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I Seminário Internacional de Ciência Política
Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015
O Recrutamento Ministerial no Governo do PSDB (1995-2002)
Paulo Franz1
Dhyeisa Lumena Rossi2
Resumo
Em contextos presidencialistas os ministros desempenham um papel chave na formulação de políticas públicas e na
garantia de governabilidade. Durante o período de consolidação democrática, nos anos 1990, as configurações
ministeriais brasileiras passaram por amplas reformas institucionais. Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é mapear
os perfis dos ministros recrutados durante esse período, especificamente os dois mandatos do presidente Fernando
Henrique Cardoso. Para tanto, analisaremos informações referentes a: i) sexo; ii) faixa etária; iii) formação acadêmica;
iv) ocupação profissional; v) setor de origem profissional (público, privado, político ou militar); vi) filiação partidária.
Ao compararmos esses mandatos, a nossa hipótese é de que tenha ocorrido uma mudança no perfil e no padrão de
recrutamento dos ocupantes dos cargos ministeriais, não obstante o chefe do poder executivo tenha sido o mesmo nos
períodos analisados. Acreditamos que os perfis ministeriais podem indicar, em boa medida, as estratégias utilizadas na
implementação da agenda presidencial e as relações entre sociedade civil e Estado, pois é justamente através de
nomeações que o presidente controla e influencia políticas públicas conforme o seu interesse. Este trabalho é parte de
uma pesquisa mais ampla sobre ministros no Brasil e na América Latina desenvolvida no âmbito do Observatório de
Elites Políticas e Sociais do Brasil. Os dados utilizados neste trabalho foram coletados no sítio institucional do
Dicionário Histórico- Biográfico Brasileiro – DHBB do Centro de Pesquisa e Documentação de História
Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas – CPDOC/FGV em colaboração com os pesquisadores do
Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira da Universidade Federal do Paraná - NUSP/ UFPR.
Palavras-chave: elites; recrutamento; gabinete; ministérios; FHC;
1 Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Paraná (PPGCP –
UFPR). Contato: [email protected] 2 Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Paraná (PPGCP –
UFPR). Contato: [email protected]
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INTRODUÇÃO
Em sua autobiografia, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, alegou que ao concluir a
montagem de sua equipe ministerial se deparou com um gabinete “vergonhosamente masculino”
(CARDOSO, 2006, p.270). Essa declaração indica um paradigma constante enfrentado pelos chefes
do poder executivo em contextos de presidencialismo de coalizão. Ao passo que os ocupantes dos
ministérios são, formalmente, de nomeação direta do presidente da República, na prática a
composição de um gabinete não é de seu controle absoluto, sendo também efeito das negociações
com outros partidos políticos, os quais possuem interesses que podem chocar com as preferências
daquele lidera o governo (AMORIM NETO, 2000; 2007).
Os resultados dessas alianças nas configurações dos ministérios têm ocupado cada vez mais
destaque na imprensa tradicional do país e na literatura internacional especializada no tema. Seja
para entender as estratégias de implementação da agenda do presidente, seja para avaliar a força
política de seus aliados de governo.
As nomeações desses cargos de chefia da burocracia governamental têm a capacidade de
modificar o perfil de ação política do ministério e adequá-la às preferências do presidente,
monitorar a atividade burocrática e comunicar a visão do presidente à imprensa, aos funcionários e
aos clientes (VIEIRA, 2010, p.4). Ou seja, é justamente através de nomeações que o presidente
controla e influencia políticas públicas conforme o seu interesse.
Além disso, em contextos institucionais como o brasileiro, é por meio dessas nomeações que
o presidente, além de formular, também consegue aprovar a sua agenda política, numa troca entre a
ocupação dos postos chaves no governo por atores indicados pelos partidos da coalizão e o apoio
político no Congresso Nacional que garanta governabilidade e a aprovação de projetos defendidos
pelo governo (FIGUEIREDO e LIMONGI, 1999).
