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Revista Militar de ARTIGOS Ciência e Tecnologia ISSN 0102-3543 Vol. XXVIII - 3 o Trimestre de 2011 ACETILCOLINESTERASE: ALZHEIMER E GUERRA QUÍMICA........................................................................................................... 03 Elaine da Conceição Petronilho Angelo C. Pinto José Daniel Figueroa Villar COMBUSTÍVEIS DE AVIAÇÃO: PERSPECTIVAS E FUTURO ........................................... 15 Flavio dos Reis Gonçalves Luiz Eduardo Pizarro Borges Marco André Fraga LACTATO DESIDROGENASE COMO ALVO MOLECULAR PARA QUIMIOTERAPIA ANTIMALARIAL.................................................................................................................... 24 Aline Alves Oliveira Tanos Celmar Costa França UMA REVISÃO DE MODELAGEM MATEMÁTICA EM BIOPROCESSOS. PARTE I: FUNDAMENTOS BÁSICOS E CLASSIFICAÇÃO ............................................... 40 Álvaro José Boareto Mendes Belkis Valdman Maurício Bezerra de Souza Júnior UMA REVISÃO DE MODELAGEM MATEMÁTICA EM BIOPROCESSOS. PARTE II: MODELOS MECANICISTAS E REDES NEURONAIS ARTIFICIAIS .................................................................................. 60 Álvaro José Boareto Mendes Belkis Valdman Maurício Bezerra de Souza Júnior

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Revista Militar de

ARTIGOS

Ciência e Tecnologia

ISSN 0102-3543

Vol. XXVIII - 3o Trimestre de 2011

ACETILCOLINESTERASE: ALZHEIMER E GUERRA QUÍMICA ........................................................................................................... 03Elaine da Conceição PetronilhoAngelo C. Pinto José Daniel Figueroa Villar

COMBUSTÍVEIS DE AVIAÇÃO: PERSPECTIVAS E FUTURO ........................................... 15Flavio dos Reis GonçalvesLuiz Eduardo Pizarro BorgesMarco André Fraga

LACTATO DESIDROGENASE COMO ALVO MOLECULAR PARA QUIMIOTERAPIA ANTIMALARIAL .................................................................................................................... 24Aline Alves Oliveira Tanos Celmar Costa França

UMA REVISÃO DE MODELAGEM MATEMÁTICA EM BIOPROCESSOS. PARTE I: FUNDAMENTOS BÁSICOS E CLASSIFICAÇÃO ............................................... 40Álvaro José Boareto Mendes Belkis ValdmanMaurício Bezerra de Souza Júnior

UMA REVISÃO DE MODELAGEM MATEMÁTICA EM BIOPROCESSOS. PARTE II: MODELOS MECANICISTAS E REDES NEURONAIS ARTIFICIAIS .................................................................................. 60Álvaro José Boareto MendesBelkis ValdmanMaurício Bezerra de Souza Júnior

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Editorials materiais foram, são e continuarão a ser fun-

damentais para o desenvolvimento da nossa

civilização; tanto é assim que vários estágios do

progresso humano recebem os nomes de “Idade da

Pedra”, “Idade do Bronze”, “Idade do Ferro” e

assim por diante. A Ciência dos Materiais é um campo interdisciplinar

que envolve as propriedades dos materiais e suas aplicações a várias

áreas da ciência e da engenharia, com ênfase na correlação entre a

microestrutura e as propriedades macroscópicas dos diversos tipos de

materiais.

Este número da Revista Militar de Ciência e Tecnologia apre-

senta, através de seus artigos, uma pequena amostra das pesquisas

que vêm sendo desenvolvidas por professores e alunos do Programa

de Pós-Graduação em Ciência dos Materiais do Instituto Militar de

Engenharia, que completou 40 anos de existência em 2010. Chamamos

a atenção para a diversidade dos assuntos tratados, que vão desde o

uso de nanopartículas para a remoção de manchas de petróleo até a

fabricação de contatos transparentes para células solares.

O

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Expe

dien

tePublicação de Pesquisa eDesenvolvimento Científico-TecnológicoDo Exército Brasileiro

Revista Militar de Ciência e Tecnologia

Comandante do ExércitoGeneral de Exército Enzo Martins Peri

Departamento de Ciência e Tecnologia General de Exército Augusto Heleno Ribeiro Pereira

Departamento de Educação e Cultura do Exército General de Exército Rui Monarca da Silveira

Editor ChefeRoberto Ades

Corpo EditorialAntonio Luís dos Santos Lima; Ronaldo Sergio de Biasi; José Antonio Apolinário Junior; Juraci Ferreira Galdino, Luciano Luporini Menegaldo; Marcelo de Miranda Reis; Ronaldo Moreira Salles; Ronaldo Sergio de Biasi; Rubenildo Pithon de Bar-ros; Tanos Celmar Costa França

Corpo RedatorialRubenildo Pithon de Barros; Tanos Celmar Costa França e Luiz Tadeu Carqueija Mota

Redação INSTITUTO MILITAR DE ENGENHARIA - IMEPraça General Tibúrcio, 80Praia Vermelha – Rio de Janeiro, RJ – CEP 22290-270Tels.: (21) 2546-7080

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Os conceitos técnico-profissionais emitidos nas matérias assinadas são de exclu-siva responsabilidade dos autores, não refletindo necessariamente a opinião da Revista e do Exército Brasileiro.A Revista não se responsabiliza pelos dados cujas fontes estejam devidamente citadas. Salvo expressa disposição em contrário, é pemitida a reprodução total ou parcial das matérias publicadas, desde que mencionados o autor e a fonte. Aceita-se intercâmbio com publicações nacionais ou estrangeiras.

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3 3o Trimestre de 2011 –

ABSTRACT

The inhibition of human acetylcholinesterase (AChE) has several important applications in medical treatments, especially in Alzheimer’s Disease (AD), which is one of the main causes of dementia in the elderly and affects about 35.6 million people worldwide. This disorder leads to decreased activity of cholinergic neurons, a problem that can be treated by increasing the amount of the neurotransmitter acetylcholine (ACh). The best way to increase the concentration of ACh is the inhi-bition of AChE. AChE drugs inhibitors used for the treatment of AD are donepezil, galantamine, rivastigmine, and tacrine. Another threat to humanity are the chemical warfare agents known as nerve agents, which deserve special attention because of its high lethality and danger. Most nerve agents are organophosphorus (OP) that act mainly by inhibiting AChE which is essential for controlling the transmission of nerve impulses. When inhibited by these compounds, AChE can be reactivated by cationic oximes such as pralidoxime (2-PAM). This review will be a discussion of the structural and biological characteristics of AChE, followed by a review of Alzheimer’s disease and OP compounds and their application as chemical warfare agents.

Keywords: Acetylcholinesterase, Alzheimer’s disease, organophosphorus compounds.

RESUMO

A inibição da acetilcolinesterase (AChE) humana tem várias aplicações impor-tantes em tratamentos médicos, especialmente na doença de Alzheimer (DA), que é uma das principais causadoras de demência em idosos e afeta cerca de 35,6 milhões de pessoas em todo o mundo. Esta doença causa a diminuição da atividade dos neu-rônios colinérgicos, um problema que pode ser tratado aumentando a quantidade do neurotransmissor acetilcolina (ACh). A melhor maneira de aumentar a concentração de ACh é pela inibição da AChE. Os fármacos inibidores da AChE utilizados para o tratamento da DA são donepezil, galantamina, tacrina e rivastigmina. Outra ameaça para a humanidade são os agentes de guerra química conhecidos como agentes de nervos, que merecem atenção especial devido a sua alta letalidade e perigo. A

ACETILCOLINESTERASE: ALZHEIMER E GUERRA QUÍMICA

Elaine da Conceição Petronilhoa, Angelo C. Pintob e José Daniel Figueroa Villara*

aGrupo de Química Medicinal, Departamento de Química, Instituto Militar de Engenharia, Praça General Tibúrcio, 80, 22290-270, Praia Vermelha, Rio de Janeiro, RJ, Brasil..bInstituto de Química, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 21941-970, Cidade Universi-tária, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.* [email protected].

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4 – 3o Trimestre de 2011

maioria dos agentes de nervos são organofosforados (OF) que atuam principalmente através da inibição da AChE que é essencial para controlar a transmissão de impulsos nervosos. Quando inibida por estes compostos, a AChE pode ser reativada por oximas catiônicas como a pralidoxima (2-PAM). Esta revisão trata das características estrutu-rais e biológicas da AChE, seguida por uma revisão da doença de Alzheimer e compos-tos organofosforados e sua aplicação como agentes de guerra química.

Palavra chave: acetilcolinesterase, doença de Alzheimer, compostos organo-fosforados.

INTRODUÇÃO

A acetilcolinesteraseA acetilcolinesterase (AChE) é uma enzima pertencente a família das colines-

terases, sendo responsável pela finalização da transmissão dos impulsos nervosos nas sinapses colinérgicas pela hidrólise do neurotransmissor acetilcolina (ACh). A AChE está presente no sistema nervoso central e periférico (Rang, 2001).

No periférico ela é responsável pela modulação dos impulsos nervosos que controlam os batimentos cardíacos, pela dilatação dos vasos sanguíneos e pela contração dos músculos lisos enquanto que no central ela está envolvida no con-trole motor, na cognição e na memória.

A ACh é um neurotransmissor formado na região terminal dos neurônios, cha-mada de axônio terminal (Figura 1). Ela permanece armazenada em vesículas sináp-ticas e, quando um impulso nervoso chega no axônio terminal, é liberada pelo neu-rônio para a região sináptica, onde é atraída pelos receptores colinérgicos que estão localizados no próximo neurônio. Quando a ACh interage com os receptores rege-nera o impulso nervoso no neurônio, levando assim a continuidade da transmissão.

Uma vez transmitido, o impulso nervoso é importante que o processo de intera-ção da ACh com o receptor seja interrompido, para evitar o excesso de transmissão nervosa, que pode levar a problemas de funcionamento do corpo (Patrick, 2001). O nosso organismo possui a enzi-ma AChE, que recolhe o neuro-transmissor ACh e realiza uma forte modificação na sua estru-tura molecular converto-a em colina (Ch), que é reabsorvida pelo primeiro neurônio para ser reconvertida em ACh, permitin-do assim a sua reutilização na transmissão de impulsos nervo-sos (Figura 1). A modificação da ACh é um processo de hidróli-se, como mostrado na Figura 2.

Figura. 1. Esquema do processo de transmissão e controle nervoso nas sinapses.

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5 3o Trimestre de 2011 –

Figura. 2. Hidrólise da ACh pela AChE.

A AChE possui uma alta eficiência catalítica, com capacidade de hidrolisar até 6X105 moléculas de ACh por molécula de enzima por minuto (Silman, 2005). Esta-enzima possui um sítio ativo onde existem três resíduos principais de aminoácidos, os quais estão envolvidos diretamente no processo de hidrólise da ACh, a serina número 200 (Ser200), a histidina número 440 (His440) e o ácido glutâmico número 327 (Glu327), como mostrado na Figura 4 (Sussman, 1991). No sítio ativo também existe uma região aniônica, que serve para interagir com a parte catiônica da ACh e que orienta este substrato para a posição necessária para sofrer o processo de hidrólise (Taylor, 1999).

Figura 3. Esquema simplificado do sítio ativo da AChE de T. californicum..

Além do sítio “aniônico” catalítico, existe um segundo sítio aniônico, conheci-do como sítio “aniônico” periférico (peripheral anionic site – PAS). Este sítio iden-tificado com base na ligação de compostos bis-quaternários pode estar envolvido na ação de alguns inibidores da enzima ou na inibição por excesso de substrato (Silman, 2005; Nunes-Tavares, 2002). Sendo assim, a ocupação do sítio aniônico periférico (PAS) influenciaria a conformação do sítio ativo, assim como a afinidade ou configuração dos compostos ligados ao centro ativo. Além do sítio catalítico e do PAS, existe o sítio de ligação à colina, caracterizado por possuir resíduos de tripto-fano hidrofóbicos, além de grupos aniônicos. Este sítio pode ser alvo de inibidores, que impediriam a saída do produto de reação.

A AChE está envolvida em dois grandes processos: a doença de Alzheimer (DA) e a intoxicação por compostos organofosforados (OF) empregados como agentes de guerra química.

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6 – 3o Trimestre de 2011

DOENÇA DE ALZHEIMER

A DA é um dos maiores problemas de demência que se tem conhecimento. Descoberta em 1907, pelo neuropatologista Alois Alzheimer, esta doença afeta cer-ca de 35,6 milhões de pessoas atualmente (http://www.folha.com.br/eq802930), na grande maioria, idosos. É uma afecção neurodegenerativa progressiva e irreversível, de aparecimento insidioso, que acarreta vários distúrbios cognitivos como perda de memória, linguagem, razão e habilidade de cuidar de si próprio (Smith, 1999).

A DA pode apresentar-se de forma tardia, geralmente de incidência ao redor dos 60 anos, e, também, pode se apresentar de forma precoce com a incidência ao redor dos 40 anos, que mostra uma recorrência familiar. Esta patologia pode ser dividida em quatro fases: inicial, moderada, grave e terminal. Na fase inicial a pessoa começa a perceber os primeiros sintomas como alterações de memória, personalidade e habilidades espaciais e visuais. Na fase moderada, o paciente fica incapaz de aprender e reter informações, apresenta insônia, agitação e dificuldade de falar e realizar tarefas diárias simples. Na fase grave, o paciente apresenta difi-culdade motora progressiva, dificuldade para comer, incontinência fecal e urinária. E na Fase terminal, o paciente é incapaz de andar, falar e apresenta infecções intercorrentes ficando restrito ao leito.

Ainda não se conhece a causa específica desta doença, mas estudos indi-cam que parece haver certa pré-disposição genética para sua ocorrência. Além do fator genético, outros estudos apontam como agentes etiológicos a toxicidade de agentes infecciosos, do alumínio, de espécies reativas de oxigênio (ERO) e de aminoácidos neurotóxicos (Freitas, 2001).

Geralmente, a DA dura cerca de 8 a 10 anos, desde os primeiros sintomas até a morte. As regiões do cérebro como hipocampo e córtex cerebral, que estão associadas às funções mentais como reconhecimento de estímulos sensoriais, memória e pen-samento abstrato, são as mais afetadas pelas alterações bioquímicas causadas pela DA. Uma das maiores evidências da ocorrência da doença é a deposição do peptídeo β-amilóide em placas que causam destruição de neurônios por criar um processo in-flamatório crônico nas regiões afetadas, alterar a regulação de cálcio, essencial para a condução dos estímulos nervosos, e aumentar a produção de radicais livres, tóxicos para as células nervosas (Demarin, 2011; Viegas Jr., 2004; Good, 1996).

Na doença de Alzheimer ocorre a deficiência de neurotransmissores que são responsáveis pela transmissão dos estímulos nervosos transmitidos de um neurô-nio a outro. O principal neurotransmissor é a ACh que está envolvida diretamente nos processos motores, cognitivos e de memória. A DA gera a degradação de neu-rônios diminuindo a atuação da ACh, a qual é degradada pela ação de enzimas. Apesar da DA não ter cura, existe um tratamento que tem sido bastante eficaz em diminuir os sintomas desta doença que é o uso de fármacos inibidores da AChE (anticolinesterásicos) para evitar a degradação da ACh.

Em relação à ligação que estabelecem com a AChE, os anticolinesterásicos po-dem ser classificados em reversíveis, irreversíveis e pseudo-irreversíveis. Uma das primeiras substâncias testadas foi a fisostigmina (1) (Figura 4), que é um inibidor rever-sível da AChE. Este composto apresentou uma melhora leve da memória em pacien-tes com DA mas teve seu uso restrito devido a seus efeitos colaterais (Gilman, 2005).

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Figura 4 – Fisostigmina, primeiro fármaco usado no tratamento da DA.

Atualmente apenas quatro inibidores da AChE são aprovados pela agência Food and Drug Administration (FDA) dos EUA para o tratamento da DA: donepezil (2) (Aricept®), galantamina (3) (Reminyl®), rivastigmina (4) (Exelon®) e tacrina (5) (THA, Cognex®), (Figura 5). A tacrina, entretanto, tem uso limitado devido a hepatotoxicida-de, levando os pacientes a descontinuarem o tratamento (Viegas Jr., 2004).

Pelo fato das substâncias atualmente utilizadas para reduzir os sintomas cau-sados pela DA apresentarem efeitos colaterais, mostra-se a necessidade do desen-volvimento de novos fármacos.

Figura 5 – Inibidores da AChE utilizados para o tratamento da doença da DA.

ORGANOSFOSFORADOS: INIBIDORES DA ACETILCOLINESTERASE

Os Compostos OF são ésteres ou tióis derivados do ácido fosfórico, fosfônico, fosfínico ou fosforamídico, que possuem em sua estrutura um átomo central de fós-foro pentavalente, com grupos arila ou alquila ligados diretamente a este, formando fosfinatos (6), ou através de um átomo de oxigênio ou de enxofre, formando fosfa-tos (7), fosforotioatos (8), fosfonotioatos (9) e fosfonatos (10) (Figura 6) (Domingos, 2003; Santos, 2007).

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8 – 3o Trimestre de 2011

Figura 6 – Exemplos de compostos OF neurotóxicos.

Os primeiros compostos OF foram sintetizados no final da década de 1930 por um cientista alemão chamado Gerhard Schraeder, quando este pesquisava insetici-das tendo como base uma estrutura organofosforada. Estes trabalhos deram origem a compostos mais potentes, que depois vieram a ser utilizados como armas químicas (Domingos, 2003).

Esses fosfatos orgânicos inibem a ação de várias enzimas, principalmente a AChE (Domingos, 2003). Sendo assim, a inibição da AChE gera um acúmulo de ACh, provocando um colapso do sistema nervoso central, causando perda do controle muscular, convulsões e morte por parada cardiorrespiratória. Existe uma gama de agentes neurotóxicos, dentre estes os mais conhecidos são: Tabun (11) (GA), Sarin (12) (GB), Soman (13) (GD), Ciclo-Sarin (14) (GF), e O-etil S-(2-(diisopropilamino)--etil)-metilfosfonotioato (15) (VX), sendo GA, GB, GD, GF e VX os códigos atribuídos pela OTAN para a identificação desses agentes químicos (Figura 7).

Figura 7 – Agentes neurotóxicos de guerra mais comuns.

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O processo de intoxicação por neurotóxicos ocorre no sistema nervoso central e no sistema nervoso periférico. Os OF têm grande afinidade pela enzima AChE que, uma vez inibida, não será mais capaz de hidrolisar a ACh. A inibição ocorre no interior do sítio ativo, no aminoácido serina da tríade catalítica, via uma interação com o OF. No caso da AChE humana (HuAChE), o OF liga-se covalentemente a Ser 203. Esta ligação ocorre entre o átomo de fósforo do organofosforado e o áto-mo de oxigênio da serina, com subseqüente saída do grupo -X do OF (Ordentlich, 2004), conforme mostrado no esquema mecanístico da Figura 8.

Figura 8 – Esquema geral de inibição da AChE, onde -X é o grupo de saída do agente OF.

Reativação da AChEComo discutido anteriormente, os compostos organofosforados possuem a

capacidade de inibir a AChE pelo processo de fosforilação. Quando isto ocorre, o sítio esterásico fosforilado pode sofrer regeneração hidrolítica espontânea, porém, com uma velocidade lenta ou insignificante. Em 1951, Wilson (Gilman, 2005) mos-trou que compostos contendo grupos nucleofílicos, como as oximas (RCH=NOH), hidroxilaminas (NH2OH) e ácidos hidroxâmicos (RCONH-OH), reativavam a enzima com maior rapidez que a hidrólise espontânea. Wilson (Gilman, 2005) constatou que a AChE fosforilada poderia ter a atividade esterase restaurada por substâncias que deslocassem o grupo fosforila da enzima. Esta reativação seletiva poderia ser alcançada por um composto contendo um nitrogênio quaternário e um nucleófilo, onde o nitrogênio quaternário interagisse com o sítio “aniônico” catalítico, deixando

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10 – 3o Trimestre de 2011

o nucleófilo em posição oposta ao átomo de fósforo (Musilek, 2011).Wilson e Ginsburg conseguiram esse feito com a pralidoxima, conhecida com

2-PAM (16) (Figura 9). Esta substância reativa a enzima 1 milhão de vezes mais rápido do que a hidroxilamina. Oximas bis-quaternárias também foram testadas e mostraram ser reativadoras potentes da AChE, como por exemplo a HI-6 (17). As estruturas da 2-PAM e da HI-6 são mostradas na Figura 9.

Figura 9 – Estruturas da pralidoxima e da HI-6.

Um mecanismo proposto para a reativação da acetilcolinesterase é mostrado na Figura 10 e sugere que para a reativação da enzima ser eficiente esta depende da nucleofilicidade da substância, neste caso do oximato. A oxima efetua um ataque nucleofílico sobre o átomo de fósforo, formando uma fosforiloxima (Kuka, 2006).

Figura 10 – Esquema geral de reativação da AChE por oximas.

