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MEC Ministério da Educação INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira O Plano de Desenvolvimento da Educação: razões, princípios e programas Fernando Haddad* * Ministro da Educação. Brasília-DF 2008

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MECMinistério da Educação

INEPInstituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

O Plano de Desenvolvimento da Educação:razões, princípios e programas

Fernando Haddad*

* Ministro da Educação.

Brasília-DF2008

© Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep)É permitida a reprodução total ou parcial desta publicação, desde que citada a fonte.

ASSESSORA DE EDITORAÇÃO E PUBLICAÇÕESLia Scholze

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

Haddad, Fernando.O Plano de Desenvolvimento da Educação : razões, princípios e programas / Fernando Haddad. –

Brasília : Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2008.

23 p. – (Série Documental. Textos para Discussão, ISSN 1414-0640 ; 30)

1. Política da educação. 2. Fundamentos da educação. 3. Métodos de ensino. I. Título. II. Série.

CDU 37.014(81)

Sumário

O Plano de Desenvolvimento da Educação:razões, princípios e programas

1 RAZÕES E PRINCÍPIOS DO PLANO DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO .......... 5

2 O PLANO DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO COMO PROGRAMA DE AÇÃO .. 9

2.1 EDUCAÇÃO BÁSICA ..................................................................................................... 9

2.1.1 FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PISO SALARIAL NACIONAL .................. 9

2.1.2 FINANCIAMENTO: SALÁRIO-EDUCAÇÃO E FUNDEB .................................... 10

2.1.3 AVALIAÇÃO E RESPONSABILIZAÇÃO: O IDEB ............................................... 11

2.1.4 O PLANO DE METAS: PLANEJAMENTO E GESTÃO EDUCACIONAL ........... 13

2.2 EDUCAÇÃO SUPERIOR ............................................................................................... 15

2.2.1 REESTRUTURAÇÃO E EXPANSÃO DAS UNIVERSIDADES FEDERAIS:REUNI E PNAES .................................................................................................. 15

2.2.2 DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO: PROUNI E FIES........................................ 16

2.2.3 AVALIAÇÃO COMO BASE DA REGULAÇÃO: SINAES .................................... 17

2.3 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA ....................................................... 18

2.3.1 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E EDUCAÇÃO CIENTÍFICA: O IFET ................ 18

2.3.2 NORMATIZAÇÃO ................................................................................................. 19

2.3.3 EJA PROFISSIONALIZANTE ............................................................................... 20

2.4 ALFABETIZAÇÃO, EDUCAÇÃO CONTINUADA E DIVERSIDADE ............................ 20

3 O PLANO DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO COMO HORIZONTEDO DEBATE SOBRE O SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ....................................... 22

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1 Constituição Federal de 1988, art. 3º.

1 Razões e Princípios do Plano deDesenvolvimento da Educação

A concepção de educação que inspira oPlano de Desenvolvimento da Educação (PDE),no âmbito do Ministério da Educação, e queperpassa a execução de todos os seus programasreconhece na educação uma face do processodialético que se estabelece entre socialização eindividuação da pessoa, que tem como objetivo aconstrução da autonomia, isto é, a formação deindivíduos capazes de assumir uma postura críticae criativa frente ao mundo. A educação formalpública é a cota de responsabilidade do Estadonesse esforço social mais amplo, que não sedesenrola apenas na escola pública, mas tem lugarna família, na comunidade e em toda forma deinteração na qual os indivíduos tomam parte,especialmente no trabalho. A escola pública e, emum nível mais geral, a política nacional deeducação exigem formas de organização quefavoreçam a individuação e a socializaçãovoltadas para a autonomia. O PDE é mais umpasso em direção à construção de uma respostainstitucional amparada nessa concepção deeducação. Os programas que compõem o Planoexpressam essa orientação.

Indo além, o objetivo da política nacionalde educação deve se harmonizar com osobjetivos fundamentais da própria República,fixados pela Constituição Federal de 1988:construir uma sociedade livre, justa e solidária;garantir o desenvolvimento nacional; erradicar apobreza e a marginalização e reduzir asdesigualdades sociais e regionais e promover obem de todos, sem preconceitos de origem, raça,sexo, cor, idade e quaisquer outras formas dediscriminação”1. Não há como construir uma

sociedade livre, justa e solidária sem umaeducação republicana, pautada pela construçãoda autonomia, pela inclusão e pelo respeito àdiversidade. Só é possível garantir o desenvol-vimento nacional se a educação for alçada àcondição de eixo estruturante da ação do Estadode forma a potencializar seus efeitos. Reduzirdesigualdades sociais e regionais se traduz naequalização das oportunidades de acesso àeducação de qualidade.

O PDE oferece uma concepção deeducação alinhada aos objetivos constitucio-nalmente determinados à República Federativado Brasil. Esse alinhamento exige a construçãoda unidade dos sistemas educacionais comosistema nacional – o que pressupõe multiplicidadee não uniformidade. Em seguida, exige pensaretapas, modalidades e níveis educacionais nãoapenas na sua unidade, mas também a partir dosnecessários enlaces da educação com aordenação do território e com o desenvolvimentoeconômico e social, única forma de garantir atodos e a cada um o direito de aprender até ondeo permitam suas aptidões e vontade.

O enlace entre educação e ordenaçãoterritorial é essencial na medida em que é noterritório que as clivagens culturais e sociais,dadas pela geografia e pela história, seestabelecem e se reproduzem.Toda dis-crepância de oportunidades educacionais podeser territorialmente demarcada: centro eperiferia, cidade e campo, capital e interior.Clivagens essas reproduzidas entre bairros deum mesmo município, entre municípios, entreestados e entre regiões do País. A razão de serdo PDE está precisamente na necessidade deenfrentar estruturalmente a desigualdade de

O Plano de Desenvolvimento da Educação:razões, princípios e programas

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oportunidades educacionais. Reduzir desi-gualdades sociais e regionais, na educação,exige pensá-la no plano do País. O PDE pre-tende responder a esse desafio através de umacoplamento entre as dimensões educacionale territorial operado pelo conceito de arranjoeducativo. Não é possível perseguir a eqüidadesem promover esse enlace.

O enlace entre educação e desenvolvimentoé essencial na medida em que é por meio dele quese visualizam e se constituem as interfaces entrea educação como um todo e as outras áreas deatuação do Estado. Não importa a abrangência doterritório considerado, o bairro ou o país. A relaçãorecíproca entre educação e desenvolvimento sóse fixa quando as ações do Estado são alinhadase os nexos entre elas são fortalecidos,potencializando seus efeitos mútuos. Dessemovimento de busca de sintonia das políticaspúblicas entre si depende a potencialidade dosplanos setoriais, inclusive o educacional, quepassam, nesses termos, à condição de exigênciado desenvolvimento econômico e social, garantindo-se que o todo seja maior que a soma das partes.

O PDE, nesse sentido, pretende ser mais doque a tradução instrumental do Plano Nacional deEducação (PNE), o qual, em certa medida,apresenta um bom diagnóstico dos problemaseducacionais, mas deixa em aberto a questão dasações a serem tomadas para a melhoria daqualidade da educação. É bem verdade, como severá em detalhe a seguir, que o PDE também podeser apresentado como plano executivo, comoconjunto de programas que visam dar conseqüênciaàs metas quantitativas estabelecidas naquelediploma legal, mas os enlaces conceituaispropostos tornam evidente que não se trata, quantoà qualidade, de uma execução marcada pelaneutralidade. Isso porque, de um lado, o PDE estáancorado em uma concepção substantiva deeducação que perpassa todos os níveis emodalidades educacionais e, de outro, emfundamentos e princípios historicamente saturados,voltados para a consecução dos objetivosrepublicanos presentes na Constituição, sobretudono que concerne ao que designaremos por visãosistêmica da educação e à sua relação com aordenação territorial e o desenvolvimentoeconômico e social.

Diferentemente da visão sistêmica quepauta o PDE, predominou no Brasil, até muitorecentemente, uma visão fragmentada daeducação, como se níveis, etapas e modalidadesnão fossem momentos de um processo, cadaqual com objetivo particular, integrados numaunidade geral; como se não fossem elos de umacadeia que deveriam se reforçar mutuamente. Talvisão fragmentada partiu de princípiosgerencialistas e fiscalistas, que tomaram osinvestimentos em educação como gastos, em umsuposto contexto de restrição fiscal.

Criaram-se falsas oposições. A maisindesejável foi a oposição entre educação básicae educação superior. Diante da falta de recursos,alegava-se que caberia ao gestor público optarpela primeira. Sem que a União aumentasse oinvestimento na educação básica, o argumentoserviu de pretexto para asfixiar a rede federal deeducação superior, cujo custeio foi reduzido em50% em dez anos, e inviabilizar uma expansãosignificativa da rede. Nesse particular, é forçosolembrar a revogação, em 1996, do parágrafo únicodo artigo 60 do Ato das Disposições Cons-titucionais Transitórias, que estabelecia: “Nos dezprimeiros anos da promulgação da Constituição,as universidades públicas descentralizarão suasatividades, de modo a estender suas unidades deensino superior às cidades de maior densidadepopulacional”. O resultado para a educaçãobásica: falta de professores com licenciatura paraexercer o magistério e alunos do ensino médiodesmotivados pela insuficiência de oferta deensino gratuito nas universidades públicas. Erauma oposição, além de tudo, irracional. Como sepode pensar em reforçar a educação básica se aeducação superior, debilitada, não lhe oferecersuporte mediante formação de bons professoresem número suficiente?

