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OBSERVATÓRIO IBERO-AMERICANO DE POLÍTICAS E SISTEMAS DE
SAÚDE (OIAPSS)
RELATÓRIO TÉCNICO DE ANÁLISE DA MATRIZ DE INDICADORES
Brasília, julho de 2015
Elaboração: Sérgio Francisco Piola Relatório Técnico de Análise da Matriz de Indicadores do Observatório
Ibero-Americano de Políticas e Sistemas de Saúde (OIAPSS)
1. Introdução
A proposta de criação de espaço de comunicação e intercâmbio com a
finalidade de contribuir para o desenvolvimento qualitativo dos sistemas
públicos de saúde surgiu, de forma embrionária, na organização da Rede
Américas, pelo Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde
(CONASEMS) do Brasil1, em 1995. A Rede foi criada para promover a troca de
experiências na organização de sistemas locais de saúde. Nos anos que se
sucederam a Rede estimulou a articulação de gestores e a organização de
congressos de secretarias municipais de saúde das Américas, sendo que, no
XXII Congresso Nacional de Secretarias Municipais de Saúde, realizado em
Recife em 2006, foi discutida proposta de criação de Observatório Continental
de Descentralização, Políticas de Saúde e Governança (CONILL; FERNANDES,
2011).
A proposta de criação de Observatório Ibero-americano de Políticas e Sistemas
de Saúde (OIAPSS) ganhou força a partir da identificação de temas prioritários
comuns, por ocasião de Seminário Internacional sobre os sistemas de saúde do
Brasil e da Espanha. Este evento foi teve lugar durante o XXVI Congresso
Nacional de Secretarias Municipais de Saúde realizado em Gramado, Rio
Grande do Sul, em maio de 2010. A inclusão de Espanha e Portugal foi
respaldada pelas históricas ligações desses países com a América Latina.
Ademais, estes dois países acumulam um conhecimento relevante na
condução de sistemas nacionais, descentralizado no caso da Espanha e
centralizado no caso de Portugal, ambos com forte ênfase na atenção
primária de saúde.
1 A Rede Américas de Atores Locais de Saúde (Rede Américas) surgiu em 1995, a partir de um
movimento encabeçado pelo CONASEMS, com a missão de articular e apoiar projetos de reforma nos
sistemas de saúde das Américas.
O passo seguinte foi a concretização da ideia, o que ocorreu em abril de 2011,
em Mérida, Espanha, com a criação do OIAPSS, como iniciativa de um
conjunto de instituições governamentais e não governamentais (CONILL;
FERNANDES. op. cit).
Uma matriz de indicadores, guardando certa similaridade com as
desenvolvidas pelo Observatorio de la Salud do Peru e pelo Projeto
Desenvolvimento de Metodologia de Avaliação do Desempenho do Sistema de
Saúde (PRO-ADESS), do Laboratório de Informação em Saúde do Instituto de
Informação Científica e Tecnológica da Fundação Oswaldo Cruz, do Brasil, foi
o instrumento básico escolhido para possibilitar o acompanhamento dos
sistemas em âmbito nacional e internacional (CONILL et al, 2013). A matriz
analítica concebida com base nesses modelos permitiu tornar disponível na
plataforma virtual do OIAPSS um conjunto de informações quantitativas, que
poderão ser adaptadas conforme o surgimento de novas necessidades e
temáticas específicas dos países.
Tendo como base as prioridades temáticas apontadas na criação do
Observatório em Mérida, Espanha, em 20112, foi organizada a matriz atual
composta de quatro áreas temáticas, 10 dimensões, 24 sub-dimensões e mais
de sessenta indicadores. As áreas temáticas foram distribuídas entre os
pesquisadores dos países segundo suas expertises de modo a promover uma
dinâmica participativa ao projeto na definição dos indicadores. Desde então,
pequenas alterações foram efetuadas na relação de indicadores em função da
disponibilidade dos dados para o conjunto de países. A apresentação dos
conceitos que nortearam a construção da Matriz pode ser acessada no site do
OIAPSS.
Para orientar a execução da iniciativa, com a criação do banco de dados, foi
decidido priorizar, como fonte inicial, os bancos de organismos internacionais
de acesso livre e somente incorporar o indicador quando houvesse a
2
1. Contexto político-institucional e legal; 2. Determinantes sociais; 3. Situação da Saúde; 4. Medicalização/
complexo produtivo; 5. Financiamento; 6. Relação público/privado; 7. Regionalização/Redes de Atenção, com
enfoque na coordenação dos serviços; 8. Trabalho em Atenção Primária de Saúde; 9- Desempenho, com ênfase no
acesso, efetividade, satisfação.
informação em pelo menos três países e quando o indicador representasse
uma abordagem inovadora da temática.
Este relatório é uma primeira aproximação analítica dos dados compilados.
Está composto, além desta breve introdução, dos seguintes capítulos: o
capítulo 2 traz um resumo do panorama econômico, social e demográfico
recente da América Latina, com foco nos países selecionados. O capítulo 3
apresenta o arcabouço legal e aspectos organizativos dos sistemas de saúde
dos países que integram o OIAPSS. O capitulo 4 traz a análise dos indicadores
que compõem a matriz. Por fim, o capítulo 5 apresenta uma síntese das
principais constatações decorrentes da análise dos indicadores e procura
identificar tendências.
Capítulo 2 - Panorama do desenvolvimento econômico,social e demográfico
recente da América Latina com foco nos paises selecionados.
2.1. Aspectos demográficos, econômicos e sociais
Neste capítulo é feita uma breve discussão de algumas características da
demografia e do desenvolvimento econômico e social da América Latina (AL)
nos últimos anos, com o objetivo de possibilitar uma melhor contextualização
dos indicadores que compõem a matriz.
A discussão está focalizada na situação vigente a partir do início do século
XXI, quando a maioria dos países da AL conseguiu reduzir a vulnerabilidade
externa e manter boas taxas de crescimento econômico, inclusive durante e
imediatamente após a crise 2008. A evolução da distribuição de renda, da
redução da pobreza e do gasto público social também são abordadas.
A maior parte das informações socioeconômicas e demográficas utilizadas
nesta seção estão agregadas para a América Latina e Caribe. Este agregado é
composto por 48 países ( 14 America do Sul3, 8 Centro América4 e 26
Caribe5). Mas não raro também foram utilizadas informações referentes à
América Latina6 ou América do Sul.
a) Demografia
A população estimada da America Latina era de 606 milhões em 2014. Os
países inicialmente inseridos no OIAPSS apresentavam uma população de
quase 330 milhões no mesmo ano, ou seja, mais de 54% do total (Brasil: 201
milhões; Argentina: 41,7 milhões; Colômbia: 49,0 milhões; Peru: 30,6 milhões
e Paraguai: 6,9 milhões).
