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PEDRO SISNANDO LEITE O Verdadeiro Desenvolvimento Econômico

O Verdadeiro Desenvolvimento Econômico · Para José Nicácio de Oliveira, amigo fraterno, colega do Banco do Nordeste do Brasil e sábio conselheiro de muitos estudos que realizei

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PEDRO SISNANDO LEITE

O Verdadeiro

Desenvolvimento

Econômico

É amplamente conhecido nos meios acadêmicos e

na observação da história econômica dos países

subdesenvolvidos que o crescimento econômico é

insatisfatório para alcançar metas de redução da

pobreza e obter melhor distribuição da renda. Entre

as muitas razões porque há essa contradição, duas

podem ser destacadas para demonstrar isso.

Primeiro, os países subdesenvolvidos que

obtiveram elevadas taxas de crescimento do Pro-

duto Nacional Bruto (PNB), durante muitos anos

seguidos, tiveram também incremento global do

desemprego e do subemprego. Na verdade, a cri-

ação de novas oportunidades de trabalho nas

atividades modernas foi inferior a taxa de cresci-

mento do produto. Segundo, o crescimento do PNB

foi acompanhado por um aumento na desigualdade

da distribuição da renda, em termos relativos e

mesmo absolutos, em alguns segmentos da

sociedade desses países.

�Combatendo a Pobreza Rural

�Questões Econômicas e Acadêmicas

�Em Busca do Desenvolvimento Rural do Ceará

�Estratégias para o Desenvolvimento Rural do Ceará

�A Luta pelo Desenvolvimento Regional e Rural no Mundo

�A Tragédia do Orós: Documento Histórico

�Devoção à Santa Face de Jesus

�A Trava do Desenvolvimento Econômico

�Fundamentos de Economia: Teoria, Prática e Políticas

�A Agricultura do Nordeste

�Subdesenvolvimento e Desenvolvimento do Nordeste

�Desenvolvimento Harmônico do Espaço Rural

�Retrospecto e Perspectivas da População e da Renda do Nordeste

�Estratégias e Planejamentos do Desenvolvimento Regional e Rural Integrado

�Novo Enfoque do Desenvolvimento Econômico e as Teorias Convencionais

�Escandinávia: Modelo de Desenvolvimento Econômico, Democracia e Bem-Estar

�A Prática de Elaboração de Relatórios Técnicos

OUTROS LIVROS DO AUTOROUTROS LIVROS DO AUTOR

9 788579 150180

ISBN 978-85-7915-018-0

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PEDRO SISNANDO LEITE

O Verdadeiro

Desenvolvimento

Econômico

É amplamente conhecido nos meios acadêmicos e

na observação da história econômica dos países

subdesenvolvidos que o crescimento econômico é

insatisfatório para alcançar metas de redução da

pobreza e obter melhor distribuição da renda. Entre

as muitas razões porque há essa contradição, duas

podem ser destacadas para demonstrar isso.

Primeiro, os países subdesenvolvidos que

obtiveram elevadas taxas de crescimento do Pro-

duto Nacional Bruto (PNB), durante muitos anos

seguidos, tiveram também incremento global do

desemprego e do subemprego. Na verdade, a cri-

ação de novas oportunidades de trabalho nas

atividades modernas foi inferior a taxa de cresci-

mento do produto. Segundo, o crescimento do PNB

foi acompanhado por um aumento na desigualdade

da distribuição da renda, em termos relativos e

mesmo absolutos, em alguns segmentos da

sociedade desses países.

�Combatendo a Pobreza Rural

�Questões Econômicas e Acadêmicas

�Em Busca do Desenvolvimento Rural do Ceará

�Estratégias para o Desenvolvimento Rural do Ceará

�A Luta pelo Desenvolvimento Regional e Rural no Mundo

�A Tragédia do Orós: Documento Histórico

�Devoção à Santa Face de Jesus

�A Trava do Desenvolvimento Econômico

�Fundamentos de Economia: Teoria, Prática e Políticas

�A Agricultura do Nordeste

�Subdesenvolvimento e Desenvolvimento do Nordeste

�Desenvolvimento Harmônico do Espaço Rural

�Retrospecto e Perspectivas da População e da Renda do Nordeste

�Estratégias e Planejamentos do Desenvolvimento Regional e Rural Integrado

�Novo Enfoque do Desenvolvimento Econômico e as Teorias Convencionais

�Escandinávia: Modelo de Desenvolvimento Econômico, Democracia e Bem-Estar

�A Prática de Elaboração de Relatórios Técnicos

OUTROS LIVROS DO AUTOROUTROS LIVROS DO AUTOR

9 788579 150180

ISBN 978-85-7915-018-0

O VERDADEIRODESENVOLVIMENTO

ECONÔMICO

PEDRO SISNANDO LEITE

FORTALEZA-CEARÁ2009

O VERDADEIRODESENVOLVIMENTO

ECONÔMICO

Copyright © 2009 by Pedro Sisnando Leite

PROJETO GRÁFICO E CAPA

Carlos Alberto Alexandre Dantas

REVISÃO

Tereza Porto

Leite, Pedro SisnandoO verdadeiro desenvolvimento econômico./ PedroSisnando Leite. – Fortaleza: Pedro Sisnando, 2009.

260p.

ISBN: 978-85-7915-018-0

1. Economia. I. Título

CDD: 330

L 533 v

Catalogação na Fonte

Floriano Lopes de Jordão

Alan Emmanuel Oliveira dos Santos

ParaJosé Nicácio de Oliveira,

amigo fraterno, colega do Banco do Nordeste doBrasil e sábio conselheiro de muitos estudos que

realizei sobre desenvolvimento regional.

“O Brasil precisaparar de admirar

o que não deu certo.”

Tom Jobim

SUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ...................................................................... 13

INTRODUÇÃO GERAL

O DILEMA CRESCIMENTO E DESIGUALDADE....................... 19

PRIMEIRA PARTEA ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

INTRODUÇÃO ........................................................................ 27OS ESTÁGIOS DO CRESCIMENTO ECONÔMICO.................. 30O PENSAMENTO LATINO-AMERICANO ................................ 34O CONSENSO DE WASHINGTON ......................................... 39SISTEMAS ECONÔMICOS ....................................................... 41O SISTEMA BRASILEIRO .......................................................... 46EVOLUÇÃO DAS IDEIAS ......................................................... 52CAMINHOS DOS PAÍSES DESENVOLVIDOS .......................... 58PERSPECTIVAS DO DESENVOLVIMENTO .............................. 62CRESCER E DISTRIBUIR ........................................................... 64DESIGUALDADE PREJUDICA CRESCIMENTO ........................ 66SUSTENTABILIDADE DO DESENVOLVIMENTO .................... 69ECODESENVOLVIMENTO ...................................................... 69DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ..................................... 71A FUNÇÃO DAS POLÍTICAS ESTATAIS E DOCAPITAL SOCIAL ..................................................................... 74

SEGUNDA PARTEA DOUTRINA DO DESENVOLVIMENTO JUSTO

INTRODUÇÃO ........................................................................ 81NOVO DESENVOLVIMENTO COM EQUIDADE .................... 84ALGUNS ELEMENTOS DA DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA .. 86

Crescimento Desigual e Pobreza Material ........................... 86As Ideias do Modelo da Doutrina Social da Igreja ............... 89Mensagem e Orientação aos Leigos .................................... 91

A FOME NO MUNDO SEGUNDO O PONTIFÍCIOCONSELHO COR UNUM ........................................................ 94

Introdução ........................................................................... 94A Igreja Está com os Pobres ................................................ 96Rumo a uma Economia mais Solidária ................................ 99A Superação da Fome ........................................................ 100

A ALIMENTAÇÃO DOS POBRES ........................................... 102A PRODUÇÃO MUNDIAL DE ALIMENTOS .......................... 104NOVO MODELO DE DESENVOLVIMENTO ......................... 107

TERCEIRA PARTEA QUESTÃO DA POBREZA

INTRODUÇÃO ...................................................................... 115O PROBLEMA DE DEFINIÇÃO .............................................. 118O SIGNIFICADO DE POBREZA RURAL E URBANA.............. 120CÍRCULO VICIOSO DA POBREZA ........................................ 124DESIGUALDADE E IGUALDADE NA DISTRIBUIÇÃO DE RENDA ...128POBREZA MUNDIAL ............................................................. 135SITUAÇÃO DA AMÉRICA LATINA E CARIBE......................... 144POLÍTICAS E PROGRAMAS PARA REDUÇÃO DA POBREZA . 153NECESSIDADE DE UM ENTENDIMENTO GLOBAL .............. 157O PACTO DE DESENVOLVIMENTO DO MILÊNIO ATÉ 2015 . 159

............ 163OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO DO MILÊNIO

.............................................................................. 166REFLEXÃO

QUARTA PARTEAS ARMAS CONTRA A POBREZA

INTRODUÇÃO ...................................................................... 173A POBREZA É RURAL ............................................................ 175O DESAFIO ............................................................................ 180CRIAR EMPREGO PRODUTIVO ............................................ 183URBANIZAR O CAMPO ........................................................ 189FAZER UMA REFORMA AGRÁRIA SOLIDÁRIA ..................... 193AJUDAR O AGRICULTOR COM TECNOLOGIA ................... 196EDUCAR PARA MUDAR ........................................................ 199

QUINTA PARTENOVAS ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTO REGIONAL

INTRODUÇÃO ...................................................................... 205A NATUREZA DO SUBDESENVOLVIMENTO REGIONAL .... 207DIRETRIZES PARA O DESENVOLVIMENTO HARMÔNICO.. 212ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTODO NORDESTE ...................................................................... 218RUMOS PARA UM DESENVOLVIMENTO JUSTO ................. 221PRINCÍPIOS DA NOVA ESTRATÉGIA RURAL ....................... 225

POSFÁCIO .............................................................................. 237

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................... 251

SEXTA PARTECONCLUSÕES

O AUTOR .............................................................................. 259

APRESENTAPRESENTAPRESENTAPRESENTAPRESENTAÇÃOAÇÃOAÇÃOAÇÃOAÇÃO

Este livro trata das causas originais que motiva-ram as graves desigualdades e a pobreza no Brasil,especialmente no Nordeste. O objetivo é discutir eapresentar ideias para contornar ou eliminar a lasti-mável situação de subdesenvolvimento em que seencontra essa populosa região de nosso País. Ain-da mais agora com a recriação da nova Superin-tendência do Desenvolvimento do Nordeste.

A bibliografia sobre os estudos regionais é va-liosa e muito me ajudaram na formulação deste li-vro. Mesmo assim, acredito que o assunto não estádevidamente esclarecido pelos economistas e espe-cialistas que estudaram a região. Os documentoselaborados pelas respeitadas insti tuiçõesgovernamentais terminam sendo comprometidospor razões institucionais.

Esta declaração de princípios não tem a finali-dade de desmerecer os primorosos estudos já reali-zados, mas transmitir ao caro leitor o meu desejo defazer uma abordagem fundamentada principalmenteno meu entendimento e na minha experiência pessoalde ensino e trabalho profissional em programas dedesenvolvimento regional e de combate à pobreza,durante os últimos trinta anos.

14 PEDRO SISNANDO LEITE

O esquema de redação deste livro foi estrutu-rado visando saber “onde estamos e para onde vamos”,considerando a meta de construir um desenvolvimen-to integral ou “verdadeiro” para o Nordeste do Brasil.

Para melhor compreensão dos leitores, adoteiuma metodologia de análise destituída de abstraçõese linguagem acadêmica. Naturalmente, foi preser-vado todo o rigor científico nas abordagens dasmatérias estudadas. O plano do livro está organiza-do na forma de cinco ensaios que tratam de aspec-tos especiais, mas se completam no contexto geralda obra.

De certo modo, orientei-me pelos dois enfo-ques preferenciais do estudo das economias sub-desenvolvidas. O primeiro relaciona-se com a buscade entender as razões por que algumas nações sãopobres e outras ricas. O segundo, procurar como ur-gente necessidade propor caminhos para realizaralgo com vista a acelerar o crescimento econômicoe reduzir o alto grau de pobreza ainda prevalenteem nosso país ou regiões.

Segundo estudos do historiador David S. Landes(Riqueza e pobreza das Nações, 1998): “Nos últi-mos 600 anos, as mais ricas economias do mundotêm sido predominantemente europeias”. Os paísesdo ocidente, de fato, prosperaram cedo devido à in-terseção de uma sociedade concentrada no trabalhoe no saber. No que resultou em aumento da produ-

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

15APRESENTAÇÃO

tividade, criação de novas tecnologias e esforço nosentido da realização das mudanças. Enquanto isso,outros fracassaram esperando uma revoluçãoapocalíptica para corrigir erros e generalizar a felici-dade, como pensavam os socialistas e marxistas. Umaexplicação do professor Landes sobre o fracasso noavanço do progresso foi a mentalidade nostálgica dealguns povos, desejando voltar à vida comunitária esem racionalidades. “Estes remando contra a maré.”

Enquanto isso, cada vez mais se reconhece quemuitos países subdesenvolvidos podem estarretardados economicamente não tanto pela es-cassez de poupança, mas pela escassez dehabilitações e conhecimentos que resultam na limita-da capacidade de sua estrutura orgânica para absor-ver o investimento de capital.

Mesmo assim, foi dada maior atenção ao inves-timento em capital material em detrimento do investi-mento em educação e capital humano. Trata-se davelha teoria de pensar em mobilizar a força muscularbruta, e não a capacidade intelectual dos paísessubdesenvolvidos. A renomada economista inglesaBárbara Ward (Nações Ricas e Libertação dos Sub-desenvolvidos, 1972) afirma nesse sentido: “Preci-samos batalhar com mais sabedoria para criar aestrutura de educação e responsabilidade social aoprogresso.”

Neste livro, procuro apresentar um quadro equi-librado dos diferentes problemas de escolha entre

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

16 PEDRO SISNANDO LEITE

menor taxa de crescimento, preservando os valoressociais, culturais e os modos de vida da população.Ou, quando possível, buscando crescer ao mesmotempo em que se obtenha novo estilo de desenvol-vimento com menos pobreza e desigualdade.

Hoje, como nunca, penso que o desenvolvi-mento integral é possível, desde que acreditemos nistoe trabalhemos todos com o firme propósito de priorizara solidariedade e a dignidade da pessoa humana.

Espero que este livro sirva para despertar, nosque o lerem, o sentimento da viabilidade dessenovo desenvolvimento em nosso país e a vontadepolítica com esse propósito. É óbvio, mas indispen-

Pedro Sisnando Leite

sável, dizer: “Não escrevo para provocar... Estou in-teressado em persuadir.” (J.K. Galbraith, 1971)

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

INTRODUÇÃO GERAL

“O desenvolvimento não se reduz a umsimples crescimento econômico. Paraser autêntico, deve ser integral, querdizer, promover todos os homens e ohomem todo.”

Papa Paulo VI

O DILEMA CRESCIMENTO DILEMA CRESCIMENTO DILEMA CRESCIMENTO DILEMA CRESCIMENTO DILEMA CRESCIMENTO E DESIGUALDO E DESIGUALDO E DESIGUALDO E DESIGUALDO E DESIGUALDADEADEADEADEADE

É amplamente conhecido nos meios acadêmi-cos e na observação da história econômica dospaíses subdesenvolvidos que o crescimento econô-mico é insatisfatório para alcançar metas de reduçãoda pobreza e obter melhor distribuição da renda.Entre as muitas razões por que há essa contradição,duas podem ser destacadas para demonstrar isso.

Primeiro, os países subdesenvolvidos que obti-veram elevadas taxas de crescimento do Produto Na-cional Bruto (PNB), durante muitos anos seguidos,tiveram também incremento global do desemprego edo subemprego. Na verdade, a criação de novas opor-tunidades de trabalho nas atividades modernas foi in-ferior à taxa de crescimento do produto. Segundo, ocrescimento do PNB foi acompanhado por umaumento na desigualdade da distribuição da renda,em termos relativos e mesmo absolutos, em alguns seg-mentos da sociedade desses países.

Esses dois fenômenos – crescimento do de-semprego e incremento na distribuição desigual darenda – são de fato conectados. Nos níveis de maisbaixa renda, com o crescimento da renda as pessoasnão conseguiram obter emprego no setor moderno,

20 PEDRO SISNANDO LEITE

enquanto os ganhos do crescimento da renda foramconcentrados nos grupos que já estavam empregados.

Em consequência disso, na formulação de po-líticas que objetivem a redução da pobreza e umamelhor distribuição de renda, o crescimento deveser colocado como um resultado e não como umameta da política econômica. Os renomados eco-nomistas Paul Streeten e Frances Stewart defendemessa tese.

É necessário, porém, estar atento para essa ques-tão de crescimento da renda versus desigualdade.Podem ocorrer várias situações que confundem oanalista desavisado. Numa situação, por exemplo,em que a distribuição de renda é relativamente boa,uma taxa mais rápida de aumento da renda irá bene-ficiar todos os segmentos econômicos e sociaisdesse país.

Caso haja previamente uma forte concentraçãoda renda e da desigualdade, certamente o crescimen-to dar-se-á nos setores mais dinâmicos da economia,agravando a concentração da renda. É o caso do Bra-sil, onde o crescimento tem ocorrido nas regiões maisprósperas e segmentos mais modernos da economia.

Em se tratando de economias subdesenvolvi-das, com baixa rendadeficientes, não há outra solução para mudar tal

per capita e condições de vida

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

21INTRODUÇÃO GERAL

situação que não seja através do crescimento darenda, inclusive com taxas mais elevadas do queocorre em outros países ou regiões. Somente assim serápossível diminuir o hiato de renda entre eles. De outraforma, numa economia estagnada, seria tentar dis-tribuir a pobreza ou retirar dos ricos, que estãoviabilizando o crescimento, para transferir para ou-tros setores menos produtivos.

A estratégia que está sendo implementada noCeará oferece uma alternativa adequada para solu-cionar esse dilema da equação: crescimento x distri-buição. Trata-se de uma política que associa os doiscomponentes numa ação simultânea, isto é, realizara redução da pobreza e da desigualdade através dodesenvolvimento econômico. Neste modelo, estãoincluídas ações intersetoriais e estrutura espacial,fazendo com que o crescimento produza dividen-dos sociais e seja acelerado pela melhor distribui-ção de renda e aproveitamento dos recursosterritoriais e vocações regionais.

O enfoque é como se a economia do interiorfosse globalizada para competir entre si, enquanto aregião metropolitana deixa de polarizar os fluxos mi-gratórios das zonas rurais.

Em função de tudo isto, entendo que o desen-volvimento consiste no crescimento e menos desi-

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

22 PEDRO SISNANDO LEITE

gualdade com redução da pobreza. É uma elevaçãodo padrão de vida de toda a população.

O desenvolvimento é também a transformaçãoqualitativa de uma sociedade em seu conjunto. Aevolução de novas formas de pensamento e, em con-sequência, de novas relações e novos métodos deprodução.

Este amplo processo de mudanças deve incluira maior parte da população. E não se deve limitar amodernização do capital ou em benefício das clas-ses mais ricas. O desenvolvimento anda paralelo como desenvolvimento humano e a solidariedade. Elenão é apenas a acumulação de investimentos e for-mação de capacidade produtiva.

O verdadeiro desenvolvimento sustentável, ouintegral, é um processo de ativação e canalizaçãode forças sociais, de capacidade associativa. É umasoma, um processo de mudança social e cultural.Condições que somente a atividade política podecanalizar essas sinergias.

O desenvolvimento histórico não tem um des-tino predeterminado como pensavam alguns filóso-fos do século XVIII. O futuro será como nós ofizermos. Não é necessário uma revolução violenta,mas reformas concebidas socialmente com vistas auma sociedade economicamente mais justa. São ní-

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

23INTRODUÇÃO GERAL

veis mínimos de saúde e condições educacionais.Oportunidades de emprego que têm de serestabelecidas e levadas à prática com investimentobem administrado e fiscalizado.

Cabe lembrar neste contexto a concepção dorenomado economista M. Todaro, ou seja: “Desen-volvimento é o processo de melhoria de todas as vi-das humanas.” (Novo enfoque do desenvolvimentoeconômico e teorias convencionais, Vivali, e-book,Sisnando, 2007).

É essa a promessa subjacente em todo este livro,o carro-chefe condutor em busca de um verdadeirodesenvolvimento integral.

O conteúdo destas páginas é o resultado de mui-tos anos de estudo, reflexões e discussões sobredesenvolvimento econômico nos meios acadêmicosonde lecionei por muitos anos essa disciplina. Te-nho participado também de experiências de progra-mas de desenvolvimento regional como economistado Banco do Nordeste do Brasil durante três déca-das. Como Secretário de Estado de Desenvolvimen-to Rural do Ceará durante o período de 1995-2002,coordenei um amplo programa de combate à pobre-za rural. Fiz muitas viagens de estudos ao exteriorpara visitar e conhecer iniciativas práticas de desen-volvimento em países desenvolvidos e subdesenvol-

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

24 PEDRO SISNANDO LEITE

vidos (A luta pelo desenvolvimento regional e ruralno mundo, Sisnando, 2006).

Este é um livro essencialmente prático, apesarde ser uma obra baseada em teorias. Ele procura re-conciliar os elementos doutrinários com a realidadedo mundo em que vivemos no Brasil.

Espero que seja útil em todos os sentidos. Nãosó para aqueles que desejam agir para mudar o queprecisa ser melhorado. Mas também para quem de-seja conhecer os problemas e as políticas que pos-sam nos orientar no futuro.

Cada uma das partes deste livro contém um sig-nificado especial, mas em conjunto são interde-pendentes e visam ao mesmo objetivo: reduzir apobreza e a desigualdade, sem prejudicar o cresci-mento econômico.

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

ECONOMIA DODESENVOLVIMENTO

PRIMEIRA PARTE

A busca de uma

maior justiça social e

de uma sociedade

mais equitativa

tornou-se, nos últimos

anos, uma unanimidade

em nível nacional e

internacional.

27PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

INTRINTRINTRINTRINTRODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃO

A literatura sobre os estudos de subdesenvolvi-mento e desenvolvimento é vasta e complexa. Den-tro dos limites dos objetivos deste livro serão trata-dos apenas as contribuições mais relevantes domodus operandi do desenvolvimento.

Uma nova ordem econômica surgiu na Segun-da Guerra Mundial, superando os fundamentos dosprincípios do livre-cambismo econômico.

Na primeira fase desse processo inovador osproblemas do subdesenvolvimento foram analisadoscom base na Teoria de Keynes. Segundo esse ex-poente da ciência econômica, a situação dos paísespobres podia ser interpretada como uma situaçãode depressão econômica dos países desenvolvidosem forma crônica.

A Teoria Geral (do emprego, do juro e da moe-da) do economista inglês John Maynard Keynes, apa-receu em 1936 como consequência da crise econô-mica mundial de 1929 (principalmente EstadosUnidos e Inglaterra). A teoria neoclássica foi in-capaz de indicar soluções para o que aconteciacomo decorrência do intervencionismo modernosobre o liberalismo econômico.

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

28 PEDRO SISNANDO LEITE

Keynes direcionou seus estudos sobre os fa-tores determinantes do nível de emprego e da ren-da nacional e propôs que o Estado deveria partici-par diretamente da atividade econômica. Isso paracompensar a redução dos investimentos provoca-da nos períodos de depressão das crises econô-micas. O intervencionismo de Keynes, entretanto,devia atuar com foco nos grandes segmentos dosistema econômico.

Com esse enfoque, a receita recomendada poressa análise era muito simples, e consistia de duasmedidas fundamentais: 1) a realização de grandesinvestimentos em obras públicas; 2) a adoção de umapolítica de dinheiro barato, ou seja, créditos combaixas taxas de juros.

Neste livro é demonstrado que essa concepçãodeixa de considerar aspectos estratégicos e outrasquestões que precisam ser levados em conta para asolução dos problemas dos países subdesenvolvidos.É oportuno observar, no entanto, que muitos países,inclusive o Brasil, ainda hoje continuam seguindo adoutrina keynesiana, com pequenos arranjos circuns-tanciais. Mas a aplicação desses princípios tem so-frido um retumbante fracasso em muitas partes domundo subdesenvolvido, conforme a história eco-nômica demonstra.

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

29PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

Esta primeira visão de tipo keynesiana, no en-tanto, deu lugar a outros enfoques e teorias que têmcontribuído para ampliar a discussão dessa proble-mática. Muitos estudos e livros foram publicados nosanos seguintes com a tese de que o subdesenvolvi-mento era um atraso temporal em alcançar a pros-peridade. Ou seja, os países subdesenvolvidos eramaqueles que ficavam para trás na corrida do cresci-mento econômico.

Em consequência, os temas essenciais a tratardeveriam ser a busca das causas que possam termotivado esse retardamento e as alternativas para su-perar tal problema. Neste particular, dois renomadoseconomistas se destacaram mundialmente pelas suascontribuições científicas, nessa fase pioneira dos no-vos estudos das causas do subdesenvolvimento. Fo-ram eles Arthur Lewis e W. Rostow. Tive oportunida-de de conhecer este último quando esteve emFortaleza a convite do Banco do Nordeste do Brasil eda Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste(SUDENE) a fim de proferir palestras para seus técnicos.

Quanto ao pensamento do professor Lewis, aquestão central que aprisiona os países subdesen-volvidos é a escassez de capital em comparação comuma oferta ilimitada de mão-de-obra. É bom lem-brar que na ocasião em que surgiram as ideias de

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

30 PEDRO SISNANDO LEITE

Lewis estava ocorrendo uma verdadeira “explosãodemográfica” nos países subdesenvolvidos.

Desta tese deduzia-se que era urgente uma po-lítica de expansão dos investimentos de capital. Paratanto, era preciso a participação tanto do setor pú-blico como do setor privado, em face da abrangênciada mão-de-obra excedente.

Os países que seguiram essas diretrizes esbar-raram em grave dificuldade. Os países subdesenvol-vidos contam, de fato, com uma grande oferta deforça de trabalho, mas com pouco treinamento e emgrande parte analfabeta.

Os Estágios do CrOs Estágios do CrOs Estágios do CrOs Estágios do CrOs Estágios do Crescimento Econômicoescimento Econômicoescimento Econômicoescimento Econômicoescimento Econômico

A teoria de Walt Whitman Rostow está expos-ta na sua famosa obra As etapas do crescimentoeconômico (1961) que se converteu em guia desteentão para os economistas do mundo inteiro. A te-oria de Rostow propõe um modelo de crescimentoque compreende cinco estágios obrigatórios quevão da sociedade tradicional à sociedade de con-sumo em massa, passando pela etapa decisiva dearranco (take off).

Sua fórmula política, que marca o surgimentode novas fronteiras pacíficas, proporcionaram as

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

31PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

ideias que fundamentaram o programa do presidenteKennedy de assistência aos países subdesenvolvidos.

Segundo as próprias palavras de Rostow, o cres-cimento tem um sentido relativamente limitado. Emcontrapartida, utiliza o termo desenvolvimento comoo estágio em que a ciência e a tecnologia modernassão desenvolvidas e difundidas através de vários se-tores e subsetores da Economia. Inclui fatorescomo o desenvolvimento do sentimento de nacio-nalidade e um sistema fiscal justo. Outro fator quereflete o desenvolvimento é a qualidade da educa-ção e a igualdade de oportunidades educativas.

Em resumo, as etapas do crescimento come-çam com o estágio da sociedade tradicional, ou quenão absorve de maneira regular um fluxo detecnologia. Explica Rostow que as sociedades tradi-cionais não eram historicamente estáticas, pois ti-nham ciência e inovações, mas não existia um fluxoestável de inovações tecnológicas. Estas sociedades(chinesas, gregas, romanas, hindus ou africanas)podiam expandir-se até certo ponto, mas defronta-vam-se com limites tecnológicos.

Esta repetição cíclica da história foi interrompi-da na Grã-Bretanha nos fins do século XVIII. As co-lônias da América e a Europa Ocidental encontra-vam-se no que Rostow chama de condições prévias

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

32 PEDRO SISNANDO LEITE

para o take off, ou arranque. Todos esses países esta-vam progredindo, mas longe da fase da industriali-zação. Mas estavam ampliando seus mercados nacio-nais com estradas e canais para a melhoria dos meiosde comunicação. Expandiam seu comércio externoe seus sistemas educacionais transformavam-se.A tarefa com que a Europa do século XVIII se defron-tou não foi diferente do que tem de enfrentar a Amé-rica Latina e a Ásia: construir uma infraestrutura,educar as pessoas, desenvolver o comércio e prepa-rar-se para a industrialização. O arranco produz-segeralmente num pequeno grupo de setores e incri-velmente em poucas regiões do país. A duração paraa etapa da maturidade tecnológica carece de déca-das para alcançar a plena industrialização e as de-mais regiões.

Na sequência ao arranco, tem-se o que Rostowchama de “consumo em massa” que é aquele emque todas estas tecnologias ocorrem paralelamentecom um alto rendimento médio da população. Comoexemplos, podem ser citados os Estados Unidos quealcançaram esta fase nos anos vinte. A Europa Ociden-tal e o Japão estavam nele nas décadas de 1960. Noseu livro Politic and the stage of growth (Política eestágio do crescimento), Rostow acrescentou maisoutro estágio ao qual denominou “Busca da Quali-

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

33PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

dade.” É uma etapa em que certos serviços públicose privados se expandem rapidamente: educação, saú-de, controle da poluição urbana etc. Os Estados Uni-dos chegaram a esse patamar nos anos sessenta, aEuropa Ocidental e o Japão na década de 1970.

O método de Rostow tenta colocar a histórianuma sequência de estágios, revelando um elemen-to importante e lógico do processo de crescimen-to. A teoria marxista também adota orientação si-milar ao propor no processo histórico a sequênciade Feudalismo, Capitalismo, Socialismo e Comu-nismo. Para Marx, o comunismo é o estágio emque a escassez dá lugar à abundância e ao bem-estarda sociedade.

No relatório apresentado por MikahilGorbatchov na reunião plenária do Partido Comu-nista da União Soviética, em 15 de outubro de 1985,afirmou: “É impossível passar diretamente à fase su-perior do comunismo transpondo o socialismo, domesmo modo que seria errôneo imaginar o Socialis-mo como formação independente.”

Para rechaçar a interpretação de Rostow dosestágios de desenvolvimento, os marxistas afirmamque o subdesenvolvimento é uma deformação es-trutural, uma anormalidade que se apresenta em de-terminados países em consequência do desenvol-

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

34 PEDRO SISNANDO LEITE

vimento do modo capitalista de produção, além danão consideração da luta de classes que é motor dahistória das sociedades. Na investigação da evolu-ção da humanidade, Karl Marx distingue formaçõeseconômico-sociais, enquanto Rostow enfatiza o as-pecto técnico-material e minimiza a importância dopolítico-ideológico. Na realidade, o economista pro-fessor Sílvio Baró Herrera, da Universidade de Ha-vana, afirma no seu trabalho sobre Notas Críticassobre o Pensamento de Três Economistas Burgue-ses Contemporâneos: “En realidad, su obra nopersigue verdadeiramente exponer una periodizaciónde la evolución económico-social de la humanidad,sino escribir um libero antimarxista.”

O Pensamento Latino-americano

O interesse pela Economia do Desenvolvi-mento também conduziu os economistas da Améri-ca Latina a áreas de pesquisa referentes à situaçãoespecífica da própria Região. A equipe de pesquisa-dores da Comissão de Estudos para a América Latina(CEPAL), órgão das Nações Unidas, liderou esse pen-samento. O diretor desse centro, que era o renomadoeconomista Raul Prebisch, desenvolveu um modeloque predominou no mundo acadêmico e nas políti-

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cas de desenvolvimento desse Continente, a partirdos anos sessenta.

Esse modelo se baseava na chamada teoria dadependência econômica cujo mecanismo consistiana dominação das economias centrais (desenvolvi-das) e uma certa subordinação das economias peri-féricas e subdesenvolvidas. Nesse modelo simplista,predominava um sistema de relações comerciais emque os países latino-americanos exportavam matérias-primas brutas para as nações ricas e importavam bensindustrializados de alto valor agregado.

Para neutralizar essas tendências e gerar umcentro dinâmico de nascimento econômico nos pa-íses subdesenvolvidos, a CEPAL propunha políticas,estratégias e diretrizes de ação. As políticas idealiza-das incluíam subvenções a atividades selecionadas,

Para agravar os efeitos desfavoráveis para os países subdesenvolvidos, os técnicos da Comissão Econô-mica para a América Latina (CEPAL) defendiam a tese de que ao longo dos anos ocorreu uma deterioração dos “termos de intercâmbio”, caracterizada pela ele-vação dos preços médios dos produtos manufatura-dos importados e uma depressão nos preços das matérias-primas exportadas. Essa armadilha exter-na acabava levando os países latino-americanos e, por certo, outros países ao redor do mundo, a uma situação de estagnação econômica e pauperismo.

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o controle de preços, a introdução de barreiras co-merciais e medidas de proteção fiscal contra produ-tos industriais e alimentos importados.

Esta política, na prática, gerou uma participa-ção governamental particularmente ativa na produ-ção industrial de bens e serviços, e na agrícola. Estaseram chamadas as áreas estratégicas para o desen-volvimento. Foi o período em que ocorreram as refor-mas agrárias em vários países latino-americanos. Asinstituições do governo passaram a controlar os mer-cados de produtos locais e externos.

Em consequência dessa ação intervencionista,a maior parte dos países da região criaram setoreseconômicos fortemente protegidos e dependentes doapoio do governo. De modo geral, essas indústriasmotivaram a aceleração das taxas de crescimento daeconomia e um sentimento positivo de autonomia eperspectivas de progresso econômico. Este processode avanço foi comprometido a partir do momentoem que os recursos financeiros para manter esse me-canismo de subsídios superaram a capacidade dospaíses em realizarem tal financiamento com recur-sos próprios.

Para solucionar esses déficits, os governos con-trataram empréstimos com instituições financeiras eo sistema bancário privado internacional. Daí começa

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a chamada “década perdida” quando as preocupa-ções das políticas públicas foram concentradas naadministração da dívida externa e processosinflacionais generalizados.