A segunda oposição não foi menos danosae se estabeleceu no nível da educação básica,formada pela educação infantil e os ensinosfundamental e médio. A atenção quase exclusivaao ensino fundamental resultou em certo descaso,por assim dizer, com as outras duas etapas eprejudicou o que supostamente se pretendiaproteger. Sem que se tenha ampliadosignificativamente a já alta taxa de atendimentodo ensino fundamental, verificou-se uma queda nodesempenho médio dos alunos dessa etapa.Sendo a educação infantil e o ensino médio

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sustentáculos do ensino fundamental, este, semeles, não avança. Todos os estudos recentessobre educação demonstram inequivocamenteque a aprendizagem e o desenvolvimento doseducandos no ensino fundamental, principalmentedos filhos de pais menos escolarizados, dependemdo acesso à educação infantil2.

A terceira oposição estabeleceu-se entreo ensino médio e a educação profissional. Nosanos 90, foi banida por decreto a previsão deoferta de ensino médio articulado à educaçãoprofissional e proibida por lei a expansão da redefederal de educação profissional e tecnológica,nos seguintes termos: “A expansão da oferta deeducação profissional, mediante a criação denovas unidades de ensino por parte da União,somente poderá ocorrer em parceria comestados, municípios, Distrito Federal, setorprodutivo ou organizações não-governamentais,que serão responsáveis pela manutenção egestão dos novos estabelecimentos de ensino”3.A União até poderia construir novos estabele-cimentos, mas custeio e pessoal seriamresponsabilidade de estados, municípios ouinstituições privadas. O Congresso Nacionalinseriu no projeto um dispositivo que relativizavaa regra geral, excepcionando as unidades deensino da União com obras já concluídas. Odispositivo foi vetado. Com isso, as experiênciasmais virtuosas de articulação do ensino médiocom a educação profissional, desenvolvidas narede federal, foram desprestigiadas.

Uma quarta oposição pode ser mencionada:alfabetização dissociada da educação de jovense adultos (EJA). As ações de alfabetização sobresponsabilidade da União nunca estiveram soba alçada do Ministério da Educação e jamais foramarticuladas com a EJA. Promoviam-secampanhas, não programas estruturados deeducação continuada em colaboração com ossistemas educacionais. Além disso, perdia-se devista a elevada dívida educacional com grupossociais historicamente fragilizados. Nessesentido, a exclusão da EJA do Fundo deManutenção e Desenvolvimento do EnsinoFundamental e de Valorização do Magistério

(FUNDEF) foi simbólica: significou o repúdio, porparte do Estado, da dívida social com aqueles quenão exerceram a tempo, por razões inteiramentealheias a sua vontade, seu direito de aprender –direito adquirido tomado por direito alienado.

Por fim, uma quinta oposição. Essa visãofragmentada também intensificou a oposiçãoentre educação regular e educação especial.Contrariando a concepção sistêmica datransversalidade da educação especial nosdiferentes níveis, etapas e modalidades deensino, a educação não se estruturou naperspectiva da inclusão e do atendimento àsnecessidades educacionais especiais, limitandoo cumprimento do princípio constitucional queprevê a igualdade de condições para o acesso ea permanência na escola e a continuidade nosníveis mais elevados de ensino.

O PDE procura superar essas falsasoposições por meio de uma visão sistêmica daeducação. Com isso, pretende-se destacar quea educação, como processo de socialização eindividuação voltado para a autonomia, não podeser artificialmente segmentada, de acordo com aconveniência administrativa ou fiscal. Aocontrário, tem de ser tratada com unidade, dacreche à pós-graduação, ampliando o horizonteeducacional de todos e de cada um, indepen-dentemente do estágio em que se encontre nociclo educacional. A visão sistêmica da educa-ção, dessa forma, aparece como corolário daautonomia do indivíduo. Só ela garante a todos ea cada um o direito a novos passos e itineráriosformativos. Tal concepção implica, adicional-mente, não apenas compreender o cicloeducacional de modo integral, mas, sobretudo,promover a articulação entre as políticasespecificamente orientadas a cada nível, etapaou modalidade e também a coordenação entreos instrumentos de política pública disponíveis.Visão sistêmica implica, portanto, reconhecer asconexões intrínsecas entre educação básica,educação superior, educação tecnológica ealfabetização e, a partir dessas conexões,potencializar as políticas de educação de formaa que se reforcem reciprocamente.

2 Segundo estudo elaborado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), a chance de umacriança concluir o ensino médio aumenta em 32% se ela tiver acesso à educação infantil.

3 Cf. art. 3º, § 5º, da Lei nº 8.948, de 8 de dezembro de 1994, com a redação dada pela Lei nº 11.195, de 18 de novembro de 2005.

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A formação inicial e continuada doprofessor exige que o parque de universidadespúblicas se volte (e não que dê as costas) paraa educação básica. Assim, a melhoria daqualidade da educação básica depende daformação de seus professores, o que decorrediretamente das oportunidades oferecidas aosdocentes. O aprimoramento do nível superior,por sua vez, está associado à capacidade dereceber egressos do nível básico mais bempreparados, fechando um ciclo de depen-dência mútua, evidente e positiva entre níveiseducacionais.

Nossa Constituição, contudo, não apenasorganiza o território sob a forma federativa,como organiza as competências da União, dosestados, do Distrito Federal e dos municípiosem matéria educacional, de modo a sobreporà forma federativa os níveis e as etapas daeducação. Os propósitos do PDE, dessa forma,tornam o regime de colaboração um impera-tivo inexorável. Regime de colaboraçãosignifica compartilhar competências políticas,técnicas e financeiras para a execução deprogramas de manutenção e desenvolvimentoda educação, de forma a concertar a atuaçãodos entes federados sem ferir-lhes a auto-nomia. Essa simples divisão de tarefas, searticulada em grandes eixos (educação básica,superior, profissional e continuada), com re-gras transparentes e metas precisas, passíveisde acompanhamento público e controle social,pode pôr em marcha um avanço perceptível esólido, como se verá adiante.

Nesse sentido, a concretização domandamento constitucional segundo o quala União deve exercer “em matéria edu-cacional, função redistributiva e supletiva, deforma a garantir equalização de oportunidadeseducacionais e padrão mínimo de qualidadedo ensino mediante assistência técnica efinanceira aos estados, ao Distrito Federal e aosmunicípios”4, implicou revisão da postura daUnião, que a partir do PDE assumiu maiorescompromissos – inclusive financeiros – e

colocou à disposição dos estados, do DistritoFederal e dos municípios instrumentoseficazes de avaliação e de implementação depolíticas de melhoria da qualidade daeducação, sobretudo da educação básicapública.

Dois outros imperativos se desdobramdos propósitos do Plano: responsabilização (oque se conhece na literatura comoaccountability) e mobilização social. Se aeducação é definida, constitucionalmente5,como direito de todos e dever do Estado e dafamília, exige-se considerar necessariamentea responsabilização, sobretudo da classepolítica, e a mobilização da sociedade comodimensões indispensáveis de um plano dedesenvolvimento da educação. Com efeito, asociedade somente se mobilizará em defesada educação se a incorporar como valor social,o que exige transparência no tratamento dasquestões educacionais e no debate em tornodas políticas de desenvolvimento da educação.Desse modo, a sociedade poderá acom-panhar sua execução, propor ajustes e fiscalizaro cumprimento dos deveres do Estado.

Como se vê, o PDE está sustentado emseis pilares: i) visão sistêmica da educação, ii)territorialidade, iii) desenvolvimento, iv) regimede colaboração, v) responsabilização e vi)mobilização social – que são desdobramentosconseqüentes de princípios e objetivos consti-tucionais, com a finalidade de expressar oenlace necessário entre educação, território edesenvolvimento, de um lado, e o enlace entrequalidade, eqüidade e potencialidade, deoutro. O PDE busca, de uma perspectivasistêmica, dar conseqüência, em regime decolaboração, às normas gerais da educação6

na articulação com o desenvolvimento socio-econômico que se realiza no território, orde-nado segundo a lógica do arranjo educativo –local, regional ou nacional.

Indo adiante, o PDE passa do conceito àação.

4 Constituição Federal de 1988, art. 211, § 1º.5 Constituição Federal de 1988, art. 205.6 Essencialmente: Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB (Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996) e Plano Nacional da Educação –

PNE (Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001).

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2 O Plano de Desenvolvimento daEducação como Programa de Ação

À luz dos elementos conceituais quesubsidiaram a formulação do PDE, é precisoapresentá-lo como plano executivo. Seusprogramas podem ser organizados em torno dequatro eixos norteadores: educação básica,educação superior, educação profissional ealfabetização.

Há que se considerar que o PDEcompreende mais de 40 programas e não sepretende aqui simplesmente elencar o conjunto demedidas propostas, assim como não se trata deapresentar o conjunto resumido da atuação dapasta. O presente texto não é uma lista derealizações nem um relatório técnico. Seu objetivoé outro. Trata-se, pelo momento, de apresentarapenas as conexões mais relevantes entre osprogramas do PDE, reciprocamente considerados,e os pressupostos mais relevantes dos programasjá em curso no Ministério da Educação. Por isso,talvez, iniciativas de vulto fiquem à margem dapresente exposição, o que se justifica diante danecessidade de apresentar, conceitualmente, aconcepção de educação que embasa a execuçãodo PDE, traduzida em propostas concretas.