Envelhecimento da AChE FosforiladaO “envelhecimento” da enzima fosforilada ocorre por desalquilação do grupo

fosfato e a facilidade desta reação depende da estrutura química do inibidor. Com a enzima “envelhecida” a chance de reativação por uma oxima é mínima. Na enzima envelhecida, há uma interação forte entre o resíduo de histidina protonado do sítio catalítico e o átomo de oxigênio carregado negativamente do grupo fosfato (Figura 11) (Worek, 2008).

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11 3o Trimestre de 2011 –

Figura 11 – Processo de envelhecimento da AChE fosforilada.

TratamentoOs princípios de tratamento médico para pessoas intoxicadas por OF são os

mesmos aplicados para qualquer outra substância tóxica como: não exposição ao agente tóxico, criação ou manutenção de ventilação adequada, administração de antídotos adequados e, por fim, correção de anomalias cardíacas (Marrs, 1996).

A quimioterapia utilizada para o tratamento da intoxicação com compostos OF inclui o uso de três tipos de fármacos: (1) uma substância anticolinérgica, para antagonizar os efeitos do acúmulo de ACh nos receptores colinérgicos, (2) um de-pressor do sistema nervoso central, que atua como um anticonvulsivante, e (3) uma oxima para reativar a AChE inibida (Marrs, 1996; Delfino, 2009). A atropina (17) (Figura 12), é o anticolinérgico mais utilizado pois compete com a ACh pelos receptores muscarínicos, bloqueando os efeitos do excesso de ACh. Na classe de depressores do sistema nervoso central, o diazepam (18) (Figura 12) é o mais empregado.

Figura 12 – Estruturas da atropina e do diazepam.

Até o momento, nenhuma oxima apresentou resultados satisfatórios para re-ativar a AChE inibida por todos os agentes neurotóxicos, sendo esta a principal deficiência atual deste tratamento. As principais oximas utilizadas são 2-PAM (15), trimedoxima (TMB-4) (19) e obidoxima (ou toxogonina) (20) (Musilek, 2011; Delfino, 2009), cujas estruturas são mostradas na Figura 13.

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12 – 3o Trimestre de 2011

Figura 13 – Principais oximas empregadas na atualidade como antídotos para intoxicação por OF.

Assim, a falta de um composto com largo espectro estimulou a síntese de no-vas oximas. As principais delas são as oximas de Hagedorn, que mostraram uma promissora reativação da AChE inibida pelo agente neurotóxico soman (13) (Pe-troianu, 2008). A eficiência das oximas varia de acordo com a estrutura do compos-to organofosforado e, geralmente, estas são utilizadas para a reativação da AChE considerando que a enzima fosforilada ainda não esteja “envelhecida”. Assim a efetividade do tratamento depende da administração do antídoto imediatamente após a exposição ao OF, quando a enzima fosforilada ainda não está “envelhecida”.

Existem outros tipos de tratamentos para evitar e diminuir a intoxicação por OFs. Um deles é utilizado quando há uma expectativa de exposição aos agentes neurotóxicos. Este tratamento consiste numa proteção da AChE por uma pré-expo-sição a inibidores reversíveis, os carbamatos, que se ligam a AChE, impedindo que a enzima se ligue ao OF de modo irreversível. Outro tratamento, surgido no final do século XX, consiste na utilização de enzimas (colinesterases, fosfotriesterases ou paraoxonases humanas) que degradam os organofosforados na corrente sanguínea antes que eles interajam com a AChE, os chamados “scavengers’’ (Kuka, 2009). CONCLUSÃO

A doença de Alzheimer é um dos principais problemas de demência e afeta milhões de pessoas em todo o mundo. As substâncias atualmente utilizadas para reduzir os sintomas causados pela DA apresentam altos efeitos colaterais, eviden-ciando, assim, a necessidade do desenvolvimento de novos anticolinesterásicos. Em relação aos compostos OF, existem vários métodos para o tratamento de into-xicação, mas nenhum deles é eficaz contra todos os agentes neurotóxicos conhe-cidos e contra todos os seus efeitos. Também, até o momento, não foi reportada nenhuma oxima que seja efetiva contra todos os OFs. Isto demonstra a necessi-dade do desenvolvimento de novos candidatos a fármacos, que sejam potentes e eficientes contra todos os OFs e com baixo perfil de toxicidade.

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13 3o Trimestre de 2011 –

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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14 – 3o Trimestre de 2011

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15 3o Trimestre de 2011 –

André Luís de Vasconcelos Cardosoa, João Marques Morais Mattosa, Júlio César José Ro-drigues Júniora, Iaci Miranda Pereiraa*

aCentro Tecnológico do Exército – CTEx, Divisão Bélica – Laboratório de MateriaisAv. das Américas, 28705 – Guaratiba – 23020-470 – Rio de Janeiro – RJ * [email protected]

ENVELHECIMENTO DAS FIBRAS DE ARAMIDA UTILIZADA EM COLETES BALÍSTICOS NÍVEL – III

ABSTRACT

Personal body armors is an apparatus designed to ballistic protection of the front and the back of the thorax, upper abdomen and the back through a vest con-sisting of ballistic resistant materials, usually enclosed in a nonremovable cover. Typically, the ballistic panels are produced with fibers of: aramid, polyethylene and high strength polymers. The ballistic protection is established considering the bul-let characteristics: the composition, shape, mass, and caliber. In addition, during the vest design phase, the angle of incidence and impact velocity of the projectile should be oversee. Ordinarily, the type IIIA armor is suitable for routine wear, ho-wever, weather conditions, ultraviolet radiation, and sweat may reduce the panels performance. Therefore, the present study aims to verify the degradation of fibers employed in 7 years old personal body armors type IIIA by using infrared spectros-copy, scanning electronic microscopy and thermal analysis.

Keywords: aramid, degradation, personal body armors and FTIR

RESUMO

O Colete de Proteção Balística, nível de proteção IIIA, é um aparato destina-do a fornecer proteção a área frontal, dorsal, e lateral do combatente por meio de painéis balísticos, placas balísticas e uma capa em tecido resistente destinada a acomodar os painéis e as placas. Tipicamente, os painéis balísticos são confeccio-nados com fibras de aramida, polietileno e polímeros de alta resistência. A proteção balística é estabelecida considerando as características do projétil: a composi-ção, a forma, a massa, e o calibre. Ademais, durante a fase de design do colete, o ângulo de incidência e a velocidade de impacto do projétil devem ser previstos. Frequentemente, a blindagem tipo IIIA é apropriada para o desgaste de rotina, no entanto, as condições climáticas, a radiação ultravioleta, a umidade e o suor podem reduzir o desempenho dos painéis. Assim, o presente estudo tem como objetivo verificar a degradação morfológica das fibras empregadas em coletes tipo IIIA de 7 anos de idade utilizando espectroscopia de infravermelho, microscopia eletrônica de varredura e análise térmica.

Palavra-chave: aramida, degradação, colete de proteção balística e FTIR

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16 – 3o Trimestre de 2011

INTRODUÇÃO

O colete de proteção balística ou colete à prova de balas é um aparato desti-nado a oferecer proteção a área frontal, dorsal, e lateral do combatente utilizando painéis balísticos, placas balísticas e uma capa em tecido resistente (Norma Exér-cito Brasileiro). Os materiais que constituem os painéis balístico determinam o nível de proteção do colete. Estes são planejados conforme a ameaça balística que de-vem suportar considerando, entre outras coisas, a composição, a forma, o calibre, a massa, o ângulo de incidência e a velocidade de impacto dos projéteis. Para o Exército Brasileiro, diversas normas regulam a: avaliação técnica, fabricação, aqui-sição, importação e destruição dos coletes balísticos empregados pelo combaten-te. Essas normas especificam os requisitos técnicos e detalham a metodologia dos ensaios de verificação da resistência do colete quanto a penetração de projéteis de armamentos leves.

Tipicamente, as placas balísticas dos coletes utilizados são produzidas com fibras de aramida ou fibras de polietileno de ultra alto peso molecular - PEUAPM. A aramida é uma fibra sintética baseada em uma poliamida de cadeia longa com pelo menos 85% das amidas ligadas a 2 anéis aromáticos. A orientação das cadeias e as ligações químicas secundárias produz um material muito resistente e leve que encontra emprego em diversas aplicações: pastilha de freio, tecidos para proteção em altas temperaturas, substituição de asbestos, cabos e cordas, tecidos para pro-teção balística, etc. Apesar das propriedades notáveis, os compostos de aramida estão sujeitos a degradação devido a ação química, luz ultravioleta e umidade. Assim, o envelhecimento dos coletes balísticos deve ser considerado durante o pla-nejamento do seu ciclo de aquisição. Contudo, não existem estudos e/ou pareceres técnicos de domínio público que atestem e caracterizem o final da vida do material.

No presente trabalho, tem-se por objetivo verificar o estado de degradação da fibra de aramida dos Colete de Proteção à Prova de Bala tipo IIIA utilizados pelo Exército Brasileiro.

EXPERIMENTAL

Os coletes estudados foram recolhidos no 1º Depósito de Suprimentos do Comando Militar do Leste – Rio de Janeiro. Estes foram separado nas suas partes diversas: capa, forro e placas balísticas. No caso dos coletes estudados, a placa balística anterior constituía-se de uma placa rígida de PEUAPM. A placa posterior constituía-se, entretanto, de um compósito de aramida formado por prepregs da fibra. O forro que revestia as placas balísticas foi produzido por lâminas flexíveis de PEUAPM e lâminas de polibenzoxazolos. Finalmente, o revestimento externo do colete, a capa, era formado por um tecido de poliamida sintética. Como os materiais mais suscetível a degradação são as fibras de aramida presente nos forros dos coletes, o estudo foi direcionando à este material.

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17 3o Trimestre de 2011 –

Microscopia Eletrônica de Varredura: A superfície das amostras foi investigada por microscopia eletrônica de varredura sem recobrimento das amostras. Os experimentos foram realizados em um equipamento Zeiss, modelo EVO-10.

Ensaio Termogravimétrico: A termogravimetria foi realizada em uma termobalança modelo TGA 50H da

Shimadzu em atmosfera de nitrogênio com vazão de 50 mL min-1. Foram utilizados pequenos pedaços dos filmes com cerca de 7 mg. O aquecimento foi efetuado a uma razão de 5oC min-1 a partir da temperatura ambiente até 700oC.

Espectroscopia de infravermelho por transformada de FourierAs análises por espectroscopia de infravermelho por transformada de Fourier

(FTIR) foram realizadas em um espectrofotômetro NICOLET, modelo 6700. Os es-pectros dos filmes foram obtidos utilizando pastilhas de KBr. Todos os espectros foram obtidos em atmosfera de nitrogênio, a partir de 128 varreduras com uma resolução de 4 cm-1.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Fig. 1, ilustra o aspecto visual do colete de proteção balística estudados.

Foi observado que a integridade física dos coletes estudados não comprome-teu-se devido a degradação da capa ou das costuras que possuíam aspecto visual razoável. Entretanto, as placas balísticas e o forro, responsáveis pela proteção balística do colete, estavam em estado precário de conservação. O exame visual evidenciou que as placas balísticas anteriores apresentaram acentuada delamina-ção ou descolagem. Delaminações ou descolagens são ocorrências indesejáveis em materiais compósitos (Mallick, 1997), uma vez que atuam como elementos mo-dificadores das propriedades originais do sistema como um todo. A microscopia eletrônica de varredura foi utilizada para avaliar superfície do filamento da fibra de aramida dos coletes em estudo. Para efeito comparativo, um filamento de material não degradado foi utilizado como referência. A Fig. 2a refere-se a um conjunto de

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filamentos de uma amostra de referência, com fibrilas unidas e alinhadas. A Fig. 2b ilustra um conjunto filamentos de aramida obtidos do material degradado em estudo. É possível observar, na Fig. 2b, fibras com diversas fibrilas soltas e emara-nhadas, o que provavelmente é consequência do processo de envelhecimento do material.

Figura 2 – Micrografias das fibras de aramida: (a) amostra de referência, (b) feixe pertencente aos coletes estudados

Pode-se verificar nos espectros da Fig. 3 as bandas características dos com-postos da fibra de aramida.

Figura 3 – Análise de FTIR do fio de aramida degradado

Entretanto, sinais de degradação são visíveis no espectro. A diminuição do pico típico dos compostos de PPTA em ~3322 cm-1, amida A (N-H ligado por inte-ração de hidrogênio quando C=O e NH are em configuração trans), sugere a pre-sença de umidade (Chatzi, 1986; Xiaoyan, 2011; Chin, 2009). A banda larga entre 3600cm-1 e 3000 cm-1 sugere acoplamento da banda da amida com a banda da água absorvida e fracamente ligada. Contudo, o acoplamento da banda também pode ser consequência da técnica utilizada para preparação da amostra. Para tra-balhos futuros, pode ser necessário minimizar e padronizar a utilização de KBr. O aumento da intensidade do pico da amida I (Chatzi, 1986; Xiaoyan, 2011; Chin,

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19 3o Trimestre de 2011 –

2009), 1640 cm-1, e seu deslocamento para comprimento de onda inferiores pode ser o resultado da interrupção das interações de hidrogênio entre o grupamento CO e NH promovido pela cissão das cadeias e a oxidação pela radiação UV (Chatzi, 1986; Xiaoyan, 2011; Chin, 2009). A radiação UV também é responsável pelo au-mento da intensidade do pico de amida II, 1540 cm-1, e amida III, 1319 cm-1, devido a quebra das ligações C-N (Chatzi, 1986; Xiaoyan, 2011; Chin, 2009). O pico pre-sente em 1420 cm-1 evidência a hidrólise da cadeia principal de amida para amina e ácido carboxílico (Zhang, 2006).

A Fig. 4 apresenta a curva termogravimétrica do material estudado. Conside-rando eventos térmicos de decomposição (temperatura inicial, a metade da tempe-ratura de decomposição, e a temperatura final) observados na Fig. 3 e utilizando dados de literatura, verifica-se redução da temperatura inicial de decomposição em mais de 50oC (Cai, 2010), sugerindo que esta amostra é termicamente mais instá-vel que a amostra de referência. A Tab. 1 mostra os resultados obtidos na literatura (Chin, 2009).

Figura 4: Termogramas das amostras de aramida dos coletes estudados.

Tabela 1 – Temperaturas características de fibras de alto desempenho (Chin, 2009)

Temperatura (oC) Kevlar® 49 Kevlar 129® Nomex®

Temperatura inicial 548,1 542,4 423,7

Metade da temperatura de decomposição 592,7 598,6 632,24

Temperatura final 643,7 660,4 784,2

A diminuição da estabilidade térmica observada na Figura. 4 pode ser efeito direto da degradação estrutural da fibra discutidos e apontados nas análises de FTIR. Os processos químicos que promovem a cissão de ligações e a interrupção

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de interações químicas diminuem a estabilidade da cadeia diminuindo o valor da temperatura inicial de decomposição.

CONCLUSÕES

Conclui-se que as fibras poliméricas das placas balísticas dos coletes de pro-teção, nível de proteção IIIA, apresentam evidência de degradação química após 7 anos de uso. A constatação de quebra e oxidação das ligações sugere o com-prometimento das propriedades balísticas. Porque a proteção balística oferecida pelos coletes é planejada por meio das propriedades mecânicas e morfológicas dos materiais que compõe os coletes, os equipamentos com mais de 7 anos de uso são inadequados para operações em condições reais.

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24 – 3o Trimestre de 2011

LACTATO DESIDROGENASE COMO ALVO MOLECULAR PARA QUIMIOTERAPIA ANTIMALARIAL

Aline Alves Oliveiraa, Tanos Celmar Costa Françaa*

aSeção de Engenharia Química – Instituto Militar de Engenharia; Praça General Tibúrcio, 80, 22290-270, Rio de Janeiro/RJ, Brasil.* [email protected]

ABSTRACT

Malaria is a disease that affects millions of people worldwide every year. The Brazilian Army also suffers the consequences of this disease; the main responsible for causalities in the Amazon region. Although there are many drugs to treat mala-ria, the emergence of resistant strains of its causative agent (protozoa of the genus Plasmodium) have pointed to the need for planning new drugs against new molecu-lar targets. Within this context, the enzyme lactate dehydrogenase has been shown to be a promising target for antimalarial chemotherapy.

Keywords: malaria, Plasmodium falciparum, lactate dehydrogenase

RESUMO

A malária é uma doença que atinge milhões de pessoas no mundo a cada ano e o Exército Brasileiro também sofre as consequências dessa doença que é a principal responsável pelas baixas na região Amazônica. Embora existam muitos fármacos para o tratamento de malária, o surgimento de cepas resistentes dos seus agentes causadores (protozoários do gênero Plasmodium) tem apontado para a necessidade de planejar fármacos contra novos alvos moleculares. Dentro desse contexto, a enzima lactato desidrogenase tem se mostrado um alvo promissor para a quimioterapia antimalarial.

Palavras-chave: malária, Plasmodium falciparum, lactato desidrogenase.

INTRODUÇÃO

A malária é uma doença presente em quase todas as regiões tropicais e sub-tropicais do mundo, sendo considerada um grave problema de saúde pública. Em função de políticas cada vez mais eficientes de controle de vetores, diagnóstico e tratamento de pacientes, observou-se nos últimos anos uma redução no número de casos da doença. A Figura 1 traz os dados mais atuais do número de casos de malária disponibilizados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) que foram

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25 3o Trimestre de 2011 –

publicados no ano de 2011, fazendo referência à situação global no ano de 2010.Embora a campanha de erradicação patrocinada pela OMS, a partir de 1960,

tenha sido um importante marco no combate a malária (Barata, 1995), ainda são necessários muitos investimentos e pesquisas na área, pois ainda foram estima-dos 216 milhões de casos para o ano de 2010 resultando em 655 mil mortes. O maior número de registros da doença ocorre no continente africano onde as mortes estimadas representam 91% do total mundial (WHO, 2011). Além disso, na África Subsaariana, a malária é a principal responsável pela morte de crianças menores de cinco anos (WHO, 2010b).

A OMS estima ainda que em 2010 cerca de 335 mil brasileiros foram infecta-dos pela malária. Os casos registrados são, quase exclusivamente, na região Ama-zônica onde uma série de fatores como baixa densidade demográfica, dispersão populacional e tipo de habitação favorecem a transmissão da doença e prejudicam o uso de procedimentos de controle (Barata, 1995). Para o Exército Brasileiro a ma-lária causa grande preocupação em função das atividades desenvolvidas na região Amazônica, uma vez que a doença é responsável por um número considerável de baixas em hospitais e afastamentos para tratamento de saúde. Por isso a malária é um grande obstáculo para qualquer atividade que as forças armadas pretendam desenvolver naquela região (França, 2008).

Figura 1 – Estimativa do número de casos de malária no mundo entre os anos 2000-2010, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (WHO, 2011).

No combate à malária há duas estratégias de ação: prevenção e controle de casos. Para o tratamento são usados medicamentos e também transfusões sanguí-neas (Enayati e Hemingway, 2010). A prevenção da doença envolve desde o con-trole do vetor através do emprego de inseticidas como o DDT, amplamente utilizado durante a Segunda Guerra Mundial, até o uso de medicamentos profiláticos ou vacinas (Enayati e Hemingway, 2010; França, 2008). Atualmente não há nenhuma vacina autorizada para doenças parasitárias como a malária, mas existem estudos para o planejamento de vacinas que têm como alvo um só estágio do ciclo de vida do parasita ou mesmo fases iniciais desse ciclo no hospedeiro humano. A vacina mais efetiva testada atualmente é a RTS,S, um híbrido de partículas de proteína as-sociado a imunoestimulantes, cujo mecanismo de proteção ainda é desconhecido (Hill, 2011; Cohen, 2010; Good e Doolan, 2010).

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26 – 3o Trimestre de 2011

ASPECTOS CLÍNICOS DA MALÁRIA

Os principais sintomas da malária são febre intermitente, dores no corpo, dor de cabeça, anemia, icterícia e inchaço do fígado e baço. O sistema nervoso cen-tral também pode ser comprometido quando o paciente apresenta malária cerebral (França, 2008).

A malária é causada pelo parasita do gênero Plasmodium, transmitido ao ho-mem através da picada da fêmea do mosquito do gênero Anopheles. Há diferen-tes espécies de Plasmodium, entretanto são cinco as principais responsáveis pela transmissão da doença ao hospedeiro humano: P. falciparum, P. vivax, P. malariae, P. ovale, e a espécie P. knowlesi, identificada recentemente (Cox-Singh, 2008; Sin-gh, 2004). O P. falciparum é a espécie que provoca a forma fatal da doença, a ma-lária cerebral, e é responsável pela maioria das mortes. Por isso, a malária cerebral tem sido o principal foco das pesquisas para a prevenção e tratamento. Já as espé-cies P. vivax e P. ovale podem provocar relapsos clínicos em intervalos regulares, pois o parasita pode permanecer no fígado por anos (Wiesner, 2003).