Considerando o conjunto dos 25 países cujadívida externa representava 80% do total da dívidadas nações de renda média, ocorreu um aumentodesses endividamentos de US$ 78 bilhões para US$125 bilhões entre 1973 e 1980, a preços reais. Omais difícil disso tudo era que 63% desse valor pro-vinha de fontes privadas com prazos relativamentecurtos. Tal situação gerou um encargo de pagamen-tos ao exterior que causou transtornos econômicos,sociais e políticos.

Com as medidas tomadas para restringir o con-sumo e estimular a mobilização de recursos interna-cionais, essa combinação de desajustes na evoluçãodas políticas econômicas motivou o aumento dapobreza, mesmo que alguns países tenham conse-guido obter taxas surpreendentes de crescimento darenda. A política de substituição de importações doBrasil, por exemplo, possibilitou uma taxa de cresci-mento médio anual de 10%, embora não tenha con-seguido manter-se estável. Com a estratégia da aber-tura da Economia na década de 1980, finalmentecomeçou a dar frutos nos anos 1990, mesmo que o

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crescimento tenha sido mais modesto do que ocor-rera antes.

À medida que a dívida dos países latino-ameri-canos aumentava, tornava-se evidente a necessida-de de um ajuste estrutural. Em seguida, foi a própriapressão das instituições financeiras internacionais queapressaram tais medidas. É dessa época a aplicaçãogeneralizada das chamadas “políticas neoliberais.”A partir de então, a situação da Economia regionaltornou-se complexa e contraditória, com avanços eretrocessos na situação econômica e social. A CEPALcalcula que nesse período a pobreza aumentou e asdesigualdades de renda se agravaram.

As recomendações que foram estipuladas nasrodas de negociação da dívida externa de cada paíseram fomentadas segundo os princípios das organi-zações internacionais. O conjunto de medidas depolítica econômica aplicadas aos países da AméricaLatina daria resultados em crescimento e estabilida-de. Essas orientações tornaram-se conhecidas como“Consenso de Washington”, segundo denominaçõesatribuídas ao economista inglês John Williamson,do Banco Mundial. Todas essas análises sobre a teo-ria da dependência foram objeto de uma série decríticas baseadas em argumentos econômicos e ide-ológicos. Segundo essas opiniões, a história da evo-

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lução das nações não é de um desenvolvimento equi-librado e autárquico. No processo de crescimento,explicam, as nações se destacam enquanto outrascom o tempo alcançam as que estão mais adianta-das. Assim, é normal as nações experimentarem asensação de dependência proveniente de seu relati-vo desenvolvimento.

No século XVII, os ingleses sentiam-se dessemodo em relação aos holandeses, assim como hojeos países subdesenvolvidos sentem em relação aosEstados Unidos ou à Europa. Por vezes, esta depen-dência foi direta como na situação do colonialismo.Foram os norte-americanos os primeiros a expor adoutrina que relaciona a industrialização com o sen-tido de dependência (ou independência). AlexandreHamilton, em 1791, apresentou um documento aoCongresso dos Estados Unidos expondo essa doutri-na que a esquerda latino-americana adotou comobandeira das ideias de desenvolvimento da região.

O Consenso de WO Consenso de WO Consenso de WO Consenso de WO Consenso de Washingtonashingtonashingtonashingtonashington

As políticas idealizadas por esse consenso pro-punham a disciplina fiscal para eliminar o déficit pú-blico e as pressões inflacionárias, com prioridade nosgastos públicos em educação, saúde e infraestrutu-

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ra. Reforma tributária, com maior peso nos impostosindiretos. Liberalização financeira, com taxa de câm-bio competitiva. Liberalização do comércio exteriore o fim das restrições ao capital externo. Adoção deprivatização das empresas deficitárias. Desregulaçãodas relações trabalhistas e defesa da propriedade in-telectual e patentes.

Essas políticas foram motivo de inflamados de-bates desde a sua adoção em 1989. Com raras exce-ções, essa reestruturação foi muito aquém do espera-do. Para avaliar os resultados disso tudo, o próprioeconomista John Williamson organizou um livro parafazer um balanço da teoria e da política das medidassugeridas no passado. O nome do livro é Depois doConsenso de Washington (Editora Saraiva, 2003).

Na autocrítica, Williamson identifica falhas denatureza institucional e erro de avaliação quanto aosefeitos do crescimento econômico, seus sérios pro-blemas de distribuição de renda e pobreza. A novaAgenda proposta pelos colaboradores do referido li-vro pode ser resumida na seguinte reflexão: “A basepara o combate às desigualdades está na ênfase eco-nômica.” Dentre as recomendações, que agora estãosendo chamadas de “Dissenso de Washington”, sãoos mais relevantes para os países emergentes: oportu-nidade para pequenas empresas por ser responsável

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pela maior parte de emprego; redes de proteção soci-al como forma de garantir uma renda mínima para apopulação; escolas para os pobres por ser a educaçãoa forma mais rápida e visível de ascensão social eeconômica; reforma agrária sustentável. Outras dire-trizes concebidas nessa nova proposta estão tambémrecomendações quanto a aumentar a tributação dosricos e disciplina fiscal; dirimir a dependência exter-na e reforçar os direitos dos trabalhadores e serviçospúblicos acessíveis aos pobres.

Em entrevista à revista Veja (27 de agosto de2003), o professor Williamson afirmou que “De cer-ta maneira o governo Fernando Henrique Cardosojá estava preocupado com todas essas questões; e ode Lula parece que também vai encarar os mesmosdesafios.” Ele conclui: “ O Consenso de Washingtonpoderia se chamar, sem nenhum problema: Consen-so de Brasília.”

Sistemas EconômicosSistemas EconômicosSistemas EconômicosSistemas EconômicosSistemas Econômicos

Sistema econômico é a denominação que oseconomistas dão à estrutura organizacional einstitucional de uma Economia. Estão incluídas nessaconceituação a natureza da propriedade e o controledos recursos produtivos.

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De modo geral, os países estão classificados nes-se particular como capitalismo de mercado puro, ca-pitalismo avançado, socialismo de mercado, alémdos sistemas “mistos.” Nos últimos anos perdeuimportância o chamado de sistema socialista dirigi-do praticado na antiga União Soviética, China e al-guns países do leste europeu.

Nas aulas de Economia, os estudantes fre-quentemente pedem esclarecimentos sobre ossignificados das denominações dos sistemas eco-nômicos mencionados. Por influência da imprensa, háuma tendência para se classificarem as economias em“capitalistas” e “socialistas.” É a ideia bipolar de es-querda versus direta formulada a partir da “guerra fria”liderada pelos Estados Unidos e União Soviética.

Por essa razão, serão descritas resumidamente ascaracterísticas essenciais de cada tipo predominantedos sistemas econômicos. Nossa tarefa aqui, portan-to, não é comparar ou analisar os diferentes sistemasconforme suas qualidades e defeitos.

Podemos iniciar dizendo que a “economia demercado capitalista pura” é um modelo baseado napropriedade privada de todos os ativos produtivos.Os elementos desse sistema são a instituição da pro-priedade privada e da livre empresa, apoiadas porgarantias legais. O foco principal é a maximização

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dos lucros por parte dos produtores e de maximiza-ção das satisfações por parte dos consumidores. Osmecanismos para o alcance desses objetivos são omercado e o sistema de preços.

No modelo de capitalismo puro supõe-se a exis-tência de milhares de produtos e consumidores que,isoladamente, não podem influenciar o preço quepaga ou compra por bens e serviços produtivos oude consumo.

Outra condição é que cada unidade econômi-ca possua “perfeito conhecimento de todas as alter-nativas de preços.” Assim, os produtores podemmaximizar os lucros e os consumidores podem maximi-zar a satisfação. É isto que tecnicamente se diz que éuma situação de competição perfeita. Este sistema,como é fácil observar, não existe no mundo real,mas apenas nos livros-textos.

A chamada de “economia de mercado capita-lista desenvolvida” é o sistema adotado principal-mente nos países do Primeiro Mundo, como a Amé-rica do Norte, a Europa Ocidental, Austrália, Japãoetc. Neste sistema prevalecem regimes de proprieda-des e tomada de decisões econômicas privadas epúblicas. Para disciplinar o funcionamento do sis-tema privado, os governos atuam com crescentecontrole sobre a atividade econômica. São políti-

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cas monetárias e fiscais, atuando diretamente nasatividades produtivas na forma de empresas esta-tais e programas de investimento. Os governos de-sempenham também ações de regulação das ativi-dades das empresas e corporações privadas. Outrasmodalidades de atuação do setor público são ocontrole dos salários, taxas de juros e diversas mo-dalidades de impostos.

Dessa forma, a economia de mercado é consti-tuída da instituição da propriedade privada e liber-dade econômica individual, mas convivendo comelementos de interesse público. É, na verdade, umsistema misto do setor privado e do setor público.

O terceiro sistema é denominado de “econo-mia de mercado, com planejamento.” Trata-se deuma modalidade muito semelhante ao modelo an-terior, mas com características ainda não plenamen-te desenvolvidas. Neste caso, por exemplo, prevale-cem graus variáveis de propriedade privada dosrecursos lado a lado com a participação pública dasatividades econômicas.

Exemplos desse sistema são o Brasil, Argenti-na, México e grande parte das economias do Tercei-ro Mundo. Um elemento comum nesses países é ouso do planejamento governamental como instru-mento de política econômica.

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A economia socialista “de mercado” utiliza o me-canismo de preços e a eficiência econômica capita-lista de mercado. O objetivo é o igualitarismo de pro-dução e distribuição socialista. A Iugoslávia seria oexemplo mais citado, antes da queda do muro deBerlim. Na verdade, este sistema é a alternativa quesurgiu do sistema de mercado dirigido com plane-jamento central da antiga União Soviética e da Repú-blica Popular da China. Neste último caso, a proprie-dade privada ainda é bastante limitada, consistindode ferramentas, casas rurais, algumas residências ur-banas e pequenas parcelas de terra, após a última re-forma agrária com base na propriedade familiar.

Nos últimos anos, com a modernização capita-lista da China, pode-se dizer que praticamente to-dos os países antes integrantes da União Soviéticae dos países do leste europeu estão adotando gra-dativamente a modalidade de sistemas de economiasocialista de mercado ou de economia mista. Ho-je, apenas Cuba continua regida pelos princípios daseconomias de mercado estatal ou socialismo cen-tralizado.

Dessa maneira, M. Todaro, depois de analisartodas essas denominações de sistemas econômicos,afirma que essas questões são de natureza retóricagovernamental ou de escritos acadêmicos e ideoló-

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gicos. A sua recomendação aos estudantes é “anali-sar uma determinada Economia, seu sistema econô-mico através de uma maneira pela qual estão real-mente organizados”, conclui Todaro citando um ditosatírico fixado certa vez num quadro de avisos daUniversidade de Varsóvia: “Capitalismo é a explora-ção do homem pelo homem; comunismo é o inver-so.” Ideologias têm um importante papel na ativida-de econômica, mas a distância é substancial entre ateoria e a prática. Dessa maneira, rótulos como sis-tema capitalista, socialista e comunista devem serusados com responsabilidade.

O Sistema BrasileirO Sistema BrasileirO Sistema BrasileirO Sistema BrasileirO Sistema Brasileirooooo

O conhecimento das teorias, conceitos e signi-ficado da terminologia da ciência econômica é umanecessidade e uma obrigação das pessoas que lidamprofissionalmente ou desejam entender a realidadedo mundo em que vivem. Esta afirmação se aplica atodos os ramos das ciências exatas e sociais.

A economia, no entanto, é complexa e poucocompreendida, apesar de todos falarem diretamentesobre ela ou viverem experiências de sua própriavida, quer se trate de ricos ou pobres. Isso porqueenvolvem certos elementos intangíveis, tais como pa-

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drões culturais e valores sociais. Apresenta dimen-sões políticas e humanas, assim como econômicasprioritariamente. Muitas vezes é profundo oarcabouço histórico que explica a razão de ser deacontecimentos presentes.

O sistema de colonização é um exemplo des-sas influências. O financiamento da economia de umdeterminado país pode depender de fatores externosincontroláveis, assim como de forças internas quepodem ser suscetíveis de alteração. Na área política,há pessoas no Brasil que acham melhor o crescimen-to mais acelerado da economia com a perda de al-gumas liberdades civis. Outros julgam que o desejá-vel é um crescimento mesmo que mais lento, con-tudo com justiça social.

Os sistemas econômicos presentes no mundoatual estão marcados pelo processo de globalização.Embora não se trate de um processo novo, a revolu-ção das comunicações ampliou os processos eco-nômicos, sociais e culturais de âmbito mundial so-bre aqueles de natureza nacional. Por força dacrescente gravitação dos processos econômicos, asestratégias nacionais são levadas a ser delineadas comvista a incorporação à economia mundial.

De acordo com as condições de cada país, aglobalização pode oferecer oportunidades para o de-

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senvolvimento, mas, devido à abertura nas relaçõesinternacionais, aumentam os riscos originados de no-vas fontes de instabilidade comercial e financeira.Assim, a caracterização do que é um sistema econô-mico de determinado país depende da avaliação davulnerabilidade externa e política socioeconômica,modalidade dos sistemas ou inovação e desenvolvi-mento tecnológico e complementaridade entre ins-tituições globais, regionais e nacionais.

Embora o modelo brasileiro seja denominadode “capitalista”, o rótulo é ilusório. A política pragmáti-ca do Brasil tem utilizado indistintamente os recursosdisponíveis: capital, tecnologia e iniciativa empresa-rial. O Brasil, ao longo de sua história, tem sido recepti-vo ao capital e firmas estrangeiras tem estimuladocompanhias privadas nacionais e criado grandes em-presas públicas em áreas de produção crítica ou estra-tégica. É verdade que o sistema econômico brasileirose apoia muito mais no mercado do que na gestãoeconômica global e detalhada das agências governa-mentais. O governo, no entanto, tem desempenhadoum papel central na orientação, formulação e dire-ção do mercado, mediante alguns controles, numero-sos incentivos e através da gestão fiscal e monetária.

A estratégia principal tem sido acelerar a in-dustrialização e expandir as exportações para os mer-

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cados externos. Mesmo assim, o papel das exporta-ções é relativamente baixo em relação ao PIB, maisou menos 10% em comparação com outros paísesonde essa relação chega a 70%. Em compensação, oBrasil ficou imune às crises externas.

A estratégia brasileira para investimento priva-do estrangeiro é um outro exemplo importante dapolítica pragmática referida. O Brasil teve sempremuita preocupação com os perigos do controle es-trangeiro da economia. Cuidando de fazer prevale-cer os interesses nacionais sobre os interesses ex-ternos das empresas multinacionais.

O processo de desenvolvimento político pas-sou por diversas fases. Desde o governo burocrá-tico sob o regime militar (1964-1974), o domínioou influência de elites agrárias e urbanas, até osistema de partidos políticos apoiados na cor-

cinquenta anos o sistema de eleições populares

O renomado professor Stefan H. Robock, daUniversidade de Columbia (USA), escreveu um ex-celente livro (O desenvolvimento brasileiro em de-bate, Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves) ondeele faz interessantes observações e análises sobre omodelo brasileiro. Lembra ele que:

rupção. No entanto, tem prevalecido nos últimos

multipartidárias.

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O processo de desenvolvimento é comple-xo e insuficientemente compreendido.Envolve muitos fatores intangíveis, taiscomo padrões culturais e valores sociais.Apresenta dimensões políticas e humanas,assim como elementos econômicos.

Deve-se acrescentar também que depende defatores incontroláveis, assim como condições políti-cas internas. O Brasil tem adotado políticas flexíveisquanto à utilização de empresas privadas e públi-cas, internas e estrangeiras. Com exceção do petró-leo e materiais radioativos, o Brasil jamais opôs res-trições marcantes. Em serviços públicos, o setor deenergia elétrica do governo é responsável em 80%pela produção e 60% pela distribuição. O Banco Na-cional de Desenvolvimento Econômico e Social(BNDES) tem emprestado recursos para a constru-ção de obras de infraestrutura e criação de grandesempresas como a EMBRAER.

Quanto às multinacionais, encontram no Bra-sil um ambiente favorável. Exemplo de políticas efi-cazes foi induzir as multinacionais em exportaçõesde produtos manufaturados, como ocorreu com aindústria automobilística.

O desenvolvimento do modelo brasileiro temsido limitado por muitos obstáculos decorrentes de

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seu meio físico. Outros aspectos geográficos têmajudado para o desenvolvimento do país.

A expansão econômica conseguida pelo Bra-sil, na década de 1930 e 1940, resultou principalmentede forças espontâneas e fatores externos. No perío-do que se seguiu a Segunda Guerra Mundial, o de-senvolvimento surgiu com uma providência nacio-nal. A taxa média anual de crescimento do ProdutoInterno do Brasil foi de 5,1% e do setor industrial6,5%. De 1948 a 1956, com os novos programasde substituição de importações, o Produto InternoBruto cresceu em termos reais em 6,4% e o setorindustrial, 8,8%.

O Plano SALTE do governo Dutra (1946-51) eo trabalho da Comissão Conjunta de Desenvolvimen-to do Brasil/Estados Unidos (1951-53), sob a admi-nistração de Getúlio Vargas, foram determinantespara esses resultados. Com relação às novas polí-ticas de planejamento, foi criado o Banco Nacionalde Desenvolvimento Econômico, e, em 1953, aPetrobrás. É dessa época também a criação do Ban-co do Nordeste do Brasil, bem como a CompanhiaHidroelétrica do São Francisco (Getúlio Vargas).

Com o governo Juscelino Kubistcheck, inicia-do em janeiro de 1956, foi criado um Conselho deDesenvolvimento Nacional, que elaborou o progra-

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ma de metas “baseado em setores de base.” Em 1962foi criado o Ministério do Planejamento, cujo minis-tro Celso Furtado elaborou o Plano Trienal que tevevida curta, com a instituição do governo militar(1964). O Programa de Ação Econômica do Gover-no (Roberto Campos) deu continuação da experiên-cia de planejamento até os nossos dias.

Como se pode verificar, com base no exemplobrasileiro não existem padrões universalmente acei-tos que possam ser utilizados como “modelos de sis-temas econômicos.”

Cada país, no seu contexto histórico e político,tem o seu sistema econômico.

EvEvEvEvolução das Ideiasolução das Ideiasolução das Ideiasolução das Ideias

Nos últimos cinquenta anos ocorreu um crescen-te entendimento sobre o processo de desenvolvimentoeconômico. Sabemos agora que o desenvolvimentodeliberado é possível, mas não é inevitável. Sabemostambém que não há fórmulas mágicas para o suces-so. Algumas estratégias funcionavam bem por certoperíodo, depois fracassavam. Outras dão certo em umpaís, mas fracassam noutro. De certo modo, pode-sedizer até que as teorias econômicas têm contribuídotanto para bons resultados como para frustrações.

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As mais frequentes perguntas que vêm sendofeitas ao longo das últimas décadas são: Quais osfatores que explicam as diferenças de renda entre ospaíses ricos e pobres? Como reduzir a pobreza e asgrandes desigualdades econômicas dos paísessubdesenvolvidos?

O interesse para um melhor entendimento des-ses fenômenos provém de tempo imemorial. Na épo-ca em que Adam Smith publicou sua obra sobre aRiqueza das Nações (1776) já se notava uma per-ceptível e crescente diferença nos níveis de cresci-mento econômico das diversas partes da Europa eentre a Europa Ocidental e a maior parte do Conti-nente Asiático.

Mas sem essas estatísticas era impossível mediras diferenças e definir alguma razão desse fenôme-no. Poucos séculos antes a Europa era pobre e pou-cos séculos depois prosperou e passou outros conti-nentes. Os economistas que especulavam sobre asrazões dessas mudanças não se atreviam a supor queum ciclo havia se rompido e que a sociedade entra-va em um período indefinido de crescimentoacumulativo e autoimpulsionado.

Muito pelo contrário. Tempo depois de Smith,a literatura econômica falava da profecia acerca deum estado estacionário. De acordo com essa teoria,

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o crescimento econômico era contido por culpa dealgum fator limitativo tal como o crescimento da po-pulação, da lei dos rendimentos decrescentes ou umatendência crônica a poupar em excesso (H. W.Singer, 1969).

É muito difícil indicar algum economista do sé-culo XIX ou dos primeiros anos do século XX quesustente a opinião de que o abismo entre países ri-cos e pobres estava destinado a aumentar sem limiteprevisível. Mas quando o fenômeno começou a serpercebido, os economistas passaram a tratá-lo comoum surto passageiro.

Vendo que um país após outro seguia a estei-ra da Inglaterra e a alcançava, tendiam a adotar aopinião otimista de que só era uma questão de tempo.Assim, toda a economia mundial por-se-ia em movi-mento e seria iniciada a marcha para o desenvolvimento.

O surgimento de um interesse explícito peloproblema da pobreza e desigualdade passou a ocor-rer durante a II Guerra Mundial. Com a criação dasnovas organizações internacionais (FMI, Banco Mun-dial etc) com responsabilidades econômicas e deassistência técnica, os economistas começaram apreocupar-se com os problemas dos países subde-senvolvidos. Dessas organizações das Nações Uni-das nasceram estatísticas e estudos que proporcio-

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naram uma base para a interpretação das questõespertinentes ao desenvolvimento econômico.

A partir desse momento, a consciência públicapassou a conhecer a pobreza das nações situadas naÁfrica, América Latina e Ásia. Outro fator deter-minante para a tomada de consciência política des-ses países foi que passaram a desejar a independên-cia política e a liberdade econômica que a riquezapode proporcionar.

Um programa de ajuda internacional, que sus-citou muitas esperanças nos países subdesenvolvi-dos, foi chamado de Plano Marshall. Com um gastode US$ 13 bilhões, cerca de 4% do seu Produto In-terno Bruto, os Estados Unidos conseguiram revitali-zar a economia dos países destruídos na Europa pelaguerra. Em apenas dois anos e meio, a produção in-dustrial desses países passou de quarenta por centoe a produção agrícola ultrapassou os níveis de antesdo conflito.

Baseados nesses dados, a crença de então erade que se ocorresse uma mobilização de recursosde todos os países industrializados para a promoçãodo desenvolvimento mundial, os resultados seriamigualmente espetaculares. Foi, sem dúvida, estimu-lado por essa confiança que inspirou a declaraçãodo Presidente Kennedy em seu discurso de posse:

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Aos novos Estados da metade do globo quelutam para romper as amarras da misériamassiva, prestaremos todos os nossos es-forços para ajudá-los a que se ajudem a simesmos, durante qualquer período que sejanecessário. Se a sociedade livre não podeajudar aos muitos que são pobres, nuncapoderá salvar os poucos que são ricos.

Devemos ter em conta o fato de que, sejam quaisforem as dificuldades entre os países no plano interna-cional, essas dificuldades se repetem de forma surpre-endente, dentro dos próprios países subdesenvolvidos.

O problema de reconciliar o desenvolvimentoeconômico e essas dificuldades indesejáveis não é omaior obstáculo que se confrontam aqueles aquem os países gostariam de contribuir do lado defora para a eliminação da pobreza e do atrasotecnológico.

É difícil formar um juízo satisfatório sobre asmodalidades de ajuda que devem ser proporciona-das a países subdesenvolvidos. Mas está muito claroque há muitas coisas que devem ser feitas pelo pró-prio país. O desenvolvimento não é só uma questãode dispor de dinheiro abundante, nem é simples-mente um fenômeno econômico. Abarca todos osaspectos da conduta social. No âmbito internacio-nal, há três linhas principais de ação: ajuda financei-

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ra, ajuda técnica e comércio mais livre para os pro-dutos dos países subdesenvolvidos.

Num resumo, porém, o problema da pobrezaé superficialmente de natureza econômica. Em sen-tido mais profundo, por exemplo, o fundamental é aquestão educacional. A pobreza que se deve destruirnão é fonte na carência dos ativos externos da pro-priedade industrial moderna. A força de criar os ativosque necessita decorre do conhecimento e experiên-cia, habilidade e poder de olhar o futuro com vonta-de para fazer as coisas e adaptação às mudanças.

Não há nenhum país que se possa chamar a simesmo de desenvolvido em que não exista uma edu-cação na forma da civilização industrial. Os agricul-tores têm de ingressar na economia de mercado eagronegócio, com trabalhadores empregados em fá-bricas e no setor dos serviços. Há de se aplicar àeconomia o fruto da ciência. E, acima de tudo isso,há que surgir, como elemento contínuo na vida dopaís, um grupo de dirigentes, políticos e administra-dores de que se depende para colocar em marcha asinovações continuamente. A educação não é, comose diz, uma coisa que está só nas escolas ou nasuniversidades. Mas deve ser um processo geral e con-tinuado de toda a população.

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Caminhos dos Países DesenvCaminhos dos Países DesenvCaminhos dos Países DesenvCaminhos dos Países DesenvCaminhos dos Países Desenvolvidosolvidosolvidosolvidosolvidos

As condições em que os países atualmente estãoprocurando lançar-se num processo de desenvolvi-mento diferem de muitas maneiras do que ocorreudurante o período em que os países industrializados en-veredaram pelo caminho do crescimento econômico.

Focalizando essas experiências pode-se concluirque, na verdade, há mais de um caminho possívelpara o desenvolvimento. O que é melhor dentro dascircunstâncias de um país não é necessariamentemelhor dentro das condições de outro.

A Inglaterra, que foi o primeiro país a ter umaindústria moderna no século XIX, fez um esforço nãodeliberadamente desenvolvimentista do governo. Mas,à medida que a nova Economia tomou corpo, o Esta-do passou a ter um papel importante para dinamizare restringir os abusos do setor privado. No século XX,a adoção do “welfare state” tomou por base uma com-binação da empresa privada e socialismo.

Em termos de desenvolvimento econômico, osEstados Unidos da América contavam principalmentecom a iniciativa privada. Mas o papel do Estado nãodeve ser subestimado. O governo americano abriugrandes áreas novas para colonização. Construir ca-nais e ferrovias que permitiram a interiorização do de-

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59PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

senvolvimento. O papel do governo na adoção daeducação gratuita foi uma das mais revolucionáriasda época.

De modo característico, o Japão foi o primeiropaís asiático a desenvolver uma economia moder-na. O Japão carecia de todas as condições para odesenvolvimento econômico. Não contava com re-cursos naturais e seu território era montanhoso, dei-xando apenas 20% de suas terras para a agricultura.Isolado do resto do mundo, o povo japonês perma-neceu voltado para si mesmo e resistente às influên-cias estrangeiras até a segunda metade do século XIX.

Não obstante, dentro de poucas décadas ela se tor-nou uma nação importante na política internacionaldo Extremo Oriente. Um forte programa de subsídiosgovernamentais foi empregado na exportação e trans-portes marítimos. O itinerário do Japão foi fascinan-te. O governo foi pioneiro para a implantação deimportantes projetos industriais. Com base na res-tauração de Meiji (1868), ele construiu um sistemaeducacional público que até os dias de hoje é o sus-tentáculo de sua moderna sociedade industrial.

A participação do governo nesse processo foisuplementada pelos grandes trustes privados e de-zenas de milhares de pequenas empresas privadasque contribuíram no conjunto para o crescimento

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econômico. Mesmo com distorções sociais e políti-cas em sua fase inicial, em termos de desenvolvi-mento econômico, o sistema japonês funcionou. Atu-almente é a segunda potência econômica mundial eo país de melhor distribuição de renda do mundo.

Na União Soviética o desenvolvimento reali-zou-se até a queda do muro de Berlim em 1989,dominado pelo partido único e absoluto. O sistemade planejamento global era centralizado e as em-presas estatais operavam toda a indústria, comércioe serviços. Na agricultura, eram as empresas coleti-vas ou cooperativas que operavam o sistema produ-tivo. Mesmo que, clandestinamente, uma agriculturafamiliar produtora de artigos hortigrangeiros teve umpapel crescente nos últimos anos do sistema socia-lista soviético.

O ponto forte da economia soviética foi o de-senvolvimento científico e educacional, mas a fra-queza que debilitou o sistema de forma direta foi aagricultura, a produção e a distribuição de bens deconsumo e, sobretudo, a falta de liberdade pessoal.

A experiência soviética foi única em vários as-pectos. O fim da União Soviética nos anos de 1990foi mais expressiva que a grande depressão nos Esta-dos Unidos. De 1929 a1936 o Produto Interno Bru-to deste País caiu um terço. Na Rússia, a renda per

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61PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

capita caiu 80%, segundo o professor SeymourMelmam (2002).

O colapso da produção nacional soviética foiagravado pelas operações caóticas e predatórias deuma classe financeiro-gerencial que extirpou a socie-dade ao buscar os próprios ganhos financeiros. Oprofessor Seymour Melmam, no seu livro Depois docapitalismo (2002), destaca pontos que não podemdeixar de ser ressaltados ao examinar a experiênciasoviética.

A antiga União Russa Socialista Soviética (URSS)de 224 milhões de km2 , um sexto da superfície ter-restre do globo, tinha uma população de 288 mi-lhões (1989). Era grande produtora de uma varie-dade de matérias-primas. Antes do colapso, ela eraa maior produtora de ferro do mundo (41%), ní-quel, petróleo (58%), gás natural e o terceiro produ-tor de carvão (55% do mundo). Era a segunda maiorfonte mineral de urânio e cromo e destacado produ-tor de ouro e prata.

Segundo Paul Kennedy (, 1993) o problema soviético tinha uma

tríplice crise: a crise da legitimidade política, a cri-se da produção econômica e social e a crise daagricultura. As fazendas coletivas destruíram to-dos os incentivos à força de trabalho, enquanto

Preparando para oSéculo XX

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enormes subsídios levaram à falência do setor: “se-tenta anos de experiência demonstraram que o so-cialismo científico centralizado não funciona.” A“perestroica” foi o reconhecimento de que essadecadência era real.

Resumindo, vimos quatro exemplos diferentesde desenvolvimento econômico. Concluímos pornão haver uma forma ou método estereotipado dedesenvolvimento. Não podemos dizer: “Esta é amaneira correta de agir e não há outra.”

Se há um fator comum, decerto é representa-do pelos sacrifícios presentes e a existência de umaautoridade asseguradora de que os frutos desses sa-crifícios se destinarão ao desenvolvimento econô-mico de todas as camadas populacionais. Não sedestina apenas a poucas pessoas como tem sido omodelo da América Latina e de muitos países sub-desenvolvidos em várias partes do mundo.

PPPPPerspectiverspectiverspectiverspectiverspectivas do Desenvas do Desenvas do Desenvas do Desenvas do Desenvolvimentoolvimentoolvimentoolvimentoolvimento

A busca de mais justiça social e de uma so-ciedade mais equitativa tornou-se, nos últimos anos,uma unanimidade em nível nacional e internacio-nal. O diálogo a respeito desses assuntos, no entan-to, precisa encontrar uma linguagem comum quanto

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63PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

ao significado de desenvolvimento, políticas, estra-tégias a adotar e formato dos programas.

A literatura sobre a economia do desenvolvi-mento revela que não há, atualmente, concordânciasobre as forças e os elementos básicos que promo-vem o desenvolvimento. Uma enorme quantidade deestudos profissionais e científicos tem sido divulgadaem teses, livros e imprensa especializada.

Várias teorias, doutrinas, conceito e remédiosforam propostos ao longo das décadas, para nãofalar dos pioneiros dessas investigações. Os tiposde caminhos e soluções sugeridas são, na maiorparte, oferecidos por cientistas de várias discipli-nas. São economistas, sociólogos, geógrafos e es-pecialistas envolvidos em diversas atividades aca-dêmicas, políticas e religiosas. O livro do meusaudoso professor e orientador, Dr. Raanan Weitz,expõe magnificamente essa questão: New roads todevelopment (1986).

Segundo minha própria experiência, umdos conceitos mais difíceis de ser explicado peloscientistas sociais é o de desenvolvimento. Paraentendermos a razão disso, é bom esclarecer que domesmo modo que as definições de “classe social”,“mudança” e “consciência social”, o termo “desen-volvimento” não está bem definido.

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64 PEDRO SISNANDO LEITE

O termo “crescimento econômico” foi bastanteutilizado até o fim da década de 1960. Neste caso,enfatizamos os fatores de produção, a produtivida-de e a renda per capita como indicadores mais im-portantes. Na década de 1970, tratou-se de envolvercomo variáveis para definição de desenvolvimentode uma sociedade o seu grau de urbanização e deindustrialização crescente.

Os economistas e sociólogos latino-americanostiveram importante participação em um novo esque-ma teórico para esclarecer melhor esse fenômeno.Tal enfoque está baseado numa definição do desen-volvimento como um processo de mudanças queabrange todo o país: sua estrutura econômica, social,política e física e, de igual modo, o sistema de valo-res e a forma de vida do povo.

CrCrCrCrCrescer e Distribescer e Distribescer e Distribescer e Distribescer e Distribuiruiruiruiruir

Para uma nova visão de desenvolvimento, nãoé importante apenas produzir mais. Tão importantequanto assegurar o incremento da produção física étambém assentar as bases de uma política distributiva,assegurando bens e serviços a todos. Deve haver umamaior distribuição quantitativa de bens e serviçosentre diferentes grupos sociais. Para que se alcance

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65PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

esse objetivo, torna-se necessário conscientizar-se dasnecessidades dos grupos menos favorecidos, propi-ciando-lhes uma participação efetiva nas decisões queafetam a redistribuição de renda. Por outro lado, éimportante reafirmar a obtenção numa fase inicialde maiores níveis de produtividade e produção comofator primordial para atingir o desenvolvimento, alémda identificação das carências que afetam cada seg-mento da sociedade.

Uma referência bibliográfica importante paraentender melhor essa problemática é a obra de SimonKuznets, Prêmio Nobel de Economia e um dos maio-res economistas do mundo ocidental: Teoria do cres-cimento econômico moderno. O professor Kuznetsrepensa as doutrinas anteriores ao seu trabalho exa-minando os problemas do desenvolvimento, sob óticanova que lhe permite inclusive negar certos precei-tos antes estabelecidos, como a incompatibilidade entredinamização da riqueza e aumento populacional.

Mostra ele que se o crescimento econômicopressupõe aumento per capita da produção tambémexige mudanças estruturais, tanto nas instituiçõesquanto nas práticas sociais e econômicas. Afirma,ainda, que as mudanças que iniciam em novo perío-do econômico podem ser descritas como decorren-tes de um aumento do conhecimento humano, o qual

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66 PEDRO SISNANDO LEITE

fornece instrumental para a escalada do progresso. Esalienta que a principal mudança que distingue operíodo econômico moderno é a aplicação da ciên-cia aos problemas da produção.

