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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE ESCOLA DE ENFERMAGEM AURORA DE AFONSO COSTA - EEAAC MESTRADO ACADÊMICO EM CIÊNCIAS DO CUIDADO EM SAÚDE - MACCS O USO ABUSIVO DE ÁLCOOL: EM SERVIDORES MILITARES CONTRIBUIÇÃO PARA CIÊNCIAS DO CUIDADO TAÍSA DIVA GOMES FELIPPE Niterói 2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

ESCOLA DE ENFERMAGEM AURORA DE AFONSO COSTA - EEAAC

MESTRADO ACADMICO EM CINCIAS DO CUIDADO EM SADE - MACCS

O USO ABUSIVO DE LCOOL: EM SERVIDORES

MILITARES CONTRIBUIO PARA CINCIAS DO

CUIDADO

TASA DIVA GOMES FELIPPE

Niteri

2015

O USO ABUSIVO DE LCOOL: EM SERVIDORES

MILITARES CONTRIBUIO PARA CINCIAS DO

CUIDADO

TASA DIVA GOMES FELIPPE

Dissertao apresentada ao Mestrado

Acadmico em Cincias do Cuidado em Sade

(MACCS) da Escola de Enfermagem Aurora

de Afonso Costa (EEAAC), da Universidade

Federal Fluminense (UFF), como parte dos

requisitos necessrios para a obteno do ttulo

de Mestre.

Orientador: Prof Dr Mauro Leonardo Salvador Caldeiras dos Santos.

Niteri

2015

TASA DIVA GOMES FELIPPE

O USO ABUSIVO DE LCOOL: EM SERVIDORES

MILITARES CONTRIBUIO PARA CINCIAS DO

CUIDADO

Dissertao apresentada ao Mestrado Acadmico em Cincias do Cuidado em Sade

(MACCS) da Escola de Enfermagem Aurora de Afonso Costa (EEAAC), da Universidade

Federal Fluminense (UFF), como parte dos requisitos necessrios para a obteno do ttulo de

Mestre.

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr . Mauro Leonardo Salvador Caldeira dos Santos Orientador

UFF

Prof. Dr Rosangela da Silva Santos 1 Examinadora

UERJ

Prof. Dr. Eneas Rangel Teixeira 2 Examinador

UFF

Prof. Dr. Elias Barbosa de Oliveira 1 Suplente

UERJ

Prof. Dr Marilda Andrade 2 Suplente

UFF

Niteri

2015

2

Enquanto estiveres viva, sente-te viva.

Se sentes saudades do que fazias, volta a faz-lo.

No vivas de fotografias amarelecidas

Continua, quando todos esperam que desistas.

No deixes que enferruje o ferro que existe em ti.

Faz com que em vez de pena, te tenham respeito.

Quando no consigas correr atravs dos anos, trota.

Quando no consigas trotar, caminha.

Quando no consigas caminhar,

Usa uma bengala.

Mas nunca te detenhas!

Madre Teresa de Calcut

3

AGRADECIMENTOS

Inicio meus agradecimentos por DEUS, sem Ele no teria chegado at aqui e por

permitir realizar mais essa etapa em minha vida.

A minha me Tania Regina, meu infinito agradecimento. Sempre acreditou em minha

capacidade e me acha A MELHOR de todas, mesmo no sendo. Isso s me fortaleceu e me fez

tentar, no ser A MELHOR, mas a fazer o melhor de mim. Obrigada pelo amor

incondicional!

Ao meu Pai Edson que mesmo de longe sempre torceu por mim e se preocupou com

meu esforo e cansao.

As minhas irms Tatiana e Tamara por simplesmente compreenderem meus momentos

de isolamento, alm de sempre acreditarem no meu trabalho e que o fim seria de vitria.

Agradeo tambm meu cunhado Jocelim e tio Osvaldo pela fora e torcida.

Agradeo as minhas amigas de sempre, Denise e Daniele, por s quererem o meu bem

e me valorizarem tanto como pessoa, alm de estarem presentes em momentos nicos de

minha vida. Obrigada pela amizade!

Ao meu orientador Mauro Leonardo Salvador Caldeira dos Santos por acreditar na

minha pesquisa e no desistir de mim mesmo com as dificuldades apresentadas no percurso.

Aos colegas do MACCS por compartilhar conhecimentos, em especial as amigas fruto

de almoos e discusses sobre dissertao Rejane, Juliana e Vernica, obrigada meninas.

A Capito-de-Fragata Ana Paula Winklewsk de Frana por me receber e gerenciar a

liberao da pesquisa no campo juntamente com o Capito-de-Mar-e-Guerra Vice Diretor do

HCM.

Agradeo imensamente aos pacientes do CEDEQ, pois nada teria sentido se este

estudo no fosse dedicado a riqueza das narrativas de vocs.

Muito Obrigada!

4

RESUMO

O consumo de bebidas alcolicas est classificado pela Organizao Mundial de Sade

(OMS) entre os 10 comportamentos de maior risco sade na atualidade. Dentre todas as

drogas, o lcool a mais utilizada no mundo inteiro. No Brasil, como destaque est a cerveja,

fazendo parte do contexto sociocultural como forma de socializao. A ingesto abusiva de

bebidas alcolicas necessita de maior ateno pela sociedade e servios de sade. O

alcoolismo tem um efeito negativo quando presente na esfera do trabalho, assim, quando o

trabalhador se depara com a impossibilidade de executar suas atividades laborativas devido ao

uso abusivo do lcool ele se depara com confrontos e insatisfaes, por estar rompendo seu

ritual de tarefas e vnculos, e isto pode ser considerada a maior perda social na vida do

trabalhador, sobretudo porque outras perdas esto associadas ao trabalho, tais como, a reduo

salarial, a restrio do ncleo social e a ociosidade, gerando assim, um meio mais propcio ao

alcoolismo. O estudo tem a inteno de contribuir para a classe de servidores militares no que

tange o cuidado especfico e a colaborao da enfermagem para levantamento de estratgias

de melhorias na qualidade de vida dos servidores militares. O diagnstico e o tratamento do

transtorno neste grupo se torna cada vez mais importantes. Trazendo a relevante na

Universidade no qual se produzem novos estudos sobre o tema alcoolismo e militares

adensando mais a temtica e justificando a elaborao deste estudo que tem como objeto:

identificar atravs das narrativas de vida as vulnerabilidades dos servidores militares ao uso

abusivo de lcool. Os seguintes objetivos: Identificar as vulnerabilidades dos servidores

militares decorrente do uso abusivo de lcool. Analisar os tipos de vulnerabilidades nas

narrativas dos servidores militares frente ao uso abusivo de lcool. Discutir as repercusses

decorrentes do uso abusivo de lcool no ambiente familiar e de trabalho do servidor militar.

Tomando-se por base os objetivos propostos para esta pesquisa, optamos pela abordagem de

natureza qualitativa. O mtodo adotado nesta pesquisa ser a Narrativa de Vida, que permite

obter informaes na essncia subjetiva da vida de uma pessoa, o que vai ao encontro do

objeto de estudo. Foi atravs da histria que os elementos de vida foram transmitidos. O local

do estudo foi o servio de tratamento psicossocial de lcool e outras drogas do Corpo Militar

da Marinha do Brasil, situado no Hospital Central da Marinha o Centro de Dependncia

Qumica (CEDEQ). Desta forma, o processo analtico que foi empregado foi a anlise

temtica conforme Bertaux, o material que foi fornecido pelo participante, propiciou a

construo das categorias, em ordem diacrnica e distribuio do tempo de acordo com o

narrador. Para discusso dos dados utilizamos o Referencial conceitual de vulnerabilidade e

Risco de Ayres e o Referencial Terico de Afaf Meleis com a teoria das transies.

Conclumos que as vulnerabilidades dos servidores militares ao uso abusivo de lcool esto

interligadas entre as vulnerabilidades individual, social e programtica onde os fatores

favorveis so: a predisposio ao alcoolismo, conflitos familiares, entrada no servio militar,

a facilidade de beber em servio, transferncias e punies juntamente com as transies de

sade/doena e transies organizacionais descritas por Meleis.

Descritores: Alcoolismo, Histria de vida, Militares.

5

ABSTRACT

Alcohol consumption is classified by the World Health Organization (WHO) among the 10

risk behavior health today. Among all drugs, alcohol is the most widely used worldwide. In

Brazil, as highlighted is the beer as part of the socio-cultural context as a form of

socialization. Abusive drinking alcohol needs further attention by society and health services.

Alcoholism has a negative effect when present in the sphere of work, so when the worker is

faced with the inability to perform their work activities due to alcohol abuse he faces conflicts

and grievances, to be breaking your task and ritual ties, and this can be considered the largest

loss in the social worker's life, especially because other losses are associated with the work,

such as wage reduction, restriction of social core and idleness, generating a way more

conducive to alcoholism . The study intends to contribute to the class of military employees

regarding the specific care and collaboration of nursing-raising strategies improvements in the

quality of life of military servers. Diagnosis and treatment of this disorder group becomes

increasingly important. Bringing relevant in University where occur the new studies on the

subject alcoholism and military more thicken the theme and justifying the preparation of this

study whose object: identify through life narratives vulnerabilities of military servers to

alcohol abuse. The following objectives: Identify the vulnerabilities of military servers

resulting from alcohol abuse. Analyze the types of vulnerabilities in the narratives of the

military front servers to alcohol abuse. Discuss the repercussions of alcohol abuse in the

family environment and work of military server. Taking as a basis the proposed objectives for

this research, we chose the qualitative approach. The method adopted in this research will be

the Narrative of Life, which provides information on the subjective essence of a person's life,

which is consistent with the object of study. It was through the story the life elements were

transmitted. The study site was the psychosocial treatment service of alcohol and other drugs

of the Military Corps of the Navy of Brazil, located in the Navy Central Hospital Chemical

Dependency Center (CEDEQ). Thus, the analysis method that was used was thematic analysis

as Bertaux, the material that was provided by the participant, provided the construction of

categories, in diachronic order and distribution of time according to the narrator. For

discussion of the data we use the conceptual Reference Vulnerability and Risk Ayres and the

Theory of Reference Afaf Meleis with the theory of transitions. We conclude that the

vulnerabilities of military servers to alcohol abuse are connected between the individual,

social and programmatic vulnerabilities where the favorable factors are: the predisposition to

alcoholism, family conflicts, entry into military service, ease of drinking on duty, transfers

and punishments along with health transitions / disease and organizational transitions

described by Meleis.

