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RevistaDiscentedoProgramadePós-GraduaçãoemHistóriaSocialCultura(PUC-Rio)
ANIMA Ano V – nº6 – 2015 história, teoria & cultura
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OPersonagemeseuModelo:aficcionalizaçãodeLukácsporThomasMannemAMontanhaMágica
KaioFelipe[DoutorandoemSociologia–IESP/UERJ]
FELIPE,K.OpersonagemeseuModelo:aficcionalizaçãodeLukácsporThomasMannemAMontanhaMágica.
RevistaAnima.AnoV,n°6,2015,p.19-40.
Resumo
GeorgLukácsproduziuvastacríticaliteráriasobreasobrasdeThomasMann;nosentidoinverso,emseuro-
manceAMontanhaMágica,ManncriouopersonagemLeoNaphta,dotadodeumaideologiaparadoxalmente
revolucionáriaetradicionalista,sugerindoumaapropriaçãodopensamentodeLukács,queatémeadosdos
anos1920caracterizava-seporum“romantismoanticapitalista”.Esteartigopretendeinvestigarestaficcionali-
zaçãooperadaporMannemAMontanhaMágica,deformaacompreendercomocertosaspectosdavisãode
mundolukacsianaforamapropriadosparacriarNaphta.
Palavras-chave:sociologiadacultura,intelelectuais,literaturaalemã.
Abstract
GeorgLukácsproducedvastliterarycriticismontheworksofThomasMann;inreverse,inhisnovelTheMagic
Mountain,ManncreatedthecharacterLeoNaphta,paradoxicallyendowedwitharevolutionaryandtraditiona-
listideology,suggestinganappropriationofthethoughtofLukacs,whountilthemid-1920swascharacterized
byan"anticapitalistromanticism”.ThispaperintendstoinvestigatethisfictionalizationdevelopedbyMannin
TheMagicMountain,inordertounderstandhowcertainaspectsoftheLukácsianworldviewwereappropria-
tedtocreateNaphta.
Keywords:SociologyofCulture;Intellectuals;Germanliterature.
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IntroduçãoDois dos mais destacados pensadores do século XX foram o filósofo Georg Lukács
(1885-1971)eo romancistaThomasMann (1875-1955).Oprimeiroéconsideradoumdos
principaisexpoentesdomarxismoocidental,11graçasàobraHistóriaeConsciênciadeClasse
(1923),alémdeterinfluenciadomuitosestudosemestéticaecríticaliteráriaatravésdeen-
saioscomoATeoriadoRomance(1916);porsuavez,Manncriouobrasmarcadaspelaele-
gânciaformalepeladensidadefilosófica,destacando-seanovelaAMorteemVeneza(1912)
eosromancesAMontanhaMágica(1924)eDoutorFausto(1947).
Ambosdesenvolveramtrajetóriasintelectuaisquetêmemcomumumasúbitatransi-
ção ideológica entre as décadas de 1910 e 1920. Inspirado pela Revolução Russa, Lukács
abandonouo idealismode toques kierkegaardianosde seusprimeirosescritosemprolde
umadefesahegeliano-marxistadosocialismo,efiliou-seaoPartidoComunistaHúngaro.Jáo
romancistaalemão,apósaPrimeiraGuerraMundial,migroudeumconservadorismoapolí-
ticoedecadentistaparaumhumanismodemocrático,tornando-seassimumdosprincipais
(eraros)intelectuaispúblicosdeseupaísaapoiaraRepúblicadeWeimar(1918-33).
NestemesmoperíodoLukácseManncomeçaramadesenvolverumamútua influên-
cia:ocríticotinhaemaltaconsideraçãoaformacomquecontoscomoTonioKröger(1903)
lidavamcomaproblemática relaçãoentreartistae sociedade; jáo romancista se inspirou
emensaiosdohúngaroemAAlmaeasFormas(1911)paraescreversuanovelaAMorteem
VenezaeseulongoensaioConsideraçõesdeumApolítico(1918).Nosanosseguintes,mes-
mo o profundo distanciamento político-ideológico entre ambos não impediu que Lukács
continuasseaelegerManncomoumdosmaioresescritoresdesuaépoca,equeestede-
monstrassegratidãopelasinterpretaçõesdeseucrítico.
Opropósitodesteartigoécapturarummomentodecisivodarelaçãoentreambos:a
formacomoManntomouLukácscomoinspiraçãoparacriarLeoNaphta,umsoturnoperso-
11Vertentedopensamentomarxistacaracterizadapelaepistemologiahumanística(equepassaporumacríticadonaturalismocientificista),peloforteinvestimentonacríticacultural(tantodaarteeruditaquantodaculturademassa)epeloecletismoconceitual(cf.MERQUIOR,1987,p.19).NatradiçãodomarxismoocidentalháumamescladasanálisesdeMarx(1818-1883)comafilosofiadeHegel(1770-1831)e,nocasodaEscoladeFrank-furt,comasociologiadeGeorgSimmel(1858-1918)eMaxWeber(1864-1920)Dentreosprincipais“marxistasocidentais”podemsercitados,alémdeLukács,AntonioGramsci (1891-1937),MaxHorkheimer (1895-1973),HerbertMarcuse(1898-1979)eTheodorAdorno(1903-1969).
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nagemdeseuromanceAMontanhaMágicaqueapresentaideiasparadoxalmenterevoluci-
onáriasetradicionalistas.Essaficcionalizaçãopoderiaseridentificada,porexemplo,nofato
deNaphtaseraomesmotempo jesuítaecomunista,nessesentidorepresentandooasce-
tismoeoanseioporordemdeLukács,críticocontundentedaartemodernaedadecadência
moraldasociedadeburguesa.
Cabeinvestigar,portanto,seManninspirou-senopensamentodeLukácsapósacon-
versão deste aomarxismo, em1918, oumesmona visão demundo da fase pré-marxista
destepensador;alémdisso,tambémpretendoanalisarseoutrosmodelos intelectuais(Eu-
genLeviné,ErnstBlocheCarlSchmitt)tambémpodemserassociadosaNaphta.
Aolongodoartigodialogo,comoscamposdasociologiadosintelectuaisedacríticali-
terária.Seumladoéprecisoapresentarascondiçõessociaisehistóricasemqueoautorde
AMontanhaMágicaeseucríticoestavaminseridos,poroutrocabeumainterpretaçãomais
imanente (masnão formalista) deste romance;nesse sentido, descrevoa seguir de forma
sucintaométodoficcionaldeThomasMann,emaisadianteanalisoodiscursodopersona-
gemNaphta,deformaarastrearsuasposiçõespolíticasefilosóficas.
OestilorealistadeThomasMann
SegundoocríticoMiklósSzabolcsi,Mannpodeserconsideradoumescritorfiliadoao
realismo.Szabolcsiconsiderarealistas“asobrasdeartequeevocamostraçosessenciaise
espelhamastendênciasbásicasdarealidadesocial,utilizandoasmáximaspossibilidadesde
consciênciasocialdasuaprópriaépoca”;alémdisso,otípicoescritorrealista“acreditaser
capazdeabrangeromundo,emsuatotalidadeouemsuaspartes,apartirdeumpontode
vistaexterno,compreendendo-lheasrelações”(SZABOLCSI,1990,pp.109-110).
