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O PAPEL DO PEDAGOGO COMO MEDIADOR DO TRABALHO PEDAGÓGICO NA

EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Autora: Valdete Maria Alves Bormann1

Orientadora: Maria Aparecida Zanetti2

Resumo

O presente artigo tem por objetivo refletir sobre o reconhecimento do trabalho

do pedagogo e seu papel na organização do trabalho pedagógico na escola

pública, na modalidade de Educação de Jovens e Adultos, tendo como

referência os documentos produzidos pela Coordenação de Gestão Escolar –

CGE, as normatizações inerentes a este profissional e o aprofundamento

teórico das concepções que embasam a organização do trabalho pedagógico

na escola. Propõe estabelecer um diálogo entre a teoria e a prática do papel do

pedagogo nesta modalidade na (re)construção do projeto político pedagógico,

refletindo sobre o currículo, a gestão democrática, a formação continuada e os

sujeitos da educação de jovens e adultos. Busca relacionar o planejamento das

ações da escola com o papel do pedagogo como um dos mediadores do

trabalho coletivo, tendo em vista a necessidade de uma educação diferenciada

que atenda a diversidade dos educandos jovens, adultos e idosos

trabalhadores.

Palavras-chave: pedagogo; organização do trabalho pedagógico; modalidade;

jovem; adulto.

1 Introdução

1 Graduação em Pedagogia, Pós-Graduação em Gestão do Trabalho Pedagógico e em

Metodologia de Ensino, pedagoga do Centro Estadual de Educação Básica de Jovens e Adultos de Rio Negro. 2 Pedagoga, Professora do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná, Mestre em

Educação, Doutoranda em Educação pela UFPR.

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O presente artigo apresenta discussões em torno do papel do pedagogo

na organização e mediação do trabalho pedagógico na Escola Pública, no

Centro Estadual de Educação Básica de Jovens e Adultos, tendo como objetivo

principal refletir sobre o reconhecimento do trabalho e das funções deste

profissional no interior da escola, entre alunos, diretores, professores e demais

profissionais da educação. Esta Escola atende ao público adolescente, jovem,

adulto e idoso do segundo segmento do Ensino Fundamental e do Ensino

Médio, nos turnos vespertino e noturno.

Para fundamentar o tema em questão foi realizado aprofundamento

teórico das concepções e normatizações que regem as funções do pedagogo

na escola pública do Paraná, análise de dados levantados juntos aos

profissionais da educação e educandos da EJA sobre o papel do pedagogo e

para o reconhecimento da demanda atendida na escola com o intuito de

fortalecer o trabalho da equipe pedagógica e, consequentemente, qualificar a

prática pedagógica desenvolvida na Educação de Jovens e Adultos.

Durante muito tempo a EJA teve como princípio superar o “atraso” dos

jovens e adultos analfabetos totais e funcionais, pautada em uma concepção

instrumental de educação, que não levou em consideração as experiências de

vida destes alunos que retornaram a escola, orientada na maioria das vezes

pela atuação de professores e pedagogos que colaboraram com a reprodução

social, primeiro pela fragmentação do trabalho, voltado a manutenção da

sociedade capitalista, segundo pela hierarquia produzida por essa mesma

sociedade.

Paralelo ao mesmo processo histórico, o papel do pedagogo esteve

voltado ao trabalho funcional e burocrático, como supervisor e orientador, que

descaracterizou a função pedagógica na escola, contextualizada em gestões

conservadoras, centralizadoras e burocráticas da denominada democracia,

entendida somente enquanto o ato de escolha dos diretores pelo voto, ou por

decisões compartilhadas com profissionais da educação informalmente nos

corredores, na sala dos professores e com pais e alunos nos horários de

entrada, saída e intervalos.

Diante disso, urge a necessidade de realizar reflexões e, principalmente,

ações dos pedagogos para que a comunidade escolar compreenda o papel

deste profissional como mediador do trabalho coletivo em função da

organização do trabalho pedagógico, principalmente na EJA, por ser uma

modalidade de educação diferenciada, que atende a uma pluralidade de

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sujeitos, o que requer professores, funcionários e pedagogos preparados para

trabalhar com as suas especificidades, cumprindo assim o papel principal da

escola que é o desenvolvimento do processo de ensino, que resulte em

aprendizagem.

Na tentativa de explicitar o tema abordado, este trabalho organiza-se em

conceitos inter-relacionadas, que propõe a reflexão sobre o papel do pedagogo

na organização do trabalho pedagógico, suas relações com o projeto político

pedagógico, com o currículo e a gestão democrática deste projeto, tomando

como referência especialmente os documentos produzidos pela Coordenação

de Gestão Escolar – CGE e as normatizações inerentes a este profissional;

busca-se estabelecer um diálogo entre a teoria e a prática do papel do

pedagogo na Educação de Jovens e Adultos abordando a (re)construção do

Projeto Político Pedagógico enquanto reflexão sobre o currículo, sua relação

com os sujeitos da EJA e com a construção de uma gestão democrática e a

formação continuada dos professores da e na escola.

2 O papel do pedagogo

É responsabilidade do pedagogo, viabilizar articulações no processo

ensino-aprendizagem, promovendo abertura no interior da escola para que

professores, alunos, pais e demais profissionais da educação, possam estudar,

discutir e avaliar a qualidade do trabalho pedagógico, bem como, do material

didático, procedimentos de ensino, avaliação e programas, ou seja, tudo o que

faz parte do processo ensino-aprendizagem, estando, assim, comprometido

com a construção de uma sociedade democrática, visando a superação do

trabalho fragmentado dentro da estrutura educacional, bem como, ousando

ouvir a comunidade e acreditando que a escola, deve atender essas pessoas e

seus filhos, supostamente sem conhecimento e sem possibilidade de escolha

para possíveis interferências no currículo e deste modo, levar a escola a dar o

grande passo rumo à quebra da disputa de interesses dos que a compõe a

partir da ruptura da eterna reprodução dos que organizaram e/ou organizam os

currículos engessados, prenhes de ideologias voltadas ao capital, como se os

alunos fossem formados unicamente para servirem a esse capital, garantindo a

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manutenção do ¨status quo¨. Portanto, pensar a escola concreta é fundamental

para o trabalho do pedagogo iniciando-se um novo movimento, o de buscar

compreender o meio em que ela está inserida, seus desafios, seus anseios,

suas contradições e seus limites.

É preciso analisar o mundo do aluno para, a partir do conhecimento de sua realidade, ajudá-lo a encontrar meios para mudar a correlação de forças com a sociedade que o explora. E a partir daí, procurar desenvolver a sua capacidade de organizar o pensamento e compartilhar suas ideias, de se constituir enquanto grupo, de compreender a força da ação coletiva, de liderar, de pensar criticamente a realidade social, de filtrar da história oficial a história de sua classe, de se capacitar a se tornar sujeito de sua própria história”. (VALE, 1982, p. 35).

