à Arábia Saudita, no que dizia respeito à
moderação, era um sinal de que manteriam os preços sob controle. Os dois
países juntos representavam 48% da produção total da OPEP. Dessa forma, de
1974 a 1978, houve apenas dois pequenos aumentos do preço geral, dos U$S
10,84 em dezembro de 1973, para U$S 11,46 em 1975, e para U$S 12,70 no
final de 197716.
Com o fim das concessões, as empresas internacionais estavam agora
se tornando contratadas, com acordos de participação, na produção. Assim, a
quantidade de petróleo vendida diretamente, pelos próprios exportadores, ao
mercado, sem beneficiar as companhias, no seu papel de intermediárias,
aumentou de 8% da produção total da OPEP, em 1973, para 42% em 1979. A
indústria global de petróleo havia, em pouco mais de cinco anos, se
transformado completamente sob o império da OPEP17.
16 Em 1978, o preço do petróleo, corrigido pela inflação, era cerca de 10% menor que em 1974. Em resumo o petróleo não era mais uma mercadoria barata, mas o preço também não foi parar nas alturas. 17 No final de 1978, as políticas pós-embargo em outros países, como nos Estados Unidos, começaram a surtir efeito. Houve uma reação ao embargo de efeito instantâneo. O aumento de preços, a expectativa de novos aumentos, grande expansão do fluxo de caixa desencadeou uma grande procura por petróleo.
A OPEP continuou a dominar o mercado mundial do petróleo ao longo
dos anos 70. Era responsável por 65% da produção total de petróleo em 1973 e
62% em 1978. Mas seu domínio começava a declinar. O incentivo do preço e
as razões de segurança estimularam o desenvolvimento da produção de
petróleo fora da OPEP e, em questão de anos, essas novas fontes
transformariam o sistema de suprimento mundial de petróleo. Três novas
regiões petrolíferas teriam influência dominante: o Alasca, o México e o Mar do
Norte. As reservas do Mar do Norte, na Grã-Bretanha, seriam as mais
importantes devido ao seu tamanho.
II.4 - A Crise de 1979 O novo choque do petróleo ocorreu em 1979, com a Revolução Islâmica
ocorrida no Irã, encorajando as antecipações inflacionárias e favorecendo o
surgimento de práticas de aumento de preços dentro da OPEP (Terra, 1999).
Esse novo choque do petróleo passou por vários estágios. O primeiro
prolongou-se do final de dezembro de 1978, quando cessaram as exportações
de petróleo iraniano, até o outono de 1979. A perda da produção iraniana foi
parcialmente compensada por aumentos de produção em outros lugares. A
Arábia Saudita expandiu sua produção, além de 8,5 milhões de barris diários,
para 10,5 milhões. Outros países da OPEP também aumentaram sua
produção18.
Portanto, o aumento de 150% no preço do petróleo não foi explicado
somente com essa perda, mas por mais cinco fatores: i) o crescimento do
consumo de petróleo e o sinal que esse fato representou para o mercado; ii) o
rompimento de acertos contratuais dentro da indústria petrolífera resultante da
18 O Irã era o segundo maior exportador de petróleo do mundo, atrás somente da Arábia Saudita. Porem comparada à demanda mundial de 50 milhões de barris por dia, a perda não era maior do que 5%.
Revolução no Irã; iii) o conjunto de estratégias contraditórias e conflitantes dos
governos consumidores19, iv) a possibilidade, por parte dos países
exportadores de petróleo, de ganhar rendimentos extras, extremamente
grandes20 e v) as expectativas da chegada de uma crise petrolífera mais
profunda21.
A indústria petrolífera mundial mantinha estoques. Esses estoques eram
necessários para garantir a regularidade das operações. A manutenção de
estoques era fundamental para o esforço de equilibrar a oferta e a demanda e
manter a cadeia de operações na normalidade. Manter esses estoques custava
caro. Significava dinheiro imobilizado no petróleo estocado. A mera suspeita de
queda dos preços por diminuição no consumo provocava imediata ação de
"desova" do petróleo estocado, para recuperá-lo, mais adiante, a preços
menores. Dessa maneira a indústria se comportou na maior parte de 1978, em
condições de mercado estável.
As companhias, porém, compraram além do consumo previsto,
principalmente porque não estavam certas de que conseguiriam petróleo mais
tarde. Essas aquisições extras, para além das reais necessidades de consumo,
associadas à especulação, levaram a mais um aumento dos preços. Em 1979
os preços deram um salto, ultrapassando os US$ 5 do preço oficial, para US$
13,33. E em 1980 passaram para US$ 30.
A corrida das companhias para armazenar estoques, reforçada pela dos
consumidores, resultou numa demanda extra de 3 milhões de barris diários,
acima das necessidades reais de consumo. Portanto, esse foi um fenômeno
predominantemente especulativo.
19 Enquanto os governos prometiam cooperação para estabilizar os preços, as companhias dessas mesmas nações procuravam aumentar os preços. 20 Mais uma vez eles podiam afirmar seu poder e influenciar no cenário mundial. A maioria continua a aumentar os preços em todas as oportunidades. 21 A crise esperada para meados da década de 80 chegara em 1979.
No começo de 1979, o petróleo iraniano começou a voltar ao mercado
mundial, embora em níveis menores que antes. Neste mesmo ano, a produção
da OPEP estava de volta aos 31 milhões de barris diários, o que mesmo
computando a interrupção da produção iraniana, era de 3 milhões de barris
acima da média de 1978.
O aumento dos preços em 1979 se desenvolveu num momento em que
as condições de equilíbrio seriam procuradas e estabelecidas num mercado em
mudança. Os países que eram grandes consumidores adotaram medidas
econômicas de energia, mesmo às custas da redução do crescimento
econômico, somadas à produção em jazidas fora da OPEP, o que a fez ter uma
participação reduzida no mercado mundial (Terra, 1999).