Essa ideia toma uma dimensão ainda maior para o nosso estudo quando admitimos que os
agentes na elite da burocracia federal possuem capacidade privilegiada de implementação de
políticas públicas num contexto de presidencialismo “exacerbado, em que o presidente tem poderes
extraordinários, se comparado a outros países” (PACHECO, 2011, p.23). O poder executivo no
Brasil, a exemplo do que ocorre nos países presidencialistas, é reconhecidamente dotado de
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privilégios para negociação com o Congresso Nacional e com outras esferas federativas:
prerrogativa orçamentária e legislativa, poder de veto total e parcial, direito a nomeações
ministeriais e na estrutura burocrática, implementação de projetos em áreas eleitoralmente
relevantes, etc. (FIGUEIREDO, 2010, p.191; BATISTA, 2013, p.454)
Isso posto, nosso objetivo é traçar um perfil geral dos ocupantes das pastas ministeriais dos
governos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), entre 1995 e 2002. Mobilizaremos informações
dos titulares e interinos que encabeçaram as pastas durante o período, a partir das quais poderemos
mapear alguns padrões referentes às suas características político-partidárias e sócio-ocupacionais.
Apesar deste trabalho focar nos mandatos de apenas um chefe do executivo federal,
acreditamos que o perfil dos ministros possa ter variado ao longo dos oito anos em que FHC esteve
à frente da presidência. Além disso, acreditamos que o perfil encontrado dos ministros pode
depender do setor do qual o ministério em questão faz parte. Nesse sentido, as diferenças de perfis
podem ser constatadas ao longo do tempo, ou da área temática do governo.
A experiência adquirida em um partido, em uma comissão parlamentar ou em altos cargos
do serviço público têm impacto significativo sobre o estilo e preferências pessoais dos agentes
políticos, assim, qualquer resultado ou tipologia aqui colocada deve levar em conta os caminhos
prévios que esses agentes seguiram. Por exemplo, m ministro que passou maior parte da sua carreira
profissional dentro de facções de um partido não tem o mesmo perfil e as mesmas opiniões e
preferências que seus colegas vindos dos altos níveis da administração pública ou das comissões
parlamentares do Congresso (DOGAN, 1979, p.22).
Esses cargos são de livre nomeação, ou seja, para assumi-los não há necessidade de
aprovação em concursos ou tempo de trabalho na instituição. Dessa forma, partimos do pressuposto
de que os perfis encontrados na elite executiva do governo federal dizem respeito às preferências do
Presidente da República e de seus aliados políticos.
O RECRUTAMENTO NO PODER EXECUTIVO
Este trabalho está focado na política de nomeações dos cargos de primeiro escalão no Brasil.
Dessa forma, atentaremos para trabalhos que centraram as suas análises para a importância do
recrutamento na esfera federal brasileira, principalmente em contextos de coalizão.
É o caso de estudos como o de Ben Ross Schneider (1994) e Edson de Oliveira Nunes
(1999), sobre a configuração do executivo no segundo período democrático brasileiro (1946-1964).
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A partir de suas pesquisas, esses autores mostraram que as estratégias de nomeações ministeriais e
recrutamento burocráticos foram imprescindíveis para as políticas nacional desenvolvimentistas,
levadas a cabo pelos governos de Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek.
Em geral esses estudos defendem que os grandes projetos de modernização do país
enfrentaram sérios obstáculos no aparelho burocrático do Estado. Segundo os autores, ao se
depararem com um estamento burocrático altamente politizado e sem conhecimento técnico ou
interesse necessário pelos projetos, Vargas e JK optaram por “compartimentalizar” a máquina
pública.
Essa compartimentalização consistia basicamente em separar secretarias e órgãos que, na
visão deles, eram fundamentais para os seus projetos de desenvolvimento, dos órgãos de
“patronagem”, que seriam usados como moeda de troca para obtenção de apoio político e
sustentação da coalizão governista. Dessa forma, as áreas insuladas por eles seriam ocupadas, em
sua maioria, por indivíduos recrutados de forma paralela, sob critérios meritocráticos, o que no fim
das contas levou à realização das políticas consideras prioritárias por esses governos (SCHNEIDER
apud BORGES, 2010, p.135).