O compromisso do Pedagogo vincula-se a um tempo e espaço do fazer

pedagógico. Daí a importância que lhe é atribuída ao ser sua tarefa a

coordenação da elaboração coletiva do Projeto Político Pedagógico, bem como

do Plano de Ação da Escola em que atua. Entre estas e outras atribuições

conferidas pela SEED-PR, em defesa do papel do Pedagogo, está também a

de organizar o espaço/tempo escolar, o que significa o grande desafio de

entender e respeitar também, (levando cada docente a fazer o mesmo) o ritmo,

o tempo e a história de cada aluno. Pois cada um traz as marcas das suas

vivências, das oportunidades que lhes foram oferecidas ou negadas, através

das quais todos nós, seres humanos construímos ou aprimoramos nossos

conhecimentos:

A história da escola é a história de sua conformação como instituição e organização e como cultura instituída. Por que é imprescindível que o pedagogo saiba pensar e organizar o tempo escolar? Porque, segundo Arroyo, o tempo escolar nasce inseparável da formação de uma nova cultura do tempo e da descoberta da centralidade do tempo, não apenas de novos processos produtivos, mas também na construção, formação e desenvolvimento do ser humano. (ARROYO, 2009, p.27)

As Diretrizes Curriculares da Educação de Jovens e Adultos colocam que:

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A EJA deve ter uma estrutura flexível e ser capaz de contemplar inovações que tenham conteúdos significativos. Nesta perspectiva, há um tempo diferenciado de aprendizagem e não um tempo único para todos. Os limites e possibilidades de cada educando devem ser respeitados (...). (PARANÁ, 2006, p.28)

Portanto, ao pedagogo cabe priorizar o tempo, ultrapassando a idéia de

tempo escolar, que compreende as exigências de calendário, hora-relógio,

mecânico e burocrático. Deve ser pensado enquanto tempo pedagógico,

enfocando o processo de formação, adequando o tempo escolar as

necessidades educativas dos educandos, incluindo os diferentes sujeitos da

educação de jovens e adultos. A organização do trabalho pedagógico necessita

ser compreendida como a articulação entre o tempo pedagógico e o tempo

escolar.

Nesse sentido o tempo e o espaço são aspectos da cultura da própria

escola e fazem parte de toda ação pedagógica. Segundo as Diretrizes

Curriculares da EJA (PARANÁ, 2006, p.34), o tempo escolar compreende três

dimensões: o tempo físico que se refere ao Direito Subjetivo a todos,

organizados em dias letivos, carga horária, aproveitamento de estudos,

organização individual e coletiva, devendo ser compreendido como direito

essencial dos alunos para que tenham a oportunidade de se apropriarem dos

conteúdos escolares, pois para a maioria, esta modalidade é a única

oportunidade de acesso a educação formal, e a cultura como forma de reduzir

as desigualdades sociais apresentadas no cenário atual; o tempo vivido pelo

professores nas suas experiências pedagógicas, nos cursos de formação, na

ação docente, bem como, o tempo vivido pelos educandos nas experiências

sociais e profissionais estabelecidas ao longo da sua história individual. Refere-

se à garantia do acesso, da permanência e do sucesso no retorno à

escolarização básica, fornecendo subsídios para que professores e alunos da

EJA reconheçam que a democracia é tanto uma atitude ética perante a

comunidade, quanto política e, além disso, desmistificar entre os educadores,

educandos e a comunidade escolar, a divisão social e técnica do trabalho

entendido como extremos entre o trabalho manual e intelectual, ou seja,

conceitos opressores estabelecidos por ideologias presentes nos modos de

organização do sistema produtivo atual e o tempo pedagógico que se faz

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compreendendo o tempo e formas de organizar aulas e o tempo que o aluno

trabalhador tem para se dedicar aos afazeres escolares. Para isso, o currículo

deve ter uma forma de organização abrangente, na qual os conteúdos culturais

estejam articulados à realidade em que se encontram os jovens, adultos e

idosos, na busca pela significação do conhecimento escolar para os mesmos,

tomando como ponto de partida a experiência dos alunos, ou seja, o saber

popular, originário na cultura vivida e ainda a definição de critérios para seleção

dos conteúdos essenciais para cada nível de ensino e o desenvolvimento de

práticas educativas que tornem os conteúdos escolares significativos,

articulando-os as situações relacionadas na prática escolar, com a prática

social e profissional.

A relação pedagógica, vista como a essência do papel do pedagogo e da

própria escola, pressupõe que tanto os professores, quanto a equipe

pedagógica, necessitam interagir na busca de um objetivo comum - a

promoção da aprendizagem e a melhoria da qualidade da educação

independentemente da modalidade que atuam -, redefinindo práticas capazes

de fazer da escola pública, especialmente na EJA, uma escola de educação

popular e não simplesmente para as classes populares o que significa o

reconhecimento da heterogeneidade que caracteriza o cotidiano escolar como

aspecto produtivo, que evidencia a necessidade de se aprender a conviver

democrática e solidariamente com as diferenças, tornando-as indispensáveis

ao processo individual e coletivo de produção do conhecimento. Isso demanda

reflexões profundas sobre os conhecimentos e práticas, sobre o modo como

compreendemos os processos diferenciados de aprendizagem que ocorrem no

interior das salas de aula, sobre o que consideramos essencial enquanto

conhecimento e sobre os critérios que vão estabelecer as manifestações de

aprendizagem.

Se o objetivo último da educação é a aprendizagem e se para que ela possa acontecer, conteúdos, métodos, enfoques, espaços e tempos devem adequar-se às necessidades e as possibilidades daqueles que aprendem. O diferente passa a ser a norma e não a exceção nos sistemas destinados a satisfazer tais necessidades. Não se trata, então de construir sistemas uniformes únicos, mas precisamente em nome da igualdade de propiciar modalidades e sistemas diferenciados, tão variados quanto os exigidos pelas populações, pelos grupos e pelas condições concretas. Não se trata de projetar

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paliativos de compensação (para os pobres, as meninas, os meninos trabalhadores), assumindo um único padrão como norma a respeito da qual há de se definir o que é “standart”, o que é o esperável e o exigido para se adequar a tal forma, mas de projetar modelos educativos que atendam às necessidades específicas de cada grupo e garantam em cada caso, uma educação de qualidade, com trajetórias e modalidades diferenciadas, e com expectativas de sucesso e êxito semelhantes. (TORRES, 2001, p.81-82)

É na relação professor-aluno que se concretiza a aprendizagem, ou seja,

cabe ao professor o domínio do conhecimento articulado a especificidade de

sua área, convertendo o saber escolar em saber sistematizado, elaborando

práticas que levem o educando a apropriar-se dos conhecimentos

historicamente acumulados, por outro lado a formação do pedagogo é

específica e diretamente voltada ao domínio das formas, como aponta

Dermeval Saviani:

Empenhem-se no domínio das formas que possam garantir às camadas populares o ingresso na cultura letrada, vale dizer, a apropriação dos conhecimentos sistematizados. E, no interior das escolas, lembrem-se sempre de que o papel próprio de vocês será provê-las de organização tal que cada criança, cada educando, em especial aquele das camadas trabalhadoras, não veja frustrada a sua aspiração de assimilar os conhecimentos metódicos incorporando-os como instrumento irreversível a partir do qual será possível conferir uma nova qualidade às suas lutas no seio da sociedade”. (SAVIANI, 1985, p. 27)

A legitimação do papel do pedagogo da e na escola será garantida

quando o coletivo tomar consciência do seu verdadeiro papel, para que todos

os profissionais da educação, alunos e responsáveis tenham clareza das

especificidades da função pedagógica, aceitando que não cabe ao pedagogo

abarcar todas as situações, conflitos e necessidades para si, com a ideia de

que ele deve resolver os problemas da escola.

