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O quadro comunicacional e a produção da subjetividade em
uma campanha de segurança no trânsito Agmar Bento Teodoro
Centro Federal de Educação Tecnológica de MG
Departamento de Linguagem e Tecnologia (DELTEC)
Palavras-chave: campanhas de trânsito; Subjetividade; Midiatização.
RESUMO EXPANDIDO
O processo de globalização, bem como, a convergência tecnológica tem dado novas
dimensões aos meios de comunicação e consequentemente isso vem alterando
significativamente as relações entre os atores sociais individuais e coletivos na atualidade.
Pode se afirmar que o processo de midiatização se dá nesse contexto, no qual, as
linguagens das mídias penetram e passam a fazer parte da dinâmica de vários campos
sociais. O individuo, enquanto receptor, passa a fazer parte do processo de comunicação,
interagindo e, muitas vezes, intervindo e é nesse processo que ele elabora seu discurso. E
é notório que o processo de midiatização se potencializou com a difusão das novas formas
de se interagir, sobretudo, com as tecnologias ligadas a internet.
Apoiado nesse novo cenário, de facilidades de transmissão de informações, como uma
forma de sanar um grande problema enfrentado pela maioria das grandes cidades
brasileiras, os acidentes de trânsito, o DENATRAN (Departamento Nacional de Trânsito)
em parceria com o Ministério das Cidades tem produzido várias campanhas de
conscientização e educação de trânsito, veiculadas em diferentes mídias.
Essas campanhas surgem em atendimento ao chamado doa ONU (Organização das
Nações Unidas), que, em Assembleia Geral, no dia 02 de março de 2010, sancionou
oficialmente o período de 2011 a 2020 como sendo a Década Mundial de Ação pela
Segurança no Trânsito com o objetivo de estimular esforços em todo o planeta para conter
e reverter a tendência crescente de fatalidades e ferimentos graves em acidentes no
trânsito no mundo.
Para fortalecer o chamado da ONU o Brasil lançou em 11 de maio de 2011 o programa
PARADA “Pacto Nacional pela Redução de Acidentes no Trânsito” que tem por objetivo
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buscar o engajamento dos poderes executivo, legislativo e judiciário, nos três níveis de
governo, e da sociedade civil na redução dos acidentes e violência no trânsito.
O objeto das campanhas de educação de trânsito é conscientizar, informar e educar os
usuários do sistema trânsito. Essas campanhas são produzidas em folders (panfletos),
distribuídos em blitzen educativas, outdoors, fixados em áreas urbanas e em áreas rurais
próximos a rodovias e também vídeos veiculados na TV e na internet.
O objetivo deste trabalho é apresentar a análise de um vídeo de uma campanha de
segurança e educação no trânsito produzido pelo DENATRAN e veiculado no período da
Semana Nacional de Trânsito em 2011 (18 a 25 de setembro).
O vídeo escolhido tem 30 segundos de duração e é composto por imagens, sons e legendas
e narração, conforme descrição a seguir: No início do vídeo, é mostrado um rapaz sobre
a direção de um carro branco. Esse engata a marcha no veículo e pisa fundo no acelerador,
(som de ruído do motor) é dado um close em seus pés e mostra que ele esta usando um
tênis nas cores e forma da bandeira da formula 1.
Na sequencia ele realiza uma conversão (som de derrapagem) à esquerda em um local
proibido, onde há uma placa de “proibido virar à esquerda”, e quase colide com um carro
vermelho que vinha na pista contrária (som de buzina e frenagem). Em seguida, é focado
em uma placa de “velocidade máxima permitida”, de 60 km/h. É mostrado o carro se
movimentando em alta velocidade, e o velocímetro marcando 80 km/h. O motorista se
direciona até um cruzamento, onde há uma placa de “PARE”. Ele não obedece a
sinalização, e por pouco não bate em outro veículo que entrava no cruzamento, que freia
bruscamente. O rapaz chega até a praia, estaciona o carro e retira sua prancha de surf, e
se direciona correndo ao mar (som de ondas).
Ele avista na areia uma placa, onde está escrito “PERIGO” e abaixo a imagem de um
tubarão. Vendo que aquele lugar não era próprio para surfar, devido ao risco de ataque de
tubarões, o jovem rapaz faz cara de tristeza, dá meia volta e retorna ao veículo.
Em seguida, a tela fica preta, (musica triste) e é mostrada a frase “Se você acredita numa
placa que protege sua vida, por que não fazer o mesmo no trânsito?”. Ao final da
campanha, passa-se a cena do surfista se retirando do local. Uma tela preta é retomada
(musica triste) e aparece a frase na tela PARE – PENSE – MUDE, juntamente com a
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logomarca do programa PARADA, uma mão estendida sobre um losango amarelo com a
frase PARADA Pacto Nacional Pela Redução de Acidentes.
O objetivo principal da propaganda escolhida é conscientizar jovens motoristas sobre a
importância de se respeitar as placas de sinalização de trânsito. A opção por analisar esse
vídeo se deveu ao fato de ser o primeiro vídeo produzido após a ONU instituir o decênio
de 2011 a 2020 como a Década Mundial de Ação pela Segurança no Trânsito.
Procurou mostrar, por meio da análise, como se dá o caráter informativo da campanha
com base na teoria comunicacional de Patrick Charaudeau e também mostrar como se
constroem as estratégias enunciativas com base na produção de subjetividade proposta
por Félix Guattari, bem como, a influência da midiatização no processo de recepção da
mensagem transmitida pelo vídeo.
Foi possível observar na campanha dois circuitos de comunicação formados pelo agente
enunciador, comunicante e interpretante. Sob a ótica da subjetividade foi possível
identificar na campanha, em análise, nuances que são capazes de reforçar, no jovem
motorista, a subjetivação imposta pelo capitalismo e pela midiatização.
A campanha utiliza recursos para se tornar atrativa ao público alvo. No entanto esse
jovem, alvo da campanha, não está isento das forças externas produzidas pelo processo
de midiatização, ao qual ele está exposto, representado em várias instâncias. E os recursos
apresentados na campanha em tela podem reforçar, no jovem, essas forças externas,
reforçando uma subjetivação que conduz a um caminho oposto ao desejado pela
campanha.
A mídia, enquanto representante da força capitalista, (força externa) exerce sobre os
indivíduos certa influência com a finalidade de impor e formar um padrão de
comportamento (sociedade midiatizada). As campanhas publicitárias de automóveis, por
exemplo, apresentam veículos potentes e rápidos capazes de vencerem grandes distâncias
em um tempo curto.
A sinalização de trânsito é mostrada no vídeo, como algo que pode retardar o tempo de
deslocamento, pois o veículo é capaz de se locomover muito mais rápido do que a
sinalização preconiza. Dessa forma, respeitar as placas de sinalização, que informam que
se devem dirigir mais devagar do que o automóvel permite, passa ser um desafio, o
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condutor passa a fazer algo contra a sua vontade e contra as premissas do automóvel, que
lhe permite alcançar uma alta velocidade em um tempo mínimo, fazer conversões bruscas,
graças ao seu sistema inovador de direção, paradas quase instantâneas devido ao seu
robusto sistema de freios.
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Zero Hora e seus “3 projetos para o Rio Grande”:
Jornalismo construindo realidades na sociedade em
midiatização
Antônio Rogério Rolim Cândido Unisinos — São Leopoldo/RS
Palavras-chave: Jornalismo. Midiatização. Cultura participativa. Circulação. Contrato
de leitura.
RESUMO EXPANDIDO
A midiatização provoca turbulências na comunicação. Esta complexificou-se
como campo, ao mesmo tempo em que seus processos de mediação vêm sofrendo
transformações. As rotinas do jornalismo foram alteradas, das práticas discursivas à
identidade dos profissionais, assim como a relação com o público. A apropriação de
regras de trabalho jornalístico por parte de outros campos levou os meios a buscarem
diferentes formas de relacionar-se com estes e, especialmente, com seu público. Com
muitas e diversas opções para buscar as informações que lhes interessem, os leitores,
ouvintes e telespectadores tornaram-se alvo de acirrada disputa. Nessa concorrência, as
mídias constroem as mais diferentes maneiras de atrair e manter seus consumidores.
Conforme Braga (2012, p.37), “todas as áreas e setores da sociedade passaram a
desenvolver práticas e reflexões [...], testando possibilidades e inventando processos
interacionais para participar segundo suas próprias perspectivas e interesses”.
Esses processos interacionais afetam os processos de produção e recepção na
sociedade em midiatização, reforçam a cultura participativa e criam a necessidade de que
novos vínculos sejam estabelecidos entre meios de comunicação e seus públicos. O artigo
vai abordar esse cenário a partir do estudo de uma iniciativa de Zero Hora.
Para comemorar seus 45 anos, em maio de 2009, ZH lançou a promoção "3
projetos para o Rio Grande". Oferecia ao público a possibilidade de escolher, em uma
lista de 15 obras, a que considerasse mais relevante. As três mais votadas (uma da Região
Metropolitana de Porto Alegre e duas do interior) teriam sua importância analisada e seu
andamento acompanhado por meio de reportagens especiais.
Por meio de uma eleição direta, o cidadão rio-grandense ajudará a selecionar
três grandes obras (poderá votar em apenas uma entre 15) que gostaria de ver
implantadas para melhorar sua vida. A partir da escolha popular, o jornal se
dedicará a detalhar a importância de cada uma e dará início a uma campanha
para transformar antigas promessas em realidade. Após subir ao pódio definido
pela vontade dos leitores, essas obras vão migrar para as páginas de ZH na
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forma de reportagens especiais e de fiscalização do andamento de cada uma.
(ZERO HORA, 2009, p. 27).