II.5 - O Pós-Crise de 1979
A Guerra entre o Irã e o Iraque sacudiu o mercado internacional do
petróleo em 1980. Essa guerra retirou do mercado 4 milhões de barris de
petróleo por dia, ou seja, cerca de 15% da produção total da OPEP e 8% da
demanda total mundial. Os preços obviamente aumentaram. Porém a demanda
por petróleo estava diminuindo. A retração econômica havia começado,
resultante do aumento de preços associado à decisão das nações do Ocidente
de lutarem contra a inflação, a qualquer custo, mesmo se implicasse recessão
profunda. Qualquer que fosse o motivo, a demanda estava diminuindo (Yergin,
1992).
Desde 1979 as empresas gastavam muito na compra de petróleo a
qualquer preço, incluindo volumes superiores à demanda. Esse volume extra
não era consumido, mas sim estocado. No final de 1980, enquanto os estoques
se mantinham altos, a demanda continuava em alta queda e os preços estavam
se debilitando. Assim, tornava-se cada vez mais antieconômico acumular
estoques e, portanto, havia incentivo para dispor deles, em vez de comprar
petróleo adicional.
Não só o consumo estava diminuindo como a produção de outras fontes
estava compensando a perda de petróleo do Irã e do Iraque (Yergin, 1992).
Ao mesmo tempo em que alguns países da OPEP aumentavam sua
produção, e até mesmo algum petróleo do Irã e do Iraque estava voltando ao
mercado, aumentava-se a produção no México, no Mar do Norte, na Noruega e
em outros países fora da OPEP, bem como no Alasca. Dessa forma, o uso de
estoques tornou-se uma alternativa irresistível à compra do petróleo. Os
produtores fora da OPEP, a fim de aumentar suas fatias de mercado, faziam
descontos significativos em seus preços oficiais. Seu ganho era perda para a
OPEP e a sua demanda caía com isso. Como resultado, a produção da OPEP
em 1981 foi 27% menor do que a de 1979.
Em 1981, com a pressão saudita, para o aumento do preço de US$ 32
para US$ 34 o barril, os preços do petróleo da OPEP aumentariam pela última
vez. Alguns países baixariam seu preço para US$ 34. Dessa forma, o preço se
reunificou. O consolo era que a produção saudita voltaria ao patamar de 8,5
milhões de barris diários. Os maiores aumentos da produção petrolífera no
México, no Alasca e no Mar do Norte começaram a mudar a estrutura da
economia da energia, sendo que vários outros países, considerados de
pequena expressão individualmente, mas importantes quando tomados em
conjunto, se tornaram produtores e exportadores.
Mudanças significativas também aconteciam com, a demanda. A
dependência crescente do petróleo como fonte de energia, dentre todas as
outras possibilidades, foi revertida pelo impacto dos preços altos. O carvão
retornou na geração de energia elétrica e na indústria. A energia nuclear
também surgiu rapidamente na geração de eletricidade. No Japão, o gás
natural liquefeito aumentou sua participação na economia energética e no
fornecimento de eletricidade. A combinação disso tudo mostrava que o petróleo
estava perdendo terreno rapidamente. A participação do petróleo, no mercado
da energia total consumida, nos países industrializados, caiu de 53%, em 1978,
para 43%, em 1985.
Não só o petróleo passava por uma queda, em sua participação no
mercado da energia, como o próprio mercado estava diminuindo, devido ao
reflexo do aumento da eficiência energética ou da economia de energia.
Em 1983, o impacto da economia de energia e da substituição de
combustíveis foi evidente. O consumo de petróleo mundial era de 6 milhões de
barris a menos que em 1979, quando se atingiu o pico do consumo. Enquanto a
demanda caíra entre 1979 e 1983, a produção extra OPEP aumentara em 4
milhões de barris por dia. Além disso, as companhias de petróleo buscavam
dispor dos altos estoques que haviam acumulado na previsão de um nível de
demanda que nunca ocorreu.
Essas três tendências, a queda na demanda, o crescimento da produção
fora da OPEP e a grande liberalização dos estoques, reduziram a procura pelo
petróleo da OPEP em quase 3 milhões de barris por dia, uma queda de 43%
em relação aos níveis de 1979. A Revolução Iraniana, seguida da Guerra Irã-
Iraque havia afetado seriamente a capacidade de exportação daquele dois
países. Em vez da escassez, o que se viu foi uma capacidade de produção
muito maior que a demanda do mercado, em resumo, o aparecimento de um
maciço excedente de produção (Yergin, 1992).
Até 1977, a OPEP produzia dois terços de todo o petróleo cru consumido
no mundo. Em 1982, pela primeira vez, a produção extra-OPEP tomou a
dianteira em 1 milhão de barris por dia e continuava crescendo.
A OPEP estava em dificuldades. O mercado a confrontava com uma
escolha entre baixar o preço, para recuperar a sua participação, ou cortar a
produção e manter os preços. Como a OPEP não ia baixar seus preços, teria
que cortar a produção para dessa maneira preservar os preços. Em março de
1982, a organização, que produzira 31 milhões de barris por dia, em 1979,
estabelecia agora um limite de produção de 18 milhões de barris por dia, com
cotas individuais de produção para cada país, exceto para a Arábia Saudita,
que ajustaria sua produção conforme as necessidades.
Finalmente a OPEP havia se tornado um cartel, administrando e
alocando a produção e estabelecendo os preços. Esse papel nunca tinha sido
alcançado anteriormente, pois as estratégias não eram coordenadas e seguidas
por todos os seus países-membro de forma conjunta.
