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PATRÍCIA BRESSAN LINHARES GAUDENZI O PERFIL JURÍDICO DO IMPOSTO DE RENDA E A TRIBUTAÇÃO DOS PLANOS DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR PRIVADA MESTRADO EM DIREITO PUC/SP São Paulo 2006

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PATRÍCIA BRESSAN LINHARES GAUDENZI

O PERFIL JURÍDICO DO IMPOSTO DE RENDA E A TRIBUTAÇÃO DOS PLANOS

DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR PRIVADA

MESTRADO EM DIREITO

PUC/SP

São Paulo

2006

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PATRÍCIA BRESSAN LINHARES GAUDENZI

O PERFIL JURÍDICO DO IMPOSTO DE RENDA E A TRIBUTAÇÃO DOS PLANOS

DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR PRIVADA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como

exigência parcial para obtenção do título de Mestre

em Direito Tributário (Direito do Estado), sob a

orientação do Professor Doutor Roque Antonio

Carrazza.

PUC/SP

São Paulo

2006

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BANCA EXAMINADORA:

___________________________________________

___________________________________________

___________________________________________

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À memória de meu pai, Normando, à minha mãe, Rose, às

minhas irmãs, Ana Carolina e Adriana, e ao meu grande

amigo, companheiro e marido, Leonardo.

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AGRADECIMENTOS

Ao colega e amigo Roberto Quiroga Mosquera, pela inspiração, pelas oportunidades e pela

confiança que em mim deposita.

Ao professor Roque Antonio Carrazza, estimado orientador, pelos ensinamentos jurídicos e

pelas lições de vida que transmite.

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“Não há nada como o sonho para criar o futuro.”

Victor Hugo

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RESUMO

Diante dos avanços alcançados pelo regime de previdência complementar, com a edição da

Emenda Constitucional nº 20, de 1998, que ensejou a edição da Lei Complementar nº 109, de

2001, e do oferecimento de novos produtos previdenciários ao público, a previdência privada

figura atualmente como elemento fundamental na estruturação do sistema previdenciário

brasileiro – especialmente em vista do conhecido desequilíbrio atuarial e financeiro da

previdência oficial –, propiciando meios para que os indivíduos permaneçam economicamente

ativos mesmo com a chegada da fase de inatividade profissional. A fim de realizar o seu

planejamento para o período de aposentadoria futuro, o indivíduo passa a avaliar os impactos

tributários do investimento de recursos em planos de previdência complementar, em relação

aos outros instrumentos de poupança. Com vistas a esta realidade é que se propõe a apresentar

como tema deste estudo a análise do perfil constitucional do imposto de renda, a sua matriz de

incidência, e o tratamento tributário atualmente conferido aos valores aplicados em planos de

previdência privada. A partir deste estudo, pretende-se analisar criticamente se o “regime de

diferimento do imposto de renda” aplicável aos investimentos em planos de previdência

privada efetivamente traduz uma postergação do ônus financeiro do tributo ou pode acarretar

a incidência do referido tributo sobre parcela do patrimônio (e não da renda) da pessoa física.

Palavras-chave: Previdência complementar privada. Imposto de renda. Conceito de renda.

Perfil constitucional do imposto de renda. Regra-matriz do imposto de renda. Tributação dos

Planos de Benefícios.

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ABSTRACT

Considering the progress reached by the private pension fund system, because of the edition

of the Constitutional Amendment n. 20, as of 1998, which has resulted in the edition of the

Complementary Law n. 109, as of 2001, and the offering of new pension products to the

public, private pension is presently a fundamental element for the structure of the Brazilian

pension system – especially towards the actuarial and financial instability of the public

pension system –, rendering alternative for the individuals to keep themselves economical

actives even in the inactivity phase of professional duties. In order to organize the retirement

planning, the individual assesses the tax consequences of the investment in private pension

funds, in comparison to other kinds of investment. Facing this reality, the purpose of this

study is to present the analysis of the constitutional profile of the income tax, its matrix-rule

and the tax treatment imposed to the values invested in private pension funds. As from this

analysis, the intention is to review if the “income tax deferment regime” applicable to the

investment in private pension funds effectively corresponds to a postponement of the financial

tax burden or if it can result the income tax incidence on part of the individual’s heritage (and

not his/her income).

Keywords: Private Pension Funds. Income Tax. Definition of Income. Income Tax

Constitutional Profile. Income Tax Matrix-rule. Taxation of the Pension Fund Plans.

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SUMÁRIO

Introdução..................................................................................................................... 12

PARTE I – NOÇÕES PRELIMINARES SOBRE A PREVIDÊNCIA

COMPLEMENTAR PRIVADA NO BRASIL

Capítulo I - A Previdência Complementar Privada na Constituição Federal de

1988................................................................................................................................

19

1.1 Panorama Geral da Previdência Social....................................................... 19

1.2 A Previdência Complementar Privada......................................................... 25

1.3 A Lei Complementar nº 109/01................................................................... 29

Capítulo II - O Regime Jurídico da Previdência Complementar Privada.............. 32

2.1 A Relação Jurídica Contratual...................................................................... 45

2.1.1 O Participante – Pessoa Física............................................................. 46

2.1.2 O Patrocinador – Pessoa Jurídica........................................................ 49

2.1.3 A Entidade de Previdência Complementar.......................................... 51

2.2 Planos de Benefícios das Entidades Fechadas de Previdência

Complementar...............................................................................................

56

2.3 Planos de Benefícios das Entidades Abertas de Previdência

Complementar...............................................................................................

59

PARTE II – O PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS E RESGATES EM PLANOS

DE BENEFÍCIOS POR ENTIDADES DE PREVIDÊNCIA

COMPLEMENTAR PRIVADA COMO FATO JURÍDICO TRIBUTÁVEL

PELO IMPOSTO DE RENDA

Capítulo III - Perfil Constitucional do Imposto de Renda........................................ 63

3.1 Competência Tributária da União................................................................ 67

3.2 Noção Constitucional da Renda................................................................... 71

3.3 Princípios Constitucionais Tributários Aplicáveis ao Imposto de Renda... 73

3.3.1 A Importância do Princípio da Capacidade Contributiva.................... 77

3.3.2 A Limitação Imposta pelo Princípio da Vedação ao Confisco............ 82

3.4 A Renda Passível de Tributação pelo Imposto de Renda............................. 86

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Capítulo IV - A Hipótese de Incidência do Imposto de Renda e a Formação de

sua Regra-Matriz..........................................................................................................

90

4.1 O Antecedente da Norma Tributária............................................................. 96

4.1.1 Critério Material – Renda e Proventos de Qualquer Natureza............ 96

4.1.2 Critério Espacial.................................................................................. 100

4.1.3 Critério Temporal................................................................................ 103

4.2 O Conseqüente da Norma Tributária............................................................ 108

4.2.1 Critério Pessoal.................................................................................... 109

4.2.2 Critério Quantitativo............................................................................ 112

4.3 Síntese da Regra-Matriz do Imposto de Renda............................................ 116

Capítulo V - A Tributação dos Planos de Benefícios de Previdência

Complementar Privada pelo Imposto de Renda........................................................

117

5.1 Regime de Diferimento do Ônus Financeiro................................................ 117

5.1.1 Dedutibilidade das Contribuições na Apuração do Imposto de

Renda..................................................................................................

123

5.1.1.1 Pessoa Física .......................................................................... 123

5.1.1.2 Pessoa Jurídica........................................................................ 129

5.1.2 Isenção do Imposto de Renda Durante a Fase de Acumulação.......... 135

5.1.3 Incidência do Imposto de Renda sobre Resgates e Benefícios........... 143

5.1.3.1 Regime Progressivo de Tributação......................................... 148

5.1.3.2 Regime Regressivo de Tributação.......................................... 150

5.1.3.3 Situações de Isenção............................................................... 156

5.1.3.3.1 Resgate de Contribuições Efetuadas pela Pessoa

Física entre 1989 e 1995, para Desligamento do

Plano.......................................................................

157

5.1.3.3.2 Beneficiários Portadores de Moléstias Graves e

Portadores de Deficiência Mental...........................

160

5.1.3.3.3 Beneficiários Maiores de 65 Anos........................... 163

5.1.3.3.4 Pecúlio..................................................................... 165

5.1.3.3.5 Auxílio-doença e Outros.......................................... 167

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Capítulo VI - A Adequação da Tributação dos Planos de Previdência

Complementar pelo Imposto de Renda ao Perfil Constitucional do Tributo ........

168

6.1 Possibilidade de Tributação de Parcela do Patrimônio.............................. 168

6.1.1 O Princípio da Capacidade Contributiva e o Regime Regressivo de

Tributação...........................................................................................

170

6.1.2 O Princípio da Vedação ao Confisco e o Regime Regressivo de

Tributação...........................................................................................

173

Capítulo VII - A Adequação da Tributação dos Planos de Previdência

Complementar pelo Imposto de Renda à Regra-Matriz do Tributo......................

175

7.1 A Possibilidade de Tributação do Próprio Capital Investido – Critérios

Material e Quantitativo (Base de Cálculo)...................................................

175

Conclusões..................................................................................................................... 179

Referências Bibliográficas........................................................................................... 187

Acesso Eletrônico......................................................................................................... 192

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INTRODUÇÃO

O funcionamento da previdência complementar privada no Brasil remota do

final do século XIX, com a criação das primeiras caixas de previdência para trabalhadores

ferroviários, autorizadas a funcionar pela Lei Eloy Chaves (Decreto nº 4.682, de 1923). Em

estrutura bastante primitiva, se comparada com a complexa organização de uma entidade de

previdência complementar atual, as caixas de previdência proporcionavam aos trabalhadores

associados auxílio médico, benefícios de aposentadoria e auxílio funerário.

A idéia central das caixas de pecúlio – como também são chamadas essas

primeiras entidades previdenciárias –, estava pautada na solidariedade dos seus associados, a

fim de criar condições de sustentabilidade para os trabalhadores, quando não lhes fosse mais

possível exercer ativamente suas funções laborais.

Essa inspiração inicial da previdência complementar com as caixas de

pensões e pecúlio prolongou-se até a edição da Lei nº 6.435, de 1977, quando a previdência

privada foi instituída formalmente sob as bases das entidades abertas e fechadas de

previdência privada. Neste compasso, criou-se uma maior independência da previdência

privada às relações de trabalho, uma vez que foi possível propiciar aos indivíduos o ingresso

em planos de benefícios abertos, independentemente da existência de vínculo de emprego

com pessoa jurídica patrocinadora.

A normatização da previdência complementar, até o início do corrente

século, pela Lei nº 6.435, de 1977, ganhou contornos mais definidos – alinhados à tendência

mundial de reforçar o sistema previdenciário de caráter privado –, com a edição da Lei

Complementar nº 109, de 21 de maio de 2001.

A referida Lei, ao estabelecer disciplina objetiva ao regime jurídico dos

planos de previdência complementar no Brasil, consignou princípios para a operacionalização

dos planos dessa natureza, estabeleceu institutos obrigatórios (de resgate e portabilidade, entre

outros) e fixou direitos e obrigações às partes da relação jurídica contratual deste segmento:

entidades, participantes e patrocinadores1.

1 A figura denominada patrocinador é mencionada na legislação como atinente apenas aos planos administrados por entidades fechadas de previdência complementar, uma vez que, nos planos abertos, a pessoa jurídica

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Com o advento da Lei Complementar nº 109, de 2001, possibilitou-se a

modernização dos planos de benefícios, por intermédio da introdução de uma disciplina

normativa mais robusta e eficaz.

Tal avanço foi possível mediante a previsão constitucional do regime

jurídico da previdência complementar, marcada pela edição da Emenda Constitucional nº 20,

de 15 de novembro de 1998. Com isso, reforçou-se a importância da estruturação jurídica da

previdência complementar, possibilitando o seu crescimento, já acentuado na década de 90.

Atualmente, a previdência complementar figura como elemento fundamental

na organização do sistema previdenciário brasileiro, notadamente pela indiscutível

importância de se propiciar meios para que os cidadãos permaneçam economicamente ativos

mesmo com a chegada da fase de inatividade profissional (total ou parcial) e em vista do

conhecido desequilíbrio atuarial e financeiro da previdência geral oficial.2

Não se trata, pura e simplesmente, de um instrumento de investimento com

reflexos apenas na condição financeira individual, mas, sim, de um mecanismo de proteção

social eficiente, capaz de proporcionar consistência e sustentabilidade à previdência social.

Isto porque, estando a previdência social brasileira dividida em duas vertentes: uma

obrigatória, responsável pela previdência básica dos trabalhadores da iniciativa privada e do

serviço público, e outra facultativa, de caráter privado, acessível a todos os cidadãos, o seu

equilíbrio somente é alcançado quando ambos os setores estiverem equalizados e coexistirem

de forma adequada.

participante do custeio do plano recebe o nome de instituidor. Contudo, para fins do presente estudo, serão abrangidos, com este termo, também as pessoas jurídicas patrocinadoras de planos abertos de previdência complementar. Isto porque, os instituidores, no âmbito dos planos fechados, correspondem àqueles que patrocinam planos para associados ou membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial. Assim, o termo patrocinador (ou patrocinadora), para a presente análise, abracará toda pessoa jurídica que efetuar aportes em planos de benefícios previdenciários em favor de seus empregados, dirigentes, associados ou membros, independentemente de se tratar de plano administrado por entidade fechada ou aberta de previdência complementar. 2 A este respeito, Marcos Antonio Simões Peres, em recente estudo intitulado “A evolução da previdência complementar aberta” ressalta que: “O sistema de previdência brasileiro apóia-se em dois pilares. O primeiro (previdência social) possui natureza pública e é de iniciativa governamental, a participação da massa de trabalhadores é universal e compulsória (...). O segundo pilar possui natureza privada e subdivide-se em dois segmentos: o fechado e o aberto (...). O incentivo à expansão do segundo pilar tem sido objeto da política dos Governos de muitos países, inclusive o Brasil. Isso vem ocorrendo na medida em que fica cada vez mais clara para a sociedade a incapacidade do primeiro pilar de prover aposentadorias em valor adequado à manutenção do padrão de vida das camadas da população com rendimentos que extrapolam o limite (teto) dos benefícios pagos pela previdência social, bem como não se mostra sustentável, econômica e atuarialmente, a longo prazo.” (in “A Evolução da Previdência Complementar Aberta”, Revista de Previdência nº 4, Gramma, Rio de Janeiro, abril/06, p. 23/24).

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O fortalecimento da previdência complementar privada – motivado por uma

estrutura normativa organizada, e impulsionado por uma tributação coerente – tem por

conseqüência uma maior expansão do sistema previdenciário nacional, atingindo cada vez

maior parte da população, e, com isso, oferecendo meios para o avanço social e econômico do

País.

É em razão da conscientização sobre a importância da previdência

complementar privada, que, ao longo dos últimos anos, vem sendo verificada uma mudança

na formação cultural quanto ao planejamento da poupança previdenciária do indivíduo

brasileiro. Tal transformação é marcada pelo crescimento do número de planos de benefícios

operados por entidades fechadas de previdência complementar – os chamados fundos de

pensão – e pelo diariamente noticiado aumento dos planos administrados por entidades

abertas de previdência complementar e sociedades seguradoras – especialmente os planos da

modalidade PGBL (Plano Gerador de Benefícios Livres).

Com a identificação da relevância da realização de um planejamento para o

período de aposentadoria futuro, o indivíduo passa a avaliar os impactos tributários do

investimento de recursos em planos de previdência complementar, e os reflexos fiscais sobre

os investimentos em outras modalidades de aplicação financeira, como fundos de

investimento, títulos de renda fixa, ações e até mesmo as alternativas para investimento

imobiliário.

Isto porque, quando se trata de poupança previdenciária, o que a caracteriza

é a finalidade que se pretende alcançar (rendimentos futuros de longo prazo) e não a

modalidade de investimento utilizada para tanto. Assim, é possível admitir-se o investimento

de caráter financeiro ou imobiliário, ou outro, que tenha por finalidade complementar a renda

individual em determinada fase futura, de diminuição da atividade profissional, e, com isso, o

investimento revestir-se da finalidade previdenciária.

Contudo, neste contexto, os planos de benefícios de caráter previdenciário,

ganham posição de destaque em relação às demais modalidades de investimento, em razão de

estarem estruturados especialmente para a finalidade de garantir complementação da renda na

fase de aposentadoria. Por esta razão, justifica-se o agrupamento, facultativo, de pessoas e

seus recursos em planos, cuja carteira de investimentos seja diversificada e esteja voltada para

a cobertura de benefícios previdenciários a seus participantes.

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É devido à importância do tema relativo à tributação dos planos de

previdência complementar, enquanto instrumento de poupança previdenciária, que se propõe

a apresentar como tema deste estudo a incidência do imposto de renda sobre o investimento

nestes planos. Uma análise crítica acerca do modelo tributário imposto a esta modalidade de

investimento, poderá contribuir para estimular o debate para a sua evolução a fim de que, a

final, a tributação não represente um entrave para o desenvolvimento da previdência

complementar privada no País.

Seguindo estes moldes, o objetivo proposto no presente estudo é o de

analisar a tributação dos resgates e benefícios recebidos de planos de previdência

complementar privada, instituídos no Brasil, em vista da hipótese de incidência do imposto de

renda, conforme delineada constitucionalmente. Justifica-se tal análise à necessidade de se

traçar uma visão crítica sobre o regime tributário ao qual os recursos recebidos pelos

participantes e beneficiários de planos de benefícios estão atualmente submetidos, em face do

enquadramento jurídico-constitucional do imposto de renda devido pelas pessoas físicas

residentes no Brasil.

A tributação a que se refere, neste estudo, é especificamente aquela apurada

mediante a incidência do imposto de renda sobre os recursos alocados em planos de

previdência complementar, posteriormente vertidos sob a forma de benefícios de

aposentadoria ou de resgates, aos participantes e beneficiários dos planos de benefícios. Não

cuidará o presente estudo da análise dos tributos incidentes sobre os resultados das entidades

de previdência complementar ou sociedades seguradoras que administram os planos de

benefícios em questão; mas tão-somente do impacto do imposto de renda sobre as

importâncias vertidas e recebidas dos planos de previdência complementar.

Neste enfoque, abordar-se-á, inclusive, a isenção do imposto de renda

conferida recentemente, pela Lei nº 11.053, de 29 de dezembro de 2004, aos rendimentos e

ganhos auferidos nas aplicações financeiras dos recursos das reservas técnicas, fundos e

provisões dos planos de previdência complementar. Isto é, aos rendimentos e ganhos

auferidos na aplicação financeira dos recursos destinados, pelos participantes e

patrocinadores, aos planos de benefícios.

É de se destacar que a tributação de tais rendimentos e ganhos é tratada, pela

maior parte da doutrina, como uma tributação da entidade administradora do plano, e não do

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participante, beneficiário final dos recursos. Isto se deve ao fato de, originalmente, o debate

sobre a tributação de tais recursos estar voltado para a discussão sobre a aplicação ou não da

imunidade tributária das entidades fechadas de previdência complementar conquanto

assemelhadas às entidades de assistência social – artigo 150, VI, “c”, da Constituição Federal

de 19883. O debate sobre a imunidade tributária, apesar de focado na natureza jurídica da

entidade fechada de previdência complementar, tinha como finalidade afastar a tributação,

pelo imposto de renda, sobre os ditos rendimentos e ganhos nas aplicações financeiras dos

recursos acumulados no plano de benefícios, e, com isso, desonerar da tributação os valores

acumulados no plano de benefícios, pelos participantes e patrocinadores.

Contudo, o que se verifica é que o impacto da tributação ou não dos

referidos rendimentos e ganhos é suportado pelo participante, destinatário dos recursos objeto

das aplicações financeiras4. Por isso é que, no bojo deste estudo sobre a incidência do imposto

de renda sobre os resgates e benefícios recebidos dos planos de previdência complementar

pela pessoa física, não se pode afastar a análise da tributação da remuneração obtida na

aplicação financeira dos recursos alocados no plano durante a fase de acumulação.

Portanto, o enfoque que se tomará acerca da isenção prevista na Lei nº

11.053/04, é o de se identificar os seus reflexos sobre o investimento em plano de previdência

complementar, conjuntamente com a análise do impacto da incidência do imposto de renda

sobre o aporte de recursos e sobre a sua disponibilização para o beneficiário, sob a forma de

resgate ou benefício.

Também não será objeto de análise específica a tributação dos planos de

seguro de vida com cobertura por sobrevivência (cujo nome comercial é “VGBL”), nem

3 Conforme será descrito no curso deste estudo, o Supremo Tribunal Federal pôs fim à discussão sobre a imunidade tributária das entidades fechadas de previdência complementar ao decidir no processo que serviu de leading case sobre a matéria (RE nº 202.700-DF). Não obstante, desde o julgamento do leading case, persistia o intuito de demonstrar a existência de bitributação, pelo imposto de renda, quando de sua incidência sobre os rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações financeiras (fase de acumulação) e, posteriormente, sobre os valores recebidos na fase de gozo dos benefícios previdenciários. 4 Mesmo porque, como as entidades fechadas de previdência complementar são entidades sem fins lucrativos, o imposto de renda por elas recolhido impacta diretamente nos recursos por elas administrados, cujos beneficiários são os participantes. De outro lado, no tocante às entidades abertas de previdência complementar e sociedades seguradoras, até o ano de 2002, estavam elas isentas do imposto de renda incidente sobre os rendimentos e ganhos que viessem a auferir em aplicações financeiras, quer com recursos próprios, ou com recursos dos planos de previdência por elas administrados. Após a edição da Medida Provisória nº 2.222, de 4 de setembro de 2001, estabeleceu-se a cobrança do referido imposto, o qual, por autorização da entidade reguladora, pôde ser transferido às reservas dos participantes dos planos de previdência complementar; e, com isso, tem-se exatamente o mesmo efeito que o

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tampouco dos fundos de aposentaria programada individual (referidos pela sigla “FAPI”). Isto

porque, diferentemente dos planos de previdência complementar privada, estas modalidades

de investimento têm natureza de seguro de vida e fundo de investimento, respectivamente, e,

assim, não estão submetidas ao mesmo regime jurídico dos planos de previdência privada –

apesar de estar o FAPI sujeito ao mesmo tratamento tributário dos planos previdenciários em

questão.

A não inclusão dessas espécies de investimento no foco de análise do

presente estudo não impede que sejam tecidos esclarecimentos pontuais e comparações entre

eles e os planos de previdência privada, a título de elucidar e trabalhar os seus cenários

normativos diversos.

Especificamente em relação aos planos de previdência complementar

privada, a hipótese que se propõe analisar é se o regime de tributação introduzido pelas Leis

nº 9.250, de 26 de maio de 1995, 9.532, de 10 de dezembro de 1997, e 11.053, de 2004,

comumente referido como “regime de diferimento do imposto de renda”, efetivamente traduz

uma postergação do ônus financeiro do tributo ou acarreta – e em que situações – a incidência

do referido tributo sobre parcela do patrimônio (e não da renda) da pessoa física.

Cuida-se, portanto, de verificar, em última instância, a adequação do regime

de tributação pelo imposto de renda dos valores investidos e recebidos dos planos de

benefícios previdenciários, no formato atualmente vigente, à competência

constitucionalmente atribuída para instituição do referido tributo e ao perfil constitucional

deste imposto.

Para tanto, verificar-se-ão os contornos constitucionais do imposto de renda,

bem como da estruturação de sua regra-matriz, para então se analisar os efeitos tributários das

contribuições vertidas para os planos de previdência complementar – tanto para a pessoa

física, quando investe recursos para seu próprio benefício, quanto para a pessoa jurídica, na

qualidade de ente patrocinador, ou seja, ao efetuar contribuições em favor de seus empregados

ou associados – (momento um), o impacto tributário da manutenção dos recursos no plano de

previdência complementar durante a fase de acumulação, em que há a aplicação financeira de

tais recursos (momento dois), e a incidência do imposto de renda quando do resgate ou

imposto de renda sobre a remuneração obtida nas aplicações financeiras realizadas pelas entidades fechadas de previdência complementar: a oneração das reservas acumuladas pelo participante.

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recebimento dos benefícios de aposentadoria, pela pessoa física (momento três), beneficiária

do plano previdenciário.

Com isso, espera-se demonstrar as hipóteses em que a incidência do imposto

de renda sobre os resgates e benefícios recebidos dos planos de previdência complementar

poderá acarretar a tributação sobre a parcela que não corresponde ao conceito constitucional

de renda tributável por esta exação.

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PARTE I

NOÇÕES PRELIMINARES SOBRE A PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR

PRIVADA NO BRASIL

Capítulo I - A Previdência Complementar Privada na Constituição Federal de 1988

1.1 Panorama Geral da Previdência Social

Para tratar sobre a previdência complementar privada é indispensável,

primeiramente, identificar a sua situação em termos constitucionais, a fim de verificar a sua

posição no universo da seguridade social brasileira.

Indiscutivelmente, na Constituição Federal é que residem as normas

estruturadoras e norteadoras do ordenamento jurídico nacional, o que, no campo da

seguridade social, reflete-se no estabelecimento de seus pilares de sustentação: saúde,

assistência social e previdência social.

Com efeito, no Capítulo II, do Título VIII, do texto constitucional, encontra-

se a disposição de que, no Brasil, a seguridade social compreende um conjunto integrado de

ações destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Tais ações, conforme previsão do artigo 194, devem ser promovidas no âmbito de uma

parceria entre o Poder Público e a sociedade.

Como poder legitimado para definir a ordem nacional, o Poder Público

estabelece normas e cria as instituições e entidades necessárias para fazer valer a organização

da seguridade social. À sociedade cabe a participação mediante a realização de contribuições

para o financiamento da estrutura social, conforme descritas no artigo 195 da Constituição.5

5 Na visão de Arthur Bragança de Vasconcellos Weintraub, porém, a participação da sociedade no âmbito da seguridade social reflete-se justamente na organização da previdência privada: “Pois bem, a iniciativa da sociedade vem se manifestando com o crescimento ímpar da Previdência Complementar Privada brasileira. A Justiça Social se dá, outrossim, com observância do princípio da liberdade de iniciativa (art. 170 da Constituição).” (in “Manual de Direito Previdenciário Privado”, São Paulo, Ed. Juarez de Oliveira, 2004, p. 18)

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Na divisão dos pilares que sustentam a seguridade social, tem-se que a saúde

e a assistência social são regidas pelos artigos 196 a 200 e 203 e 204, respectivamente. Já a

previdência social encontra-se regulada nos artigos 201 e 202, cuja redação atual foi dada pela

Emenda Constitucional nº 20, de 1998.

A reforma constitucional promovida pela Emenda Constitucional nº 20,

destacou os dois eixos de direcionamento da previdência social: de um lado, a previdência

social de caráter geral e de filiação obrigatória, regida pelo artigo 201, e, de outro, a

previdência complementar privada, autônoma e de filiação facultativa, regida pelo artigo

202.6

É de se notar que ambas figuram na esfera da previdência social (Seção III),

e, portanto, forçoso asseverar que formam um único conjunto que determina a organização da

previdência aos cidadãos, no Brasil. A referência à previdência geral e obrigatória como

previdência sócia (stricto sensu), justifica-se apenas em contrapartida à expressão usada pelo

artigo 202 (previdência privada), não se afastando, porém, o reconhecimento de que ambas –

previdência social e previdência privada – compõem faces de uma mesma unidade da

seguridade social, qual seja, a previdência social (lato sensu).7

O regime geral da previdência social – como é chamada a previdência social

obrigatória – está voltado para segurar os trabalhadores8, garantindo-lhes cobertura na

6 A redação anterior do texto constitucional não contemplava a previdência complementar privada: “Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condições: I - aos sessenta e cinco anos de idade, para o homem, e aos sessenta, para a mulher, reduzido em cinco anos o limite de idade para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, neste incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal; II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidas em lei; III - após trinta anos, ao professor, e, após vinte e cinco, à professora, por efetivo exercício de função de magistério. § 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após vinte e cinco, à mulher. § 2º - Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos sistemas de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei.” 7 Conforme será exposto a seguir, o sistema previdenciário brasileiro é composto, além da previdência social e da previdência privada, pelo regime próprio dos servidores públicos, o qual encontra sua previsão constitucional no artigo 40 da Constituição Federal de 1988. 8 Entende-se pr “trabalhadores” os cidadãos que prestam serviços a pessoas jurídicas de direito privado ou a pessoas físicas e aqueles que venham a se associar ao regime geral da previdência social, na qualidade de segurado facultativo.

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modalidade benefício definido9, segundo o regime de repartição simples, em que os

participantes ativos contribuem para o pagamento de benefícios aos beneficiários inativos,

sem qualquer individualização das contribuições arrecadadas, gerando o que Marcos Antônio

Simões Peres chamou de “pacto social entre gerações”10.

A previdência complementar privada, de outro lado, organizada na forma de

planos de benefícios das modalidades benefício definido, contribuição definida ou

contribuição variável11, está voltada para assegurar benefícios previdenciários a todos aqueles,

trabalhadores ou não, que venham a se associar a seus planos, observados os critérios

estabelecidos na legislação12. Este segmento da previdência está baseado no regime de

capitalização, em seu formato escritural ou financeiro. No primeiro, as contribuições são

aplicadas em contas individuais, porém os fluxos financeiros são usados para pagar os

benefícios de beneficiários inativos existentes; no segundo, as contribuições e o seu fluxo

financeiro integram uma reserva individual, usada para pagamento do benefício tão-somente

ao seu titular.13

Com isso, têm-se diferenças essenciais na forma de tratamento financeiro

das contribuições arrecadadas para o regime geral da previdência social e para o regime da

previdência complementar privada, o que acaba por criar discrepâncias quanto ao equilíbrio

atuarial e financeiro de suas contas. Enquanto a previdência privada tende a direcionar os

recursos arrecadados com as contribuições dos seus participantes para o benefício a ser

gozado, na fase de aposentadoria, por estes mesmos participantes, na previdência pública, as

9 Já se adianta, aqui, o esclarecimento de que a cobertura da modalidade “benefício definido” implica a definição do valor da contribuição e do benefício no momento do ingresso no sistema. 10 In ob.cit. p. 23. 11 Não obstante a definição desses tipos de planos ser apresentada adiante, vale, desde já, esclarecer que plano de “contribuição definida” é aquele no qual o benefício de aposentadoria é estabelecido apenas no momento da sua concessão, com base no montante das contribuições arrecadadas, as quais tenham sido previamente fixadas quando da contratação do plano. Os planos da modalidade “contribuição variável”, por sua vez, contém natureza mistas, possuindo características das modalidades “benefício definido” e “contribuição definida”. 12 Conforme será descrito posteriormente, os planos de benefícios fechados são disponibilizados apenas para o universo de empregados, dirigentes e associados a determinada pessoa jurídica ou a determinado grupo de empresas, enquanto que os planos abertos são acessíveis a toda e qualquer pessoa física, independentemente de vínculo empregatício ou associativo. 13 Vale esclarecer que existem variações possíveis nestes regimes financeiros, a depender do desenho estrutural do plano de benefícios – como, por exemplo, o regime de repartição de capital de cobertura, em que parte das contribuições é destinada a um fundo necessário para pagamento de obrigações futuras relativas a eventos não programados –, os quais, porém, não estão contemplados em descrição específica em razão da sua especialidade e eventualidade.

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contribuições arrecadadas destinam-se ao pagamento dos benefícios de terceiros, num sistema

de genuíno mutualismo e solidariedade.14

Até aqui, é possível afirmar que, enquanto o regime geral da previdência

social é destinado aos trabalhadores da iniciativa privada, o regime da previdência

complementar é voltado para todo e qualquer indivíduo que exerça a faculdade de manter uma

complementação de aposentadoria. Assim, a todo trabalhador atuante no setor privado é dada

a opção de, além de se manter filiado ao regime geral da previdência social, associar-se a

plano de previdência complementar privada. Mas e aos servidores públicos? Há possibilidade

de filiação apenas ao regime da previdência complementar?

Para os servidores públicos, o artigo 40 da Carta Magna prevê a instituição

de regime de previdência próprio, de caráter contributivo, baseado na modalidade benefício

definido, a funcionar como um regime geral para estes servidores, tal como existente para os

trabalhadores da iniciativa privada.

O regime próprio de previdência dos servidores públicos também sofreu

alteração pela Emenda Constitucional nº 20/98, e, posteriormente, modificações adicionais

pela Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, e está estruturado para atender

aos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como de

suas autarquias e fundações, mediante contribuições, em caráter solidário.

Segundo disposição do parágrafo 5º, do artigo 201, da Constituição, é

vedada a filiação ao regime geral de previdência social, na qualidade de segurado facultativo,

de pessoa participante de regime próprio de previdência dos servidores públicos. Desta forma,

tem-se, em termos gerais: o regime geral para os trabalhadores da iniciativa privada, o regime

próprio dos servidores públicos, e, facultativamente, o regime da previdência complementar,

para ambos.

Ocorre que, especialmente para a determinação de previdência

complementar para os servidores públicos, os parágrafos 14, 15 e 16, do artigo 40, do texto

constitucional, prevêem a possibilidade de a União, os Estados, o Distrito Federal e os

Municípios instituírem regime de previdência complementar para os seus respectivos

14 Daí decorre o desequilíbrio hoje amplamente divulgado das contas da previdência social pública: na medida em que cresce a população de pessoas inativas e diminui o número de cidadãos em atividade laboral, as contribuições arrecadadas destes últimos tornam-se insuficientes para suportar os benefícios previdenciários dos primeiros.

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servidores titulares de cargo efetivo. Tal regime deve ser instituído por lei de iniciativa do

respectivo Poder Executivo, observado o disposto no artigo 202, que, conforme dito, trata da

previdência complementar acessível a todos os indivíduos.

A peculiaridade deste regime de previdência complementar destinado aos

servidores, além da sua instituição por lei, é a sua operacionalização obrigatória por

intermédio de entidade fechada de previdência complementar, de natureza pública, e a

estruturação imperativa de seus planos na modalidade de contribuição definida.

A instituição da previdência complementar específica para os servidores

públicos, contudo, não veda o seu ingresso em planos de previdência complementar operados

por entidades abertas de previdência complementar, oferecidos à população em geral. Com

isso, os servidores, em tese – pois depende do exercício da instituição da previdência

complementar específica pelo Poder Legislativo do ente federativo competente –, têm, além

do seu regime próprio, a previdência complementar fechada especial (de caráter público) e a

previdência complementar privada aberta, oferecida a todos os indivíduos, servidores ou não.

Assim, a despeito de a previdência social brasileira estar fundada em dois

pilares: regime geral da previdência social e regime da previdência complementar privada,

conforme anteriormente afirmado, o sistema previdenciário brasileiro, como um todo, é

composto por três vertentes: o regime geral da previdência social, o regime da previdência

complementar e o regime próprio de previdência dos servidores públicos, sendo que a

segunda vertente se subdivide em previdência complementar privada e previdência

complementar pública, assim considerada aquela instituída por lei para os servidores públicos.

Neste sentido, didaticamente expõe Luiz Gushiken:

“A situação atual da previdência no Brasil, após a aprovação da EC nº 20/98 pode ser resumida graficamente da seguinte maneira:

Previdência no Brasil

Regime Próprio de Previdência Social

(RPPS)

Regime Geral de Previdência Social

(RGPS)

Previdência Complementar

Entidades Abertas

Entidades Fechadas

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Como se pode observar no gráfico acima, o sistema previdenciário brasileiro assenta-se em três pilares:

À direita, tem-se o Regime Geral da Previdência Social (RGPS), de caráter contributivo e regido pelo princípio do equilíbrio financeiro e atuarial e que guarida a todos os trabalhadores que exercem atividades remuneradas, excetuando os que estejam filiados ao subsistema RPPS descrito abaixo - e é administrado pelo INSS;

Ao meio, a Previdência Complementar, facultativa e privada, que supre a necessidade de renda adicional, por ocasião da inatividade, e é administrada por entidades abertas com fins lucrativos – bancos e seguradoras – ou por entidades fechadas, sem fins lucrativos – Fundos de Pensão, de que são membros a PREVI, a PETROS etc;

À esquerda, tem-se o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), de caráter contributivo e regido pelo princípio do equilíbrio financeiro e atuarial, que é assegurado exclusivamente aos servidores titulares de cargos efetivo (...).”15

A este quadro esquemático deve-se esclarecer que as entidades abertas de

previdência complementar não se confundem com bancos ou seguradoras, sendo vedado

àqueles (bancos), nos termos da Lei Complementar nº 109/01, administrar planos de

previdência privada16.

Ademais, conforme anteriormente descrito, no tocante à previdência

complementar, é possível a instituição de planos privados – operados por entidades abertas,

fechadas ou sociedades seguradoras – ou de caráter público – operados necessariamente por

entidades fechadas.

Diante disso, em suma, pode-se afirmar que o sistema previdenciário

brasileiro é composto pelos seguintes regimes previdenciários: (i) regime geral da previdência

social; (ii) regime da previdência complementar (de caráter público ou privado); e (iii) regime

próprio dos servidores públicos. Sendo que os regimes mencionados em (i) e (ii) – em relação

aos planos privados – compõem a previdência social lato sensu, conforme disposição

constitucional (artigos 201 e 202), e o regime previsto em (iii) está constitucionalmente

inserido no âmbito das garantias do servidor público (artigo 40), assim como os planos de

previdência complementar de caráter público.

15 “Regime Próprio de Previdência dos Servidores: Como Implementar? Uma Visão Prática e Teórica”. Coleção Previdência Social vol. 17, Brasília, MPAS, 2002, p. 29/30.

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1.2 A Previdência Complementar Privada

Conforme explicitado anteriormente, é no artigo 202 da Constituição

Federal, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/98, que se encontra a previsão

sobre o regime da previdência complementar privada:

“Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar. § 1° A lei complementar de que trata este artigo assegurará ao participante de planos de benefícios de entidades de previdência privada o pleno acesso às informações relativas à gestão de seus respectivos planos. § 2° As contribuições do empregador, os benefícios e as condições contratuais previstas nos estatutos, regulamentos e planos de benefícios das entidades de previdência privada não integram o contrato de trabalho dos participantes, assim como, à exceção dos benefícios concedidos, não integram a remuneração dos participantes, nos termos da lei. (...)”

A Constituição, com estes dispositivos, criou bases gerais obrigatórias para

os planos de previdência complementar privados, fixando sua estrutura (como regime

autônomo em relação ao regime geral da previdência social, de caráter facultativo e

contributivo) e estabelecendo direitos dos participantes (recebimento do benefício contratado,

pleno acesso às informações sobre a gestão dos recursos e o não cômputo das contribuições

do empregador na remuneração devida em razão do contrato de trabalho).

Esses direitos, apesar de constarem do texto constitucional como garantias a

serem disciplinadas por lei complementar específica, já por estarem expressos na

Constituição, servem como genuínos direitos subjetivos constitucionais dos participantes que

ingressam em plano de benefícios privado. Assim, ainda que não estivessem disciplinados em

lei, a sua previsão no bojo do artigo 202 da Constituição Federal é suficiente para lhes

conferir a vedação à sua supressão ou inobservância. A lei complementar mencionada no

16 “Art. 2o O regime de previdência complementar é operado por entidades de previdência complementar que têm por objetivo principal instituir e executar planos de benefícios de caráter previdenciário, na forma desta Lei Complementar.”

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referido artigo serve tão-somente para instituir meios a garantir a efetivação de tais direitos,

sem restringi-los nem modificá-los.

Ademais, é com a previsão do artigo 202 da Constituição Federal que a

formatação da previdência complementar teve expressamente assegurada a sua autonomia em

relação ao regime geral da previdência social e o seu caráter facultativo.

Essa formatação que atualmente se tem da previdência complementar

somente foi possível com a edição da Emenda Constitucional nº 20/98, a qual inaugurou uma

nova etapa no desenvolvimento e modernização do regime da previdência complementar

privada. Como bem assevera Léo do Amaral Filho, a referida Emenda Constitucional

representa um marco na evolução legislativa da previdência privada, pois a partir de sua

edição “o braço facultativo do sistema de seguridade social teve contornos mais nítidos e

específicos” 17.

É curioso observar que, especificamente em relação à previdência

complementar, o legislador constituinte derivado menciona a necessidade de edição de lei

complementar, e não ordinária, para disciplinar este segmento. Enquanto o artigo 201 da

Constituição Federal determina que o regime geral da previdência social será organizado “nos

termos da lei”, o regime da previdência complementar privada deve ser “regulado por lei

complementar”.

A diferença entre esses instrumentos legais, como se sabe, reside tanto no

seu aspecto formal (uma vez que a lei complementar somente é aprovada por maioria

absoluta, enquanto que a lei ordinária é aprovada por maioria simples), quanto no tocante ao

seu aspecto material. Em relação a este último, a doutrina vem procurando identificar as

hipóteses que ensejam a disciplina da lei complementar, de modo a justificar a sua aprovação

por maioria especial, como um indicativo de que, para as matérias reservadas à lei

complementar, o legislador constituinte requer maior ponderação e reflexão.

Para Arthur Bragança de Vasconcellos Weintraub, a necessidade de lei

complementar para regular a previdência privada deve-se à sua importância sob a perspectiva

social, sendo que, em sua opinião, a previdência complementar privada teria recebido

“tratamento legislativo superior” ao do regime geral da previdência social, verbis:

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“A relevância da Previdência Privada é tão marcante, do ponto de vista social, e, por conseguinte, legal, que o ordenamento jurídico brasileiro veio a regular a Previdência Social em leis ordinárias, e a Previdência Privada em leis complementares (hierarquicamente superiores). (...) Na hierarquia legal, a Previdência Complementar Privada obteve um tratamento legislativo superior em relação à Previdência Social.” 18

Porém, tal entendimento, data vênia, resta equivocado, pois não se trata de

superioridade em relação ao campo de atuação da lei ordinária em relação ao da lei

complementar, no âmbito do sistema previdenciário brasileiro. Mesmo porque, no caso em

questão, estar-se-ia, assim, admitindo que a previdência privada estaria num nível de

importância superior à previdência social geral.

Neste sentido, parece ser mais apropriada, especialmente em vista do tema

ora tratado, o entendimento sobre a inexistência de hierarquia formal entre leis ordinárias e

complementares, mas tão-somente reservas materiais distintas para seus conteúdos.

A este respeito, leciona Michel Temer:

“A lei complementar à Constituição foi, durante muito tempo, e ainda é, por muitos doutrinadores, tida como uma norma que ocupa uma posição de prevalência constitucional como uma norma à qual se submete hierarquicamente a lei ordinária. Muitos sustentaram que a lei complementar, escalonada no art. 49, vinha antes da lei ordinária e, por isso, seria hierarquicamente superior. (...) Hierarquia, para o Direito, é a circunstância de uma norma encontrar sua nascente, sua fonte geradora, seu ser, seu engate lógico, seu fundamento de validade, numa norma superior. A lei é hierarquicamente inferior à Constituição porque encontra nesta o seu fundamento de validade. (...) Pois bem, se hierarquia assim se conceitua, é preciso indagar: lei ordinária, por acaso, encontra seu fundamento de validade, seu engate lógico, sua razão de ser, sua fonte geradora, na lei complementar? Absolutamente não! (...) A distinção entre a lei ordinária e a lei complementar reside no âmbito material expressamente previsto, que, por sua vez, é reforçado pela exigência de um quorum especial para sua aprovação. (...) Não há hierarquia alguma entre a lei complementar e a lei ordinária. O que há são âmbitos materiais diversos atribuídos pela Constituição e cada qual destas espécies normativas.” 19

Especificamente no tocante à necessidade de lei complementar para regular

a previdência privada, a previsão constitucional justifica-se pelo fato de a Lei Magna não ter

17 “Previdência Privada Aberta”, São Paulo, Quartier Latin, 2005, p. 144. 18 In ob. cit. p. 18. 19 “Elementos de Direito Constitucional”, 15ª edição, Malheiros, São Paulo, 1999, p. 147/148.

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determinado critérios específicos para os benefícios e institutos aplicáveis ao regime da

previdência privada, como o fez para o regime geral da previdência social.

De fato, explica Antonio Carlos Rodrigues do Amaral que:

“A inserção do instituto da lei complementar no ordenamento positivo pátrio deveu-se ao fato de ter o legislador supremo verificado que, diante de sua natureza, não seria conveniente que determinadas matérias ficassem submetidas à rigidez constitucional, tampouco à flexibilidade concedida à legislação ordinária. Previu assim a edição de normas integradoras do texto magno, orientando, com força vinculante, o trabalho legislativo ordinário.” 20

Em relação ao regime geral da previdência social, o legislador constituinte

definiu critérios mínimos para equilíbrio atuarial e financeiro e estabeleceu benefícios

necessários para: cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada;

proteção à maternidade, especialmente à gestante; proteção ao trabalhador em situação de

desemprego involuntário; salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos

segurados de baixa renda; pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou

companheiro e dependentes. Ademais, fixou valor para os benefícios previdenciários, com

referência ao mínimo autorizado (equivalente ao salário mínimo), sua atualização, com

preservação do seu valor real, além da contagem do tempo para gozo dos benefícios

previdenciários.

Como, para a previdência privada, tais critérios não estão previstos

expressamente, ficou a cargo do legislador complementar definir estes parâmetros gerais,

sempre com vistas ao atendimento do perfil geral traçado para este segmento, pela

Constituição Federal, isto é, mantendo-se a autonomia do setor, a sua facultatividade e as

garantias mínimas de publicidade das informações, de pagamento do benefício contratado e

do não cômputo das contribuições do empregador na remuneração devida em razão do

contrato de trabalho.

A ausência de definição, pela Constituição Federal, de critérios rígidos para

a previdência complementar tem sua razão de ser por se tratar de um regime autônomo,

facultativo e voltado para a iniciativa privada. Por isso, não caberia à Lei Magna impor limites

rigorosos para sua operacionalização, reservando-se ao legislador complementar a definição

20 “Lei Complementar” in “Curso de Direito Tributário”, coord. Ives Gandra da Silva Martins, 8ª edição Saraiva, São Paulo, 2001, p. 66.

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de princípios gerais, parâmetros contratuais, atuariais, financeiros e de investimento, bem

como a imposição de responsabilidade aos agentes operadores do sistema.

Assim, a partir do texto constitucional, é possível extrair a situação jurídica

da previdência complementar privada em contraposição aos demais regimes previdenciários

(regime geral da previdência social e regime próprio da previdência dos servidores públicos) e

à previdência complementar pública, bem como as características gerais a ela aplicáveis,

apenas.

Neste tocante, pontua Alexandre de Moraes:

“O regime de previdência privada apresenta algumas características constitucionais: • caráter complementar; • organização autônoma em relação ao regime geral de previdência social; • independência financeira em relação ao Poder Público: (...) • facultatividade; • regulamentação por lei complementar; • publicidade de gestão: (...).”21

As demais características e a especificação dos critérios para a

operacionalização dos planos de previdência complementar privada ficam reservados à

disciplina legal complementar, infra-constitucional.

1.3 A Lei Complementar nº 109/01

Quando da edição da Emenda Constitucional nº 20/98, que passou a prever o

regime da previdência privada no texto da Constituição Federal de 1988, este segmento estava

regulado em esfera infraconstitucional pela Lei nº 6.435/77, isto é, por lei anterior à própria

instituição da ordem constitucional vigente.22

Apesar de tratar de alguns dos importantes aspectos da previdência

complementa privada – como, por exemplo, a definição de parâmetros mínimos de

21 In “Direito Constitucional”, 17ª edição, São Paulo, Atlas, 2005, p. 726/727. 22 Neste tocante, cabe mencionar que a Lei nº 6.435/77, apesar de formalmente ter sido editada como lei ordinária, foi recepcionada, pela Constituição Federal de 1988, com status de Lei Complementar, a partir da edição da Emenda Constitucional nº 20/98.

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operacionalização dos planos de benefícios, a sua administração por entidades abertas e

fechadas de previdência privada, e a atuação do Estado como agente regulador e fiscalizador

do setor –, a Lei nº 6.435/77 não preenchia, integralmente, o perfil traçado pelo artigo 202 da

Carta Magna.

Por esta razão, a Emenda Constitucional nº 20/98 previu, em seu artigo 7º,

que “os projetos das leis complementares previstas no art. 202 da Constituição Federal

deverão ser apresentados ao Congresso Nacional no prazo máximo de noventa dias após a

publicação desta Emenda”.

A Lei Complementar nº 109/01, porém, somente foi publicada quase dois

anos e meio após a reforma constitucional, o que significou a disciplina defasada da Lei nº

6.435/77 por mais de dois anos após o estabelecimento da disciplina constitucional da

previdência privada.

Com o advento da Lei Complementar nº 109/01, porém, as características

constitucionais do regime da previdência complementar e os parâmetros gerais de sua

operacionalização restaram perfeitamente entrelaçados.

A Lei Complementar nº 109/01 cuida da definição dos papéis dos agentes do

setor – entidades, Estado e contratantes (participantes e patrocinadores) –, da exposição de

princípios, das condições mínimas de estruturação dos planos de benefícios, dos direitos dos

participantes e deveres e responsabilidades das entidades de previdência complementar e de

seus dirigentes, da instituição das entidades e o exercício da atividade de administrar planos

de benefícios, dos critérios gerais para o custeio dos benefícios, bem como da fiscalização e

imposição de regime disciplinar repressivo.

A referida lei complementar não determina, como não poderia, a relação

exaustiva de benefícios a serem assegurados pelos planos, tampouco o seu valor e forma de

atualização. Isto porque, como é próprio deste regime o caráter privado, a definição destes

elementos deve ser efetivada contratualmente, em manifestação expressa da vontade das

partes contratantes.