A taxa de crescimento populacional da América Latina tem diminuído nas
últimas décadas. No período 1995-2000 era de 1,35 por 100.000 habitantes e
baixou para 1,06 por 100.000 habitantes no período de 2010-2015. Dos países
selecionados os que apresentaram crescimento populacional mais baixo neste
último período foram Argentina (0,85/100.000) e Brasil (0,78/100.000). As
taxas mais elevadas ficaram por conta de Colômbia (1,33/100.000), Paraguai
(1,59/100.000) e Peru (1,14/100.000) (CEPAL, 2014a)
O perfil demográfico da América Latina ainda é de população jovem, embora
a participação da população entre 0 a 14 anos tenha reduzido de 32,2% do
total em 2000 para 28,2% em 2010. Por outro lado, as proporções da
população de 15 a 64 anos e de 65 anos ou mais aumentaram. Entre 2000 e
3 América do Sul (14): Argentina, Bolívia (Estado Plurinacional da), Brasil, Chile, Colômbia, Equador,
Guiana, Guiana Francesa, Ilhas Malvinas, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela (República
Bolivariana da). 4 América Central (8): Belize, Costa Rica, El Salvador,Guatemala, Honduras, México, Nicarágua e
Panamá. 5 Caribe (26): Anguila, Antigua Barbados, Aruba,Bahamas, , Caribe Holandes, Cuba, Curaçao,
Dominica, Granada, Guadalupe, Haití, Ilhas Caimán, Ilhas Turcas y Caicos, Ilhas Vírgens Britanicas,
Ilhas Vírgenes dos Estados Unidos, Jamaica, Martinica, Montserrat, Porto Rico, República Dominicana,
Saint Kitts y Nevis, San Martín (Parte holandesa), San Vicente y a Granadinas, Santa Lucía y Trinidad y
Tabago. 6Argentina,República Bolivariana da Venezuela, Brasil, Belize, Chile, Colômbia, Costa Rica,Cuba,
República Dominicana, Equador, El Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras, México, Nicarágua, Panamá,
Paraguai, Perú, Estado Plurinacional da Bolívia e Uruguai.
2010 a população de 15 a 64 anos de 62,2% para 65% do total, enquanto a
população de mais de 65 anos aumentou de 5,6% em 2000 para 6,8% total em
2010 (Gráfico 1).
Outro dado importante em relação à população da América Latina foi a
velocidade de seu processo de urbanização. Em 2015, cerca de 81% da
população viviam em cidades, em um processo que começou a acelerar na
década de 70 e nem sempre foi acompanhado das medidas necessárias em
termos de extensão dos serviços de água, esgotos, moradia e urbanização de
uma forma geral. Em 2000, a população urbana já representava 75,8% do total
(CEPAL, 2014a).
b) Economia
A primeira década do século XXI foi bastante favorável aos países da América
Latina, que conseguiram manter boas taxas de crescimento do Produto
Interno Bruto (PIB), mesmo depois da crise de mundial de 2008, e também
reduzir sua vulnerabilidade externa, mediante superavits significativos do
balanço de pagamentos e acumulação de reservas internacionais (PINTO,
2013)
Nas últimas quatro décadas, ou seja, a partir da década de 70, as maiores
taxas de crescimento da America Latina e Caribe ocorreram no período entre
1971 e 1980 (taxa media de 5,9% a.a). No período de 1981 a 1990 houve uma
desaceleração (1,5% a.a). Os períodos de 1991 a 1997 e de 2003 a 2010, por
sua vez, mostram uma retomada do crescimento, com taxas médias de
crescimento anual de 3,6% e 4,2%, respectivamente (CEPAL, 2014b). Essas
duas fases são separadas por um período de estagnação econômica e de
queda na atividade em alguns países da região no período 1998 a 2002,
chamado de "meia década perdida" em alusão aos anos 1980 (CEPAL, 2014b).
Considerando apenas América do Sul, observa-se que a região apresentou nos
períodos 1971-1980, 1981-1990 e 1998-2002 taxas de crescimento levemente
inferiores às observadas para a América Latina e Caribe. Nos períodos de
1991-1997 e 2003-2010 a América do Sul, contudo, teve taxas de crescimento
superiores (Tabela 1)
O fraco desempenho econômico no período entre 1998 e 2002 é explicado
pelas crises das economias do Brasil (1999) e Argentina (2001) em virtude do
acúmulo de desequilíbrios externos. Nesse período a economia da Argentina
apresentou crescimento médio negativo (-3,1%, a.a), enquanto o Brasil
apresentou um crescimento médio de 1,7%. Contudo, no período de 2003 e
2010, estes dois países apresentaram taxas médias de crescimento de 7,5%
(Argentina) e 4% (Brasil) (Tabela 1).
A diminuição da taxa de crescimento populacional, que ocorreu em todos os
países da América Latina, combinada com o aumento do Produto Interno
Bruto produziram efeito muito positivo na elevação no PIB per capita.
Efetivamente, com exceção do período 1981-1990 e de 1998 a 2002, nos
demais anos, desde 1970 a taxa de crescimento do PIB foi superior a taxa de
crescimento populacional. Esta taxa apresentou um crescimento médio de
1,35% em 2000/2005 e está estimada em 1,06% para o período de 2010 a 2015.
De 2006 a 2013, o PIB per capita da América do Sul passou de US$ 7.766,1 a
US$ 9.114,5 em 2013 (a preços constantes de 2010), com um crescimento
médio anual de 2,42% (CEPAL, 2014a).
Na economia, houve ainda um crescimento importante do superavit na
balança comercial da região. Entre 2000 e 2010 o resultado cresceu de -3,7
bilhões de US$ em 2000, para US$ 45,8 bilhões em 2010. Isso permitiu aos
países da América Latina acumularem reservas que passaram de US$ 162,7
bilhões em 2000 para US$ 651,4 bilhões em 2010 (PINTO, 2013). Boa parte
desses resultados foram devidos ao incremento das transações comerciais com
a China.
Contudo, a maior presença econômica da China na região não gera somente
efeitos positivos. Países como Argentina, Brasil e Colômbia são os países da
América do Sul que mais sofrem a pressão competitiva das manufaturas
chineses, uma vez que têm uma estrutura industrial mais complexa (Barbosa
2011 apud PINTO, 2013).
Mas o período de bonança pode ter chegado ao fim do seu ciclo, como já
aconteceu em outros períodos. As taxas de crescimento econômico da
América Latina, depois de 2010, são mais modestas do que o crescimento
médio verificado no período pré-crise de 2009: 6,2% do PIB em 2010; 4,3% em
2011; 2,9% em 2012; 2,5% em 2013 e algo em torno de 1% e 1,5% em
2014.(CEPAL, 2015).
A redução da demanda, com diminuição dos preços das matérias-primas da
pauta de exportações dos países sul-americanos, reduz o valor monetário das
exportações e o aumento das taxas de juros nos Estados Unidos, por sua vez,
tem efeitos negativos sobre a entrada de capitais externos na região.
De qualquer forma, os efeitos dessas novas condições entre os países da
região são diferentes. O fortalecimento da economia dos Estados Unidos tem
efeitos benéficos sobre o México e o Caribe. Fatores de gestão interna da
economia também ajudam a definir os efeitos das novas condições da
economia internacional sobre a situação de cada país.
