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EducMédSatud, Vol. 16, No. 4 (1982) O papel da universidade na formaçao de recursos humanos para a Década Internacional da Água Potável e do Saneamento JURANDYR POVINELLI 1 INTRODUÁAO O saneamento básico no Brasil, n5o obstante esforços esporádicos no século passado e início desde século, teve seu primeiro grande desenvolvi- mento por volta de 1940, quando se criou e se implantou a que é hoje a Fundaaáo Serviço Especial de Saúde Pública (FSESP), mantida especial- mente pela Organizaaáo Mundial da Saúde e pelo Governo brasileiro. Con esse programa, pode-se dizer que teve início também o primeiro plano de treinamento de pessoal, desenvolvido junto a universidades estrangeiras, principalmente nos Estados Unidos. Com isso, profissionais brasileiros foram treinados para, em seu retorno, atuarjunto ás regioes de atividade da FSESP, especialmente aquelas menos desenvolvidas e carentes de serviQos na área do abastecimento de água e do saneamento. A essa iniciativa, seguiram-se outras nas décadas seguintes, merecendo destaque dentre elas os programas da USAID e o PLANASA. A sustentaçáo desses programas exigia a presença de pessoal especiali- zado, fato que propiciou o início da formaçao de recursos humanos na universidade brasileira. Assim, em 1949, o entao Instituto de Higiene de Sáo Paulo iniciava a sua tarefa de prover recursos humanos para a área do saneamento. Mais tarde, incorporado á Universidade de Sáo Paulo (USP), o Instituto passou a formar engenheiros sanitaristas, como vem fazendo até hoje através da Faculdade de Saúde Pública. Seguiu-se a criaçao do curso da Escola Nacional de Saúde Pública, mantida pelo Ministério da Saúde no Rio de Janeiro. IProfessor da Escola de Engenharia de Sáo Carlos, Universidade de Sáo Paulo, Brasil; Coorde- nador do Curso de Engenharia Sanitária da Escola de Engenharia Mauá, Sao Paulo, Brasil. 484

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EducMédSatud, Vol. 16, No. 4 (1982)

O papel da universidade na formaçaode recursos humanos para a DécadaInternacional da Água Potável edo Saneamento

JURANDYR POVINELLI1

INTRODUÁAO

O saneamento básico no Brasil, n5o obstante esforços esporádicos noséculo passado e início desde século, teve seu primeiro grande desenvolvi-mento por volta de 1940, quando se criou e se implantou a que é hoje aFundaaáo Serviço Especial de Saúde Pública (FSESP), mantida especial-mente pela Organizaaáo Mundial da Saúde e pelo Governo brasileiro.

Con esse programa, pode-se dizer que teve início também o primeiroplano de treinamento de pessoal, desenvolvido junto a universidadesestrangeiras, principalmente nos Estados Unidos. Com isso, profissionaisbrasileiros foram treinados para, em seu retorno, atuarjunto ás regioes deatividade da FSESP, especialmente aquelas menos desenvolvidas ecarentes de serviQos na área do abastecimento de água e do saneamento.

A essa iniciativa, seguiram-se outras nas décadas seguintes, merecendodestaque dentre elas os programas da USAID e o PLANASA.

A sustentaçáo desses programas exigia a presença de pessoal especiali-zado, fato que propiciou o início da formaçao de recursos humanos nauniversidade brasileira.

Assim, já em 1949, o entao Instituto de Higiene de Sáo Paulo iniciava asua tarefa de prover recursos humanos para a área do saneamento. Maistarde, incorporado á Universidade de Sáo Paulo (USP), o Institutopassou a formar engenheiros sanitaristas, como vem fazendo até hojeatravés da Faculdade de Saúde Pública.

Seguiu-se a criaçao do curso da Escola Nacional de Saúde Pública,mantida pelo Ministério da Saúde no Rio de Janeiro.

IProfessor da Escola de Engenharia de Sáo Carlos, Universidade de Sáo Paulo, Brasil; Coorde-nador do Curso de Engenharia Sanitária da Escola de Engenharia Mauá, Sao Paulo, Brasil.