Zero Hora construiu, ao mesmo tempo, uma circunstância para interagir com seus
leitores e uma oportunidade de fazer intermediação jornalística entre Estado e atores
sociais. Propõe uma parceria com seu leitorado, chama seus leitores a participarem da
definição da pauta de uma série de reportagens sobre grandes obras no Rio Grande do
Sul. No mesmo momento, demarca o espaço inicial em que o público atuará — como
eleitor/pauteiro. A produção ficará a cargo dos peritos jornalistas.
Na sociedade em midiatização, os meios buscam preservar sua autonomia para
falar para a sociedade. O protagonismo do jornalismo está em apresentar ofertas de
intervenção na realidade, em construir realidades. Ao criar — sem pedir autorização a
ninguém — um processo eleitoral informal, cujo resultado aponta para uma intervenção
na sociedade, ZH demonstra o poder do campo jornalístico.
O resultado imediato da participação do público provoca a ocorrência de um fato
a ser noticiado. A operação que o jornal oferece vai além do colocado pela leitura, é uma
proposta de união de forças — adiante do ambiente interno midiático. Ao dar a
oportunidade de decisão ao seu leitorado, Zero Hora o empodera. E capitaliza esse
empoderamento, pois o apoio do leitorado à sua iniciativa, o voto, daria suporte à ZH para
batalhar pelas obras selecionadas, fortalecendo a personalidade do jornal.
As condições para essa iniciativa foram desenhadas por Verón (1997, p. 15) em
sua representação esquemática sobre a complexidade dos fenômenos da midiatização.
Como meio de comunicação, ZH tem relações específicas, de mão dupla, com instituições
e atores individuais. E afeta, também em duplo sentido, a relação direta existente entre
ambos.
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Esquema para análise da midiatização
A intermediação proposta por ZH afeta a sociedade de modo complexo, visa
produzir efeitos de sentido para o leitorado, para o poder público e para si mesma. É de
natureza simbólica, sendo que Zero Hora mostra-se como elo de contato ativo e faz com
que a relação com os acontecimentos seja explicitada por operações produzidas pelo
próprio meio.
Mas essa afetação não é um processo linear, deve ser analisada pelo viés das
transformações que a midiatização provocou nas relações entre produção e recepção,
como foi dito no início deste texto. O que nos leva à necessidade de analisar o tema da
circulação — em que oferta e apropriação têm gramáticas e lógicas próprias. Seu encontro
se dá num local que não é nem uma, nem outra — é um terceiro, o da circulação. É uma
zona de contato em que essas diferenças produzem sentidos. É essa interdiscursividade
que faz a comunicação. Como diz Fausto Neto (2010, p. 9), na circulação “as intenções
de origem perdem força, uma vez que são entregues a outras dinâmicas que fazem com
que produção e recepção não possam mais controlá-las, bem como os efeitos que
presumem estabelecer sobre discursos”.
Esse cenário entrópico, por sua vez, remete à necessidade dos meios de
estabelecerem laços com seus públicos. O que Verón (2004, p. 249, grifo do autor), define
como construção da personalidade do jornal “através de uma estratégia enunciativa
própria, ou seja, construindo um certo vínculo com seus leitores”. Uma visão convergente
com a de Fausto Neto (2007a, p. 20),
[...] a constituição de um contrato de leitura pelo qual o jornal pede
reconhecimento, depende cada vez menos de operações de sentido definidas
apenas pelo mundo das regras internas ao campo produtor da noticiabilidade.
Depende de outras complexas estratégias, que procedendo de diferentes
campos sociais, fariam lembrar a inevitável incompletude dos ‘contratos’ e dos
próprios processos de comunicação. E, porque não dizer, de um processo de
vinculação que não se estruturaria mais apenas na em lógicas regulatórias, na
convicção e nas próprias operações tecno-organizacionais jornalísticas.
O artigo vai problematizar os efeitos da midiatização na imprensa, afetando sua
representatividade e os vínculos existentes com seu leitorado, situação tensionada pelo
desenvolvimento de uma cultura participativa e a nova condição produtiva dos atores
sociais. Analisar as estratégias e operações enunciativas que os jornais desenvolvem para
manter sua identidade e preservar sua autonomia numa sociedade marcada por
atravessamentos e processos interacionais.
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Referências
BRAGA, José Luiz. Circuitos versus campos sociais. In: MATTOS, M. A. et AL.
(Org.). Mediação & Midiatização. Salvador: UFBA, p. 31-52, 2012. Disponível em:
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Leopoldo: Unisinos/PPGCC, 2005.
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2007a. Disponível em:
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<www.latrama.fcpolit.unr.edu.ar/index.php/trama/article/download/129/pdf>. Acesso
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______. A circulação além das bordas. In: FAUSTO NETO, A. et al. (Org).
Mediatización, Sociedad y Sentido: diálogos entre Brasil y Argentina. Rosario,
Argentina: Universidad Nacional de Rosario, p. 2-15, 2010. Disponível em:
<http://www.fcpolit.unr.edu.ar/wpcontent/uploads/Mediatizaci%C3%B3n-sociedad-y-
sentido.pdf>. Acesso em 08 abr. 2016.
VERÓN, Eliseo. Esquema para el análisis de la mediatización. Diálogos de La
Comunicación, Buenos Aires, n. 48, out. 1997. Disponível em:
<https://comycult.files.wordpress.com/2014/04/veron_esquema_para_el_analisis_de_la
_mediatizacion.pdf>. Acesso em 25 mar. 2016.
______. Fragmentos de um tecido. São Leopoldo: Unisinos, 2004.
ZERO HORA. Porto Alegre. Diário. Disponível em:
<http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a2496
684.x ml&template=3898.dwt&edition=12224§ion=1003>. Acesso em: 3 mai.
2009.
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Lógicas de midiatização na cidade: apontamentos sobre usos e
apropriações dos APPS WAZE e NIKE+
Daniel Bittencourt UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DO SINOS
Palavras-chave: Midiatização, territórios, práticas sociais, usos e apropriações
RESUMO EXPANDIDO
A popularização da Internet e a configuração de um ambiente de mídia programável
- um dos desdobramentos da rede, a web possui uma espécie de funcionamento orgânico
cuja dinâmica é abastecida por milhões de programadores - constituem um terreno
propício para novos experimentos e relacionamentos entre pessoas, tecnologias e
territórios. Diferentemente de outros meios de comunicação, cuja possibilidade de
recombinação e refundação é mais lenta e difícil, a Internet (e o que se faz dela)
experimenta usos e apropriações de práticas comunicacionais que remodelam a paisagem
midiática. Seja pela adoção do público e/ou pela popularização de tecnologias como
georreferenciamento, interfaces de programação de aplicativos (API) e de conexão com
redes sociais, existem hoje elementos acessíveis ao público para que ele - e não apenas os
grandes conglomerados midiáticos - possa propor novas dinâmicas interacionais. É nesta
ambiência que surgiram novos atores que extravasaram seus papéis iniciais, voltados à
comunicação, para interferir em dinâmicas sociais, econômicas e culturais. A Internet e a
cultura digital que a acompanha forneceram elementos para a emergência de plataformas
colaborativas, cujo papel do público extrapola os limites da recepção e do consumo -
gerando dinâmicas próprias e singulares no campo da circulação midiática, ao reprocessar
e reprogramar circuitos comunicacionais a partir de novas lógicas.. Antes terreno de quem
dominava linguagens de programação, a redução da barreira de entrada aos códigos
facilitou a criação na web de sites de mapeamentos de crimes, de ciclovias, de feiras
orgânicas e de áreas com acesso wi-fi livre. Esta primeira onda sugere a formação de
territórios informacionais (LEMOS, 2007) com forte relação com a ambiência física
marcada pelas cidades. O crescimento deste tipo de comunidade virtual e a apropriação
dos usuários permitiram a eclosão de aplicações que deixaram a web e invadiram
smartphones para ajudar o público a estabelecer rotas de trânsito mais inteligentes, a
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propor novas modalidades de transporte e de dinâmicas esportivas orientadas à coleta de
dados e ao fornecimento de fórmulas de melhoria de performance atlética.
Este resumo expandido é parte da pesquisa de doutoramento e se propõe a discutir
plataformas colaborativas que formam parte da paisagem emergente do que é chamado
provisoriamente de cidade midiatizada, onde os processos de circulação se dão através de
novas zonas comunicacionais - com filtros e mediações diferentes de filtros e mediações
usados por meios de comunicação convencionais -, dotados de algoritmos sistêmicos
auto-organizados (JOHNSON, 2001). Para tanto, analisamos usos e apropriações de
colaborativos expoentes da Nova Economia, Waze e Nike+, ancorados na constituição de
comunidades de usuários, são estudados na busca de inferências iniciais para checagem
da hipótese que está em estudo. Este texto pretende investigar dois dos três objetos
estudados na pesquisa por entender que fornecem indícios distintos e complementares
entre si e de grande valia para o que se pretende investigar: os traços digitais que
fornecemos ao usar aplicativos colaborativos de georreferenciamento. Mais: o que isso
nos diz em relação ao território que habitamos. Waze e Nike+ tem características comuns:
são plataformas digitais que rodam preferencialmente em smartphones - mas podem ser
usadas em tablets e acessadas na web -, baseiam-se em dados do usuário para fornecer
respostas pró-ativas relativas ao seu serviço proposto e valem-se da contribuição das
pessoas para que seus algoritmos computacionais não só respondam às necessidades das
pessoas como se aperfeiçoem e "aprendam" através da interação de seus usuários.
O Waze1 é um dos mais populares aplicativos de mapas e navegação do mundo.
Através de dispositivos celulares, o usuário pode traçar rotas de deslocamentos e planejar
seu melhor caminho no trânsito a partir de informações disponibilizadas pelo aplicativo.
