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1 O SEGUNDO REINADO Em 1840, nosso país passava por um quadro de instabilidade social, política e econômica. A posse de dom Pedro como imperador do Brasil representava para grande parte da população e dos políticos uma esperança de estabilidade. Como ela, estabelecia-se o principio pelo qual tinha se organizado o Estado brasileiro: o da centralidade do poder na figura do imperador. Na realidade, a sagração antecipada do jovem príncipe contribuiu de forma decisiva para a pacificação do país, convulsionado pelas rebeliões, e para consolidação das instituições do império. Os grupos dominantes puderam, então, construir uma ordem política e social estável, baseada na supremacia do imperador sobre todos os outros poderes do estado, na grande propriedade rural monocultura e no trabalho escravo. A principal garantia material dessa estabilidade era a prosperidade econômica, assegurada pela expansão de um novo produto de exportação: o café. 1. A CONSTRUÇÃO DA ORDEM: Nomeado em 24 de julho de 1840, o primeiro ministério de dom Pedro II era composto de políticos liberais. Dois irmãos faziam parte dessa composição: Antônio Carlos e Martim Francisco de Andrada e Silva. Os Andradas alimentavam a expectativa de que o ministério, ou gabinete, com o era chamado na época, fosse estável e duradouro. Ao contrário do que esperavam dom Pedro II o dissolveu em março de 1841, substituindo-o por um gabinete conservador. A partir de então, liberais e conservadores passaram a revezar no poder durante os quase cinquenta anos do Segundo Reinado. Entre 1840 e 1853, alternaram-se sete gabinetes liberais e quatro conservadores. Em setembro de 153, um dos lideres conservadores, Honório Hermeto Carneiro Leão, marquês do Paraná, chamado por dom Pedro para formar o ministério, compôs sua equipe com políticos das duas facções, dando início ao período da conciliação. Essa fase duraria cinco anos, ao longo dos quais houve três gabinetes conciliadores, ou seja, compostos de liberais e conservadores. Em dezembro de 1858, voltaria à cena a gangorra política, ora com conservadores, ora com liberais, até 1889, ano da queda da monarquia e da Proclamação da República.

O Segundo Reinado

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Em 1840, nosso país passava por um quadro de instabilidade social, política e econômica. A posse de dom Pedro como imperador do Brasil representava para grande parte da população e dos políticos uma esperança de estabilidade. Como ela, estabelecia-se o principio pelo qual tinha se organizado o Estado brasileiro: o da centralidade do poder na figura do imperador. Na realidade, a sagração antecipada do jovem príncipe contribuiu de forma decisiva para a pacificação do país, convulsionado pelas rebeliões, e para consolidação das instituições do império. Os grupos dominantes puderam, então, construir uma ordem política e social estável, baseada na supremacia do imperador sobre todos os outros poderes do estado, na grande propriedade rural monocultura e no trabalho escravo. A principal garantia material dessa estabilidade era a prosperidade econômica, assegurada pela expansão de um novo produto de exportação: o café.

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O SEGUNDO REINADO

Em 1840, nosso país passava por um quadro de instabilidade social,

política e econômica. A posse de dom Pedro como imperador do Brasil

representava para grande parte da população e dos políticos uma esperança

de estabilidade. Como ela, estabelecia-se o principio pelo qual tinha se

organizado o Estado brasileiro: o da centralidade do poder na figura do

imperador. Na realidade, a sagração antecipada do jovem príncipe contribuiu

de forma decisiva para a pacificação do país, convulsionado pelas rebeliões, e

para consolidação das instituições do império. Os grupos dominantes

puderam, então, construir uma ordem política e social estável, baseada na

supremacia do imperador sobre todos os outros poderes do estado, na grande

propriedade rural monocultura e no trabalho escravo. A principal garantia

material dessa estabilidade era a prosperidade econômica, assegurada pela

expansão de um novo produto de exportação: o café.

1. A CONSTRUÇÃO DA ORDEM:

Nomeado em 24 de julho de 1840, o primeiro ministério de dom Pedro II

era composto de políticos liberais. Dois irmãos faziam parte dessa composição:

Antônio Carlos e Martim Francisco de Andrada e Silva. Os Andradas

alimentavam a expectativa de que o ministério, ou gabinete, com o era

chamado na época, fosse estável e duradouro. Ao contrário do que esperavam

dom Pedro II o dissolveu em março de 1841, substituindo-o por um gabinete

conservador. A partir de então, liberais e conservadores passaram a revezar no

poder durante os quase cinquenta anos do Segundo Reinado.