Em meados de 1983, a competição continuava a crescer rapidamente no
mercado de petróleo. Para neutralizar a competição, os descontos e os cortes
de preços extra-oficiais tornou-se a regra geral entre os países da OPEP. Isso
levou-a, em março de 1983, a cortar os preços em 15%, entre US$ 29 e US$ 34
o barril. Era a primeira vez que isso acontecia na história da organização
(Yergin, 1992).
Dessa forma, até 1985, os preços foram orientados no sentido de baixa,
e o papel diretor foi assumido pelo mercado livre. A OPEP, portanto, foi
pressionada e obrigada a adotar novamente uma estratégia defensiva (Terra,
1999).
II.6 - A Crise de 1986 Em meados da década de 80, o preço do petróleo equilibrava-se
precariamente. A produção fora da OPEP continuava a aumentar, e o carvão, a
energia nuclear e o gás natural continuavam a tomar o mercado do petróleo. À
medida que os países da OPEP viam seus lucros diminuírem, as fraudes entre
eles com relação às cotas tornavam-se mais evidentes, descaracterizando o
cartel. Já que não conseguiam satisfazer a receita através dos preços, dariam
descontos e tentariam alcançá-la pelo aumento do volume de produção.
Assim, se viu numa posição crítica. A organização poderia reduzir o
preço ou continuar a sustentar os altos preços. Mas, se fizesse isso, o petróleo
que não lhe pertencia prosperaria, junto com as outras fontes de energia
concorrentes ao petróleo, garantindo a si própria uma parcela muito reduzida do
mercado.
Assim, a Arábia Saudita passou da defesa dos preços à defesa dos
volumes, ao seu próprio nível desejado de produção, e a escolher acordos de
lucros garantidos com algumas companhias de petróleo. Seu objetivo era
recuperar o seu nível de cotas da OPEP. O contrato de lucros garantidos
significava que já não havia mais um preço saudita oficial. O preço seria aquele
alcançado pelo petróleo no mercado. Dessa forma, não haveria mais um preço
estabelecido pela OPEP.
Por seus atos, a Arábia Saudita já tinha declarado guerra pela
participação no mercado, contra os demais países da OPEP. Agora a OPEP,
como um grupo, anunciava a sua intenção de disputar com os países não
membros a recuperação dos mercados perdidos. A partir daí os preços
começaram a desabar.
Nos dois choques anteriores, perdas marginais e interrupções no
fornecimento tinham sido o suficiente para mandar os preços para o alto. A
produção da OPEP, nos quatro primeiros meses de 1986 variava numa média
de 17,8 milhões de barris por dia, cerca de apenas 9% acima da produção de
1985. Ao todo, a produção adicional não significava mais de 3% do suprimento
total de petróleo no mundo. No entanto, isso tudo, associado ao compromisso
com a participação no mercado foi o suficiente para fazer caírem os preços a
níveis tão baixos (Yergin, 1992).
Nesse terceiro choque do petróleo, eram os exportadores que lutavam
por mercados, ao invés dos compradores a brigar por suprimentos, o que
aconteceu nos choques anteriores do petróleo. Os preços entraram em queda e
estavam também fora de controle. Afinal, o preço agora era estabelecido pelas
inúmeras negociações individuais. Os próprios membros da OPEP,
individualmente, entraram em disputa uns com os outros pela conquista de
mercados.
Os dois fatores fundamentais, que causaram essa queda, nos preços,
eram que havia mais petróleo à procura de mercados do que mercados à
procura de petróleo e que a posição de regulador ou swing producer, da Arábia
Saudita, fora eliminada.
Não havia existido uma experiência anterior a essa de um ambiente
competitivo na indústria petrolífera mundial. Agora, o preço em que o petróleo
devia competir com outras fontes de energia e com a economia de consumo era
o de US$ 18 o barril. O novo preço iria reacender a demanda por petróleo, ou
até mesmo reverter a produção aparentemente incontrolável dos países não
membros da OPEP.
Com a Arábia Saudita mantendo sua produção e o antigo nível de cotas,
dava indícios que iria impulsionar sua produção a níveis mais elevados. Assim,
em julho de 1986, o petróleo bruto do Golfo Pérsico caiu para U$S 7 o barril.
Dessa forma, a estratégia da divisão do mercado havia acabado. Mas, ao
anunciar o restabelecimento das cotas, a OPEP teria que contar com a
cooperação dos países não-membros. Apenas em dezembro de 1986, ocorreu
o restabelecimento dos rendimentos. Os países exportadores concordaram com
o preço de US$ 18 e com a cota que pudesse manter esse preço. Essa
estrutura de acordo funcionou durantes os anos de 1987 a 1989. Os novos
preços do petróleo, num nível mais baixo, beneficiaram os países
consumidores. A redução dos tributos estimulou e prolongou o crescimento
econômico do mundo industrial.
Portanto, entre 1986 e 1990, a OPEP agiu de forma defensiva, a fim de
recuperar os mercados consumidores perdidos, já que o mercado mundial de
petróleo havia se tornado muito competitivo (Terra, 1999).
CAPÍTULO III - A OPEP E AS PRINCIPAIS MUDANÇAS NO MERCADO PETROLÍFERO MUNDIAL NA DÉCADA DE 90
Em 1989, ocorreu o fim da Guerra Fria com o colapso dos países da
Europa Oriental, e principalmente da União Soviética. A Guerra Irã-Iraque não
modificou substancialmente a tendência de mercado comprador introduzida na
indústria petrolífera mundial desde o "contra choque" de 1986. No entanto, o
petróleo estava no alto das discussões ambientais e seu preço estava baixo.