Um dos maiores diferenciais do Waze é ser um dispositivo comunicacional de mão dupla:
o usuário não apenas recebe informações, como pode fornecer dados sobre ocorrências
no trânsito, que servirão para auxiliar outros motoristas. Nike+2 é um aplicativo que
rastreia a corrida de desportistas profissionais e amadores e armazena informações como
ritmo das passadas, ritmo médio, tempo de percurso, distância percorrida, duração e
calorias gastas. Através de sua interface gráfica, Nike+ mostra o percurso do usuário com
o trajeto realizado entre dois pontos, indicando em zonas quentes e frias momentos em
1 Waze. Disponível em <http://www.waze.com>. Acesso em 8 de setembro de 2016.
2 Nike+. Disponível em <https://www.nike.com/us/en_us/p/activity>. Acesso em 8 de setembro de 2016.
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que o usuário imprimiu maior ou menor velocidade na corrida. A partir da leitura destes
dados, o app fornece métricas para a melhoria de desempenho do usuário. Ao conectar
sua conta Nike+ com sites de redes sociais, o atleta pode receber mensagens de incentivo
de seus amigos, além de áudios gravados previamente com áudios pré-gravados de atletas
de ponta.
Neste sentido, a pesquisa avança na perspectiva de investigar como as lógicas de
consumo e circulação de aplicativos colaborativos resultam em novas dinâmicas de
consumo e apropriação de territórios físicos. Assim, pretende-se estudar os processos
comunicacionais que levam à midiatização da cidade e a complexificação do papel do
usuário, que assume a posição de coautor dos apps ao utilizarem os dispositivos não
apenas em suas lógicas de consumo, mas inclusive de (re)produção e circulação. Busca-
se, assim, otimizar este processo e tensionar estes objetos a partir da perspectiva da
midiatização. Nas duas aplicações investigadas, são estudadas com maior profundidade
as relações que se estabelecem entre tecnologias, redes sociais e pessoas para o
apontamento de lógicas de consumo e circulação no ambiente territorial das cidades,
dentro de um complexo processo comunicacional inserido nas práticas decorrentes de
uma sociedade em vias de midiatização (BRAGA, 2012; FAUSTO NETO, 2010;
HJARVARD, 2012, 2014; VERÓN, 2014). E, ainda, como esses apps redesenham nossa
relação com o território físico e estabelecem - a partir de mediações com outras aplicações
- uma cidade que se estabelece em um território simbólico, construído através das
interações simultâneas do real com o virtual, cuja semantização é atribuída por lógicas
algorítmicas de sentimentalização territorial (o espaço que é ocupado, que é visível ou
que foi mapeado pelos app versus o espaço periférico, distante das nuvens de conexão
wifi ou dos smartphones mais potentes; o território seguro versus o território do medo).
De alguma forma, a constituição desse território informacional simbólico chamado de
cidade midiatizada é afetado e impõe afetações pelo modo como os softwares "leem" e
processam o que se faz na ambiência física.
Um das linhas de investigação adotada, a partir das primeiras coletas de indícios e
inferências na relação com o empírico é que as lógicas de usos, consumos e apropriações
que os usuários dos apps Waze e Nike+ fazem resultariam na constituição da cidade
midiatizada - uma interface interpolada entre o território físico, o informacional e o
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simbólico. Dito de outra forma, as lógicas de midiatização analisadas até este momento
apontam para uma nova possibilidade de vetor de interação entre a comunidade de
usuários e os apps, a partir da seguinte direção: invenção → uso → apropriação →
adoção, em que cada elemento implica em diferentes níveis de apropriação.
BIBLIOGRAFIA
BRAGA, José Luiz. Uma teoria tentativa. In: Revista da Associação Nacional dos
Programas de Pós-Graduação em Comunicação, E-Compós, Brasília, v. 15, n.3, set./dez.,
2012
FAUSTO NETO, Antônio. A circulação além das bordas. In: FAUSTO NETO,
Antônio; VALDETTARO, Sandra (ORGs.) Mediatización, Sociedad y Sentido: diálogos
entre Brasil y Argentina. Programa de Cooperación Científico Tecnológico MINCYT-
CAPES, 2010.
HJARVARD, Stig. Midiatização: teorizando a mídia como agente de mudança social
e cultural. Matrizes, vol. 5, núm. 2, janeiro-junho, 2012, pp. 53-91 Universidade de São
Paulo: São Paulo, Brasil
_________. A midiatização da cultura e da sociedade. São Leopoldo: Editora Unisinos,
2014.
JOHNSON, Steven. Emergência: a dinâmica de rede em formigas, cérebros, cidades e
softwares. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2003. 231 p.
LEMOS, André. Cidade e Mobilidade. Telefones Celulares, Funções pós-massivas e
territórios informacionais. Matrizes (USP. Impresso), v. 1, p. 121-138, 2007.
VERÓN, Eliseo. Teoria da midiatização: uma perspectiva semiantropológica e
algumas de suas consequências. In: Matrizes., v.8, nº1, São Paulo, jan./jun. 2014. p. 13-
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O museu como elemento transformador da cidade:
Da forma/função ao museu imagem na sociedade do
hiperespetáculo. Fabiano D Alessio Ferrara
RESUMO EXPANDIDO
No ritmo acelerado de transformações que atingem todas as cidades
contemporâneas, impõe-se a conservação do patrimônio edificado e daquilo que deve ser
considerado como índice de valor de uma cidade e memória histórica. Porém, assim como
no caso da coleta, conservação e exposição dos objetos, ao tratar da cidade é necessário
decidir aquilo que deve ser conservado supõe definir o que é digno daquela memória.
Considerando que a cidade é um organismo vivo em constante mudança no fluxo
das suas gerações, realizações, atuações, valores e cultura, a conservação dos índices
memoráveis exige a sensibilidade de perceber que aquela conservação não significa,
apenas, renovar ou conservar espaços urbanos que necessitam ser recuperados. Ao
contrário, a eleição daquela memória supõe identificar os caminhos que, conservando o
passado, permita a descoberta de outros espaços urbanos que introduzam a possibilidade
de descoberta de novos usos. Ou seja, conservar a memória de uma cidade significa
redesenhar o uso do espaço urbano.
Com a proximidade do segundo centenário da Revolução Francesa, a esquerda
francesa, recém-chegada ao poder, lança um grande pacote de projetos culturais. A
construção de um grande centro cultural que possibilitasse a revitalização de um
importante bairro nas proximidades da Sena, o Marrais apresentou-se como espaço
suficientemente notável como história que justificava sua recuperação. No final dos anos
70, a França vivia um momento de recuperação de uma indústria que, competente e
inovadora, sugeria igual ou semelhante empresa na área da cultura. A proposta de um
grande expoente reformulador do espaço público surge como possibilidade de renovação
do decadente Marrais e o Centro Georges Pompidou se oferece como espaço novo para
reapresentar o velho. O Museu surge como espaço que não mais guarda a memória da
cidade, mas a apresenta com novas configurações e outros interesses. A implantação do
Beaubourg marcou o início de grandes transformações urbanas e culturais que oferecia
Paris à descoberta do mundo.
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Inaugurado em 1977, o Centro Cultural Georges Pompidou surge como um
espaço híbrido e contínuo, onde artes plásticas, artes visuais, cinema, dança e outras
vertentes artísticas convivem em harmonia. Projetado por Richard Rogers e Renzo Piano,
o edifício joga todas suas “entranhas” para o exterior a fim de resguardar o espaço interno
que se reservava para selecionadas exposições temáticas, enquanto o espaço externo
transforma o museu em objeto de arte no contexto da cidade.
A premissa básica foi a criação de grandes áreas de convívio tanto no exterior
quanto no interior do prédio, exigia-se um projeto que contasse com grandes estruturas
para suportar enormes vãos: surge uma grande estrutura de metal colorido e fora da escala
das casas do bairro. Marcava-se o desejo de assinalar um novo tempo na cultura da cidade
de Paris e o projeto surgia como um “ser intruso” que usando suas cores e formas se
contrapunha às construções cinzentas do entorno. No final dos anos 70, o edifício era a
imagem da vanguarda francesa no campo das artes e cultura, mas também nos campos da
engenharia e da indústria metalúrgica. No final dos anos 70, o Beaubourg era o museu
em transformação: superava-se o espaço interno onde se recolhia a memória da cidade
para transformá-la em lugar público que deve ser visto.
Notadamente o Pompidou criou uma imagem de diálogo e perfeição entre forma
e função, tudo no edifício e essencial e estrutural, e por isso uma das premissas do projeto
é deixar todo o processo construtivo “a mostra”.
Certamente, o Centro Pompidou é um marco em relação à mudança de concepção
no espaço expositivo do museu: transforma o espaço em imagem com a qual o público
interage antes de chegar às exposições. O equipamento cultural museu, deixa de ser
endógeno e se expande pelos seus arredores criando uma visualidade que começa há
vários metros de distância, antes que se possa acessar o espaço. O caso Centro Pompidou
é emblemático como inserção de espaço onde o novo e diferente vem para colorir e
humanizar áreas urbanas decadentes. O museu se transforma em lugar irradiador de
cultura e requalificação do espaço urbano. Já não se sabe o que se expõe: o acervo, o
museu ou a própria cidade.