Keywords: Alcoholism, Life History, Military

6

RESUMEM

El consumo de alcohol est clasificado por la Organizacin Mundial de la Salud (OMS), entre

la salud comportamiento 10 riesgo hoy. Entre todas las drogas, el alcohol es el ms

ampliamente utilizado en todo el mundo. En Brasil, segn ha destacado es la cerveza como

parte del contexto socio-cultural como una forma de socializacin. El consumo de alcohol

abusivo requiere ms atencin por servicios de la sociedad y de salud. El alcoholismo tiene un

efecto negativo cuando est presente en la esfera del trabajo, por lo que cuando el trabajador

se enfrenta a la imposibilidad de realizar sus actividades de trabajo debido al abuso del

alcohol se enfrenta a conflictos y quejas, que se rompen su tarea y ritual lazos, y esto se puede

considerar la prdida ms grande en la vida del trabajador social, especialmente porque otras

prdidas estn asociadas con el trabajo, tales como la reduccin de los salarios, la restriccin

de ncleo social y la ociosidad, la generacin de una manera ms propicio para el alcoholismo

. El estudio pretende contribuir a la clase de empleados militares con respecto al cuidado y la

colaboracin de enfermera de fondos estrategias mejoras en la calidad de vida de los

servidores militares especficos. Diagnstico y tratamiento de este grupo de trastorno se

vuelve cada vez ms importante. Traer relevante en la Universidad, donde se producen los

nuevos estudios sobre el alcoholismo tema y militar ms espesan el tema y justificar la

elaboracin de este estudio cuyo objeto: identificar por la vida narrativas vulnerabilidades de

los servidores militares para el abuso del alcohol. Los siguientes objetivos: Identificar las

vulnerabilidades de los servidores militares resultantes del abuso de alcohol. Analizar los

tipos de vulnerabilidades en las narraciones de los servidores frontales militares al abuso de

alcohol. Discutir las consecuencias del abuso de alcohol en el entorno familiar y la obra del

servidor militares. Tomando como base los objetivos propuestos para esta investigacin, se

opt por el enfoque cualitativo. El mtodo adoptado en esta investigacin ser la narracin de

la vida, que proporciona informacin sobre la esencia subjetiva de la vida de una persona, lo

cual es consistente con el objeto de estudio. Fue a travs de la historia se transmite los

elementos de la vida. El sitio de estudio fue el servicio de tratamiento psicosocial de alcohol y

otras drogas del Cuerpo Militar de la Marina de Brasil, ubicada en el Hospital Central de

Dependencia Centro de Qumica Armada (CEDEQ). Por lo tanto, el mtodo de anlisis que se

utiliz fue el anlisis temtico como Bertaux, el material que fue proporcionada por el

participante, siempre que la construccin de las categoras, en orden y distribucin del tiempo

diacrnico segn el narrador. Para la discusin de los datos que utilizamos la vulnerabilidad

de referencia conceptual y Riesgo Ayres y la Teora de Referencia Afaf Meleis con la teora

de las transiciones. Llegamos a la conclusin de que las vulnerabilidades de los servidores

militares a abuso de alcohol estn conectados entre las vulnerabilidades individuales, sociales

y programticas donde los factores favorables son: la predisposicin al alcoholismo,

conflictos familiares, entrada en servicio militar, la facilidad de beber de turno, transferencias

y castigos, junto con transiciones de salud / enfermedad y transiciones organizacionales

descritos por Meleis.

Palabras clave: Alcoholismo, Historias de Vida, Militar

7

LISTA DE ILUSTRAES

Quadro 1 - Caracterizao dos participantes da pesquisa

Quadro 2 - Historiograma dos participantes da pesquisa

Quadro 3 Diviso das unidades temticas e sua ocorrncia de aparecimento

8

LISTA DE SIGLAS

OMS - Organizao Mundial de Sade

MACCS - Mestrado Acadmico em Cincias do Cuidado em Sade

EEAAC - Escola de Enfermagem Aurora de Afonso Costa

UFF - Universidade Federal Fluminense

HUAP Hospital Universitrio Antnio Pedro

ILO - Internacional Labour Office

CAS - Comisso de Assuntos Sociais

AA - Alcolicos Annimos

PNAISH - Poltica Nacional de Ateno Integral da Sade do Homem

UISM - Unidade Integrada de Sade Mental

SUS - Sistema nico de Sade

INCA - Instituto Nacional do Cncer

HIV - Vrus da Imunodeficincia Humana

SDA - Sndrome da Dependncia do lcool

DSM-III-R - Manual Diagnstico e Estatstico de Transtornos Mentais da Associao

Psiquitrica Norte-Americana

SAA - Sndrome da Abstinncia Alcolica

CID-10 - Classificao Internacional de Doenas Dcima Edio

GGT - Gama Glutamil Transferase

VCM - Volume Corpuscular Mdio

GABA2 - cido Gama Aminobutrico 2

FUNASA- Fundao Nacional de Sade

CONAD Conselho Nacional de Polticas Sobre Drogas

COTRAN - Conselho Nacional de Trnsito

CLT - Consolidao das Leis do Trabalho

CEPAL - Centro de Ensino, pesquisa e Referencia de Alcoologia e Adictiologia

PAEE - Programa de Ateno aos Empregados e a Empresa

RH - Recursos Humanos

HCM - Hospital Central da Marinha

9

CEDEQ - Centro de Dependncia Qumica

LNCS - Lista de Notificao Compulsria em Unidades Sentinelas

LMS Laudo Mdico Pericial

10

SUMRIO

CONSIDERAES INICIAIS 1

4

Apresentao 1

4

Motivao e exposio do problema 1

7

Questes norteadoras e objetivos 2

1

Justificativa 2

1

Contribuies do estudo 2

4

CAPTULO I 2

5

1 REFERENCIAL CONCEITUAL E TERICO 2

6

1.1 O alcoolismo pela perspectiva da vulnerabilidade e risco 2

6

1.2 Conceituaes do alcoolismo 2

9

1.3 A dependncia do lcool e o meio familiar/social 3

4

1.3.1 Lar em conflito 3

4

1.3.2 Acidentes urbanos e relao no trabalho 3

5

1.3.3 Absentesmo e aposentadoria 3

7

1.3.4 Polticas Pblicas 4

0

1.4 Normas e regulamentaes do servio militar 4

11

2

1.5 Referencial Terico de Meleis 4

6

CAPTULO II 5

2

2 METODOLOGIA 5

2

2.1 Tipo, abordagem e mtodo do estudo 5

2

2.2 Local de estudo 5

6

2.3 Aspectos ticos 5

8

2.4 Participantes do estudo 5

9

2.5 Coleta de dados 5

9

2.6 Perfil sociodemogrfico 6

3

2.7 Historiograma 6

5

2.8 Anlise das Narrativas 6

7

CAPTULO III 7

0

3 ANLISE DOS RESULTADOS 7

0

3.1 Primeira etapa construo das unidades temticas 7

1

3.2 Segunda etapa - recodificao 7

6

12

3.3 Terceira etapa categorias analticas 8

2

CAPTULO IV 8

3

4 DISCUSSO DOS RESULTADOS 8

3

4.1 CATEGORIA I A vulnerabilidade de servidores militares do uso de

lcool: e agora o que fazer com a SDA?

8

3

4.1 .1 Seguindo da infncia a adolescncia: cultura da famlia

beber em festas sou nordestino, lcool e seus conflitos!

8

3

4.1.2 Entrada na Marinha: a realidade de um mundo disciplinar 9

2

4.2 CATEGORIA II: Repercusses sociais e familiares: um lar em

conflito e o despertar de que o sonho acabou

1

00

4.2.1 Transio do processo sade/doena vivenciada pelos

militares.

1

00

4.2.2 Servio militar sonho de heri ou mito cultural:

Transies organizacionais

1

06

5 CONSIDERAES FINAIS 1

14

6 REFERNCIAS 1

17

ANEXOS

ANEXO A Termo de consentimento do setor 1

26

ANEXO B Carta de anuncia 1

27

ANEXO C Instrumento de coleta de narrativa 1

28

ANEXO D - Parecer do CEP 1

13

29

ANEXO E - Termo de consentimento livre e esclarecido 1

32

14

CONSIDERAES INICIAIS

Apresentao

Suba o primeiro degrau com f. Voc no

precisa ver toda a escada. Voc s precisa dar o primeiro passo.

Martin Luther King

O lcool uma substncia psicoativa com propriedades produtoras de dependncia

que tem sido amplamente utilizada em muitas culturas ao longo dos sculos. O uso nocivo do

lcool provoca uma doena de agravo econmico e social. Os efeitos nocivos gerados pelo

lcool determinado pelo volume e a concentrao consumidos pela pessoa. Que ao longo do

uso abusivo gera prejuzos a sade.

As consequncias da estreita ligao entre o uso nocivo do lcool e o desenvolvimento

socioeconmico mundial foram descritas em 2010 na Estratgia Global para Reduo do Uso

Nocivo do lcool (OMS, 2010), sendo o consumo de lcool classificado como um dos 10

comportamentos de maior risco sade. Dentre todas as drogas, o lcool a mais utilizada no

mundo inteiro.

Segundo a Organizao Mundial de Sade (OMS, 2014, p.5), no Brasil, o consumo de

lcool total estimado equivalente a 8,7L por pessoa, quantidade superior mdia mundial.

Completa ainda que as bebidas destiladas correspondem ao tipo de bebida mais consumido no

mundo (50%), seguindo da cerveja (35%), j as bebidas do tipo vinho correspondem a 8%. E

no Brasil a cerveja o tipo mais consumido (55%), seguido dos destilados (32,6%) e do vinho

(11,7%). Ou seja, o consumo de bebida alcolica faz parte da cultura da sociedade brasileira

como fato no s aceito, mais frequentemente reforado pela mdia estimulando o consumo.

Por outro lado, o consumo do lcool um dos maiores fatores de adoecimento e que tambm

contribui para situaes de risco para a populao brasileira.

O Ministrio da Sade define o alcoolismo como: bebedor moderado, algum que

utiliza a bebida alcolica sem dependncia e sem problemas decorrentes de seu uso; o

bebedor-problema, algum problema que apresente qualquer tipo de problema (fsico,

psquico ou social) decorrente do consumo de lcool; e o dependente do lcool, algum que

apresente estado psquico e/ou fsico caracterizado por relaes que incluem uma ingesto

excessiva de lcool, de modo contnuo ou peridico (BRASIL, 2012).

Deste modo, o lcool e seu consumo abusivo , certamente, um dos maiores fatores

que contribuem para situaes de risco para a populao brasileira como tambm para o

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adoecimento. Esferas governamentais reforam que o alcoolismo uma doena e que se

encontra em percentual elevado, sua separao de consumo por gnero encontra-se crescente

em homens, um ano aps a primeira pesquisa em 2010, quase trs vezes maior do que entre

as mulheres 26,2% e 9,1% (BRASIL, 2012).