Afinal, as reservas mundiais comprovadas de petróleo tinham aumentado
imensamente22.
Os maiores acréscimos nas reservas mundiais, porém, estavam
concentrados nos cinco maiores produtores do Golfo Pérsico, além da
Venezuela. De maneira suave e modesta, a demanda continuava a crescer e a
produção americana decaía, entre 1986 e 1990, em cerca de 2 milhões de
barris diários. As importações de petróleo dos Estados Unidos estavam em seu
nível mais alto e continuavam subindo. A dependência em relação ao Golfo
Pérsico aumentava. A margem de segurança, distância entre a demanda e a
capacidade de produção estava encurtando. Essa margem havia sido grande o
suficiente em meados da década de 80, para absorver a guerra entre o Irã e o
Iraque, com todas as rupturas e perdas de produção.
III. 1 - O Mercado Petrolífero na Década de 90
No decurso do período entre 1986 e 1990, a maioria dos países
exportadores de petróleo tinha procurado reconstruir os vínculos com os países
22 Dos 615 bilhões de barris, em 1985, para mais de 1 trilhão de barris, em 1990. (Yergin, 1992).
consumidores, antes quebrados na década de 70. Com o aumento das
reservas, esses países desejavam demonstrar que eram confiáveis
fornecedores para longo prazo, e que poderiam ser considerados,
seguramente, como as reservas de energia do mundo industrializado. O
petróleo precisava de mercado e o mercado precisava de petróleo (Yergin,
1992).
Em 1990, ocorreu a invasão iraquiana no Kuwait, a chamada Guerra do
Golfo. O Kuwait era um país que estava identificado a uma estratégia de
petróleo a preços reduzidos. Com a pressão iraquiana, o Kuwait conteve a sua
produção e começou a respeitar as cotas da OPEP.
Porém, a intervenção direta dos Estados Unidos no conflito, com o apoio
tácito dos governos dos países da OCDE23, no conflito, criou uma unanimidade
na comunidade internacional e conduziu a investida iraquiana ao fracasso.
Caso tivesse sucesso em firmar-se no Kuwait, o Iraque controlaria diretamente
20% da produção da OPEP e 20% das reservas mundiais de petróleo.
Os anos 90 começaram com uma luta pelos recursos petrolíferos do
Golfo Pérsico, dos quais o mundo está se tornando cada vez mais dependente.
A crise do Golfo fez com que a segurança energética retornasse à agenda
política, incitando os governos a darem um novo enfoque à segurança do
abastecimento. Essa crise reativou os esforços para a promoção do
desenvolvimento energético nos países industrializados. Grande parte do
mundo industrializado percebera que se encontrara envolvida na disputa entre
dois grandes temas, energia e segurança.
Dessa forma, a dinâmica da indústria petrolífera mundial, que foi
sacudida por crises, sendo a de maior relevância a de 73, passou por uma
23 Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico.
relativa estabilidade em meados da década de 90: o preço do petróleo se
estabilizou, ocorrendo apenas pequenas quedas ou aumentos. A OPEP
sobreviveu, nessa última década, na tentativa de aumentar seu mercado
consumidor a preços baixos. Portanto, sua estratégia foi extremamente
defensiva e o seu poder de influenciar no preço do petróleo caiu abruptamente.
Somente há poucos anos, no final da década de 90, é que a OPEP
voltou a tentar reconstituir a sua influência no mercado. Esta tendência se deve,
principalmente, à continuidade da alta inelasticidade da demanda por petróleo.
Os aumentos de preço praticados pela OPEP, principalmente nos
choques da década de 70, e os enormes esforços investidos pelos países
desenvolvidos, para substituir o petróleo, em suas matrizes energéticas, não
conseguiram ainda mudar essencialmente o seguinte fato: a imensa
dependência dos países industrializados ao petróleo bruto. Apesar dos
investimentos em outras fontes de energia, de racionalização e economia de
energia, praticada pelos países consumidores, o petróleo continua a ser o maior
combustível da economia mundial. Daí a continuidade da alta inelasticidade da
demanda por petróleo.
III.2 - A Transição Pós-Petróleo e a OPEP: a Questão das Reservas
A indústria petrolífera apresenta grandes assimetrias nas condições de
produção, dada a distribuição muito desigual das jazidas do planeta, além de
tamanhos e qualidades muito diferentes entre as existentes. A qualidade das
reservas é um dado muito relevante nesta indústria porque, ao definir grandes
diferenças, na estrutura de custos de produção, condiciona-se a oportunidade
de gerar elevadas rendas diferenciais24 e importantes vantagens competitivas,
em todos os segmentos da cadeia petrolífera. Ora, a OPEP possui as maiores
jazidas, de melhor qualidade e de custos mais baixos.
Desde o início de 1999, os preços internacionais do barril de petróleo
vêm apresentando uma acentuada tendência de alta, partindo de uma média
anual, em 1998, de US$ 13,11, chegando a US$ 32 em junho de 2000. Embora
tal patamar de preços, em termos reais, ainda se encontre abaixo do atingido
nos dois Choques do Petróleo, de 1973 e de 1979, tal comportamento dos
preços pode estar já sinalizando uma situação diferente, uma antecipação ao
menor crescimento das reservas em relação à expansão da produção,
principalmente nos países não membros da OPEP.
Embora os preços do óleo dependam de uma série de fatores, sua
elevação nas crises dos anos 70 não pode ser atribuída ao esgotamento das
reservas mundiais, mas às práticas de cartel adotadas pelos países membros
da OPEP, que, valendo-se de uma expressiva participação no market share (de
36% em 1973), decidiram elevá-los mediante o sistema de controle de cotas de
produção.