Em contexto mais recente de requalificação e redesenho urbano através de um
museu como edifício imagem, a cidade de Bilbao, na Espanha, foi uma grande
protagonista. A construção do Museu Guggenhein foi responsável pela transformação de
uma decadente cidade industrial no norte da Espanha, transformando-a em local dos mais
visitados no país e do mundo. De modo emblemático, o museu transforma o entorno e
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transforma a cidade, e se torna exemplo econômico-cultural de recuperação urba
Ao contrário do Centre Georges Pompidou, o Museum Guggenhein explora as
formas complexas e até pouco compreensíveis, e chega à cidade de Bilbao como um
grande barco do futuro. Construído com placas de titânio e outra ligas metálicas, sua
forma complexa e inusitada é um elemento de atração internacional e atrai milhões de
visitantes por ano. Neste caso, a atração é o próprio museu enquanto edifício imagem,
projetado e planejado para ser amplamente midiatizado. Parecendo ser cidade, esse
museu projeta a imagem daquilo que poderia ser uma hiperealidade urbana, uma
imagem/simulacro que, autorreferencial, vale por si mesma:
“ A metrópole, ao contrário, é dominada pela imagem que, reproduzida aos
milhões, se torna o simulacro do mundo, assim como o espaço por ela criado
invade, sem cerimônia, todos os espaços privados, fazendo-os parecer
públicos e, portanto, simulacros de uma representação. O início da segunda
metade século XX, marcado pela amarga realidade de duas grandes guerras,
viu nascer a metrópole e, com ela, se expande e se multiplica a cidade simulada
que se reproduz ao lado e através da televisão, enquanto seu espaço é visto a
distância através de um tubo catódico: a metrópole elege seus “lugares
iluminados” através dos quais conhecemos os lugares da cidade, ao mesmo
tempo em que se cria uma outra raiz para a visualidade do espaço social...” (
Ferrara, 2008, 66)
Nas imagens acima fica claro que o edifício tem uma força simbólica tão grande
como objeto que não comporta a exposição de um acervo clássico, os espaços pedem
para serem ocupados por instalações e grandes objetos que compõe esse “gigante de
titânico”. Nesse contexto, fica clara a estranha relação do museu com a cidade:
constituindo um aplique que se alojou na cidade, ela é exposta pelo museu que, porém, a
esconde como visualidade de lugar urbano. Mesmo sem transparência que revele seu
interior e que produza uma experiência exógena, o Guggenhein Bilbao deixa clara a sua
vocação de museu como imagem e como objeto de contemplação. A cidade exibe o museu
como se ele fizesse parte de uma grande exposição em escala urbana.
No final dos anos 70, o Centro Pompidou foi um marco que iniciou os primeiros
movimentos da arquitetura pós-moderna propondo novas integrações entre espaços e
lançando um desafio de investigação e pesquisa de novas técnicas construtivas.
Notadamente faz-se uma crítica à arquitetura moderna que se valeu da plástica do
concreto armado durante décadas, e avançou muito pouco no campo de pesquisa de novas
técnicas. Renzo Piano e Richard Rogers vencem o concurso para a instalação do novo
centro cultural justamente pela ousadia projetiva, considerada extremamente arrojada na
16
época. Cria-se através de um desejo projetivo um ciclo que se inicia no desenvolvimento
de novas técnicas construtivas e se finaliza no “edifício máquina” colorido que se destaca
no skyline parisiense.
Já no final dos anos 90, o Guggenhein Bilbao destaca-se também, pela ousadia no
projeto. Ao contrário do aconteceu na França dos anos 70, a técnica construtiva em si já
estava dominada e a quantidade de materiais à disposição era infinitamente maior. O
grande desafio de Frank Gehry nessa empreitada foi justamente usar a técnica como
ferramenta projetiva já que a técnica enquanto construção estava dominada. Para
conseguir calcular todas as curvas e ângulos do edifício complexo que se pretendia criar,
foram usados softwares CAD usados no projeto de objetos industriais. O resultado foi a
criação de uma grande escultura de placas de titânio que é exibida no meio da cidade.
Claramente não se tentou criar um diálogo com o entorno, mas sim uma ruptura total e o
resultado do contraste entre o velho e o novo, o ortogonal e o orgânico é sensacional.
Se fizermos uma comparação entre o Pompidou e o Guggenhein Bilbao, é possível
dizer que o Pompidou representa o momento das imagens técnicas, enquanto o
Guggenhein representa era das imagens tecnológicas e espetaculares. Para Gilles
Lipovetsky os dois exemplos de requalificação urbana entram na mesma categoria:
“Não se trata mais de maravilhar e subjugar o público por meio da expressão
da grandeza das finalidades, trata-se de impressionar à maneira de um ícone
publicitário, de criar umas espéciede logo ou de anúncio luminoso de luxo
capaz de animar a cidade e os turistas sedentos de imagens e divertimento.
Desde os anos 1970-80 – O Centro Pompidou é inaugurado em 1977 – não se
constroem mais museus cujo modelo é o templo grego ou a villa do
Renascimento cuja a função é conferir uma elevação espiritual às obras,
expressar quase a divindade das Belas-Artes. Não mais templos que visem
criar uma aura, mas museus de formas espetaculares que celebram antes o
universo do lazer e do divertimento do que a “Sacralidade” da arte à moda
antiga. A arquitetura da inciação espiritual é substituída por uma arquitetura
voltada para o consumo turístico de acontecimentos distrativos” (Lipovetsky,
2015, 275)
A lógica espetacular exige que um número crescente de exposições e museus se organize
como fontes de acontecimentos midiáticos, que são destinados a aumentar receitas e
número de visitantes. A própria museografia, representada por meio da montagem e da
apresentação das exposições passou dar um valor muito grande ao espetáculo onde
arquitetos, designers e cenógrafos de renome atraem o público tanto quanto a obra de arte
em si.
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“ Na era do capitalismo criativo, até os museus integram em seu
funcionamento as lógicas do espetacular, do sensacional, do cinema e dos
parques temáticos. ” (Lipovetsky, 2015, 288)
Vivemos na era das imagens espetaculares e isso não terá mais volta, desde o final
dos anos 70 investem-se muitos recursos na tentativa de criar equipamentos culturais que
vão além de guardar e expor a história da cultura do homem. Se por um lado podemos
pensar no lado fútil de criar um “museu imagem” para atrair mais visitantes e dinheiro
para determinado lugar, por outro, essa necessidade de criação de edifícios espetaculares
são a oportunidade de sair do lugar comum, de ousar, de criar novos paradigmas para os
usos, formas e processos construtivos.
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Enquadramentos e cobertura do jornal Folha de São Paulo
acerca das midiatizadas manifestações sociais de junho de
2013: crise jornalística e o papel das pesquisas Datafolha
Ivan Daniel Müller
Gustavo Roese Sanfelice
Palavras-chave: manifestações sociais; midiatização; mídia impressa.
RESUMO EXPANDIDO
O presente artigo evidencia uma análise acerca da cobertura do Jornal Folha de
São Paulo a respeito das Midiatizadas Manifestações Sociais de Junho de 2013 e, a partir
de tal análise procedimental, denota uma crise jornalística experimentada pela Folha à
época e o papel das pesquisas DataFolha na reinserção de uma “legitimidade discursiva”
por hora rompida pela crise.
Sob a ótica de enquadramentos (frames) de Goffman analisou-se distintos
fragmentos de registros veiculados na Folha de São Paulo dos dias 07 de junho de 2013
ao dia 02 de julho de 2013 que faziam referência às Manifestações Sociais de Junho de
2013. A partir dessa análise procedimental identificou-se três fases distintas de
enquadramentos do Jornal, referidas como: “Os vândalos da Folha de São Paulo!?”, “A
violência e o abuso policial em destaque” e “Ressignificando os enquadramentos:
destaques do campo político”.
“Os vândalos da Folha de São Paulo!?”
A primeira fase de enquadramentos intitulada: “Os vândalos da Folha de São
Paulo!?”, se estendeu do dia 07 ao dia 13 de junho de 2013, semana que cobriu os
momentos iniciais das Manifestações de Junho de 2013; aqui, os frames da Folha foram
massivamente depreciativos em relação às manifestações e manifestantes. O Movimento
Passe Livre (MPL), movimento social que liderou os primeiros protestos na Cidade de
São Paulo foi maculado, os manifestantes classificados deliberadamente como vândalos
e as manifestações deslegitimadas. Notadamente a Folha promoveu uma definição
particular da realidade, possibilidade derivada dos enquadramentos, pois havia, segundo
o Jornal, um lado ruim da história, e esse lado sem dúvida era o dos manifestantes.
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Figura 1: Exemplos dos enquadramentos “Os Vândalos da Folha de São Paulo!?” (Folha de São
Paulo - 12 de junho de 2013)
“A violência e o abuso policial em destaque”
A segunda fase por sua vez recebeu o título de: “A violência policial em destaque”,
sendo que tais enquadramentos estiveram presentes na edição do dia 14 de junho, onde a
Folha passou deliberadamente a enxergar o outro lado da história. Após uma ação
desmedida da polícia militar paulista e da tropa de choque, o Jornal mudou seus
enquadramentos bruscamente. Cabe lembrar que a PM e a tropa de choque se utilizaram
de bombas de efeito moral, spray de pimenta e sobremaneira disparos com bala de
borracha para conterem manifestantes, sendo que houve inúmeros feridos, alguns
gravemente, dentre eles, jornalistas da própria Folha de São Paulo.
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Figura 2: Exemplos dos enquadramentos “A violência e o abuso policial em destaque” (Folha de
São Paulo - 14 de junho de 2013)
“Ressignificando os enquadramentos: destaques do campo político”
Já a terceira fase de enquadramentos denominou-se: “Ressignificando os
enquadramentos: destaques do campo político”. Essa fase compreendeu o período que vai
do dia 15 de junho ao dia 02 de julho, onde há uma nova ressignificação dos frames do
Jornal, e o que se percebe é um maior cuidado da Folha no que diz respeito a classificações
do campo social (manifestantes e manifestações) e uma maior promoção de notícias no
que tange o campo político, sobremodo em relação às disputas partidárias que se
desenhavam para as eleições presidenciais do ano seguinte. Vale aqui a disposição de
que, nesse terceiro momento dos enquadramentos, as Manifestações haviam mudado seu
rumo e seu modo, foram excessivamente midiáticas, assumido diversas demandas e
desvinculando-se unicamente do MPL. O perfil dos participantes a partir de então também
estava modificado.