Alm de apresentar aumento do consumo por gnero, o levantamento realizado aponta

aumento do consumo de acordo com a escolaridade, sendo maior entre pessoas com mais de

12 anos de estudos do que entre os que estudaram at oito anos 20,1% e 15,9%,

respectivamente (BRASIL, 2012).

Apesar do lcool ser srio problema de sade pblica, a embriaguez uma experincia

reveladora de muitos aspectos da alma humana, como a busca pela intensidade, pelo

transbordamento ou por inspirao (CARNEIRO, 2010). Uma histria dos discursos sobre a

embriaguez mais do que uma histria das bebidas ou mesmo do corpo brio, uma histria

dos excessos e dos cuidados de si, da intimidade e das relaes sociais, exigindo o cruzamento

de fontes da medicina.

Podendo assim considerar que a doena alcolica extravasa o limite intrapessoal,

afetando a famlia, deteriorando os vnculos sociais e os afetos emocionais possibilitando a

representao do alcoolismo, como uma doena social familiar e no somente do usurio. A

pessoa dependente do lcool, alm de prejudicar a sua prpria vida, acaba afetando a sua

famlia, amigos e colegas de trabalho.

Dessa forma, o consumo de lcool constitui um significante problema social, certo que

o uso abusivo e os comportamentos de risco esto fortemente vinculados ao meio social de

quem o consome sendo evidenciado pelas esferas mundiais de sade devido a sua grande

complexidade.

Isso traz uma real preocupao para os profissionais de sade que atuam diretamente

com o consumidor abusivo de lcool, porm paralelamente a isso, ainda se observa uma

grande dificuldade em avaliar, abordar e conduzir situaes que envolvam o consumo de

lcool no trabalho devido a sua grande complexidade e construo social de consumo de

lcool pela sociedade.

Os transtornos por uso de lcool so caracterizados por um desejo persistente ou

esforo infrutfero para reduzir ou controlar o uso, sendo que a dependncia desenvolve

comportamentos no saudveis que com o tempo o consumo faz com que se torne mais e mais

progressivo e repetitivo. (WILCOX et al., 2014)

16

E ao se tornar cada vez mais progressivo o alcoolismo tem um efeito negativo quando

presente na esfera do trabalho, quando o trabalhador se depara com a impossibilidade de

executar suas atividades laborativas devido ao uso abusivo do lcool que ao longo do uso

apresenta perdas cognitivas por ser um depressor do Sistema Nervoso Central, ele se depara

com confrontos e insatisfaes, por estar rompendo seu ritual de tarefas e vnculos.

Com a reduo cognitiva, o empregador entende como um trabalhador no produtivo,

acarretando em suspenses e mais agravantes demisses, pode assim, ser considerada a maior

perda social na vida do trabalhador, sobretudo porque outras perdas esto associadas ao

trabalho, tais como, a reduo salarial, a restrio do ncleo social e a ociosidade, gerando um

meio mais propcio ao alcoolismo. Estas consequncias foram referidas por Frana (2008), o

que fazer da vida sem o trabalho e a utilizao da administrao do tempo disponvel so

desafios para as pessoas que se dedicam por muitas horas sua vida ao trabalho. Podendo

favorecer o dependncia a dependncia alcolica.

Conforme descreve Vaissman (2004, p.23), o alcoolismo e o consumo excessivo de

lcool so mais comumente encontrados em determinadas ocupaes, e a anlise de situaes

de trabalho como estresse, carga de trabalho excessiva e presso de superiores. Alguns

fatores contribuem para maior vulnerabilidade ao consumo excessivo de lcool. Em certas

formas de ocupao o acesso ao lcool ocorre enquanto se trabalha ocorrendo uma presso

social para beber. Completa ainda que, em certas profisses, h uma tradio quanto a se

beber muito. Quando ocorrem situaes de solido ou de falta de suportes scio familiares.

Estudo Norte Americano, realizou um levantamento da prevalncia de uso abusivo de

bebida alcolica Binge Drinking 1, entre os trabalhadores locais. Este foi o primeiro estudo

de base populacional para examinar a relao entre consumo excessivo de lcool e ocupao

segundo caractersticas selecionadas entre 2004-2005, de entrevistados empregados, a

prevalncia de consumo excessivo de lcool variou de ocupao, variando de 13,2% entre os

trabalhadores de sade para 45,3 % entre os empregados da fazenda ou rancho (JARMAN et

al, 2007).

Podemos associar as profisses que oferecem posies de comando de alto status ou

sem chefias, com pessoas de alta ou baixa renda envolvendo indivduos em plos sociais

extremos, capazes de beber muito. Como tambm, as tenses, estresses e perigo no trabalho.

1 Um padro de ingesto intensa durante um perodo prolongado, escolhido de maneira propositada. Os bebedores desse padro geralmente intercalam esses perodos com perodos

de abstinncia.

17

Empregos com essas caractersticas costumam facilitar o uso de bebidas. A autora completa,

que algumas profisses atraem pessoas propensas a se tornarem bebedores excessivos, como

na medicina (pelo estresse do trabalho mdico), Marinha Mercante ou entre cozinheiros,

estivadores, etc. (VAISSMAN, 2004, p.23)

Sendo assim, atividades laborais que apresentam riscos pessoais, fatores estressores e

presses impostas por liderana apresentam maior vulnerabilidade ao alcoolismo.

Concomitantemente, consequncias relacionadas ao uso abusivo de lcool no trabalho esto

associados incluindo, as leses no intencionais devido diminuio da concentrao, assim

como a reduo do rendimento no trabalho gerando absentesmo.

Deste modo, como apresentado os servidores militares da Marinha Mercante esto

vulnerveis a apresentarem os riscos decorrentes do uso abusivo de lcool. Por fazer parte da

cultura milenar das foras militares pelo processo de trabalho e os fatores associados ao risco,

segue a descrio de autores que j abordaram o tema.

Com o objetivo de manter a coerncia na abordagem do tema e a obteno de dados

provenientes do servidor militar optou-se pelo referencial metodolgico da Narrativa de vida.

Que segundo Daniel Bertaux (2010, p.17) o mtodo visa estudar um fragmento particular da

realidade social-histrica, de compreender como ele funciona e como se transforma,

destacando as configuraes de relaes sociais, os mecanismos, os processos, as lgicas de

ao que caracterizam.

A Narrativa de vida como mtodo nos permite conhecer os relatos vividos, as histrias

vivenciadas de cada participante e como ele expe de relevante em seus fatos cotidianos. O

narrador que conduz a sua entrevista, ficando apenas o entrevistador ouvindo e salientando os

pontos relevantes e que precisam de maior aprofundamento na narrativa. Cabendo ao

entrevistador a escuta atenta e sensvel para estimular um esclarecimento maior sobre

determinado fato, levantando temas relevantes para implementao do cuidado frente s

narrativas.

Motivao e exposio do problema

Conforme exposto, esta dissertao apresentada com resultados parciais ao Curso de

Mestrado Acadmico em Cincias do Cuidado em Sade da Escola de enfermagem Aurora de

Afonso Costa / Universidade Federal Fluminense (MACCS/ EEAAC/UFF) tem por objeto de

18

investigao identificar atravs das narrativas de vida as vulnerabilidades dos servidores

militares ao uso abusivo de lcool.

A motivao para o desenvolvimento deste estudo contribui-se ao longo do percurso

de formao profissional, iniciando-se durante a graduao em Enfermagem. Minha

compreenso das questes abrangentes do uso abusivo do lcool constitui um fio condutor em

com incio em 2009. Tendo como experincia a produo acadmica e a vivncia em atuar em

um grupo de apoio psicossocial no perodo de coleta de dados aonde foi estudado o

alcoolismo em um Grupo de Apoio na Baixada Fluminense do Rio de Janeiro, no qual foram

levantados os motivos da ingesto da bebida alcolica entre adultos trabalhadores,

evidenciando que entre os participantes do grupo haviam militares que com pouca frequncia

participavam das discusses apresentando pouca adeso a dinmica do grupo, como

concluso houve destaque para as dificuldades vivenciadas por esse grupo social, bem como o

despreparo dos familiares, e da sociedade em lidar com o uso abusivo de lcool.

Completando ainda mais meu interesse em continuar a desenvolver pesquisas sobre a

temtica, no decorrer do processo de trabalho e formao (especializaes) me deparei com o

pai de uma amiga muito prxima a famlia que apresentava Sndrome da Dependncia

Alcolica, e ao longo de sua vida consumia abusivamente o lcool at chegar ao estgio de

dependncia gerando complicaes a sade. O mesmo tinha como ocupao laboral ser

Militar da Marinha do Brasil, devido ao seu estado de sade cada vez mais deflagrado

decorrente do lcool falece aos 58 anos. Presenciando a dificuldade apresentada pelos

familiares e profissionais que o atendia no processo do tratamento.

A partir de ento, o meu interesse em desenvolver pesquisas e estudos sobre o uso

abusivo de lcool apresentou um aumento crescente, com o intuito de buscar o bem estar do

trabalhador, em mais amide o trabalhador militar, devido as dificuldades apresentadas de

adeso, como tambm a busca por compreenso aos fatores que geram o consumo abusivo,

visando a assistncia integral a este grupo. Tal fato est me trazendo oportunidade de um

aprofundamento maior nos conhecimentos tericos sobre a temtica. Por tambm poder

contribuir para as estratgias de atendimento dos profissionais de sade.

Embasando teoricamente conceitos que permeiem a dimenso das atividades

laborativas dessa classe de trabalhadores, assim como a presena de vieses de vulnerabilidade

ao alcoolismo.

Deste modo, os servidores militares que esto na ativa precisam exercer tarefas de

responsabilidades administrativas, corporativas e hierrquicas conforme regulamento militar e

suas obrigaes. Disciplina a rigorosa observncia e o acatamento integral das leis,

19

regulamentos, normas e disposies que fundamentam o organismo militar e coordenam seu

funcionamento regular e harmnico, traduzindo-se pelo perfeito cumprimento do dever por

parte de todos e de cada um dos componentes desse organismo. A disciplina e o respeito

hierarquia devem ser mantidos em todas as circunstncias da vida entre militares da ativa, da

reserva remunerada e reformados. (BRASIL, 1980)

Gomes (2012, p.2), afirma que as instituies militares possuem uma identidade

marcante, nas quais a disciplina e a hierarquia so as bases para a formao dos sujeitos que

delas fazem parte, declara que a disciplina e a hierarquia, so valores to arraigados a essas

instituies, que ensejam raras discusses, sendo quase sempre naturalizados a tal. Vale

ressaltar que tais atos levam a uma conformidade no real as regras e normas. Cabe-nos,

portanto, pensar os fazeres historicamente construdos por estas organizaes.