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Ambos os cursos destinam-se, na realidades, á especializaaáo na área,podendo, entretanto, por complementacao através de programaspróprios, levar o candidato ao Mestrado ou Doutorado.

No ámbito dos cursos de graduaçao em engenharia, até 1953, o ensinode Saneamento se resumia, na maioria das escolas, a uma únicadisciplina (Higiene e Saneamento), com pouca influencia na formaçao doprofissional específico para a área.

Algumas escolas, a partir dessa data, introduziram "opoSes" no cursode Engenharia Civil, correspondentes a conjuntos de disciplinas de cará-ter profissional específico, a serem escolhidas como caráter de certa espe-cializaçáo em setores específicos, sendo uma delas voltada para o Sanea-mento.

Estas opç5es foram ministradas até 1976, quando se reformularam oscurrículos mínimos dos cursos de Engenharia no país. Foram sem dúvidaimportantes sementes para a constituicao de grupos interessados na área,que mais tarde chegaram mesmo a transformar-se em cursos de pós-graduaáao em algumas escolas, como a de Engenharia da USP em SaoCarlos e a Politécnica da Universidade de Sáo Paulo.

Fato interesante, que merece destaque, foi o de ter-se implantado após-graduaaáo nesta área no Brasil, antes mesmo do curso de graduaçao.Assim, surgiram vários centros formadores de mestres e doutores, queserviriam mais tarde como importante ponto de apoio ao programa de im-_plantaaáo dos cursos de graduaáao em Engenharia Sanitária no país.

Há ainda a ressaltar vários cursos de especializaçáo, promovidos porinstituio5es diversas, dirigidos para a área de saneamento, que nasúltimas décadas tim sido e continuam a ser oferecidos.

A partir de 1977, com o estudo e implantaçao do seu currículo mínimopelo Conselho Federal de Educaçao (CFE), a Engenharia Sanitária foioficialmente estabelecida no Brasil como curso no nível de graduaaáo.

Estudos realizados pelo Ministério da Educaçao e Cultura (MEC) noinício da década de 1970 mostraram também a necessidade de dar enfaseao "fazer" na formaaáo do profissional, para atender ás peculiaridadesdo mercado de trabalho. A universidade, atendendo a esse chamado,passou entáo a formar o tecnólogo ou técnico de nível superior. Na áreado saneamento, passaram entao a ser formados tecnólogos em Saneamen-to Básico e tecnólogos em Saneamento Ambiental.

Em resumo, ve-se que a universidade brasileira forma hoje os seguintesprofessionais para a área sanitária: Doutores e Mestres a nível de pós-graduaaáo, engenheiros sanitaristas e tecnólogos a nível de graduaçao.

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SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO

A estrutura e o funcionamento do sistema educacional brasileiro (1)obedecem a legislaçiro relativamente recente, em que o ensino, paraafeitos administrativos, foi organizado na forma de sistemas-o sistemafederal e os sistemas estaduais.

O sistema federal compreende todas as Universidades Federais, asescolas técnicas federais, as escolas de qualquer grau que funcionem nosterritórios e todas as escolas particulares do país. Cabe ao MEC manternesse sistema todas as unidades escolares financiadas pelo orçamento daUniao, bem como inspecionar o funcionamento destas e das escolas priva-das do sistema, dando-lhes, quando necessário, assistencia téicnica efinanceira. O órgáo normativo do sistema federal é o Conselho Federal deEducaçao (CFE), que pode, em certos casos, decidir quanto aos ;sistemasestaduais.

Os sistemas estaduais comprendem as escolas superiores mantidaspelos cofres públicos estaduais e municipais, assim como todas as de 1o e29 graus, sejam oficiais ou particulares. Cabe á Secretaria de Educacao afiscalizaáao e o estabelecimento de normas de funcionamento dessasunidades. O órgáo normativo desses sistemas é o Conselho Estadual deEducaaáo respectivo.