A este respeito, extrai-se da obra de coordenação do professor Wagner

Balera, a esclarecedora descrição acerca do papel da Lei Complementar nº 109/01:

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“As partes podem decidir, desde que capazes para contratar, sem qualquer tutela, a extensão, os limites e os efeitos do negócio jurídico que engendram entre elas e que somente a elas diz respeito. Ao definir, pois, o negócio previdenciário privado como contrato, a Superlei já imprime os lineamentos que revestirão, sob o império da autonomia privada, o comportamento humano, no particular. É evidente que a lei, ao estabelecer a tipologia contratual previdenciária, definirá, com caráter genérico e abstrato, os termos do negócio privado. A lei é, sempre, a fonte das obrigações. Digamos, explicando melhor, que a lei definirá os elementos externos do negócio previdenciário, deixando ao talante das partes a manifestação da vontade contratual que afeiçoa o arquétipo genérico legalmente estabelecido ao querer que justificou a avença.” 23

Com efeito, o negócio jurídico da previdência complementar privada, de

contratação livre pelas partes, deverá prever os benefícios previdenciários contratados e todas

as demais condições de sua efetivação, uma vez que a Lei Complementar nº 109/01 conferiu

autonomia às entidades de previdência privada e aos indivíduos para fixação das obrigações a

serem reciprocamente assumidas, observado o arquétipo genérico por ela estabelecido.

23 “Comentários à Lei de Previdência Privada”, São Paulo, Quartier Latin, 2005, p. 19/20.

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Capítulo II - O Regime Jurídico da Previdência Complementar Privada

Por regime jurídico entende-se o conjunto dos elementos e características

que definem o tratamento a ser conferido a dado instituto do direito.

Edmir Netto de Araújo descreve que:

“Por outro lado, regime jurídico de um instituto jurídico pode significar o conjunto de notas que o tipificam, em essência: se esse conjunto coincidir, nos ramos público e privado, o instituto será comum aos dois, não sendo peculiar a nenhum deles; se for diverso, pode-se dizer que existe, em separado, no direito público ou no direito privado. Estabelecer seu regime jurídico, então, é integrá-lo no sistema a que pertence, estabelecendo seus pontos essenciais (mínimos e máximos), de modo a fixar seu exato lugar ‘geométrico’ e delimitar o alcance preciso de suas implicações”. 24

Vejam-se, pois, os elementos que determinam o regime da previdência

complementar privada, identificando a sua essência e o seu alcance.

A previdência complementar privada está estruturada, de forma autônoma,

em planos de benefícios de caráter previdenciário, cuja finalidade precípua é a de

complementar a atuação estatal, no âmbito da previdência social (lato sensu), assegurando a

seus participantes benefícios complementares aos benefícios de aposentadoria assegurados

pelo regime geral da previdência social.

A par da autonomia da previdência complementar privada ao regime estatal

(regime geral da previdência social ou regime próprio de previdência dos servidores

públicos), a primeira característica que se coloca, neste tocante, é o caráter privado da

previdência complementar. Isto significa que apenas os particulares que tenham formalizado

sua inscrição junto à entidade de previdência complementar estarão abrangidos por este

regime previdenciário. Tal inscrição pressupõe que os benefícios assegurados pelo plano de

previdência privada serão concedidos na medida e forma contratadas formalmente, mediante

manifestação da vontade das partes.

Trata-se, efetivamente, de uma relação de cunho contratual privado, pois se

instala com formalização de um acordo entre as partes de direito privado (participante e

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entidade de previdência privada, com ou sem a participação de uma pessoa jurídica

patrocinadora). A participação do Estado restringe-se à fiscalização e ao controle da

observância de normas gerais aplicáveis à relação contratual instaurada.

O Estado, na previdência complementar privada, não age como parte

contratante nem como interveniente, mas como mero fiscalizador e regulador das condutas

assumidas no âmbito dos planos de benefícios instituídos.

Com efeito, a Lei Complementar nº 109/01, em seu artigo 3º, limita a

atuação do Estado, no regime de previdência complementar privada, apenas para formular a

política de previdência complementar, disciplinar, coordenar e supervisionar as atividades

exercidas pelas entidades de previdência privada, compatibilizando-as com as políticas

previdenciária e de desenvolvimento social e econômico-financeiro, determinar padrões

mínimos de segurança econômico-financeira e atuarial, com fins específicos de preservar a

liquidez, a solvência e o equilíbrio dos planos de benefícios, isoladamente, e de cada entidade

de previdência complementar, no conjunto de suas atividades, assegurar aos participantes e

assistidos o pleno acesso às informações relativas à gestão de seus respectivos planos de

benefícios, fiscalizar as entidades de previdência complementar, suas operações e aplicar

penalidades e proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios.25

Ademais, nos planos de previdência privada, o custeio dos benefícios é

realizado exclusivamente por contribuições dos participantes (pessoas físicas) e dos

patrocinadores (pessoas jurídicas), se houver. Não há, por parte do Estado, qualquer prestação

ou contraprestação, complementando ou suplementando o custeio das reservas dos

participantes no plano.

A este respeito, ressalta Wagner Balera:

24 “Curso de Direito Administrativo”, São Paulo, Saraiva, 2005, p. 46. 25 “Art. 3º A ação do Estado será exercida com o objetivo de: I - formular a política de previdência complementar; II - disciplinar, coordenar e supervisionar as atividades reguladas por esta Lei Complementar, compatibilizando-as com as políticas previdenciária e de desenvolvimento social e econômico-financeiro; III - determinar padrões mínimos de segurança econômico-financeira e atuarial, com fins específicos de preservar a liquidez, a solvência e o equilíbrio dos planos de benefícios, isoladamente, e de cada entidade de previdência complementar, no conjunto de suas atividades; IV - assegurar aos participantes e assistidos o pleno acesso às informações relativas à gestão de seus respectivos planos de benefícios; V - fiscalizar as entidades de previdência complementar, suas operações e aplicar penalidades; e VI - proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios.”

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34

“Pertencem ao domínio do ius civile os contornos jurídicos da entidade previdenciária privada. Já mais de uma vez apontei essa circunstância, como no seguinte trecho: ‘O sistema de previdência supletiva, no Brasil, é privado. Essa característica não pode ser considerada apenas como rótulo, presente no nome (previdência privada) e ausente na prática. Não! Convém que haja em esquema estatal de proteção e que, ao lado dele, cólica uma estrutura privada e facultativa.’ (cf., o meu, A Seguridade Social na Constituição de 1988, RT, São Paulo, 1989, p. 109).” 26

A atuação do Estado como órgão regulador e fiscalizador justifica-se pela já

destacada importância da previdência privada na composição da estrutura da previdência

social brasileira.

O papel do Estado, no regime de previdência complementar privada,

portanto, não lhe retira a natureza de direito privado da relação jurídica instalada entre as

partes quando da contratação do plano de previdência privada.

Isso se evidencia ainda mais ao se observar que, no regime geral da

previdência social, ou mesmo no regime próprio de previdência dos servidores públicos, ou

ainda no regime da previdência complementar voltado para os servidores públicos, o Estado

participa do custeio dos benefícios previdenciários e é parte da relação jurídica instaurada. Na

previdência privada, não; é mero fiscalizador e regulador das atividades exercidas pelas

entidades de previdência privada.

As entidades de previdência privada são pessoas jurídicas de direito privado,

ainda que não visem ao lucro, como é o caso das entidades fechadas. São instituídas por livre

iniciativa, sem qualquer imposição por parte de qualquer órgão público. É a fiscalização de

suas atividades que é realizada por órgãos da Administração Pública.

Isso ocorre com inúmeras outras categorias de entidades e instituições no

País, como, por exemplo, as instituições financeiras (bancos, sociedades de capitalização,

distribuidoras de títulos e valores mobiliários, entre outras). Estas, assim como as entidades de

previdência complementar privada, apesar de estarem estruturadas e atuarem como pessoas

jurídicas de direito privado, são reguladas e fiscalizadas por órgãos públicos, em razão do

papel que exercem no mercado em que atuam (neste exemplo, nos mercados financeiro e de

capitais), de suma importância para ordem econômica do País.

26 In ob. cit. p. 32.

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O caráter privado da previdência complementar tem como corolário a livre

fixação das condições contratuais que regerão os planos de benefícios contratados. Isso quer

dizer que, desde que não haja vedação, e esteja-se observando os limites normativos, as

entidades de previdência privada e seus contratantes (participantes, patrocinadores) podem

fixar livremente o formato do custeio dos benefícios (valor das contribuições, periodicidade,

atualização monetária), os benefícios assegurados (coberturas de aposentadoria por tempo

determinado, vitalício, pecúlio por morte, invalidez) e o tempo de sua concessão (data de

início do pagamento, periodicidade), além de todas as demais condições. É por essa razão que

a previdência privada é marcada pela diversidade de produtos, condições e perfis de

investimento, sendo oferecidas os mais distintos formatos de complementação de

aposentadoria.

Além do seu caráter privado, o regime jurídico da previdência privada ainda

é marcado pela sua complementaridade ao regime geral da previdência social.

Com efeito, tanto o texto constitucional quanto a Lei Complementar nº

109/01, que rege o regime da previdência privada, expressamente destacam que este regime

tem caráter complementar, e não suplementar ao regime estatal de previdência27. Com isso,

destaca-se que a destinação de tais planos, por essência, é a de proporcionar renda extra

àquela já assegurada pelo regime geral da previdência social ou pelo regime próprio dos

servidores públicos.

Vale aqui esclarecer a diferença entre os termos complementar e

suplementar. Complementar deriva de completar, tornar completo; concluir, rematar; perfazer,

preencher. Suplementar quer dizer que serve de suplemento ou de auxílio; que se ajunta como

suplemento; que supre o que falta.28

Com isso, tem-se que dizer que alguma coisa é complementar significa que

ela preenche algo a fim de torná-lo completo, concluído, inteiro. De outro lado, caracterizar

27 Vale observar que a Lei nº 6.435/77, que anteriormente disciplinava o regime da previdência complementar, dispunha expressamente os benefícios assegurados pela previdência privada como complementares e assemelhados aos da Previdência Social, verbis: “Art. 1º Entidades de previdência privada, para os efeitos da presente Lei, são as que têm por objeto instituir planos privados de concessão de pecúlios ou de rendas, de benefícios complementares ou assemelhados aos da Previdência Social, mediante contribuição de seus participantes, dos respectivos empregadores ou de ambos. (...)” (grifamos) 28 Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa, Melhoramentos, São Paulo: 1998.

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algo como suplementar é o mesmo que afirmar que este supre alguma coisa, faz as vezes de

algo que está faltando.

No caso específico das entidades de previdência privada, o texto

constitucional e o texto legal mencionam o termo complementar, a fim de indicar que,

efetivamente, não se trata de substituir benefícios assegurados pelo regime geral da

previdência social, ou de instituir um regime previdenciário alternativo ao regime geral29,

mas, sim, de servir como meio para complemento, como um adicional aos benefícios

assegurados pela previdência social geral.

Neste sentido, descreve Léo do Amaral Filho:

“O aspecto de complementaridade decorre da insuficiência do sistema oficial. Explica-se, desde logo, que o sistema oficial de previdência tem como finalidade prover condições mínimas para os que a ela estão filiados, facultativa ou obrigatoriamente. Esses limites serão aferíveis por meio dos parâmetros que a lei fixar. Por certo, os benefícios que a previdência social proporcionar deixarão uma parcela da população com restrições à época do pagamento dos benefícios, em relação àqueles auferidos quando em atividade. Aquele segurado que em atividade extrapolar o limite (teto) de benefícios pagos pela Previdência Social terá seus rendimentos sensivelmente reduzidos por ocasião da aposentadoria. É no exame desse contexto que se verifica a característica nitidamente complementar do regime que ora tratamos. (...)”30

Importante notar que a complementaridade da previdência privada não se

reflete apenas no regime geral da previdência social, isto é, para servir de complemento aos

benefícios dos segurados vinculados à previdência oficial, mas também adiciona benefícios

àqueles assegurados no âmbito do regime próprio da previdência dos servidores públicos. Isto

porque, conforme já exposto anteriormente, não há qualquer vedação para que servidores

públicos ingressem em planos de benefícios operados por entidades de previdência privada.

Desta forma, a previdência privada é complementar ao regime geral da

previdência social e também ao regime próprio de previdência dos servidores públicos.

Ocorre, porém, que a complementação dos benefícios de aposentadoria não

exige, necessariamente, uma vinculação do participante ao regime de previdência dos

trabalhadores da iniciativa privada (regime geral) ou dos servidores públicos (regime próprio).

29 Ainda que, em certos casos concretos a seguir apresentados, a previdência privada seja a única fonte de obtenção de renda na fase da inatividade laboral. 30 In ob. cit. p. 148/149.

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A previdência privada é autônoma e acessível a qualquer indivíduo, ainda que não esteja

vinculado a um desses regimes31.

A idéia proposta na constituição para a previdência privada não é de limitar

o seu acesso apenas àqueles que já possuam garantia de benefícios mínimos de aposentadoria.

É o de prever que, dentro da estrutura do sistema previdenciário brasileiro, a previdência

privada serve de complementação, e não como um regime paralelo ao de filiação obrigatória.

É nessa intenção, faz-se parecer, que reside a caracterização da previdência

privada como complementar.

Diante disso, é possível perceber que, em alguns casos concretos,

excepcionalmente, os benefícios assegurados pela previdência privada servirão como um

substituto aos benefícios do regime geral de previdência social. É o caso, por exemplo, de

uma pessoa que não tenha vínculo empregatício nem tenha jamais prestado serviços a

terceiros, mas exerce atividade de trabalho doméstico, em sua própria residência. Essa pessoa,

como se sabe, pode ter-se filiado ao regime geral da previdência social, na qualidade de

segurado facultativo. Contudo, se não formalizou tal filiação, mas ingressou em plano de

previdência privada, os benefícios previdenciários percebidos por essa pessoa serão apenas

aqueles advindos do plano de previdência privada, quando da chegada da fase de

aposentadoria.

Ressalte-se que, neste exemplo, os benefícios da previdência privada,

excepcionalmente, não corresponderão a uma complementação dos benefícios do regime

previdenciário geral, mas, sim, como substituição para estes. Há, nesses casos específicos,

certa flexibilização do caráter complementar da previdência privada – o que, contudo, não

afasta a sua essência “complementar” ao regime geral da previdência social.

Exemplos como esse, porém, servem apenas para demonstrar que o caráter

complementar dos benefícios da previdência privada não é absoluto, e admite exceções.

31 No tocante ao tratamento tributário das contribuições efetuadas pela pessoa física para o plano de previdência privada, será possível observar adiante que a sua dedutibilidade para fins de apuração do imposto de renda está, contudo, condicionada à contribuição para o regime geral da previdência social ou para o regime próprio da previdência dos servidores públicos – condição não aplicável apenas aos participantes aposentados por um desses regimes.

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Vale dizer: o caráter complementar dos planos de previdência privada reside

na essência do seu papel dentro do sistema previdenciário brasileiro, e não na finalidade que

lhes é conferida pelos seus usuários (participantes).

A este respeito, é oportuno mencionar o entendimento exposto, com

exemplos, por Heloisa Hernandez Derzi e Fabiana Ulson Zappa a respeito do tema:

“Afirma-se que o traço constitucional de complementariedade da previdência privada fica profundamente maculado quando a atual legislação dissocia a necessidade de haver obtido a necessária implementação do benefício no regime previdenciário público para que se dê a cobertura do Plano Privado. Entretanto, não se pode esquecer que existe igualmente a função da suplementariedade, que consiste na concessão de benefícios da previdência privada ainda que não se implemente a cobertura pela previdência pública. Ex.: um trabalhador fica desempregado, não consegue mais trabalho e, de acordo com o Regime Geral de Previdência Social, ele perde a qualidade de segurado; em tese não teria direito à aposentadoria, entretanto, nada impede que o plano de previdência privada possa prever a concessão de aposentadoria quando ele atingir a idade e tiver implementado a carência. O mesmo pode se dar em caso de morte que no Regime Geral de Previdência Social não exista beneficiário (dependente econômico); nessa hipótese, a regra não incide e não há prestação do benefício; na previdência privada, ao revés, existe a ordem de sucessão vocacional do Direito Civil, que beneficia os herdeiros necessários ou o beneficiário indicado na proposta de inscrição do plano.” 32

Ainda no tocante a essa relativização da complementaridade da previdência

privada, é possível também observar que, ainda que se tome por base os indivíduos filiados ao

regime previdenciário geral, nem sempre os benefícios assegurados pelo plano de previdência

privada significarão um adicional aos rendimentos futuramente obtidos pelo regime geral.

Isto porque, para o indivíduo filiado ao regime geral da previdência oficial

que não faça jus ao teto do benefício previdenciário assegurado por este regime, os valores

recebidos no plano de previdência privada serão parcialmente considerados como uma

composição de renda.

Essa idéia vem exposta em debates na doutrina e em manifestações dos

órgãos públicos competentes pela fiscalização do sistema, como se destaca do despacho do

Ministro da Previdência e Assistência Social em 28 de agosto de 1997, publicado no D.O.U.

em 03 de setembro de 1997, que aprovou a Nota/CJ/nº 414/97. Confira-se:

32 “A Tributação e o Caráter Social da Previdência Complementar”, Revista de Previdência nº 4, Rio de Janeiro, Ed. Gramma, Abril/06, p. 64/65.

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“3 - Analisando a questão a Secretaria da Previdência Social deste Ministério, em Nota de 24 de julho de 1997 assim o dispôs: (...)

d) A previdência oficial básica assegura aos seus beneficiários os meios de manutenção indispensáveis nas situações denominadas de risco social, quais sejam, a incapacidade, temporária ou permanente, a idade avançada, o tempo de serviço transcorrido, os encargos familiares, a reclusão e a morte. O valor do benefício oferecido, no entanto, não ultrapassa R$ 1.031,87. Assim, a previdência complementar socorre o trabalhador com rendimentos acima deste valor, na composição do benefício mais próximo de sua remuneração real. Não faz sentido obrigar a que segurados com rendimentos abaixo do teto aufiram benefícios da previdência complementar porque, neste caso, não haveria o que ser complementado. (...)

4. Neste aspecto a Nota da Secretaria da Previdência Social é suficientemente esclarecedora.

5. É certo que o programa há de estar disponível a todos os empregados e dirigentes. Por óbvio não estará obrigatoriamente disponível para aqueles que recebam remuneração abaixo do valor máximo de benefício pago pela Previdência Social. (...)” (g.n.)

Segundo este entendimento, o caráter complementar da previdência privada

somente estaria refletido nos casos em que o beneficiário dos recursos assegurados pelo plano

de previdência privado percebesse aposentadoria, pelo regime geral da previdência social

segundo o teto assegurado por este sistema.

Porém, tal entendimento imobiliza demasiadamente a essência da

complementaridade da previdência privada, restringindo significativamente o âmbito de sua

aplicação.

A complementação dada pelo regime da previdência privada, conforme já se

mencionou, está baseada no papel do regime, em si, por não representar um paralelo ao

regime geral da previdência social ou ao regime próprio dos servidores públicos, mas, sim,

um regime complementar à estrutura do sistema previdenciário brasileiro, como instrumento

de proteção social.

Neste sentido, concorda-se com a afirmação extraída do artigo de autoria de

Andréa Nogueira Neves e Fabiana Ulson Zappa, a seguir transcrito:

“A partir desse novo arcabouço legal resta claro que a ‘complementaridade’ da previdência privada não mais se relaciona com a complementação aos valores de

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benefícios concedidos pela Previdência Social (...), mas sim com a complementação ao sistema de seguridade social, na cobertura dos ‘riscos sociais’.” 33

A par do caráter complementar, cabe ainda ressaltar outra característica

peculiar do regime da previdência privada: a facultatividade. Qualquer pessoa capaz poderá

ingressar num plano de previdência complementar privada – se assim o desejar –, desde que

siga o procedimento definido pelos órgãos reguladores competentes.

A facultatividade é válida mesmo no âmbito de um plano fechado, restrito

aos empregados de determinada empresa ou grupo de empresas. Assim, não há

obrigatoriedade de instituição de planos de previdência complementar para os empregados de

uma empresa, nem tampouco é compulsória a adesão dos empregados, caso haja instituição de

planos dessa natureza na empresa em que trabalham.

Essa característica da facultatividade, apesar de, a rigor, vincular-se à adesão

ao plano de previdência privada, também está presente nos momentos que seguem essa

contratação, ou seja, à manutenção do plano e à eventual alteração das condições contratadas

originalmente. Desta forma, toda a contratação do plano de benefícios e manutenção da

relação contratual está envolvida pela facultatividade.

A facultatividade referida pela Constituição Federal e disciplinada nas

normas legais diz respeito tanto ao participante do plano, pessoa física que poderá optar ou

não pelo ingresso no plano de benefícios (fechado ou aberto), como à pessoa jurídica, que

poderá optar por integrar a relação jurídica contratual na qualidade de patrocinadora de parte

ou de todo o custeio dos benefícios contratados.

Sobre este ponto-de-vista, pondera Wladimir Novaes Martinez:

“A facultatividade do regime pouco tem que ver com a possibilidade ingresso do trabalhador no plano. Mera coincidência de idéias. Significa que a empresa patrocinadora, sindicato ou associação de classe não está obrigada a criá-lo ou provê-lo, podendo fazê-lo por livre e espontânea vontade. Mas, claro, presencia-se a facultatividade de adesão da pessoa, que detém, a pretensão de fazer parte ou não.” 34

33 “Dedutibilidade das Contribuições Destinadas a Planos de Previdência Complementar”, in “Tributação nos Mercados Financeiro e de Capitais e na Previdência Privada”, coord. Heleno Taveira Torres, São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 511/512. 34 “Comentários à Lei Básica da Previdência Complementar”, LTr, São Paulo, 2003, p. 26.

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Ademais, também para a entidade de previdência há faculdade, na medida

em que não lhe é imposta a instituição de um número mínimo ou máximo de planos,

tampouco de condições rígidas para operacionalização de tais planos (exceto, obviamente, as

restrições impostas pelo Estado, enquanto agente regulador e fiscalizador)35.

Por tudo isso, é que Arthur Bragança de Vasconcellos Weintraub afirma:

“O fato é que existe grande flexibilidade nas possibilidades de ingresso em planos de Previdência Privada, tanto em relação aos participantes, quanto aos patrocinadores. Para que haja esta flexibilidade de opções de ingresso no sistema previdenciário complementar privado, a contratualidade é a característica mais significativa em relação à formalização material dos direitos e obrigações do participante de entidade de Previdência Privada.” 36

E complementa, reforçando o que antes foi dito sobre a atuação do Estado

apenas como regulador do sistema, sem contudo, limitar a liberdade contratual inerente ao

regime em questão:

“O Estado, porém, permeando o caráter institucional da Previdência, mantém um caráter extremamente regulador, cerceando (com uma legislação extremamente minuciosa e burocratizante) de certa forma a supracitada liberdade contratual, em desprezo à contratualidade. (...) A autonomia da vontade não é absoluta, mas não havendo previsão contrária de ius cogens, a vontade do participante é plena. (...)”

Um outro aspecto importante do regime jurídico aplicável à previdência

complementar privada é a sua organização segundo o regime de capitalização baseado na

acumulação de capital. Isto significa dizer que, diferentemente do regime geral da previdência

social, em que a capitalização está fundada na força do trabalho, de forma que a geração atual

custeia os benefícios previdenciários da geração anterior (atuais aposentados), o regime da

previdência privada está voltado para que os participantes de hoje custeiem os seus próprios

benefícios de manhã.

A este respeito, explica a cartilha “Panorama da Previdência Social

Brasileira”, de edição do Ministério da Previdência Social:

35 Neste sentido, vale destacar que o próprio texto da Lei Complementar nº 109/01 destaca a necessária flexibilidade da previdência complementar privada: “Art. 7o (...) Parágrafo único. O órgão regulador e fiscalizador normatizará planos de benefícios nas modalidades de benefício definido, contribuição definida e contribuição variável, bem como outras formas de planos de benefícios que reflitam a evolução técnica e possibilitem flexibilidade ao regime de previdência complementar.”

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“A técnica desenvolvida para a construção de qualquer sistema de previdência funda-se no princípio da capitalização, seja com base na força de trabalho ou no capital propriamente. O primeiro modelo diz respeito ao pacto integracional, no qual a geração futura, ao ingressar no mercado de trabalho, assume o ônus da aposentadoria da geração anterior. Todavia, em matéria de Previdência Complementar, a legislação apenas permite a capitalização com base na acumulação de capital, que ocorre por meio da acumulação de ativos, que podem ser imobiliários, títulos da dúvida ou participações acionárias no capital das empresas. Em relação ao modelo de capitalização com base a acumulação de ativos, a técnica desenvolvida permite a utilização de uma grande diversidade de métodos, os quais variam de acordo com o perfil da massa de trabalhadores segurados. Se, por exemplo, a idade média dos participantes é relativamente baixa, o plano de previdência pode acumular recursos a uma taxa mais lenta no início e mais acelerada no final, isso tanto para tornar o plano mais atrativo aos mais jovens, quanto para adequar-se à capacidade de pagamento do grupo. Enfim, o processo de constituição dos ativos que irão garantir o pagamento dos benefícios poderá ocorrer na proporção e na velocidade que for mais adequada aos interesses e à capacidade financeira dos contribuintes, mantendo-se a compatibilidade necessária para manutenção do equilíbrio entre período e nível de contribuição em relação ao valor e período de recebimento dos benefícios.” 37

A operacionalização do regime financeiro, na previdência complementar,

deverá buscar, invariavelmente, a solvência, a liquidez e o equilíbrio econômico-financeiro e

atuarial dos planos de previdência complementar privada, por determinação da Lei

Complementar nº 109/0138.

No tocante aos benefícios assegurados pelos planos de previdência

complementar, tem-se, basicamente, os de aposentadoria, aí incluída a aposentadoria por

alcance de determinada idade, por invalidez ou mesmo em razão de falecimento do

participante inscrito – além de outros benefícios de cobertura de risco, como o auxílio-doença.

Diferentemente do regime geral da previdência social, porém, os planos

privados asseguram a possibilidade de resgate das contribuições realizadas no plano em que a

pessoa física é participante.

Nos planos de previdência complementar privada, o resgate permite o saque

de recursos acumulados pelo participante, antes do gozo da aposentadoria. Ou seja, é o

instrumento que possibilita o recebimento dos recursos acumulados pelo participante, antes do

início do pagamento do benefício contratado.

36 In ob. cit. p. 25/26. 37 Brasília, Março/2004. 38 “Art. 7o Os planos de benefícios atenderão a padrões mínimos fixados pelo órgão regulador e fiscalizador, com o objetivo de assegurar transparência, solvência, liquidez e equilíbrio econômico-financeiro e atuarial. (...)”

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Neste sentido, Adacir Reis descreve: “Trata-se do único instituto que desvia

a vocação previdenciária da poupança privada, tendo em vista que o resgate nada mais é que

o saque sem qualquer destinação específica, ou seja, é o saque para o consumo.” 39

Apesar de também resultar na entrega de recursos depositados no plano de

benefícios, assim como o pagamento do benefício de aposentadoria, o resgate diferencia-se

essencialmente do pagamento de benefícios de aposentadoria porque, enquanto o resgate

corresponde a um pagamento extraordinário, ocorrido por solicitação do participante,

conforme sua conveniência, ou por desligamento do plano, o pagamento de benefícios é

definido desde a contratação do plano, com a finalidade primordial de proporcionar

complementação à aposentadoria do participante ou de auxiliar na subsistência de seus

beneficiários, em não ocorrendo a sobrevivência do participante.

Observe-se, portanto, que, independentemente da forma como é pago – se

em parcelas periódicas ou em parcela única –, o resgate não se confunde com o pagamento de

benefícios, por sua natureza jurídica. Tal distinção torna-se importante não apenas para fins

contratuais, como para determinação do tratamento tributário ao qual tais institutos estão

sujeitos, conforme será descrito adiante.

Além do resgate, outros institutos podem estar inseridos no âmbito do

regime de previdência complementar (benefício proporcional diferido, portabilidade e

autopatrocínio). A respeito deles, vale mencionar o esclarecimento pontual e objetivo dado

por Andréa Nogueira Neves e Fabiana Ulson Zappa:

“Além desses ‘benefícios previdenciários’, a Lei Complementar nº 109/01 também estabelece alguns institutos que necessariamente devem estar previstos nos planos de benefícios de caráter previdenciário administrados por Entidades Fechadas:

i) o benefício proporcional diferido, que é a possibilidade de o participante do plano

coletivo, em razão da cessação do vínculo empregatício com o patrocinador ou associativo com o instituidor, antes da aquisição do direito ao benefício pleno, permanecer vinculado ao plano até que cumpridos os requisitos de elegibilidade ao benefício;

ii) a portabilidade do direito acumulado pelo participante para outro plano, administrado por Entidade Aberta ou Entidade Fechada;

iii) o resgate (...) iv) o autopatrocínio, faculdade de o participante manter-se vinculado ao plano, opção

na qual será obrigado a arcar com o valor de sua contribuição e a do patrocinador, no caso de perda parcial ou total da remuneração recebida.

39 in “Temas Centrais da Nova Legislação”, publicado no livro “Fundos de Pensão em Debate”, Ed. Brasília Jurídica, 2002, p. 22.

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Por sua vez, em relação aos planos administrados pelas Entidades Abertas, o artigo 27 da Lei Complementar nº 109/01 garante aos participantes o direito irrestrito ao exercício do resgate e portabilidade de recursos das reservas técnicas, provisões e fundos, total ou parcialmente (...).”40

Dentre esses institutos, para os fins do presente estudo, além do resgate,

anteriormente comentado, destaca-se a portabilidade, posto que os demais (autopatrocínio e

benefício proporcional diferido) têm reflexos no tocante à execução e manutenção do plano e

pagamento dos benefícios, enquanto que a portabilidade altera a condição dos recursos

acumulados.

Isso porque, com a portabilidade, o participante transfere suas reservas

(recursos até então acumulados) para outro plano, no âmbito de uma mesma entidade ou

outra, podendo essa transação ocorrer no âmbito dos planos abertos ou fechados ou entre

esses.

Na portabilidade, diferentemente do resgate, o participante movimenta os

recursos que acumulou, porém, sem que tais recursos se tornem disponíveis a ele. A

portabilidade dos recursos acontece diretamente de um plano (destinatário) para outro

(receptor).41

Sobre a diferença entre a portabilidade e o resgate, pontua Wladimir Novaes

Martinez:

“Portabilidade difere de resgate. Ela é transferência de valor de uma para outra entidade, sem a posse própria da propriedade, enquanto o resgate é saque de importância para uso e fruto do participante. O legislador separa bem claramente os dois institutos: portabilidade é uma coisa e resgate, outra. Significa que a importância sacada dos cofres da EFC [entidade de previdência complementar], na primeira hipótese, é encaminhada aos cofres da outra EPC, onde, finalmente, conforme o caso, segundo as novas regras ora impostas, poderia o titular, a princípio e a rigor, presente os pressupostos, ser resgatada” 42

A portabilidade caracteriza-se por ser um direito subjetivo individual de

cada participante. Nos casos em que a transferência dos recursos acumulados em determinado

plano é realizada em caráter coletivo (isto é, abrangendo todo o universo de participantes e

40 In ob. cit, p. 515/516. 41 Adiante será objeto de comentários o tratamento tributário aplicável aos resgates efetuados no âmbito dos planos de previdência privada e sua diferença em relação à tributação da portabilidade justamente por se tratar de institutos de natureza diversa.

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45

reservas de determinado plano de benefícios, que passarão a ser administrados por outra

entidade), a denominação comumente usada é a de “transferência”. A transferência é, em

última instância, portanto, uma portabilidade coletiva.

Além da transferência e da portabilidade, outras hipóteses podem ensejar a

realocação das reservas de determinado plano em outro plano ou para administração de outra

entidade de previdência complementar. São os casos em que há, por exemplo, a retirada de

patrocínio – ou seja, a(s) patrocinadora(s) deixa(m) de custear o plano no âmbito de uma

entidade fechada de previdência complementar e o plano passa a ser administrado por uma

entidade aberta de previdência complementar – ou a reorganização societária da patrocinadora

ou da própria entidade de previdência complementar.

Em qualquer desses casos, entende-se que, não havendo disponibilização de

recursos ao participante nem tampouco à patrocinadora, mas transferência direta dos recursos

entre entidades de previdência complementar, os efeitos jurídicos são semelhantes aos

aplicáveis à portabilidade.

2.1 A Relação Jurídica Contratual

Toda relação jurídica, enquanto o vínculo abstrato criado para gerar

conseqüências de direito, pressupõe a existência de, ao menos, duas pessoas. Hans Kelsen em

sua insuperável obra “Teoria Pura do Direito” explica que “em estreita conexão com os

conceitos de dever jurídico e de direito subjetivo (Berechtigung) está, segundo a concepção

tradicional, o conceito de relação jurídica. Esta é definida como relação entre sujeitos

jurídicos, quer dizer, entre o sujeito de um dever jurídico e o sujeito do correspondente

direito (Berechtigung) (...)”.43

No tocante à previdência complementar privada, há relações jurídicas

instauradas (i) entre a pessoa física que contrata o plano na qualidade de beneficiário

(chamado participante) e a entidade de previdência complementar, administradora do plano

de benefícios, (ii) entre a pessoa jurídica que contrata o plano não como beneficiário, mas

42 In ob. cit. p. 165. 43 Martins Fontes, São Paulo, 1996, p. 182.

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como intermediário ou participante do custeio do plano (chamado patrocinador) e a entidade

de previdência, e (iii) entre o patrocinador e o participante.

Essas relações jurídicas intersubjetivas, porém, se entrelaçam, formando um

conjunto jurídico único, cuja prestação final é a garantia de benefícios previdenciários futuros

a determinada pessoa física (que poderá ser o participante ou um terceiro que seja por ele

nomeado).

Sobre essas partes das relações jurídicas na previdência privada, Léo do

Amaral Filho descreve:

“Uma visão preliminar da idéia de relação jurídica de previdência privada importa concluir pela existência de, necessariamente, dois sujeitos elementares: o participante, assim entendida a pessoa física que adere ao sistema complementar, visando a auferir benefícios no futuro; e a entidade, administradora e gestora dos planos (...).

Entretanto, ao examinarmos o texto da lei, verificamos que outras espécies de sujeitos da relação podem surgir. São elas: o assistido, assim entendido o participante ao sair da fase de acumulação (formação de reserva) e adentrar a fase de fruição dos benefícios e a figura do proponente, assim entendido o empregador ou o equivalente que proporcionam a oportunidade de o participante aderir a determinado plano, subvencionado total ou parcialmente ou não por ele.” 44

Veja-se, pois, cada uma dessas pessoas que compõem as relações jurídicas

instauradas no âmbito da previdência complementar.

2.1.1 O Participante – Pessoa Física

O artigo 8º, da Lei Complementar nº 109/01, conceitua participante como a

pessoa física que adere ao plano de benefícios e assistido como o participante ou seu

beneficiário em gozo de benefício de prestação continuada. Segundo os termos da lei,

portanto, o participante somente pode ser pessoa física e apenas será considerado como tal se

formalizar sua adesão a um plano de previdência complementar. 45

44 In ob. cit. p. 183/184. 45 “Art. 8o Para efeito desta Lei Complementar, considera-se: I - participante, a pessoa física que aderir aos planos de benefícios; e II - assistido, o participante ou seu beneficiário em gozo de benefício de prestação continuada.”

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O fato de a pessoa física contribuir ou não para o plano de benefícios,

portanto, não é condição para a sua caracterização como participante, assim como não o é o

fato de ele manter ou não vínculo empregatício ou associativo com uma pessoa jurídica.

Isto porque, conforme será mais amplamente descrito, os planos de

benefícios, apesar de em sua maioria serem custeados com contribuições da pessoa física

(exclusivamente ou conjuntamente com pessoa jurídica), poderão ser custeados integralmente

por pessoa jurídica patrocinadora. Em qualquer caso, a condição do seu titular como

participante está caracterizada desde o seu ingresso no plano de benefícios.

Não pode o participante ser pessoa jurídica, pois a natureza jurídica dos

benefícios assegurados pelo plano é previdenciária, e, com isso somente pode beneficiar

pessoas físicas. As pessoas jurídicas podem, sim, participar da relação jurídica instaurada no

âmbito de um plano de previdência privada, mas na qualidade de patrocinador; jamais como

beneficiário ou participante.

A este respeito, Wladimir Novaes Martinez, afirma:

“Participante é a pessoa segurada, ou seja, o protegido pelo sistema supletivo que tenha aderido ao plano de benefícios da EPC [entidade de previdência complementar]. No caso da EFPC, empregado ou outro prestador de serviços à empresa (art. 31). Quando se tratar de instituição de associação de classe, o associado. Tal pessoa física não pode ser confundida com a pessoa jurídica que patrocina, ainda que ‘participe’ do empreendimento”. 46

A adesão ao plano de benefícios deve ser formalizada pela pessoa física por

escrito, mediante termo de adesão ou contrato (tendo ambos indiscutível caráter contratual),

no qual conste referência ao plano e às suas condições. É comum, no âmbito da previdência

complementar aberta, a formalização da proposta de inscrição, como instrumento de ingresso

no plano. Nestes casos, a referida proposta servirá, para todos os efeitos, como documento de

adesão do participante ao plano de benefícios.

A figura do assistido, tal como previsto no inciso II, do artigo 8º, da Lei

Complementar nº 109/01, corresponde ao participante ou ao seu beneficiário, quando

estiverem em gozo de benefício de prestação continuada. Em outras palavras, o assistido é a

pessoa física que: (i) tendo aderido a plano de benefício, esteja em fase de gozo do benefício

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ou (ii) seja indicada por esta pessoa (que tenha aderido ao plano de benefícios) como

beneficiário dos benefícios previdenciários, e esteja na fase de gozo desses benefícios.

O beneficiário do plano de previdência privada, quando não seja o próprio

titular do plano, é indicado por este quando de sua adesão, ou poderá corresponder aos

dependentes que venham a fazer jus às prestações de aposentadoria pagas pelo plano. Em

qualquer desses casos, o beneficiário receberá os valores da entidade de previdência

complementar após o falecimento do participante, uma vez que, a rigor, é ele o beneficiário

original de tais recursos.

O assistido recebe comumente a denominação de “aposentado”, pois se

encontra no período de recebimento dos benefícios de aposentadoria. Mas será também

considerado como assistido o beneficiário que, diante do falecimento do titular do plano

(participante), venha a usufruir os benefícios assegurados pelo plano de previdência (seus

dependentes, em geral).

Note-se que o que define a qualidade de assistido a um participante ou à

pessoa que ele indica como beneficiário, é o fato de ele se encontrar como beneficiário dos

valores pagos pelo plano de previdência privada a título de benefícios. Isso quer dizer que a

condição de assistido somente se concretiza após a fase de acumulação dos recursos no plano.

Enquanto ainda estiver na fase de acumulação, se o participante vier a efetuar resgates

parciais ou mesmo resgate total dos valores acumulados até então, isso não o caracterizará

como assistido.

Desta forma, é possível conceber situações concretas em que possa não

haver o alcance da condição de assistido, se, por exemplo, houver a realização de resgate de

todo o valor acumulado no plano, antes de iniciada a fase de gozo dos benefícios

previdenciários.

Roberto Quiroga Mosquera, sobre a figura do assistido de um plano de

previdência complementar privada, esclarece que não há que confundi-lo com o beneficiário

de serviços de assistência à saúde, oferecidos por entidades fechadas de previdência

complementar:

46 In op. cit . p. 72.

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49

“É interessante frisar que o termo assistido, contido no artigo 8º em comento, não guarda vínculo direto com os planos assistenciais ou planos de assistência à saúde, passíveis de oferecimento por entidades fechadas de previdência complementar, nos termos do artigo 76 da Lei Complementar nº 109, de 2001. Nestes planos, assim como nos planos de benefícios de caráter previdenciário, as pessoas físicas que deles participarem serão participantes ou assistidos.” 47

Com efeito, o termo assistido, num plano de previdência privada, refere-se à

condição da pessoa física como aquele que é beneficiário da cobertura previdenciária

oferecida pelo plano.

2.1.2 O Patrocinador – Pessoa Jurídica

Conforme anteriormente comentado, a pessoa jurídica48 somente se insere

no bojo da relação jurídica contratual relativa à previdência complementar privada na

qualidade de patrocinadora do plano de benefícios. Isto é, ela somente pode intervir para o

custeio do plano ou para intermediar esse custeio – como, por exemplo, figurando como

agente arrecadador e repassador das contribuições dos participantes ao plano, descontadas

diretamente da sua remuneração –, e não como beneficiária dos valores acumulados no plano.

Para participar da relação jurídica instalada no âmbito da previdência

privada, a pessoa jurídica patrocinadora deverá guardar vínculo jurídico de natureza

empregatícia ou associativa com o participante. Ou seja, ela somente pode participar do plano

para custear contribuições em favor de seus empregados, dirigentes ou associados, ou

arrecadar e repassar contribuições dos próprios participantes (contribuições essas que sejam

descontadas diretamente da remuneração a ser recebida em razão do trabalho).

Os planos de previdência complementar que tenham a participação da

pessoa jurídica patrocinadora são administrados por entidades fechadas de previdência

complementar (e, assim, os planos são fechados, isto é, restritos aos empregados e dirigentes

47 In “Comentários à Lei de Previdência Privada”, coord. Wagner Balera, Quartier Latin, São Paulo, 2005, p. 76. 48 Está excetuada da referência a pessoa jurídica, a entidade de previdência complementar, uma vez que essa exerce papel específico e exclusivo na relação contratual firmada com participantes e patrocinadores, que é a administração do plano de benefícios.

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de determinada empresa ou grupo de empresas) ou, quando inseridos na previdência privada

aberta, são chamados de planos coletivos (ou empresariais).

Sobre os planos coletivos, descreve Manuel Soares Póvoas:

“A qualificação ‘coletivo’ não significa que o plano aberto tenha um tratamento atuarial de grupo, mas apenas que o plano é instituído por uma pessoa jurídica para beneficiar mais de uma pessoa a ela vinculada por relação lícita. (...) A característica do plano coletivo previdenciário é ter de ser implantado mediante contrato celebrado entre uma pessoa jurídica, de qualquer natureza, e uma entidade de previdência privada aberta”. 49

No âmbito da previdência aberta, a participação da pessoa jurídica no

custeio do plano de benefícios lhe confere a denominação de instituidora (que é o mesmo que

patrocinadora), enquanto que, se a ela (pessoa jurídica) couber apenas a arrecadação das

contribuições dos participantes e respectivo repasse à entidade de previdência complementar

(além de intermediarem a relação entre participante e entidade de previdência privada), a

denominação que lhe é atribuída é de averbadora.

Didaticamente, expõe Roberto Quiroga Mosquera:

“As pessoas jurídicas, nos planos de previdência complementar, podem figurar apenas como patrocinadoras, instituidoras ou averbadoras, sendo: (i) as primeiras, aquelas que participam do custeio de plano de benefícios oferecido por entidades fechadas de previdência complementar, (ii) as instituidoras, pessoas jurídicas que participam do custeio do plano de benefícios oferecido por entidades abertas de previdência complementar, (iii) as averbadoras, as que, em planos também oferecidos por entidades abertas de previdência complementar, não participam do custeio, mas figuram como intermediárias na relação jurídica entre o participante e a entidade de previdência, inclusive para arrecadar as contribuições devidas pelos participantes” 50

Em qualquer caso, inclusive nos planos de benefícios administrados por

entidades fechadas de previdência complementar, a adesão da pessoa jurídica é facultativa.

Assim como também o é, invariavelmente, a adesão da pessoa física participante; a mera

contratação do plano pela pessoa jurídica não implica assentimento e participação das pessoas

físicas a ela vinculadas direta ou indiretamente.

49 in “Previdência Privada – Planos Empresariais”, Fundação Escola Nacional de Seguros – Editora, 1991, p. 31/32. 50 In ob. cit. p. 73.

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51

2.1.3 A Entidade de Previdência Complementar

Nos termos da Lei Complementar nº 109/01, o regime de previdência

complementar privada é operado por entidades abertas e fechadas de previdência

complementar, bem como sociedades seguradoras que atuam no ramo vida, desde que

possuam autorização específica para tanto.

A autorização para tais sociedades, bem como toda a regulamentação,

fiscalização e controle da atividade de administração dos planos de previdência complementar

deverão ser exercidas por órgãos públicos vinculados ao Ministério da Previdência Social e ao

Ministério da Fazenda – Secretaria de Previdência Complementar (SPC) e Superintendência

de Seguros Privados (Susep), respectivamente. A primeira encarrega-se das entidades

fechadas de previdência complementar e a segunda, das entidades abertas de previdência

complementar e sociedades seguradoras.

As entidades de previdência complementar são pessoas jurídicas,

organizadas, como já dito, sob o amparo do direito privado. O que não significa dizer que

tenham, necessariamente, intuito lucrativo.

O parágrafo 1º, do artigo 31, da Lei Complementar nº 109/01, estabelece que

“as entidades fechadas organizar-se-ão sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem fins

lucrativos”. Com isso, tem-se que, necessariamente, as entidades fechadas de previdência

complementar devem organizar-se sob a forma de entidades não lucrativas. O resultado por

elas auferido corresponderá a superávit ou déficit, mas não a lucro ou prejuízo; e sempre que

for superavitário, este resultado deverá ser integralmente revertido em favor dos beneficiários

dos planos por ela administrados, por imposição do artigo 20 da mesma Lei Complementar.51

51 “Art. 20. O resultado superavitário dos planos de benefícios das entidades fechadas, ao final do exercício, satisfeitas as exigências regulamentares relativas aos mencionados planos, será destinado à constituição de reserva de contingência, para garantia de benefícios, até o limite de vinte e cinco por cento do valor das reservas matemáticas. § 1o Constituída a reserva de contingência, com os valores excedentes será constituída reserva especial para revisão do plano de benefícios. § 2o A não utilização da reserva especial por três exercícios consecutivos determinará a revisão obrigatória do plano de benefícios da entidade. § 3o Se a revisão do plano de benefícios implicar redução de contribuições, deverá ser levada em consideração a proporção existente entre as contribuições dos patrocinadores e dos participantes, inclusive dos assistidos.”

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Quanto à sua estrutura formal como fundação ou sociedade civil, é preciso

lembrar que a Lei Complementar nº 109/01 foi editada anteriormente à edição do Código

Civil atualmente em vigor, o qual deu nova formatação às espécies de pessoas jurídicas de

direito privado.

O referido diploma prevê que:

“Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado: I - as associações; II - as sociedades; III - as fundações. IV - as organizações religiosas; V - os partidos políticos. (...). Art. 62. (...) Parágrafo único. A fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência. (...) Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados. (...)”

Assim, com a vigência do novo Código Civil, a figura da sociedade não

comporta mais o seu formato não-lucrativo, e a fundação fica restrita para determinados fins,

dentre os quais não se inclui a previdência privada.

Diante disso, a doutrina divide-se em considerar, por alguns, que a espécie

de organização jurídica aplicável às entidades fechadas de previdência complementar desde o

advento do novo Código Civil é o da associação, pois é, dos tipos mencionados no artigo 44

supratranscrito aquele que mais se assemelha a estrutura da previdência complementar

fechada, e, por outros, que o disposto no artigo 31, parágrafo 1º, da Lei Complementar nº

109/01, ainda é aplicável por se tratar de norma complementar à Constituição Federal e de

caráter especial, pois regula o regime jurídico da previdência complementar privada. Há ainda

aqueles que concluem pela defesa de que as entidades fechadas de previdência complementar

passaram à condição de entidades sui generis.52

Não obstante tal discussão, a Secretaria de Previdência Complementar, por

intermédio da Portaria nº 2, de 08 de janeiro de 2004, dispensou as entidades fechadas já

52 Neste sentido, “Comentários à Lei de Previdência Privada”, coord. Wagner Balera, p. 208.

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constituídas anteriormente à edição do Código Civil de 2002, à promoção de modificações em

seus estatutos.53

A entidade fechada de previdência complementar é caracterizada pela sua

instituição especificamente para gerir plano ou planos de previdência privada para um

determinado grupo de pessoas vinculadas a uma pessoa jurídica ou pessoas jurídicas

integrantes de um mesmo grupo econômico. É ela classificada como “de plano comum”,

quando administrar plano ou conjunto de planos acessíveis ao universo de participantes; ou

“com multiplano”, quando administrar plano ou conjunto de planos de benefícios para

diversos grupos de participantes, com independência patrimonial, e como “singular”, quando

estiver vinculada a apenas um patrocinador ou instituidor; ou “multipatrocinada”, quando

congregar mais de um patrocinador ou instituidor.

Possuem personalidade jurídica independente das suas patrocinadoras, e

exercem sua atividade de administração de planos de benefícios de forma autônoma e em

caráter exclusivo, posto que é vedado às entidades fechadas a prestação de quaisquer outros

serviços, exceto os de assistência à saúde, desde que tenham sido autorizadas até a edição da

Lei Complementar nº 109/01.54

Como as entidades fechadas – diferentemente das entidades abertas – são

pessoas jurídicas sem fins lucrativos, criadas com o único objetivo de proporcionar um meio

de administrar os recursos dos participantes e patrocinadoras, para assegurar o benefício de

aposentadoria futuro a estes participantes, todo e qualquer recurso que transite por suas

contas é destinado exclusivamente para os participantes e beneficiários do plano de

previdência administrado e para manutenção dessa administração55. Em função dessa

característica, muitos entendem que a entidade fechada de previdência complementar nada

mais é que um veículo assistencial, tal como uma entidade de assistência social.