Entre 1840 e 1853, alternaram-se sete gabinetes liberais e quatro

conservadores. Em setembro de 153, um dos lideres conservadores, Honório

Hermeto Carneiro Leão, marquês do Paraná, chamado por dom Pedro para

formar o ministério, compôs sua equipe com políticos das duas facções, dando

início ao período da conciliação. Essa fase duraria cinco anos, ao longo dos

quais houve três gabinetes conciliadores, ou seja, compostos de liberais e

conservadores. Em dezembro de 1858, voltaria à cena a gangorra política, ora

com conservadores, ora com liberais, até 1889, ano da queda da monarquia e

da Proclamação da República.

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Liberais e conservadores - farinha do mesmo saco.

Com a ascensão do padre Feijó à regência, em 1835, a corrente liberal

moderada se dividiu em dois grupos. Os que se opunham ao regente se uniram

a Bernardo Pereira de Vasconcelos, um antigo liberal que assumiu pouco a

pouco posições conservadoras, sob o pretexto de que era preciso evitar a

anarquia. A esse grupo se juntaram os restauradores, cuja luta havia perdido

sentido com a morte de dom Pedro I, em 1834. Dessa combinação de forças

surgiu a facção denominada “Partido” Conservador.

Em contrapartida, os que apoiavam Feijó constituíram uma facção de

características nitidamente liberais, à qual se somariam mais tarde os liberais

exaltados. Uma vez unificadas, as duas correntes dariam origem ao grupo

conhecido como “Partido” Liberal. Entre liberais e conservadores não havia

diferenças ideológicas e políticas muito significativas. Ambas as correntes eram

monarquistas e defensoras da grande propriedade rural e do trabalho escravo

(em relação a esse tema, havia exceções nos dois grupos, como o liberal Feijó

e o conservador José Bonifácio, que defendiam a extinção da escravidão de

forma lenta e gradual). Da mesma forma, as bases sociais em que os dois

grupos se apoiavam eram semelhantes.

Os liberais representavam, sobretudo, os interesses de setores da

aristocracia agrária e do comercio, mas suas propostas eram apoiadas também

por amplos segmentos das camadas médias da população urbana. Os

conservadores, por sua vez, estavam ligados a outros setores da aristocracia e

do comércio de exportação.

Devido a essa semelhança, durante o Segundo Reinado dizia-se que

“não há nada mais parecido com um conservador do que um liberal no poder”.

Mesmo assim, não se pode deixar de reconhecer algumas diferenças entre

eles. Os liberais seriam sempre mais partidários da descentralização do poder

e da proposta federalista do que os conservadores. Não por acaso, das fileiras

liberais, e não do grupo conservador, surgiria por volta de 1870. O movimento

republicano.

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A Revolução Praieira (1848).

Entre as províncias do Nordeste, Pernambuco se destacava por sua

forte economia açucareira e por longa tradição de revoltas políticas, que

começaram com a luta contra os holandeses, em meados do século XVII. Em

1840, uma nova revolta eclodiu na região. De caráter liberal e Federalista, o

movimento ficaria conhecido como a Revolução Praieira. Os líderes dos

revoltosos pertenciam à facção mais radical dos liberais.

Como seu ponto mais frequente de reunião era a sede do Diário Novo,

localizada na rua da Praia, no Recife, o grupo passou a ser chamado de

Partido da Praia, nome do qual derivaria o da própria revolução. No Recife,

uma das fontes de descontentamento popular era o domínio que os

portugueses ainda exerciam sobre o comércio local, para muitos a causa do

alto custo de vida e do desemprego urbano. A situação levava os

pernambucanos a exigir a nacionalização do comércio. Além disso, a

insatisfação também era crescente em relação à crise da economia açucareira,

o que criava um clima de criticas generalizadas à política imperial. A partir de

1844, os liberais estiveram no governo da província durante 4 anos. Em 1848,

os conservadores subiram ao poder no Rio de Janeiro, formando um novo

gabinete. Como era de praxe, nomearam conservadores para presidir as

províncias. Em Pernambuco, o presidente Liberal Chichorro da Gama foi

destituído e o conservador Herculano Ferreira Pena assumiu o cargo. A

resposta do Partido da Praia foi pegar em armas para derrubar o governo.

