38
UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ MARIA BELONI DOS SANTOS O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA CURITIBA 2015

O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

  • Upload
    vuhanh

  • View
    215

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

MARIA BELONI DOS SANTOS

O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE

JUSTIÇA

CURITIBA

2015

Page 2: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

MARIA BELONI DOS SANTOS

O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE

JUSTIÇA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Ciências

Jurídicas. Professor: Dr. Wagner Rocha D’Angelis.

CURITIBA

2015

Page 3: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

TERMO DE APROVAÇÃO

MARIA BELONI DOS SANTOS

O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE

JUSTIÇA

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel no Curso de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, __ de ________________ de 2015.

_______________________________________

Prof. Doutor Eduardo de Oliveira Leite

Coordenador do Núcleo de Monografias

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador:______________________________

Prof. Dr. Wagner Rocha D’Angelis

Faculdade de Ciências Jurídicas

Universidade Tuiuti do Paraná

Prof. ____________________________________

Faculdade de Ciências Jurídicas

Universidade Tuiuti do Paraná

Prof.____________________________________

Faculdade de Ciências Jurídicas

Universidade Tuiuti do Paraná

Page 4: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

Dedico este trabalho à minha mãe, Ema, e ao meu irmão Aroaldo que, por coração, me deram a inspiração e o apoio necessário para que o meu sonho se tornasse realidade.

Page 5: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

Agradeço a Deus pela oportunidade de evoluir. À minha mãe Ema e meu irmão Aroaldo. Ao meu orientador Wagner Rocha D’Angelis, pela compreensão, correções, dicas e paciência em me orientar. A esta Universidade pela oportunidade de cursar Direito, com um corpo docente excelente. Aos amigos pelo apoio, companheirismo e incentivo. A todos os funcionários e colaboradores da Universidade Tuiuti do Paraná, pelo respeito e cordialidade.

Page 6: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

“Posso não concordar com uma palavra do que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo."

- Voltaire.

Page 7: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

LISTA DE SIGLAS

CIJ – Corte Internacional de Justiça

ONU – Organização das Nações Unidas

TESL – Tribunal Especial para a Serra Leoa

TIDM – Tribunal Internacional de Direito do Mar

TPIR - Tribunal Penal Internacional para Ruanda

Page 8: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

RESUMO

Este trabalho visa fazer uma análise de como é o funcionamento da Corte Internacional de Justiça da ONU e como a ONU se comporta diante das situações em que é chamada a resolver conflitos nos tribunais de justiça. No presente trabalho, analisa-se o funcionamento do sistema jurídico internacional, apontando para o princípio da complementaridade e participação dos Estados. Citam-se ainda outros importantes tribunais no âmbito do direito internacional, tais como os Tribunais permanentes, como o Tribunal de Direito do Mar e o Tribunal Penal Internacional e, também, os Tribunais ad hoc. O método de pesquisa utilizado neste trabalho é a revisão sistemática de literatura, concentrando-se na coleta de dados em livros, artigos, dissertações, teses e revistas especializadas de Direito Internacional. Argumenta-se que a Corte Internacional de Justiça da ONU não é e, por enquanto, não será a última esperança para a correção dos graves erros e das grandes afrontas aos direitos dos povos. No entanto, é um importante passo da evolução humana em direção à pacificação dos povos. Palavras-chave: Direito Internacional. Sistema jurídico internacional. Corte Internacional de Justiça da ONU.

Page 9: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

ABSTRACT

This paper aims to make an analysis of how the operation of the UN International Court of Justice and as the UN behaves in the face of situations where it is called upon to settle disputes in courts of law. In this paper, we analyze the functioning of the international legal system, pointing to the principle of complementarity and participation of States. It is still cite other important courts in the context of international law, such as the permanent courts, such as the Law of the Sea Tribunal and the International Criminal Court and also the ad hoc tribunals. The research method used in this work is the systematic literature review, focusing on data collection in books, articles, dissertations, theses and journals of international law. It is argued that the International Court of Justice UN is not, and for now will not be the last hope to correct the serious errors and big affronts to the rights of people. However, it is an important step in human evolution towards the pacification of the people. Keywords: International right. International legal system. International Court of Justice UN.

Page 10: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 11

2 O SISTEMA JURÍDICO INTERNACIONAL ........................................................... 13

2.1 PRINCÍPIO DA COMPLEMENTARIEDADE: A PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS .................................................................................................................................. 13

2.2 TRIBUNAL INTERNACIONAL DE DIREITO DO MAR ........................................ 14

2.3 TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL ................................................................ 16

2.4 TRIBUNAIS “AD HOC” ........................................................................................ 19

3 DA CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA ........................................................ 22

3.1 ASPECTOS HISTÓRICOS .................................................................................. 22

3.2 ESTRUTURA ...................................................................................................... 23

3.3 OS JUÍZES AD HOC ........................................................................................... 25

3.4 A COMPETÊNCIA DA CORTE ........................................................................... 26

4 A CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA E AS IMPLICAÇÕES PARA O BRASIL ..................................................................................................................... 29

4.1 O BRASIL COMO ESTADO PARTE ................................................................... 29

4.2 AS DECISÕES DA CORTE COMO FONTE DE DIREITO INTERNACIONAL .... 30

4.3 POSICIONAMENTOS BRASILEIROS ................................................................ 31

CONCLUSÃO ........................................................................................................... 34

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 36

Page 11: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

11

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho visa fazer uma análise do funcionamento da Corte Internacional

de Justiça (CIJ), órgão da Organização das Nações Unidas (ONU) e como tal

organização se comporta diante das situações as quais é chamada para resolver os

conflitos nos tribunais de justiça. O questionamento central talvez seja o que a Corte,

pela força que representa, deveria ser mais atuante como nos casos de estrangeiros

condenados à morte, assim como nos casos de genocídios praticados contra

aqueles a quem deveria proteger.

Sendo a Corte um órgão da ONU, e esta uma instituição independente e de

soberania indiscutível, não se deveria esperar que fosse chamada a intervir. A sua

manifestação e interferência, nos casos envolvendo massacres e desrespeito aos

direitos humanos, por exemplo, deveria se dar de forma imediata. Dessa forma,

surgem diversos questionamentos, dentre eles o de que, sendo a Corte Internacional

de Justiça o órgão mais importante da ONU, qual o fator impeditivo de uma atuação

mais abrangente da mesma.

O presente trabalho se volta ao funcionamento do sistema jurídico

internacional, apontando para o princípio da complementaridade e participação dos

Estados, principalmente, para a compreensão de tal problema de pesquisa. Além

disso, cita, ainda, além da Corte Internacional de Justiça – que é instância judicial

originária da ONU – outros três importantes tribunais no âmbito do direito

internacional, que é o Tribunal de Direito do Mar, o Tribunal Penal Internacional e os

Tribunais ad hoc.

Traz-se à baila o papel e o funcionamento da Corte Internacional de Justiça, a

qual é responsável por resolver os litígios não solucionados depois de esgotadas as

tentativas nos seus Estados de origem. Tem esse trabalho o objetivo primordial de

buscar conceitos e entendimentos doutrinários acerca do tema.

De forma bastante específica, se busca analisar a estrutura institucional, as

partes recorrentes e a forma de acesso à Corte Internacional, além da questão da

eficácia das decisões da Corte à luz dos pressupostos normativos.

Destaque, também, para importância da CIJ em sua relação com o Brasil, país

que tem um relacionamento de proximidade muito grande não somente pelo

envolvimento em diversos litígios, mas pela relevância também dos nomes que o

representaram na mais alta Corte de Justiça da ONU.