CICLO DE VIDA DO PLASMODIUM

O Plasmodium necessita de dois hospedeiros para completar seu ciclo de vida, um vertebrado e outro invertebrado. A infecção de um hospedeiro vertebrado, como o homem, acontece quando este é picado pelo mosquito infectado. Nesse momento acontece uma injeção de esporozoítos na corrente sanguínea que, em seguida, são levados para órgãos e tecidos do corpo. No fígado os esporozoítos iniciam a reprodução assexuada produzindo dezenas de milhares de merozoítos. Estes, por sua vez, são liberados das células hepáticas, caem na circulação sanguí-nea e invadem os eritrócitos dando origem aos esquizontes (eritrócitos infectados). Dentro de cada eritrócito também ocorre a reprodução assexuada produzindo mais merozoítos, que são liberados quando os eritrócitos se rompem. O estado febril da malária caracteriza esse momento de ruptura sincronizada dos eritrócitos infecta-dos. Alguns merozoítos continuam a invadir novamente os eritrócitos, mas outros podem se diferenciar em gametócitos (estágios sexuais). Quando outro mosquito pica o homem e ingere os gametócitos, um ciclo sexual se inicia. No estômago do mosquito os gametócitos se transformam em gametas que se fundem para formar o zigoto. Cada zigoto se transforma em um oocisto. Divisões assexuais nos oocistos produzem centenas de esporozoítos, que são liberados quando o oocisto se rom-pe, e migram para as glândulas salivares do Anopheles, completando assim o ciclo de vida do Plasmodium (Sherman, 1979; Wiesner, 2003).

QUIMIOTERAPIAS PARA O TRATAMENTO DA MALÁRIA

Vários estudos foram desenvolvidos ao longo dos anos na tentativa de propor fármacos cada vez mais eficientes no combate à malária. Os primeiros registros indicam a utilização de cascas da árvore Cinchona calisaya para o tratamento da febre desde o início do século XVII. Somente em 1820 seu ingrediente ativo, a

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quinina (Figura 2), foi isolado e tornou-se um dos primeiros compostos químicos puros usados para tratar uma doença. O composto azul de metileno foi utilizado em 1891 também para tratar a malária, sendo o primeiro fármaco sintético usado em humanos. Modificações estruturais nesses compostos permitiram a síntese de outras moléculas quinolínicas com potencial antimalarial como a pamaquina e a mepacrina (Figura 2) nos anos de 1925 e 1932, respectivamente (Meshnick e Do-bson, 2001).

A cloroquina (Figura 2), sintetizada em 1934 e liberada em 1946, é um dos fármacos mais utilizados no tratamento da malária em função da sua eficácia, fácil administração e baixa toxicidade. A partir da cloroquina, foram desenvolvidos aril amino álcoois, principalmente para a utilização na Guerra do Vietnã, como a meflo-quina e a halofantrina (Figura 2). A utilização da cloroquina como medida profilática ao ser adicionada ao sal em regiões da América do Sul, África e Ásia, provavelmen-te induziu o surgimento dos primeiros casos de resistência ao fármaco no final de década de 1950. Hoje são vários os registros de cepas de Plasmodium resistentes aos compostos quinolínicos em diversas regiões do mundo (Nosten, 1991; Ter Kui-le, 1992; Wellems, 2002).

Figura 2 – Principais antimalariais quinolínicos e aril amino álcoois já desenvolvidos.

Acredita-se que os fármacos quinolínicos são capazes de impedir o mecanis-mo de polimerização do grupo heme a partir da degradação da hemoglobina. Para obter energia necessária a sua sobrevivência, o parasita ingere a hemoglobina do hospedeiro e a transporta para seu vacúolo digestivo. A hemoglobina é então degra-dada em pequenos peptídeos e o grupo heme é liberado. Entretanto, o grupo heme e a hematina, em equilíbrio com sua forma dimérica, são tóxicos para o parasita e podem destruir membranas ou mesmo inibir enzimas (Dorn, 1998). Para contornar esse problema, o Plasmodium converte a hematina à hemozoína, um polímero não

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tóxico. Para formar a hemozoína, o íon férrico central de um grupo heme se liga a um átomo de oxigênio do grupo carboxilato lateral do grupo heme seguinte. Essa ligação se repete entre os grupos heme, formando assim o polímero (Slater, 1991). Como resultado, a hemozoína se acumula nos eritrócitos e ao ser liberada causa a febre (Miller, 1994). O papel dos fármacos quinolínicos é justamente impedir que ocorra essa detoxificação do grupo heme e, consequentemente, impedir a produ-ção de hemozoína (Chou e Fitch, 1993).

Inibidores do ciclo do folato também foram planejados para o tratamento da malária, uma vez que inibindo as enzimas que participam desse ciclo, a produção de material genético do parasita é afetada. A pirimetamina e o proguanil são inibido-res conhecidos da enzima dihidrofolato redutase (DHFR) enquanto que a sulfado-xina é capaz de inibir a dihidropteroato sintase (Nzila, 2000) (Figura 3). Entretanto, há muitos registros de resistência a essa classe de antimalariais (Costanzo e Hartl, 2011; Sibley, 2001).

Figura 3 – Inibidores do ciclo do folato utilizados como antimalariais.

A artemisinina, ingrediente ativo da planta Artemisia annua, foi isolada em 1972, apresentando também potente atividade antimalarial ao agir no mecanismo de detoxificação do grupo heme. A partir da artemisinina, uma nova classe de com-postos foi planejada para utilização no tratamento da malária. Dentre os derivados da artemisinina destacam-se dihidroartemisinina, artesunato e artemeter (Figura 4) (Klayman, 1985). O uso desses medicamentos de forma isolada, ou mesmo em combinação com outras classes de antimalariais, também induz o surgimento de resistência e consequente diminuição de sua eficácia em várias regiões do mundo (Dondorp, 2009; Rogers, 2009).

Figura 4 – Artemisinina e seus derivados aplicados na quimioterapia antimalarial.

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A fim de evitar o surgimento de resistência, algumas combinações de fár-macos substituem a monoterapia. A OMS estimula atualmente o uso de terapias combinadas baseadas na artemisinina (ACTs, do inglês artemisinin-based combi-nation therapies) para o tratamento de casos confirmados da malária causada pelo P. falciparum. Para o tratamento da malária causada pelo P. vivax recomenda-se o tratamento com cloroquina nas regiões onde não há resistência a esse fármaco (WHO, 2010a; WHO, 2010c).

Novos fármacos antimalariais foram propostos e muitos estão nas fases de testes de desenvolvimento clínico e pré-clínico. Alguns dos novos fármacos têm alvos diferentes dos já conhecidos. Essa estratégia permite superar o problema da resistência, além de permitir a busca por um novo antimalarial que seja mais eficaz e seletivo. A fosmidomicina, por exemplo, é um inibidor da enzima 1-deoxi-D--xilulose 5-fosfato (DOXP), uma redutoisomerase envolvida na biossíntese de iso-prenóides (Jomaa, 1999). Proteases como a plasmepsina II também são estudadas no planejamento de antimalariais (Carcache, 2002; Haque, 1999; Mckay, 2011). Outras enzimas envolvidas nas sínteses de ácidos graxos, de lipídeos de membra-na ou mesmo aquelas envolvidas na glicólise, são também alvos propostos para o desenvolvimento de inibidores que possam se tornar potentes fármacos para o tratamento da malária (Waller, 1998; Surolia, 2001; Wengelnik, 2002; Razakantoa-nina, 2000; Cameron, 2004; Choi, 2007a; Choi, 2007b).

A LACTATO DESIDROGENASE

Diversos organismos vivos, como o ser humano, utilizam a via glicolítica para a obtenção de energia. Nessa via, após várias reações catalisadas por enzimas, uma molécula de glicose é degradada dando origem a duas moléculas de piruvato. Durante esse processo, parte da energia livre oriunda da glicose é conservada na forma de ATP e NADH (Lehninger, 2006).

O piruvato produzido pela via glicolítica pode ter diferentes destinos. Em con-dições aeróbicas, ele é oxidado ao grupo acetila da acetil-coenzima A, que poste-riormente será totalmente oxidada a CO2 através do ciclo de Krebs. Em processos anaeróbicos o piruvato pode ser convertido em etanol (fermentação alcoólica) ou em lactato (fermentação lática). A produção de lactato a partir de piruvato envolve a conversão de NADH em NAD+ (Figura 5) e é catalisada pela enzima lactato desi-drogenase (LDH) (EC 1.1.1.27) (Lehninger, 2006).

Figura 5 – Reação catalisada pela enzima LDH.

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Nos mamíferos, a LDH pode ser expressa em diferentes isoformas. As isofor-mas majoritárias encontradas no Homo sapiens envolvem a forma M, encontrada principalmente em músculos esqueléticos e no fígado, e a forma H, característica do músculo cardíaco. As isoformas M e H são codificadas por genes diferentes, A e B, respectivamente. Essas isoformas são geralmente encontradas no citosol de células somáticas, mas podem ocorrer também nas mitocôndrias. Uma isoforma menos frequente, a forma X encontrada no esperma, também foi identificada. As isoformas independentes M e H podem se combinar de formas distintas para for-mar tetrâmeros (H4, MH3, M2H2, M3H e M4) (Granchi, 2010; Read, 2001).

Um estudo da LDH humana (HssLDH) desenvolvido por Read e colabora-dores (2001) mostra que as isoformas M e H, com 75% de identidade sequencial, apresentam atividades diferentes, mas as regiões do sítio ativo e a associação de subunidades são indistinguíveis. A partir de cálculos de potencial eletrostático, as diferenças nas atividades de cada isoforma puderam ser explicadas pelas varia-ções dos resíduos da superfície periférica do sítio ativo.

Há diversas estruturas cristalográficas de LDH depositadas no Protein Data Bank (PDB) (Berman, 2000) como a de Homo sapiens sapiens (Read, 2001), a de P. falciparum (Dunn, 1996), a de Bacillus steareothermophilus (Piontek, 1990) e de Squalus acanthius (White, 1976). Geralmente essas enzimas formam uma estrutu-ra com dois domínios. O maior deles compreende um motivo estrutural característi-co de proteínas que se ligam a nucleotídeos, denominado Rossmann fold (resíduos 20-162 e 248-266). Esse motivo estrutural compreende o sítio de ligação do cofator NADH e envolve a repetição de uma sequência de folhas β e α-hélices, dispostas na seguinte ordem: β-α-β-α-β (Bellamacina, 1996; Rao e Rossmann, 1973). O outro domínio presente na LDH envolve o sítio de ligação do substrato e compreende os resíduos de aminoácidos 163-247 e 267-331. Os resíduos de 1-20 apresentam uma conformação estendida e se dobram sobre outra unidade do tetrâmero (Read, 2001).

O processo de catálise da LDH envolve primeiramente a ligação do cofator seguida pelo substrato através de um processo ordenado. Em seguida, ocorre o fechamento do sítio ativo através de um loop (resíduos 99 a 110). Entretanto, para que o substrato se ligue, é necessário que o resíduo catalítico His195 esteja em seu estado protonado (Shoemark, 2007). A protonação da His195 ocorre em função do resíduo Asp168, formando a díade catalítica. Este interage com a His195 estabele-cendo uma forma protonada do anel imidazol por meio de uma ligação hidrogênio entre o grupo carboxila do Asp168 e o anel imidazol da His195. A catálise enzimáti-ca envolve uma reação de transferência de hidreto na qual o estado de transição é estabilizado pela Arg109. Outro resíduo catalítico, a Arg171, é responsável por fixar o substrato através de duas fortes interações entre sua cadeia lateral e o grupo car-boxilato do piruvato. A Ile250 também é importante, pois sua cadeia lateral cria um ambiente apropriado para acomodar o anel nicotinamida do NADH (Granchi, 2010). Além disso, contatos entre o substrato e os resíduos 101-103 do loop são determi-nantes na especificidade da enzima (Shoemark, 2007; Dunn, 1991; Dafforn, 1997).

Além de ser um alvo para a quimioterapia do câncer, a LDH tem se mostrado ainda um interessante alvo para o tratamento da malária (Dunn, 1996; Granchi, 2010). Durante o seu ciclo assexuado, no interior do eritrócito, o Plasmodium de-pende da glicólise anaeróbica para a síntese de ATP e consequente geração de

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energia (Vander Jagt, 1990). Logo, a interrupção da atividade da LDH impede uma das principais vias pelas quais o parasita produz energia, levando-o a morte. Além da LDH, qualquer enzima da via glicolítica representa um potencial alvo para o de-senvolvimento de fármacos (Brown, 2004).

As enzimas LDH dos diferentes parasitas que causam a malária, P. vivax, P. ovale e P. malariae, apresentam de 90 a 92% de identidade com a LDH de P. falciparum (PfLDH), sendo que os resíduos catalíticos são idênticos. Estudos por modelagem molecular mostram que inibidores do sítio do cofator apresentam orientações similares nas LDH de todas as quatro espécies. Entretanto, há notável variação nas propriedades cinéticas, como valores da constante de Michaelis para o piruvato, lactato, NADH e NAD+, bem como diferentes constantes de dissociação dos inibidores (Brown, 2004).

Importantes diferenças entre a PfLDH e a HssLDH contribuem para que a PfL-DH seja vista como um potencial alvo para o tratamento da malária (Dunn, 1996). Além disso, a PfLDH apresenta ainda características capazes de diferenciá-la das LDHs de outros organismos. Uma dessas diferenças está relacionada à inibição da enzima por excesso de substrato. Em quase todas as LDHs o excesso de substra-to (piruvato) ou o complexo piruvato-NAD+ inibem a atividade enzimática. Porém, essa inibição não é observada para a PfLDH, provavelmente em função do deslo-camento de 1,2 Å na posição do cofator em relação as LDHs de diferentes mamífe-ros (Dunn, 1996; Vander Jagt, 1981; Read, 1999). Essa característica da PfLDH é função de uma adaptação do parasita para sobreviver nas condições anaeróbicas predominantes nos eritrócitos (Read, 1999).

Estudos mostram também outra característica interessante da PfLDH segun-do a qual a enzima é muito mais ativa com o 3-acetilpiridina adenina dinucleotídeo (APADH), substância análoga ao cofator NADH, onde a carboxiamida da nicoti-namida é substituída por um grupo metila (Figura 6) (Brown, 2004; Berwal, 2008). Esse fato permite que a enzima seja utilizada em testes de parasitemia (Brown, 2004; Makler e Hinrichs, 1993; Makler, 1993).

Figura 6 – Representação estrutural do NADH e do APADH.

A PfLDH apresenta ainda outras características que a tornam um interessante alvo no planejamento de novos fármacos seletivos. Há cinco resíduos (DKEWN) a mais no loop do sítio ativo da PfLDH em relação a HssLDH, ampliando a cavidade

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da região catalítica (Brown, 2004). Os resíduos adicionais do loop do sítio ativo da PfLDH são responsáveis por conferir uma maior especificidade do substrato em comparação com as isoformas da HssLDH (Shoemark, 2007). Um loop maior na PfLDH traz como consequência o deslocamento do anel da nicotinamida do cofator acarretando no aumento do volume do sítio ativo da PfLDH (Dunn, 1996; Read, 1999). Além disso, o resíduo Ser161 presente no sítio ativo, encontrado em todas as outras estruturas de LDH, é substituído pela Leu163 na PfLDH. A Ser161 é responsável por interagir com a porção carboxiamida do anel da nicotinamida do NADH através de uma molécula de água. Na PfLDH essa ligação não ocorre pois há substituição pela Leu163, provocando redução da inibição por excesso de substrato na enzima plasmodial (Dunn, 1996; Sessions, 1997). Os resíduos Thr248 e Ile252 também tem correspondentes diferentes na PfLDH, eles são substituídos por resíduos de prolina. Entretanto, os resíduos Arg109, Asp168, Arg171 e His195 da PfLDH, fundamentais para a catálise enzimática, são mantidos em todas as ou-tras LDH (Dunn, 1996; Brown, 2004).

INIBIÇÃO DA PFLDH

Há três formas diferentes de inibir a PfLDH dependendo da região onde o inibidor se liga: no sítio de ligação do piruvato, na região do sítio de ligação entre piruvato e cofator ou no sítio de ligação da adenina do NADH (Conners, 2005). Portanto, existem classes distintas de inibidores de PfLDH. O gossipol e seus deri-vados, por exemplo, se ligam na região entre a nicotinamida do cofator e o piruvato enquanto que os ácidos oxâmicos se ligam no sítio do piruvato (Choi, 2007a; Choi, 2007b; Conners, 2005; Sessions, 1997).

O gossipol, um aldeído polifenólico, é um produto natural extraído de semen-tes de algodão e é capaz de inibir de forma não seletiva a LDH por competição com o cofator (Brown, 2004; Yu, 2001). O gossipol tem duas formas opticamente ativas geradas pelo atropoisomerismo. Esse tipo de estereoisomerismo é característico de sistemas onde há uma ligação simples cuja rotação é impedida em função de uma barreira energética suficientemente elevada. O atropoisomerismo do gossipol acontece em função da restrição rotacional em torno da ligação entre os dois carbo-nos do sistema binaftila, dando origem a duas formas opticamente ativas: (aS)-(+) e (aR)-(-) (Figura 7) (Santos, 2007). Shelley e colaboradores (1999) demonstraram que o enantiômero aR apresenta maior atividade antitumoral em comparação ao enantiômero aS e à mistura racêmica.

Figura 7 – Representação estrutural dos atropoisômeros do gossipol. À esquerda, o enantiômero aS e à direita o enantiômero aR.

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O gossipol apresenta atividade biológica para diferentes fins como contra-ceptivo (Wu, 1989), anti-viral (Radloff, 1986; Royer, 1991) e antimalarial (Heidrich, 1983; Vander Jagt, 1984). Porém, apresenta alta toxicidade, provavelmente em função dos grupos aldeídos presentes em sua estrutura. Diversos derivados do gossipol são sintetizados na busca por compostos com menor toxicidade e maior atividade biológica que possam ser utilizados como antimalariais (Deck, 1998; Ra-zakantoanina, 2000; Vander Jagt, 1984; Yu, 2001).

Outra classe de inibidores de PfLDH, capazes de competir pela região de ligação do substrato enzimático, foi desenvolvida com base em compostos azóis. Alguns compostos dessa classe, além de propriedades inibitórias para a PfLDH, apresentam também seletividade para essa enzima. Quatro compostos utilizados para o desenvolvimento de outros inibidores, possuem uma porção farmacofórica comum, tendo um grupo hidroxila na posição 3 do anel azol e um grupo carboxi-la na posição 4 (Figura 8). As estruturas primárias dos compostos baseados em azóis incluem 1,2/1,5-isoxazóis (X = N, Z = CH e Y = O e X = CH, Z = N e Y = O), 1,2,5-oxadiazóis (Y = Z = N e Y = O), 1,2,5-tiodiazóis (Y = Z = N e Y = S) e triazóis (X = Y = Z = N) (Cameron , 2004).

Figura 8 – Representação estrutural geral de compostos baseados em azóis.

O ácido oxâmico (Figura 9) e seus derivados constituem outra classe de po-tenciais antimalariais. O ácido oxâmico é um análogo do piruvato e compete pelo sítio de ligação deste. Por apresentar atividade antimalarial, além da seletivida-de em comparação à HssLDH, vários derivados N-substituídos foram sintetizados (Choi, 2007a; Choi, 2007b; Yu, 2001).

Figura 9 – Representação estrutural do ácido oxâmico.

Choi e colaboradores (2007b) propuseram uma nova classe de derivados do ácido oxâmico que possuem em sua estrutura o grupo cromeno. Essa estrutura per-mite que os compostos assumam conformações similares ao NADH no sítio ativo da LDH, competindo também pela região de ligação do substrato. Além de apresentar facilidade sintética, o grupo cromeno é capaz de interagir com a região da enzima na qual o grupo difosfato do NADH interage. Os inibidores desenvolvidos apresen-taram atividade antimalarial, além de seletividade em relação à HssLDH. Apresenta-ram também atividade para a malato desidrogenase do P. falciparum (PfMDH) (EC 1.1.1.37), uma enzima capaz de catalisar a mesma reação da PfLDH quando esta

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tem sua atividade reduzida. Em função de todas essas características, os deriva-dos do ácido oxâmico que contém o grupo cromeno têm se mostrado muito promis-sores para o planejamento de novos antimalariais.

ESTUDOS DA LDH POR MODELAGEM MOLECULAR

Para compreender como os derivados do ácido oxâmico interagem com a PfL-DH, Choi e colaboradores (2007b) fizeram estudos por acoramento molecular. As técnicas de modelagem molecular são muito importantes no estudo de inibidores enzimáticos, como os derivados do ácido oxâmico. A partir dos estudos teóricos, várias informações relevantes obtidas ajudam no planejamento de novos compos-tos. Estudos por ancoramento molecular na PfLDH sugerem outros compostos, desta vez análogos ao NADH, que também são promissores antimalariais (Penna--Coutinho, 2011). Cortopassi e colaboradores (2011) propuseram ainda um novo mecanismo de inibição da PfLDH no qual o sítio ativo da enzima é bloqueado pelo complexo formado entre fármacos quinolínicos e o grupo heme. Nesse trabalho foram realizados estudos por ancoramento e dinâmica molecular (DM). As técnicas de modelagem molecular aplicadas a LDH permitem compreender melhor a es-trutura e o comportamento dinâmico dessa enzima, contribuindo para a busca por novos antimalariais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A malária é uma doença que causa grande preocupação mundial. Para o Exército Brasileiro, também não é diferente, pois a doença é responsável por um número considerável de baixas na região Amazônica. Por isso é de extrema impor-tância realizar estudos direcionados para o planejamento de novos antimalariais.