53 “Art. 1º As entidades fechadas de previdência complementar, regidas por lei complementar, não estão obrigadas a promover em seus estatutos as adaptações a que se refere o artigo 2.031 da Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Novo Código Civil)”. 54 Lei Complementar nº 109/01: “Art. 32. As entidades fechadas têm como objeto a administração e execução de planos de benefícios de natureza previdenciária. Parágrafo único. É vedada às entidades fechadas a prestação de quaisquer serviços que não estejam no âmbito de seu objeto, observado o disposto no art. 76. (...) Art. 76. As entidades fechadas que, na data da publicação desta Lei Complementar, prestarem a seus participantes e assistidos serviços assistenciais à saúde poderão continuar a fazê-lo, desde que seja estabelecido um custeio específico para os planos assistenciais e que a sua contabilização e o seu patrimônio sejam mantidos em separado em relação ao plano previdenciário.” 55 Gastos com pessoal, material e gestão financeira do plano.

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54

Neste sentido, Sacha Calmon Navaro Coelho assevera:

“Em resumo, a total ausência de finalidade lucrativa, a prevalência do espírito de solidariedade entre os participantes das entidades fechadas que leva a empresa a contribuir com parcela considerável para o financiamento dos benefícios concedidos, amplos ou de complementação àqueles da seguridade social estatal, prestando atividade de relevante valor social, são características essenciais que legitimam o enquadramento dessas instituições dentro do conceito de assistência social ou de assistência previdenciária (...).”56

Contudo, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar incidentalmente tal

questão, a fim de decidir sobre a aplicabilidade ou não da imunidade tributária assegurada

pelo artigo 150, VI, c, da Constituição Federal de 1988, entendeu que as entidades de

previdência complementar, a despeito de não buscarem o lucro, têm caráter contratual,

contraprestacional.57, 58

As entidades abertas de previdência complementar, por sua vez, são pessoas

jurídicas de direito privado que administram planos de benefícios com finalidade lucrativa.

Ainda sob a égide da Lei nº 6.435/77, foram criadas entidades abertas de previdência privada

sem finalidade lucrativa, porém, atualmente são minoria no universo da previdência privada

aberta.59

As entidades abertas são constituídas sob a forma de sociedades anônimas e

têm por objetivo administrar planos de benefícios de caráter previdenciário a quaisquer

pessoas físicas, independentemente de vínculo empregatício ou associativo. É certo que elas

podem instituir planos coletivos, cujo acesso esteja restrito aos empregados e dirigentes de

determinada pessoa jurídica, porém, neste caso, a entidade aberta deverá manter outros planos

de benefícios acessíveis a qualquer pessoa jurídica, pois que é este o dado que as caracteriza.

56 “Pis/Cofins – Lei nº 9.718/98 – Entidades Fechadas de Previdência Privada”, Revista Dialética de Direito Tributário nº 55, abril/2000, p. 140. 57 Recurso Extraordinário nº 202.700-DF. 58 Exceto aquelas cujo plano de benefícios administrado seja custeado integralmente pela patrocinadora. 59 A essas, a Lei Complementar nº 109/01 facultou a permanência de sua manutenção como sociedade civil não lucrativa, desde que não participem do capital social de outras pessoas jurídicas. Confira-se: “Art. 77. As entidades abertas sem fins lucrativos e as sociedades seguradoras autorizadas a funcionar em conformidade com a Lei no 6.435, de 15 de julho de 1977, terão o prazo de dois anos para se adaptar ao disposto nesta Lei Complementar. § 1o No caso das entidades abertas sem fins lucrativos já autorizadas a funcionar, é permitida a manutenção de sua organização jurídica como sociedade civil, sendo-lhes vedado participar, direta ou indiretamente, de pessoas jurídicas, exceto quando tiverem participação acionária: I - minoritária, em sociedades anônimas de capital aberto, na forma regulamentada pelo Conselho Monetário Nacional, para aplicação de recursos de reservas técnicas, fundos e provisões; II - em sociedade seguradora e/ou de capitalização. (...)”

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55

As sociedades seguradoras autorizadas a operar no ramo vida podem obter

licença para administrar planos de previdência privada. Neste caso, funcionam sob o mesmo

formato e regras aplicáveis às entidades abertas de previdência complementar.

Não raro se confunde a figura das entidades abertas e sociedade seguradoras

à dos bancos. Isso se deve ao fato de grande parte das entidades e seguradoras integrarem

grupos financeiros de bancos comerciais, e, com isso, operarem junto ao público em

instalações próprias desses bancos. Contudo, não obstante a oferta de serviços junto ao

público ser possivelmente realizada em espaço destinado à atividade bancária, a

administração dos planos de benefícios não poderá ser confundida com a atividade financeira

dos bancos, pois o exercício da administração de planos de benefícios abertos é autorizado

exclusivamente às entidades abertas e às sociedades seguradoras do ramo vida.

Uma outra forma de contato com o público utilizada para oferta dos planos

de previdência privada aberta é a corretagem. Tal prática está, inclusive, expressamente

contemplada pela Lei Complementar nº 109/01.60

Em razão da possibilidade de as entidades abertas atuarem conjuntamente

com as sociedades seguradoras no âmbito da previdência complementar aberta, a Lei

Complementar prevê a possibilidade de sua regulação também, no que couber, pela legislação

aplicável às sociedades seguradoras.61

Isso não significa, porém, que o seguro de vida possa ser confundido com o

plano de previdência complementar. Conforme já explicitado anteriormente, a previdência

complementar atua na complementação dos benefícios previdenciários, integrando o sistema

previdenciário brasileiro, em conjunto com o regime geral da previdência social e o regime

próprio de previdência dos servidores públicos. A sua presença, neste sistema, justifica-se

como um instrumento adicional de proteção social.

60 “Art. 30. É facultativa a utilização de corretores na venda dos planos de benefícios das entidades abertas. (...)” 61 “Art. 73. As entidades abertas serão reguladas também, no que couber, pela legislação aplicável às sociedades seguradoras.”

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2.2 Planos de Benefícios das Entidades Fechadas de Previdência

Complementar

A previdência complementar privada está estruturada em planos de

benefícios de caráter previdenciário, também chamados de planos de previdência

complementar ou planos de previdência privada. A expressão primeiramente referida advém

do artigo 2º da Lei Complementar nº 109/01: “O regime de previdência complementar é

operado por entidades de previdência complementar que têm por objetivo principal instituir

e executar planos de benefícios de caráter previdenciário, na forma desta Lei

Complementar.”

Os planos de benefícios são unidades separadas, com características

próprias, cuja finalidade é assegurar benefícios previdenciários aos seus participantes. No

dizer de Wladimir Novaes Martinez:

“Plano de benefícios é modalidade ampla de instituição, expressa num conjunto complexo de normas derivadas de opções assumidas (uma espécie de Lei) e de atos, medidas e providências reais (práticas usuais) no âmbito organizacional, econômico, financeiro e atuarial com vistas à organização e a operação dos comandos de constituição da EPC [entidade de previdência complementar], filiação e admissão dos participantes (entendida abrangendo inclusive a patrocinadora ou a instituidora), contribuição obrigatória e definição das prestações postas à disposição dos beneficiários.” 62

O plano de benefícios reflete a própria contratação efetivada entre o

participante e a entidade de previdência privada, pois deverá ser operado exatamente nos

termos do acordo firmado quando da adesão ao plano. Cada plano possui o seu respectivo

regulamento, que determina as normas segundo as quais será operacionalizado.

Ademais, é o plano de benefícios tão próprio do regime de previdência

privada, que não raramente, no dito popular, ele é confundido com a própria entidade de

previdência que o administra. Diz-se, por exemplo, que determinada pessoa aderiu ao “fundo

de pensão” de determinada empresa, pretendendo referir-se à adesão de alguém a um

62 In ob. cit. p. 60/61.

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determinado plano de benefícios administrado por determinada entidade fechada de

previdência complementar (ou “fundo de pensão”).

Essa proximidade justifica-se pelo fato de a entidade de previdência

complementar somente exercer atividade se administrar plano(s) de benefícios. Caso

contrário, será um pessoa jurídica formalmente constituída, porém, inativa, “vazia”.

Os planos de benefícios não possuem personalidade jurídica própria,

independente de suas administradoras (entidades), pois não respondem por obrigações ou

deveres. Conforme ensina Roberto Quiroga Mosquera63: “Representam, em verdade, normas

de conduta estatuídas por diferentes pessoas para o atendimento de um custeio

previdenciário complementar, comandos normativos estes traduzidos em rubricas contábeis

dentro de uma única pessoa jurídica, qual seja: a entidade de previdência complementar.”

A entidade de previdência complementar poderá administrar um ou mais

planos, sendo que, os ativos e passivos da cada um deverão estar segregados contábil,

financeira e atuarialmente, para o fim de individualizar os planos de benefícios, visto que

cada um é específico no tocante às suas condições de operacionalização, conforme

contratualmente firmado.

Essa segregação deu ensejo à edição da Resolução do Conselho de Gestão

da Previdência Complementar (“CGPC”) nº 14, de 01 de outubro de 2004, a qual instituiu o

Cadastro Nacional de Planos de Benefícios das Entidades Fechadas de Previdência

Complementar – CNPB, a permitir o controle, por parte da Secretaria de Previdência

Complementar, sobre a devida segregação patrimonial e equilíbrio econômico-atuarial dos

planos fechados.

Os planos de benefícios podem ser da modalidade “benefício definido”,

“contribuição definida” ou “contribuição variável”64, tanto no caso de plano abertos, quanto

para os planos fechados.

63 In ob. cit. p. 56. 64 “Art. 7o (...) Parágrafo único. O órgão regulador e fiscalizador normatizará planos de benefícios nas modalidades de benefício definido, contribuição definida e contribuição variável, bem como outras formas de planos de benefícios que reflitam a evolução técnica e possibilitem flexibilidade ao regime de previdência complementar.”

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Newton Conde, ao tratar sobre as modalidades de planos de benefícios

operados por entidades fechadas de previdência complementar esclarece que o plano de

“benefício definido” é aquele em que o benefício complementar é estabelecido no momento

da adesão do participante com base em valores pré-fixados ou em fórmulas de cálculo

previstos em regulamento. “Contribuição definida”, por outro lado, é a modalidade de plano

em que o benefício complementar é estabelecido apenas no momento da sua concessão, com

base no montante das contribuições previamente fixadas e vertidas ao plano durante a fase

contributiva. 65

Por plano da modalidade “contribuição variável”, por sua vez, conceitua o

artigo 4º da Resolução CGPC nº 16, de 22 de novembro de 2005, ser “aquele cujos benefícios

programados apresentem a conjugação das características das modalidades de contribuição

definida e benefício definido”. Um plano de contribuição variável pode ser, por exemplo,

aquele que defina previamente (no momento da contratação) os critérios para definição do

benefício previdenciário, sendo possível a oscilação sobre o valor e formato das contribuições

que irão custeá-lo.

No tocante aos planos de benefícios operados por entidades fechadas de

previdência complementar, diferentemente dos planos abertos, não há “produtos” ou

“modelos” de planos (como PGBL, por exemplo). Os planos são estruturados segundo o perfil

do grupo de pessoas a que se destina, a atividade laboral por elas desenvolvida e a cobertura

previdenciária que se procura oferecer (benefícios de aposentadoria vitalícia, por invalidez,

pecúlio etc.).

Assim, na previdência privada fechada, os planos, apesar de classificados

como de benefício definido, contribuição definida ou contribuição variável, variam de acordo

com as especificidades do público a que se destinam.

65 “Modalidades e Características dos Planos de Benefícios”, in “Introdução à Previdência Complementar”, ABRAPP/ICSS/Sindapp, 2005, p. 88.

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2.3 Planos de Benefícios das Entidades Abertas de Previdência Complementar

Os planos de benefícios oferecidos por entidades abertas são oferecidos a

todos que preencham as condições estabelecidas contratualmente, nos limites e condições

determinados pelo órgão regulador competente. Por isso denominam-se “planos abertos”.

Tais planos poderão ser coletivos, isto é, serem oferecidos exclusivamente a

pessoas físicas que possuam vínculo empregatício com uma determinada pessoa jurídica ou a

pessoas físicas que possuam vínculo empregatício com pessoas jurídicas integrantes de um

grupo de controle societário comum – neste caso, assemelham-se, quanto à sua destinação,

com os planos fechados –, ou individuais, nos quais qualquer pessoa poderá ingressar,

independentemente de vínculo direto ou indireto com pessoa jurídica.

A caracterização do plano aberto como individual não significa que a ele

somente uma pessoa física possa aderir; mas, sim, que qualquer pessoa física que queira

aderir (para formar o grupo necessário de participantes) poderá fazê-lo sem que seja

necessário vínculo de qualquer natureza com pessoa jurídica.

O custeio dos planos individuais, justamente pela inexistência da

participação de pessoa jurídica na relação contratual, é realizado exclusivamente por

contribuições dos participantes. Já o custeio dos planos coletivos pode ou não ter participação

(ou “patrocínio”) da pessoa jurídica, a depender da sua caracterização como instituidora ou

averbadora, conforme anteriormente exposto.

Os planos de benefícios de previdência privada aberta também são

organizados sob as modalidades contribuição definida, benefício definido ou contribuição

variável, seguindo os mesmos parâmetros antes comentados.

Ocorre, que, por se tratar de planos acessíveis ao público em geral,

convencionou-se criar modelagens padronizadas, que admitem a estipulação de condições

específicas a depender das características do grupo de pessoas que se busca atingir. São essas

modelagens semelhantes a verdadeiros “produtos previdenciários”, conhecidos por suas

siglas: PGBL (Plano Gerador de Benefícios Livres), PAGP (Plano com Atualização Garantida

e Performance), PRGP (Plano com Remuneração Garantida e Performance), VGBL (Vida

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Gerador de Benefícios Livres), VAGP (Vida com Atualização Garantida e Performance),

VRGP (Vida com Remuneração Garantida e Performance), além dos planos tradicionais, cuja

sigla mais comumente usada é a de FGB (Fundo Garantidor de Benefícios).

Segundo descrição apresentada pelo órgão regulador e fiscalizador das

entidades abertas (Susep), os planos denominados sobre a sigla PGBL têm, durante o período

de diferimento, como critério de remuneração das reservas, a rentabilidade da carteira de

investimentos do fundo de investimento exclusivo instituído para o plano, ou seja, durante o

período de diferimento não há garantia de remuneração mínima. Os planos denominados

sobre a sigla PRGP garantem, durante o período de diferimento, remuneração dos recursos

por taxa de juros efetiva anual e índice de atualização de valores, os quais deverão estar

previstos em seu Regulamento. Nestes, durante o período de diferimento, há apuração de

resultados financeiros. E, por fim, os planos denominados sobre a sigla PAGP garantem,

durante o período de diferimento, atualização dos recursos acumulados, segundo índice de

atualização de valores, sendo que, durante o período de diferimento, há apuração de

resultados financeiros.66

Note-se, com isso, que os planos dos tipos PGBL, PRGP e PAGP são planos

de previdência privada, cujos benefícios assegurados variam desde o pagamento do total das

contribuições adicionadas aos rendimentos produzidos durante a fase de acumulação dos

recursos, até o pagamento do total das contribuições remuneradas segundo uma taxa de juros

ou um índice de atualização, previamente contratados.

As coberturas asseguradas em tais planos podem variar de acordo com a

contratação individual de cada participante (renda vitalícia, por tempo determinado, renda

reversível a filhos menores, a cônjuge etc.).

Os chamados planos tradicionais, por sua vez, distinguem-se das espécies

antes comentadas, pelo fato de assegurarem um mínimo de remuneração (rendimentos)

durante a fase de acumulação dos recursos no plano. A maior parte dos planos com este perfil

encontra-se encerrada para novas adesões – mantido o direito de permanência dos

participantes que já ingressaram –, especialmente devido ao risco a que se expõe a entidade

66 Na sua página na rede mundial de computadores (internet), cujo endereço eletrônico, especificamente no tocante a essas informações é: http://www.susep.gov.br/menuatendimento/previdencia_aberta_consumidor.asp

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administradora, na medida em que deve honrar o compromisso de rentabilidade mínima,

independentemente de obtê-la em investimentos no mercado financeiro.

Os planos VGBL, VAGP e VRGP, por outro lado, apesar de, na prática,

serem oferecidos como planos de previdência privada, consistem, em sua essência, em

seguros de vida com cobertura por sobrevivência. Em outras palavras, são seguros de vida

pagos ainda em vida ao seu titular (chamado segurado), sendo os recursos aplicados,

inclusive, passíveis de resgate.

Esses planos foram instituídos no início da década corrente, com o objetivo

de oferecer uma alternativa aos planos PGBL, PRGP e PAGP, no tocante ao seu tratamento

tributário. Conforme será descrito adiante, os planos VGBL, VAGP e VRGP diferenciam-se

dos antes mencionados (PGBL, PAGP e PRGP), basicamente, pelo fato de as contribuições e

eles destinadas não serem passíveis de dedução na apuração do imposto de renda devido pela

pessoa física (segurada), e, em contrapartida, quando do recebimento dos valores pagos pela

entidade de previdência privada, o imposto incide apenas sobre a parcela do rendimento

proporcionado durante o período de investimento.

A não ser por esta característica, os planos VGBL, VAGP e VRGP são

bastante semelhantes, quanto à sua estrutura financeira e atuarial, aos planos PGBL, PAGP e

PRGP.

Arthur Bragança de Vasconcellos Weintraub explica o VGBL nos seguintes

termos:

“Sobrevivendo pelo tempo determinado em contrato, o participante (segurado por um VGBL) receberá aposentadoria que varia de acordo com o plano oferecido pela seguradora. Se vier o participante a falecer, o beneficiário por ele indicado em contrato receberá a indenização, exatamente como ocorre em um seguro de vida.” 67

É preciso ressalvar, porém, que, mesmo estando destinados a suprir uma

necessidade de mercado voltada à poupança previdenciária, por serem planos de seguro de

vida, os “VGBL” não estão subordinados ao regime jurídico da previdência privada, nos

moldes antes comentados. O seu regime jurídico é o dos seguros.

67 In ob. cit. p. 29.

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Da mesma forma, os fundos de aposentaria programada individual,

chamados de “FAPI”, regidos pela Lei nº 9.477, de 24 de julho de 1997, também não se

sujeitam ao regime da previdência complementar privada. Têm como destinatários aqueles

que buscam a formação da poupança previdenciária, mas se estruturam como fundo de

investimento, e, como tal, são administrados por instituições financeiras, notadamente bancos

e asset managements, sob a égide da regulamentação editada pelo Conselho Monetário

Nacional, por intermédio da Comissão de Valores Mobiliários e do Banco Central do Brasil.

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PARTE II

O PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS E RESGATES EM PLANOS DE BENEFÍCIOS

POR ENTIDADES DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR PRIVADA COMO FATO

JURÍDICO TRIBUTÁVEL PELO IMPOSTO DE RENDA

Capítulo III - Perfil Constitucional do Imposto de Renda

Para se analisar a extensão de qualquer incidência tributária é preciso

verificar, de antemão, a sua previsão constitucional, examinando-se a competência tributária

para sua instituição, a sua limitação material e os princípios constitucionais que a informam.

É na Constituição Federal que se encontra o fundamento último de validade

das normas do sistema jurídico brasileiro, a partir dela é que se arquiteta a pirâmide jurídica,

criando um sistema harmônico de normas válidas.

A validade das normas jurídicas não pode ser, no entanto, dada como uma

característica da norma, por si só. É tomada pela existência de relação de sua pertinência no

sistema jurídico em que se insere, sendo, portanto, um resultado da sua ligação com as demais

normas no sistema.

Paulo de Barros Carvalho, a respeito, ensina que a validade não deve ser tida

como um atributo que qualifica a norma jurídica, mas sim pelo seu status de relação,

correspondendo ao vínculo que se estabelece entre a proposição normativa, considerada na

sua inteireza lógico-sintática e o sistema do direito posto, “de tal sorte que ao dizermos que

u’a norma ‘n’ é válida, estaremos expressando que ela pertence ao sistema ‘S’.” 68

E continua, expondo, a par das críticas69, os principais métodos de

verificação de validade de uma norma em um sistema jurídico:

68 “Direito Tributário – Fundamentos Jurídicos da Incidência”, Saraiva, São Paulo, 2004, 3ª edição, p. 52. 69 As críticas descritas pelo autor tomam por referência o entendimento de Daniel Mendonça, para quem esses métodos de verificação da validade da norma jurídica pressupõem a pré-existência de regras no sistema, cuja relação de pertinência não seria passível de verificação por tais métodos.

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“Que significa, contudo, pertencer ao sistema ‘S’? Em outras palavras, qual o critério para sabermos se um enunciado lingüístico com estrutura hipotética e articulado deonticamente pode ser tido como pertencente a determinado sistema, assumindo as proporções de norma jurídica? Bem, aloja-se precisamente aqui a observação de Farrell, no sentido de que depende da perspectiva eleita pelo sujeito do conhecimento. Depende do ponto de vista adotado ou do sistema de referência com que trabalhamos. Poder-se-ia escolher, para esse fim, o modelo kelseniano, importa dizer, será considerada norma válida aquela produzida por órgão credenciado pelo sistema e na conformidade com o procedimento também previsto pela ordenação total. Ao lado dessa diretriz, temos também o critério da dedutibilidade, segundo o qual uma norma pertence ao sistema quando é conseqüência lógica de normas pertencente ao sistema. A relação de pertinencialidade será aferida, para efeito de controle, mediante confronto com a norma superior, dentro da hierarquia do sistema empírico, culminando na norma hipotética fundamental, axioma que fecha o corte metodológico, em termos cognoscitivos. Ou então, pela linha da dedutibilidade, indicando-se as normas do sistema que, por dedução, produziriam a unidade questionada.” 70

Segundo o modelo kelseniano, portanto, uma norma pode ser tida como

pertencente a determinado sistema se for produzida por órgão credenciado pelo sistema e na

conformidade com o procedimento também previsto pela ordenação total. Já pelo critério da

dedutibilidade, uma norma pertence ao sistema quando é conseqüência lógica de normas

pertencentes ao sistema, dentro da hierarquia do sistema empírico.

Para fins do presente estudo, seja pelo modelo kelseniano ou pelo critério da

dedutibilidade, tem-se que a Constituição Federal figura como indicativa do procedimento de

produção das normas válidas e como norma superior, a partir da qual as demais normas

devem se estruturar no ordenamento jurídico nacional.

Não se afasta, contudo, que a fonte primeira do direito é a própria sociedade,

o fato que desencadeia a necessidade de regulação das condutas, como quando da estruturação

de uma organização de Estado fundada na legitimação de poderes para a imposição de regras

de comportamento. No sistema brasileiro, isso se reflete na formação de um poder

constituinte, formulado para o fim de impor a fonte primária formal do direito positivo

brasileiro: a promulgação da Constituição Federal.

Superado, pois, este estágio, parte-se da Constituição para verificar o

encaixe das normas em seu contexto. Assim, a validade das normas no Brasil é extraída da

sua coerência com a Constituição Federal de 1988. Como afirma Roque Antonio Carrazza71,

“a Constituição, num Estado-de-direito”, como o Brasil, “é a lei máxima, que submete todos

70 “Direito Tributário – Fundamentos Jurídicos da Incidência”, cit. p. 52/53. 71 “Curso de Direito Constitucional Tributário”, 20ª edição, Malheiros, São Paulo, 2004, p. 30.

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os cidadãos e os próprios Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Uma norma jurídica

só será considerada válida se estiver em harmonia com as normas constitucionais”.

Quando se trata da validade da norma jurídica no sistema, considera-se tanto

a sua pertinência formal, isto é, a sua edição segundo o procedimento previsto na Constituição

e nos ditames da competência por ela definida, como também a sua coerência material com os

ditames constitucionais72. Desta forma, ainda que editada pelo poder competente, segundo a

instrumentalidade prevista constitucionalmente, a norma jurídica no Brasil somente deverá

produzir efeitos se estiver em perfeita adequação com a extensão dada pela Constituição aos

institutos e fatos jurídicos por ela tratados.

Essa observação ganha força ao tratar-se do sistema tributário brasileiro,

rigidamente construído no texto constitucional.

Com efeito, se a toda norma a verificação prévia da Constituição para

checagem da sua validade é necessária, no tocante à norma tributária, a Constituição serve de

diretriz, norteando o legislador no tocante à divisão de competência, à relação de espécies de

tributos, às limitações para sua cobrança (princípios e imunidades).

Isto porque, o sistema tributário nacional está desenhado em sua inteireza na

Constituição; o papel das normas infraconstitucionais é o de preencher esse desenho com

regras de conduta.

Nas palavras de Luciano Amaro:

“(...) o direito tributário encontra na Constituição Federal, em primeiro lugar, sua estruturação sistemática: é ali que se desenham, na definição da competência tributária dos entes da federação, os contornos que irá ter cada peça integrante do sistema tributário nacional. Na Constituição encontra-se a matriz de todas as competências; nela se demarcam os limites do poder de tributar e se estruturam os princípios, inclusive os de natureza especificamente tributária, que constituem as pilastras de sustentação de todo o sistema tributário. É ainda na Constituição que se disciplina o modo de expressão do direito tributário, ou seja, a regulação do processo produtivo de normas jurídico-tributárias (leis complementares, leis ordinárias etc.) e o espaço de atuação de cada uma (ou seja, quais tarefas competem a cada tipo normativo).” 73

72 Note-se que aqui fala-se em hierarquia (formal) e coerência (material), critérios para sistematização material das normas num sistema jurídico constitucional, conforme descreve Humberto Ávila (“Sistema Constitucional Tributário”, Saraiva, São Paulo, 2004). 73 “Direito Tributário Brasileiro”, 12ª edição, Saraiva, São Paulo, 2006, p. 166.

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A Constituição Federal, porém, como fonte do direito positivo, necessita de

ser interpretada para que possa ser aplicada. Isto é, o exercício de verificação da validade e

coerência entre as normas infraconstitucionais e a Lei Magna se perfaz mediante a

interpretação dos dispositivos desta. Sem interpretar o texto constitucional, torna-se

impossível a sua aplicação correta; torna-se inviável a verificação da validade da norma infra-

legal.

É pela interpretação que se extrai o sentido de um enunciado do direito

positivo, que se alcance o substrato de um princípio constitucional.

Roque Antonio Carrazza, com a precisão, assevera:

“Sem outras considerações, que não vêm para aqui, a interpretação é uma atividade cognoscitiva que visa a precisar o significado e o alcance das normas jurídicas, possibilitando-lhes uma correta aplicação. Esta tarefa, voltada, precipuamente, à descoberta da mens legis (da vontade do Estado contida na norma jurídica), exige a constante invocação dos grandes princípios, mormente em face das disposições incertas e das palavras equívocas ou polissêmicas que costumam recamar nossos textos legislativos. Afinal, a procura pela verdade científica não pode determinar na simples leitura de um texto legislativo (ainda mais quando ele briga com o texto legislativo hierarquicamente superior).” 74

A interpretação do texto constitucional para extrair os elementos que

integram o sistema tributário nacional – ramo do direito a que se propõe a analisar –, pode ser

exercida segundo diferentes critérios ou métodos.

Luís Roberto Barroso, ao estudar com louvável empenho tais métodos e

critérios, descreve que, basicamente, se pode realizar a interpretação constitucional a partir de

três aspectos diferentes: (i) com atenção para o sistema, (ii) com ênfase no objeto, ou (iii)

investigando-se o papel do sujeito da interpretação.

Para os fins da presente análise, acredita-se ser mais apropriada a realização

da interpretação com foco no sistema, “isto é”, explica o jurista, “para o conjunto de normas,

princípios e conceitos inerentes ao processo interpretativo”. Com isso, mantém-se reserva à

interpretação sob a perspectiva do objeto – que seria uma análise voltada aos “casos

concretos, às situações da vida, aos problemas que devem ser solucionados pela

interpretação da norma” – e à interpretação do ponto de vista do seu sujeito – em que se

74 “Curso de Direito Constitucional Tributário”, cit. p. 38.

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estaria, explica o autor, “voltando os olhos para os valores e a ideologia do intérprete e sua

repercussão no produto de seu trabalho”.75, 76

Deste modo, o perfil constitucional que se busca para o imposto de renda, a

fim de avançar na análise sobre a tributação dos valores pagos às pessoas físicas no âmbito da

previdência complementar privada, toma por premissa a busca dos critérios para verificação

da validade e coerência das normas tributárias que tratam acerca de tal tributação, segundo

uma interpretação com vistas para o sistema jurídico-constitucional tributário.

Com isso, não se pretende alcançar todo o campo de incidência do imposto

de renda, conforme seu desenho constitucional, tampouco esgotar a análise dos aspectos

constitucionais que resultam em reflexo direto ou indireto sobre a sua instituição e cobrança.

Procura-se apenas destacar alguns dos elementos que oferecem arcabouço para a atividade do

legislador, na definição do ente competente para exercício da capacidade tributária ativa, na

verificação da extensão material do tributo e na identificação dos princípios elementares para

formação do “arquétipo” do imposto em referência77.

3.1 Competência Tributária da União

O imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza é tributo passível

de instituição e cobrança pela União, conforme disposto no artigo 153, III, da Constituição

Federal de 198878. O referido dispositivo constitucional trata da competência tributária para

instituição do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza.

75 “Interpretação e Aplicação da Constituição”, 6ª edição, Saraiva, São Paulo, 2004, p.4. 76 É natural que não se consiga afastar por completo as influências de valores e convicções subjetivas, uma vez que, sendo este trabalho construção de expressão humana, está sujeito a ser “contaminado” por opiniões lastreadas em valores sócio-culturais. Porém, ao pretender tratar do tema com foco no sistema em que se insere, estar-se-á buscando afugentar os possíveis desvios pautados exclusivamente em uma visão estritamente subjetiva. 77 Vale-se de empréstimo da expressão “arquétipo tributário” usada por Roque Carrazza e Geraldo Ataliba, posto que expressa com clareza a mensagem que se pretende alcançar. 78 “Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: (...) III - renda e proventos de qualquer natureza; (...) § 2º - O imposto previsto no inciso III: I - será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade, na forma da lei; (...)”

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A competência tributária é, nas palavras de Roque Antônio Carrazza, “a

aptidão para criar, in abstrato, tributos”79. Não se trata, pois, da criação concreta do tributo –

posto que não tarefa da Constituição instituir tributos, mas, sim, da lei ordinária80 –, mas de

atribuição conferida a determinada pessoa jurídica de direito público para instituir tributos, em

conformidade com as limitações constitucionais.

É a competência tributária que define qual o tributo pode ser instituído no

País, qual o seu titular, sobre qual materialidade ele poderá incidir, e com base em que limites.

Não fossem por essas especificações que a Constituição Federal prescreve, os entes políticos

seriam titulares de verdadeiros poderes absolutos (poder de tributar, em sentido estrito). No

entanto, o direcionamento traduzido no texto constitucional a este poder de tributar

(estabelecendo princípios, imunidades e o que Roque Antonio Carrazza denomina a “hipótese

de incidência possível de cada tributo”81) o converte em competência tributária.

A compreensão da competência tributária perfaz-se pela análise de suas

características. Neste sentido, destaca Roque Antonio Carrazza seis: a privatividade, a

indelegabilidade, a incaducabiliidade, a inalterabilidade, a irrenunciabiilidade e a

facultatividade de exercício. Alguns juristas discordam serem todas necessárias à definição da

competência tributária, a exemplo de Paulo de Barros Carvalho82, para quem apenas a

indelegabilidade, a irrenunciabilidade e a incaducabilidade são atributos essenciais deste

objeto jurídico, e de Cristiane Mendonça83, que entende que apenas a facultatividade e a

irrenunciabilidade caracterizam a competência legislativo-tributária pátria.

A privatividade remete à exclusividade para instituição do tributo, a

autorização para uma pessoa política instituir o tributo e, a contrario sensu, a proibição para

as demais para instituí-lo.

Já a indelegabilidade se refere à proibição para que se transfira a outrem

(mesmo que pessoa jurídica pública de mesma espécie – como entre Estados da federação) a

79 “Curso de Direito Constitucional Tributário”, cit. p. 449. 80 Ressalvadas as hipóteses em que a Constituição Federal de 1988 impõe a instituição de tributo mediante lei complementar. 81 “Curso de Direito Constitucional Tributário”. cit. p. 460. 82 “Curso de Direito Tributário”, Saraiva, São Paulo, 17ª edição, 2005, p. 222. 83 “Competência Tributária”, Quartier Latin, São Paulo, 2004, p. 281.

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competência para instituição do tributo. A este respeito, o artigo 7º da Lei nº 5.712/6684

(Código Tributário Nacional) esclarece que a indelegabilidade atinge a instituição do tributo

(isto é, o poder para editar lei que crie o tributo in concreto e majore-o), não abrangendo as

funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões

administrativas em matéria tributária, tarefas que podem ser conferidas pela pessoa jurídica

designada pela Constituição a outros sujeitos de direito.

A incaducabilidade, está presente no artigo 8º do mesmo diploma, o qual

esclarece que “o não-exercício da competência tributária não a defere a pessoa jurídica de

direito público diversa daquela a que a Constituição a tenha atribuído”. Ou seja, mesmo o

seu não exercício, por tempo prolongado, não impede a pessoa política de exercê-la a

qualquer tempo.

No tocante à inalterabilidade, também passível de extração por este mesmo

dispositivo legal, alude-se à proibição para se modificar a competência tributária, a não ser

por vontade do legislador constituinte derivado, por intermédio de emendas constitucionais.

A irrenunciabilidade refere-se à indisponibilidade da competência tributária;

não pode o ente político designado como competente renunciar à atribuição dada pela

Constituição Federal para instituição de determinado tributo. Não se trata, pois, de proibição

para renúncia à arrecadação de determinado tributo (a chamada renúncia fiscal, que depende

da vontade da pessoa política competente, no exercício dessa competência, estabelecendo

fatos tributáveis e hipóteses de isenção), mas, sim, de vedação à recusa em receber a

competência tributária da forma como delineada na Constituição.

Por fim, a facultatividade de exercício, como corolário das características

anteriormente comentadas, remete-se à não obrigatoriedade de instituição do tributo cuja

competência fora designada pela Constituição. O exercício da competência não é obrigatório,

depende de decisão política (conveniência, vontade e agilidade).

84 “Art. 7º A competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra, nos termos do § 3º do artigo 18 da Constituição. § 1º A atribuição compreende as garantias e os privilégios processuais que competem à pessoa jurídica de direito público que a conferir. § 2º A atribuição pode ser revogada, a qualquer tempo, por ato unilateral da pessoa jurídica de direito público que a tenha conferido. § 3º Não constitui delegação de competência o cometimento, a pessoas de direito privado, do encargo ou da função de arrecadar tributos.”

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Diante dessas características e em vista da legislação em vigor no tocante ao

imposto de renda, é possível observar que todos estes atributos da competência tributária

foram preservados, tendo o legislador federal, como poder a quem privativamente foi

atribuída a competência para instituição deste tributo, exercido sua faculdade de criação in

concreto do referido imposto, sem delegar tal função a terceiros, nem tampouco alterá-la, ou

renunciá-la.

Compreendido o poder de tributar limitado a que se refere a competência

tributária, é forçoso lembrar que a forma como ela vem prescrita na Constituição Federal não

apenas aponta para o campo de tributação em que o ente competente deve atuar, mas também

descreve os contornos gerais que devem ser obrigatoriamente observados quando do seu

exercício (isto é, instituição concreta do tributo) pelo legislador ordinário.

Neste diapasão, José Eduardo Soares de Melo afirma que “A competência

tributária é a aptidão para criar os tributos, legalmente e de forma abstrata, indicando todos

os elementos da hipótese de incidência, compreendendo o aspecto pessoal (sujeitos ativos e

passivos), a materialidade, base de cálculo e alíquota.” 85

É como se a Constituição trouxesse, implicitamente, uma regra-matriz

possível para cada tributo, apontando para uma hipótese de incidência possível, um sujeito

passivo possível, um sujeito ativo possível, uma base de cálculo possível e uma alíquota

possível, conforme destaca Roque Antonio Carrazza86.

Isto significa dizer que, quando o artigo 153, inciso III, da Carta Magna,

confere competência à União para instituir imposto sobre a renda, já contém de forma

embutida, o “auferir renda” como materialidade do tributo, a União como sujeito ativo,

“aquele que auferir renda” como sujeito passivo, o valor da renda como base de cálculo e

percentuais progressivos dessa renda como alíquota87.

Esses elementos devem servir como critérios máximos para o legislador

ordinário, ao estabelecer a regra-matriz concreta do imposto de renda, não lhe sendo facultado

85 “Curso de Direito Tributário”, 6ª edição, Dialética, São Paulo, 2005, p.139. 86 “Curso de Direito Constitucional Tributário”, cit. p. 460. 87 No tocante especificamente à alíquota, entende-se que o seu conteúdo possível deve ser alcançado pela combinação do artigo 153, III, com o parágrafo 2º do mesmo artigo e com o artigo 150, IV, da Constituição, que prescreve o princípio de vedação ao confisco, a seguir comentado.

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extrapolar esses limites a fim de alcançar fatos jurídicos que não guardem correlação com este

arquétipo tributário constitucional.

Luciano Amaro, sobre esta limitação, descreve com precisão:

“Não se nega que a lei tributária possa modificar o conceito dado pelo direito privado (ou, em regra, por qualquer outro ramo do direito). Por conseguinte, é lícito à lei tributária, por exemplo, equiparar a pessoa física à pessoa jurídica (o que, efetivamente, é feito, em dadas situações, pela lei do imposto de renda ). O que se veda à lei tributária é a modificação de conceitos que tenham sido utilizados por lei superior para definição da competência tributária, se da modificação puder resultar ampliação da competência. Por isso, se a regra que outorga competência tributária (e, portanto, dá os contornos do campo sobre o qual é exercitável a competência) autoriza a tributação de imóvel, não pode o legislador tributário equiparar móveis a imóveis, para efeitos fiscais, sob pena de ampliar, ilegitimamente, sua esfera de competência.” 88

Com isso, quer desde já se firmar a conclusão de que, em relação ao imposto

de renda, a sua materialidade não pode corresponder a algo que não seja “auferir renda”, o seu

sujeito passivo não pode ser outro ente da federação que não a União (e pessoas a quem ela

atribua a capacidade de arrecadação, fiscalização e controle do tributo), o sujeito passivo não

pode ser outro senão “aquele que auferir renda”, a base de cálculo não pode ser diversa do

valor da renda (ou parte dela) e a alíquota não pode ser outra senão parte (ou percentual) da

renda auferida, progressivamente projetada.

3.2 Noção Constitucional da Renda

Sabendo-se que a renda, é, então, fator determinante para a análise do perfil

constitucional do imposto de renda, faz-se indispensável uma análise mais precisa sobre a sua

noção constitucional.

Não se trata, pois, de, neste momento, traçar comentário sobre o conceito de

renda tratado pelo legislador infraconstitucional, uma vez que essa é matéria a ser tratada no

tópico seguinte, quando se analisará a regra-matriz de incidência do imposto de renda. O que

se propõe a descrever, aqui, é sobre qual o sentido geral que é possível extrair do texto

constitucional acerca da renda (incluídos aí os “proventos de qualquer natureza”).

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Roque Antônio Carrazza, em sua importante obra que trata do tema,

descreve que a União deve respeitar em tudo a regra-matriz constitucional desse tributo, pois

do contrário estará exigindo “um arremedo de imposto sobre a renda e proventos de qualquer

natureza”. E continua, afirmando que há, na Constituição Federal, conteúdos semânticos

mínimos (noções genéricas) renda e de proventos de qualquer natureza, a serem

obrigatoriamente levados em consideração pelo legislador oridinário.89

Os conteúdos mínimos a que se refere o jurista, decorrem, justamente, do

perfil constitucional anteriormente comentado, que limita a competência do legislador federal

para tributar aquilo que esteja em dissonância com os princípios que regem o tributo.

Para lapidar o conceito de renda, deve ter-se em mente as demais

competências tributárias atribuídas pela Constituição Federal de 1988. Isto porque,

prescrevendo a Constituição competência para instituição de outros tributos sobre o

patrimônio e sobre operações financeiras, não pode a renda passível de tributação

corresponder ao valor da operação ou do patrimônio do contribuinte.

Assim, não se pode dizer que o imposto de renda tributa a operação de

transferência de bens imóveis, já que o valor envolvido em tal operação está sujeito ao

imposto de competência municipal (“ITBI”), nem tampouco a operação de aplicação em

títulos de renda fixa, pois tal materialidade é alcançada pelo chamado “imposto sobre

operações financeiras” (“IOF”)90. Ademais, não pode o imposto de renda incidir sobre a

manutenção da propriedade de bens móveis ou imóveis, per se, em função de a Constituição

traçar competência para tanto aos Estados (imposto sobre propriedade de veículos

automotores – “IPVA”), aos Municípios (imposto sobre propriedade territorial urbana –

“IPTU”) e à própria União (imposto sobre propriedade territorial rural – “ITR”).

A palavra “renda” deve guardar relação com a atividade de aplicação do

patrimônio ou da realização de operações; não o seu valor, mas o seu produto. O produto

dessa atividade humana, porém, somente é renda se for positiva, isto é, desde que acrescente

riqueza, pois o resultado negativo é considerado prejuízo e decresce o patrimônio existente ou

o valor investido.

88 “Direito Tributário Brasileiro” cit. p. 101. 89 “Imposto sobre a Renda (Perfil Constitucional e Temas Específicos)”, Malheiros, São Paulo, 2005, p. 33/34. 90 Nesta oportunidade, não se pode deixar de mencionar a crítica de Roberto Quiroga Mosquera a tal denominação, tendo em vista se tratar de quatro impostos e não apenas de um incidente sobre operações financeiras (“Tributação no Mercado Financeiro e de Capitais”, 2ª edição, Dialética, São Paulo , 1999, p. 112).

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Já a expressão “proventos de qualquer natureza” vem significar, conforme

explicita Mizabel Abreu Machado Derzi, baseada no entendimento de Modesto Carvalhosa

sobre a matéria, a forma específica de rendimento tributável, tecnicamente compreendida

como o acréscimo patrimonial resultante de uma atividade que já cessou, mas que ainda

produz rendimentos, como os benefícios de origem previdenciária, pensões e aposentadoria. 91,

92

Ocorre, porém, que, ao se lapidar este conteúdo semântico, é necessário

verificar os princípios constitucionais elementares para imposição do imposto de renda, e, a

partir de então, acrescentar-se mais alguns dados à noção constitucional de renda, a fim de

identificar a renda passível de tributação pelo imposto de renda.

3.3 Princípios Constitucionais Tributários Aplicáveis ao Imposto de Renda

Humberto Ávila, em sua “Teoria dos Princípios” conceitua:

“Os princípios são normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão de complementaridade e de parcialidade, para cuja aplicação se demanda uma avaliação da correlação entre o estado das coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária à sua promoção”. 93

Celso Antonio Bandeira de Mello, completa:

“Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhe o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo,. No que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico...” 94

Com efeito, em qualquer das concepções adotadas na doutrina, é claro que o

princípio, o constitucional, por excelência, é que serve de parâmetro para nortear tanto a

91 Nota de atualização da obra de Aliomar Baleeiro “Direito Tributário Brasileiro”, 11ª edição, Forense, Rio de Janeiro, 2003, p. 291. 92 No mesmo sentido, Roberto Quiroga Mosquera (“Renda e Proventos de Qualquer Natureza – O Imposto e o Conceito Constitucional”, cit. p. 61) e Geraldo Ataliba (apud Roberto Quiroga Mosquera, “Renda e Proventos de Qualquer Natureza – O Imposto e o Conceito Constitucional”, Dialética, São Paulo, 1996, p. 61). 93 “Teoria dos Princípios – Da Definição à Aplicação dos Princípios Jurídicos”, 2ª edição, Malheiros, São Paulo, 2003, p. 70.

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aplicação das leis e normas infralegais, quanto para a interpretação do próprio texto

constitucional. Por isso, em seu sentido amplo, os princípios constitucionais regem tanto as

normas (regras) constitucionais quanto as infraconstitucionais.

A fim de melhor compreender a extensão dessa afirmação, vale mencionar a

justa diferenciação feita pela doutrina entre regras e princípios. Neste sentido, Paulo

Bonavides95, Humberto Ávila96 e Willis Santiago Guerra Filho97, baseados no pensamento de

Dworkin e Robert Alexy, descrevem que diversos são os aspectos que diferenciam estes

daquelas.

A diferença principal está na sua estrutura deôntica, tendo em vista que a

regra tem por objeto fatos hipotéticos específicos. Já o princípio não corresponde a fatos

específicos, pois traduz-se em uma “prescrição programática genérica”. Há ainda diferenças

estruturais entre regras e princípios. Considerando-se a teoria tríade de Hans Kelsen, tem-se

que, nas regras, o elemento “valor” é implícito e o elemento “fato” é explícito, enquanto que

nos princípios, ocorre justamente o inverso: o valor é explícito e o fato é implícito. Quanto à

generalidade, os princípios apresentam alto grau, enquanto que as regras têm reduzido grau de

generalidade.

Diante dessas observações, é possível afirmar que os princípios guardam,

intrinsecamente, forte conteúdo pragmático, isto é, tomam por prioridade a ligação entre o

objeto e o seu utente.98 Isto porque, tal como descrito anteriormente, os princípios têm

expressivo conteúdo valorativo.

Posto isso, e retomando à análise sobre os princípios constitucionais

tributários aplicáveis ao imposto de renda, verifica-se que o parágrafo 2º do já mencionado

artigo 153, da Constituição Federal, prescreve que o imposto de renda é informado pelos

critérios de generalidade, universalidade e progressividade, na forma da lei99. Portanto, a

94 Apud Luis Roberto Barroso, ob. cit. p. 153. 95 Curso de Direito Constitucional, 14ª edição, Malheiros, São Paulo, p. 277. 96 “Teoria dos Princípios – Da Definição à Aplicação dos Princípios Jurídicos”, cit., p. 28. 97 “Teoria da Ciência Jurídica”, Saraiva, São Paulo, 2001, p. 126 e seguintes. 98 A semiótica, compreendida, assim, a teoria geral dos signos, abrange a estruturação dos sistemas de comunicação. Com base na semiótica, é possível identificar três dimensões de linguagem: (i) sintática (relação dos signos com signos); (ii) semântica (relação dos signos com seu objeto); e (iii) pragmática (relação dos signos com seu usuário, com o homem). 99 “Art. 153. (...) § 2º - O imposto previsto no inciso III: I - será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade, na forma da lei; (...)”

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incidência do imposto sobre a renda deve, obrigatoriamente, observar tais princípios, sob pena

de sua inconstitucionalidade.

Isso não significa afirmar que somente esses princípios são aplicáveis ao

imposto de renda. Ao contrário: o que se extrai desta disposição constitucional é que,

especificamente para o imposto de renda, além dos demais princípios constitucionais

tributários, é obrigatória a observância da generalidade, universalidade e progressividade.

Apesar de o texto da Carta Magna tratar desses elementos como “critérios”,

em verdade, correspondem a princípios, posto que se enquadram perfeitamente no contexto

anteriormente descrito, no tocante a esta espécie – têm alta carga valorativa, não prescrevem

condutas a fatos específicos, funcionando como verdadeiras prescrições programáticas

genéricas.

Especificamente no tocante ao princípio da generalidade, importa esclarecer

que, corolário do princípio da igualdade no âmbito tributário, ele alude à impossibilidade de o

ente tributante competente instituir qualquer diferenciação por critérios diversos daqueles

relacionados ao fato tributável pelo imposto – auferir renda ou proventos de qualquer

natureza. Com base neste princípio, torna-se inconstitucional qualquer tratamento

diferenciado entre contribuintes (desde que não vinculados ao elemento “renda”), quer seja

por condição social, raça, cor, origem etc..

Neste sentido, Mary Elbe Queiroz, em estudo sobre o imposto de renda das

pessoas físicas, assevera:

“A generalidade tem o seu uso mais comum como referindo-se a pessoas, no sentido de que todos, salvo os casos de imunidade, deverão submeter-se à imposição dos tributos, desde que realizem os respectivos fatos geradores. Saliente-se que somente poderá existir a possibilidade de o legislador poder criar exceções à generalidade, se destinadas a realizar a isonomia em consideração à capacidade contributiva”. 100

Enquanto o princípio da generalidade atua no campo subjetivo da hipótese

de incidência do imposto de renda, o princípio da universalidade está situado no campo

objetivo deste tributo. Isto porque corresponde à obrigatoriedade de o imposto sobre a renda

abranger todos os fatos positivos e negativos que contribuam para identificação da renda,

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independentemente de sua fonte, origem ou natureza. É a imposição dada pela Constituição

contra qualquer distinção para tributação pelo imposto de renda segundo a procedência da

renda.

No que tange ao princípio da progressividade, o que pretendeu o

constituinte foi estabelecer que a fixação da(s) alíquota(s) do imposto de renda deve,

necessariamente, observar uma variação progressiva conforme o aumento da base de cálculo.

Este princípio corresponde, assim, a uma subdivisão (assim tomada pela sua função didática)

do princípio da capacidade contributiva, a seguir comentado.