A tarefa do pedagogo, em parceria com a direção, implica em coordenar

a reflexão e a tomada de decisão coletiva em todas as dimensões do trabalho

pedagógico, onde todos assumem a responsabilidade pelas ações

pedagógicas, administrativas e financeiras da escola.

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2.1 O pedagogo na organização do trabalho pedagógico

A ação humana intencional se dá a partir do trabalho pelo qual o

homem se humaniza e humaniza a própria natureza. Desta forma, o trabalho

pedagógico escolar precisa buscar um caminho, que deve ser percorrido por

todos da escola, pautado no currículo enquanto processo histórico e cultural,

ou seja, resultado de um conjunto de forças sociais, políticas e pedagógicas

que expressam e organizam os saberes que fundamentam as práticas

escolares na formação do sujeito, entendido também como ser histórico e

social, estabelecendo relações entre os conteúdos escolares e os movimentos

contraditórios presentes na sociedade. Tal posição não significa responsabilizar

a escola por questões não resolvidas pela comunidade social, colocando-a

como a redentora dos problemas e conflitos da sociedade. Para FELDMANN

(2009, p.78-79) tal posição acaba por minimizar o verdadeiro sentido da

educação escolarizada, que se expressa na produção do conhecimento, que

para se constituir em educação emancipatória é impregnada de lutas e

contradições. Segundo ela, na escola há o existir, a existência humana. Não

nascemos humanos, mas nos tornamos humanos na prática social da qual a

escola faz parte, humanizando-nos uns aos outros.

Nesta perspectiva, apresenta-se a concepção progressista de currículo

que busca superar a visão burocrática e técnica com métodos e objetivos

voltados ao controle social, a padronização das formas, a hierarquização das

atividades, com caráter de ordem e racionalidades para a formação em massa

dos sujeitos, ordenado pelo modo de produção capitalista.

O currículo, no horizonte de superação, passa a ser construído a partir

da problematização das relações de poder que se estabelecem na escola.

Neste contexto, todos os envolvidos no processo pedagógico possibilitam

espaços na gestão democrática, como um recurso para a escolha do caminho

a ser percorrido e neste caminho, todos aprendem, se educam e se constroem

enquanto seres históricos e sociais para emancipação humana, enquanto um

projeto contra hegemônico. Para Melo Neto (2004, p.176) a educação pelo

diálogo, caminha para a superação da opressão, constituindo-se em uma

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pedagogia emancipatória, uma pedagogia orientada pela interpretação do

mundo, considerando que todos se educam pelo diálogo intersubjetivamente.

Nesta concepção progressista de currículo e educação, o pedagogo

tem a função de coordenar e mediar o trabalho pedagógico, agindo em todos

os espaços educativos, interagindo com professores e demais profissionais da

educação, alunos, comunidade e órgãos colegiados para a efetivação de uma

prática pedagógica que cumpra os pressupostos teóricos e práticos presentes

no Projeto Político Pedagógico. Para a Coordenação de Gestão Escolar - CGE

(PARANÁ, 2010b, p.27), no Caderno Temático sobre a Organização do

Trabalho Pedagógico, o pedagogo é aquele que não fica indiferente, neutro,

diante da realidade. Procura intervir e aprender com a realidade em processo.

Várias teorias definem concepções de currículo. Tomas Tadeu da Silva

(2002, p.14) coloca que não há como definir currículo na prática, para ele trata-

se de mostrar que aquilo que é currículo depende precisamente da forma como

ele é definido pelos diferentes autores e teorias, ou seja, apresenta uma

dimensão histórica, construída a partir das diferentes dimensões, expressas

nas tensões e contradições, entre o instituído e o instituinte, entre a

acomodação e a superação e distintas concepções de homem, de mundo e de

escola.

Neste sentido não existem receitas prontas. Cada escola constrói seu

projeto, baseado nas condições concretas, reconhecendo as características da

comunidade escolar, suas necessidades e expectativas.

Para a Coordenação de Gestão Escolar - CGE (PARANÁ, 2010b, p.

32), currículo é uma seleção de conteúdos, de concepções, de intenções que

devem ser democratizadas para toda a população, uma vez que são requisitos

mínimos para a participação em uma sociedade cada vez mais excludente,

seletiva e contraditória.

Desse modo, atribui-se ao currículo o caráter político, abrindo-se

espaço fundamental para a escola e especialmente para o pedagogo como

mediador na construção do Projeto Político Pedagógico da escola, traduzindo-

se num projeto que contemple formas inovadoras de seleção, organização e

tratamento metodológico dos conteúdos, observando as especificidades da

modalidade Educação de Jovens e Adultos, sua demanda, suas formas de

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organização para a promoção do saber, a garantia da qualidade e a

consequente promoção humana.

O projeto de educação se expressa no currículo, assumindo sua função

prática e transformadora, saindo do papel, o que significa que a proposta

pedagógica deve reunir a concepção das disciplinas em torno da concepção de

educação apresentada no Projeto Político Pedagógico e na Proposta

Curricular, na qual o professor planeja suas aulas e organiza seu Plano de

Ação Docente, o que se pode definir como currículo em ação mediado pelo

pedagogo:

(...) o pedagogo é o profissional que atua em várias instâncias da prática educativa, direta ou indiretamente vinculadas à organização e aos processos de aquisição de saberes e modos de ação, com base em objetivos de formação definidos no Projeto Político Pedagógico, esse passa a ser compreendido como mediador e articulador deste projeto na escola, que se consolida através do Plano de Trabalho Docente e do trabalho efetivo do professor em sala de aula. (PARANÁ, 2010b, p.35-36)

Alerta-se que o currículo não se limita a seleção de conteúdos.

Estende-se a organização do trabalho pedagógico para apropriação dos

mesmos.

O conhecimento que dá conta da concepção de educação que pressuponha a compreensão do mundo em sua totalidade e em suas contradições, somente será aquele que for o produto do movimento histórico e social produzido e apropriado na totalidade, entendendo-a como a expressão dos condicionantes políticos, sociais, econômicos, culturais e históricos. O ponto de partida para a sua apreensão é sempre uma representação empírica, caótica e imediata da realidade. Este pode ser o conhecimento empírico, popular ou de senso comum, mas que em seu movimento de problematização, instrumentalização e sistematização pretende ser o ponto de chegada as abstratas formulações conceituais, agora como produtos da totalidade ricamente articulada e compreendida. (PARANÁ, 2010b, p.33).

As Diretrizes Curriculares da Educação de Jovens e Adultos

reconhecem o conhecimento enquanto construção histórica e como elemento

fundamental para a organização do trabalho pedagógico, estabelecendo que a

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cultura e o conhecimento sejam produzidos nas e pelas relações sociais e não

podem ser pensados fora dessas relações. (PARANÁ, 2006, p.34)

Neste sentido a função do pedagogo é mediar à relação entre as

especificidades da Educação de Jovens e Adultos: seus educandos,

conteúdos, formas de organização, tempos e métodos, agindo nos diferentes

espaços de contradição, para a transformação da prática pedagógica voltada à

formação humana, sendo necessário que o processo ensino-aprendizagem na

EJA seja coerente, segundo a sua Proposta Pedagógica Curricular, com:

o papel de socialização dos sujeitos, agregando elementos

e valores que os levem a emancipação e à afirmação de

sua identidade cultural;

o exercício de uma cidadania democrática, reflexo de um

processo cognitivo, crítico e emancipatório, com base em

valores como respeito mútuo, solidariedade e justiça;

os três eixos articuladores do trabalho pedagógico com

jovens, adultos e idosos - cultura, trabalho e tempo.