Nessa ocasião, e até antes mesmo do primeiro choque do petróleo,
muitos especialistas e analistas previram que até o final deste século haveria
uma profunda crise de escassez da oferta, a menos que fossem adotadas
importantes políticas de economia de energia e de substituição por outras
fontes energéticas.
Nas tabelas 1 e 2 abaixo, vê-se que as reservas de petróleo da OPEP
subiram, de 432,8 trilhões de barris em 1980, para 814,4 trilhões em 2000,
chegando quase a dobrar. A OPEP, que possuía 60,9% das reservas, em 1980,
24 Como vista na 1ª Seção do Capitulo I na teoria da determinação da renda desenvolvida por David Ricardo. Ver Ricardo (1982).
passou a concentrá-las em 77,8% no ano 2000. Já os países da OCDE, que
inclui os Estados Unidos e os países mais industrializados da Europa Ocidental,
assim como o Japão e o Canadá, tinham 113,7 trilhões de barris em 1980 e
caíram para 84,8 trilhões em 2000, seguindo uma trajetória decrescente de
suas reservas. Isso significou uma queda percentual muito alta de suas
reservas, de 16% em 1980 para 8,1% no ano 2000. Portanto, as reservas sob
controle das economias grandes consumidoras de petróleo praticamente se
reduziram a metade.
Tabela 1: Distribuição Mundial de Reservas de Petróleo em Trilhões
de Barris de 1980 a 2000
1980 1990 1999 2000
Países da OPEP 432,8 771,7 802,5 814,4
Países da OCDE 113,7 110,4 85,9 84,8
Resto do Mundo 164,1 180,3 166,2 147,2
Total 710,6 1062,4 1054,6 1046,4
Fonte: British Petroleum Statistical Review of World Energy 2001
Tabela: 2 Distribuição Mundial de Reservas de Petróleo por
Porcentagem (%) de 1980 a 2000
1980 1990 1999 2000
Países da OPEP 60,9 72,6 76,1 77,8
Países da OCDE 16,0 10,4 8,1 8,1
Resto do Mundo 23,1 17,0 15,8 14,1
Total 100,0 100,0 100,0 100,0
Fonte: British Petroleum Statistical Review of World Energy 2001
Logo, no momento em que o crescimento econômico mundial
experimenta algum aumento, na demanda mundial, por petróleo, e as reservas
da OPEP crescem muito, relativamente ao resto do mundo, afirma-se ainda
mais a futura dependência da economia mundial em relação ao petróleo da
OPEP.
Essa distribuição das reservas petrolíferas, no ano 2000, também pode
ser vista no gráfico abaixo, com a divisão entre os principais países da OPEP e
a presença da ex-União Soviética.
Gráfico 1: Distribuição Mundial de Reservas de Petróleo em 2000 em Trilhões de Barris
25%
10,8%
9,3%9,2%
8,6%
14,9%
8,1%
7,7%
6,4% Arábia Saudita
Iraque
Emirados Árabes Unidos
Kuwait
Irã
Outros OPEP
ICDE
Outros Não-OPEP
Ex-União Soviética
Fonte: British Petroleum Statistical Review of World Energy 2001.
Vale destacar também o papel de liderança da Arábia Saudita. Assim,
nas crises de 1973 e 1979, atuou como regulador do mercado, sacrificando a
sua produção em escala maior do que a dos outros países da OPER Em 2000,
a Arábia Saudita tendo 25% das reservas mundiais de petróleo, o equivalente a
32% das reservas da OPEP, reforçou ainda mais sua posição e seu poder de
influenciar no mercado petrolífero.
Apesar da descoberta de novos campos e do crescimento da produção
mundial extra OPEP, a participação dos países membros da OPEP, nas
reservas de petróleo, é muito acentuada, evoluindo de um patamar entre 66 e
67% entre 1970 e 1985 para um valor entre 76 e 77% no período entre 1990 e
1997. Embora tenha ocorrido uma forte reavaliação das reservas dos paises
membros da OPEP nos anos 80, tal concentração mundial tem demonstrado
ser um fator chave de poder e controle sobre preços e produção presentes e
futuros. À primeira vista, analisando os dados de reservas atuais, a produção
seria suficiente para atender à demanda mundial por mais uns 40 anos
(Campbell e Laherrère, 1998).
A quantidade de óleo existente e extraível, num determinado campo,
será sempre uma estimativa, segundo certa função de distribuição de
probabilidades, abrangendo uma ampla escala de valores possíveis, desde uma
perspectiva mais conservadora (com 90% de probabilidade), a uma visão mais
otimista (com 10%). A divulgação do tamanho das reservas de um campo
muitas vezes está sujeita a uma lógica de mercado. Um número exagerado
pode ser um sinal suficiente, para elevar a cotação das ações da empresa
descobridora, e com direitos de exploração sobre o novo campo descoberto
(Hannesson, 1998).
Nos últimos anos, o fator mais importante a explicar a expansão das
reservas se deve às revisões das mesmas. Ao revisá-las cada qual no ano de
sua descoberta, conclui-se que o pico das descobertas mundiais de novos
campos teria ocorrido no início dos anos 60, caindo desde então, e tendendo a
zero em algum instante futuro.
O fato é que a maioria dos países não membros da OPEP, ao
trabalharem no limite de suas capacidades, já atingiram ou estão prestes a
atingir o pico de sua produção, a partir do qual passam a produzir cada vez
menos, a cada ano. Somente os paises produtores de petróleo do Oriente
Médio, ao controlarem deliberadamente sua produção e deterem a imensa
parte das reservas mundiais existentes, podem suprir a queda de produção do
resto do mundo nos próximos anos. É estimado que a produção mundial deve
atingir seu pico ainda na primeira década do século XXI, declinando
continuamente desde então (Campbell e Laherrère, 1998).