Page 12: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

12

Por último, evidencia-se que esta Corte representa o foro de maior relevância

para a manutenção dos anseios da comunidade internacional e, consequentemente,

da manutenção do direito dos povos, mostrando-se extremamente necessária, uma

vez que a cooperação entre os povos é um objetivo bastante antigo no ordenamento

jurídico internacional.

Page 13: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

13

2 O SISTEMA JURÍDICO INTERNACIONAL

Pode-se dizer que a função do sistema jurídico internacional é de disciplinar

as relações e litígios existentes entre os Estados, os litígios entre as organizações e

os conflitos entre organizações e Estados.

O sistema jurídico internacional divide-se em instâncias autônomas e

descentralizadas, a saber: a) Corte Internacional de Justiça; b) Tribunal de Direito do

Mar; c) Tribunal Penal Internacional; d) Tribunais “ad hoc”.

Todos esses Tribunais observam o princípio da complementaridade, bem

como não mantém hierarquia de subordinação entre si.

2.1 PRINCÍPIO DA COMPLEMENTARIEDADE: A PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS

No funcionamento dos tribunais internacionais da ONU está presente um

princípio específico que é o da complementaridade.

Este princípio encontra-se nas características de todos os Tribunais

Internacionais. O Tribunal Penal Internacional, por exemplo, serve como um

instrumento de complementação às jurisdições penais existentes nos Estados

decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em 1998

(CARDOSO, 2012, p. 42).

De acordo com o princípio da complementaridade, ele vem para

complementar os sistemas judiciais dos Estados quando os mecanismos de

soluções são insuficientes. No entanto, com o apresentar dos argumentos dos

Estados, entendeu-se que seria importante presumir certa estabilidade e um

funcionamento adequado na solução das controvérsias pelos tribunais nacionais

(BIATO, 2002, p. 19).

Com o objetivo de alcançar a complementariedade como uma medida

concreta, foi preciso que se analisasse e se buscasse um ponto de equilíbrio entre

dois pontos importantes. A primeira ordem de questões a ser discutida é quanto à

soberania. Leva-se em consideração dentro dela o atributo de cada Estado em

garantir a aplicação da lei interna para todos os indivíduos pertencentes àquele

Estado, bem como na esfera penal, além da cível. Caso tenham sido descumpridos

os preceitos determinados no ordenamento jurídico penal, isto é, caso haver sido

cometidos crimes pelos indivíduos no território nacional, deverão ser impostas

Page 14: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

14

sanções penais, por meio de um processo sendo garantido ao acusado contraditório

e ampla defesa, como é o caso do Brasil. Além disso, a possibilidade, como

prerrogativa, do Estado em utilizar de coerção para a aplicação e cumprimento das

leis dentro do território. E, por último, a obrigação de ordem primária em promover e

assegurar o respeito aos direitos humanos (CARDOSO, 2012, p. 43).

Em suma, para a garantia de tais expectativas, após a falha, por assim dizer,

do ordenamento jurídico interno, há a possibilidade de se acessar instâncias judiciais

internacionais.

O ponto incisivo sobre a garantia dos direitos humanos, acima referida, em

razão de atos em detrimento do respeito à dignidade da pessoa humana, deve-se ao

fato de que em repetidas situações, violações graves e sistemáticas dos direitos

humanos foram cometidas impunemente por indivíduos em nome dos Estados, tanto

no âmbito interno quanto no plano internacional (CARDOSO, 2012, p. 43).

Os direitos humanos e a dignidade da pessoa humana, como um todo, é a

premissa mais importante nos ordenamentos jurídicos por todo o mundo,

principalmente no âmbito internacional, onde o clima de tensão impera, sendo foco

uma cooperação jurídica em diversas matérias, onde a central é o bem-estar e a

harmonia entre os povos.

No sistema jurídico internacional encontram-se alguns Tribunais específicos

capitaneados pela ONU. São eles: a) A Corte Internacional de Justiça; b) O Tribunal

de Direito do Mar; c) O Tribunal Penal Internacional; e d) Tribunais ad hoc.

Entre os Tribunais ad hoc cita-se o Tribunal ad hoc de Haia, para crimes de

genocídio da ex-Iugoslávia; o Tribunal ad hoc de Arusha, para crimes de genocídio

em Ruanda; e o Tribunal ad hoc de Serra Leoa.

A CIJ, ponto central deste estudo, será objeto de análise no Capítulo 3. Já os

demais Tribunais passam a ser comentados a seguir.

2.2 TRIBUNAL INTERNACIONAL DE DIREITO DO MAR

Na análise do Tribunal Internacional de Direito do Mar (TIDM), órgão

chancelado pela ONU, é preciso falar de alguns aspectos envolvendo tanto a criação

como os desdobramentos de suas decisões.

Page 15: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

15

O Tribunal de Direito do Mar foi legitimado pela Convenção de Direito do Mar

de 1982 adquirindo jurisdição universal sobre qualquer interpretação dos textos

referentes a direito marítimo.

O Tribunal foi instalado em 1996, em Hamburgo, na Alemanha. A criação

dele, em 1994, constitui-se como um grande avanço para a segurança jurídica do

sistema jurídico Internacional, sendo resultado, também, do movimento mundial para

disciplinar a sua delimitação e contribuição jurisprudencial, a utilização de um

patrimônio comum da humanidade economicamente relevante e, além disso, espaço

de disputas e de potenciais conflitos entre os povos, e espaço biodiverso de

fundamental importância para a própria manutenção da espécie humana

(MENEZES, 2014, p. 491).

Mesmo instalado em Hamburgo, sua atuação não tem limitação territorial,

podendo exercer suas funções onde achar desejável.

O TIDM tem como competência todas as disputas que versem sobre a

interpretação ou aplicação da Convenção de Montego Bay e acordos multilaterais

que foram inseridos na Convenção sobre o Direito do Mar (MENEZES, 2014, p.

491). Segundo Menezes (2014, p. 243), “a jurisdição do Tribunal é imperativa nos

casos que se relacionem liberação de embarcações e de seus respectivos grupos”.

O TIDM é formado por um grupo de vinte e um juízes independentes que são

indicados com o fundamento da distribuição geográfica com o fim de julgar litígios

sobre o direito do mar entre os Estados-membros. Esses juízes devem possuir:

“reputação ilibada, integridade moral, notável saber jurídico e de reconhecida

competência na matéria sobre o direito do mar” (MENEZES, 2014, p. 505).

Observa-se que no sistema jurídico internacional o Tribunal Internacional de

Direito do Mar é uma corte que tem um objetivo universal igual aos demais tribunais,

a pacificação dos povos.

Um ponto bastante importante deste Tribunal é que ele é bastante acessível e

a todos, tanto empresas públicas, como pessoas físicas ou jurídicas em geral.

A Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar trouxe exatamente o

que se precisa saber sobre tal Tribunal, uma vez que fica claro que os Estados

Partes precisam de uma jurisdição internacional que cuide dos direitos do mar, que

vão da preservação das espécies até a navegação de embarcações em águas

internacionais.

Page 16: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

16

Nesta linha, entende-se que os atores que transgredirem regras internacionais

de direitos humanos ou outras no plano internacional devem receber sanções. E

nessa linha de raciocínio, aparece outro Tribunal importante da ONU, o Tribunal

Penal Internacional, que se analisa a seguir.

2.3 TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

O Tribunal Penal Internacional (TPI) foi criado para passar uma ideia de

segurança à sociedade internacional, afirmando que a justiça deve estar acima de

todos. O TPI foi criado com base em um tratado internacional intitulado Estatuto de

Roma, assinado por 120 países, em 1998.

Nele, se processam os crimes de maior gravidade e de alcance internacional,

conforme estabelecido pelo próprio Estatuto supracitado. Sua sede é em Haia, nos

países baixos, mas poderá funcionar em outro local sempre que entender

conveniente, conforme dispõe o artigo 3º do Estatuto de Roma.