O sistema educacional brasileiro abrange os vários graus de ensino,distribuídos pelos sistemas federal e estaduais, com os respectivos órgáosnormativos, encontrando-se cada grau, por sua vez, sujeito preponderan-temente á jurisdiáao específica de um desses órgáos. De maneiraresumida, poder-se-iam distribuir as áreas de competencia organizativade cada grau de ensino da seguinte forma:

Ensino de 1? e 2° graus. O currículo é fixado pelo CFE, podendo ossistemas estaduais fixar outras matérias, da chamada Parte Diversificada,com que as escolas complementarao o currículo. A autorizaaáo de fun-cionamento, a inspeaáo e o reconhecimento sao feitos pelos órgáos dosistema estadual:

Ensino Superior. Cabe ao CFE a fixaáao de currículos mínirnos dosvários cursos, a aprovaçao dos planos de curso para os que nro temcurrículo mínimo (p. ex., tecnólogos), a autorizaaáo e o reconhecimentodos cursos mantidos pela Uniáo, pelos particulares e pelos estados emunicipios, com exce!;áo de Sáo Paulo e Rio de Janeiro:

Pos-graduaçao. A pós-graduaaáo no senso estrito deve ser credenciadapelo CFE para ter validade nacional, devendo obedecer ás normas gerais

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estabelecidas para a caracterizaçao dos seus dois níveis-o Mestrado e oDoutorado.

Por este resumo, observa-se que a fixaçao do currículo mínimo e aaprovaaáo do currículo pleno de cada Universidade, no nivel de gradua-çao, cabe ao CFE, de cuja aprovaçáo depende, portanto, qualquer altera-

aáo neste plano curricular.A nível de pós-graduaaáo, nao existindo currículo mínimo, as universi-

dades-por motivo análogo ao anterior-apresentam ao CFE, porocasiáo do credenciamento, o elenco de disciplinas que ministram.

FORMAÁAO DE PROFISSIONAIS PELAS UNIVERSIDADES

Para dar suporte aos programas de saneamento, a universidade temcondio5es de formar profissionais nos níveis de graduaçao e pós-gradua-çao, dependendo exclusivamente das necessidades que estes programasmostrarem. Isso pode ser evidenciado na estrutura flexível do currículomínimo do curso de Engenharia, nas possibilidades abertas pela legis-laçao que normaliza a formaçao de tecnólogos e na organizaçao dada após-graduaQao.

Concepcáo do ensino de engenharia ao nivel de graduacao

O novo currículo mínimo do curso de Engenharia surgiu de um estudode ámbito nacional, efetuado desde 1972 pela Comissáo de Especialistasde Ensino de Engenharia do MEC. Posteriormente, foi analisado o apro-vado pelo CFE, que o instituiu para todo o país através da Resoluáao48/76.

De acordo com essa Resoluaáo, os antigos cursos de Engenharia, nasvárias áreas, deram origem ao curso de Engenharia, que unificou de for-ma racional a estrutura do seu ensino, instituindo várias habilitaç5es emsubstituiçao aos antigos cursos.

Para efeito de estruturaaáo, as matérias de novo currículo mínimo (naoconfundí-las com disciplinas) foram dispostas em: a) matérias de for-macao básica; b) matérias de formaaáo geral; e c) matérias de formaáaoprofissional geral e específica, características de cada área.

O curso de Engenharia foi dividido em seis grandes áreas, a saber:Civil, Elétrica, Mecánica, Metalúrgica, Minas e Química.

Cada área tem seu elenco próprio de matérias de formaçao profissionalgeral.

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As matérias de formaçao básica e de formaçao geral passaram a sercomuns a todas as áreas, estabelecendo-se assim uma estrutura unificadapara o curso de Engenharia.

A carga horária mínima foi fixada em 3600 horas, nao devendo nela serincluídas as cargas das matérias exigidas por legislaaáo específica, como éo caso do Estudo de Problemas Brasileiros, da Educaaáo Física e dematérias exigidas pelo 19 ciclo das universidades.