É preciso, no entanto, qualificar esse realismo: a “totalidade” almejada porMann é
irônica;istoé,oautorestáconscientedacrisedatradiçãonaqualseancora:desdeosseus
primeirosromancesháumaatmosferadedecadência,comorevelamosmalogradosesfor-
çosdepersonagenscomoGustavAschenbach(AMorteemVeneza)paraenfrentaroesgo-
tamentodos ideaisformativoseafragmentaçãodaprópriaalma.Aquestãoéque,apósa
PrimeiraGuerraMundial,arevoluçãodeMuniqueem1919eocomeçoturbulentodaRe-
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públicadeWeimar,Manndeixoudeapostaremsoluçõesesteticistaseapolíticasparaessa
criseculturaleadotouumaposturamaisfirmeemproldatradiçãohumanística.
UmaconsequênciaformaldessanovavisãonocasoespecíficodeAMontanhaMágica
éotommaisfilosóficodosdiálogosentreospersonagens;écomoseaverborragiadasdis-
cussões fosse uma formade apontar a incessante busca pela Bildung (formação cultural),
porumareflexãosobreaexperiênciaquepermitisseumamadurecimentomoraleintelectu-
al. ThomasMann, portanto, cria personagens cujo processo formativo é necessariamente
problemáticoefragmentado,porquereflexodeumaépocainstável:
O romance tem intenção pedagógica, mas não é um Bildungsroman (ro-mancepedagógico)clássico.Nãoháheróiquenasequênciadaobrapassas-sepelaecoladavida,moldando-seatravésdelaousendomoldadoporela.HansCastorpéoopostodeFaustoouWilhelmMeister.(...)Aintençãope-dagógica(...)consisteemofereceràconsciênciadoleitoroselementospa-raoseuprópriopercursofenomenológico.NessesentidoaMontanhaMá-gicapodeserconsideradaumBildungsromandenovaqualidade,cujoheróiseriaopróprioleitor(FREITAG&ROUANET,1975,p.35).
Alémdisso,oprópriorecursoàironiatemumafunçãopedagógica(cf.REED,1974,p.
14),poisserveparadesestabilizarascertezasdoleitorquantoaocaráterdospersonagens,
namedidaemqueestessãoapresentadosemtramasoudiálogosnosquaissua“seriedade”
ou“coerência”épostaemxequedeformasutiledesconcertante.
ThomasMann,aodescreverseumétodorealista,dizqueoescritortemliberdadear-
tísticapara,apartirdo“materialreal”,operarum“atodetranscendência”euma“absorção
subjetiva”,atravésdasquaiscadadetalhesocialoupsicológicoépercebidonaquiloquetem
decaracterísticoetípico.Comisso,háumprocessodeapropriaçãonoqualaquiloquefoi
observadooriginalmente(istoé,a“realidade”)setornaapenasum“meiodeexposiçãode
umaideia,umaexperiência”(MARCUS,1987,p.57).
AindadeacordocomJudithMarcus,épossívelestabelecerumaanalogiaentreafor-
macomoManncria seuspersonagens comaquiloqueMaxWeber (1864-1920) concebeu
comotiposideais:decertamaneira,aquelessãoacentuaçõesanalíticasdeumoumaispon-
tosdevista,quepassamporuma“transformaçãopoética”.Ouseja,osromancesdeThomas
Mannteriamacapacidadedetornarvisívelaessênciademovimentos,direçõeseideologias
desuaépoca(cf.Ibidem,pp.66-67).
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AMontanhaMágica,nessesentido,éumdosromancesmaiscomplexosericosdeste
autor;ésimultaneamenteumaautobiografiaespiritual,umaalegoriaintricada,umromance
histórico,umareflexãosobreotempoe,porfim,conformevimosacima,umrepresentante
heterodoxodoBildungsroman.Emborasejaemalgunsaspectosumaparódiadestegênero
literário,emoutrosépossívelperceberumalúcidatomadadeposiçãodeMannemdefesa
dohumanismo(cf.REED,1974,p.226).
O protagonista deste romance éHans Castorp, um jovemengenheiro que visita um
primoenfermoemumsanatórionosAlpessuíços,edescobrequetemtuberculose;diante
dessediagnóstico,acabatendodepassarseteanosdesuavidanolocal.Durantesuaesta-
dia,Castorpaprendemaissobresimesmoeomundoàsuavolta,epartedeseuamadure-
cimentovemdasintensasdiscussõescomdoispedagogos:LodovicoSettembrini,umliberal,
republicanoeapólogodoprogressodacivilização,eLeoNaphta,sobrequemnosdeteremos
deformamaisminuciosa.
Naptha,oprofetadoTerror
UmdospersonagensmaisintrigantesdeAMontanhaMágica,Naphtaédefamíliaju-
dia,tendonascidonaEuropaoriental,maisespecificamentenafronteiraentreaGalíciaea
Volínia.12Seupai,umfanáticoreligioso,caiuemdesgraçaporsua“irregularidadesectária”e
foicruelmenteassassinadoemummotimpopular.Estatragédiamarcouprofundamentea
vidadeNaphta,quepassousuaadolescênciaabsorvidoemangústiasintelectuais:“absorto
emsombrioseamargospensamentossobreoseudestinoefuturo”,eleformava“oseues-
píritodemodoimpacienteedescontrolado”(MANN,2000,p.603).Suatendênciacríticae
cética, suapaixãopela lógicaesuadialéticaafiadao levaramaentraremconflitocomos
rabinosdesuacomunidade.
OjovemNaphtasóencontrouoseu lugarnomundoquandoseconverteuàCompa-
nhiadosJesuítas,graçasaumpadrequeconheceunumparque.Emsuaânsiadeabsoluto,
viaaIgrejaRomanacomoumapotêncianobreeespiritual,“contráriaàrealidadehostildo
mundo,eportantorevolucionária”(Ibidem:606).Naphta,contudo,nãoconseguiuprogredir
12AtualmenteestaregiãoestádivididaentreaPolônia,aBielorrússiaeaUcrânia.
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naOrdemgraçasà suasaúde frágileaoseu intelecto inquieto–pormaisquebuscassea
tranquilidadeascéticaquelevariaao“completoembotamentodavidaindividual”,as“ope-
raçõesespirituais”odebilitavam(cf. Ibidem,p.608).Comisso,tevequesemudarparaos
Alpes,ondesetornouprofessordeLatimnoginásioparaalunostuberculosos.