Apesar de intensos debates, no Estatuto de Roma prevaleceu a tese de

consentimento automático, pelo qual, foram afastadas as opções que previam

cláusulas opcionais, ainda que algumas delegações houvessem manifestado

preferência por mecanismo rígido para crimes de guerra e crimes contra a

humanidade, é o Tribunal Penal Internacional que assume o processamento e

julgamento de tais crimes quando ocorrem (CARDOSO, 2012, p. 67).

No Brasil, por exemplo, o Tribunal Penal Internacional somente irá interferir,

caso o Estado for omisso, uma vez que a Constituição Federal proíbe

terminantemente quaisquer situações degradantes, como seria o caso da tortura e o

genocídio, por exemplo. Caso fosse omisso na aplicação da pena e na apuração dos

fatos, o TPI assume o processamento e julgamento do feito, por uma questão de

ampla jurisdição e por existir para proteger a integridade e harmonia entre os povos,

sendo órgão da ONU.

Há uma corrente doutrinária que afirma que a vocação do TPI é universal.

No plano teórico, a não singularização de situações particulares é um dos

traços distintivos do Tribunal Penal Internacional em comparação com os órgãos ad

hoc, que foram criados para julgar crimes cometidos em áreas geográficas

específicas. Concebido para atuar em contexto territorial o mais amplo possível, um

dos objetivos dizia respeito à possibilidade de a jurisdição do TPI ser exercida de

Page 17: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

17

modo geral e uniforme, gerando um intenso debate acerca do tema. O artigo 13 do

Estatuto de Roma (que foi recepcionado pelo Decreto nº 4.388/2002 no Brasil)

dispõe sobre o exercício da jurisdição do TPI, veja-se:

Artigo 13. Exercício da Jurisdição. O Tribunal poderá exercer a sua jurisdição em relação a qualquer um dos crimes a que se refere o artigo 5º, de acordo com o disposto no presente Estatuto, se: a) Um Estado Parte denunciar ao Procurador, nos termos do artigo 14, qualquer situação em que haja indícios de ter ocorrido a prática de um ou vários desses crimes; b) O Conselho de Segurança, agindo nos termos do Capítulo VII da Carta das Nações Unidas, denunciar ao Procurador qualquer situação em que haja indícios de ter ocorrido a prática de um ou vários desses crimes; ou c) O Procurador tiver dado início a um inquérito sobre tal crime, nos termos do disposto no artigo 15.

Nota-se que o Tribunal Penal Internacional é resultado de um processo de

busca pela Justiça, que se originou dos tribunais penais militares, principalmente

aqueles criados no término da 2ª Guerra Mundial. O Tribunal Penal Internacional é

um instrumento importante de combate a crimes de guerra e crimes contra a

humanidade (PEIXOTO,1998, p. 32).

Conforme o próprio Estatuto de Roma, os crimes de natureza mais grave de

competência do Tribunal Penal Internacional, são os crimes de homicídio,

extermínio, escravidão, deportação ou transferência forçada de uma população,

prisão ou outra forma de privação da liberdade física grave, em violação das normas

fundamentais de direito internacional, tortura, agressão, escravatura, prostituição

forçada, esterilização forçada ou qualquer outra forma de violência do campo sexual

de gravidade comparável, bem como perseguição de um grupo ou coletividade que

possa ser identificado, por motivos de opção pessoal. Além desses, o

desaparecimento forçado de pessoas e apartheid, bem como quaisquer outros atos

desumanos nesta mesma linha (ESTATUTO DE ROMA, 1998, artigo 7º).

Tais crimes, elencados no rol dos crimes contra a humanidade, o são porque

para serem caracterizados devem ser direcionados a uma população civil, como

ataque generalizado ou sistemático, como bem traz o enunciado do próprio artigo 7º.

Essa forma didática de apresentação contida no Estatuto de Roma demonstra o

quanto é importante o papel do TPI na ordem jurídica internacional na harmonia dos

povos e para a compreensão dos Estados Partes.

Page 18: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

18

Além dos crimes contra a humanidade, há o genocídio, previsto no artigo 6º

do Estatuto. Tal Estatuto, por sua vez, traz o próprio conceito de genocídio para fins

de julgamento no TPI e interpretação da palavra no plano internacional. Não se fala

em qualquer genocídio, mas naquele referido e trazido pelo Estatuto. Veja-se:

Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por "genocídio", qualquer um dos atos que a seguir se enumeram, praticado com intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, enquanto tal: a) Homicídio de membros do grupo; b) Ofensas graves à integridade física ou mental de membros do grupo; c) Sujeição intencional do grupo a condições de vida com vista a provocar a sua destruição física, total ou parcial; d) Imposição de medidas destinadas a impedir nascimentos no seio do grupo; e) Transferência, à força, de crianças do grupo para outro grupo.

Além desses, os crimes de guerra e o crime de agressão, este último tendo

que ter uma disposição em que se defina o crime e as condições em que o Tribunal

terá a competência para interferir e julgar.

A existência do Tribunal Penal Internacional representa uma conquista da

humanidade e garante que os responsáveis pelos crimes contra a humanidade não

ficarão impunes. Quanto aos crimes de competência do TPI, trazidos pela ONU

como core crimes, são os crimes de uma gravidade maior no plano internacional,

conforme supracitados (GARCIA, 2015, p.1).

Um ponto relevante a se observar é que pelo próprio texto legal se percebe

que o Tribunal não tem a função de tomar para si todas as liberdades concernentes

a qualquer crime que for cometido dentro do território nacional do Estado Parte, mas

sim o de dar apoio e subsídio quando o crime chocar a tal ponto o juiz singular de

competência interna que o mesmo não conseguirá emitir um julgamento sem estar

envolvido emocionalmente.

Quanto à composição do Tribunal, há a presidência, as seções de recurso, de

julgamento e de instrução, o gabinete do procurador e a secretaria, descritos

respectivamente nos artigos 38, 39, 42 e 43, entendidos como próprios órgãos do

TPI.

Page 19: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

19

2.4 TRIBUNAIS “AD HOC”

No sistema jurídico internacional existe a possibilidade de criação dos

Tribunais ad hoc, cuja característica é serem temporários ou provisórios, e com o fim

de julgar e punir algumas condutas relacionadas a crimes de guerra e desrespeito

aos direitos humanos.

Um exemplo desse tipo de tribunal foi o estabelecido em Ruanda para julgar

os responsáveis pelo massacre ocorrido no país após confronto entre duas tribos

rivais: Bahutu (atualmente Hutus) e Batutsi (hoje Tutsis). O grupo maior era de Hutus

que, em 1994, promoveu um verdadeiro massacre contra o grupo minoritário Tutsi.

Segundo Castro (2010):

Culturalmente, estes grupos detinham a mesma língua e os mesmos costumes; contudo, a influência externa foi determinante para a transformação social do país na medida em que a definição de fronteiras e o estabelecido da burocracia colonial deram margem a uma luta por poder sobrepujante e discriminatório.

O Tribunal Penal Internacional para Ruanda (TPIR) foi criado pelo Conselho

de Segurança da ONU pela Resolução nº 955/1994 e tem sede em Arusha

(Tanzânia). O TPIR foi estabelecido para julgar os responsáveis pelo genocídio e

outras sérias violações às leis humanitárias internacionais do país (AKYIAMA, 2014,

p. 4). O TPIR julgou e condenou vários responsáveis pelo genocídio em Ruanda, e

continua em funcionamento.