Para que a América Latina possa ter uma inserção diferenciada na economia
mundial são necessárias uma série de reformas estruturais (CEPAL, 2015 op.
cit), que atingiriam, entre outros campos, a educação geral, a educação
técnica e o mercado de trabalho, de forma a contribuir para o aumento da
produtividade. Tais reformas permitiriam reduzir os elevados níveis de
desigualdade e pobreza, que seguem sendo, infelizmente, um marco distintivo
da maioria dos países da região. Com esses objetivo, os países da região
deveriam buscar aumentar a cobertura educacional e intensificar os esforços
para melhorar a qualidade da educação.
Um dos avanços importantes, na área educacional, foi, sem dúvida, o acesso
quase universal à educação primária. As insuficiências são, contudo, patentes
nos outros níveis de educação. No caso da pré-primária a cobertura é de 66%
da população da faixa etária correspondente na América Latina, enquanto que
entre os países da OCDE a cobertura é de 83%, segundo dados de 2012. Na
educação secundária os percentuais de cobertura são de 79% e 91%,
respectivamente. Na terciária a cobertura é de 42% na América Latina e de
71% na OCDE (CEPAL, 2015).
c) Desigualdade
O crescimento observado na renda per capita não foi suficiente para que a
América Latina deixasse de ser uma das regiões mais desiguais do mundo. Em
2010, a concentração de renda ainda se mostrava muito forte, apesar
desconcentração observada nos últimos anos.
Efetivamente, entre 1999 e 2010 a participação na renda dos 20% mais ricos
diminuiu. Tomando como exemplo alguns países, as reduções encontradas
foram de 54,1% para 49,4% na Argentina; de 63,8% para 58,6% no Brasil
(2009); de 62,4% para 60,2% na Colômbia; de 60,7% para 52,6% no Peru. Por
outro lado, a participação dos 20% mais pobres aumentou: na Argentina de
3,5% em 1999 para 4,4% em 2010; no Brasil de 2,2% para 2,9% (2009); na
Colômbia de 2,0% para 3,0% e no Peru de 2,8% para 3,9% (WORLD BANK in
PINTO, 2013). Apesar da redução, nestes países a diferença de renda entre os
20% mais ricos e os 20% mais pobres em 2010 é de 13 vezes na Argentina e
Peru e mais de 20 vezes no caso do Brasil e da Colômbia.
Agregando de outra forma e considerando a América Latina como um todo,
em 2013 os 20% mais ricos da população recebiam 46,7% da renda total,
enquanto os 20% mais pobres concentravam apenas 5,6% da renda total
(CEPAL, 2014c p 19).
Houve, entretanto, também uma redução significativa na pobreza e da
pobreza extrema (indigência)7. No caso da pobreza a redução para a America
Latina, se analisarmos a partir do ano 2002, foi de 43,9% da população nesse
ano, para 28% em 2014. A extrema pobreza, por seu turno, diminui de 19,3%
7 As estimativas de pobreza são as realizadas pela CEPAL utilizando o “método de renda”,
que se baseia no cálculo das linhas de pobreza e indigência. Estas representam o nível de
renda que permite a cada domicílio satisfazer as necessidades básicas de todos seus
membros. Somente as necessidades alimentares no caso da linha de indigência e
necessidades alimentares e não alimentares no caso da pobreza.
da população em 2002 para 12% em 2014 (Gráfico 2). (CEPAL, 2014c).
Estes resultados significaram retirar cerca de 58 milhões de pessoas da
condição de pobres e 28 milhões da pobreza extrema CEPAL, 2014c). Nada
obstante, em 2014, 167 milhões de pessoas ainda viviam em situação de
pobreza, sendo que 71 milhões em condição de indigência (Gráfico 2a).
Nos países selecionados os resultados foram significativos (Tabela 2). Na
Argentina a proporção de pobres passou de 24,8% em 2004 para 4,3% da
população em 2012; no Brasil de 36,4% em 2005 para 18% em 2013; na
Colômbia de 45,2% em 2005 para 30,7% em 2013 e no Peru de 56,9% em 2003
para 40,7% em 2013 (CEPAL, 2014c).
A diminuição da pobreza e a redução da desigualdade de renda nos anos
recentes pode ser atribuída a fatores de ordem distinta: melhor distribuição
da renda do trabalho e papel redistributivo do Estado por meio de políticas
de proteção social. A melhoria na distribuição da renda do trabalho é
decorrente da melhor distribuição das oportunidades educacionais que
contribuem para reduzir a diferença das remunerações no mercado de
trabalho. Ao mesmo tempo, as transferências públicas, seja por meio de
aposentadorias e pensões, seja por meio de programas sociais de
transferência de renda também tiveram papel importante (CEPAL, 2014b),
sobretudo quando associados a políticas de valorização do salário mínimo. O
peso de cada um desses fatores tiveram, entretanto, pesos bastante
diferenciados nos distintos grupos de países.
O gasto público teve papel importante para a redução da pobreza. Desde o
início dos anos 1990, o gasto público total se manteve relativamente estável,
como porcentagem do PIB, ficando entre 25% e 26%, com queda de um ponto
percentual entre 2002 e 2005, com crescimento a partir 2008 e 2009, no
intuito de se defender contra os efeitos da crise (CEPAL 2014c, p 45).
Com a estabilidade e até leve crescimento do gasto público total, houve um
aumento do gasto público em setores sociais. O gasto social na América Latina
passou de 13,8% do PIB nos anos 1990/1991 para 19,1% desse indicador em
2012-2013; como proporção do gasto público total os gastos sociais passaram
de 51,8% em 1990-1991 para 65,4% do gasto público total em 2012-2013.
(CEPAL, 2014c p. 45). A fase de maior crescimento se deu no período de
1990-1991 a 2002-2003, quando, o gasto público social passou de 51,8% para
62,3% do gasto público total com aumento de 10,5 pontos percentuais
(Gráfico 3).
É preciso considerar, no entanto, que há uma grande heterogeneidade no
gasto social entre os países na região, tanto no tocante ao peso relativo (% do
PIB), como em relação ao seu valor absoluto. Em 2008-2009, Argentina,
Brasil, Costa Rica, Cuba e Uruguai tinham um gasto social acima da média
regional de 17,9% do PIB, enquanto a maioria se situava em torno de 10%.