Começava a Revolução Praieira.

Do Recife, o movimento se propagou para a Zona da mata (região em

que se concentravam os engenhos de açúcar), onde um líder popular, Pedro

Ivo, mobilizou boiadeiros, pequenos arrendatários, escravos libertos, caboclos

e índios, ao lado de soldados profissionais. Com eles, passou a fustigar as

forças do governo. Os rebeldes chegaram a ocupar parte de recife, mas não

conseguiram depor o governo conservador. Para divulgar suas ideias, no dia 1ª

de janeiro de 1849 lançaram o Manifesto ao Mundo, no qual reivindicavam o

sufrágio universal, nacionalização do comércio varejista, a autonomia

provincial, a liberdade de imprensa e a extinção do poder Moderador.

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Não propunham, contudo, a formação de uma República e, assim com

nas rebeliões de 1817 e 1824, silenciaram sobre a questão do trabalho

escravo. No início de 1850, o governo central conseguiu sufocar a revolta,

empregando tropas regulares apoiadas nas forças da Guarda Nacional. Depois

de um ano e alguns meses de combate em toda a província, Pedro Ivo e outros

líderes praieiros foram presos e a “paz imperial” voltou a reinar em

Pernambuco.

A consolidação do Império.

Com o esmagamento da Revolução Praieira, o país parecia finalmente

pacificado, sob a égide do poder imperial. A unidade territorial fora garantida, a

Constituição estava em vigor, os grupos políticos se revezavam no poder e a

grande propriedade rural, assim como a escravidão, estava mantida. A partir de

1850, uma série de medidas procuraria consolidar ainda mais a ordem política,

econômica e social do país. A primeira datava já de 1847, quando foi criada a

figura do presidente do conselho de Ministros. A medida representava uma

tentativa de introduzir no Brasil o sistema político de inspiração britânica, pela

qual o Parlamento indicava o primeiro-ministro o líder do partido que tinha a

maioria parlamentar, e o monarca simplesmente acatava a indicação. Só que

no Brasil, ao contrário, a supremacia do Parlamento não existia, pois quem

indicava o presidente do Conselho de Ministro era o imperador.

De todo modo, o cargo de presidente do Conselho de Ministros

funcionou como elemento estabilizador do sistema político, sobretudo porque

foi acompanhado da alternância no poder dos dois grupos políticos em que se

dividia a elite do país. Enquanto isso, as camadas mais pobres da população

ficavam cada vez mais à margem dos processos de tomadas de decisões. Em

1850, para cumprir uma exigência da Grã-Bretanha com o ato Bill Aberdeen,

que proibia o tráfico escravo, principal parceiro comercial do Brasil – foi

aprovada a Lei Eusébio de Queirós, que estabelecia a extinção do trafico

negreiro. Outra medida importante foi a Lei de Terras, que, em 1850,

estabeleceu normas para a aquisição de terras devolutas (terras não ocupadas,

legalmente pertencentes ao Estado). Com isso, pretendia-se pôr fim a uma

situação desordenada, em que as terras eram compradas e vendidas sem

nenhum amparo legal. A nova lei determinou que as terras devolutas só

poderiam ser adquiridas mediante compra e não por meio da ocupação como

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ocorrera até então. A medida tinha também outro objetivo: impedir o acesso

das camadas populares a terra, principalmente com a suspensão do tráfico

negreiro e iminente fim da escravidão. Com a nova legislação, apenas os

grandes proprietários passavam a ter o direito legal de adquirir as terras, pois

só eles dispunham de recursos suficientes para esse tipo de transação. Em

contrapartida, os trabalhadores rurais livres já não podiam ocupar terras

devolutas nem instalar nelas suas lavouras de subsistência. Assim, na pratica a

medida favorecia a concentração da grande propriedade rural.