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Figura 3: Exemplos de “Ressignificando os enquadramentos: destaques do campo político”
(Folha de São Paulo - 20 e 30 de junho de 2013, respectivamente)
Esses três distintos períodos de enquadramentos adotados pelo Jornal Folha de
São Paulo durante a sua cobertura acerca das Manifestações de Junho de 2013, permitem
a melhor visualização da própria crise jornalística experimentada, visto que a mesma
atinge seu ápice a partir da mudança brusca entre a primeira e a segunda fase de
enquadramentos realizada pela Folha.
Tal crise jornalística está inserida ainda em um contexto de complexificação
social, e é somente a condição de Manifestação em massa midiatizada atribuída às
Manifestações de Junho de 2013 que permite a compreensão mais ampla dessa crise
experimentada, isso porque há a centralidade do papel midiático e a busca constante da
significação e ressignificação através das redes sociais, as quais compõem os fluxos
diferenciados que caracterizam o processo de midiatização da sociedade contemporânea.
Os fluxos diferenciados e as novas ferramentas tecnológicas por sua vez, tencionam
disputas de poder em distintos campos sociais, as quais englobam conjuntamente toda a
sociedade e, portanto, a própria crise jornalística experimentada.
O papel das pesquisas do Instituto DataFolha ao longo do período analisado
também se mostrou extremamente relevante, visto que a partir do ápice da crise jornalística
desenhada a Folha de São Paulo passou a se utilizar mais desse recurso, o qual transparece
empiricamente noções de cientificidade e de transparência na captação da opinião pública.
Agora já não é mais a Folha de São Paulo quem está falando “isso ou aquilo”, “assim ou
assado”; há nas pesquisas a própria ideia de uma isenção da opinião jornalística em si, visto que
ela se utiliza de métodos científicos na captação da “opinião pública”, e o faz através de
22
um Instituto. Sendo assim, a partir do momento em que o seu Instituto vai às ruas
“verificar a opinião pública” através de métodos científicos de análise, a possibilidade de
reinserção da própria Folha de São Paulo na construção discursiva sobre os fatos sociais
se mostra válida novamente. Nesse sentido, as pesquisas utilizadas pelo Instituto
DataFolha auxiliaram na reinserção de uma “legitimidade discursiva” da Folha, por hora
rompida pela crise experimentada.
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Praça, espaço virtual e plateia: o cartaz e suas ambiências Manoella M. P. Moreira das Neves
Palavras-chaves: Midiatização - Circulação - Ambiência - Cartaz – Manifestação
RESUMO EXPANDIDO
Esta proposta de artigo é o registro de parte de uma pesquisa de tese em
desenvolvimento que consiste em observar as posses e apropriações dos cartazes nas
manifestações contemporâneas, com foco nas jornadas de junho de 2013 no Brasil. Para
organizar o argumento de pesquisa e deste artigo em desenvolvimento constituíram-se
algumas inferências. Uma delas é a de que os cartazes apresentam uma lógica de
midiatização própria. O cartaz parece ser utilizado como ‘voz’ de quem o porta, tais como
os balões das histórias em quadrinhos. Confeccionado unicamente para aquele evento, o
cartaz se multiplica quando registrado e postado em uma rede social digital, apresentando-
se como suporte responsivo, ativo no processo comunicacional, como dispositivo da
circulação interacional nas ruas e nas redes. Para tanto, partiu-se da observação de alguns
cartazes que foram registrados nas coberturas de sites jornalísticos e que também se
encontraram nas mídias sociais digitais, principalmente no Facebook.
Em artigo anterior foi feito um registro sobre as manifestações no mundo desde
2010 até junho de 2013 no Brasil, a partir da observação das formas de organização, lemas
e imagens que as constituíram. Desta narrativa, destacou-se a presença das redes sociais
digitais e a dos cartazes e suas mensagens que viram hashtags. Neste processo de
comunicação, mais que ferramentas, as redes de internet e de telefonia configuraram-se
como formas organizacionais, cujos cartazes com suas mensagens constituíram-se como
marcadores da circulação nas redes e nas ruas. Como ensina Deleuze (FOUCAULT,
1990), desmaranhar as linhas de um dispositivo é traçar um mapa e percorrer terras
desconhecidas. E o ponto de partida do traçado deste trabalho é a compreensão de que o
cartaz das manifestações contemporâneas é de natureza midiatizada.
A partir da observação feita anteriormente e sendo resultante de uma pesquisa
de doutorado em andamento, em seguida, em outro artigo o cartaz foi analisado em seu
valor de signo. Este compreendido em Pierce e Bakhtin, no que suas concepções se
aproximam, a saber, o valor do signo para além do objeto que representa. Entende-se que
o cartaz da rua, ao ser fotografado passa às redes sociais digitais sendo usado a revelia de
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quem o criou, de modo a apresentar-se como suporte marcador de circulação. No entanto,
em posse de outrem, o cartaz não somente registra um movimento, mas também gera e
recebe sentido em processo de semiose, no qual se entende que este objeto, além de ser
suporte marcador é indício sobre os sentidos que pairam nesta circulação.
Agora, neste artigo, o cartaz é observado nas ambiências por onde passa, sendo
adaptado, ajustado conforme as técnicas, regras e intenções de cada espaço: na rua, na
mídia tradicional, na mídia social. Sendo suporte físico, sendo imagem, sendo postado ou
transformando-se em hashtag, as ambiências são traçadas, rastreadas pela passagem do
cartaz.
O cartaz nasce sintético, sendo parte de um discurso que já surge fragmentado,
uma vez que é individualizado. Cada um segura o seu cartaz e diz nele o que deseja sem
a necessidade de regulação prévia de um discurso institucionalizado. O novo movimento
social traz a marca da autonomia da comunicação, permitindo que tal movimento se forme
sem o controle total e centralizado do poder desta comunicação. Diante disto, o caráter
distinto dos conteúdos dos cartazes se dá na forma específica da respondibilidade de cada
manifestante. Há uma conversação entre vários, respondendo a questões postas por outro
circuito midiático. Um exemplo é o que foi dito em uma matéria jornalística na TV é
respondido, contestado em cartaz, nas ruas. A resposta é a parte mais visível da circulação
em fluxo (BRAGA, 2006).
Os conteúdos dos cartazes aparecerem comumente calibrados a partir da
existência de outros meios, os conteúdos estavam sempre mudando a partir da existência
destes outros, expressando valores articulados em atos. No cartaz entre a rua, a mídia
tradicional e a rede moldou-se a construção de uma atividade arquitetônica da autoria,
constituindo-se em pequenos textos (diferidos e difusos) nas sucessivas manifestações em
junho de 2013 e que é a própria constituição destas manifestações.
O diálogo forma a arquitetônica, ele é uma unidade, mas não a difusividade de
uma única ideia ou tema, mas certa coesão expressiva inerente às relações dialógicas,
interacionais entre várias ideais e vozes. Dai pode-se afirmar que a arquitetônica
constituída é a arquitetônica do valor, dos valores em jogo, apreendidos ao jogar o jogo,
ao ingressar nas manifestações. Cada um segura o seu cartaz e diz nele o que deseja, mas
sempre a partir de um dado contexto e de sua compreensão sobre este momento, sem a
regulação prévia de um discurso institucionalizado.
A partir da forma de organização e atuação das manifestações, estando entre a
rua e a rede, remete-se ao texto de Mata (1992) ‘Entre la plaza y la platea’ no qual a autora
25
se refere à imagem de um movimento que revela novos espaços de produção de sentido
político. Embora o texto date do início dos anos de 1990 e a autora refira-se aos meios
físicos e de massa, sua concepção de movimento dos espaços de interação e circulação
midiáticas – portanto, um modo de pensar o campo da comunicação – cabe com ajuste,
às manifestações de rua ocorridas nestes tempos de redes sociais digitais, como as
jornadas de junho de 2013 no Brasil. Rubim (2000) refere-se ao estudo da autora dizendo
que rua e tela não se eliminam ou se sobrepõem, mas realizam tensas interações.
A praça, compreendida como lugar onde ocorrem as trocas diretas, lugar de ação.
A plateia, como espaço de mediação cujos meios de comunicação de massa são os
principais ambientes entre os espaços clássicos da política e a cidadania. Seguindo o
raciocínio de Mata (op.cit.) observa-se que as manifestações ocorrem em locais públicos,
onde sucedem interações diretas, articularam-se cidadãos, havendo reconhecimento e
confrontação de interesses envolvidos num mesmo espaço de ação - a rua, a praça. Por
outro lado, a mesma sociedade que se dá em espetáculo na rua, reflete-se nas mídias onde
se constitui a plateia – a cidadania se contempla como espectadores de si. Landowski
(1992) em seu estudo sobre sociossemiótica, fala sobre ‘sociedade refletida’ e a explica
dizendo ser um conceito relacionado à reflexividade cuja comunidade social se dá em
espetáculo a si mesma, e assim fazendo, dota-se das regras necessárias ao seu próprio
jogo. É a encenação de si nas interações cotidianas que contribuem para a construção de
um espaço social de significação.
Partindo-se da concepção de Mata e agregando os processos midiáticos sócio-
técnicos dados, sobretudo pela forte presença das mídias sociais, agregou-se ao trabalho
o espaço virtual - lugar constituído em cooperação por ambas as estratégias: da praça e
da plateia, e espaço de acirramento da polarização. Seguindo o raciocínio de Rubim, os
espaços não se substituem, mas se conectam tensa e intensamente.
Em relação às manifestações, a praça se fez na ocupação das ruas, das avenidas
das cidades, ascendendo a um espaço de representação privilegiado, pois público e, lugar
de contemplação para quem observa o que se passa, sem dela participar diretamente.