Estes cinco países citados, acrescidos de Trinidad Tobago e Chile, tinham um
gasto social per capita acima da média regional, que era de US$ 981. Na
maioria, o gasto per capita era inferior a US$ 500 (CEPAL, 2011, p. 159)
Entre as áreas que compõem o gasto público social, o maior crescimento foi
na área de seguridade e assistência social, cujos gastos aumentaram de 6,3%
do PIB em 1990-1991 para 9,1% do PIB em 2012-2013, com um acréscimo de
2,8 pontos percentuais. Uma parte não desprezível desse aumento foi
destinada aos programas de transferência monetária direta aos domicílios
(CEPAL, 2014c). Os gastos com educação e saúde, por sua vez tiveram
crescimentos mais modestos: educação passou de 3,7% para 5,0% do PIB e
saúde de 3,2% pra 4,2%, no mesmo período (Gráfico 4)
Capítulo 3. Arcabouço Legal e Aspectos Organizativos dos Sistemas de
Saúde
3.1. Arcabouço Legal
A constitucionalização dos direitos fundamentais de segunda geração, ou
seja, direitos econômicos, sociais e culturais, entre os quais se incluem a
saúde, educação e trabalho, ainda que não represente, em muitas
sociedades, a garantia efetiva de implementação desses direitos, significa,
sem dúvida alguma, um compromisso societário mais forte com o bem-estar
coletivo. Os direitos de segunda geração objetivam assegurar as condições
para o pleno exercício dos de primeira geração8, os chamados direitos de
liberdade, buscando eliminar ou atenuar os impedimentos ao pleno uso das
capacidades humanas (LAFER, C. 2006).
Brasil e Paraguai, entre os cinco países latino-americanos analisados, são os
que têm saúde como direito inscrito explicitamente em sua Carta
Constitucional. No caso do Brasil, a garantia se dá de forma bastante
abrangente uma vez que os determinantes e condicionantes da saúde estão
incluídos entre os direitos, além de prever o acesso universal e igualitário às
ações e serviços de promoção, prevenção e recuperação da saúde, conforme
estabelece o Art. 196 de CF de 1988. (SANTOS, 2013) Para atender a esses
preceito constitucionais o sistema público foi integrado em um Sistema Único,
financiado com recursos fiscais. Estes dispositivos constitucionais foram
regulamentados pela Lei 8080 de 1990 e 8.142 de 1991.
No Paraguai, a Constituição de 1992, no Art. 68, determina que "O Estado
protegerá e promoverá a saúde como direito fundamental da pessoa e no
interesse da comunidade. Ninguém será privado da assistência pública para
prevenir ou tratar de enfermidades, peste ou pragas e de socorro nos casos de
catástrofes e de acidentes. Toda a pessoa está obrigada a submeter-se às
medidas sanitárias que estabeleça a lei, dentro do respeito à dignidade
humana". Reconhece fatores condicionantes da saúde e sua vinculação com o
desenvolvimento econômico, social e ambiental (Art. 6 e Art. 7).
8 Correspondem àqueles direitos básicos dos indivíduos relacionados a sua liberdade, considerada em
seus vários aspectos, basicamente os direitos civis e políticos
No Peru, a Constituição de 1993 estabelece, no artigo 7, ao tratar do direito
à saúde e proteção ao incapacitado, que: "Todos têm direito à proteção de
sua saúde, do meio familiar e da comunidade, assim como o dever de
contribuir para sua promoção e defesa...". A pessoa incapacitada de cuidar
de si mesma, por deficiência física ou mental, tem direito a regime legal de
proteção, atenção, readaptação e seguridade.
Outros dois países, Argentina e Colômbia, asseguram os cuidados de saúde de
forma distinta. No caso da Argentina, o direito à saúde não está previsto
formalmente na Constituição, mas o direito à saúde é garantido por ter o país
aderido e ratificado a Declaração Universal de Direitos Humanos. Há,
entretanto, leis que garantem direitos à saúde, como é o caso da saúde
mental, das crianças, entre outras (SANTOS, 2013).
No tocante à Colômbia, a Constituição de 1991 garante a saúde e o
saneamento ambiental como serviços públicos de responsabilidade do Estado.
Esses serviços são garantidos à população pobre do país, mediante um rol de
ações e serviços denominado de Plano Obrigatório de Saúde (POS). A
legislação básica que rege o sistema de saúde colombiano é a Lei 100, de
1993, modificada pela Lei 1438, de 19 de janeiro de 2011 que. entre outras
definições, estabelece uma política nacional de atenção primária .
Nos países da península ibérica - Espanha e Portugal - o direito à saúde está
constitucionalizado. A Constituição espanhola reconhece desde 1978 o direito
à proteção da saúde. A Lei Geral da Saúde, de 1986, dispõe nacionalmente
sobre o Sistema Nacional de Saúde espanhol. O Sistema Nacional de Saúde se
fundamenta em princípios da universalidade, igualdade da assistência,
coordenação e cooperação das administrações públicas sanitárias para
superação das desigualdades em saúde, atenção integral, colaboração entre
os serviços públicos e privados, entre outros.
Portugal, por sua vez, realizou uma reforma sanitária em 1971. Em 1976,
com a nova Constituição emergiram novas políticas sociais. A Constituição
estabelecia que “todos têm direito à proteção da saúde” que se realizaria
“pela criação de um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito”.
Também fazia referência às condicionantes e determinantes da saúde como
forma a assegurar e a promover a saúde. Contudo, 1989 a Constituição foi
revisada, alterando o Serviço Nacional de Saúde que de “gratuito” passou a
ser “tendencialmente gratuito”. A nova lei do Serviço Nacional de Saúde
também alterou o financiamento da saúde que passou a provir do Orçamento
Geral do Estado, substituindo o financiamento com base nos fundos sociais. A
saúde é de acesso universal, existindo um pagamento direto dos seus usuários
quando utilizam os serviços públicos, o qual se elevou muito nos últimos anos
(SANTOS, 2013).
No tocante à organização político-administrativa, fator que também provoca
reflexos na organização dos sistemas de saúde, Brasil e Argentina estão
organizados como repúblicas federativas. Contudo, a despeito desta
similaridade, o grau de delegação de competências para as instâncias
subnacionais é bastante diferente. Na Argentina o Governo Federal exerce
papel reitor, de direção central, coordenador e normativo. Ampla autonomia
é garantida às províncias em matéria de saúde. No Brasil, apesar do sistema
ter a provisão descentralizada o papel normalizador e financiador do Governo
Federal é mais acentuado.
No Brasil, as instâncias da federação - União, Distrito Federal, Estados e
Municípios - têm responsabilidades compartilhadas em relação ao sistema
público de saúde9. O processo de descentralização, a partir de 1993, alcançou
os 5561 municípios. Contudo, os governos estaduais ainda tem demonstrado
pouco protagonismo na coordenação dos subsistemas, havendo iniciativas
recentes para institucionalizar redes regionalizadas de atenção para melhoria
no acesso.
9 O item II, do Art. da Constituição do Brasil define como competência comum da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios "cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das
pessoas portadoras de deficiência". Contudo, conforme o Item VII, do Art. 30, a provisão de serviços é
competência primariamente municipal , cabendo ao município "prestar, com a cooperação técnica e
financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população"
Nos demais países da América do Sul, integrantes do Observatório, a
descentralização, melhor seria chamar desconcentração, existente são
próprias do modelo de estado unitário, com os recortes regionais e municipais
do poder central. A descentralização geralmente é administrativa e não
política.
A Espanha, por sua vez, tem um desenho sistêmico diferenciado em razão de
ser dividida em Comunidades Autônomas, fortemente independentes em
relação ao poder central, as quais devem observar a Lei Geral da Saúde, o
Decreto Real que dispõe sobre a carteira de serviços, e outras legislações de
cunho nacional, tendo, contudo, grande liberdade para dispor sobre seus
sistemas de saúde no âmbito das Comunidades Autônomas. Portugal, de outro
lado, descentraliza seus serviços para regiões de saúde que são em número de
cinco. O Ministério da Saúde é o poder central que mantém diálogo com o
nível local, sendo o seu coordenador nacional (SANTOS, 2013).