Desigualdade PrDesigualdade PrDesigualdade PrDesigualdade PrDesigualdade Prejudica Crejudica Crejudica Crejudica Crejudica Crescimentoescimentoescimentoescimentoescimento

Altos índices de desigualdade prejudicam ocrescimento da América Latina e reduzem investi-mentos, afirma estudo do Banco Mundial (BIRD) di-vulgado recentemente (2006). Os autores do estudoRedução da pobreza e crescimento: círculos virtuo-so e vicioso (Povert reduction and growth: virtuosand vicious circles), acreditam que só com uma po-lítica firme de redução da desigualdade será possí-vel atingir taxas de crescimento mais altas.

O renomado economista Vinod Thomas, ex-di-retor do Banco Mundial no Brasil (2001-2005), des-taca no seu excelente livro O Brasil visto por dentro(2005) que: “A distribuição de renda influi no grauem que o crescimento econômico tira as pessoas dapobreza.”

Nas simulações feitas no estudo do Banco Mun-dial também ficou claro que só com uma políticaeficaz de redução das desigualdades será possívelatingir taxas de crescimento mais altas. Na verdade,

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67PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

o Produto Interno Bruto per capita da América Lati-na caiu 0,7% durante a década de 1980, afetada pelacrise da dívida externa. Na década de 1990 cresceuapenas 1,5% anuais, sem mudanças no nível de po-breza, que abrange em média cerca de 40% da po-pulação da região. Para o vice-presidente do BIRDpara a América Latina:

São aproximadamente 180 milhões abaixoda linha de pobreza. A própria pobreza estádificultando o crescimento e só resolven-do as causas da pobreza será possível ele-var as taxas de crescimento econômico.

Segundo o estudo, as transferências de rendafeitas no Brasil contribuem para reduzir o índice deGini em apenas 0,5%. As transferências feitas naArgentina reduzem o índice em 3,5% e no Chile2,0%. É oportuno lembrar que a América Latina é aregião com a maior desigualdade do mundo, sendodestes o Brasil o de maior desigualdade. O Brasilencontra-se entre os dez mais desiguais do planetaTerra, compartilhando essa situação com os paísesmais pobres da África. Segundo estimativas do Dr.Thomas, como nível atual de desigualdade do Brasil,1% de crescimento econômico reduz a pobreza emmenos de 1%. Na Índia e na China, com padrão de

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68 PEDRO SISNANDO LEITE

melhor igualdade, esse mesmo percentual de cresci-mento implicará uma redução da pobreza acima de 3%.

Certamente não existe uma teoria ou um mode-lo acabado para acelerar o crescimento, o desenvol-vimento e a redução das desigualdades e da pobreza.

A mudança de perspectiva para uma nova teo-ria do desenvolvimento nos foi dada pelo professorAmartya Sen no seu livro The concept ofdevelopment (O conceito de desenvolvimento). Afir-ma ele:

Uma concepção adequada de desenvolvi-mento deve abranger muito mais do que aacumulação de riqueza e o crescimento doProduto Interno Bruto. Sem ignorar a im-portância do crescimento econômico, nos-so olhar deve ir muito além.

A adoção de um novo enfoque de desenvolvi-mento depende de uma reorientação fundamental naspolíticas e estratégias adotadas até agora no Brasil eem muitos países subdesenvolvidos. O primeiro pas-so para essa reformulação consiste em estabelecer osobjetivos sociais que dependem da combinação dosobjetivos de crescimento e distribuição de renda.

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

69PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

Sustentabilidade do DesenvSustentabilidade do DesenvSustentabilidade do DesenvSustentabilidade do DesenvSustentabilidade do Desenvolvimentoolvimentoolvimentoolvimentoolvimento

Os países subdesenvolvidos precisam adotar es-tratégias de desenvolvimento sustentável para atenderàs mudanças econômicas, erradicar a pobreza, prote-ger o meio ambiente beneficiando a população atual ea futura. O desenvolvimento sustentável exige acessoa tecnologias e recursos financeiros que os países sub-desenvolvidos não contam. Em consequência, os paí-ses industrializados precisam se associar e realizar umaoperação do tipo “Plano Marshall”, com recursos téc-nicos e financeiros. Aos países subdesenvolvidos cabea grande responsabilidade de investir também em for-mação e capacitação de seus recursos humanos.

EcodesenvEcodesenvEcodesenvEcodesenvEcodesenvolvimentoolvimentoolvimentoolvimentoolvimento

O conceito de ecodesenvolvimento foi conce-bido pelo Programa de Meio Ambiente das NaçõesUnidas. Seus princípios básicos são simples: o de-senvolvimento deve conservar os recursos e utilizarcom parcimônia os renováveis. Ele deve minimizaro lixo e reciclar o máximo possível os materiaisdescartáveis. Deve preservar os padrões culturais lo-cais e envolver a população na tomada de decisõessobre o estilo e o crescimento econômico.

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Na prática, ecodesenvolvimento não é fácil deexecutar. Ele demanda estudos cuidadosos das con-dições ecológicas, do homem e da natureza, e, ge-ralmente, não há pessoas treinadas para executá-lomesmo em pequenos projetos-pilotos. As tecnologiaspara usar recursos renováveis e conservá-los estãoainda em estudo e fase experimental. As práticas dedestruir florestas e que levam ao esgotamento dossolos agricultáveis são tão destrutivos como qualquerindústria poluidora. O ecodesenvolvimento é emessência, os pré-requisitos para o desenvolvimentosustentável que deve ter em vista o aspecto moral ematerial de todo o bem-estar humano.

Em resumo, é muito importante a preocupaçãodo mundo com respeito ao efeito estufa, o aqueci-mento global e a conservação da biodiversidade. Maso que realmente preocupa é o fato de bilhões de habi-tantes do planeta estarem sendo chamados a pagar commedidas corretivas esses problemas. Enquanto isso,essa população vive em condições de pobreza sem tersido responsáveis por essas alterações ambientais.

Os países industrializados que foram e são atu-almente, como a China, responsáveis poderiam fazerum pequeno sacrifício para ajudar os países subde-senvolvidos para melhorar a qualidade de sua eco-nomia do ponto de vista social e ambiental.

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

71PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

DesenvDesenvDesenvDesenvDesenvolvimento Sustentávolvimento Sustentávolvimento Sustentávolvimento Sustentávolvimento Sustentávelelelelel

Nas últimas décadas, um novo caminho do de-senvolvimento vem sendo proposto pelas organiza-ções das Nações Unidas e cientistas de várias partesdo mundo. Os elementos principais dessa estratégiaenvolve a combinação da eficiência econômica, daequidade social, da liberdade política e da preserva-ção ambiental. É um processo integrado de mais cres-cimento compartilhado por todos, modernização pro-dutiva e competitiva, mais educação e qualificaçãoe mais saúde e habitação, menos pobreza e menosdesigualdade. O alcance desses objetivos requer profunda mudança no estilo de desenvolvimentopara alcançar mais desenvolvimento hoje e maisamanhã.

A estratégia sustentável incorpora a dimensãogeoambiental no tocante à racionalização do usodos recursos hídricos, conservação dos solos, con-trole ambiental e ampliação da biodiversida-de. A dimensão econômico-social tem por áre-as estratégicas a transformação produtiva e o crescimen-to com modernização da agropecuária, reestruturaçãodo modelo industrial, capacitação dos recursos hu-manos e equidade, com ênfase no combate à pobre-za e a educação para a modernidade. A dimensão

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

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científico-tecnológica (conhecimento e inovação) e,finalmente, a dimensão político-institucional basea-da num modelo de gestão integrado e descentraliza-do do desenvolvimento econômico.

A execução de uma estratégia de desenvolvi-mento sustentável carece de uma atuação coorde-nada do governo e da sociedade, com o objetivocomum do bem-estar da população. Nos últimos dezanos, o conceito de desenvolvimento sustentávelassumiu novas feições. Com base em estudos doBanco Mundial, esse processo inclui não só o capi-tal físico industrial como também o capital natural ehumano. Para ser sustentável, o desenvolvimentodeve contribuir para que os ativos aumentem como tempo.

De acordo com essa conceituação, o principalindicador da sustentabilidade do desenvolvimentopoderia ser “a taxa de poupança gemina” ou “taxade investimento gemino.” Esse novo indicador, ela-borado pelos teóricos do Banco Mundial, consideraque as medições correntes da acumulação de rique-za não levam em conta o esgotamento e a deteriora-ção dos recursos naturais, como os bosques e conta-minação ambiental, e as inversões nos recursoshumanos. A taxa de poupança gemina tem por obje-tivo corrigir essa definição mediante o ajuste da taxa

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

73PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

de poupança tradicional, reduzindo os custos dosreferidos fatores.

As análises do Banco Mundial mostram queos países que mais dependem dos recursos natu-rais têm taxas de poupança muito baixas ou negati-vas. Se não forem adotadas medidas firmes para corri-gir essa tendência, que se não for modificada, redun-darão em sérios prejuízos para a população. Esta si-tuação indica que uma parte comercial dos recur-sos naturais não renováveis foi utilizada de ma-neira errônea ou predatória.

O renomado economista Stefan H. Robock,com quem tive o prazer de trabalhar quando ele pres-tava assistência técnica (Nações Unidas) ao Escritó-rio Técnico de Estudos Econômicos do Banco doNordeste do Brasil, falando na Convenção Interna-cional sobre Impactos e Variações Climáticas e De-senvolvimento Sustentável (Fortaleza, 1999), disseo seguinte sobre o assunto:

O conceito de desenvolvimento sustentá-vel, dando ênfase à qualidade de vida e evi-tando a deterioração do meio ambiente,representa um significativo avanço na evo-lução das estratégias do desenvolvimento.

Dentre outros importantes comentários do pro-fessor Robock, vale assinalar que ele é de opinião

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que as estratégias alternativas deveriam ir além defundamentalismo ambiental. Ou seja, evitar a máxi-ma: “conservar por conservar.” O mais importanteelemento, comenta ele, deve ser uma boa formula-ção de investimentos em recursos humanos e aca-bar com a pobreza.

Todos os esforços, certamente, serão inúteis oude pouco significado se as pessoas não estiverempreparadas para entender o que significa o desen-volvimento sustentável e dispostas a colocar em prá-tica as medidas para o seu alcance.

A Função das PA Função das PA Função das PA Função das PA Função das Políticas Estatais e do Capital Socialolíticas Estatais e do Capital Socialolíticas Estatais e do Capital Socialolíticas Estatais e do Capital Socialolíticas Estatais e do Capital Social

Que podem fazer os governos para atuar comoagentes catalisadores do desenvolvimento dos seuspaíses? Compreendemos cabalmente quais são osprincipais fatores que determinam o êxito do desen-volvimento? Essas e outras preocupantes perguntasforam formuladas por um grupo de especialistas doBanco Mundial no intuito de preparar um livro-tex-to para usar nos países em desenvolvimento. Inclu-sive a Rússia, que busca entender melhor o funcio-namento das economias de mercado globalizadas.O referido livro tem como tema Além do crescimentoeconômico Beyond the economic growth( ), está sen-

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75PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

do disponibilizado para países que desejem fazeredições da obra.

Segundo esse original documento, para res-ponder essas importantes perguntas é preciso to-mar consciência de que desenvolvimento é muito maiscomplexo que um simples crescimento e acumula-ção quantitativa de capital nacional, como geral-mente se pensa. Como tratado neste livro, a partirde uma visão do Brasil, o desenvolvimento é tam-bém uma transformação qualitativa de sua socie-dade em seu conjunto: o desenvolvimento é umaevolução de novas formas de pensamento e, con-sequentemente, novas relações e novos métodosde produção. O processo deve incluir a maior par-te da população de um país e não somente ficarlimitado à modernização do capital e a beneficiaras classes mais altas e ricas.

O Relatório do Desenvolvimento Humano de1996 do PNUD revela dados impressionantes quenão podem deixar de motivar sérias reflexões daspessoas responsáveis que vivem nos países como oBrasil. “O mundo tornou-se mais polarizado econo-micamente, quer entre países quer dentro dos países”,diz Gustave Speth, administrador do PNUD, no pre-âmbulo ao Relatório. Apesar de uma onda de rápidocrescimento econômico em 15 países nos últimos

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

76 PEDRO SISNANDO LEITE

trinta anos, cerca 1,6 bilhão de pessoas, em 89 paí-ses, não foram contempladas por nenhum programae agora estão pior do que há 20 anos. “Os ga-nhos econômicos beneficiaram grandemente algunspaíses, mas a custo de muitos”, registra o Relatório.

É preciso reconhecer, entretanto, que nos paísesonde ocorreu desenvolvimento, os governos deramprioridade à qualidade do crescimento. Providencia-ram medidas de equidade, melhoraram a saúde, aeducação e o emprego para os seus cidadãos.

Segundo essas estratégias, quinze países, prin-cipalmente asiáticos, obtiveram um crescimento ex-traordinário, com taxas mais elevadas do que toda ahistória da industrialização do Ocidente. Como temocorrido na Malásia e principalmente na Repúblicada Coréia e da China, com taxas que vão de 8% a10% ao ano. O Índice de Desenvolvimento Huma-no do PNUD (esperança de vida ao nascer, educa-ção e renda per capita) classifica o Canadá comoprimeiro dentre 174 países do mundo. Seguem compequenas diferenças decrescentes os Estados Uni-dos, Holanda e Noruega. Nos países em desenvolvi-mento, Chipre é primeiro, seguido por Barbados,Bahamas, Coréia e Argentina. A República da Coréiaé o exemplo máximo das fortes ligações forjadas pelogoverno entre crescimento, desenvolvimento huma-

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77PRIMEIRA PARTE – ECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

no e equidade. Diferentemente ocorreu no Paquistãoonde a intervenção do Estado malogrou os resulta-dos de sua taxa de crescimento de 5% ao ano. Nestepaís, o governo concentrou os recursos em grandesindústrias com capital intensivo como siderúrgicas equímicas etc.

No caso da América Latina e, especialmente,no Brasil, tem sido grande a intervenção do governona condução das políticas de desenvolvimento eco-nômico. Se bem que o desenvolvimento é um pro-cesso integral de mudanças, com a participação dosetor público e privado, os governos devem deter-minar o âmbito e a direção em que ele deve atuar. Ogoverno, além disso, para corrigir “as falhas do merca-do”, pode cumprir uma importante função decoordenador da participação de todos os agentes dodesenvolvimento – empresas privadas, organismospolíticos e agremiações civis – no quadro do desen-volvimento nacional.

As funções do Estado e o setor privado sãocomplementares e ajustadas às realidades políticasde cada país. Mas um determinante papel do go-verno é ajudar e apoiar os diferentes setores da so-ciedade a formatar uma visão comum do futuro dopaís e trabalhar essa concepção até a realidade dasações concretas.

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

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O autor deste livro espera e confia em que os leito-res e estudantes possam ser estimulados a ampliarseus conhecimentos e reflexões sobre o desenvolvi-mento do Brasil e de outros países em condiçõessimilares. A metodologia de comparar experiênciasinternacionais e analisar os acertos e erros que nos-so país tem experimentado ao longo dos anos podeser muito útil e valiosa. Para que possamos dar tam-bém a nossa contribuição na construção de um paísmais desenvolvido, com maior equidade e sem po-breza. A atitude de cada um é também fonte de ca-pital social do país. É por essa razão que elaboreieste livro a partir de uma visão do Brasil.

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

A DOUTRINA DODESENVOLVIMENTO JUSTO

SEGUNDA PARTE

As desigualdades

entre pobres e ricos,

tanto no âmbito

internacional como

dentro de cada

país, chegaram a um

limite intolerável,

moral e socialmente.

As desigualdades

entre pobres e ricos,

tanto no âmbito

internacional como

dentro de cada

país, chegaram a um

limite intolerável,

moral e socialmente.

INTRINTRINTRINTRINTRODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃO

“Sem obras, a fé é completamente morta.”

(TIAGO 2, 17)

Estou convicto de que as questões relativas à for-mação de capital, ética e desenvolvimento econômi-co, com menos pobreza, serão os temas maisrelevantes que estarão em destaque nas próximasdécadas. Especialmente em regiões subdesenvolvidascomo o Nordeste do Brasil. A Igreja, de há muito,vem ocupando uma posição ativa nas reflexões, ideiase proposições que permitam a adoção de novaspolíticas econômicas mais equitativas e justas , comliberdade e princípios cristãos de amor ao próximo.

Os pensamentos e comentários tratados nestecapítulo pretendem resumir e esclarecer em lin-guagem simples os fenômenos da pobreza e da fomeno mundo atual. As fontes de referência são princi-palmente pertinentes à visão da Doutrina Social daIgreja e segundo um modelo de desenvolvimentoeconômico mais justo e voltado para os pobres.

Dentro desse espírito , fui estimulado pelos estudosdo renomado Arcebispo Paul Josef Cordes, Presidentedo Pontifício Conselho “ Cor Unum”, sobre a “Fome noMundo na Perspectiva de um Desafio para Todos”.

82 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

A questão principal que é postulada no pre-sente trabalho atende ao apelo do Arcebispo PaulCordes, que afirmou: “Não podemos fechar os olhosante a miséria e a fome na qual vivem nossosconcidadãos.” Assim, “A Igreja ... sente a necessi-dade de declarar como injustas -como o Papa LeãoXIII fez há 100 anos- a enorme riqueza de poucosem oposição à pobreza de muitos.” (RerumNovarum, 1997).

De fato, o Santo Papa João Paulo II, quando emvida, dedicou grande atenção para divulgar comoinstrumento de ação dos católicos de todo o mun-do o Ensino Social da Igreja na luta pela justiça e adignidade humana.

São exemplos disso as Cartas EncíclicasLaboren exercens; Sollicitudo rei socialis (1987);Centesimus annus (1991); a Carta Apostólica Novomillennio ineunte (2001); e o estudo do PontifícioConselho Justiça e Paz, “Para uma melhor distribui-ção da terra (1997)” e, ainda, o documento, “ Fome noMundo”, do Pontifício Conselho “Cor Unum” (1996),para citar apenas as principais fontes.

A exortação Apostólica Pós-Sinodal Eclésia inAmérica(1990) proclama “A América necessita deleigos cristãos capazes de assumirem papéis de lide-rança na sociedade. É urgente treinar homens e mu-

83SEGUNDA PARTE – A DOUTRINA DO DESENVOLVIMENTO JUSTO

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

lheres que possam influenciar a vida pública e diri-gi-la para o bem comum.” Do mesmo modo,conclamava Paulo II que todos os cristãos devem colo-car-se a serviço das suas nações que têm fome, emresposta ao apelo do amor que Deus nos transmiteatravés de Jesus Cristo, com apoio na oração da bem-aventurada Virgem Maria.

Deus, em sua mensagem evangélica, não quer aindigência do seu povo, nem o rico obcecado pelasua própria riqueza, pois ambos são mutilados espi-ritualmente: uns pelas condições adversas, outrospelo excesso de bens materiais. A batalha, portanto,não é contra a riqueza, mas contra a desigualdade ea pobreza, geradas pelo crescimento preferencial pe-los ricos.

Os governos podem reduzir a miséria no mun-do e a fome, especialmente nos países mais atrasa-dos, criando “ estruturas do bem comum” e no rumoda partilha. Ou seja, adotando um modelo de desen-volvimento com espírito de equidade e solidarieda-de. Em outras palavras, a mensagem é que a socie-dade deve estar a serviço das famílias necessita-das. Do mesmo modo, a missão das famílias cristãsnos dias de hoje tem o objetivo e a responsabilidadede trabalhar pela construção de uma sociedade maisjusta e equitativa, voltada para a promoção humana.

84 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

NONONONONOVVVVVO DESENVO DESENVO DESENVO DESENVO DESENVOLOLOLOLOLVIMENTVIMENTVIMENTVIMENTVIMENTO COM EQUIDO COM EQUIDO COM EQUIDO COM EQUIDO COM EQUIDADEADEADEADEADE

O crescimento econômico, principalmente aolongo do último século, tornou-se aspiração dos po-vos em todos os continentes. Devido a razões histó-ricas, humanas e geográficas, deu-se uma grandeevolução das nações situadas no hemisfério Norte.Os demais países ficaram relativamente atrasados ecom grandes problemas sociais e no padrão de vidade seus habitantes. São os chamados países subde-senvolvidos. Nestes perduram índices econômicose sociais lastimáveis de analfabetismo, escassez dealimentos, deficiente estado de saúde e habitação,afora diversas formas de opressão e exploração dotrabalho humano.

A Igreja Católica proclama que não poderia fi-car indiferente aos acontecimentos do seu povo, poissente-se ligada ao gênero humano e à sua história. Asnovas circunstâncias afetam a própria vida religiosa eexige cada vez mais que “à luz de Cristo” possa aIgreja cooperar na análise crítica e na solução dasprincipais questões do nosso tempo.

Desse modo, a Igreja caminha juntamente comtoda a humanidade a qual deve ser renovada emCristo e transformada em família de Deus. É tam-bém exigência da justiça e da equidade que o de-

85SEGUNDA PARTE – A DOUTRINA DO DESENVOLVIMENTO JUSTO

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

senvolvimento não se deve ater apenas ao aumentocontínuo da atividade econômica, mas deve exer-cer-se dentro dos limites da ordem social e a serviçodo homem. (Gaudium et spes, 1996).

Com esse fim, a Encíclica Populorum Pro-gressio, do Papa Paulo VI (1967), propõe um desen-volvimento integral do homem:

Ser libertos da miséria, encontrar com maissegurança a subsistência, a saúde, um em-prego estável; ter uma maior participaçãonas responsabilidades, excluindo qualqueropressão e situação que ofendam a sua dig-nidade de homens; ter maior instrução,numa palavra, realizar, conhecer e possuirmais para ser mais; tal é a aspiração do mo-mento de hoje, quando um grande núme-ro dentre eles estão condenados a viver emcondições que tornam ilusório este legíti-mo desejo.

Na mesma Encíclica, falando o Papa da Igrejano mundo, afirma: “A situação presente no mundoexige uma ação de conjunto a partir de uma visãoclara de todos os aspectos econômicos, sociais, eculturais.”

É nesta perspectiva de um novo estilo de de-senvolvimento econômico que este livro estáfocado.

86 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

ALGUNS ELEMENTALGUNS ELEMENTALGUNS ELEMENTALGUNS ELEMENTALGUNS ELEMENTOS DOS DOS DOS DOS DA DOUTRINAA DOUTRINAA DOUTRINAA DOUTRINAA DOUTRINASOCIAL DSOCIAL DSOCIAL DSOCIAL DSOCIAL DA IGREJAA IGREJAA IGREJAA IGREJAA IGREJA

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As desigualdades entre pobres e ricos, tanto noâmbito internacional como dentro de cada país, che-garam a um limite intolerável, moral e socialmente.

Nos últimos anos, todos os órgãos das NaçõesUnidas passaram a trabalhar com programas de de-senvolvimento orientados para a redução da pobre-za. Autoridades como os prêmios Nobel de economiaJoseph Stiglitz (ex-diretor do Banco Mundial) eAmartya Sen defendem teses de desenvolvimento isen-tos de miséria, assistencialismo e com liberdade.

No mesmo sentido, o Presidente do BancoInteramericano, Doutor Enrique V. Iglesias, e o 2º noescalão do tesouro americano, John Taylor (2008) emreunião internacional sobre a questão da formação decapital social e desenvolvimento, convocaram a Amé-rica Latina a superar o neoliberalismo e investir maisem educação para reduzir a pobreza. Segundo es-tas personalidades, a região deveria crescer cerca de4% ao ano, de modo sustentável, até o ano 2015, paraviabilizar a redução da pobreza pela metade.

É oportuno ressaltar que, segundo esseenfoque, o atendimento dessas carências deve ocor-

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rer não apenas como resultado do crescimento eco-nômico, mas como o seu principal objetivo. Assim,o combate à pobreza é o fator orientador e ponto departida de todo o processo, meio de realização dasmetas sociais do desenvolvimento da sociedade. Ouseja, o crescimento não é um fim em si mesmo, masum instrumento parcial para a melhoria do bem-es-tar das pessoas.

Os filósofos, economistas e sociólogos estão di-vergindo, há várias décadas, sobre qual é a priorida-de: crescimento ou distribuição?

Infelizmente, a pobreza avança e eclode namiséria de milhões de pessoas em todos os conti-nentes. Para se ter uma ideia melhor da dimensãodesse problema, basta lembrar que as informaçõesdas Nações Unidas/UNICEF estimam um contingentede pessoas abaixo da linha de pobreza de 50% dos6,5 bilhões existentes atualmente. No Brasil, são 57milhões, dos quais 58% moram no Nordeste.

Em contraste com a opulência econômica dealgumas nações e grupos sociais, viver na pobrezaextrema no tempo atual do progresso tecnológicoconstitui uma ofensa à dignidade humana. Nessecontexto, a Santa Sé apresenta alguns princípios quedeveriam inspirar uma abordagem prática dos di-reitos humanos em relação à pobreza. A pessoa que

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vive na pobreza não deveria ser considerada comoalgo oneroso ou um objeto a ser manipulado, mascomo um sujeito participativo do processo econô-mico e social.

Os indivíduos pobres devem ter acesso à for-mação profissional, ao crédito e à proteção jurídicanecessários para assegurar tal participação. As inici-ativas de inclusão social exigem o fortalecimento dascomunidades humanas de base, mediante a criaçãode estruturas de participação e corresponsabilidades.ou seja, uma garantia de uma ordem ética da ca-ridade e da solidariedade, conforme propõe aEncíclica Centesimus annus, do Papa João Paulo II.Em visita à América Latina ele afirmou que “A pobrezaextrema é, talvez, a mais penetrante e paralisadoraforma de violação dos direitos humanos no nossomundo. Porém, a luta contra a pobreza é, sobretu-do, um imperativo moral, especialmente hoje, emvirtude do paradoxo escandaloso das dimensões dapobreza que existe pari passu com o progresso cien-tífico capaz de a eliminar.”

Aliás, em dezembro de 2003, ele fez umapelo aos governos do mundo para que com-batessem a fome e a pobreza, dizendo que elas sãouma séria ameaça à paz. Citando relatório da FAO,comenta que o número de pessoas com fome tem

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aumentado em vista disso. “O mundo não pode

permanecer surdo ao apelo daqueles que exigemo alimento necessário para sobreviver.”

A questão da pobreza material para a Igreja temcomo causas as estruturas sociais e as consciênciasindividuais. Os vícios, egoísmos dos indivíduos, am-bições desordenadas e injustiça, corrompem as es-truturas e estas contribuem para deformar ainda maisos indivíduos.

O pensamento da Igreja é que a solução paraum desenvolvimento econômico justo não será

alcançado apenas reformando os indivíduos, comopropõe o capitalismo, ou, tão somente, mudandoas estruturas, como defende o socialismo.

A Doutrina Social da Igreja é radicalmente di-ferente dessas duas ideologias. Ambas sistematiza-das de ideias induzidas de um processo históricoconcreto dotado de um sistema operacional do mer-cado ou do estado totalitário.

As Ideias do Modelo da Doutrina Social da IgAs Ideias do Modelo da Doutrina Social da IgAs Ideias do Modelo da Doutrina Social da IgAs Ideias do Modelo da Doutrina Social da IgAs Ideias do Modelo da Doutrina Social da Igrrrrrejaejaejaejaeja

Os ensinamentos das implicações sociais daIgreja têm Cristo como mensagem religiosa e moral.

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Desse modo, enquanto o dogma central do cristia-nismo é Cristo, na Doutrina Social da Igreja o crité-rio fundamental é o homem que Cristo assumiu nasua encarnação. Assim, para aferir a natureza dossistemas e políticas de desenvolvimento, o elemen-to determinante é a atenção atribuída à pessoahumana. As doutrinas, ideologias, sistemas e insti-tuições, segundo a Igreja, serão julgados de acordocom a contribuição que ofereçam para sua liberta-ção e promoção.

A Doutrina Social da Igreja tornou-se conheci-da a partir da Encíclica Rerum Novarum, do PapaLeão XIII, proclamada em 1891. Ou seja, 43 anosdepois do Manifesto do Partido Comunista de KarlMarx e Frederick Engels. Desde o nascimento do cris-tianismo, contudo, a Doutrina Social da Igreja era en-sinada pelos católicos. Em nenhum documento oficialda Igreja se encontra aprovação do capitalismo liberalou do socialismo. Na verdade, na Encíclica Quadra-gésimo Ano, o Papa condena o capitalismo e o soci-alismo. Mesmo com a observação de que nãocompete à Igreja inferir aspectos técnicos, econômi-cos, políticos e sociais dessas ideologias. Isto é fun-ção de seus filhos que estiverem à altura de suavocação cristã, diz o Pe Fernando Bastos de Ávila,ex-relator da Comissão Pontifícia de Justiça e Paz.

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Na verdade, o catecismo da Igreja Católica re-jeita as ideologias totalitaristas e ateias, associadas aocomunismo ou ao socialismo. Na prática do capitalismo:

Ela recusa o individualismo e o primado ab-soluto da lei de mercado sobre o trabalhohumano. Diversas concepções não condi-zentes com essa orientação, às vezes mani-festadas por católicos leigos, não contamcom o respaldo da Igreja una e verdadeira.

O desenvolvimento das atividades econômicase o crescimento da produção devem estar destina-dos a servir as necessidade do seres humanos den-tro dos limites da ordem moral, da liberdade e segundoa justiça social, a fim de corresponder ao plano deDeus acerca do homem. ( Gaudium et Spes, 1966).

MensagMensagMensagMensagMensagem e Orientação aos Leigem e Orientação aos Leigem e Orientação aos Leigem e Orientação aos Leigem e Orientação aos Leigososososos

A Doutrina Social Católica reconhece o papeldo mercado e da empresa, mas indica a necessida-de que esses sistemas sejam orientados para o bemcomum. Por outro lado, a socialização apresentamuitos perigos, como a história econômica temcomprovado. É, porém, tarefa do Estado garantir atutela de certos bens coletivos como o ambientenatural e humano. Os poderes públicos devem in-

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tervir para proporcionar o crescimento da produ-ção, para o progresso social e em benefício de to-dos os cidadãos.

Segundo a Carta Encíclica de João Paulo II,“Solicitude social”, a Doutrina Social da Igreja não é,contudo, uma Terceira Via entre capitalismo e cole-tivismo marxista. Ela constitui uma categoria pró-pria. Não é tampouco uma utopia, mas um modeloplausível de um novo desenvolvimento econômicomais humano.

O ensinamento e a difusão da Doutrina Socialda Igreja fazem parte da missão evangelizadora daIgreja Católica. No sentido de, como propõe a Cam-panha da Fraternidade:

Promover uma espiritualidade alicerçadana reconciliação e na solidariedade; con-tribuir ativamente com ações para superara fome e a pobreza; e favorecer soluçõesnão violentas dos conflitos sociais.

A Igreja Católica tem pedido à comunidade in-ternacional políticas econômicas que favoreçam osmais pobres. A Santa Sé, através do Arcebispo SilvanoTomasi, por exemplo, propôs na 11º Sessão daUNCTADE ( Nações Unidas) “A erradicação da po-breza faz crescer a coesão social e favorece o desen-

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volvimento sustentável”, razão por que a comunida-de internacional deve empenhar-se para alcançar talobjetivo. O Arcebispo Tomasi destacou ainda que,com a globalização, tem ocorrido a marginalizaçãode muitas pessoas, sobretudo nas áreas rurais.A de-sigualdade é fonte de conflitos e gera violência comoforma de expressão social.

Enfim, essa doutrina propõe-se a fundamen-tar e orientar a realização de um novo desenvolvi-mento econômico mais equitativo, justo, solidárioe conforme os ensinamentos cristãos.

O Centro Latino-Americano para o Desenvol-vimento, Integração e Cooperação (CELADIC) estáelaborando uma proposta alternativa de desenvolvi-mento, inspirada na doutrina social da Igreja. O pro-fessor Luis Henrique Marins, diretor geral do CELADIC,(www.celadic.org/) afirmou em reunião recente comtrezentos dirigentes sociais, políticos, empresariais,acadêmicos e religiosos na cidade do Panamá:

Cremos que a Doutrina Social da Igreja não pode esgotar-se em belos e valiosostextos, mas deve servir-nos para interpretar,a realidade que nos agride e a partir de seus parâmetros centrais de orientação, ela-borar, difundir e impulsionar propostas al-ternativas de desenvolvimento humano.

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A FOME NO MUNDO SEGUNDO O PONTIFÍCIOA FOME NO MUNDO SEGUNDO O PONTIFÍCIOA FOME NO MUNDO SEGUNDO O PONTIFÍCIOA FOME NO MUNDO SEGUNDO O PONTIFÍCIOA FOME NO MUNDO SEGUNDO O PONTIFÍCIOCONSELHO CONSELHO CONSELHO CONSELHO CONSELHO COR UNUMCOR UNUMCOR UNUMCOR UNUMCOR UNUM

IntrIntrIntrIntrIntroduçãooduçãooduçãooduçãoodução

O propósito desta parte é fazer uma síntese dealguns pontos do documento do Pontifício Conse-lho sobre “A Fome no Mundo”, que tem por subtítu-lo “Um desafio para todos; o desenvolvimentosolidário.” É oportuno referir que este importante do-cumento foi elaborado sob a coordenação do bispoPaul Josef Cordes, já referido e lançado pela SantaSé em 1997. Trata-se de um texto de grande abran-gência tanto doutrinária, como evangélica, difícil deser condensado em poucas páginas.

Os tópicos selecionados para essa resenhaguardam a maior fidelidade possível ao conteúdo ori-ginal. Os assuntos estão organizados, no documen-to do Conselho Pontifício, de acordo com osseguintes temas: as realidades da fome; os desafios denatureza ética a enfrentar conjuntamente; o rumo auma economia mais solidária; o jubileu do ano2000-uma etapa na luta contra a fome; e a fome:um apelo ao amor.