Dentro dos fatores apresentados, Marchand, Parent-Lamarche e Blanc (2011), relatam

que outros pontos esto associados ao uso abusivo de lcool no somente fatores estressores

no trabalho, salientando os estados conjugais, parentais e econmicos , bem como o bairro,

gnero, idade, escolaridade, sade fsica, hbitos de vida (tabagismo, nveis de atividade

fsica) e traos de personalidade.

Assim, dos fatores apresentados associados ou no pairam nas vulnerabilidades que

contribuem para o consumo do lcool de alto risco. Em outro estudo os autores continuam

afirmando que, alm disso, no pode se ignorar uma ampla gama de condies de trabalho em

que os indivduos so submetidos em suas atividades laborativas do dia- a-dia, assim como

eles no conseguem levar em conta tanto a posio ocupacional e as condies de trabalho e

organizao.

Em 2013, Frueh e Smith realizaram um estudo nas foras armadas americanas onde

constataram que o uso pesado de lcool e doenas psiquitricas entre os militares um

problema significativo, geralmente, para lidar com o estresse, a solido, o tdio e a ausncia

de outras atividades recreativas. Ressaltando a facilidade da disponibilidade do lcool que

contribui para uma cultura no trabalho que facilita o seu consumo pesado e abusivo.

Estudo sobre o uso abusivo de lcool realizado na corporao da polcia militar do

Estado de Goinia aborda a percepo dos militares quanto ao uso do etlico, revelando que

poucos admitem o uso de bebidas alcolicas pelos militares e os problemas ocasionados por

este uso. Dentre os problemas relacionados, citam entre outros, o no cumprimento dos

deveres, a falta de servio e a insubordinao. A possibilidade de embriaguez em horrio de

trabalho negada pela maioria. As punies so defendidas para os bebedores-problema e a

20

priso a mais instituda. Enfatizam os fatores profissionais como predisponentes ingesto

de etlicos (HALPERN E LEITE, 2010).

Devido a seu processo organizacional e estrutural o servio militar ainda apresenta

curta demanda de abordagem cientfica quanto a pesquisas relacionadas ao corpo de trabalho.

Autores como Coelho (1976), Castro (2004), Halpern e Leite (2010), em uma anlise

cronolgica, destacam que certos processos organizacionais e administrativos, no so

visveis ao olhar externo.

Com o olhar voltado aos agravos e os crescentes programas de prevenes aos riscos e

vulnerabilidades ao uso abusivo de lcool e seus agravos aos servios de sade e as empresas,

em conformidade com o ministrio da sade vem implementando aes para a identificao e

tratamento dos dependentes qumicos. Como a implementao de estratgias assistenciais.

Devendo assim, os servios militares e as empresas estarem em conformidade com as

diretrizes estabelecidas pelo Decreto Presidencial n. 6.117 que trata da Poltica Nacional sobre

o lcool, este que apresenta diretrizes que refere s iniciativas de preveno ao uso

prejudicial de bebidas alcolicas no ambiente de trabalho (BRASIL, 2011).

importante notar o disposto pelo Internacional Labour Office (ILO, 1999) programa

a respeito das atribuies dos empregadores perante a questo do uso de lcool e drogas no

trabalho. Cabe aos empregadores providenciar e manter um ambiente de trabalho seguro e

saudvel, ao restringir ou proibir a posse, o consumo e a venda de lcool no trabalho. Essa

relao entre o consumo de lcool e questes trabalhistas ganhou repercusso aps a

Comisso de Assuntos Sociais (CAS) do Senado aprovou o Projeto de Lei que probe a

demisso por justa causa trabalhadores dependentes do lcool. (BRASIL, 2010). Cabe

ressaltar que o servidor militar s apresenta estabilidade aps 10 anos de servio designado

engajamento.

Segundo Halpern e Leite (2010), apesar da implantao de outra abordagem como o

atendimento ambulatorial na Unidade Integrada de Sade Mental (UISM), na Marinha do

Brasil direcionada preveno e desintoxicao, ainda no havia sido realizados

levantamentos para avaliar o impacto dessas iniciativas no ambiente laboral. Sendo realizado

pioneiramente pelas autoras. Na mesma pesquisa as autoras, descrevem que os pacientes

servidores militares so acompanhados pela Psiquiatria e pelo Servio Social e que o

21

tratamento embasado nos 12 Passos e 12 Tradies dos Alcolicos Annimos. Os AA visa

auxili-los a evitar o "primeiro gole" e a manter a sobriedade. Privilegia-se o atendimento em

grupo por se acreditar que a ajuda mtua facilite a superao da adio (ALCOLICOS

ANNIMOS, 1996).

Deste modo, a adequao deste problema linha de pesquisa do mestrado O cuidado

em seu contexto sociocultural neste aspecto fundamental para o cuidado do outro e do

cuidado de um modo geral refletir sobre a promoo da sade na descrita prtica de atuao

profissional adensando o cuidar na preveno das vulnerabilidades e riscos a sade.

Questes norteadoras e objetivos

Com base no problema de estudo articulamos as seguintes questes norteadoras:

Como o servidor militar descreve seu perodo produtivo de trabalho?

O que o predisps fazer uso de maneira abusiva de bebida alcolica?

Quais as repercusses na vida laborativa e familiar dos servidores militares

decorrente do uso abusivo de lcool?

E elaboramos como objetivos deste estudo:

1. Identificar as vulnerabilidades dos servidores militares decorrente do uso abusivo

de lcool.

2. Analisar os tipos de vulnerabilidades nas narrativas dos servidores militares frente

ao uso abusivo de lcool.

3. Discutir as repercusses decorrentes do uso abusivo de lcool no ambiente

familiar e de trabalho do servidor militar.

Justificativa

Tomando ento cincia de toda a problemtica e magnitude do tema e impulsionada

pelo desafio de buscar respostas, visando atender o objeto de estudo surge como possibilidade

de estudar atentamente essa clientela e demanda. Assim, recorremos a instrumentos que

auxiliam a aprimorar os conhecimentos pertinentes ao tema e a contribuir no mbito

educativo, na condio de subsidiar a assistncia, o ensino, a pesquisa e a extenso.

22

O consumo do lcool apresenta uma relao individual que varia de acordo com o

indivduo e em funo do contexto, padro e intensidade do que foi ingerido. Para alguns o

efeito do consumo apresenta agravos altamente disfuncionais acarretando em complicaes e

prejuzos como o abuso e a dependncia do lcool, j outras pessoas no desenvolvem

problema algum.

A dependncia do lcool uma doena crnica que deve ser reconhecida e tratada. O

desenvolvimento, associado a danos sociais que historicamente foram vinculados a esta

doena contribui para a estigmatizao do problema. (OMS, 2010).

Segundo INCA (2014), a relao entre o lcool e cncer tem sido avaliada no Brasil,

por meio de estudos de caso-controle, que estabeleceram a associao epidemiolgica entre o

consumo de lcool e cnceres da cavidade bucal e de esfago. Trazendo o conhecimento

agravos a sade alm dos recorrentes com o consumo de longa data.

Dados do Ministrio da Sade revelam que os atendimentos em hospitais pblicos

devido ao consumo do lcool de forma abusiva, apresentam impacto nos atendimentos de

urgncia e emergncia do Sistema nico de Sade (SUS). O levantamento aponta que uma

em cada cinco vtimas de trnsito atendidas nos prontos-socorros brasileiros ingeriram bebida

alcolica. O estudo tambm mostra que 49% das pessoas que sofreram algum tipo de agresso

consumiram bebida alcolica. As principais vtimas so homens com idade entre 20 e 39

anos. (BRASIL, 2012)

O mesmo levantamento realizado pelo Ministrio da Sade, revela ainda que entre as

pessoas envolvidas em acidentes de trnsito, 22,3% dos condutores, 21,4% dos pedestres e

17,7% dos passageiros apresentavam sinais de embriaguez ou confirmaram consumo de

lcool.

Outro fator associado ao consumo de lcool so as agresses fsicas. O estudo revela

que as vtimas mais acometidas por agresses esto nessa mesma faixa etria 20 a 39 anos

e representam 56% dos casos. Em 2011, 28.352 homens com idade entre 20 a 39 anos foram

assassinados e 16.460 perderam a vida no trnsito, o que corresponde a quase metade de

bitos registrados nesta faixa etria, 31,5% e 18,3%, respectivamente (BRASIL, 2012).

Pensando nos agravos decorrentes a violncia urbana e os dados apresentados acima

cabe trazer a estratgia do Ministrio da Sade ao implementar a Poltica Nacional de

Ateno Integral da Sade do Homem/PNAISH, que foi instituda pela Portaria N 1.944/GM

de 27 de agosto de 2009. Tal estratgia vem promovendo aes que contribuem para as

singularidades masculinas, atravs de eixos temticos para alcanar a populao com a

23

importncia da preveno de doenas reduzir os agravos a sade, um dos eixos direcionado

a Preveno de Violncia e Acidentes, onde visa desenvolver aes que chamem ateno para

a grave relao da populao masculina e as violncias, em especial a violncia urbana e os

acidentes.

Mesmo com as estatsticas alarmantes e as estratgias do Ministrio da Sade para

reduzir os agravos em especial sensibilizando a populao masculina que so os mais

acometidos, o consumo de lcool continua sendo cultural mundialmente, embora a doena

alcolica seja um mal individual em que precisamos descrever o grau de dependncia de cada

pessoa, identificamos que ela atinge o dependente de lcool, gerando agravos como os

acidentes, quedas e desastres de trnsito que passaram a ser devidamente assistidos pelo

servio de sade e rgos pblicos aps a iniciativa do governo federal com a Lei Seca

(Brasil, 2008). Ressaltando a importncia de novas abordagens sobre a temtica, visando

preveno aos agravos decorrentes do consumo.

Percebe-se a preocupao crescente quanto presena do uso abusivo de lcool

devendo ser melhor investigado no ambiente de trabalho e nas diversas atividades laborativas.

Salientando a necessidade do desenvolvimento de um novo estudo com maior abrangncia de

localizao e investigao.

De fato, fica evidente que as esferas de sade vem abordando com maior rigor e

frequncia a temtica alcoolismo, e seus resultados tm sido de preocupao alarmante para a

Sade Pblica. Salienta que ao associar a temtica ao servidor militar o tema tornasse ainda

mais relevante quando voltado para enfermagem, pois esta categoria profissional est na linha

de frente da assistncia em diversas reas da sade e da sociedade, devendo assim apresentar

uma abordagem mais aprofundada sobre o assunto.