2.1 EDUCAÇÃO BÁSICA

2.1.1 FORMAÇÃO DE PROFESSORES EPISO SALARIAL NACIONAL

Um dos principais pontos do PDE é aformação de professores e a valorização dosprofissionais da educação. A questão é urgente,estratégica e reclama resposta nacional. Nessesentido, o PDE promove o desdobramento deiniciativas fulcrais levadas a termo recentemente,quais sejam: a distinção dada aos profissionaisda educação, única categoria profissional compiso salarial nacional constitucionalmenteassegurado, e o comprometimento definitivo edeterminante da União com a formação deprofessores para os sistemas públicos deeducação básica (a Universidade Aberta do

Brasil7 – UAB – e o Programa Institucional deBolsas de Iniciação à Docência – PIBID).

A Emenda Constitucional nº 53 estabeleceua obrigação de que lei federal fixe o piso salarialnacional do magistério, resgatando compromissohistórico firmado no Palácio do Planalto, em 1994,entre o Ministério da Educação, o ConselhoNacional de Secretários de Educação (CONSED),a União Nacional de Dirigentes Municipais deEducação (UNDIME), a Confederação Nacionaldos Trabalhadores em Educação (CNTE) e outrosatores sociais.

A UAB e o PIBID, por seu turno, alteramo quadro atual da formação de professores,estabelecendo relação permanente entreeducação superior e educação básica. É oembrião de um futuro sistema nacional públicode formação de professores, no qual a União,por meio da Fundação Coordenação deAperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior(CAPES)8, assume enfim uma responsabilidadeque, a rigor, sempre foi sua.

No caso da UAB, estados e municípios,de um lado, e universidades públicas, de outro,estabelecem acordos de cooperação. Por meiodeles, os entes federados mantêm pólos deapoio presencial para acolher professores semcurso superior ou garantir formação continuadaaos já graduados. As universidades públicas,da sua parte, oferecem cursos de licenciaturae especialização, especialmente onde nãoexista oferta de cursos presenciais. Quandoinstalados os pólos previstos, todos osprofessores poderão se associar a um centrode formação nas proximidades do trabalho. AUAB dialoga, assim, com objetivos do PNE:“Ampliar, a partir da colaboração da União, dosestados e dos municípios, os programas deformação em serviço que assegurem a todosos professores a possibilidade de adquirir aqualif icação mínima exigida pela LDB,observando as diretrizes e os parâmetroscurriculares” e “Desenvolver programas deeducação a distância que possam ser utilizados

7 Decreto nº 5.800, de 08 de junho de 2006.8 Lei nº 8.405, de 09 de janeiro de 1992, com a redação dada pela Lei nº 11.502, de 11 de julho de 2007.

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também em cursos semipresenciais modulares,de forma a tornar possível o cumprimento dameta anterior”.

Já o PIBID oferece bolsas de iniciação àdocência aos licenciandos de cursos presenciaisque se dediquem ao estágio nas escolas públicase que se comprometam com o exercício domagistério na rede pública, uma vez graduados.As áreas prioritárias serão física, química,biologia e matemática, nas quais se nota a menorpresença de professores em exercício comformação específica.

A CAPES passa a fomentar não apenas aformação de pessoal para o nível superior, mas aformação de pessoal de nível superior para todosos níveis da educação. Faz toda a diferença o quedispõe a LDB – “O Distrito Federal, cada estado emunicípio e, supletivamente, a União, devemrealizar programas de capacitação para todos osprofessores em exercício, utilizando também, paraisso, os recursos da educação a distância” – e oque propõe o PDE: “A União, o Distrito Federal, osestados e os municípios, inclusive em regime decolaboração, deverão promover a formação inicial,continuada, e a capacitação dos profissionais demagistério”9. Para dar conseqüência a essasresponsabilidades, a União necessita de umaagência de fomento10 para a formação deprofessores da educação básica, inclusive paradar escala a ações já em andamento11.

2.1.2 FINANCIAMENTO: SALÁRIO-EDUCAÇÃO E FUNDEB

Ainda no que toca à educação básica,graças à ação coordenada dos dirigentes daeducação dos três níveis de governo –municipal, estadual e federal –, foi possívelelaborar uma agenda mínima de fortalecimento

da educação básica. Os avanços até aquiobtidos merecem consideração.

O ensino obrigatório, em linha com aexperiência internacional e com o PNE, passoude oito para nove anos. A arrecadação pararepasses da União aos estados e municípiosrelativos ao salário-educação saltou de R$ 3,7bilhões em 2002 para R$ 7 bilhões em 2006. Astransferências voluntárias da União atingiram umnúmero mais expressivo de municípios, o quepermitiu ampliar o acesso a projetos federaisvoltados para formação de professores, reformae construção de escolas, equipamentos, materialpedagógico etc. O investimento mínimo por alunodo ensino fundamental, ainda na vigência doFUNDEF, teve reajuste de 26% acima dainflação. A merenda escolar, que teve seu valorreajustado em 70% após uma década semreajuste, foi estendida à creche, enquanto o livrodidático, pela primeira vez, foi oferecido aosestudantes do ensino médio. Programas deinclusão digital foram incrementados12.

O FUNDEB, por sua vez, ao substituir oFUNDEF, trouxe pelo menos duas vantagens:1) aumentou substancialmente o compromissoda União com a educação básica, ampliando oaporte, a título de complementação, de cerca deR$ 500 milhões (média no FUNDEF) para cercade R$ 5 bilhões de investimento ao ano; e 2)instituiu um único fundo para toda a educaçãobásica, não apenas para o ensino fundamental.Trata-se, no que diz respeito à educação básica,de uma expressão da visão sistêmica daeducação, ao financiar todas as suas etapas, dacreche ao ensino médio, e ao reservar parcelaimportante dos recursos para a educação dejovens e adultos. É também a expressão de umavisão de ordenação do território e de desenvolvi-mento social e econômico, na medida em que a

9 Projeto de Lei nº 7.515, de 2006.10 O PDE não poderia prescindir da CAPES para assumir essa nova tarefa sem deixar de considerar avanços no campo de sua missão

institucional tradicional, como demonstram a ampliação do número e o reajuste do valor das bolsas de mestrado e doutorado (após noveanos de congelamento), o lançamento do Programa de Bolsas de Pós-Doutorado, a ampliação do Portal de Periódicos e a Lei de Incentivoà Pesquisa, que tem como propósito a tradução da produção científica brasileira em tecnologia (Lei nº 11.487, de 15 de junho de 2007).

11 Como o Pró-Letramento e o Pró-Licenciatura, por exemplo.12 Vale registrar o esforço do governo federal, no âmbito do PDE, para dinamizar o processo de ensino-aprendizagem, considerando todas as

dimensões de acesso ao mundo digital: energia elétrica (Programa Luz para Todos na Escola), equipamentos e formação (Programa Nacionalde Informática na Educação – Proinfo), conectividade (Programa Governo Eletrônico: Serviço de Atendimento ao Cidadão – GSAC e TV Escola)e produção de conteúdos digitais (Portal Domínio Público, Portal de Periódicos da CAPES e Programa de Conteúdos Digitais Educativos).

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complementação da União é direcionada àsregiões nas quais o investimento por aluno éinferior à média nacional.

Três inovações foram incorporadas aoFUNDEB: 1) a diferenciação dos coeficientes deremuneração das matrículas não se dá apenaspor etapa e modalidade da educação básica, mastambém pela extensão do turno: a escola detempo integral recebe 25% a mais por alunomatriculado; 2) a creche conveniada foicontemplada para efeito de repartição dosrecursos do Fundo13; e 3) a atenção à educaçãoinfantil é complementada pelo ProInfância,programa que financia a expansão da rede físicade atendimento da educação infantil pública.

2.1.3 AVALIAÇÃO E RESPONSABILIZAÇÃO:O IDEB

O PDE promove profunda alteração naavaliação da educação básica. Estabelece,inclusive, inéditas conexões entre avaliação,financiamento e gestão, que invocam conceitoaté agora ausente do nosso sistema educacional:a responsabilização e, como decorrência, amobilização social.

Todo processo educacional reclamaavaliação. Não há professor que não submetaseus alunos a avaliação. A avaliação do alunoindividualmente considerado tem como objetivoa verificação da aquisição de competências ehabilidades que preparam uma subjetividade, narelação dialógica com outra, para se apropriarcriticamente de conhecimentos cada vez maiscomplexos. Caso bem diferente é o da avaliaçãoda instituição de ensino. Nesta, o objetivo éverificar se os elementos que compõem a escolaestão estruturados para a oferta de educaçãode qualidade.

Como indivíduos mudam mais celerementeque instituições, a periodicidade da avaliação dealunos e de instituições de ensino não precisanecessariamente coincidir no tempo, nem precisa

ser a mesma. O desempenho do aluno pode sealterar num bimestre, enquanto o desempenhode uma instituição de ensino raramente se alteranum biênio. Quando a avaliação de instituiçõesde ensino toma por base o desempenho dos seusalunos, aplica-se o procedimento de avaliaçãoexterna a uma amostra representativa. Porexemplo, todos os alunos de uma série ou deum mesmo ano. O resultado é um indicador dequalidade.

Até 2005, o Sistema de Avaliação daEducação Básica (SAEB) era apenas um exame,aplicado a cada dois anos, a uma amostra dealunos de cada estado, acompanhado de umquestionário. Apesar de limitado, tratava-se deferramenta útil, que permitia acompanhar odesempenho médio dos alunos e estabelecercorrelações estatísticas entre esse desempenhoe um conjunto de variáveis apuradas peloquestionário.

O que se tomava por sistema de avaliação,contudo, além de restrito a um exame e a umquestionário, apresentava outras limitações.Como a amostra não era representativa dosalunos de cada rede municipal ou de cada escola,ela não permitia à prefeita ou ao prefeito saberse a rede de ensino de sua cidade sedesenvolvia adequadamente. Muito menos davacondições à diretora ou ao diretor da escola desaber se seus esforços para melhorar ascondições de aprendizagem no seu estabele-cimento de ensino produziam ou não osresultados esperados.