A seu respeito, descreve Paulo Ayres Barreto:

“A renda auferida deve ser submetida à tributação, uma única vez, mediante a aplicação de alíquotas progressivas. Por força do princípio da progressividade, quanto maior for a renda passível de tributação, mais elevada será a alíquota aplicável. O constituinte não se satisfez com a mera proporcionalidade. Determinou a progressividade do imposto sobre a renda, a ser observada pelo ente tributante no exercício da sua competência impositiva.” 101

Além desses princípios, é possível destacar outros princípios que norteiam a

atividade do legislador ordinário federal, na instituição do tributo e sua majoração, bem como

servem como limites ao poder de tributar.

Dentre eles, está o princípio da igualdade, não apenas em sua extensão no

que tange à progressividade ou generalidade, mas em toda sua abrangência, assegurando que

contribuintes em mesma situação jurídica tenham mesmo tratamento tributário, e

contribuintes em situação jurídica diversa, tenham tratamento tributário diferente.102

Outro importante princípio norteador da incidência do imposto de renda é o

princípio da razoabilidade ou da proporcionalidade, retirado, também, da previsão

100 “Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza – Tributação das Pessoas Físicas” in “Curso de Especialização em Direito Tributário – Estudos Analíticos em Homenagem a Paulo de Barros Carvalho”, coord. Eurico Marcos Diniz de Santi, Forense, Rio de Janeiro, 2005, p. 445. 101 “Imposto sobre a Renda – Pessoa Jurídica” in “Curso de Especialização em Direito Tributário – Estudos Analíticos em Homenagem a Paulo de Barros Carvalho”, cit. p. 771. 102 Não raramente apresenta-se o princípio da igualdade mediante o uso de uma expressão “todos são iguais perante a lei”. Especificamente no âmbito do Direito Tributário, o princípio da igualdade encontra-se presente, no artigo 150, II, da Constituição Federal, ao estabelecer que, para um fato imponível qualquer descrito em lei, todos os indivíduos que venham a inserir-se em seu contexto, estejam obrigados e recolher o tributo cobrado (“Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação

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constitucional quanto à progressividade da incidência do imposto em questão. Trata-se de um

princípio que vem sendo aplicado pelo Supremo Tribunal Federal103, a fim de assegurar que a

cobrança do imposto sobre a renda deve atender aos preceitos da adequação, necessidade e

ponderação, para que a previsão constitucional para tal tributo seja respeitada.

O princípio da irretroatividade é igualmente aplicável ao imposto sobre a

renda, sendo passível de alcance pelo imposto de renda instituído por lei, os fatos tributáveis

futuros, apenas. Da mesma forma, o princípio da anterioridade deve ser observado pelo

legislador, ao instituir a incidência do imposto sobre a renda, não sendo possível a sua eficácia

no mesmo exercício fiscal em que se deu a instituição ou majoração do tributo.

3.3.1 A Importância do Princípio da Capacidade Contributiva

Não obstante a indiscutível importância do papel exercido pelos princípios

constitucionais antes mencionados, destaca-se, para os fins do presente estudo, dois outros

princípios constitucionais tributários, de indispensável aplicação ao imposto de renda: o da

capacidade contributiva e o da vedação ao confisco.

O princípio da capacidade contributiva vem expresso no parágrafo 1º, do

artigo 145, da Constituição Federal de 1988 como “sempre que possível, os impostos terão

caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte (...)”.

Trata-se de princípio da igualdade refletido em termos objetivos para o campo da tributação, a

fim de resguardar que a riqueza ou o poder econômico sejam considerados quando da

equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos.”). 103 “RECURSO EXTRAORDINÁRIO - MATÉRIA TRIBUTÁRIA - SUBSTITUIÇÃO LEGAL DOS FATORES DE INDEXAÇÃO - ALEGADA OFENSA ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO ADQUIRIDO E DA ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA - INOCORRÊNCIA - SIMPLES ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA QUE NÃO SE CONFUNDE COM MAJORAÇÃO DO TRIBUTO - RECURSO IMPROVIDO. - Não se revela lícito, ao Poder Judiciário, atuar na anômala condição de legislador positivo, para, em assim agindo, proceder à substituição de um fator de indexação, definido em lei, por outro, resultante de determinação judicial. (...) O Estado não pode legislar abusivamente, eis que todas as normas emanadas do Poder Público - tratando-se, ou não, de matéria tributária - devem ajustar-se à cláusula que consagra, em sua dimensão material, o princípio do "substantive due process of law" (CF, art. 5º, LIV). O postulado da proporcionalidade qualifica-se como parâmetro de aferição da própria constitucionalidade material dos atos estatais. Hipótese em que a legislação tributária reveste-se do necessário coeficiente de razoabilidade. Precedentes.” (RE-AgR 200844 / PR - Relator: Min. Celso de Mello - Julgamento: 25/06/2002 - Órgão Julgador: Segunda Turma).

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estipulação do aspecto quantitativo da hipótese de incidência tributária, tratando iguais como

“iguais e desiguais como desiguais”.

O princípio da capacidade contributiva deve ser observado na instituição do

imposto sobre a renda, na medida em que a lei criadora deste tributo preveja forma de

mensuração de riqueza efetiva (e não potencial ou patrimonial), acrescida ao patrimônio ou

auferida pelo sujeito passivo direto. Neste tocante, vale destacar que alguns juristas (como

Luis Cesar Souza de Queiroz104) consideram que o princípio da capacidade contributiva, no

âmbito do imposto sobre a renda, tem também um aspecto subjetivo, qual seja o de considerar

aspectos pessoais do sujeito passivo, para definição da parcela de seu patrimônio a ser

destinada para pagamento do imposto.

Trata-se de um preceito que visa a personalizar a incidência tributária de

acordo com a situação econômica do sujeito passivo, concretamente identificado. É sabido

que cabe à lei prever cada valor específico a ser imputado a cada sujeito passivo, “mas sim

estruturar o modelo de incidência de tal sorte que, na sua aplicação concreta, tais ou quais

características dos indivíduos (número de dependentes, volume de despesas médicas etc.)

sejam levadas em consideração para efeito de quantificação do montante do imposto devido

em cada situação concreta”, conforme ensina Luciano Amaro105. Ou seja, não apenas a

alíquota deve variar segundo a capacidade econômica do sujeito passivo, mas também a sua

base de cálculo – que, no caso do imposto de renda, conforme pontuado pelo jurista, revela-se

pela dedução de despesas, autorizada por lei.

Marcelo Saldanha Rohenkohl, em dissertação recentemente apresentada

para conclusão do curso de mestrado nesta Casa, concluiu que o conteúdo do princípio da

capacidade contributiva é determinado, inexoravelmente, pela tutela dos direitos e garantias

fundamentais expressos na Constituição Federal. A aptidão econômica sujeita à incidência

tributária somente é identificada no espaço em que, pela tributação, não seja obstado o

exercício ou fruição de qualquer das garantias individuais (com o direito à vida, à liberdade, à

igualdade, à segurança, à propriedade, ao trabalho e à livre iniciativa).106

104 in “Imposto sobre a Renda – Requisitos para uma Tributação Constitucional”, Forense, Rio de Janeiro, 2003. 105 “Direito Tributário Brasileiro”, cit. p. 140. 106 “O Princípio da Capacidade Contributiva no Estado Democrático de Direito (Dignidade, Igualdade e Progressividade na Tributação)”, PUC/SP, São Paulo: 2006, p. 189.

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Com efeito, o princípio da capacidade contributiva confere ao legislador

tributário o dever de apurar a capacidade econômica do contribuinte a partir da preservação

do mínimo vital e do direito ao trabalho e à livre iniciativa. Partindo-se dessa limitação, é que

o imposto de renda poderá ser mensurado, graduando suas alíquotas segundo a possibilidade

econômica pessoal do contribuinte.

Interessante observar que a capacidade contributiva está relacionada

diretamente à materialidade do imposto, e, com isso, toma por “capacidade econômica”, o

elemento que se insere nesta materialidade. Assim, os impostos sobre o patrimônio podem

variar segundo o tamanho deste patrimônio (o seu valor econômico, venal, de mercado etc.),

independentemente de o seu proprietário gozar de situação financeira compatível ou não com

tal patrimônio.

No tocante ao imposto de renda, tal problemática pode ser atenuada, posto

que, sendo a materialidade do imposto a própria renda, a capacidade contributiva pode ser

medida, efetivamente, pela capacidade econômica do sujeito passivo, e, assim, tributar mais

quem ganhar mais e tributar menos quem ganhar menos.

Para medir a capacidade contributiva basicamente dois métodos são

difundidos: o da progressividade e o da proporcionalidade. A proporcionalidade se concretiza

pela definição de um percentual fixo sobre a base de cálculo legalmente definida, onerando

todos os sujeitos passivos, proporcionalmente à extensão da base de cálculo a eles imponível.

Já a progressividade se fundamenta na fixação de alíquotas progressivas (ou

regressivas, conforme o caso), para bases de cálculo também progressivas (ou regressivas,

sendo o caso). Assim, o percentual ou o valor fixo atribuído como alíquota varia em

progressão geométrica de acordo com a variação geométrica da base de cálculo apurada,

pagando mais quem pode mais e pagando menos, quem pode menos.

O método da proporcionalidade, apesar de propagado para todos os impostos

submetidos ao princípio da capacidade contributiva, recebe crítica de grande parte da

doutrina, que entende não ser ele capaz de efetivar a justiça social que se procura assegurar no

parágrafo 1º, do artigo 145, da Constituição Federal.

Roque Antonio Carraza afirma que a proporcionalidade chega até mesmo a

desatender ao princípio da capacidade contributiva, pois “se alguém ganha 10 e paga 1, e

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outrem ganha 100 e paga 10, ambos estão pagando, proporcionalmente, o mesmo tributo

(10% da base de cálculo). Apenas, o sacrifício econômico do primeiro é incontendivelmente

maior” 107.

No mesmo sentido, Luciano Amaro108 e Humberto Ávila109.

Para o imposto de renda, especificamente, verifica-se que o artigo 153, em

seu parágrafo 2º, I, exige expressamente que a capacidade contributiva seja apurada segundo a

progressividade das alíquotas, de tal forma que, no âmbito deste imposto, o princípio da

capacidade contributiva seja sobreposto pelo princípio da progressividade, no tocante à

fixação das alíquotas.

O entendimento que se extrai dessa análise, é que as alíquotas do imposto de

renda deverão ser progressivas, sendo mais altas, tanto maior seja a renda auferida pelo

indivíduo. E a renda, para estes fins, também objeto é da aplicação do princípio da capacidade

contributiva, na medida em que corresponderá à base de cálculo do imposto, líquida da

dedução das despesas necessárias, realizadas pelo indivíduo.

Por fim, vale mencionar que o atendimento ao princípio da capacidade

contributiva conviver com característica extrafiscal de determinados tributos.

A extrafiscalidade corresponde à técnica usada para imputar à configuração

dos tributos, elementos que possam nortear seus comportamentos, de forma a estimular ou

desestimular determinadas ações, julgadas de relevante interesse público, seja no âmbito

social, político, monetário ou econômico.

Isso não significa afirmar que a extrafiscalidade possa afastar a aplicação

por completo desde princípio. Mesmo porque, a extrafiscalidade, conforme explica Paulo de

Barros Carvalho, somente pode ser exercida se observados os contornos da competência

tributária. Confira-se:

“Consistindo a extrafiscalidade no emprego de fórmulas jurídico-tributárias para a obtenção de metas que prevalecem sobre os fins simplesmente arrecadatórios de recursos monetários, o regime que há de dirigir tal atividade não poderia deixar de ser o próprio das exações tributárias. Significa, portanto, que, ao construir suas pretensões extrafiscais, deverá o legislador pautar-se, inteiramente, dentro dos

107 “Curso de Direito Constitucional Tributário”, cit. p. 83. 108 “Direito Tributário Brasileiro”, cit. p. 141. 109 “Sistema Constitucional Tributário”, cit. p. 361.

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parâmetros constitucionais, observando as limitações de sua competência impositiva e os princípios superiores que regem a matéria, assim os expressos que os implícitos”. 110

Assim, em se tratando de imposto de renda, a extrafiscalidade somente é

exercida se a hipótese de incidência atingida contemplar a observância do princípio da

capacidade contributiva.

Neste sentido, considerando-se, hipoteticamente, o imposto de renda sendo

fixado, por exemplo, sobre rendimentos e ganhos em aplicações financeiras, segundo

alíquotas progressivas em conformidade com o aumento da base de cálculo, e que

contemplasse um adicional de alíquota em caso de resgate da aplicação financeira antes de

determinado prazo, estaria respeitando os princípios da capacidade contributiva e da

progressividade, e, ao mesmo tempo, conteria regra válida de extrafiscalidade.

Neste caso, haveria um aumento de alíquota especificamente para atender à

extrafiscalidade, buscando-se incentivar a manutenção dos recursos em aplicação, a fim de

propiciar o alongamento das dívidas do País, sem, contudo, deixar de mensurar a capacidade

econômica do sujeito passivo. Esta situação hipotética iria ao encontro da definição dada por

Roque Antonio Carrazza a este instituto: “Há extrafiscalidade quando o legislador, em nome

do interesse coletivo, aumenta ou diminui as alíquotas e/ou as bases de cálculo dos tributos,

com o objetivo principal de induzir os contribuintes a fazer ou a deixar de fazer alguma

coisa.” 111

Por outro lado, o imposto de renda que tenha suas alíquotas baseadas

exclusivamente no período de manutenção das aplicações financeiras, sem mensurar a

capacidade econômica do sujeito passivo, quer parecer inconstitucional por violar o princípio

da capacidade contributiva e o da progressividade, em prevalência da finalidade meramente

extrafiscal.

A este respeito, ver-se-á adiante um caso concreto em que o imposto de

renda é fixado segundo alíquotas regressivas de acordo com o prazo de manutenção dos

recursos no plano de previdência privada, sendo menor a alíquota quanto maior o prazo de

acumulação nos valores no plano. Neste caso, conforme será demonstrado, a lei não faz

110 “Curso de Direito Tributário”, cit., p. 236. 111 “Curso de Direito Constitucional Tributário”, cit. p. 101.

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qualquer distinção quanto à base de incidência do tributo, variando a alíquota do imposto

exclusivamente em função do tempo de aplicação financeira do contribuinte, e não em função

da sua capacidade econômica.

3.3.2 A Limitação Imposta pelo Princípio da Vedação ao Confisco

Presente em diversos sistemas jurídicos, a vedação ao confisco, no

ordenamento jurídico brasileiro, está previsto no artigo 150, IV, da Constituição Federal.

Conforme anteriormente descrito, apesar de a Constituição expor um perfil

geral de cada tributo, descrevendo sua materialidade possível, seus sujeitos ativo e passivo

possíveis, sua base de cálculo e alíquota possíveis, é a lei que institui o tributo que deve

prever esses elementos in concreto. Pois bem, a vedação ao confisco – ou o “não-confisco”,

como alguns preferem denominar112 – atinge especificamente um desses elementos ou

elementos da regra-matriz tributária: o quantitativo.

O aspecto quantitativo da hipótese de incidência de um tributo corresponde,

basicamente, conforme restará descrito a seguir, à sua alíquota e à sua base de cálculo. Tais

elementos não precisam estar claramente descritos na lei, basta apenas que constem como a

grandezas eleitas pelo legislador (com fundamento na competência atribuída pela

Constituição Federal), a fim de dimensionar o fato que gera a cobrança do tributo.

Justamente por se referir aos elementos que mensuram o “peso” do tributo,

ou seja, a quantidade de dinheiro a ser entregue aos cofres públicos, é que o aspecto

quantitativo está intimamente ligado ao princípio da vedação ao confisco.

O princípio da proibição ao confisco apresenta-se como uma garantia ao

direito de propriedade, de forma a coibir ações do poder tributante, que tenham por

conseqüência restringir o direito dos cidadãos de usufruir seus próprios bens e direitos

legitimadamente adquiridos.

112 Estevão Horvath, “Princípio do Não-Confisco no Direito Tributário”, Dialética, São Paulo, 2002.

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É evidente que qualquer cobrança de tributos atinge a propriedade dos

indivíduos, uma vez que é de sua essência a entrega de recursos ao Poder Público competente.

Contudo, pretende-se, com a vedação ao confisco, limitar esse poder-dever que os entes

públicos detêm para retirar parcela do patrimônio dos indivíduos com o fim de arrecadar

tributos.

É o que expõe Sasha Calmon Navarro Coelho:

“A teoria do confisco e especialmente do confisco tributário ou, noutro giro, confisco através de tributo, deve ser posta em face do direito de propriedade individual, garantida pela Constituição. Se não se admite a expropriação sem justa indenização, também se faz inadmissível a apropriação através da tributação abusiva”. 113

A medida do confisco é, portanto, a medida do abuso, em que o tributo deixa

de ser encargo da atividade do cidadão ou da empresa e passa a comprometer a própria

atividade ou subsistência de sua fonte produtora114. Em outras palavras, o confisco serve

como padrão de tributação tido como suportável, razoável.

O texto constitucional determina que:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) IV - utilizar tributo com efeito de confisco; (...)”

Diante desta redação, é possível, desde já, inferir que: (i) a proibição

inserida neste dispositivo constitucional aplica-se a todos os tributos; (ii) há vedação para

qualquer utilização de tributo que tenha efeito confiscatório. Assim, o que se proíbe é haja

efeito de confisco na utilização de tributos pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Efeito confiscatório, no âmbito do direito tributário, deve ser entendido

como o resultado da cobrança de determinado tributo que represente excessiva exação. Em

outras palavras, o efeito confiscatório é identificado quando, diante de determinada exigência

113 In “O Controle da Constitucionalidade das Leis e o Poder de Tributar na Constituição de 1988”, 3ª edição, Del Rey, Belo Horizonte, 1999, p. 457. 114 Neste tocante, vale mencionar as palavras de Ricardo Conceição Souza, in “Regime Jurídico das Contribuições”, Dialética, São Paulo, 2002, p. 115: “Haverá confisco quando o tributo ou sua respectiva carga absorver os meios de produção de riqueza do contribuinte, impossibilitando-lhe de produzir, se for pessoa jurídica, ou de viver com dignidade, se for pessoa física.”

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tributária, o sujeito passivo tenha que se privar de elementos necessários à sua subsistência ou

ao exercício de suas atividades.

Trata-se, portanto, de uma conseqüência – por isso “efeito” – de uma atitude

de cunho confiscatório adotada pelo ente tributante, em relação aos sujeitos passivos

submetidos à incidência do tributo.

Tributo confiscatório, então, pode ser entendido como todo aquele que,

isoladamente, seja capaz de comprometer a fonte produtora do bem, direito ou serviço sujeito

à tributação.

Ao tratar de utilização de tributo efeito confiscatório, o que a Constituição

Federal de 1988 pretendeu proteger o sujeito passivo contra tributação insuportável,

qualquer(quaisquer) que seja(m) a(s) modalidade(s) de tributo escolhida(s) para tanto.

Não há, porém, até os dias atuais uma definição legal sobre qual o limite que

determinado tributo ou todos os tributos devem observar para não serem tidos como

confiscatórios.

No passado, porém, Ives Gandra Martins destaca que já houve tentativa de

se estabelecer tal limite. O jurista faz referência ao anteprojeto de lei, elaborado pelo então

senador Fernando Henrique Cardoso, para alteração do CTN, com vistas a disciplinar ao

disposto no artigo 150, inciso IV, da Constituição Federal de 1988. O referido anteprojeto

continha a seguinte redação:

“Art. 7º Considerar-se-á caracterizada a utilização de tributo com efeito de confisco sempre que seu valor, na mesma incidência, ou em incidências sucessivas, superar o valor normal de mercado dos bens, direitos ou serviços envolvidos no respectivo fato gerador ou ultrapassar 50% do valor das rendas geradas na mesma incidência. (...) §2º Para os efeitos deste artigo computar-se-ão todos os tributos federais, estaduais ou municipais, que incidam no bem, direito ou serviço com fatos geradores simultâneos, ou decorrentes de um único negócio.” 115

Tal projeto, porém, não foi levado adiante, sendo possível hoje uma

aplicação bastante subjetiva sobre o limite de incidência de tributos, sem que sejam

“utilizados com efeito de confisco”.

115 “A Abertura de Espaços Comunitários, Carga Tributária, Capacidade Contributiva e Efeito-Confisco”, in “Grandes Questões Atuais do Direito Tributário”, 8º vol., Dialética, São Paulo, 2004, p. 235 e 237.

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A vedação ao confisco, não se pode ouvidar, é claramente aplicável ao

imposto sobre a renda, e, este, por sua essência, deve observá-lo de forma objetiva, afastando

qualquer efeito do tributo que tenha por conseqüência a inviabilidade de práticas de atividades

ou da subsistência do contribuinte.

Neste sentido, certas situações práticas podem delinear alguns dos limites a

que se submete o legislador federal, ao definir a incidência do imposto de renda. É o caso, por

exemplo, de se tributar a fonte produtora de riqueza (o que invibilizaria o auferimento de

renda e de patrimônio, e o exercício de atividades econômicas) e a correção monetária de

valores (que apenas traz a valor presente determinado montante em dinheiro).

Ademais, apesar de se tratar de um conceito bastante subjetivo, fala-se ainda

de a tributação, especialmente a que se impõe sobre a renda, respeitar o mínimo existencial,

para uma vida digna do indivíduo. Neste tocante, o princípio da vedação ao confisco chega

mesmo a confundir-se com o princípio da capacidade contributiva, conforme palavras de

Elcio Fonseca Reis:

“O mínimo existencial é visto como limite mínimo para a capacidade contributiva, na medida em que a renda consumida na manutenção da vida digna, ou seja, aquela que assegure um mínimo de dignidade para o exercício da cidadania não pode ser posta sob o enfoque da norma de tributação, por não denotar capacidade contributiva. A capacidade contributiva tem como limites, de um lado, o mínimo existencial ligado à dignidade da pessoa humana e, de outro, a propriedade ligada à vedação de tributos confiscatórios. Dentro desses limites há capacidade contributiva passível de ser tributada pelo imposto de renda.” 116

Porém, outros tantos aspectos do princípio da não-confiscatoriedade podem

ser identificados juridicamente, sempre à margem das limitações ao poder de tributar e ao

princípio da capacidade contributiva. Importante, face mesmo à ausência de definição precisa

constitucional sobre o tema, é verificar, em toda e qualquer norma que estatua hipóteses de

incidência tributária, a razoabilidade e a garantia aos direitos fundamentais dos cidadãos,

como o da livre iniciativa117, bem como garantir o mínimo existencial.

116 “O Imposto de Renda das Pessoas Físicas e a Dignidade da Pessoa Humana. Intributabilidade do Mínimo Existencial”, Revista Dialética de Direito Tributário nº 65, fev/2001, p. 39. 117 Neste sentido, Roque Antonio Carrazza, in “Curso de Direito Constitucional Tributário”, cit. p. 94.

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3.4 A Renda Passível de Tributação pelo Imposto de Renda

Aqui chegados, torna-se possível a combinação das conclusões parciais

apontadas anteriormente com o conteúdo dos princípios constitucionais tributários

anteriormente comentados, a fim de identificar a abrangência da renda passível de tributação

pelo imposto de renda.

Vê-se, primeiramente, que, em razão das demais competências tributárias

atribuídas na Constituição, a renda tributável pelo imposto de renda não pode corresponder ao

valor de determinada operação nem ao valor dos bens móveis ou imóveis de que se tenha

propriedade. A “renda” em questão deve corresponder ao produto da atividade de aplicação

do patrimônio ou da realização de operações, e não ao valor da operação realizada ou do

patrimônio aplicado.

Ademais, sendo renda aquilo que acrescente riqueza, o imposto somente

pode incidir sobre resultados positivos auferidos pelo sujeito passivo. Isto reflete-se pela

aplicação do princípio da capacidade contributiva, segundo o qual, conforme já exposto, o

imposto há de conter a mensuração da capacidade econômica do sujeito passivo, em

consonância com a materialidade por ele (imposto) alcançada. Isto quer dizer que o imposto

de renda deve ser instituído com base na capacidade econômica mensurada pela renda

auferida pelo sujeito, e a renda do sujeito não considera, por essência, resultados negativos.

Seguindo nesta linha, acrescenta-se ainda que a renda, sujeita ao imposto

federal, há de ser o resultado positivo líquido auferido pelo indivíduo, retirando-se a parcela

investida ou a perda incorrida. Caso contrário, estar-se-á tributando o patrimônio ou o

prejuízo (e não o acréscimo de riqueza), em ofensa ao princípio da capacidade contributiva.

No tocante ao princípio da vedação ao confisco, extrai-se que a renda

passível de tributação pelo imposto federal não pode corresponder à reposição patrimonial,

quer sob a denominação de indenização ou mera devolução do capital investido. Com efeito,

por não representarem acréscimo de riqueza nova (posto que a já acumulada é capital ou

patrimônio) não podem estar compreendidas no espectro de incidência do tributo em tela, sob

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pena de se atingir a fonte produtora da renda – o que, conforme visto, é banido pelo princípio

do não-confisco.

Neste tocante, são palavras de Mizabel Abreu Machado Derzi:

“Será inconstitucional, então, a lei federal que tribute a receita representativa de mera reposição de bens patrimoniais (por terem, sido objeto de aplicação de capital da pessoa), como pagamento de capital ou reembolso das despesas feitas para produção da receita, inclusive royalties. Nem se pode tributar o preço da alienação do bem, que é mera reposição do capital investido, se não há ganho real. Muito menos é tributável a verdadeira e própria indenização, que é simples recomposição de perdas patrimoniais”. 118

Especificamente sobre a importância da tributação do resultado positivo

líquido auferido, lembra o professor Roque Antônio Carrazza que se trata de corolário do

princípio da universalidade, segundo o qual, conforme descrito em linhas anteriores, o

imposto de renda deverá abranger todos os fatos positivos e negativos que contribuam para

identificação da renda, independentemente de sua fonte, origem ou natureza. 119

Mizabel Abreu Machado Derzi, em outra passagem vem confirmar: a

exclusão das despesas a fim de alcançar a renda líquida tributável é decorrência justamente da

conjunção do princípio da capacidade contributiva e do princípio da vedação ao confisco.

Confira-se:

“A pessoalidade é própria e tecnicamente adequada à apuração da capacidade econômica. Entretanto, só se ajusta, de fato, aos impostos sobre a renda percebida, sobre o patrimônio e seus acréscimos. Essa capacidade só se inicia após deduzidos os custos e gastos necessários à aquisição, produção e manutenção da renda ou do patrimônio (art. 145, §1º). Antes disso, não há capacidade contributiva, sendo confiscatória a tributação: a) que reduza substancialmente o patrimônio, impedindo a sua manutenção; b) que atinja o mínimo vital, como definido no ar. 7º, VI, da Constituição Federal, indispensável a uma existência digna, pessoal e familiar do contribuinte; c) que obste o consumo dos gêneros de primeira e média necessidade.” 120

Neste sentido, devido a estas características, o conceito de “renda e

proventos de qualquer natureza” é assim expressado por Luis Cesar Souza de Queiroz:

“Renda e proventos de qualquer natureza (ou renda em sentido amplo ou simplesmente Renda) é conceito que está contido nas normas constitucionais

118 Nota de atualização da obra de Aliomar Baleeiro em “Direito Tributário Brasileiro”, cit. p. 287. 119 “Imposto sobre a Renda (Perfil Constitucional e Temas Específicos)”, cit. p. 40. 120 Nota de atualização da obra de Aliomar Baleeiro em “Direito Tributário Brasileiro”, cit. p. 318.

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relativas ao imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza e que designa o acréscimo de valor patrimonial, representativo da obtenção de produto ou de simples aumento no valor do patrimônio, apurado, em certo período de tempo, a partir da combinação de todos os fatos que contribuem para o acréscimo de valor de patrimônio (fatos-acréscimos) com certos fatos que, estando relacionados ao atendimento das necessidades vitais básicas à preservação da existência, com dignidade, tanto da própria pessoa quanto de sua família, contribuem para o decréscimo de valor de patrimônio (fatos-decréscimos).” 121

Note-se que o referido autor, ao tratar de “fatos-acréscimos” e “fatos-

decréscimos”, a fim de destacar que o perfil constitucional da renda somente admite a sua

tributação sobre a renda líquida, ainda ressalta, em linha com o princípio da vedação ao

confisco, que a exclusão das despesas da renda auferida justifica-se por tais despesas estarem

vinculadas às necessidades de subsistência pessoal e familiar, com dignidade.

A reforçar tudo o quanto ora exposto, vale citar trecho da obra de Humberto

Ávila em que ele concorda com este posicionamento:

“O conceito de renda é construído a partir do postulado da coerência substancial. Desse postulado decorre o dever de analisar, de um lado, os princípios constitucionais fundamentais na sua concretização tributária (o princípio da igualdade, art. 5º, caput, e art. 150, II, a inviolabilidade da dignidade humana, art. 1º, os direitos fundamentais de liberdade, art. 1º, art. 5º, caput, e incisos II, XXII, XXIII, e art. 150) e, de outro lado, os princípios gerais tributários previstos no Sistema Tributário Nacional (pessoalização dos tributos e capacidade contributiva, art. 145, §1º) e aqueles aplicáveis ao imposto sobre a renda (generalidade, universalidade e progressividade). O conceito de renda, apesar de não expressamente instituído, decorre de uma conexão entre direitos fundamentais, princípios constitucionais fundamentais e gerais e regras de competência. Dessa conexão decorrem algumas conseqüências: (i) os gastos indispensáveis para existência pessoal e da família

devem ser desonerados; (ii) os gastos indispensáveis para o livre exercício da atividade

econômica ou para a manutenção da fonte produtora de riqueza devem ser desonerados.

O conceito legal de renda deve ser, portanto, definido de modo a abranger apenas o resultado líquido entre receitas e despesas em determinado período de tempo.” 122

Por tudo isso, acredita-se que a lei ordinária da União, no tocante à

incidência do imposto de renda, deve considerar como sua materialidade (renda

constitucionalmente passível de tributação): (i) o produto da atividade de aplicação do

patrimônio ou da realização de operações, e não ao valor da operação realizada ou do

patrimônio aplicado; assim considerados os (ii) resultados positivos auferidos pelo sujeito

121 in “Imposto sobre a Renda – Requisitos para uma Tributação Constitucional”, Forense, Rio de Janeiro, 2003, p. 263. 122 “Sistema Constitucional Tributário”, cit. p. 366.

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passivo; apurados (iii) após a dedução da parcela investida ou a perda incorrida, e dos gastos

necessários à sua subsistência ou à manutenção da fonte produtora da renda (resultado

líquido); (iv) excluindo-se qualquer forma de reposição patrimonial.

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Capítulo IV - A Hipótese de Incidência do Imposto de Renda e a Formação de sua

Regra-Matriz

Partindo-se do conceito de tributo, essencialmente aquele “desenhado” pela

Constituição Federal, é possível destacar entre um dos seus elementos primordiais a

necessária vinculação à lei (princípio da legalidade123). Isto porque, é a norma tributária que

definirá todos os critérios componentes do fato, eleito como ensejador da obrigação tributária

de “transferir dinheiro aos cofres públicos” – excluindo-se, aí, as demais hipóteses de entrega

de recursos ao Estado, decorrente de penalidades, disposições contratuais ou danos124.

A norma tributária tem o mesmo tratamento e efeito que as demais normas

jurídicas, ou seja, o de determinar um comportamento para sujeitos em sociedade, criando

relações jurídicas (mandamento). Há, porém, uma qualificação própria da norma tributária,

que é justamente descrever o fato imponível.

O fato imponível consiste no fato hipoteticamente descrito na lei, como

gerador da obrigação tributária; é o fato que, quando verificado concretamente de forma

completa (isto é, em todos os seus contornos descritos na norma), gera a obrigação de recolher

o tributo.

Desta concepção decorre, portanto, a conclusão de que a lei tributária, que

define as circunstâncias hipotéticas do fato imponível, deve ser anterior à concretização do

fato em si.

Em termos formais, Geraldo Ataliba critica a utilização da expressão “fato

gerador” para designar tanto a descrição hipotética do fato imponível, quanto a sua realização

propriamente dita; a não ser que haja a diferenciação do “fato gerador in abstracto” como

hipótese de incidência, em relação ao “fato gerador in concreto”, assim tido o fato imponível

propriamente125.

123 Constituição Federal: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; (...)” 124 Código Tributário Nacional: “Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.” 125 “Hipótese de Incidência Tributária”, 6ª edição, Malheiros, São Paulo, 2005, p. 55.

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Para este jurista, hipótese de incidência é a denominação mais adequada

para se referir à “descrição legal, hipotética, de um fato, estado de fato ou conjunto de

circunstâncias de fato”, e fato imponível, o termo próprio para conceituação do fato

efetivamente acontecido, no tempo e no espaço, “configurando rigorosamente a hipótese de

incidência”126.

Outros estudiosos, concordando com tal posicionamento, apenas variam em

substituir a expressão “fato imponível” por “fato gerador”, mas sem confundi-lo, porém, com

a hipótese de incidência tributária (ou hipótese tributária).127

A importância desta distinção reside na linha lógica e cronológica da

incidência do tributo: primeiro deve haver a previsão legal atribuindo determinados efeitos a

certas circunstâncias de fato (previsão hipotética, por isso “hipótese de incidência”) e depois o

seu acontecimento, capaz de produzir os efeitos previstos em lei, gerando, assim, a obrigação

de pagar o tributo (por isso “fato gerador”).

Característica destacável da hipótese de incidência é a de que, enquanto

conceito geral, não pode conter descrição do objeto conceituado (fato que enseja a obrigação

tributária), mas apenas o espelhar, mediante menção a seus elementos destacados deste objeto.

Estes elementos, conjuntamente, indicam quais as circunstâncias que são capazes de gerar os

efeitos tributários pretendidos – de recolhimento do tributo.

Assim, é possível encontrar, na norma tributária, muitos elementos ou

poucos elementos do fato descrito hipoteticamente como gerador da obrigação tributária,

sendo que, num ou noutro caso, isto é, havendo muitos ou poucos caracteres da situação

hipotética, todos aqueles descritos são considerados para definição do fato imponível,

concretamente realizado, para fins de imputação da obrigação tributária. Havendo outros,

quaisquer que sejam, não mencionados na hipótese de incidência, não são necessários para

delimitação do espectro de incidência tributária.

Para exemplo, poder-se-ia mencionar como hipótese de incidência do

imposto de renda “aquele que auferir rendimentos decorrentes do trabalho assalariado estará

obrigado a recolher o imposto de renda à alíquota de X%”. Diante dessa hipótese, o sujeito

126 Op. cit. p. 54. 127 Neste sentido, Hugo de Brito Machado in “Curso de Direito Tributário”, 23ª edição, Malheiros, 2003, p. 124.

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que auferir rendimento, em função do desenvolvimento de trabalho assalariado, estaria

submetido à obrigação de recolher, aos cofres públicos, X% do seu rendimento auferido.

Note-se que, neste caso, a hipótese de incidência não descreve outros

elementos que podem ser vislumbrados concretamente – como o dia em que se aufere o

rendimento, o local, quem é a fonte pagadora dos recursos, o tipo de trabalho assalariado que

foi desenvolvido, se o auferimento do rendimento deu-se por meio de crédito em conta

bancária ou por cheque nominal etc..

Assim, no exemplo em questão, desde que auferido o rendimento decorrente

do trabalho assalariado (seja ele auferido no dia 1, 2 ou 3 ou outro do mês, em qualquer

cidade do País ou fora dele, sendo a fonte pagadora pessoa física ou jurídica,

independentemente de o trabalho ser decorrente da prestação de serviços de venda, de

consultoria, de vigilância ou outro, e sendo o referido rendimento recebido em cheque,

dinheiro ou crédito em conta bancária), estaria o sujeito passivo obrigado a pagar o imposto

de renda à alíquota de X%.

Outro ponto de destaque para a hipótese de incidência é o seu caráter

unitário. Cada hipótese descrita em lei vale apenas para um e somente um tributo, assim como

cada tributo tem uma e somente uma hipótese de incidência.

O fato imponível descrito hipoteticamente na norma tributária confere-lhe

apenas determinado tributo. Isto não quer dizer, porém, que, de um mesmo fato concreto e sua

repercussão no mundo fenomênico não possa ensejar a incidência de tributos diversos. Vender

uma casa, por exemplo, pode acarretar a incidência do imposto sobre transmissão de bens

imóveis (“ITBI”), e o produto da alienação pode estar sujeito ao imposto de renda, por ter

possivelmente gerado, para o alienante, rendimento tributável.

Observe-se, porém, que, nestes casos, não atribui a lei um mesmo fato

imponível para dois tributos. Para o ITBI definiu-se a transmissão onerosa do bem imóvel;

enquanto que, para o imposto de renda, a hipótese descrita na lei é auferir rendimento ou

ganho de capital decorrente da alienação de imóvel. Assim sendo, neste exemplo comentado,

havendo transmissão do bem, por preço inferior ao custo de sua aquisição para o alienante, há

incidência do ITBI, mas não do imposto de renda.

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Geraldo Ataliba conceitua fato imponível como sendo “fato concreto,

localizado no tempo e no espaço, acontecido efetivamente no universo fenomênico, que – por

corresponder rigorosamente à descrição prévia, hipoteticamente formulada pela h.i. legal –

dá nascimento à obrigação tributária”128.

Com efeito, o fato gerador ou imponível, é o fato ocorrido externamente,

contemplado ipsis literis na hipótese de incidência descrita na norma tributária, exceto pelas

variáveis antes comentadas, que não interferem para sua caracterização como fato ensejador

da obrigação tributária.

Por isso afirmar-se que “o fato imponível é um fato jurígeno (fato

juridicamente relevante) a que a lei atribui a conseqüência de determinar o surgimento da

obrigação tributária concreta” (Geraldo Ataliba129). É, pois, um fato qualquer, passível de

ocorrência, que é tomado hipoteticamente na norma tributária, a fim de criar o liame

obrigacional tributário entre o sujeito ativo e o sujeito passivo.

Salienta-se que se trata, efetivamente, de um fato jurídico, e não de um ato

jurídico, pois independe da vontade das partes envolvidas – sujeitos ativo e passivo –, já que o

liame obrigacional criado pela norma tributária não está condicionada à voluntariedade de um

ou outro sujeito.

Assim, ainda que para realização do fato imponível tenha o sujeito passivo

agido mediante ato de vontade (este sim, ato jurídico), não depende de sua vontade o efeito

tributário a ele subjacente.

Em termos práticos, retomando-se o exemplo da venda do imóvel, o

alienante, pressupõe-se, agiu mediante a manifestação expressa de sua vontade ao se desfazer

de propriedade sua – ato jurídico. Mas não o fez com a finalidade de alcançar a hipótese de

incidência do ITBI. A incidência deste tributo foi conseqüência imposta legalmente (e não

voluntariamente) do fato ocorrido (fato imponível – venda do imóvel).

Por isso, justifica-se a afirmação de Geraldo Ataliba: “se a lei colocar como

aspecto material da hipótese de incidência um fato que para outros ramos do direito é

voluntário, para o direito tributário esse fato será fato jurídico simplesmente, sendo

128 Op. cit. p. 68. 129 Op. cit. p. 68.

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indiferente sua classificação como fato voluntário. (...) Para o direito tributário a única

vontade relevante, juridicamente, é a vontade da lei (...) ”130.

O fenômeno de adequação perfeita entre a hipótese de incidência e o fato

imponível é denominado “subsunção”.

É como se fosse possível imaginar o desenho de uma linha constante, que

corresponderia à hipótese de incidência, e uma parábola que consistiria nos fatos ocorridos no

mundo fenomênico, sendo que o ponto de encontro da linha contínua e da parábola é o fato

imponível, ensejador da obrigação tributária, tal como descrito em lei.

É preciso observar que, como somente com base na hipótese de incidência é

que se torna possível verificar, posteriormente o vínculo obrigacional entre o Estado e o

sujeito passivo tributário, também somente com a ocorrência do fato imponível é que se dá o

nascimento da obrigação tributária.

Interessante observar, neste ponto, que, assim como cada hipótese de

incidência está para um, e somente um, tributo, cada fato imponível dá ensejo a uma, e

somente uma, obrigação tributária. Em outras palavras, a hipótese de incidência de

determinado tributo pode contemplar inúmeros fatos imponíveis, porém, cada um deles,

ocorridos concretamente, dá origem a apenas uma obrigação tributária; assim, haverá tantas

obrigações tributárias quantos sejam os fatos geradores ocorridos.

Para identificar-se como está estruturada a hipótese de incidência de um

tributo, Geraldo Ataliba aponta para seus aspectos, consistindo a hipótese de incidência na

reunião desses aspectos.

Trata-se, em verdade, de “elementos” do fato descrito hipoteticamente na

norma tributária como ensejador do nascimento da obrigação tributária. São, pois, os

contornos da situação descrita na lei (como, se e quando verificada), que criará a obrigação de

recolher tributo aos cofres públicos.

Estes aspectos devem estar todos presentes nas normas que disciplinam a

regra geral de incidência do tributo, ainda que não sejam explicitamente descritos como tal, e

ainda que presentes de forma esparsa, em normativos distintos.

130 Op. cit. p. 72.

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Estes aspectos são cinco: aspecto material, aspecto temporal, aspecto

subjetivo, aspecto espacial e aspecto quantitativo.

Paulo de Barros Carvalho, ao tratar da matéria, prefere referir-se a estes

elementos como critérios. Com isso, busca descrever que a hipótese de incidência tributária

possui uma estrutura cujos critérios de identificação resultam na formação de uma verdadeira

matriz. Debruçando-se ao estudo desse tema, o jurista verifica o conteúdo desses critérios e

analisa a sua forma de estruturação lógica, a formar a chamada regra-matriz tributária131.

A regra-matriz contém os cinco critérios, sendo três deles (material espacial

e temporal) alocados na parte da regra-padrão do tributo que descreve a hipótese132

(denominado antecedente), e os dois outros (subjetivo e quantitativo) localizados no

conseqüente da regra-matriz tributária, em que se prescreve a norma jurídica tributária.

Por se tratar de norma jurídica, o liame que intercede o antecedente e o

conseqüente da regra-matriz tributária é um dever-ser implicacional, posto que não cria um

vínculo de causalidade, mas de imputação deôntica.

Nas palavras do professor:

“A obra reconstrutiva da norma não estará acabada se não insistirmos no elo de ligação que se estabelece entre a proposição hipótese e a proposição tese, ou, em outros signos, entre o antecedente e o conseqüente. Repousa aí o nexo especialíssimo, a marca indelegável do jurídico-normativo, o dever-ser, o deôntico, que faz com que as leis do direito sejam substancialmente diferentes das leis naturais. (...) Entre a descrição factual e o regramento da conduta incide laço imputativo – a imputação deôntica. Se A ocorrer, deve-ser B, ou se A, então deve-ser B. Diverso é o que se passa com as leis da natureza, guiadas pelo princípio da causalidade – se A for, B também será, ou se A, então B.” 133

A regra-matriz, portanto, forma-se pela combinação dos critérios material,

espacial, temporal (como antecedentes) e subjetivo e quantitativo (como conseqüentes),

ligados pelo vínculo de implicação deôntica: dever-ser.

131 “Curso de Direito Tributário”, cit., p. 256. 132 A “descrição” do fato, contida na hipótese da regra-matriz de incidência, está inserida no contexto da prescrição normativa, pois se vincula diretamente com a “prescrição” da conduta (prevista no conseqüente do enunciado proposicional normativo). “Por isso, os conceitos jurídicos veiculados na hipótese não estão sujeitos aos valores de verdade ou falsidade, como as proposições descritivas que os cientistas emitem. As hipóteses das normas jurídicas valem ou não valem, como também as respectivas conseqüências (prescritores) têm validade ou invalidade”, explica Paulo de Barros Carvalho (“Curso de Direito Tributário”, cit. p. 256). 133 “Curso de Direito Tributário”, cit., p. 346.

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Como resultado desta verificação, passar-se-á à análise dos critérios que

formam a regra-matriz tributária do imposto de renda, a fim de que sejam identificados os

elementos que compõem a figura do seu fato imponível abstrato – que, realizado

concretamente, gerará a incidência do referido tributo.

4.1 O Antecedente da Norma Tributária

O antecedente da norma tributária, que rege a incidência do imposto de

renda contém a hipótese da regra-matriz de incidência do imposto de renda. Nele estarão

presentes a materialidade do imposto, a indicação do espaço geográfico no qual os fatos, uma

vez ocorridos, desencadearão a implicação normativa e a precisão do momento em que o fato

considerar-se-á concretizado, para efeitos de determinação da incidência.

Em se tratando de imposto de renda, todos esses critérios presentes no

antecedente da estrutura-padrão normativa estão voltados para a definição da obtenção da

renda pelo indivíduo: qual o comportamento alcançado pelo imposto, qual o marco de tempo

em que se dá por ocorrido esse comportamento e onde se considera nascido o liame

obrigacional relativo a este tributo.

Ao perquirir esses critérios, o fato passível de tributação pelo imposto de

renda restará identificado, faltando apenas examinar quem são os sujeitos que, ao realizarem o

comportamento tributável, no tempo e espaço delimitados, irão se submeter à incidência

tributária, e em que medida será devido o tributo.

4.1.1 Critério Material - Renda e Proventos de Qualquer Natureza

O critério material da hipótese da regra-matriz tributária está voltada para a

verificação do comportamento objeto da incidência, isolado dos demais elementos que

formam a situação passível de tributação. Cuida-se, no aspecto material, de extrair da

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incidência tributária qual a ação ou estado passível de tributação, de forma destacada de seu

contexto (pessoas, espaço, tempo etc.).

Para esta tarefa de identificar tal comportamento, é necessário compor um

enunciado formado por verbo e complemento mínimo.

Sabe-se que este critério material está relacionado com a obtenção de renda

e proventos de qualquer natureza, conforme competência constitucionalmente atribuída à

União. Contudo, a definição precisa do “verbo mais complemento” relativo a este imposto

advém da análise do disposto na lei complementar à Constituição – tomando-se por premissa,

obviamente, que ela somente será válida se estiver coerente com o texto constitucional.

A lei complementar a que se refere é o Código Tributário Nacional (Lei nº

5.172/66), que foi formalmente editada como lei ordinária, sob a égide de ordenamento

constitucional anterior, mas recepcionada pela Constituição Federal de 1988 com status de lei

complementar.

O artigo 43, com redação ajustada pela Lei Complementar nº 104, de 10 de

janeiro de 2001, desse diploma estatui:

“Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica: I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos; II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior. § 1º A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. § 2º Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo.”

Na linha do que foi exposto anteriormente, ao definir o “fato gerador” do

imposto de renda, a lei determina, além do aspecto material, outros elementos da hipótese de

incidência tributária, os quais serão analisados separadamente. O que importa, neste

momento, é precisar o comportamento tributável.

A este respeito, o artigo supratranscrito contém a dicção de que o

comportamento passível de tributação é adquirir renda, assim entendido o produto do capital,

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do trabalho ou da combinação de ambos, e/ou proventos de qualquer natureza, assim

entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no conceito de renda. Tem-se aí o

verbo (adquirir) e o seu complemento (renda... e/ou proventos de qualquer natureza...), a

descrição do critério material do imposto.

Não basta, porém, a menção das locuções contidas na prescrição normativa.

É preciso entendê-las, dissecando o que se pode compreender por materialidade desse tributo.

Neste sentido, não oferece maiores dificuldades o conteúdo semântico do

termo “adquirir”. Adquirir é alcançar, conseguir, obter. A substituir o verbo adquirir, vem

sendo bastante usado na doutrina o verbo auferir, que significa colher, obter, receber134.135

Já as definições de renda e de proventos de qualquer natureza merecem

maior atenção.136

Para este exame, é preciso se ter em mente as delimitações já contidas

implicitamente na Constituição a respeito da extensão que essas expressões podem conter,

para fins de incidência do imposto federal. Com isso, somente a partir desses limites

constitucionais é que se definirá o núcleo da materialidade do referido tributo.

Ao conceituar renda, o Código Tributário Nacional remete-se a três

elementos: (i) produto do capital, (ii) produto do trabalho ou (iii) produto da combinação de

capital e trabalho.

O produto do capital é tudo aquilo que resulta da aplicação de bens,

materiais ou imateriais, móveis ou imóveis, permanentes ou não, em razão da sua aplicação,

investimento ou disponibilização. Estão aí incluídos os juros, os aluguéis, os rendimentos e os

ganhos de aplicações financeiras.

Já o produto do trabalho é o que resta do exercício de atividade de prestação

de serviços, com ou sem vínculo empregatício, regular ou esporádico, em caráter público ou

privado. Neste contexto, situam-se os salários, as gratificações, as remunerações de prestação

de serviços, os vencimentos.

134 Significados extraídos do Michaelis Moderno Dicionário de Língua Portuguesa, cit. 135 Neste sentido, José Artur Lima Gonçalves entende que o verbo auferir é “inquestionavelmente aceito como o mais adequado à hipótese” (apud Paulo Ayres Barreto, “Imposto de Renda – Pessoa Jurídica”, cit. p. 773).

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O produto da combinação de capital e trabalho, como se extrai das

definições anteriores, é aquilo que é fruto da conjunção da aplicação de bens e do exercício de

atividade de prestação de serviços. É, por exemplo, o produto da venda de plantações,

rebanhos, o lucro da atividade econômica de produção, ou ainda o que se recebe por obras de

arte ou literárias (pois nelas não está embutido apenas o serviço que as concretizam, mas

também a propriedade imaterial que lhes é inerente).