A integralizaaáo das 3600 horas deve ser efetivada pelas matérias deformacáo básica, geral e profissional próprias de cada área.

A Resoluçao 48/76 explicita que uma matéria pode ser coberta por umelenco de disciplinas, por uma só disciplina ou mesmo por um conjuntode disciplinas que cubram também outras matérias.

O que foi comentado anteriormente pode ser expresso pela Figura 1.Uma área é sempre caracterizadas por seu elenco de matérias de for-

maaáo profissional geral e define certo universo de conhecimentos. Esseuniverso pode ser am.plo a ponto de permitir a formaaáo de mais de umprofissional.dentro das mesma área. Desse fato surge o conceito de habili-taçao.

Caracteriza-se uma habilitaçáo pelas matérias de formaçao profissionalgeral e específica. Estas podem-se constituir num desdobramento dasmatérias de formaaáo profissional geral (listadas e apresentadas com asrespectivas ementas na Resoluiao 48/76) ou ser caracterizadas especial-

Figure 1. DistribuiCúo das matérias do novo currculo mínimo de Engenharia.

\,/- MATÉRIAS DE FORMAÇAO PROFISSIONAL(PRÓPRIAS DE CADA AREA)

O( IOMATÉRIAS DE FORMAÇAO GERAL< c /C (COMUNS A TODAS AS HABILITAÇ5ES)

MATÉRIAS DE FORMAQAO BASICA(COMUNS A TODAS AS HABILITAÇOES)

Papel da universidade naformacao de recursos humanos / 489

mente para a habilitaaáo específica. Como exemplo vamos citar a área daEngenharia Civil.

Atualmente, esta área apresenta as habilitao5es de Engenharia Civil ede Engenharia Sanitária. O elenco de matérias de formaçao profissionalespecífica da primeira se constitui num desdobramento das de formaáaoprofissional geral; o da segunda, de matérias de formaçao profissionalespecífica especialmente caracterizadas pela Resoluaáo 2/77 do CFE, asaber: Qualidade da Água, do Ar e do Solo; Tratamento de Águas deAbastecimento e Águas Residuárias; Recursos Hídricos; e SaneamentoAmbiental e Ecologia Aplicada.

Convém mais uma vez ressaltar que o elenco das matérias de formaáaoprofissional geral permanece praticamente o mesmo para as duas habili-tao5es.

As áreas assim implantadas possibilitam uma grande flexibilidade parao surgimento das habilitao~es, que constitui um dos pontos altos do novocurrículo mínimo. O currículo permite ainda que, uma vez atendido omínimo de conteúdo estabelecido nas várias matérias, sua integralizaáaose faca por disciplinas de complementaçáo, que podem por sua vez en-fatizar determinada especializaçáo (sem com isso admitir opçoes,modalidades, etc., como antes). Essa conceituaaáo permitiu a adequadaregionalizaçáo dos currículos plenos, possibilitando que um curso implan-tado em determinada localidade ou regiáo atenda as peculiaridades domercado de trabalho ali existentes. Assim, por exemplo, a habilitaçaoEngenharia Sanitária da Escola de Engenharia Mauá (EEM) dá enfase asoluçao dos problemas de poluiçao, tratamento e controle de poluiçao,decorrentes de complexo industrial do ABCD, onde a EEM também seencontra localizada. Com essa flexibilidade, as universidades tem amplaliberdade em propor seus currículos plenos, atendendo assim aos anseiosde toda a coletividade.

A implantaCáo da habilitaCao Engenharia Sanitária

A implantaçao da habilitaçao Engenharia Sanitária (3), como visto, foicaracterizada por um elenco de matérias de formaçáo profissional especí-fica, ficando também estabelecida a sua origem na área civil do curso deEngenheria.

Isso nao veda em absoluto a possibilidade de que no futuro, na medidaem que o mercado de trabalho assim o exigir, esta habilitaaáo possatambém originar-se em outras áreas, como, por exemplo, a da Química.