Esta pesquisa possibilita de forma relevante aprofundar a temtica sobre o consumo de

lcool entre trabalhadores da nossa sociedade, pois os profissionais de sade tem papel

importante de identificar e prevenir os fatores de riscos decorrentes do consumo de lcool,

atravs da implementao de consultas de enfermagem, com a identificao precoce do

consumo aplicando intervenes imediatas visando bom prognstico da doena tornando

positivo em termos de agravos.

24

Contribuies do estudo

Destacando dentre os resultados esperados, quando falamos em Cuidado em Sade na

rea Sade, no podemos deixar de aprimorar nossos conhecimentos em relao ao consumo

de lcool, buscando a equidade e visando uma assistncia integral sade, procurando sadas

e incentivos para esse problema to srio. E atravs da contribuio da pesquisa levantar

estratgias de atendimento.

O estudo tem a inteno de trazer benefcios e contribuio para a classe de

trabalhadores no que tange o cuidado com a colaborao do olhar da enfermagem e sua

ressignificao do sujeito a contar sua prpria histria empregando a escuta atenta, pois ao

adotar atravs da consulta de enfermagem a escuta teraputica nos trs a possibilidade de um

olhar do cuidado e a partir da elaborar estratgias de melhorias na qualidade de vida, pois a

principal responsabilidade do enfermeiro consiste em dar confiana ao cliente. Contribuindo

para o cuidado clnico de um olhar diferenciado com intervenes para trabalhos em grupo e

clnicas de apoio. O diagnstico e o tratamento do transtorno neste grupo se tornam cada vez

mais importante.

Trazendo relevncia para Universidade ampliando literaturas sobre a temtica em suas

futuras pesquisas com a presente abordagem, visa ampliar as discusses na linha de pesquisa

sobre o cuidado em diferentes etapas do processo de viver, que venha aprimorar a prtica

assistencial da enfermagem e outras profisses da sade, que contribua com frum de

Polticas Pblicas sobre lcool e drogas. Tambm como ponto de partida para o

desenvolvimento de tecnologias voltadas para a educao, visando melhorias no cuidado e

promoo da sade.

25

CAPTULO I

O normal e o patolgico:

Normal seria aquilo que conforme a regra, regular,

generalizvel, adquirindo um valor de tipo ideal. A

normalizao uma experincia especificamente antropolgica

ou cultural. (Canguilhem, 2009)

Este captulo tem como objetivo principal discutir a fundamentao terica que d

suporte para toda investigao. Inicialmente, conceituaram-se as perspectivas da

Vulnerabilidade e suas vertentes para predisposio do uso abusivo do lcool, que vm

ganhando espao nas pesquisas em Cincias da Sade e Sociais oferecendo contribuies

para o cuidado em sade ao indivduo e coletividade. Como tambm aborda a conceituao

do alcoolismo e o que trs de consequncias ao meio social e familiar. Interligando a

problematizao abordaremos as normas e regulamentaes do servio militar e o que traz de

relevante que possa vir a caracterizar um agravo se desenvolver a dependncia do lcool,

sendo importante frisar que o indivduo vive no meio social e coletivo aonde apresentam

fatores vulnerveis que caracterizam possveis riscos a sade.

Assim, este captulo prossegue com a histria e construo dos conceitos de

vulnerabilidade, uso abusivo do lcool, uma discusso sobre a sociedade e familiares e o

servio militar; Pautando a discusso nas polticas pblicas que embasam a temtica alm de

um levantamento das pesquisas de autores precursores de conceitos atravs de literaturas

publicadas.

26

1 REFERENCIAL CONCEITUAL E TERICO

1.1 O alcoolismo pela perspectiva da Vulnerabilidade

No mbito da pesquisa em enfermagem, o conhecimento da abrangncia da

Vulnerabilidade, se faz importante por se tratar diretamente dos danos a sade da populao.

Deste modo, ao estudar o alcoolismo e os agravos sade dos trabalhadores, evidencia-se o

interesse e a profundidade de conhecimento em compreender as vulnerabilidades ao

alcoolismo.

O conceito de "vulnerabilidade" originrio da rea da advocacia internacional pelos

Direitos Universais do Homem e designa, em sua origem, grupos ou indivduos fragilizados,

jurdica ou politicamente, na proteo ou garantia de seus direitos de cidadania (ALVES,

1994 apud AYRES, 2003). Tal conceito foi trazido para o campo da sade, principalmente, no

que se refere a estudos e intervenes frente a infeco por HIV/AIDS h aproximadamente

dez anos. Sendo:

"a proposta da vulnerabilidade aplicvel, rigorosamente, a qualquer dano ou

condio de interesse para a sade pblica, pode ser resumido justamente como este movimento de considerar a chance de exposio das pessoas ao

adoecimento como a resultante de um conjunto de aspectos no apenas

individuais, mas tambm coletivos, contextuais, que acarretam maior

suscetibilidade aos adoecimentos" (AYRES et al., 2003, p.123).

Outras pesquisas sobre temtica foram sendo realizadas por diversos autores no

decorrer da ltima dcada condensando as intervenes de sade com base na

vulnerabilidade, tais como: (MANN, TARANTOLA e NETTER, 1993; AYRES, 1996;

AYRES, CALAZANS e FRANA JUNIOR, 1998), com a inteno de superar a noo de

risco social como forma de ampliar a compreenso da suscetibilidade aos agravos de sade.

Essa contribuio se d na medida em que passa a deslocar o foco do individual,

considerando os aspectos do contexto social.

Com isso a vulnerabilidade caracteristicamente passa a ser abordada em diversas

disciplinas, pois busca compreender alm dos determinantes epidemiolgicos, como tambm

a dimenso dos sentidos e dos significados da exposio dos sujeitos a determinadas

situaes de risco, bem como as trajetrias individuais e sociais que geram as implicaes e

os efeitos diferenciados dessas exposies.

27

Ferreira (2009) define que, a vulnerabilidade pode ser considerada como a condio

de risco em que uma pessoa se encontra. Um conjunto de situaes mais, ou menos

problemticas, que situam a pessoa numa condio de carente, necessitada, impossibilitada de

responder com seus propsitos recursos a dada demanda que vive e a afeta. O mesmo autor

define o risco como, a possibilidade de perigo, incerto, mas previsvel, que tem ameaa de

dano pessoa ou a coisa. Pode-se entender que as pessoas enfrentam diferentes situaes de

vulnerabilidade, individualmente ou coletivamente, e as situaes de agravo ou ameaa

sade podem ser particularizadas pelo reconhecimento dos agravos.

Os descritores utilizados na Bireme apresentam vulnerabilidade como o grau de

suscetibilidade ou de risco a que est exposta uma populao em sofrer danos por desastres

naturais. Inclui, ainda, a relao existente entre a intensidade do dano e a magnitude de uma

ameaa, evento adverso ou acidente. Contempla, tambm, a probabilidade de uma

determinada comunidade ou rea geogrfica ser afetada por uma ameaa ou risco potencial de

desastre. (BERTOLOZZI, 2012). Na perspectiva da vulnerabilidade, a exposio a agravos de

sade resulta de aspectos individuais e de contextos ou condies coletivas que produzem

maior suscetibilidade aos agravos e morte e, simultaneamente, possibilidade aos recursos

para o seu enfrentamento.

Dessa forma, para a interpretao do processo sade-doena, considera-se que a

vulnerabilidade um dos indicadores da desigualdade social, variando de acordo com as

probabilidades de ocorrncia. Antecedendo assim ao risco, determinando as diferenas

pessoais e coletivas de uma predisposio a um adoecimento, de se infectar, de adoecer e at

mesmo a morte.

Assim, a vulnerabilidade com amplo entendimento difundida por mltiplos

condicionantes, tratando de forma mais abrangente nos determinados segmentos de

abordagem, nesse sentido, Ayres et al (2011, p. 99) retrata que a vulnerabilidade pode ser

compreendida como um conjunto de condies que tornam indivduos e comunitrios mais

susceptveis s doenas ou incapacidades, em decorrncia de aspectos no apenas individuais,

mas tambm sociais e programticos. Tal definio nos traz a compreenso de como

investigar a vulnerabilidade ao alcoolismo.

E ao realizar a juno de vulnerabilidade visando sade atravs do uso abusivo de

lcool houve a necessidade de busca e reconhecimento do quadro conceitual de trs

28

dimenses interligadas descritas pelo precursor do conceito: a individual, a social e a

programtica ou institucional.

O autor descreve que a vulnerabilidade individual refere-se ao grau e

qualidade da informao que cada indivduo dispe sobre o risco,

capacidade de elaborao das informaes e aplicao das mesmas na sua

vida prtica; j a vulnerabilidade social diz respeito a um conjunto de fatores sociais que determinam o acesso informaes, servios, bens

culturais, as restries ao exerccio da cidadania, exposio violncia, grau

de prioridade poltica ou de investimentos dados sade e condies de moradia, educao e trabalho e a vulnerabilidade programtica relaciona-se

s aes que o poder publico, iniciativa privada e organizaes da sociedade

civil empreendem, ou no, no sentido de diminuir as chances de ocorrncia das enfermidades, assim como se refere ao grau e qualidade de

compromisso das instituies, dos recursos, da gerncia e do monitoramento

dos programas nos diferentes nveis de ateno. (AYRES et al, 2012, p.100)

Seguindo o caminho Ruotti, Massa e Peres (2011) descrevem que as situaes

individuais, sociais e programticas no podem ser analisadas de forma isolada, elas so

mutuamente referidas e devem ser sempre singularizadas com base nas seguintes questes de

ordem prtica: vulnerabilidade de quem, vulnerabilidade a qu, vulnerabilidade em que

circunstncias ou condies?

Neste estudo, a perspectiva da vulnerabilidade privilegiada, em relao s dimenses

individuais e sociais que compreendendo que as questes do uso abusivo do lcool que

envolve aspectos sociais, estruturais, culturais e individuais. Portanto, seu conhecimento

permite a compreenso do processo sade-doena e estimula as transformaes nas prticas

de sade, sociais e educativas para a reduo de danos.

Tomando por base as definies e a relevncia da temtica nos remete a tratar que o

dependente do lcool esta suscetvel a agravos, o que predispes a propenso de ausncia de

sade e reduo na qualidade de vida. Em relao operacionalizao do conceito de

vulnerabilidade, o aumento da tolerncia ao lcool pode no ser visto como problemtico

quando buscam tratamento, particularmente quando o tempo transcorrido entre o incio do

transtorno e o comeo do tratamento longo.