Assim, renda, para fins de interpretação do artigo 43, I, do Código,

compreende todo o universo dos resultados acima mencionados. Resultados esses que, por

limitação constitucional, somente estão alcançados pela tributação se positivos e líquidos.

Interessante notar que um dos elementos dessa definição de renda corrobora

o que antes foi exposto acerca da necessidade de a renda representar riqueza nova, para que

possa ser alcançada pela incidência do imposto de renda. O inciso I do artigo acima transcrito

destaca que a renda será o produto do capital. Ora, se os resultados positivos já acumulados

(independentemente de terem sido tributados ou não – isto é, de terem ou não correspondido

ao conceito de renda) compõem o patrimônio do indivíduo, são parte do seu capital, e,

portanto, somente são atingidos pela incidência sobre aquilo que os ultrapassar, o que os

acrescer.

Ademais, quando se trata do produto do capital, claramente afasta a

possibilidade de se pretender tributar a reposição patrimonial, e toda forma de indenização ou

reembolso (como também a correção monetária). Isso porque, sendo uma recomposição do

próprio capital (ainda que imaterial), a reposição não pode ser resultado, e, com isso, não

corresponde a produto.

No tocante aos proventos de qualquer natureza, o conceito dado pelo artigo

43, II, do Código Tributário Nacional é mais amplo: todos os acréscimos patrimoniais que não

sejam considerados como renda.

Trata-se, portanto, de tudo o quanto acresce o patrimônio do indivíduo, sem

que ele tenha aplicado capital, nem trabalho. Estão contemplados, nesta espécie, os prêmios

de loterias e sorteios, as riquezas naturais, extraídas, por exemplo, de minas (que não

136 Afasta-se a análise dos termos “receita” e “rendimento”, presentes no parágrafo 2º do artigo 43, visto que, inseridos no contexto do mesmo dispositivo legal que o que define a renda e os proventos de qualquer natureza como elementos materiais de incidência do imposto, estão por estes abrangidos.

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representem remuneração do trabalho), e, a princípio até mesmo as heranças e as doações137 e

a valorização patrimonial (de moeda, bens móveis ou imóveis)138.

Também está abraçado pelo termo “proventos” as aposentadorias e os

benefícios previdenciários recebidos pela pessoa física, quer seja da previdência estatal ou da

previdência privada. Isto porque tais valores não decorrem diretamente da aplicação do capital

(pois não é extraído da aplicação de bens, exclusivamente), tampouco do trabalho (mas

justamente da inatividade laboral do beneficiário – pressuposto usual para concessão de

aposentadoria).

Importa esclarecer que o inciso II do artigo 43 trata de outros acréscimos

patrimoniais não contemplados no conceito de renda. Isto quer dizer que tanto a renda quanto

os proventos estão dirigidos ao que acresce o patrimônio139, não podendo jamais abranger o

que decresce o patrimônio (do contrário, estar-se-ia diante de um imposto sobre ingressos ou

sobre receitas, e não sobre a renda). Assim, claro está, mais uma vez, que não pode o imposto

de renda, já pela redação constitucional, mas adicionalmente também por uma limitação da lei

complementar, alcançar parcela que corresponda a diminuição de patrimônio. Isso reforça a

idéia de que somente os resultados positivos líquidos estão alcançados pelo imposto.

4.1.2 Critério Espacial

Geraldo Ataliba ensina que “designa-se aspecto espacial a indicação de

circunstâncias de lugar, contidas explícita ou implicitamente na h.i. [hipótese de incidência],

relevantes para a configuração do fato imponível” 140. E assevera que “um determinado fato,

ainda que revista todos os caracteres previstos na h.i., se não se der em lugar nela previsto

137 Estas somente não estão sujeitas à tributação em razão da sua materialidade guardar íntima relação com a materialidade do imposto sobre transmissão causa mortis e doação, de competência dos Estados. 138 Neste caso, a incidência do imposto de renda somente não poderá acontecer porque a mera valorização não está inserida no critério temporal da regra-matriz de incidência, que, como será descrito, corresponde à disponibilidade jurídica ou econômica da renda e dos proventos. 139 Daí a afirmação de Luciano Amaro de que “para o CTN, ‘acréscimo patrimonial’ é gênero de que ‘renda’ e ‘proventos’ seriam espécies”. (“Imposto de Renda: Regime Jurídico” in “Curso de Direito Tributário”, coord. Ives Gandra da Silva Martins, 8ª edição, Saraiva, São Paulo, 2001, p. 281). 140 Op. cit. p. 104.

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implícita ou explicitamente, não será imponível (...) não determinará o nascimento de

nenhuma obrigação tributária”141.

Com efeito, a identificação do espaço geográfico em que o comportamento,

se realizado, pode dar ensejo à incidência do tributo é de suma importância para a análise do

fato que faz nascer o vínculo implicacional concretamente.

O espaço geográfico referido corresponde ao local físico em que a lei reputa

consumado o comportamento que corresponde à materialidade do tributo. Pode ser o

estabelecimento, depósito, sucursal, filial etc., ou simplesmente qualquer lugar dentro dos

limites espaciais explícitos ou implícitos na norma142.

A este respeito, Paulo de Barros Carvalho enumera três possibilidades para

definição do espaço de ocorrência do fato tributável: (i) determinado local para ocorrência do

fato típico; (ii) áreas específicas, de tal sorte que o acontecimento apenas ocorrerá se dentro

delas geograficamente contido; (iii) genérico, em que todo e qualquer fato, que suceda sob o

manto da vigência territorial da lei instituidora, estará apto a desencadear seus efeitos

peculiares.143

Partindo-se dessas alternativas, parece ser mais adequada a opinião de que o

imposto de renda está inserido na terceira hipótese, ou seja, que o seu critério espacial é

genérico, podendo o tributo alcançar toda a aquisição de renda ocorrida no local de vigência

da lei federal, isto é, o território nacional.

Diante dessa verificação, a primeira impressão é a de que somente é

tributável pelo imposto de renda a renda ou os proventos pagos por fontes localizadas no

Brasil. Essa idéia, porém, está equivocada, pois, ao se definir que o critério material da regra-

matriz deste imposto é a “adquirir (ou auferir) renda”, extrai-se a conclusão de que o que

importa é o local é no qual a renda é auferida, e não onde é paga. Essa distinção é suma

importância, no que se refere ao imposto de renda, para que se determine qual o alcance do

imposto.

Considerando-se do local em que a renda é auferida, é possível verificar que

a hipótese da regra-matriz do imposto de renda abrange toda a renda adquirida no território

141 Op. cit. p. 105. 142 Neste sentido, Geraldo Ataliba, op. cit. p. 106. 143 “Curso de Direito Tributário”, cit. p. 262.

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nacional, independentemente da localização de sua fonte pagadora. Assim, residentes no

Brasil têm sua renda aqui tributada, independentemente de ela ser proveniente de fonte

localizada além das fronteiras geográficas do País.

Daí advém o esclarecimento contido no parágrafo 1º, do artigo 43, do

Código Tributário, no sentido de que a incidência do imposto independe da localização,

condição jurídica ou nacionalidade da fonte.

Importa verificar que, além de se tomar que toda a renda auferida no

território por residentes no Brasil, independentemente do local em que se situa a fonte

pagadora, o critério espacial voltado para o território nacional também implica a tributação de

residentes no exterior, sobre a renda aqui produzida.

Essa evolução da territorialidade simples para a territorialidade voltada para

a pessoalidade justifica-se pela necessidade atual de preservação da identidade soberana dos

países e manutenção das suas fontes de arrecadação, diante do cenário de globalização em que

se vive.

E é por este motivo que importantes estudiosos da tributação internacional

apontam para o desenvolvimento de critérios de conexão com base em elementos como a

localização da fonte de produção da renda e da residência, além da territorialidade da fonte

pagadora simplesmente. A exemplificar, vale citar a crítica de Alberto Xavier:

“Ora, continuar a falar-se de um princípio da territorialidade, quando os critérios de ligação ao território não são já reais, mas pessoais, significa pelo menos uma radical alteração no sentido tradicionalmente conferido ao conceito e, indubitavelmente, uma quebra do seu valor dogmático”. 144

Especificamente no caso brasileiro, Paulo Ayres Barreto afirma que a

Constituição Federal não impõe limites para fixação da instituição do imposto de renda, sendo

que a identificação do limite espacial da regra matriz de incidência passa a ser a própria

soberania tributária do Estado brasileiro. “Nesse contexto”, afirma o autor, “pode o legislador

ordinário(...) optar por restringir a imposição tributária sobre as fontes produtoras de renda

localizadas no território nacional ou adotar o princípio da universalidade, por meio do qual

144 “Direito Tributário Internacional do Brasil”, 6ª edição, Forense, Rio de Janeiro, 2004, p. 29.

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são passíveis de tributação tanto a renda auferida nos lindes do território nacional, como a

renda auferida fora de seus limites”.145

A inexistência de impedimento, melhor dizendo, a existência de autorização

constitucional para se tributar pelo imposto de renda a renda e os proventos adquiridos de

fontes situadas no Brasil ou no exterior, por residentes no Brasil, e de fonte situadas no Brasil,

por residentes no exterior, decorre do princípio da universalidade, consagrado no já

comentado parágrafo 2º, do artigo 153, da Constituição Federal.

Assim, é possível afirmar que o comportamento de auferir renda, quando

ocorrido dentro do espaço geográfico que corresponde ao território nacional, desencadeia a

incidência do imposto – partindo-se da premissa de que tenham sido verificados os demais

aspectos de incidência –, sendo considerada ocorrida dentro do território nacional a aquisição

de renda por pessoa localizada no Brasil e/ou por fonte pagadora/produtora aqui localizada.

4.1.3 Critério Temporal

O estudo do critério temporal da regra-matriz de incidência tributária está

direcionado ao exame do momento preciso em que se considera realizado o comportamento

que dá ensejo à obrigação tributária.

Alguns referem-se a este elemento como o próprio fato gerador, pois é ele

que define quando se dá a incidência do tributo. O próprio Código Tributário Nacional utiliza-

se dessa referência.146 Contudo, por ser o fato jurídico tributável o produto da reunião de

vários elementos dentre os quais está o marco temporal, essa confusão não deve prosperar.

Quando se analisa o exato instante em que acontece o comportamento

tributável, não se faz referência ao seu acontecimento físico, mas àquele que é atribuído por

lei como concretamente realizado. É claro que o momento atribuído por lei deve guardar

145 Op. cit. p. 779. 146 Cita-se, como exemplo, os artigos 19 e 23: “Art. 19. O imposto, de competência da União, sobre a importação de produtos estrangeiros tem como fato gerador a entrada destes no território nacional. (...)

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algum vínculo com a realização física do comportamento passível de exação, mas não precisa

ser exatamente coincidente. Esse vínculo, ao menos mínimo, é necessário, pois evita que se

pretenda tributar algo que ainda não aconteceu, por presunção.

A importância da definição do momento em que é desencadeado o vínculo

implicacional da incidência reflete-se não apenas na determinação de quando o sujeito passa a

estar obrigado a recolher determinada quantia aos cofres públicos, mas também gera efeitos

da aplicação de outros institutos, conforme destaca Mary Elbe Queiroz:

“A importância de se detectar, com precisão, o efetivo momento de ocorrência do fato gerador é de extrema relevância, sendo imprescindível e essencial a sua fixação por ter influência sobre: i) o respeito e atendimento aos princípios constitucionais da anterioridade e da irretroatividade aplicáveis aos tributos; ii) o lançamento, independentemente da época em que for efetuado, de conformidade com o art. 144 do CTN, deverá reportar-se, sempre, à data de ocorrência do fato gerador, devendo-se reger pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada; iii) demarcação do prazo decadencial do direito de a Fazenda Pública lançar, isto é, no que se refere à contagem do início do prazo de que dispõe o Fisco para exercer o seu dever-poder de constituir o crédito tributário, com vista a aferir a ocorrência, ou não, do fato gerador e garantir esse crédito, que é um bem público indisponível” 147

Para o imposto de renda, o caput do artigo 43 do Código Tributário expressa

sua incidência sobre a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda e de

proventos de qualquer natureza. Mais adiante, no parágrafo 2º, o mesmo artigo determina que,

na hipótese de renda auferida de fonte pagadora localizada no exterior, “a lei estabelecerá as

condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do

imposto referido neste artigo”.

Observe-se que, pela referida Lei Complementar, o que define o momento

da incidência do imposto de renda é a sua disponibilidade econômica ou jurídica. A dicção do

parágrafo 2º é inócua neste sentido, pois não altera a definição do critério do imposto, e

menciona que a lei ordinária deverá definir quando se considerará disponível a renda, quando

auferida de fonte estrangeira, o que, invariavelmente, também ocorre com a renda auferida de

fonte localizada no País.

Art. 23. O imposto, de competência da União, sobre a exportação, para o estrangeiro, de produtos nacionais ou nacionalizados tem como fato gerador a saída destes do território nacional.” 147 Op. cit. p. 462.

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Resta verificar, portanto, o que é disponibilidade econômica e o que é

disponibilidade jurídica de renda.

Fortunato Bassani Campos destaca que a disponibilidade “é a qualidade

daquele ou daquilo que está disponível; é também usado como sinônimo de livre,

desembaraçado, desimpedido, daquilo que se pode negociar e transferir livremente para

outrem” 148. A disponibilidade econômica seria caracterizada pela renda percebida no regime

financeiro (cash basis), enquanto que a disponibilidade jurídica seria a renda produzida, mas

não percebida, representativa de um crédito exigível, reconhecida sob o regime de

competência (accrual basis).

Hugo de Brito Machado, a esse respeito, assevera:

“Referindo-se o CTN à aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica, quer dizer que a renda, ou os proventos , podem ser os que foram pagos ou simplesmente creditados. A disponibilidade econômica decorre do recebimento do valor que se vem a acrescentar ao patrimônio do contribuinte. Já a disponibilidade jurídica decorre do simples crédito desse valor, do qual o contribuinte passa a juridicamente dispor, embora este não lhe esteja ainda nas mãos.” 149

Com isso, vê-se que não é apenas o efetivo recebimento da renda (em

dinheiro, por assim dizer), que faz nascer um vínculo obrigacional tributário. Qualquer efeito

que torne a renda desimpedida para uso do seu titular caracteriza tal renda como “auferida”

para fins de incidência do imposto federal.

Havendo disponibilidade econômica, a disponibilidade jurídica está

implicitamente presente. Portanto, o imposto de renda é devido quando, no mínimo, há

disponibilidade jurídica da renda. É neste sentido que, comenta Ives Gandra da Silva Martins,

indicando haver verdadeira coincidência entre os conceitos de disponibilidade jurídica e de

disponibilidade econômica:

“Toda aquisição de disponibilidade econômica é, necessariamente, jurídica. Se não fosse, estaria fora da legalidade. Não há aquisição de disponibilidade injurídica. E toda a aquisição de disponibilidade jurídica é necessariamente econômica, vale dizer, sua materialidade deve decorrer do produto do capital, do trabalho, de ambos ou de acréscimos patrimoniais não decorrentes do trabalho ou do capital.” 150

148 “Imposto de Renda: Pessoas Jurídicas”, in “Curso de Direito Tributário”, coord. Ives Gandra da Silva Martins, Saraiva, 8ª edição, 2001, p. 292. 149 “Curso de Direito Tributário”, cit. p. 290. 150 “A Hipótese de Imposição sobre a Renda”, Revista Dialética de Direito Tributário nº 2, nov/1995, p. 40.

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106

Neste tocante, interessa observar que se trata de verificar se a renda está

livre, e, portanto, que sobre a sua entrega não paira condição suspensiva. A este respeito, o

artigo 117 do Código Tributário brasileiro, dispõe que é considerado devido o tributo desde o

momento da realização do fato tributável, ainda que sobre ele plane condição resolutória, ou,

no caso de condição suspensiva, desde o momento em que ela se concretize151. Estando a

renda disponível, poderá ela sujeitar-se à incidência do imposto.

À primeira vista, o artigo 43 do Código deixa a impressão de que a todo

momento em que se pagar ou creditar renda e proventos, pode ser efetivada a cobrança do

imposto de renda. Não é esta a conclusão adequada.

O aspecto material é adquirir renda ou proventos de qualquer natureza, e

tanto renda quanto proventos, conforme antes comentado, são resultados positivos líquidos,

isto é, resultados positivos após a dedução de despesas e outros decréscimos de patrimônio.

Ora, sendo assim, quando um rendimento qualquer é percebido, não é ainda passível de

tributação, pois ainda não está líquido. Por isso, é necessário que a lei fixe um período

mínimo para definição da disponibilidade da renda, a fim de que seja possível torná-la líquida.

Luciano Amaro explica:

“O período de formação da renda tributável não pode ser muito curto, sob pena de prejudicar a personalização do tributo e a adequação à capacidade contributiva: o indivíduo que, episodicamente, tem um rendimento elevado não possui a mesma capacidade contributiva de outro indivíduo que perceba, consistentemente, renda elevada. Feita a apuração após o período mais longo, esses efeitos de pico de renda tendem a ser neutralizados. Por outro lado, o período também não pode ser muito longo, o que comprometeria o fluxo de receita tributária do Tesouro. O período que foi tradicionalmente estabelecido no Direito brasileiro, em como na legislação de outros países, é de um ano (...). Ao término de cada um desses períodos, faz-se um ‘corte’ nas atividades do contribuinte, para que se apure o acréscimo líquido do patrimônio (que, com alguns ajustes, fornece a base de cálculo do tributo).” 152

151 “Art. 117. Para os efeitos do inciso II do artigo anterior e salvo disposição de lei em contrário, os atos ou negócios jurídicos condicionais reputam-se perfeitos e acabados: I - sendo suspensiva a condição, desde o momento de seu implemento; II - sendo resolutória a condição, desde o momento da prática do ato ou da celebração do negócio.” 152 “Imposto de Renda: Regime Jurídico”, cit. p. 285.

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107

Para as pessoas físicas, esse período corresponde a um ano civil, encerrando-

se em 31 de dezembro153, e, para as pessoas jurídicas, o período pode ser coincidente com este

ou trimestral, encerrando-se em 31 de março, 30 de junho, 30 de setembro e 31 de dezembro

de cada ano civil. Este é o intervalo de tempo que a lei julga suficiente para apurar a renda

líquida do sujeito que dela for beneficiário.

A rigor, somente após a data final de encerramento destes períodos é que o

imposto pode ser considerado como devido, e, então, deve ser recolhido ao Tesouro Nacional.

A lei tributária, porém, determina a realização de algumas “antecipações“, durante o ano civil,

antes mesmo de se concluir o intervalo temporal de apuração da disponibilidade de renda.

No âmbito da tributação das pessoas físicas, essas “antecipações”

correspondem a: (i) retenção na fonte com base na tabela de alíquotas e bases progressivas,

sobre os rendimentos recebidos de pessoas jurídicas, exceto se decorrentes de aplicações

financeiras, (ii) retenção na fonte com base em alíquotas fixas, sobre os rendimentos

decorrentes de aplicações financeiras de renda fixa154; (iii) recolhimento mensal obrigatório

(popularmente conhecido como “carnê-leão”), calculado sobre a tabela de alíquotas e bases

progressivas, sobre os rendimentos recebidos de pessoas físicas ou do exterior; (iv)

recolhimento com base em alíquotas fixas, sobre ganhos de capital na alienação de bens e

direitos e sobre os ganhos apurados em aplicações financeiras de renda variável.155

Vale esclarecer que o termo “antecipações” é usado com certa

impropriedade, uma vez que apenas as incidências descritas em (i) e (iii) são compensáveis

com o imposto de renda devido ao final de cada período de apuração do imposto de renda

(ano civil). As incidências previstas em (ii) e (iv) são tidas como “exclusivas” ou de

tributação “definitiva”, e, portanto, não são objeto de compensação quando da apuração do

imposto efetivamente devido pelo sujeito passivo, ao final do período de apuração.

Apesar de a tributação definitiva parecer a mais incoerente sob a perspectiva

constitucional do conceito de renda e a que mais afronta à hipótese de incidência traçada pelo

153 Neste sentido, Paulo Ayres Barreto (“Imposto sobre a Renda – Pessoa Jurídica”, cit. p. 777) e Mary Elbe Queiroz (“Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza – Tributação das Pessoas Físicas”, cit. 463). 154 Alguns rendimentos decorrentes de aplicações financeiras estão sujeitos a alíquotas progressivas, mas não em função da renda, e sim em razão do prazo de investimento financeiro. 155 Os rendimentos e ganhos referidos neste parágrafo são aqueles sobre os quais, geralmente, a antecipação do imposto é cobrada, o que não implica afirmar que os demais rendimentos e ganhos auferidos pela pessoa física não estarão sujeitos à tributação por antecipação; os que não estão mencionados expressamente em uma dessas categorias podem estar abrangidos por uma delas, se a legislação assim definir.

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artigo 43 do Código Tributário Nacional, visto que não apenas tributa o ingresso de recursos

(ou “renda” bruta), mas também desrespeita o aspecto temporal da incidência –

disponibilidade da renda, assim considerada findo o período do ano civil –, não se pode deixar

de apontar para a manifesta inadequação da antecipação do imposto mediante os

procedimentos de retenção na fonte com base na tabela progressiva ou de recolhimento

mensal obrigatório. Nestes casos, também se está tributando o ingresso de recursos, a receita,

sem se verificar qual parcela efetivamente é resultado positivo líquido.

Se a lei permite a antecipação do imposto sobre o resultado bruto percebido

pelo sujeito, o procedimento de ajuste, ao final do exercício, portanto, haveria de contemplar

ao menos um crédito de imposto devidamente corrigido monetariamente, e não apenas o seu

valor nominal à época em que foi recebido.

A evitar tais questionamentos, a legislação autoriza que parte das deduções

permitidas pela legislação, e que servem de abatimento do resultado bruto, para fins de

apuração da base tributável pelo imposto ao final de cada ano-calendário, possa ser

descontado sobre a apuração do imposto nas modalidades (i) e (iii) anteriormente referidas,

isto é, nos casos em que o imposto “antecipado” é abatido ao final do período de apuração.

Nos demais casos – itens (ii) e (iv) –, a lei ordinária não permite a dedução de qualquer

despesa, nem quando da sua incidência “antecipada”, nem quando do cálculo do montante

efetivamente devido no ano.

Em qualquer dos casos, tem-se que é nitidamente imprópria a definição de

tributação a título de antecipação do imposto, posto que o critério temporal da regra-matriz de

incidência do imposto de renda devido pelas pessoas físicas corresponde ao período que se

encerra em 31 de dezembro de cada ano. Assim, o imposto em questão somente pode ser

exigido a partir de então.

4.2 O Conseqüente da Norma Tributária

Formada a hipótese, isto é, o antecedente da estrutura-padrão de incidência

do imposto de renda, passa-se, neste momento, à pesquisa sobre o conteúdo do conseqüente

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deste enunciado normativo. Ele contém, conforme antes descrito, a prescrição da conduta,

fornecendo os critérios para identificação do vínculo jurídico que resulta da prática do

comportamento e fato antes descritos, na hipótese.

O conseqüente indica quem são os sujeitos da relação tributária

(hipoteticamente considerada, posto que ela somente se forma com a concretização do fato

tributável) e qual o objeto da prestação da obrigação, quando surgir (definição do valor a ser

pago). Esta análise, portanto, resulta na definição do retrato da relação obrigacional tributária:

credor, devedor e prestação.

4.2.1 Critério Pessoal

Como em qualquer relação jurídica obrigacional, o credor é o sujeito que

detém o direito subjetivo de exigir de outrem uma determinada prestação. Em se tratando de

direito tributário, esse credor recebe o nome de sujeito ativo, e é, a rigor, um dos entes da

federação – posto que somente esses receberam competência para instituição de tributos.

Contudo, é possível que uma pessoa jurídica que seja parte da

Administração Pública, figure como sujeito ativo tributário, caso receba do ente competente

para instituição do tributo a atribuição para cobrá-lo, controlá-lo e fiscalizá-lo. Paulo de

Barros Carvalho156 e Hugo de Brito Machado157 afirmam que esse terceiro que receber tais

funções não precisa ser necessariamente uma pessoa jurídica pública, pode ser privada e até

mesmo pessoa física. Em qualquer desses casos, a atribuição conferida não se estende à

instituição do tributo, pois que esta é privativa dos entes que possuam Poder Legislativo, a

atender o princípio da estrita legalidade.

As situações em que há a nomeação de um terceiro para figurar como titular

de determinado tributo são denominadas pelo termo “parafiscalidade”158.

156 “Curso de Direito Tributário”, cit. p. 301. 157 “Curso de Direito Tributário”, cit. p. 133. 158 Roque Antonio Carrazza conceitua: “Juridicamente, a parafiscalidade é apenas a atribuição, mediante lei, da capacidade tributária ativa que a pessoa política faz a outra pessoa (pública ou privada), que, por vontade desta mesma lei, passa a dispor do produto arrecadado, para a consecução de suas finalidades.” (“Curso de Direito Constitucional tributário”, cit., p. 221).

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No caso do imposto de renda, o artigo 153, III, da Constituição atribui à

União a competência tributária, não tendo esta atribuído função de exercer a capacidade

tributária ativa a nenhuma outra pessoa. Assim, é ela própria que figura no espaço reservado

ao credor da prestação tributária.

No tocante ao devedor da obrigação tributária, isto é, o sujeito passivo de

quem o sujeito ativo pode exigir o tributo, normalmente tem-se aquele que está ligado à

materialidade do tributo, conforme destaca José Eduardo Soares de Melo:

“Numa fase pré-jurídica, o legislador colhe a pessoa intimamente vinculada à realização da materialidade, que deve traduzir-se no mero índice de capacidade contributiva. A íntima conexão da pessoa com a materialidade é que tem a virtude de revelar a figura do contribuinte, porque, ao realizar o fato imponível, terá que recolher aos cofres públicos uma parte da respectiva grandeza econômica, qualificada como tributo.” 159

A definição do sujeito passivo é feita pela lei que institui o tributo, apesar de

a Constituição Federal já conter uma previsão do sujeito passivo possível, conforme

anteriormente já se tratou quando da análise do perfil constitucional do imposto de renda.

Neste sentido, o sujeito passivo possível do imposto de renda é aquele que venha a auferir

renda e proventos de qualquer natureza.

O artigo 45 do Código Tributário Nacional, ao determinar o desenho da

hipótese de incidência do imposto em questão, aponta expressamente as pessoas que devem

constar da posição de sujeito passivo da relação jurídico-tributária:

“Art. 45. Contribuinte do imposto é o titular da disponibilidade a que se refere o artigo 43, sem prejuízo de atribuir a lei essa condição ao possuidor, a qualquer título, dos bens produtores de renda ou dos proventos tributáveis. Parágrafo único. A lei pode atribuir à fonte pagadora da renda ou dos proventos tributáveis a condição de responsável pelo imposto cuja retenção e recolhimento lhe caibam.”

Note-se que o caput do artigo trata da figura do contribuinte, como sendo,

em regra, o titular da disponibilidade da renda e dos proventos de qualquer natureza, enquanto

que o parágrafo único define o responsável tributário, como sendo a fonte pagadora da renda

ou dos proventos.

159 “Curso de Direito Tributário”, cit. p. 229.

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Assim, ressalvados os casos de imunidades, estão inseridos no campo

passível de tributação pelo imposto de renda todas as pessoas físicas ou jurídicas, privadas ou

públicas, nacionais ou estrangeiras, residentes no Brasil ou no exterior, que adquiram

disponibilidade de renda ou proventos de qualquer natureza, no território nacional.

Apesar de o teor do artigo supratranscrito contemplar a possibilidade de o

contribuinte não ser aquele que dispuser da renda, mas aquele a quem a lei atribuir uma

equiparação, há o entendimento de que essa hipótese não pode se configurar, em razão da

obrigatoriedade da aplicação do princípio da capacidade contributiva.

Geraldo Ataliba, nesta esteira, ensina:

“Nos impostos, o sujeito passivo é alguém de alguma forma relacionado com o fato posto como aspecto material da hipótese de incidência, de modo que se infira ser o titular da capacidade contributiva”. 160

Isto vale tanto para o contribuinte quanto para o responsável tributário

(posto que ambos compõem o papel de sujeitos passivos – um direta, e ou outro,

indiretamente).

Ocorre, porém, que, no tocante à responsabilidade pela retenção e

recolhimento do imposto, a capacidade econômica dificilmente é aferida. Isto se deve, explica

Aliomar Baleeiro, pelo fato de que “a técnica da retenção necessita de homogeneizar, ao

máximo tolerável, situações individuais diversas, reduzindo-as a poucos tipos ou categorias

estandardizadas” 161.

Com efeito, as hipóteses de retenção na fonte previstas na legislação vigente

quando muito prevêem a aplicação da progressividade de alíquotas e suas bases de cálculo;

não consideram as demais condições pessoais do contribuinte sobre cuja renda o imposto é

retido (tais como gastos com a sua subsistência, ou ao menos, despesas dedutíveis).

As pessoas que recebem o dever de responsáveis tributários pela retenção do

imposto de renda são, em geral, pessoas jurídicas; tanto para pagamentos realizados entre si,

como para aqueles feitos em favor de pessoas físicas. Nada impede – senão a vontade política

– que se atribua a pessoas físicas essa função, apesar de não parecer razoável essa

160 “Hipótese de Incidência Tributária”, cit. p. 88.

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possibilidade visto que uma das funções da retenção é justamente a de otimizar a fiscalização

e o controle da arrecadação do tributo – e sendo as pessoas jurídicas em número notadamente

menor que o universo de pessoas físicas sujeitas ao imposto, a conferência da

responsabilidade tributária somente às pessoas jurídicas parece ser mais apropriada para este

fim.

Luciano Amaro aponta as razões que podem justificar a figura do

responsável tributário pela retenção e recolhimento do imposto de renda:

“Por uma série de razões (...), o imposto de renda pode (e, às vezes, deve) incidir na fonte. Casos há em que essa forma é a única viável ou possível (...). Noutras situações, a incidência na fonte visa a: a) coibir ou dificultar a sonegação (a fonte não tem o mesmo interesse em sonegar, pois, em regra, não teria proveito, mas só risco, na hipótese de deixar de reter e de recolher o tributo); b) atenuar o impacto psicológico negativo de o contribuinte ter que desembolsar os recursos já recebidos para pagar o tributo; c) estimular a adimplência, pois, se o recolhimento do tributo for em momento posterior ao da percepção dos rendimentos, o contribuinte imprevidente pode não mais dispor dos recursos para efetuar o pagamento.” 162

A incidência do imposto de renda na fonte, portanto, restaria validada nos

casos em esta seja a única forma viável ou possível de recolhimento deste tributo, como para

coibir ou dificultar a sonegação, para atenuar o impacto psicológico negativo de desembolso,

para pagamento do tributo, de recursos já recebidos e para estimular a adimplência.

4.2.2 Critério Quantitativo

Nas palavras do professor Paulo de Barros Carvalho: “É no critério

quantitativo que encontraremos referências às grandezas mediante as quais o legislador

pretendeu dimensionar o fato jurídico tributário, para efeito de definir a quantia a ser paga

pelo sujeito passivo, a título de tributo”. 163

161 “Direito Tributário Brasileiro”, cit. p. 313. 162 “Imposto de Renda: Regime Jurídico”, cit. p. 288/289. 163 “Curso de Direito Tributário”, cit., p. 285.

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Trata-se do objeto da prestação que o sujeito passivo tem a pagar ao sujeito

ativo e este, em contrapartida, tem o direito de exigir do sujeito passivo. Como o objeto desta

relação, por estar inserido no universo jurídico tributário, corresponde a uma prestação

pecuniária164, resta definir qual o montante de pecúnia a ser entregue aos cofres públicos pelo

contribuinte.

Para definição deste montante, a técnica normativa utiliza-se da combinação

de dois elementos: base de cálculo e alíquota. O critério quantitativo da regra-matriz de

incidência consiste, portanto, nos elementos que denotam a capacidade de mensuração do

aspecto material (núcleo do fato jurídico hipotético) da hipótese de incidência do tributo.

Para Geraldo Ataliba, a base de cálculo é que pode ser considerada como

“ordem de grandeza do aspecto material do tributo”165. Tal afirmação deve-se ao fato de a

base de cálculo necessariamente guardar coerência estrita com o aspecto material da hipótese

de incidência de um tributo.

A base de cálculo deve mensurar as proporções reais do fato tributável

enquanto que a alíquota atribui a definição do quantum debeatur na obrigação tributária. É ela

que delimita qual a parcela da base de cálculo deve ser separada para recolhimento aos cofres

públicos. Com a superposição da alíquota sobre a base de cálculo é que se torna possível

aferir o quantum devido pelo sujeito passivo da obrigação tributária.

Enquanto a base imponível é determinada pela sua estrita vinculação com o

aspecto material de incidência, a alíquota não encontra relação direta com tal aspecto, sendo

fixada externamente, mediante adoção dos critérios econômicos e jurídicos, pelo legislador –

tal como o princípio da capacidade contributiva.

A alíquota pode ser um valor fixo (“x” por litro, por metro) ou um

percentual. Correspondendo a um percentual, a alíquota pode ser proporcional (percentual

fixo) ou progressiva (variando conforme a base de cálculo), seguindo os critérios antes

comentados, quando se tratou do princípio da capacidade contributiva e os métodos de sua

efetivação. A progressividade de alíquotas implica, obviamente, o aumento da base de

164 Código Tributário Nacional assim define: “Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.” (destacamos) 165 “Hipótese de Incidência Tributária”, cit. p. 108.

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cálculo, o que, inversamente significa afirmar que podem ser regressivas as alíquotas,

segundo a diminuição da base de cálculo.

Em qualquer dos casos, porém a progressividade (ou regressividade) deve

estar baseada na variação da base de cálculo, assim estruturada de forma a corresponder a

uma dimensão de riqueza da materialidade do tributo.

Dito isto, importa afirmar que a base de cálculo do imposto de renda deve

invariavelmente ser uma dimensão da renda, deve ser a sua correspondência em termos

pecuniários, como bem ressalta Ricardo Mariz de Oliveira:

“No caso do imposto de renda, que necessariamente incide sobre o acréscimo patrimonial com disponibilidade econômica ou jurídica adquirida (art. 43 do CTN), é sobre o próprio fato do acréscimo patrimonial que a tributação incide, e é do próprio montante do acréscimo que o imposto deve ser apartado em favor dos cofres públicos”. 166

Em razão de tudo o quanto exposto – desde o perfil constitucional do

imposto até a definição dos critérios material, espacial e temporal da sua regra-matriz de

incidência –, tem-se que não é qualquer rendimento ou ingresso recebido pelo sujeito passivo

que poderá representar base de cálculo. Apenas a renda, assim considerado o resultado

positivo líquido disponível, auferido de fonte localizada no Brasil ou no exterior, que

implique acréscimo patrimonial.

A alíquota, por outro lado, pode ser fixada pelo legislador, sempre com

vistas à observância dos princípios da capacidade contributiva e da vedação ao confisco, antes

comentados. Ademais, como o parágrafo 2º, do artigo 153, da Constituição Federal, consagra

expressamente o princípio da progressividade, não pode a União desviar-se de sua aplicação.

Ao se verificar a aplicação, pelo legislador ordinário federal, destas

diretrizes, para definição das situações passíveis de gerar a cobrança deste imposto, porém,

depara-se com sérias irregularidades.

A maior e mais relevante delas decorre da irregular definição do aspecto

material, cuja implicação gera efeitos diretos no conseqüente da norma, especificamente o

aspecto quantitativo – base de cálculo. O legislador federal, não raramente, determina a

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incidência do imposto de renda sobre algo que não pode ser considerado como resultado

positivo líquido apurado pelo contribuinte. Na maior parte dos casos, o erro está em atribuir a

incidência do imposto sobre os rendimentos auferidos pelo contribuinte, sem levar em

consideração eventuais despesas incorridas para a apuração do rendimento.

Num primeiro momento, seria até possível dizer que tal inadequação jurídica

é temporária, na medida em que o imposto incidente sobre o rendimento auferido, será

ajustado na declaração anual do contribuinte. Porém, aí residirá o outro problema relacionado

a este ponto: o imposto antecipado poderá não ser compensável, e se o for, não atenderá

integralmente o pressuposto de corresponder a um resultado efetivamente líquido (extraídas

todos os gastos necessários à subsistência do indivíduo e da manutenção da fonte produtiva de

renda).

Será não compensável, isto é, definitivo, nas hipóteses em que o imposto for

retido na fonte em caráter exclusivo, conforme descrito anteriormente. Nestas situações, o

imposto de renda recolhido aos cofres públicos acabará por incidir sobre parcela que não pode

ser considerada como renda, por não corresponder ao montante líquido apurado – as despesas

incorridas não são computadas para abater o resultado positivo bruto (rendimento) verificado.

Em outras situações, não menos comuns, o problema não é a tributação

definitiva, mas a limitação à dedução de despesas, na declaração anual apresentada pelo

contribuinte. Nestes casos, novamente por exclusivo critério do legislador –

fundamentalmente para atender ao orçamento da União –, sem qualquer respaldo

constitucional, limitam-se quais despesas poderão abater o rendimento bruto auferido pelo

contribuinte, a fim de alcançar a renda. É o que acontece em não se considerar como

dedutíveis para fins de imposto de renda, as despesas com aluguel, com vestuário e

alimentação, e tantos outros elementos necessários à subsistência humana.

E quando se autoriza o cômputo da despesa para fins de apuração do

imposto de renda devido aos cofres públicos, a irregularidade reside na fixação de limite de

valor a ser considerado para dedução – tal como para as despesas com educação –, em

flagrante desobediência aos preceitos constitucionais anteriormente comentados.

166 “A Sujeição Passiva da Fonte Pagadora de Rendimento, quanto ao Imposto de Renda Devido na Fonte”,

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4.3 Síntese da Regra-Matriz do Imposto de Renda

Como resumo do quanto antes exposto em relação à norma-padrão de

incidência do imposto de renda, é possível afirmar que o referido tributo (i) alcança o

comportamento de se auferir renda e proventos, assim considerados os resultados positivos

líquidos que correspondam a acréscimos patrimoniais decorrentes do capital, do trabalho, de

ambos ou de outra origem; (ii) renda e proventos estes adquiridos no território nacional, tidos

como aqueles que sejam auferidos por pessoa aqui localizada, ainda que a fonte pagadora

esteja fora das fronteiras geográficas do país; (iii) sendo considerados tributáveis tais “renda e

proventos” quando disponíveis jurídica ou economicamente, ao final de cada período mínimo

(anual ou trimestral), (iv) cabendo à União o direito de exigir tal imposto de toda e qualquer

pessoa, física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, ressalvadas as situações

de imunidade, (v) sobre a base de cálculo que represente uma renda (ou provento) líquida(o)

de despesas, a partir da(o) qual se aplica alíquota fixada de forma progressiva.

Com isso, é possível notar que a hipótese de incidência do imposto de renda

– assim considerada com a abrangência dos proventos, aqui e adiante – desenhada

constitucionalmente e cujos critérios tenham sido fixados expressamente em lei complementar

vem sendo claramente desrespeitada, especialmente no que tange à definição da renda

tributável – o que acaba por causar reflexos na definição de todos os elementos que definem a

incidência do tributo, em concreto.

A exemplo disso, passar-se-á a analisar a estrutura da tributação dos valores

investidos nos planos de previdência complementar privada, a fim de identificar os seus

deslindes em relação aos contornos da regra-matriz antes comentados e a sua (in)coerência

com o perfil constitucional do tributo em questão.

Revista Dialética de Direito Tributário nº 49, out/1999, p. 93.

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Capítulo V - A Tributação dos Planos de Benefícios de Previdência Complementar

Privada pelo Imposto de Renda

5.1 Regime de Diferimento do Ônus Financeiro

Os planos de previdência privada, como visto, têm natureza peculiar. De um

lado, guardam semelhança com um instrumento de aplicação meramente financeira, pois são

regidos pelo direito privado, e formalizados, por livre iniciativa das partes, em contratos nos

quais o investidor tem ampla liberdade de contratação, inclusive para fixar índices de retorno

financeiro e o perfil de investimento dos recursos. De outro, estão intimamente relacionados

com a poupança de caráter estritamente previdenciária, na medida em que servem de

complemento à previdência estatal, garantido benefícios de aposentadoria, pecúlio, e

cobertura por invalidez, entre outras, servindo como instrumento de proteção social.

Em vista dessas características, estruturou-se no Brasil um tratamento

tributário diferenciado aos investimentos nestes planos, que possa garantir a preservação da

sua natureza jurídica, evitando que fossem descaracterizados ou usados de forma desviada ao

que se propõem.

Esse tratamento tributário está estruturado nas premissas de, primeiramente,

incentivar a adesão das pessoas ao setor, promovendo o almejado equilíbrio social decorrente

da manutenção do padrão econômico aos cidadãos mesmo com a chegada da fase de

inatividade laboral, e, de outro, assegurar que a fonte de arrecadação tributária não sofra

diminuição, sob pena de pôr em risco o interesse público subjacente que primeiramente se

procurou estimular.

Seguindo o modelo e a experiência de outros países, estabeleceu-se uma

sistemática que propaga a idéia de diferimento do ônus financeiro do imposto de renda

incidente sobre os valores recebidos dos planos de previdência complementar.

Fernando Pimentel retrata a visão do setor sobre a eficácia desse modelo

tributário nos seguintes termos:

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“Em todos os países onde os fundos de pensão foram mais longe, os impostos são cobrados unicamente sobre o valor da aposentadoria que está sendo paga, jamais incidindo sobre a poupança em formação. Não importa o nome que se dê a isso – diferimento, isenção ou imunidade – o fundamental é que o exemplo seja seguido. Nações como o Canadá, Estados Unidos, Holanda, Reino Unido e Suíça, têm guardado em seus fundos de pensão reservas próximas ou até mesmo muito superiores aos seus PIBs nacionais” 167

Essa sistemática de tributação está calcada na autorização para dedução, na

apuração da base de cálculo do imposto de renda devido, dos valores investidos em planos de

previdência privada, e, em contrapartida, quando do recebimento de recursos do plano, o

imposto de renda incide sobre o montante integral, correspondente à parcela investida somada

aos rendimentos acumulados durante o período de investimento.

Não se trata, pois, de uma renúncia fiscal, como é característica das isenções

tributárias, conforme bem assevera Marcos Antônio Simões Peres:

“(...) deve ficar claro que esse benefício fiscal não deve ser visto como uma isenção fiscal, mas simplesmente como um diferimento do imposto, visto que a renúncia fiscal do presente será paga no futuro, no momento do resgate.” 168

Tampouco se trata de isenção ou de um benefício fiscal, como será a seguir

demonstrado. O que essa sistemática pressupõe é mesmo, apenas, a postergação do ônus

tributário.

Este modelo encontra-se presente na Lei Complementar nº 109/01, que rege

o regime da previdência privada. Confira-se:

“Art. 69. As contribuições vertidas para as entidades de previdência complementar, destinadas ao custeio dos planos de benefícios de natureza previdenciária, são dedutíveis para fins de incidência de imposto sobre a renda, nos limites e nas condições fixadas em lei. (...).”

A sua justificativa consta claramente da Exposição de Motivos nº 28, de

elaboração o então Ministro da Previdência e Assistência Social, Waldeck Ornélas, e do então

Ministro da Fazenda Interino, Pedro Parente, de cujo texto se destaca:

167 “Tratamento Tributário dos Fundos de Pensão: A Busca de um Padrão Internacional”, em “A Previdência Social Reavaliada - II”, MPAS, agosto/2002, p. 73/74.

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“O regime de previdência complementar funciona basicamente como instrumento de poupança de longo prazo. Esse tipo de poupança é socialmente mais desejável do ponto de vista da promoção do desenvolvimento econômico, do que a poupança de curto prazo. Dessa forma, estabelecemos que sobre as contribuições aportadas para as entidades de previdência complementar não incide tributação, sendo o pagamento de resgate e dos respectivos benefícios sujeitos à incidência do imposto sobre a renda”.

Importa ressaltar, porém, que, apesar de ter ganhado status de

complementaridade à Constituição Federal, ao passar a ser contemplado em Lei

Complementar, o regime de “diferimento fiscal” para a previdência privada já se faz presente,

no Brasil, desde 1996.

Até o referido ano, vigorava a regra prevista na Lei nº 7.713, de 22 de

dezembro de 1988, segundo a qual os valores vertidos a planos de previdência privada, pelo

participante, sofriam a incidência do imposto de renda por ocasião do pagamento da

contribuição, realizado mediante o desconto no salário mensal da pessoa física (participante),

ajustável na apuração do Imposto sobre a Renda devido anualmente pela pessoa física, em sua

Declaração de Ajuste Anual. Assim, quando do recebimento da aposentadoria, assegurava-se

a isenção do imposto de renda sobre a parcela referente às contribuições vertidas pelo

participante169.

A partir de 1996, porém, passou a vigorar a Lei nº 9.250, de 26 de dezembro

de 1995, que estabeleceu a faculdade de dedução, para fins de incidência do imposto de renda

das pessoas físicas, das contribuições por elas vertidas aos planos de benefícios, e o

recebimento do benefício ou resgate dos recursos aplicados passou a estar sujeito, na sua

integralidade, ao imposto de renda.

Essa, porém, não foi a primeira previsão de um regime de postergação fiscal

aplicável aos planos de previdência privada, como conta Maria da Consolação Silva:

“Até 1988, com base no Decreto-Lei nº 1.642, de 7 de dezembro de 1978, as importâncias pagas ou descontadas, como contribuição, a entidades de previdência privada fechadas de que trata a Lei nº 6.435/1977, eram deduzidas na cédula ‘C’ da declaração de rendimentos da pessoa física participante. Por conseqüência, as

168 “A Evolução da Previdência Complementar Aberta”, cit. p. 35. 169 “Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: (...) VII - os benefícios recebidos de entidades de previdência privada: a) quando em decorrência de morte ou invalidez permanente do participante; b) relativamente ao valor correspondente às contribuições cujo ônus tenha sido do participante, desde que os rendimentos e ganhos de capital produzidos pelo patrimônio da entidade tenham sido tributados na fonte;”

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importâncias recebidas como benefícios pecuniários das entidades de previdência privada, a pessoas físicas participantes, eram sujeitas à tributação na cédula ‘C’ da declaração de rendimentos, sujeitos ao imposto de renda na fonte, como antecipação do que for devido na declaração, na forma estabelecida para a tributação dos rendimentos do trabalho assalariado.” 170

A estrutura prevista pela Lei nº 9.250/95 foi parecida com o modelo de

diferimento fiscal anterior, abrangendo, porém, todo o universo de planos de benefícios

(abertos e fechados), como decorrência do crescimento do regime da previdência privada até

então, verbis:

“Art. 4º. Na determinação da base de cálculo sujeita à incidência mensal do imposto de renda poderão ser deduzidas: (...) V - as contribuições para as entidades de previdência privada domiciliadas no País, cujo ônus tenha sido do contribuinte, destinadas a custear benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social; (...) Parágrafo único. A dedução permitida pelo inciso V aplica-se exclusivamente à base de cálculo relativa a rendimentos do trabalho com vínculo empregatício ou de administradores, assegurada, nos demais casos, a dedução dos valores pagos a esse título, por ocasião da apuração da base de cálculo do imposto devido no ano-calendário, conforme disposto na alínea e do inciso II do art. 8º desta Lei. (...) Art. 8º A base de cálculo do imposto devido no ano-calendário será a diferença entre as somas: I - de todos os rendimentos percebidos durante o ano-calendário, exceto os isentos, os não-tributáveis, os tributáveis exclusivamente na fonte e os sujeitos à tributação definitiva; II - das deduções relativas: (...) e) às contribuições para as entidades de previdência privada domiciliadas no País, cujo ônus tenha sido do contribuinte, destinadas a custear benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social; (...) Art. 33. Sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte e na declaração de ajuste anual os benefícios recebidos de entidade de previdência privada, bem como as importâncias correspondentes ao resgate de contribuições.”

Com isso, desde 1º de janeiro de 1996, os valores recebidos dos planos de

previdência complementar privada estão sujeitos a uma sistemática específica de tributação

pelo imposto de renda: quando do resgate de recursos mantidos em tais planos ou do

pagamento de benefícios previdenciários, incide o imposto de renda na fonte sobre a

importância total paga ao participante ou beneficiário, e não apenas sobre o resultado ou

170 “Tratamento Tributário da Entidade de Previdência Complementar e dos Planos de Benefícios”, Revista de Previdência nº 4, abril/06, p. 98.

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rendimento proporcionado pela aplicação financeira durante a fase de acumulação de recursos

no plano. Em contrapartida, as contribuições efetuadas pela pessoa física para tais planos são

dedutíveis na apuração do imposto de renda devido anualmente, acarretando, ao menos por

pretensão, a postergação da tributação dos valores aportados nos planos de previdência

complementar para o momento do efetivo recebimento dos recursos.

No mesmo ano, previu-se a dedutibilidade das contribuições efetuadas pelas

pessoas jurídicas em favor de seus empregados e dirigentes, com a finalidade de se incentivar

a participação das empresas no fomento ao sistema previdenciário nacional.

Ocorre que, dois anos depois da reformulação no regime tributário dos

investimentos em previdência privada, passou-se a estabelecer limites a estas deduções,

ocasionando distorções no modelo originalmente previsto. Da mesma forma, e igualmente

causando desajustes no almejado “diferimento fiscal”, a legislação veio a contemplar

expressamente a tributação dos rendimentos e ganhos auferidos durante o período de

acumulação dos recursos no plano de benefícios.