Nesse documento é destacado o pensamentodo Papa João Paulo II, onde ele diz que:

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Não será fácil avançar no difícil caminhoda indispensável transformação das estru-turas econômicas se não intervier uma ver-dadeira conversão das mentes, das vontadese dos corações. A tarefa exige a aplicaçãodecidida de homens e pessoas livres e soli-dárias. (Redemptor hominis)

Como são tantos os que sofrem de fome nomundo, o Sagrado Concílio Vaticano II exorta to-dos os particulares ou autoridades a refletirem so-bre a advertência dos padres da Igreja; “Alimenta oque morre de fome, porque se não o alimentaste,mataste-o.”

Esclarece o Conselho “Cor Unum” que não sedeve confundir fome com subnutrição. A fome ame-aça a vida e a dignidade das pessoas. A fome podeser motivada por um fator natural, como secas ouenchentes, ou derivar de ação humana.

Quanto à subnutrição, ela pode ser quantitati-va ou qualitativa. Por exemplo, falta de proteínas ouvitaminas na alimentação. Os pobres são as primei-ras vítimas das carências alimentares, tanto nas ci-dades como no campo. A população mais vulneráveldentre os pobres são as crianças, mulheres grávidas,os idosos e enfermos. Segundo a FAO/OMS, a por-ção diária mínima necessária de calorias para nãocomprometer a saúde é de cerca de 2.000/2.500.

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Convém esclarecer, nesse ponto, que as pesquisasdo IBGE no Brasil indicam que o consumo das camadasmais pobres é de, mais ou menos, 1.800 calorias/dia.

As causas principais para a fome são apontadaspelo Conselho “Cor Unum” com base em documen-tos das Nações Unidas e se originam do próprio sub-desenvolvimento, de fatores climáticos, de políticaseconômicas inadequadas e restrições ao comérciode produtos alimentícios. O crescimento demográficomais rápido do que a produção tem gerado dese-quilíbrio alimentar. Há causas políticas que tambémgeram graves problemas para certos grupos sociais.

A concentração da riqueza no interior de al-guns países acentua a pobreza em alguns segmentosda população. A causa da pobreza pode ser tambémde ordem política, moral, corrupção, ou falta doexercício da solidariedade. Para enfrentar o desafioda fome e da subnutrição exigem ações específicasque não podem ser separadas de esforço do desen-volvimento integral do pensar e das pessoas.

A IgA IgA IgA IgA Igrrrrreja Está com os Peja Está com os Peja Está com os Peja Está com os Peja Está com os P obrobrobrobrobreseseseses

O ensinamento da Igreja, no tocante aos pro-blemas relatados, toma por base uma filosofia deação responsável. É uma busca do bem comum,

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fundamentada na solicitude e no amor pelos ho-mens. Os obstáculos ao desenvolvimento, convémadvertir, não são unicamente produto da ignorân-cia e da incompetência. Decorrem também daspróprias estruturas do pecado social. A des-tinação universal dos bens exige, de fato, cons-truir meios de produção de utilidade comum e quepossam ser compartilhados com os mais desafortu-nados e pobres.

O Papa João Paulo II, na Encíclica Centesimusannus, fala da escuta preferencial pelos pobres e aseu serviço, com espírito de partilha. Diz ele;

... Sobretudo será necessário abandonar amentalidade que considera os pobres-pes-soas e povos- um fardo e oportunistas quepretendem consumir tudo o que os outrosproduzem... O progresso dos pobres é umagrande ocasião para o crescimento moral,cultural e econômico da humanidade.

Na verdade, sublinha o Conselho que o lugardo pobre não é na periferia, numa marginalidade daqual haveria de procurar tirá-lo. Ele deve ser postono centro da nossa solicitude e no âmago da famíliahumana. É ali que poderá desempenhar o seu pa-pel singular no seio da comunidade:

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A ideia é que haja uma justiça arraigada nasolidariedade humana e que leve a maisforte ajuda ao mais fraco com justiça, paze caridade.

Uma visão pouco reconhecida é quanto ao di-namismo que os pobres possuem quando motivados.De fato, quando se dá responsabilidades e se escuta aopinião dos pobres obtêm-se frutos positivos. Sãoexemplos disso as iniciativas comunitárias realizadasem muitas partes do mundo, inclusive aqui no Ceará.Basta citar os casos do Projeto São José, de combate àpobreza, e de Reforma Agrária Solidária, para se teruma ideia do potencial comunitário em ação.

O Pontifício Conselho “Cor Unum” dá granderelevo à questão da integridade e sentido social dasiniciativas de combate à fome. Nesse sentido, assina-la que “é absolutamente necessário motivar o con-junto dos agentes sociais econômicos em favor depolíticas de desenvolvimento que tenham como fi-nalidade garantir a todos os homens uma igual opor-tunidade de viver na dignidade, contribuindo comos esforços e sacrifícios necessários.”

Segundo essa instituição, muitas vezes é, so-bretudo, a corrupção que obstaculiza os esforços ne-cessários à busca do bem comum e da justiça queconvivem lado a lado.

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Rumo a uma Economia mais SolidáriaRumo a uma Economia mais SolidáriaRumo a uma Economia mais SolidáriaRumo a uma Economia mais SolidáriaRumo a uma Economia mais Solidária

O documento afirma que o crescimento da ri-queza, necessária para o desenvolvimento, deve serfeito com reformas estruturais. O desenvolvimentohumano, nesse contexto, não será feito de mecanis-mos econômicos autoritários, que geralmente resul-tam em mero crescimento com concentração darenda. A economia para tornar-se mais humana ca-rece de reformas orientadas para o melhor serviçodo verdadeiro bem comum, numa visão ética.

Quanto à questão da ajuda de natureza mera-mente humanitária, existem muitas controvérsias. Masa Igreja é de opinião que as doações assistencialistasdevem ser realizadas em condições de emergência etemporárias. Geralmente elas não incidem sobre ascausas da fome e podem desencorajar os produto-res, criando uma dependência externa para sobrevi-verem. Outros dizem que podem favorecer acorrupção, ajudar os intermediários e especuladores.

Parece não haver dúvidas de que o problemada fome não poderá ser resolvido enquanto não sefomentar a segurança alimentar, com produção eestocagem para as ocasiões de escassez dos produ-tos. Para essa finalidade, é importante desenvolverprogramas que valorizem a produção de alimentos

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localmente, inclusive através de reforma agrária ondea questão da terra for elemento limitante para a ex-ploração agrícola. Outro fator é a organização dacomercialização que garanta os preços mínimos. To-das essas tarefas requerem ao mesmo tempo com-petência e vontade humana e política.

No caso especifico do Nordeste do Brasil, a po-breza rural é ligada à baixa produtividade da mão-de-obra e da terra. Para mudar isso, são necessáriosmais investimentos na erradicação do analfabetismoe na organização dos produtores. No semiárido ascalamidades climáticas são associadas às perdas naprodução de alimentos e à fome.

Mesmo nos anos de pluviometria normal enas entressafras há escassez de alimentos. A produ-ção é estacional e os agricultores de subsistência ven-dem a produção na época da colheita para cobrirsuas necessidades básicas, faltando o produto norestante do ano.

A Superação da FA Superação da FA Superação da FA Superação da FA Superação da Fomeomeomeomeome

A solução dos problemas da fome e da pobre-za carece da contribuição da ciência agronômica, ede uma organização social orientada para asolidariedade. Há necessidade, para isso, desensibilização dos indivíduos e dos povos. Para pos-

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sibilitar um desenvolvimento autêntico, a Igreja con-vida todos os homens a desenvolver seu saber,sua competência e sua experiência. Ou seja, cadaum deve contribuir de conformidade com os donsque revelam e segundo a sua própria vocação. Comefeito, todos os homens de boa vontade podem com-preender quais são os desafios éticos ligados ao fu-turo da economia mundial.

A Igreja preocupa-se com os pobres e famin-tos, pois Deus não quer a indigência de seu povo.Ela, porém, adverte quanto aos ídolos que estão pró-ximos de nós. Trata-se da busca individual ou co-munitária, de ricos ou pobres, dos bens materiais,do poder, da reputação e do prazer, consideradoscomo um fim em si mesmos. Servir tais ídolos subju-ga o homem e empobrece o planeta.

É libertando-nos desses ídolos que Deus irá per-mitir que nosso esforço transforme o mundo. Não ape-nas multiplicando as riquezas, mas, sobretudo,orientando o trabalho dos homens para o serviço detodos. O apóstolo São Paulo afirmou “... Jesus Cristo,embora sendo rico, fez-se pobre por nós.” ( 2 Cor 8,9)

“Todos os seres humanos têm capacidade natanão só de cuidar de si mesmos, mas também de contri-buir para aumentar o bem-estar do mundo como um todo”, disse Muhammad Yunes no discurso quando recebia o Prêmio Nobel da Paz, em Oslo (2006).

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A ALIMENTA ALIMENTA ALIMENTA ALIMENTA ALIMENTAÇÃO DOS POBRESAÇÃO DOS POBRESAÇÃO DOS POBRESAÇÃO DOS POBRESAÇÃO DOS POBRES

A Declaração Universal dos Direitos Humanosde 1948 e vários outros documentos aprovados pelasNações Unidas asseguram a determinação dos mem-bros dessas organizações no sentido da eliminação dafome e da subalimentação onde ela exista. O progra-ma de governo do atual Presidente do Brasil, Luiz InácioLula da Silva, também estabelece esse objetivo para apopulação pobre, especialmente do Nordeste.

Não há nenhuma dúvida de que a populaçãopobre necessita de ajuda emergencial para sobrevi-ver, especialmente no caso da mitigação da fome. Oproblema central que tem preocupado as organiza-ções internacionais e os gestores públicos é o para-doxo dos modelos assistencialistas geralmenteadotados para enfrentar esse problema. Num modelode desenvolvimento de uma sociedade justa, entre-tanto, essa forma de política paternalista é condenada.

De acordo com a história econômica, o assis-tencialismo tem sido o mais eficaz remédio para man-ter a pobreza e ofender a dignidade humana. Ospobres, na verdade, não querem esmolas, mas ajudae apoio para a melhoria, de modo sustentável, de suascondições de vida. Isto por que o assistencialismomata a iniciativa e geralmente transforma-se em ins-trumento de dominação social e política dos promo-tores dos programas.

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Os fundos de transferência de renda e de assis-tência social, sem contrapartida, foram idealizadospelos países desenvolvidos para serem seguidos pe-los atrasados economicamente e dependentes dosorganismos financeiros internacionais. Essa modali-dade de ajuda tem uma fundamentação doutrináriaidealizada para amenizar as tensões políticas e soci-ais que a pobreza gera.

Um dos presidentes do Banco Mundial na dé-cada de 70, por exemplo, era defensor do assisten-cialismo nos programas de cooperação financeira aospaíses subdesenvolvidos. Robert McNamara, empronunciamento na Junta de Governadores do Gru-po do Banco Mundial, nas Filipinas, em outubro de1976, já reconhecia que “A pobreza tende a perpe-tuar-se e, a menos que se conceba e empregue umacampanha deliberada contra sua dinâmica interna,ela persistirá e crescerá.”

Os negociadores dos recursos de apoio aos paí-ses subdesenvolvidos, no entanto, sabiam que o pro-cesso de desenvolvimento econômico é umfenômeno de longo prazo. Acreditavam também quepela própria natureza do crescimento, ocorria umaconcentração da riqueza nas fases iniciais do pro-cesso. Isto gerava a pobreza nas camadas sociais des-providas de educação e recursos para participaremdas forças produtivas.

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A PRA PRA PRA PRA PRODUÇÃO MUNDIAL DE ALIMENTODUÇÃO MUNDIAL DE ALIMENTODUÇÃO MUNDIAL DE ALIMENTODUÇÃO MUNDIAL DE ALIMENTODUÇÃO MUNDIAL DE ALIMENTOSOSOSOSOS

De modo geral, a situação alimentar mundialnão poderia ser melhor. Se a produção de gênerosalimentícios fosse distribuída entre todos os países,não haveria a fome atualmente.

A produção total de cereais e produtos de ori-gem animal tem crescido no mundo mais do que apopulação. O incremento por pessoa foi de 2-3% nadécada de 90 e início do novo século. A produtivi-dade dos principais gêneros alimentícios por hecta-re mais do que dobrou nas últimas três décadas. Equanto aos preços, dada essa situação da evoluçãoda oferta, foi em termos reais de estabilização emesmo declínio ao longo dos anos.

Mesmo assim, cerca de 925 milhões de pes-soas no mundo todo não têm acesso à alimen-

tação suficiente para manter padrões de saúdee uma vida produtiva. De acordo com as Nações

Unidas, 95% desses famintos estão na África, Ásia,América Latina e Caribe.

O Comitê Permanente pela Nutrição das Na-ções Unidas, reunido em Genebra no dia quatro demarço de 2005, advertiu que os programas rea-l izados pelas nações em desenvolvimento

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na luta contra a fome estão sendo insuficientes.O porta-voz do Comitê, Salvador Herêncio, in-forma que 125 milhões de crianças com menos decinco anos estão com peso abaixo do normal. Taiscondições estão aumentando a taxa de morta-lidade infantil. Com essas tendências, externa o Co-mitê, os objetivos de desenvolvimento para 2015não serão alcançados.

O que se pode deduzir desse panorama é queos países desenvolvidos estão produzindo bem aci-ma de suas necessidades, com apoio de altatecnologia e pesados subsídios aos agricultores. Comisso, acumulam estoques ou exportam para os paísesdeficitários desses produtos. Em outras palavras, en-quanto ocorre essa superprodução nos países ricos,as populosas nações subdesenvolvidas não conse-guem produzir alimentação suficiente para atenderàs suas necessidades. Em muitos casos, as melhoresáreas agrícolas são destinadas à produção de matéri-as-primas para a indústria ou para a geração de dívi-sas pelas exportações para os países industrializados.

Nos próximos vinte ou trinta anos, os fazendei-ros, agricultores de subsistência e governantes dos

países subdesenvolvidos terão o desafio de proveralimentos, a preços acessíveis, para milhões depessoas que aumentam a população mundial a

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cada ano. Além disso, eles terão de incrementar aprodução com tecnologias rentáveis e sem degrada-ção dos seus recursos naturais.

Nos países subdesenvolvidos, ou regiões comoo Nordeste brasileiro, a agricultura não tem produ-zido o suficiente para abastecer a sua grande popu-lação. Parte importante de suas necessidades sãosatisfeitas através da importação de outras regiõesou mesmo do exterior.

A agricultura dessa região é muito atrasada e asprioridades são mais para a produção de matériasprimas e produtos para exportação. Mesmo os pro-jetos de irrigação pública se direcionam prioritaria-mente à produção de frutas para essa finalidade,

negligenciando-se a produção de grãos.

“A turbulência financeira mundial (2008) tornamais difícil projetar o comportamento da produ-ção e dos preços dos alimentos nos próximos anos.Para garantir a segurança alimentar de uma populaçãoque cresce, é preciso investir. Mas o desafio é gran-

de diante da escassez de crédito e o alto preço das

sementes e fertilizantes”, avalia o Banco Mundial.A percepção global atual é de uma crise mun-

dial de alimentos nos próximos anos, especialmenteem face da concorrência dos biocombustíveis.

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NOVO MODELO DE DESENVOLVIMENTONOVO MODELO DE DESENVOLVIMENTONOVO MODELO DE DESENVOLVIMENTONOVO MODELO DE DESENVOLVIMENTONOVO MODELO DE DESENVOLVIMENTO

“Não vos conformeis com este mundo.”

(RM 12,2)

O progresso econômico sempre foi uma dasaspirações dos povos. Especialmente nas últimas dé-cadas, a busca por prosperidade e melhoria dos pa-drões de vida passou a ser a maior obsessão de todasas nações do Norte e do Sul do planeta. Para alcan-ce desses objetivos, os países se empenharam comtodas as armas possíveis. Desenvolvendo tecnologias,aproveitando recursos naturais, envolvendo-se emguerras de dominação, inclusive estabelecendo es-tados coloniais e seguindo ideologias e doutrinaspolíticas e econômicas que se propunham garantir oêxito para o alcance dessa finalidade.

A história econômica mostra que o resultadodessa corrida para a riqueza foi o surgimento de doismundos: Uma pequena minoria de nações ricas,onde ocorreu uma grande elevação da renda e acu-mulação de bens materiais; por outro lado, cerca de60 ou 70% da população mundial, distribuída emcentenas de países da África, América Latina e Ásia,subsistindo num generalizado atraso econômico epobreza. As características principais desses países

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são a fome, o estado de saúde precário, as condiçõesde habitação deficientes e os padrões educacionaismarcados pelo analfabetismo e baixa qualidade doensino para a maioria da população.

Assim, a situação do mundo está marcada porvárias distorções de ordem econômica, social e reli-giosa. Diz a Igreja que não é um mal alcançar ummodo de vida melhor, mas é errado quando o de-senvolvimento é orientado no ter e não no ser.

É pouco provável que os sistemas e doutrinaseconômicas seguidas até agora no mundo possamcorrigir tão graves desigualdades. Fundamentalmen-te decorrentes de sistemas econômicos orientadospelo princípio do lucro como motor da economia,ou de regimes políticos onde prevalece um estadototalitário ateísta, sem liberdade e respeito aos di-reitos humanos.

Torna-se necessário e urgente, em consequên-cia dessa situação, realizar uma obra educativae de esclarecimento dos dirigentes, líderes e dapopulação para que contribuam para a formula-ção e adoção de novas políticas de desenvolvi-mento econômico mais equitativo e com menospobreza e fome.

A missão própria confiada por Cristo à sua Igrejanão é de ordem política, econômica ou social. O fim

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a que se propôs é de ordem religiosa, mas dessa mis-são deriva o encargo de servir à comunidade humanasegundo a lei divina e suscitar obras destinadas a ser-vir a todos, sobretudo aos pobres (Gaudium et spes).

Na verdade, a Igreja não tem ficado alheia aessa realidade e pensa que muito pode ajudar nosentido de tornar mais humana a família dos homense sua história. Apoiada na palavra de Deus e noespírito do evangelho, a Igreja tem, principalmentenos últimos cem anos, proclamado em inúmerosdocumentos dos santos papas os itinerários e os mo-dos de agir para construir uma sociedade mais huma-na, fraterna, solidária e assentada na paz.

Pode-se encontrar essa proclamação na Doutri-na Social da Igreja, abordada resumidamente nasegunda parte deste livro. Assim, a finalidade deste texto,elaborado por um professor de teoria econômica dedica-do há trinta anos aos estudos desses problemas, é ofere-cer elementos para ajudar aos governantes na sua mis-são de difusão evangélica de um novo modelo de de-senvolvimento econômico mais justo e cristão.

A Carta Encíclica Solicitude Social de JoãoPaulo II resume isso, magistralmente: “O verdadeirodesenvolvimento não pode existir na simples acu-mulação de riqueza e na maior disponibilidade dosbens e dos serviços.”

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O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Mais ainda, reflete o saudoso Papa, se isso forobtido à custa do subdesenvolvimento das multidõese “sem levar em conta as dimensões sociais, cultu-rais e espirituais do ser humano.”

O imperativo do século XXI, segundo a Doutri-na Social, é reduzir as desigualdades na distribuiçãodos bens, maiores oportunidades no plano educa-tivo, proteção do ambiente e desenvolvimento sus-

tentável.O Papa Bento XVI, recebendo os representan-

tes da Plenária Pontifícia Academia das CiênciasSociais, afirmou que “o compromisso pela dignidadehumana se baseia sobre dois eixos: o horizontal,representado pela solidariedade e subsidiaridade e

o vertical representado pelo bem comum.”O primeiro passo decisivo para alcançar o ver-

dadeiro desenvolvimento é implementar políti- cas que reconheçam e “situem o valor da pessoa hu-ana em seu centro.”

111SEGUNDA PARTE – A DOUTRINA DO DESENVOLVIMENTO JUSTO

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

ESQUEMA DO NOVO MODELOESQUEMA DO NOVO MODELOESQUEMA DO NOVO MODELOESQUEMA DO NOVO MODELOESQUEMA DO NOVO MODELODE DESENVDE DESENVDE DESENVDE DESENVDE DESENVOLOLOLOLOLVIMENTVIMENTVIMENTVIMENTVIMENTO ECONÔMICOO ECONÔMICOO ECONÔMICOO ECONÔMICOO ECONÔMICO

DOUTRINA SOCIALDA IGREJA

DESENVOLVIMENTO

JUSTO

UMA SOCIEDADE

EQUITATIVA E

SEM POBRES

ECONOMIA DA

COMUNHÃO

(Cultura da Partilha)

NOVOS

HOMENS E

MULHERES

A QUESTÃO DA POBREZA

TERCEIRA PARTE

“Estou profundamente

convencido de

que podemos livrar o

mundo da pobreza

se estivermos

determinados a isso

(...). Quer sejam ações

revolucionárias,

liberais, conservadoras,

jovens ou velhas,

podemos unir forças

para resolver

esse problema.”

Muhammad YunesPrêmio Nobel de Economia, 2006

INTRINTRINTRINTRINTRODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃO

Durante os últimos duzentos anos, mais de umadezena de nações novas e milenárias tornaram-sedesenvolvidas e ricas. Ao mesmo tempo, mais de umacentena de outras nações permaneceram ou torna-ram-se subdesenvolvidas ou pobres.

O mundo rico passou a ser denominado de Pri-meiro Mundo. O segundo era socialista, formadoapós a Primeira Guerra Mundial, que permaneceuisolado até a queda do muro de Berlim (1989). Noauge de sua existência compreendia trinta países eum terço da população mundial. Neste bloco preva-lecia a propriedade estatal dos meios de produção,o planejamento central, o sistema de partido únicoe a integração econômica dentro desses países. OTerceiro Mundo correspondia a uma grande maio-ria de países subdesenvolvidos. Eram os países não-alinhados, nem com os ricos nem com os socialistas.

Segundo os estudos do Prof. Jeffrey Sachs(2005), o mundo rico (acima de US$ 20.000 de ren-da per capita) incluía os Estados Unidos, Canadá,Europa Ocidental, Japão, Austrália e Nova Zelândia.Os países de renda média (entre US$ 4.000 e US$20.000) compreendiam a maior parte da Ásia Ori-ental (como Coréia do Sul e Singapura), Europa Cen-

116 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

tral e ex-União Soviética e América Latina. Os paí-ses de renda baixa superior (entre US$ 2.000 e US$4.000) incluem partes da América do Sul, Ásia Meri-dional e leste da Ásia. Os países abaixo de US$ 2.000concentram-se na África subsaariana e no sul da Ásia.

Devemos estar lembrados de que a humanida-de avançou em muitas frentes importantes, apesarda emergência dos grandes problemas de pobreza.A família das Nações Unidas, por exemplo, cresceudesde o fim da II Guerra Mundial de 51 para 184países e muitas nações garantiram a sua liberdade eautodeterminação.

O Produto Interno Bruto elevou-se de US$ 3 tri-lhões para US$ 44 trilhões e a população mundialcresceu mais do dobro, passando de 2,5 bilhões paramais de 6 bilhões. Ocorreu um substancial aumentona expectativa de vida e a diminuição dramática damortalidade infantil nos países subdesenvolvidos. Omundo está hoje mais seguro de um holocausto nu-clear. As fronteiras médicas atingiram limitesinimagináveis, através de medicamentos e operaçõescomplexas de transplante de órgãos.

Entretanto, segundo David S. Landes, osavanços em saber e tecnologia não foram equita-tivamente distribuídos, nem mundialmente nem den-tro das nações. Vivemos hoje um mundo de desigual-

117TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

dades, como ocorre com o Brasil, que se encontraentre os de pior situação nesse particular em todo o

TABELA 1 – Indicadores da Economia Mundial

Fonte dos dados originais: World Development Report – World Bank – 2007.

Gráfico I – O Mundo Desigual

1. Distribuição de renda

MUNDORENDA BAIXARENDA MÉDIARENDA ALTABAIXA + MÉDIALeste da África ePacíficoEuropa e Ásia CentralAmérica Latina eCaribeOriente Médio e Norteda ÁfricaSul da ÁsiaÁfrica Subsaariana

PopulaçãoMilhão

6.4382.3533.0741.0115.4261.885

473551

305

1.470741

% anual2000-2005

1,21,90,90,71,30,9

0,01,4

1,9

1,72,3

PIB TotalUS$ bilhão

44.3841.3918.535

34.4669.9263.032

2.1902.455

632

995615

PIB per CapitaUS$ (dólares)

6.987580

2.64035.1311.7481.627

4.1134.008

2.241

684745

planeta Terra.

118 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

2. Distribuição da população

O PrO PrO PrO PrO Problema de Definiçãooblema de Definiçãooblema de Definiçãooblema de Definiçãooblema de Definição

O conceito de pobreza varia de um país a ou-tro e ao longo do tempo. A pobreza pode ser defini-da também de um ponto de vista objetivo ou subje-tivo, afora o significado evangélico. Os indivíduostêm, em qualquer ocasião, a sua opinião do queconstituiu a pobreza.

Os padrões objetivos são de três espécies: físi-cas, econômicas e sociais. Vejamos, por exemplo,o que diz Adam Smith sobre as necessidades conven-cionais das populações pobres:

Por necessidades essenciais eu entendonão só os artigos que são indispensáveis enecessárias para o sustento da vida, mas oque quer que, em faltando, os habitantesdo país consideram a provação deles in-digna para pessoas doentes, mesmo dascamadas mais baixas.

15%

37%

48%

ALTA

MÉDIA

BAIXA

119TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Não é mero sofisma a respeito de definição,mas de considerável importância prática, pois todosos padrões para a medida da pobreza são relativosno tempo e no espaço.

O padrão de necessidades mínimas agoraadotado para a população de São Paulo é bem dife-rente do que há cinquenta anos, embora as carên-cias mínimas de alimentação e moradia não te-nham mudado. O padrão mínimo do campo é pro-vavelmente mais baixo do que na cidade. E os pa-drões mínimos de São Paulo seriam considerados

como puro luxo em muitas áreas do Nordeste.Como atualmente a pobreza aflige uma parte

representativa da humanidade e do Brasil, convémanalisar sua extensão e suas causas para que a po-

lítica econômica e social possa ser dirigida, tan-to através da redistribuição de renda como poroutros meios.

Não é pura retórica falar dessa luta pela reduçãoda pobreza como maior desafio da história mundial.Atualmente ela supera, em complexidade, ta-manho e amplitude, qualquer empreendimentoanterior do homem nos últimos cinquenta anos.

Na realidade, pobreza significa algo mais doque simplesmente viver com o mínimo de dignida-

120 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

de e respeito humano. A luta pela redenção da po-breza não é apenas uma busca pelo crescimentoeconômico, mas o resgate de uma dívida social,um dever moral do governo e da sociedade civil, osquais são responsáveis e estão usufruindo os benefí-cios da prosperidade.

O que descrevo neste capítulo tem o objetivode oferecer elementos para um melhor entenderdessa realidade incontestável e impressionante dapobreza mundial.

O Significado de PO Significado de PO Significado de PO Significado de PO Significado de Pobrobrobrobrobreza Rural e Urbanaeza Rural e Urbanaeza Rural e Urbanaeza Rural e Urbanaeza Rural e Urbana

Os pobres constituem um grupo heterogêneo.Como sublinhado antes, as definições de pobreza sãodiferenciadas nos países industrializados e subdesen-volvidos. Além disso, afirma David Satterthwate, doInstituto Internacional para o Meio Ambiente e De-senvolvimento, com sede em Londres, que as linhasde pobreza com base unicamente na renda não sãoadequadas para bem entender esse fenômeno.

As linhas de pobreza com base na renda apre-sentam níveis muito baixos que não permitem co-brir os custos de itens essenciais não alimentares, taiscomo transporte, manutenção das crianças na esco-la e pagamento de água e serviços de saúde. Tam-

121TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

bém não representam aspectos da pobreza referentesa habitações de má qualidade, acesso inadequado aserviços de emergência e proteção legal e falta devoz nos sistemas políticos.

A maior parte das definições de pobreza não fa-zem distinção entre áreas rurais e urbanas. Embora oresultado final da pobreza possa ser o mesmo, as cau-sas e as características são diferentes. A causa da po-breza rural depende da posse de uma pequena terra ebaixo rendimento. Difere de um domicílio urbano.

A pobreza em uma habitação urbana pode serdecorrente de estar localizada em uma comunidadede favelas, desempregados, com problemas saúde edespesas de manutenção do domicílio. Os progra-mas destinados à redução da pobreza rural e urbanaprecisam considerar essas diferenças.

O Banco Mundial estima que havia cerca de500 milhões de moradores urbanos pobres no anode 2000, abaixo da linha de pobreza com base narenda de “um dólar por dia.” Sobre a pobreza rural,a estimativa para 114 países em desenvolvimento éde que viviam nas zonas rurais cerca de um bilhãode pessoas com rendimentos abaixo da linha de po-breza. Destes, 2/3 estavam na Ásia e mais 1/5 naÁfrica subsaariana. Na maior parte da América Lati-na, a maior parte da pobreza agora é considerada

122 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

urbana, mas, em termos relativos, a zona rural conti-nua predominando para muitos países.

De fato, 74% da população e 62% dos habi-tantes pobres da América Latina e Caribe se encon-tram em zonas urbanas. Mas em termos relativos, apobreza continua sendo um fenômeno rural na Re-gião. Além disso, a renda média rural é bastante in-ferior à urbana. Cerca de 70% ou mais da popula-ção rural da Bolívia, Equador, Guatemala, Haiti,Honduras e Nicarágua se encontram abaixo da li-nha de pobreza. No Brasil, México e Colômbia essaproporção era de 50% a 62%. São cerca de 205milhões de pobres, com 30% desses em situação deextrema pobreza. As maiores concentrações de po-bres se acham na América Central, na região andinae Nordeste brasileiro, onde 60% dos habitantes es-tão abaixo da linha de pobreza.

TABELA 2 – América Latina: situação de pobreza –porcentagem (%)

Pobreza Pobreza extrema

Anos Total Urbana Rural Total Urbana Rural1980 35 25 54 15 9 281990 41 35 58 18 12 342000 36 32 54 15 10 342005 38 30 56 14 10 31

Fonte: CEPAL (2000) Estimativa (2005)

123TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

A grande maioria dos pobres das áreas ruraisvive nas zonas de escasso potencial agrícola, inclu-sive áreas degradadas ou semiáridas, terras propen-sas à erosão, com solos frágeis e de acentuada incli-nação como nas Cordilheiras dos Andes e zonascosteiras do México.

O Brasil tem cerca de 20 milhões de pessoaspobres na zona rural, a maioria no Nordeste do Bra-sil. Ao longo dos anos, muitos habitantes pobres daszonas rurais emigram para as zonas metropolitanasde São Paulo e Rio de Janeiro. No caso da Amé-rica do Sul, os pobres são geralmente indíge-nas, arrendatários ou vivem em comunidades mon-tanhosas remotas da Bolívia, Peru e Equador. NoBrasil, a maior concentração é no semiárido nor-destino, como já comentado.

A pobreza rural está geralmente associada coma falta de melhor distribuição da terra e inadequadoacesso à informação tecnológica e ativos produtivospara pequenos produtos. As populações pobres resi-dentes no quadro rural sofrem das consequênciasdo isolamento rural e limitados serviços de educa-ção, saúde e habitação. Políticas orientadas pelomercado nas últimas décadas levaram a um padrãode investimento nas áreas rurais que contribuírampara o aumento de pobreza.

124 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

CírCírCírCírCírculo Vculo Vculo Vculo Vculo Vicioso da Picioso da Picioso da Picioso da Picioso da Pobrobrobrobrobrezaezaezaezaeza

As causas da pobreza podem ser históricas, geo-gráficas, antropológicas, políticas e até mesmo circuns-tanciais. Cada país ou região tem suas motivações, mes-mo que haja semelhanças na origem desse fenômeno.São muitas as teorias e concepções que buscam expli-car esse grave problema da humanidade. Alguns mo-delos são de fundamentação estritamente econômicaou sociológica, enquanto outros argumentam com ra-zões geográficas (os países pobres nos trópicos), sociais,religiosas ou ideológicas (capitalismo/socialismo).

Por intuito de simplificação e objetividade voutratar apenas do que há de mais consenso e baseempírica de comparação documental. Ao longo demuitos anos, grupos de estudo de órgãos das Na-ções Unidas identificaram várias causas elementa-res da pobreza: falta de acesso aos recursos econô-micos e serviços básicos por segmento da população;políticas econômicas públicas equivocadas e eco-nomia de mercado para estimular iniciativas priva-das; discriminação social que torna difícil a popu-lação utilizar o potencial produtivo; falha no papelda segurança pública quanto aos direitos humanos;crises e guerras, desastres ambientais e dissemina-ção de doenças contagiosas.

125TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Acrescentam-se a falta de mecanismos para pro-teger a população com gastos sociais baixos;ineficiente administração pública e instituições fra-cas; insuficiente interesse governamental no com-bate à pobreza; protecionismo ao mercado externocontra os países subdesenvolvidos pelos países in-dustrializados, bloqueando o crescimento dos paí-ses produtores de matérias-primas.

Nos estudos contidos nos Relatórios de Desen-volvimento Humano do PNUD (Nações Unidas) sãorelacionadas outras causas físicas que geram a po-breza e a perpetuam. São elas o analfabetismo, a inse-gurança alimentar (fome, subalimentação), ausênciade estruturas e serviços sociais destinados aos po-bres, saneamento básico e água potável, precarieda-de das instituições e da vida política. Vale desta-car, ainda, a falta de liberdade que restringe asoportunidades.

Devido a essas características, a pobreza é maisdo que uma categoria demográfica ou uma classesocioeconômica: “A pobreza é também uma atitu-de de vida.” (Banco Interamericano de Desenvolvi-mento, 2000).

Alguns preeminentes economistas defendem atese de que nas economias subdesenvolvidas preva-lece um fenômeno que perpetua a pobreza como

126 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

se fosse um círculo vicioso da pobreza. Como é bai-xa a renda per capita, não há suficiente poupança epor consequência, é baixa a taxa de investimento.Em ocorrendo isso, dá-se uma baixa produtividadeque é o elemento básico para o aumento da rendaper capita. Outro elemento de expansão da econo-mia é demanda do mercado ou dos padrões de con-sumo. Numa economia de baixa renda ocorre pou-co consumo e estagnação dos estímulos que motivauma elevação da demanda. Como se pode deduzir, es-se esquema do círculo vicioso da pobreza é uma gran-de simplificação da realidade, mas serve para orien-tar o raciocínio do processo de crescimento.