2. CAFÉ E FERROVIAS:

O Brasil tinha entrado no século XIX com uma economia baseada na

produção e exportação de produtos agrícolas. Passados cinquenta anos, a

situação não era diferente. No lugar do açúcar e do algodão, começava a

despontar agora outro produto tropical de grande aceitação no mercado

internacional: o café. Plantado nas primeiras décadas do século XIX nos

arredores do Rio de Janeiro, o café ocupou rapidamente toda a região da atual

floresta da tijuca e se espraiou mais tarde pelo vale do Paraíba. Na década de

1820, o Brasil produzia cerca de 90 mil sacas de café por ano. Por volta de

1840, a produção já era de cerca de um milhão de sacas e representava quase

48% das vendas do país no exterior.

Do vale do Paraíba, os cafezais logo alcançaram São Paulo e o sul de

Minas. A partir de 1870, as plantações chegaram ao Oeste paulista, a cidades

como Campinas, Ribeirão Preto, Campos Novos Paulistas e São José do Rio

Preto. Dez anos depois, por volta de 1880, o Brasil já produzia mais da metade

de todo o café cultivado no mundo. As atividades ligadas a essa expansão

provocaram profundas mudanças na sociedade, deslocando o eixo da

economia do Nordeste açucareiro e das regiões mineradoras, esgotadas na

época, para o Centro-Sul do país, onde o café encontrou melhores condições

de clima e solo para seu desenvolvimento. Surgia assim uma camada nova de

prósperos senhores de terra: os cafeicultores. No começo, os cafeicultores do

Rio de Janeiro e do vale do Paraíba seguiam um estilo de vida semelhante ao

dos senhores de engenho nordestinos. Tinham uma mentalidade

tradicionalista, defendiam com unhas e dentes os regimes de trabalho escravo,

moravam em suas fazendas e empregavam os lucros apenas no consumo de

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artigos de luxo e na compra de novos escravos. A partir de 1870, contudo, com

a chegada do café ao Oeste paulista, começou a surgir um novo tipo de

cafeicultor, com uma mentalidade bem diferente. O novo cafeicultor utilizava

em sua fazenda métodos mais racionais e modernos de produção agrícola.

Admitia também a substituição da mão de obra escrava por trabalhadores

imigrantes vindos da Europa. Já na década de 1840, o senador liberal e ex-

regente Nicolau Vergueiro empregou como trabalhadores livres em sua

fazenda na região de Campinas, em São Paulo, um grupo de 177 famílias

alemãs, suíças, belgas e portuguesas.

Mas foi só a partir de 1850, quando a Lei Eusébio de Queirós proibiu o

tráfico negreiro, que a imigração começou a ser encarada como solução viável

para o problema da mão de obra. Em 1871, fazendeiros paulistas criaram, com

o apoio do Ministério da Agricultura. A Sociedade auxiliadora da Colonização e

Imigração, destinada a promover a vinda para o Brasil de trabalhadores

agrícolas europeus. A expansão da cafeicultura tornou possível a implantação

de ferrovias na província de São Paulo para facilitar o transporte do produto

entre as áreas de cultivo e o porto de Santos, por onde se dava o escoamento

do café. A primeira delas, a São Paulo Railway, ligava Santos a Jundiaí.

Construída com capitais britânicos, a ferrovia foi inaugurada em 1867. Logo

depois, uma nova empresa, a Companhia Paulista, levaria os trilhos da Santos-

Jundiaí até Campinas. Em 1870, surgiram mais duas empresas ferroviárias em

São Paulo, a companhia Sorocabana e a companhia Ituana. Por volta de 1882,

nada menos de 1400 quilômetros de ferrovias cortavam o território paulista.

3. AS PRIMEIRAS INDÚSTRIAS:

O fim do tráfico negreiro e a expansão do café colocaram nas mãos dos

fazendeiros e do comércio de exportação grande soma de capitais ociosos,

antes destinados à compra de escravos. Parte desses capitais acabaria

impulsionando um primeiro surto industrial no país.

Esse surto foi estimulado por uma alteração na política alfandegário do

governo imperial: em 1844, o ministro da fazenda, Manuel Alves Branco,

estabeleceu novos impostos (entre 20 e 60%) sobre os produtos importados

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pelo Brasil. As taxas mais pesadas (de 40 a 60%) recaíam sobre artigos com

assimilar nacional, como chá, vidros, tecidos de cânhamo e outros. As mais

baixas (20%) incidiam sobre produtos como ferro, folha de flandres, cobre, etc.,

necessários à produção industrial.