3.2. Aspectos organizativos dos sistemas de saúde
Os sistemas de saúde são "a soma de todas as organizações, instituições e
recursos cujo objetivo principal é melhorar a saúde da população" (OMS,
2000). Em uma concepção mais abrangente "correspondem ao conjunto de
relações políticas, econômicas e institucionais responsáveis pela condução dos
processos referentes à saúde e que se concretizam em organizações, regras e
serviços e visam a alcançar resultados condizentes com o valor e a concepção
de saúde numa determinada sociedade". (LOBATO; GIOVANELLA, 2012). Já os
serviços de saúde são parte do sistema de saúde e correspondem ao conjunto
de atividades cujo principal propósito é promover, restaurar e manter a saúde
de uma população.
A noção de sistema de saúde advém da concepção da saúde como
manifestação objetiva das condições de vida sendo resultante da ação
intersetorial de diferentes subsistemas. Contudo, quando se fazem
comparações estas se referem, em geral, aos sistemas de serviços de saúde ou
sistema de serviços profissionais10, havendo diversas formas para descrevê-los
e analisá-los. Na descrição e análise dos sistemas de saúde as dimensões mais
utilizadas são: grau de cobertura (universal ou segmentada); equilíbrio entre
as fontes de financiamento (impostos, contribuições sociais, seguro público ou
privado, pagamento direto); tipo de organização e grau de integração entre os
agentes financiadores e os prestadores (número de agentes financiadores,
presença de um Ministério da Saúde e/ou de um Seguro Nacional,
descentralização); propriedade dos serviços (públicos, privados lucrativos ou
filantrópicos); formas de remuneração e regulação dos profissionais,
especialmente dos médicos (ato, salário, capitação, maior ou menor
regulação) (CONILL, 2012).
Com o objetivo de melhor contextualizar os sistemas de saúde dos países
selecionados são elencadas algumas características, sejam as mais comuns ou
as mais discrepantes, uma vez que não há tipologia que consiga expressar a
diversidade dos arranjos que foram conformando os sistemas de saúde da
América Latina ao longo de tantos e distintos processos sociais.
Na América do Sul, as primeiras organizações sanitárias públicas, na primeira
metade do século XX, foram direcionadas ao controle de endemias. A criação
de Seguros Sociais, de inspiração bismarckiana, para prestar assistência à
saúde à população vinculada ao mercado formal de trabalho e, em algumas
situações, seus familiares, também datam dessa época (ISAGS, 2012).
Essa característica, vinculação ao mercado de trabalho, foi predominante na
estruturação inicial dos sistemas de serviços de saúde da região. Sobre esse
marco foram se revelando as concepções a respeito da saúde: (i) direito
fundamental a ser garantido universalmente pelo Estado; (ii) saúde como
direito relacionado à vinculação ao mercado formal de trabalho, ou (iii)
saúde, especialmente os serviços de saúde individual, como objeto de ação
10
No referencial da socioantropologia o sistema de saúde seria mais abrangente e composto por três
subsistemas: o informal (popular sector - família, comunidade, rede de amigos, grupos de apoio e auto-
ajuda), o popular (folk sector - agentes especializados seculares ou religiosos, mas não reconhecidos
legalmente na sociedade) e o subsistema profissional (professional sector)(11)
.
residual do Estado e somente para a população mais pobre. Esse trajeto
histórico está na gênese da segmentação atual dos sistemas de saúde da
região.
Nas décadas de 1970 e 1980, o avanço de políticas neoliberais levaram à
iniciativas de cunho privatizante em diversos países da América Latina. Em
anos mais recentes, o relativo fracasso de experiências mais audaciosas de
privatização, onde o exemplo mais citado foi o sistema do Chile, e a eleição
de governos situados mais à esquerda no espectro político-ideológico, há
tentativas de reorganização dos sistemas nacionais regionais em bases mais
solidárias, como apontam a criação do Sistema único de Saúde (SUS) no Brasil
e mudanças recentes nos sistemas do Chile.
Para a maioria dos países, a segmentação do acesso é a característica mais
frequentemente encontrada. Nesses países, aproximadamente um terço da
população tem algum tipo de seguro social, um terço utiliza serviços do setor
público e o outro terço o setor privado, através de pagamento direto ou por
meio de pré-pagamento (planos e seguros privados de saúde.
Em quase todos os países, o seguro social, vinculado à inserção ao mercado
do trabalho, foi a forma primordial de proteção, cabendo ao setor público,
por meio de recursos fiscais a atenção à população, de menor renda, não
inserida no mercado de trabalho. Os sistemas de pré-pagamento, por meio de
seguros privados de saúde, tiveram expansão na região a partir dos ajustes
neoliberais da década de 1980.
Na Argentina, o sistema de saúde é formado por três subsetores: o público
com gestão nacional, provincial e municipal; o seguro social e de saúde de
afiliação obrigatória composto pelas Obras Sociales; e o seguro privado de
afiliação voluntária. 11 A partir de 1997 foi estabelecido um Plano Médico
Obrigatório (PMO) a ser oferecido pelas Obras Sociales, com incentivo à
competição entre esses agentes e liberdade de escolha para os
11
Existem, na Argentina, cerca de 250 empresas de Medicina Pre-paga (Seguro Saúde)
beneficiários 12 . Esse sistema é responsável pela cobertura de 47% da
população, mas em geral não possui serviços próprios, garantindo a prestação
por meio de prestadores privados ou de hospitais públicos (IRD EUROSOCIAL
SALUD, 2007; FINDLING; ARRUNÃDA; KLIMOVSKY, 2002 apud CONILL, 2012).
O setor público detém uma rede própria de hospitais e centros de saúde. A
maior parte do financiamento e da prestação de serviços está a cargo das
províncias (Ministério da Saúde da Província), enquanto o Ministério da Saúde
da Nação se reserva funções de normatização e regulação. As políticas de
atenção primária são de tipo focalizado (distribuição de medicamentos, saúde
materno-infantil, médicos comunitários para ações essencialmente de
promoção e prevenção no nível local), com algumas experiências mais
relevantes realizadas por municípios (ROVERE, 2006; BÁSCOLO; YAVICH, 2010
apud CONILL, 2012). O sistema continua essencialmente voltado para a
atenção médica curativa e centrado na instituição hospitalar.
No Brasil, a Constituição de 1988 garantiu o acesso universal e a integralidade
da atenção no plano legal. Foram extintos os serviços de assistência médica
da previdência social estabelecendo-se um sistema público descentralizado
com gestão compartilhada entre União, Estado e Municípios, financiado por
recursos fiscais, o Sistema Único de Saúde (SUS).