2.2 A gestão democrática do projeto da escola

A gestão democrática é uma ferramenta a serviço da melhoria da

qualidade do ensino o que não quer dizer que a gestão seja o coração da

escola. Significa que as relações pedagógicas que ocorrem entre professores e

alunos no interior das salas de aula devem ser o cerne das discussões que

visam enfrentar os desafios do cotidiano da escola. Neste contexto, a equipe

pedagógica e a direção devem articular uma metodologia de trabalho que

possibilite re-significar a ação de todos os agentes da escola para o

enfrentamento dos desafios presentes e urgentes na educação de jovens e

adultos, dentre eles a cultura do aligeiramento e o restrito cumprimento da

carga-horária mínima:

(...) parece residir uma preocupação política com a certificação das

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pessoas, com a ampliação do número de escolarizados, e não com os conhecimentos a serem desenvolvidos nessa modalidade da educação básica. Ao mesmo tempo em que se enfatiza o direito social à educação, parece haver um distanciamento em relação ao direito humano de acesso ao conhecimento. (SOUZA, 2010, p. 22)

Nesse sentido é fundamental que o pedagogo busque conhecimentos e

que procure auxiliar e orientar os professores, no sentido de promover

oportunidades de aprendizagem a todos, desenvolvendo estratégias igualitárias

de acesso ao conhecimento, de forma que a escola não se limite a aproveitar

somente os que têm, sabem e podem mais; aqueles que pelo contexto em que

vivem, pelos códigos de que dispõem e pelos instrumentos que mais facilmente

adquirem, sempre aproveitam melhor as melhores experiências. Uma escola

cuja prática se constrói democrática, (pública na sua essência) é aquela que

procura fazer do “conhecimento” o bem mais partilhado por todos os seus

membros, alunos e professores, funcionários, de forma que atinja a

comunidade e se efetive como transformação de toda a sociedade.

A mediação do trabalho pedagógico está na articulação e compreensão

das possibilidades da gestão democrática da educação enquanto

intencionalidades, concepções e formas de organizar o trabalho pedagógico na

escola, responsabilidade essencial atribuída à equipe pedagógica em conjunto

com a direção. Portanto, a função do pedagogo inclui-se na gestão escolar.

A gestão democrática da escola pública deve ser incluída no rol de práticas sociais que podem contribuir para a consciência democrática e a participação popular no interior da escola. Esta consciência, esta participação, é preciso reconhecer que não tem a virtualidade de transformar a escola numa escola de qualidade, mas têm o mérito de implantar uma nova cultura na escola: a politização, o debate, a liberdade de se organizar, em síntese, as condições essenciais para os sujeitos e os coletivos se organizarem pela efetividade do direito fundamental: acesso e permanência dos filhos das classes populares na escola pública. (BASTOS, 2001, p.22-23).

Abre-se assim um espaço de gestão para a construção do projeto de

escola que resignifique a ação e o compromisso coletivo baseado nos

interesses e anseios das camadas populares. Isso requer o enfrentamento de

todas as questões que excluem e marginalizam os educandos.

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Segundo a Coordenação de Apoio a Direção e Equipe Pedagógica -

CADEP (PARANÁ, 2007, p.2) essa concepção de gestão pressupõe:

que a prática da participação coletiva elimine o individualismo;

que a reciprocidade exclui a exploração;

que a solidariedade supere a opressão;

a participação coletiva dos professores, funcionários, pais e

alunos na construção, execução e avaliação do Projeto Político-

Pedagógico;

a transparência das decisões e legitimidade da participação na

construção de instrumentos de gestão democrática: eleição de

Diretores, constituição de Conselhos e Conselho de Classe;

o redimensionamento de sua função pedagógica.

A gestão dessa forma compreende a condição de participação de toda

comunidade escolar na organização do trabalho pedagógico, ressignificando o

processo de construção, o compromisso coletivo de formação e humanização

dos sujeitos e a possibilidade de enfrentamento dos desafios presentes na

escola fundamentados teoricamente.. O conceito desta gestão extrapola a

forma de poder autoritário, passa a compreender a gestão enquanto conquista

da cidadania presente na construção do PPP. Neste conceito entende-se a

essência do papel do pedagogo como um dos mediadores da intencionalidade

educativa da escola.

O PPP é um instrumento teórico-metodológico que visa ajudar a enfrentar os desafios do cotidiano da escola, só que de forma refletida, consciente, sistematizada, orgânica e, o que é essencial, participativa. É uma metodologia de trabalho que possibilita re-significar a ação de todos os agentes da instituição. (VASCONCELOS, 1995, p.143)

Neste sentido, há a necessidade de novas formas de organização e

mobilização, especialmente em relação ao papel da direção de escola. Esta

precisa extrapolar a concepção gerencialista, autônoma, corporativa e

centralizadora das decisões. Necessita assumir o papel de liderança, de

articulação do processo educativo, assumindo um projeto de gestão

participativa, ou seja, não está sozinha para decidir, agir e conseqüentemente

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assumir os problemas presentes na escola. Na organização pedagógica da

escola, segundo a CGE (PARANÁ, 2010b, p.25-26), cada sujeito do processo

educativo tem suas funções específicas, porém, o planejamento e a

implementação das ações parte do coletivo. O papel da direção é

predominantemente, gestor e administrativo, mas sempre com enfoque

pedagógico, uma vez que se refere a uma instituição e a um projeto que existe

em prol da educação.

O papel da direção e da equipe pedagógica são indissociáveis na

gestão escolar, pois tanto uma quanto a outra, são responsáveis pela

mediação, organização e articulação do trabalho pedagógico. O Regimento

Escolar do CEEBJA Rio Negro estabelece no artigo 33, que:

A equipe pedagógica é responsável pela coordenação, implantação e implementação no Estabelecimento de Ensino, das Diretrizes Curriculares definidas no Projeto Político-Pedagógico e no Regimento Escolar, em consonância com a política educacional e orientações emanadas da Secretaria de Estado da Educação. (PARANÁ, 2010a, p.34)

Para a CGE (PARANÁ, 2010b, p.27), o reconhecimento e efetivação do

papel do pedagogo dependem do reconhecimento da intencionalidade e

especificidade do trabalho pedagógico junto à comunidade escolar. Portanto, o

envolvimento do pedagogo com questões do dia-a-dia escolar torna-se

necessário, na medida em que ele elabora proposições de formas e

procedimentos a serem discutidos e encaminhados no coletivo da escola, com

base nos conhecimentos teóricos e normativos, tendo em vista que problemas

de disciplina, acompanhamento de entradas e saídas de alunos, etc., são

problemas da escola e o seu coletivo deve planejar ações para o

enfrentamento destas. Para que isso se efetive é necessário que a equipe

pedagógica trabalhe na coletividade através de ações dialógicas, discutindo e

reavaliando as práticas cotidianas com toda comunidade escolar e

principalmente, estando em sintonia, intimamente ligada a direção, que por

vezes carece de priorizar as questões pedagógicas e de afastar-se de

concepções fragmentadas da administração escolar.