Fatores que favorecem a vulnerabilidade de acordo com o alcoolismo esto

relacionados tolerncia social com relao ao consumo excessivo de lcool tambm podem

influenciar a probabilidade da ocorrncia de problemas relacionados ao uso abusivo. De

acordo com o apresentado, os dados que sero levantados com a pesquisa enriquecero as

29

informaes e a ligao a cerca da vulnerabilidade e a predisposio ao alcoolismo. Deste

modo ajudar a identificar formas de reduo dos agravos sade.

1.2 Conceituaes do alcoolismo

O consumo de bebidas alcolicas integra os hbitos e a cultura de frao substancial

da populao dos pases ocidentais, e os problemas acarretados pelo consumo se fazem

presente, ocupando espao de relevante significao nas esferas de sade mundial, o consumo

de forma elevada de substncias psicoativas se fazem presentes ao longo da histria da

humanidade tornando a populao vulnerveis a vrias patologias orgnicas gerando agravos

a sade.

O lcool sempre se fez presente em simbolismos culturais, um deles o ritual religioso

milenar na Eucaristia conforme refere o filosofo Frances Bachelard (1999), o vinho o

smbolo da energia vital, produto da unio dos elementos contrrios, em sua metfora o

filosofo disserta: A aguardente a gua de fogo, a gua que queima (...) e se inflama. a

comunho da vida com o fogo. O lcool tambm um alimento que produz calor no centro do

peito.

Atravs da histria, o lcool tem sua representao cultural na vida da humanidade,

assim como suas funes em remdios, perfumes, cosmticos, e principalmente, como

componente essencial nas festividades sociais familiares em todo o mundo, como lao de

sociabilizao, euforia, comunho e para alguns, mtodo adotado de aceitao em grupos

distintos. Essa relao com o lcool e a sociedade, sofreu transformaes no decorrer da

crescente globalizao e transformao econmica levando ao aumento da produo e

disponibilidade de acesso ao consumo, favorecendo o uso abusivo e o alcoolismo. Fato

comprovado pela OMS (2012), ao declarar que, quanto maior for a riqueza econmica de um

Pas, o lcool mais consumido. E que pases de alta renda tm o maior consumo de lcool

por renda per capita e a maior prevalncia de beber pesado.2

Seguindo o caminho para melhor compreenso e aprofundamento sobre as definies

da doena como: o uso abusivo de lcool, alcoolismo, classificao, efeito e a sndrome da

dependncia alcolica foi realizado uma retrospectiva dos dados existentes embasando a

2 Padro definido como consumo de 60 ou mais gramas (cerca de 5-6 doses) de lcool puro em uma nica ocasio, ao menos uma vez por ms.

30

pesquisa com base nos objetivos, e com isso aprimorando o conhecimento em sade e a

temtica de relevncia mundial.

No sculo XIX o autor Magno Huss (1953), foi o primeiro a definir alcoolismo como

doena, passando a ser norteado pelos Alcolicos Annimos em 1935, apesar de todos os

estudos realizados, foi apenas com Jellinek, que o conceito de alcoolismo-doena tornou-se

popular na cincia em todo o mundo. Para ele, uma pessoa teria ou no alcoolismo como em

qualquer situao de tudo ou nada. Branco ou preto, ou tem ou no tem. E, para seus

portadores, a nica sada para tratar sua "doena progressiva e fatal" seria a abstinncia

alcolica definitiva. (JELLINEK, 1960). Portanto, para o autor, todos os pacientes que no

aderem a abstinncia sustentada so casos de fracasso teraputico.

Em 1976, Griffith Edwards e Milton Gross (Edwards e Gross 1976) propuseram o

conceito de Sndrome de Dependncia do lcool/SDA, ttulo esse provisrio que defendeu a

compreenso conceitual da dependncia do lcool, que se baseia na ideia de dependncia

como uma sndrome. Os autores abriram caminho para novas abordagens para preveno e

tratamento de lcool e problemas relacionados com a droga. No ano citado, tal conceito

passou ser adotado pela Organizao Mundial da Sade (OMS), na classificao de problemas

de lcool sendo includa a Classificao Internacional de Doenas (CID-10).

Firmando definio no Manual Diagnstico e Estatstico da Associao Psiquitrica

Norte-Americana (DSM-III-R), que trs, como um conjunto de fenmenos comportamentais,

cognitivos e fisiolgicos que podem se desenvolver aps o uso repetido da substncia. (WHO,

1994, p.111 ).

Baseando-se inicialmente no conceito de lcool e da doena alcolica, nos remete a

compreenso da definio do abuso do lcool de acordo com a Organizao Mundial da

Sade no Manual Diagnstico e Estatstico da Associao Psiquitrica Norte-Americana

(DSM-III-R) que sua 3 edio vem dizer que o abuso de drogas, lcool, produtos qumicos

ou de substncias psicoativas so:

o padro desajustado de uso indicado pela continuao desse uso apesar do

reconhecimento da existncia de um problema social, ocupacional, psicolgico ou fsico, persistente ou recorrente, que causado ou exacerbado

pelo uso recorrente em situaes nas quais ele fisicamente arriscado.

(WHO, 1994, p. 13)

O uso repetido de uma substncia psicoativa a tal ponto que o usurio fica perodo ou

permanentemente intoxicado, o mesmo apresenta uma compulso por consumir a substncia

preferida (WHO, 1994), demonstrando grande dificuldade para interromper o uso, levando a

vontade de consumir cada vez mais a substncia alcolica.

31

Na perspectiva do Ministrio da Sade a pessoa que usa de forma abusiva o lcool

definido como: bebedor moderado, algum que utiliza a bebida alcolica sem dependncia e

sem problemas decorrentes de seu uso; o bebedor-problema, algum que apresente qualquer

tipo de problema (fsico, psquico ou social) decorrente do consumo de lcool; e o dependente

do lcool, algum que apresente estado psquico e/ou fsico caracterizado por relaes que

incluem uma ingesto excessiva de lcool, de modo contnuo ou peridico (BRASIL, 2012).

Deste modo, o abuso do lcool no gera problemas iniciais como dependncia fsica,

j o alcoolismo se faz presente quando o consumidor passa a apresentar caractersticas de um

bebedor problema. Objetivando maior compreenso de como o uso abusivo gera o alcoolismo

e a Sndrome da dependncia alcolica os precursores do conceito (Edwards e Gross 1976)

citados por Gigliotti e Bessa (2004), dividiram em sete elementos o relacionamento do

consumo do lcool:

1 Estreitamento do repertrio

No incio, o usurio bebe com flexibilidade de horrios, de quantidade e at de tipo de

bebida. Com o tempo, passa a beber com mais frequncia, at consumir todos os dias, em

quantidades crescentes, ampliando a frequncia e deixando de importar-se com a inadequao

das situaes.

Nos estgios avanados, o indivduo consome de modo compulsivo e incontrolvel

para aliviar os sintomas da abstinncia, sem importar-se com os danos orgnicos, sociais ou

psicolgicos. Sua relao com a bebida torna-se rgida e inflexvel, no padro de tudo ou

nada.

2 Salincia do comportamento de busca do lcool

Com o estreitamento do repertrio do beber, h uma tentativa do indivduo de priorizar

o ato de beber, mesmo em situaes inaceitveis (por exemplo, dirigindo veculos, no

trabalho). Em outras palavras, o beber passa a ser o fulcro da vida do usurio, acima de

qualquer outro valor, sade, famlia e trabalho.

3 Aumento da tolerncia ao lcool

Com a evoluo da sndrome, h necessidade de doses crescentes de lcool para obter

o mesmo efeito conseguido com doses menores, ou a capacidade de realizar atividades apesar

de altas concentraes sanguneas de lcool.

4 Sintomas repetidos de abstinncia

Quando h diminuio ou interrupo do consumo de lcool, surgem sinais e sintomas

de intensidade varivel. No incio, eles so leves, intermitentes e pouco incapacitantes mas,

32

nas fases mais severas da dependncia, podem manifestar-se os sintomas mais significativos,

como tremor intenso e alucinaes.

Antes de dar prosseguimento nos elementos da Sndrome da dependncia alcolica,

vale salientar os trs grupos de sintomas presentes no processo de abstinncia caracterstica da

Sndrome da Abstinncia Alcolica (SAA). (Fantinato, 2011, p.27): sintomas fsicos:

tremores (desde finos de extremidades at generalizados), nuseas, vmitos, sudorese,

cefaleia, cibras, tontura. Sintomas afetivos: irritabilidade, ansiedade, fraqueza, inquietao,

depresso. E sintomas de senso percepo: pesadelos, iluses, alucinaes (visuais, auditivas

ou tcteis).

5 Alvio ou evitao dos sintomas de abstinncia pelo aumento da ingesto da bebida

Este um sintoma importante da SDA, sendo difcil de ser identificado nas fases

iniciais. Torna-se mais evidente na progresso do quadro, com o paciente admitindo que bebe

pela manh para sentir-se melhor, uma vez que permaneceu por toda noite sem ingerir

derivados etlicos.

6 Percepo subjetiva da necessidade de beber

H uma presso psicolgica para beber e aliviar os sintomas da abstinncia e,

7 Reinstalao aps a abstinncia

Mesmo depois de perodos longos de abstinncia, se o paciente tiver uma recada,

rapidamente restabelecer o padro antigo de dependncia e com maior intensidade.

Essa sistematizao da SDA, proposta por Edwards, teve sua validade clnica

comprovada por inmeros estudos e modificou a compreenso dos problemas relacionados ao

lcool pela sade contempornea.

Na mesma vertente, ao expor o adoecimento causado pelo alcoolismo, Henrique

Carneiro (2010) retrata que apesar do lcool ser srio problema de sade pblica, a

embriaguez uma experincia reveladora de muitos aspectos da alma humana, como a busca

pela intensidade, pelo transbordamento ou por inspirao. Uma histria dos discursos sobre a

embriaguez mais do que uma histria das bebidas ou mesmo do corpo brio, uma histria

dos excessos e dos cuidados de si, da intimidade e das relaes sociais, exigindo o cruzamento

de fontes da medicina.

importante frisar, que a relao com o lcool varia de pessoa para pessoa, ou seja, o

contexto que vai definir as consequncias individuais que o lcool poder acarretar, tal

varivel depender do padro e intensidade do consumo, o que para uns o consumo gera

efeito disfuncional com complicaes e prejuzos a sade como o uso abusivo e a

33

dependncia, enquanto outras pessoas conseguem controlar o abuso de lcool sem apresentar

alteraes agravantes e antes mesmo que se transforme em dependncia.

Hoje, em relao origem da dependncia qumica, encontra-se multicausalidades

referentes ao alcoolismo, isto , h fatores de vulnerabilidades sociais, culturais, psicolgicas,

e gentica, sendo o ltimo ainda motivo de discusso e pesquisas em todo o mundo, a fim de

explicar seu estabelecimento e progresso foram realizados muitos estudos para testar a

hiptese gentica do alcoolismo como doena de carter hereditrio.