Outro conhecido Tribunal ad hoc foi o estabelecido em Serra Leoa. O Tribunal

Especial para Serra Leoa tinha como objetivo julgar e condenar os responsáveis

pelos massacres promovidos em uma década de guerra civil naquela região

africana. A instalação de um tribunal internacional específico àqueles fatos decorreu

de um pedido do então presidente de Serra Leoa, Ahmed Kabbah, em junho do ano

2.000, por não ver segurança jurídica nas instituições do País. Neste sentido, De

Paula (2014, p. 44) relata:

O presidente Kabbah, diante da total destruição do sistema judiciário de Serra Leoa, enviou uma carta em junho de 2000 ao Secretário-Geral da ONU requerendo ajuda da Organização para a instituição de um tribunal de caráter especial, dotado de mandato para julgar os maiores responsáveis por graves violações ao direito humanitário no território serra-leonês. Em agosto de 2000, o Conselho de Segurança aprovou a Resolução 1.315, em que autorizava a criação de um “tribunal independente e de caráter

Page 20: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

20

especial” e recomendava que a jurisdição de tal corte incluísse crimes contra a humanidade, crimes de guerra e outras sérias violações ao direito humanitário internacional, além de crimes relevantes sob a legislação serra-leonesa, concedendo ao Tribunal seu caráter híbrido. Seria sediado em Freetown, capital de Serra Leoa, de modo a facilitar os procedimentos.

O Tribunal Especial para a Serra Leoa (TESL) foi um tribunal estabelecido de

forma diferente dos outros de caráter temporário, porque foi mediante acordo entre o

governo de Serra Leoa e a ONU, na modalidade de tribunal híbrido, ou seja,

harmonizando a lei interna com a lei externa.

Assim sendo, em agosto de 2000, o Conselho de Segurança aprovou a

Resolução 1.315, em que autorizava a criação do tribunal com sede em Freetown,

com jurisdição sobre crimes contra a humanidade, crimes de guerra e outras sérias

violações ao direito humanitário internacional (CONSELHO DE SEGURANÇA DA

ONU, 2000).

Este tribunal entrou para a história, principalmente, porque nele foi

condenado, em 2012, a 50 anos de prisão, o ex-presidente da Libéria, Charles

Taylor, por colaborar e ser cúmplice de múltiplas atrocidades cometidas por uma

força rebelde no país vizinho a Serra Leoa (TERRA, 2012).

Na mesma linha, cita-se o Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia.

Esse tribunal pretendia julgar e condenar os responsáveis pelo massacre étnico na

região dos Balcãs, como bem colocado por Santos Júnior (2014), veja-se:

Os conflitos na região da ex-iugoslávia eram de natureza étnica, e após um decreto presidencial de Slobodan Milosevicque revogava o estatuto especial de autonomia das Províncias de Vojvodina e do Kosovo, reconhecido pela Constituição iugoslava, vindo a ameaçar os regimes políticos das outras repúblicas. O conselho de Segurança da ONU condenou as ações de violação aos Direitos Internacional Humanitário por decorrência dos conflitos, colocando em risco a paz e segurança internacional.

O Tribunal Penal Internacional ad hoc para a antiga Iugoslávia foi

estabelecido por determinação da Resolução n. 827 do Conselho de Segurança das

Nações Unidas, de 25 de Maio de 1993, com o objetivo de dar uma resposta ao

problema das inúmeras vítimas dos crimes cometidos durante as Guerras Iugoslavas

que resultou na fragmentação em diversos Estados do antigo território iugoslavo.

Principalmente, ele foi instalado com o objetivo de julgar crimes de genocídio, mas

também crimes contra a humanidade e crimes de guerra (estes, com base nas

Convenções de Genebra de 1949).

Page 21: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

21

O Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia foi um passo importante

em direção à punição dos responsáveis por crimes de guerras e massacre de

caráter étnico. De acordo com Santos Júnior (2014), o Tribunal condenou cerca de

160 pessoas “por sérias violações ao Direito Humanitário Internacional, também

levado a prisão pelo tribunal o então presidente da Sérvia Slobodan Milosevic sob a

acusação de genocídio e crimes contra a humanidade”.

Dessa forma, após relato sucinto sobre os demais mecanismos do sistema

jurídico internacional, percebe-se a estrutura capitaneada pela ONU de Tribunais

que possuem jurisdição e competências específicas para possíveis conflitos

existentes entre os Estados.

Nesta linha, é importante aprofundar comentários acerca do papel da Corte

Internacional de Justiça da ONU, objeto de estudo do presente trabalho

monográfico, conforme se analisa a seguir.

Page 22: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

22

3 DA CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA

3.1 ASPECTOS HISTÓRICOS

A Corte Internacional de Justiça da ONU encontra-se sediada em Haia, nos

Países Baixos. De acordo com Piovesan (2002, p. 34), essa cidade tem um

importante valor histórico, especialmente para o Direito Internacional, pois nela

ocorreram as duas importantes Convenções: a Primeira Convenção para a

Resolução Pacífica de Controvérsias Internacionais (1899) e a Segunda Convenção

para a Resolução Pacífica de Controvérsias Internacionais (1907). Nesta última

convenção, o advogado brasileiro Ruy Barbosa teve importante papel, adquirindo a

alcunha de “Águia de Haia”.

Em Haia, foi instalada a Corte Internacional em 1945, em substituição à Corte

Permanente de Justiça Internacional (CPJI), que se vinculava à extinta Sociedade

das Nações. Segundo Farache (2010), o fundamento para esta alteração está

disciplinado no artigo 92 da Carta das Nações Unidas, que dispõe:

Artigo 92. O Tribunal Internacional de Justiça será o principal órgão judicial das Nações Unidas. Funcionará de acordo com o Estatuto anexo, que é baseado no Estatuto do Tribunal Permanente de Justiça Internacional e forma parte integrante da presente Carta.

Inicialmente, esta corte era denominada Corte Permanente de Justiça

Internacional (CPJI). De acordo com Rezek (2005, p. 356), esse Tribunal não se

constitui como uma inovação no cenário mundial, pois já havia existido outro órgão

no âmbito internacional com competência parecida. Explica Rezek (2005, p. 368):

Após o término da Segunda Guerra Mundial, a Corte de julgamento de Haia ressurgiu na mesma sede, no entanto, com outro nome: Corte Internacional de Justiça (CIJ), e constitui como presente na Carta da ONU, um órgão dessa organização. Assim, o Estatuto da Corte voltou a ser o que havia sido editado em 1920, conservando-se até a numeração dos artigos.

Desta forma, a Corte Internacional de Justiça da ONU constituiu-se como um

órgão de cunho internacional, com regramento (estatuto) específico, tratando do seu

funcionamento e dos procedimentos para o julgamento dos casos e possíveis

consultas postas à sua apreciação.

Page 23: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

23

Importante destacar que é o principal órgão judiciário das Nações Unidas,

com função principal de solucionar, tendo em vista o direito internacional, as

disputas legais submetidas por Estados, prestando assistência por meio de

pareceres quando consultada (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO - USP).

3.2 ESTRUTURA

A Corte Internacional de Justiça da ONU é composta por quinze juízes eleitos,

que são independentes e efetivos. De acordo com Marques (2010), esses juízes

possuem mandato de nove anos, sendo possível a reeleição uma vez; no entanto, é

vedado que dois juízes de um mesmo Estado integrem a Corte. Sobre o rodízio dos

membros, acrescenta o autor que “as eleições são a cada três anos e ocorrem em

Nova Iorque”.

Uma crítica por parte da doutrina se refere ao fato de que os juízes deveriam

ser escolhidos pela sua competência e não com relação a sua nacionalidade. Para

Marques (2010), se esse fosse o critério, as votações, não gerariam distinções na

escolha dos juízes por influência dos Estados Permanentes do Conselho de

Segurança da ONU.