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O pedagogo é aquele que não fica indiferente, neutro, diante da

realidade. Procura intervir e aprender com a realidade em processo. Neste

sentido, o conflito está na base de toda a pedagogia. A equipe pedagógica tem

a função de mediadora do trabalho pedagógico, agindo em todos os espaços

escolares para a transformação da prática pedagógica.

3 Diálogo entre a teoria e a prática do papel do pedagogo na Educação de

Jovens e Adultos

Para o levantamento da compreensão da comunidade escolar do

CEEBJA – Centro de Estadual de Educação Básica de Jovens e Adultos Rio

Negro sobre o papel do pedagogo, foram realizados diálogos e levantamento

de dados junto à direção, aos pedagogos, aos professores, e aos educandos

adolescentes, jovens e adultos através de questionários e entrevistas, bem

como, análises e reflexões de documentos legais e de orientação - LDB,

Resoluções e Instruções, Edital do Concurso para Pedagogo da Rede Estadual

de Ensino, orientações da CADEP - e dos documentos da escola (Regimento

Escolar e Projeto Político–Pedagógico). Este diálogo sobre o papel do

pedagogo na EJA considerou como eixos de reflexão a gestão democrática do

PPP, os sujeitos da EJA e a formação continuada dos profissionais da

educação.

3.1. A gestão democrática do Projeto Político Pedagógico

A reflexão sobre a gestão democrática traz como elemento norteador o

planejamento das ações educativas, presentes no PPP vinculado a um projeto

social que possibilita a compreensão do papel da escola na sociedade, ou seja,

o papel político e pedagógico. Neste sentido, é necessário que a escola se

posicione e se reconheça, “fazendo parte do movimento histórico – social, deve

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ser vista como o palco de uma dimensão da luta de classes. É nesse processo

de engajamentos e de luta no interior da própria escola burguesa que o

educador se educa” (VALLE, 1997, p.90).

Educadores e profissionais da educação necessitam reconhecer o

significado do planejamento como ação humana participativa e neste sentido

“há toda uma luta ideológica, política, econômica, social a ser enfrentada, seja

consigo mesmo, com seus colegas de trabalho, com os educandos, com as

famílias e com as instituições em geral”. (VASCONCELOS, 1995, p.143), Este

autor apresenta as dificuldades que fazem parte da construção do PPP:

comodismo por parte dos sujeitos da educação, imediatismo, falta de

experiência de caminhada enquanto grupo, falta de condições objetivas de

espaço – tempo para encontros de reflexão, elaboração e acompanhamento, a

falta de exercício democrático na escola e consequentemente na visão

burocratizada de planejamento bastante presente entre os profissionais da

educação e neste contexto estão os pedagogos que vivem em constantes

conflitos, reflexões e debates sobre a sua real função na escola.

Em relação a esta questão apresenta-se a função progressista do

trabalho pedagógico na perspectiva da democratização da gestão escolar, na

qual o pedagogo em parceria com a direção assume a função de articulador do

trabalho pedagógico compreendendo a gestão enquanto instrumento para a

melhoria da qualidade da educação, desvelando a gestão conservadora e

centralizadora, atribuída como democrática somente pelo ato de escolha de

diretores e das decisões compartilhadas informalmente nos corredores, na sala

dos professores, nos intervalos, entradas e saídas da escola. Neste contexto a

democracia torna-se o eixo da organização escolar, onde todos os envolvidos

precisam ter acesso a oportunidades democráticas, pois a participação para a

autonomia exige aprendizado e a equipe pedagógica e a direção tem a

responsabilidade de dar condições para e fazer com que todos possam

vivenciar essa forma de organização do trabalho pedagógico.

É preciso entender que o diálogo na escola deve acontecer

frequentemente, em espaços/tempos planejados formalmente, não pensados

somente enquanto expressão de relações harmônicas, mas como expressões

diversificadas, onde todos colocam suas experiências e ideias, manifestadas

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por conflitos e contradições, para construção de novas possibilidades de

encaminhamentos e ações, reconhecendo que o outro pode ter um ponto de

vista válido e tem o direito de ser ouvido. Para isso é necessário desvelar a

gestão do consenso:

O consenso não é ponto de partida para a interação dos profissionais da escola, pois apenas obscurece a diversidade; ele deve ser buscado numa trajetória que comporte a discussão, o conflito; enfim, o consenso e as decisões devem ser construídas coletivamente. (SPÒSITO, 1999, p.52).

As ações e decisões construídas coletivamente estão associadas

a compreensão do conceito de democracia pelos diretores e pedagogos,

reconhecidos como gestores escolares, conforme pressupõe Camargo &

Adrião (2003, p. 30-31) a articulação da igualdade, proporcionando a todos os

integrantes do processo, a condição de sujeitos, expressa no reconhecimento

enquanto interlocutores válidos e, como método, deve garantir a cada um dos

participantes igual poder de interferência e decisão, criando mecanismos que

facilitem a consolidação de iguais possibilidades de opção e ação diante dos

processos decisórios.

Isso requer pensar a gestão do diálogo e do conflito, pois o diálogo na

escola deve ser garantido continuamente, mas não necessariamente por

relações harmônicas, mas por relações e experiências diversas, por diferentes

visões de mundo em confronto com novas expectativas. Desta forma, Spósito

(1999, p.25) coloca que o consenso não é ponto de partida para os

profissionais da escola, pois apenas obscurece a diversidade, ele deve ser

buscado numa trajetória que comporte a discussão, o conflito, enfim, o

consenso e as decisões devem ser construídos coletivamente.

Percebe-se que o papel do pedagogo está nas relações democráticas de

poder, conquistado nas relações estabelecidas entre os envolvidos na

organização do currículo, via gestão.

O poder pode (e deve!) ser socializado, isto é, as relações humanas podem e devem ser controladas por todos os envolvidos nelas mesmas, de sorte que todos sejam co-responsáveis pela direção que

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essas relações irão tomar, ou seja, que todos se assumam como autoridade, parte das responsabilidades sobre os destinos das suas próprias relações. (SPÓSITO, 1999, p.26)

Neste sentido, pensar o papel do pedagogo pressupõe a organização do

trabalho pedagógico de forma coletiva e dialógica à luz da concepção de

educação para um projeto de sociedade menos excludente e conservadora,

banindo a alienação como forma de minimizar o fosso atual entre os

dominados e dominantes.