Tudo isto veio a contribuir para a formação do cenário atual, sobre o qual

passar-se-á a tratar mais especificamente, com vistas a identificar possíveis incongruências do

ponto de vista jurídico-constitucional do imposto de renda.

O regime tributário ora apresentado, vale destacar, aplica-se aos planos que

tenham a natureza jurídica de previdência privada, não sendo o mesmo aplicado para seguros

de vida com cobertura por sobrevivência, como os chamados “VGBL”.

Para estes, o legislador fixou o regime de tributação que não pressupõe o

diferimento fiscal. Assim, as contribuições realizadas pela pessoa física não são dedutíveis na

apuração do imposto de renda, e, em contrapartida, quando do pagamento em forma de

resgate ou “benefícios”, o imposto somente incide sobre a parcela dos rendimentos

acumulados durante a fase em que permaneceram no plano (artigo 63 da Medida Provisória nº

2.113-30, de 26 de abril de 2001).171

171 “Art. 63. Na determinação da base de cálculo do imposto de renda incidente sobre valores recebidos em decorrência de cobertura por sobrevivência em apólices de seguros de vida, poderão ser deduzidos os valores dos respectivos prêmios pagos, observada a legislação aplicável à matéria, em especial quanto à sujeição do referido rendimento às alíquotas previstas na tabela progressiva mensal e à declaração de ajuste anual da pessoa física beneficiária, bem assim a indedutibilidade do prêmio pago.

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As contribuições realizadas pela pessoa jurídica “patrocinadora” para planos

de seguro de vida desta modalidade são dedutíveis nos moldes do artigo 4º da Lei nº 11.053,

de 29 de dezembro de 2004172, desde que tais planos sejam oferecidos à totalidade dos

empregados e dirigentes da empresa.

Já em relação aos fundos de aposentadoria programada individual (“FAPI”),

apesar de terem natureza de fundo de investimento e serem operados por instituições

bancárias, o legislador federal optou por conferir-lhes o mesmo tratamento tributário aplicável

aos planos de previdência complementar, conforme se pode notar dos textos legais a seguir

mencionados.

Em qualquer dos casos – VGBL e FAPI –, porém, é preciso alertar para o

fato de que, por não corresponderem a planos de previdência complementar, os comentários

adiante tecidos podem não lhes ser aplicáveis – como, por exemplo, em relação à tributação

dos rendimentos e ganhos auferidos na aplicação financeiras das reservas técnicas dos planos

de benefícios173.

§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2002, os rendimentos auferidos no resgate de valores acumulados em provisões técnicas referentes a coberturas por sobrevivência de seguros de vida serão tributados de acordo com as alíquotas previstas na tabela progressiva mensal e incluídos na declaração de ajuste do beneficiário. § 2º A base de cálculo do imposto, nos termos do § 1º, será a diferença positiva entre o valor resgatado e o somatório dos respectivos prêmios pagos. § 3º No caso de recebimento parcelado, sob a forma de renda ou de resgate parcial, a dedução do prêmio será proporcional ao valor recebido.” 172 “Art. 4º A partir de 1º de janeiro de 2005, a dedução das contribuições da pessoa jurídica para seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência fica condicionada, cumulativamente: I - ao limite de que trata o § 2º do art. 11 da Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997, com a redação dada pela Lei nº 10.887, de 18 de junho de 2004; e II - a que o seguro seja oferecido indistintamente aos empregados e dirigentes.” A previsão original para dedutibilidade dessas contribuições constava do artigo 8º da Medida Provisória nº 2.222, de 4 de setembro de 2001, nos seguintes termos: “Art. 8º A dedução das contribuições da pessoa jurídica para os seguros de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência fica: I - condicionada à opção de que trata o art. 2º desta Medida Provisória; II - sujeita, a partir de 1o de janeiro de 2002, ao limite de que trata o § 2º do art. 11 da Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997.” 173 Os rendimentos e ganhos apurados nas aplicações dos recursos da carteira de investimentos dos VGBL e FAPI são isentos por força dos artigos 77 da Lei nº 8.981/95, 1º da Lei nº 9.065/95, 12 da Lei nº 9.249/95 e 5º da Lei nº 9.779/99 (no caso dos VGBL) e artigo 28, parágrafo 10º, da Lei nº 9.532/97 (no caso dos FAPI).

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5.1.1 Dedutibilidade das Contribuições na Apuração do Imposto de

Renda

5.1.1.1 Pessoa Física

Conforme antes transcrito, o artigo 8º da Lei nº 9.250/95 estabelece que a

base de cálculo do imposto devido no ano-calendário “será a diferença entre as somas de

todos os rendimentos percebidos durante o ano-calendário, exceto os isentos, os não-

tributáveis, os tributáveis exclusivamente na fonte e os sujeitos à tributação definitiva” e as

deduções relativas a, entre outras despesas, “contribuições para as entidades de previdência

privada domiciliadas no País, cujo ônus tenha sido do contribuinte, destinadas a custear

benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social”.174

Com isso, passou-se a autorizar (ou facultar) a pessoa física a descontar, do

montante devido a título de tributos, todo o valor destinado aos planos de previdência

complementar, os quais são, posteriormente, submetidos ao imposto de renda, quando de sua

disponibilização ao beneficiário.

Alternativamente, o desconto pode ser efetuado sobre o imposto anual,

diretamente, ou sobre o imposto devido mensalmente, desde que o valor das contribuições

seja deduzido da base de cálculo relativa a rendimentos do trabalho com vínculo empregatício

ou de administradores.

No momento do recebimento dos benefícios previdenciários, por outro lado,

o artigo 33 da Lei nº 9.250/95 impõe a incidência do imposto sobre a importância total

recebida pela pessoa física.

Partindo-se da premissa de que os valores, durante a sua acumulação no

plano de benefícios, não sofreriam tributação pelo imposto de renda175, estar-se-ia, com essa

174 O texto da norma faz menção a “benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social”, o que remete ao debate sobre o alcance desse dispositivo. A este respeito, para se evitar repetições, faz-se referência aos comentários tecidos quando do exame do caráter complementar da previdência privada (Capítulo II), em que, basicamente, se expôs o entendimento no sentido de considerar que a complementaridade da previdência privada reside, não na complementação dos benefícios mínimos de aposentadoria assegurados pela previdência estatal, mas no papel do regime de previdência privada como parte do sistema previdenciário brasileiro, a servir de complementação, e não como um regime paralelo, ao de filiação obrigatória. 175 O que será objeto de comentários ulteriores.

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sistemática, atendendo à desejada finalidade de postergar a tributação pelo imposto de renda

para o momento do recebimento dos recursos.

É de se ressaltar que a postergação ora referida há de ser considerada em seu

aspecto fiscal e não financeiro, pois se assim o for, deve-se ter em mente que a tributação

posterior pode representar perda financeira, na medida em que o principal investido é

tributado sob uma realidade econômica posterior, em que provavelmente há maior ônus

econômico do que aquele existente quando da dedutibilidade das contribuições.

Ademais, a afirmação de que se estaria diante de um efetivo diferimento

parte da premissa de que a tributação seria imposta sob os mesmos critérios vigentes quando

da dedução. Assim, a mudança de alíquotas e/ou base de cálculo do imposto no intervalo

temporal entre o momento da dedução e o do resgate ou recebimento do benefício

previdenciário pode implicar um prejuízo financeiro e fiscal.

Em todo caso, esta realidade foi alterada em 1997, sendo que, desde 01 de

janeiro de 1998, passou a vigorar o disposto no artigo 11 da Lei nº 9.532, de 10 de dezembro

de 1997, que incorporou à sistemática prevista na Lei nº 9.250/95, um limite de 12% para a

dedução das contribuições realizadas pelas pessoas físicas aos planos de previdência

privada176, sem que tenha havido, em contrapartida, uma limitação para o imposto de renda

devido sobre os resgates e benefícios.

Em outras palavras, dois anos após a instituição do regime de diferimento

fiscal, a lei alterou tal sistemática, impondo um limite para a dedução das contribuições

efetuadas pela pessoa física a plano de previdência privada, mas mantendo a incidência, sem

176 A redação original do artigo tem o seguinte teor: “Art. 11. A dedução relativa às contribuições para entidades de previdência privada, a que se refere a alínea ‘e’ do inciso II do art. 8º da Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, somada às contribuições para o Fundo de Aposentadoria Programada Individual - FAPI, a que se refere a Lei n.º 9.477, de 24 de julho de 1997, cujo ônus seja da pessoa física, fica limitada a doze por cento do total dos rendimentos computados na determinação da base de cálculo do imposto devido na declaração de rendimentos. § 1º Aos resgates efetuados pelos quotistas de Fundo de Aposentadoria Programada Individual - FAPI, aplicam-se, também, as normas de incidência do imposto de renda de que trata o art. 33 da Lei nº 9.250, de 1995. § 2º Na determinação do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido, o valor das despesas com contribuições para a previdência privada, a que se refere o inciso V do art. 13 da Lei nº 9.249, de 1995, e para os Fundos de Aposentadoria Programada Individual - FAPI, a que se refere a Lei nº 9.477, de 1997, cujo ônus seja da pessoa jurídica, não poderá exceder, em cada período de apuração, a vinte por cento do total dos salários dos empregados e da remuneração dos dirigentes da empresa, vinculados ao referido plano. § 3º O somatório das contribuições que exceder o valor a que se refere o parágrafo anterior deverá ser adicionado ao lucro líquido para efeito de determinação do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido. § 4º O disposto neste artigo não elide a observância das normas do art. 7º da Lei n° 9.477, de 1997.”

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limites, sobre a totalidade dos valores recebidos pelo plano, quando do resgate ou pagamento

dos benefícios.

Em 2001, em atendimento ao novo perfil de público dos planos de

previdência privada, notadamente aqueles operados por entidades abertas de previdência

complementar e sociedades seguradoras autorizadas, o Poder Executivo editou a Medida

Provisória nº 2.113-30, de 26 de abril de 2001, que possibilitou, pelo seu artigo 61, a dedução

das contribuições efetuadas por pessoas físicas em favor de seus dependentes, assim

relacionados na Declaração Anual do imposto de renda177, 178. Foi mantido, porém, o limite de

12% para dedução das contribuições, limite este considerado globalmente, isto é, em relação

ao valor total destinado a planos de benefícios, tanto em favor próprio, como de seus

dependentes.

O referido dispositivo legal nada mais fez que adequar a legislação ao

regime de tributação já vigente para os rendimentos recebidos pelos dependentes, os quais

devem ser somados aos rendimentos do contribuinte, para efeitos de tributação pelo imposto

de renda, quando da elaboração da Declaração Anual do imposto.

Mais recentemente, em 18 de junho de 2004, foi editada a Lei nº 10.887, que

estabeleceu mais uma limitação para tal dedutibilidade: a condição de que, para efetuar a

dedução das contribuições, a pessoa física também contribua, ao menos com o valor mínimo

estabelecido pela legislação, para o regime geral de previdência social ou para o regime

próprio de previdência social dos servidores públicos, condição esta somente dispensada, por

questões óbvias, aos participantes aposentados por um desses regimes previdenciários

estatais.

177 “Art. 61. A partir do ano-calendário de 2001, poderão ser deduzidas, observadas as condições e o limite global estabelecidos no art. 11 da Lei no 9.532, de 1997, as contribuições para planos de previdência privada e para o Fundo de Aposentadoria Programada Individual - FAPI, cujo titular ou quotista seja dependente do declarante.” 178 Instrução Normativa SRF nº 15 de 6 de fevereiro de 2001: “Art. 38. Podem ser considerados dependentes: I - o cônjuge; II - o companheiro ou a companheira, desde que haja vida em comum por mais de cinco anos, ou por período menor se da união resultou filho; III - a filha, o filho, a enteada ou o enteado, até 21 anos, ou de qualquer idade quando incapacitado física ou mentalmente para o trabalho; IV - o menor pobre, até 21 anos, que o contribuinte crie e eduque e do qual detenha a guarda judicial; V - o irmão, o neto ou o bisneto, sem arrimo dos pais, até 21 anos, desde que o contribuinte detenha a guarda judicial, ou de qualquer idade quando incapacitado física ou mentalmente para o trabalho; VI - os pais, os avós ou os bisavós, desde que não aufiram rendimentos, tributáveis ou não, superiores ao limite de isenção mensal de R$ 900,00 (novecentos reais);

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Essa alteração, como demonstrado na exposição de motivos da lei

(Exposição de Motivos MP/MPS nº 08), tem por finalidade criar uma vinculação financeira

entre o regime de previdência complementar privada e os regimes de filiação obrigatória,

seguindo uma interpretação que é equivocada179. Confira-se:

“A legislação relativa ao imposto de renda pessoa física, especialmente o art. 11 da Lei nº 9.532, de 1997, possibilita que tanto as contribuições pagas à previdência social obrigatória, quanto as vertidas aos planos de previdência privada sejam dedutíveis da base de cálculo do imposto de renda devido pela pessoa física. Contudo, não exige, para fins dessa dedução, nenhuma vinculação entre os regimes previdenciários. A parcela vertida à previdência privada pode ser deduzida, mesmo não havendo qualquer contribuição ap RGPS ou a qualquer outro regime próprio de previdência social da União, Estados ou Municípios. Essa situação não é razoável. Um dos principais atrativos da participação em fundos de previdência privada tem sido a dedução das contribuições do valor a ser pago a título e imposto de renda da pessoa física. Esse tipo de poupança deve ser estimulado, Entretanto, não há como desvincular a participação do segurado na previdência privada de sua participação nos regimes de previdência oficial. Isto porque a filiação a esses regimes é de caráter obrigatório para qualquer pessoa física que exerce atividade remunerada. É justo que somente seja concedido o incentivo fiscal da dedução aos contribuintes do regime de previdência complementar, nas modalidades aberta ou fechada, desde que seja comprovada a sua regularidade em relação à previdência de filiação obrigatória, vale dizer, desde que op sujeito, primeiramente, desincumba-se do dever constitucional de solidariedade social, fazendo-o ao verter as suas contribuições para os sistemas oficiais de previdência. Do contrário, os regimes deixam de ser complementares, tornando-se simplesmente substitutivos.”

Vale destacar que a regulamentação trazida pela Instrução Normativa da

Secretaria de Receita Federal nº 588, de 21 de dezembro de 2005, no tocante a esta condição

imposta pela Lei nº 10.887/04, deixa claro o entendimento das autoridades fiscais no sentido

de que, para realizar a dedução de contribuições a planos de previdência privada pelas pessoas

físicas em favor dos seus dependentes fiscais, é necessário que também os dependentes

contribuam para os regimes de previdência estatal, se forem maiores de 16 anos de idade.

Confira-se:

“Art. 7º As contribuições para planos de previdência complementar e para Fapi, cujo titular ou quotista seja dependente, para fins fiscais, do declarante, podem ser deduzidas desde que o declarante seja contribuinte do regime geral de previdência social ou, quando for o caso, para regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, observado o disposto no art. 6º. Parágrafo único. Na hipótese de dependente com mais de 16 anos, a dedução a que se refere o caput fica condicionada, ainda, ao recolhimento, em seu nome, de

VII - o absolutamente incapaz, do qual o contribuinte seja tutor ou curador. (...)” 179 A este respeito, vide Capítulo II, quando tratou-se do regime jurídico da previdência privada e o seu caráter complementar.

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contribuições para o regime geral de previdência social, observada a contribuição mínima, ou, quando for o caso, para regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.”

O elemento que salta aos olhos, no tocante a este dispositivo, é a fixação de

uma condição que não reflete o perfil da população brasileira – quer porque muitos dos jovens

de idade igual ou superior a 17 anos não têm emprego, estando ainda em fase de conclusão do

ensino médio, ou porque exercem atividades sem vínculo empregatício (até mesmo na

economia informal)180.

Não obstante tais críticas, tem-se hoje vigente a seguinte redação do artigo

11 da Lei nº 9.532/97:

“Art. 11. As deduções relativas às contribuições para entidades de previdência privada, a que se refere a alínea e do inciso II do art. 8o da Lei no 9.250, de 26 de dezembro de 1995, e às contribuições para o Fundo de Aposentadoria Programada Individual - Fapi, a que se refere a Lei no 9.477, de 24 de julho de 1997, cujo ônus seja da própria pessoa física, ficam condicionadas ao recolhimento, também, de contribuições para o regime geral de previdência social ou, quando for o caso, para regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, observada a contribuição mínima, e limitadas a 12% (doze por cento) do total dos rendimentos computados na determinação da base de cálculo do imposto devido na declaração de rendimentos. § 1o Aos resgates efetuados pelos quotistas de Fundo de Aposentadoria Programada Individual - Fapi aplicam-se, também, as normas de incidência do imposto de renda de que trata o art. 33 da Lei no 9.250, de 26 de dezembro de 1995. (...) § 5o Excetuam-se da condição de que trata o caput deste artigo os beneficiários de aposentadoria ou pensão concedidas por regime próprio de previdência ou pelo regime geral de previdência social.”

Assim, atualmente, a pessoa física poderá deduzir, para apuração do

imposto de renda devido no ano, as contribuições vertidas para o plano de previdência

complementar privada, desde que: (i) a contribuição seja destinada a custear benefícios em

plano de previdência próprio ou para seus dependentes fiscais; (ii) não se ultrapasse o limite

de 12% dos rendimentos tributáveis anuais; (iii) haja contribuição para o regime geral da

previdência social ou para regime próprio de previdência social dos servidores públicos

180 A realidade a que se refere está baseada na constatação de que o recolhimento de contribuição para o regime geral da previdência social está intimamente ligado ao exercício de atividade com vínculo empregatício; sendo possível, ainda que remotamente se verifique concretamente, a realização de contribuição, por estes jovens, na condição de segurado facultativo deste regime previdenciário estatal.

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(exceto aposentados por estes regimes), e, nos casos de contribuição em favor de dependentes

fiscais maiores de 16 anos, estes também contribuam para o regime previdenciário estatal.

Diante disso, algumas considerações merecem destaque.

A primeira é que nem sempre a dedução dá-se da forma descrita na

legislação supra mencionada. Isto se deve ao fato de, atualmente, a pessoa física pode apurar

o imposto de renda anual segundo duas modalidades, que se convencionou referir pelo

modelo de declaração anual do imposto: segundo uma base presumida (em que a declaração é

apresentada em modelo dito simplificado) e um base real (cuja declaração segue o modelo

dito completo).

Apurando o imposto pela base presumida, o contribuinte há de considerar,

para formação da base de cálculo do imposto de renda, a totalidade dos rendimentos e ganhos

auferidos no ano-calendário, com dedução de um percentual de 20%, que, presumivelmente,

tenha sido consumido para despesas necessárias à subsistência do indivíduo. Neste caso, não

importa se houve ou não a realização de contribuições para o plano de previdência

complementar. O percentual de 20% é descontado para formação da base tributável

independentemente de qualquer comprovação por parte do sujeito passivo.

Segundo a base real, por outro lado, parte-se da totalidade dos rendimentos e

ganhos auferidos no ano, para então serem descontadas as despesas autorizadas pela lei, nos

limites e condições legalmente fixados. Nesta hipótese, a pessoa física que tenha realizado

investimento no plano de previdência complementar, poderá descontar as contribuições

efetuadas, até o limite de 12% dos rendimentos tributáveis anuais, mas desde que também

contribua para um dos regimes da previdência estatal181.

Assim, nos casos em que a pessoa física opte pela apuração do imposto de

renda anual pelo sistema de tributação presumida182 e contribua para plano de previdência

privada, a sua dedução efetiva pode ser maior ou menor que aquela autorizada pela lei, e

ainda é possível que não haja nem mesmo satisfação da condição de contribuição ao regime

de previdência estatal. Ao passo que, se essa mesma pessoa escolher a apuração pelo regime

da tributação real, os limites e condições previstos legalmente serão aplicados.

181 Ressalvados os aposentados por um dos regimes estatais, conforme antes mencionado. 182 Lembrando-se que o que se presume, neste caso, é a despesa e não o rendimento.

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Outra observação que se faz é que o cálculo do limite de 12%, repousa sobre

os rendimentos tributáveis anuais, isto é, outros rendimentos (isentos ou tributados

exclusivamente na fonte) não são computados para determinação deste limite quantitativo,

resultando numa limitação ainda mais estreita que aquela possivelmente atribuída, se

considerados esses outros rendimentos.

Ademais, a limitação para os rendimentos tributáveis acarreta a

impossibilidade de dedução das contribuições para os planos de previdência complementar

para aqueles que não auferem rendimentos tributáveis, o que poderá ser tanto aqueles que

estão abaixo da faixa tributável (segundo a tabela progressiva do imposto de renda) quanto os

que aufiram rendimentos considerados isentos por sua natureza, tal como os lucros e

dividendos e a aposentadoria recebida do regime geral da previdência social.

Por todas estas razões, observando-se exclusivamente as condições para

dedução das contribuições para os planos de previdência complementar, pela pessoa física,

verifica-se que, por existir uma limitação para tal desconto, sem que haja tal limitação para

incidência do imposto no resgate de contribuições ou recebimento dos benefícios, não se

alcança o almejado “diferimento fiscal”.

Ademais, mesmo que se tome como exemplo um indivíduo que contribua

anualmente para o plano de previdência privada até o limite de 12% dos seus rendimentos

tributáveis, é possível, como mencionado anteriormente, que as condições impostas para

dedução das contribuições acarretem a vedação, total ou parcial, dos descontos desses valores,

da base do imposto de renda devido no respectivo ano-calendário.

5.1.1.2 Pessoa Jurídica

Quando da análise do tema da tributação dos planos de previdência

complementar privada, a primeira impressão é a de que se está tratando apenas dos reflexos

tributários relativos ao imposto de renda devido pela pessoa física. Porém, como a contratação

de um plano dessa natureza pode incluir a participação de uma pessoa jurídica na qualidade de

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patrocinadora, é preciso, também, averiguar qual o impacto das contribuições por ela feitas

em favor de seus empregados e dirigentes.

Essas contribuições, por se dirigirem ao benefício de terceiros que mantêm

vínculo empregatício com a patrocinadora, assemelham-se, à primeira vista, a uma

remuneração concedida em razão do serviço prestado. Assim sendo, em termos tributários,

haveria a incidência do imposto de renda sob a mesma sistemática aplicável aos salários e

demais remunerações decorrentes do contrato de trabalho (i.e., incidência do imposto de renda

na fonte com base de tabela progressiva).

Ocorre, porém, que, especificamente para esses valores, o artigo 6º, inciso

VIII, da Lei nº 7.713/88 previu a isenção do imposto de renda. Dessa forma, sobre as

contribuições realizadas pelas pessoas jurídicas haverá apenas a incidência do imposto de

renda para a pessoa física quando houver a efetiva disponibilidade dos recursos, na realização

de resgates ou recebimento dos benefícios previdenciários183.

Do ponto de vista da empresa patrocinadora, há de se verificar quais os

ditames legais para determinação do seu tratamento tributário.

Editada na mesma data que a Lei nº 9.250/95, que introduziu a sistemática

de diferimento fiscal ao investimento em previdência privada, a Lei nº 9.249, ao estabelecer

normas para a incidência do imposto de renda das pessoas jurídicas, assegurou a possibilidade

de dedução, na apuração do lucro real (base de cálculo do imposto de renda) e da base de

cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, das contribuições efetuadas pessoas

jurídicas aos planos de previdência complementar em favor de seus empregados e dirigentes:

“Art. 13. Para efeito de apuração do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido, são vedadas as seguintes deduções, independentemente do disposto no art. 47 da Lei nº 4.506, de 30 de novembro de 1964: (...) V - das contribuições não compulsórias, exceto as destinadas a custear seguros e planos de saúde, e benefícios complementares assemelhados aos da previdência social, instituídos em favor dos empregados e dirigentes da pessoa jurídica; (...)”

A dedução, no tocante ao imposto de renda, está autorizada apenas para as

pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real, conforme expressamente consta do texto legal.

183 “Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: (...) VIII - as contribuições pagas pelos empregadores relativas a programas de previdência privada em favor de seus empregados e dirigentes (...)”

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Aquelas tributadas pela sistemática do lucro presumido não possuem tal faculdade, visto que,

assim como referido quando se tratou da pessoa física, a base de cálculo presumida do

imposto de renda das pessoas jurídicas não admite a dedução de despesas especificamente

autorizadas na legislação.184

Ademais, interessante notar que mais uma vez a redação da lei faz referência

a “benefícios complementares assemelhados aos da previdência social”, o que, conforme

antes afirmado, ressalta a característica de complementaridade da previdência privada no

sistema previdenciário nacional, nada mais185.

Outra expressão usada pelo legislador, no artigo 13 supratranscrito é

“contribuições não compulsórias”, cujo cabimento somente é possível para os seguros e

planos de saúde, mencionados no dispositivo legal, ao lado dos planos de previdência privada.

Isto porque, conforme antes comentado, a previdência privada é marcada pela característica

da liberdade de contratação, sendo facultado às partes das relações jurídicas a ela subjacentes

(participantes, entidades de previdência e patrocinadoras) estabelecer livremente as condições

que desejarem, inclusive no tocante à periodicidade e ao valor das contribuições a serem

efetuadas. Assim sendo, em se tratando dos planos de previdência privada instituídos em

favor de empregados e dirigentes, é desnecessária a menção à não-compulsoriedade das

contribuições da patrocinadora.

Outra observação possível é a de que o texto não condiciona que as

contribuições sejam feitas em favor de todos os empregados e dirigentes da empresa para que

possam ser consideradas dedutíveis. O que está determinado legalmente é que, efetuando a

pessoa jurídica contribuições para custear benefícios de previdência complementar instituídos

em favor de empregados e dirigentes, estará assegurada a dedutibilidade. Em outras palavras,

sendo o plano de benefícios instituído para todos os empregados e dirigentes, ainda que

apenas alguns deles tenham efetuado a sua adesão, as contribuições vertidas pela

patrocinadora podem ser descontadas do imposto de renda devido no respectivo período de

apuração. Em outras palavras, a universalidade é obrigatória quanto à disponibilização do

plano previdenciário para os empregados e dirigentes da empresa; porém, a adesão individual

destes ao plano é facultativa.

184 A dedução é presumida. 185 Vide comentários à característica de complementaridade da previdência privada no Capítulo II do presente estudo.

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Ocorre que, assim como aconteceu com a dedutibilidade das contribuições

da pessoa física, o artigo 11 da Lei nº 9.532/97 estabeleceu um limite para o desconto das

contribuições realizadas pelas pessoas jurídicas em planos privados de previdência em favor

de seus empregados e dirigentes. Confira-se:

“Art. 11 (...) § 2o Na determinação do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido, o valor das despesas com contribuições para a previdência privada, a que se refere o inciso V do art. 13 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995, e para os Fundos de Aposentadoria Programada Individual - Fapi, a que se refere a Lei no 9.477, de 24 de julho de 1997, cujo ônus seja da pessoa jurídica, não poderá exceder, em cada período de apuração, a 20% (vinte por cento) do total dos salários dos empregados e da remuneração dos dirigentes da empresa, vinculados ao referido plano. § 3o O somatório das contribuições que exceder o valor a que se refere o § 2o deste artigo deverá ser adicionado ao lucro líquido para efeito de determinação do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido.”

Desde 1998, portanto, nos planos coletivos abertos ou nos planos fechados,

em que a pessoa jurídica participe como patrocinadora, o valor das despesas com

contribuições por ela efetuadas poderá ser deduzido na apuração da base de cálculo do

imposto de renda, desde que não exceda, em cada período de apuração, a 20% do total dos

salários dos empregados e da remuneração dos dirigentes da empresa, vinculados ao

referido plano.

A justificativa dada para a inclusão deste limite para dedução das

contribuições da pessoa jurídica, conforme a Exposição de Motivos nº 644, de 14 de

novembro de 1997, foi a de que seria necessário colocar uma “trava” na possibilidade de

postergação do pagamento do imposto de renda mediante a constituição de planos de

previdência no encerramento dos períodos de apuração com resgates previstos para prazos

curtos, com a única finalidade única e exclusiva de obter vantagens de natureza fiscal.

Confira-se:

“O artigo 11 trata das contribuições para a previdência privada, limitando as deduções das pessoas físicas a até doze por cento do seu rendimento bruto no período a que corresponder as contribuições. Relativamente à parcela das contribuições cujo ônus seja da pessoa jurídica instituidora, o limite estabelecido é de até o dobro do valor suportado pelos empregados e dirigentes da empresa. Referidos limites compatibilizam-se com os que atualmente são praticados pela esmagadora maioria das empresas que proporcionam este tipo de benefício a seus

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empregados e dirigentes, notadamente aquelas com participação societária do setor público. Essa medida, ao mesmo tempo que em nada prejudica o setor da previdência privada, coloca uma trava na possibilidade, hoje existente, de postergação do pagamento do imposto de renda mediante a constituição de planos de previdência no encerramento dos períodos de apuração com resgates previstos para prazos curtos, com a única finalidade única e exclusiva de obter vantagens de natureza fiscal.”

Com a introdução deste limite, o legislador não apenas restringiu a dedução

das contribuições da patrocinadora do plano com a fixação de um percentual, mas também

vinculou esse percentual à remuneração dos respectivos beneficiários.

De um lado, parece razoável ter-se limitado a dedução das contribuições

para evitar que a previdência privada pudesse ser usada como instrumento de pagamento de

salários e gratificações a seus empregados, conforme asseveram Andréa Nogueira Neves e

Fabiana Ulson Zappa:

“A dedução de tais contribuições era ilimitada até a edição da Lei nº 9.532/97, por meio da qual ficou restrita a 20% do valor dos salários dos empregados e da remuneração dos dirigentes vinculados ao plano previdenciário, o que é bastante compreensível na medida em que evita a substituição de parcelas salariais – sujeitas a pesados encargos sociais (FGTS, contribuições para a previdência social, 13º salário, férias, verbas rescisórias etc.) por contribuições a planos de previdência complementar.” 186

No mesmo sentido, Eurico Marcos Diniz de Santi e Paulo Ayres Barreto

afirmam:

“Esta é a finalidade do art. 11, §2º, da Lei nº 9.532/97, que – diante da dificuldade de se precisar os contornos e critérios de dedutibilidade das despesas com o custeio de previdência complementar (...) – estabeleceu o limite máximo de 20% da folha de salários, demarcando, por via oblíqua, o conceito de despesa necessária nesta matéria. Fixar limites assim cabe legitimamente em tais circunstâncias – se ausente a regra objetivamente, ao contribuinte sobre-restaria poder unilateral para furtar-se à incidência do IR ou mesmo reduzir artificialmente sua base de cálculo. Sendo assim, é plenamente constitucional a aplicação do limite estabelecido nesta regra às despesas ordinárias correntes com contribuições destinadas a custear seguros, planos de saúde e benefícios complementares assemelhados aos da previdência social, instituídos em favor dos empregados e dirigentes da pessoa jurídica, a partir de 1º de janeiro de 1998.” 187

186 “Dedutibilidade das Contribuições Destinadas a Planos de Previdência Complementar” cit. p. 517. 187 “Contribuições para Previdência Privada – Dedutibilidade em face do Imposto sobre a Renda – Força da EC 20/98 – Aplicabilidade da Lei 9.532/97, no Tempo”, Revista Dialética de Direito Tributário nº 93, junho/03, p. 130.

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No entanto, ao se observar essa previsão de forma sistemática, considerando

os critérios da dedutibilidade da pessoa física, anteriormente descrita, é possível verificar que

não há uma “complementação” que pudesse justificar a limitação para a realização dessas

contribuições – nem para o participante, nem para a patrocinadora.

Com efeito, o limite, estabelecido para as patrocinadoras, de 20% da

remuneração dos empregados e dirigentes vinculados ao plano não guarda qualquer coerência

nem com o limite fixado para desconto das contribuições realizadas pelo participante, nem

com o imposto que irá incidir sobre o resgate ou aposentadoria recebidos do plano, pela

pessoa física.

Não obstante, é forçoso reconhecer que a faculdade para dedução das

contribuições da pessoa jurídica é um verdadeiro estímulo para a instituição de planos de

previdência em favor de empregados e dirigentes, e, com isso, um importante fator para o

desenvolvimento da previdência privada no País, e, por conseguinte, da evolução de todo o

sistema previdenciário nacional.

Alguns ajustes quanto à aplicação dos dispositivos atinentes à dedução das

contribuições das patrocinadoras, porém, carecem ainda de adaptação por parte das

autoridades tributárias. Isto porque, nos últimos anos, é possível verificar a lavratura de autos

de infração que, a pretexto de questionarem a satisfação das condições legais para

dedutibilidade das contribuições da pessoa jurídica ao plano de benefícios, acabam por

descaracterizar o plano de benefícios como um todo188.

Esses questionamentos devem ser analisados com a devida cautela, para se

separar o que é análise das condições para dedutibilidade das contribuições da pessoa jurídica

– e, com isso delimitar o âmbito de competência da Administração Tributária – daquilo que é

condição contratual do plano de benefícios – submetido à fiscalização e controle da Secretaria

188 “IRPJ E CSLL – BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS - EMPREGADOS E DIRIGENTES – INDEDUTIBILIDADE: São indedutíveis as contribuições não compulsórias destinadas a custear planos de benefícios complementares não assemelhados aos da previdência social, instituídos em favor dos empregados e dirigentes da pessoa jurídica. A previsão contratual de resgate independentemente da ocorrência de um estado de necessidade como o que ocorre na previdência social, descaracteriza a semelhança, tornando indedutíveis os pagamentos. (Lei nº 9.249/95 art. 13 inciso V c/c Lei 8.213/91 arts. 1º e 18). RECURSO NEGADO” (Acórdão 107-07355 - Sétima Câmara – Primeiro Conselho de Contribuintes)

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de Previdência Complementar (SPC)189 ou da Superintendência de Seguros Privados

(SUSEP), conforme antes exposto.

5.1.2 Isenção do Imposto de Renda Durante a Fase de Acumulação

Até aqui, é possível afirmar que, quando da realização de contribuições ao

plano de benefícios, a legislação determina a dedução de tais valores, quer tenham sido eles

aportados pela pessoa física ou pela pessoa jurídica. Na seqüência, é necessário verificar,

portanto, qual o tratamento, para fins do imposto de renda, dos recursos, enquanto mantidos

no plano de previdência complementar, isto é, após as contribuições e antes da sua devolução,

sob a forma de resgate ou benefício, ao participante ou beneficiário.

Durante este período (mais conhecido como “fase de acumulação” ou

“período de diferimento”), os recursos mantidos no plano são considerados como reservas

técnicas (para pagamento dos benefícios futuros)190 e são integralmente aplicados em

investimentos financeiros (de renda fixa e de renda variável) e imobiliários. As aplicações são

realizadas com estrita observância dos critérios, condições e limites de diversificação

impostos pelo Conselho Monetário Nacional, conforme previsão do artigo 9º, parágrafo 1º, da

Lei Complementar nº 109/01191.

Os rendimentos e ganhos auferidos em tais aplicações financeiras são

revertidos para o plano e passam a compor a reserva técnica, a fim de rentabilizar a poupança

acumulada pelos participantes e patrocinadores.

189 Houve, em 2004, a tentativa de criação de uma superintendência de regulação das entidades fechadas de previdência complementar, a exemplo da SUSEP, no âmbito das entidades abertas. Por intermédio da Medida Provisória nº 233, de 30 de dezembro de 2004, criou-se a Superintendência Nacional de Previdência Complementar – PREVIC, a qual deixou de existir em razão de a referida medida provisória não ter sido convertida em lei no prazo previsto no artigo 62 da Constituição Federal. 190 A referência feita pela lei a essas reservas é mediante o uso da expressão “reservas técnicas, fundos e provisões”; atingindo, com isso, todos os valores destinados aos planos de benefícios, que representam passivos para pagamento de benefícios futuros aos participantes ou beneficiários por estes eleitos. 191 “Art. 9o As entidades de previdência complementar constituirão reservas técnicas, provisões e fundos, de conformidade com os critérios e normas fixados pelo órgão regulador e fiscalizador. § 1o A aplicação dos recursos correspondentes às reservas, às provisões e aos fundos de que trata o caput será feita conforme diretrizes estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional. § 2o É vedado o estabelecimento de aplicações compulsórias ou limites mínimos de aplicação.”

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No caso das entidades fechadas de previdência complementar, a quase

totalidade do que é revertido em contribuições por participantes e patrocinadoras é aplicado

financeiramente e retorna como remuneração das reservas acumuladas, exceto pela pequena

parcela destinada ao custeio das despesas administrativas. Isso se deve à natureza não

lucrativa dessas entidades e a obrigatória reversão do superávit para os planos de benefícios

por elas administrados.

Nos planos abertos, por sua vez, há cobrança de uma taxa que é descontada

das contribuições efetuadas, a título de remunerar a entidade aberta de previdência

complementar ou sociedade seguradora administradora do plano (ambas organizadas como

sociedades com fim lucrativo), e o restante é destinado à constituição de fundo de

investimento exclusivo, a partir do qual as aplicações financeiras são realizadas.

Em ambos os casos, as aplicações financeiras são realizadas pelas entidades

de previdência complementar, tal como se fossem as efetivas titulares dos recursos aplicados.

Tal mecanismo se justifica pelo fato de a estrutura dos planos de previdência no País estar

pautada na entrega dos recursos, pelos participantes e patrocinadoras, às entidades, de forma

semelhante ao negócio fiduciário. As entidades administram esses recursos, realizam

contratos sob nome próprio, mas sempre com vistas a atingir o objetivo dos seus beneficiários

(ou titulares reais).192

Historicamente, um largo debate foi travado acerca do tratamento tributário

dos rendimentos e ganhos auferidos pela aplicação financeira das reservas técnicas dos planos

de previdência privada. Primeiramente, tomando-se por base o desejado reconhecimento das

entidades fechadas de previdência complementar como entidades de assistência social,

beneficiárias da imunidade prevista no artigo 150, VI, “c”, da Constituição Federal193.

A necessidade de tal reconhecimento não somente se justificava pelo

interesse de se desonerar a aplicação financeira dos recursos poupados pelos participantes –

192 Apenas com a edição da Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005 (em seus artigos 76 seguintes), é que se passou a estabelecer a possibilidade de criação de planos abertos de previdência complementar nos quais os recursos possam ser aplicados em fundos de investimento cujos quotistas são as próprias patrocinadoras e participantes do plano. 193 “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: VI - instituir impostos sobre: (...) c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; (...)”

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vez que esses já sofreriam, como de fato sofrem, incidência do imposto de renda quando da

sua disponibilidade sob a forma de resgate ou benefício –, mas também para se criar

condições isonômicas entre as entidades abertas e fechadas de previdência. Isto porque as

entidades e seguradoras administradoras dos planos abertos, ao receberem tratamento

tributário equiparado ao de instituições financeiras, estavam desoneradas da incidência do

tributo durante a fase de acumulação194.195

O artigo 70 da Lei Complementar nº 109/01 tentou pôr fim aos entraves

nesta matéria, determinando que “os investimentos e os rendimentos provenientes das

aplicações dos recursos das reservas técnicas, provisões e fundos, constituídos com recursos

das contribuições e que garantam os benefícios, poderão ser incentivados, na forma da lei, e

deverão ter a tributação diferida em relação ao imposto sobre a renda”.

O referido dispositivo significaria a garantia de se determinar, em lei

complementar, uma limitação para a tributação dos planos de previdência privada, permitindo

o efetivo diferimento fiscal, conforme comentam José Cassiano Borges e Maria Lucia

Américo dos Reis:

“O artigo 70 da Lei Complementar nº 109/2001, indubitavelmente, reconhecia as extraordinárias funções social e econômica da previdência complementar no cenário nacional e reconhecia, ainda, que o estímulo às atividades desempenhadas pelas entidades abertas e fechadas era vital para o incremento da poupança interna. A tributação no período de acumulação e sobre as receitas de provisões, reservas e fundos de tais entidades inviabilizaria esse crescimento tão necessário para o país; daí a preocupação em diferir a tributação do imposto de renda, para a fase de execução dos planos de benefício”. 196

Contudo, o referido artigo foi vetado sob a justificativa de que não caberia à

lei complementar tratar sobre o tratamento tributário dos investimentos em previdência

privada197.

194 Artigo 77 da Lei nº 8.981/95, artigo 1º da Lei nº 9.065/95, artigo 12 da Lei nº 9.249/95 e artigo 5º da Lei nº 9.779/99. 195 Note-se que, como as aplicações financeiras dos recursos investidos nos planos de previdência privada são realizadas pelas entidades de previdência, em seu próprio nome, a discussão sobre a tributação dos rendimentos e ganhos auferidos nestas aplicações está relacionado à tributação das próprias entidades que os administram. 196 “O Regime Jurídico-tributário dos Fundos de Pensão e suas Inconsistências”, Revista Dialética de Direito Tributário nº 78, março/02, p. 39. 197 Justificativa de veto presidencial ao artigo 70: “A lei complementar não é a norma própria para dispor sobre o tratamento a ser dispensado aos Fundos de Pensão, mormente quando fere questões que se inscrevem no domínio da legislação isencional. Isto posto, estou nesta oportunidade determinando ao Ministro da Fazenda que elabore, no mais breve prazo possível, através do apropriado ato normativo a ser submetido ao Congresso Nacional, que disponha sobre o

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Com isso, as entidades fechadas de previdência complementar mantiveram

suas demandas judiciais, buscando o reconhecimento do direito ao gozo da imunidade

tributária, e, por conseguinte, da não aplicação das disposições legais que previam a

tributação dos rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações financeiras realizadas por tais

pessoas jurídicas.

A previsão sobre a tributação das aplicações financeiras realizadas pelas

entidades fechadas de previdência complementar data de 26 de outubro de 1983, quando foi

editado o Decreto-Lei nº 2.065, cujo artigo 6º continha a seguinte previsão:

“Art. 6º - As entidades de previdência privada referidas nas letras ‘a’ do item I e ‘b’, do item II, do Art. 4, da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977, estão isentas do Imposto sobre a Renda de que trata o Art. 24 do Decreto-Lei nº 1.967 de 23 de novembro de 1982. § 1º - A isenção de que trata este artigo não se aplica ao imposto incidente na fonte sobre dividendos, juros e demais rendimentos de capital recebidos pelas referidas entidades. § 2º - O imposto de que trata o parágrafo anterior será devido exclusivamente na fonte, não gerando direito à restituição. § 3º - Fica revogado o § 3, do Art. 39, da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977.”

O parágrafo 3º, do artigo 39, da Lei nº 6.435/77, revogado por este

dispositivo era justamente o que previa que “as entidades fechadas são consideradas

instituições de assistência social, para os efeitos da letra c do item II do artigo 19 da

Constituição” (leia-se Constituição Federal de 1967).

Como a Constituição Federal de 1988 não trouxe uma previsão expressa

acerca dessa equivalência entre as entidades fechadas de previdência complementar e as

entidades de assistência social, e a Lei Complementar nº 109/01, ao revogar e substituir a Lei

nº 6.435/77, também não fez considerações a este respeito, o questionamento das entidades

subsistiu até finalmente o Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal decidir, nos autos do

Recurso Extraordinário nº 202.700-DF, em 08 de novembro de 2001, que as entidades

fechadas de previdência complementar, cujos planos sejam custeados por participantes, não

têm natureza assistencial, mas contratual, verbis:

adequado tratamento tributário a ser conferido aos Fundos de Pensão, porquanto representam instituições indispensáveis à constituição da poupança nacional e, por conseguinte, merecem atenção prioritária e diferenciada, particularmente no que diz respeito ao diferimento da tributação em relação ao imposto de renda, comparativamente a outras formas de captação e investimento.” (Mensagem nº 494, de 29 de maio de 2001).

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“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. INEXISTÊNCIA. 1. Entidade fechada de previdência privada. Concessão de benefícios aos filiados mediante recolhimento das contribuições pactuadas. Imunidade tributária. Inexistência, dada a ausência das características de universalidade e generalidade da prestação, próprias dos órgãos de assistência social. 2. As instituições de assistência social, que trazem ínsito em suas finalidades a observância ao princípio da universalidade, da generalidade e concede benefícios a toda coletividade, independentemente de contraprestação, não se confundem e não podem ser comparadas com as entidades fechadas de previdência privada que, em decorrência da relação contratual firmada, apenas contempla uma categoria específica, ficando o gozo dos benefícios previstos em seu estatuto social dependente do recolhimento das contribuições avençadas, conditio sine qua non para a respectiva integração no sistema. Recurso extraordinário conhecido e provido.”

Vinte dias depois, em julgamento do Recurso Extraordinário nº 259.756, o

Plenário da mesma corte firmou o entendimento segundo o qual as entidades fechadas de

previdência complementar, cujos planos sejam custeados exclusivamente por patrocinadoras

em favor de seus empregados e dirigentes, têm natureza assistencial, gozando, portanto, da

imunidade tributária assegurada constitucionalmente às entidades de assistência social,

conforme se extrai de sua ementa:

“IMUNIDADE - ENTIDADE FECHADA DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. Na dicção da ilustrada maioria, entendimento em relação ao qual guardo reservas, o fato de mostrar-se onerosa a participação dos beneficiários do plano de previdência privada afasta a imunidade prevista na alínea ‘c’ do inciso VI do artigo 150 da Constituição Federal. Incide o dispositivo constitucional, quando os beneficiários não contribuem e a mantenedora arca com todos os ônus. Consenso unânime do Plenário, sem o voto do ministro Nelson Jobim, sobre a impossibilidade, no caso, da incidência de impostos, ante a configuração da assistência social.”

Em tempo quase coincidente com tais julgamentos, o Poder Executivo

Federal editou a Medida Provisória nº 2.222, de 4 de setembro de 2001, a qual passou a prever

a incidência do imposto de renda sobre os rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações das

reservas técnicas tanto de planos abertos quanto de planos fechados:

“Art. 1º A partir de 1º de janeiro de 2002, os rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações de recursos das provisões, reservas técnicas e fundos de entidades abertas de previdência complementar e de sociedades seguradoras que operam planos de benefícios de caráter previdenciário, ficam sujeitos à incidência do imposto de renda de acordo com as normas de tributação aplicáveis às pessoas físicas e às pessoas jurídicas não-financeiras.

Parágrafo único. O imposto correspondente à parcela do rendimento ou ganho apropriada ao participante ou assistido pelo plano não pode ser compensado com

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qualquer imposto ou contribuição devido pelas pessoas jurídicas referidas neste artigo ou pela pessoa física participante ou assistida.”

Alternativamente a esta tributação, as entidades de previdência

complementar e seguradoras poderiam optar pela tributação segundo a sistemática que se

convencionaria chamar de Regime Especial de Tributação ou simplesmente “RET”:

“Art. 2º A entidade aberta ou fechada de previdência complementar, a sociedade seguradora e o administrador do Fundo de Aposentadoria Programada Individual - FAPI poderão optar por regime especial de tributação, no qual o resultado positivo, auferido em cada trimestre-calendário, dos rendimentos e ganhos das provisões, reservas técnicas e fundos será tributado pelo imposto de renda à alíquota de vinte por cento. § 1º O imposto de que trata este artigo: I - será limitado ao produto do valor da contribuição da pessoa jurídica pelo percentual resultante da diferença entre: a) a soma das alíquotas do imposto de renda das pessoas jurídicas e da contribuição social sobre o lucro líquido, inclusive adicionais; e b) oitenta por cento da alíquota máxima da tabela progressiva do imposto de renda da pessoa física; II - será apurado trimestralmente e pago até o último dia útil do mês subseqüente ao da apuração; III - não poderá ser compensado com qualquer imposto ou contribuição devido pelas pessoas jurídicas referidas neste artigo ou pela pessoa física participante ou assistida. § 2º A opção pelo regime de que trata este artigo substitui o regime de tributação do imposto de renda sobre os rendimentos e ganhos auferidos por entidade fechada de previdência complementar e pelo FAPI, previsto na legislação vigente, bem assim o de que trata o art. 1º, relativamente às entidades abertas de previdência complementar e às sociedades seguradoras.

§ 3º No caso de entidade aberta de previdência complementar e de sociedade seguradora, o limite de que trata o inciso I do § 1º será calculado tomando-se por base, exclusivamente, as contribuições recebidas de pessoa jurídica referentes a planos de benefícios firmados com novos participantes a partir de 1º de janeiro de 2002.”

Com a instituição da tributação para as entidades abertas de previdência

privada, o Conselho Nacional de Seguros Privados editou a Resolução nº 72, de 26 de abril de

2002, segundo a qual o imposto de renda devido sobre os rendimentos e ganhos auferidos na

aplicação dos recursos dos planos de benefícios seria imputado às reservas dos participantes.

Com isso, o ônus do imposto, que, a priori, seria devido pela entidade administradora, visto

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que seria ela que figuraria como titular dos investimentos, foi transferido diretamente para o

participante do plano198.

No tocante às entidades fechadas de previdência complementar, como os

seus ativos correspondem aos ativos dos planos de benefícios por elas administrados, a

imputação do ônus do tributo seria imediata e direta, não sendo necessária regulamentação a

este respeito.

O RET consistia, basicamente, no “autorecolhimento” do imposto de renda,

à alíquota de 20%, devido trimestralmente sobre os rendimentos e ganhos de capital auferidos

nas aplicações de recursos das reservas técnicas, fundos e provisões das entidades de

previdência privada. De acordo com essa metodologia de tributação, a carga tributária efetiva

para aqueles que optassem pelo RET poderia ser substancialmente inferior, já que o imposto

de renda ficava limitado a 12% do valor da contribuição da pessoa jurídica instituidora.