A ausência de investimentos compatíveis com a ampliação da cobertura
favoreceu o crescimento dos planos e seguros privados (segmento
suplementar), existentes no Brasil desde os anos 70, que passaram a cobrir
trabalhadores dos setores mais dinâmicos da economia e a população dos
estratos de renda média-alta e alta, mas que hoje já se estendem para os
estratos de renda média-baixa. Este segmento tem como usuários cerca de
25% da população do país, mais de 50 milhões de pessoas.
12
Na Argentina o segmento do Seguro Social está composto por 298 obras sociais nacionais,
24 provinciais e o Instituto de Serviços Sociais para Aposentados e Pensionistas. Os serviços
são prestados, majoritariamente, por instituições privadas e médicos contratados.
No sistema do Brasil há e uma composição público-privado no financiamento,
prestação e utilização dos serviços, caracterizando um sistema universal com
cobertura duplicada e subsidiada, uma vez que os gastos privados, tanto das
empresas como das famílias com assistência médica, podem ser descontados
da renda tributável para fins de imposto de renda13. Essa situação configura
desigualdades no acesso (parcela da população possui cobertura do SUS e do
plano; outra, exclusivamentedo sistema público), dificuldades de
coordenação, pressões tecnológicas e de consumo sobre o setor público, com
diversos arranjos em função da interação dos profissionais e dos usuários nos
dois subsistemas (CORDEIRO et al, 2011 apud CONILL, 2012).
Os avanços do SUS são reconhecidos em diversas áreas (transplantes,
imunizações, controle e tratamento de pacientes com Síndrome da
Imunodeficiência Adquirida, desenvolvimento técnico-científico, formação de
recursos humanos). Houve, ao mesmo tempo, maior uso de serviços de
atenção básica, tratamentos hospitalares e exames de alta complexidade em
todas as regiões do país. Entretanto, há dificuldades na qualidade percebida
pelos usuários (baixa oferta de serviços especializados, hospitalares e de
diagnóstico; longas listas de esperas).
Na Colômbia foi criado um Sistema General de Seguridad Social en Salud
(SGSSS), desde 1993, instituindo-se dois Planos Obrigatórios de Saúde (POS):
um para o regime de seguro contributivo e outro, mais restrito, para o
subsidiado (Lei 100, em 1993). O eixo dessa reforma, denominada de
pluralismo estruturado, foi a separação entre financiamento, asseguramento e
prestação de serviços.
As Entidades Promotoras de Salud (EPS), que podem ser públicas ou privadas,
funcionam como operadoras (registro de filiados, pagamento de prestadores)
garantindo o fornecimento do POS através de uma rede de prestadores
13
Pessoas físicas podem descontar de sua renda bruta, para fins de pagamento de Imposto de
Renda, os gastos pessoais com serviços de assistência à saúde e com planos e seguros de
saúde. Por sua vez, as empresas privadas que contratam serviços de saúde para seus
empregados e dependentes, podem computar esses gastos como despesa operacional.
públicos e privados (Institucões Prestadoras de Servicios (IPS). O sistema de
proteção do regime contributivo foi unificado num Fondo de solidaridade e
garantia (*FOSYGA), responsável pelo pagamento das EPS por meio de valores
per capita (Unidades de Pagamento por captação (UPC), ajustadas por idade e
sexo) e da transferência de um porcentual de recursos para o regime
subsidiado. As atividades de saúde coletiva ficaram a cargo de Departamentos
e municípios (Plano de Atenção Básica (PAB) sendo também financiadas por
recursos fiscais.
De 1993 a 2009, a cobertura assistencial da população colombiana aumentou,
situando-se em torno de 90% (38% regime contributivo e 51% subsidiado)
(CALDERÓN et al, 2011 apud CONILL, 2012). O crescimento do plano
subsidiado foi quase três vezes superior ao contributivo, mas persiste uma
grande diferença no rol de serviços garantidos.
Um conjunto de problemas tem sido referido para explicar essa situação:
judicialização crescente, consumo desregulado de medicamentos, ausência de
prioridades sociais, insuficiência de recursos públicos, problemas econômicos
estruturais com maior incremento do regime subsidiado frente ao
contributivo, questões administrativas de diversas ordens (falta de clareza e
atualização nas listas de garantias, por exemplo), corrupção com perda de
legitimidade das EPS (operadoras) e baixa efetividade do sistema (SOJO, 2011,
CALDERÓN et al, 2011;ROMERO, 2011, apud CONILL, 2012).
O ano de 2010 foi marcado por uma profunda crise do SGSSS colombiano com
uma reforma da Lei 100 votada em 2011 (Lei 1438). A nova Lei incorpora uma
política nacional para atenção primária. Seus objetivos, no entanto, estariam
direcionados para a maior regulação das operadoras e sustentabilidade
financeira do sistema sem uma mudança estrutural nas características do
modelo assistencial (FRANCO-GIRALDO, 2012, apud CONILL, 2012).
No Paraguai,segundo dados do Inquérito Permanente de Domicílios, de 2010,
16,4% da população estava coberta pelo Instituto de Previdência Social (IPS) e
7% por algum outro tipo de seguro (privado, militar ou do empregador). Desta
forma, o Ministério da Saúde e Bem Estar Social (MSBS) se responsabiliza por
mais de 75% da população O MSBS, além das clássicas ações de promoção,
prevenção e vigilância da saúde, desenvolve serviços de atenção à saúde
(recuperação e reabilitação). A Previdência Social, além dos benefícios de
aposentadorias e pensões, assegura serviços de assistência à saúde a seus
segurados e dependentes. Instituição pública, de administração
descentralizada, a Universidade Nacional, presta serviços de alcance nacional.
As instituições militares possuem serviços específicos. Instituições privadas
prestam serviços de atenção curativa e de reabilitação (ISAGS, 2012)
Apesar do setor público (MSBS e IPS) ser responsável pela cobertura de ampla
maioria da população, a participação do gasto público no gasto total em saúde
é inferior a 50 % total. Mais precisamente, correspondeu a cerca de 46% do
gasto em 2009, embora venha crescendo desde 2005.
Além da segmentação do acesso, decorrente de diferentes formas de
inscrição/financiamento, ocorre fragmentação da atenção, com programas
verticais e centralizados e uma atenção primária ainda com pouca
coordenação com os níveis assistenciais de maior complexidade.
O sistema de saúde do Perú é segmentado e composto, basicamente, pelos
seguintes setores e instituições: (i) Ministério da Saúde (MINSA), que congrega
o Seguro Integral de Saúde (SIS), uma seguradora pública com autonomia
administrativa. O MINSA que tem responsabilidade de atendimento da
população não segurada. Essa atenção é financiada com recursos fiscais
repassados ao SIS e os serviços são prestados por meio da rede de serviços do
MINSA. O SIS procura atender os trabalhadores do setor informal e a
população pobre. (ii) o Seguro Social de Saúde, (EsSALUD) instituição
vinculada ao Ministério do Trabalho, que presta serviços aos trabalhadores
com emprego formal e a seus dependentes. Também são acolhidos segurados
autônomos. Ademais, existem serviços específicos para as Forças Armadas e
da Polícia Nacional. (iii) O setor privado que é composto por entidades
prestadoras de serviços, seguradoras privadas e clinicas e organizações da
sociedade civil. O setor privado, por meio das Empresas Prestadoras de
Serviços de Saúde - EPS cobrem ao redor de 4% da população em 2010
(ISAGS,2012). Em termos de cobertura, o EsSALUD cobre 25,3% da população
com um seguro bastante abrangente. O SIS cobre 35,3% da população e, a
despeito do nome, só agora começa a contar com uma carteira de serviços
mais abrangente; 1,6% da população são cobertos por seguros privados; 1,6%
por serviços da Forças Armadas e cerca de 35% da população não tem
cobertura mais integral.