Importa ressaltar que cada país membro permanente do Conselho de

Segurança tem um juiz indicado para atuar na Corte Internacional. É o que

reconhece Rezek (2005, p. 540), conforme se vê:

Na realidade vê-se que determinados países — membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU — sempre tiveram na composição da Corte um nacional seu. Tal o caso da França, do Reino Unido, dos Estados Unidos e da Rússia. É também, desde os anos oitenta, o caso da China.

Tal preferência é embasada e autorizada pelo Estatuto da Corte Internacional

de Justiça.

No mesmo sentido, Accioly (2012, p. 842) comenta que “mesmo o Estatuto

aduzindo que os juízes serão eleitos sem consideração à sua nacionalidade, na

prática, a Assembleia Geral e o Conselho se atêm às indicações dos cinco grandes

grupos da organização”.

A sua imparcialidade e suas posturas perante a sociedade em que vive são

fundamentais que sejam avaliadas, uma vez que tais julgadores terão em suas mãos

Page 24: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

24

as causas mais importantes do mundo. O mesmo entendimento no que tange esta

matéria é apontado por Husek (2012, p. 223):

Serão elegíveis os juízes que tenham uma alta integridade moral e possuam condições exigidas pelos respectivos Estados de que são nacionais para o desempenho das mais altas funções judiciárias, ou, então, que sejam jurisconsultos de reconhecida competência em direito internacional. O estatuto da corte disciplina que os juízes eleitos representem as mais altas formas de civilização e os principais sistemas jurídicos do mundo.

Com esse intuito de ter os mais renomados ordenamentos jurídicos

representados na Corte é que se procede às eleições. Os juízes membros do

Tribunal serão sempre juízes independentes. Eles devem fazer uma declaração em

audiência pública afirmando que serão imparciais. Seu mandato exige dedicação

exclusiva, razão pela qual é vedado ao magistrado exercer qualquer outra atividade

profissional durante o período em que figurará como juiz da Corte (MARQUES,

2010).

Sabe-se, no entanto, que em razão de questões puramente políticas, os juízes

que deveriam se tratar de renomados juristas, de reputação ilibada e notório

conhecimento jurídico, muitas vezes são trocados por indivíduos que possuem

ligação com os representantes de seu país que fazem parte do Conselho de

Segurança, portanto, muitas vezes, não se tem chances de incluir indivíduos que

fariam a diferença na Corte, por justamente o Conselho de Segurança ter

preferência de indicação.

Apesar disso, o Brasil tem um representante na Corte, que se trata do juiz

Antônio Augusto Cançado Trindade, cujo mandato finaliza em 2018. Além disso, o

Brasil já teve de 1946 a 1951 José Philadelpho de Barros e Azevedo, de 1951 a

1955 Levi Fernandes Carneiro, Francisco Rezek de 1996 a 2006 e José Sette-

Camara de 1979 a 1988 (INTERNACIONAL COURT OF JUSTICE, 2010).

Importa ressaltar que a Corte Internacional de Justiça é atuante, sendo que de

22 de maio de 1947 a 23 de outubro de 2015, 161 casos foram inscritos na lista

geral da Corte, mas em 2015 ainda nenhum caso foi inscrito (INTERNACIONAL

COURT OF JUSTICE, 2015).

As informações a respeito dos casos em discussão no Tribunal são públicas,

podendo ser acessadas por qualquer indivíduo.

Page 25: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

25

3.3 OS JUÍZES AD HOC

Analisando o Estatuto da Corte Internacional de Justiça, vê-se a previsão

quanto à possibilidade de funcionamento de uma demanda com juízes ad hoc. De

acordo com Marques (2010), a nomeação destes juízes é feita para que se atenda

ao princípio de igualdade entre os Estados, especialmente quando o Estado não

tiver um magistrado que os represente na Corte. Assim dispõe o art. 31 do Estatuto

da CIJ:

Os juízes da mesma nacionalidade de qualquer das partes conservam o direito de funcionar numa questão julgada pela Corte. Se a Corte incluir entre os seus membros um juiz de nacionalidade de uma das partes, qualquer outra parte poderá escolher uma pessoa para funcionar como juiz. Essa pessoa deverá, de preferência, ser escolhida dentre os que figuram entre os candidatos a que se referem os Artigos 4 e 5. Se a Corte não incluir entre os seus membros nenhum juiz de nacionalidade das partes, cada uma destas poderá proceder à escolha de um juiz, de conformidade com o parágrafo 2 deste Artigo. [...]. (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO – USP).

O referido artigo ainda disciplina que se houver diversos Estados interessados

numa mesma questão, ambos serão vistos como se fosse uma parte só. Neste

sentido, Husek (2012, p. 224) argumenta que essa previsão dos juízes ad hoc tem

como objetivo elevar o nível de credibilidade na Corte Internacional de Justiça,

porque os juízes escolhidos temporariamente estariam de certa forma mais próximos

das questões do Estado não representado por juiz permanente.

Por sua vez, Rezek (2005, p. 356) relata que a utilização de um magistrado ad

hoc é uma opção dada às partes, mas a participação deste juiz estará delimitada ao

processo. Os magistrados temporários compõem da mesma maneira que os

permanentes a Corte Internacional de Justiça no julgamento do caso específico.

Segundo Marques (2010, p. 7) esses juízes: “farão jus a todos os privilégios e

imunidades de que gozam todos os outros juízes, assim como deverão respeitar e

cumprir todas as obrigações que lhe correspondem”.

Sendo assim, a Corte Internacional de Justiça tem como objetivo promover

também a igualdade e preservar a credibilidade dada a ela por meio de tantos anos

de trabalho dedicado à comunidade internacional. Dessa forma ela promove um

ambiente harmonioso para as ações para as quais tem competência para atuar.

Page 26: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

26

3.4 A COMPETÊNCIA DA CORTE

A Corte Internacional de Justiça da ONU tem uma competência bastante

ampla. A respeito dela, Marques (2010, p. 8) observa que:

A Corte Internacional de Justiça possui competência ampla em razão da matéria (ratione materiae), na medida em que abrange todas as questões a ela submetidas pelos Estados, bem como todos os assuntos especialmente previstos na Carta das Nações Unidas e nos tratados e convenções em vigor.

A referida Corte é a de maior relevância no cenário internacional atual e em

alguns casos é denominada como “Corte Mundial”. Mas a sua importância é limitada

pela ausência de hierarquia jurídica internacional (HEE MOON JO, 2001, p. 235).

Significa dizer, por exemplo, que sua importância é definida quando faltam

mecanismos internos para resolver determinado conflito. Caso não seja possível

resolver, acionam-se os tribunais internacionais, que, de acordo com a matéria e

com o país envolvido, atuam para resolução do conflito, mas sem hierarquia externa.

Da mesma maneira que se procedeu à criação da CIJ, houve o surgimento de

tribunais internacionais pelo consentimento das partes envolvidas, como é o caso

tanto da Corte de Haia, quanto da Corte das Comunidades Europeias, da Corte

Europeia de Direitos Humanos e também da Corte Interamericana para Direitos

Humanos, entre outras (HEE MOON JO, 2001, p. 236).

A competência da Corte Internacional de Justiça da ONU é tão ampla que ela

pode apreciar qualquer matéria. De acordo com Accioly (2012, p. 445):

No tocante às matérias que poderá analisar (ratione materiae), sua competência estende-se a todas as questões que as partes lhe submetam, bem como a todos os assuntos previstos na Carta das Nações Unidas ou em tratados e convenções em vigor. No tocante a quem poderá postular perante a Corte (ratione personae), sua competência abrange apenas os estados, sejam ou não membros das Nações Unidas.