Conhecidas como tarifas Alves Branco, as novas taxas configuravam

uma política alfandegária protecionista, pois encareciam as mercadorias

importadas e estimulavam a produção de similares nacionais. A decisão era um

incentivo à industrialização brasileira, que pôde então contar com o

investimento de capitais provenientes da cafeicultura e do trafico negreiro.

Como resultado, na década de 1850 foram fundadas 62 empresas industriais,

catorze bancos, três caixas econômicas, vinte companhia de navegação a

vapor, 23 companhias de seguros, oito estradas de ferro, além de empresas de

mineração, transporte urbano e serviço de gás, entre outras.

Ao mesmo tempo em que a política interna favorecia os negócios do

país, a situação internacional criava outros estímulos à produção industrial. Na

região do Prata, por exemplo o Império entrou em diversos conflitos a partir da

década de 1850, culminando com sua intervenção na Guerra do Paraguai,

entre 1865 e 1870. Esse envolvimento levou o Exército e a Marinha a comprar

mais das indústrias brasileiras, que a essa altura começavam a diversificar sua

produção. Só para ter ideia, muitos dos navios utilizados por nossa Marinha de

guerra nos conflitos, por exemplo, foram adquiridos no Estaleiro de Ponta da

Areia, de propriedade de Irineu Evangelista de Sousa, o barão de Mauá.

Mais ou menos no mesmo período, a produção algodoeira dos Estados

Unidos entrou em colapso, devido à Guerra de Secessão (1861-1865),

estimulando o plantio e as exportações de algodão no Brasil. Como efeito

colateral do conflito, houve um surto de crescimento da indústria têxtil

brasileira. Em 1879, o ministro da Fazenda, Afonso Celso de Assis Figueiredo,

futuro visconde de Ouro Preto, adotou novas medidas protecionistas.

A partir desse momento, o país conheceria sua fase de maior

desenvolvimento industrial no século XIX. O crescimento, porém, era ainda

modesto, pois o país continuava sendo essencialmente agrário, apesar de

contar com algumas fábricas, concentradas, sobretudo, no Rio de Janeiro.

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4. CONFLITOS NO PRATA:

Entre 1850 e 1870, o Brasil se envolveu em diversos conflitos na região

do rio Prata (Uruguai, Argentina e Paraguai). Na verdade, como vimos, a região

era foco de tensões desde o período colonial. Entretanto, depois da

independência dos países platinos, a rivalidade se acirrou. Nas décadas de

1810 e 1820, o governo brasileiro procurou a todo custo evitar a formação de

uma única nação platina, que teria como base o antigo Vice-reino do Prata.

Na eventualidade de esse país ser criado, os interesses do Brasil de

assegurar a livre navegação no rio Prata e o comércio com o interior do

continente seriam inviabilizados. Em 1825, rebeldes uruguaios proclamaram a

independência da Província Cisplatina, anexada ao Brasil por dom João Vi, e

sua unificação com as províncias Unidas do Prata ( atual Argentina). Esse fato

foi encarado como uma ameaça ao Brasil e levou dom Pedro I a se empenhar

num longo e desgastante conflito, a Guerra da Cisplatina, que só terminou em

1828. Graça à mediação da Grã-Bretanha no acordo de paz, o Uruguai foi

declarado Estado independente e ficou garantida a livre navegação no rio da

Prata. As duas decisões eram favoráveis ao Brasil.

A partir de então, o governo brasileiro e o argentino passaram a intervir

nos assuntos internos do Uruguai, apoiando grupos rivais em constante disputa

pelo poder. Em 1834, foi eleito para presidência do Uruguai Manuel Oribe, do

partido Blanco aliado do governo argentino de Juan Manuel Rosas. Contra ele

se rebelou José Fructuoso Rivera, chefe do partido colorado, apoiado pelo

Brasil. Em 1838, Rivera derrubou Oribe, que fugiu para a Argentina.

A reação do governo argentino foi bloquear o porto de Montevidéu.

Mesmo com esses contratempos, Rivera conseguiu se manter no poder até

1843. Mas uma coisa era certa: a possibilidade de integrantes do partido

Blanco, assumirem o poder no Uruguai alterava o equilíbrio de forças na

região, favorecendo a Argentina. Como o governo de Buenos Aires não queria

reconhecer a independência do Paraguai, o Brasil aliou-se a esse país e

declarou guerra à Argentina em 1851.