O Peru, gradualmente, está procurando substituir um sistema de segmentado,
por um seguro universal, com um único plano de benefícios oferecido por
seguradoras públicas e privadas. O sistema de seguro universal buscará
atender 100% da população e se servirá da ampliação progressiva do Programa
Essencial de Asseguramento em Saúde (PEAS, Lei 29. 344 de 2009). O PEAS
abrange 1.100 diagnósticos e busca a cobrir 65% das causas de morbidade. A
antiga lista de procedimentos prioritários cobria cerca de 20% das causas de
morbidade.
Em 2007, foi introduzido no SIS umsistema semicontributivo para incentivar a
filiação de trabalhadores do setor informal. A Lei de Cobertura Universal de
2009 criou uma sistema regulatório que busca alcançar a cobertura universal
mediante a coordenação institucional do EsSalud, SIS, MINSA e governos
regionais (WORLD BANK GROUP, 2014)
Espanha e Portugal, países da Península Ibérica, ingressaram juntos na União
Européia em 1986. Seus sistemas sanitários são similares e se enquadram num
modelo de serviço nacional de saúde. (CONIL; FERNANDES, 2011) Além de
possuírem sistema nacionais de abrangência universal, esses países se
destacam pela ênfase na atenção primária. Na Espanha, a atenção primária de
saúde (APS) tem uma avaliação sempre positiva por parte dos usuários e, os
indicadores de mortalidade prematura (anos potenciais de vida perdida) são
menores nos países da Organização de Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) com score elevado para APS, mesmo se controlados os
determinantes econômicos, demográficos, de recursos e estilo de vida.
A maior diferença entre seus sistemas ocorre por conta de co-pagamentos
importantes em Portugal que são mínimos na Espanha e, pelo alto grau de
descentralização da gestão nesse país (Comunidades Autônomas), quando
comparado ao primeiro. Em ambos há uma densidade médica alta, com
menor oferta de leitos e de recursos de enfermagem, em relação ao contexto
europeu e aos padrões internacionais. Nos dois países há um processo
avançado de privatização com a introdução de modelos de mercado (Private
Finance Iniciative – PFI). (CONILL; FERNANDES, op. cit)
Como dito anteriormente a segmentação do acesso é o traço predominante
dos sistemas latino-americanos. Dentro desse modelo, aproximadamente um
terço da população tem algum tipo de seguro social, um terço utiliza serviços
do setor público e o outro terço o setor privado, através de pagamento direto
ou de operadoras de seguro, em franca expansão a partir dos ajustes
neoliberais. (CONILL; FERNANDES, op.cit.).
No tocante à atenção primária de saúde, há uma grande diversidade nos
significados e interpretações acerca da APS. Predominam as seguintes
modalidades: atenção primária integrada em programas de saúde materno-
infantil (Bolívia, El Salvador, Nicarágua); APS como porta de entrada e eixo
estruturante do sistema público (Brasil, Chile, Costa Rica); experiências
municipais em sistemas com universalização incompleta e baseados em
seguros (Colômbia, Argentina). Existem iniciativas mais recentes como a
criação, em 2007, do Sistema Nacional Integrado de Salud (SNIS) no Uruguai
que contempla uma orientação para a APS e, no Paraguai a implantação de
“Unidades de Atención a la Familia” como porta de entrada do sistema
público em 2008. (CONILL; FERNANDES, op. cit. )
No Brasil, desde o final dos anos de 1990, a Estratégia da Saúde da
Família/ESF tem tido uma importante expansão 14 com vários estudos
demonstrando resultados positivos sobre as desigualdades, hospitalizações
evitáveis, modo de prática, equipe ampliada, agentes comunitários, com
apoio sustentado da gestão federal, estadual e municipal. Alguns dos pontos
negativos assinalados se referem à rotatividade de profissionais pela ausência
de planos de carreira, baixa densidade tecnológica, preponderância dos
14
Em janeiro de 2015 o PSF estava implantado em 5.458 municípios, contando com 47.824 equipes
(básicas) com uma cobertura estimada de 62% da população.
programas verticais com um "déficit curativo" (CONILL, 2008; GÉRVAS J;
FERNÁNDEZ,2011, apud CONILL, 2012).
Capítulo 4. Análise da Matriz de Indicadores
4.1. Determinantes Sociais
4.1.1 Dimensão Demográfica
A América Latina convive com um processo demográfico caracterizado por
uma diminuição mais ou menos acelerada das taxas de crescimento
populacional e aumento da expectativa de vida. Nos últimos anos, taxa de
crescimento populacional baixou de 1,35 por 100.000 habitantes no período
2000-2005 para 1,06 por 100.000 habitantes no período 2010-2015. Nesse
mesmo intervalo, a expectativa de vida ao nascer de ambos os sexos
aumentou de 72,4 anos para 74,3 anos (CEPAL, 2014a) Essa situação está
acompanhada pela redução da proporção dos grupos mais jovens (até 14 anos)
e aumento da população em idade potencialmente produtiva (15-64 anos) e
da população idosa (65 anos e mais).
Como há um crescimento proporcionalmente maior do segmento em idade
produtiva (15 a 64), do que da população economicamente dependente (0 A
14 anos e de 65 anos e mais) há uma redução na razão de dependência. Na
America Latina esse indicador baixou de 60,4 em 2000 para 53,4 em 2010. É o
chamado "bônus" demográfico. Este fenômeno para ser aproveitado, no
entanto, exige que parcela maior da população em idade produtiva seja
adequadamente capacitada educacionalmente e empregada da forma mais
produtiva possível, nas condições de cada país.
Para as políticas sociais e econômicas essa situação apresenta diversos
desafios como a necessidade de gerar novos postos de trabalho; responder
adequadamente às necessidades de educação técnica e universitária, tudo
isso sem perder de vista a necessidade de expandir, desde agora, os serviços
direcionados para a terceira idade principalmente os de saúde, previdência e
assistência social.
No conjunto de países selecionados da América Latina, que fazem parte da
Matriz, esse fenômeno está bem caracterizado: todos apresentaram no
período de 2000 a 2011 uma diminuição do percentual da população menor de
15 anos e aumentos da participação dos grupos populacionais de 65 e mais
anos e, principalmente, do grupo de 15 a 64 anos.
Espanha e Portugal, por seu turno, apresentam estruturas populacionais mais
estabilizadas. Na Espanha a participação da população menor de 15 anos, de
15 a 64 anos e de 65 anos e mais se mantém sem alteração entre 2000 e 2011.