Aconversãodojudaísmoaocristianismoéapenasumadasváriasfacetasquemar-
camopensamentode LeoNaphta.Durante sua juventudeele tambémsimpatizou como
socialismo,queconheceugraçasaumdeputadodaregiãoeseufilho.Alémdisso,tinha“um
desejoapaixonadodeelevar-seacimadaesferadesuaorigem”(Ibidem,p.603).Segundoo
narrador, “Naphta tinha um instinto aomesmo tempo revolucionário e aristocrático; era
socialistaetambémdominadopelosonhodeparticipardeumaformadevidasoberba,dis-
tinta,exclusivaeordenada”(Ibidem,p.605).
Aolongodoromance,Naphtatravaconstanteseintensosembatesintelectuaiscom
Settembrini.Comsuaretóricaperigosamenterefinada,Naphtamuitasvezesapelaparaar-
gumentosrelativistas,dizendoque“verdadeiroéoqueconvémaohomem”,poisohomem
“representaamedidadascoisas,esuasalvaçãoéocritériodaverdade”(Ibidem,p.543).
Aotentardefini-loideologicamente,onarradornosdizqueNaphta“talvezfossetão
revolucionárioquantooSr.Settembrini,masoeranosentidoconservador,comorevolucio-
náriodoconservantismo” (Ibidem,p.627;grifosmeus).Estadefiniçãoépertinentediante
das fortescríticasqueNaphta fazaosvaloresburgueses:paraele,aEuropacapitalistaera
umsistemacondenadoàruína(cf.GOLDMAN,1992,p.140);emconversacomSettembrini,
chegaacolocaraLiberdadecomoumprincípioultrapassadoeatémesmoanacrônico:
...se acredita que o resultado das revoluções vindouras será a liberdade,iludiu-seredondamente.Oprincípioda liberdadecumpriuoseudestinoechegouaserantiquadonosúltimosquinhentosanos.(...)Todasasorgani-zaçõesverdadeiramenteeducadorassouberamsempreoqueemrealidadedeveseroúltimoobjetivodapedagogia:aautoridadeabsoluta,aobrigaçãodeferro,adisciplina,osacrifício,arenúnciaasipróprio,odomíniodaper-sonalidade.(...)Osegredoeaexistênciadanossaeranãosãoalibertaçãoeodesenvolvimentodoeu.Oqueelanecessita,oquedeseja,oquecriaráé–oterror(MANN,2000,pp.545-546).
NaphtacontémtodasasantinomiasculturaissobreasquaisMannhaviaponderado;
eleéadialéticaencarnada.Alémdisso,expressaahostilidademedieval,russae–eisuma
ironia–anti-semitapelausurae,porconseguinte,docapitalismo(cf.HEILBUT,1997,p.411).
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Alémdisso,estepersonagemexaltaa“vida”enquantoexpressãomáximadaKultur:13rejeita
oindividualismoburguêsepregaumaespéciedeholismocomunitário–ouseja,alivrede-
dicaçãodo“eu”ao“todo”.Paraopersonagemjesuíta,sóépossívelserlivreseintegrandoà
coletividade,pormeiodaautoidentificaçãodo indivíduocomum idealholístico. Esta tese
aparece,porexemplo,quandoNaphtaalegaque:
...a liberdadeeraumconceitodoRomantismoantesdoquedaÉpocadasLuzes,poiscomaqueletinhaemcomumoentrelaçamentoinextricáveldosimpulsos de expansão coletiva e do ensimesmamento apaixonadamenteindividualístico(MANN,2000,p.957).
Naphta também prega um coletivismo cristão e socialista: sua pregação ascética da
submissão do indivíduo à coletividade ganha ares demissão política quando ele coloca o
socialismocomoaúltimaexpressãodafécristã,atribuindoumsentidoreligiosoàRevolução
eàditaduradoproletariado.Apropósito,estafacetasocialistadopersonagemseráporme-
norizadamaisadiantenesteartigo.
Ummomentodaobraemquesetornaexplícitaavisãodemundotãorevolucionária
quantoreacionáriadestepersonageméquando,diantedaacusaçãodeSettembrinidede-
fender“umamoraleconômicaàqualsãoinerentesaservidãoeoaviltamentodapersonali-
dadedohomem”,Naphtarespondecategoricamente:“oprimeiropassoemdireçãoàver-
dadeira liberdade e humanidade seria abandonar essemedo covarde da ideia de reação”
(Ibidem:552).
TrêspossíveismodelosparaNaphta:Leviné,SchmitteBloch
AcombinaçãoexplosivadeideologiasdeNaphta,assimcomoasdescriçõestãominu-
ciosaserealistasdotipofísicoeintelectualdopersonagem,sãofatoresqueparecemsugerir
orecursoaalgummodelovivo;poroutrolado,éprecisoreconhecerqueesseefeitodeve-
rossimilhançaétípicodoestilorealista,semqueoautornecessariamentepreciseseancorar
13OconceitodeKulturremontaaopensamentodeHerder(1744-1803),oqualtrazumaênfasenasingularida-de,na individualidadehistórica.Kulturrefere-se,portanto,aumpadrãodevidaparticular,emúltimaanálisenãoimportável,centradoemprodutoshistóricosespecíficos“significativos”,maisdoqueempotencialidadesgerais.Esteconceitoevoca,portanto,umaacepçãohistoricistadacultura,“coletivaenãopessoal,expressivaenãoperfectiva,(...)empiricamentedadaaoinvésdeideal-normativa”(MERQUIOR,1997,pp.49-50).
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emumafigurahistóricadelimitida.Detodaforma,sobreoprocessodecriaçãodopersona-
gemNaphtacabedizerquedesdeoiníciodacomposiçãodoromanceThomasManntinhaa
intençãodecriardoiseducadorescomoexpoentesde“experiênciaseideias”(cf.MARCUS,
1987,pp.59-60).Mannimaginavaumduelopedagógicoentreumhumanistaeprogressista
eummísticoreacionário;contudo,osegundodestespersonagenssetornoumaiscomplexo
doqueerapensadoaprincípio.
Em1919,diantedarevoluçãooperáriaemMunique,oautorse impressionoucoma
“misturaexplosivaderadicalismointelectualjudeuedemisticismocristãoeslavo”ecomos
“elementosrusso-quiliasto-comunistas”(LÖWY,2008,p.90).AefêmeraRepúblicaSoviética
naBavária,tevecomoumdeseuslíderesEugenLeviné(1883-1919),umemigrantejudeuda
altaclassemédiadeSãoPetersburgo.Socialistaeutópicoporexcelência,elerepresentava
umtipoderevolucionárioaristocrático,semelhanteaRobespierremasdiferentedeLênin,
EngelseoutrospregadoresdarevoluçãoproletárianoséculoXX:Leviné(e,comoveremos,
tambémLukács)portavaavisãodemundosegundoaqualhomenssábiosestãodispostosa
mostraraatitudeapropriadacomorespostaàfalsaatitudedasmassas.Outracaracterística
dessesrevolucionáriosaristocráticoséoseuascetismo:estavamsempreprontosparaosa-
crifício.Leviné,antesdeserexecutado,dissequeoscomunistaseram“homensmortosem
sursis”(MARCUS,1987,pp.78;120-121).ÉplausívelqueManntenhausadoalgunsaspectos
destelíderrevolucionárioparacriarNaphta,nosentidodequeopersonagemdeixoudeser
simplesmenteumreligiosoconservadorparaganharumaideologiamaisambígua.