Na própria Argentina, o governo Brasileiro obteve o apoio de dois

poderosos líderes políticos, inimigos de Rosas: Justo José de Urquiza e

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Bartolomeu Mitre. Em 1852, o Brasil e seus aliados derrotaram e depuseram

Rosas. Urquiza assumiu então a presidência da Argentina e reconheceu a

independência do Paraguai. Pouco tempo depois, as alianças construídas

durante a guerra contra Rosas foram desfeitas. Na Argentina, Urquiza rompeu

com Bartolomeu Mitre e se aproximou do partido Blanco, do Uruguai. Em

1862, Mitre foi eleito presidente da Argentina. Enquanto isso, o Brasil passava

por uma série e atritos com o Paraguai por questões de fronteiras e pelo direito

de navegação no rio Paraguai, que atravessava o território paraguaio.

A guerra do Paraguai (1865 -1870).

Em 1864, as forças da região estavam assim distribuídas: no Uruguai, o

governo blanco do presidente Atanásio Cruz Aguirre era apoiado por Solano

Lopez, presidente do Paraguai e pelo o argentino Urquiza. Em contrapartida, os

colorados uruguaios recebiam ajuda do governo brasileiro e do presidente

argentino Bartolomeu Mitre. Em novembro de 1864, uma esquadra de guerra

brasileira, comandada pelo almirante Joaquim Marques Lisboa, barão de

Tamandaré, bloqueou Montevidéu a pretexto de punir o governo uruguaio

contra “maus-tratos” a cidadãos brasileiros. Como a intervenção alterava o

equilíbrio da região a favor do Brasil, em resposta o governo de Solano López

aprisionou um navio brasileiro que navegava por aguas do rio Paraguai e

rompeu relações com o governo do Brasil.

A guerra entre os dois países era iminente. Em dezembro de 1864,

forças paraguaias atacaram Mato Grosso. Enquanto isso, tropas brasileiras,

apoiadas por forças uruguaias coloradas, invadiram o território Uruguai,

tomando a cidade de Paissandu em janeiro de 1865 e colocaram no poder o

colorado Venâncio Flores. Em abril, forças paraguaias reagiram e invadiram a

província argentina de Corrientes, com o objetivo de chegar ao Uruguai e

recolocar no poder o partido blanco. Em maio de 1865, representantes dos

governos brasileiros, argentino e Uruguai reuniram-se em Buenos Aires e

firmaram o Tratado da Tríplice Aliança contra o Paraguai. O acordo previa a

entrega de territórios paraguaios ao Brasil e á Argentina em caso de vitória dos

aliados. A Grã-Bretanha, que também tinha interesses em jogo na bacia do

Prata, daria apoio financeiro e militar aos aliados. Em junho, a guerra se

estendeu por toda a região.

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No primeiro momento do conflito, a ofensiva militar coube ao Paraguai,

mas a primeira derrota não tardaria. Em 11 de junho de 1865, na batalha naval

de Riachuelo, uma esquadra brasileira, comandada pelo almirante Francisco

Manuel de barroso, destruiu quase toda a frota de guerra paraguaia. A partir

dessa vitória, as forças aliadas passaram a tomar a iniciativa nos combate. Em

abril de 11866, a Tríplice Aliança invadiu o Paraguai. Um mês depois, o

exército Paraguai sofreu fragorosa derrota na batalha de Tuiuti. Solano López

concentrou então suas forças na fortaleza de Humaitá, que durante dois anos

resistiu ao assédio das tropas invasoras. Detidos em Humaitá, os exércitos

conjuntos da Tríplice Aliança foram atraídos para Curupaiti, onde acabaram

batidos pelos paraguaios em setembro de 1866.

Em janeiro de 1868, o general brasileiro Luís Alves de Lima, o duque de

Caxias, assumiu o comando supremo das tropas aliadas. Em julho, Humaitá se

rendeu, e cinco meses depois Caxias venceu a batalha de Avaí e ocupou

Lomas Valentinas. Em seguida, no dia 1º de janeiro de 1869, as forças aliadas

entraram em Assunção. O Paraguai, contudo, não se deu por vencido.

Reunindo o que restava de seu exército, a essa altura formado quase que

exclusivamente por velhos e meninos, Solano López se retirou para o norte do

país. No dia 1º de março, o conde D’Eu, marido da princesa Isabel e substituto

de Caxias no comando das tropas aliadas, chegou a Cerro Corá, na fronteira

com Mato Grosso, e derrotou as forças de López, que morreu em combate.