A partir da reconfiguração institucional do país em 1988, que estabeleceu o
presidencialismo de coalizão como sistema de governo (ABRANCHES, 1988), o enfoque das
pesquisas sobre a autonomia da elite dirigente burocrática deu lugar a reflexões sobre a
partidarização e/ou o insulamento de agências burocráticas. Algumas dessas ideias já foram
expostas acima, ao apontarmos alguns trabalhos que se discutiram as condições para a realização
dos grandes projetos liderados por Vargas e JK, hoje vistos como responsáveis pela modernização
da economia brasileira.
Outros estudos focaram prioritariamente as relações entre o executivo e o poder legislativo
(AMORIM NETO, 2000; 2007; INÁCIO, 2013; BATISTA, 2013). A ideia central é de que o
presidencialismo, num contexto federativo e multipartidário, obriga o chefe de Estado a formar
coalizões com o objetivo de aprovar ações legislativas do próprio executivo no Congresso Nacional,
e obter governabilidade. A moeda de troca do governo seria justamente os cargos na burocracia
federal, então reservados para a ocupação de indicados pelos partidos aliados no parlamento.
Tais estudos foram muito convenientes e tiveram o mérito de esclarecer alguns dos critérios
de nomeação para os Ministérios e seus respectivos corpos burocráticos, sobretudo os critérios
político-partidários. O problema dessas análises é restringir as análises do preenchimento desses
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cargos apenas pela lógica clientelista. Além disso, dessas pesquisas pouco se pode deduzir acerca
do funcionamento do Executivo, pois muitas delas centram suas análises na aprovação de medidas
provisórias no poder legislativo.
Pesquisas que analisam as relações executivo-executivo foram retomadas recentemente.
Muitas, inclusive, a partir das discussões iniciadas nos anos 1990, nos estudos de Schneider (1994)
e Nunes (1999). Entretanto, algumas delas alertaram para artificialidade da separação elaborada nos
textos citados entre os burocratas técnicos e os políticos.
Na verdade, assume-se que estratégias de nomeação burocrática tais como as de Getúlio
Vargas e Juscelino Kubitschek, não são mais possíveis no atual contexto institucional, desde a
promulgação da Carta Magna de 1988. A partir de então, os partidos e o Congresso Nacional têm
sobre a máquina pública, controle o suficiente para que não fiquem alheios à produção e realização
de políticas públicas complexas ou de grandes projetos macroeconômicos (FIGUEIREDO, 2010,
p.206).
Seria então o caso de afirmarmos que um ousado programa de metas torna-se inviável nesse
contexto? A implementação de um grande projeto de transformação social só seria possível sob a
tutela de burocratas técnicos e imparciais? A politização do estamento burocrático é nociva à
qualidade das políticas públicas?
Segundo Figueiredo (2010), o controle político sobre a máquina pública é fundamental
numa democracia representativa, pois parte exatamente dos políticos eleitos a tarefa de a burocracia
atuar em conformidade com as suas decisões, e que eles mesmos estejam em situação de prestar
contas e responder aos cidadãos pelos projetos implementados (FIGUEIREDO, 2010, p.207)
Os últimos estudos sobre as relações executivo-executivo procuram evidenciar que toda
atividade que envolve o Estado, por mais técnica que pareça, tem, inevitavelmente, um conteúdo
político, pois afetam a atuação e os interesses de grupos e classes sociais, “enfim, alteram a
distribuição de recursos na sociedade” (OLIVIERI, 2007, p.150). Disso, nos parece mais legítimo
abandonar uma suposta separação entre o burocrata e o político, e adotar uma abordagem que
vincule essas duas esferas no seio do Estado.
Em seus trabalhos sobre as nomeações no alto escalão dos governos federais nos anos 1990,
Loureiro e Abrucio (1998; 1999) mostram que os ocupantes desses cargos não deixam de ser
técnicos ou políticos, mas possuem atributos e modos de ação que conectam as duas características.
O que vem sendo constatado na literatura sobre os dirigentes públicos é a maior presença de
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“políticos baseando sua atuação cada vez mais no discurso técnico e burocrata reforçando o aspecto
político em seu cálculo de atuação” (LOUREIRO e ABRUCIO, 1999, p.70). Trata-se de um modelo
híbrido, chamado pelos autores de policymaker. Mesmo que esses agentes não sejam filiados a
partidos e tenham sido nomeados apenas por seus conhecimentos técnicos, suas ações no setor
público irão responder às orientações políticas de seus governos.