Além de infectar milhões de pessoas, a malária merece atenção no que diz respeito aos fármacos já comercializados. Muitos deles tiveram seu potencial re-duzido em função do surgimento de cepas de Plasmodium resistentes. Por isso, a busca por novos alvos moleculares para o tratamento da malária é uma alternativa interessante no planejamento de fármacos. A enzima PfLDH tem se mostrado um alvo promissor, uma vez que sua inibição leva o parasita a morte. Além disso, as várias diferenças entre essa enzima e sua correspondente humana permitem a proposição de inibidores eficazes e seletivos que podem vir a se tornar potentes antimalariais.

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37 3o Trimestre de 2011 –

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38 – 3o Trimestre de 2011

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40 – 3o Trimestre de 2011

UMA REVISÃO DE MODELAGEM MATEMÁTICA EM BIOPROCESSOS. PARTE I: FUNDAMENTOS BÁSICOS E CLASSIFICAÇÃO

Álvaro José Boareto Mendesa,b*, Belkis Valdmana, Maurício Bezerra de Souza Júnior a

aEscola de Química – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Centro de Tecnologia – Av. Athos da Silveira Ramos, 149 Bloco E Sala E-209, 21941-909, Ilha do Fundão, Rio de Ja-neiro/ RJ, Brasil.bSeção de Engenharia Química – SE5 – Instituto Militar de Engenharia; Praça General Tibúrcio, 80, 22290-270, Rio de Janeiro/RJ, Brasil. *[email protected]

ABSTRACT

Biochemical fermentation systems are highly sensitive to changes in abnormal operating conditions. Get the maximum product yield implies maintaining operating conditions within the fermenter close to pre-specified trajectory. Moreover, the com-plexity, efficiency and reliability of modern industrial systems increase continuously, imposing the need for continued development of tools for monitoring and process control. Thus, the mathematical models becomes important in the optimization, mo-nitoring and control of biotechnological processes. The aim of this paper is to pre-sent a review on mathematical modeling of bioprocesses. Due to the length of the subject, we chose to split the article into three parts. In the first part it is treated environmental, economic and general aspects, broad foundation and classification of mathematical models. The second part describes mecanicist models and artificial neural network. The third part describes cibernetic and hybrid models. In particular, greater emphasis is given to the fermentation processes for production of bioetha-nol, because it involves technology of great strategic interest national and global, since it aims to obtain energy from renewable sources and environmentally less harmful. This review is not intended to exhaust the complex and intricate area of knowledge related to the mathematical modeling, even though only on the field of bioprocesses.

Keywords: Bioprocess Modeling, Bioethanol Production, Saccharomyces cerevisiae, Zymomonas mobilis

RESUMO

Sistemas fermentativos são altamente sensíveis a mudanças sob condições anormais de operação. Obter um produto com o máximo de rendimento implica, portanto, em manter as condições de operação dentro do fermentador bem pró-ximas de uma trajetória pré-estabelecida. Além disso, a complexidade, eficiência e confiabilidade dos sistemas industriais modernos aumenta continuamente, im-

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pondo a necessidade do desenvolvimento contínuo de ferramentas de monitora-mento e controle de processos. Sendo assim, os modelos matemáticos se tornam importantes na otimização, no monitoramento e no controle de bioprocessos. O objetivo desse trabalho é apresentar uma revisão sobre a modelagem matemática de bioprocessos. Dado o amplo espectro do assunto, optou-se por dividir o artigo em três partes. Na primeira parte são abordados aspectos ambientais, econômicos e gerais, além de tratar de fundamentos básicos e classificação de modelos mate-máticos. A segunda parte atém-se à descrição de alguns dos modelos matemáticos existentes, especificamente modelo fermenológico e redes neuronais artificiais e a terceira parte descreve os modelos cibernético e híbridos. Particularmente, maior ênfase foi dada aos processos fermentativos associados à produção de bioetanol, por se tratar de assunto de grande interesse estratégico nacional em termos de obtenção de energia a partir de fontes renováveis e ambientalmente menos im-pactante. Não obstante, tal interesse não se limita ao Brasil, atraindo significativa atenção mundial, independente do grau de desenvolvimento econômico da nação. É importante ressaltar que a presente revisão não tem a pretensão de abranger e/ou esgotar a totalidade da complexa e intrincada área do conhecimento atinente ao assunto modelagem matemática, mesmo que somente focado no campo de bioprocessos.

Palavras-chave: “Bioprocess Modeling, Bioethanol Production, Saccha-romyces cerevisiae, Zymomonas mobilis”

INTRODUÇÃO

Aspectos econômicos e ambientaisO desenvolvimento de processos para a obtenção de energia a partir de fontes

sustentáveis é recorrente. Fatores como a eminência da extinção dos combustíveis fósseis e geração de poluentes fazem com que esta preocupação gere um grande número de trabalhos, os quais ocupam extenso espaço na literatura científica.

Desta forma, a produção de etanol como uma alternativa às fontes de energia oriundas de combustíveis fósseis tem sido um assunto de grande interesse desde a crise petrolífera dos anos 1970. Portanto, existe uma forte necessidade de produ-ção de etanol com eficiência, com baixo custo das matérias-primas e também baixo consumo de energia (Tao, 2005).

O Brasil é, mundialmente, o país com a maior tecnologia de processo fermen-tativo para produção de álcool e possui mercado garantido, devido ao álcool anidro adicionado à gasolina - obrigatório por lei nacional em substituição ao chumbo - ou hidratado para uso como combustível. O desenvolvimento do motor multicombus-tível para automóveis, iniciado em 1994, aumenta ainda mais o mercado nacional. Além disso, a indústria sucroalcooleira é autossustentável em uso de energia além de sua produção ser ecologicamente adequada, por reduzir os gases geradores do efeito estufa provenientes da queima de combustíveis fósseis no país numa taxa próxima de 20% (Porto, 2005).

A União da Indústria de Cana-de-açúcar (UNICA) e o Ministério da Agricultura,

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Pecuária e Abastecimento elaboraram a estatística de licenciamento de automó-veis e comerciais leves por tipo de combustível a partir dos dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (ANFAVEA). Essa comparação da quantidade de veículos comercializados no país e os diferentes combustíveis no período de 20 anos (1979 a 2009) é apresentada na Tabela 1.

Tabela 1 - Estatística de licenciamento de automóveis e comerciais leves por tipo de combustível.

MESESAUTOMÓVEIS E COMERCIAIS LEVES

TOTALGASOLINA ÁLCOOL BICOMBUSTÍVEL

1979 905.706 3.114 - 908.820

1980 626.467 240.643 - 867.110

1981 344.467 136.242 - 480.709

1982 365.434 232.575 - 598.009

1983 78.618 579.328 - 657.946

1984 33.482 565.536 - 599.018

1985 28.655 645.551 - 674.206

1986 61.916 697.049 - 758.965

1987 31.190 458.683 - 489.873

1988 77.312 566.482 - 643.794

1989 260.821 399.529 - 660.350

1990 542.855 81.996 - 624.851

1991 546.258 150.982 - 697.240

1992 498.927 195.503 - 694.430

1993 764.598 264.235 - 1.028.833

1994 1.127.485 141.834 - 1.269.319

1995 1.557.674 40.706 - 1.598.380

1996 1.621.968 7.647 - 1.629.615

1997 1.801.688 1.120 - 1.802.808

1998 1.388.734 1.224 - 1.389.958

1999 1.122.229 10.947 - 1.133.176

2000 1.310.479 10.292 - 1.320.771

2001 1.412.420 18.335 - 1.430.755

2002 1.283.963 55.961 - 1.339.924

2003 1.152.463 36.380 48.178 1.237.021

2004 1.077.945 50.949 328.379 1.457.273

2005 697.004 32.357 812.104 1.541.465

2006 316.561 1.863 1.430.334 1.748.758

2007 245.660 107 2.003.090 2.248.857

2008 217.021 84 2.329.247 2.546.352

2009 221.709 70 2.652.298 2.874.077

Obs: 1) Os dados até 2004 referem-se a vendas internas no atacado. Os dados a partir de 2004 fazem referência ao número de veículos licenciados;2) Inclui somente os veículos do Ciclo Otto (não estão contabilizados os comerciais leves movidos a diesel).3) Fonte: ANFAVEA; UNICA e MAPA. http://www.unica.com.br/dadosCotacao/estatistica, acessado em 11 Ago 2011.

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Neste contexto, a indústria de bioetanol tem se desenvolvido rapidamente nos últimos anos para lidar, novamente, com o esgotamento dos combustíveis fósseis (Fu, 2009). Essa afirmação pode ser corroborada pela estatística apre-sentada pela UNICA e pelo MAPA para o volume de litros de etanol total (anidro + hidratado) produzido no Brasil por safra, englobando as últimas 19 safras. A Figura 1 apresenta a mencionada estatística. A UNICA ressalta que os dados da safra 2008/2009 para a Região Norte-Nordeste referem-se à posição final em 30/08/09.

Figura 1 – Estatística da produção de etanol total (anidro + hidratado) no Brasil em mil litros nas últimas 19 safras.Fonte: UNICA e MAPA. http://www.unica.com.br/dadosCotacao/estatistica, acessado em 11 Ago 2011.

Aspectos gerais do processo fermentativoNos processos fermentativos de bioetanol, Saccharomyces é o gênero de

levedura largamente utilizada, seja para uso carburante ou para obtenção de bebidas alcoólicas. Os fatores que consagram esse microrganismo como o mais indicado para esse fim estão relacionados aos atributos desejados para a condu-ção de um processo de produção de álcool por esse gênero de fungo (Andrietta, 2006; Glazer, 2007). No entanto, embora as leveduras tenham muitos atributos como produtoras ideais de etanol, apresentam limitações significativas, estando as principais relacionadas a um restrito grupo de substrato para uso e a uma limitada tolerância à concentração de álcool presente no meio de fermentação. Assim, a limitação em fermentar uma diversidade de substratos baratos e dispo-níveis é o principal obstáculo enfrentado nas tentativas de reduzir o custo da pro-dução de álcool em processos que empregam Saccharomyces (Glazer, 2007).

Nesse esforço de otimização e melhoria da produção de etanol, o gênero bacteriano Zymomonas surge com uma especial habilidade, sendo uma alter-nativa atraente à atual demanda mundial por combustível. Quando comparada com a levedura Saccharomyces cerevisiae, as Zymomonas revelam alto grau de produtividade específica, elevada tolerância ao etanol e menor produção de biomassa (Santos, 2009). Não obstante, nos últimos 15 anos Zymomonas mo-bilis tem se mostrado como um microorganismo promissor para produção indus-

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trial de etanol, devido também as suas características cinéticas e de produtividade superiores quando comparadas com estas mesmas características em leveduras (Daugulis, 1997; Ernandes, 2009).

O etanol produzido é recuperado em 90% a 95% do rendimento teórico para Saccharomyces cerevisiae e em 97% para Zymomonas mobilis. O rendimento te-órico é de 51,1% por peso, conforme equação estabelecida por Gay-Lussac em 1810 para conversão fermentativa de glicose em etanol por levedura (Eq 1) (Spren-ger, 1996; Glazer, 2007; Ernandes, 2009):

(Eq. 1)

Apesar de sua promissora adequação ao processo, uma desvantagem as-sociada à fermentação contínua empregando Zymomonas mobilis é a ocorrência de oscilações peculiares na concentração de substrato, na concentração celular e na concentração de produto sob certas condições de processo (Lee, 1980; Jöb-ses, 1986; Ghommidh, 1989; Bruce, 1991; Jarzebsk, 1992; Daugulis, 1997). Jo-nes (1999) também identificou esse perfil oscilatório nas variáveis de processo de fermentação alcoólica quando se emprega Saccharomyces cerevisiae. Daugulis (1997) constatou que o comportamento oscilatório significava a existência de perío-dos de tempo durante os quais ocorria decréscimo na produtividade de etanol e, por conseguinte, um alto nível de resíduo de substrato. Isto implicava em uma alta perda de substrato, o que é circunstância inaceitável para as condições de processo.

Em 2008, Patnaik também reportou que muitos sistemas microbianos exibem comportamento oscilatório em condições realistas, no entanto, essas culturas com oscilações recebem menor atenção face aos sistemas monotônicos. Neste contex-to cita o perfil oscilatório de bactérias e leveduras em culturas operadas em modo contínuo.

Além disso, sistemas de fermentação bioquímicos são altamente sensíveis às mudanças anormais em condições operacionais. Para assegurar que o máximo rendimento possível de produto seja obtido é necessário garantir que as condições dentro do fermentador permaneçam essencialmente programadas ao redor de uma trajetória pré-especificada. Em muitos sistemas de fermentação industrial, opera-dores de processo usam sua experiência e conhecimento do processo fermenta-tivo para detectar potenciais problemas e fazer modificações quando necessário. No entanto, a importância do controle eficaz não pode ser subestimada porque o desempenho de uma fermentação é muito dependente da capacidade de manter o sistema operando suavemente. Uma fermentação livre de maiores transtornos é seguramente mais produtiva que uma sujeita a perturbações significativas. En-tão, quanto mais cedo um potencial problema para o sistema puder ser detectado, menos severa será sua influência no processo e a ação corretiva resultante será mais comedida (Lennox, 2000; Montague, 2000; Venkatasubramanian, 2003). As-sim sendo, o contínuo aumento da complexidade, eficiência e confiabilidade dos modernos sistemas industriais necessita de um constante desenvolvimento no mo-nitoramento e controle do processo.

Por conseguinte, na visão de Freire (1999), modelos matemáticos são im-portantes ferramentas para a otimização e controle de processos biotecnológicos.

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Nesse viés, pode-se afirmar ser irrefutável que o desenvolvimento e estudo de mo-delos matemáticos apropriados que possibilitem maior compreensão e melhorias do processo por simulação, otimização e implementação de malhas de controle em bioprocessos é altamente desejável. Adicionalmente, tais modelos podem ser usados em esquemas de monitoramento e diagnósticos de processos, podendo ser executados enquanto os processos são conduzidos, permitindo a detecção preco-ce de comportamentos anormais.

O objetivo deste trabalho é apresentar uma revisão bibliográfica acerca de modelagem matemática em bioprocessos, inserindo-a no contexto econômico e ambiental e tratando dos fundamentos básicos, da classificação e da descrição de alguns modelos disponíveis na literatura. Dada ao amplo espectro do assunto, optou-se por dividir o artigo em três partes. Na primeira parte são abordados as-pectos ambientais, econômicos e gerais, além de tratar de fundamentos básicos e classificação de modelos matemáticos. A segunda parte atém-se à descrição de alguns dos modelos matemáticos existentes, especificamente modelo fenomenoló-gico e redes neuronais artificiais e a terceira parte descreve os modelos cibernético e híbrido. Particularmente, maior ênfase foi dada aos processos fermentativos as-sociados à produção de bioetanol, por se tratar de assunto de grande interesse es-tratégico nacional em termos de obtenção de energia a partir de fontes renováveis e ambientalmente menos impactante. Não obstante, tal interesse não se limita ao Brasil, atraindo significativa atenção mundial, independente do grau de desenvolvi-mento econômico da nação. É importante ressaltar que a presente revisão não tem a pretensão de abranger e/ou esgotar a totalidade da complexa e intrincada área do conhecimento atinente ao assunto modelagem matemática, mesmo que somente focado no campo de bioprocessos.

FUNDAMENTOS BÁSICOS DE MODELAGEM MATEMÁTICA

Na etapa de modelagem matemática de processos, independente da área de concentração (química, biologia, físico-química, bioquímica, engenharia, psicologia ou economia) busca-se a proposição de um conjunto de relações entre as variáveis capaz de representar de forma adequada, dentro da precisão requerida, cada caso em particular. Este conjunto de relações é chamado de modelo e, no caso especí-fico da modelagem matemática, é constituído por equações algébrico-diferenciais.

Schwaab (2007) descreveu o modelo como sendo uma estrutura que tenta descrever de forma aproximada a realidade. Esta descrição aproximada é função da necessidade do modelo basear-se em um conjunto de observações experimen-tais, as quais são corrompidas por erros de medidas. Os erros de medidas também são designados como incertezas experimentais. Logo, na oportunidade da con-cepção do modelo, nem todas as variáveis podem ser controladas e/ou medidas precisamente durante os experimentos.

Um modelo matemático é um conjunto de relações entre as variáveis em um sistema em estudo e geralmente pode predizer as variáveis de saída e o estado do sistema a partir das variáveis de entrada. Estas relações são normalmente expres-sas na forma de equações matemáticas, mas também podem ser especificadas

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como expressões lógicas (ou relações de causa/efeito), as quais são usadas na operação de um processo. Assim, as equações de balanço especificam como os materiais fluem dentro e fora do volume de controle e como são convertidos no in-terior deste volume. Essa conversão interna no volume de controle é representada pela equação de taxa (também chamada de cinética) e, juntamente com o balanço de massa, especificam o modelo completo (Nielsen, 2003).

Segundo Gordillo (1996), a elaboração do modelo, juntamente com sua aplica-ção na simulação, reúne uma série de vantagens na hora de conhecer e melhorar o processo, tais como: (a) entender o comportamento do sistema, já que abrange as evoluções que seguem as diferentes variáveis, de modo a formular um modelo; (b) a exploração do modelo mediante simulação ajuda a planejar o experimento, já que em pouco tempo se pode obter uma visão de quais variáveis afetam o processo e, portanto, estabelecer o tempo de duração para atingir os objetivos propostos; (c) nesse sentido, a predição da evolução do processo permite detectar em que mo-mento a operação vai mudar sua trajetória, de modo que se possa tomar decisões a tempo de corrigir e dirigir o processo para a produção ótima. O modelo, portanto, permite projetar estratégias de operação e controle; (d) finalmente, uma aplicação menos direta, contudo também útil, é a sua utilização didática, já que permite traçar diferentes situações do processo e, portanto, facilitar sua compreensão e estudo, o que de forma experimental seria muito mais difícil e demorado de se levar a termo.

Além disso, pode se acrescentar às considerações de Gordillo (1996) que a forma experimental para fins didáticos seria também mais dispendiosa quando comparada à aplicação de modelos.

Neste contexto, encontram-se na literatura diversos conceitos e classificações desta ferramenta imprescindível para o estudo desses processos.

A combinação do balanço de massa, incluindo as equações cinéticas de taxa e o modelo do reator, perfazem uma descrição matemática completa do processo fermen-tativo e esse modelo pode ser usado para simular como as variáveis de saída depen-dem do conjunto de variáveis de entrada. No entanto, projetar um modelo matemático envolve diversas etapas, dentre as quais a primeira e mais importante é a definição da complexidade do modelo. Para essa tarefa deve se definir o número de reações a serem consideradas no modelo e a estequiometria para essas reações (Nielsen, 2003).

A Figura 2 ilustra as etapas envolvidas na elaboração do modelo matemático.

Figura 2 – Etapas para modelagem matemática de processos fermentativos. Adaptado de Nielsen (2003).

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A Figura 2 mostra que se as simulações empregando o modelo são conside-radas estatisticamente representativas dos dados experimentais o modelo é acei-tável. Caso contrário, se o ajuste não é significativo dentro do nível de significância estatística selecionado, mesmo para o conjunto de parâmetros estimado que propi-cia o melhor ajuste, torna-se necessário revisar o modelo cinético e passar através do ciclo de modelagem novamente (Nielsen, 2003).

É oportuno destacar que o balanço de energia também deve ser considerado na etapa de modelagem, muito embora não sejam tratados recorrentemente no estudo de processos fermentativos. Como exemplo, Nascimento (1983) verificou que o calor em fermentação alcoólica é removido pelo emprego de espargimento de água na superfície da dorna, utilização de serpentinas internas com circulação de água ou jaquetas externas e etc. Contudo a autora relata não ter encontrado à época nenhum trabalho que abordasse as equações envolvidas nas taxas de calor liberado durante a fermentação e o calor trocado com os meios externos de aqueci-mento e resfriamento. Para este mesmo tipo de processo Rivera (2006) comentou que mudanças nas condições operacionais são muito comuns devido a oscilações nas características da matéria-prima, à variação do microrganismo dominante e de pequenos desvios de temperatura em função da característica exotérmica da fermentação alcoólica. Estas flutuações afetam a cinética e, por conseguinte, pro-vocam perda de produtividade e de conversão, podendo deslocar o processo das condições ótimas de operação. Todavia, apesar de constatada a influência da tem-peratura nas condições reacionais, Rivera (2006) verificou a existência de poucos trabalhos na literatura científica abordando o efeito dessa variável nos parâmetros cinéticos e, dentre estes estudos, não há a determinação da relação para descrever estes parâmetros em função da temperatura.