OutrointelectualdaépocaquepodeserassociadoaojesuítadeAMontanhaMágica,
devidoaoseuconservadorismodetom“decisionista”,paradoxalmenteantimodernoerevo-
lucionário, é Carl Schmitt (1888-1985). Quando questionado por Pierre-Paul Sagave sobre
esta possível inspiração para a figura deNaphta,Mann alegou que apenas ouviu falar de
Schmitt,nãotendochegadoaleralgodesteautornaépocadaescritadoromance(cf. Ibi-
dem:63);porém,certostextosdeSchmittnadécadade1920–dentreelesumcomosuges-
tivonomeCatolicismoRomanoeFormaPolítica(1923)–sugeremcertassemelhançasentre
seupensamentopolíticoeodeNaphta,aindaquenãointencionais.Exemplodissoéquando
Schmittafirmaqueocatolicismopossuiuma“forçacriadoraracional”que“dáumadireçãoà
escuridãoirracionaldaalmahumana,semlevá-laàforçaatéaluz.Elanãodá,comooracio-
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nalismotécnico-econômico,receitasparaamanipulaçãodamatéria”(SCHMITT,1985apud
FERREIRA,2004,p.28).
OfilósofoErnstBloch(1885-1977)tambémpodeseraproximadodeNaphta;emam-
bosseencontraria“aassociaçãojudaísmo/catolicismo/comunismo,aarticulaçãoentrecris-
tianismomedieval e revolução bolchevista, de umponto de vista judeu” (LÖWY, 2008, p.
88). Não há, contudo, nenhum traço de sua obra ThomasMünzer, Teólogo da Revolução
(1921)nabibliotecadeThomasMann;assimcomoSchmitt,aaproximaçãoaquiémaissuge-
ridapeloscomentadores(nocaso,MichaelLöwy)doqueporintençãoexplícitadoescritor.
Breveinterlúdiosobreoromantismoanticapitalista
Saindodessescasosparticularesparaumaconsideraçãogeral,épertinente ressaltar
queopróprioZeitgeistdosanos1920permitiaasassociações religiosase ideológicasque
caracterizavamNaphta:judeu-jesuíta,jesuíta-comunistaejudeu-comunista.Sobreasegun-
dadessasmesclas,oescritorRobertMusil(1880-1942)chegouadizerqueerauma“ironia
construtiva”traçarsemelhanças,aindaquedesconcertantes,entreumclérigoeumbolche-
vique, pois issopermitia o aparecimentoda “verdadenuae crua”: a disciplinamilitar e o
fervorquecaracterizatantooscristãosascéticosquantoosrevolucionáriosrussos(cf.MAR-
CUS,1987,p.112).Jáaassociaçãoentrejudaísmoecomunismoganhouforçaprincipalmen-
te depois dos experimentos revolucionários emBerlim, Budapeste eMunique, emque se
destacaram lideranças de etnia judaica como Leviné, Rosa Luxemburgo (1871-1919), Béla
Kun (1886-1939) e o próprio Lukács; aliás, esta associação entre semitismo e comunismo
aindaserviriaparaaargumentaçãoracialistadonascentePartidoNacional-Socialista.
SegundoMichaelLöwy,“Naphtarepresentaotipo idealdoromânticoanticapitalista,
e,emparticular,daversãojudiadessacorrentecultural”(LÖWY,2008,p.96).Esteroman-
tismorevolucionário-utópicorecusatanto“ailusãoderetornoàscomunidadesdopassado”
quantoa“reconciliaçãocomopresentecapitalista”,eprocuraumasaídana“esperançado
futuro”;nessacorrente,“anostalgiadopassadonãodesaparece,massetransmudaemten-
sãovoltadaparaofuturopós-capitalista”(Ibidem,p.16).
Uma fórmula capaz de resumir a visão demundo romântico-revolucionária foi dada
porninguémmenosqueLukács,aoanalisarDostoiévski(1821-1881)emumensaiode1943:
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...omundocriadoporDostoiévskiconfundecaoticamenteosideaispolíticosdopróprioautor.MasessemesmocaoséaverdadeiragrandezadeDostoi-évski,oseupossanteprotestocontratudoaquiloqueéfalsoenegativonasociedadeburguesamoderna.(...)Osseusheróisdefinemessequadroco-mo“idadeáurea”,eodescrevemcomoosímbolomaispoderosodesuasaspiraçõesmaisprofundas. (...)OspersonagensdeDostoiévskisabemqueisso,emseutempo,nãopassadeumsonho:maselesnãopodemnemque-remseparar-sedessesonho. (...)A instintiva, selvagemecegarevoltadospersonagens(...)dirige-sesempreparaaquelaidadeáurea(LUKÁCS,1968,p.173).
EstadigressãosobreDostoiévskiésurpreendentementereveladorasobreoromantis-
moanticapitalistaque iluminaaobrade juventudedopróprio Lukács.Basta lembrarque,
emATeoriadoRomance,opensadorhúngarodemonstracertopessimismoculturalaocon-
ceberoromancecomo“epopeiadeummundoabandonadoporDeus”(Idem,2009,p.89);
porém, há um veio utópico quando afirma que as obras dos russos Tolstoi (1828-1910) e
Dostoiévski desvelampotencialidades não só estéticas,mas tambémpolíticas; enfim, per-
tencemaumnovomundo(cf.Ibidem,p.160).Destaforma,tambémemLukács“aidadede
ourodopassado(...)iluminaocaminhoparaofuturo”(LÖWY,2008,p.30).
GeorgLukács:messianismoeânsiapeloabsoluto
AdespeitodaspossíveisaproximaçõesquepodemserfeitasentreopersonagemNa-
phtacomaspectosdavisãodemundodeLeviné,SchmitteBloch,ahipótesecentraldamai-
oriadosestudiososquantoàinspiraçãodeThomasMannparacriarestepersonagemdeA
MontanhaMágicarecaisobreafiguradeGeorgLukács.
JoséGuilhermeMerquior(1941-1991),porexemplo,afirmaemOMarxismoOcidental
(1986)queoretratoliteráriomaisconhecidodeLukácséum“fascinante,maspoucosimpá-
ticopersonagem”:Naphta,“ojesuítavermelho”(MERQUIOR,1987,p.136).Emsuaerrante
necessidadedeabsoluto,LukácsapresentavaoqueMann,pormeiodeNaphta,descreveu
como“umtremendoanelodeautoridade”(Ibidem,1981,p.158).