Nesse sentido, um dos objetivos deste trabalho consiste justamente em colocar à prova a tese
comum de que ministérios sociais seriam objeto de repartição política entre os partidos que apoiam
o governo, ao passo que os ministérios relacionados à infraestrutura e às questões econômicas
estariam insuladas do clientelismo (BRESSER-PEREIRA, 2007, p. 18). Segundo seus defensores,
essa distribuição direcionada de cargos é o que proporcionaria ao governo realizar as suas políticas
prioritárias sem abrir mão do “controle” sobre os aliados.
Ainda, para complementar os resultados, mensuraremos os níveis de expertise dos ministros,
a partir da formação acadêmica e da trajetória político-profissional, relacionando essas informações
com os temas das respectivas pastas ocupadas por eles. Nosso objetivo aqui é identificar critérios
técnicos de recrutamento ministerial que possam ser predominantes a depender da importância do
ministério em questão.
NOTA METODOLÓGICA
Antes de entrarmos na análise dos dados é importante fazermos alguns apontamentos. Os
resultados apresentados nessa pesquisa são referentes ao mandato ministerial, ou seja, nossa
unidade de análise não diz respeito aos ministros, embora eles sejam a nossa unidade de
observação, dos quais coletamos as informações. Desse modo, os indivíduos que ocuparam o
mesmo ministério durante todo o governo FHC foram inseridos duas vezes no banco de dados, uma
por mandato, com as devidas mudanças no tempo de carreira, número de cargos prévios, e na
experiência política prévia. Da mesma forma foram duplicados aqueles que chefiaram mais de uma
pasta ministerial ao longo dos oito anos aqui abarcados.
Também ressaltamos que foram encontrados durante o período 33 ministérios. Chegamos a
este número através de uma padronização de pastas que mudaram de nome, se dividiram ou
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fundiram-se ao longo governo psdbista3. Foram incluídos em nosso banco de dados os ministros
que chefiaram secretarias com status ministerial, como a Advocacia Geral da União e a Secretaria
de Coordenação Política e Relações Institucionais.
Seguindo a classificação sugerida por Inácio (2007), dividimos os 33 ministérios em 6
grandes áreas. São elas: i) desenvolvimento econômico e regional (ministérios da Fazenda, do
Planejamento, da Integração Nacional, e da Indústria e Comércio); ii) agricultura e meio ambiente
(ministério da Agricultura e Abastecimento, do Meio Ambiente, e do Desenvolvimento Agrário);
iii) infraestrutura (ministério dos Transportes, das Comunicações, de Ciência e Tecnologia, e de
Minas e Energia); iv) políticas sociais (ministérios da Saúde, da Educação, do Trabalho, da
Previdência e Assistência Social, e do Esporte e Turismo, além da Secretaria Nacional dos Direitos
Humanos); v) assessoramento político (ministérios da Casa Civil, da Justiça, de Assuntos Políticos,
das Relações Exteriores, da Defesa, e das Reformas Institucionais, além das secretarias Geral da
Presidência da República, de Assuntos Estratégicos, de Comunicação Social, e da Advocacia Geral
da União); vi) e militar (ministério do Exército, da Marinha, da Aeronáutica, além da Casa Militar e
do Gabinete de Segurança Institucional). A distribuição dentro dessas categorias foi feita pelos
próprios autores.
Nossa última observação antes de adentrarmos na análise dos dados, diz respeito ao n da
pesquisa que compreenderia em 109 mandatos. No entanto, quatro mandatos foram excluídos do
nosso universo por falta de informações disponíveis4.
O PERFIL MINISTERIAL DOS GOVERNOS FHC
No período que compreende esse estudo, os ministérios são compostos majoritariamente por
homens - com exceção da ministra da indústria, do comércio e do turismo do primeiro governo
FHC, Dorothea Werneck - com idade que varia entre 41 e 69 anos, sendo que a mediana das idades
no primeiro e segundo mandatos é de 55 e 57 anos, respectivamente.