É interessante notar que, por mais divergentes que sejam as diversas
estimativas das reservas mundiais atuais e de projeções da demanda, todas
elas apontam para uma queda de produção mundial nos próximos 20 anos, na
melhor das hipóteses.
Como há sinais de que, até 2010, a produção dos paises produtores do
Oriente Médio comece a declinar, agora é o momento de planejar a transição,
para um mundo pós-petróleo ou de escassez da mais importante fonte
energética primária, que sustentou o crescimento das economias
industrializadas no século XX.
Qualquer que seja o ano em que ocorra o declínio da sua produção, o
fim, do petróleo barato reforça o debate em torno da busca de fontes
alternativas de energia, especialmente em segmentos da economia onde os
derivados de petróleo têm um mercado cativo, como acontece, por exemplo, no
setor de transportes (90%). A produção de combustíveis líquidos a partir do gás
natural, por exemplo, pode vir a ser uma solução possível de ser adotada em
larga escala para uso em veículos. Investimentos em programas de
conservação de energia e de incentivo ao uso de fontes renováveis devem ser
cada vez mais uma prioridade, e os paises que estiverem melhor preparados
para a transição gozarão de uma considerável vantagem comparativa em
relação aos demais.
Assim, entre todas as alternativas energéticas competitivas, a que
sobressai é a relativa a outro hidrocarboneto: o gás natural.
A distribuição mundial de reservas de gás natural, porém, também
mostra uma tendência de dependência mundial em relação à OPEP. Ademais
da ex-União Soviética, essas reservas também estão fortemente concentradas
nos países da OPEP.
Gráfico 2: Distribuição Mundial de Reservas de Gás Natural em 2000 em Trilhões de Metros Cúbicos
8,9%
35%
37,7%
18,4%
OCDE
Oriente Médio
Ex-União Soviética
Resto do Mundo
Fonte: British Petroleum Statistical Review of World Energy 2001
Observando o gráfico 2, vê-se que os países do Oriente Médio, em sua
maioria da OPEP, controlam 35% das reservas mundiais de gás natural,
apenas sendo ultrapassados pela Rússia junto com outros países da ex-União
Soviética. Dessa forma, a OPEP também possui uma grande parcela das
reservas mundiais de gás natural, demonstrando que a dependência futura
nesse mercado também deverá ocorrer.Portanto, tanto no mercado petrolífero
quanto no mercado de gás natural, existe uma grande possibilidade de
dependência futura em relação a OPEP.
III.3 - A Evolução da Produção
A produção de petróleo também é um assunto muito relevante na
indústria petrolífera mundial. Isso porque o produtor possui poder de influenciar
o mercado de acordo com a sua participação na produção total. Somando-se
ainda a alta inelasticidade da demanda por petróleo, a OPEP sempre teve esse
poder de controlar a sua produção, muitas vezes através de cotas de produção,
a fim de praticar preços que lhe interessasse.
Tabela 3: Produção de Petróleo em Milhões de Barris por dia e Respectiva Porcentagens (%) e dos Países da OPEP em Relação ao Total
Fonte: Monthly Energy Review (March 2000).
Tabela 4: Produção de Petroleo em Milhões de Barris por dia e
Respectivas Porcentagens (%) dos Países Extra OPEP em Relação ao Total
Fonte: Monthly Energy Review (March 2000).
Grã-Betanha % Estados
Unidos % México % Ex-União
Soviética %
Total Extra OPEP
% Total %
1960 - 0,00 7,04 33,54 0,27 1,29 2,91 13,86 12,29 58,55 20,99 100,00
1970 - 0,00 9,64 21,01 0,49 1,07 6,99 15,23 22,59 49,23 45,89 100,00
1973 - 0,00 9,21 16,54 0,47 0,84 8,32 14,94 25,05 44,99 55,68 100,00
1980 1,62 2,72 8,60 14,43 1,94 3,26 11,71 19,65 32,99 55,35 59,06 100,00
1986 2,54 4,52 8,68 15,44 2,44 4,34 11,90 21,16 37,95 67,49 56,23 100,00
1990 1,82 3,00 7,36 12,15 2,55 4,21 10,98 18,13 37,37 61,70 60,57 100,00
1995 2,49 3,99 6,56 10,52 2,62 4,20 6,00 9,63 36,33 58,29 62,33 100,00
1997 2,52 3,79 6,45 9,71 3,02 4,55 5,92 8,91 38,01 57,36 66,42 100,00
1999 2,69 4,10 5,93 9,03 2,91 4,43 6,07 9,24 38,02 57,90 65,66 100,00
Arábia Saudi-
ta % Irã %
Vene-zuela %
OPEP Outros %
Total OPEP % Total %
1960 1,31 6,24 1,07 5,10 2,85 13,58 3,47 16,53 8,70 41,45 20,99, 100,0
1970 3,80 8,28 3,83 8,35 3,71 8,08 11,96 26,06 23,30 50,77 45,89 100,0
1973 7,60 13,65 5,86 10,52 3,37 6,05 13,80 24,78 30,63 55,01 55,68 100,0
1980 9,90 16,61 1,66 2,79 2,17 3,64 12,88 21,61 26,61 44,65 59,60 100,0
1986 4,87 8,66 2,04 3,63 1,79 3,18 9,58 17,04 18,28 32,51 56,23 100,0
1990 6,41 10,58 3,09 5,10 2,14 3,53 11,56 19,09 23,20 38,30 60,57 100,0
1995 8,23 13,20 3,64 5,84 2,75 4,41 11,38 18,26 26,00 41,71 62,33 100,0
1997 8,56 12,89 3,66 5,51 3,32 5,00 12,78 19,24 28,32 42,64 66,42 100,0
1999 7,83 11,93 3,56 5,42 2,83 4,31 13,42 20,44 27,64 42,10 65,66 100,0
Verifica-se que, desde a sua criação, em 1960, a OPEP já possuía uma
parcela significativa da produção mundial de petróleo. Em 1960 ela já era de
41,45% do total, aumentando para 50,77%, em 1970, quando a organização
detinha mais da metade da produção mundial diária.