Merquior provavelmente baseou esta hipótese em Leszek Kolakowski (1927-2009),
queemsuaobraMainCurrentsofMarxism(1976)teceaseguinteconsideraçãosobreoper-
filintelectualdeLukács:
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LukácsisdepictedinliteratureastheJesuitNaphtainThomasMann'sTheMagicMountain: ahighly intelligent characterwhoneedsauthority, findsit,andrenounceshisownpersonalityforitssake.Lukácsinfactwasatrueintellectual,amanofimmenseculture(…),butonewhocravedintellectualsecurityandcouldnotenduretheuncertaintiesofascepticalorempiricaloutlook. In the Communist party he foundwhatmany intellectuals need:absolutecertaintyindefianceoffacts,anopportunityoftotalcommitmentthatsupersedescriticismandstillseveryanxiety.Inhiscase,too,thecom-mitmentwassuchastoafforditsownassuranceoftruthandinvalidateallotherintellectualcriteria(KOLAKOWSKI,1978,p.306).
DefatoatrajetóriaintelectualdeLukácséturbulentaerepletadesobressaltos.Desde
seusprimeirosescritossobreestéticaépossívelperceber“asmaistensaseintensasconota-
çõesexistenciais”(MERQUIOR,1987,p.94).OsensaiosreunidosemAAlmaeasFormassão
marcadosporumaantíteseentre“a‘vida’–equiparadaamilrelaçõescontingentesecarac-
terizadapelafaltadeautenticidade–ea‘alma’,fontedealtasescolhasexistenciais,tentan-
doimporsentidoàmerafaticidadedasimplesexistência”(Ibidem,p.94).
O jovem Lukács, portanto, tem seu pensamento marcado por uma nostalgia pelos
temposqueaperfeiçãoeraumacoisa “natural”,emque se faziaagrandearte “ingenua-
mente”,combinando-seperfeitamentecomavida.JánestaetapaLukácsémarcadoporum
conservadorismoestético,nosentidodeumagranderejeiçãodosrumosdaartemoderna.O
artistahodierno,segundoLukács,nãoconseguesedisciplinar,estandoentregueasimesmo,
a “umadança triunfalbêbadaeorgiásticadaalmapelas florestas imprevisíveisdas sensa-
çõesanímicas”(LUKÁCS,2015,p.100).
EmumprefácioautocríticoqueescreveuparaaTeoriadoRomanceem1962,Lukács
definiuretrospectivamenteasimesmocomoum“anticapitalistaromântico”,alegandoque
esteensaio,escritoentre1914e15,eraumaexpressãodeseu“desespero”diantedaEuro-
paemmeioàPrimeiraGuerraMundial.Lukácsrecorda-sequenaépocaseperguntava,em
umtomapocalíptico:“Quemnossalvadacivilizaçãoocidental?”(Idem,2009,pp.7-18).
PoucosanosdepoisLukácsseredimiudamelancoliaedopessimismodesuasprimei-
ras obras,masmanteveo viés utópico e a busca por uma redenção escatológica. Emno-
vembrode1918,apósmuitohesitar,decidiudeformasúbitaingressarnoPartidoComunis-
ta,epoucosmesesdepoissetornouComissáriodoPovoparaaCulturaeaEducaçãoname-
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teóricarepúblicasoviéticanaHungria.Pregandooengajamentototalemnomedeumamo-
raldosacrifício,omessiânicoenfimencontrouoseumessias.
AindaqueestepensadortenhaencontradonoPartidoComunistaalgopróximodaor-
dem e estabilidade pela qual tanto ansiava, suas colisões com outros comunistas foram
constantes,apontodeLêninoacusarde“radicalismodeesquerda” jáem1920(cf.MAR-
CUS,1987,p.121).Apesardisso,emsuaobraHistóriaeConsciênciadeClasseLukácsoscila
entreaheterodoxiateórica(consideravaqueateoriamarxistatinhavalidadehistórica,con-
trariandoassimavulgatamarxista),masortodoxiapolítica;opensadorhúngarobuscoufa-
zer“davitóriadoleninismoamoladeumaelucidaçãodanaturezafilosóficadomarxismo”
(MERQUIOR,1981,p.158).EisumdosváriostrechosdeHistóriaeConsciênciadeClasseque
revelamessetomsoteriológico:
Somenteaconsciênciadoproletariadopodemostrarasaídaparaacrisedocapitalismo.Enquantonãoexistiressaconsciência,acriseserápermanen-te, retornaráao seupontodepartida, repetiráessa situaçãoatéque, (...)apósinfinitossofrimentoseterríveisatalhos,aliçãopedagógicadahistóriaconcluioprocessodaconsciêncianoproletariadoecoloca-lhenasmãosaconduçãodahistória(LUKÁCS,2003,pp.183-184;grifosnooriginal).
SegundoMerquior,amisturademarxismoecríticaculturalromânticaemLukács,as-
sim como sua argumentação “apresentadamais por asserção do que por qualquer lógica
demonstrativa”(MERQUIOR,1987,p.114),tiveramumefeitodeletérionomarxismocomo
heurísticasociológica,poisotransformaramemuma“‘visãodemundo’carregadadedog-
matismoegirandoemtornodeumamitologiadeconsciênciadeclasse” (Ibidem,p.132).
Baseando-se em Kolakowski,Merquior afirma que a conseqüência imprevista disso que é
queoromantismoearejeiçãodaciênciaedaindústria(associadasàreificaçãocapitalista)
“deramàobradeLukácsopoderdedesvendarameduladamitologiamarxista(...).Lukács
revelouoromantismoocultodoprópriomarxismo”(Ibidem,p.133;grifosmeus).
Sendoassim,nosprimeirosanosda fasemarxistadopensamentodeLukácsaindaé
possível perceber uma continuidade com o romantismo anticapitalista de sua juventude;
pode-seafirmarqueaguinadaideológicadeLukácsconsistiunatransposiçãodeseuidealde
harmoniadodomínioestéticoparaodomíniopolítico.(cf.VANDENBERGHE,2012,p.353).
NaépocadesuaconversãoaomarxismoLukácsacreditavaqueoobjetivosupremodosocia-
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lismo era a substituição da realidade presente por uma “forçamaior” que corresponda à
“dignidadedohomem”,eissoerauma“questãomoral”(MARCUS,1987,p.145).Oabsoluto
étransformado,emvida,nopossível;ouseja,a“utopianostálgica”dojovemLukácssecon-
verteemumavisãodemundoquesatisfaziaseudesejoporuma“transcendência imanen-
te”,porumaharmoniaterrena.
Lukács,portanto,buscavaincessantementeo“sentidodavida”,amoralabsolutadas
coisaseacontecimentos.Enquantoesforçodeclarificaçãodosentidoedireçãodouniverso
social,suaobra–e,consequentemente,adeváriosautoresligadosaomarxismoocidental
que inspirou–descendediretamentedoculturalismoexistencialdeAAlmaeasFormase
TeoriadoRomance.EsseelementoécrucialparaentenderLukácseseusherdeiros,porque
demonstra,demododecisivo,“queoânimosoteriológicoportrásdomessianismorevoluci-
onáriodomarxismoocidentalnasceudosmesmosimpulsosromânticoseirracionalistasque
motivaram a ruptura da arte moderna com a sociedade liberal e a civilização industrial”
(MERQUIOR,1981,pp.159-160;grifosnooriginal).