O Edital 10/2007 – SEED/PARANÁ, de seleção para o concurso público

para o ingresso de pedagogos no Quadro Próprio do Magistério apresenta o

papel de sua participação na gestão escolar:

Coordenar a elaboração coletiva e acompanhar a efetivação do Projeto Político-Pedagógico e do Plano de Ação da Escola;

Coordenar a construção coletiva e a efetivação da Proposta Pedagógica Curricular da Escola, a partir das Políticas Educacionais e das Diretrizes Curriculares Nacionais e Estaduais;

Promover e coordenar reuniões pedagógicas e grupos de estudo para reflexão e aprofundamento de temas relativos ao trabalho pedagógico e para a elaboração de propostas de intervenção na realidade da escola;

Participar e intervir, junto à direção, da organização do trabalho pedagógico escolar no sentido de realizar a função social e a especificidade da educação escolar;

Participar da elaboração do projeto de formação continuada de todos os profissionais da escola e promover ações para a sua efetivação, tendo como finalidade a realização e o aprimoramento do trabalho pedagógico escolar;

Analisar as propostas de natureza pedagógica a serem implantadas na escola, observando a legislação educacional em vigor e o Estatuto da Criança e do Adolescente, como fundamentos da prática educativa;

Coordenar a organização do espaço-tempo escolar a partir do Projeto Político-Pedagógico e da Proposta Pedagógica Curricular da Escola;

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Coordenar o processo coletivo de elaboração e aprimoramento do Regimento Escolar, garantindo a participação democrática de toda a comunidade escolar;

Participar do Conselho Escolar, subsidiando teórica e metodologicamente as discussões e reflexões acerca da organização e efetivação do trabalho pedagógico escolar;

Propiciar o desenvolvimento da representatividade dos

alunos e sua participação nos diversos momentos e

órgãos colegiados da escola.

Dentre as funções atribuídas aos pedagogos pelo Edital, a equipe

pedagógica do CEEBJA Rio Negro, destaca como suas maiores dificuldades,

por ordem de prioridade, a coordenação na elaboração coletiva e no

acompanhamento do PPP em consonância com as Propostas Curriculares e os

Planos de Trabalho Docente, pela falta de compreensão, muitas vezes, do

próprio pedagogo, da importância do planejamento coletivo e interdisciplinar; a

organização do espaço-tempo escolar, assumido quase que exclusivamente

pela secretaria e direção da escola; a participação e intervenção junto a

direção, no sentido de organizar coletivamente o trabalho e a participação na

elaboração do projeto de formação continuada dos profissionais, justamente

pelo fato de ser determinado pelo sistema de ensino e pela falta de

participação dos principais responsáveis pela melhoria da qualidade de ensino,

os professores. Estes assumem maior número de aulas em outros

estabelecimentos de ensino regular, optando por estes no momento das

reuniões pedagógicas estabelecidas no calendário escolar. A participação

nestas reuniões envolve os funcionários da escola, os pedagogos, a direção e

menos de 40% do quadro de professores, os responsáveis imediatos pelo

sucesso do aluno na modalidade EJA. Esta situação dificulta o aprofundamento

e encaminhamento do trabalho pedagógico em uma escola com as

especificidades da EJA.

No CEEBJA Rio Negro existem situações e momentos de divisão do

trabalho pedagógico, por vezes como resultado de uma visão burocrática da

gestão, com ausência de exercícios democráticos formais disponibilizados e/ou

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praticados pelos gestores, tornando o trabalho do pedagogo, muitas vezes,

também burocrático e fiscalizador. Existe na comunidade escolar um

desconhecimento da real função da equipe pedagógica na escola (e por vezes,

do próprio pedagogo), pelo engessamento da ideia do “apagador de incêndio”,

do “lobo-mau” que desempenha a função de fiscalizador de alunos e

professores, formas estas de conduzir o trabalho, muitas vezes, criadas pelo

próprio pedagogo, distanciando-o da função de articulador do trabalho

pedagógico. Existe ainda certa resistência por parte de alguns professores em

relação à própria presença dos pedagogos na escola e a importância do

trabalho coletivo para a autonomia, bem como, a falta de compreensão do

significado do Plano de Trabalho Docente pelo professor e também por parte

dos pedagogos, apresentando dificuldades na sua elaboração a partir das

necessidades reais da demanda educacional atendida.

Neste sentido, cabe ao pedagogo apresentar e encaminhar propostas,

alternativas, sugestões que possibilitem o desenvolvimento e o

aperfeiçoamento do trabalho pedagógico escolar, conforme o Projeto Político

Pedagógico, a Proposta Pedagógica Curricular, o plano de ação dos gestores,

da equipe pedagógica e professores e das políticas educacionais. Para isso

torna-se necessário desenvolver um trabalho coletivo pautados na concepção,

demandas e encaminhamentos presentes nestes documentos. Neste sentido, o

pedagogo necessita se organizar para fazer articulações entre a teoria e as

metodologias, levando em conta as condições concretas da escola, dos seus

profissionais e seus educandos, pois ele tem a possibilidade de conhecer a

diversidade de situações que compõem a realidade escolar e com isso orientar

a organização e desempenho das ações, com o objetivo de garantir a

aprendizagem.

Portanto, compete aos pedagogos e aos gestores explicitar a

importância do fortalecimento das formas democráticas de gestão e

organização coletiva da escola, por meio de análises e reflexões que fazem do

Projeto Político Pedagógico um instrumento de ações concretas,

fundamentadas no exercício contínuo da participação.

É necessário evidenciar que ao pedagogo, como articulador da gestão

e organização do trabalho pedagógico, não cabe a definição de ações

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diferentes daquelas discutidas e definidas coletivamente na elaboração do

PPP. Cabe a ele refletir e propor encaminhamentos que dêem conta da

efetivação das propostas registradas no projeto da escola, com vistas a atingir

os objetivos comuns, elencados pelo poder da participação, elemento

fundamental da gestão democrática na escola.

3.2 Educandos da Educação de Jovens e Adultos

A Constituição Federal de 88 determina em seu artigo 205, que a

“educação, direito de todos e dever da família e do estado, será promovida e

incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno

desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e a

qualificação para o trabalho”. (BRASIL, 1988)

A LDBEN 9394/96 estabelece que:

Art. 37º - A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria. § 1º - Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e adultos que não puderam efetuar seus estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames.

A modalidade EJA, para que efetive sua função educativa deve

contemplar ações pedagógicas que levem em consideração o perfil do(a)

educando(a) que teve seu direito à educação negado por diferentes motivos

pessoais e históricos.

Em um sentido amplo, analisando-se a pluralidade dos sujeitos que

dela fazem parte, percebe-se nitidamente que a EJA ainda está longe de servir

as oportunidades educacionais democráticas, comprometidas com a formação

humana. Para Arroyo (2001, p.10) os olhares sobre a condição social, política e

cultural dos alunos da EJA têm condicionado as diversas concepções da

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educação que lhes é oferecida, os lugares a eles reservado - marginais,

oprimidos, excluídos, empregáveis, miseráveis - tem condicionado o lugar

reservado a sua educação no conjunto das políticas oficiais. São tratadas como

uma massa de alunos, qualificados sob diferentes nomes, relacionados

diretamente ao chamado “fracasso escolar”, repetentes, evadidos, defasados,

aceleráveis, deixando de fora dimensões da condição humana desses sujeitos,

básicas para o processo educacional.

Como forma de reconhecer os educandos que compõe a comunidade

escolar do CEEBJA, foram levantados dados na própria escola, na data do

Exame Supletivo/2011, com todos os inscritos. Esses dados demonstraram que

os educandos desta comunidade foram excluídos do sistema de ensino, seja

pela entrada precoce no mercado de trabalho, pela falta de escolas ou pelo

histórico de passagem escolar marcada por repetências acumuladas e

interrupções na sua escolaridade. São trabalhadores, empregados e

desempregados, moradores rurais e urbanos, 60% moradores das periferias,

excluídos nas esferas socioeconômicas e educacionais, sem acesso ao

letramento e às tecnologias. Permanecem na escola regular por muito tempo,

ou pelo tempo que conseguem manter-se nela, quando à ela tem acesso.