Dentro das condio5es atuais, a flexibilidade do currículo mínimo possi-

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bilitou o planejamento da implantaaáo de cursos em vários pontos dopaís, atendendo ás reais necessidade locais e dando a devida enfase a cadacurso.

Na Figura 2, estao indicados os seis cursos de graduacao em Engenha-ria Sanitária implantados no país até agora.

Formacao de tecnólogos em Saneamento Básico

Este tipo de profissional está sendo formado na Faculdade de Engenha-ria de Limeira, da Universidade Estadual de Campinas (4).

Trata-se de uma carreira de curta duraaáo, preconizada pela Lei5540/68, que previu, em seus Artigos 18 a 23, a organizaáao de tais cursospara fazer face ás peculiaridades do mercado de trabalho regional.

Nao havendo currículo mínimo para os cursos dessa natureza, estabe-leceu o CFE que o respectivo plano de curso deverá ser submetido a apre-ciaçao prévia para possibilitar o seu reconhecimento.

Figure 2. Cursos de graduaffo ern Engenharia Sanita'ria, 1982.

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O profissional assim formado, de conformidade com o parecer queaprovou o curso, deverá atuar "na supervisáo da construcáo de redes deabastecimento de água, sistemas de coleta e disposiaáo de esgotos, siste-mas de drenagem de águas pluviais, etc." Receberá também "formaáaopara atuar em estaç5es de tratamento de águas e esgotos, na construáaodas partes hidráulicas e na operaçao posterior, bem como na prática dassoluçoes propostas ou que venham a ser propostas para os problemasdecorrentes da poluiaáo".

E, como se pode notar, uma excelente abertura para se formar um pro-fissional que atenda a demanda específica do mercado de trabalho.

A pós-graduaQáo em Saneamento

Conforme indica a Figura 3, os cursos de pós-graduaaáo da área sanitá-ria concentram-se na regiáo Sul do País, havendo apenas um na regiaoNordeste.

Sao cursos que surgiram através de grupos que se fortaleceram em tor-no de cursos de Engenharia Civil mais tradicionais.

A característica principal desses grupos é a de se dedicarem a pesquisano campo das águas de abastecimento e das águas residuárias. No entan-to já despontam alguns grupos, como o Centro de Recursos Hídricos eEcologia Aplicada de Escola de Engenharia de Sao Carlos, que se vemdedicando ao estudo de outros problemas especialmente ligados aosaneamento ambiental.

A produtividade desses centros pode ser estimada em 50 professionaisanuais. Tendo em vista o seu alto nível de treinamento, constituem-seeles em excelente apoio ao programa de recursos humanos para a Década.

PLANEJAMENTO PARA A FORMACAO DE PROFISSIONAIS

É norma vigente no país, para a autorizaaáo de cursos, que a universi-dade, ao propor sua criaçao, demonstre a necessidade do profissional naregiáo onde atua. Embora se trate de exigencia legal, a falta de dados con-fiáveis e de um melhor planejamento do desenvolvimento por parte dosórgáos governamentais muitas vezes torna essas previs5es discrepantes,gerando situao5es conflitantes entre a demanda e a oferta.

Para a implantaçao dos cursos de Engenharia Sanitária no nível de gra-

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Figura 3. Cursos de pós graduaçao em Engenharia Sanitária, 1982.

duaaáo, houve a preocupaaáo de formar um profissional que pudesse serabsorvido pelo mercado de trabalho. Dentre os documentos existentesque mostravam a necessidade do engenheiro sanitarista no nível degraduaçao, destaca-se, por exemplo, o Relatório do VIII Seminário deDocentes de Engenharia Sanitária (5), realizado no Rio de Janeiro, em1973, onde se encontram dados de um levantamento de recursos humanosnecessários para o desenvolvimento do PLANASA. Nesse documento,pode-se observar que se previa a absorçao de 6.000 engenheiros (de todasas especialidades), destacando-se ainda que se deveria enfatizar e estimu-lar a formaaáo da maior porcentagem possível de engenheiros sanita-ristas.