Praça ainda por ser o domínio do espetáculo, da atuação pelo contato presencial. Fez-se
também plateia na sociedade que se dá em espetáculo, vendo-se refletida e refratada pelos
meios de comunicação que faz isto aos meus modos e processos. As manifestações
conclamadas, organizadas e em parte ocorrida nas mídias sociais, constitui-se ainda,
espaço virtual de ação/atuação.
26
O cartaz passa por todos estes ambientes sendo adaptado, ajustado conforme as
técnicas, regras e intenções de cada espaço. O cartaz cartolina, o cartaz mediatizado, o
cartaz postado são as várias performances deste suporte, que não somente sustenta e
sinaliza uma mensagem, mas mostra-se adaptativo ao meio, comunicando e sendo
comunicado. Refere-se aqui, portanto não somente a questão da ‘tecnologia em cartaz’ -
escrita (na rua), imagem (na mídia), postagem (no espaço virtual) -, mas também a
evidenciação dos modos como se processa uma manifestação contemporânea.
27
Charges na Rua: política, mídia contra-hegemônica e
midiatização
Marcelo Rodrigo da Silva
Tamires Ferreira Coêlho
Renato Ítalo da Silva Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG
Palavras-chave: Charges; Política; Mídia Contra-Hegemônica; Midiatização.
RESUMO EXPANDIDO
Desenvolvemos uma reflexão sobre o processo de midiatização na relação entre os
campos da mídia e da política, mais especificamente a partir de uma análise do projeto
Charges na Rua, um meio alternativo e contra-hegemônico. O Charges na Rua é um
projeto criado em 1997 por Reginaldo Soares Coutinho, mais conhecido como Régis
Soares. Consiste na publicação semanal de charges em uma placa de aproximadamente
dois metros de largura por um metro e meio de altura, localizada na Rua Etelvina Macedo
de Mendonça, número 265, no bairro da Torre, em João Pessoa, capital paraibana. A placa
fica na calçada do próprio ateliê do artista. A referida rua é a continuação da Avenida
Dom Pedro II, uma das principais e mais movimentadas avenidas da Capital paraibana.
A cada semana, as charges novas são pintadas sobre as anteriores, numa forma de
palimpsesto. Antes de serem apagadas e cobertas com uma nova produção, entretanto, as
charges produzidas são fotografadas e disponibilizadas digitalmente no site do projeto
(www.chargesnarua.com.br). Régis Soares desenvolve esse trabalho há mais de 30 anos.
A mídia, em formato de outdoor, chama atenção pelo conteúdo, pela forma e pelas
conexões estabelecidas entre o que é publicado e o cenário urbano que o circunda,
interagindo e ressignificando, simultaneamente, cada charge exposta. Assim, a cidade não
só abriga diversos tipos de mídia, mas torna-se mídia potente, constituindo-se enquanto
dispositivo de enunciação (RODRIGUES, 2016). O Charges na Rua foi escolhido como
corpus de análise para o desenvolvimento da presente pesquisa, primeiramente, por ser
uma manifestação que traduz um processo curioso, inusitado e distinto de apropriação do
espaço urbano e para uma produção midiática; posteriormente, pelo reconhecimento e
respaldo locais atribuídos ao trabalho do artista; e, por fim, pela condição de singularidade
do modelo de publicização de charges na cidade de João Pessoa. A partir desse objeto de
28
análise, são observadas as relações entre mídia e política que embasarão a discussão,
observadas em dois níveis: 1) as relações políticas do “Charges na Rua” enquanto prática
social, que resulta da manifestação e do lugar de fala do artista enquanto ator social, sua
postura de enfrentamento, contestação e resistência e 2) as relações políticas no interior
do discurso, envolvidas no processo de produção de sentido, que resulta das construções
semânticas e semióticas no interior da arquitetura da narrativa das charges. Neste nível
são adotadas as contribuições da Análise do Discurso (VAN DIJK, 1992;
MAINGUENEAU, 2002) e da Semiótica (PLAZA, 2003; SANTAELLA, 2004). Para
tanto, foram selecionadas as quatro charges mais recentes produzidas pelo cartunista até
setembro de 2016 e que tivessem seu discurso diretamente relacionado ao contexto da
crise política brasileira. Depois de estabelecidos esse critérios mínimos, foram
selecionadas no site do projeto os seguintes trabalhos: charge número 1.454, que foi
publicada no dia 24 de agosto; charge número 1.453, publicada no dia 12 de agosto;
charge número 1.450, que foi publicada no dia 13 de julho; e charge número 1.445, que
foi publicada em 18 de maio. As reflexões sobre mídia e política são conduzidas tendo
em seu cerne os conceitos e discussões sobre política propostos por Néstor García
Canclini (2005) e Jacques Rancière (2009). O que se pretende, a partir da adoção das
contribuições dos referidos autores, é desenvolver a discussão englobando os pontos de
vista distintos e complementares sobre política oferecidos pelos teóricos. Dessa forma, de
um lado, serão consideradas as contribuições teóricas de Canclini, a partir de suas
percepções sobre o campo político e suas relações partidárias, de luta de classes e forças
entre grupos diversos de atores político-partidários. De outro, serão consideradas as
proposições de Rancière, com suas reflexões sobre a política enquanto articulação e
negociação social, que determinam os “lugares” a partir das tensões entre o lugar social
que é oferecido e o lugar social que é escolhido pelos atores. As duas formas de reflexão
sobre política são consideradas em ambos os níveis de observação que conduziram a
discussão deste texto. Tendo base na partilha do sensível rancieriana, o campo midiático
é também político (não restrito ao seu âmbito partidário), à medida que instaura cenas de
dissenso, rupturas e questionamentos. Ao mesmo tempo, outros campos (o político está
aí incluso) aparelham-se comunicacionalmente diante de um contexto de “presença
constante das mídias imersas no âmbito das relações pessoais cotidianas” (MARTINO,
2014, p. 270). Analisar as charges do projeto selecionado implica também considerar o
papel das representações na construção de seu discurso, os modelos mobilizados e os
implícitos, dentre outros elementos. O discurso da crise, construído entre os campos
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político e midiático, toma forma dentro e fora da mídia hegemônica, sendo (re)apropriado
por mídias populares, como no projeto Charges na Rua. As instituições políticas e os
atores sociais, como o idealizador do projeto paraibano, apropriam-se de lógicas
midiáticas, estão inseridos no bios midiático proposto por Sodré (2002), agindo de
maneira cada vez mais complexa, a partir da articulação de “invenções sociais de
direcionamento interacional” (BRAGA, 2012, p. 36). Assim, os fluxos comunicativos e
os sentidos da crise política em 2016 circulam em diversos suportes (constitutivos de
meios digitais ou “tradicionais”, hegemônicos ou alternativos), a partir de temporalidades
e espacialidades múltiplas, que geram pontos de fuga atrelados às matrizes sociais
culturalmente acionadas (BRAGA, 2012). O dispositivo outdoor, uma tecnologia3
bastante utilizado pela publicidade, é utilizada em outro contexto, para outra finalidade:
a crítica social. A circulação de mensagens por meio dessas charges põe em movimento
sentidos que não são necessariamente inaugurados neste suporte e que alimentam
circuitos de feedback (VERÓN, 1997). A publicação das charges no site do projeto torna
mais complexas as formas de (inter)mediação, multiplica possibilidades de brechas
simbólicas e de novas relações entre mídia e política, evidenciando o caráter transversal
e relacional de uma comunicação que não se encerra ou se resume a processos lineares de
produção e recepção (FAUSTO NETO, 2006). E, mesmo que não houvesse o site, a
interferência de lógicas digitais estaria atravessando a produção das obras de Régis
Soares; o processo de midiatização está nas mudanças quanto à forma de apropriação da
mídia outdoor, na forma de expor e consumir charges, na forma de articular charges e
espaço urbano. E as relações entre mídia e política que resultam dessas processualidades
são o cerne das discussões aqui propostas.
REFERÊNCIAS
BRAGA, José Luiz. Circuitos versus campos sociais. In: MATOS, Maria Angela;
JANOTTI JR, Jeder; JACKS, Nilda. Mediação e Midiatização. Livro Compós 2012.
Salvador/Brasília: UFBA/COMPÓS, 2012. p.31-52.
CANCLINI, Néstor García. Diferentes, desiguais e desconectados. Rio de Janeiro:
Editora UFRJ, 2005.
DIJK, Teun A. Van. Cognição, Discurso e Interação. São Paulo: Contexto, 1992.
3 O termo tecnologia é aqui empregado para além das inovações técnicas recentes no campo
comunicacional. Uma tecnologia é possuidora de lógicas (com postulados e subversões), é uma nova mídia
digital, mas pode também ser a imprensa (VERÓN, 1997).
30
FAUSTO NETO, Antônio. Midiatização: prática social, prática de sentido. In: Anais do
Encontro da Rede PROSUL – Comunicação, Sociedade e Sentido, Unisinos, São
Leopoldo, v.1, p. 15, 2006. São Leopoldo: Unisinos, 2006.
MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação. São Paulo – SP:
Cortez, 2002.
MARTINO, Luis Mauro Sá. Teoria da Comunicação. Petrópolis: Vozes, 2014.
PLAZA, Julio. Tradução intersemiótica. São Paulo: Editora Perspectiva, 2003.
RANCIÈRE, Jacques. A partilha do sensível. São Paulo: EXO; Ed. 34, 2009.
RODRIGUES, Adriano Duarte. Afinal, o que é mídia? Disponível em:
<http://www.ciseco.org.br/index.php/artigos/279-afinal-o-que-e-a-midia#voltar1>
Acesso em: 04 abr. 16.
SANTAELLA, Lucia. Semiótica aplicada. São Paulo – SP: Pioneira Thomson Learning,
2004.