Em 2005, o SAEB foi reformulado, a partirda realização da primeira avaliação universal daeducação básica pública. Mais de três milhõesde alunos da quarta e da oitava séries das escolaspúblicas urbanas realizaram a Prova Brasil,graças à adesão de governos estaduais emunicipais, cientes das dificuldades de construirum sistema próprio de avaliação14 e danecessidade de um sistema nacional de avaliaçãoque acompanhasse as condições de ensino eaprendizagem dos conteúdos que asseguram

13 A atual taxa de atendimento da educação infantil, em especial na creche, dadas as metas expressas no PNE, justifica, nesse caso, aparceria do Poder Público com o segmento comunitário.

14 O ideal seria que os sistemas estaduais e municipais de educação vencessem as dificuldades e desenvolvessem sistemas próprios deavaliação complementares ao sistema nacional.

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formação básica comum, sobretudo em línguaportuguesa e matemática. Registre-se que a LDBjá determinava aos entes federados “integrar todosos estabelecimentos de ensino fundamental15 doseu território ao sistema nacional de avaliação dorendimento escolar”.

Os dados do SAEB, antes amostrais,passaram a ser divulgados também por rede epor escola, o que tem aumentado significa-tivamente a responsabilização da comunidadede pais, professores, dirigentes e da classepolítica com o aprendizado. Aqui, respon-sabilização e mobilização social tornam a escolamenos estatal e mais pública. A divulgaçãopermite identificar boas práticas, que valem serdisseminadas, e insuficiências, o que tornapossível enfrentá-las de forma efetiva.

O SAEB, inicialmente, não permitia uma visãoclara da realidade de cada rede e menos ainda decada escola que a integra. A Prova Brasil deunitidez à radiografia da qualidade da educaçãobásica. A percepção que se tinha anteriormenteera de que nenhuma escola ou rede pública garantiao direito de aprender – um clichê injusto imposto àeducação básica pública como um todo. A ProvaBrasil revelou que isso não era verdade. Confirmou,sim, a existência de enormes desigualdadesregionais, muitas vezes no interior do mesmosistema. Mas, ao mesmo tempo, revelou boaspráticas de escolas e redes de ensino que resultamem aprendizagem satisfatória.

O movimento implicava riscos. São gravesos dados relativos à aprendizagem, mas não sepode esquecer que são igualmente preocupantesas altas taxas de evasão e repetência. Adivulgação, por escola, dos dados relativos aodesempenho médio dos alunos poderia ensejarum movimento de retenção, visando à melhoriado indicador de qualidade relativo aodesempenho, o que prejudicaria ainda mais o fluxo.A avaliação poderia, no limite, produzir efeitoscontrários aos pretendidos. O PDE partiu dodiagnóstico de que a “indústria da aprovaçãoautomática” é tão perniciosa quanto a “indústriada repetência”. Dessa preocupação nasceu a

idéia de combinar os resultados de desempenhoescolar (Prova Brasil) e os resultados derendimento escolar (fluxo apurado pelo censoescolar) num único indicador de qualidade: o Índicede Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB).

Essa nova sistemática de avaliação exigiuuma providência adicional: uma alteraçãosignificativa na forma de realizar o censo escolar.O censo não poderia mais ser feito por escola,mas por aluno. A mudança permite que os dadosde fluxo não mais sejam estimados por modelosmatemáticos, mas baseados em dadosindividualizados sobre promoção, reprovação eevasão de cada estudante. Ou seja, umasistemática tanto quanto possível à prova deerros e fraudes. O censo escolar feito a partir depouco mais de 200 mil formulários preenchidosà mão transformou-se, com o ProgramaEducacenso, em um banco de dados on-line commais de 50 milhões de registros. No lugar do fluxoestimado, o fluxo real. Aluno por aluno.

Com a Prova Brasil e o Educacensoestavam dadas as condições para a criação doIDEB, expresso numa escala de zero a 10. Como novo indicador, o PDE procura superaralgumas dificuldades do PNE em torno destaquestão central: o tratamento dado à qualidade.Ao se referir à qualidade do ensino, o PNE remeteà necessidade de se estabelecer sistemas deavaliação e padrões de qualidade, mas mantémsuas metas referenciadas no atendimento, comuma métrica que desconsidera a qualidade. OPNE fixa meta para correção de fluxo escolar,mas quando se trata da aprendizagempropriamente dita, apenas determina que seassegure “a elevação progressiva do nível dedesempenho dos alunos mediante a implantação,em todos os sistemas de ensino, de um programade monitoramento que utilize os indicadores doSAEB”, abstratamente. Somente para aeducação especial, o PNE fixara prazo para adefinição de “indicadores básicos de qualidade”.

A partir da criação do IDEB, calculado porescola, por rede e para o próprio País, foi possívelfixar metas de desenvolvimento educacional de

15 No caso do ensino médio, a quase universalização do Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM) permitiu, com tratamento estatísticosofisticado e infelizmente ainda pouco conhecido no Brasil, divulgar as notas médias, escola por escola, do ensino médio, a exemplodo que se fez com a quarta e a oitava séries do ensino fundamental com a Prova Brasil.

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médio prazo para cada uma dessas instâncias,com metas intermediárias de curto prazo quepossibilitam visualização e acompanhamento dareforma qualitativa dos sistemas educacionais.

Os dados divulgados referem-se àradiografia tirada em 2005. O IDEB calculadopara o País, relativo aos anos iniciais do ensinofundamental, foi de 3,8, contra uma médiaestimada dos países desenvolvidos de 6, quepassa a ser a meta nacional para 2021. O desafioconsiste em alcançarmos o nível médio dedesenvolvimento da educação básica dos paísesintegrantes da Organização para a Cooperaçãoe o Desenvolvimento Econômico (OCDE), noano em que o Brasil completará 200 anos de suaindependência, meta que pode ser consideradaousada. O que mais impressiona, contudo, é aenorme dispersão do IDEB entre escolas eredes. Foram encontrados, nas redes, índicesde 1 a 6,8. Nas escolas, a variação é ainda maior,de 0,7 a 8,5. Tornou-se evidente, uma vez mais,a imperiosa necessidade de promover o enlaceentre educação, ordenação do território edesenvolvimento econômico e social.

Da mesma forma que as ações do PDEno âmbito da educação superior e profissional,como se verá, consideram o espaço geográficoe as desigualdades regionais como dimensõesindissociáveis da reforma educacional, no âmbitoda educação básica o mesmo conceito se impõequando se trata de organizar os programaspropostos no território do município. Isso nãosignifica restringir as ações do PDE aos âmbitosde atuação prioritária do município, o queimplicaria a retomada da visão fragmentada deeducação. Além disso, em cada estado, é fortea correlação entre o IDEB das redes municipaise o IDEB da rede estadual em cada município, oque exige atenção às redes no seu conjunto. Valenotar, contudo, que a forte correlação observadanão elide o fato de que, na grande maioria doscasos, o IDEB da rede estadual em cadamunicípio é superior ao IDEB da rede municipal.Isso sugere que o desejável processo demunicipalização não foi acompanhado doscuidados devidos.

Os dados divulgados deixam claro que oproblema da qualidade só será resolvido setambém for enfrentado o problema da eqüidade.

E, da análise dos dados relativos àstransferências voluntárias da União, percebe-seque os municípios que mais necessitam do apoiotécnico e financeiro foram aqueles que, até hoje,menos recursos receberam. Como vimos, o art.211 da Constituição Federal estabelece: “AUnião, os estados, o Distrito Federal e osmunicípios organizarão em regime de colabo-ração seus sistemas de ensino”. Cabe à Uniãoexercer, “em matéria educacional, funçãoredistributiva e supletiva, de forma a garantirequalização de oportunidades educacionais epadrão mínimo de qualidade do ensino medianteassistência técnica e financeira aos estados, aoDistrito Federal e aos municípios”. Como darconseqüência a esse comando sem umindicador como o IDEB?

O IDEB permite identificar as redes e asescolas públicas mais frágeis a partir de critériosobjetivos e obriga a União a dar respostasimediatas para os casos mais dramáticos aoorganizar o repasse de transferênciasvoluntárias com base em critérios substantivos,em substituição ao repasse com base emcritérios subjetivos. O escopo é atenderimediatamente os 1.242 municípios e as 7.085escolas com os mais baixos indicadores e, emcurto prazo, todos os que estejam abaixo damédia nacional. Isso exigirá do Ministério daEducação uma mudança de postura radical noatendimento aos entes federados. Em vez deaguardar as respostas às suas resoluções,selecionando os “melhores” projetos apresen-tados, muitas vezes elaborados por consultoriascontratadas, trata-se de ir ao encontro de quemmais precisa, construindo o regime de cola-boração na prática. O Ministério da Educaçãoprecisa sair de Brasília e conhecer seusparceiros. Só assim o relacionamento entregovernos, mediado pelo tráfico de influência, pelapressão político-partidária ou pelo jogo deinteresses, dará lugar ao relacionamento entreEstado nacional e os entes federados, mediadopelo direito de aprender do educando.

2.1.4 O PLANO DE METAS: PLANEJAMENTOE GESTÃO EDUCACIONAL

Esse padrão de relacionamento requerinstrumentos jurídicos que permitam inaugurar

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um novo regime de colaboração. Umcompromisso fundado em diretrizes econsubstanciado em um plano de metasconcretas, efetivas, voltadas para a melhoria daqualidade da educação.