LukácseNaphta:ascetismoeabordagemreligiosadocomunismo
Adespeitodo intensodiálogo intelectualquedesenvolveramao longodequatrodé-
cadas, ThomasMann e Georg Lukács se encontraram pessoalmente apenas uma vez, em
Viena,noanode1922.Tiveramumaconversanaqual trataramdaproblemática situação
éticadaarte, istoé,de suamissãoe função. Lukácsexpôsas suas teorias,asquaisMann
achoudeumaabstraçãoquaseinquietantequeseconfundiacomapurezaeanobrezainte-
lectual(cf.BRODE,1975,p.131).
Naépocadoencontro,MannestavatrabalhandoemumcapítulodeAMontanhaMá-
gica,chamado“MaisAlguém”,emquefoiintroduzidoopersonagemLeoNaphta,cujafigura
foiretratadasegundoumparadigmafísicoeintelectualquemuitolembraLukács.Asseme-
lhançasnãosãoapenasfísicas(porexemplo,onarizaduncoeoslábiosfinos),mastambém
étnicas(osdoissãojudeus),ideológicas(ambossãocríticosdaburguesiaedefendemarevo-
luçãocomunista)eaténomododeargumentação(marcadopelaabstraçãoepelorigordia-
lético).OfatodeosenhoriodeNaphtaeSettembrinisechamarLukacekparecereforçar,de
forma sarcástica, essa inspiração (cf. Ibidem, p. 132). AnthonyHeilbut ressalta categorica-
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menteoparentescoentreopensadorhúngaroeNaphta: “Emsuaextrema feiúrae argu-
mentação implacável ele émodelado emGyörgy Lukács, cujos poderes persuasivos eram
taisque‘enquantoelefalava,eleestavacerto’”(HEILBUT,1997,p.411).
EntreoselementosqueconectamestepensadorhúngaroeopersonagemdeAMon-
tanhaMágicatambémpodemserelencadosalgunsdecunhobiográfico.Pesa,porexemplo,
ofatodequeThomasManneraamigodopaidofilósofohúngaro,quechegoualhepedir
paradissuadirseufilhodaperigosavidarevolucionáriaqueestavavivendo;aliás,estefoium
dospretextosparaoencontroentreambosem1922.Mannpossivelmente se inspirouna
famíliadeLukácsparacomporatensarelaçãoentreNaphtaesuamãeeirmãos,assimcomo
orespeitosorelacionamentocomopai(cf.MARCUS,1987,p.82).
Ocomponente“lukacsiano”destepersonagempode,contudo,serencontradodefor-
mamaisprecisaedecisivanãoemsuahistóriadevidaouemsuafisionomia,massimem
suapersonalidade,emseuaspectoespiritual,intelectual.TantoNaphtaquantoLukácscom-
partilhamaaspiraçãoporformasmaisnobresdeexistência;aéticalukacsianabuscasuperar
adeKant(1724-1804),consideradainsatisfatóriaelimitadaàesferado“ordinário”edo“co-
tidiano”. A verdadeira ética estaria baseada no “milagre, graça e salvação” (cf. Ibidem, p.
137).Dentreostraçoscompartilhadosporambos,contudo,osdoisprincipaissãooascetis-
moeaabordagemreligiosadocomunismo(cf.Ibidem,pp.105-106).
Sobre o comportamento ascético, cabe dizer que já em seu ensaio sobre Theodor
Storm(1817-1888),emAAlmaeasFormas,Lukácslouvavaoartistaquesededicaintegral-
menteaotrabalho.Oestilodevidaburguêspossuioaspectode“umtrabalhoforçado,de
umahediondaservidão(...)queimpõeafirmedisciplinadotrabalhoaosseusentusiastas”
(LUKÁCS,2015,p.100);aliás,nestepontoopróprioThomasMannseidentificacomLukács.
Hánoartistaburguês(bürger),cujo“tipoideal”éStorm,adorexistencialdeumromântico
tardio;eleécaracterizadopelarenúncia,resignaçãoeautodisciplina.Lukács,portanto,pro-
fessaumascetismoradical:arteevidaintelectualpressupõemumdistanciamentodeuma
“vidafracassadaearruinada”(Ibidem,p.100).
MannseinspirounesseensaiodeLukácsparafazeraapologiadoascetismoburguês
emConsiderações de umApolítico: identificou-se com a preponderância do ético sobre o
estético,davida sobreaobra,daordemsobreoestadodeânimo,doduradouro sobreo
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momentâneo,dotrabalhoserenosobreagenialidade(cf.MANN,1978,pp.123-124).Pode-
seiralémeafirmarqueManncompõearigidezquedefineocaráterdeLeoNaphtatambém
a partir domodelo lukacsiano. Há neste personagem, assim como no pensador húngaro,
umaaspiraçãopor“dogma”,por“existênciaregrada”–nocasodeLukács,pelaadesãoao
PartidoComunista;emNaphta,atravésdavidaestruturadanumainstituiçãojesuíta.
O narrador deAMontanhaMágica traça uma interessante comparação de Naphta
comJoachim,umsoldadodoexércitoalemãoqueéprimodoprotagonistaHansCastorp:
Cadaqualdosdoisdeviaolharcomsimpatiaaprofissãodooutroeperce-beroparentescoestreitoqueexistiaentreelaeaprópria.Eramcastasmili-tares,tantoumacomooutra,eissosobmuitosaspectos,odoascetismoeodahierarquia,odaobediênciaeodopundonorespanhol.Esseúltimode-sempenhavaumpapel importantíssimonaordemdeNaphta,que tinhaasuaorigemnaEspanha(...).MasoqueosmundosdeNaphtaeJoachimti-nhamemcomum,antesdemaisnada,eraarelaçãocomosangueeoaxi-omadequenãosedevia impediramãodederramá-lo(MANN,2000,pp.610-612).
Aautodisciplinadopersonagemjesuítalhedavaumelementoheróicoqueédescrito
comosua“coragem”–eoatosupremodecorageméseusuicídio,nopenúltimocapítulode
AMontanhaMágica.Quando seuduelopedagógico comSettembrini chega ao ápice,Na-
phtaapelaparaahonradeseuadversárioeodesafiaparaumduelodearmas.Odesfecho
nãopoderiasermaistrágico:
–Osenhoratirouparaoar–disseNaphta,controlando-se,enquantobai-xavaaarma.Settembrinireplicou:–Euatirocomoquero.–Atireosenhornovamente.–Nempensonisso.Agoraéasuavez.(...)–Covarde!–bradouNaphta,ecomessegritohumanoadmitiuqueerapre-cisomaiorcoragemparaatirardoqueparaservirdealvo.Levantouentãoapistoladeummodoquenadamais tinhaemcomumcomumcombate,edescarregou-anaprópriacabeça(MANN,2000,p.972).