CLASSIFICAÇÃO DE MODELOS MATEMÁTICOS

Segundo Schwaab (2007), o modelo pode ser apresentado de várias formas, a depender do propósito do pesquisador, das limitações das observações experi-mentais e da complexidade do fenômeno a ser investigado. Algumas dessas formas são: (a) Modelo Matemático - propõe que as relações entre as diversas variáveis de um problema podem ser descritas de forma matemática precisa. Permitem fazer previsões quantitativas sobre o comportamento futuro do sistema em estudo; (b) Modelo Conceitual - estabelece vínculos qualitativos entre as várias variáveis do problema, sem necessariamente estabelecer vínculos matemáticos quantitativos precisos, dada a complexidade e/ou impossibilidade de mensuração das variáveis envolvidas no processo. Como exemplo podem ser citados: (b1) Ciências huma-nas: “Complexo de Édipo”; (b2) Engenharia: Princípio de Lavoisier – conservação da massa; Primeira Lei da Termodinâmica – conservação da energia; e Leis Funda-mentais de Newton para o Movimento – conservação da quantidade de movimento; (c) Modelo Físico: A Planta Piloto – constitui-se em modelos físicos reais, quase sempre em escala muito inferior à escala dos sistemas estudados, utilizadas para fazer experimentação e estudos que podem ser vinculados ao comportamento dos sistemas reais de interesse. É empregada quando é inconveniente ou impossível

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realizar experimentos diretamente no sistema estudado, tendo em vista a possibili-dade de testes experimentais mal-sucedidos resultarem em acidentes ou em des-vios de metas de produção, como ocorre, por exemplo, em ambientes fabris e em ambientes naturais onde possam comprometer a saúde do ecossistema e resultar em catástrofes ambientais.

Dentre as formas descritas no parágrafo anterior, muitas vezes é conveniente a classificação dos modelos em grupos distintos conforme os conjuntos de ferra-mentas e técnicas matemáticas disponíveis para análise. Nesta acepção de clas-sificação, a Figura 3 apresenta a proposta de esquema dos grupos recorrentes na literatura.

Figura 3 – Proposta de classificação dos modelos em grupos distintos conforme os conjuntos de ferramentas e técnicas matemáticas disponíveis na literatura.

Em consonância com a classificação proposta na Figura 3, a seguir são apre-sentadas as diversas abordagens encontradas na literatura científica.

Para Himmelblau (1970), modelos são empregados em todos os campos, considerando ser provavelmente impossível incluir sob uma única definição as di-versas conotações dos modelos existentes no mundo. No entanto, para o trabalho de descrição de processos, este autor se ateve aos modelos determinísticos, tam-bém chamados de modelos de elementos, e aos modelos estocásticos ou randômi-cos. Nos modelos determinísticos cada variável e parâmetro podem ser atribuídos a um número fixo definido ou a uma série de números fixos, para qualquer conjunto de condições dadas. Já nos modelos estocátiscos a incerteza é introduzida. Assim, neste último modelo, as variáveis ou parâmetros usados para descrever as rela-

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ções de entradas-saída do processo e a estrutura dos elementos não são precisa-mente conhecidos.

Na abrangência dos modelos determinísticos e estocásticos, Himmelblau (1970) propôs que três tipos muito gerais de modelos podem ser escritos para um processo, sendo: (a) Modelos de fenômeno de transporte - usam princípios físico-químicos. Como exemplo cita as equações fenomenológicas de conversão, as quais são equações de continuidade descrevendo as conversões de massa, de momento e de energia; (b) Modelos de balanço populacional - usam balanços populacionais. Distribuição de tempo de residência e outras distribuições de idade são exemplos para este tipo de modelo; (c) Modelos empíricos - usam dados em-píricos para o ajuste. São polinômios usados para ajustar os dados experimentais.

Numa outra visão, Schwaab (2007) propôs os modelos distinguidos como: (a) Modelos Teóricos e Empíricos - nos modelos teóricos as equações que rela-cionam as diversas variáveis do problema derivam de pressupostos teóricos fun-damentais como as leis de conservação de massa, de energia e de quantidade de movimento. Já nos modelos empíricos as equações utilizadas para descrever as relações observadas entre as variáveis do problema são postuladas, não havendo a princípio qualquer pressuposto teórico que justifique a relação concebida; (b) Mo-delos Lineares e Não Lineares (implícitos e explícitos) - os modelos são ditos lineares quando apresentam relações lineares entre as variáveis consideradas no problema e quando satisfazem as propriedades de linearidade, caso contrário, são classificados como não lineares. Estes modelos ainda podem ser considerados explícitos ou implícitos, conforme a possibilidade de resolução direta ou à neces-sidade de aplicação de métodos numéricos, respectivamente; (c) Modelos Deter-minísticos e Estocásticos - os modelos determinísticos associam a cada expe-rimento um resultado bem definido, enquanto os modelos estocásticos associam a cada condição experimental um conjunto possível de resultados, cada qual com certa probabilidade; (d) Modelos a Parâmetros Concentrados e a Parâmetros Distribuídos - quanto à forma da variação espacial das variáveis. Os modelos a parâmetros concentrados são assim designados se as variáveis espaciais são des-prezíveis e as propriedades não mudam com a posição. Por outro lado, os modelos a parâmetros distribuídos têm lugar quando as variações espaciais são relevan-tes; (e) Modelos Estacionários e Dinâmicos - tomando por base a dependência temporal, os modelos são ditos dinâmicos quando uma ou mais variáveis variam no tempo e são chamados de estacionários quando as variáveis não mudam em função do tempo.

De acordo com Valdman (2008) os modelos matemáticos representam o com-portamento dinâmico do processo segundo as características das equações dife-renciais e algébricas que o compõem, de forma a definir os métodos e técnicas usadas para determinar a sua solução. Nesta concepção, designaram-nos como: (a) Modelos agrupados – são os constituídos por equações diferenciais totais, ob-tidas pela aplicação das leis fundamentais, sendo o tempo a variável independente. Neste caso, os processos são tratados como tendo todas as variáveis agrupadas e uniformes dentro do volume considerado para a aplicação das leis da continuidade de massa e de energia; (b) Modelos distribuídos - aqueles onde as equações diferenciais componentes são parciais e, geralmente, a variável tempo e outra va-

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riável dimensional (comprimento) são as variáveis independentes. Nestes casos as variáveis do processo são tratadas como variações distribuídas ao longo do volume total dos equipamentos considerados. As leis fundamentais são aplicadas, em geral, para volumes infinitesimais ao longo de uma das dimensões principais do equipamento; (c) Modelos lineares - aqueles nos quais as equações diferenciais e algébricas não contêm nenhum termo não linear. A não linearidade do termo é caracterizada, por exemplo, por produtos de variáveis dependentes, variáveis em expoentes ou radicais e etc. Neste caso, os coeficientes de todos os termos das equações diferenciais são constantes ou funções da variável independente; (d) Modelos não lineares - os que apresentam as equações diferenciais e algébricas do modelo contendo pelo menos um termo não linear. Assim, este termo contém um coeficiente ou uma função de outra variável dependente do modelo.

Segundo Nielsen (2003), na combinação do balanço de massa, incluindo as equações cinéticas de taxa e o modelo do reator, os modelos podem ser de estado estacionário e transientes ou dinâmico. Os modelos de estado estacionário consis-tem em um conjunto de equações algébricas que relacionam as variáveis de saída às variáveis de entrada. Já os modelos transientes ou dinâmicos englobam um conjunto de equações diferenciais, onde, para um biorreator ideal, as variáveis de saída são descritas como funções de tempo para o conjunto de variáveis de entra-da e para os valores iniciais das variáveis de saída.

Não obstante, de uma forma geral, os modelos cinéticos de processos fer-mentativos podem também ser divididos aproximadamente em quatro grupos, de-pendendo do nível de detalhes do modelo (Oliveira, 2004; Coelho, 2001; Schmidell, 2001). Nessa linha de definição, têm-se: (a) Modelos estruturados e não estru-turados - quanto ao número de componentes usados na representação celular. Os modelos estruturados levam em conta que a biomassa não é um composto sim-ples, visto que no interior das células ocorre uma série de reações envolvendo uma infinidade de substâncias. Esse tipo de modelo em particular fornece uma melhor descrição das condições transientes em relação ao modelo não estruturado con-vencional. Por outro lado, os modelos não estruturados não consideram nenhuma organização interna das células e sempre expressam a concentração do micro-organismo em termos de biomassa. Esses modelos são geralmente simples e as descrições matemáticas são baseadas em observações da cinética do microrganis-mo; (b) Modelos segregados e não segregados - quanto à heterogeneidade da população microbiana. Os modelos segregados consideram a biomassa segregada em unidades estruturadas e funcionais, as células. Assim, a variável fundamental é o número de células. Estas são consideradas como unidades discretas e a popu-lação é vista como heterogênea. Já nos modelos não segregados assume-se que a biomassa está distribuída homogeneamente por todo o sistema. Desta forma, a variável fundamental é a concentração celular e as células são representadas pela propriedade média da população, ou seja, a população é considerada homogênea. Esta divisão dos modelos tem por base a forma com que o bioprocesso é aborda-do para o desenvolvimento dessa ferramenta (Schmidell, 2001; Nielsen, 2003). A Figura 4 mostra esquematicamente a variação da complexidade destes diferentes tipos de modelo.

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Figura 4 – Variação de complexidade dos tipos modelo. A complexidade aumenta do canto superior esquerdo para o inferior direito. Adaptado de Nielsen (2003).

Ainda nesta linha de distinção entre os modelos apresentados na Figura 4, Nielsen e colaboradores (2003) dividem os modelos matemáticos para processos fermentativos em: (a) Cinética de crescimento não estruturada - modelos não estruturados são adequados para condições de estado estacionário, mesmo quan-do há a incorporação de padrões complexos de crescimento. Além disso, este tipo de modelo propicia ajuste adequado para um conjunto restrito de dados e raramen-te pode ser empregado em condições experimentais significativamente diferentes. (a1) Modelos caixa preta (empíricos): é a mais simples apresentação matemática, onde todas as reações celulares são englobadas em uma única reação global. Isto implica que os coeficientes de rendimento para crescimento celular, consumo de substrato e formação de produtos são constantes, assumindo-se a hipótese de uma constante distribuição de fluxos através de diferentes vias celulares e de dis-tintas condições de crescimento. Neste caso, o modelo cinético transforma a des-crição da taxa específica de crescimento em uma função das variáveis do sistema; (a2) Modelos de reações múltiplas: nestes modelos os fatores de conversão não são constantes. Já se considera alguma estrutura bioquímica no modelo cinético, movendo de não estruturado e não segregado em direção ao estruturado e não segregado, contudo ainda são basicamente não estruturados, uma vez que a influ-ência celular continua sendo expressa em função da concentração das células; (a3) Influência da temperatura e pH: são incluídas como outras variáveis de proces-so com incidência na cinética de crescimento, sendo normalmente mantidas cons-tantes ao entorno de seus valores ótimos. São também chamadas de parâmetros de cultura para distingui-las das outras variáveis, as quais mudam ao longo do processo fermentativo (concentrações reacionais, taxa de agitação e etc). (b) Mo-delos estruturados simples - em linhas gerais essa classe de modelos pode ser considerada como uma melhoria dos modelos não estruturados por meio da incor-poração, pelo menos qualitativamente, de mecanismos básicos do comportamento celular. Dessa forma, podem ter algum poder de predição, adquirindo habilidade para descrever processo de crescimento em diferentes condições utilizando o mes-

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mo conjunto de parâmetros como, por exemplo, em otimização de processos. Nos modelos estruturados simples, componentes da biomassa são englobados dentro de poucas variáveis chaves, esperando que sejam representativas do comporta-mento celular. Por esse motivo, a atividade microbiana torna-se função não somen-te das variáveis abióticas – que podem mudar com constantes de tempo muito pe-quenas. Assim, são também funções da composição celular, dependendo da história da célula, ou seja, das condições ambientais experimentadas pela cultura no passado. Os componentes celulares incluídos no modelo representam grupos de diferentes enzimas, metabólitos ou outros componentes celulares. As reações celulares consideradas nesses modelos são, portanto, empíricas, porque elas não representam diretamente a conversão entre os componentes. Da mesma forma, a cinética das reações individuais normalmente é descrita com o emprego de expres-sões empíricas, de forma a ajustar os dados experimentais com um pequeno nú-mero de parâmetros. Para tanto, expressões do tipo Monod são freqüentemente usadas, uma vez que resumem algumas características fundamentais da maioria das reações celulares, isto é, sendo de primeira ordem à baixa concentração de substrato e de ordem zero à alta concentração de substrato. A despeito de sua na-tureza empírica, modelos estruturados simples são normalmente baseados em me-canismos celulares bem estabelecidos, sendo hábeis para simular certas caracte-rísticas experimentais. (b1) Modelos de compartimento: a biomassa é dividida em alguns compartimentos ou grupos moleculares. Há a necessidade de escolher esses compartimentos com cuidado, devendo os componentes celulares com funções simi-lares ser colocados no mesmo compartimento (por exemplo, todo material de mem-brana e outros componentes bastante inativos em um compartimento; todo material ativo em outro compartimento). Muitos modelos são baseados na divisão da célula em uma parte ativa e uma inativa. Ramkrishna e colaboradores (1967) apresentaram um dos primeiros modelos compartimentados, considerando a célula dividida em dois compartimentos: um compartimento “G” composto de ácidos nucléicos e um compar-timento “D” com enzimas. Toda a biomassa foi considerada ativa, uma vez que tanto o material genético quanto as proteínas são envolvidas no processo de cres-cimento. Contudo, ambos os compartimentos “G” e “D” podem ser degradados pela ação de um inibidor não especificado e tornar-se assim materiais inativos, sendo importante para a descrição das células mortas ao final do processo em batelada; (b2) Modelos cibernéticos: para simplificar a complexidade da simulação do cresci-mento celular em múltiplos substratos, Ramkrishna (1982) desenvolveu um concei-to de modelagem adequado para descrever o crescimento em múltiplas fontes de carbono e de energia. A abordagem por modelagem cibernética baseia-se na hipó-tese que, enquanto a modelagem detalhada do processo regulador é complicada, é possível a interpretação funcional da célula como sendo guiada pela estratégia de alocação ótima de recursos (Ramkrishna, 1984). Não existe nenhuma forma direta de confirmar se realmente microrganismos otimizam a alocação de seus recursos para o crescimento, dessa forma os modelos cibernéticos devem ser aceitos na mesma base de outros modelos estruturados simples. (c) Modelos mecanicistas (ou fenomenológicos) - modelos mecanicistas, também chamados de fenomeno-lógicos, incluem certa quantidade de informações sobre o mecanismo celular exis-tente, sendo normalmente criados no nível molecular, assim como os modelos de

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cinética enzimática. Desta forma, tornam-se desejáveis para avaliar a importância relativa de diferentes processos celulares, visto o envolvimento de muitas estrutu-ras reguladoras complexas. Esses modelos matemáticos são bem adequados para tal finalidade, posto que permitem a integração de informações de diferentes expe-rimentos, as quais somente podem ser obtidas por meio de análises quantitativas. Todavia, ainda é impossível que o modelo descreva todos os processos envolvidos no crescimento celular, logo nem todos os processos são identificados e, mesmo que o fossem, a capacidade de processamento dos computadores não poderia controlar o grande número e complexidade dos modelos envolvidos nessa situa-ção. (c1) Modelos geneticamente estruturados: tem por objetivo a quantificação da transcrição de gene com base no conhecimento da função promotora. Entre os mais estudados promotores está o lac-promotor de Escherichia coli, o qual toma parte na regulação da expressão dos genes envolvidos no consumo de lactose (lactose permease e β-galactosidase). O lac-promotor é de grande interesse indus-trial para conduzir a expressão dos genes heterólogos que codificam proteínas re-combinantes em Escherichia coli. A verdadeira força do modelo geneticamente es-truturado não está ligada ao modelo de crescimento global, mas preferencialmente na possibilidade oferecida de analisar a influência de parâmetros específicos do modelo no processo, como a importância de diferentes constantes de equilíbrio. Como em muitas indústrias de enzimas exibem uma regulação complexa, estes modelos podem também ser usados para aumentar o conhecimento da expressão da codificação do gene da enzima de interesse. (c2) Modelos de célula única: as características individuais da célula são consideradas e eventos particulares duran-te o ciclo celular podem ser estudados. As vantagens dos modelos de célula única são: - possibilidade de descrever explicitamente a geometria celular e deste modo examinar seu potencial efeito no transporte de nutrientes; - incluir no modelo even-tos temporais durante o ciclo celular; - considerar arranjos espaciais dos compo-nentes intracelulares; - facilidade de incluir vias bioquímicas e modelos de controle metabólico. No entanto, embora a meta final seja descrever todos os processos na célula, atualmente somente é possível representar poucos processos chaves. (d) Modelos estruturados morfologicamente - para alguns sistemas microbianos a diferenciação de células na cultura desempenha importante papel em sua perfor-mance global, pois a cinética de crescimento e a produtividade são afetadas pela presença de mais de um tipo de célula. Estes modelos com estrutura morfológica já apresentam certo grau de segregação, sendo relevantes para a descrição do cres-cimento de fungos filamentosos, onde a diferenciação celular está relacionada com a extensão das hifas. Então, as células são divididas em um número finito de esta-dos e a conversão entre os diferentes estados celulares é determinada por uma seqüência de reações morfológicas empíricas, descritas por um conjunto de rea-ções intracelulares. Contudo, os mecanismo por trás da maior parte das conver-sões morfológicas são amplamente desconhecidos, não permitindo descrever de-talhadamente essas mudanças morfológicas por modelos mecanicistas bem definidos e, portanto, reações morfológicas empíricas têm sido empregadas. Não obstante, esses modelos morfológicos também são aplicáveis para a descrição de outros sistemas celulares como bactérias contendo plasmídeos instáveis e na ex-

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plicação do comportamento oscilatório exibido em certas condições por culturas de leveduras. (d1) Modelos de cultura de levedura com oscilação: ao contrário da divi-são celular simétrica em bactérias, onde há a formação de duas células quase idênticas, a divisão celular em leveduras é assimétrica formando a célula mãe e a célula filha, as quais são distintas. O ciclo celular de brotamento de levedura é mos-trado na Figura 5.

Figura 5 – Ciclo celular de brotamento em levedura. Adaptado de Nielsen (2003).

Analisando a Figura 5, verificam-se os tempos e as fases do brotamento da levedura. A célula filha é convertida em célula mãe dentro do tempo de crescimento “tc”, passando a seguir por um período de amadurecimento “ta” para o surgimento de um novo broto. Depois, decorrido mais um período de tempo de brotamento “tb”, o broto atinge um tamanho crítico e ocorre a divisão celular. Na divisão celular forma-se a “cicatriz de broto”, onde se acredita não poder haver um novo brotamen-to. O ciclo de brotamento para levedura é composto por fases características, como apresentadas na Figura 5: (1) em “tc + ta” para a célula filha e em “ta” para a célula mãe ocorre a fase de amadurecimento, designada como “fase G1”. Nesta fase a célula se prepara para o brotamento (por exemplo, forma sua reserva de carboi-drato); (2) em “tb” acontece o brotamento propriamente dito em três fases consecu-tivas: (2.1) “fase S” onde os cromossomos são duplicados; (2.2) “fase G2” quando a célula se prepara para a divisão; (2.3) “fase M” onde ocorre a divisão celular. Assim, o metabolismo da célula filha e o da célula mãe são muito diferentes, sendo necessária a aplicação do modelo morfologicamente estruturado para a correta descrição da cinética de crescimento global e, desta forma, descrever o fenômeno de oscilações espontâneas observadas em variáveis de processo como oxigênio dissolvido, concentrações de etanol e glicose, taxas de consumo de oxigênio e de formação de CO2 e de variáveis intracelulares (NAD e DNA) (Nielsen, 2003). (d2) Modelo de crescimento de fungos filamentosos: o crescimento de fungos filamen-tosos difere muito do observado em microrganismos unicelulares. Nos fungos as células estão conectadas em estrutura de hifas. Dentro dessa estrutura multicelular todas as células podem contribuir no processo de crescimento produzindo proto-plasma, contudo o crescimento das hifas ocorre somente nas pontas. Portanto, o número de pontas no micélio é uma característica morfológica variável. Megee (1970) formulou o primeiro modelo morfologicamente estruturado para descrever o crescimento e formação de produto em Aspergillus awamori, considerando cinco formas morfológicas separadas no modelo: (1) ZA – comportamento apical nas hifas

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em crescimento ativo; (2) ZH – comportamento subapical nas hifas em crescimento ativo; (3) ZC – desenvolvimento de conidióforos; (4) ZB – esporos pretos; (5) ZM – es-poros maduros. Este modelo descreve diversas observações gerais concernentes ao crescimento do fungo estudado e constitui um bom exemplo do emprego de mo-delos morfologicamente estruturados na descrição de sistemas muito complexos. Não obstante, uma desvantagem deste modelo é o grande número de parâmetros, mas para simulações de crescimento submerso pode-se negligenciar a formação de esporos e considerar somente o crescimento ativo das hifas e contornar a super parametrização do modelo.

Em alguns processos, dado as suas características específicas, não se con-segue, pela aplicação de uma técnica de modelagem isoladamente, a descrição do fenômeno com acurácia suficiente para permitir sua operação dentro das con-dições exigidas. Nesses casos é recorrente na literatura a combinação de técnicas de modelagem, aproveitando os pontos fortes de cada uma de forma a compensar as limitações individuais. A essa junção de duas ou mais técnicas para diferentes aspectos de um sistema microbiano dá-se o nome de modelagem híbrida (Patanaik, 2009). Esta técnica de modelagem também é chamada de caixa-cinza (Zorzetto, 2000; Komives, 2003; Boareto, 2005). Este último autor avalia que os modelos cog-nitivos são freqüentemente superiores aos modelos mecanicistas para um reator não ideal. A modelagem híbrida tem sido reconhecida como uma alternativa quanto a custo e efetividade para análise de bioprocessos (Oliveira, 2004; Zorzetto, 2000; Henriques, 1999; Psichogios, 1992; Boareto, 2005).