GRÁFICO II – Círculo Vicioso da Pobreza

127TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Precisa ficar claro também que o problema dapobreza vai além da questão da renda. É preciso conhe-cer a estrutura da origem da renda para identificar osfatores que estão determinando o seu comportamento.

A renda de cada domicílio ou pessoa isolada,por exemplo, depende da renda gerada pelos ativosda unidade ou indivíduo que são: humano, físico ecapital social. Do lado da produção, esses fatores ge-ram renda, de acordo com o preço de mercado des-ses fatores. A renda também pode ser recebida inde-pendentemente da renda dos ativos, proveniente deoutras fontes e transferências. Finalmente, a renda fa-miliar depende do número de pessoas do domicílio.

As estratégias para quebrar o círculo vicioso dapobreza estão relacionados com todos esses fatores.Assim, não se trata de uma política independente. Oprincipal objetivo que se pretende, na verdade, émelhorar o padrão de vida da população pobre atra-vés do crescimento da produtividade dos fatores deprodução e da melhoria da alocação desses fatoresno sistema econômico.

O aumento mais rápido da renda média é fun-damental para reduzir a pobreza absoluta. O cresci-mento por si só não é suficiente. Há uma grandediferença entre as rendas médias e das pessoas maispobres. O crescimento tende a aumentar essa dife-

128 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

rença. Esse padrão se explica mediante a Curva deKuznets que mostra que a renda dos 40% maispobres da população normalmente aumenta maislentamente que a média até que a renda per capitaalcance uma escala de US$ 5,700 a US$ 9,000. Aci-ma deste nível, as rendas dos grupos mais pobrestendem a se elevar com mais rapidez que a média.

Deste modo, a distribuição da renda é normalmentemais desigual nos países subdesenvolvidos do quenaqueles em pleno desenvolvimento. O aumentoinicial das desigualdades é motivado pelos incentivosque, na fase inicial, vão para os com melhores con-dições e com mais recursos.

Desigualdade e Igualdade na DistribDesigualdade e Igualdade na DistribDesigualdade e Igualdade na DistribDesigualdade e Igualdade na DistribDesigualdade e Igualdade na Distribuição de Rendauição de Rendauição de Rendauição de Rendauição de Renda

Não basta saber sobre qual é o nível de rendapara conhecer quantas pessoas da população estãoem determinada categoria. A quantidade de pobresde um país também depende da desigualdade ouigualdade na distribuição da renda. A falta de ade-quado entendimento sobre esse assunto tem sidomotivo de muitas polêmicas acadêmicas e crassoserros na formulação de políticas de desenvolvimen-to e combate à pobreza no Brasil e em muitos paísessubdesenvolvidos.

129TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Esses problemas já foram estudados em capítu-los anteriores. No momento, desejo simplesmentedemonstrar novos argumentos sobre o complexo pro-blema da pobreza no meio da abundância.

O Relatório sobre Desenvolvimento Mundialde 2000/2001 do Banco Mundial sobre “A luta con-tra a pobreza” oferece uma contribuição segura so-bre a problemática desse flagelo. Segundo esse con-ceituado documento, os pobres são aquelas pessoasque não dispõem de condições adequadas de ali-mentação, habitação, educação e saúde. Os pobres,além disso, vivem sem liberdade de ação e escolhae sofrem privações que os impedem de dispor deum tipo de vida que todos valorizam.

Por não disporem de recursos de reserva, sãoextremamente vulneráveis a doenças, crises finan-ceiras e climáticas, como as secas do Nordeste doBrasil. Não recebem a devida atenção das institui-ções do Estado e da sociedade em geral.

As diversas dimensões da pobreza somentepodem ser entendidas plenamente por quem já teveoportunidade de vê-la in loco. É tal a frustração e ador psicológica que as pessoas vivem nesse estadoque, para eles, parece impossível escapar dessa situa-ção. Como residente em uma das regiões mais po-bres do Brasil (Nordeste) e ter profissionalmente con-

130 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

vivido com essa realidade e conhecido situaçõessimilares na África e América Latina, posso testemu-nhar que são ambientes desumanos.

A pobreza, no entanto, é consequência de siste-mas econômicos que produzem essas condições deprivação e ausência de liberdade real de opções. A falta

de emprego, escassez de bens e poucas oportunida-des produtivas mantêm as pessoas na pobreza e namiséria. Agravam essa situação a deformação do sis-tema de poder político, o funcionamento ineficientedas instituições com relação aos pobres, inclusivea corrupção e arbitrariedade do Estado.

O estudo do Banco Mundial também assinala

que a situação da pobreza é muito influenciada pelasnormas sociais, práticas nas comunidades e no mer-cado levando à exclusão as mulheres, minoriasétnicas e sociais. Nos países pobres, por exemplo,20% das crianças não completam os cinco anosde vida e 50% são desnutridas.

A riqueza global no mundo, entretanto, cres-ceu mais no último século do que no resto da histó-ria da humanidade. Em contrapartida, a distribuiçãoda renda é extremamente desigual. A diferença derenda média nos 20 países mais ricos do mundo emrelação aos 20 mais pobres duplicou nos últimos 40

131TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

anos. A experiência dessas desigualdades difere emcada região, mas o fosso entre ricos e pobres temse agravado constantemente.

O Brasil é recordista em padrões de desigual-dade, como pode ser observado na Tabela III. Nestepaís, os 10% mais ricos sobre os 10% mais pobresera de 57,8% em 2006, contra 34,5% na Argentina,8,1% na Dinamarca e 4,5% no Japão.

Tabela III – Lista de Países Selecionados por Distribui-ção de Renda – 2006

Países 10% mais ricos 20% mais ricos índice de Gini*sobre os 10% sobre os 20%mais pobres mais pobres

Argentina 34,5 17,6 52,8

Austrália 12,5 17,6 35,2

Brasil 57,8 23,7 58,0

China 18,4 10,7 44,7

Dinamarca 8,1 4,3 24,7

Espanha 10,3 6,0 34,7

Estados Unidos 15,9 8,4 40,8

França 9,1 4,9 32,5

Itália 11,6 3,4 24,9

*Nota: Quanto maior a porcentagem, maior a desigualdade.

132 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Uma pergunta que os economistas estão fazen-do nos últimos anos é se a igualdade é ou não preju-dicial para o desenvolvimento de um país? É possí-vel justificar essa preocupação diante do colapso daeconomia da antiga União Soviética, onde as políti-cas de distribuição de renda eram bem mais rigoro-sas do que nos países capitalistas? Daí as diferentesopiniões sobre a distribuição ótima da renda. Algunsconsideram nos anos recentes que o Índice de Gini(distribuição) deveria ser próximo de 25% (como naSuécia), outros 40% como nos Estados Unidos.

Um grupo de estudos do Banco Mundial consi-dera que uma distribuição muito próxima da igualda-de absoluta pode tornar-se prejudicial para a eficiên-cia econômica. Imagina-se que quando isso ocorrepode haver uma eliminação dos incentivos que as pes-soas necessitam para participar mais ativamente domercado de trabalho e empreendedorismo.

Apesar de tudo isso, o que se tem como provas in-contestáveis são os malefícios de uma excessiva con-centração de renda. Uma grande desigualdade podemotivar uma instabilidade política, pois aumenta aincidência da pobreza, e melhorias na oferta de ser-viços de educação, saúde e segurança pública.

O Relatório de 2006 do Programa das NaçõesUnidas para o Desenvolvimento (PNUD) aponta o

133TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Brasil dentre os mais desiguais do mundo. Numa listade 126 países, o Brasil ocupa o 10o lugar à frente ape-nas da Colômbia, Bolívia, Haiti e cinco países da Áfri-ca subsaariana, a região mais pobre do planeta. Odesempenho brasileiro é avaliado no referido Re-latório com base no Coeficiente de Gini, indicadorde desigualdades de renda que varia de 0 a 1, sendo 0uma situação na qual toda a população possuísseuma renda equivalente e 1 se apenas uma pessoadetivesse toda a riqueza do país.

Quanto ao Índice de Desenvolvimento Huma-no (IDH), outro indicador para aferir o problemada desigualdade, o Brasil avançou nos últimosanos, mas continua o mais desigual entre todosos países com IDH superior ao seu. Os 10% maispobres no Brasil detêm apenas 0,8% da renda, fa-tia superior apenas à dos pobres da Colômbia, ElSalvador, Botsuana, Paraguai, Namíbia, Serra Leoae Lesoto.

O Relatório do PNUD, Programa de Desen-

assinala que reduzir a desigualdade aumentará a efi-ciência do país em transformar crescimento em re-dução da pobreza.

volvimento das Nações Unidas, em face desses dados,

134 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

A Pobreza Crônica

Gráfico III – Condições Históricas e Estruturais

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

PPPPPobrobrobrobrobreza Mundialeza Mundialeza Mundialeza Mundialeza Mundial

A pobreza está presente em todas as sociedadesmodernas, mesmo nas mais ricas. Para compreendermelhor essa situação é preciso levar em conta que oscritérios para medir a pobreza em um país subdesen-volvido e em um país industrializado são diferentes.

Para os países subdesenvolvidos, as NaçõesUnidas e o Banco Mundial estipularam o critério dovalor de US$ 2 dólares por dia como linha da pobreza.Para as pessoas em condições de extrema pobreza (in-digência) a linha é de US$ 1 dólar por dia. Por essecritério, a pobreza nos países industrializados é mínima.

Cerca de três bilhões de pessoas no mundo vi-vem na pobreza com uma renda de US$ 2 dólarespor dia, sendo que 50% destes estão na categoria deindigência. Além de renda baixa, o pobre tem outrascaracterísticas, isto é, 2/5 são crianças de menos de10 anos e formam parte de uma família numerosa; e¾ vivem em zonas rurais. Muitas famílias pobres pos-suem ou são arrendatários de um pequeno terrenoonde eles trabalham em regime de subsistência.

A grande maioria dos pobres é analfabeta epadece de doenças tropicais. A taxa de mortalida-de é elevada. O bem-estar do pobre pode sofrer gran-des flutuações. Um ano de bom inverno e fartura

135TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

oferece alimentos para a família mas um ou doisanos de chuvas irregulares podem causar muitosdanos e sofrimentos. É larga a descrição das suascondições da pobreza, especialmente para as pesso-as que nunca a viram in loco.

Para ilustrar o que estou pretendendo dizer, valea pena contar uma pequena história. Em certa oca-sião, a Sociedade Brasileira de Economia Rural eSociologia estava realizando uma Conferência Lati-no-Americana, na Escola Superior de Agricultura Luisde Queiroz (USP), sobre desenvolvimento rural.Como palestrante, eu estava falando em uma das reu-niões plenárias e analisava as disparidades de de-senvolvimento da agricultura do Nordeste do Brasile Sudeste. Encontrava-se participando desse eventoum dos diretores da International Society ofAgricultural Economists (Sociedade Internacional deEconomistas Agrícolas), professor sueco Ulf Renborg.

Em dado momento da minha exposição, quan-do destacava as características humilhantes em quevivem os agricultores de subsistência do Nordeste, atradutora do professor Renborg começou a chorar,descontroladamente! Saiu da mesa e gerou-se, mo-mentaneamente, um grande mal-estar. Tive de ame-nizar a minha digressão sobre a pobreza rural doNordeste que, para mim, era uma situação quase na-

136 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

tural, mesmo que sejam intoleráveis os padrões mí-nimos de respeito humano.

No ano seguinte, fui convidado pela Associa-ção Internacional de Economistas Agrícolas paraapresentar um trabalho na XIX InternationalConference of Agricultural Economists, na cidade deMálaga (Espanha). O tema que abordei juntamentecom o professor japonês Yugiro Hayami e o profes-sor Mancur Olsom, da Universidade de Maryland

(USA), foi Forças que moldarão o desenvolvimentorural do futuro . Em certo trecho de minha apresen-tação nessa conferência, afirmei:

O grande desafio político e social do pre-sente, no Nordeste do Brasil, é introduziras melhorias necessárias para contraba-lançar os desequilíbrios de seu atual sis-tema produtivo e obter um nível dedignidade e decência mínima supor-tável. De fato, certos preconceitos sobrea pobreza criaram fossos de hostilidade àobservância dos direitos de sobrevivên-cia condigna do homem.

Finalmente, com base nos dados do “World

Development Report de 2007” (Banco Mundial),

137TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

estimo que neste ano vivam nessa condição cercade 1,2 bilhão de pessoas. Em comparação com apopulação total da Terra, esse montante corres-pondia a 28,8%. De acordo com os quantitativos decada região, essa proporção eleva-se de 1,9% naEuropa e Ásia Central a mais ou menos 39% na Áfri-ca subsaariana e sul da Ásia.

Nessas regiões, encontram-se países como Ín-dia, Bangladesh e Indonésia. É relevante assinalar que46% de toda a pobreza extrema do mundo estãoconcentradas no sul da Ásia. Outros 23% habitam aÁfrica subsaariana, seguida da América Latina eCaribe com 6%. Mesmo assim, esta Região contacom 81 milhões de miseráveis e teve um aumentode 28% nos últimos 20 anos.

Fato notório a destacar quanto às tendênciasda evolução da pobreza mundial foi a redução de36%, entre 1987-2007, no leste da Ásia e Pacíficoonde se encontra localizada a China. No montanteglobal, nesse período, ocorreu um ligeiro acréscimode 6%. É bom advertir, porém, que os dados dessacategoria de extrema pobreza precisam ser contextua-lizados no montante geral da pobreza que correspon-de, pelos critérios do Banco Mundial, à faixa de US$1 e US$ 2 dólares por dia. Ou seja, muitas vezesocorre uma redução dos que estão no extremo da

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O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

pobreza, mas podem ter-se transferido para o grupode pobres. Desse modo, melhoraram quanto ao graude pobreza, mas continuam abaixo da linha de po-breza absoluta.

TABELA IV – Pobreza Extrema por Região 1987-2007

1. Pessoas que vivem com menos de 1 dólar por dia (milhões)Região 1987 1996-1997 2007*Leste da Ásia e Pacífico 417,5 26,51 270,0Europa e Ásia Central 1,1 23,8 25,0América Latina e Caribe 63,7 76,0 88,2Oriente Médio e Norte de África 9,3 5,0 5,7Sul da Ásia 474,4 531,7 577,0África Subsaariana 217,2 287,0 292,0Total 1.183,2 1.190,5 1.150,0Excluindo China 878,8 980,5 998,0

2. Parcela (%) da população que vive com menos de 1 dólar por diaRegião 1987 1996-1997 2007*Leste da Ásia Central 27,6 14,9 14,3Europa e Ásia Central 1,6 5,1 1,9América Latina 16,8 15,6 14,7Oriente Médio e Norte da África 2,4 1,8 4,7Sul da Ásia 44,0 42,3 39,2África Subsaariana 47,7 48,5 39,4Total 29,0 24,5 18,9Excluindo China 28,1 27,0 28,8

*Fonte dos dados originais: World Development Report, 2000/2001; World Bank,2007.Nota: A linha de pobreza internacional é US$ 1,08 por dia com o PPA de 1993(pobreza extrema), baseada em pesquisas que abrangem 88% da populaçãomundial.*Dados estimados pelo autor com base na tendência histórica.

139TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Classificação dos paísesPaíses nos grupos de desenvolvimento humano

Desenvolvimento Desenvolvimento Desenvolvimentohumano elevado humano médio humano baixo(IDH 0,800 e acima) (IDH 0,500 a 0,799) (IDH abaixo de 0,500)Alemanha África do Sul AngolaAntígua e Barbuda Albânia BangladeshArgentina Arábia Saudita BeninAustrália Argélia Bukina FasoÁustria Armênia BurundiBahamas Azerbaijão ButãoBahrein Belarus Congo, RepúblicaBarbados Belize DemocráticaBélgica Bolívia Costa do MarfimBrunel Botswana DjiboutiCanadá Brasil EriteiaChile Bulgária EtiópiaChipre Cabo Verde GambiaCoréia do Sul Camarões GuinéDinamarca Cambodja Guiné-BissauEmirados Árabes Unidos Cazaquistão HaitiEslováquia China IêmenEslovênia Colômbia LaosEspanha Camoros MadagascarEstados Unidos Congo MalawiEstônia Costa Rica MaliFinlândia Croácia MauritâniaFrança Cuba MoçambiqueGrécia Dominica NepalHolanda Egito NígerHong Kong, China (RAE) El Salvador NigériaHungria Equador República Centro-AfricanaIrlanda Federação Russa RuandaIslândia Fiji SenegalIsrael Filipinas Serra LeoaItália Gabão SudãoJapão Gana TanzâniaKuweit Geórgia TogoLuxemburgo Granada UgandaMalta Guatemala ZâmbiaNoruega GuianaNova Zelândia Guiné EquatorialPolônia HondurasPortugal Ilhas SalomãoQatar ÍndiaReino Unido IndonésiaRepública Checa IrãSingapura IraqueSuécia Jamaica

QUADRO I

140 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Desenvolvimento Desenvolvimento Desenvolvimentohumano elevado humano médio humano baixo(IDH 0,800 e acima) (IDH 0,500 a 0,799) (IDH abaixo de 0,500)Suíça JordâniaUruguai Lesoto

LetôniaLíbanoLituâniaMacedôniaMalásiaMaldivasMarrocosMaurícioMéxicoMoldáviaMongóliaMyanmarNamíbiaNicaráguaOmanPanamáPapua Nova GuinéPaquistãoParaguaiPeruQuêniaQuirguistãoRepública DominicanaRomêniaSamoa (Ocidental)Santa LúciaSão Cristóvão e NevisSão Vicente e GrenadinasSeychellesSíriaSuazilândiaSurinameTailândiaTajiquistãoTrindadee TobagoTunísiaTurquemenistãoTurquiaUcrâniaUzbequistãoVanuatuVenezuelaVietnameZimbabwe

141TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Países nos grupos de desenvolvimento humano

Rendimento elevado Rendimento médio Rendimento baixo(PNB per capita de (PNB per capita de (PNB per capita de9.361 dólares ou mais 761-9.360 dólares 760 dólares ou menosem 1998) em 1998) em 1998)Alemanha África do Sul AngolaAustrália Albânia ArmêniaÁustria Antíqua e Barbuda AzerbaijãoBahamas Arábia Saudita BangladeshBélgica Argélia BeninBrunei Argentina Burkina FasoCanadá Bahrein BurundiChipre Barbados ButãoDinamarca Belarus SenegalEmirados Árabes Unidos Belize CambodjaEslovênia Bolívia SudãoEspanha Botswana ChinaEstados Unidos Brasil ComorosFinlândia Bulgária CongoFrança Cabo Verde Congo Rep. Dem.Grécia Cazaquistão Papua Nova GuinéHolanda Chile EritreiaHong Kong. China Colômbia EtiópiaIrlanda Coréia do Sul GâmbiaIslândia Costa Rica GanaIsrael Croácia GuinéItália Cuba Guiné-BissauJapão Djibouti HaitiKuweit Dominica HondurasLuxemburgo Egito IêmenMalta El Salvador ÍndiaNoruega Equador IndonésiaNova Zelândia Eslováquia LaosPortugal Estônia LesotoQatar Federação Russa MadagascarReino Unido Fiji MalawiSingapura Filipinas MaliSuécia Gabão MauritâniaSuíça Geórgia Moçambique

Granada MoldáviaGuatemala MongóliaGuiana MyanmarGuiné Equatorial NepalHungria NicaráguaIrã VenezuelaIraque Níger

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O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Rendimento elevado Rendimento médio Rendimento baixo(PNB per capita de (PNB per capita de (PNB per capita de9.361 dólares ou mais 761-9.360 dólares 760 dólares ou menosem 1998) em 1998) em 1998)

Jamaica NigériaJordânia PaquistãoLetônia QuêniaLíbano QuirguistãoLíbia Rep. Centro-AfricanaLituânia RuandaMacedônia SalomãoMalásia São Tomé e PrícipeMaldivas SenegalMarrocos Serra LeoaMaurício SudãoMéxico TajiquistãoNamíbia TanzâniaOman TogoPanamá TurquemenistãoPapua Nova Guiné UgandaParaguai VietnamePeru ZâmbiaPolônia ZimbabweRep. DominicanaRepública ChecaRomêniaSão Cristóvão e NevisSão Vicente e GrenadinasSamoa (Ocidental)Santa LúciaSeychellesSíriaSri LankaSuazilândiaSurinameTailândiaTrindade e TobagoTunísiaTurquiaUcrâniaUruguaiUzbequistãoVanuatuVenezuela

143TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Situação da América Latina e CaribeSituação da América Latina e CaribeSituação da América Latina e CaribeSituação da América Latina e CaribeSituação da América Latina e Caribe

O maior desafio da América Latina e do Caribe noinício do século XXI é a redução da pobreza e dasdesigualdades socioeconômicas. Alguns países dessaregião estão classificados na condição de países comrenda média, mas as taxas de pobreza são excessiva-mente graves. Uma das razões apontadas pelos eco-nomistas para esse “excesso de pobreza” são os ele-vados índices de desigualdades social e territorial.

No caso do Brasil, por exemplo, o Nordeste ape-sar de reunir apenas 28% da população brasileira (50milhões), concentra, ao mesmo tempo, 49% dos po-bres e 55% dos indigentes de toda a nação. Odesequilíbrio regional brasileiro é um problema anti-go, mas não tem obtido melhorias ao longo dos anos.

O mais preocupante em nível continental é queesses indicadores estão estagnados ou pioraram emmuitos desses países. Tradicionalmente, os gover-nos da América Latina e do Caribe têm aplicado pro-gramas de transferência de renda de naturezaassistencialista que apenas aliviam temporariamen-te a pobreza das pessoas assistidas. Esses programasnão atuam geralmente sobre as causas da pobreza epor isso são motivo de críticas por parte de intelec-tuais e representações políticas.

144 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

A América Latina e o Caribe contam com uma su-perfície de 20 milhões de km2 e uma população de551 milhões de habitantes em 2005. O Brasil, México,Colômbia e Argentina concentraram 68% dessa popula-ção e 78% do Produto Interno Bruto, que é de US$ 2,2trilhões no referido ano. Incluindo-se a Venezuela e oChile essa proporção subia para 88%. Mas no que dizrespeito ao Produto Interno Bruto per capita, a Argenti-na ocupava posição de muito destaque, também to-mando-se por base o ano de 2005. São US$ 8.130 per ca-

, seguidos pelo México, Chile e Venezuela.Entrementes, o Brasil ocupava a quinta coloca-

ção nesse particular, com US$ 3,573, segundo osdados do Anuário Estatístico da CEPAL, utilizadospara essa análise. Dentre dez países analisados emordem decrescente, a Bolívia está em pior posiçãocom apenas US$ 1,033 per capita, ou 12% da cifracorrespondente ao primeiro colocado. A média daAmérica Latina e do Caribe é de US$ 4.055.

O que acabo de descrever serve para con-textualizar o quadro da pobreza dessa região. Uti-lizando ainda dados de pesquisa da CEPAL, referen-te a 18 países e 93% do total da população da re-gião, estima-se uma média de 40% de pessoas abaixoda linha da pobreza, tomando por base o critério doBanco Mundial de US$ 2 per capita por dia. Emnúmeros absolutos, isto significa 220 milhões de

145TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

pita

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

pessoas. O grave e assustador é que esse númeroera de 181 milhões de latino-americanos em 1996.Portanto, um aumento de 21% no período.

Há uma grande variação de situações entre paísescomo ocorre nos casos da Nicarágua, El Salvador e Bo-lívia onde essa proporção se eleva ao patamar de 70%,caindo na situação da Argentina para 20%, juntamentecom Chile e Venezuela. O Brasil e o México estão emcondições similares, com cerca de 36% abaixo da linhada pobreza. Vale destacar, porém, que a pobreza noquadro rural do Brasil era de 53%. Contribuiu para essevergonhoso resultado a posição do Nordeste do Brasilonde nada menos de 70% da população rural se enqua-dram nessa situação. Cerca de 33% da população urba-na brasileira é de pobres, contra 28% no México.

É bem provável que parte da explicação paratão desastrosa situação em que se encontra a popu-lação rural latino-americana esteja na frágil contri-buição do setor agrícola para a função da renda regi-onal. São apenas 6% em média nos últimos dez anos.Com uma elevada proporção da população ocupa-da nesse setor, é consequentemente baixa a produti-vidade da mão-de-obra empregada. Bem diferenteocorre com o setor de serviços gerador de uma médiade 65% do Produto Interno Bruto, principalmentenas zonas metropolitanas e nas cidades.

146 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

TABELA V – América Latina –Estimativas da Popu-lação Ocupada – 2005

(percentagem)País Agricultura Indústria ServiçosArgentina 11,1 23,5 3,4Brasil 19,5 21,6 58,8Chile 13,2 23,9 62,9Colômbia 20,9 19,8 50,3Equador 30,3 17,6 52,1México 13,9 35,7 60,4Uruguai 4,6 22,0 73,4Venezuela 9,7 20,8 69,5

Fonte: CEPAL

TABELA VI – América Latina e Caribe

1. População e PIB – 2005

Países População (1.000) PIB Total US$ bilhão

1. Argentina 38.592 313,82. México 106.147 636,23. Chile 16.267 93,24. Venezuela 26.577 131,25. Brasil 187.597 670,46. Cuba 11.369 30,07. Peru 28.349 65,48. Colômbia 46,039 99,39. Equador 13.215 20,410. Bolívia 9.427 9,711.América Latina 551.056 2.215,5

Fonte: CEPAL

147TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Gráfico IV – Renda per capita*

O que descrevo até aqui é simplesmente osubdesenvolvimento que ainda prevalece na Améri-ca Latina, apesar de todos os avanços e transforma-ções econômicos que ocorreram na região nos últi-mos cinquenta anos. A dolorosa impressão que noscausa a existência de tão chocante quadro é queos governos e a sociedade não se têm empenhadoadequadamente para resolvê-la. Na América Latina,ironiza o renomado economista Albert Hirschman,

Fonte dos dados originais: CEPAL. *Tabela VI.

Países

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

8.1305.993

5.7244.939

3.5732.700

2.3412.156

1.5501.033

2.500 5.000 7.500 10.000

148 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

O desenvolvimento econômico se proces-sa apesar e não em virtude da ação gover-namental, como bem expressa no ditobrasileiro – o nosso país se desenvolve denoite, quando os políticos estão dormindo.

Na realidade, as políticas de combate à pobre-za têm sido influenciadas pela literatura sobre o as-sunto. O foco dessas estratégias é quanto à necessi-dade de mais recursos para os pobres. Embora essetipo de programa de transferência de renda seja jus-tificado em situações de crise e calamidades, ele temum enfoque reducionista. Ele não considera a com-plexidade do problema e sua abrangência.

A pobreza na América Latina e em outros luga-res é um problema estrutural e causado pela maneiracomo funciona o sistema econômico. Todos os mo-dos de pensar que consideram a pobreza como umfenômeno separado do desenvolvimento estão equi-vocados. As sociedades dos países subdesenvolvidossofrem de uma inércia econômica que se origina daspróprias instituições e atitudes sociais, explica RobertL. Heilbrone, da “New School for Social Research”.

Assim, a pobreza somente pode ser atacada atra-vés de políticas que modifiquem o ambiente e todosos excluídos possam participar de novas oportuni-dades. A primeira providência efetiva de tal política

149TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

é atacar o foco de retrogradação do mecanismo quegera as desigualdades e a pobreza. É preciso cons-truir uma estrutura analítica que identifique o meca-nismo que faz funcionar o novo sistema.

Podemos ter uma compreensão mais clara des-sa digressão, afirmando que a causa principal geradorada excessiva pobreza é o alto nível de desigualdade.

Em resumo, vale destacar a análise do secretárioexecutivo da CEPAL, José Luís Machinea, na apresen-tação do relatório do ano de 2004, da Comissão Eco-nômica das Nações Unidas da região. Diz ele: “A Amé-rica Latina cresce, mas não reduz pobreza.” Explica eacrescenta o argentino que as taxas de pobreza nãorecuam mais rapidamente porque existe um fosso en-tre ricos e pobres que limita os benefícios da expansãodo segundo grupo. O referido relatório destacou que aAmérica Latina e o Caribe seguem como a região demaior desigualdade social do mundo. “A má distribui-ção da riqueza na região não tem melhorado. Ao con-trário, tende a piorar”, disse o professor Machinea.

Por outro lado, Argentina, Paraguai e Venezueladevem ficar neste ano (2004) com um nível de indi-gência superior ao registrado em 1990. Cerca de 48milhões de pessoas na América Latina e no Caribe vi-vem em pobreza extrema (menos de 1 US$ por dia),sem condições de comprar sequer alimentos suficien-

150 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

tes só com sua renda. Defende o argumento de que os

problemas de transferência de renda, mesmo assisten-

cialistas, se justifica como ação humanitária. Essa par-

cela de miseráveis, conforme informa a CEPAL, cres-

ceu 9 milhões de pessoas desde 1997.

Apesar disso, é oportuno registrar que alguns

países, inclusive o Brasil, mostraram significativos

progressos na industrialização, infraestrutura, edu-

cação e saneamento.

TABELA VII – América Latina: Superfície de AlgunsPaíses (1.000ha)

País Área Total Agriculturável Irrigada

Argentina 278.040 27.900 1.550

Bolívia 109.858 3.050 1.132

Brasil 851.488 59.000 2.920

Cuba 11.086 3.063 870

México 195.820 24.800 6.320

Peru 128.522 3,700 1.200

Chile 75.663 1.982 1.900

Venezuela 91.205 2.600 575

América Latina e Caribe 2.043.191 143.074 18.561

Fonte: CEPAL

151TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

TABELA VIII – América Latina - Produto InternoBruto por Atividades

1. Números Absolutos – US$ Bilhões

Anos Agricultura Indústria Serviços Total

1995 107,0 471,9 1.211,3 1.683,2

2000 119,8 545,6 1.142,6 1.972,0

2005* 140,0 612,6 1.602,9 2.215,5

2. Números Percentuais (%)

Anos Agricultura Indústria Serviços Total

1995 6,4 28,0 65,6 100

2000 6,1 27,7 66,5 100

2005 6,3 26,6 67,4 100

Fonte: CEPAL, Anuário Estadístico de América Latina y Caribe, 2006

Nota * Estimativa

TABELA IX – BRASIL: Produto Interno Bruto

Anos PIB médio em US$ bilhões Variação Anual% PIB per capita (US$)1960-70 29,3 7,2 363

1970-80 146,3 9,7 1.345

1980-90 308,3 2,6 2,536

1990-2000 6445 2,1 4,243

2001 509,7 1,3 3,186

2002 459,4 2,7 2.359

2003 506,8 1,2 3,093

2004 603,9 5,7 3,655

2005 796,3 2,9 4,793

2006 825,0 3,7 5,715

Fonte dos dados originais: Conjuntura Econômica FGV, dezembro 2007, n. 61.

152 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

PPPPPolíticas e Prolíticas e Prolíticas e Prolíticas e Prolíticas e Prooooogggggramas para Redução da Pramas para Redução da Pramas para Redução da Pramas para Redução da Pramas para Redução da Pobrobrobrobrobrezaezaezaezaeza

As políticas e programas para a redução da po-breza executados nas últimas décadas estiveram ori-entadas por instrumentos diretos e indiretos. Desta-cam-se nesse intuito, gastos no setor social público,o fomento de emprego, concessão de subvençõespúblicas, programas de geração e transferência derenda para alívio da miséria. Em alguns países foidada alguma atenção às diferenças sociais entrehomens e mulheres.

Essas diretrizes nem sempre foram transformadasem ações concretas ou executadas, e tiveram resultadosabaixo das expectativas na maioria dos países. Emconsequência disso, há uma crescente preocupaçãoem melhorar as políticas públicas quanto à introdu-ção de critérios de maior eficácia em função das me-tas dos programas de redução da pobreza. A elimina-ção ou redução do enfoque paternalista das políticasé uma das maiores aspirações dos governantes dessasnações. O objetivo agora é adotar programas orienta-dos para a produção e a criação de empregos e apli-cação de práticas democráticas de participação no pla-nejamento e execução desses programas.

Uma das grandes dificuldades que distorcemas políticas e programas de combate à pobreza é a

153TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

diversidade de percepções da sociedade sobre amatriz dessa problemática.

Convém ressaltar uma vez mais a importânciade fazer chegar os benefícios do crescimento eco-nômico aos países mais pobres e às grandes massasde suas populações. O formato de um crescimentorápido, equitativo e com base ampla segue sendouma meta difícil. Sem dúvida, sua consecuçãorequer um compromisso genuíno de aliviar a pobre-za e atender às necessidades sociais. Ao mesmo tem-po, o crescimento com equidade só pode ser conse-guido, na maioria dos países, por meio de umaestratégia de desenvolvimento sólido, com uma ori-entação constante em investimentos nas infraestru-turas rural, capital humano e serviços sociais.

A parte mais difícil do desenvolvimento do Bra-sil tem sido a concentração da renda. O Nordeste doBrasil tem sofrido muito com esse problema, acumu-lando hoje a maior parcela dos pobres, analfabetos eportadores de índices de saúde deploráveis do País.

Se a pobreza é em grande parte consequênciada desigualdade, como visto antes, “Por que há tan-ta desigualdade?”

Parte desse motivo é porque as pessoas são dife-rentes em várias dimensões: escolaridade, idade, sexo,localização regional, natureza da ocupação e setores

154 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

de atividade na estrutura produtiva. Na América Lati-na, as desigualdades e a pobreza estão profundamenteassociados com o sistema econômico. Donde se con-clui que dificilmente esses problemas serão solucio-nados se não houver novos direcionamentos oureestruturação do sistema econômico.

Ao longo dos últimos cinquenta anos, os bene-fícios das políticas públicas de combate à pobrezaforam desapontadores. A menos que a América Lati-na enfrente as questões de pobreza e fome com pri-oridade, podemos esperar o agravamento das crisessociais e a deterioração das condições da populaçãomarginalizada.

O governo pode fazer um trabalho melhor nocombate à pobreza global, dedicando maior aten-ção ao auxílio para o aumento da produtividade des-sas pessoas. A comunidade política necessita fazertambém a sua parte, eliminando a corrupção que édevastadora para o crescimento e a redução dos re-cursos que poderiam se destinar a fins produtivos eà criação de empregos.