Dessa maneira, verifica-se que a competência da Corte abrange as matérias

que a Carta das Nações Unidas, Tratados Internacionais e Convenções disporem. O

Estado envolvido pode submeter à Corte a interpretação de um tratado internacional

e, ainda, a reparação pelo descumprimento de um compromisso e/ou acordo

Page 27: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

27

internacional. Essa previsão está disposta no artigo 36 do Estatuto da Corte,

conforme se vê abaixo:

Artigo 36. A competência da Corte abrange todas as questões que as partes lhe submetam, bem como todos os assuntos especialmente previstos na Carta das Nações Unidas ou em tratados e convenções em vigor. Os Estados, partes do presente Estatuto, poderão, em qualquer momento, declarar que reconhecem como obrigatória, ipso facto e sem acordos especiais, em relação a qualquer outro Estado que aceite a mesma obrigação, a jurisdição da Corte em todas as controvérsias de ordem jurídica que tenham por objeto: a) a interpretação de um tratado; b) qualquer ponto de direito internacional; c) a existência de qualquer fato que, se verificado, constituiria violação de um compromisso internacional; d) a natureza ou extensão da reparação devida pela ruptura de um compromisso internacional. As declarações acima mencionadas poderão ser feitas pura e simplesmente ou sob condição de reciprocidade da parte de vários ou de certos Estados, ou por prazo determinado. Tais declarações serão depositadas junto ao Secretário-Geral das Nações Unidas que as transmitirá, por cópia, às partes contratantes do presente Estatuto e ao Escrivão da Corte. Nas relações entre as partes contratantes do presente Estatuto, as declarações feitas de acordo com o Artigo 36 do Estatuto da Corte Permanente de Justiça Internacional e que ainda estejam em vigor serão consideradas como importando na aceitação da jurisdição obrigatória da Corte Internacional de Justiça, pelo período em que ainda devem vigorar e de conformidade com os seus termos. Qualquer controvérsia sobre a jurisdição da Corte será resolvida por decisão da própria Corte. (grifos no original).

A Corte Internacional de Justiça, de acordo com He Moon Jo (2001, p. 237),

tem competência dupla, uma vez que julga, de acordo com o Direito Internacional,

controvérsias jurídicas que lhe são submetidas por Estados e dá pareceres

consultivos sobre questões jurídicas submetidas por órgãos ou instituições

especializadas da ONU autorizadas a fazê-lo.

Acrescente-se, ainda, que nas decisões da Corte Internacional de Justiça da

ONU, a jurisprudência pode ser usada como ferramenta para determinar regras de

direito. De acordo com Mattos (2014, p. 496), isso ocorre quando há uma lacuna

normativa em que seja necessário decidir com base no Direito, podendo os juízes

recorrer, então, aos preceitos jurisprudenciais, às decisões de tribunais

internacionais, entre outros.

É importante pontuar que a jurisdição da CIJ é facultativa, conforme dispõe a

ONU. De acordo com Magalhães (2000, p. 102), pode-se aceitá-la ou não. Mas, se

Page 28: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

28

aceitou, mediante declaração formal, o país está obrigado a dar cumprimento à

decisão que vier a ser proferida.

Finalmente, vale acrescer que somente aos Estados soberanos é garantida a

capacidade de litigar perante a corte jurisdicional internacional. Ou seja, aos

indivíduos não é dada essa faculdade, porque quando da elaboração das regras da

Corte (Estatuto da Corte), os indivíduos não foram considerados sujeitos de direito

internacional para efeito de pleitearem seus direitos perante este organismo

(MAZZUOLI, 2010, p. 955).

Assim, os países e Estados é que litigarão mediante jurisdição da Corte

Internacional de Justiça.

Page 29: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

29

4 A CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA E AS IMPLICAÇÕES PARA O

BRASIL

4.1 O BRASIL COMO ESTADO PARTE

O Brasil como Estado parte da ONU não somente pode submeter seus litígios

à Corte Internacional de Justiça da ONU, como também pode conquistar vaga na

sua composição, como é o momento atual, em que o país tem um membro na Corte.

Observa-se que o Brasil já figurou como parte em alguns litígios na Corte

Internacional de Justiça da ONU. De acordo com Rezek (2005, p. 407), durante o

período de 1922 a 1940 a CPIJ julgou cerca de vinte nove casos contenciosos entre

Estados e emitiu pelo menos vinte e sete pareceres consultivos. E o Brasil faz parte

desse levantamento.

Neste particular, o Brasil esteve envolvido em uma controvérsia com a França

em 1927, que versava sobre empréstimos tomados pelo Brasil anos antes. Em 1929,

a CPIJ decidiu favoravelmente à França.

O Brasil é um país bastante ativo em relações internacionais, mas há um

motivo especial pelo qual se fala da Corte Internacional de Justiça. De acordo com

Martins (2015) a vinculação especial do Brasil com a Corte Internacional de Haia,

está intimamente ligada a um jurista renomado bastante conhecido

internacionalmente:

Não apenas no ideal do primado do direito nas relações entre os Estados - que é a sua razão de ser -, mas na própria história de nossa participação nesta instituição, que teve início antes mesmo da criação da Corte Internacional, com destaque para a grande atuação de Rui Barbosa: “O Águia de Haia”. Rui Barbosa foi um dos primeiros juízes eleitos para a Corte Permanente de Justiça Internacional, tendo recebido a mais alta votação na Assembleia da Liga das Nações.

Apesar de ter sido eleito para a Corte, Rui Barbosa não assumiu a cadeira no

Tribunal. Mesmo assim, Martins (2015) aduz a seu respeito que “a luta intelectual

que havia travado na Conferência da Haia na defesa do critério de escolha dos

magistrados da Corte deixou sua marca”.

Dessa forma, e tendo outros juristas brasileiros renomados, ocupado cargos

na Corte Internacional e dada a importância da mesma, o Brasil tem um

Page 30: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

30

relacionamento de proximidade muito grande com ela, não somente pelo

envolvimento em diversos litígios, mas pela relevância também dos nomes que o

representaram. Esta Corte representa o foro mais relevante para a manutenção dos

anseios da comunidade internacional e, consequentemente, da manutenção do

direito dos povos.

4.2 AS DECISÕES DA CORTE COMO FONTE DE DIREITO INTERNACIONAL

Assim como ocorre em muitos ordenamentos jurídicos, as decisões da CIJ

podem ser instrumentos importantes para interpretação e fundamentação de futuras

sentenças da Corte. De acordo com Lima (2010, p. 13):

Ainda que não se pudesse reconhecer expressamente a autoridade do precedente, os juízes da Corte ao estatuir sobre um determinado caso, no corpo das argumentações que precedem o dispositivo das sentenças, relembram casos antecedentes, suas tomadas de decisões anteriores e a maneira que a Corte seguiu determinado argumento.

Dessa maneira, baseando-se em precedentes de julgados anteriores, a Corte

Internacional de Justiça da ONU acaba tendo um norte sobre o posicionamento da

casa sobre casos parecidos, mesmo que sob composição diferente de membros.

Lima (2010, p. 14), prossegue lecionado que:

Este movimento resta sobremaneira translúcido no que se refere aos próprios procedimentos da Corte, na maneira como ela age em relação às suas normas processuais. A Corte, num movimento de legitimação de seus próprios julgados, acaba por moldar uma jurisprudência autorreferencial que dialoga e nas situações em que assume uma posição incongruente com suas decisões anteriores, explicita os motivos de sua distinção, em muito se aproximando da maneira de julgar adotada pelo sistema da common law.