CONCLUSÃO

A necessidade de desenvolvimento de processos para obtenção de energia a partir de fontes sustentáveis é recorrente na literatura. A produção de bioetanol e outros biocombustíveis desponta como tecnologia viável e necessária devido a fatores como a eminente extinção dos combustíveis fósseis e premência em mi-norar o impacto ambiental. Assim, existe uma forte demanda para produção de etanol com eficiência, com baixo custo das matérias-primas e com baixo consumo de energia.

A otimização e a melhoria da produção passam pela busca de novos catali-zadores biológicos. Na produção de etanol o gênero bacteriano Zymomonas surge como alternativa por se destacar em relação à levedura tradicional Sccharomyces cerevisiae, visto possuir maior grau de produtividade específica, elevada tolerân-cia ao etanol e menor produção de biomassa, além de características cinéticas e de produtividade superiores. O etanol produzido é recuperado em 90% a 95% do rendimento teórico para Saccharomyces cerevisiae e em 97% para Zymomonas mobilis.

Sistemas de fermentação bioquímicos são altamente sensíveis às mudan-ças anormais em condições operacionais e a cada dia tornam-se mais complexos. Então, para atingir o máximo rendimento possível de produto, torna-se necessário garantir, dentro da significância estatística desejada, a permanência das condições

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de processo próximas a valores pré-estabelecidos. Isto implica em constante de-senvolvimento do monitoramento e controle do processo.

A permanente evolução dos processos biotecnológicos, garantindo a otimiza-ção de rendimento, produtividade e conseqüente redução da geração de resíduos exige a constante elaboração de ferramentas que permitam o monitoramento, de-tecção de falhas e diagnóstico para permitir a implementação de malha de controle eficaz. Nestes termos, a modelagem matemática reveste-se de importância como instrumento capaz de inferir a variável independente como função das variáveis dependentes fixadas na partida do processo. Assim, a elaboração do modelo, jun-tamente com sua aplicação na simulação, reúne uma série de vantagens na hora de conhecer e melhorar o processo.

Os modelos são empregados em todos os campos, sendo provavelmente im-possível incluir em uma única definição as diversas vertentes existentes na litera-tura. Nesta primeira parte, das três que compõem esta revisão, abordaram-se os aspectos ambientais e econômicos, os aspectos gerais do processo fermentativo, os fundamentos básicos de modelagem matemática e a classificação de modelos matemáticos, dando maior ênfase aos processos fermentativos para produção de bioetanol, por envolver tecnologia de grande interesse estratégico.

No escopo da abordagem na área de modelagem foram descritas as caracte-rísticas, aplicação e limitações das inúmeras técnicas apresentadas. Essa descri-ção permite conhecer a aplicação mais adequada de cada técnica de modelagem, possibilitando o discernimento de sua melhor adequação para cada processo em estudo. Para facilitar a visualização foi proposto um esquema classificando os mo-delos dentro de distintos grupos, conforme os conjuntos de ferramentas e técnicas matemáticas disponíveis para análise.

O conhecimento da técnica mais adequada é fundamental na tarefa de mode-lagem matemática por favorecer o perfeito delineamento das etapas. Desta forma, pode-se assim desenvolver o modelo matemático com capacidade de representar o processo dentro da significância estatística determinada e assumir a hipótese do modelo perfeito. Nesse sentido, a filosofia permanente no campo da modelagem implica na tendência de utilização dos modelos mais simples com capacidade de representar convenientemente o processo em detrimento aos mais complexos, evi-tando a demanda de tempo na formulação e a exigência de esforço computacional excessivo, que muitas vezes pode implicar na não convergência para a solução do problema.

A segunda parte desta revisão descreverá os métodos de modelagem feno-menológica e por redes neuronais artificiais. Por fim, a terceira parte tratará, aos mesmos moldes, dos modelos cibernéticos e híbridos.

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60 – 3o Trimestre de 2011

UMA REVISÃO DE MODELAGEM MATEMÁTICA EM BIOPROCESSOS. PARTE II: MODELOS MECANICISTAS E REDES NEURONAIS ARTIFICIAIS

Álvaro José Boareto Mendesa,b,*, Belkis Valdmanª, e Maurício Bezerra de Souza Júniorª,*.

ª Escola de Química – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Centro de Tecnologia – Av. Athos da Silveira Ramos, 149 Bloco E Sala E-209, 21941-909, Ilha do Fundão, Rio de Ja-neiro/ RJ, Brasil.bSeção de Engenharia Química – Instituto Militar de Engenharia; Praça General Tibúrcio, 80, 22290-270, Rio de Janeiro/RJ, Brasil.* [email protected]

ABSTRACT

In bioprocesses the complexity varies according to the morphological chan-ges of cells, the rheological characteristics of the fermentation broth and numerous other interfering factors. This requires raising the level of detail of the mathematical model, implying the inclusion of equations for the description of metabolic pathways, of intracellular reactions and various abiotic variables, requiring deeper knowledge of the microbial system, often unavailable. In the first part of this review, the mathe-matical modeling subject was contextualized within the industrial production pro-cess, invoking the strategic relevance of bioethanol production, when the basic fun-damentals and classification of mathematical models in the context of fermentation processes were discussed. In this second part, we describe mechanistic models and artificial neural networks. The methodologies of models nominated above are described, with the most important definitions, discussing about recurrent applica-tions in the literature and outlining an application example. Moreover, the main ad-vantages and drawback of each technique are discussed. About RNA, we discuss the foundations of neural models too, training methods for MLP and RBF networks and architectures most often used in chemical engineering are shown. The third part of this work will focus on cybernetic and hybrid modeling.

Keywords: Bioprocess Modeling, Mecanicist Model, Artificial Neural Ne-tworks; Artificial Intelligence; Intelligent Model

RESUMO

A complexidade dos bioprocessos varia de acordo com as modificações mor-fológicas das células, as características reológicas do caldo de fermentação e nu-merosos outros interferentes. Isso requer um aumento no nível de detalhamento do modelo matemático implicando na inclusão de equações para a descrição dos caminhos metabólicos, das reações intracelulares e diversas variáveis abióticas,

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61 3o Trimestre de 2011 –

requerendo um conhecimento mais profundo do sistema microbiano, que geral-mente não está disponível. Na primeira parte dessa revisão a modelagem mate-mática foi contextualizada dentro do processo de produção industrial, invocando a relevância estratégica da produção de bioetanol, quando os fundamentos básicos e a classificação dos modelos matemáticos foram discutidos. Nessa segunda parte nós descrevemos modelos mecanísticos e redes neurais. Essas metodologias de construção de modelos são descritas, com suas definições mais importantes e a discussão sobre as recorrentes aplicações na literatura e seus exemplos de aplica-ção. Além disso, as principais vantagens e desvantagens de cada técnica são dis-cutidas. Para as RNA abordam-se também os fundamentos dos modelos neuronais e os métodos de treinamento para as redes MLP e RBF. Além disso, as redes de arquitetura mais utilizadas na engenharia química têm suas principais aplicações enunciadas. A terceira parte dessa revisão será focada em modelagem cibernética e híbrida.

Palavras-chave: Modelagem de bioprocessos, Modelo mecanicista, Redes neurais; Inteligência artificial; Modelo inteligente.

LISTA DE SÍMBOLOS

(a) Modelo fenomenológico (Daugulis, 1997)

- SÍMBOLOS

a Parâmetro para taxa específica de crescimento instantânea (adimensional)

b Parâmetro para taxa específica de crescimento instantânea (adimensional)

D Taxa de diluição para substrato (h-1)

De Taxa de diluição para etanol exógeno (h-1)

ƒµ Fator de inibição para taxa específica de crescimento dinâmica (adimensional)

Ki Parâmetro de inibição de substrato para taxa específica de crescimento (g L-1)

Ks Parâmetro de saturação de substrato para taxa específica de crescimento (g L-1)

Kmp Parâmetro de saturação de substrato para taxa de produção de etanol (g L-1)

P Concentração de etanol (g L-1)

Pe Concentração de etanol exógeno (g L-1)

Pma Limite de inibição de etanol para taxa específica de crescimento instantânea (g L-1)

Pmb Limite máximo de inibição de etanol para crescimento celular (g L-1)

Pme Limite máximo de inibição de etanol para produção de etanol (g L-1)

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62 – 3o Trimestre de 2011

(a) Modelo fenomenológico (Daugulis, 1997)

- SÍMBOLOS

Pob Limite de inibição de etanol para taxa específica de crescimento instantânea (g L-1)

Qp Taxa específica de produção de etanol (g g-1h-1)

Qpmax Taxa específica máxima de produção de etanol (g g-1h-1)

S Concentração de substrato (glicose) (g L-1)

Sf Concentração de substrato na linha de alimentação (glicose) (g L-1)

Si Limite inferior de inibição por substrato de taxa específica de crescimento (g L-1)

τ Tempo atual (h)

X Concentração de celular (g L-1)

W Média ponderada de 1ª ordem da taxa de mudança da concentração de etanol (g L-1h-1)

YP/S Coeficiente de rendimento para formação de etanol (g g-1)

Z Média ponderada de 2ª ordem da taxa de mudança da concentração de etanol (g L-1h-1)

- SÍMBOLOS GREGOS

α Expoente de inibição por etanol para a taxa de produção de etanol (adimensional)

βParâmetro histórico ponderado para a taxa de mudança de concentração de etanol. Indica a mag-nitude do tempo LAG para o atraso do efeito de inibição (h-1)

1/βTempo no passado quando ocorre a mudança na concentração de etanol, a qual causa a mais significativa influência na performance da célula (h) no tempo atual “t” (h)

δ Parâmetro do fator de inibição da taxa de mudança da concentração de etanol (adimensional)

λ Parâmetro do fator de inibição da taxa de mudança da concentração de etanol (adimensional)

σ Variável de contagem para adição de etanol exógeno (adimensional)

τ Tempo histórico (h)

ψw Média ponderada da taxa de mudança da concentração de etanol anterior (h-1)

µ(S,P) Taxa de crescimento específica instantânea (h-1)

µ(S,P,Z) Taxa específica de crescimento dinâmica (h-1)

µmax Taxa de crescimento específica instantânea na concentração de etanol instantânea zero (h-1)

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63 3o Trimestre de 2011 –

(b) Rede Neuronal Artificial

- SÍMBOLOS

ak(x)função de ativação gaussiana para a camada escondida de rede neuronal de funções de

bases radiais

c centro da função de ativação gaussiana de rede neuronal de funções de bases radiais

ck

vetor de centros armazenados da função de ativação gaussiana de rede neuronal de funções

de bases radiais

ckP

centro do vizinho mais próximo da função de ativação gaussiana de rede neuronal de funções

de bases radiais

cik

elementos do vetor de centros armazenados da função de ativação gaussiana de rede neuro-

nal de funções de bases radiais

∇E gradiente para calcular a direção de busca

E erro global da rede neuronal

Ep erro para cada padrão de treinamento “p” apresentado à rede neuronal

ƒ(•) quando referida a um neurônio denota função de ativação ou função de transferência

ƒpj função de ativação gausiana

i número índice

j designação do j-ésimo neurônio de uma camada k+1

k designação da camada de unidades neuroniais anterior à camada k+1

K+1 designação da camada de unidades neuroniais seguinte

L número de neurônios na camada escondida nas redes neuronais de função de bases radiais

L camada de saída da rede neuronal

M unidades de soma lineares da camada de saída de rede neuronal de funções de bases radiais

nh número de neurônios na camada escondida

ni número de neurônios na camada de entrada

nk número de neurônios na camada “k”

nL número de neurônios na camada de saída

N dimensão do vetor de entradas nas redes neuronais de função de bases radiais

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64 – 3o Trimestre de 2011

(b) Rede Neuronal Artificial

- SÍMBOLOS

Np número total de padrões de treinamento

p padrão de treinamento

P número de vizinhos mais próximos ckp nas redes de bases radiais

s saída predita pela rede neuronal

s direção de busca para otimização ou saída da rede neuronal

sk direção de busca na iteração k

sk+1 direção de busca na iteração k+1

sp saída predita pela rede neuronal para o padrão de treinamento “p”

so direção inicial de busca para otimização

spi,k saída ou ativação de um neurônio “i” da camada k, para um padrão “p”

Spj,k+1 resposta do j-ésimo neurônio de acordo com a função de ativação oriunda da camada k+1

Spj,L

resposta do j-ésimo neurônio de acordo com a função de ativação oriunda da camada de

saída

SpnL,L sinal de saída de um neurônio “L” na camada de saída

t saída alvo

tpl saída alvo de um neurônio “l” da camada de saída, para um padrão “p”

w forma vetorial das variáveis independentes de otimização (pesos e biases)

w0

forma vetorial das variáveis independentes de otimização nas condições iniciais (pesos e

biases)

wk forma vetorial das variáveis independentes de otimização (pesos e biases) na iteração k

wk+1 forma vetorial das variáveis independentes de otimização (pesos e biases) na iteração k+1

wjik peso entre o neurônio “j” da camada “k+1” e o neurônio “i” da camada anterior

wkj

fator peso entre a saída da camada escondida e a camada de saída de rede neuronal de

funções de bases radiais

x vetor de entradas nas redes neuronal de função de bases radiais

yj camada de saída de rede neuronal de funções de bases radiais

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65 3o Trimestre de 2011 –

(b) Rede Neuronal Artificial

- SÍMBOLOS

- SÍMBOLOS GREGOS

ε termo de momento

η taxa de aprendizagem

θj

limite interno de ativação do j-ésimo neurônio na camada de saída para redes de bases radiais

(bias)

θj,k+1 limite interno de ativação do j-ésimo neurônio na camada k+1 (bias)

θj,L limite interno de ativação do j-ésimo neurônio na camada de saída (bias)

λj,k+1 nível de ativação do j-ésimo neurônio

λpj,k+1 nível de ativação do j-ésimo neurônio para um padrão de treinamento na camada k+1

λpj,L nível de ativação do j-ésimo neurônio para um padrão de treinamento na camada de saída

µji Centro da função de ativação gaussiana

ξ função degrau linear

σj fator escala para redes de bases radiais

σk fator escala para redes de bases radiais

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66 – 3o Trimestre de 2011

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLASAI Inteligência artificial (Artificial Intelligence)

ANN Artificial neural networks

Bias Limite interno de ativação de uma unidade neuronal

BP retropropagação (backpropagation)

CER velocidade de produção de gás carbônico

Entner-Doudorof Rota metabólica empregada por Zymomonas mobilis para fermentação alcoólica

FeedforwardDiz-se das RNA cuja alimentação de dados históricos seguem do início para o final para

frente

GRNN Rede neuronal de regressão generalizada (general regression neural network)

MLP Perceptron muticamada (multilayer perceptron)

MLST Modelo de séries temporais lineares

PNN Rede neuronal probabilística (probabilistic neural network)

PSP Função potencial pós-sináptico

RBF Função de bases radiais (radial of bases function)

RMS Raiz da distância média dos quadrados

RNA Rede(s) neuronal(ais) artificial(ais) ou Rede neural artificial ≡ ANN

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento de modelo avançado para monitoramento de biorreator, otimização e estratégia de controle é algumas vezes condicionado pela etapa de modelagem. Nesse contexto, os modelos para bioprocessos são freqüentemente simplificados em demasia, particularmente no que concerne à descrição de subsis-temas de populações celulares (Oliveira, 2004).

Essa tendência de utilização de modelos mais simples em detrimento aos mais complexos está de acordo com a filosofia permanente no campo da mode-lagem matemática, onde se busca sempre o modelo mais simplificado que possa representar convenientemente o processo, evitando a demanda de tempo em sua formulação e a exigência de esforço computacional excessivo (Boareto, 2005).

Não obstante, a busca da simplicidade ao modelar traz ambigüidade entre os conceitos do modelo eficiente e do modelo simples (Boareto, 2005). Deste modo, Oliveira (2004) constata que para alguns processos estacionários, modelos sim-ples podem produzir resultados com acurácia suficiente, contudo, para processos operados em batelada alimentada - altamente dinâmicos, negligenciar a estrutura intracelular e a heterogeneidade celular resultará invariavelmente em insuficiente estimação ou capacidade de predição do modelo. Coelho (2001) também verificou a possibilidade de discrepâncias entre a predição do modelo e os dados expe-rimentais, devido à grande complexidade e incerteza características dos biopro-

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cessos reais. Tal complexidade e incerteza são inerentes à descrição das taxas cinéticas, geralmente representadas por expressões semi-empíricas que procuram abarcar fenômenos de inibição por substrato e produtos, repressão catabólica e limitação por substrato.

Assim, o mais importante elemento na modelagem matemática de proces-sos fermentativos é definir a estrutura do modelo, que implica em especificar sua complexidade e, deste modo, tem-se como regra que o modelo seja “tão simples quanto possível, mas não o mais simples” (Nielsen, 2003). Essa regra implica que os mecanismos básicos sejam sempre incluídos e que a estrutura do modelo seja determinada por seu objetivo.

Na segunda e terceira parte desta revisão bibliográfica serão abordados os modelos matemáticos mais comumente citados na literatura atinente a bioproces-sos, ou seja, os fenomenológicos (mecanicista), as RNA, os cibernéticos e os hí-bridos.

Nesta segunda parte, são descritos os modelos mecanicistas e as RNA. As metodologias de cada modelo acima nominado são descritas, apresentando as definições mais importantes, discorrendo sobre as aplicações conforme citado na literatura pertinente, bem como um exemplo de aplicação é mostrado. Ademais, as principais vantagens e limitações de cada técnica são discutidas. Para as RNA abordam-se também os fundamentos dos modelos neuronais, os métodos de trei-namento para as redes MLP e RBF. As redes de arquitetura perceptron multica-mada, função de bases radiais, lineares, bayesianas (neuronais probabilísticas e neuronais de regressão generalizada), mais utilizadas na Engenharia Química, têm suas principais aplicações enunciadas.

MODELO MECANICISTA

O termo designativo mecanicista – do inglês mechanicist – refere-se à dou-trina do mecanicismo, a qual admite que determinado conjunto de fenômenos, ou mesmo toda a natureza, se reduz a um sistema de determinações mecânicas. Con-cebe, ainda, o movimento como determinado por lei causal rigorosa, negando todo o tipo de finalismo ou de qualidade oculta para a determinação dos fenômenos naturais (Ferreira, 1975). Esses modelos também são designados como fenome-nológicos, por descreverem os fenômenos do sistema empregando equações ma-temáticas. Patnaik (2009a) trata o modelo mecanicista como modelo convencional.

Os modelos mecanicistas utilizam sistemas de equações diferenciais e algé-bricas, exigindo conhecimento amplo e geral sobre o sistema a ser modelado.

Oliveira (2004) verificou que freqüentemente modelos celulares não estrutu-rados e não segregados são as únicas opções de escolha para a modelagem ma-temática de processos biotecnológicos, seja pela falta de conhecimento básico ou pela complexidade excessiva dos processos biotecnológicos. Nesta mesma linha, Coelho (2001) relatou que o levantamento de modelos estruturados é dependente de um grande conhecimento sobre o metabolismo do microrganismo e, por esta ra-zão, os modelos não estruturados têm sido mais utilizados para propósitos práticos.

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Jöbses (1986) propôs um modelo estruturado em dois compartimentos con-siderando a célula dividida em compartimentos contendo grupos específicos de macromoléculas (por exemplo, proteínas, DNA e lipídios).

Montesinos (1997) desenvolveu um modelo matemático estruturado acoplado com uma metodologia para estimação de variáveis de estado e parâmetros para aplicação no processo de produção de lipase por Candida rugosa para operação em batelada e contínuo, apresentando resultados satisfatórios.

Daugulis (1997) relatou a proposição recente de diversos modelos para repre-sentar o comportamento oscilatório de Zymomonas mobilis em processos contínu-os de produção de etanol. Neste contexto citou o modelo proposto por Ghommidh (1989), que posteriormente foi expandido por Jarzebski (1992) pela inclusão de limitação de substrato e inibição pelo produto, conceituando a população celular em três estados: (1) células viáveis – com capacidade de reprodução e produção de etanol; (2) células não viáveis – capazes de produzir etanol, mas sem capa-cidade de reprodução; e (3) células mortas – incapazes de reproduzir e produzir etanol. Assim, com equações de balanço de massa apropriadas, o modelo foi hábil para representar o comportamento oscilatório dos dados experimentais obtidos. No entanto, os experimentos necessários para a determinação do estado das células consumiam muito tempo.

Freire (1999) propôs um modelo não estruturado para a representação do processo de produção de lipase por Penicillium restrictum em um fermentador ope-rado em descontínuo. O autor relatou que a produção de enzima por Penicilliun apresenta alguns desafios para a modelagem matemática devido a mudanças na morfologia da biomassa que ocorrem durante o cultivo e as complexas característi-cas reológicas do caldo fermentativo, além de outros fatores interferentes.