Logo após a divulgação dos resultados daProva Brasil, em 2006, dois estudos foramrealizados em parceria com organismosinternacionais, em escolas e redes de ensinocujos alunos demonstraram desempenho acimado previsto, consideradas variáveis socioeco-nômicas. O objetivo central dos estudos eraidentificar um conjunto de boas práticas às quaispoderia ser atribuído o bom desempenho dosalunos. Essas boas práticas foram traduzidasem 28 diretrizes que orientam as ações do Planode Metas Compromisso Todos pela Educação,programa estratégico do PDE16.

Estabelecer como foco a aprendizagem;alfabetizar as crianças até, no máximo, os oitoanos de idade; acompanhar cada aluno da redeindividualmente; combater a repetência, porestudos de recuperação ou progressão parcial;combater a evasão; ampliar a jornada; fortalecera inclusão educacional das pessoas comdeficiência; promover a educação infantil; instituirprograma de formação e implantar plano decarreira, cargos e salários para os profissionaisda educação; valorizar o mérito do trabalhadorda educação; fixar regras claras, consideradosmérito e desempenho, para nomeação eexoneração de diretor de escola; promover agestão participativa na rede de ensino; fomentare apoiar os conselhos escolares etc. Taisdiretrizes foram desdobradas de evidênciasempíricas que as legitimam. E a adesão ao Planode Metas significa mais do que o reconhecimentodessas diretrizes. Significa o compromisso dosgestores municipais com sua concretização noplano local.

O Plano de Metas, por sua vez, agregaingredientes novos ao regime de colaboração,de forma a garantir a sustentabilidade das açõesque o compõem. Convênios unidimensionais eefêmeros dão lugar aos planos de açõesarticuladas (PAR), de caráter plurianual,

construídos com a participação dos gestores eeducadores locais, baseados em diagnóstico decaráter participativo, elaborados a partir dautilização do Instrumento de Avaliação de Campo,que permite a análise compartilhada do sistemaeducacional em quatro dimensões: gestãoeducacional, formação de professores e dosprofissionais de serviço e apoio escolar, práticaspedagógicas e avaliação e infra-estrutura físicae recursos pedagógicos. O PAR é, portanto,multidimensional e sua temporalidade o protegedaquilo que tem sido o maior impeditivo dodesenvolvimento do regime de colaboração: adescontinuidade das ações, a destruição damemória do que foi adotado, a reinvenção, a cadatroca de equipe, do que já foi inventado. Em outraspalavras, a intermitência. Só assim se tornapossível estabelecer metas de qualidade delongo prazo para que cada escola ou rede deensino tome a si como parâmetro e encontreapoio para seu desenvolvimento institucional.

Além da atuação na rede de ensino, o PDEpermitirá uma incidência ainda mais específica:permitirá que o Poder Público, com base no IDEB,atue nas escolas mais fragilizadas. Trata-se doPlano de Desenvolvimento da Escola (PDE-Escola), antiga ação do Ministério da Educaçãoque, de abrangência restrita, ganhou escalanacional. O PDE-Escola é uma ação de melhoriada gestão escolar fundamentada centralmente naparticipação da comunidade. No PDE-Escola, acomunidade escolar é diretamente envolvida emum plano de auto-avaliação que diagnostica ospontos frágeis da escola e, com base nessediagnóstico, traça um plano estratégico orientadoem quatro dimensões: gestão, relação com acomunidade, projeto pedagógico e infra-estrutura.O plano estratégico define metas e objetivos e, sefor o caso, identifica a necessidade de aportefinanceiro suplementar.

Por fim, o SAEB ganhou contornos desistema de avaliação, que se constitui, numprimeiro momento, da combinação dos resultadosda avaliação universal de desempenho escolar(Prova Brasil) com o rendimento escolar real(Educacenso). Não se compreende o novodesenho do SAEB, entretanto, se não se

16 Decreto nº 6.094, de 24 de abril de 2007.

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considera o Instrumento de Avaliação de Campo,formulado a partir das 28 diretrizes do Plano deMetas Compromisso Todos pela Educação. OSAEB, nos moldes atuais, ao estabelecer nexosentre seus três elementos constituintes, rompecom a visão fragmentada de avaliação e passa aorientar o apoio financeiro da União (transferên-cias voluntárias) e o apoio técnico do Ministérioda Educação aos sistemas educacionais (gestãoeducacional)17. Avaliação, financiamento e gestãose articulam de maneira inovadora e criam umacadeia de responsabilização pela qualidade doensino que abrange tanto os gestores, do diretorou da diretora da escola ao Ministro da Educação,quanto a classe política, do prefeito ou da prefeitaao Presidente da República.

2.2 EDUCAÇÃO SUPERIOR

No contexto do PDE, a educação superiorbaliza-se pelos seguintes princípios comple-mentares entre si: i) expansão da oferta de vagas,dado ser inaceitável que somente 11% de jovens,entre 18 e 24 anos, tenham acesso a esse níveleducacional, ii) garantia de qualidade, pois nãobasta ampliar, é preciso fazê-lo com qualidade,iii) promoção de inclusão social pela educação,minorando nosso histórico de desperdício detalentos, considerando que dispomos compro-vadamente de significativo contingente de jovenscompetentes e criativos que têm sido sis-tematicamente excluídos por um filtro de naturezaeconômica, iv) ordenação territorial, permitindoque ensino de qualidade seja acessível às regiõesmais remotas do País, e v) desenvolvimentoeconômico e social, fazendo da educação su-perior, seja enquanto formadora de recursos hu-manos altamente qualificados, seja como peçaimprescindível na produção científico-tecnoló-gica, elemento-chave da integração e da for-mação da Nação.

Definidos esses princípios, o PDE pôs àdisposição das instituições federais de educaçãosuperior um instrumento que, respeitada aautonomia universitária, pode viabilizar uma

reestruturação de grande alcance do parqueuniversitário federal.

Alguns antecedentes, contudo, são dignosde nota.

Foi enviado ao Congresso Nacional proje-to de lei de reforma universitária18, o qual prevêpatamar mínimo de recursos para garantir ofinanciamento estável das universidades federais(recuperando dispositivo vetado do PNE), numsistema dinâmico que premia o mérito institu-cional – sem o que a autonomia universitáriaprevista na Constituição Federal e delineada naLDB não tem suporte material. Prevê, igualmente,a regulação do setor privado, o qual, sem marcolegal estável, vive uma expansão caótica e umprocesso crescente de desnacionalização.Paralelamente, as verbas de custeio das univer-sidades federais foram integralmente recupe-radas, os concursos públicos foram retomados,ao mesmo tempo em que foi restabelecida acapacidade de investimento das instituições, deforma a sustentar a expansão e a interiorizaçãodo ensino superior público, com dez novasuniversidades públicas federais e 48 novoscampi universitários. Além disso, várias dispo-sições normativas que inibiam o exercício daautonomia pelas instituições federais deeducação superior (IFES) foram revistas ourevogadas.

2.2.1 REESTRUTURAÇÃO E EXPANSÃODAS UNIVERSIDADES FEDERAIS:REUNI E PNAES

Recomposto o patamar de financiamentocondizente com a oferta de matrículas, erapreciso oferecer às instituições condições paraque pudessem repensar sua estruturaacadêmica e seu desenho institucional. OPrograma de Apoio a Planos de Reestruturaçãoe Expansão das Universidades Federais(REUNI)19 tem como fim imediato o aumento dasvagas de ingresso e a redução das taxas de

17 Daí a importância de organizar o Guia de Tecnologias Educacionais, composto por tecnologias desenvolvidas pelo Ministério daEducação ou por ele pré-qualificadas (e eventualmente certificadas), para que a sociedade possa acompanhar a efetividade de cada“insumo” no que concerne à aprendizagem.

18 Projeto de Lei nº 7.200, de 2005.19 Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007.

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evasão nos cursos presenciais de graduação.Em linha com proposta da Associação Nacionaldos Dirigentes das Instituições Federais deEnsino Superior (ANDIFES), feita em 1997, oREUNI, mediante investimento maciço naeducação superior, pretende melhorar osindicadores das instituições federais deeducação superior, projetando alcançar ummilhão de matrículas de graduação. O REUNIpermite uma expansão democrática do acessoao ensino superior, o que aumentará expressi-vamente o contingente de estudantes decamadas sociais de menor renda na universidadepública. O desdobramento necessário dessademocratização é a necessidade de uma políticanacional de assistência estudantil que, inclusive,dê sustentação à adoção de políticas afirmativas.O Plano Nacional de Assistência Estudantil(PNAES) consolida o REUNI.

Engana-se, não obstante, quem tomá-loapenas como abertura de um espaço orça-mentário para que cada instituição melhore seusindicadores quantitativos – embora essa sejauma resposta importante aos renitentes críticosda universidade pública e gratuita. É certo que,nesse aspecto, há como avançar, e o REUNI éo instrumento que permite expandir e defender auniversidade pública. Contudo, mais do que isso,o REUNI propicia que cada instituição encontre,autonomamente, seu caminho de desenvolvi-mento no momento em que, em plena revoluçãocientífica, as fronteiras entre áreas do conhe-cimento tornam-se tênues e novas possi-bilidades de formação vão se delineando. A exatacompreensão dos fins do programa, portanto,exige atenção quanto aos meios a seremempregados: a expansão dos cursos noturnos,a ampliação da mobilidade estudantil, a revisãoda estrutura acadêmica e a diversificação dasmodalidades de graduação. Itinerários rígidos,desperdício de créditos, imobilidade e espe-cialização precoce são incompatíveis com umaestrutura universitária à altura dos novosdesafios da ciência. A reestruturação que seespera, portanto, é acadêmica e, como tal,qualitativa.