Naphta,portanto,morreuna“horacerta”,justoquandoqueria;aautodestruiçãovem
quando,vencidopelaenfermidade,“confessa”queosesforçosdeautonegaçãoerecusaà
vidaforamemvão.Sólherestaentãoosacrifício(cf.MARCUS,1987,pp.123-127).
OascetismodeLukácstambémflertoucomotemadosuicídio,oquenãosurpreende
dadaaagoniaexistencialquemarcousuavidaeobranadécadade1910.Osuicídiodesua
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amante IrmaSeidler (1883-1911) teveum impactodevastadoremseupensamento, inspi-
randodiretamenteoensaioDapobrezadoespírito:umdiálogoeumacarta(1911).Eisum
trechododiálogoemqueosuicídiodeSeidlerganhaumcomponentedegesto,dedecisão
existencial,inspirandoaprópriacontinuidadedaempreitadaintelectualdeLukács:
Masagoratudoestáclaro;essedesfechosemsentido,absurdo,essacatás-trofe sem tragédia, é, paramim,uma sentençadivina.Retiro-meda vida.Assimcomonafilosofiadaarteapenasogêniotemodireitodeexistir,navidaapenasohomemagracidadopelabondadedeveriapoderexistir.(...)Osuicídioéumacategoriadavida,eeuestoumortojáfaztempo.(...)Poris-sosuamortesetornouumasentençadivinaparamim.Elatevedemorrerparaqueminhaobraseconsumasse,paraquenãomerestassemaisnadanomundoforaminhaobra(LUKÁCS,2015,p.256).
Quantoàrelaçãoentrereligiosidadeecomunismo,caberessaltar,emprimeirolugar,
queThomasMann,emapenasumaconversa(e,éclaro,lendoosescritosestéticosdohún-
garo), conseguiu captaro caráter religiosode Lukácse transpô-loemNaphta.Manncom-
preendeuacontinuidadeentreosdiferentes“estágiosvitais”deLukács:oestético,oéticoe
opolítico (cf.MARCUS,1987,p. 132).A influênciadeErnstBloch levouopensamentode
Lukácsparaumadireçãoutópica;MartinBuber(1878-1965)oinspirouadaraesseelemen-
toutópicoumacoloração religiosaeatémessiânica.Nesse sentidopode-seafirmarquea
“etapaética”deLukácscomeçaem1915,portantoécontemporâneaàescritadaATeoria
doRomance(cf. Ibidem,pp.132-133)–algoque,comovimos,éexplícitonocapítulofinal,
sobreosescritoresrussoseo“novomundo”quepermitemvislumbrar.
Emsegundolugar,tantoLukácsquantoNaphtaestãoconvictosdanecessidadedacru-
eldade,dosacrifíciohumanoparaofimescatológico,sejaeleaglóriadeDeusoua“totali-
dade imanente”. Se emO bolchevismo como problemamoral (1918), ensaio escrito uma
semanaantesdesuaconversãoaomarxismo,Lukácsaindanãocompartilhavada“aceitação
metafísicaqueépossível extrair obemdomal, queépossível (...) chegar à verdadepela
mentira”(LUKÁCS,1975apudMACHADO,2004,p.148),poucodepoiselepassouaacreditar
que, “para sealcançaronovomundo,énecessário sacrificar-se– ‘deumaéticamística à
cruelRealpolítica’”(MACHADO,2004,p.150).QuantoaNaphta,emumadesuasconversas
comSettembrini,opersonagemjesuítalhecriticao“individualismoliberal”eo“absolutismo
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esclarecidodoeu”,edefendeaiminênciade“ideiassociaismenosefeminadas,(...)ideiasde
disciplinaededocilidade,decoaçãoedeobediência”(MANN,2000,pp.620-622).
Emterceiro,épossívelestabelecerumparaleloentresuasconversões.Naphtasupe-
rousuacriseexistencialapóssefiliaràCompanhiadosJesuítas;concebiaa IgrejaRomana
como“umapotêncianobreeespiritual,querdizerantimaterial,contráriaàrealidadehostil
domundo,eportantorevolucionária”(Ibidem,p.605;grifosmeus).Porsuavez,Lukácsen-
controunomarxismoumarespostaparaasdúvidasangustiantesquepermeiamsuaobrade
juventude.Nessesentido,consideravatalvisãodemundocomoalgomaisqueumaciência
social:eraumareligião,econsequentemente implicavaemumsacrificium intelectus.Esse
fervorpodeserencontrado,porexemplo,emsuadefesadométododialético:
Emmatériademarxismo,aortodoxiaserefereanteseexclusivamenteaométodo.Ela implicaaconvicçãocientíficadeque,comomarxismodialéti-co, foiencontradoométodode investigaçãocorreto,queessemétodosópóde ser desenvolvido, aperfeiçoado e aprofundado no sentido dos seusfundadores(...).Essaconcepçãodialéticadatotalidade(...)éoúnicométo-docapazdecompreenderereproduzirarealidadenoplanodopensamento(LUKÁCS,2003,pp.64;78-79;grifosmeus).
Emquartolugar,LukácscompartilhacomaféjudaicaanoçãodeumDeusdominante
e justo; assim comoNaphta, acredita que, ao fazer a “escolha correta”, o indivíduo pode
sacrificar“seueuinteriornoaltardaidéiaelevada”.Sendoassim,seurigoréticoquebeirao
fanatismo e suamoral de convicção (“os fins justificam osmeios”) têm como corolário a
convicçãodequeaviolênciaénecessáriaemcertas“situaçõestrágicas”,emprolda“salva-
çãodasociedade”(cf.MARCUS,1987,pp.139-140;146).Umdeseusprimeirosensaiosmar-
xistas,TáticaeÉtica(1919),evocaumavisãovoluntaristadapolítica:“Poisadecisãoprecede
ofato.Quemreconhecearealidade–entendidanosentidomarxiano–éamoenãoescravo
dosfatosvindouros”(LUKÁCS,2005apudVEDDA,2012,p.47;grifosnooriginal).
Porfim,éinteressantenotarcomotantoo“jesuítavermelho”daficçãoquantoo“an-
ticapitalistaromântico”davidarealsãomarcadosporumintensomessianismo;bastalem-
brar,deumlado,aadesãoespetaculardeLukácsaocomunismo;dooutro,Naphta,emuma
daspassagensmaisdesconcertantesdeAMontanhaMágica,dissertaemumtomprofético
sobrearevoluçãosocialistacomorestauraçãodoImpériocristão:
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...oproletariadodomundo,hojeemdia,opõeahumanidadeeoscritériosdaCidadedeDeusàdepravaçãoburguesa-capitalista.Aditaduradoprole-tariado,essaexigênciadesalvaçãopolíticaeeconômicadosnossostempos,temosentido(...)deumaab-rogaçãotemporáriadoconflitoentreoespíri-toeopoder sobo signodacruz,o sentidodese triunfar sobreomundodominando-o, (...)o sentidodoReino. (...)Oproletariado retomouaobradeGregório; sente arderno seu íntimoo zelopiedosodo grandepapae,como ele, tampouco poderá impedir as suas mãos do derramamento desangue.Sua incumbênciaéespalharo terrorparaa salvaçãodomundoeparaaconquistadoobjetivodaredenção,queéarelaçãofilialcomDeus,sem a interferência do Estado e das classes (MANN, 2000, p. 550; grifosmeus).