É importante estimular e apoiar as contribui-ções das forças sociais, políticas e culturais de gru-pos determinados da própria população pobre. Al-gumas maneiras podem influenciar as políticasgovernamentais com essa finalidade, como fizeram

155TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

os países emergentes do Sudeste asiático. Isto é,criar um acervo de bens produtivos e atividades so-ciais; mover o capital humano de um setor paraoutro, criar novas técnicas de produção e adotarmedidas para reduzir os custos governamentais eos desperdícios.

O gráfico a seguir indica, esquematicamente, umprocesso que tem sido chamado de círculo virtuosoda riqueza, numa ilação ao processo de estagnaçãorepresentado pelo círculo vicioso da pobreza.

GRÁFICO V – Ações Redistributivas

Círculo Virtuoso da Riqueza

156 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Necessidade de um Entendimento GlobalNecessidade de um Entendimento GlobalNecessidade de um Entendimento GlobalNecessidade de um Entendimento GlobalNecessidade de um Entendimento Global

A busca de mais justiça social e de uma socieda-de mais equitativa, tornou-se, nos últimos anos,unanimidade nacional como internacional.

Ao nível nacional, a busca está voltada direta-mente aos enormes problemas dos que vivem napobreza absoluta. Os governos estão concentrandoatenção nas estratégias que possam combinar um

crescimento econômico substancial com mais e-quidade e distribuição de renda.

Em nível internacional a preocupação se direcio-na para as questões das imensas disparidades de ren-da entre os países desenvolvidos e subdesenvolvi-dos e sobre toda a situação desesperadora dos paísesmais pobres. Constam das agendas desses países pro-gramas de ajuda financeira, flexibilização do comér-cio e proteção ambiental.

O diálogo a respeito desses assuntos precisaencontrar uma linguagem comum, quanto às estra-tégias a adotar e as políticas de desenvolvimento decada país. As organizações internacionais que ori-entam e aprovam os programas com esse objetivoprecisam de um crescente entendimento. Os extre-mos de pobreza e desigualdade estão provocando

157TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

distúrbios políticos em vários países e situações de

violência.

As políticas até agora adotadas têm enfati-zado que o problema da pobreza é suprir ospobres com recursos. Embora esse tipo de políticatenha menos resposta é adequada e necessária emcertas situações de crise econômica. A pobreza naAmérica Latina, todavia, é um problema estruturalcausado pela operação de todo o sistema econômi-co. Este somente pode efetivamente ser soluciona-do com políticas que modifiquem a operação de todoo sistema.

O papel da educação tem sido cada vez maisconsiderado como o combustível do motor do desen-volvimento. A influência da educação no crescimen-to econômico não se deve apenas ao fato que a mão-de-obra competente faz aumentar a produção demaneira passiva, como o fertilizante e o trator na agri-cultura. Deve-se também porque o ser humano é afonte de ideias e medidas com respeito a investimen-tos e outras oportunidades. As atitudes técnicas, cien-tíficas e profissionais para produzir bens e serviçosmodernos ou a capacidade empresarial no setor pú-blico e privado dependem das pessoas. Em todos ospaíses, as pessoas com mais elevado nível educacional

158 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

tendem a perceber melhores salários. Os países sub-desenvolvidos com taxas de alfabetização maiores têmapresentado também taxas mais rápidas de crescimento.

O crescimento econômico depende de outrosfatores como recursos naturais, ativos fixos e eficiên-cia no uso dos recursos.

O Pacto de DesenvO Pacto de DesenvO Pacto de DesenvO Pacto de DesenvO Pacto de Desenvolvimento do Milênio até 2015olvimento do Milênio até 2015olvimento do Milênio até 2015olvimento do Milênio até 2015olvimento do Milênio até 2015

A declaração do milênio das Nações Unidas,acordada em setembro do ano 2000, comprometeas nações signatárias a realizarem um esforço globalpara reduzir a pobreza, melhorar a saúde e promo-ver a paz, os direitos humanos e a sustentabilidadeambiental. Os objetivos do desenvolvimento domilênio, que emergiram dessa declaração, são mui-to específicos e mensuráveis, incluindo a da reduçãoda pobreza extrema até 2015.

Na conferência das Nações Unidas sobre o fi-nanciamento para o desenvolvimento, em marçode 2002 (Monterey), os líderes mundiais de paísesricos firmaram um pacto entre eles de apoiar os ob-jetivos de desenvolvimento do milênio. Esse pactoapela para todos os envolvidos a fim de orientarem osseus esforços no sentido de assegurar êxito dos obje-tivos numa situação de responsabilidade partilhada.

159TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Com objetivos didáticos é indispensável comen-tar alguns antecedentes dessa decisão histórica na re-construção das políticas de desenvolvimento mundial.

Na década de 1980 e parte dos anos de 1990,as instituições financeiras internacionais trabalhavamorientadas por algumas convicções políticas e estra-tégicas. Havia então uma grande confiança no senti-do de que as forças de mercado colocariam todos ospaíses pobres num caminho de crescimento econô-mico autosustentado.

A globalização era vista como um novo motordo progresso econômico mundial. Acreditava-se queos países pobres atingiriam o crescimento econômicocom base numa boa governança econômica ealgumas diretrizes estratégicas. Isto é, adoção dospreceitos de estabilidade macroeconômicas, libera-lização dos mercados e privatização da atividadeeconômica. Com o crescimento econômico conse-guido por essas políticas, ocorreriam melhorias ge-neralizadas na saúde, na educação, na nutrição, nahabitação e no acesso às infraestruturas básicas –água e saneamento – levando os países a superarema “armadilha da pobreza”.

Essa concepção revelou-se extremamente fala-ciosa e inadequada para centenas de milhões de pes-soas pobres, mesmo que alguns países emergentes

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O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

como China, Coréia e Índia tenham obtido êxito emsuas taxas de crescimento. A globalização benefi-ciou algumas regiões do mundo, mas deixou paratrás muitos países e grupos humanos.

A revisão do pensamento das Nações Unidassobre a pobreza revelou forte influência dos estímu-los sobre desenvolvimento humano realizados peloPNUD, que é um dos órgãos das Nações Unidas.Na verdade, o PNUD tem encarregado a elaboraçãode relatórios anuais sobre desenvolvimento humanoa um grupo de especialistas, com o objetivo de anali-sar as questões fundamentais de interesse geral dodesenvolvimento econômico mundial. Uma rede deconsultores de alto nível acadêmico, governamentale da sociedade civil colaboram com o fornecimen-to de ideias, sugestões e dados.

Uma das inovações desses estudos foi a adoçãode um conceito de desenvolvimento humano que nãose restringe ao aspecto apenas da renda per capita. Apreocupação desses estudos tem sido avaliar as diver-sidades da população com parâmetros para avaliaçãodo programa. O conceito vai além, incluindo tam-bém os fatores como a liberdade, a dignidade e a in-tervenção humana no processo produtivo e social.

O desenvolvimento, em última análise, segun-do essas concepções, “é um processo de alargamen-

161TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

to das opções das pessoas”, não somente uma ques-tão de aumentar o rendimento nacional. Uma dasconclusões marcantes sobre o assunto é que o cres-cimento econômico contribui mais para erradicar apobreza quando expande o emprego, a produtivida-de e os salários dos pobres. E quanto aos recursospúblicos são canalizados para a expansão do desen-volvimento humano.

Uma estratégia “em favor dos pobres” não é uniforme,mas depende das condições específicas de cada país.Os governos são os responsáveis em oferecer umamelhor distribuição da terra, crédito, habitação e servi-ços sociais para reduzir as desigualdades estruturais.Para a obtenção dos objetivos e metas do Pacto doDesenvolvimento, muitos países em desenvolvimentocarecem de ações firmes em setores estratégicos.

O aumento da produtividade da agricultura depequena dimensão é uma condição essencial para aredução da pobreza. A maior parte dos pobres dospaíses subdesenvolvidos dependem da agriculturapara sua subsistência. Os países do leste asiáticoenfrentaram a pobreza inicialmente desenvolvendoo setor agrícola e, em seguida, através da industriali-zação intensiva em mão-de-obra.

O desenvolvimento econômico deve visar à criaçãode empregos e salários crescentes. Para isso, é preci-

162 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

so atribuir prioridade como a produção de calçadose confecções. As microempresas e o setor informalprestaram decidido apoio. Os ingredientes para obom êxito da microempresa são os mecanismos depoupança, acesso ao crédito e melhoria das infra-estruturas que facilitem esses empreendimentos. Apromoção das capacidades humanas constitui a molado processo de desenvolvimento e redução da po-breza, atuando como um verdadeiro círculo virtuosodo desenvolvimento sustentável.

No essencial, o Pacto proporciona um processode desenvolvimento orientado para os objetivos do mi-lênio e suas principais obrigações. Os autores einstituições comprometidas com esse objetivo reafirmamque, para escapar das armadilhas da pobreza, é necessá-rio que os países atinjam certos limites críticos quantoà educação, saúde, infraestrutura e governança. As-sim, será possível atingir uma decolagem para o cresci-mento econômico sustentável e o desenvolvimento.

ObjetivObjetivObjetivObjetivObjetivos de Desenvos de Desenvos de Desenvos de Desenvos de Desenvolvimento do Milênioolvimento do Milênioolvimento do Milênioolvimento do Milênioolvimento do Milênio

Os objetivos de desenvolvimento do milênioforam adotados em 2000 pelos governos de 189países – inclusive o Brasil – como um compromissopara combater a desigualdade e melhorar o desen-

163TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

volvimento humano no mundo. Ele prevê oito gran-des objetivos a serem cumpridos, em sua maioria,até 2015.

Para alcançar as metas do milênio, os países daAmérica Latina e do Caribe devem realizar um gran-de esforço a fim de assegurar eficiência no uso dosrecursos do Estado para cumprir as prioridades dodesenvolvimento.

A seguir estão, resumidamente, os objetivos emetas desse acordo:

1 Erradicar a extrema pobreza e a fome• Reduzir pela metade, entre 1990 e 2015, a

proporção da população com renda inferiora um dólar por dia.

• Reduzir pela metade, entre 1990 e 2015, aproporção da população que sofre de fome.

2 Atingir o ensino básico universal• Garantir que, até 2015, todas as crianças de

ambos os sexos, terminem um ciclo completode ensino básico.

3 Promover a igualdade entre os sexos e au-tonomia das mulheres

• Eliminar a disparidade entre sexos no ensi-no primário/secundário, se possível até 2005,

164 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

e em todas os níveis de ensino o mais tardaraté 2015.

4 Reduzir a mortalidade infantil• Reduzir em dois terços, entre 1990 e 2015, a

mortalidade de crianças com menos de 5 anos.

5 Melhorar a saúde materna• Reduzir em três quartos, entre 1990 e 2015,

a taxa de mortalidade materna.

6 Combater o HIV/AIDS, a malária e outrasdoenças

• Até 2015, ter detido a proporção de HIV/AIDSe começando a inverter a tendência atual.

• Até 2015, ter detido a incidência da maláriae outras doenças importantes e começado ainverter a tendência atual.

7 Garantir a sustentabilidade ambiental• Integrar os princípios do desenvolvimento sus-

tentável nas políticas e programas nacionaise inverter a perda de recursos ambientais.

• Reduzir pela metade, até 2015, a proporçãoda população, sem acesso permanente e sus-tentável à água potável segura.

165TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

• Até 2020, ter alcançado uma melhoria signi-ficativa de, pelo menos, 100 milhões de habi-tantes de bairros degradados.

8 Parceria mundial para o desenvolvimento• Avançar no desenvolvimento de um sistema

financeiro aberto, baseado em regras previ-síveis e não-discriminatório.

• Tratar globalmente o problema da dívida dospaíses em desenvolvimento,mediante medi-das nacionais e internacionais de modo a tor-nar a sua dívida sustentável a longo prazo.

ReflexãoReflexão

A pobreza é um fenômeno multidimensionalque se concretiza pela exclusão e discriminação social eeconômica. As pessoas nessa condição têm acesso limi-tado a serviços destinados a satisfazer às suas necessida-des básicas (saúde, educação e habitação).

A forma em que os países enfrentam o subde-senvolvimento e a erradicação da pobreza depende dapercepção que a sociedade em seu conjunto tem dapobreza e da economia. Às vezes os funcionários encar-regados pelas formulações de políticas e programas po-dem ter uma visão das soluções e consequências dessas

166 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

e as pessoas que estão acima e abaixo da linha dapobreza outra.

A influência de instituições financeiras inter-nacionais (Banco Mundial, Fundo Monetário Interna-cional) constituem um elemento a mais na formula-ção de estratégias de desenvolvimento que osgovernos precisam adotar.

políticas e as organizações da sociedade civil outras

Essas diferentes percepções afetam a defini-ção das políticas, dando lugar em muitos casos a teorias, enfoques e programas contraditórios. A maiorparte dos países da América Latina aplicarammodelos de desenvolvimento diferenciados a cadadécada.

Nos anos sessenta e setenta a prioridade máxima era a industrialização a qualquer preço.Lembro-me que em reunião de promoção de investi-mento realizada em São Paulo, o Secretário dePlanejamento do Estado do Amazonas afirmou, re-petidamente, que seu estado recebia de bomgrado a poluição que as indústrias viessem a gerar.O importante era o desenvolvimento!

Os modelos econômicos aplicados nos anos90 não consideravam o setor rural e a agriculturacomo atividade importante do desenvolvimento. Sóa produção agrícola exportadora era apoiada me-

167TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Essa visão apresentada pelas instituições interna-cionais partia da hipótese de que o desenvolvimentoglobal era suficiente para reduzir paulatinamentea pobreza urbana e rural. Esta abordagem do com-bate à pobreza era conhecida como a teoria do trans-bordamento “the trickle down theory.”

diante medidas de caráter econômico e financeiro.

Esse enfoque foi originado da equipe do presidente Ronald Reagan e bastante difundidopelos economistas do Banco Mundial. A AméricaLatina adotou, de modo geral, essa concepçãocomo verdadeiro dogma.

Foram poucos os resultados dessa política que,na verdade, gerou um processo de empobrecimentogeral e grande concentração da renda no Brasil. Paraneutralizar essa situação, vários programas de alívio à pobreza foram sendo adotados nos últimosanos por alguns países da América Latina, inclusi-ve o Brasil. Há muitas críticas a essas iniciativas, como argumento de que se converteram em instru-mentos de politização e clientelismo político, comoé o caso do bolsa família. Em vista disso, uma dasperguntas mais frequentes que se fazem é comomelhorar a renda e as oportunidades de empre-go para reduzir a pobreza, sem assistencialismo. Aresposta mais frequente é acelerar o crescimento.

168 PEDRO SISNANDO LEITE

Uma das teses deste livro é que, embora o cres-

169TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

cimento econômico possa ser um meio poderoso deerradicar a pobreza, não é suficiente. A qualidadee a estrutura do crescimento devem ser “suficiente-mente” em favor dos pobres. Ou seja, o crescimentoeconômico contribui mais para a erradicação dapobreza quando cria emprego, aumenta a produtivi-dade e quando os recursos públicos são canaliza-dos para a melhoria do desenvolvimento humano. Apobreza é, de fato, uma consequência do limite das capacidades dos indivíduos (educação), das estrutu-ras políticas e processos que determinam a dis-tribuição da renda.

A história das nações não registra que o de-senvolvimento seja movido por qualquer determi-nismo impessoal. Esse processo é gerado por uma constelação de sujeitos de cujos atos depende a ordemsocial. As instituições não garantem por si o alcancedo bem-estar de todos. Os políticos devem se esforçarpelo melhoramento das estruturas governamentaislevando em conta as situações históricas e usandomeios lícitos a fim de que a liberdade de todas aspessoas seja respeitada.

169TERCEIRA PARTE – A QUESTÃO DA POBREZA

AS ARMASCONTRA A POBREZA

QUARTA PARTE

“Não há receitas

fáceis para crescer e

sair da pobreza.

Há, sim, lições

produzidas pela

experiência de êxitos

e fracassos que devem

ser aproveitadas,

caso a caso, com

liderança e

perseverança.”

Enrique IglesiasPresidente do BID

“Não há receitas

fáceis para crescer e

sair da pobreza.

Há, sim, lições

produzidas pela

experiência de êxitos

e fracassos que devem

ser aproveitadas,

caso a caso, com

liderança e

perseverança.”

Enrique IglesiasPresidente do BID

INTRINTRINTRINTRINTRODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃO

Com base na experiência histórica internacional,o último relatório do Banco Mundial sobre a pobrezapropõe uma estratégia para atacar a pobreza em trêsfrentes; 1o) Promover oportunidades para os pobres,especialmente a ampliação dos recursos humanos,acesso à terra e infra-estrutura que os pobres possamdispor. 2o) Facilitar a autonomia, ou seja, “fortaleci-mento da participação dos pobres nos processos polí-ticos e nas eleições locais.” A modalidade mais diretadessa condição é promover a descentralização/parti-cipação e o desenvolvimento comunitário. 3o) Aumen-tar a segurança quanto às catástrofes que afetam asobrevivência dos pobres, como são, no caso do Nor-deste, as ocorrências de secas e inundações. Trata-se deassegurar a sustentabilidade da vida dos pobres.

A luta pelo combate à pobreza, contudo, nãotem êxito garantido. A marcha em busca do desen-volvimento sem desigualdade e menos pobreza émuito mais longa e lenta do que se imagina. Nos últi-mos anos esse problema tornou-se o maior desafiopara algumas regiões do Brasil e do Nordeste, de modoparticular. Especialmente porque o sentido do desen-volvimento econômico deixou de ser apenas altas ta-xas de crescimento da renda e passou a significar

174 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

melhores condições de vida para toda a população,especialmente a que reside no quadro rural.

A agricultura do Nordeste, entretanto, nuncaprogredirá tão depressa como necessário sem que ogoverno, seus líderes políticos e o setor produtivodecidam desenvolvê-la prioritariamente. Sem estadecisão, a distribuição e a alocação de recursos e in-vestimentos já escassos tendem a espalhar-se emmuitos programas e atividades de poucos resultadospara a redução da pobreza.

Isto significa que, para orientar as prioridades deação e investimentos, devem ser definidas claramenteas estratégias e os programas de acordo com os princí-pios do ataque à pobreza e a redução das desigualdades.

Neste documento estão propostas algumas açõesdirecionadas a essa finalidade. São as armas contra apobreza, pois se trata, na realidade, de uma guerra.

É oportuna a advertência feita pelo eminentecientista Dr. Raanan Weitz, meu inesquecível pro-fessor de pós-graduação em Israel:

A pressão das massas rurais dos povos po-bres está crescendo firmemente e encon-trando expressão em termos políticos. A nãoser que o povo esteja convencido de que ogoverno está adotando meios bem conhe-cidos para resolver seus problemas básicos,o governo será derrubado, não importaquanto forte pretenda ser.

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

A POBREZA É RURAL A POBREZA É RURAL A POBREZA É RURAL A POBREZA É RURAL A POBREZA É RURAL

A pobreza continua sendo um problema sériono mundo desenvolvido. Mesmo que a pobreza ab-soluta mais grave tenha sido reduzida ao mínimo,subsistem ainda em todas as partes a pobreza relativa.

Nos países subdesenvolvidos, os problemas fun-damentais da pobreza, desigualdade e desempregotêm origem na vida econômica das áreas rurais. Nocaso do Nordeste, cerca de 70% das populações maispobres estão no quadro rural ou em pequenos povo-ados. Essas pessoas são dedicadas principalmente àsatividades agropecuárias de subsistência, quer desequeiro ou pequena irrigação.

A característica da pobreza rural é que a maioriadas pessoas dessa Região está concentrada em ter-ras de baixo potencial. Dependendo para viver de ter-ras marginais e de microfúndios, os pobres das zonasrurais não têm outra chance a não ser superexplorar osrecursos disponíveis. Assim, a produção de alimentostem prioridade sobre a conservação do meio ambientedessas terras vulneráveis. Outro motivo da pobreza ruralé que a maior parte da produção é de qualidade inferi-or destinada ao consumo dos próprios estabelecimen-tos e famílias dos produtores. A produção portrabalhador e por hectare é também baixa, devido aos

175QUARTA PARTE – AS ARMAS CONTRA A POBREZA

176 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

poucos investimentos no setor. Por sua vez, as políti-cas federais de preços agrícolas baixos são favoráveisàs populações urbanas, mas fatais para os produtoresde alimentos e matérias-primas. Entretanto, o maior obs-táculo da redução da pobreza vem do hiato de educa-ção no meio rural, em todos os níveis.

Outros fatores não econômicos têm sido deter-minantes também para a manutenção da pobreza nocampo. Muitos estudiosos desse fenômeno estão deacordo que a mais fundamental das razões do atrasoda agricultura é a existência de preconceitos das insti-tuições e das pessoas influentes das cidades contra aagricultura. Muitas vezes, esse setor é considerado desegunda classe. Nas universidades, os assuntos ruraissão negligenciados e não despertam interesse dos es-tudantes de mentalidade urbana. O moderno é asso-ciado à industrialização e aos serviços, enquanto oatraso e obsoleto, às atividades agrícolas.

A causa do desempenho fraco da agricultura doNordeste, além disso, decorre da ênfase mal colocadana industrialização rápida, baseada na grande empresalocalizada nos maiores centros urbanos. Sabe-se quenão há verdadeiro desenvolvimento sem as manufatu-ras e serviços de apoio a essas atividades. O desenvol-vimento industrial permite dar velocidade às taxas decrescimento econômico e acelera a modernização. On-

177QUARTA PARTE – AS ARMAS CONTRA A POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

de ela surge, provoca as transformações estruturais in-dispensáveis ao desenvolvimento econômico moderno.

É verdade, também, que o desenvolvimento in-dustrial sem desenvolvimento agrícola paralelo e com-plementar resulta em concentração da renda, geraçãode pobreza no quadro rural e caos social em toda asociedade. Assim está ocorrendo em todo o mundosubdesenvolvido onde a agricultura foi negligenciada.

No caso do Ceará, como exemplo, o Governodo Estado orientou suas prioridades para resolver ascausas originais da pobreza no campo. São exem-plos dessa política os programas de construção debarragens e interligação de bacias hidrográficas, pro-gramas de educação de crianças de 7 a 14 anos, pro-gramas de melhoramento de padrões de saúde e deeletrificação rural e abastecimento dágua, afora asobras de infraestrutura viária.

Programas de combate direto à pobreza tam-bém estão em execução no Ceará, como é o caso doProjeto São José, que em cinco anos (1995-2001)aplicou nas comunidades pobres cerca de US$ 100 milhoões, a fundo perdido. O programa Horade Plantar, que beneficia cerca de 100 mil famíliascom sementes de alta qualidade e assistênciatécnica. Os programas de difusão do milho híbridonas áreas apropriadas e de produção de sementes

178 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

em comunidades, com o apoio da EMBRAPA,além do Seguro-Safra, são comprovantes dessas inicia-tivas de apoio às populações das zonas rurais.

O Ceará tem encontrado dificuldades em au-mentar a produção e a produtividade da agriculturade subsistência em benefício dos pequenos produ-tores. Os incentivos oferecidos até agora não estãosendo suficientes para superar o subdesenvolvimen-to do campo. Os agricultores tradicionais tambémresistem às mudanças porque são analfabetos e nãoestão suficientemente organizados para o processoprodutivo e a comercialização dos seus produtos.

A questão da redução da pobreza, portanto,carece de maior atenção e novas políticas que ata-quem essas causas primárias e promovam um de-senvolvimento econômico verdadeiramente equili-brado entre as zonas urbana e rural e mais justo doque o atualmente vigente.

O economista indiano Vinod Thomas, viveucinco anos no Brasil como diretor do Banco Mundi-al. No seu recente livro O Brasil visto por dentro(2005) menciona que o programa de combate à po-breza do Ceará é uma lição para o mundo.Vivenciei essa experiência com o Dr. Thomas, naqualidade de Secretário do Desenvolvimento Ru-ral do Estado do Ceará de 1995-2002.

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Sobre o assunto, vale referenciar o diag-nóstico do Mapa da Extrema Indigência elaborado peloLaboratório de Estudos da Pobreza do CAEN - Uni-versidade Federal do Ceará. Esse estudo retrata umasituação positiva dos programas adotados no Cearána zona rural, onde se encontram 48% desse seg-mento da população do Estado. Vale ressaltar que a linha divisória para os de extrema indigência é de 1/8do salário mínimo de cada ano considerado.

Segundo dados dessa pesquisa, existiam emmédia nos anos de 1995-96 cerca de 860 mil pes-soas na categoria em comentário. Oito anos depois,no ano 2000, esse montante havia decaído para420 mil pessoas. Ou seja, uma redução no perío-do de 37%.

Como no decorrer desses anos ocorreu umacerta estabilidade na quantidade de pessoas na con-dição de extrema indigência no quadro urbano doCeará, pode-se deduzir que a tendência declinantena extrema pobreza do Estado (18%) deveu-se à influência do que ocorreu na zona rural. Essasituação serve para demonstrar que ações organi-zadas e focadas na solução do problema da pobre-za podem dar bons resultados.

179QUARTA PARTE – AS ARMAS CONTRA A POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

O DESAFIOO DESAFIOO DESAFIOO DESAFIOO DESAFIO

Reduzir a pobreza é hoje o objetivo comum detodas as nações subdesenvolvidas desejosas de saí-rem da dramática situação de inferioridade em quese encontram.

Até recentemente, a grande meta dos paísesatrasados era obter aceleradas taxas de crescimentoda renda total. Essa mentalidade também prevaleciaaqui no Brasil. No entanto, tudo isso mudou quan-do a brecha entre riqueza e pobreza nas regiões eclasses sociais passou a se tornar um fosso e um pro-blema de indignação humanitária e social.

Agora a pobreza é o maior problema das naçõessubdesenvolvidas. O único remédio para essa doença éa eliminação de suas causas. Com isso, além de se ob-ter a vantagem do desenvolvimento equilibrado e jus-to, um amplo campo de novas oportunidades abrir-se-á.

As principais dificuldades para enfrentar a po-breza derivam de deficiências no planejamento, bai-xos níveis educacionais, distorções burocráticas,tradições paternalistas e falta de parceria da iniciati-va privada com o governo para juntos atuarem demodo organizado com esse propósito.

É necessário uma reviravolta para poder criarum novo modelo em que a qualidade e a equidade

180 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

substituam as disparidades na distribuição dos be-nefícios do desenvolvimento.

Nenhum problema é tão grande no Nordeste doque a pobreza, especialmente no quadro rural. De100 pessoas que moram no campo 70 são pobres. Adiferença entre a cidade e o campo é enorme, segui-do das desigualdades dentro da própria zona rural.

Sem solucionar essa questão que tem desafiadoo governo federal e dos estados do Nordeste, não se po-derá falar em desenvolvimento econômico real no Brasil.

O meio mais eficaz para se mitigar a pobreza se-cular é a mobilização e a ação concentrada para aliviarsuas causas fundamentais (doenças, falta de instruçãoe moradia), envolvendo todos os recursos financeirose técnicos, combatendo a pobreza como se ela fosseuma ameaça ao desenvolvimento econômico.

Enfim, é necessário levar em conta o que disse orenomado economista do desenvolvimento econômi-co Gunnar Myrdal, prêmio Nobel de economia: “Éna agricultura que será ganha ou perdida a batalhapelo desenvolvimento econômico sustentável.” Con-vém registrar que o desenvolvimento tratado nestelivro dá grande destaque à erradicação da pobrezaatendendo às necessidades básicas de toda a popu-lação rural mediante o aumento da produção e pro-dutividade do setor.

181QUARTA PARTE – AS ARMAS CONTRA A POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

A batalha é difícil e os recursos são poucos. Sãonecessárias estratégias eficazes e resultados garanti-dos. “A agricultura não se desenvolve por si só. Re-quer um complexo sistema institucional de apoiopara comercializar seus produtos, supri-lo deinsumos, dar-lhe crédito e prestar-lhe assessoramentoprofissional”, ensina o renomado professor israelen-se Raanan Weitz.

Como base em minha experiência, acredi-to que o problema da pobreza no semiárido éé mais uma questão de organização do processo produtivo do sistema econômico vigente do que de secas e crises de produção. Outro fator agravante do subdesenvolvimento é a constatação de que não há nenhuma região semiárida do mundo tão povoada como o Ceará, e o Nordeste de modo geral.

mundo.

habitantes como de natureza rural, são mais de 4 milhões de pessoas no Ceará que vivem no interior (50% da população total) Aproximadamente 1,2 milhão trabalham diretamente na agricultura (35% do emprego total) gerando cerca de 6% do Produto Interno Bruto Estadual. Quanto ao emprego na agricultura, corresponde a 3 vezes a situação da Austrália, igual ao quantitativo da França (maior produtora agrícola da Europa) e quase 1/3 dos Estados Unidos, os maiores produtores agrícola do

182 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

mil estabelecimentos rurais contam, por exemplo,

da UFC estipulam que são necessários 50ha para

sequeiro.

As estratégias para corrigir essa falha de mercado que deformou a composição da economia do Estado devem dar prioridade à criação de emprego não agrícola no quadro rural, evitando as emigrações para as zonas metropolitanas. Segundo os meus cálculos, existem pelo menos 500 mil pessoas excedentes subempregadas na agro- pecuária do semiárido do Ceará. Mais de 100

com apenas 5 hectares, quando estudos do BNB e

uma família viver condignamente na agricultura de

similar que o grande problema da pobreza no

forma de agricultura familiar empresarial (coo-

É preciso compreender e politicamente as-

semiárido é essencialmente social, donde a açãopública é determinante, pois são questões es- truturais que dependem da ação política para alterá-las. Por isso, os projetos de irrigação com dinheiro público devem ser de interesse social, na

perativas), e prioritariamente destinada à pro-dução de alimentos. O modelo mercantilista de exportação de frutas é concentrador de renda e osbenefícios convergem para uma minoria de inter-mediários e monopsônios internacionais. Além

183QUARTA PARTE – AS ARMAS CONTRA A POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

das questões tecnológicas dos processos produtivos sustentáveis, há necessidade de uma revolução na educação fundamental rural. Com 60% de pessoas consideradas analfabetas funcionais no campo, não há política ou programa de proteção às mudanças climáticas ou ambientais que obtenham êxito. A simples prática de tecnologias agrícolas inadequadas (como as queimadas) é suficiente para derrotar o progresso da ciência nas questões de mudanças climáticas.

Em suma, as atuais políticas de preservação ambiental e combate à pobreza no semiárido pre-cisam ser revistas, pois não têm funcionado e serãoum desperdício de recursos e motivo de frustrações no futuro.

184 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

CRIAR EMPREGO PRCRIAR EMPREGO PRCRIAR EMPREGO PRCRIAR EMPREGO PRCRIAR EMPREGO PRODUTIVODUTIVODUTIVODUTIVODUTIVOOOOO

A pobreza e o desemprego estão crescendo naAmérica Latina e no Caribe, de acordo com o últimorelatório do Banco Interamericano de Desenvolvimen-to (BID). Nas palavras do vice-presidente desse Banco,Shahid Javed Burki, 73% da população dessas regi-ões residem hoje em áreas urbanas. O total de pes-soas que vivem abaixo da linha da pobreza, enfatizao referido economista, dobrou nos últimos vinte anos.

É oportuno lembrar também que em São Paulo,a cidade mais industrializada e rica do Brasil, a popu-lação favelada cresce 15% ao ano, onde já existemduas mil favelas com 2,0 milhões de pessoas.

Em outras palavras, por que têm ocorrido essasdistorções no crescimento econômico na maioria dospaíses do Terceiro Mundo e o que pode ser feitopara corrigi-las?

De modo geral, esses países seguiram a via daindustrialização sofisticada a qualquer preço, usan-do muito capital e pouco emprego de mão-de-obra.Essa política resultou na participação declinante daszonas rurais na economia. A longo prazo, esse pa-drão de crescimento tende a esvaziar o campo e acongestionar as metrópoles, sem condições de infra-

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

estrutura e de oferecerem empregos a todos quebuscam tais aglomerados.

Nesse contexto, por mais forte que possa serum programa para a agricultura, a população ruraltenderá a emigrar para a marginalidade das cidadesse não forem criadas oportunidades econômicas al-ternativas de renda no próprio quadro rural. Asagroindústrias e outros ramos neutros (sem ligaçãodireta com a agricultura) podem significar um ele-mento-chave para introduzir novas atividades nascomunidades do interior e ter um efeito indireto noemprego rural para as famílias dos produtores locais.

Uma boa articulação do setor agropecuário como industrial é fundamental para que ambos sejambeneficiados com essa solução. A escolha das in-dústrias a serem instaladas deve levar em conta oimpacto que provocarão na economia da micro-região e na criação de trabalho produtivo para osdesempregados das áreas rurais.

Outro objetivo para a localização das indústri-as no interior é criar centros dispersos de inovação emudanças econômicas e sociais nas vilas e peque-nas cidades. No caso das agroindústrias, a interde-pendência com a agricultura deve-se também ao fatode as matérias-primas agrícolas serem altamente pe-recíveis e sofrerem grande perda de peso no proces-

186 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO:ENSAIOS DE POLÍTICA ECONÔMICA

so de manufatura. Assim, podem ser transportadas alonga distância, mais adequadamente e a menorescustos na forma industrializada.

A relação mútua entre a agricultura e a indústria,enfim, foi um dos fatores notáveis do processo decrescimento da economia dos países hoje desenvol-vidos. Os planejadores dos países subdesenvolvidosignoram esse fato e equivocadamente procuram imi-tar o padrão de industrialização hoje existente nospaíses ricos, onde as condições são totalmente dife-rentes do que prevalece na etapa do arranco inicialdo crescimento econômico.

Especificamente no caso do Nordeste, existemcondições e fatores técnico-econômicos que permi-tem o desenvolvimento industrial descentralizado ebem mais viável do que ocorreu durante a revolu-ção industrial da Europa. As disponibilidades de ener-gia elétrica, meios de transporte e comunicação emquase todos os municípios do Estado tornam menosimprescindível a necessidade de localização das fá-bricas nas grandes cidades. As experiências já reali-zadas no Ceará, nesse particular, precisam sercultivadas e ampliadas urgentemente, pois é aí quese encontra a estratégia comprovada de êxito nocombate à pobreza e a obtenção do desenvolvi-mento harmônico autêntico. Como a história eco-

187QUARTA PARTE – AS ARMAS CONTRA A POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

nômica comprova, a única saída para erradicardefinitivamente a pobreza é o povo ter empregosque podem ser viabilizados através da interiorizaçãodo desenvolvimento econômico e da industrializa-ção rural.