2.2.2 DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO:PROUNI E FIES

No que diz respeito à expansão do acessoao ensino superior privado, há que se considerarque o PDE promove inovações consideráveis nomecanismo de financiamento do estudante doensino superior não-gratuito, por meio de umaalteração no funcionamento do Fundo deFinanciamento ao Estudante do Ensino Superior(FIES)20, que se coadunam integralmente com oprograma de bolsas de estudo consubstanciadono Programa Universidade para Todos(PROUNI)21.

Sobre essa iniciativa, dado o persistentedesencontro de informações, cabe umcomentário. Com atraso de 16 anos, foramreguladas, pelo PROUNI, as isenções fiscaisconstitucionais concedidas às instituiçõesprivadas de ensino superior, garantindo acessoao nível superior a mais de 300 mil jovens. De1988 a 2004, as instituições de ensino superiorsem fins lucrativos, que respondem por 85% dasmatrículas do setor privado, amparadas pelosartigos 150, inciso VI, alínea c, e 195, § 7º, daConstituição Federal, gozaram de isençõesfiscais sem nenhuma regulação do PoderPúblico. Ou seja, sem nenhuma contrapartida.Acórdão do Supremo Tribunal Federal (STF), de1991, reconhecia a lacuna legislativa. Mas, porconta dessa omissão, garantia o gozo dasisenções enquanto perdurasse a situação22.

Até 2004, as instituições sem fins lucrativosconcediam bolsas de estudos, mas eram elasque definiam os beneficiários, os cursos, onúmero de bolsas e os descontos concedidos.Resultado: raramente era concedida uma bolsaintegral e quase nunca em curso de altademanda. A isenção fiscal não resultava em umaampliação do acesso ao ensino superior.

O PROUNI estabelece que as instituiçõesbeneficiadas por isenções fiscais passem aconceder bolsas de estudos na proporção dosalunos pagantes por curso e turno, sem exceção.

20 Projeto de Lei nº 920, de 2007.21 Lei nº 11.096, de 13 de janeiro de 2005.22 Cf. Mandado de Injunção nº 2321/400-RJ, rel. min. Moreira Alves, in DJ de 27/3/1992.

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Ficou estabelecido que só haveria dois tipos debolsas – integral ou parcial de 50% – e que osbeneficiários fossem selecionados pelo ENEM. Aconcessão da bolsa teria como único critério omérito. Além disso, foi definido o perfilsocioeconômico dos bolsistas: egressos de escolapública com renda familiar per capita de até umsalário mínimo e meio para bolsa integral e de atétrês salários mínimos para bolsa parcial de 50%.

Os resultados são conhecidos, mas valerepeti-los: nos primeiros três anos do programa,foram concedidas aproximadamente 300 milbolsas, 40% delas a afrodescendentes eindígenas, inclusive nos cursos de alta demanda,como medicina, direito, engenharia, odontologiaetc. Cerca de 60 mil bolsistas freqüentam cursosde licenciatura, nas diversas áreas. Professoresem serviço da educação básica pública têmacesso privilegiado ao programa. Por suacondição, estão dispensados de preencher osrequisitos socioeconômicos definidos para osdemais bolsistas – um claro exemplo de umapolítica de acesso ao ensino superior comreflexos positivos na formação de professorespara a educação básica. A nota mínima no ENEMpara obtenção da bolsa foi fixada em 45 pontos,mas a nota média dos beneficiados atingiu marcasuperior a 60 pontos e se manteve sempresuperior à pontuação obtida pelos alunosegressos de escolas privadas. Bolsistasmatriculados em cursos de turno integral fazemjus à bolsa permanência, já que não podemtrabalhar enquanto estudam23.

Por falta de regulamentação, no períodoentre 1988 e 2004, enquanto as isenções eramusufruídas, mais de um milhão de bolsas deestudo deixaram de ser concedidas. Hoje, asituação é outra. O avanço pode ser atestado pelonúmero de estudantes que passaram a fazer aprova do ENEM a cada ano – cerca de trêsmilhões. O desempenho dos bolsistas do PROUNIno Exame Nacional de Desempenho dosEstudantes (ENADE), um dos componentes do

Sistema Nacional de Avaliação da EducaçãoSuperior (SINAES)24, é sistematicamente superiorao desempenho dos alunos pagantes, o quedemonstra cabalmente que a questão do acessofoi tratada corretamente: os alunos não chegavamà educação superior por uma questão econômica,não por falta de méritos. O impacto do PROUNIsobre a qualidade da educação superior não pá-ra por aí. Outros efeitos positivos logo se farãonotar. A lei que cria o PROUNI estabelece queos cursos que receberem conceito insatisfatórioem duas edições do SINAES sejam descreden-ciados do programa e que as bolsas corres-pondentes, nos processos seletivos seguintes,sejam remanejadas para cursos com conceitosatisfatório.

O PDE, motivado pelo desempenho dosalunos bolsistas do PROUNI, tanto no ENEMquanto no ENADE, amplia o PROUNI por meiode sua articulação estrutural com o FIES. O PDEpropõe uma reformulação do FIES25 paracontemplar a ampliação do prazo de amortizaçãodo financiamento, o aumento do percentual daanuidade que pode ser financiado (até 100%), aredução dos juros, a consignação em folha e ofiador solidário, inovações que, combinadas como PROUNI, permitirão ampliar ainda mais o aces-so ao ensino superior. Tanto quanto o PROUNI,o FIES também passa a ter como parâmetro asavaliações do SINAES, contribuindo para aconsolidação desse inédito sistema de avaliação,em fase final de implantação.

2.2.3 AVALIAÇÃO COMO BASE DAREGULAÇÃO: SINAES

É preciso considerar, então, o que tem sidofeito até agora nessa área. O SINAES consoli-da de maneira harmoniosa as três experiên-cias anteriores de avaliação, extraindo delas oque tinham de melhor26. Todos os instrumentosde avaliação foram discutidos, revistos ou reela-borados e aprovados pela Comissão Nacional deAvaliação da Educação Superior (CONAES).

23 Lei nº 11.180, de 23 de setembro de 2005, art. 11.24 Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004.25 Projeto de Lei nº 920, de 200726 O Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras (PAIUB), as comissões de especialistas e o Exame Nacional de Cursos

(Provão).

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O Banco de Avaliadores do INEP foi recompostocom base na experiência e no mérito acadêmico,de sorte que as comissões de avaliação in locopassaram a ser constituídas por sorteio (não maispor indicação), segundo critérios muito mais rígidosrelativos ao perfil acadêmico dos avaliadores.

O ENADE, por sua vez, demonstra van-tagens em relação ao Provão. O Provão era apl-icado anualmente aos concluintes de determinadoscursos de graduação. Em oito anos de existência,avaliou apenas um terço dos cursos. O ENADE,em três anos, avaliou todos.

O Provão estava gradualmente se trans-formando no único indicador usado para avaliaçãode cursos e em instrumento de avaliação dealunos, papel para o qual não se presta. O ENADEse apresenta como um elemento, dentre outros,da avaliação de cursos e, ao medir o desempenhodos alunos ingressantes, permite o cálculo deindicador de valor agregado, que isola o efeitoinstituição sobre a formação geral e específica deseus alunos.

Aqui também, mais uma vez, rompeu-secom a visão fragmentada de avaliação. Os trêscomponentes do SINAES (avaliação institucional,avaliação de cursos e avaliação de desempenhodos estudantes) dialogam entre si; a avaliação setornou a base da regulação, em um desenhoinstitucional que criou um marco regulatóriocoerente, as- segurando ao Poder Público maiorcapacidade, inclusive do ponto de vista jurídico,de supervisão sobre o sistema federal deeducação superior, o que abre às boas instituiçõescondições de construir sua reputação e conquistarautonomia27.

A ampliação do acesso ao ensino superior,bem como a possibilidade de reestruturar osistema universitário federal, como ações doPDE, só adquirem plenamente sentido quandovislumbradas como elos adicionais de umconjunto de projetos no âmbito da educaçãosuperior que articulam, com um olho na educa-ção básica e outro na pós-graduação, ampliaçãode acesso e permanência, reestruturação

acadêmica, recuperação orçamentária, avalia-ção e regulação, concorrendo para que a univer-sidade, para além da formação profissional etécnica, cumpra a função de criar, difundir e popu-larizar as ciências e as artes.

2.3 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL ETECNOLÓGICA

Talvez seja na educação profissional etecnológica que os vínculos entre educação, territórioe desenvolvimento se tornem mais evidentes e osefeitos de sua articulação, mais notáveis.

Antes, contudo, os respectivosantecedentes.

As verbas de custeio e de pessoal da redefederal de educação profissional e tecnológicaforam recuperadas, à semelhança do que se fezcom a educação superior. Em 1998, o orçamentodo sistema atingiu cerca de R$ 856 milhões, avalores de 2005. Naquele mesmo ano, oorçamento do sistema, já recuperado, atingiumais de R$ 1,2 bilhão. De 1995 a 1998, não foiautorizada a contratação de um único docenteou técnico para o sistema de 140 unidades. De2003 a 2006, foi autorizada a contratação de3.433 docentes e técnicos administrativos. Foideflagrado o maior processo de expansão darede. Um dado simples dá a dimensão do quetem sido feito na educação profissional. De 1909a 2002, quer dizer, em quase um século, foramautorizadas 140 unidades federais de educaçãoprofissional e tecnológica no País, pouco maisde uma por ano. De 2003 a 2010, serão auto-rizadas 214 novas unidades federais, ou seja,teremos realizado uma ampliação de 150% doparque federal de educação profissional etecnológica em apenas oito anos.