Estetrechodeixaexplícitaarelaçãoentreopersonagemeseumodelo.Naphtaviaa
“salvaçãodomundo”comoamissãodoproletariado,eestatambémeraademandamarxis-
tasupremadeLukács;o“terror”édefinidoporamboscomoumatoreprovável,masverda-
deiro e tragicamentemoral.Nesseponto as noções lukacsianas e os pronunciamentos de
Naphtasetornampraticamenteidênticos(cf.MARCUS,1987,p.147).
ArelaçãoentreNaphtaeLukácséquestionadaporHanspeterBrode,paraquemare-
laçãodopersonagemcomopensadorhúngaroseria“esquemáticaesuperficial”(cf.BRODE,
1975,p.132), afinalopersonagem tem ideias cristãs, conservadoraseaténiilistasque se
distinguemfortementedafilosofiadahistóriahegeliano-marxistaàqualLukácsaderiu.Bro-
de,porém,citaumacartaemqueThomasMannconfessaarelaçãoentreNaphtaeLukács
emumacartaaseuamigoMaxRychner,em1947:“Lukácsdealgumamaneirameaprecia(e
aparentementenãosereconheceunafiguradeNaphta)”(Ibidem,p.132).
ThomasMann,contudo,emoutrasocasiõesnegouainspiração,edissequeoperso-
nagemerafrutodesuaimaginação–oqueestariaevidentenapeculiarmisturadejesuitis-
mo e comunismo. Lukács não se reconheceu publicamente como o personagem; em seu
ensaioÀprocuradoburguês (1945)chegouadefinirNaphtacomo“porta-vozdeumacos-
movisãoreacionária,fascistaeantidemocrática”.(LUKÁCS,1945apudBRODE,1975,p.132)
EmumaentrevistaaJudithMarcus,contudo,opensadorhúngaroadmitiununcaterdúvidas
de queo personagemdeAMontanhaMágica tinha alguns aspectos “emprestados” dele,
mesmoquedeformairônica(MARCUS,1987,pp.63-65).ApartirdessaafirmaçãodeLukács,
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Marcusafirmaquesófoiapartirdaqueleencontrode1922queManndeuformaaNaphta;
foigraçasàquelaúnicaconversaqueoescritorviueouviuopersonagem(cf.Ibidem,p.69).
Conclusão
Nesteartigoprocureiargumentarque,emborasejapossível traçaranalogiasentreo
personagem Leo Naphta de AMontanha Mágica com figuras como Carl Schmitt e Ernst
Bloch,ainterpretaçãomaisconsistenteapontaparaumaficcionalizaçãodeGeorgLukács.
É verdadeque se podediluir essa inspiração alegando, tal comoMichael Löwy, que
Naphtanãoseassemelhaanenhummodeloreal,pois“representaotipoidealdoromântico
anticapitalista,e,emparticular,daversãojudiadessacorrentecultural”(LÖWY,2008,p.96).
Quando,contudo,nosdeparamoscomo“coquetelexplosivodemessianismoutópico,defé
escatolológica, de anticapitalismo romântico, de moralismo revolucionário” (VANDEN-
BERGHE,2012,p.362)quehánaobradeLukácsentreasdécadasde1910e1920,édifícil
acreditarqueThomasMann(que,comovimos,leuváriosensaioseconheceupessoalmente
opensadorhúngaro)nãotenhaaproveitadopelomenosalgunsaspectosdapersonalidadee
dopensamentodeLukácsparaconceberNaphta.
Talvezumdosmaiscontroversospersonagens intelectuaisdoséculoXX,Lukácsvivia
umapersistentebuscaporumasaídadavidacotidianaparaalcançaruma“verdadeira”rea-
lidade.Seusescritosdejuventudesãomarcadosporuma“concepçãoéticaelitistaeesteti-
zante”(cf.MACHADO,2004,pp.147-150),aqualémantidamesmodepoisde1918,quando
finalmenteencontraoseusentidoexistencialnoengajamentopelarevolução.
LeoNaphtaé tão revolucionárioquantoLukács,e tãoavessoàmodernidadequanto
ele.Hádiferençasnosdetalhes,masquenoextremotambémseassemelham:deumlado
temos um judeu convertido ao cristianismoque leva seu desespero existencial às últimas
consequências,ecometesuicídiocomosefosseumatoheróico;dooutro,temosumateue
marxistaque, frustradocomos impassesdaartemodernaecomadecadentemoralidade
burguesa, resolve suaprofundaangústia intelectual sacrificandoo seu intelecto, comuma
conversãoreligiosaaomarxismo.
Lukács,portanto,encarnoucomoninguémodramaexistencialdaintelectualidadedo
séculoXX:as ideologiasestéticasepolíticassãosucedâneasdasreligiões.Porsuavez,Na-
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phta é umanotável expressão literária desses radicalismos ideológicos, tanto reacionários
quanto revolucionários. Mais do que isso: o “jesuíta comunista” deAMontanhaMágica
tambémencarnouoniilismoqueacometeuboapartedessaintelligentsia:“a‘transcendên-
cia’tematizadanafiguradeNaphtapermanece(...)nanegatividade.Nãoindicaumaforma
desobreviveràsintempériesdonossotempo”(FREITAG&ROUANET,1975,p.47).Ohuma-
nistaSettembrini,seurival,certavezapontouparaHansCastorposperigosespirituaisque
acarretavamocontatocomaquelaestranhafigura:“Suaformaélógica,massuanaturezaé
confusão”(MANN,2000,p.555).Omesmotalvezsepossadizerdopensadorhúngaro...
ÉprecisoreiterarqueThomasMannnãoconheciaostextosdafasemarxistadeLukács
quandoestavaescrevendoAMontanhaMágica;sóhavialidoAAlmaeasFormaseATeoria
doRomance(cf.MARCUS,1987,p.63).Issodemonstraaforçavisionáriacomquecaptouas
possibilidades inerentesnotiporeligiosodo jovemLukács,poiscriouumpersonagemcuja
defesa do comunismo, povoada por um tommessiânico e soteriológico, assemelha-se de
forma intrigantecomadopensadorhúngaro.Otomparadoxalmentenostálgicoeutópico
quecaracteriza,porexemplo,osensaiosdeAAlmaeasFormaspermitiramàintuiçãopoéti-
cadeMann,assimqueconheceupessoalmenteesteensaísta,terminardecomporumretra-
toficcionalintrigante,noqualpolítica,éticaereligiãosemesclamcomfervornumpersona-
gemque,décadasdepois,aindapodeservistocomoumanotávelalegoriadasturbulências
ideológicasquemarcaramaEuropaeomundonoséculopassado.
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ANIMA Ano V – nº6 – 2015 história, teoria & cultura
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