Os estudos efetuados pelo MEC mostraram a necessidade de criar ahabilitaaáo Engenharia Sanitária para satisfazer o perfil da demanda exis-tente. A implantaçáo dos cursos foi assim efetivada dentro de um plane-jamento que evitou a. rápida saturaQao do mercado de trabalho e que

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visou a formaçáo de um profissional que viesse atender aos interesses decada regiáo. Hoje, nos seis cursos implantados no país, cada um com suaenfase específica, sáo oferecidas apenas 325 vagas.

Uma das condio5es para aprovaçao do curso proposto por uma univer-sidade seria a manifestaçao expressa de interesse por parte de empresasligadas ao setor, com vistas ás suas próprias atividades.

Esse mecanismo pareceu importante para a formaaáo de uma quan-tidade satisfatória de profissionais que, embora com base científica sólida,fossem também adequados ás necessidades das empresas.

A PESQUISA: FATOR DE DESENVOLVIMENTO

A pesquisa é, sem dúvida, um dos principais fatores de desenvolvimen-to tecnológico e de aprimoramento de recursos humanos. A próprialegisla¢ao de ensino em vigor no país fala, em um de seus artigos, sobre aindissociabilidade do ensino e da pesquisa.

O desenvolvimento de pesquisas junto as universidades possibilitou oaprimoramento de técnicas empregadas em sistemas de saneamento e aimplantaçao de laboratórios até entáo inexistentes, oferecendo assimmelhores condiçoes de treinamento do pessoal.

Essas aç5es de pesquisa deveriam ser estimuladas, incentivando gruposemergentes ligados á formaçao de recursos humanos e dando atençaoprincipalmente áquelas que busquem soluçoes economicas para os pro-blemas de saneamento das pequenas comunidades, sobretudo as situadasna zona rural e na periferia das grandes cidades.

Os resultados desses trabalhos viriam, por certo, estimular a atualiza-Qao dos conhecimentos através da revisáo dos programas de ensino, dacriaaáo de um mecanismo de reciclagem de profissionais ligados ás em-presas e do estabelecimento de uma política de educaaáo continuada.

A pesquisa junto aos órgaos tomadores de máo-de-obra poderiafornecer dados sobre os profissionais adequados as suas necessidades,possibilitando com isso uma revisáo do que se vem fazendo, e formandoassim profissionais com sólido conhecimento básico, aliado a um preparoespecífico para atuar em tais empresas.

O DESEMPENHO DAS UNIVERSIDADES

Sofre a universidade, em geral, da burocracia reinante, da políticasalarial implantada e da falta de recursos financeiros suficientes ao seu

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desenvolvimento. Esses fatos vem ocasionando a evasáo de pessoal capa-citado para outros setores privados e a falta de materiais, equiparnentos einstalaçoes para pesquisa, impossibilitando assim que ela tenha ummelhor desempenho.

Torna-se cada vez mais indispensável o entrosamento da universidadecom outros órgaos públicos e privados, principalmente com as empresas eindústrias, visando a colaboraçao na soluaáo de seus problemas e contan-do também com a sua ajuda no financiamento de pesquisas e na conces-sao de estágios e bolsas de estudos.

No Brasil, organismos como o BNH (Banco Nacional da Habitagao), aSEMA (Secretaria Especial do Meio Ambiente) e as CompanhiasEstaduais de Saneamento deveriam ter melhor relaaáo com as universida-des, com o que se poderia dispor de um enorme potencial para a formaaáode seus recursos humanos.

PROPOSICOES

Com vistas para urna melhor política de desenvolvimento de recursoshumanos, seria oportuno propor as seguintes ao5es:

a) estabelecimento de convenios entre as universidades e os órgaos públicos eprivados ligados ao setor, com a alocaçáo de recursos financeiros específicos paradesenvolvimento de pesquisas, formaçáo de pessoal e reciclagem do pessoal;

b) entrosamento entre os órgaos públicos ligados ao setor, como o BNH, aSEMA, as Secretarias, os Ministérios e as Universidades;

c) desburocratizaaáo das universidades, removendo obstáculos políticos, ad-ministrativos e financeiros; e

d) cooperaçao das universidades com as indústrias, visando o desenvolvimen-to de materiais e equipamentos que permitissem soluç5es de baixo custo.