Esse corpo de jurisprudência da Corte serve tanto no sentido de construir um

entendimento sobre casos semelhantes, como também para pontuar distinções e

novos entendimentos de acordo com a evolução do direito e do relacionamento

internacional entre os Estados. Mas os julgados anteriores não são a única forma de

fundamento da corte. Neste sentido, Lima (2010, p. 14), pondera:

É importante salientar que a Corte não usa direta e unicamente a autoridade dos julgados anteriores, mas a ele faz referência para embasar e solidificar o posicionamento assumido na nova contenda. Esse fenômeno começa a

Page 31: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

31

interessar a ciência do direito, em particular, os internacionalistas das décadas de 20 e 30 que com atenção se debruçam sobre este novel fenômeno que advém com a jurisdição permanente.

Nota-se que, além dos Tratados e Convenções Internacionais, o entendimento

da Corte Internacional de Justiça pode ser compreendido como um progressivo

desenvolvimento do direito internacional. Quando a Corte decide por um direito que

deve ser preservado acaba contribuindo para a criação de uma nova noção de

direito no plano internacional. Nesta linha, é importante ressaltar os apontamentos

de Martins (2015):

Uma sentença da CIJ é caracterizada pela obrigatoriedade de seu conteúdo e pela impossibilidade jurídica de recolocar em questão os pontos sobre os quais o tribunal já decidiu a título definitivo e irrevogável. Neste sentido, o artigo 60 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça, prevê claramente que a sentença prolatada pelo referido órgão é de natureza definitiva e sem recurso: “Artigo 60 - A sentença é definitiva e inapelável. Em caso de controvérsia quanto ao sentido e ao alcance da sentença, caberá à Corte interpretá-la a pedido de qualquer das partes”.

Dessa forma, entende-se que o preceito exposto no artigo 60 supracitado

apresenta uma finalidade dupla: 1) o caráter definitivo da sentença denotando uma

presunção do direito; e 2) no que concerne ao caráter imutável da sentença que ela

“corresponde ao termo imposto para a elaboração da norma individual”. Nesta toada,

cumpre apontar alguns posicionamentos dos Tribunais brasileiros que ensejaram

futuras provocações de outros Estados à Corte Internacional de Justiça (MARTINS,

2015).

4.3 POSICIONAMENTOS BRASILEIROS

O Brasil envolveu-se em algumas controvérsias com outros Estados, recentemente,

e resultaram no acionamento da Corte Internacional de Justiça da ONU. Pode-se

citar o caso em que a embaixada brasileira em Honduras recebeu e protegeu o

presidente deposto Manuel Zelaya. De acordo com Martins (2015), o governo de

Honduras iniciou os trâmites legais para processar o Brasil na Corte Internacional de

Justiça por intromissão em assuntos internos de Honduras. No entanto, com o

transcorrer do tempo, o governo de Honduras acabou desistindo da ação.

Page 32: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

32

Outro destaque diz respeito à atuação de brasileiros enquanto juízes da Corte

de Haia. Assim, menciona-se a questão da dupla nacionalidade, a respeito do que o

jurista José Francisco Rezek (2005, p. 409) leciona que, nos casos em que houver

dupla ou múltipla nacionalidade, é vedado a um dos estados patriais proteger pela

via diplomática um nacional contra outro estado patrial.

Exemplo desse posicionamento é o Caso Canevaro, de 1912, que trata de um

binacional nato, chamado Rafael Canevaro. Era italiano de sangue, mas tinha

cidadania peruana. Tinha negócios no Peru e teve participação na vida pública, a

ponto ter se candidatado a senador. Sofreu com medidas fiscais e expropriatórias do

governo peruano que alcançaram parte de seu patrimônio e, acontecido isso,

Canevaro pretendeu valer-se da proteção diplomática de uma de suas pátrias – a

Itália – contra justamente a outra, o Peru (E-INTERNACIONALISTA, 2015).

Houve sentença arbitral que considerou irreceptível a demanda italiana,

porque o réu era um Estado que também contava Canevaro entre seus nacionais.

Ficou claro que ambos os vínculos patriais desse homem eram legítimos à luz do

Direito Internacional Público: tanto a Itália quanto o Peru poderiam eventualmente

endossar alguma reclamação sua contra a Espanha ou o Brasil; nenhum deles,

contudo, poderia pretender proteger o nacional comum exatamente contra o outro

(E-INTERNACIONALISTA, 2015).

Dessa forma, esse caso é utilizado por Francisco Rezek para afirmar o

tradicional entendimento a espeito da vedação de, no caso de dupla ou múltipla

nacionalidade, um dos Estados patriais proteger diplomaticamente um nacional

contra outro o Estado patrial (E-INTERNACIONALISTA, 2015).

Dessa maneira, o jurista brasileiro entende que existindo a dupla ou múltipla

nacionalidade, qualquer dos Estados patriais pode proteger o cidadão contra um

terceiro Estado envolvido no litígio, mas nunca contra outro Estado em que o

cidadão também é nacional.

Rezek, que esteve na Corte durante o período de 1997-2006, auxiliou também

no julgamento do caso Avena (2004), envolvendo o México contra os Estados

Unidos. O referido caso versava sobre a prisão e condenação à morte de uma série

de mexicanos no Texas. O Estado do México sustentou que os mexicanos não

tiveram assistência consular devida e ingressou na CIJ para que fossem paralisados

os julgamentos e houvesse proteção diplomática.

Page 33: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

33

De acordo com o Portal Internacionalista (2015), a CIJ sentenciou que os EUA

romperam as obrigações firmadas na Convenção de Viena sobre as relações

diplomáticas ao não conceder aos mexicanos a proteção devida. Neste caso, no

ponto de vista de Rezek, o Direito Internacional deve ter primazia sobre o Direito

Interno. Vale mencionar, também, que em duas ocasiões, o Brasil convocou um juiz

ad hoc para um julgamento na CIJ. Conforme aponta Pinheiro (2010, p. 1):

No caso sobre navegação que o Brasil se envolveu com a Costa Rica, foi convocado o hoje juiz com mandato na Corte, Cançado Trindade. Na disputa territorial intitulada Libyan Arab Jamahiriya (caso da Plataforma Continental entre a Tunísia e a Líbia), decidida em 1982, foi convocado José Sette Câmara, que mais tarde também se tornou juiz oficial do tribunal (1979-1988).

Essas são as importantes participações do Brasil na Corte Internacional de

Justiça, enquanto Estado-membro e através de juízes como J. Francisco Rezek,

Cançado Trindade e José Sette-Camara.

Page 34: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

34

CONCLUSÃO

Conforme inúmeros estudos acerca do tema, o Direito Internacional Público

baseia-se no consentimento e livre vontade dos Estados.

No funcionamento dos tribunais internacionais da ONU encontra-se presente

um princípio específico, que é o Princípio da Complementariedade. Significa dizer

que o direito do plano internacional serve como complemento para o direito interno

dos Estados.

A Corte Internacional de Justiça é o principal órgão das Nações Unidas, e

somente interfere nas disputas legais quando chamada a resolver determinado litígio

ou para emitir um parecer consultivo a respeito de determinada demanda. Ela e os

demais tribunais internacionais são pautados na complementariedade.

No que diz respeito ao relacionamento do Brasil com a Corte Internacional de

Justiça, é possível dizer que não é um mero contato no sentido de submeter seus

litígios à Corte Internacional de Justiça, até porque, em várias ocasiões, o Brasil teve

representantes naquela Corte, como na atualidade isto ainda ocorre. Portanto,

historicamente, o Brasil teve importantes nomes de reconhecimento internacional em

seu corpo de juízes, aproximando o relacionamento que tem com a Corte

Internacional de Justiça.

A criação da Corte foi um avanço quanto às garantias e preservação do direito

internacional. Ao institui-la como competente para solucionar problemas

internacionais envolvendo os países-membros, a ONU deu um passo importante em

direção à pacificação dos povos, integrando-os em um plano de organização

mundial que tem como objetivo maior auxiliar os Estados a resolverem seus conflitos

externos e internos.