Ao realizar o estado da arte de pesquisas j publicadas sobre a hereditariedade

gentica, estudo sobre a perspectiva da gentica e epidemiologia do alcoolismo por Claiton

Dotto Bau (2002), retrata que mesmo no estado da cincia atual, s existe os marcadores

biolgicos do alcoolismo como a Gama Glutamil Transferase / GGT e o Volume Corpuscular

Mdio/VCM, que indicam o comprometimento orgnico pelo etanol, tal estudo trais pesquisas

realizadas (Cook & Gurling, 1991; Pickens et al., 1991; McGue et al., 1992), entre pares de

gmeos com base na populao geral do estado norte-americano de Virgnia, tendo como

amostra filhos de pais alcolatras e filhos adotados de pais alcolatras, obtendo como

resultado os filhos que se tornaram alcolatras os que convivem com o comportamento dos

pais e no somente os filhos com fator sanguneo dos pais. Completa ao descrever que a

hereditariedade foi estimada em aproximadamente 50-60%, tanto para homens, como para

mulheres.

Outro indcio de existncia de um comportamento gentico foi descrito por Schuckit

(1991), vem de uma intensidade diminuda de reao ao etanol nos filhos de alcoolistas,

quando comparados aos controles. Completa que esta diferena fisiolgica pode estar

relacionada com uma maior suscetibilidade ao alcoolismo, devido a uma exposio mais

frequente.

Deste modo, apesar de sabermos quais os marcadores biolgicos que indicam o

comprometimento orgnico pelo etanol, pesquisas ainda so realizadas para descobrir os

marcadores definitivos do alcoolismo. Na atualidade, estudos experimentais esto sendo

realizados em Los Angeles/EUA (UHART et al,2013), para detectar os marcadores genticos

associou o gene GAMA2 com a dependncia do lcool aps submeterem em laboratrio

indivduos saudveis entre 21 a 30 anos a doses via oral de lcool at atingirem um nvel

sanguneo de pico para avaliao. Como evidncias de resultado descreveram que a variao

do gene GABRA2 est associada a respostas negativas atenuadas do efeito do lcool, sendo

um fator de risco conhecido para a vulnerabilidade a transtornos por uso de lcool. Mantendo

assim, as evidncias que moderam a vulnerabilidade sem uma afirmativa de genoma.

34

Diante do exposto, aps as evidncias de se ter o alcoolismo como doena e os

diversos fatores de vulnerabilidades, salientou a preocupao das esferas de sade em levantar

uma vasta gama de polticas e intervenes globais, regionais e nacionais eficazes para

reduzir o uso nocivo do lcool, por ser uma tendncia promissora ao longo das ltimas

dcadas.

1.3 A dependncia do lcool e o meio familiar/social

1.3.1 Lar em conflito

O autor Gilmar Torquato (2013), contribui ao descrever que uma das consequncias na

infncia do uso dessa substncia pelos pais est associada ao abuso de crianas e s

repercusses negativas para o universo social, psicolgico e econmico do infante, alm de

danificar o desempenho desse indivduo como pai ou me, como marido ou mulher ou ainda

como provedor da casa. Nota-se assim que o consumo de bebidas alcolicas pode prejudicar a

relao entre pais e filhos e entre marido e mulher, desgastando as relaes interpessoais,

prejudicando a famlia atravs da negligncia e por maior necessidade de cuidados e gastos

com a sade de seus membros.

Na juventude, estudo realizado anteriormente aborda que as avaliaes cognitivas

mostraram diferenas no desempenho acadmico entre filhos de alcoolistas e filhos de no

alcoolistas, e apontou para um desempenho acadmico precrio. Assim, as dificuldades

cognitivas, acadmicas, comportamentais e emocionais podem ser entendidas como aspectos

de condies de vulnerabilidade. (Zanoti-Jeronymo & Carvalho, 2005).

Seguindo o exposto, somando para as vulnerabilidades familiares, o dependente do

lcool na posio de provedor da casa torna-se abalada devido aos danos que o lcool provoca

estrutura familiar, comprometendo o relacionamento de pai/me com filhos e do casal, alm

de muitas vezes abalar a situao financeira domiciliar (MENDES, MACEDO, 2012).

Tais problemas financeiros acarretam em repercusses na vida conjugal. O casamento

mais facilmente rompido quando o alcoolismo est presente, do que no grupo dos que usam

ou usavam pouco lcool. Estes alcoolistas uma vez divorciados custam mais a recasar-se do

que o grupo dos que usam pouco lcool (Carvalho e Menandro, 2012). Assim podemos

entender que as necessidades materiais da famlia servem frequentemente para consumar a

separao. Rompidos os laos familiares, com ou sem separao conjugal os que vivem sob o

mesmo teto passam a viver com degradaes econmicas e sociais.

35

Dentro das ocorrncias, estudos realizados por diversos autores, tais como: Moos

(1990); Sanchez e Gager (2000); Halford et al (2001) e Joseane Souza (2012) contriburam ao

mostrarem as consequncias decorrentes da presena da dependncia do lcool na famlia

afirmam que diretamente as esposas apresentam ao longo do tempo problemas mentais,

fsicos, de comunicao, baixa atividade social e insatisfao conjugal. Tambm indicam que

o cuidado de alcolatras, gesto financeira e educao das crianas so delegadas as

esposas. Essas mulheres centram suas vidas no cuidado de seus filhos e marido, no falam

sobre suas dificuldades e no param para pensar sobre suas vidas.

1.3.2 Acidentes urbanos e de trabalho

O alcoolismo e as consequncias sociais urbanas tornaram-se um dos principais

fatores de contribuio para mortes prematuras e incapacidades, alm de ser um gerador de

violncia, desemprego e absentesmo.

Na dcada de 80 o ministrio da sade realizou um levantamento atravs do programa

nacional de controle dos problemas relacionados com o consumo do lcool onde estimou que

no Brasil o alcoolismo seria: (1) a terceira principal causa de absentesmo ao trabalho; (2)

responsvel pela ocupao de 9% a 32% dos leitos hospitalares e (3) relacionado com at 75%

dos acidentes de trnsito. (Ministrio da Sade, 1987).

Dentro da perspectiva de quase duas dcadas, mundialmente o alcoolismo continua

com elevada potencialidade de agravos deixando de ser apenas uma estimativa para

confirmaes estatsticas. Estudos comprovam que nos EUA 16.000 mortes/ano esto

associados ao uso abusivo do lcool correlacionado a acidentes de trnsito, sendo esta a causa

de 1.000.000 mortes anuais. Os dados brasileiros so alarmantes quando constatamos que o

incio do uso do lcool se d na faixa etria entre 13,9 e 14,6 anos, e ainda que de 5037

indivduos com idade superior a dezoito anos 9,4% possuem abuso e 3,3% so dependentes

do lcool de acordo com os diagnsticos estipulados pela 4 edio do Diagnostic and

Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-IV) (ANDRADE, SILVEIRA, 2010).

Uma parte substancial da situao de risco de beber ocorre em ambientes de diverso

noturnas, como bares, discotecas e pubs 3. Por exemplo, um estudo realizado recentemente no

Reino Unido (Tutenges; Bogkjaer; Witte e Hesse, 2013), mostrou que 72% dos homens

3 Deriva-se do nome formal em ingls public house, cuso significado casa , um

estabelecimento licenciado para servir bebidas alcolicas, originalmente em pases e regies

de influncia britnica.

36

chegariam a uma concentrao de lcool no sangue de 0,15 durante uma s noite. Podendo se

compreender que os altos nveis de consumo de lcool em ambientes de diverso noturnos

acarretam a vulnerabilidades, principalmente aos riscos de acidentes de trnsito e de

violncias urbanas.

Outro estudo mostra que em 2012, o lcool estava envolvido em 62,9% das leses

relacionadas violncia. As intervenes destinadas a reduzir o consumo de lcool entre os

pacientes por leses de lcool se fazem existentes h mais de 20 anos e que algumas

abordagens de tratamento como grupo motivacional tm demonstrado a sua eficincia,

enquanto outros tipos de interveno parecem ter pouco ou nenhum efeito no tudo na

reduo do consumo de lcool. (CHERPITEL et al, 2013, p. 250)

Deste modo, podemos compreender que o alcoolismo resultado de grande

variedade de vulnerabilidade que propiciam ao risco nas violncias urbanas como tambm,

em acidentes de trnsito, e que a influncia do contexto ambiental e o impacto sobre a

sociedade tem sido amplamente discutido em todo o mundo.

No ambiente social do trabalho o alcoolismo afeta, sobretudo, as relaes do

dependente qumico e a sua atividade laborativa. A dependncia do lcool, ao atingir o

trabalhador, abala a sua "fora fsica", prejudicando o exerccio de sua responsabilidade como

homem, deixando de trabalhar por limitaes fsicas e psquicas, sobretudo, no cumprindo

seu papel moral de homem provedor.

Em termos gerais, o uso abusivo de lcool ocasiona prejuzos no ambiente

profissional, como diminuio na produtividade aumenta o absentesmo (falta ao trabalho),

maior probabilidade de acidentes de trabalho, entre outros. De acordo com a Organizao

Internacional do Trabalho (OIT), agncia das Naes Unidas de informao, anlise e

orientao sobre o trabalho, de 20% a 25% dos acidentes de trabalho no mundo envolvem

pessoas que estavam sob o efeito do lcool ou outras drogas. Alm disso, os prejuzos do uso

de lcool no ambiente de trabalho acarretam custos enormes para a economia do pas. (CISA,

2014).

O estudo completa descrevendo as consequncias do efeito do lcool a curto prazo,

decorrentes da depresso do Sistema Nervo Central (SNC):

Ao contrrio do que muitos acreditam, mesmo em pequenas

quantidade, o lcool pode causar prejuzos performance, qualidade e

segurana no trabalho, pois uma substncia depressora do Sistema

Nervo Central (SNC), cujos principais efeitos envolvem: Prejuzo do

julgamento e da crtica; Prejuzo da percepo, memoria e

compreenso, diminuio da resposta sensvel e retardo da resposta

reativa; diminuio da acuidade visual e viso perifrica;

37

Incoordenao sensitivo-motora, prejuzo do equilbrio e sonolncia.

(ANDRADE, SILVEIRA, 2010, p.66)

Seguindo o caminho, outros fatores tambm so levantados como vulnerabilidades no

ambiente de trabalho para o uso abusivo de lcool. Tais como: revolta, descontentamento,

momentos de estresse, decepo no trabalho, insatisfaes financeiras e sentimentos de ser

lesado no local de trabalho, os fatores apresentados favorecem a relao entre o lcool e

trabalho.