2.3.1 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL EEDUCAÇÃO CIENTÍFICA: O IFET

Diante dessa expansão sem precedentes,a proposição dos institutos federais deeducação, ciência e tecnologia (IFET)28, como

27 Decreto nº 5.773, de 9 de maio de 2006.28 Decreto nº 6.095, de 24 de abril de 2007.

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modelos de reorganização das instituiçõesfederais de educação profissional e tecnológicapara uma atuação integrada e referenciadaregionalmente, evidencia com grande nitidez osdesejáveis enlaces entre educação sistêmica,desenvolvimento e territorialidade.

A missão institucional dos IFET deve, noque respeita à relação entre educação e trabalho,orientar-se pelos seguintes objetivos: ofertareducação profissional e tecnológica, comoprocesso educativo e investigativo, em todos osseus níveis e modalidades, sobretudo de nívelmédio; orientar a oferta de cursos em sintoniacom a consolidação e o fortalecimento dosarranjos produtivos locais; estimular a pesquisaaplicada, a produção cultural, o empreendedo-rismo e o cooperativismo, apoiando processoseducativos que levem à geração de trabalho erenda, especialmente a partir de processos deautogestão. Quanto à relação entre educação eciência, o IFET deve constituir-se em centro deexcelência na oferta do ensino de ciências,voltado à investigação empírica; qualificar-secomo centro de referência no apoio à oferta doensino de ciências nas escolas públicas;oferecer programas especiais de formaçãopedagógica inicial e continuada, com vistas àformação de professores para a educaçãobásica, sobretudo nas áreas de física, química,biologia e matemática, de acordo com asdemandas de âmbito local e regional, e oferecerprogramas de extensão, dando prioridade àdivulgação científica.

Trata-se de um arranjo educacional quearticula, em uma experiência institucionalinovadora, todos os princípios que informaram aformulação do PDE. Esse arranjo pode abrirexcelentes perspectivas para o ensino médio, hojeem crise aguda. A combinação virtuosa do ensinode ciências naturais, humanidades (inclusive

filosofia e sociologia) e educação profissional etecnológica – o que deve contemplar o estudo dasformas de organização da produção – pode repor,em novas bases, o debate sobre a politecnia, nohorizonte da superação da oposição entre opropedêutico e o profissionalizante. Sem prejuízodo indispensável apoio da União à reestruturaçãodas redes estaduais, os IFET podem colaborarpara recompor a espinha dorsal do ensino médiopúblico: no aspecto propedêutico, o modeloacadêmico deve romper com o saber de cor – tãopróprio ao ensino médio –, que nada mais é doque “conservar o que se entregou à memória paraguardar”; no aspecto profissionalizante, deveromper com o ensino mecanicista e objetivante,que estreita, ao invés de alargar, os horizontesdo educando, tomado como peça de engrenagemde um sistema produtivo obsoleto, que ainda nãoincorporou a ciência como fator de produção.

Visão sistêmica da educação, território edesenvolvimento se fundem nos IFET de maneiraplena. Uma rede com 354 unidades não podemanter as características do período anterior. Amaturidade da rede federal de educação profissionale tecnológica e a escala e a dispersão das unidadespor todas as mesorregiões do País exigem um novomodelo de atuação, que envolva o desenvolvimentode um arrojado projeto político-pedagógico,verticalidade da oferta de educação profissional etecnológica, articulação com o ensino regular,aumento da escolaridade do trabalhador, interaçãocom o mundo do trabalho e as ciências e apoio àescola pública. Mais uma vez, níveis e modalidadeseducacionais em estreita conexão29.

2.3.2 NORMATIZAÇÃO

No plano legal, o PDE promove avançosconsistentes na educação profissional etecnológica.

29 Os IFET são elementos de articulação do arranjo educativo regional, da mesma maneira que a Escola de Altos Estudos da CAPES(Decreto nº 5.801, de 8 de junho de 2006) é elemento de articulação do arranjo educativo nacional, ao pensar o País como roteiro decientistas estrangeiros de renome mundial. Ou, ainda, da mesma maneira que o Programa Mais Educação é elemento de articulação,no bairro, do arranjo educativo local, em conexão com a comunidade. Sobre o Programa Mais Educação (Portaria NormativaInterministerial nº 17, de 24 de abril de 2007), vale ressaltar que, mais do que um programa, a expressão “mais educação” traduz umconceito, ou melhor, traduz uma das dimensões do enlace entre a visão sistêmica de educação e desenvolvimento, que organiza, emtorno da escola pública, ações na área da cultura, do esporte, dos direitos humanos e do desenvolvimento social, mediante ampliaçãoda jornada escolar (Programa Mais Educação); na área da saúde, por meio de um programa de educação e saúde nas escolas (ProgramaSaúde na Escola); na área da ciência e tecnologia, através de uma importante iniciativa de fomento à produção de conteúdos digitaiseducacionais (Programa Conteúdos Digitais Educacionais); na área do transporte, com o inovador programa que subsidia a compra deveículos escolares (Programa Caminho da Escola) etc.

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A educação no ambiente de trabalho, comou sem vínculo empregatício, ganhará força coma nova regulamentação da aprendizagem e anova lei do estágio. O ato educativo foi valorizadoem detrimento da precarização do trabalhoformal. Tanto quanto possível, temos deincorporar as unidades produtivas aos arranjoseducativos locais.

O estágio, como ato educativo supervi-sionado desenvolvido no ambiente de trabalho,deve fazer parte do projeto pedagógico do curso,além de integrar o itinerário formativo doestagiário. O estágio deve ainda visar aoaprendizado de competências próprias daatividade profissional ou à contextualizaçãocurricular, objetivando o desenvolvimento paraa vida cidadã e para o trabalho em geral.

Em oposição ao Decreto nº 2.208, de 14de abril de 1997, que desarticulou importantesexperiências de integração do ensino regular àeducação profissional, o Decreto nº 5.154, de 23de julho 2004, retomou a perspectiva daintegração. O PDE propõe sua consolidaçãojurídica na LDB, que passará a vigorar acrescidade uma seção especificamente dedicada àarticulação entre a educação profissional e oensino médio, denominada “Da EducaçãoProfissional Técnica de Nível Médio”30. Aeducação profissional integrada em especial aoensino médio é a que apresenta melhoresresultados pedagógicos ao promover o reforçomútuo dos conteúdos curriculares, inclusive namodalidade a distância31.

No plano da regulação, os cursossuperiores de tecnologia, importante fronteira deexpansão da educação superior, ganharam umcatálogo nacional que, nos moldes da experiênciainternacional, assumiu um papel decisivo naordenação da oferta de cursos, antesdesorganizada, na medida em que criou umpadrão de referência para os estudantes quebuscam formação profissional e para o mundodo trabalho – o que permite a avaliação dessescursos pelo SINAES. A partir do catálogo,

ajustam-se as expectativas quanto à formaçãoprofissional e se projeta grande expansão daeducação superior tecnológica no próximoperíodo, essencial ao desenvolvimento do País.Prepara-se, na esteira desse processo, aelaboração de um catálogo de cursos técnicosde nível médio que permitirá ao estudante, já apartir desse nível, vislumbrar consistentesitinerários formativos.

2.3.3 EJA PROFISSIONALIZANTE

A educação de jovens e adultos integradaà educação profissional também ganhoudestaque. O Programa Nacional de Integração daEducação Profissional com a Educação Básicana Modalidade de Educação de Jovens e Adultos(PROEJA) orienta os sistemas estaduais e osistema federal a oferecer educação profissionalintegrada ao ensino médio na modalidadeeducação de jovens e adultos, enquanto oPrograma Nacional de Inclusão de Jovens:Educação, Qualificação e Ação Comunitária(PROJOVEM) orienta os sistemas municipaisnessa mesma direção quanto às séries finais doensino fundamental. O bom resultado dessesprogramas anima a proposta de, também nesseaspecto, incorporar a educação de jovens eadultos profissionalizante ao texto da LDB, nosseguintes termos: “A educação de jovens eadultos deverá articular-se, preferencialmente,com a educação profissional”32.

2.4 ALFABETIZAÇÃO, EDUCAÇÃOCONTINUADA E DIVERSIDADE

No que toca à educação continuada ediversidade, as providências tomadas comple-mentam a visão sistêmica da educação.Recapitulando o que foi dito – e feito: a educaçãode jovens e adultos (EJA) foi contemplada noFUNDEB, ao mesmo tempo em que a EJA dosanos finais do ensino fundamental e do ensinomédio passou a ser integrada à educaçãoprofissional pelo PROJOVEM e pelo PROEJA,

30 Projeto de Lei nº 919, de 2007.31 Nesse sentido, cabe lembrar as experiências que motivaram o lançamento da Escola Técnica Aberta do Brasil (e-TEC Brasil), como

programa do PDE.32 Projeto de Lei nº 919, de 2007.

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respectivamente. São passos de grande valor,mas ainda insuficientes. O Ministério da Educaçãotem ainda pela frente seu maior desafio: integraro Programa Brasil Alfabetizado, remodelado noPDE, com a educação de jovens e adultos dasséries iniciais do ensino fundamental.