3 É o caso, por exemplo, do Ministério Extraordinário de Política Fundiária, que, pelo Decreto nº 3.338/2000, passou a ser chamado Ministério do Desenvolvimento Agrário. 4 São eles: Alderico Jefferson da Silva Lima, ministro dos Transportes, Sergio Gitirana Florencio Chagasteles, ministro da Marinha, Waldemar Nicolau Canellas Junior, ministro da Marinha, e Walter Werner Brauer, ministro da Aeronáutica.
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Como esperado os ministros que compuseram o gabinete presidencial nesses dois períodos
são altamente qualificados (D’ARAÚJO, 2009; BEHR, MICHON, 2013) como podemos ver na
tabela a seguir.
Tabela 1. Nível de escolaridade
Formação %
Superior incompleto 1,9
Mestrado 9,5
Graduação 31,4
Especialização militar 5,7
Especialização 22,9
Ensino médio 1,0
Doutorado 27,6
Fonte: Observatório/ NUSP- UFPR
O alto grau de escolaridade entre ministros também já foi constatado por D’Araújo (2009)
nos governos de Sarney, Collor, Itamar e Lula assim, podemos afirmar com certo grau de certeza
que esse é um dos atributos, não formalmente instituído, mas caro a seleção ao cargo em questão.
As três características, exploradas acima, não apresentam variação significativa entre os dois
mandatos analisados, de modo que podemos caracterizar o perfil do ministro médio desse período
como homem, com idade média de 56 anos e com alto grau de escolaridade.
Quanto aos aspectos políticos, o gabinete do governo FHC apresentou uma média de 59%
de ministros filiados a partidos, não havendo variância significativa entre os dois mandatos. Dentre
esses ministros partidarizados, tanto no primeiro, quanto no segundo governo, todos eram filiados
aos mesmos partidos, ou seja, não houve qualquer alteração nas legendas da coalizão. A
distribuição de cada uma delas, entretanto, mudou consideravelmente, como indica a tabela abaixo:
Tabela 2. Distribuição partidária por mandato
Mandato Partido Representação partidária (%)
FHC I
PSDB 41,4 PFL 13,8 PPS 3,4 PPR 3,4
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PMDB 20,7 PTB 13,8 PPB 3,4
FHC II
PSDB 42,4 PFL 24,2 PPS 3,0 PPR 3,0
PMDB 18,2 PTB 3,0 PPB 6,1
Fonte: Observatório/ NUSP- UFPR
Devido a dissidência internas quanto as políticas adotadas pelo governo federal, o que teve
como consequência o apoio de parte dos membros à candidatura de Ciro Gomes ao pleito de 1998,
o Partido Trabalhista Brasileiro apresentou uma queda evidente na composição dos ministérios no
segundo mandato. Por outro lado, o PFL foi o partido que mais angariou ministérios em relação ao
primeiro mandato, consolidando uma relação de apoio com o PSDB.
Inácio (2013) argumenta que existem duas estratégias que poderiam ser adotadas pelo chefe
do executivo para manter a centralização de tarefas de governo e o controle dos ministérios em suas
mãos, sendo elas a nomeação de: i) técnicos burocratas que responderiam diretamente às
preferências do presidente ou; ii) membros de seu partido, os quais, em tese, compartilhariam
interesses com o presidente na elaboração e implementação de políticas públicas.
Para Inácio (2013) e Power e Mochel (2004) os gabinetes dos governos FHC seriam
ocupados por atores com perfil mais tecnocrata quando comparados aos gabinetes subsequentes de
Lula, por exemplo. Esse caráter tecnocrata dos ministérios assumido pelo chefe do executivo fica
claro quando analisamos a experiência política prévia de seus atores.
Tabela 3. Experiência profissional prévia por mandato
Mandato Experiência Profissional Prévia %
FHC I
Somente técnico-burocrática 45,8
Somente militar 12,5
Somente político- administrativa 39,6
Sem experiência 2,1
FHC II
Somente técnico-burocrática 56,1
Somente militar 3,5
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Somente político- administrativa 38,6
Sem experiência 1,8
Fonte: Observatório/ NUSP- UFPR
Primeiramente é interessante notar o baixíssimo percentual de indivíduos sem nenhuma
experiência prévia, o que nos mostra que, independente do mandato, ter uma larga carreira política/
profissional parece ser um elemento de extrema importância para a ascensão aos cargos de alta
burocracia federal.