Em 1973, ano do primeiro choque do petróleo, a OPEP detinha 55% da
produção mundial e por isso as suas políticas foram decisivas para a elevação
do preço do barril, o que levou os países industrializados a uma profunda crise
e recessão econômica.
Já em 1980, ano posterior ao segundo choque do petróleo, a OPEP
detinha menos da metade do mercado, 44,65%. Isso se deveu principalmente
às descobertas de novas jazidas extra-OPEP, principalmente no Mar do Norte,
e ao aumento da produção em países como o México, os Estados Unidos e a
ex-União Soviética.
A produção no Mar do Norte (Grã-Bretanha), que se iniciou em 1974, já
era o equivalente a 2,72% em 1980, e chegou ao seu pico em 1986, onde foi de
4,52% do total. Em 1999, a sua participação na produção foi de 4,1%.
A produção nos Estados Unidos, que em 1960 era mais de 33% do total,
se reduziu a apenas 16,54%, em 1973, e a 14,43% em 1980. Essa tendência se
acentuou: em 1999 a sua produção foi de somente 9,03% do total.
Já a produção soviética é a mais significativa frente à produção total da
OPEP. Em 1960, era de 13,86% do total, em 1973 de 14,94% e em 1980 de
19,65%. Em 1986, quando o mercado era comprador, a produção soviética
equivalia a 21,16% do total. Entretanto, em função da crise que a região sofreu
durante toda a década de 90, a sua produção entrou em queda e, em 1999, o
nível produzido foi de apenas 9,24% do total.
A produção da OPEP, que cresceu desde 1960 até o choque de 1973,
onde ela começou a declinar, chegando em 1980 à parcela de 44,65% do total,
teve o seu pior desempenho na década de 80, quando ela chegou a responder
por apenas 32,51% da produção, em 1986. Desde 1990, com a descoberta de
novas jazidas, a OPEP vem novamente recuperando a sua participação. Em
1990 chegou a 38,30%, passando em 1999 a 42,1% do total.
Esses números refletem o futuro aumento e participação da OPEP na
produção mundial e, portanto, o aumento do seu poder de influenciar a
dinâmica do mercado petrolífero.
III.4 - A Evolução da Demanda
Outra variável muito importante a ser analisada é a evolução da
demanda por petróleo no mundo. A demanda é um fator decisivo, pois quanto
maior ela for, maior é a tendência de um aumento nos preços, o que se
verificou nos choques da década de 70, com uma intensa participação da
OPEP.
Tabela 5: Demanda de Petróleo dos Principais Países Extra OPEP em Milhões de Barris por dia e Respectivas Porcentagens (%) em relação ao total
Europa Ocidental %
Estados Unidos % Canadá % Japão %
1960 4,20 19,72 9,80 46,01 0,84 3,94 0,66 3,10 1970 12,40 26,49 14,70 31,40 1,52 3,25 3,82 8,16 1973 14,92 26,07 17,31 30,24 1,73 3,02 4,86 8,49 1980 13,63 21,61 17,06 37,05 1,87 2,96 4,96 7,86 1986 12,10 19,59 16,28 26,36 1,50 2,43 4,44 7,19 1990 12,63 19,14 17,00 25,77 1,69 2,56 5,14 7,79 1995 14,12 20,21 17,72 25,48 1,76 2,52 5,71 8,17 1997 14,41 19,72 18,62 26,04 1,84 2,52 5,71 7,81 2000 14,40 19,04 19,70 26,04 2,00 2,64 5,50 7,27
Coréia do Sul % China %
Ex União Soviética % Outros % Total %
1960 0,01 0,05 0,17 0,80 2,38 11,17 3,24 15,21 21,30 100,001970 0,20 0,43 0,62 1,32 5,31 11,34 8,24 17,60 46,81 100,001973 0,28 0,49 1,12 1,96 6,60 11,53 10,42 18,20 57,24 100,001980 0,54 0,86 1,77 2,81 9,00 14,27 14,24 22,58 63,07 100,001986 0,61 0,99 2,00 3,24 8,98 14,54 15,85 25,66 61,76 100,001990 1,03 1,56 1,34 2,03 8,39 12,72 18,76 28,43 65,98 100,001995 2,03 2,91 3,36 4,81 2,98 4,27 22,19 31,76 69,87 100,001997 2,39 3,27 3,92 5,36 2,56 3,50 23,64 32,34 73,09 100,002000 2,00 2,64 4,30 5,68 3,70 4,89 24,04 31,78 75,64 100,00
Fonte: International Energy Annual 2000.
Observa-se que os países da Europa Ocidental, mais industrializados,
tiveram seu pico na demanda em 1965, quando demandavam 30,9% do total,
continuando alto em 1970, com 26,5%, e em 1973, às vésperas do primeiro
choque, com 26%. Essa demanda européia vem em pequena queda desde
então, com uma taxa de crescimento anual próxima a 1%, muito menor que a
do período do pós-guerra e das décadas de 60 e 70, onde essa taxa era muito
maior. Isso se deveu a projetos de conservação, de racionalização de energia e
de investimentos em outras fontes, como a nuclear, a solar e a eólica.