RESUMO

O presente trabalho mostra a evoluaáo do ensino da Engenharia Sani-tária no Brasil e os diferentes tipos de profissionais formados pela univer-sidade: mestres e doutores no ámbito da pós-graduaaáo, engenheirossanitaristas e tecnólogos no nível da graduaçao.

Apresentam-se detalhes do sistema educacional brasileiro, mostrandoas possibilidades de reformulaaáo dos programas de ensino.

Papel da universidade na formaVúo de recursos humanos / 495

É dada enfase especial ao que se vem fazendo nas universidades naárea de recursos humanos, destacando-se o ensino de Engenharia, e emespecial a Engenharia Sanitária. Analisando a da flexibilidade curriculardada por Resoluçáo do Conselho Federal de Educaaáo, o autor assimalaas enfases curriculares que possibilitam a formacáo profissional para aten-dimento de necessidades específicas das diversas regioes do país.

Sao também conceituados os cursos de curta duraQao e destacadosentre eles os que forman o tecnólogo em saneamento básico.

A importancia do planejamento para a formaiáo de profissionais emestreita colaboraçao com os órgáos tomadores de máo-de-obra é ressalta-da, através da experiencia brasileira na formaaáo de engenheiros sanita-ristas.

A importancia da pesquisa é igualmente acentuada, destacando-se oseu valor no desenvolvimento de recursos humanos e no estudo desoluçoes para os problemas do setor.

Sao apresentadas ao final algumas proposio5es visando adequar a uni-versidade aos órgáos ligados ao setor, com vistas ao desenvolvimento derecursos humanos para a Década Internacional do Abastecimento deAgua e do Saneamento.

REFERENCIAS

(1) SEMA. Secretaria Especial do Meio Ambiente. Educaçfo Ambiental. Brasflia, 1977(38 pg.).

(2) Povinelli, J. O Currículo Mínimo e as Habilitaç5es do Curso de Engenharia, Mauáem Revista, Ano I-No. 2, setembro de 1981.

(3) Ministério da Educaçao e Cultura. "Curso de Engenharia-Autorizaçao, Reconhe-cimento e Funcionamento," Brasflia, setembro de 1977 (268 pg.).

(4) Vieira, R.C.C. Evoluaáo do Ensino da Engenharia Sanitária no País. Trabalhoapresentado no IX Seminário de Docentes de Engenharia Sanitária, Rio de Janeiro, julhode 1976 (13 pg.).

(5) VIII Seminário de Docentes de Engenharia Sanitária. Relatório e Conclusaes, Rio deJaneiro, 3 a 6 setembro de 1973 (11 pg.).

PAPEL DE LA UNIVERSIDAD EN LA FORMACION DE RECURSOSDE PERSONAL PARA EL DECENIO INTERNACIONAL DEL AGUAPOTABLE Y DEL SANEAMIENTO AMBIENTAL (Resumen)

En este trabajo se expone la evolución de las enseñanzas de ingeniería sanitariaen el Brasil y se indican los distintos tipos de profesionales formados en la Univer-

496 / Educación médica y salud * Vol. 16, No. 4 (1982)

sidad: especialistas y doctores a nivel de posgrado, e ingenieros sanitarios y técni-

cos a nivel de grado.Se presentan detalles sobre el sistema educativo brasileño, con indicación de

las posibilidades de reformular los programas de enseñanza.Se hace hincapié especial en la labor que realizan las universidades en lo que

respecta a formación de recursos humanos, se destacan las enseñanzas de inge-niería (en particular la sanitaria) y se analiza la flexibilidad imprimida a losplanes de estudios por la resolución del Consejo Federal de Educación. El autorindica las diversas orientaciones de dichos planes, que permiten formar profesio-nales para atender las necesidades específicas de las distintas regiones del país.