Um modelo matemático que representasse o processo de síntese de éster em um sistema bifásico usando lipase imobilizada de Mucor circinelloides foi desen-volvido por Antezak (2001). Os resultados obtidos pelos autores mostraram que a proposta de um modelo matemático não estruturado respondeu com alta precisão o rendimento de síntese de éster.

Segundo Pinheiro (2005) muitos relatos de comportamentos oscilatórios em fermentação contínua podem ser encontrados na literatura. Destacam que a maior parte do fenômeno oscilatório está associada com Saccharomyces cerevisiae e Zymomonas mobilis. Ainda segundo os autores, o modelo matemático mais desen-volvido foi o proposto por Li (1995 apud Pinheiro, 2005).

Ranzan (2009) fez uma revisão sobre modelos matemáticos propostos na literatura para fermentações contínuas empregando Zymomonas mobilis e glicose como substrato, referindo-se aos modelos propostos por Jöbses (1986), Ghom-midh (1989), Jarzebski (1992) e Daugulis (1997). Por fim, fez análise detalhada dos modelos estudados por Jöbses (1986) e Daugulis (1997) utilizando análise de bifurcação.

No esforço de modelagem em seu trabalho, Camêlo (2009) implementou o modelo fenomenológico de Daugulis (1997) para representar o comportamento os-cilatório exibido no processo de produção de etanol quando do emprego de Zymo-monas mobilis. A autora relatou dificuldade em estimar parâmetros, mesmo pelo emprego de diferentes técnicas. Nesta condição, sugeriu uma determinação mais

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precisa dos fatores que desencadeiam as oscilações, levando em conta a rota bio-química da bactéria Zymomonas mobilis e, assim, redefinir os parâmetros mais importantes.

Daugulis (1997) sugeriu um modelo mecanicista não estruturado, baseado nas variáveis macroscópicas de processo, tais como concentração celular, consu-mo de substrato e formação de etanol. Para tanto, analisou prévios trabalhos de Li (1995) com Zymomonas mobilis. Então, para proceder à modelagem, basearam-se na constatação de que o efeito inibitório histórico da concentração de etanol (etanol produzido no processo) era insignificante, enquanto o efeito de inibição provocado por uma taxa ascendente de variação na concentração de etanol (etanol exógeno adicionado) era bastante intenso. Desta forma, ao reconhecer que as células são incapazes de responder instantaneamente às mudanças no seu ambiente, o autor postulou a existência de um “atraso” a ser considerado entre o momento no qual as células sofrem uma mudança em seu ambiente reacional e o momento no qual há sua resposta metabólica efetiva. Este modelo proposto por Daugulis (1997) consta de três equações diferenciais estabelecidas do balanço de massa, duas equações diferenciais resultantes da diferenciação de Z (t) e W (t) em relação a t, oito equa-ções algébricas e mais uma função tangente hiperbólica, conforme descrito abaixo:

Taxa de crescimento celular:

(Eq. 1)

Taxa de consumo de substrato:

(Eq. 2)

Taxa de formação de produto:

(Eq. 3)

Derivada da média ponderada da taxa de mudança de concentração de etanol de 2ª ordem:

(Eq. 4)

Derivada da média ponderada da taxa de mudança de concentração de etanol de 1ª ordem:

(Eq. 5)

Média ponderada da taxa histórica de mudança da concentração de etanol de 2ª ordem:

(Eq. 6)

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O tempo histórico (τ):

(Eq. 7)

Onde é tempo no passado quando ocorre a mudança na concentração de etanol, a qual causa a mais significativa influência na performance da célula (h) no tempo atual “t” (h).

Peso para a taxa histórica de mudança da concentração de etanol:

(Eq. 8)

Função hiperbólica continuamente diferenciável, para aproximar o efeito de Z(t) sobre o crescimento celular:

.....[adimensional] (Eq. 9)

Média ponderada da prévia taxa de variação da concentração de etanol de 1ª ordem:

(Eq. 10)

Peso para a taxa histórica de mudança da concentração de etanol de 1ª or-dem:

(Eq. 11)

Taxa dinâmica específica de crescimento relacionada à taxa instantânea es-pecífica de crescimento pelo fator de inibição:

] (Eq.12)

Velocidade específica de crescimento celular, com inibição pelo produto e pelo substrato

(Eq. 13)

(Veeramallu, 1990):A taxa específica de produção:

(Eq. 14)

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Camêlo (2009) estudou o comportamento dinâmico das principais variáveis de estado (concentração celular, decaimento de glicose e formação de etanol) em fermentação alcoólica catalisada por Zymomonas mobilis, tendo glicose como substrato. Para seu estudo, a autora empregou análise de bifurcação e o modelo mecanicista proposto por Daugulis (1997).

Ao estudar o modelo de Daugulis (1997), Camêlo (2009) considerou que a taxa específica de produção (Qp) retirada da literatura (Lee, 1983; Luong, 1985 apud Daugulis, 1997), vincula totalmente o consumo de glicose à produção de eta-nol, não considerando parte do consumo para o crescimento celular, estando em desacordo com a rota de Entner-Doudoroff, o que segundo a autora, não permitiu o ajuste do modelo implementado em sua pesquisa.

No prosseguimento de seu estudo e face ao não ajuste do modelo mecanicis-ta empregado, Camêlo (2009) formulou também modelos lineares (MLST – Modelo de Séries Temporais Lineares) para aplicações de monitoramento e controle, em-pregando os dados on line de concentração celular obtida, considerando a ferra-menta útil para predição do comportamento oscilatório.

Essa série de fatores complicadores para a modelagem matemática de bio-processos, descrita nos parágrafos anteriores, comumente acarretam a inserção de grande quantidade de parâmetros de ajuste – na maioria das vezes difíceis de estimar, além do acoplamento do sistema de equações, tornando sua solução difí-cil e por muitas vezes impossível para a precisão requerida (Boareto, 2005). Esta dificuldade de estimação pode estar relacionada aos efeitos correlacionados advin-dos do grande número de parâmetros, o que torna alguns desses parâmetros não significativos estatisticamente.

Embora o desenvolvimento de modelos matemáticos apropriados que possi-bilitem a simulação, otimização e implementação de malhas de controle do proces-so seja altamente desejável, a literatura científica reporta que o desenvolvimento de modelos matemáticos fenomenológicos simples com acurácia suficiente para a descrição de bioprocessos é uma tarefa difícil, dada a sua alta não linearidade e complexidade (Glassey, 1994; Hussain, 1999; Henriques, 1999; Zorzetto, 2000; Vlassides, 2001; Patnaik, 2003; Oliveira, 2004).

Modelos mecanicistas (convencional) de sistemas microbianos são derivados da analogia com reações químicas. No entanto, falham ao retratar algumas carac-terísticas da dinâmica microbiana, as quais diferem das observadas nas reações químicas. Além disso, a interação entre a fluidodinâmica e o metabolismo cria novo modelo de comportamento celular, o qual é dificilmente descrito por modelos feno-menológicos. Essas dificuldades são mais pronunciadas para fermentações com-plexas em biorreatores grandes, onde mais de um substrato é usado e apresenta homogeneização não uniforme (Patnaik, 2009a).

Assim, dada a limitação da aplicação de modelos fenomenológicos à biopro-cessos que exijam maior complexidade em sua descrição, a literatura descreve ou-tras ferramentas empregadas separadamente ou combinadas. Abaixo, encontram--se descritas algumas delas, tais como RNA.

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REDES NEURAIS ARTIFICIAIS: INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

O paradigma das RNA (Artificial Neural Netwokrs - ANN) é resultante de pes-quisas em Inteligência Artificial (AI - Artificial Intelligence), as quais tentam aprender e modelar o comportamento do cérebro. Neste contexto, existem três principais ramos da AI, quais sejam: sistemas especialistas, redes neuronais e sistemas de lógica Fuzzy (Haykin, 1999; Baughman, 1995).

Na literatura, como nomenclatura na língua portuguesa, ANN são designa-das comumente como “Redes Neurais Artificiais”, “Redes Neuronais Artificiais” ou “Redes Neuroniais Artificiais” (RNA). Sem entrar no mérito da discussão sobre a nomenclatura mais apropriada, cumpre relatar que o Dicionário Aurélio Buarque de Holanda Ferreira descreve o termo “NEURAL” como sendo relativo a ou próprio de nervo; o termo “NEURONIAL” - correspondente a neurônico, como relativo ou per-tencente aos neurônios; e o termo “NEURONAL”, apesar de recorrente na internet, não é encontrado no dicionário consultado (Ferreira, 1975). Neste trabalho as ANN são referidas como RNA.

Os sistemas especialistas operam simbolicamente, numa escala macroscó-pica, processando símbolos não numéricos e nomes. Requerem o conhecimento das relações e não se atêm a como essas relações se desenvolvem (Haykin, 1999; Baughman, 1995). Ainda, segundo De Souza Jr. (2001), nesse processamento sim-bólico, o conhecimento - conjunto de informações sobre um domínio particular - é extraído e representado simbolicamente por regras.

RNA, por outro lado, usam processamento subsimbólico, caracterizado por interações microscópicas que eventualmente se manifestam como comportamento macroscópico, simbólico, inteligente (Haykin, 1999; Baughman, 1995). De Souza Jr. (2001) complementou quando recorreu à consideração de que nem todas as in-formações captadas pela mente humana são facilmente representadas por regras (processo simbólico). Assim, as redes neuronais surgem como o modo de reprodu-zir esse mecanismo cognitivo onde se consegue reconhecer padrões e caracterís-ticas relevantes em um conjunto de dados.

A lógica Fuzzy surgiu do desejo de quantificar sistemas baseados em regra. O raciocínio baseado em regra é fun-damentado em representação qualitati-va do conhecimento e a lógica “Fuzzy” nos permite uma abordagem quanti-tativa com a representação qualitati-va. Essa abordagem provê um modo para quantificar certos qualificadores tais como aproximadamente, freqüen-temente, raramente, vários, poucos e muitos (Baughman, 1995).

A Figura 1 correlaciona caracte-rísticas dos sistemas especialistas, das RNA e da lógica Fuzzy.

Figura 1 – Correlação de características de sistemas de inteligência artificial. Adaptado de Kosko (1991)

apud Baughman (1995).

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Não obstante, a metodologia da modelagem de bioprocessos por RNA está inserida dentro do campo da modelagem empírica. Essa técnica também é conhe-cida como modelagem “caixa-preta”.

As vantagens das RNA em relação a outras técnicas computacionais podem se descritas como: (a) a informação é distribuída sobre um campo de neurônios, propiciando-lhe maior flexibilidade quando comparada ao processamento simbóli-co; (b) habilidade em aprender frente à situação que provoque imprecisão no siste-ma; (c) habilidade para armazenar uma quantia grande de informação e acessá-las facilmente (knowledge indexing); (d) melhor para processamento de sistemas com ruídos, incompletos ou inconsistentes; (e) imita o processo de aprendizado humano (tentativa e erro); (f) capacidade de determinar automaticamente as relações es-senciais de um conjunto de dados de entrada - saída; (g) potencial para uso on-line pois, apesar de poder requer longo tempo para treinamento para, uma vez treinada, pode calcular o resultado de uma dada entrada com muita rapidez (Baughman, 1995).

Baughman (1995) também apresentou as principais limitações das RNA, den-tre as quais tem-se: (a) pode necessitar de longo tempo de treinamento; (b) neces-sita de grande quantidade de dados para o treinamento (Henriques, 1999); (c) não garante resultados ótimos, pois o treinamento dos biases pode levar a precisão da rede para alguma região de operação, sendo imprecisas em outras regiões. Assim não garante 100% de confiabilidade, vez que está limitada aos dados de treinamen-to, o que, segundo Lennox (2001), pode ser contornado com o procedimento de validação com conjunto de dados distinto dos de treinamento.

Conforme descrito por Linko (1992) e Zorzetto (2000), os modelos desenvol-vidos aplicando técnicas de RNA, também chamados de caixa-preta, não exigem o conhecimento do fenômeno físico envolvido no processo, bastando-lhe apenas os dados experimentais.

Cruz (1998) aplicou separadamente modelos fenomenológicos e RNA para a descrição do processo de produção da Cefalosporina C com Cephalosporium acre-monium, discorrendo sobre a viabilidade de aplicação de técnicas de RNA para o monitoramento, detecção de falhas e simulação, haja vista o comportamento não li-near do processo ter sido descrito de forma adequada por essa ferramenta compu-tacional. Em sua conclusão verificou que, apesar de ambos os modelos (neuronal e fenomenológico) terem descrito satisfatoriamente as características principais do processo, a rede neuronal se sobressaiu ao dispensar a difícil etapa de estimação de inúmeros parâmetros de ajuste.

Henrique (2000) relatou que RNA têm sido intensivamente utilizadas em apli-cações de Engenharia Química. Assim, desenvolveu em seu trabalho metodologia para identificar e eliminar parâmetros redundantes e insignificantes que aumentam a complexidade das redes e diminuem sua acurácia.

Segundo Lennox (2001), uma vez que o desempenho dos algoritmos para monitoramento e controle de processos é dependente da precisão dos modelos utilizados em seu interior, as RNA têm potencial para prover benefícios a esses al-goritmos quando aplicados a sistemas não lineares. Este autor obtiveram sucesso

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quando aplica as RNA em seu trabalho para a modelagem, monitoração e controle de processos.

Vlassides (2001) empregou uma rede neuronal artificial para a análise senso-rial de vinhos. A rede treinada foi de topologia feedforward com uma camada escon-dida - empregando função de ativação sigmoidal, e funções de ativação linear para as demais camadas. O autor observou que a rede neuronal estudada foi capaz de predizer os atributos químicos e sensoriais do vinho.

Komives (2003) discutiu que modelos empíricos podem variar de muito sim-ples - para a estimação de simples variável fundamental, a muito complexo - para a estimação e controle do estado total do processo. Observam também que, dada à imprecisão na predição dos dados de saída, quando as RNA são empregadas fora do domínio dos dados históricos usados no treinamento (espaço amostral), não apresentam boa propriedade de extrapolação; há, portanto, dificuldade de va-lidação deste método para processos farmacêuticos. No entanto, Linko (1992) e Glassey (1994) obtiveram anteriormente resultados satisfatórios com a utilização de modelos estruturados em técnicas de redes neuronais para estimação e pre-dição no controle de fermentação de glucoamilases e supervisão de bioprocesso de Escherichia coli recombinante, respectivamente. Esses resultados significati-vos aplicando modelos baseados nos princípios de RNA, segundo os autores, são oriundos da habilidade das redes neuronais em aprenderem relações não lineares complexas sem requerer detalhado conhecimento do processo, o que as tornam viáveis para condições de comportamento pouco conhecido, que, aliás, são deve-ras recorrentes em processos biotecnológicos. Nessa mesma linha Hussain (1999) relatou que considerando o potencial das redes neuronais em aprender pelo exem-plo, elas oferecem um método de custo aceitável para o desenvolvimento de mode-los de processos úteis. Cita ainda que elas também têm a habilidade de aprender comportamento dinâmico freqüentemente complexo de um sistema físico.

Boareto (2006) desenvolveu uma rede do tipo Percptron Multicamadas (MLP) para a representação de processo produtivo de lipase em batelada alimentada. Concluiu ser a rede adequada para a descrição da produção de lípase e além disso discorreu sobre a possibilidade de sua aplicação como sensor virtual ao longo de uma fermentação, fornecendo - a partir de informações da taxa de formação de gás carbônico (CER), biomassa e vazão de alimentação de substrato – predição da ati-vidade das enzimas, sendo também apropriado para emprego no desenvolvimento de modelos híbridos-neuronal/fenomenológico.

Fundamentos dos modelos neuronaisExiste um número variado de tipos de RNA que podem ser aplicadas para a

modelagem de bioprocessos, sendo definidas por sua topologia e pela anatomia de seus neurônios. Conforme o tipo de RNA empregada, o método de aprendizado é definido (Lennox, 2001).

RNA multicamadas são compostas por seqüências de neurônios justapos-tos em camadas - entrada, escondida e saída - e interligados entre si por interco-nexões. Os neurônios constituem as unidades de processamento matemático da rede. A forma como os neurônios estão interconectados define sua topologia ou

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arquitetura (Baughman, 1995; Haykin, 1999; De Souza Jr., 2003).Como exemplo pode-se citar o emprego de RNA de topologia multicamada

com conexões feedforward, contendo três camadas, quais sejam, uma camada de entrada, uma camada escondida e uma camada de saída. Nas redes interca-madas a saída de um neurônio alimenta a entrada do neurônio da outra camada e na conexão feedforward os sinais se propagam para frente (De Souza Jr., 2003; Lennox, 2001; Baughman, 1995). A Figura 2 apresenta esquematicamente a RNA em questão.

Figura 2 - RNA de topologia multicamada, com conexões feedforward contendo três camadas (Baughman, 1995).

Definida a topologia da rede, o funcionamento de um neurônio numa rede multicamada pode ser estudado.

Um neurônio “j” qualquer da camada “k+1” recebe um conjunto de informa-ções “Spi,k”, onde i=l,...nk - correspondentes às saídas ou ativações dos “nk” neurô-nios da camada anterior - ponderadas, cada uma, pelo peso “wjik” correspondente a sua conexão. O neurônio soma essas entradas ponderadas e o valor resultante é comparado a um limite interno de ativação, chamado de bias representado por “ ”. O resultado dessa comparação constitui o nível de ativação “ ” do j--ésimo neurônio, o qual, então, produz uma resposta “Spj,k+1” de acordo com uma função de ativação “ ” (De Souza Jr. 1993; Baughman, 1995; Haykin, 1999). A Figura 3 esquematiza o j-ésimo neurônio descrito.

Figura 3 - J-ésimo neurônio da camada k+1.

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Os termos apresentados na Figura 3 são especificados a seguir.As entradas do j-ésimo neurônio são ponderadas conforme descrito pela

equação 15:

(Eq. 15)

O nível de ativação do j-ésimo neurônio é definido por:

(Eq. 16)

A equação que descreve como uma função de ativação aplicada ao ní-vel de ativação do j-ésimo neurônio é dada a seguir:

(Eq. 17)

Segundo Bakshi (1993), dois tipos de funções de ativação são comumente usadas para a ativação dos neurônios: global e local. As funções de ativação glo-bais produzem uma saída ativa para um amplo intervalo de valores de entrada, e fornecem uma aproximação global para os dados empíricos. As funções de ativa-ção locais são aquelas que produzem uma saída ativa apenas na vizinhança ime-diata dos seus dados de entrada, ou seja, na vizinhança do seu centro de ativação.

A topologia definida para a RNA, bem como a função de transferência aplica-da no nível de ativação dos neurônios, define o tipo de rede. As funções de ativação estão descritas abaixo (Baughamn, 1995; Haykin, 1999; De Souza Jr., 2001).

As funções de ativação globais podem ser:Função linear:

(Eq. 18)

Função degrau limiar:para: (Eq. 19)

para: (Eq. 20)

Função de ativação sigmoidal:

(Eq. 21)

Função de ativação tangente hiperbólica:

(Eq. 22)

A função de ativação local é:

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Função de ativação gausiana:

(Eq. 23)

Portanto, como será detalhado à frente, as funções de ativação globais do tipo sigmoidal e tangente hiperbólica são aplicáveis para as redes do tipo MLP (Multi-layer Perceptron) chamadas de Perceptron multicamada. A função de ativação local do tipo gausiana é aplicável para redes do tipo RBF (Radial of Bases Function) cha-mada redes de função de bases radiais ou simplesmente redes de bases radiais.

Tipos de RNADentre as inúmeras arquiteturas de RNA existentes, Baughman (1995), Karim

(1997) e De Souza Jr. (2003) apresentaram as mais comuns no universo da Enge-nharia Química: (a) Rede Perceptron Multicamadas: é a arquitetura de redes mais popular. Usa uma função PSP (potencial pós-sináptico) linear e, usualmente, uma função de ativação não-linear. Rede do tipo MLP pode ser usada em problemas de regressão e em problemas de classificação. (b) Função de Bases Radiais: tem uma camada de entrada, uma camada escondida de unidades radiais e uma camada de saída de unidades lineares. Redes RBF são utilizadas tipicamente para problemas de diagnóstico de falhas e classificação. Treinam relativamente rápido, no entanto, tendem a serem maiores que as MLP e, portanto, executam mais devagar. (c) Re-des lineares: têm apenas duas camadas. Uma camada de entrada e uma de saída, a última tendo funções PSP de ativações lineares. (d) Redes Bayesianas: há 2 tipos de redes bayesianas: Redes Neuronais Probabilísticas (PNN) e Redes Neuronais de Regressão Generalizada (GRNN). (d1) As PNN que são usadas apenas para tarefas de classificação e têm três ou quatro camadas. Há uma camada de entrada, uma camada de unidades radiais, e uma camada de unidades de classificação line-ar. (d2) As GRNN, empregadas apenas para tarefas de regressão, têm exatamente quatro camadas: uma camada de entrada, uma camada de centros radiais, uma ca-mada de unidades de regressão, e uma camada de saída. (e) Redes Mapeamento Auto Organizável de Características: têm uma camada de entrada e uma camada de saída de unidades radiais. São usadas principalmente para fins de classificação, como exemplo as redes treinadas pelos métodos de Kohonen.