Conforme descreve Vaissman (2004, p.23), o alcoolismo e o consumo excessivo de

lcool so mais comumente encontrados em determinadas ocupaes, e a anlise de situaes

de trabalho como estresse, carga de trabalho excessiva e presso de superiores. Alguns fatores

contribuem para maior vulnerabilidade ao consumo excessivo de lcool. Em certas formas de

ocupao o acesso ao lcool ocorre enquanto se trabalha ocorrendo uma presso social para

beber. Completa ainda que, em certas profisses, h uma tradio quanto a se beber muito.

Quando ocorrem situaes de solido ou de falta de suportes scio familiares.

Sendo assim, atividades laborais que apresentam riscos pessoais, fatores estressores e

presses impostas por liderana apresentam maior vulnerabilidade ao alcoolismo.

Concomitantemente, consequncias relacionadas ao uso abusivo de lcool no trabalho esto

associados incluindo, as leses no intencionais devido diminuio da concentrao, assim

como a reduo do rendimento no trabalho gerando absentesmo.

1.3.3 Absentesmo e aposentadoria

Como exposto anteriormente os principais sintomas da intoxicao alcolica so um

sentido deficiente de equilbrio e coordenao, diminuio na ateno e tempo de reao

lento, favorecendo os riscos de acidentes no trabalho.

Estudo realizado na Blgica sobre o custo de lcool no local de trabalho (Tecco e

Annemans, 2013), descreve que a extenso do problema do lcool ainda um custo no

calculado nas empresas. Continua apontando, que poucos estudos fornecem evidncias claras

de uma causa, efeito ou relao entre abuso de substncias e os custos de trabalho e

orientaes valiosas para os empregadores para avaliar o custo do abuso de substncias em

seus locais de trabalho est faltando. Maior investimentos em preveno pelas empresas o

que se faz deficiente.

38

A Sndrome de Dependncia do lcool, de acordo com o Ministrio da Sade, um

problema tambm relacionado ao trabalho, e que as empresas subnotificam os acidentes de

trabalho relacionados ao uso abusivo do lcool, observando que so singelas as publicaes e

notificaes acerca do problema. Em 2004, visando melhorar as evidncias a cerca dos

acidentes de trabalho, foi implementada a portaria n777 onde dispe sobre os procedimentos

tcnicos para a notificao compulsria de agravos sade do trabalhador em rede de

servios sentinela especfica, no Sistema nico de Sade SUS. Onde resolve no Art,1,

inciso X os Transtornos Mentais Relacionados ao Trabalho (Brasil, 2004).

Passando tambm a fazerem parte da portaria do Ministrio da Sade - Gabinete do

Ministro N 104 de 2011 estabelecendo os fluxos, critrios, responsabilidade e atribuies aos

profissionais e servios de sade, estando presente no Anexo III que a Lista de Notificao

Compulsria em Unidades Sentinelas LNCS, como a 14 doena. (BRASIL, 2011).

Pensando no uso nocivo do lcool e seus problemas nas empresas, seu inicio se da a

partir das situaes de abuso nos fins de semana, que por parte cultural da nossa sociedade o

lcool um meio de sociabilizao como j mencionado anteriormente, resultando em

complicaes no trabalho. Conforme Maria Maeno (2011), o uso de lcool nos fins de semana

resulta em "atrasos de segunda-feira", queda da produtividade, repetidas licenas para

tratamento de sade, acidentes de trabalho e/ou trnsito, aposentadorias precoces e problemas

familiares, fazem parte de uma preocupao ou alerta para os programas de ateno sade

do trabalhador.

No mesmo estudo a autora completa que, na maioria das vezes, os trabalhadores

dependentes de bebidas alcolicas no procuram os servios de atendimento de sade nas

empresas, e sim as unidades de emergncia j no quadro avanado da dependncia,

principalmente pelo fato de que, no atendimento de emergncia, em geral a anamnese no

identifica os aspectos laborais (MAENO, 2011 p.298).

Segue o pressuposto, que parte do motivo dos trabalhadores no buscarem

atendimento pelas empresas vem do medo de serem punidos pela evidncia da alcoolizao.

Como tambm, a negao da dependncia pode ser um dos motivos da falta de procura dos

servios de sade nas instituies de trabalho.

Outro fator importante o preconceito existente na sociedade, que afeta o indivduo na

empresa, exemplo clssico quando uma pessoa apresenta determinada limitao de sade,

principalmente relacionada ao alcoolismo, ela torna-se destaque dos demais trabalhadores.

Levando a subnotificao diagnstica do alcoolismo crnico relacionado ao trabalho,

realidade que o preconceito social estimula o mascaramento. O trabalhador pode ser afastado

39

do trabalho aps algum tempo devido a complicaes do lcool no organismo e pode vir a ser

precocemente aposentado por invalidez (BRITES, ABREU, PINTO, 2014).

Os mesmos autores descrevem que o alcoolismo compromete 20% da fora de

trabalho no Brasil. Completam que a prevalncia de 20% de licenas mdicas por alcoolismo,

nas quais o tempo mdio de afastamento para tratamento de sade situa-se entre 30 e 59 dias -

perodo longo para se permanecer fora do ambiente de trabalho. No quadro epidemiolgico

mundial a OMS trs que o alcoolismo a terceira causa de absentesmo ao trabalho, a causa

mais frequente de aposentadorias precoces e acidentes de trabalho, e a oitava causa de

concesso de auxlio-doena. Na diviso por faixa etria, a taxa de prevalncia da populao

adulta ao alcoolismo varia de 3 a 10% (WHO, 2014).

As aposentadorias por SDA se enquadram pela legislao como aposentadoria por

invalidez, que definido pela incapacidade total e permanente do indivduo para o trabalho.

Para a constatao dessa condio, faz-se necessria avaliao pericial por Junta Mdica

objetivando subsidiar a emisso de Laudo Mdico Pericial (LMP) conclusivo de invalidez.

(Lda, 2013). De acordo com o estabelecido no Art. 188 da Lei n 8.112/1990, a

aposentadoria por invalidez ser precedida de licena mdica para tratamento da sade por

perodo no excedente a 24 meses. Para finalizar o processo da aposentadoria por invalidez o

laudo pericial se torna imprescindvel.

Estudo longitudinal realizado para avaliar perfil dos trabalhadores que se aposentaram

por alcoolismo na Fundao Nacional de Sade FUNASA resultam em dados alarmantes e

de maior preocupao para levantamento de estratgias de preveno.

O perfil demogrfico das aposentadorias por invalidez devido ao alcoolismo

na Presidncia da Funasa de 2005 a 2011 corresponderam a 31,81% do total das aposentadorias por invalidez. A prevalncia da correlao entre

alcoolismo e transtornos mentais foi de 54,54% do total de aposentados por

invalidez. Constataram no presente estudo que 100% dos servidores aposentados por alcoolismo eram do gnero masculino. (LDA, 2013)

Diante do exposto, se faz necessrio investigaes mais apuradas e intervenes

precoces nas empresas para as vulnerabilidades presentes no alcoolismo, implementando

programas preventivos relacionado ao uso abusivo de lcool, principalmente para aqueles que

ainda no desenvolveram um transtorno.

40

1.3.4 Polticas Pblicas

Salientou a preocupao das esferas de sade em levantar uma vasta gama de polticas

e intervenes globais, regionais e nacionais eficazes para reduzir o uso nocivo do lcool,

com isso levantamos uma discusso sobre as polticas pblicas que embasam a temtica.

So consideradas politicas do lcool aquelas que dizem respeito relao entre lcool,

segurana, sade e bem estar social, como qual esforo ou deciso de autoridades

governamentais ou de organizaes no governamentais para minimizar ou prevenir

problemas relacionados ao lcool (OMS, 2010).

As politicas pbicas sobre o lcool so divididas em duas categorias: as alocatrias e

as regulatrias que so fundamentadas como:

As polticas de alocao promovem recursos a um grupo ou organizao

especfica para preveno e tratamento, de forma a atingir objetivos de interesse pblico, com financiamento de campanhas educativas e

fornecimento de tratamento aos dependentes do lcool. E as polticas

regulatrias procuram influenciar comportamentos e decises individuais por

meio de aes mais diretas. Por exemplo, leis tm sido usadas para restringir o acesso bebida alcolica por razes de sade e segurana pblica, que:

regulam preo e taxao dessas bebidas; impem uma idade mnima para sua

compra; limitam os horrios de funcionamento de bares; probem total ou parcialmente a propagandas de bebidas. (DUAILIBI & LARANJEIRA,

2007, p.841)

O que facilita o entendimento das determinaes de legislaes. Outra medida, o

combate do beber e dirigir pela populao, com o objetivo de preveno dos acidentes. A

conduo de veculos sob o efeito do lcool constitui um srio problema mundial, gerando

gastos pblicos decorrentes do tratamento dos agravos.

As leis federais que propem aes regulamentatrias relacionadas s bebidas

alcolicas. Entre elas destacam-se a proibio da venda de bebidas alcolicas para menores de

18 anos (artigo 243 do Estatuto da Criana e do Adolescente, Lei 8.069/90 e Lei das

Contravenes Penais, artigo 63)

Em 2005, o Conselho Nacional de Polticas sobre Drogas - CONAD aprovou a

Poltica Nacional sobre Drogas, que admite a importncia de incluir a questo do uso abusivo

de drogas como um problema se sade pblica, e admite a necessidade do tratamento,

recuperao e reinsero social do usurio de lcool e outras drogas (DUAILIBI &

LARANJEIRA, 2007).

O Decreto n 6.117/2007 aprova a Poltica Nacional sobre o lcool, que dispe sobre

as medidas para reduo do uso indevido de lcool, sua associao com a violncia e

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criminalidade e confere outras providncias como as que restringem a exibio da propaganda

na televiso de bebidas com baixo teor alcolico, como a cerveja.

A legislao tem objetivo e princpios fundamentais sustentao de

estratgias para o enfrentamento coletivo dos problemas relacionados ao consumo de lcool, contemplando a intersetorialidade e a integralidade de

aes para a reduo dos danos sociais, sade e vida causados pelo

consumo desta substncia, bem como as situaes de violncia e

criminalidade associadas ao uso prejudicial de bebidas alcolicas na populao brasileira. (BRASIL, 2007)

.

Em dezembro de 2012 foi sancionada a Lei N12.760, substituindo a lei n

11.705/2008, onde trs como principal alterao no Cdigo de Trnsito Brasileiro o aumento

no valor da multa administrativa, como tambm amplia as possibilidades de provas da

infrao de dirigir sob influncia de lcool ou de qualquer substncia psicoativa, as quais

foram disciplin