A industrialização rural ou agroindustrial, obvi-amente, não pode ser vista como um processo de trans-plante de práticas industriais urbanas para o meio rural.

O planejamento e execução dos programas deindustrialização de polos deve levar em conta: as dis-ponibilidades relativas de fatores, as condições deinfraestrutura, assim como as formas organizacionaise tecnologias requeridas para cada caso específico.

188 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

URBURBURBURBURBANIZAR O CAMPOANIZAR O CAMPOANIZAR O CAMPOANIZAR O CAMPOANIZAR O CAMPO

Será o êxodo rural um mal, como muitos dizem?A revolução tecnológica posta em marcha no

início do século dezenove provocou o processo deurbanização. Foi a industrialização que criou os es-tímulos para sua expansão.

Até 1800 a população da Europa e da Américado Norte era predominantemente rural. Nos EstadosUnidos a população das cidades que era de 5%,passou para 15% cinquenta anos depois. Em 1940era de 56% e, atualmente, é de 91%.

A Inglaterra contava com 10% da população nascidades, no início do século. Em 2006 essa populaçãoera de 96%. A Austrália, atualmente, é o país maisurbanizado do mundo. Todas as nações desenvolvi-das tiveram o mesmo padrão de crescimentodemográfico.

Pode-se concluir disso que o êxodo rural é umafatalidade ou uma decorrência das transformaçõeseconômicas e sociais do desenvolvimento econômi-co. A proposta da fixação do homem no campo éuma rejeição da história econômica. É remar contraa corrente.

Do mesmo modo ocorre com o emprego.Quando a economia é atrasada, há proporcionalmen-

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

te muito emprego no campo. Os livros de históriamostram que, no século vinte, os trabalhadores agrí-colas caíram de 70 a 60% para 5 ou 3% em todos ospaíses desenvolvidos.

O processo de urbanização nos países hoje de-senvolvidos ocorreu através do aumento da produti-vidade da agricultura. Assim, uma população cadavez menor supria as necessidades alimentares doshabitantes nas cidades. Atualmente, apenas 3% dapopulação empregada na agricultura produz o sufi-ciente para atender o consumo interno desses paí-ses e, muitas vezes, com excedentes para exportação.

Nas últimas décadas, semelhante processo deurbanização passou a se verificar nos países subde-senvolvidos, com duas diferenças fundamentais. Aotempo em que ocorre a saída da população do cam-po para a cidade, não tem melhorado a produtivida-de agrícola. Em muitos casos, tem ocorridodiminuição da produtividade média com elevaçãodas necessidades de importação de alimentos.

O Nordeste e o Ceará encontram-se em tal situ-ação. Neste Estado trabalham hoje na agricultura cer-ca de 38% da população ocupada, isto é, 1,2 milhãode pessoas produzindo apenas 7% do produto inter-no do estado. Há excedente de, pelo menos, 500 milpessoas ocupadas na agropecuária. Esta situação é pro-

190 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

porcionalmente semelhante para o Nordeste.É um mito, portanto, pensar que a agricultura,

isoladamente, vai poder criar novos empregos ereduzir a pobreza dos que trabalham nesta ativida-de. Se isto não é possível, qual a solução para a redu-ção da pobreza rural e a obtenção do desenvolvimen-to sustentável de toda a sociedade rural?

Para o Nordeste de hoje, a opção viável é a reali-zação do desenvolvimento do interior, sem desloca-mento demográfico. Dizendo de outra forma, deve-semanter a população nas cidades e povoados do inte-rior, ocupadas em outras atividades econômicas nãoagrícolas. São agroindústrias, turismo, produção deinsumos e ramos complementares.

As indústrias neutras, que não dependem daprodução agrícola, são atualmente muito comunsnas áreas rurais dos países desenvolvidos. Chama-se a isto de agronegócios ou desenvolvimento inte-grado. A construção de infraestrutura e a urbaniza-ção do quadro rural mantêm o modo de vida dosistema social agrícola com as transformações eco-nômicas e demográficas peculiares ao desenvolvi-mento econômico.

A conclusão dessa tese é de que o êxodo rural vaiacontecer, seja pela revolução tecnológica ou motiva-da pela industrialização das cidades. Outra força de

191QUARTA PARTE – AS ARMAS CONTRA A POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

expulsão será através da elevação da produtividade agrí-cola ou, como ocorre no Nordeste, pela seca. A estru-tura agrária deficiente e a pouca disponibilidade deterras férteis têm um papel importante nesse tocante.

Se os governos não conseguirem oferecer nocampo as condições de melhor conforto para a po-pulação residente e para criação de emprego, bemmenos custosos do que nas grandes cidades, comovão poder fazê-los nas cidades? Segundo estudos bemfundamentados, são necessários vinte e duas vezesmais investimentos do governo para fazer isto nascidades do que no interior. É melhor gastar mais emreforma agrária e educação rural do que mesmo emrepressão urbana.

Portanto, o desenvolvimento deve ir para o cam-po e não deixar que a população do campo se dirija àsgrandes cidades, incapazes de oferecer o essencial paraa melhoria das condições de vida da população.

192 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

FFFFFAZER UMA REFORMA AAZER UMA REFORMA AAZER UMA REFORMA AAZER UMA REFORMA AAZER UMA REFORMA AGRÁRIA SOLIDÁRIAGRÁRIA SOLIDÁRIAGRÁRIA SOLIDÁRIAGRÁRIA SOLIDÁRIAGRÁRIA SOLIDÁRIA

O Programa de Reforma Agrária Solidária ins-tituiu, em 1997, um novo modelo de reestruturação

Por este sistema, os trabalhadores sem terra eminifundiários organizados em associações nego-ciam diretamente com os donos a compra da terracom recursos proporcionados por um fundo de terras.

As propostas de investimentos comunitários(infraestrutura, produtivas e sociais) são tambémidentificadas e implementadas pela comunidade.

Os benefícios do Projeto são o aumento darenda e da qualidade de vida dos produtores semterra ou minifundiários. A consequência natural dis-so tem sido o aumento da produção com maior efi-ciência do uso de recursos de terra, mão-de-obra eredução da pobreza.

Um aspecto verdadeiramente inovador nessamodalidade de reforma agrária é a sistemáticaoperacional democrática e descentralizada. Não bas-tasse isso para garantir a lisura em tudo que é feitopara ajudar as comunidades a tomarem melhor de-cisões, os contratos são firmados pela Associação dosprodutores de maneira solidária.

Assim, o papel do setor governamental é deorientador e monitoramento da operação do progra-

agrária no Ceará.

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

ma, deixando para as comunidades as responsabili-dades de planejarem suas próprias atividades.

O esquema operacional de financiamento daaquisição da terra em longo prazo, com alguns anosde carência, forçam os beneficiários a participaremcom os seus próprios recursos.

Em complemento ao financiamento creditícioda terra, são dados subsídios na construção das infra-estruturas físicas e para a sustentabilidade produti-va, tornando plenamente viável a capacidade depagamento dos beneficiados pelo programa.

Os principais fatores do sucesso dessa políticatem sido a descentralização da execução, ficando asiniciativas nas mãos dos beneficiários, de acordo comos seus próprios interesses. As simplificações dos pro-cedimentos administrativos agilizam o atendimentorápido dos interessados.

A Reforma Agrária Solidária viabiliza a posseimediata da propriedade, mesmo que o pagamentoocorra ao longo de muitos anos. E, como diz o prof.Raanan Weitz, o apego do agricultor à terra tem afi-nidade com o sentimento do homem pela mulheramada. A posse da terra também é importante comofator psicossocial e poder político. Um líder comu-nitário beneficiado pelo programa afirmou, em umaúnica palavra, o sentimento que ele tinha ao ser be-

194 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

neficiado pelo programa: “Liberdade! Liberdade paraplantar e para colher!”

Na verdade, como disse o economista Celso Fur-tado: “Somos o único País do mundo com sorte depoder resolver o problema social por meio da agri-cultura.” E isto é possível com a ajuda da ReformaAgrária Solidária.

Para melhor entendimento, é bom esclarecer queo Programa em referência teve início como experi-ência piloto financiada com recursos do Governodo Estado e do Banco Mundial, através do projeto decombate à pobreza (Projeto São José).

A partir de 1998, o Governo Federal passa a ado-tá-lo em cinco estados do Nordeste com a denomi-nação de Cédula da Terra. Este programa tornou-se um complemento às ações do Instituto de ReformaAgrária (INCRA), que implementa a política agráriaclássica baseada no Estatuto da Terra.

Desde o ano de 2003, este Programa passou adenominar-se de Crédito Fundiário, mantendo omesmo formato da política inicial, com a inclusão

de outros estados e aperfeiçoamentos naturais. Masprecisa ser dotado de mais recursos financeiros e re-tornar a sua apropriada denominação de Reforma A-

grária Solidária, assim como sua metodologia original.

195QUARTA PARTE – AS ARMAS CONTRA A POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

AJUDAJUDAJUDAJUDAJUDAR O AAR O AAR O AAR O AAR O AGRICULGRICULGRICULGRICULGRICULTTTTTOR COM TECNOLOGIAOR COM TECNOLOGIAOR COM TECNOLOGIAOR COM TECNOLOGIAOR COM TECNOLOGIA

A grande maioria da população rural do Nordestetrabalha para manter-se em um nível de subsistência.Esta situação decorre de muitos fatores estruturais ecircunstanciais.

Não há dúvida de que uma das causas disso é afalta de uma orientação técnica eficaz sobre como su-perar esses obstáculos. Seria injusto não reconhecerque têm sido feitos muitos esforços para mudar tal situ-ação. As ações empreendidas até agora, entretanto,pouco alteraram as condições de vida de segmento im-portante da população pobre do quadro rural cearense.

O grande problema a resolver é como chegar aesses agricultores e mostrar-lhes como se autoaju-darem. Isso por que o elemento mais importantepara as mudanças requeridas é o próprio agricultor.Os modos de gestão devem ser orientados para afinalidade de criação de renda e emprego e não paraservir as estruturas existentes da própria fazenda.

Os serviços de extensão existentes no Nordestetiveram suas primeiras sementes importadas do mo-delo utilizado na época nos Estados Unidos. Essas ex-periências de extensão rural, contudo, não puderamser plenamente transplantadas tais quais prevaleciamna origem. Daí por que, desde o início, a metodologia

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

de assistência técnica adotada no Brasil apresentavadeficiências de adequação às realidades locais.

O objetivo metodológico de transferir umatecnologia moderna de ponta existente naquela épo-ca contrastava com as necessidades dos peque-nos produtores que viviam numa agriculturatradicional e simples.

Os resultados obtidos dessa experiência não fo-ram plenamente satisfatórios.

Nos últimos anos tem havido um renovado in-teresse no sentido de reorganizar o sistema de ex-tensão rural tornando-o mais eficaz e orientado paraa solução dos problemas que realmente entravam amodernização do setor tradicional e de subsistên-cia. O novo enfoque adotado na reorganização daextensão rural do Ceará, por exemplo, buscou ensinaro agricultor a ajudar-se a si mesmo. O cliente, e nãoos problemas corporativos, passaram a ser o centroda ação do sistema. Para maior eficiência, cadaCentro de Atendimento aos Clientes (CEACs) defi-nia claramente o seu plano de ação para a sua áreade atuação, coordenando os órgãos envolvidos e opúblico-meta. Assim, respeitando as prioridades doPlano Estadual de Desenvolvimento Rural, eram con-centrados os esforços por áreas, produtos específi-cos e por grupos determinados de agricultores.

197QUARTA PARTE – AS ARMAS CONTRA A POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

A estratégia de mudanças se apoiava nos progra-mas de capacitação que abrangiam todos os níveis doquadro técnico e administrativo do sistema e dos agri-cultores contemplados no âmbito de atuação da exten-são rural.

todas as partes interessadas os problemas existentes eas soluções possíveis para cada caso. Os resultados fi-nais tinham como base a avaliação das atividades do sistema.

programa é necessário que a equipe do sistema de ex-tensão esteja dotada de uma nova visão e muitadedicação a sua missão de agente da transformaçãorural. Todos os esforços dos extensionistas deverãoser orientados para o agricultor. É ele que vai ganharou perder a batalha pela melhoria das suas condi-ções de vida.

198 PEDRO SISNANDO LEITE

A finalidade desse programa era dar a conhecer a

Em outras palavras, para execução desse tipo de

Ceará no período de 1995 - 2002, tive a oportunidadede acompanhar o excelente trabalho desenvolvidopela empresa de extensão rural, vinculada à re-ferida secretaria.

Como secretário de Desenvolvimento Rural do

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

EDUCAR PEDUCAR PEDUCAR PEDUCAR PEDUCAR PARA MUDARA MUDARA MUDARA MUDARA MUDARARARARAR

A educação é a pedra fundamental do desen-volvimento rural.

Entenda-se desenvolvimento como um proces-so de transformação cultural. No caso específico dosetor rural, ele significa uma transformação das es-truturas econômicas e sociais, das relações de pro-dução de uma determinada área ou comunidade.

O objetivo principal desse processo é encon-trar um equilíbrio com ênfase na distribuição equi-tativa da renda. É a geração de mais emprego e renda,melhores condições de saúde, nutrição e habitação.

O investimento em educação dos pobres, se-gundo Hollis Chenery, representa um dos instru-mentos através do qual é possível acelerar o crescimen-to e melhorar a distribuição da renda. Para fazer umarevolução agrícola é necessário educar o próprio agri-cultor, completa o mencionado professor.

A educação, na verdade, desempenha umatríplice função. Através da difusão de ideais comunse dando às massas a possibilidade de compreendere julgar a organização sociopolítica ou transforman-do as atitudes e o comportamento favorável às ino-vações e ao progresso. É formando quadros técnicos,elevando nível de instrução e adestramento paraaumentar a possibilidade de derrotar a pobreza.

199QUARTA PARTE – AS ARMAS CONTRA A POBREZA

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Não basta apenas capacitar mas, sobretudo,educar e formar o homem em todos os sentidos:intelectual, físico, moral e ético, ou seja, preparar ohomem para a missão de produtor e cidadão.

Neste contexto, a luta contra o analfabetismoconstitui um meio eficaz para mobilizar a popula-ção em torno das tarefas de construção de um novodesenvolvimento mais equilibrado.

A educação de adultos é de rentabilidade ime-diata. O adulto já possui conhecimento e experiên-cia no campo da produção, podendo dedicar-se commais eficiência a outras atividades não-agrícolas. Nesteparticular, encontra-se a chave para a redução rápi-da da população ocupada diretamente nas lides agrí-colas para outras atividades mais rentáveis do próprioquadro rural. É a transformação estrutural da econo-mia e emprego com vista a aumentar o nível derenda das famílias beneficiadas e suas comunidades.Mas o realmente importante é que os índices de de-senvolvimento social podem ser alterados rapida-mente pela melhoria da educação.

Sobre o assunto, a ex-vice-presidente do BID, Dra.Nancy Birdsall, afirma que a educação é um ativoque gera renda para quem a possui. Pelo menos emdois aspectos a educação se diferencia de todos osdemais fatores do desenvolvimento econômico; isto

200 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

é, uma vez adquirida, a educação não pode ser ven-dida ou roubada. Por outro lado, a proporção queela aumenta, outros ativos como capital ou terra di-minuem de importância.

É fácil perceber que a educação pode ser umativo mais bem distribuído do que qualquer outro.Ela é personalizada, enquanto os demais ativos ten-dem a ficar nas mãos de poucos. Assim, com o cresci-mento da educação automaticamente há umamelhoria na distribuição da riqueza. É por esse motivoque a desigual acumulação de capital humano expli-ca a disparidade de renda e pobreza rural do Ceará.

Um dos resultados da educação é possibilitar amobilidade ocupacional. Para o homem do interiormudar de profissão é mudar de escala social. A edu-cação é importante para as atividades não agrícolasdos produtores. De fato, a atividade agrícola envol-ve conhecimentos sobre clima, trato do solo, semen-tes, irrigação, fertilizantes, pragas e doenças,armazenagem, transporte, comercialização e crédi-tos, para citar apenas alguns conhecimentos neces-sários a fim de bem conduzir as atividades rurais.

Nenhum país do mundo saltou da agriculturatradicional e de subsistência para a modernidade semeducação e capacitação dos agricultores.

201QUARTA PARTE – AS ARMAS CONTRA A POBREZA

NOVAS ESTRATÉGIAS PARAO DESENVOLVIMENTO

REGIONAL

QUINTA PARTE

“Combater a miséria e

lutar contra a injustiça

é promover não só o

bem-estar, mas também

o progresso humano e

espiritual de todos

e, portanto, o bem da

humanidade.

O desenvolvimento

é o novo nome da Paz.”

Papa Paulo VI

Populorum Progressio

26 de março de 1967

INTRINTRINTRINTRINTRODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃOODUÇÃO

“A teoria é uma coisa, prática é outra bemdiferente.”

JEFFREY SACHS

O crescimento da renda do Nordeste nos úl-timos trinta anos foi semelhante ao padrão nacio-nal. O setor industrial, a geração de divisas e outrosindicadores macroeconômicos seguiram tendên-cia ascendente.

Estes resultados quantitativos não foram, toda-via, os mesmos no tocante à melhoria de qualidadede vida e das condições sociais da maioria dos 50milhões de habitantes dessa região, especialmenteos dependentes das atividades agrícolas.

Na verdade, o que tem ocorrido no Nordeste éum mal desenvolvimento. Subsistem ainda os prin-cipais problemas de desigualdade e da pobreza ab-soluta que marcam as economias mais atrasadas doTerceiro Mundo. Nesse sentido, destacam-se a con-centração da indústria nas grandes empresas e daterra em mãos de poucos com baixa produtividade.Há excesso de gente nas pequenas propriedades, des-nutrição generalizada, analfabetismo elevado e faltade oportunidades de emprego para parcela signifi-cativa da mão-de-obra nordestina.

206 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

A crise agrária tem motivado uma disfunção ru-ral-urbana em favor das emigrações rurais descon-troladas e de alto custo social para as congestionadasmetrópoles da região e do sul do País.

Tais condições, de reflexos políticos e institu-cionais, impedem a criação de oportunidades eco-nômicas e sociais. Refreiam os impulsos docrescimento econômico a favor da sociedade e mo-tivam tensões sociais de grande expressão coletiva.

Efetivamente, o verdadeiro significado de desen-volvimento não corresponde apenas a um aumentoquantitativo da produção de bens e serviços. É tam-bém sua melhor distribuição. Trata-se de um conceitoideológico que implica a reorientação das transfor-mações estruturais de ordem econômica, social eorganizacional. A finalidade do desenvolvimento, en-fim, é melhorar as condições de vida e da sociedadeem todos os seus aspectos econômicos, sociais, cultu-rais, institucionais, ambientais e humanos.

Há necessidade, por isso, de se redefinirem clara-mente os objetivos e os rumos de um novo estilo dedesenvolvimento econômico mais qualitativo do queo atualmente em curso do Nordeste: um desenvol-vimento socioeconômico justo e solidário.

207QUINTA PARTE – NOVAS ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTOREGIONAL

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

A NAA NAA NAA NAA NATUREZATUREZATUREZATUREZATUREZADO SUBDESENVDO SUBDESENVDO SUBDESENVDO SUBDESENVDO SUBDESENVOLOLOLOLOLVIMENTVIMENTVIMENTVIMENTVIMENTO REGIONALO REGIONALO REGIONALO REGIONALO REGIONAL

“É difícil entender como essa ordem mun-dial compassiva pode incluir tanta genteatormentada pela miséria extrema, pelafome persistente e por vidas miseráveis esem esperança.”

AMARTYA SEN

PRÊMIO NOBEL DE ECONOMIA

As causas do subdesenvolvimento do Nordes-te são frequentemente atribuídas a diversos fatoreshistóricos, econômicos, internacionais, políticos, dedotação inadequada de recursos naturais, além delimitantes culturais e sociais. Torna-se difícil, contu-do, distinguir entre os fatores causais e os efeitos dopróprio atraso econômico e social da região.

Com o propósito de estimar apenas alguns in-dicadores técnico-econômicos explicativos das dife-renças do nível de renda entre o Nordeste e o Sudeste,elaboramos alguns cálculos com base em metodo-logia utilizada por Hans W. Singer.1

De acordo com essas estimativas, a diferençada renda entre o setor rural do Sudeste e

1 Singer, Hans W. Estudo sobre o desenvolvimento econômico do Nordes-te. Recife. Codepe, 1962.

per capita

208 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

do Nordeste decorre, principalmente, da maior pro-porção de jovens na população do Nordeste, produ-tividade mais baixa e menor área por trabalhadornesta região do que no Sudeste. Estes fatores expli-cam 85% da diferença da renda da popu-lação residente nas áreas rurais das duas regiões.

Por esses dados, verifica-se que o Nordeste temum longo caminho a percorrer para superar as dife-renças de desenvolvimento com o Sudeste do País.Além dos aspectos de obtenção de recursos, a gran-de tarefa a ser realizada será no tocante à organiza-ção e coordenação das diretrizes e instituições nosentido de modernizar substancialmente a agricul-tura, sem criar desemprego e concentração da renda.

A questão crucial, contudo, é que um grande con-tingente populacional e a quase totalidade das lavou-ras, especialmente de subsistência, estão localizadasno semiárido e nas áreas de pressão demográfica.

É fácil concluir, portanto, que o grande desafioe a maior esperança da melhoria das condições devida da população estejam na elevação substancialda produtividade da terra e no desenvolvimento deculturas adaptadas às condições climáticas da região.

A elevação da renda das famílias dos agriculto-res dependerá, também, da criação de indústrias ru-rais que permitam, juntamente com as atividades

per capita

209REGIONAL

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

terciárias, oferecer opções complementares de ocu-pação e atividade econômica durante o período mai-or do que aqueles curtos períodos de plantio ecolheita. De fato, o desenvolvimento rural requertambém bons transportes, serviços sanitários e umconjunto de outros fatores, principalmente desenvol-vimento industrial dentro das zonas agrícolas. Estedesenvolvimento industrial proporcionará empregoà população agrícola excedente.

Em outras palavras, qualquer solução implica-rá o aumento da inversão no campo. Deve-se evitara tradicional concentração dos investimentos ape-nas nas grandes propriedades e em culturas de ex-portação, cujos rendimentos tendem a ser transferidosaos centros urbanos e outras regiões do País. Sãoproblemas difíceis, mas podem ser resolvidos comcriatividade.

Como diz George C. Lodge:

Deve dar-se uma alta prioridade às políti-cas que aumentam a capacidade dascomunidades agrícolas para organizar-se,para desenvolver iniciativas, para vencer aresistência à mudança e para fazer realida-de o progresso.2

2 “Desarrolo rural”. México, DF. La Universidad Nacional Autonoma deMéxico, 1965.

QUINTA PARTE – NOVAS ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTO

210 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Em resumo, o ponto importante é que a agri-cultura deve tornar-se significativamente maisprodutiva para que não haja paralisação do desenvol-vimento geral.

Por essa razão, é necessário ajudar aos produ-tores rurais com o propósito da modernização, poisa agricultura familiar não tem condições autônomasde ação, enquanto os grandes proprietários tememrealizá-la por não contar com uma política clara dogoverno federal para o setor. Não se deve conceber,todavia, programas assistencialistas ou paternalistas quesó resultariam em ostracismos da mão-de-obra, fon-te de corrupção e desestímulo ao verdadeiro traba-lho construtivo, indispensável ao desenvolvimento.

Quanto à diferença do nível da rendada zona urbana do Nordeste em relação ao Sudeste,os principais fatores explicativos são diferença tec-nológica, densidade de capital por mão-de-obra,composição etária da população e outros fatores demenor importância.

Cabe relembrar, entretanto, as conclusões dos es-tudos do prof. Stefan H. Robock quando trabalhou noBanco do Nordeste do Brasil, na condição de especia-lista das Nações Unidas. Ao analisar o problema dasdisparidades regionais, afirma o renomado economista:

per capita

211REGIONAL

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Deve-se encorajar uma mudança de filoso-fia para que o Nordeste concentre a aten-ção sobre os seus ganhos absolutos e naspossibilidades de maior crescimento, emvez de preocupar-se exclusivamente emcomparar o seu desempenho com o de SãoPaulo. Além disso, a má distribuição de ren-da no Nordeste poderá ser problema mui-to mais sério para essa área do que asdisparidades de renda entre regiões.3

3 “Desenvolvimento econômico regional; O Nordeste brasileiro”. São Paulo,Fundo de Cultura, 1963.

QUINTA PARTE – NOVAS ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTO

212 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

DIRETRIZES PDIRETRIZES PDIRETRIZES PDIRETRIZES PDIRETRIZES PARA O DESENVARA O DESENVARA O DESENVARA O DESENVARA O DESENVOLOLOLOLOLVIMENTVIMENTVIMENTVIMENTVIMENTOOOOOHARMÔNICOHARMÔNICOHARMÔNICOHARMÔNICOHARMÔNICO

“Em muitas situações são necessárias mu-danças radicais e urgentes, para restituir aagricultura – e aos homens dos campos – oseu justo valor como base de uma sã eco-nomia, no conjunto do desenvolvimento dacomunidade social.”

JOÃO PAULO II

A concepção dominante da política econômi-ca para o Nordeste tem sido a obtenção de acelera-do crescimento da renda, com o objetivo de diminuiras disparidades de desenvolvimento entre esta Re-gião e outras mais prósperas, especialmente o Su-deste.4

Os resultados obtidos nos últimos 30 anos nes-se particular são decepcionantes, em face dos esfor-ços e montante de investimentos realizados. Têm sidoinsuficientes as conquistas no campo econômico,social e da melhoria das condições de vida da popu-lação pobre, conforme comentado antes.

Estudos realizados pelo Banco do Nordeste doBrasil, por professores da “Ben-Gurion University”

4 Leite, Pedro Sisnando. Desenvolvimento harmônico do espaço rural. For-taleza, BNB, 1983.

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O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

(Israel) e pelo autor identificaram também outras gravesdificuldades da economia nordestina que exigem urgen-te solução. As mais agudas nesse particular são; a)existência de níveis demasiadamente elevados de de-semprego e subemprego, aliados à baixa produtivi-dade no setor agrícola e acelerado processo deemigração do campo para as cidades; b) extensa pro-porção de pobreza absoluta e amplo hiato de padrõesde vida entre a população do Nordeste e do Sudestedo País; c) excessiva concentração de renda nos cen-tros urbanos industrializados em relação às zonasrurais e por categorias sociais em ambas as áreas; d)falhas na execução das políticas econômicas para aregião e falta de controle dos programas de desen-volvimento regional; e) problemas sociais de habita-ção inadequada, alimentação deficiente, saneamentoe baixos padrões de educação e de saúde pública,em relação às regiões mais desenvolvidas.

Diante dessas constatações, verifica-se que oempenho em obter o desenvolvimento regional nãotem resultado no atendimento do duplo objetivo decrescimento econômico suficiente e benefíciossociais para a sociedade nordestina. Não pode ha-ver dúvidas, por isso, de que o problema no desen-volvimento do Nordeste seja prioritário e umaresponsabilidade nacional como condição para o

QUINTA PARTE – NOVAS ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTO

214 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

próprio desenvolvimento do País. Muito foi feito, maso essencial ainda precisa ser realizado.

Parece ilusório, portanto, pretender superar es-sas dificuldades mantendo a mesma estratégia de de-senvolvimento até agora seguida. Há necessidade deuma mudança de ênfase nos objetivos, bem como naestratégia utilizada. Aperfeiçoar ou criar também osinstrumentos de política econômica para a regiãoque poderia ser tarefa da nova SUDENE. A abordagemdeve ser abrangente, clara e permanente para o desen-volvimento regional que, nos últimos anos, não contoucom orientação segura e planejamento adequado.

A tarefa de superação do subdesenvolvimento,naturalmente, depende da solução de alguns pro-blemas básicos, além da mera pretensão de aumen-to da renda e de outros indicadores gerais. Podemser citadas como questões vitais para o êxito do pro-jeto de desenvolvimento do Nordeste: a) aumen-to acentuado de produtividade agrícola, comsimultânea criação de emprego não agrícola do qua-dro rural, para absorver a mão-de-obra liberada pelamodernização do setor; b) orientação das políticaspara dar ênfase à redução do desemprego esubemprego, através da pequena e média indústriae outras atividades empregadoras; c) direcionamentoda economia com vista à disseminação espacial dos

215REGIONAL

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

benefícios do desenvolvimento, com ênfase nas zo-nas rurais onde se encontram os maiores focos desubdesenvolvimento econômico e social.

Os recursos dos governos federal e estadual, as-sociados à contribuição do setor privado local, deveri-am ser canalizados para a solução desses reaisproblemas da região. Com isso advirão benefícios paraa economia nacional quanto à criação de uma eco-nomia fortalecida e gradativamente autossustentada,reduzindo a necessidade futura de transferência derecursos para a região. Um Nordeste mais desenvol-vido fortalece o sistema político nacional pela redu-ção das pressões sociais que a pobreza fermenta.

Desse modo, torna-se necessário explicitar cla-ramente na política econômica regional os proble-mas centrais a serem atacados. Com essa orientação,será mais fácil ajustar todas as diretrizes e instrumen-tos de atuação, evitando a disseminação dos escas-sos recursos em problemas sem prioridade para oautêntico desenvolvimento econômico.5

Os objetivos macroeconômicos para o desen-volvimento do Nordeste nos próximos anos deve-riam ser: a) crescimento o mais acelerado possívelda renda, buscando maximizar os resultados em ter-

5 Revista Econômica do Nordeste, BNB, nº 2.Vol. 10, 1979.

QUINTA PARTE – NOVAS ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTO

216 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

mos econômicos, sociais e espaciais; b) moderniza-ção da agricultura com base na unidade familiar eno apoio à empresa agrícola onde se tornar necessá-rio; c) fortalecimento do setor industrial moderno,reorganização das empresas tradicionais e ajuda àspequenas e médias empresas, especialmente asagroindústrias e indústrias das comunidades do in-terior, com vista à internalização dos resultados; d) am-pliação e organização dos serviços de suporte daagricultura e da indústria, sem os quais dificilmentepoderão ocupar suas reais funções econômicas esociais no desenvolvimento regional, em proveitodos que efetivamente produzem.

A ideia é adotar um “modelo” que produza umprocesso de desenvolvimento harmônico.6 Para tan-to, torna-se necessário, no que tange à agricultura,“o estabelecimento de políticas, delineando os pro-jetos, regras e regulamentos que deem bastante aten-ção ao desenvolvimento gradual e absorção dosrurícolas pobres, numa economia rural em expan-são”.7 Isto implica modernização do sistema admi-nistrativo e das organizações de apoio à produçãodos agricultores e suas necessidades. O projeto de6 Schlegel, John P. Towards a re-definition of development. Nebraska.Pergamon Press, 1980.7 Leite, Pedro Sisnando. “Planejamento e execução do desenvolvimentorural integrado”. Fortaleza, Rev. Econ. do Nordeste. V. 13 nº 1, 1982.

217REGIONAL

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

desenvolvimento com combate à pobreza no Cearápoderia ser uma experiência a estender-se a todoo Nordeste.

Para a efetivação dessas diretrizes será ne-cessário que ocorra um gradativo aperfeiçoa-mento das instituições regionais e estaduais. O foco deve ser uma atuação coordenada em certasáreas, segundo um método abrangente. Poderia co-meçar por um conjunto de atividades mais restritas, orientadas para a melhoria das condições do pú-blico-meta e, progressivamente, para toda a popula-ção regional.

QUINTA PARTE – NOVAS ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTO

218 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

ESTRAESTRAESTRAESTRAESTRATÉGIAS PTÉGIAS PTÉGIAS PTÉGIAS PTÉGIAS PARA O DESENVARA O DESENVARA O DESENVARA O DESENVARA O DESENVOLOLOLOLOLVIMENTVIMENTVIMENTVIMENTVIMENTOOOOODO NORDESTEDO NORDESTEDO NORDESTEDO NORDESTEDO NORDESTE

“A pobreza não foi criada pelos pobres, maspelo modo como a sociedade se estruturou,assim como pelas políticas governamentaisimplementadas.”

PRÊMIO NOBEL DA PAZ (2006)

Um programa para o desenvolvimento regio-nal não pode ficar restrito a um setor ou medidasisoladas. Intervenções individuais de reforma agrá-ria, modernização tecnológica ou de industrializa-ção, por exemplo, podem surtir efeitos bem abaixode suas possibilidades se não forem empreendidosconjuntamente.

Na prática, é oportuno relembrar que o desenvol-vimento da agricultura é parte do desenvolvimentomais abrangente de todo o espaço rural, o qual, porsua vez, liga-se umbilicalmente a todo o processode desenvolvimento econômico. Do mesmo modoocorre com as interligações do desenvolvimento in-dustrial e dos serviços.

Dessa constatação, pode-se concluir que a ori-entação das ações carece de uma nova estratégia queleve em conta a necessidade de um enfoque abran-gente e concentrado em localidades prioritárias. “To-

Muhammad Yunes

219REGIONAL

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

das as atividades requerem espaço”, diz JohnFriedman. Por estas razões, as medidas propostas nes-te documento precisam ser consideradas numa pers-pectiva de interdependência e complementaridadepara que os resultados econômicos e sociais dessesprogramas possam ser maximizados.