Convivem com uma educação homogênea, que segrega, discrimina, ressalta

as diferenças, sob a perspectiva de neutralidade, preconceitos enraizados

social e escolarmente, que conduzem e justificam a exclusão.

A consequência disso está na participação comprometida no mundo da

cultura, do trabalho e da política, e na maioria dos casos, apresentando

dificuldades pessoais e emocionais, sentindo-se inseguros frente aos

processos escolares.

Se nossa sociedade e nossa escola não tivessem que responder à demanda dos pobres, desses trabalhadores sem trabalho, desses estudantes sem estudo, desses lavradores sem terra, desses que, com dificuldade, entram nas emergências dos hospitais sem a esperança de saúde, bastariam remendos leves na política econômica, social e educacional. Mas pobres e miseráveis penetram na cidade, na escola e sacodem o presente e nos fazem olhar para o futuro, num exercício ousado de instituir o novo ou abdicar da democracia, da convivência, da própria humanidade. (LINHARES, 1997, p. 69)

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Neste contexto, construir um projeto emancipatório de educação

popular na modalidade EJA, considerando seus sujeitos, conforme coloca

Andrade (2004, p.1), implica pensar sobre as possibilidades de transformar a

escola que as atende em uma instituição aberta, que valorize seus interesses,

conhecimentos e expectativas; que favoreça a sua participação; que respeite

seus direitos em práticas e não somente em enumerados de programas e

conteúdos; que se proponha a motivar, mobilizar e desenvolver conhecimento

que partam da vida desses sujeitos; que demonstrem interesse por eles como

cidadãos e não somente como objetos de aprendizagem.

Os educadores da Educação de Jovens e Adultos precisam reconhecer

a heterogeneidade que caracteriza o cotidiano escolar desta modalidade, como

uma referência, que evidencia a urgência de se aprender a conviver com a

democracia, com as diferenças e contradições, tornando-as recursos

necessários ao permanente processo individual e coletivo de produção do

conhecimento. Esse movimento democrático de gestão escolar exige reflexões

profundas sobre as práticas realizadas, sobre como compreendemos o

processo, ou os processos de aprendizagem que ocorrem nesta diversidade,

sobre o que consideramos conhecimento essencial e como percebemos a

manifestação das aprendizagens e segundo quais critérios.

É necessário extrapolar o sentido da educação proposta para as

classes populares baseado em processos de subordinação, para a produção

de um projeto discutido, tecido e validado pelas vozes populares, por meio de

múltiplos diálogos com os diferentes segmentos sociais, iniciando-se este

processo na própria escola, com a participação ativa de toda comunidade

escolar, associação de moradores, empresas e demais representantes da

sociedade. Essas ações promovem oportunidades de participação e

constituição de projetos que incorporam na prática pedagógica as experiências

e necessidades dos sujeitos da EJA.

Como ensina Steban (2007, p.167), os diálogos redefinem as relações,

criam possibilidades, alternativas de partilha do poder e do saber, constituindo

processos, práticas e projetos, em cujas tramas também podem ser

encontrados insucessos, erros, dúvidas, impossibilidades, porém

compreendidos como características das interações humanas e não como

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incompetência de alguns sujeitos individualizados e deslocados do contexto do

qual participam.

A escola pública amplia sua qualidade ao aprender com os movimentos

de educação popular a incorporar, em seu cotidiano, o trabalho coletivo, as

relações solidárias, os diferentes saberes e a participação das diferentes

pessoas. O encontro da escola pública com a educação popular produz

processos reflexivos e atuações que podem gerar práticas que ampliem a face

democrática da escola e aprofundem seus vínculos com os históricos

movimentos de emancipação humana:

O conhecimento que dá conta da concepção de educação que pressuponha a compreensão do mundo em sua totalidade e em suas contradições, somente será aquele que for o produto do movimento histórico e social produzido e apropriado na totalidade, entendendo-a como a expressão dos condicionantes políticos, sociais, econômicos, culturais e históricos. O ponto de partida para a sua apreensão é sempre uma representação empírica, caótica e imediata da realidade. Este pode ser o conhecimento empírico, popular ou de senso comum, mas que em seu movimento de problematização, instrumentalização e sistematização pretende ser o ponto de chegada as abstratas formulações conceituais, agora como produtos da totalidade ricamente articulada e compreendida. (PARANÁ, 2010b, p.33).

Nesse novo cenário, se insere a necessidade de que a comunidade

escolar, direção, equipe pedagógica, funcionários e docentes procurem

conhecer as diferentes práticas de atendimento da EJA, seus educandos, suas

necessidades e expectativas, apostando nessa modalidade como forma de

promoção humana, analisando que para muitos será a última chance de

escolarização. Essas ações poderão desenvolver o sentimento de pertencer a

um novo projeto educativo de direito.

As propostas e práticas pedagógicas devem superar a cultura

alicerçada historicamente no aligeiramento, dos conceitos tradicionais de

suplência, além de ultrapassar a educação compensatória, à favor de uma

visão ampla que responda as aspirações dos diversos sujeitos da EJA.

Conforme as Diretrizes Curriculares da EJA do Estado do Paraná

(2006), o desafio desta modalidade está em reorganizar o trabalho pedagógico

com o objetivo de desenvolver processos de formação humana, articulados a

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contextos sócio-históricos, a fim de que se reverta a exclusão e se garanta aos

jovens, adultos e idosos o acesso, a permanência e o sucesso no início ou no

retorno desses sujeitos à escolarização básica como direito fundamental.

Atualmente incluem-se no contexto da EJA os adolescentes de quinze

a dezessete anos, conforme dispositivo do Art. 38, parágrafo 1 inciso I da Lei n

9394/96 considerando idade mínima para os cursos e exames da EJA do

Ensino Fundamental, quinze anos completos.

A Resolução CNE/CEB n 3/2010, no ART. 5, inciso II, observa:

II – incentivar a apoiar as redes e sistemas de ensino a estabelecerem, de forma colaborativa, política própria para o atendimento dos estudantes adolescentes de quinze a dezessete anos, garantindo a utilização de mecanismos específicos para esse tipo de alunado que considerem suas potencialidades, necessidades, expectativas em relação à vida, às culturas juvenis e ao mundo do trabalho, tal como prevê o artigo 37 da Lei n 9394/96, inclusive com programas de aceleração da aprendizagem, quando necessário.

Portanto, após a formalização da regra da prioridade para o

atendimento da escolaridade obrigatória, com o advento da LDB e

recentemente da Resolução 03/2010 do CNE/CEB, a modalidade EJA passa a

atender uma nova demanda no Ensino Fundamental, configurando o grupo

daqueles que se evadiram da escola pelas condições de sobrevivência da

família marcada muitas vezes por histórias margeadas pela exclusão social de

todas as formas. Geralmente são meninos e meninas que lutam pela

sobrevivência nas cidades e no campo. Filhos de famílias pobres, moradoras

de localidades periféricas que convivem com todas as formas de discriminação

e marginalização social. Muitos inseridos precocemente no mercado de

trabalho informal, doméstico ou no comércio local. Alguns já assumindo a

condição de pai e mãe.