O decréscimo daqueles de carreira militar pode ser explicado pela extinção das pastas da
Marinha, Aeronáutica e Exército através da lei complementar nº 97, de 9 de junho de 1999, que
antes ocupadas por ministros de longínqua carreira militar, foram substituídas pelo Ministério da
Defesa, chefiado a partir de então por ministros civis.
Nos dois períodos estudados os ministérios são compostos amplamente por indivíduos com
experiência política técnico-burocrática, ou seja, que construíram carreira principalmente através de
cargos em agências e secretarias estatais ou empresas privadas, havendo crescimento considerável
desse perfil no segundo mandato. Esse tipo de ministro é seguido por aquele de experiência
político-administrativa, caracterizada pela ocupação em cargos políticos eletivos, muitas vezes
intercalados com passagens por cargos de nomeação política, como secretarias estaduais.
Isso em última instância nos diz muito sobre quais as estratégias e diretrizes políticas o
presidente decide assumir para a formulação e implementação das políticas consideradas prioridade
para o seu projeto. Fica claro, pelos resultados expostos nas tabelas acima, que durante todo o seu
governo o ex presidente Fernando Henrique Cardoso, procurou formar um gabinete de tecnocratas e
profissionais do campo administrativo, sem, no entanto, abrir mão do apoio político que o
garantisse maioria legislativa para aprovação dos projetos formulados.
Dito isso, a próxima tabela diz respeito à área na qual o ministro construiu a sua carreira
profissional, a partir da pasta na qual ele ocupou durante os governos FHC. Desse modo, o tipo de
expertise se refere ao conhecimento técnico profissional do indivíduo relacionado ao ministério
chefiado por ele. Seguindo esse critério dividimos o banco de dados entre aqueles que possuíam i)
histórico profissional em instâncias administrativas, como em secretarias, agências e empresas, mas
sem relação com o tema da pasta ocupada; ii) carreira profissional marcada por experiência na área
que coincide com o tema da pasta; iii) apenas formação acadêmica, mas sem ter trabalhado ou
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ocupado cargos relacionados ao tema; iv) sem qualquer relação acadêmica, administrativa ou
profissional com o tema do ministério o qual chefia.
De modo geral, a carreira profissional relacionada a área da pasta é predominante em ambos
os períodos.
Tabela 4. Tipo de expertise por mandato
Mandato Tipo de expertise %
FHC I
Apenas formação acadêmica relacionada
10,4
Experiência apenas administrativa
22,9
Carreira profissional relacionada 50,0 Sem expertise 16,7
FHC II
Apenas formação acadêmica relacionada
7,0
Experiência apenas administrativa
22,8
Carreira profissional relacionada 43,9 Sem expertise 26,3
Fonte: Observatório/ NUSP – UFPR
O primeiro dado que nos chamou atenção diz respeito ao grande número de indivíduos com
algum tipo de conhecimento técnico, seja apenas administrativo, seja inclusive na área da sua
respectiva pasta. Esses dados ajudam a desconstruir a ideia de que os ministros nomeados em
contexto de presidencialismo de coalizão seriam majoritariamente despreparados profissionalmente
para assumir o cargo. Ao menos em relação aos dois mandatos de Cardoso, essa ideia não se
sustenta.
Entretanto, uma variação do primeiro para o segundo mandato merece mais atenção. Ao
contrário do que poderíamos supor, o aumento de ministros sem qualquer expertise não foi
acompanhado por crescimento no número de ocupantes partidarizados, negando qualquer relação
automática inversa entre politização e tecnocracia. Neste caso, a falta de expertise não pode ser
explicada diretamente pelo caráter partidário dos mandatos ministeriais.
No entanto, constatamos que 100% dos ministros sem expertise são filiados a algum partido,
em sua maioria o PFL. A tabela 5 apresenta alguns dados sobre a concentração de casos entre
filiação partidária e tipo de expertise dos ministros.
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Tabela 5. Resíduos padronizados entre tipo de expertise e filiação, por mandato
Mandato
Filiado?
