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O ramo verde Adelina Lopes Vieira Frederico era estouvado, não aceitava conselhos; ria e zombava, coitado! das sábias lições dos velhos. Sofia, meiga criança, era o contraste perfeito do irmão, uma pomba mansa sem o mais leve defeito. Dera o papai aos pequenos dois canteiros bem plantados, em tudo iguais; mas em menos de um mês estavam mudados. O de Sofia, que encantos! Tinha fartura de rosas, cravos, baunilha, agapantos, e violetas perfumosas. No outro havia mamona, urzes, trifólios, urtigas e uns restos de manjerona já roída das formigas. Foram à tarde a passeio no jardim os dois; Sofia colhia rosas; em meio disse ao irmão: — que alegria! Vou dar à mamãe um ramo das minhas amadas flores! a sua alcova embalsamo e alcanço beijos e amores! — Dás-me esta rosa encarnada, Sofia, p'ra o seu cabelo? — Dou, mas não levas mais nada; corrige o teu desmazelo. Trabalha, meu preguiçoso! Ouro é o tempo que se perde não deves ser ocioso, nem pôr pé em ramo verde. Só assim terás emenda! — Tens graça, linda agoireira; vais ver, minha doce prenda, se a sentença é verdadeira. Disse, e subiu apressado

O ramo verde

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Page 1: O ramo verde

O ramo verdeAdelina Lopes Vieira

Frederico era estouvado,não aceitava conselhos;ria e zombava, coitado!das sábias lições dos velhos.

Sofia, meiga criança,era o contraste perfeitodo irmão, uma pomba mansasem o mais leve defeito.

Dera o papai aos pequenosdois canteiros bem plantados,em tudo iguais; mas em menosde um mês estavam mudados.

O de Sofia, que encantos!Tinha fartura de rosas,cravos, baunilha, agapantos,e violetas perfumosas.

No outro havia mamona,urzes, trifólios, urtigase uns restos de manjeronajá roída das formigas.

Foram à tarde a passeiono jardim os dois; Sofiacolhia rosas; em meiodisse ao irmão: — que alegria!

Vou dar à mamãe um ramodas minhas amadas flores!a sua alcova embalsamoe alcanço beijos e amores!

— Dás-me esta rosa encarnada,Sofia, p'ra o seu cabelo?— Dou, mas não levas mais nada;corrige o teu desmazelo.

Trabalha, meu preguiçoso!Ouro é o tempo que se perdenão deves ser ocioso,nem pôr pé em ramo verde.

Só assim terás emenda!— Tens graça, linda agoireira;vais ver, minha doce prenda,se a sentença é verdadeira.

Disse, e subiu apressado

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a verde acácia frondosa,e lá, de um ramo delgado,gritou à irmã receosa:

— Não vês o ramo... sensata?o pisá-lo não me aterra...Mal acabara a bravata,partiu-se o ramo, ei-lo em terra.

Na queda quebrou um braço,Sofia teve um fanico...Mas deixou de ser madraçoo pequeno Frederico.