Dos 705 alunos matriculados no CEEBJA Rio Negro no ano letivo de

2012, 302 são do Ensino Fundamental e 401 do Ensino Médio. 48% são do

sexo feminino e 52% do sexo masculino. A maior demanda atendida está com

idade entre quinze a trinta anos, sendo que desta, 30% são menores de

dezoito anos, matriculados no Ensino Fundamental - EF. Dos alunos menores,

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34% estudam no período vespertino e 66% estudam a noite por já estarem no

mercado de trabalho. Esse aumento da matrícula de alunos menores no EF

justifica-se pela Resolução CNE/CEB 3/2010 e Deliberação 05/2010, CEE/PR:

considera a idade mínima de 15 (quinze) anos completos, para matrícula no

Ensino Fundamental, ofertado na modalidade Educação de Jovens e Adultos e

o total da carga horária do curso do Ensino Fundamental - Fase II passa a ser

de 1600 horas.

O acesso dos adolescentes na EJA aos 15 anos colocou a escola em

conflito, pois esta faixa etária além de alterar, maximiza a diversidade da EJA.

Somente no ano letivo de 2011, 25% dos alunos matriculados no Ensino

Fundamental são menores egressos do ensino regular e em 2012 atingiu 30%

dos alunos, número que vem crescendo consideravelmente. O levantamento

de dados referente a esta parcela dos estudantes, apresenta que a maioria

desses menores quando ingressam na EJA apresentaram e apresentam

defasagens na aprendizagem, somam inúmeras reprovações e aumentam o

número de evasão nesta modalidade. Estes alunos, excluídos sócia,

econômica e culturalmente da sociedade, referem-se ao processo de exclusão

de todas as formas e práticas ainda presentes na escola.

Pensar numa política de inclusão escolar implica em compreender que a

exclusão que a escola produz e/ou reproduz, se insere num projeto de

sociedade na qual a diversidade e as contradições se apresentam, afastando-

se da cultura da hegemonia historicamente pensada pela escola e pela própria

sociedade. A exclusão social é resultado constante e crescente dos

desdobramentos do modo de produção capitalista. Neste sentido,

reconhecemos que a escola não vai conseguir sozinha resolver o problema da

exclusão que é social, política, econômica e cultural. O papel fundamental da

escola é desvelar as causas da exclusão, de possibilitar a vivencia de práticas

inclusivas, tanto no conhecimento, quanto nas formas de participação no

espaço escolar.

4 Conclusão

“Refletir sobre educação é pensar a pessoa, em qualquer etapa da sua vida, é discernir o homem e a mulher no seu tempo histórico, nas

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relações que esses estabelecem consigo e com a natureza; é desvendar a organização social do mundo, o lugar das pessoas nesse mundo, o porquê do modo de vida de cada um; é pensar as identidades, as razões para ser o que se é ou para as suposições elaboradas em torno de si mesmo e do outro; é discutir linguagens; é conhecer as circunstâncias da vida humana, para mantê-las ou para transformá-las; é ação compromissada com a busca de melhorias na qualidade de vida das pessoas.” (SOARES, 2006, p.203)

Neste contexto o desafio do pedagogo está em organizar o trabalho

pedagógico com a intenção de buscar incessantemente o desenvolvimento de

processos de formação humana em sintonia com os contextos históricos de

seus educandos, com objetivo de reverter à cultura da exclusão, garantindo

aos adolescentes, jovens, adultos e idosos o acesso, a permanência e o

sucesso no retorno ou na continuidade da escolarização básica, como direito

fundamental e subjetivo. Pedagogos, diretores, professores e profissionais da

educação necessitam reconhecer a heterogeneidade que faz parte da

Educação de Jovens e Adultos, com suas diferenças e contradições, como um

recurso para reflexões sobre as práticas desenvolvidas, sobre os diferentes

processos e tempos de aprendizagem que ocorrem na diversidade presente

atualmente nesta modalidade.

Aí está à essência do trabalho do pedagogo na EJA - a mediação do

trabalho coletivo -, em função da organização do trabalho pedagógico por

atender a esta pluralidade, o que exige mediação no processo ensino-

aprendizagem, refletindo com a equipe docente e toda comunidade escolar a

diversidade destes educandos e o direito a educação pública de qualidade.

Ao pedagogo cabe o desafio de coordenar a reflexão e a tomada de

decisões, em parceria com a direção, em todas as dimensões e espaços

pedagógicos de gestão, buscando formas de participação democrática para

que todos assumam as responsabilidades das ações pedagógicas,

administrativas e financeiras da instituição escolar, tornando o papel da direção

e equipe pedagógica indissociável. Para isso é necessário superar a visão

burocrática e o consequente trabalho fragmentado, ainda presente no interior

da escola.

A organização do trabalho pedagógico via gestão democrática somente

será possível quando o diretor e o pedagogo assumirem o papel de gestores

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da escola, reconhecendo a educação como um ato intencional para a

promoção humana, comprometidos e buscando o comprometimento da

comunidade escolar pela participação com o objetivo de propor um novo

projeto de escola e de sociedade.

O Projeto Político Pedagógico é o elemento norteador de todo trabalho

pedagógico, que se refere a todas as ações que envolvem o processo de

aprendizagem na relação professor-aluno e objeto do conhecimento,

ultrapassando a idéia gerencialista de gestão que acredita que o projeto é

somente um documento burocrático para atender as normativas vigentes.

O pedagogo tem por função precípua organizar e coordenar

democraticamente a elaboração, implementação, execução e avaliação

contínua do projeto da escola expresso no Projeto Político Pedagógico,

oportunizando suporte teórico e metodológico; articulando a organização

pedagógica da EJA entre o tempo pedagógico e o tempo escolar, pautados em

formas diferenciadas de seleção, organização, tratamento metodológico dos

conteúdos e os critérios de avaliação, observando as especificidades desta

modalidade e suas formas de oferta das disciplinas, promovendo ainda

processos de construção de projetos que incorporem as necessidades e

experiências dos educandos da EJA;

A intervenção pedagógica, vinculada ao material didático-pedagógico

produzido a partir da formação continuada do PDE, e realizada no CEEBJA Rio

Negro, apresentou como desafios à equipe pedagógica, incentivar e coordenar

a participação de todos os profissionais e comunidade escolar nos mecanismos

de gestão democrática, conduzindo e organizando reuniões, promovendo e

incentivando oportunidades de diálogo no interior da escola, seja nas horas-

atividade, nos conselhos de avaliação, no conselho escolar, na organização

estudantil, na reunião pedagógica de pais, professores e demais profissionais,

reconhecendo que a participação na gestão não é espontânea e sim construída

no dia-a-dia da escola.

Cabe aos pedagogos na escola alterar a lógica do planejamento escolar,

ainda pautado em paradigmas burocráticos. Isso somente será possível

quando o mesmo assumir a formação continuada de todos os profissionais da

educação que trabalham na modalidade EJA, no sentido de aproximá-los da

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relação teórico-prática, que resulte na criação consciente de exercícios

democráticos, possibilitando um maior e melhor entendimento e mudanças nas

relações de poder que existem no interior da escola, na coordenação do

processo de ensino e de aprendizagem propostos no Projeto Político

Pedagógico, intervindo constantemente na organização do trabalho pedagógico

na sua totalidade histórica e concreta, buscando garantir a melhoria do trabalho

pedagógico com os educandos jovens, adultos e idosos trabalhadores.

Referências

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