SODRÉ, Muniz. O ethos midiatizado. In: _____. Antropológica do Espelho. Petrópolis:
Vozes, 2002.
VERÓN, Eliséo. Esquema para el analisis de la mediatización. In: Diálogos de la
Comunicación, Lima, n.48, out. 1997.
31
A ressignificação dos territórios urbanos através de novos
processos de midiatização nas cidades
Sergio Roberto Trein
Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS)
Palavras-chave: cidade; midiatização; ressignificação; território.
RESUMO EXPANDIDO
As cidades sempre mexeram com a imaginação popular. Em todos os momentos
da vida, seja na infância, na adolescência, na fase adulta e, mesmo na fase madura, em
algum instante, de alguma forma, as pessoas criam relações emocionais e de raízes com
as suas cidades e têm, guardadas em suas memórias, alguma lembrança especial do lugar
onde moram ou moraram um dia. Não é impróprio e nem exagerado dizer que a cidade
está na alma das pessoas.
Mais do que uma simples hipótese, esta ligação entre alma e cidade pode ser
identificada através de vários aspectos. O primeiro deles se manifesta pela ideia de
reflexão. E isso está construído em nossas cidades sob a forma de piscinas, lagos, galerias,
sombras e janelas onde ocorrem reflexos. Ou seja, as pessoas precisam se enxergar nos
espelhos da cidade e, assim, perceber a sua alma presente no espaço urbano. Um segundo
aspecto está ligado à ideia de profundidade. Precisamos de níveis, tais como níveis de
iluminação ou de materiais contrastantes, para que possamos nos perceber e nos localizar
na cidade. Um terceiro ponto, que evidencia esta ligação entre alma e cidade, é que a alma
tende a ser imaginada por meio de imagens e símbolos. Sem imagens, corremos o risco
de perder o caminho. Isso acontece, por exemplo, nas ruas e nas estradas, através das
placas.
A alma precisa tanto de imagens que, quando não as encontra, elabora substitutos,
como os cartazes de rua e os grafites, por exemplo. Porém, um dos aspectos mais
importantes que explicam esta ligação da alma com as cidades é a ideia de que alma tem
a ver com memória emotiva. As pessoas transitam pelo território, de forma repetitiva ou
não, e, assim, criam uma identidade e uma relação com o lugar. Porém, mesmo que façam
isso de forma individual, não se pode pensar ruas, praças, avenidas, passeios, casas ou
prédios como elementos autônomos, mas como fatores de um conjunto. Ou seja, a cidade
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é resultado da atividade do conjunto que dinamiza suas estruturas e, a isso, denominamos
de contexto urbano.
É justamente esse contexto urbano que contribui para o significado da cidade.
Bem como, toda mudança no contexto implica alteração daquele significado. Isso ocorre
porque mesmo entendida como unidade de percepção, a cidade não é um dado, mas, sim,
um processo contextual onde tudo é signo, é linguagem. Ruas, avenidas, praças,
monumentos, edificações configuram-se como uma realidade sígnica que informa sobre
seu próprio objeto: isto é, o contexto. O elemento que aciona essa percepção global e
contínua, que estabelece seleções e relações em um repertório contextual é o usuário e o
uso é sua fala, sua linguagem. O uso é uma leitura da cidade na relação humana das suas
correlações contextuais. Logo, uma praça, por exemplo, só encontra seu espaço
contextual no momento em que é flagrada numa seleção de usos que lhe atribui
significado.
O mesmo vale para outros elementos do mobiliário urbano. O usuário processa a
leitura do mutante espaço contextual, ao mesmo tempo, que nele inscreve sua linguagem:
o uso que flagra e é flagrado na cidade. Isso faz com que cada indivíduo, através de sua
alma, de sua linguagem e de seu contexto, perceba no urbano, ao mesmo tempo,
imundícies e êxtases, atrações e repulsões. A justificativa para este fenômeno está no fato
de que, na cultura urbana, cada um comunica-se com edifícios, ruas, árvores, lojas,
pontes, cenários, ambientes etc, conforme seus próprios interesses, suas relações com o
território e da sua maneira.
Na verdade, a própria configuração do espaço urbano contribui para isso, pois a
paisagem urbana pode ser definida como a percepção individual, espacial e temporal da
composição de todos os seus elementos fixos (edificações, árvores, pavimentação, ruas),
semifixos (anúncios, comércio ambulante) e móveis (automóveis, pessoas). Todo esse
contexto urbano acaba tornando-se um locus dinâmico de atividades, exercidas por
pessoas, de acordo com suas necessidades sociais.
Quando se fala no contexto urbano, devemos analisá-lo através de dois pontos de
vista: primeiro, tomando como base uma categoria a quem denominamos de produtor,
que necessitará de equipamentos de infraestrutura, de informação, de inovação, de amplas
instalações. Em geral, quem ocupa este papel de produtor nas cidades são os gestores
públicos. O segundo ponto de vista diz respeito a quem classificamos como consumidor,
que usará o espaço fundamentalmente por questões de sobrevivência: o habitar e o
trabalho, mas que para tal necessita de equipamentos de lazer, oferecimento de
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determinados bens e serviços coletivos, de cultura etc. Este espaço, em que os indivíduos
acabarão conformando sua identidade e suas relações de poder, é definido como território.
Necessariamente, o território não possui fronteiras visíveis. Nem mesmo o processo de
formação territorial ocorre por meio de expressões concretas sobre o espaço. Pode haver,
inclusive, múltiplas territorialidades no mesmo espaço. Bem como os territórios podem
possuir um caráter cíclico, que varia com o tempo; móvel, que se desloca nos mais
diferentes espaços; ou que se organiza a partir de redes interligadas pelo fluxo de
informações ou contatos.
Tudo vai depender da relação dos indivíduos com o território e de que forma eles
percebem os artefatos e como eles os utilizam como mediadores na interação com outras
pessoas e seus ambientes físicos e sociais. Desta forma, passa-se a gerenciar o território
como um sistema-produto, tratando dos seus aspectos materiais e imateriais e gerando
sentido e valor para o espaço em si, os produtos e a cidade como um todo. Especialmente
quando há uma recriação do território ou intervenções urbanas que ressignifiquem este
espaço.
Especialmente na última década, uma quantidade bastante considerável de ações
e iniciativas coletivas passou a ocupar territórios como ruas, avenidas, praças, parques,
áreas verdes e terrenos vazios nas cidades. Os territórios ocupados por estas ações são
espaços públicos, muitas vezes, degradados ou esquecidos, com os quais não se criam
memórias afetivas e sem um uso maior dentro do contexto urbano. No máximo, são
territórios que se apresentam como um ponto ou marco nodal dentro da cidade. Todas
estas ações coletivas, desenvolvidas nestes territórios, tais como os food-trucks, espaços
móveis de comércio de alimentos; as novas perspectivas de ambiência, circulação e
interação de mensagens produzidas pelo coletivo e promovidas através de novos moldes
de sinalização e publicização destas mensagens; as intervenções artísticas; a criação de
hortas comunitárias; além de cursos livres, shows e teatros nas praças e nas ruas das
cidades, representaram uma ressignificação dos territórios, transformando-os em
sistemas-produto. Ou seja, procuram recriar as cidades construídas pelas almas dos
indivíduos, em resposta a uma profunda crise de desconfiança em relação aos
governantes, que não conseguem cumprir o seu papel estabelecido no contrato social e,
por consequência, gerar sentido e valor para os espaços públicos.
Com isso, a comunicação urbana produzida pelos usuários dos territórios e
veiculada no próprio mobiliário urbano, bem como a comunicação veiculada nas redes
sociais para gerar a mobilização social necessária e atrair os usuários para as ações
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desenvolvidas nos territórios, permite que as práticas sociopolíticas ganhem uma nova
dinâmica e uma intensividade e diversidade de processos. Ou seja, cria-se uma ruptura
com os tradicionais canais de comunicação nas cidades, tais como a grande mídia, que
escolhe de que parte da cidade quer falar e comunicar. O resultado destes novos processos
de midiatização nas cidades possibilita uma alteração nos regimes de expressão e de
interação sociopolítica, a partir de lógicas, operações e estratégias comunicacionais que
instalam na sociedade um novo regime de estruturação de vínculos. Desta maneira, estas
mídias e formatos alternativos de comunicação produzidos pelos usuários dos territórios
deixam de se constituir apenas como um campo e assumem um papel de reordenação, de
reorganização e de transformação na estrutura social e política.
Com base nisso, nosso estudo se enquadra no campo das metodologias
qualitativas, que são caracterizadas pela descrição, compreensão e interpretação de fatos
e fenômenos. Sendo ainda mais específico, as pesquisas qualitativas têm, por objetivo,
investigar o significado das relações humanas e sociais, tornando possível compreender
os fenômenos com dados não quantificáveis. Entre as opções de pesquisa existentes,
nossa escolha foi pela pesquisa exploratória e empírica, por convidar o pesquisador a
voltar o seu olhar para acontecimentos de práticas, processos e circuitos, na tentativa de
estabelecer um contato maior com a situação pesquisada, para descrever e perceber
fenômenos a ela relacionados.
Através da pesquisa exploratória e empírica, o objetivo deste estudo será o de
compreender de que forma é possível (e se é, de fato, possível) promover a ressignificação
destes territórios urbanos através de novos processos de midiatização. Para isso, como
corpus de pesquisa, serão analisadas cinco ações de ressignificação dos territórios: “Que
ônibus passa aqui”, um projeto de sinalização colaborativa de pontos de ônibus; “Passo a
passo”, um projeto de sinalização para informar a distância a pé até os principais pontos
da cidade e, com isso, tentar diminuir o trânsito de carros; “Paraíso do golfe”, para mostrar
o péssimo estado das ruas da cidade; “Dorme com essa”, uma coleção de frases famosas
de pessoas, promovendo questionamentos pelos muros, postes e tapumes na cidade; e “A
natureza recarrega”, um espaço móvel em que a pessoa pode sentar, descansar e
recarregar a energia do corpo e do celular.