Este limite de 12%, correspondia à soma das alíquotas do imposto de renda

das pessoas jurídicas e da contribuição social sobre o lucro líquido (15% + 10% + 9% = 34%)

e 80% da alíquota máxima do imposto de renda das pessoas físicas (27,5% x 80% = 22%). A

sua fixação explicava-se como forma de compensar a “perda de arrecadação” da União em

razão da dedutibilidade das contribuições da pessoa jurídica para os planos de previdência

privada, conforme explicam Fabio Junqueira de Carvalho e Maria Inês Murgel:

“O Regime Especial de Tributação – RET – buscou, justamente, evitar a perda da receita tributária quando do pagamento da contribuição do empregador pessoa jurídica. É essa diferença, não devolvida via diferimento, que consubstanciava o limite da tributação sobre os ganhos das operações com os ativos garantidores. (...) No que tange às entidades fechadas de previdência, o cálculo do limite descrito incluiu todas as contribuições de patrocinadoras. No caso de entidades abertas de previdência, o limite em comento era calculado tomando-se como base, exclusivamente, as contribuições recebidas de pessoas jurídicas referentes a planos de benefícios firmados com novos participantes a partir de 1º de janeiro de 2002.

198 “Art. 1° Dispor sobre os procedimentos operacionais necessários à imputação do imposto de renda incidente sobre os rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações dos recursos das provisões de planos de benefícios de caráter previdenciário. (...) Art. 2° O imposto de que trata o art. 1° será imputado à parcela da Provisão Matemática de Benefícios a Conceder do plano representada pelos rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações dos respectivos recursos. Parágrafo único. O eventual provisionamento a maior deverá, ao final de cada trimestre do ano civil, ser revertido à respectiva Provisão Matemática de Benefícios a Conceder. Art. 3° A imputação de que trata o art. 2° não poderá comprometer o rendimento mínimo contratualmente garantido, quando for o caso. Parágrafo único. Os planos de benefícios de caráter previdenciário que prevejam garantia de rendimento mínimo, submetidos à análise e aprovação da SUSEP, a partir da data de publicação desta Resolução, poderão prever que a respectiva garantia é líquida do referido imposto.(...)”

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Essa situação denotou verdadeira arbitrariedade por parte do legislador tributário”. 199

Com efeito, sob a justificativa de estabelecer um tratamento igualitário entre

entidades abertas e fechadas de previdência complementar – o que, em última instância,

significaria tratamento isonômico entre participantes dos planos abertos e participantes dos

planos fechados –, a Medida Provisória previu mesma sistemática de tributação, porém com a

estipulação de um critério discriminador, que impactou significativamente, de forma

desfavorável, para a tributação dos planos fechados de previdência privada. Isto porque previa

que, para os planos abertos, o RET somente seria calculado com base nas contribuições dos

novos participantes ou novos planos instituídos a partir de 2002.

Entre aqueles que debatiam sobre a constitucionalidade de se tributar os

resultados financeiros das aplicações efetuadas com os recursos investidos pelos participantes

nos planos de previdência privada, encontra-se José Guilherme Ferraz da Costa, que, em sua

dissertação de mestrado nesta Casa, concluiu que a tributação das entidades de previdência

privada, fechadas ou abertas, sem fins lucrativos, não implica dupla incidência tributária,

tampouco violação ao princípio da capacidade contributiva, pois referidas entidades, em sua

independência econômica e jurídica, detêm capacidade contributiva apartada da do

contribuinte vinculado ao respectivo plano previdenciário. “Assim”, afirma o autor, “a

incidência de tributos sobre ganhos de capital da pessoa jurídica, auferidos na fase de

acumulação desses planos, e sobre os mesmos rendimentos quando repassados ao

beneficiário pessoa física implica mera dupla incidência econômica sobre contribuições

diferentes e não ‘bis in idem’ do ponto de vista jurídico”.200

A Medida Provisória nº 2.222/01 vigorou até 31 de dezembro de 2004,

quando então passou a produzir efeitos a Lei nº 11.053, de 29 de dezembro de 2004. O artigo

5º desta Lei, cuja redação foi posteriormente complementada pela inclusão do parágrafo único

pela Lei nº 11.196/05, dispõe:

“Art. 5º A partir de 1º de janeiro de 2005, ficam dispensados a retenção na fonte e o pagamento em separado do imposto de renda sobre os rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações de recursos das provisões, reservas técnicas e fundos de planos de benefícios de entidade de previdência complementar, sociedade

199 “A Tributação das Entidades Fechadas de Previdência Complementar e o Princípio da Igualdade”, em “Tributação nos Mercados Financeiro e de Capitais e na Previdência Privada”, cit. p. 475 e 477. 200 “Incentivos Fiscais na seguridade Social”, PUS/SP, São Paulo: 2004, p. 180.

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seguradora e FAPI, bem como de seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência. Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo aos fundos administrativos constituídos pelas entidades fechadas de previdência complementar e às provisões, reservas técnicas e fundos dos planos assistenciais de que trata o art. 76 da Lei Complementar nº 109, de 29 de maio de 2001.”

Diante dessa previsão, atualmente os rendimentos e ganhos auferidos nas

aplicações financeiras dos recursos dos planos de benefícios, tanto administrados por

entidades abertas e seguradoras, quanto por entidades fechadas, estão isentos da incidência do

imposto de renda.

Trata-se de um importante avanço em direção ao almejado diferimento

fiscal, por intermédio do qual se propicie a incidência do imposto de renda única e

exclusivamente no momento do recebimento dos recursos pelo beneficiário do plano, seja na

forma de resgate ou de benefícios.

Isto não apenas como forma de alavancar o crescimento da previdência

complementar privada no País, mas como respeito à hipótese de incidência do imposto de

renda, como lembra Enrico Estefan Mannino, ao tratar especificamente das entidades

fechadas de previdência complementar (“fundos de pensão”):

“De fato, se tais fundos são (i), por expressa disposição legal, impedidos de auferir lucros, e, por tal razão, (ii) obrigados a contabilizar todos os rendimentos por ele recebidos como obrigações suas para com seus participantes, é mais do que legítima a tributação dos respectivos benefícios quando de sua disponibilização à pessoa física dos participantes. Como repetidamente mencionado, é dos ditos beneficiários a disponibilidade jurídica e econômica de todo e qualquer rendimento auferido nas aplicações administradas pelos fundos de pensão privada fechados” 201

5.1.3 Incidência do Imposto de Renda sobre Resgates e Benefícios

Conforme antes mencionado, a Lei nº 9.250/95, ao introduzir o regime de

“diferimento fiscal” previu, em seu artigo 33, que, em contrapartida à dedutibilidade das

contribuições, pela pessoa física, “sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte e na

201 “Imunidade das Entidades Fechadas de Previdência Privada – Não-ocorrência dos Fatos Geradores do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro”, Revista Dialética de Direito Tributário nº 86, novembro/02, p. 140.

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declaração de ajuste anual os benefícios recebidos de entidade de previdência privada, bem

como as importâncias correspondentes ao resgate de contribuições.”

Trata-se de uma previsão diferenciada de incidência do imposto de renda: ao

invés de incidir apenas sobre a parcela que corresponder a um acréscimo patrimonial, este

regime prevê a incidência sobre o valor principal investido, além da parcela de acréscimo

patrimonial (rendimento). Essa tributação diferenciada pressupõe que tenha havido dedução

das contribuições realizadas ao plano, e até mais, que tenham sido tais contribuições

integralmente deduzidas da base do imposto de renda, tanto pelos participantes quanto pelas

empresas patrocinadoras. O que, conforme visto, nem sempre ocorrerá.

Em não ocorrendo a dedução, porém, o regime previsto na Lei nº 9.250/95

não admite flexibilização de sua aplicação, isto é, mesmo que não haja dedução das

contribuições, por qualquer motivo, o imposto incide invariavelmente sobre a totalidade do

valor pago pela entidade de previdência complementar.

As únicas exceções a este tratamento são as situações abrangidas por

isenção, sobre as quais se tratará a seguir. No mais, a regra é válida em sua inteireza.

É conveniente ressaltar, desde já, que o artigo 33 da Lei nº 9.250/95, matriz

legal da tributação dos investimentos nos planos de previdência complementar faz expressa

referência à incidência do imposto de renda apenas sobre os benefícios recebidos de entidade

de previdência privada, e sobre as importâncias correspondentes ao resgate de contribuições,

o que significa dizer que outras movimentações dos recursos aplicados nos planos, que não

tenham natureza de resgate ou de benefícios, não sofrem a incidência do imposto por

carecerem de previsão legal para tanto.

Este esclarecimento é importante para se demonstrar a inexistência de

autorização legal para as autoridades fiscais pretenderem cobrar imposto de renda sobre as

operações de portabilidade das reservas acumuladas nos planos de benefícios.

Conforme as considerações tecidas no Capítulo II desde estudo, a

portabilidade corresponde à transferência das reservas individuais do participante entre planos

de previdência complementar administrados pela mesma entidade ou por outra entidade de

previdência privada, fechada ou aberta. Trata-se de um direito assegurado pela Lei

Complementar nº 109/01 a todos os participantes de planos previdenciários privados.

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A portabilidade, por corresponder a uma transferência direta de recursos

entre entidades de previdência complementar ou mesmo no âmbito de uma mesma entidade,

sem qualquer disponibilização de recursos ao participante ou à patrocinadora, diferencia-se

essencialmente do resgate e do pagamento de benefícios – hipóteses em que os recursos do

plano são justamente postos à disposição do participante.

Assim sendo, é forçoso concluir que sobre a portabilidade não há que se

falar em incidência do imposto de renda.

Da mesma forma, as demais situações comentadas, que têm o mesmo efeito

da portabilidade – tal como a transferência coletiva de reservas de todo o grupo de

participantes de um plano de benefícios, a retirada de patrocínio ou mesmo as realocações de

reservas devido à reorganização societária da entidade – estão igualmente fora do alcance da

incidência do imposto.

Foi neste espírito que o legislador complementar inseriu o parágrafo 2º ao

artigo 69 da Lei Complementar nº 109/01:

“Art. 69. (...) § 2º Sobre a portabilidade de recursos de reservas técnicas, fundos e provisões entre planos de benefícios de entidades de previdência complementar, titulados pelo mesmo participante, não incidem tributação e contribuições de qualquer natureza.”

Posto isso, firma-se, desde já, o entendimento de que a incidência do

imposto de renda, nos planos de previdência complementar somente atingem resgates e

benefícios.

Até 31 de dezembro de 2004, a tributação dos resgates e benefícios

recebidos de planos de benefícios estava baseada na incidência da tabela progressiva do

imposto de renda, instituída pelo artigo 25 da Lei nº 7.713/88, com alterações subseqüentes,

composta por uma faixa de renda isenta, uma faixa de renda tributada à alíquota de 15% e

uma tributada a 27,5%.

A partir de 1º de janeiro de 2005, no entanto, os participantes dos planos de

previdência complementar passaram a poder optar pelo regime de tributação que preferem

seja aplicado aos resgates e benefícios recebidos de seus planos.

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Com efeito, em razão da edição da Lei nº 11.053/04, à escolha do

participante, os valores recebidos pelo plano de previdência complementar são tributáveis

segundo a tabela progressiva (“Regime Progressivo de Tributação”) ou, alternativamente, de

acordo com alíquotas regressivas conforme o prazo de permanência dos recursos no plano

(“Regime Regressivo de Tributação”).

Tal escolha somente não foi permitida para os participantes de planos de

benefícios da modalidade “benefício definido”, por impossibilidade técnica de aplicação do

Regime Regressivo de Tributação, conforme será exposto a seguir. Para estes participantes, os

resgates e os benefícios recebidos no âmbito desses planos sujeitam-se obrigatoriamente à

tabela progressiva do imposto de renda.

A escolha deve ser feita até o último dia útil do mês subseqüente ao do

ingresso do participante no plano de benefícios202, 203 e vale para todos os benefícios e

resgates pagos no âmbito do plano de previdência privada, ainda que os benefícios

previdenciários sejam pagos a beneficiários outros que não o próprio participante (se este vier

a falecer, por exemplo).

Tal opção é irreversível, mesmo que o participante transporte seus reservas

para outro plano administrado pela mesma ou outra entidade de previdência complementar,

exercendo o direito que lhe é garantido da portabilidade204. Com isso, há uma espécie de

“carimbo” das reservas acumuladas pelo participante, de tal forma que, se no momento da

realização da portabilidade, ele venha a optar por regime de tributação distinto daquele

escolhido no plano originário, as reservas acumuladas neste plano serão tributadas segundo o

202 Participantes que ingressaram nos planos antes de 1º de janeiro de 2005 tiveram até 30 de dezembro de 2005 para formalizar sua opção, nos termos do parágrafo 2º, do artigo 2º, da Lei nº 11.053/04, com redação dada pelo artigo 91 da Lei nº 11.196/05. 203 Lei nº 11.053/04, com redação modificada pela Lei nº 11.196/05: “Art. 1º É facultada aos participantes que ingressarem a partir de 1o de janeiro de 2005 em planos de benefícios de caráter previdenciário, estruturados nas modalidades de contribuição definida ou contribuição variável, das entidades de previdência complementar e das sociedades seguradoras, a opção por regime de tributação no qual os valores pagos aos próprios participantes ou aos assistidos, a título de benefícios ou resgates de valores acumulados, sujeitam-se à incidência de imposto de renda na fonte às seguintes alíquotas: (...) § 5º As opções de que tratam o caput e o § 1º deste artigo serão exercidas pelos participantes e comunicadas pelas entidades de previdência complementar, sociedades seguradoras e pelos administradores de FAPI à Secretaria da Receita Federal na forma por ela disciplinada. § 6º As opções mencionadas no § 5º deste artigo deverão ser exercidas até o último dia útil do mês subseqüente ao do ingresso nos planos de benefícios operados por entidade de previdência complementar, por sociedade seguradora ou em FAPI e serão irretratáveis, mesmo nas hipóteses de portabilidade de recursos e de transferência de participantes e respectivas reservas.” 204 A respeito deste instituto, vide Capítulo II do presente estudo.

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modelo de tributação antes escolhido e os recursos acumulados após a portabilidade serão

tributados de acordo com a opção feita no plano receptor.

Independentemente da alternativa escolhida, a base de cálculo do imposto de

renda será sempre a totalidade dos recursos pagos (principal e rendimentos); o que irá variar é

a alíquota aplicada para fixação do montante de tributo a ser recolhido.

Além da fixação da alíquota a outra única mudança entre o Regime

Progressivo de Tributação e o Regime Regressivo de Tributação é o tratamento a ser dado ao

imposto devido: no primeiro, o imposto de renda é retido em caráter de antecipação, isto é,

compensável com o imposto de renda devido ao final do ano-calendário, enquanto que no

outro, o imposto de renda retido é definitivo, não sendo ajustável quando da apuração da base

de cálculo efetiva do imposto da pessoa física.

Afora isto, também importa destacar que, independentemente do regime de

tributação escolhido, permanece a faculdade de dedução das contribuições tanto da pessoa

física quanto da pessoa jurídica. A opção pelos regimes de tributação progressivo ou

regressivo somente causa reflexos quanto ao imposto de renda devido no momento do

pagamento dos valores ao beneficiário, sendo mantida a dedutibilidade e a isenção na fase de

acumulação dos recursos no plano.

A modificação do tratamento tributário possibilitando-se a escolha entre dois

modelos de tributação é, de um modo geral, bem recebida, especialmente por criar uma

cultura de análise dos impactos tributários dos investimentos realizados em planos de

previdência privada.

Ademais, conforme destacado por João Marcelo Máximo Ricardo dos

Santos, a mudança no formato da tributação dos investimentos de longo prazo, como é o caso

da previdência privada, sempre deverá conter uma regra que inspire segurança jurídica aos

investidores, e neste ponto a manutenção do Regime Progressivo de Tributação tem grande

relevância:

“O primeiro ponto a ser pensado no tocante a mudanças no ambiente legal, quando se trata de uma atividade e de contratos que se constroem no longo prazo, é a segurança jurídica. Essa segurança, por sua vez, não está somente no respeito ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido, elementos que, juntamente com a coisa julgada, compõem aqueles expressamente protegidos pela Constituição. Na realidade, conforme acima mencionado, mesmo os ofertantes de planos consideram o ambiente legal existente quando se estruturam e preparam-se para

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prover dinamismo à atividade que exercem. A alteração abrupta desse ambiente, muito embora possa eventualmente ser necessária, resulta na quebra das expectativas não somente dos consumidores mas também desses ofertantes, e pode desorganizar a evolução da atividade como um todo. Assim, o primeiro cuidado que se teve foi a criação de ambientes paralelos, o novo e o antigo, sem alterar os contratos já celebrados e mantendo válido o sistema tributário anterior, inclusive para contratações realizadas após a promulgação da norma, que veio a ser a Lei nº 11.053, de 2005.” 205

Passe-se à análise das peculiaridades e implicações de cada regime de

tributação.

5.1.3.1 Regime Progressivo de Tributação

O Regime Progressivo de Tributação segue, basicamente, os moldes daquele

vigente até 31 de dezembro de 2004, isto é, os resgates e benefícios pagos pelos planos de

previdência complementar sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte com base na

tabela progressiva vigente à época da ocorrência do fato jurídico tributável (“fato gerador”).

A referida tabela progressiva é composta por faixas de renda que

determinam a alíquota do imposto de renda aplicável. Atualmente, a tabela progressiva

mensal vigente, tal como aprovada pelo artigo 1º, da Lei nº 11.311, de 13 de junho de 2006, é

a seguinte:

Base de Cálculo em R$ Alíquota % Parcela a Deduzir do Imposto emR$

Até 1.257,12 - - De 1.257,13 até 2.512,08 15 188,57

Acima de 2.512,08 27,5 502,58

A única alteração promovida, neste regime, pela Lei nº 11.053/04, foi a

determinação da alíquota fixa de 15% do imposto de renda retido sobre os resgates efetuados

pelos participantes, independentemente do valor resgatado. Essa tributação é válida, porém,

205 “Panorama da Evolução Recente do Ambiente Legal e Regulatório da Previdência Complementar Aberta”, Revista de Previdência nº 4, Ed. Gramma, Rio de Janeiro, abril/06, p. 15.

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para o imposto de renda a ser retido na fonte, sendo que, ao final do exercício fiscal, quando

da apuração da base de cálculo do imposto efetivamente devido no ano pelo contribuinte, os

resgates deverão ser submetidos à tabela progressiva, podendo alcançar a tributação pela

alíquota de 27,5%, a depender dos demais rendimentos e ganhos, bem como das deduções, a

serem consideradas.

Diante disso, é correto afirmar que, em última instância, resgates e

benefícios são tributados, no Regime Progressivo de Tributação, segundo a tabela

progressiva.

Cabe esclarecer que o estabelecimento da alíquota de 15% para os resgates

teve por finalidade prática evitar as situações, que antes aconteciam, de o contribuinte

programar seus resgates em valores iguais ou inferiores à faixa de renda isenta do imposto.

Assim, evitavam a retenção do imposto a título de antecipação. Quando da apuração do

imposto de renda anual, muitos desses contribuintes deixavam de incluir os resgates que

efetuavam no cômputo dos rendimentos tributáveis.

Esse tipo de situação ocorria no âmbito dos planos abertos de previdência

complementar, em que a realização de resgates é mais flexível que nos planos fechados – nos

quais os resgates decorrem da cessação de vínculo empregatício entre o participante e a

patrocinadora. Não obstante, a regra contida no artigo 3º da Lei nº 11.053/04206 é aplicável a

ambos os tipos de planos207, desde que o participante tenha optado pelo Regime Progressivo

de Tributação.

O participante que tenha optado pela incidência do imposto de renda

segundo o regime de tributação em tela, conforme dito, terá seus resgates e benefícios sempre

tributados pela tabela progressiva vigente á época do pagamento desses valores. Assim,

sempre que a tabela progressiva for corrigida, ou tiver suas alíquotas aumentadas ou

diminuídas, haverá reflexo na tributação dos valores a receber do plano de previdência

privada.

206 “Art. 3º A partir de 1º de janeiro de 2005, os resgates, parciais ou totais, de recursos acumulados relativos a participantes dos planos mencionados no art. 1º desta Lei que não tenham efetuado a opção nele mencionada sujeitam-se à incidência de imposto de renda na fonte à alíquota de 15% (quinze por cento), como antecipação do devido na declaração de ajuste da pessoa física, calculado sobre: I - os valores de resgate, no caso de planos de previdência, inclusive FAPI; II - os rendimentos, no caso de seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de opção pelo regime de tributação previsto nos arts. 1º e 2º desta Lei.”

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Em contrapartida, como a tabela progressiva é a medida de tributação da

pessoa física pelo imposto de renda no Brasil, as deduções que o participante faça no âmbito

de seu plano de previdência tomarão por base também essa tabela, o que mantém certa

coerência entre esses dois momentos. A correspondência somente não será mais adequada

porque é possível que o participante deduza as contribuições com base em uma tabela

progressiva (vigente à época da realização desses aportes) e resgate ou receba benefícios

tributados com base em outra tabela progressiva (vigente à época do recebimento dos

valores).

O imposto de renda devido no Regime Progressivo de Tributação é retido na

fonte pela entidade de previdência complementar (fonte pagadora), seguindo os moldes da

tributação dos rendimentos pagos por pessoas jurídicas em favor de pessoas físicas, conforme

antes comentado208.

O imposto retido nesses termos é passível de compensação quando da

apuração do devido no respectivo ano-calendário, pela pessoa física. Assim, será ele

considerado quando do ajuste entre os rendimentos e ganhos auferidos pelo contribuinte e as

despesas dedutíveis por ele efetuadas, acarretando eventual complementação ou restituição do

imposto já antecipado.

5.1.3.2 Regime Regressivo de Tributação

O Regime Regressivo de Tributação, diferentemente do regime progressivo,

corresponde a uma inovação na legislação que disciplina a tributação dos planos de

previdência privada no Brasil. Consiste basicamente na introdução de alíquotas do imposto de

renda sobre os resgates e benefícios, variáveis segundo o tempo em que os recursos são

mantidos no plano de previdência complementar.

O referido regime está assim previsto na Lei nº 11.053/04 – com parágrafos

6º e 7º, respectivamente alterado e incluído pelo artigo 91 da Lei nº 11.196/05:

207 Exceto os da modalidade “benefício definido”, conforme antes citado.

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“Art. 1º É facultada aos participantes que ingressarem a partir de 1º de janeiro de 2005 em planos de benefícios de caráter previdenciário, estruturados nas modalidades de contribuição definida ou contribuição variável, das entidades de previdência complementar e das sociedades seguradoras, a opção por regime de tributação no qual os valores pagos aos próprios participantes ou aos assistidos, a título de benefícios ou resgates de valores acumulados, sujeitam-se à incidência de imposto de renda na fonte às seguintes alíquotas: I - 35% (trinta e cinco por cento), para recursos com prazo de acumulação inferior ou igual a 2 (dois) anos; II - 30% (trinta por cento), para recursos com prazo de acumulação superior a 2 (dois) anos e inferior ou igual a 4 (quatro) anos; III - 25% (vinte e cinco por cento), para recursos com prazo de acumulação superior a 4 (quatro) anos e inferior ou igual a 6 (seis) anos; IV - 20% (vinte por cento), para recursos com prazo de acumulação superior a 6 (seis) anos e inferior ou igual a 8 (oito) anos; V - 15% (quinze por cento), para recursos com prazo de acumulação superior a 8 (oito) anos e inferior ou igual a 10 (dez) anos; e VI - 10% (dez por cento), para recursos com prazo de acumulação superior a 10 (dez) anos. § 1º O disposto neste artigo aplica-se: I - aos quotistas que ingressarem em Fundo de Aposentadoria Programada Individual - FAPI a partir de 1º de janeiro de 2005; II - aos segurados que ingressarem a partir de 1º de janeiro de 2005 em planos de seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência em relação aos rendimentos recebidos a qualquer título pelo beneficiário. § 2º O imposto de renda retido na fonte de que trata o caput deste artigo será definitivo. § 3º Para fins do disposto neste artigo, prazo de acumulação é o tempo decorrido entre o aporte de recursos no plano de benefícios mantido por entidade de previdência complementar, por sociedade seguradora ou em FAPI e o pagamento relativo ao resgate ou ao benefício, calculado na forma a ser disciplinada em ato conjunto da Secretaria da Receita Federal e do respectivo órgão fiscalizador das entidades de previdência complementar, sociedades seguradoras e FAPI, considerando-se o tempo de permanência, a forma e o prazo de recebimento e os valores aportados. § 4º Nos casos de portabilidade de recursos e de transferência de participantes e respectivas reservas entre planos de benefícios de que trata o caput deste artigo, o prazo de acumulação do participante que, no plano originário, tenha optado pelo regime de tributação previsto neste artigo será computado no plano receptor. § 5º As opções de que tratam o caput e o § 1º deste artigo serão exercidas pelos participantes e comunicadas pelas entidades de previdência complementar, sociedades seguradoras e pelos administradores de FAPI à Secretaria da Receita Federal na forma por ela disciplinada. § 6º As opções mencionadas no § 5º deste artigo deverão ser exercidas até o último dia útil do mês subseqüente ao do ingresso nos planos de benefícios operados por entidade de previdência complementar, por sociedade seguradora ou em FAPI e serão irretratáveis, mesmo nas hipóteses de portabilidade de recursos e de transferência de participantes e respectivas reservas. § 7º Para o participante, segurado ou quotista que houver ingressado no plano de benefícios até o dia 30 de novembro de 2005, a opção de que trata o § 6º deste artigo deverá ser exercida até o último dia útil do mês de dezembro de 2005, permitida

208 Vide Capítulo IV, quando tratou-se dos comentários à regra-matriz de incidência do imposto de renda.

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neste prazo, excepcionalmente, a retratação da opção para aqueles que ingressaram no referido plano entre 1º de janeiro e 4 de julho de 2005.”

As alíquotas descritas no caput do artigo supratranscrito podem ser

organizadas segundo uma tabela nos seguintes moldes:

Prazo de Acumulação Alíquota Igual ou inferior a 2 anos 35%

Superior a 2 anos e igual ou inferior a 4 anos 30% Superior a 4 anos e igual ou inferior a 6 anos 25% Superior a 6 anos e igual ou inferior a 8 anos 20% Superior a 8 anos e igual ou inferior a 10 anos 15%

Superior a 10 anos 10%

O artigo 2º da Lei nº 11.053/04, para não tratar de forma distinta os novos

participantes (que ingressaram em planos de previdência privada a partir de 1º de janeiro de

2005) e participantes “antigos” (que ingressaram antes desta data), previu a possibilidade de

escolha a estes últimos, também:

“Art. 2º É facultada aos participantes que ingressarem até 1º de janeiro de 2005 em planos de benefícios de caráter previdenciário estruturados nas modalidades de contribuição definida ou contribuição variável, a opção pelo regime de tributação de que trata o art. 1º desta Lei. § 1º O disposto neste artigo aplica-se: I - aos quotistas de Fundo de Aposentadoria Programada Individual - FAPI que ingressarem até 1º de janeiro de 2005; e II - aos segurados que ingressarem até 1º de janeiro de 2005 em planos de seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência em relação aos rendimentos recebidos a qualquer título pelo beneficiário. § 2º A opção de que trata este artigo deverá ser formalizada pelo participante, segurado ou quotista, à respectiva entidade de previdência complementar, sociedade seguradora ou ao administrador de FAPI, conforme o caso, até o último dia útil do mês de dezembro de 2005. § 3º Os prazos de acumulação mencionados nos incisos I a VI do art. 1º desta Lei serão contados a partir: I - de 1º de janeiro de 2005, no caso de aportes de recursos realizados até 31 de dezembro de 2004; e II - da data do aporte, no caso de aportes de recursos realizados a partir de 1º de janeiro de 2005. § 4o Aplica-se às opções realizadas na forma deste artigo o disposto nos §§ 2º a 6º do art. 1º desta Lei. § 5º Os valores pagos aos próprios participantes ou aos assistidos, a título de benefícios ou resgates de valores acumulados, antes da formalização da opção

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referida no § 2º deste artigo, sujeitam-se à incidência de imposto de renda com base na legislação vigente antes da edição desta Lei.”

Interessante notar que neste Regime Regressivo de Tributação, a alíquota do

imposto de renda varia não em função do valor da renda tributável (ou melhor, do valor dos

resgates e benefícios recebidos pela pessoa física), mas em função do prazo de acumulação,

que, basicamente, é refletido pelo tempo de manutenção dos recursos no plano de benefícios.

Trata-se de uma sistemática que busca privilegiar aqueles que constroem a

poupança previdenciária em médio ou longo prazo, afastando uma possível utilização do

plano de previdência privada como instrumento de investimento meramente financeiro. A este

respeito, são as considerações de Heloisa Hernandez Derzi e Fabiana Ulson Zappa:

“Entendemos que essa nova sistemática de tributação foi introduzida para preservar a própria filosofia da previdência complementar, na medida em que privilegia aqueles participantes que contribuem para o plano de previdência com a idéia de formação de poupança previdenciária ao longo de sua vida laboral. Tal modelo surgiu embasado em questões práticas e econômicas. O mercado sempre muito criativo, a partir da grande gama de produtos previdenciários com características financeiras muito fortes, passou a utilizar largamente os planos de previdência com intuitos desvirtuados, permitindo resgates das contribuições efetuadas ao plano independentemente da configuração de qualquer ‘estado de necessidade’ que pudesse justificar a natureza previdenciária dos recursos” 209

Ocorre que, de outro lado, ainda que o participante tenha a intenção de

permanecer com os recursos investidos no plano a longo prazo, situações alheias à sua

vontade poderão ensejar a antecipação do pagamento dos benefícios pelo plano de

previdência, e com isso, a tributação para aquele que tiver optado pelo Regime Regressivo de

Tributação poderá ser bastante onerosa.

Com vistas a solucionar (ou ao menos amenizar os efeitos negativos dessas

situações), foi que o legislador incluiu a previsão do artigo 95 da Lei nº 11.196/05, verbis:

“Art. 95. Na hipótese de pagamento de benefício não programado oferecido em planos de benefícios de caráter previdenciário, estruturados nas modalidades de contribuição definida ou contribuição variável, após a opção do participante pelo regime de tributação de que trata o art. 1º da Lei nº 11.053, de 29 de dezembro de 2004, incidirá imposto de renda à alíquota: I - de 25% (vinte e cinco por cento), quando o prazo de acumulação for inferior ou igual a 6 (seis) anos; e

209 “A Tributação e o Caráter Social da Previdência Complementar”, cit. p. 79.

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II - prevista no inciso IV, V ou VI do art. 1º da Lei nº 11.053, de 29 de dezembro de 2004, quando o prazo de acumulação for superior a 6 (seis) anos. § 1º O disposto no caput deste artigo aplica-se, também, ao benefício não programado concedido pelos planos de benefícios cujos participantes tenham efetuado a opção pelo regime de tributação referido no caput deste artigo, nos termos do art. 2º da Lei nº 11.053, de 29 de dezembro de 2004.

§ 2º Para fins deste artigo e da definição da alíquota de imposto de renda incidente sobre as prestações seguintes, o prazo de acumulação continua a ser contado após o pagamento da 1ª (primeira) prestação do benefício, importando na redução progressiva da alíquota aplicável em razão do decurso do prazo de pagamento de benefícios, na forma definida em ato da Receita Federal do Brasil, da Secretaria de Previdência Complementar e da Superintendência de Seguros Privados.”

Com isso, caso, antes de ultrapassados os seis anos de prazo de acumulação

dos recursos no plano, o participante venha a receber benefícios por invalidez ou seus

beneficiários passem a perceber os benefícios previdenciários em razão da falência do titular

do plano, estará assegurada a tributação à alíquota de 25%, desde que o participante tenha

efetuado a opção pelo Regime Regressivo de Tributação. Essa alíquota inicialmente fixada,

será passível de redução, segundo os mesmos critérios da tabela regressiva antes apresentada.

A fixação da alíquota de 25% nestes casos, visa a manter certa relação com

aquela que seria imputável caso o participante tivesse optado pelo Regime Progressivo de

Tributação – isto é, 27,5%210.

Diante disso, sendo o caso de pagamento de benefícios programados ou de

resgates a pessoa física titular de plano em que se optou pelo Regime Regressivo de

Tributação, a alíquota do imposto de renda irá variar entre 35% e 10%, a depender da

acumulação dos recursos no plano.

No caso dos participantes que ingressaram no plano de benefícios até 31 de

dezembro de 2004 e que tenham efetuado a opção por esta modalidade de tributação, é

preciso saber que o tempo de aplicação até então não será contado. Todos os valores

acumulados por estes participantes ate a referida data são considerados como se tivessem sido

aportados no dia 1º de janeiro de 2005, e, a partir de então, sofrem a contagem para fins de

determinação da alíquota regressiva do imposto.

210 Claro que, para essa comparação, parte-se da premissa de que os valores pagos alcançariam a faixa de renda tributável pela alíquota de 27,5%.

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O prazo de acumulação, para fins de aplicação das alíquotas regressivas

anteriormente mencionadas, segundo a Lei nº 11.053/04, deve ser considerado como sendo “o

tempo decorrido entre o aporte de recursos no plano de benefícios mantido por entidade de

previdência complementar, por sociedade seguradora ou em FAPI e o pagamento relativo ao

resgate ou ao benefício, calculado na forma a ser disciplinada em ato conjunto da Secretaria

da Receita Federal e do respectivo órgão fiscalizador das entidades de previdência

complementar, sociedades seguradoras e FAPI, considerando-se o tempo de permanência, a

forma e o prazo de recebimento e os valores aportados”.

Em razão desta previsão, as referidas autoridades editaram a Instruções

Normativas Conjuntas nº 524, de 11 de março de 2005 e nº 589, de 21 de dezembro de 2005,

que determinam o cálculo do prazo de acumulação. Nos termos ditados pelos referidos

normativos, o prazo de acumulação é contado, basicamente, de duas formas: (i) segundo o

método do prazo médio ponderado (“PMP”), para os benefícios estruturados em regime cuja

manutenção dos benefícios concedidos tenha por premissa o mutualismo dos respectivos

recursos garantidores (“regime atuarial”); ou (ii) com base nas primeiras contribuições

efetuadas durante o período que antecede o pagamento do resgate ou o início do gozo do

benefício pelo participante ou pelo beneficiário do participante não assistido (“PEPS”), para

os benefícios não estruturados em regime atuarial.

Em ambos os casos, há um controle segregado de cada uma das

contribuições realizadas pelo participante211. O que diferencia uma modalidade de cálculo da

outra é o fato de que no PEPS os pagamentos a serem efetuados ao participante vão

“esgotando” o estoque de contribuições mais antigas até chegar às mais recentemente

aportadas no plano. Nesse sistema, ao pagar um benefício à pessoa física, a entidade de

previdência retirasse das reservas desse participante os valores com acumulados a mais

tempo.

No caso do PMP, por outro lado, o cálculo do prazo de acumulação parte da

média ponderada do tempo de manutenção das contribuições no plano e os seus respectivos

valores correspondentes.

211 Que é justamente o dado que impede os participantes de planos de “benefício definido” de optarem pelo Regime Regressivo de Tributação, uma vez que nestes planos os recursos vertidos formam uma reserva comum, partilhada por todos os participantes do plano de benefícios.

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O imposto de renda do Regime Regressivo de Tributação, assim como no

Regime Progressivo de Tributação, é retido na fonte pela entidade de previdência privada.

Ocorre, no entanto, que esse imposto, especificamente no regime tributário em questão, é

considerado como definitivo, não integrando o ajuste na Declaração Anual do imposto de

renda da pessoa física.

Isso significa afirmar que os valores submetidos à tributação não são

considerados para formação da base de cálculo do imposto de renda devido no respectivo ano-

calendário – e, com isso, eventuais despesas dedutíveis realizadas pelo contribuinte não

podem acarretar diminuição do imposto a pagar ou restituição do imposto pago –, e o

montante de imposto retido e recolhido não é compensável com aquele efetivamente devido

pelo contribuinte.

Note-se, portanto, que, aqueles participantes cujos resgates e aposentadoria

estiverem submetidos ao Regime Regressivo de Tributação, não apenas têm as alíquotas do

imposto de renda alteradas, em comparação àquelas aplicáveis ao Regime Progressivo de

tributação, mas também o tratamento do referido imposto na declaração anual apresentada

pela pessoa física, sendo o imposto não passível de ajustes segundo outros rendimentos e

despesas incorridos no respectivo ano-calendário.

5.1.3.3 Situações de Isenção

Apresentam-se, abaixo, as situações contempladas pela legislação vigente

como isentas do imposto de renda sobre resgates e/ou benefícios recebidos de planos de

previdência complementar privada.

Apesar de todas as situações a seguir descritas serem tratadas pela legislação

como isenções, é possível que elas se refiram à mera modificação quanto ao tratamento

tributário aplicável aos valores recebidos de planos de previdência complementar. É o caso

das contribuições efetuadas até 1995, para as quais a legislação então vigente não autorizava a

dedução. Neste caso, não se pode falar em isenção sobre toda a parcela do valor pago pela

entidade de previdência privada, mas tão-somente sobre os rendimentos acumulados.

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Importante esclarecer que as dispensas de tributação concedidas nos termos

abaixo comentados são aplicáveis independentemente da opção de regime de tributação

efetuada pelo participante do plano de benefícios212.

5.1.3.3.1 Resgate de Contribuições Efetuadas pela Pessoa

Física entre 1989 e 1995, para Desligamento do Plano

Conforme descrito anteriormente, até o início da vigência da Lei nº

9.250/95, os investimentos em previdência complementar estavam submetidos a um regime

de tributação diverso daquele hoje aplicável.

Até 1995, vigorava a regra prevista na Lei nº 7.713/88, segundo a qual os

valores vertidos a planos de previdência privada, pelo participante, sofriam a incidência do

imposto de renda por ocasião do pagamento da contribuição, realizado mediante o desconto

no seu salário mensal, ajustável na apuração do Imposto sobre a Renda devido anualmente

pela pessoa física, em sua Declaração Anual do imposto. Assim, quando do recebimento da

aposentadoria, não havia nova cobrança do imposto de renda sobre a parcela referente às

contribuições vertidas pelo participante.

Nos termos do artigo 6º, VII, da Lei nº 7.713/88, os benefícios recebidos dos

planos de previdência estariam “isentos” “desde que os rendimentos e ganhos de capital

produzidos pelo patrimônio da entidade tenham sido tributados na fonte”.

Com a edição da Lei nº 9.250/95, porém, introduziu-se a já comentada

sistemática de diferimento fiscal segundo a qual as contribuições destinadas aos planos de

previdência podem ser deduzidas na apuração do imposto de renda da pessoa física, e, em

contrapartida, o imposto de renda passa a incidir, sobre o resgate e pagamento dos benefícios,

em relação ao montante total pago.

212 Neste tocante, vale mencionar o artigo 19 da Instrução Normativa SRF nº 588, de 21 de dezembro de 2005, segundo o qual: “Para fins de apuração da base de cálculo do imposto de renda, conforme o disposto nos arts. 11, 15 e 16, relativamente à parcela do benefício pago, devem ser observadas, no que couber, as disposições relativas a isenção, não-incidência e exclusões previstas na legislação vigente, independentemente da opção pelo regime de tributação efetuada pelo participante.”

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Ocorre, porém, que, para aqueles que já haviam aderido a um plano de

benefícios à época da edição da Lei nº 9.250/95, a realidade legislativa que lhes era

apresentada, em relação às contribuições efetuadas até 31 de dezembro de 1995, implicava a

dupla incidência do imposto de renda: primeiramente sobre as contribuições vertidas e

posteriormente sobre o valor total recebido da entidade de previdência complementar.

Diante desse cenário, fazia-se necessária a edição de uma norma de

transição, que pudesse resguardar o direito dos participantes de serem tributados, quando do

resgate ou recebimento dos benefícios, apenas em relação às contribuições realizadas a partir

de 1º de janeiro de 1996.

Essa norma somente foi editada em 21 de maio de 1996, com a publicação

da Medida Provisória nº 1.459, a qual atualmente encontra-se vigente sob o nº 2.159-70, de 24

de agosto de 2001. O artigo 8º da referida norma determinou a exclusão da incidência do

imposto de renda na fonte e na declaração de rendimentos “o valor do resgate de

contribuições de previdência privada, cujo ônus tenha sido da pessoa física, recebido por

ocasião de seu desligamento do plano de benefícios da entidade, que corresponder às

parcelas de contribuições efetuadas no período de 1º de janeiro de 1989 a 31 de dezembro de

1995”213.

Ainda que após a edição desta Medida Provisória a grande parte das

eventuais discussões sobre a incidência do imposto de renda sobre o resgate de contribuições

efetuadas no período entre 1989 e 1995 tenham sido parcialmente solucionadas, a Fazenda

Pública vinha sustentando posicionamento sobre essa tributação, nas demandas judiciais

propostas sobre a matéria. Isso somente veio a cessar com a edição do Parecer PGFN/CRJ/nº

2.863/2002 (publicado no D.O.U. de 26/09/02), segundo o qual:

“(...) 15. Examinando-se a hipótese vertente, desde logo, conclui-se que: I) nas causas em que se discute a incidência do Imposto de Renda sobre o resgate das contribuições efetuadas perante entidade de previdência privada por parte do segurado, a competência para representar a União é da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, já que se trata de matéria fiscal; e II) os venerandos acórdãos retromencionados manifestam a reiterada Jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça. Destarte, há base legal para o Sr. Procurador-Geral da Fazenda Nacional, com o imprescindível agreement de S. Exa. O Ministro de Estado da

213 A fixação do marco inicial para 1º de janeiro de 1989, deve-se ao fato de, somente com a edição da lei nº 7.713/88 é que as contribuições deixaram de ser dedutíveis na apuração do imposto de renda da pessoa física, conforme antes comentado. Até 31 de dezembro de 1988, vale lembrar, vigorava o Decreto-lei nº 1.642/78, que assegurava uma sistemática de diferimento fiscal, em formato semelhante ao hoje vigente.

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Fazenda, dispensar a interposição de recursos ou requerer a desistência dos já interpostos na situação sub examine. 16. Assim (...) recomenda-se sejam autorizadas pelo Sr. Procurador-Geral da Fazenda Nacional a dispensa e a desistência dos recurso cabíveis nas ações judiciais que versem exclusivamente a respeito da incidência do Imposto de Renda sobre o resgate dos depósitos efetuados perante as entidades de previdência privada durante a vigência da Lei nº 7.713, de 22.12.1988 até o advento da Lei nº 9.250, de 26.12.1995, desde que inexista qualquer outro fundamento relevante.”

Ocorre que a decisão de desistência dos processos referida no parecer da

Procuradoria Geral da Fazenda Nacional refere-se exclusivamente àqueles que tratem da

incidência do imposto de renda sobre o resgate das contribuições efetuadas pelas pessoas

físicas nos planos de previdência privada entre 1989 e 1995. Com isso, permaneceram as

discussões judiciais sobre a incidência do imposto de renda sobre os benefícios pagos pelo

plano de previdência, com recursos das contribuições efetuadas no mencionado período.

Esse debate tem por fundamento o texto da Medida Provisória nº 1.459/96,

que contemplou expressamente a “isenção” do imposto de renda somente sobre o valor do

resgate de contribuições de previdência privada, cujo ônus tenha sido da pessoa física,

recebido por ocasião de seu desligamento do plano de benefícios da entidade, que

corresponder às parcelas de contribuições efetuadas no período de 1º de janeiro de 1989 a 31

de dezembro de 1995. Assim, pela letra da lei, somente os resgates efetuados para

desligamento do plano de previdência privada estão dispensados da tributação pelo imposto

de renda, restando tributáveis os benefícios pagos com os valores dessas contribuições. Este

equívoco da lei acarretou, como ainda acarreta, a proposição de numerosas ações judiciais por

parte dos participantes, especialmente nos últimos 5 a 10 anos, quando, estima-se, esses

participantes passaram a ser elegíveis ao gozo dos benefícios assegurados pelo plano.

O Superior Tribunal de Justiça, apesar de, na maioria dos seus julgados,

manifestar entendimento favorável à aplicação da “isenção” do imposto de renda também

sobre os benefícios pagos com recursos dos investimentos efetuados entre 1989 e 1995214,

214 A exemplo, cite-se a decisão proferida em 20 de junho de 2006, nos autos do recurso especial nº 808.488, de cuja ementa se extrai: “TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. IMPOSTO DE RENDA. PRESCRIÇÃO. ORIENTAÇÃO FIRMADA PELA 1ª SEÇÃO DO STJ. ERESP 262.475/DF. LC 118/2005: NATUREZA MODIFICATIVA (E NÃO SIMPLESMENTE INTERPRETATIVA) DO SEU ARTIGO 3º. INCONSTITUCIONALIDADE DO SEU ART. 4º, NA PARTE QUE DETERMINA A APLICAÇÃO RETROATIVA. ENTENDIMENTO CONSIGNADO NO VOTO DO ERESP 327.043/DF. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. LEIS 7.713/88 (ART. 6º, VII, B) E 9.250/95 (ART. 33) E MP 1.943/96 (ART. 8º). INCIDÊNCIA SOBRE O BENEFÍCIO. BIS IN IDEM. EXCLUSÃO DE MONTANTE EQUIVALENTE ÀS CONTRIBUIÇÕES EFETUADAS SOB A ÉGIDE DA LEI 7.713/88. JUROS. SELIC.

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expressou opinião diversa em outras decisões isoladas sobre a matéria215. Assim, permanece

controverso o entendimento jurisprudencial sobre a matéria.

5.1.3.3.2 Beneficiários Portadores de Moléstias Graves e

Portadores de Deficiência Mental

O artigo 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88, prevê isenção para os benefícios de

aposentadoria recebidos por pessoas portadoras de determinadas mazelas de grave

repercussão à saúde. O referido artigo, com redação dada modificada pelo artigo 47 da Lei nº

8.541/92 e posteriormente pelo artigo 1º da Lei 11.052/04 prevê:

(...) 4.O recebimento da complementação de aposentadoria e o resgate das contribuições recolhidas para entidade de previdência privada no período de 1º.01.1989 a 31.12.1995 não constituíam renda tributável pelo IRPF, por força da isenção concedida pelo art. 6º, VII, b, da Lei 7.713/88, na redação anterior à que lhe foi dada pela Lei 9.250/95. Em contrapartida, as contribuições vertidas para tais planos não podiam ser deduzidas da base de cálculo do referido tributo, sendo, portanto, tributadas. 5. Com a edição da Lei 9.250/95, alterou-se a sistemática de incidência do IRPF, passando a ser tributado o recebimento do benefício ou o resgate das contribuições, por força do disposto no art. 33 da citada Lei, e não mais sujeitas à tributação as contribuições efetuadas pelos segurados. 6. A Medida Provisória 1.943-52, de 21.05.1996 (reeditada sob o nº 2.159-70), determinou a exclusão da base de cálculo do imposto de renda do ‘valor do resgate de contribuições de previdência privada, cujo ônus tenha sido da pessoa física, recebido por ocasião de seu desligamento do plano de benefícios da entidade, que corresponder às parcelas de contribuições efetuadas no período de 1º de janeiro de 1989 a 31 de dezembro de 1995’ (art. 8º), evitando, desta forma, o bis in idem. 7. Da mesma forma, considerando-se que a complementação de aposentadoria paga pelas entidades de previdência privada é constituída, em parte, pelas contribuições efetuadas pelo beneficiado, deve ser afastada sua tributação pelo IRPF, até o limite do imposto pago sobre as contribuições vertidas no período de vigência da Lei 7.713/88. (...) 9. Recurso especial a que se dá parcial provimento.” (destacamos) 215 “TRIBUTÁRIO - COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA - PRESCRIÇÃO - INCIDÊNCIA DE IMPOSTO DE RENDA - NÃO CONFIGURADA HIPÓTESE DE BIS IN IDEM. (...) 2. Nos termos do art. 33 da Lei 9.250/95, incide imposto de renda sobre as verbas recebidas a título de complementação de aposentadoria, independentemente do período ou da legislação vigente à época do recolhimento das contribuições do beneficiário para o fundo de pensão. 3. O recebimento de complementação de proventos decorre de vínculo contratual existente entre o participante e a entidade de previdência privada, não se tratando e de devolução de valores, de modo que inexiste correlação entre aquilo que foi recolhido pelo beneficiário e que será recebido na aposentadoria, o que fica evidente quando observada a possibilidade de contratação de renda mensal vitalícia - feito na grande maioria dos casos -, prevista no art. 14, § 4º, e no art. 33, § 2º, da Lei Complementar 109/2001. 4. Impossível configurar-se a hipótese de bis in idem se não há identidade entre a parcela recolhida e a recebida na complementação, inexistindo bitributação, não importando se a contribuição mensal foi recolhida sob a égide da Lei 7.713/88 ou na vigência da Lei 9.250/95. 5. Revisão do entendimento firmado na jurisprudência do STJ. 6. Impossibilidade de modificação do julgado, na hipótese dos autos, a fim de se evitar a reformatio in pejus. 7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido.” (destacamos)

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“Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: (...) XIV – os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma; (...) XXI - os valores recebidos a título de pensão quando o beneficiário desse rendimento for portador das doenças relacionadas no inciso XIV deste artigo, exceto as decorrentes de moléstia profissional, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída após a concessão da pensão.”

Trata-se de uma efetiva isenção, pois não está condicionada à não dedução

das contribuições efetuadas pelo participante durante a fase de acumulação dos recursos no

plano de benefícios.