A estratégia que sugerimos se destina a atacaro problema de subdesenvolvimento de modo multis-setorial, com vista a reduzir as emigrações ruraispara as cidades metropolitanas já congestionadas. Achave desse enfoque é criar oportunidades produti-vas nas próprias zonas rurais, inclusive nas peque-nas cidades do interior que devem funcionar comocentros de serviços sociais e de apoio à produção.8

A metodologia para o desenvolvimento regio-nal deve tomar por base o crescimento econômico,a modernização e o aumento da dimensão econô-mica das áreas rurais, mediante: a)mobilização dosrecursos humanos e melhor aproveitamento dos re-cursos naturais e de infraestrutura existentes nas áreasde ação prioritária; b) garantia do acesso dos peque-nos produtores aos recursos produtivos e aos servi-ços de suporte necessário à produção; c) criação deoportunidades de emprego com vista à melhoria

8 Weitz, Raanan. “New Roads to Development”. New York, Twenty CenturyFund, 1985.

QUINTA PARTE – NOVAS ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTO

220 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

da distribuição de renda e do poder de compra dapopulação rural; d) integração da agricultura,indústria e serviços, no próprio quadro rural, levan-do em conta os aspectos físicos, econômicos, soci-ais e organizacionais; e) melhoria das condições dealimentação, saúde, educação, habitação e outras ne-cessidades básicas, como requisitos para o aumentoda produtividade e qualidade de vida da população.

A diretriz básica do desenvolvimento rural deve,portanto, transformar e resolver os problemas eco-nômico-sociais das comunidades do interior de modoharmônico, segundo padrões de justiça social o maisequitativos possível.

Este enfoque, como defende o prof. RaananWeitz, baseia-se numa estratégia fundamentada emtrês pressupostos: crescimento agrícola como chavedo desenvolvimento rural; desenvolvimento da agri-cultura simultâneo com os setores industrial e dosserviços; ênfase das forças sociais como elementodo processo de desenvolvimento rural.

221REGIONAL

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

RUMOS PRUMOS PRUMOS PRUMOS PRUMOS PARA UM DESENVARA UM DESENVARA UM DESENVARA UM DESENVARA UM DESENVOLOLOLOLOLVIMENTVIMENTVIMENTVIMENTVIMENTO JUSTO JUSTO JUSTO JUSTO JUSTOOOOO

“O Brasil vive um momento de definiçãoentre realizar seu vasto potencial ou per-der essa preciosa oportunidade.”

VINOD THOMAS

“Nenhuma sociedade pode certamente estar flo-rescente e feliz se a grande maioria dos seus habi-tantes é pobre e miserável”, advertia profeticamenteAdam Smith (1776), patrono do capitalismo científi-co, no início da Revolução Industrial inglesa.

De fato, há falta de medidas e de um projetode desenvolvimento econômico que expressem avontade da maioria da população. Que sejam voltadospara o atendimento dos interesses comuns de toda asociedade e inspirem confiança e mobilizem esforçosda coletividade. Isso pode provocar nas elites, nosintegrantes do próprio sistema de poder e no povouma sensação de profunda frustração e desesperan-ça crescente.

Pode ser um equívoco trágico, portanto, pen-sar que o tempo trará espontaneamente soluçõespara os problemas do subdesenvolvimento e dasdistorções sociais do modelo desigual de crescimentoeconômico do Nordeste.

QUINTA PARTE – NOVAS ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTO

222 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Em suma, o Brasil precisa de uma nova filoso-fia de desenvolvimento econômico justo, de umanova política econômica social de mercado e de umarenovada participação política e sensibilidade soci-al na definição dos rumos de um desenvolvimentoregional autêntico. Com mais precisão, o governotem a obrigação moral, em termos de dever e solida-riedade humana, de definir metas orientadas objeti-vamente para a obtenção de crescimento maisacelerado possível, mas com equidade e redução dapobreza absoluta, em termos de satisfação das ne-cessidades básicas.

Ao governo cabe atuar através dos seus órgãosregionais, no sentido de aumentar a eficiência nouso dos recursos regionais, oferecendo incentivospara a melhoria da tecnologia, mobilização das pou-panças para reinvestimentos e fomento da iniciativaempresarial. Para tanto, torna-se necessária a elabo-ração de programas globais de investimentos e depolíticas de crédito a fim de compensar as desigual-dades na dotação de recursos e na própria disponi-bilidade de infraestrutura social e econômica noNordeste.

O alcance desses propósitos carece de modifi-cações nos objetivos, no sistema administrativo pú-blico e no tocante a reorientar as atribuições das

223REGIONAL

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

entidades que atuam no desenvolvimento regional,além da reorganização dos próprios produtores.

A carta encíclica Mater et Magistra de sua Santi-dade o Papa João XXIII sobre a evolução da questãosocial, à luz da doutrina cristã, oferece um planopara os próximos governantes do Brasil, tanto emnível nacional como estadual e local. Eis as exi-gências do bem comum que deveriam se transformarem dogmas para o desenvolvimento econômico:

Eliminar ou reduzir os desequilíbrios entreos setores da agricultura, das indústrias e dosserviços públicos essenciais; adaptar na me-dida do possível as estruturas produtivas eos progressos das ciências e dos técnicos;moderar o teor de vida já melhorado da ge-ração presente, tendo a intenção de prepa-rar um porvir melhor às gerações futuras.

Não podemos deixar de aludir também às pre-ocupações do eminente Papa, de venerável memó-ria, com a questão do trabalho humano. Segundoele, a intervenção dos poderes públicos em matériaeconômica deve procurar, de diversas maneiras, daremprego ao maior número possível de trabalhado-res; manter uma justa proporção entre salários e pre-ços tornando acessíveis os bens e serviços deinteresse geral ao maior número de cidadãos. É opor-

QUINTA PARTE – NOVAS ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTO

224 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

tuno assinalar que a “educação é a chave mestra dofuturo”, como disse o saudoso Papa João Paulo II,em visita à CEPAL (Chile) em abril de 1987. Ao rece-ber nessa ocasião a Medalha da Paz, das NaçõesUnidas, o Sumo Pontífice afirmou, entre fortesaplausos dos técnicos dessa entidade científica:

Que os estados, os indivíduos, as institui-ções, as múltiplas formas de iniciativa pri-vada, deveriam concentrar seus maioresesforços na promoção da educação.

De fato, além da educação, a ocupação produ-tiva é um direito fundamental para a pessoa huma-na. O homem sem trabalho está ferido em suadignidade, nos ensina a doutrina social da Igreja.

Nenhuma nação entre as desenvolvidas avan-çou na industrialização sem passar por uma profun-da transformação social e cultural, apoiada naeducação.

Combater a pobreza sem educação é como que-rer que um barco navegue em terra firme.

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

PRINCÍPIOS DPRINCÍPIOS DPRINCÍPIOS DPRINCÍPIOS DPRINCÍPIOS DA NOA NOA NOA NOA NOVVVVVA ESTRAA ESTRAA ESTRAA ESTRAA ESTRATÉGIA RURALTÉGIA RURALTÉGIA RURALTÉGIA RURALTÉGIA RURAL

“O problema agrícola não será solucionadono laboratório ou na mesa de conferências.”

MAX MILLIKAN

Não se pode pretender superar as dificuldadesdo atraso da agricultura mantendo as mesmas estraté-gias tradicionais do passado. Elas não funcionarão. Omais fundamental dos requisitos para o progresso daagricultura sustentável e sem pobreza é a mudança dasatitudes do governo e das instituições sobre o papel daagricultura no desenvolvimento econômico geral. Aadoção de uma nova estratégia para o setor rural é umanecessidade inadiável da nossa época e pré-requisitopara um desenvolvimento econômico-social autêntico.

O desenvolvimento rural deve ser realizado commudança estrutural, mas sem mobilidade geográficada população da zona rural. Em outras palavras, oprogresso deve ser levado para o interior e não a po-pulação emigrar para as zonas metropolitanas.

Nesse novo enfoque, é necessário adaptar oucriar estabelecimentos agrícolas com maior capaci-dade de produção. O desenvolvimento econômicorural não será obtido sem o aumento simultâneo daprodução e da produtividade agrícola.

226 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

O setor público precisa ajudar o trabalhadoragrícola a adaptar-se às novas estruturas produtivase tecnológicas, introduzindo mudanças organiza-cionais apropriadas e convencendo o agricultor queele receberá mais renda por seu trabalho.

Para assegurar o crescimento e a moderniza-ção da produção é preciso criar uma estrutura exter-na eficaz de apoio: crédito, comercialização,pesquisa e assistência técnica.

CONCLUSÕESSEXTA PARTE

“O mundo continua

tendo um aumento no

número de miseráveis

nos últimos 25 anos,

inclusive na

América Latina.

Com esses resultados,

o combate contra

a pobreza será

mais difícil que os

governos esperavam.”

BANCO MUNDIAL26 de agosto de 2008

“O mundo continua

tendo um aumento no

número de miseráveis

nos últimos 25 anos,

inclusive na

América Latina.

Com esses resultados,

o combate contra

a pobreza será

mais difícil que os

governos esperavam.”

BANCO MUNDIAL26 de agosto de 2008

A realização do desenvolvimento econômicotem sido a maior aspiração de quase todos os paísesdo mundo. A história sobre essa experiência é fasci-nante e, ao mesmo tempo, desalentadora.

A origem do moderno desenvolvimento come-çou após a Segunda Guerra Mundial. Em sentido lite-ral, esse fenômeno funcionou para um quarto da po-pulação mundial, diz um dos relatórios sobre desen-volvimento humano do programa das Nações Uni-das (PNUD). Enquanto isso ocorreu em um lado domundo, noutro mais de 800 milhões de pessoas vi-vem hoje em situação de desnutrição e subemprego.

Para enfrentar essa tragédia, o Papa Bento XVIafirmou que há “necessidade de eliminar as causas

Segundo estudos realizados pelo Instituto Mundial para Desenvolvimento de Pesquisas Econô-micas da Universidade das Nações Unidas (Um mun-do sem pobreza, Muhammad Yunes, 2008), apenas1% dos mais ricos possui 40% dos bens da huma-nidade. Enquanto isso, a metade da população doplaneta conta com somente 1% dos bens de todoo mundo.

230 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

ções em desenvolvimento vão passar de injustaspara desumanas”.

São exceções a essa situação os países da Ásiaoriental e do sudeste asiático que cresceram maisrapidamente e alcançaram melhores resultados nadistribuição de renda e de ativos como terra e crédi-to. Em outros poucos países, mesmo com estagna-ção da renda, obtiveram progressos na educação,na saúde e no acesso à água.

Está cada vez mais claro, entretanto, que as es-tratégias mais bem sucedidas são aquelas que base-aram o crescimento nas pessoas e no seu potencialprodutivo e que criaram oportunidades de emprego.Para compreender a extensão da pobreza, como foiexaustivamente explicitado neste livro, é preciso le-var em conta esse elemento. Isto é, a pobreza decapacidades humanas e não só de renda, como re-ferida pelo Prêmio Nobel de Economia Amartya Sen,

de, o mundo tornou-se mais polarizado economica-mente quer entre países, quer dentro de países. Oadministrador do Programa das Nações Unidas parao Desenvolvimento, Gustave Speth, explicou que “seas tendências de longo prazo continuarem, as dispa-ridades econômicas entre países industriais e na-

estruturais ligadas ao sistema de governo da econo-mia mundial, que destina a maior parte dos recursosdo planeta a uma minoria da população”. Na verda-

231CONSIDERAÇÕES FINAIS

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Países como o Brasil precisam equacionar me-lhor o crescimento com o combate à pobreza atra-vés da melhoria da educação e do auxílio ao desenvol-vimento humano. Os programas assistenciais debolsas precisam de novas abordagens ao emprego,equidade, melhorias dos serviços sociais de saúde enovos padrões de consumo de energia e preserva-ção ambiental. É necessária uma nova visão sobre opapel da globalização, de modo a tirar proveito dasoportunidades da internacionalização da economiae dos conhecimentos. Estamos diante do que o jácitado economista Gustave Speth denominou “umaoportunidade e um imperativo moral para inverteras tendências negativas dos tempos recentes e re-forçar os padrões positivos do desenvolvimento hu-mano sustentável”.

Essa é a visão que procurei oferecer neste livrosobre “O Verdadeiro Desenvolvimento Econômico”.Ou seja, é preciso atentar para a qualidade do cres-

no seu livro “Desenvolvimento com Liberdade,2002” e muitos outros renomados economistas.

Neste particular, parece não haver dúvidas quenão há uma fórmula universal para os países obte-rem bons resultados em suas aspirações de desen-volvimento. Por outro lado, há concordância que odesenvolvimento econômico bem sucedido é decor-rente de um crescimento econômico paralelo com odesenvolvimento humano.

232 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

reito a opinião ( ausência de democracia e liberda-de); e crescimento sem futuro, quando a conserva-ção do meio ambiente não é respeitada.

A concepção de desenvolvimento econômicobrasileiro deveria ser entendida como uma mudan-ça positiva no econômico dos 50% da popu-lação que está abaixo da linha de pobreza e viveem condições deploráveis. Se o crescimento nãoajudar a melhorar a vida dessas pessoas, não setrata de desenvolvimento econômico real. Pode serchamado de progresso, industrialização, qualquercoisa, mas não é desenvolvimento econômico comofoi demonstrado no decorrer deste livro.

É justo reconhecer que a pobreza não é certa-mente um problema recente no Brasil. Do mesmomodo, cada administração do governo federal nasúltimas décadas tem concebido e anunciado algumplano para superá-la. Em consequência, importan-

cimento porque esse processo pode gerar um bomcrescimento ou um mau crescimento que necessitede uma ação corretiva do governo.

Pela experiência do que ocorreu com a histó-ria econômica de muitos países, as Nações Unidasidentificaram pelo menos cinco tipos de crescimen-to: crescimento sem emprego ( o caso do Nordestedo Brasil); crescimento desumano, com excessivaconcentração da renda (Brasil); crescimento sem di-

status

233CONSIDERAÇÕES FINAIS

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

processo produtivo, suas estratégias de sobrevivên-cia e suas relações com outras pessoas.

Em consequência disso, é impossível não se in-dignar com a miséria em que vivem mais de 25 mi-lhões de pessoas no Nordeste do Brasil ou em maisde um bilhão no mundo. Todos os anos, por exem-plo, 10 milhões de pessoas morrem nos países sub-desenvolvidos em consequência da fome e doençascontroláveis. Segundo estudo da Organização Mun-dial da Saúde(OMS), o Brasil é um dos piores nascondições de saúde, especialmente o Nordeste.Para ter-se uma ideia, dos 191 países avaliados, oBrasil ocupa a posição de número 125. Equiparadocom o nosso País estão a Birmânia, China, Vietnã,Nepal, Peru e Camboja. Nesses países, a insuficiên-cia de qualidade desse setor “ocasiona sofrimentodesumano, injustiça, desigualdade e negação dosdireitos individuais de saúde”, segundo o diretor daOMS, Christopher Murrou.

tes mudanças tiveram lugar na natureza desse fenô-meno, suas causas, sua persistência e a necessidadede mais eficiente maneira de erradicá-la.

A pobreza, deve-se ressaltar, é mais do que umacategoria demográfica ou uma classe socioeconô-mica. A pobreza é também uma atitude de vida.Neste aspecto, os pobres têm uma preocupação peran-te a comunidade, a sociedade e a baixa auto-estima.Esses comportamentos influenciam a natureza do

234 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

penso que todos nós deveríamos ter um determinadograu de humildade em reconhecer que não estamosganhando a luta contra a crescente pobreza.”

Nesse sentido, a doutrina social da Igreja ofe-rece uma nova alternativa de desenvolvimento que per-mite sentar as bases da edificação de uma sociedadeque tem como centro “o homem e não o dinheiroou a ideologia.” Acredito que, sem este e outros va-lores semelhantes, os países subdesenvolvidos nãochegarão a um verdadeiro progresso. É preciso dizertambém que os povos do Terceiro Mundo precisamsentir-se respeitados na sua dignidade e nos seus di-reitos de cidadãos.

O desenvolvimento como tratado neste livronão é um fim em si mesmo, como explica o profes-sor Manuel de Unciti (Terceiro Mundo, 1997): “Épreciso inventar um modelo de desenvolvimentohumano não só nos objetivos, mas, sobretudo, nosseus procedimentos.” Para concluir, torna-se opor-

A questão principal, intimamente unida à per-sistente pobreza e à elevação da desigualdade entreos mais ricos e os mais pobres, é a busca de umamodalidade de desenvolvimento em que haja paz eharmonia para todos.

No final da década de 90, o renomado econo-mista Joseph Stiglitz ( Prêmio Nobel de Economia)tornou-se uma referência mundial em assuntos de de-senvolvimento econômico. Afirmava ele então: “ Eu

tuno evocar o saudoso Papa Paulo VI, que afirmou:“O verdadeiro desenvolvimento (...) é, para todos

e para cada um, a passagem de condições menos hu-manas a condições mais humanas (...), a passagemda miséria à posse do necessário, a vitória sobre osflagelos sociais, o alargamento do conhecimento, aaquisição da cultura.”

235CONSIDERAÇÕES FINAIS

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

POSFÁCIO

Dr. José Nicácio de Oliveira pertenceu à equipe técnica pioneira do Banco do Nordeste do Brasil, onde exerceu vários cargos e, por muitos anos, a importante chefia do Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (ETENE) dessa Instituição.

Dr. José Nicácio de Oliveira

representa o coroamento dos estudos e reflexões do autor sobre o assunto durante muitos anos de

seminários no país e no exterior. A obra está centrada na procura do entendi-

no exame de experiências voltadas para a promoção do

desenvolvimento integral: a melhoria das condições de vida da sociedade como um todo em seus aspectos econômicos, sociais, culturais, institucionais, ambientais

desigualdade sem prejudicar o crescimento. Para indicar a magnitude do desafio da adoção

de um modelo de desenvolvimento que leve a uma redução significativa da pobreza e das desigualdades,

O livro “O Verdadeiro Desenvolvimento Econômico”, do professor Pedro Sisnando Leite,

atividades no magistério, pesquisa econômica, elaboração e execução de programas de desen-volvimento, viagens de estudo e participação em

mento do processo, na formulação de políticas e

e humanos, procurando reduzir a pobreza e a

que chama de verdadeiro desenvolvimento ou

240 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

mostra que dos 6,5 bilhões da população mundial três bilhões de pessoas vivem na pobreza, com uma renda de até US$ 2,00 por dia, das quais 50% em estado de extrema pobreza ou indigência, com até US$ 1,00 por dia. Cabe também mencionar que 46% de toda a

África subsaariana e 6% na América Latina e Caribe. No caso brasileiro, dos 189 milhões de

habitantes (2007) cerca de 30% são pobres e 15% indigentes, ao passo que o Nordeste, que constitui uma preocupação central no livro, tem 28% da população do país, mas concentra 47% do total de pobres e 56% dos indigentes. É o Nordeste, assim, a maior e a mais pobre das regiões do país, embora venha passando por mudanças importantes nas últimas quatro décadas, com a adoção de políticas e ações de órgãos regionais.

O Brasil oferece um exemplo eloquente de que pode ocorrer crescimento sem desenvolvimento, sem elevação generalizada da renda e do emprego. Esse país tem uma longa história de altas taxas de crescimento em comparação com outros países. Durante 116 anos (1870-1986) cresceu à taxa média de 4,4%, a mais alta do mundo, sendo superado apenas pelo Japão em

daquele país. Outros períodos são também ilustrativos: durante

40 anos (1940-1980) atingiu a taxa média de 7,0%, registrando 8,3% em 1967-1980 e 11,1% em

pobreza estão concentrados no sul da Ásia, 23% na

termos de crescimento 2,1% contra 2,4% per capita:

241POSFÁCIO

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

1968-1973, com um máximo de 13,9% em 1973. Daí mergulhou em duas décadas perdidas nos anos 80 e 90, seguindo-se um período de reativação e, agora, a exemplo dos outros países, uma desaceleração decorrente da crise financeira que se alastra pelo mundo. Observe-se, além disso, que a riqueza é bem

observação básica, no final das contas, é que o Brasil cresceu desigualando, com alta concentração de renda.

Diz Celso Furtado (Em Busca de Novo Modelo, 2002) ser escandalosa a distância, no Brasil, entre o consumidor médio e o rico, indicando que, na Índia, os 20% mais ricos têm em média uma renda quatro vezes maior que a dos 20% mais pobres, enquanto no Brasil a diferença é de 33 vezes, figurando o país praticamente como campeão mundial de desigualdades. E que os

10% de pobres, ao passo que o Brasil tem 34%. Acrescente-se a observação de que os elevados

padrões de consumo de nossa chamada classe alta, que imita o padrão de consumo dos Estados Unidos em um

esterilização de parte substancial da poupança e

investimento. No Brasil, a renda não se concentra para

mais concentrada do que a renda: 1% dos mais ricos recebem 17% da renda, mas detêm 53% do estoquede riqueza (fábricas, habitações, terras etc.). Uma

países com renda semelhante à do Brasil têm per capita

país com renda dez vezes menor, levam à per capita

aumentam a dependência externa dos esforços de

aumentar a poupança, mas para elevar o consumo

dos mais ricos. Ressalte-se que uma afirmativa básica, que bem

expres

e complexidade, requer necessariamente a adoção

ro ressaltar a con

imento, como

sa a visão e o posicionamento positivos do professor Pedro Sisnando ante esse quadro generalizado de desigualdades, é que “o desenvolvimento integral é possível, desde que acreditemos nisso e trabalhemos com o firme propósito de priorizar a solidariedade e a dignidade da pessoa humana”.

amplitude de variadas políticas públicas e ações, dentro de

uma visão de conjunto e de longo prazo. Entre as políticas e instrumentos voltados para a

redução da pobreza e das desigualdades quetribuição que pode ser dada pela pequena

empresa, sempre citada no discurso político e em planos de desenvolvimento. Mas sem as ações abrangentes, persistentes e decisivas, necessárias para que sejam gerados os resultados que seriam de esperar com a intensificação do seu desenvolvimento.

Por sua vez, o caso do desenvolvimento rural associado à ideia de interiorização do desenvolv

propõe o autor, constitui uma estratégia especial de combate à pobreza com o uso da pequena empresa, combinando o incremento de atividades rurais, industriais e de serviços vários. O objetivo é criar no campo e cidades mais ligadas ao quadro rural um novo dinamismo com o objetivo de reduzir a emigração em

242 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

O enfrentamento do problema, em sua

busca de melhores condições de vida nas metrópoles

é a pobreza e a marginalidade.

participação de 38% da produção da agropecuária),

considerado mais e mais como detentor de um grande potencial inexplorado de ações no sentido da redução da pobreza e das desigualdades, tendo em vista que é na zona rural onde estão presentes, de forma mais

Não se trata, no caso dessa ênfase à pequena empresa, de um pacto com o atraso, mas da adoção do pensamento de Ignacy Sachs (Inclusão Social pelo

empresário deve ser encarado como um arquiteto do futuro e não como um resquício do passado. Assim, em vez de apenas procurar redistribuir uma renda que foi

solidária. Trata-se de uma correção de ênfases em favor

243POSFÁCIO

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

multifacetado, com o apoio da pequena empresa, des-tacando-se a empresa rural de natureza familiar (com

produzida de forma concentrada em empresas modernas de maior porte, buscar também des-concentrar a própria produção ou geração da renda através da pequena empresa e mesmo da mi-croempresa. Atenção deve ser dada ainda à ex-ploração das oportunidades no campo da economia

Trabalho, 2003) no sentido de que o pequeno

congestionadas, onde o que se encontra com frequência

Esse enfoque de desenvolvimento rural

acentuada, essas limitações e esses aspectos negativos.

ganha relevância e atenção crescentes por ser

desse amplo segmento gerador da maior parte de

tentar fazê-lo

menor

tradicionalmente assegurados apenas às empresas de maior porte, o que tem contribuído para reforçar a tendência à concentração de renda inerente ao livre jogo das forças de mercado. Esse apoio deve passar pelas adaptações requeridas por sua finalidade.

Não se pensa, naturalmente, em construir um sistema econômico dinâmico e próspero apenas com pequenas empresas, como não seria o caso de

somente com grandes empresas, embora estas cumpram um importante papel na dinamização e modernização da economia. Considerar, assim, que um objetivo básico é também desconcentrar a produção e a renda, aproveitando de forma ampla o potencial de “empreendedorismo” da população, um recurso valioso que não pode ser desperdiçado.

Pretende-se com isso assegurar renda e poder de compra a uma quantidade maior de pessoas através de um forte incremento das atividades produtivas de

também para a própria dinâmica do desenvolvimento. Com aumento da produtividade e da produção, geração de emprego, capacitação e sentido de realização pessoal e de elevação da autoestima. Trata-se, na realidade, de um processo de redistribuição do próprio desenvolvimento.

244 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

empregos, como forma de destravar o seu des-desenvolvimento, com estímulos e benefícios

porte, cujo processo de redistribuição contribua

Ressalte-se que a ideia básica é de um “upgrade”, em que o aumento da produção e do emprego nesse setor tenha apoio na elevação do nível tecnológico e

existentes e de novas que for preciso criar,

costumeira e simples abertura de linhas de crédito. É fundamental que o aparelhamento do Estado, indo das universidades aos institutos de pesquisa, órgãos de

permanente, planejada e integrada, com criativos tipos de parceria, arranjos que permitam assegurar a essas empresas, como recomendam vários estudiosos, amplo acesso a capital, a tecnologia e a mercados, inclusive externos.

Com essa finalidade, além da adequação, ampliação e aprofundamento das ações de entidades nacionais

relevantes no exterior que possam ser aproveitadas no esforço local de promoção da pequena empresa, com o

financiamento, tecnologia, capacitação e oportunidades de mercado. No pressuposto de que outros países

formar e fortalecer uma rede de cooperação entre eles,

245POSFÁCIO

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

organizacional, da produtividade e da competi-tividade. Para isso, é preciso ir muito além da

outras entidades se engajem no processo,

cabe buscar também facilidades e experiências

beneficiando-se da criatividade e das soluções

estabelecimento de intercâmbios em áreas como

estabelecendo, com alta prioridade e de forma

fomento, bancos públicos, cooperativas e também

estejam também engajados nesse esforço, pode-se

uns dos outros.

promoção da pequena empresa, com a sua inserção no contex

amplia

to do desenvolvimento do país, é necessário que as instituições com responsabilidades nessa área estejam muito bem informadas e capacitadas com relação às

algumas experiências dignas de nota em andamento em algumas comunidades e regiões.

Os instrumentos a utilizar já existem, mas com atuação muito limitada diante das reais necessidades,

dos, com a possível adição de novas tarefas. Uma

cooperativas, incluindo as de produção, de compra e venda, de poupança e crédito, e consórcios para compras em comum, inclusive para promoção de

ampliada é a das incubadoras, nas universidades e institutos de pesquisa, para o desenvolvimento de produtos e tecnologias para pequenas empresas, dando-se atenção a oportunidades e peculiaridades regionais. Importante também é assegurar o acesso das pequenas empresas ao sistema de compras públicas, bem como às grandes redes de distribuição, inclusive as localizadas no exterior, o que pode favorecer as exportações.

246 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

precisando ser criativamente aperfeiçoados e

ações e inter-relações a desenvolver, aproveitando

área merecedora de atenção especial é a de

exportações. Outra experiência que precisa ser

Na verdade, para que sejam alcançados resultados realmente significativos nesse esforço de

O planejamento deve incorporar em termos práticos essas concepções, nos três níveis de governo,

rsistência do problema da pobrez

pode s

Isso não significa que programas de doações de

amplitude, gravidade e pea e das desigualdades. Contudo, cabe ter sempre

em vista que o fundamental é adotar um modelo de desenvolvimento que assegure às populações pobres crescentes oportunidades de atividades produtivas e

autossustentação.

geralmente não se dão conta de que nem todas são

urgir na esteira de tecnologias modernas. Há que considerar ainda a disponibilidade de tecnologias já conhecidas, mas não suficientemente difundidas, podendo ser vantajosas e facilmente incorporadas ao processo produtivo, além do fato de que pequenas

podem dar contribuições apreciáveis para a elevação da produtividade dessas empresas. São numerosos os exemplos de empresas que nasceram em quintais ou garagens e cresceram com um dinamismo tal que

tinacionais, sem contarem inicialmente com o apoio

247POSFÁCIO

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

passando a ser um processo descentralizado e vivenciado pela sociedade.

caráter assistencial sejam dispensáveis, pois dependem da

trabalho garantidor de condições condignas de

Quando se fala em pequena empresa, as pessoas

atrasadas e de que quantidade significativa delas

adaptações ou resultados de pesquisas simples

chegaram à posição de grandes ou até de mul-

normalmente proporcionado aos projetos de maior porte.

país, e um meio eficaz de combate à pobreza e às desigualdades.

constituem conhecimento materializado, na forma de capital tangível, e do conhecimento representado por um conjunto crescente de ideias, técnicas e habilidades que se incorporam às pessoas, na forma de capital

desenvolvimento moderno. Desse modo, na base

modalidades que deve ser levado também, de forma apropriada, às populações pobres.

mudanças fundamentais em um quadro mundial em

248 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Desse modo, a adoção de programas abran-gentes voltados para o fortalecimento da pequena empresa pode simplesmente significar o apro-aproveitamento amplo de potencialidades e

intangível, de importância fundamental no de-

de tudo está o conhecimento nas suas diversas

desenvolvimento é um processo crescentemente intensivo de conhecimento. O aumento da pro- dutividade ocorre em grande parte com o uso de

habilidades importantes para o desenvolvimento do

da educação, da ciência e da tecnologia, já que o Outra ênfase do livro refere-se à matriz básica

equipamentos que se sofisticam cada vez mais e que

Pode-se concluir, assim, que se deseja introduzir

que três bilhões de pessoas apresentam de for- ma generalizada condições de vida caracterizadas

marchar, com decisões e políticas econômicas e outras

abrangente, neste livro do Professor Pedro Sisnando Leite. Insistir no modelo que tem conduzido aos

frustrações e dramas humanos pelo mundo afora, não parece ser o caminho apropriado.

O amplo esforço de correção de rotas que se está realizando para fazer face à grave crise financeira que se alastra pelo mundo ainda deixará, dados os seus objetiv

melho

comum na área de pesquisas econômicas e

os específicos, grandes vulnerabilidades, pois

Que essa constatação fortaleça a ideia de que é preciso enfrentar com seriedade e decisiva vontade política o recorrente tema da “construção de um mundo

r”, com redução significativa e contínua da pobreza e das desigualdades. Melhor para todos, com a formação de verdadeiras nações e um mundo mais solidário, e não apenas para faixas privilegiadas da população.

Por fim, quero agradecer ao amigo Pedro Sisnando – amizade consolidada em muitos anos de trabalho em

249POSFÁCIO

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

pertinentes, para a adoção de um modelo de desenvolvimento como delineado, de forma

resultados insatisfatórios mencionados, causando

passa ao largo do amplo cenário de pobreza e desigualdades que divide nações e flagela populações.

pela fome, estado de saúde precário, habitações

analfabetismo e baixa qualidade do ensino é preciso deficientes e padrões educacionais marcados pelo

de uma economia sustentável.

250 PEDRO SISNANDO LEITE

O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

planejamento no Banco do Nordeste - a elevada distinção ao dedicar-me este livro que também expressa concepções e ideais que compartilhamos numa instituição basicamente voltada para a redução das desigualdades regionais no Brasil e a construção

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PEDRO SISNANDO LEITE é economista for-mado pela Universidade Federal do Ceará,com pós-graduação em economia rural e pla-nejamento regional em Israel. Foi técnico emdesenvolvimento econômico do Banco doNordeste e, durante muitos anos, chefe daDivisão de Estudos Agrícolas deste Banco.Lecionou, como professor adjunto e titular

de desenvolvimento econômico, nos cursos de graduação ede mestrado em Teoria Econômica (CAEN) e de EconomiaRural da Universidade Federal do Ceará. Na administraçãouniversitária foi Pró-Reitor de Planejamento em duas gestões,nos períodos de 1983-87 e de 1991-95. Dedicou grandeparte de sua vida acadêmica e profissional estudando expe-riências de desenvolvimento em países desenvolvidos e emer-gentes, visitando mais de vinte nações ao redor do mundocom esse objetivo. Publicou trinta livros sobre economia dodesenvolvimento econômico, planejamento e desenvolvi-mento regional. Destaca-se em sua contribuição científica,o livro Novo Enfoque do Desenvolvimento Econômico e asTeorias Convencionais, adotado em muitas faculdades deeconomia em todo o país. Outra obra muito conhecida doProfessor Sisnando, editada pela HUCITEC, de São Paulo, éEscandinávia: Modelo de desenvolvimento, democracia ebem-estar. Sobre este livro, o rigoroso crítico Jânio Quadrosescreveu em bilhete ao autor: “Seu livro é uma longa e sólidalição de economia democrática. O cap. 9, por exemplo, émodelar. Nunca li nada com mais clareza pedagógica.” Éreferência internacional o livro sobre Estratégia e Planejamen-to do Desenvolvimento Econômico Rural Regional Integra-do, publicado conjuntamente pelo Banco do Nordeste,

O AUTORO AUTORO AUTORO AUTORO AUTOR

onal e internacionalTem contribuido com muitos artigos e ensaios para jornais

nomia e Sociologia Rural e, como membro da Sociedadeciedade Internacional de Economia Rural, tem participado comoconferencista convidado em vários encontros internacionais.Foi bolsista pesquisador do Conselho Nacional de Pesquisa(1988-1992). Ocupou a função de secretário de Estado daSecretaria de Desenvolvimento Rural do Ceará, em 1995-1998e 1999-2002, na administração do governo Tasso Jereissati.Durante esse período, executou alguns programas de com-bate à pobreza no Ceará que se tornaram referência nacio-nal. O livro do Prof. Sisnando, Combatendo a PobrezaRural, trata desse assunto, tanto do ponto de vista doutriná-rio como das soluções práticas adotadas para superar estegrave e desafiador problema para os governantes do Brasil edos países subdesenvolvidos do século XXI. Lançou recen-temente, pela LCR Gráfica, um importante livro didático:Fundamentos de Economia: Teoria, Prática e Políticas.Por sua vez, o Banco do Nordeste do Brasil publicouuma suas obras mais importantes, que também foi lan-çado em formato virtual, inclusive em inglês: A Luta peloDesenvolvimento Regional e Rural no Mundo. É vice-pre-sidente do Instituto do Ceará e efetivo da Academia Cearen-se de Ciências e vice-presidente da Academia de CiênciasSociais do Ceará.

260

.vivali.com.br/ne sletter/psisnando).w(www

e revistas. Foi vice-presidente da Sociedade Brasileira de Eco-

Universidade Federal do Ceará e Centro de Estudos Rural-Urbano de Rehovot-Israel. A Editora Vivali, de São Paulo, publi-cou em formato virtual oito de suas obras para o mercado naci-