Tipo de Expertise
Sem expertise
Carreira profissional relacionada
Experiência apenas
administrativa
Apenas formação acadêmica relacionada
FHC I Não -1,8 1,1 ,3 -,7 Sim 1,4 -,9 -,3 ,6
FHC II Não -2,5 2,6 -,6 -,5 Sim 2,1 -2,2 ,5 ,4
FHC I: sig. 0,040/ FHC II: sig. 0,000 Fonte: Observatório/ NUSP- UFPR
No que se refere ao primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, a distribuição de
casos foi normal, não havendo concentração em nenhuma das categorias. Corroborando a esse
resultado, o valor de sig. está acima do limite crítico, o que nos permite aceitar a hipótese nula de
independência entre as variáveis.
Já no segundo mandato o cenário muda. A relação de dependência entre as duas variáveis é
alta, estando muito abaixo do limite crítico. Observa-se concentração positiva dos indivíduos com
carreira profissional relacionada à pasta, com aqueles que não possuem filiação partidária. Do
mesmo modo, há uma forte relação entre ministros sem expertise e os filiados a algum partido no
momento da nomeação.
Essa variação entre os mandatos pode sugerir um menor controle do presidente sobre as
escolhas daqueles que vieram a ocupar um posto no gabinete do seu governo no segundo mandato.
Esta constatação encontra respaldo no trabalho de Abrucio e Loureiro (1999). Segundo os autores,
Fernando Henrique Cardoso, lançando mão de sua popularidade, iniciou seu governo rodeado por
nomes de confiança e conhecimento técnico especializado para garantir a realização de políticas
públicas de seu interesse. Dessa forma, boa parte do sucesso do primeiro mandato presidencial de
Cardoso poderia ser explicado pela virtude do presidente (além boa dose de fortuna originada pelo
sucesso do Plano Real) no controle de delegação de funções.
No entanto, o trunfo da estabilidade econômica não pôde ser utilizado no segundo mandato.
A crise econômica asiática, os escândalos de corrupção sobre compra de votos para aprovação da
possibilidade de reeleição dos cargos executivo, e os programas de privatização implementados no
primeiro mandato, impactaram o poder de controle do presidente sobre a nomeação dos ministros a
partir do início do segundo mandato. Isso fica claro com o aumento no número de ministros com
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vínculos partidários sem expertise, o que sugere uma maior delegação de poder visando
governabilidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo dos perfis dos indivíduos que ocuparam cargos do alto escalão da burocracia
federal para além de nos mostrar um retrato dessa elite ao longo do tempo, nos revelando alguns dos
atributos caros à seleção desses atores, pode trazer à luz um debate muito importante no campo da
Ciência Política, ou seja, as relações executivo-executivo.
Em um primeiro momento pode parecer que o perfil dos ministros nos dois períodos
abordados nesse trabalho não se diferencia substancialmente, uma vez que se trata de homens, com
faixa etária média de 56 anos, alto nível de escolaridade, em sua maioria filiados a partidos e com
larga experiência prévia a ocupação do cargo.
No entanto, no trato dos dados algumas nuances puderam ser percebidas.
Em primeiro lugar, o peso de alguns partidos variou entre os mandatos, indicando uma
reconfiguração interna na aliança partidária, visto uma maior parcela do PFL no gabinete
acompanhando pela perda de espaço do PTB. A despeito, nenhum partido saiu ou ingressou da
coalizão entre os dois mandatos.
Além da perda do espaço dos militares, o segundo mandato também caracterizou pelo maior
número de indivíduos sem qualquer tipo de expertise. Esse dado ganha ainda mais relevância
quando observamos a coincidência desse aspecto com a filiação partidária. Dito de forma clara, nem
todo ministro filiado a alguma legenda é desprovido de conhecimento técnico, mas todos os
indivíduos que ingressaram no gabinete sem expertise são filiados a algum partido da coalizão.
De qualquer fica registrado caráter tecnocrático dos dois governos de Fernando Henrique
Cardoso. Lançamos uma hipótese a ser testada de que o arranjo institucional do primeiro mandato
era mais propício para a construção de uma agenda política favorável aos interesses do presidente,
ao passo que no segundo mandato haveria a maior preocupação do presidente com a garantia da
governabilidade.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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