Os Estados Unidos, país mais industrializado do mundo e maior
consumidor de petróleo, em 1960 demandava 46% do total produzido. Depois
dessa data, entrou em ligeira queda, como no período próximo ao choque de
1973, quando consumia pouco mais de 30% do total. Essa queda ocorreu até
os dias atuais, sendo que, em 2000, os Estados Unidos consumiram 26,1 % da
produção total de petróleo.
Assim como os Estados Unidos, o Canadá chegou ao pico de demanda
por petróleo em 1960, com 3,9%, entrando em queda, e, atualmente,
consumindo 2,6% do total de petróleo produzido no mundo.
Já o consumo da ex-União Soviética entrou em queda, em função da
forte crise que a região sofre desde a década de 90. Em 1960 consumiu 11,3%
do total, e, no ano 2000, menos de 5% do total de petróleo produzido.
As principais mudanças na demanda de petróleo ocorreram nos países
emergentes, ou em industrialização, como é o caso do Brasil, e em países
industrializados do Leste Asiático, como Japão, Coréia do Sul e China.
Em 1960, o Japão consumia apenas 3,3% do total produzido no mundo.
Antes do choque de 73 essa porcentagem já era de 8,6%, onde atingiu o seu
pico, e atualmente é de 7,3% do total. Já a Coréia do Sul demandava pouco
petróleo em 1960, em torno de 0% em termos relativos mundiais, chegando a
demandar 1% em 1986, 3,3%, em 1997, e, no ano 2000, demandou 2,6% do
total. A China consumiu 0,8%, em 1960, e depois disso só teve aumentos em
sua demanda. Em 1973, consumiu 2% do total, em 1986, 3,2%, em 1997, 5,4%
e, no ano 2000, consumiu 5,7% do total.
Já os países emergentes e os países subdesenvolvidos promoveram o
maior crescimento na demanda mundial de petróleo. Eles todos juntos, em
1960, consumiram menos de 15% do total. Essa demanda entrou em alto
crescimento, atingindo em 2000 a marca dos 31,7% do total produzido.
Portanto, o crescimento da demanda mundial de petróleo, nas últimas
três décadas, deve ser atribuído, principalmente, ao crescimento da demanda
nos países do Leste Asiático e nos países emergentes e em industrialização.
Os países do Leste Asiático são dotados de muito poucos recursos de
hidrocarbonetos e tendem a se tornar crescentemente dependentes de gás,
petróleo e outros derivados oriundos dos países da OPEP. Já os países
emergentes estão demandando muito petróleo devido ao aumento de seus
sistemas produtivos, já que ainda estão em industrialização.
Essa demanda mundial crescente se deve, primeiramente, à alta taxa de
crescimento da demanda de petróleo nos países emergentes e do Leste
Asiático e, em menores proporções, às demandas nos países tradicionalmente
consumidores, os países da Europa Ocidental e da América do Norte. Essa
dinâmica da demanda tende a não se alterar substancialmente num futuro
previsível como mostra a tabela 6:
Tabela 6: Participação em Porcentagem (%) das Projeções de Demanda dos Principais Consumidores de Petróleo de 2005 a 2020
Europa Ocidental
Estados Unidos
Canadá Japão Coréia do Sul
China Ex Uniao Soviética
Outros Total Mundial
2005 17,39 24,91 2,47 6,70 2,94 6,23 5,76 33,61 100,00 2010 15,79 23,89 2,21 6,11 2,95 7,05 5,89 36,11 100,00 2015 14,22 22,73 2,06 5,52 2,90 7,95 6,45 38,17 100,00 2020 12,88 21,57 1,84 4,93 2,76 8,70 6,52 40,80 100,00
Fonte: International Energy Annual 2000.
Considerando as previsões acima, de 2005 a 2020, observa-se que o
maior crescimento da demanda deve continuar a ocorrer nos países
emergentes ou em industrialização. Porém, a taxa média de crescimento anual
da demanda total de petróleo, que nas décadas de 60 e 70 se situava entre 6
e 8% ao ano, tendera a decair no horizonte das duas próximas décadas para
ficar em torno de 2,5% ao ano.
Enfim, apesar do alarme equivocado de escassez iminente do produto,
desenhada por diagnósticos apressados, no clima de tensão dos dois choques
do petróleo da década de 70, existe ainda a garantia de abastecimento mundial
tranqüilo até o ano de 2050, nos atuas níveis de produção e demanda.
CONCLUSÃO
Este trabalho objetivou mostrar a importância da OPEP desde a
criação, em 1960, até os dias atuais, com algumas previsões para um futuro
próximo. Dessa forma, utilizou-se a teoria da renda da terra, de David
Ricardo, como instrumental de análise, para explicar o conflito pela
apropriação da renda petrolífera, entre os países exportadores e as
companhias de petróleo.
Ao examinar a evolução da estrutura do mercado petrolífero mundial
até os dias atuais, concluiu-se que a OPEP passou por momentos de
estratégia ofensiva, com alta influência nesse mercado, e outros de
estratégia defensiva, a fim de reconquistar mercado.
O cenário atual, porém, aponta para um progressivo aumento da
influência da organização no mercado petrolífero e na economia mundial. Os
fatores chaves dessa tendência obedecem ao aumento relativo da
concentração das reservas de petróleo e de gás natural nas mãos da OPEP,
ao crescimento da demanda mundial, mesmo que numa taxa anual menor
que a das décadas de 60 e 70, e à queda progressiva de produção em
países extra OPEP nos próximos anos, já que esses estão atingindo o ápice
de suas produções.
No momento a OPEP reduz ou aumenta a sua oferta de petróleo a fim
de manter o preço do barril no patamar de seu interesse,. Isso ocorre devido
à observação prática de que mudanças na oferta de longo prazo afetam o
preço no curto prazo.
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