Externos, em relação aos litígios que por ventura figurarem como

demandantes ou demandados e internos quando precisarem submeter determinada

demanda a um parecer consultivo, para decidir com base em uma jurisdição

imparcial.

Entretanto, verifica-se que nem sempre as decisões dessa Corte representam

uma eficácia no cumprimento da sentença pelo Estado perdedor. Isto porque a

sentença da Corte é sujeita à aceitação dos Estados envolvidos no litígio. Dessa

forma, caso os Estados não acordem sobre a jurisdição da Corte para pacificar o

Page 35: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

35

conflito, fica prejudicada a competência para o caso. Sendo assim, ela pode ficar à

mercê dos interesses das grandes potências.

Ainda tratando das decisões da Corte, nota-se que as decisões antigas do

Tribunal servem para fundamentar novas decisões em casos idênticos. O corpo de

jurisprudência da Corte presta serviço tanto no sentido de construir um entendimento

sobre casos semelhantes, como também para pontuar distinções e novos

entendimentos de acordo com a evolução do direito e do relacionamento

internacional dos países.

A referida Corte presta o serviço de garantir os interesses institucionais e

políticos de determinados Estados soberanos em vez de ter uma atuação eficaz

noutro sentido.

Portanto, conclui-se que a Corte Internacional de Justiça não é, e, por

enquanto, não será a última esperança para a correção de graves erros e grandes

afrontas aos direitos dos povos. Todavia, ela é, inegavelmente, um importante passo

nessa evolução da humanidade no que diz respeito à observação dos princípios

basilares da pacificação dos povos no plano internacional.

Assim, o presente estudo vem como forma de apresentar uma possível

solução ao problema dos conflitos internacionais, uma vez que nem todos os países

submetem suas demandas à Corte.

No primeiro capítulo foram analisados os sistemas jurídicos internacionais e

suas particularidades, como forma de compreender os moldes atuais da jurisdição

no plano internacional e como foi possível construir tal modelo de sistema.

O segundo capítulo destinou-se à compreensão da Corte Internacional de

Justiça e sua estrutura, bem como atuação no plano internacional.

Já no terceiro capítulo, abordou-se a efetiva aplicação das decisões e a

influência que a Corte Internacional de Justiça tem no ordenamento jurídico

brasileiro, uma vez que o país tem uma relação bastante próxima de tal órgão

jurisdicional internacional. Além disso, a aplicação das decisões proferidas por tal

Corte e como elas são aplicadas no plano nacional. Importa ressaltar, que toda e

qualquer decisão proferida fora do país deve respeitar a soberania e a ordem pública

brasileiras.

Page 36: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

36

REFERÊNCIAS

ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito Internacional Público. 20. Ed. São Paulo: Saraiva. 2012. AKYIAMA, André Oliveira. Tribunal Penal para Ruanda. Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/tpi/a_pdf/tpi_mini_guia_ruanda.pdf>. Acesso em 29 set. 2015. BIATO, Marcel. O Tribunal Penal Internacional e a Segurança Coletiva. In: Política Externa. Vol. 10, n. 3, 2001/2002. CARDOSO, Elio. Tribunal Penal Internacional: Conceitos, realidades e implicações para o Brasil. Disponível em: <http://funag.gov.br/loja/download/986Tribunal_Penal_Internacional_CONCEITOS.pdf>. Acesso em 17 set. 2015. CASTRO, Marina Scotelaro de. O poder do discurso na deflagração do genocídio: o caso de Ruanda. Belo Horizonte: PUC, 2009. Disponível em: < http://www.pucminas.br/imagedb/conjuntura/CNO_ARQ_NOTIC20101101145119.pdf>. Acesso em 25 out. 2015. CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU. Nota à Imprensa SC/6910 (2000). Disponível em: <http://www.un.org/News/Press/docs/2000/20000814.sc6910.doc.html>. Acesso em 04 set. 2015. DE PAULA, Thaís Leo N. A evolução do Direito Internacional Penal e o Tribunal Especial para Serra Leoa: análise da Natureza Jurídica e considerações sobre sua jurisprudência. Nomos: Revista do Programa de pós-graduação em Direito da UFC. p. 349-390, N. 5, 2014. FARACHE, Jacob Arnaldo Campos. A Corte Internacional de Justiça. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.28879&seo=1>. Acesso em 10 set. 2015. GARCIA, Fernanda Lau Mota. O Tribunal Penal Internacional: funções, características e estrutura. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=12141&revista_caderno=16>. Acesso em 25 set. 2015. HEE MONN, Jo. JO, Hee Moon. Introdução ao Direito Internacional. São Paulo: LTr, 2001. HUSEK, Carlos Roberto. Curso de Direito Internacional Público. São Paulo: LTr, 2010.

Page 37: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

37

INTERNATIONAL COURT OF JUSTICE. Disponível em <http://www.icj-cij.org/homepage/index.php?lang=en>. Acesso em 25 out. 2015. MAGALHÃES, José Carlos de. O Supremo Tribunal Federal e o direito internacional: uma análise crítica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. MARQUES, Miguel Ângelo. Corte Internacional de Justiça (CIJ). Disponível em: <http://revistasapereaude.org/SharedFiles/Download.aspx?pageid=123&mid=167&fileid=129>. Acesso em 10 set. 2015. MARTINS, Hugo Lázaro Marques. Corte Internacional de Justiça: estrutura e atuação na manutenção da paz. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3445, 6 dez. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/23162>. Acesso em: 01 out. 2015. MATTOS, Adherbal Meira. Os novos limites dos espaços marítimos nos Trinta anos da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do mar. In: Reflexões sobre a Convenção do Direito do Mar. Brasília: FUNAG, 2014. MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de direito internacional público. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. MENEZES, Wagner. Tribunal Internacional do Direito do Mar e sua contribuição jurisprudencial. In: Reflexões sobre a Convenção do Direito do Mar. Brasília: FUNAG, 2014. Os principais casos de Direito Internacional Público para o CACD. Disponível em: <http://e-internacionalista.com.br/2015/04/06/os-principais-casos-de-direito-internacional-publico-para-o-cacd/>. Acesso em 03 set. 2015. PEIXOTO, Alexandre Kotzias. O Estabelecimento do Tribunal Penal Internacional: Notas sobre Alguns dos Principais Temas das Negociações. In: Boletim da Sociedade Brasileira de Direito Internacional, n. 113/118, 1998. PINHEIRO, Aline. Corte Internacional de Justiça Delimita Soberania. Revista Consultor Jurídico. Agosto, 2010. Disponível em: < http://www.conjur.com.br/2010-ago-19/haia-capital-juridica-corte-internacional-de-justica-delimita-soberania>. Acesso em 25 de out. de 2015. PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 5. ed. São Paulo: Max Limonad, 2002. REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. SANTOS JÚNIOR, Francisco Carlos de Oliveira. Tribunal Penal Internacional. Disponível em: <www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9417>. Acesso em 29 set. 2015.

Page 38: O PAPEL E O FUNCIONAMENTO DA CORTE INTERNACIONAL DE …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/03/O-PAPEL-E-O... · decorrendo de previsão específica do Estatuto de Roma, que o criou em

38

TERRA. NOTÍCIAS. Charles Taylor condenado por crimes de guerra. Disponível em: <http://noticias.terra.com.br/mundo/africa/ex-lider-liberiano-charles-taylor-e-condenado -por-crimes-de-guerra,e11994c8b47da310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html>. Acesso em 25 set. 2015. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP). Corte Internacional de Justiça. Disponível em: < http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Corte-Internacional-de-Justi%C3%A7a/o-que-e.html>. Acesso em 25 out. de 2015.