Tal isenção tem forte cunho social, e visa a trazer um benefício fiscal aos

valores recebidos por pessoas que sejam portadoras das moléstias expressamente designadas

pela legislação, de forma a evitar que a tributação possa representar mais um fardo a ser

suportado, na difícil luta de superação pessoal sofrida por esses indivíduos diariamente.

Sabendo-se que muitas dessas doenças relacionadas pelo legislador

impedem o exercício de atividade profissional e/ou diminuem sensivelmente a capacidade

laboral de seus portadores, a lei procurou assegurar que o mínimo necessário para a

subsistência desses indivíduos seja preservado da incidência do imposto de renda.

É preciso, porém, que a interpretação dessa isenção seja feita corretamente,

à luz do artigo 111 do Código Tributário Nacional216, sabendo-se que ela alcança

exclusivamente os proventos de aposentadoria e pensão percebidos pelos portadores das

doenças expressamente previstas na legislação.

Especialmente em relação a esta observação, cabe alertar para o fato de que

o texto da lei faz referência aos benefícios de aposentadoria e pensão, não limitando a sua

abrangência àqueles pagos pelo regime geral da previdência social ou pelo regime próprio dos

servidores públicos. Assim, diante da inexistência de restrição a este respeito, é perfeitamente

216 “Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre: (...)

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aplicável tal isenção aos benefícios de aposentadoria e pensão pagos pelas entidades de

previdência complementar.

Mesmo porque, se o intuito da lei é o de propiciar condições mínimas de

sobrevivência de pessoas portadoras dessas mazelas, especialmente diante da sua diminuição

da capacidade de trabalho, não seria coerente qualquer imposição de limitação acerca da fonte

pagadora da aposentaria por elas recebida.

Note-se, porém, que o texto da lei trata de proventos de aposentadoria e

pensão, não abarcando com a isenção os resgates efetuados pelos portadores das doenças

relacionadas.

A par disso, vale mencionar que a Lei nº 9.250/95, em seu artigo 30,

determina condições para que a pessoa física possa usufruir a isenção em questão:

“Art. 30. A partir de 1º de janeiro de 1996, para efeito do reconhecimento de novas isenções de que tratam os incisos XIV e XXI do art. 6º da Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, com a redação dada pelo art. 47 da Lei nº 8.541, de 23 de dezembro de 1992, a moléstia deverá ser comprovada mediante laudo pericial emitido por serviço médico oficial, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. § 1º O serviço médico oficial fixará o prazo de validade do laudo pericial, no caso de moléstias passíveis de controle. § 2º Na relação das moléstias a que se refere o inciso XIV do art. 6º da Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, com a redação dada pelo art. 47 da Lei nº 8.541, de 23 de dezembro de 1992, fica incluída a fibrose cística (mucoviscidose)”.

No mesmo sentido da isenção prevista no artigo 6º, XIV e XXI, da Lei nº

7.713/88, sobreveio, em 20 de julho de 1993, a Lei nº 8.687, que prevê a isenção do imposto

de renda sobre os benefícios de aposentadoria e pensão recebidos por beneficiários portadores

de deficiência mental, verbis:

“Art. 1º Não se incluem entre os rendimentos tributáveis pelo Imposto sobre a Renda e proventos de qualquer natureza as importâncias percebidas por deficientes mentais a título de pensão, pecúlio, montepio e auxílio, quando decorrentes de prestações do regime de previdência social ou de entidades de previdência privada. Parágrafo único. Para fins do disposto nesta Lei, considera-se deficiente mental a pessoa que, independentemente da idade, apresenta funcionamento intelectual

II - outorga de isenção; (...)”

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subnormal com origem durante o período de desenvolvimento e associado à deterioração do comportamento adaptativo.

Art. 2º A isenção do Imposto de Renda conferida por esta Lei não se comunica aos rendimentos de deficientes mentais originários de outras fontes de receita, ainda que sob a mesma denominação dos benefícios referidos no artigo anterior.”

Apesar de o texto desta lei fazer referência a “pensão, pecúlio, montepio e

auxílio”, em se tratando de pagamentos realizados no âmbito da previdência privada, todos

eles recebem o tratamento de benefícios, e, portanto, é válida a mesma observação

anteriormente tecida, no tocante à não abrangência da isenção aos resgates efetuados pelos

beneficiários referidos pela lei.

5.1.3.3.3 Beneficiários Maiores de 65 Anos

O artigo 6º da Lei nº 7.713/88, além da isenção antes comentada, também

isenta da incidência do imposto de renda devido pelos indivíduos maiores de 65 anos os

rendimentos de aposentadoria e pensão uma parcela adicional, equivalente àquela fixada

como isenta para todas as pessoas físicas, segundo a tabela progressiva do imposto. Com isso,

tais indivíduos passam a ter o equivalente ao dobro da parcela isenta do imposto de renda

aplicável aos rendimentos auferidos pelas demais pessoas físicas.

Tal isenção dirige-se exclusivamente aos benefícios de aposentadoria e

pensão, inclusive aqueles pagos por entidade de previdência privada (dessa vez

expressamente designada), não incluindo resgates eventualmente realizados pelas pessoas

beneficiárias. Confira-se da redação do inciso XV, do referido artigo, alterado pelas Leis nº

9.250/95, 11.119/05 e 11.311/06:

“Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: (...) XV - os rendimentos provenientes de aposentadoria e pensão, transferência para a reserva remunerada ou reforma pagos pela Previdência Social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, por qualquer pessoa jurídica de direito público interno ou por entidade de previdência complementar, até o valor de R$ 1.257,12 (mil, duzentos e cinqüenta e sete reais e doze centavos), por mês, a partir do mês em

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que o contribuinte completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, sem prejuízo da parcela isenta prevista na tabela de incidência mensal do imposto; (...)”

Esta dispensa da incidência do imposto de renda sobre os benefícios de

aposentadoria para os beneficiários com idade superior a 65 anos, constava do texto original

da Constituição Federal de 1988, o que lhe conferia verdadeiro status de imunidade tributária.

O parágrafo 2º, do artigo 153, do texto constitucional previa tal imunidade em relação à

aposentadoria e à pensão recebida das pagos pela previdência social (não abrangendo as

entidades de previdência privada) e estava condicionada a que a renda total auferida pelos

indivíduos maiores de 65 anos fosse constituída exclusivamente de rendimentos do trabalho.

Confira-se:

“Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: (...) III - renda e proventos de qualquer natureza; (...) § 2º - O imposto previsto no inciso III: (...) II - não incidirá, nos termos e limites fixados em lei, sobre rendimentos provenientes de aposentadoria e pensão, pagos pela previdência social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, a pessoa com idade superior a sessenta e cinco anos, cuja renda total seja constituída, exclusivamente, de rendimentos do trabalho.”

Esta imunidade tributária estava fundamentalmente vinculada com os

padrões fixados pelo regime de previdência social, vigentes até 1998. Tanto o é que, com a

reforma do sistema previdenciário nacional pela Emenda Constitucional nº 20/98, o referido

dispositivo foi revogado.

Há entendimento doutrinário no sentido de que a revogação formal do inciso

II, do parágrafo 2º, do artigo 153, da Carta Magna, porém, não pode representar a sua retirada

do ordenamento jurídico, em razão de a emenda constitucional não poder alterar cláusulas

pétreas, como a ora referida. Neste sentido, merecem destaque as palavras de Roque Antonio

Carrazza:

“(...) dentro da linha de pensamento que adotamos, estamos convencidos de que este dispositivo continua em vigor e irradiando efeitos. Realmente, tratando de imunidade tributária (direito fundamental do contribuinte), ele veicula cláusula pétrea (cf, art. 60, §4º, IV, da CF), imodificável, pois, por meio de emenda constitucional, fruto do mero poder constituinte derivado”. 217

217 “Curso de Direito Constitucional Tributário”, cit. p. 737.

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De qualquer forma, em se tratando de benefícios pagos por planos de

previdência privada, por não estarem anteriormente contemplados no texto do artigo 153,

parágrafo 2º, II, da Constituição Federal, a dispensa de incidência do imposto de renda deverá

vincular-se ao texto do artigo 6º, XV, da Lei nº 7.713/88, anteriormente transcrito.

5.1.3.3.4 Pecúlio

O inciso VII, do artigo 6º, da Lei nº 7.713/88, conforme antes mencionado,

continha a regra de isenção do imposto de renda sobre os benefícios recebidos de planos de

previdência privada, em razão da sistemática antes vigente, em que as contribuições

realizadas pela pessoa física não eram passíveis de dedução na apuração do imposto de renda.

Contudo, a Lei nº 9.250/95, ao introduzir a sistemática do diferimento fiscal,

retirou o original do inciso VII e, em seu artigo 32, deu nova redação a este dispositivo:

“Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: (...) VII - os seguros recebidos de entidades de previdência privada decorrentes de morte ou invalidez permanente do participante; (...)”

Note-se que a isenção mencionada pela norma usa do termo seguro para

designar a parcela paga pela entidade de previdência complementar em razão da morte ou de

invalidez permanente do participante. Cabe, no entanto, ao aplicador da lei interpretar esta

palavra no contexto em que se enquadra. Isto porque, em se tratando de entidades de

previdência complementar privada, impedidas de exercer outras atividades que não a

administração de planos de benefícios previdenciários, o pagamento por elas efetuado como

conseqüência do falecimento ou invalidez permanente do participante há de ter a natureza

previdenciária e não securitária. Por esta razão, a legislação que disciplina a isenção

introduzida pelo artigo 6º, VII, da Lei nº 7.713/88, refere-se a este “seguro” pelo uso do termo

“pecúlio”.

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As autoridades tributárias, ao regulamentar a aplicação desta isenção,

porém, estabeleceram como condição que o pagamento do pecúlio, para ser considerado

isento, seja feito em parcela única, conforme é possível extrair da Instrução Normativa SRF nº

15, de 6 de fevereiro de 2001:

“Art. 5º Estão isentos ou não se sujeitam ao imposto de renda os seguintes rendimentos: (...) XXII - pecúlio recebido em prestação única de entidades de previdência privada, quando em decorrência de morte ou invalidez permanente do participante;(...)”

Esta condição tem por equivalência o tratamento conferido pelo artigo 82 da

Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991 (revogado pela Lei nº 9.032/95) que, ao tratar do pecúlio

então pago no âmbito do regime geral da previdência social, estabelecia que “o pecúlio

consistirá em pagamento único de valor correspondente à soma das importâncias relativas às

contribuições do segurado, remuneradas de acordo com o índice de remuneração básica dos

depósitos de poupança com data de aniversário no dia primeiro”.

Assim sendo, mesmo com a revogação do referido artigo 82, permanece o

entendimento das autoridades fiscais de que o pecúlio pago por morte do participante ou em

decorrência de sua invalidez permanente é isento se for pago em parcela única.

Vale mencionar que a redação equivocada do artigo 7º da Instrução

Normativa Conjunta nº 524, de 11 de março de 2005, criou dúvidas sobre um possível

entendimento das autoridades tributárias sobre a não aplicação da isenção relativa ao pecúlio,

a partir da vigência da Lei nº 11.053/04. Isto porque a Instrução Normativa em questão, com a

intenção de disciplinar em âmbito infralegal o Regime Regressivo de Tributação, previu que,

em relação aos benefícios de “pecúlio” morte ou pensão por morte do participante assistido, a

tributação seria determinada considerando o prazo de acumulação apurado para o benefício

que vinha sendo pago ao participante falecido, verbis:

“Art. 7º Em relação aos benefícios não programados decorrentes da reversão em pecúlio por morte ou pensão por morte do participante assistido, a tributação será determinada considerando o prazo de acumulação apurado para o benefício que vinha sendo pago ao participante falecido, adotando-se a redução progressiva da alíquota aplicada à última prestação de benefício em razão do decurso do prazo de pagamento do benefício.”

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Contudo, a Instrução Normativa Conjunta nº 589, de 21 de dezembro de

2005, afastou tal possibilidade ao incluir o parágrafo único ao referido artigo, em que restou

determinado que “não se aplica o disposto no caput ao pecúlio recebido em prestação única,

isento de tributação nos termos da legislação vigente”.

5.1.3.3.5 Auxílio-doença e Outros

Outra isenção assegurada pela legislação que rege o imposto de renda das

pessoas físicas, aplicável aos benefícios recebidos de entidades de previdência complementar

é a prevista no artigo 48 da Lei nº 8.541, de 23 de dezembro de 1992. O referido artigo, em

sua redação original, garantia isenção do imposto de renda para “os vencimentos (...)

decorrentes de seguro desemprego, auxílio-natalidade, auxílio-doença, auxílio-funeral e

auxílio-acidente, quando pagos pela previdência oficial da União, dos Estados, do Distrito

Federal e dos Municípios”.

Contudo, a Lei nº 9.250/95, em seu artigo 27, deu nova redação a este

dispositivo, de forma a abranger, pela isenção do imposto, os benefícios dessa natureza, pagos

por entidades de previdência complementar. Confira-se:

"Art. 48. Ficam isentos do imposto de renda os rendimentos percebidos pelas pessoas físicas decorrentes de seguro-desemprego, auxílio-natalidade, auxílio-doença, auxílio-funeral e auxílio-acidente, pagos pela previdência oficial da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e pelas entidades de previdência privada."

Em vista disso, atualmente tem-se como isentos, além dos valores

mencionados nos itens anteriores, o auxílio-natalidade, o auxílio-doença, o auxílio-funeral e o

auxílio-acidente, pagos por entidades de previdência complementar privada.

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Capítulo VI - A Adequação da Tributação dos Planos de Previdência Complementar

pelo Imposto de Renda ao Perfil Constitucional do Tributo

Diante da descrição acima sobre o tratamento tributário previsto na

legislação que atualmente rege o imposto de renda sobre os investimentos em planos de

previdência privada, resta identificar quais as suas possíveis incongruências em relação ao

perfil constitucional do imposto de renda, notadamente quanto à adequação dessas normas ao

conceito constitucional de renda tributável e aos princípios constitucionais que norteiam a

competência tributária da União no tocante a este tributo.

6.1 Possibilidade de Tributação de Parcela do Patrimônio

O regime de diferimento do ônus financeiro do imposto de renda, com a

dedução das contribuições e incidência do imposto de renda sobre a totalidade dos valores

pagos pelo plano de previdência complementar, como visto, não é eficaz ao que se propõe

(postergar o ônus do tributo), em razão das distorções existentes, decorrentes dos critérios

adotados para dedução e para a incidência do imposto.

Isto porque a dedutibilidade das contribuições, tanto pela pessoa física

quanto pela pessoa jurídica, conforme verificado, está limitada a determinadas condições que

impedem, na maior parte das vezes, que todo o valor contribuído seja usado para abater do

imposto de renda devido. E, em contrapartida, quando do retorno dos recursos ao participante

ou beneficiário do plano de previdência complementar, o imposto de renda incide na fonte

sobre alíquotas variadas – que podem não guardar relação com aquelas usadas para a dedução

das contribuições – e sob sistemáticas diversas – imposto de renda definitivo ou em caráter de

antecipação.

Assim, o que se verifica é que, ainda que o intuito do legislador tenha sido o

de traçar um regime de tributação que proporcionasse a postergação do efeito financeiro do

imposto de renda, o que há, na realidade, é a tributação de algo que não pode ser considerado

como renda nem como proventos.

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Antes descreveu-se que a Constituição Federal contém uma definição

mínima do conceito de renda e de proventos passíveis de tributação pelo imposto federal.

Observou-se que a renda e os proventos tributáveis não podem alcançar o patrimônio das

pessoas, nem o valor das transações por elas efetuadas, posto que esses elementos são objeto

de competências tributárias diversas, atribuídas à própria União, aos Estados, ao Distrito

Federal e aos Municípios.

Com isso, o imposto de renda somente pode abranger o produto da atividade

de aplicação do patrimônio ou da realização de operações, e os valores recebidos em razão de

uma atividade que já cessou (aposentadoria e pensões); sendo que tanto a renda, quanto os

proventos, deverão representar acréscimos patrimoniais (resultados positivos).

Ademais, após a análise dos princípios constitucionais aplicáveis ao tributo

em questão, concluiu-se que a materialidade do imposto de renda deve corresponder aos

resultados positivos auferidos pelo sujeito passivo apurados após a dedução da parcela

investida ou a perda incorrida, e dos gastos necessários à sua subsistência ou à manutenção da

fonte produtora da renda, obtendo-se, assim, o resultado líquido, com exclusão de qualquer

forma de reposição patrimonial.

O imposto de renda incidente sobre os resgates e benefícios recebidos dos

planos de previdência privada, porém, não guarda correspondência com esse perfil. Isto

porque a incidência do imposto ocorre sobre o valor total recebido pelo participante, seja a

título de benefícios ou de resgate, e, dessa forma, acaba por tributar o patrimônio da pessoa

física e o valor da operação realizada (isto é, do investimento efetuado no plano).

Tal situação somente não irá ser constatada nos casos em que as

contribuições aportadas no plano sejam deduzidas na exata medida da tributação incidente

sobre os benefícios e resgates ulteriores, ou se a tributação destes ocorrer em alíquota inferior

àquela aplicável sobre a dedução das contribuições. Nos demais casos, o imposto de renda

incide, efetivamente sobre todo o valor recebido, inclusive sobre a devolução do patrimônio

(valor principal – contribuições) investido – em descompasso com a vedação para tributação

da reposição patrimonial.

Por conta disso, o imposto de renda, nas hipóteses em que não houver

dedução com base em critérios coincidentes ou de dedução “a maior” que a medida do

imposto de renda incidente sobre os resgates e benefícios recebidos pela pessoa física, incide

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não apenas sobre os resultados positivos, mas também sobre o que não é resultado (é

principal, é patrimônio).

Mesmo na hipótese de a pessoa deduzir a totalidade das contribuições que

efetue ao plano de benefícios, o imposto de renda cobrado sobre os resgates e benefícios

decorrentes desse investimento pode não incidir sobre o resultado líquido. Isso é verificado

verificado quando da aplicação do Regime Regressivo de Tributação, em que as alíquotas do

imposto de renda são empregadas sobre os resgates e benefícios, sem a possibilidade de

dedução de qualquer despesa – tributação em caráter exclusivo ou definitivo.

Por essas razões, é possível afirmar que, exceto nos casos em que se possa

deduzir a totalidade das contribuições efetuadas para o plano de benefícios, e que o imposto

de renda incida com base na tabela progressiva do imposto de renda, a incidência do imposto

de renda ocorrerá em completo descompasso ao perfil constitucional do referido imposto.

6.1.1 O Princípio da Capacidade Contributiva e o Regime Regressivo de

Tributação

No tocante ao princípio da capacidade contributiva, descreveu-se, antes, que

ele se destina a determinar que o ente político competente, sempre que possível, mensure as

bases de incidência dos impostos de sua competência segundo a capacidade econômica dos

respectivos sujeitos passivos.

Diante desse preceito, a base de cálculo e a alíquota dos impostos devem ser

fixadas segundo um modelo que possa propiciar a gradação da carga tributária de acordo com

a situação econômica do contribuinte. Essa gradação e a verificação da capacidade econômica

do contribuinte devem ser medidas em coerência com a materialidade do tributo, posto que é

esse o dado com o qual o poder competente estrutura a tributação que lhe compete instituir.

Em relação ao imposto de renda, isto significa dizer que a sua base de

cálculo deve ser “personalizada” de forma que a base tributável guarde estrita correlação com

a realidade econômica do contribuinte – daí decorre a autorização para dedução das despesas

efetivamente incorridas pelo sujeito passivo.

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Quanto à alíquota do imposto de renda, o princípio da capacidade

contributiva impõe a fixação de percentuais progressivos, conforme aumentar o poder

econômico do contribuinte. Essa imposição resulta, também, da aplicação do princípio da

progressividade, consagrado especificamente para o imposto de renda, no artigo 153,

parágrafo 2º, da Constituição Federal.

Importante observar que, como a mensuração da capacidade econômica do

sujeito passivo deve estar relacionada à materialidade do tributo, a União deve medir a

incidência do imposto de renda sempre em função da renda e dos proventos percebidos pelo

contribuinte.

No caso da tributação dos planos de previdência privada, é possível observar

que o Regime Progressivo de Tributação atende ao princípio da capacidade contributiva, pois,

além de conter a previsão de alíquotas progressivas segundo a renda auferida pela pessoa

física, tem a sua base de cálculo submetida aos descontos de despesas incorridas pelo

contribuinte no respectivo ano-calendário – já que o imposto de renda, nesses casos, tem

caráter de antecipação do devido ao final do período de apuração.

O mesmo não se pode afirmar do Regime Regressivo de Tributação. Este

referido regime baseia-se na instituição de alíquotas regressivas, não segundo a renda do

contribuinte, mas segundo o prazo de acumulação dos recursos no plano. Assim, conforme o

tempo de acumulação dos recursos, a alíquota do imposto de renda é a mesma

independentemente do montante de renda auferida pela pessoa física.

Ademais, a sua base de cálculo não é variável de acordo com a situação

econômica pessoal do contribuinte. Isto porque o imposto de renda, nesta sistemática, é

definitivo, não sendo computado quando da apuração do imposto de renda efetivamente

devido no ano pelo indivíduo (sobre a renda efetivamente recebida no período) nem os

rendimentos por ele tributados, nem o seu montante retido na fonte.

A única justificativa para este critério de incidência seria vislumbrar a

aplicação da extrafiscalidade – técnica usada para imputar à configuração dos tributos,

elementos que pudessem nortear seus comportamentos, de forma a estimular ou desestimular

determinadas ações, julgadas de relevante interesse público, seja no âmbito social, político,

monetário ou econômico.

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Neste caso, porém, conforme anteriormente exposto, em se tratando de

imposto de renda, a extrafiscalidade somente poderá ser exercida se a hipótese de incidência

atingida contemplar a capacidade contributiva e a progressividade.

Roque Antonio Carrazza, a este respeito, leciona:

“De qualquer modo, os tributos extrafiscais, tanto quanto os fiscais, devem submeter-se aos princípios que informam a tributação: igualdade, legalidade, generalidade, proporcionalidade, não-confiscatoriedade etc.. Além disso, na medida em que interferem nas condutas das pessoas precisam encontrar respaldo num valor constitucionalmente consagrado, nunca em concepções ideológicas ou morais, incompatíveis com a liberdade na atuação da vida privada das pessoas, que deve imperar num Estado Democrático como o nosso”. 218

Tomando-se por base esta lição, ter-se-ia que a extrafiscalidade, neste caso

em exame, deveria estar respaldada num valor consagrado pela Constituição Federal.

Não é o que se verifica.

A extrafiscalidade, no Regime Regressivo de Tributação, está relacionada ao

incentivo de realização da poupança de longo prazo. Com efeito, a Exposição de Motivos nº

116, de 20 de agosto de 2004, que contém as razões para edição da Medida Provisória nº 209,

de 2004, da qual resultou a edição da Lei nº 11.053/04, destaca que “deve existir um estímulo

para que o cidadão abra mão de um consumo imediato ou de investimentos de curto prazo em

troca de uma poupança que exija períodos mais longos de maturação”.

O intuito da fixação das alíquotas regressivas é, portanto, de fazer com que

as pessoas considerem a poupança da previdência como um investimento do longo prazo.

Este valor deveria, como ensina Roque Carraza, estar consagrado na

Constituição Federal, para que pudesse ser aplicado como medida de mensuração do imposto

de renda, e ainda assim não poderia ser sobreposto em prejuízo à aplicação dos princípios da

capacidade contributiva e da progressividade.

Ocorre, porém, que, nem no Título VII, da Constituição Federal, que

disciplina a ordem econômica e financeira no País ou mesmo o artigo 192, que trata

218 “Imposto sobre a Renda (Perfil Constitucional e Temas Específicos), cit. p. 132.

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especificamente do Sistema Financeiro Nacional219, nem no Título VIII, que trata da ordem

social ou em seus artigos que tratam da previdência social, é possível encontrar disposição

constitucional que privilegie a poupança de longo prazo. Dessa forma, na linha de pensamento

de que a extrafiscalidade deve encontrar justificativa em fundamento constitucional, verifica-

se que, no tocante ao Regime Regressivo de Tributação, a expressão extrafiscal do imposto de

renda está fundada em valor não convencionado pelo constituinte.

Ainda que estivesse, a extrafiscalidade jamais poderia implicar a não

aplicação dos princípios da progressividade e da capacidade contributiva. Assim, não se

encontra razão para justificar a constitucionalidade da regressividade proposta nos artigos 1º e

2º da Lei nº 11.053/04.

A única situação em que, possivelmente, fosse afastado o caráter

inconstitucional do Regime Regressivo de Tributação seria o de tal sistemática de apuração do

imposto de renda resultar em efetivo benefício fiscal para o sujeito passivo. Isso ocorreria, por

exemplo, se o participante viesse a deduzir integralmente as contribuições efetuadas para o

plano previdenciário – à alíquota máxima de 27,5% –, e, posteriormente, quando do resgate

ou do recebimento dos benefícios, a alíquota do imposto de renda fosse a mínima, de 10%.

6.1.2 O Princípio da Vedação ao Confisco e o Regime Regressivo de

Tributação

Também em relação ao princípio de vedação ao confisco, verifica-se

irregularidade jurídico-formal no Regime Regressivo de Tributação.

Conforme antes mencionado, o princípio do não-confisco representa uma

limitação imposta ao legislador tributário para evitar a fixação de critérios de quantificação do

tributo (base de cálculo e alíquota) de forma abusiva, comprometendo a própria atividade

exercida pelo sujeito passivo ou a sua subsistência, e preservando o mínimo existencial.

219 “Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram.”

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No que se refere ao Regime Progressivo de Tributação, em que se apura o

imposto de renda segundo base de cálculo e alíquota fixadas de acordo com a situação pessoal

do contribuinte, permitindo que a retirada da parcela tributável (dedução) as despesas com

tratamentos de saúde e educação, e a tributação da renda segundo a sua capacidade

econômica, é possível afirmar que, a rigor, não haveria ofensa ao princípio do não-confisco.

No Regime Regressivo de Tributação, porém, além de a base de cálculo do

imposto não permitir a dedução de despesas inerentes à sobrevivência do indivíduo, as

alíquotas chegam a alcançar 30% e 35% do valor recebido da entidade de previdência privada,

isto é, bem acima dos percentuais fixados normalmente para o imposto da pessoa física (cuja

alíquota máxima é de 27,5%).

Ademais, o imposto de renda apurado pela aplicação destas alíquotas do

Regime Regressivo de Tributação é considerado como definitivo, e, portanto, incide

independentemente da dedução das contribuições realizadas ao plano.

Esses elementos, se somados, podem acarretar a tributação, pelo imposto de

renda, de uma parcela bastante significante da renda efetivamente auferida pelo contribuinte

no período; e, com isso, ensejar a caracterização deste tributo, especificamente neste caso,

como de efeito confiscatório.

Com isso, e apesar de não existir definição legal de um critério para

classificação dos tributos (ou sua carga tributária) como confiscatórios, a fixação de alíquotas

elevadas, sobre base de cálculo que corresponda não apenas à renda – bruta –, mas ao próprio

capital aplicado, pode ensejar a caracterização de ofensa ao princípio consagrado no artigo

150, IV, da Constituição Federal.

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Capítulo VII - A Adequação da Tributação dos Planos de Previdência Complementar

pelo Imposto de Renda à Regra-Matriz do Tributo

A par da análise sobre as inconsistências do tratamento tributário aplicável

aos planos de benefícios em relação ao perfil constitucional do imposto de renda, importa

também verificar em que medida a tributação aplicável aos investimentos em previdência

complementar privada não se ajustam à regra-matriz de incidência deste tributo.

7.1 A Possibilidade de Tributação do Próprio Capital Investido – Critérios

Material e Quantitativo (Base de Cálculo)

Da forma como está atualmente prevista, a tributação dos recursos

destinados aos planos de previdência complementar acarreta a incidência do imposto de renda

sobre parcela não considerada como renda ou proventos, segundo o seu sentido semântico

extraído da Constituição Federal de 1988.

Esse descompasso entre o conceito constitucional de renda e proventos

passíveis de tributação pelo imposto federal e o os valores recebidos de planos de previdência

privada, como estão submetidos ao imposto de renda atualmente, repercute diretamente na

análise da observância aos limites do critério material da regra-matriz de incidência.

Isto porque o artigo 43 do Código Tributário Nacional, ao disciplinar os

elementos da hipótese de incidência do imposto de renda, assegurou que a renda tributável por

este imposto coincida exatamente com aquela extraída da Carta Magna. O mencionado

dispositivo legal apenas conferiu definição expressa sobre a classificação da renda como o

acréscimo patrimonial resultante da aplicação do capital ou do trabalho, ou de ambos, e dos

“proventos de qualquer natureza”, como os demais acréscimos patrimoniais que não

estivessem alcançados pelo conceito de renda.

Assim, não havendo compatibilidade entre o elemento submetido à

incidência do imposto de renda pela legislação que disciplina a tributação dos planos de

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previdência complementar – a não ser nos casos em que se possa deduzir a totalidade das

contribuições efetuadas para o plano de benefícios, e que o imposto de renda incida com base

na tabela progressiva – e a “renda” (aí incluídos os proventos) passível de tributação pelo

imposto de renda, há, de fato, não apenas um problema de constitucionalidade, mas também

de legalidade.

Com relação ao critério quantitativo da hipótese de incidência, observa-se

que a base de cálculo está intimamente ligada ao critério material da regra-matriz do tributo.

Isto porque a base de cálculo deve mensurar as proporções reais do comportamento objeto da

incidência tributária.

Diante disso, o imposto de renda deve sempre ter como base de cálculo uma

projeção da renda e dos proventos auferidos pelo contribuinte. Deve ela corresponder,

necessariamente, ao que efetivamente se define como renda tributável.

Assim sendo, nos casos em que o imposto venha a incidir sobre algo que não

represente renda, assim considerado o resultado positivo líquido disponibilizado ao sujeito

passivo, estar-se-á desrespeitando o critério quantitativo da regra-matriz de incidência do

imposto de renda.

Ante dessa verificação, é possível afirmar que a base de cálculo do imposto

de renda incidente sobre os resgates e benefícios recebidos de planos de previdência

complementar é ilegal, exceto nos casos em que se possa deduzir a totalidade das

contribuições efetuadas para o plano de benefícios, e que o imposto de renda incida com base

na tabela progressiva do imposto de renda ou nos casos em que a dedução seja maior que a

própria incidência do imposto (benefício fiscal). Isto porque, em todos os demais casos, parte

do patrimônio investido no plano de benefícios por meio de contribuições – que, por certo,

não é acréscimo patrimonial, mas o próprio capital investido – estará sendo submetido à

incidência do imposto.

Conforme descrito anteriormente, a dedução das contribuições para os

planos de previdência complementar, é feita, para as pessoas físicas, com base na tabela

progressiva, cuja alíquota máxima é de 27,5%, e, para as pessoas jurídicas, com base na

alíquota de 34%. A incidência do imposto de renda, quando do resgate ou recebimento da

aposentadoria, contudo, recai sobre toda a importância recebida pela pessoa física, a uma

alíquota que pode alcançar 35%.

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Ou seja, ainda que se considere que a pessoa física deduz integralmente as

contribuições vertidas aos planos de previdência complementar, à alíquota máxima de 27,5%,

todo o valor recebido do plano (inclusive a parcela que foi deduzida à alíquota máxima de

27,5%) pode estar sujeito à alíquota do imposto de renda de 35%.

E o mesmo poderá ocorrer em relação à parcela contribuída pela

patrocinadora, a qual se integralmente deduzida, atingirá o percentual máximo de 34% da

renda tributável pela pessoa jurídica.

Com efeito, parece evidente que esse descompasso entre a alíquota (menor)

do imposto usada para dedução e a alíquota (maior) do imposto para a tributação resulta em

evidente tributação de parcela do patrimônio do contribuinte.

Some-se, ainda, a essas conclusões o fato de que o contribuinte pode deduzir

(se cumpridos todos os rígidos limites legais) as contribuições segundo uma sistemática de

antecipação do imposto de renda, sendo que a incidência, quando do resgate ou recebimento

da aposentadoria, poderá ocorrer segundo a sistemática de imposto de renda definitivo (no

Regime Regressivo de Tributação), isto é, não compensável com outros rendimentos e

despesas incorridos pelo mesmo contribuinte.

Assim, enquanto o valor deduzido do imposto de renda anual (quando da

realização das contribuições para o plano) pode ser submetido a ajuste na declaração anual,

em que se deveria apurar o montante de renda efetivamente auferida pela pessoa física e o

imposto efetivamente devido à União, conforme discorrido anteriormente, a importância

retida no retorno dos recursos (inclusive principal, que não corresponde à renda tributável)

pode não ser considerada para tal ajuste, caso o participante tenha optado pelo Regime

Regressivo de Tributação.

Por fim, mas não menos importante, tem-se que a imposição de restrições

bastante rígidas para a dedução das contribuições, especialmente as das pessoas físicas,

segundo descrito anteriormente, em contrapartida à ampla e irrestrita tributação de todo o

valor pago pelo plano de previdência complementar aos participantes e beneficiários, gera,

sem sombra de dúvidas, a incidência do imposto de renda sobre parcela do patrimônio das

pessoas físicas.

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Isto porque, mesmo não conseguindo realizar a dedução das contribuições –

por ter ultrapassado o limite de 12% dos rendimentos tributáveis anuais, ou por nem mesmo

apurar rendimentos tributáveis no ano em que as contribuições foram pagas, ou ainda por não

contribuir para o regime geral da previdência social ou para o regime próprio de previdência

dos servidores públicos –, o imposto de renda incidirá na fonte sobre a totalidade dos valores

recebidos do plano de previdência complementar, ou seja, sobre a parcela dos rendimentos

gerados durante a permanência dos recursos no plano de previdência complementar e sobre

parcela do principal (patrimônio do contribuinte).

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CONCLUSÕES

8.1 Desde a reforma introduzida pela Emenda Constitucional nº 20/98, o sistema

previdenciário brasileiro é composto por três vertentes: o regime geral da previdência social, o

regime próprio dos servidores públicos e o regime da previdência complementar, o qual pode

ter caráter público – cujos planos são instituídos por lei, para os servidores do ente que os

instituir – ou privado – no qual os planos são acessíveis a qualquer pessoa física e contratados

livremente, observados apenas os limites previstos em lei.

8.2 Especificamente quanto a este último, a Constituição Federal de 1988

assegura a sua organização enquanto regime autônomo, facultativo e complementar à atuação

estatal no âmbito da previdência pública. Assim, a previdência complementar privada tem por

finalidade proporcionar um mecanismo adicional de proteção social àqueles que atingem a

fase de inatividade laboral.

8.3 Por se tratar de um regime previdenciário regido pelo direito privado, apenas

os particulares que tenham formalizado sua inscrição junto à entidade de previdência

complementar estarão abrangidos pela previdência complementar privada. Tal inscrição

pressupõe que os benefícios assegurados pelo plano de previdência privada serão concedidos

na medida e forma contratadas formalmente, mediante manifestação da vontade das partes. A

participação do Estado restringe-se à fiscalização e ao controle da observância de normas

gerais aplicáveis à relação contratual instaurada.

8.4 Nos planos de previdência privada, o custeio dos benefícios é realizado

exclusivamente por contribuições dos participantes (pessoas físicas) e dos patrocinadores

(pessoas jurídicas), se houver. Não há, por parte do Estado, qualquer prestação ou

contraprestação, complementando ou suplementando o custeio das reservas dos participantes

no plano.

8.5 Segundo previsão da referida Lei, a previdência complementar privada é

operada exclusivamente pelas entidades fechadas de previdência complementar, pelas

entidades abertas de previdência complementar e pelas sociedades seguradoras do ramo vida.

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São elas pessoas jurídicas de direito privado, instituídas por livre iniciativa, sem qualquer

imposição por parte de qualquer órgão público.

8.6 Tais pessoas jurídicas operam os planos de benefícios de caráter

previdenciário, os quais podem estar organizados sob a modalidade “benefício definido”,

“contribuição definida” ou “contribuição variável”. O plano de “benefício definido” é aquele

em que o benefício complementar é estabelecido no momento da adesão do participante com

base em valores pré-fixados ou em fórmulas de cálculo previstos em regulamento;

“contribuição definida” é a modalidade de plano em que o benefício complementar é

estabelecido apenas no momento da sua concessão, com base no montante das contribuições

previamente fixadas e vertidas ao plano durante a fase contributiva; e o plano da modalidade

“contribuição variável” é aquele cujos benefícios programados apresentem a conjugação das

características de ambas as modalidades.

8.7 Os planos de benefícios são contratados por participantes e/ou

patrocinadores.

8.8 Participante é a pessoa física que adere ao plano de benefícios,

independentemente de participar do custeio do plano de benefícios. Não pode o participante

ser pessoa jurídica, pois a natureza jurídica dos benefícios assegurados pelo plano é

previdenciária, e, com isso somente pode beneficiar pessoas físicas. As pessoas jurídicas

podem, sim, participar da relação jurídica instaurada no âmbito de um plano de previdência

privada, mas na qualidade de patrocinador; jamais como beneficiário ou participante.

8.9 Para participar da relação jurídica instalada no âmbito da previdência

privada, a pessoa jurídica patrocinadora deverá guardar vínculo jurídico de natureza

empregatícia ou associativa com o participante. Ou seja, ela somente pode participar do plano

para custear contribuições em favor de seus empregados, dirigentes ou associados, ou

arrecadar e repassar contribuições dos próprios participantes (contribuições essas que sejam

descontadas diretamente da remuneração a ser recebida em razão do trabalho).

8.10 Diferentemente do regime geral da previdência social, os planos privados

asseguram a possibilidade de resgate das contribuições realizadas no plano em que a pessoa

física é participante. Nos planos de previdência complementar privada, o resgate permite o

saque de recursos acumulados pelo participante, antes do gozo da aposentadoria. Ou seja, é o

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instrumento que possibilita o recebimento dos recursos acumulados pelo participante, antes do

início do pagamento do benefício contratado.

8.11 Para se analisar o pagamento de benefícios e resgates em planos de

benefícios por entidades de previdência complementar privada como fato jurídico tributável

pelo imposto de renda, há que se verificar, primeiramente, a extensão da incidência do

referido segundo a sua previsão constitucional, examinando-se a competência tributária para

sua instituição, a sua limitação material e os princípios constitucionais que a informam.

8.12 A competência tributária conferida à União pelo artigo 153, inciso III, da

Carta Magna, para instituir imposto sobre a renda, já contém de forma embutida, o “auferir

renda” como materialidade do tributo, a União como sujeito ativo, “aquele que auferir renda”

como sujeito passivo, o valor da renda como base de cálculo e percentuais progressivos dessa

renda como alíquota, não sendo facultado ao legislador ordinário federal extrapolar esses

limites a fim de alcançar fatos jurídicos que não guardem correlação com este arquétipo

tributário constitucional.

8.13 Por força do princípio da capacidade contributiva e do princípio da

progressividade, as alíquotas do imposto de renda deverão ser progressivas, sendo mais altas,

tanto maior seja a renda auferida pelo indivíduo. E a renda, para estes fins, também objeto é

da aplicação do princípio da capacidade contributiva, na medida em que corresponderá à base

de cálculo do imposto, líquida da dedução das despesas necessárias, realizadas pelo indivíduo.

Tais critérios devem ser observados mesmo em se tratando de imposto com característica

extrafiscal.

8.14 Em razão do princípio de vedação ao confisco, a tributação da renda deve

levar em consideração, como limitação de incidência, a razoabilidade e a garantia aos direitos

fundamentais dos cidadãos, como o da livre iniciativa, bem como garantir o mínimo

existencial.

8.15 Baseado neste perfil constitucional, a renda constitucionalmente passível de

tributação corresponde: (i) ao produto da atividade de aplicação do patrimônio ou da

realização de operações, e não ao valor da operação realizada ou do patrimônio aplicado;

assim considerados os (ii) resultados positivos auferidos pelo sujeito passivo; apurados (iii)

após a dedução da parcela investida ou a perda incorrida, e dos gastos necessários à sua

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subsistência ou à manutenção da fonte produtora da renda (resultado líquido); (iv) excluindo-

se qualquer forma de reposição patrimonial.

8.16 Em relação à regra-matriz do imposto de renda, partindo-se da estruturação

lógica da hipótese de incidência tributária, tem-se que: (i) o seu critério material corresponde

aos resultados líquidos auferidos como produto do capital, do trabalho, de ambos (renda) ou

decorrente de qualquer outra forma de acréscimo patrimonial (proventos); (ii) o seu critério

espacial é o território nacional, sendo passível de tributação a renda adquirida por pessoa nele

residente ou paga por fonte produtora ou pagadora nele localizada; (iii) o seu critério temporal

é a disponibilidade jurídica ou econômica da renda, após o período mínimo estabelecido por

lei como exercício fiscal, sendo possível apenas antecipações do imposto de renda, antes de

findo o este período, se passíveis de compensação e ajuste quando da apuração do imposto

devido ao final do mesmo exercício fiscal; (iv) o seu critério pessoal, de um lado, a União

(sujeito ativo), e, de outro, o titular da disponibilidade da renda e dos proventos de qualquer

natureza (contribuinte) e a sua fonte pagadora (responsável tributário); e (v) o seu critério

quantitativo o resultado positivo líquido (base de cálculo) e percentuais progressivos

(alíquota).

8.17 Em decorrência desse conteúdo da norma-padrão de incidência do imposto

de renda, é possível afirmar que o referido tributo alcança o comportamento de se auferir

renda e proventos, assim considerados os resultados positivos líquidos que correspondam a

acréscimos patrimoniais decorrentes do capital, do trabalho, de ambos ou de outra origem;

renda e proventos estes adquiridos no território nacional, tidos como aqueles que sejam

auferidos por pessoa aqui localizada, ainda que a fonte pagadora esteja fora das fronteiras

geográficas do país, sendo considerados tributáveis tais “renda e proventos” quando

disponíveis jurídica ou economicamente, ao final de cada período mínimo (anual ou

trimestral), cabendo à União o direito de exigir tal imposto de toda e qualquer pessoa, física

ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, ressalvadas as situações de

imunidade, sobre a base de cálculo que represente uma renda (ou provento) líquida(o) de

despesas, a partir da(o) qual se aplica alíquota fixada de forma progressiva.

8.18 A tributação, pelo imposto de renda, dos resgates e benefícios recebidos dos

planos de previdência complementar privada, está baseada em um regime de diferimento do

ônus financeiro do imposto. Tal sistemática de tributação está calcada na autorização para

dedução, na apuração da base de cálculo do imposto de renda devido, dos valores investidos

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em planos de previdência privada, e, em contrapartida, quando do recebimento de recursos do

plano, o imposto de renda incide sobre o montante integral, correspondente à parcela investida

somada aos rendimentos acumulados durante o período de investimento.

8.19 A dedução das contribuições vertidas para o plano de previdência

complementar privada, pela pessoa física, somente é permitida se: (i) a contribuição for

destinada a custear benefícios em plano de previdência próprio ou para seus dependentes

fiscais; (ii) não ultrapassar o limite de 12% dos rendimentos tributáveis anuais; (iii) houver

contribuição para o regime geral da previdência social ou para regime próprio de previdência

social dos servidores públicos (exceto aposentados por estes regimes), e, nos casos de

contribuição em favor de dependentes fiscais maiores de 16 anos, estes também contribuam

para o regime previdenciário estatal.

8.20 As contribuições vertidas para o plano de previdência complementar

privada, pela pessoa jurídica, em favor de seus empregados e dirigentes, por sua vez, podem

ser deduzidas na apuração da base de cálculo do imposto de renda, desde que não excedam,

em cada período de apuração, ao equivalente a 20% do total dos salários dos empregados e da

remuneração dos dirigentes da empresa, vinculados ao referido plano.

8.21 Atualmente, os rendimentos e ganhos de capital auferidos nas aplicações

financeiras com os recursos acumulados nos planos de previdência complementar encontram-

se isentos da incidência do imposto de renda.

8.22 Quando do resgate ou recebimento de benefícios de aposentadoria, o

imposto de renda incide sobre a totalidade dos valores recebidos – principal e rendimentos

produzidos durante o período em que os recursos foram mantidos no plano.

8.23 O imposto de renda, sobre tais resgates e benefícios, poderá ser calculado

segundo o Regime Progressivo de Tributação ou de acordo com o Regime Regressivo de

Tributação, à escolha do participante.

8.24 No Regime Progressivo de Tributação, os resgates e benefícios pagos pelos

planos de previdência complementar sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte

com base na tabela progressiva vigente à época da ocorrência do fato jurídico tributável, cuja

alíquota máxima é 27,5%. O imposto de renda retido sob esses moldes é passível de

compensação quando da apuração do devido no respectivo ano-calendário, pela pessoa física.

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8.25 Já o Regime Regressivo de Tributação consiste na aplicação de alíquotas

regressivas do imposto de renda (de 35% a 10%), segundo o tempo em que os recursos são

mantidos no plano de previdência complementar – quanto maior o prazo da aplicação dos

valores, menor a alíquota do imposto. O imposto de renda, retido na fonte pela entidade de

previdência privada, é considerado como definitivo, não integrando o ajuste na Declaração

Anual do imposto de renda da pessoa física.

8.26 Há casos previstos na legislação em que se assegura a isenção do imposto de

renda para os benefícios e resgates recebidos dos planos de previdência complementar. Nesses

casos, porém, a regra de isenção é aplicável independentemente da opção de regime de

tributação efetuada pelo participante do plano de benefícios.

8.27 Contrapondo-se o perfil jurídico do imposto de renda ao regime de

tributação atualmente aplicável aos recursos destinados aos planos de previdência

complementar, verifica-se não ser possível, em alguns casos, apurar uma efetiva postergação

do ônus financeiro do imposto de renda, como pretendido pelo legislador federal. Nesses

casos, haverá verdadeira tributação sobre o patrimônio (valor principal destinado no plano) e

não apenas sobre a renda (rendimentos gerados durante a fase de acumulação).

8.28 Tal situação somente não irá ser constatada nos casos em que as

contribuições aportadas no plano sejam deduzidas na exata medida da tributação incidente

sobre os benefícios e resgates ulteriores, ou se a tributação destes ocorrer em alíquota inferior

àquela aplicável sobre a dedução das contribuições. Nos demais casos, o imposto de renda

incide, efetivamente sobre todo o valor recebido, inclusive sobre a devolução do patrimônio

(valor principal – contribuições) investido – em descompasso com a vedação para tributação

da reposição patrimonial.

8.29 O Regime Regressivo de Tributação, na medida em que pressupõe a fixação

de alíquotas regressivas do imposto de renda independentemente da base de incidência desse

tributo, acarreta ofensa ao princípio da capacidade contributiva.

8.30 Mesmo considerando que este critério de incidência tem caráter extrafiscal,

em se tratando de imposto de renda, a extrafiscalidade somente poderá ser exercida se a

hipótese de incidência atingida contemplar a capacidade contributiva e a progressividade.

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8.31 No Regime Regressivo de Tributação, além de a base de cálculo do imposto

não permitir a dedução de despesas inerentes à sobrevivência do indivíduo, as alíquotas

chegam a alcançar 30% e 35% do valor recebido da entidade de previdência privada, e o

imposto de renda apurado pela aplicação destas alíquotas é considerado como definitivo, e,

portanto, incide independentemente da dedução das contribuições realizadas ao plano. Esses

elementos, se somados, podem acarretar a tributação, pelo imposto de renda, de uma parcela

bastante significante da renda efetivamente auferida pelo contribuinte no período; e, com isso,

ensejar a caracterização deste tributo como de efeito confiscatório.

8.32 Não havendo compatibilidade entre o elemento submetido à incidência do

imposto de renda pela legislação que disciplina a tributação dos planos de previdência

complementar – a não ser nos casos em que se possa deduzir a totalidade das contribuições

efetuadas para o plano de benefícios, e que o imposto de renda incida com base na tabela

progressiva – e a “renda” (aí incluídos os proventos) passível de tributação pelo imposto de

renda, há, de fato, não apenas um problema de constitucionalidade, mas também de

legalidade.

8.33 A base de cálculo do imposto de renda incidente sobre os resgates e

benefícios recebidos de planos de previdência complementar é ilegal, exceto nos casos em

que se possa deduzir a totalidade das contribuições efetuadas para o plano de benefícios, e que

o imposto de renda incida com base na tabela progressiva do imposto de renda ou nos casos

em que a dedução seja maior que a própria incidência do imposto (benefício fiscal). Isto

porque, em todos os demais casos, parte do patrimônio investido no plano de benefícios por

meio de contribuições – que, por certo, não é acréscimo patrimonial, mas o próprio capital

investido – estará sendo submetido à incidência do imposto.

8.34 Além disso, o contribuinte pode deduzir (se cumpridos todos os rígidos

limites legais) as contribuições segundo uma sistemática de antecipação do imposto de renda,

sendo que a incidência, quando do resgate ou recebimento da aposentadoria, poderá ocorrer

segundo a sistemática de imposto de renda definitivo (no Regime Regressivo de Tributação),

isto é, não compensável com outros rendimentos e despesas incorridos pelo mesmo

contribuinte.

8.35 Ademais, a imposição de restrições bastante rígidas para a dedução das

contribuições, especialmente as das pessoas físicas, segundo descrito anteriormente, em

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contrapartida à ampla e irrestrita tributação de todo o valor pago pelo plano de previdência

complementar aos participantes e beneficiários, acarreta a incidência do imposto de renda

sobre parcela do patrimônio das pessoas físicas.

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