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As relações e a virtualização das cidades através do aplicativo
UBER
Tiago Guimarães
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
Palavras-chave: cibercultura, cibercidade, mobilidade, virtualização
RESUMO EXPANDIDO
A computação ubíqua e sua onipresença no cotidiano das pessoas tem como
maior objetivo tornar comum, corriqueiro e simples o uso de computadores a ponto de
seus usuários não perceberem a sua presença (JANDL, 2011). Essa sensação de
invisibilidade das novas tecnologias permite uma introdução mais fluida de novos
serviços e/ou produtos que se fundamentam nesse aspecto. Além disso, a computação
ubíqua “deve possibilitar que os dispositivos detectem alterações em seus ambientes,
adaptando-se automaticamente e atuando conforme tais mudanças, considerando
também as preferências ou necessidades dos usuários” (JANDL, 2011 p.80).
Sendo assim, a computação móvel torna-se um dos maiores expoentes da
ubiquidade computacional. Dentro desse ecossistema, os aplicativos são os principais
protagonistas, oferecendo uma diversidade de serviços e facilidades para seus usuários.
É compreensível, portanto, que cada vez mais o mundo corporativo volte seus olhos
para o crescente movimento tecnológico apresentado, destacando-se, nesse aspecto, as
empresas chamadas de disruptivas. Christensen (2001) cunhou esse termo ao definir
organizações que originam novos mercados e modelos de negócio, apresentando
soluções mais eficientes do que as existentes, causando uma ruptura no mercado e
alterando suas bases de competição. Ao inovar o serviço de transporte particular a Uber
Technologies se tornou um dos grandes exemplos desse modelo de negócio.
Mas como se dá a relação e a comunicação entre motoristas e clientes do Uber e
seu aplicativo? A fim de tentar responder esta questão, propomos, neste artigo de caráter
bibliográfico e documental, analisar essas interações à luz das teorias de Lévy (1996,
1999), Negroponte (1995) e Lemos (2004, 2009), com base nas telas virtuais do
aplicativo e na usabilidade do serviço.
No momento em que se tornam parceiros do Uber, os motoristas da empresa
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iniciam uma relação virtual com a organização e seu aplicativo. Desde sua relação
trabalhista até a troca de informações, para sua melhor produtividade e execução de
tarefas (pegar e largar passageiros com maior eficiência), se dá a partir do ciberespaço
pela virtualização de dados (LÉVY, 1996;1999).
Para Lévy (1999, p.12), a virtualização é “um processo de transformação de um
modo de ser num outro”. Distanciando dos conceitos do virtual como falso, ilusório ou
imaginário, assim como sua empregabilidade para definir a ausência de existência “a
virtualização é a dinâmica mesma do mundo comum, é aquilo através do qual
compartilhamos uma realidade” (LÉVY, 1996 p.148).
Ao problematizar a distinção entre átomos e bits, Negroponte (1995) flerta com
os conceitos de virtualização apontados por Lévy (1999). Para o autor, a matéria formada
por átomos se diferencia daquilo que é virtual, traduzido de maneira binária (zero e um)
pelos bits (NEGROPONTE, 1995).
Sendo assim, ao instalarem o aplicativo do Uber em seus smartphones e ativá-lo,
tanto o motorista quanto o passageiro passam a transmitir uma variedade de subsídios
para o sistema, como seus dados pessoais, sua localização e trajeto a ser percorrido, sem
precisarem interagir diretamente com o aplicativo para cada uma dessas informações.
Existe, portanto, diversas camadas nessa relação e o usuário “não precisa conhecer a
complexidade subjacente ao aplicativo que está manipulando ou a heterogeneidade da
rede que percorre” (LÉVY, 1999 p.43).
Levando em consideração que “os processadores disponíveis tornam-se, a cada
ano, menores, mais potentes, mais confiáveis e mais baratos” (LÉVY, 1999 p.33), a
acessibilidade à tecnologias e serviços como os oferecidos pela empresa Uber fora
amplificada. Essa disseminação do uso de smatphones possibilita uma maior cultura da
mobilidade. Como explica Lemos (2009, p.29), “com a atual fase dos computadores
ubiquos, portateis e moveis, estamos em meio a uma ‘mobilidade ampliada’ que
potencializa as dimensões física e informacional”.
As mídias de geolocalização, em que o aplicativo Uber se insere, são “serviços e
tecnologias baseadas em localização onde um conjunto de dispositivos, sensores e redes
digitais sem fio e seus respectivos bancos de dados agem informacionalmente de forma
‘atenta’ aos lugares” (LEMOS, 2009 p.33). Existe, dessa forma, uma relação dinâmica
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entre os smatphones (tanto do cliente, como do motorista), suas informações transmitidas
e suas localizações a partir de trocas infocomunicacionais contextualizadas (idem, ibdem).
Ao categorizar a relação entre os participantes da comunicação, Lévy (1999)
designa três grandes conjuntos de dispositivos comunicacionais, são eles: um-todos, um-
um, todos-todos. A primeira compreende os meios de comunicação de massa, como a
imprensa, o rádio e a televisão, em que um emissor central envia suas mensagens a um
grande número de receptores passivos e dispersos. A segunda categoria é de reciprocidade
entre os interlocutores, mas apenas para contatos de indivíduo a indivíduo ou ponto a
ponto, como ocorre em ligações telefônicas ou troca de mensagens entre dois pontos. Por
fim, “o ciberespaço torna disponível um dispositivo comunicacional original, já que ele
permite que que comunidades constituam de forma progressiva e de maneira cooperativa
um contexto comum” (LÉVY, 1999 p.63), esse dispositivo é chamado de todos-todos.
A partir das categorias de dispositivos comunicacionais expostas por Lévy (1999),
pode-se propor uma nova relação entre os participantes ativos do Uber: todos-um/um-
todos. Como pode ser visto na Figura 1, em um primeiro momento todos os usuários
(motoristas e clientes) transmitem suas informações de localização e dados pessoais para
o aplicativo. Posteriormente, com todas as informações digitalizadas, o aplicativo
transmite aquilo que é relevante para cada usuário de forma massiva.
Figura 1 - Relação todos-um/um-todos
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Fonte: O autor (2016)
Essa nova relação, possibilitada pelo uso e disseminação dos smartphones,
amplifica a cultura da mobilidade e fortalece o conceito de cibercidade proposto por
Lemos (2004), que compreende cidades nas quais há um avanço na infraestrutura de
telecomunicações e tecnologias digitais.
No entanto, as cibercidades não devem ser interpretadas como a criação de uma
nova cidade em detrimento das existentes. Pelo contrário, deve-se “reconhecer a
instauração de uma nova dinâmica de reconfiguração que faz com que o espaço e as
práticas sociais das cidades sejam reconfiguradas com a emergência das novas
tecnologias de comunicação e das redes telemáticas” (LEMOS, 2004 p.21). Assim, o
espaço urbano não é suprimido pelo ciberespaço, mas ambos se encontram em uma
dinâmica relação de trocas comunicacionais e de transporte através da ação à distância e
da ação local, proporcionada pela infraestrutura tecnológica. Sendo assim, “as
cibercidades devem potencializar trocas entre seus cidadãos e a ocupação de espaços
concretos da cidade real, ao invés de ser uma simples substituição” (LEMOS, 2004 p.22).
Através da transmissão de dados e sua virtualização as cibercidades se constituem
em um espaço eletrônico onde trafegam bits e bytes (MORAES in LEMOS, 2004). É
através das “interfaces” dos aparelhos utilizados que se permite a interação entre o
universo da informação digital e o mundo corriqueiro (LÉVY, 1999). Dessa forma, a
cibercidade, segundo Morais (in LEMOS, 2004),
[...] deve reivindicar uma “narrativa” da cidade e não sua transposição literal
ou espacial. A cibercidade é uma descrição/narração onde os olhos não vêm
coisas, mas simulações de quase-objetos; ícones e símolos gráficos como
praças, ruas, monumentos. (MORAIS in LEMOS, 2004 p.30)
Sendo assim, através de sua interface, o aplicativo Uber apresenta para seus
usuários uma narrativa da cidade em que está inserido. É através dos dados gerados por
inúmeros motoristas em constante deslocamento e clientes ativos que pode ser vista em
sua tela uma representação simbólica do contexto da cidade.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CHRISTENSEN, Clayton M. O Dilema da Inovação - Quando as Novas Tecnologias
Levam Empresas ao Fracasso. São Paulo: Saraiva, 2012.
JANDL JUNIOR, P.. Computação, Ubiquidade e Transparência. Revista Ubiquidade,
v. 1, p. 8, 2011.
LEMOS, Andre. Cibercidades: Um modelo de inteligência coletiva. In: LEMOS,
Andre (Org.). Cibercidade: A cidade na cibercultura. Rio de Janeiro: E-Papers
Serviços Editoriais, 2004.
______________. Cultura da Mobilidade (2009). Disponivel em:
http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/revistafamecos/article/viewFile/6314/
4589. Acesso em 20 de junho de 2016.
LEVY, Pierre. Cibercultura. Sao Paulo: Ed. 34, 1999.
__________. O que e o virtual? Sao Paulo: Ed. 34, 1996.
MORAIS, Patrícia Barros. Propostas e desafios nas cidades digitais. In: LEMOS,
Andre (Org.). Cibercidade: A cidade na cibercultura. Rio de Janeiro: E-Papers
Serviços Editoriais, 2004.
NEGROPONTE, Nicholas. A vida digital. Sao Paulo: Companhia das Letras, 1995.