Com o fim do conflito, os países beligerantes puderam contabilizar seus

prejuízos. O Paraguai, o mais atingindo pela guerra, só tinha perdas a registrar.

Sua população, de cerca de 400 mil habitantes em 1865, havia se reduzido a

apenas 194 mil em 1870. Cerca de 90% dos homens estavam mortos. Suas

terras estavam devastadas, seus rebanhos dizimados e suas indústrias

destruídas. O Brasil, ao contrário, afirmou sua soberania sobre uma faixa de

território pretendida pelo Paraguai no sul de Mato Grosso, mas perdeu um

quinto dos efetivos enviados para a guerra, estimados em cerca de 150 mil

homens. Além disso, para fazer face aos custos da mobilização militar, o

governo imperial contraiu vários empréstimos junto a banqueiros ingleses.

Ao mesmo tempo, foi obrigado a aumentar os impostos e a emitir grande

quantidade de papel-moeda para cobrir os gastos de guerra. Essas emissões

provocaram a alta do custo de vida, o que diminuiu muito o apoio da população

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ao imperador. A guerra teria ainda outro custo para o governo de dom Pedro II.

No decorrer do conflito, a composição social e étnica do Exército sofreu

mudanças importantes. O esforço de guerra exigiu a participação de

numerosos escravos, que, dessa forma, ganhariam a liberdade.

Esses homens, antes considerados seres inferiores, demonstraram valor

e bravura nos combates, despertando a admiração e o respeito dos oficiais,

acostumados a trata-los com desprezo. A própria oficialidade também mudou,

com o ingresso de jovens provenientes das camadas médias e baixas da

sociedade. Esses jovens eram sensíveis às ideias republicanas e

abolicionistas, com as quais entraram em contato nas frentes de batalhas. Por

isso, ao voltar da guerra, o Exército entrou pouco a pouco em “rota de colisão”

com o sistema monárquico de poder e com o regime de trabalho escravo

vigente no Brasil, apoiando de modo cada vez mais decidido a campanha

abolicionista e a proposta republicana.

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PARA SISTEMATIZA OS ESTUDOS1

1. Uma mudança importante na Constituição foi introduzida em 1847, ao

ser criado o cargo de presidente do Conselho de Ministros, que introduziu

uma espécie de parlamentarismo no Brasil. Explique como se encontrava

o quadro político brasileiro nesse período e como essa mudança

colaborou para a estabilidade política nos anos seguintes.

2. Em 1850, foi abolido definitivamente o trafico negreiro no Brasil. Quais

as principais implicações dessa medida?

3. Elabore um texto resumindo os motivos que levaram à Guerra do

Paraguai e suas principais consequências para Brasil e Paraguai.

4. Quais foram às causas econômicas, as políticas e as principais

reivindicações da Revolução Praieira?

5. Embora o café não alterasse, inicialmente, as bases agroexportadoras

de nossa economia, trouxe uma série de mudanças econômicas e sociais

para o Brasil. Quais foram elas?

6. O fato de a Lei Eusébio de Queirós e a Lei de Terras terem sido

aprovadas no mesmo ano, 1850, não é mera coincidência. Quando a mão

obra era escrava, o acesso à terra era livre; quando a mesma começou a

torna-se livre, o acesso à terra foi restringido. Comente a lógica

econômica dessas medidas.

1 Material elaborado pelo Prof. Elicio Lima para sistematizar situações de ensino-aprendizagem na sala de aula. A intertextualidade desse trabalho se estabelece no dialogo entre as obras: História: Volume único: Divalte Garcia Figueiredo. 1. ed. São Paulo: Ática, 2005. História global volume único: Gilberto Cotrim. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. História Sociedade & Cidadania: Alfredo Boulos Júnor. 1ª ed. São Paulo: FTD 2013. Material referenciado pelos Parâmetros curriculares Nacionais e proposta curricular do Estado de São Paulo (Feitas algumas adaptações e grifos para facilidade o processo didático ensino aprendizagem - 2015). Sequencia didática. Quarto Bimestre - Segundo ano do Ensino Médio.

O SEGUNDO REINADO Situação de aprendizagem 27 – História - Prof. Elicio Lima

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