Muitos educadores recomendam deixar delado o problema do analfabetismo de jovens eadultos. A baixa efetividade dos vários programasbrasileiros de alfabetização tem lhes dado razãoaté aqui (Mobral, Alfabetização Solidária e aprimeira versão do Brasil Alfabetizado). Contudo,se tomarmos as taxas médias de analfabetismona faixa de população de 15 a 29 anos, ela é de2,6% nas regiões Centro-Oeste, Sul, Sudeste eNorte, enquanto na região Nordeste ela alcança12,5%. Ou seja, quase cinco vezes a média dasdemais regiões. Sobre isso, o PNE já alertava:“Todos os indicadores apontam para a profundadesigualdade regional na oferta de oportunidadeseducacionais e a concentração de populaçãoanalfabeta ou insuficientemente escolarizada nosbolsões de pobreza existentes no País. Cercade 30% da população analfabeta com mais de15 anos está localizada no Nordeste”. Dentre osmil municípios com os menores IDEB, 80,7%estão no Nordeste e, destes, 86% têm taxa deanalfabetismo superior a 30%.

Aqui, a questão territorial assume contor-nos críticos e talvez seja possível dizer quenenhum outro aspecto da educação brasileira étão marcado pelos traços característicos danossa formação nacional quanto este. NoNordeste, particularmente no Semi-Árido, osefeitos do nosso fardo histórico – escravidão,patrimonialismo estatal e reacionarismo religioso– são mais visíveis do que em qualquer outraregião, embora ainda presentes, em diferentesmedidas, em todas elas.

As cifras e as estatísticas, porém, nãobastam para fundamentar o que está em jogoaqui. O Estado brasileiro tem o dever moral de

explorar todas as possibilidades de superaçãodo problema do analfabetismo. A saída que oPDE aponta com a nova versão do ProgramaBrasil Alfabetizado33 é o aprofundamento davisão sistêmica da educação, integrando, emcada município, a alfabetização à EJA. As salasde alfabetização, a cada formatura, devem sertransformadas em salas de educação continuadade jovens e adultos, o que ocorrerá com maiorfreqüência se os equipamentos públicos e osprofessores da rede pública forem incorporadosao programa, sobretudo no campo – o que nãosignifica prescindir da sociedade civil organizada,que pode desempenhar importante papel namobilização da comunidade e na formaçãoespecializada dos alfabetizadores, concreti-zando as dimensões da transparência e damobilização social, fundamentais ao PDE.

As diretrizes do PDE contemplam ainda ofortalecimento da inclusão educacional,reconhecendo que as formas organizacionais eas práticas pedagógicas forjaram historicamenteuma cultura escolar excludente e que, portantohá uma dívida social a ser resgatada. O PDEprocura responder a esse anseio com váriasações34. Educação significa respeitar as especi-ficidades de indivíduos e comunidades, incluir epreservar as diferenças, realizando a diversi-dade na igualdade como fundamento primeiro doato educativo. Assim se permite considerar asturmas comuns de ensino regular nas quais hajainclusão, a reserva indígena, a comuna quilom-bola ou o assentamento como “territórios decidadania” ou arranjos educativos específicosnos quais se promove o desenvolvimento huma-no de todos e de cada um.

As populações indígenas têm constitu-cionalmente garantido o direito a uma educaçãoprópria. Os conceitos que sustentam o PDEpermitem que sejam construídos, com ascomunidades indígenas, arranjos étnico-educativos em respeito à territorialidade dascomunidades, ensejando um novo desenho do

33 Decreto nº 6.093, de 24 de abril de 2007.34 Programa de Formação Continuada de Professores na Educação Especial, Programa de Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais,

Programa de Acompanhamento e Monitoramento do Acesso e Permanência na Escola das Pessoas com Deficiência Beneficiárias doBenefício de Prestação Continuada da Assistência Social, Programa Incluir: Acessibilidade na Educação Superior, Programa de AçõesAfirmativas para a População Negra nas Instituições Públicas de Educação Superior, Programa de Formação Superior e LicenciaturasIndígenas, Programa Nacional de Informática na Educação do Campo (Proinfo Campo), Projovem Campo – Saberes da Terra e ProgramaDinheiro Direto na Escola do Campo (PDDE Campo), entre outros.

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regime de colaboração, com as responsa-bilidades partilhadas entre os níveis de governo,participação ativa das comunidades e dasociedade civil organizada. Do mesmo modo, aspopulações de áreas remanescentes de quilomboterão condições de participar de uma educaçãoque valorize suas tradições.

3 O Plano de Desenvolvimento daEducação como Horizonte doDebate sobre o Sistema Nacional deEducação

Em todos os eixos norteadores do PDE(educação básica, superior, profissional ealfabetização), os enlaces entre educaçãosistêmica, território e desenvolvimento sãoexplicitados. Em contrapartida, a visão frag-mentada da educação retira a discussão docampo estratégico, concorrendo para a fixaçãode uma disputa entre etapas, modalidades eníveis educacionais. Ou seja, uma disputa daeducação com ela mesma que resulta na faltade coerência e na ausência de articulação detodo sistema. A visão sistêmica da educação éa única compatível com o horizonte de umsistema nacional de educação, não apenasporque organiza os eixos norteadores como elosde uma cadeia que devem se reforçar mu-tuamente, mas também porque fixa seus supor-tes institucionais: sistema nacional de avaliação,sistema nacional de formação de professores eregime de colaboração.

Duas questões correlacionadas merecemconsideração final: financiamento e autonomia.

Estudiosos da educação, em especialeconomistas, têm defendido a tese de que o Brasilnão precisa ampliar os investimentos emeducação como proporção do Produto InternoBruto. Alegam que o patamar atual, de 4%, apro-xima-se da média dos países desenvolvidos, omesmo valendo para a relação entre o investimentona educação básica e o investimento na educaçãosuperior, de cerca de quatro para um. Esta abor-dagem, contudo, perde de vista dois aspectos:nosso baixo PIB per capita e nossa elevada dívidaeducacional. Se quisermos acelerar o passo esuperar um século de atraso no prazo de uma

geração, não há como fazê-lo sem investimentosna educação da ordem de 6% a 7% do PIB. Nesteesforço, que deve ser nacional, o PDE, consi-derada a complementação da União ao FUNDEB,acrescenta, a partir do quarto ano de seu lança-mento, R$ 19 bilhões anuais ao orçamento doMinistério da Educação, ou 0,7% do PIB, apenascomo contrapartida federal.

Outro equívoco comum é a defesa de umsistema de incentivos composto de prêmios epunições, em geral de caráter pecuniário, àsescolas ou às redes educacionais que cumpri-rem ou não metas de qualidade, em geral preesta-belecidas. Esta perspectiva desconsidera o fatode que restringir o financiamento de escolas ousistemas educacionais por queda de desempe-nho pode significar punir uma segunda vez aqueleque já não viu respeitado seu direito de aprender– o educando. O regime de colaboração deveprever o aumento das transferências automáticasde recursos às escolas e às redes educacionaisque demonstrem capacidade de avançar comsuas próprias forças e o aumento das transferên-cias de recursos condicionado à elaboração eao cumprimento de um plano de trabalho para asescolas e as redes educacionais que necessi-tem de apoio técnico e financeiro. Em outras pala-vras, deve-se equalizar as oportunidades educa-cionais pelo aumento do financiamento, diferen-ciando-se apenas o caráter do apoio, de modo agarantir a ampliação da esfera de autonomia dasescolas e das redes educacionais. A autonomiadas escolas e das redes, não obstante, não éoriginária, mas derivada da autonomia do edu-cando conseqüente ao processo de socializaçãoe individuação. Quando esta última é ameaçadapela primeira, entram em conflito o direito da es-cola e o direito do educando. Há, aqui, uma antino-mia, direito contra direito. Em educação, tem pre-cedência o direito do educando, caso em que umaação reparadora se justifica.

O objetivo da educação pública é, portanto,promover autonomia. A regra vale tanto para insti-tuições de ensino como para indivíduos. O con-ceito de autonomia, contudo, tem se prestado aequívocos, com conseqüências danosas para aaprendizagem. A compreensão do conceito deautonomia do indivíduo exige a percepção danatureza dialética da relação entre socializa-ção e individuação. Educar homens e mulheres

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autônomos é garantir a emergência desubjetividades críticas sobre o pano de fundo deuma tradição cultural gerada pela linguagem e pelotrabalho, o que só é possível pelo desenvo-lvimento de competências para se apropriar deconteúdos e da capacidade de tomar posturacrítica frente a eles. O juízo crítico se desenvolvemais pela forma como se ensina do que peloconteúdo do que se ensina. Mas a falta ou oexcesso de conteúdo, por exemplo, contamina aforma. A relação entre forma e conteúdo éigualmente dialética e é sua justa mediação quedá ao educando condições de, por um lado,aprender a agir autonomamente dentro de ummarco de referência universalista para, por outrolado, habilitá-lo a se desenvolver na sua particu-laridade. É essa condição que permite aoindivíduo autônomo tanto sua autodeterminaçãoquanto sua auto-realização, seja colocando-seda perspectiva ética de membro de uma

comunidade em devir, seja pela afirmação de seupróprio valor por meio de atividades criativas,como as ciências ou as artes.

Educação sistêmica, ordenação territoriale desenvolvimento são princípios do PDE. Oenlace entre educação, território e desenvol-vimento deve ser um de seus resultados. Quali-dade, eqüidade e potencialidade são seuspropósitos. Qualidade entendida como enriqueci-mento do processo educacional, participação dossujeitos e valorização das diferenças, de modoque as oportunidades educacionais se constituamem formas reais de reconhecimento e desenvol-vimento das potencialidades, conhecimentos ecompetências. A melhoria da qualidade da edu-cação e a redução de desigualdades relativasàs oportunidades educacionais – em outras pala-vras, o direito de aprender – são suas razõesconstitutivas.