Otro aspecto interesante son los cursillos, en particular los destinados a forma-ción de técnicos de saneamiento básico.

La experiencia de Brasil en la formación de ingenieros sanitarios pone derelieve la importancia que tiene la estrecha colaboración con las institucionesempleadoras en la elaboración de planes de formación de personal profesional.

No se olvida el importante papel que tiene la investigación para el desarrollo derecursos humanos y para la solución de los problemas del sector.

Por último, se formulan algunas propuestas de coordinación entre la universi-

dad y los organismos del sector, con vistas a la formación del personal necesariopara el Decenio Internacional del Agua Potable y del Saneamiento Ambiental.

THE ROLE OF THE UNIVERSITY IN MANPOWER DEVELOPMENTFOR THE INTERNATIONAL DRINKING WATER SUPPLYAND SANITATION I)ECADE (Summary)

This paper traces the development of the teaching of sanitary engineering inBrazil and describes the different types of professionals turned out by universi-ties: holders of master's degrees and doctors at the post-graduate level, andsanitary engineers and technicians holding "graduaaáo" degrees (comparable tothe bachelor's degree in the US).

Details are supplied on the Brazilian education system, and possibilities for therevamping of programs of instruction are indicated.

Special attention is given to the production of manpower in the universities,notably in the area of engineering, and of sanitary engineering in particular. Theauthor dwells on the curricular flexibility introduced by a resolution of theFederal Education Council and cites the variety of curricular emphases, whichmake it possible to train professionals to meet specific needs in differenl: parts ofthe country.

There is also an assessment of short courses, especially of those for the train-ing of basic sanitation technicians.

The importance of planning professional instruction in close collaboration with

Papel da universidade na formacáo de recursos humanos / 497

employers is illustrated through the Brazilian experience in the training ofsanitary engineers.

Also underscored is the importance of research, particularly for manpower

development and in the quest for solutions to the problems of the sector.The paper closes with a number of proposals for adjusting the university to the

establishments operating in the sector with a view to manpower development forthe International Drinking Water Supply and Sanitation Decade.

LE ROLE DE L'UNIVERSITÉ DANS LE DÉVELOPPEMENT DESRESSOURCES HUMAINES POUR LA DÉCENNIE INTERNATIONALEDE L'EAU POTABLE ET DE L'ASSAINISSEMENT (Résumé)

Cette étude fait le bilan de l'évolution de l'enseignement du génie sanitaire auBrésil et décrit les différents types de spécialistes formés par les universités: titu-laires de maitrise et de doctorat de troisieme cycle, ingénieurs et techniciens sani-taires détenant des diplo6mes comparables á la licence.

Des renseignements sont fournis sur le systéme d'enseignement au Brésil, etdes possibilités d'améliorer les programmes d'asseignement sont mis en lumiére.

Une attention particuliere est accordée á la formation de personnel dans lesuniversités, notamment dans les domaines de l'ingénierie, et en particulier del'engénierie sanitaire. L'auteur met l'accent sur la souplesse des programmes ap-portée par une résolution du Conseil fédéral de l'éducation, et y cite la diversitédes programmes qui permet de former des spécialistes pour répondre aux besoinsspécifiques des différentes régions du pays.

Cette étude comprend également une évaluation des stages de courte durée, eten particulier de ceux consacrés a la formation de techniciens en assainissementde base.

La nécessité de planifier l'enseignement professionnel en étroite collaborationavec les employeurs est illustrée par l'expérience brésilienne de la formation d'in-génieurs sanitaires.

Cette étude souligne également l'importance de la recherche, notamment en cequi concerne le perfectionnement de la main-d'oeuvre et la recherche de solu-tions aux problemes du secteur.

Cette étude se termine par un certain nombre de propositions en vue d'adapterl'université aux établissements fonctionnant dans ce secteur, conformément ál'objectif de perfectionnement de la main-d'oeuvre de la décennie internationalede l'eau potable et de l'assainissement.