Método de treinamento de RNAOs métodos de treinamento são divididos basicamente em supervisionados e

não supervisionados (Baughman, 1995; Haykin, 1999; De Souza Jr., 2001).Nos métodos supervisionados, existe um “professor” que orienta o aprendi-

zado. Para tanto, padrões com dados de entrada e saída (dados históricos) são apresentados à rede, de modo que ela modifica as suas interconexões (pesos e biases) a fim de obterem uma saída alvo.

Já nos métodos não supervisionados, a rede é apresentada aos dados, des-

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cobre alguma propriedade e aprende a refleti-la nas suas saídas. Não existe o “pro-fessor”, ou seja, não há o conjunto de dados de entrada e saída para determinar o comportamento da rede. A RNA é autônoma.

As redes MLP podem ser treinadas por um dos seguintes algoritmos subpervi-sionados: Gradiente Conjugado Descendente, Quasi-Newton, Levenberg-Marquar-dt, Back Propagation, Quick Propagation ou Delta-bar-Delta (De Souza Jr., 2001).

As redes RBF são treinadas em três estágios: (a) Localização de centros - Os centros armazenados em uma camada escondida radial são otimizados primei-ramente, (tipicamente) usando técnicas de treinamento não supervisionadas. Os centros podem ser localizados pelos algoritmos: Sub-Sampling, K-means, treina-mento Kohonen, ou Learned Vector Quantization. Estes algoritmos estabelecem os centros para refletir o agrupamento dos dados. (b) Estabelecimento dos desvios - O espalhamento dos dados é refletido nos desvios radiais (armazenados no bias). Os desvios podem ser estabelecidos pelos algoritmos Explicit, Isotropic e K-nearest neighbor. (c) Otimização linear - Uma vez estabelecidos os centros, a camada de saída linear é usualmente otimizada usando a técnica Pseudo-Inverse (otimização por mínimos quadrados). Pode-se também usar Gradiente Conjugado Descenden-te, Quasi-Newton, Levenberg-Marquardt, Back Propagation, Quick Propagation, ou Delta-bar-Delta. Alternativamente, uma RBF usada para classificação pode usar funções de erro de entropia e funções de ativação logística ou softmax. Neste caso, algoritmos de treinamento iterativos devem ser usados.

Treinamento de RNA pelo método de retropropagaçãoAo se tentar reproduzir os mecanismos de cognição humanos, treinam-se as

redes neuronais pelo uso de exemplos. Entre os métodos de treinamento das RNA, o da retropropagação se destaca pela simplicidade e larga utilização (De Souza Jr., 1993).

O método de retropropagação, dentre todos os métodos de treinamento de redes neuronais, tem sido desde a sua concepção o mais comumente utilizado (Karim, 1997; De Souza Jr., 2001).

O objetivo do treinamento por retropropagação é ajustar os pesos e biases da rede, modificando-os até que a aplicação de um conjunto de entradas produza a saída da rede que corresponda às saídas desejadas ou alvos. Para isso, apre-sentam-se muitos exemplos de dados históricos à RNA. Treinar a rede, neste caso, corresponde a minimizar a função objetivo não linear que dá o erro entre as saídas “s” - preditas pela rede - e as saídas alvos “t” para “Np” padrões em função dos pe-sos e biases, que são as variáveis independentes de otimização. A fundamentação matemática do método encontra-se descrita em diversas referências (Baughman, 1995; De Souza Jr., 1993; Haykin, 1999).

Fonseca (1998) descreveu a metodologia da técnica de treinamento por retro-propagação, abordando os conceitos e, do ponto de vista de otimização, a função objetivo com a condição necessária para o mínimo, além de variantes do método. Os itens a), b) e c) a seguir apóiam-se em sua descrição.

a) Conceitos sobre retropropagação

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Segundo De Souza Jr. (1993), as redes treinadas pelo método backpropa-gation são multicamadas, não apresentam conexões laterais (entre neurônios da mesma camada) e os seus sinais são feedforward, ou seja, dado um vetor de en-trada, o vetor de saída é calculado em um passo do tipo para frente (forward) que calcula os níveis de atividade de cada camada por vez, usando os níveis de ativi-dade já computados nas camadas anteriores.

Para as redes feedforward, esse método calcula o gradiente do erro, aplican-do de uma maneira direta a regra da cadeia do cálculo elementar, como será visto adiante. Logo, as funções de ativação dos neurônios da rede precisam ser funções continuamente diferenciáveis.

Várias funções não lineares podem ser usadas no método, sendo a sigmoi-dal (Equação 21) a mais empregada (Grossberg, 1976; Hopfield, 1984; Rumelhart, 1986). Há também resultados na literatura (Hecht-Nielsen, 1989) que provam que qualquer função contínua pode ser aproximada para qualquer grau de acurácia usando uma rede neural backpropagation com três camadas, desde que exista um número suficiente de neurônios sigmoidais na camada escondida.

Com essa motivação, Fonseca (1998) adotou no desenvolvimento de seu tra-balho a função sigmoidal como função de ativação dos neurônios internos. A deri-vada “f´(x)” da função sigmoidal “f” em relação a “x” - aqui “x” representando um peso ou um bias - é dada por:

(Eq. 24)

O padrão de redes treinadas por retropropagação mais popular atualmente emprega apenas uma camada escondida.

b) Descrição do método pelo ponto de vista de otimizaçãob.1) Função objetivo e condição necessária para mínimoA Figura 4 apresenta uma rede neuronal feedforward com três camadas com

os pesos e os biases das interconexões e neurônios.Treinar a rede, neste caso, corresponde a minimizar a função objetivo não

Figura 4 - Rede neuronal feedforward com 3 camadas (De Souza Jr., 1993).

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linear (Equações 25 e 26) que dá o erro entre as saídas “t” - preditas pela rede, e as saídas alvos “t” para “Np” padrões - adotando a nomenclatura de De Souza Jr. (1993), explicitada na Figura 4 - em função dos pesos e dos biases, que são as variáveis independentes de otimização (W na forma vetorial):

(Eq. 25)

onde:

(Eq. 26)

Os métodos de otimização multidimensional indiretos - que usam a informa-ção do gradiente para calcular a direção de busca - empregam a condição neces-sária para um ponto extremo (Edgar, 1988):

( ) E W 0∇ = (Eq. 27)O cálculo do gradiente da função objetivo em relação aos pesos e aos biases

será apresentada posteriormente, pois antes é preciso apresentar toda a nomen-clatura para os sinais da rede.

No método retropropagação padrão, Rumelhart (1986) minimizou a função objetivo (Equação 26) usando a estratégia de otimização do gradiente descenden-te, na qual a direção local da busca é o negativo do gradiente, com tamanho do passo fixo “η” (“η” é chamado, neste contexto, “taxa de aprendizagem”). Assim, para a k-ésima iteração:

(Eq. 28)

onde “η” é positivo e, geralmente tem magnitude menor que 1 (De Souza Jr., 1993).

Os passos de um treinamento por retropropagação são compostos de duas fases: na 1ª fase a entrada “sp” é apresentada e propagada para frente através da rede, até computar os sinais de saída “ ” que são comparados com as saídas alvos “tpl”, obtendo-se um erro; na 2ª fase em que o erro “Ep” é propagado para trás e os pesos vão sendo atualizados (De Souza Jr., 1993). Essas duas fases são apresentadas a seguir. Porém, antes de aplicá-las deve-se inicializar os pesos das interconexões e os biases com números aleatórios pequenos, de modo a evitar problemas como simetria (que haveria caso se começasse com pesos iguais) e saturação (produzida por pesos grandes). Rumelhart (1986) adotou pesos iniciais aleatórios no intervalo entre -1 e 1.

b.2) Fase 1: passagem para frente (forward)Para cada padrão “p” (p=1,2,...,Np), tem-se um conjunto de entradas “Spj,0” (j=1,2,...

ni) - onde “ni ” corresponde ao número de neurônios na camada de entrada - e um conjunto de saídas desejadas “tpl” (l=1,2,...nL) - onde “nL” corresponde ao número de neurônios na camada de saída. Apresenta-se um padrão “p”, por vez, à rede.

A descrição da varredura da rede pelos sinais é enumerada abaixo:

η

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(1) A passagem pela primeira camada de neurônios produz as seguintes ati-vações:

(Eq. 29)

onde j=1,2,...,ni, e “f” é dada pela função de ativação sigmoidal (Equação 21);(2) Na saída da camada escondida têm-se as seguintes ativações:

(Eq. 30)

(Eq. 31)

onde j= 1, 2,...nh; tal que “f” é dada pela função de ativação sigmoidal (Equação 21) e “nh ” corresponde ao número de neurônios na camada escondida;

(3) Na saída da rede tem-se:

(Eq. 32)

(Eq. 33)

onde j= 1, 2,...nh; tal que “f” é dada pela função de ativação sigmoidal (Equa-ção 21).

b.3) Fase 2: propagação do erro para trás (backpropagation)O erro obtido na saída da rede é propagado para trás para atualizar os pesos

e os biases. Primeiro corrigem-se os valores dos pesos entre a camada escondida e a camada de saída e depois, entre a camada escondida e a camada de entrada (Bhat, 1990). Como afirmado anteriormente, isto é feito pelo método gradiente des-cendente (Equação 28) no caso do método retropropagação padrão.

Na implementação do backpropagation podem-se atualizar os pesos após a apresentação de cada padrão (aprendizagem por padrão) ou após a apresentação de todos os padrões (aprendizagem por “época” ou “batelada”) (McClelland, 1988; Leonard, 1990). Apresenta-se a seguir o cálculo dos elementos de “ ” (De Souza Jr., 1993).

Para os pesos “wji2” entre a camada escondida e a camada de saída, calcula--se - pela regra da cadeia do cálculo elementar- a derivada:

(Eq. 34)

Para os biases “ ” da última camada, calcula-se também pela regra da cadeia:

(Eq. 35)

Para os pesos “wjil” entre a camada de entrada e a camada escondida, calcu-

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la-se - pela regra da cadeia - a derivada:

(Eq. 36)

onde os valores de “wji2” utilizados são os da iteração anterior (Bhat, 1990).Para os biases “ ” da camada escondida, também, pela regra da cadeia

generalizada, calcula-se:

(Eq. 37)

onde os valores de “wli2” utilizados são os da iteração anterior (Bhat, 1990).Repetem-se os passos das Fases 1 e 2 até que o erro (Equação 25) seja su-

ficientemente pequeno. Logo, enquanto houver diferença entre as saídas da rede e os valores alvos para um dado padrão, essa diferença vai dar um sinal de erro que é propagado de volta (daí o nome retropropagação) pela rede e usado para gerar mudança nos pesos.

Depois do treinamento, a rede está pronta para ser usada. Tem-se, então, apenas a fase em que as entradas passam através da rede “para frente”, corres-pondendo às Equações 29 a 33.

c) Variantes do métodoO método do gradiente descendente com passo fixo, adotado no método por

retropropagação padrão, é ineficiente (Edgard, 1988). Tem-se muita dificuldade de convergência em função da escolha do tamanho do passo fixo “η”. Passos pe-quenos conduzem a uma convergência extremamente lenta - principalmente perto da solução (Watrous, 1987) - e passos grandes, levam a oscilações nas variáveis independentes de otimização (pesos e biases).

Com o intuito de evitar essas oscilações nos pesos, pode-se somar ao lado di-reito da Equação (28) um termo de momento (Rumelhart, 1986; McClelland, 1988).

(Eq. 38)

Todavia, a modificação acima pode não ser suficiente para resolver o proble-ma de oscilações, para “ ” tomado fixo.

Dessa forma, apareceram na literatura vários trabalhos com propostas que objetivavam superar as dificuldades de convergência no treinamento via backpro-pagation.

De Souza Jr. (1993) se deteve longamente na revisão das várias modificações do método por retropropagação, comparando-as e chegando a propor uma nova

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formulação (baseada no método de Newton e na hessiana analítica). Desta forma, o leitor interessado numa lista mais ampla de métodos poderá consultar aquela referência.

Aqui será apresentado apenas o método largamente empregado do gradiente com direções conjugadas (Leonard, 1990), no qual “ ” e “ ” são ajustados dina-micamente. Neste método, a direção de busca “sK+1” na iteração “k+1” é gerada recursivamente como segue:

(Eq. 39)

(Eq. 40)

(Eq. 41)

onde o vetor de pesos “WK+1 ” foi determinado usando-se uma busca unidi-mensional (interpolação quadrática) para “ ” (Edgard, 1988):

(Eq. 42)

Este método - ao fazer os ajustes automáticos de “ ” e “ ”- pode eliminar as oscilações do gradiente descendente com passo fixo, convergindo de forma mais confiável. Isto às custas de apenas uma pequena quantidade adicional de informa-ção (o gradiente da iteração anterior) a ser armazenada (Edgard, 1988).

Método de treinamento para RNA do tipo RBFA camada escondida é a mais importante na rede função de bases radiais.

Seus neurônios atendem a uma única propriedade de ser simetricamente radial (Baughman, 1995).

Baughman (1995), Haykin (1999), De Souza Jr. (2001) e Costa (2005) descre-(2001) e Costa (2005) descre-veram a sistemática envolvida no treinamento de redes RBF, a qual é apresentada na seqüência.

As redes de bases radiais possuem três camadas: uma camada de entrada linear, uma camada escondida não linear e uma camada de saída linear como pode ser visualizado na Figura 5.

Figura 5 - Representação esquemática de uma rede neural de base radial, adaptado de Costa (2005).

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A camada de entrada possui “N” neurônios, onde “N” é a dimensão do vetor de

entradas .As conexões da camada de entrada, que não são ponderadas, conduzem os sinais de entrada para a camada escondida que possui “L” neurônios. São utilizadas funções gaussianas como funções de ativação da camada escondida (Equação 43).

(Eq. 43)

onde k=(1,2...,L).

As funções de ativação (Equação 43) possuem centros, que são denomina-dos “c”. Essas funções possuem um valor máximo em seus centros e decrescem monotonicamente com o aumento da distância verificada em relação ao centro “c”. Assim, cada neurônio da camada escondida é uma função radial, ou seja, cada neurônio da camada escondida possui uma finita região de ativação dada pela fun-ção de ativação gaussiana descrita na Equação 43.

Esta região de ativação é determinada em função da distância Euclidiana ve-rificada entre o vetor de entradas “x” e o seu centro “ck”, ponderada pelo fator de escala designado pela constante “ ”.

A Figura 6 apresenta o comportamento da função de ativação gaussiana, con-siderando um valor fixo para o centro “Ck” do neurônio “L” da camada escondida e diferentes valores para o fator de escala “ ”.Figura 6 - Comportamento da função de ativação gaussiana considerando um valor fixo para “Ck” e diferen-

tes valores para “ck ”.

Os sinais que deixam a camada escondida são conduzidos à camada de sa-ída composta por “M” unidades de soma lineares. Cada conexão entre a camada escondida e a camada de saída possui um peso associado “wkj”.

As RBF não utilizam nenhum valor de saída desejado para que se possa ajus-tar (treinar) as conexões da camada de entrada com a camada escondida.

Para desenvolver a rede RBF, deve-se primeiro determinar os valores dos ve-tores de centros armazenados “ck” com elementos Cik=(i=l,...,N;k=1,...L)” e a largura

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da função gaussiana “ ”.Para obter o valor de centros armazenados “ck ” é utilizado o adaptive K-means

clustering algorithm e para a largura da função gaussiana, “ ”, é utilizado o esque-ma “P-nearest neighbor heuristic”, que é a raiz da distância média dos quadrados (RMS) entre o centro do grupo “ck” e o centro dos “P” vizinhos mais próximos (ckp). A Equação 44 apresenta a forma do cálculo.

(Eq. 44)

Uma vez estabelecidos os centros, os valores da matriz de pesos “wkj” são ajustados utilizando uma técnica de regressão linear Pseudo-inversa (PI) - otimiza-ção por mínimos quadrados, se os neurônios da camada de saída forem lineares, ou o método backpropagation, se forem sigmoidais. A Equação 45 apresenta o cálculo, na camada de saída, onde o fator peso “wkj”, entre a saída do neurônio da camada escondida “ak” e a camada de saída “yj ”, é treinada após o procedimento de agrupamento K-means ter sido completado. Sendo k = (1,2,...L) e j = (1,2,...M) .

(Eq. 45)

Onde “ ” representa a função de transferência de saída dos neurônios e “” os biases internos.

CONCLUSÃO

Na literatura científica encontram-se propostos vários modelos mecanicistas para aplicação em bioprocessos, cuja complexidade varia em função das mudan-ças morfológicas das células, das características reológicas do caldo fermentativo e de inúmeros outros fatores interferentes. Essa mudança de complexidade faz com os modelos variem, de uma forma geral, de não estruturados a estruturados e de não segredados a segregados. Tal fato impõe o aumento do nível de detalhamento do processo, implicando na inserção de equações para a descrição de rotas meta-bólicas, de reações intracelulares e das diversas variáveis abióticas, exigindo, por-tanto, conhecimento mais aprofundado do sistema microbiano, muitas vezes não disponível. Além disso, o aumento do número de equações invariavelmente eleva a quantidade de parâmetros, por vezes de difícil estimação. Esses parâmetros e ou-tros termos estão inseridos em mais de uma equação, ocasionando o acoplamento destas. Assim, o excesso de parâmetros provoca a super-parametrização, condu-zindo à perda da significância estatística desses parâmetros devido ao aumento da correlação na matriz de covariância dos erros. Este evento, associado ao acopla-mento do conjunto de equações leva a dificuldade de convergência, e não poucas vezes, a não convergência para uma solução com a acurácia desejada.

Desta forma, é relatado na literatura científica os óbices para a elaboração de modelos mecanicistas simples com precisão suficiente para representar processos

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biotecnológicos altamente dinâmicos, de elevada complexidade e não linearida-de, onde negligenciar a estrutura intracelular e a heterogeneidade celular resulta invariavelmente em insuficiente capacidade de predição dos mesmos. Contudo, discorre também sobre a adequação de modelos simples em produzir resultados com acurácia suficiente para alguns processos em estado estacionário.

Nesta condição, alternativas de técnicas de modelagem são propostas, cada qual com suas vantagens e desvantagens, adequando-se segundo as característi-cas peculiares de cada processo. Deste modo, nesta segunda parte da revisão são também tratadas as RNA e, na terceira parte, abordam-se os modelos cibernéticos e híbridos, selecionados dentre muitas outras disponíveis.

A rede neuronal artificial é um método de modelagem empírica e está inseri-da no campo da inteligência artificial, usando processamento subsimbólico como proposta de reprodução do mecanismo cognitivo por meio do reconhecimento de padrões e características relevantes em um conjunto de dados. Devido a esta pro-priedade, talvez uma das principais vantagens das RNA seja a de não exigir o conhecimento explicito do fenômeno – físico, químico, bioquímico e etc – envolvi-do no processo, bastando-lhes apenas os dados experimentais para aprenderem relações não lineares complexas implícitas. Essa peculiaridade auxilia em contor-nar a dificuldade em compreender a complexidade e não linearidade dos proces-sos biotecnológicos, tornando-as viáveis para condições de comportamento pouco conhecido. Todavia, as redes apresentam desvantagens, dentre as quais a mais acentuada possa estar relacionada a sua inadequação para extrapolação, tornan-do-se imprecisas quando empregadas fora do domínio de seus dados históricos utilizados no treinamento. As RNA apresentam inúmeras arquiteturas, que definem seu tipo e aplicação mais adequada. Dentre os tipos mais utilizados no universo da Engenharia Química tem-se: (a) perceptron multicamada (MLP), normalmente empregadas em problemas de regressão e de classificação; (b) função de bases radiais (RBF), tipicamente empregadas em detecção de falhas e diagnóstico e tam-bém para classificação; (c) redes lineares, podem ser empregadas em sistemas li-neares ou linearizados; (d) redes bayesianas do tipo neuronais probabilística (PNN) usadas somente para tarefas de classificação e as neuronais de regressão gene-ralizada (GRNN) empregadas apenas para problemas de regressão; (e) redes de mapeamento auto organizável, principalmente aplicadas para fins de classificação.

Dadas as características específicas de cada método abordado nesta parte da revisão, a literatura é vasta em discorrer sob os melhores resultados na representa-ção de processo biotecnológicos quando as RNA são empregadas em comparação ao desempenho dos modelos mecanicistas. Contudo, frente à filosofia de modelagem matemática, deve-se recorrer à aplicação mais simples, a qual resulte em predição dentro da significância estatística requerida. Logo, as duas ferramentas ora descritas apresentam-se como recursos disponíveis e viáveis, cabendo ao usuário definir a mais adequada frente à complexidade do sistema a ser representado.

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89 3o Trimestre de 2011 –

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“Não basta saber, também é preciso saber aplicar.Não basta querer, é preciso também saber fazer.”

GoetheRua Ramon Franco, 26 - Urca - CEP 22290-290 - Rio de Janeiro - RJTel.: +55 21 3873 7700http://www.frf.br

FORTALEZA DE SÃO JOÃOCONCEPÇÃO DA REVITALIZAÇÃO DO COMPLEXO DESPORTIVO

OBRAS A CARGO DA FUNDAÇÃO RICARDO FRANCO

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