Em Portugal há uma pequena diminuição no grupo de menores de 15 anos e no
grupo de 15 a 64 anos, com ligeiro crescimento (dois pontos percentuais) no
grupo de 65 anos e mais (Tabela 3 )
Estas diferenças na estrutura demográfica se refletem na razão de
dependência total da população. Quanto maior for o valor dessa razão15,
significa que um maior número de pessoas consideradas inativas (ou
dependentes) devem ser subsidiadas por pessoas da idade ativa. Como mostra
a Tabela 4, a seguir, a razão de dependência dos países sul americanos
selecionados, apesar de vir diminuindo principalmente em função do declínio
da taxa de natalidade, ainda é superior ao da Espanha e Portugal. A diferença
está, no entanto, no fato que nos países sul americanos o grupo que tem
maior peso na composição da população dependente são os menores de
15
População menor de 15 anos + população com idade de 65 anos e mais multiplicado por 100/ população de 15 a 64 anos
quinze, que, em alguns casos como o do Paraguai, chega a ser seis vezes
superior ao grupo de 60 anos e mais. Na Espanha e Portugal o grupo de 65 e
mais anos tem uma representação levemente superior aos menores de 15 anos
no total da população dependente (Tabela 3).
Chama atenção a situação do Brasil que, devido à rápida queda da natalidade
principalmente nas décadas de 70-80, já apresenta uma taxa de dependência
igual à da Espanha. Contudo, na Espanha o grupo de maior participação é o de
idosos, enquanto que no Brasil ainda é o grupo de menores de 15 anos. Ainda
como consequência da queda brusca na natalidade, o Brasil deverá a partir
dos próximos anos começar a ter redução na participação da população
economicamente ativa no total da população.
4.1.2 - Dimensão Socioeconômica
a) Renda
Na avaliação das condições econômicas da população deve ser levado em
consideração não somente o valor absoluto da renda per capita disponível,
mas, principalmente, outras medidas derivadas, como são as medidas de
pobreza e de indigência e, também, as medidas de concentração da renda,
como índice de Gini, este utilizado para medir o grau de desigualdade na
distribuição.
Os dados da Tabela 5. mostram o crescimento do PIB dos países selecionados.
Com os dados em dólares correntes se observa que Argentina e Brasil são os
que apresentam maior PIB per capita entre os países da América Latina,
mesmo assim o PIB per capita da Espanha é mais do que o dobro. Verifica-se
também que o crescimento, com exceção da Argentina, foi bastante intenso
em todos os países selecionados da América Latina, especialmente no Peru
b) Desigualdade
O crescimento da renda foi acompanhado por uma redução da desigualdade
na distribuição dos rendimentos em todos os países latino-americanos
incluídos no OIAPSS. Em alguns países como Colômbia e Paraguai a
diminuição foi modesta. Em outros, como Brasil, Peru e Argentina, os
decréscimos no Gini se situaram entre 5,4, 9,1 e 8,1 pontos, respectivamente,
comparando o período de 2000/2001 e 2011/2012. Portugal teve pequena
diminuição no Gini e a Espanha apresentou um pequeno aumento da
concentração de renda entre 2000 e 2012. Contudo, deve ser salientado que o
Gini de 2012 em Portugal e na Espanha, 35 e 33, respectivamente, ainda são
bastantes inferiores ao da Argentina, que é o pais com renda menos
concentrada entre os países analisados da América Latina (Tabela 6 ). Em
2008, o índice de Gini da Noruega, um dos países com menor desigualdade na
distribuição de renda era de 25. Em 2007, os Estados Unidos, sempre citado
como exemplo de país desenvolvido e desigual, o Gini era de 45.
Conforme analisado no capítulo anterior, a proporção de pobres e indigentes
vem diminuindo na América Latina. No caso da pobreza a redução para a
America Latina foi de 43,9% da população em 2002 para 28% em 2014. A
extrema pobreza, por seu turno, diminui de 19,3% da população em 2002 para
12% em 2014 (Cepal, 2014c). Essas medidas, realizadas pela Cepal, se
baseiam na capacidade de adquirir uma cesta de insumos essenciais. Existem,
contudo, outras medidas utilizadas para medir a pobreza e indigência ou
pobreza extrema. O Banco Mundial, por exemplo, utiliza o valor de 1,25
dólares por dia, ajustado pela paridade de poder de compra (PPP) como linha
de pobreza extrema (indigência). Esta medida foi utilizada pelas Nações
Unidas como o principal indicador para monitorar o primeiro Objetivo de
Desenvolvimento do Milênio16. Outra linha utilizada pelo Banco Mundial é de
US$ 2 PPC per capita ao dia. Tomando como base este último valor, a linha de
pobreza teve a seguinte evolução no período entre nos anos de 2004/2006 e
2009/2010: Argentina (3,1% para 1,7%); Brasil (8,5% para 5,3%); Colômbia
(15,8% para 6,8%); Paraguai (6,7% para 5,7%); Peru (6,1% para 4,1%),
conforme dados do Banco Mundial (Tabela 6a).
16
Até 2015 reduzir a taxa de pobreza extrema do mundo à metade do nível de 1990.
c) Emprego
Em todos os países selecionados da América Latina houve diminuição da taxa
de desemprego de 2000 a 2012. Em alguns caiu fortemente como é o caso da
Argentina e Brasil, principalmente se considerarmos como ponto inicial os
anos de 2002. Nos demais países selecionados da América Latina a diminuição
foi menor, mas o fato relevante é que na crise de 2008/2009 e nos anos pós
crise as taxas de desemprego continuaram sem alteração (Paraguai) ou ainda
declinaram levemente nos demais países latino-americanos analisados. Por
outro lado, Espanha e Portugal, que tinham taxas de desemprego mais ou
menos estabilizadas até 2007/2008, apresentam crescimento desde então,
chegando a 24,8% da população economicamente ativa em 2012 no caso da
Espanha e a 15,8% em Portugal (Tabela 7)
Observou-se um aumento da organização da estrutura ocupacional nos cinco
países latino americanos, com diminuição da participação de trabalhadores
informais de baixa produtividade. Segundo categorização da Cepal, são
considerados trabalhadores informais (i) empregadores e assalariados em
microempresas; (ii) autônomos não qualificados e (iii) os empregados
domésticos. Desta forma, houve uma diminuição da informalidade na
Argentina (43% em 2000 para 37,7% em 2012) e no Brasil (45,6% em 2001 para
37,3% em 2012). Diminuições menores ocorreram no Paraguai e Peru, onde as
taxas são bastante elevadas em 2012 (53,3% e 57,1%, respectivamente). Na
Colômbia taxas elevadas se mantiveram entre 2008 (58,6%) e 2012 (58,9%)
(Tabela 8)
d) Educação
O acesso a educação básica 17 tem aumentado na América Latina,
principalmente na educação fundamental, apesar dos níveis de acesso serem
ainda bastante inferiores aos observados nos países da OCDE.
Os anos de escolaridade geral esperados para o ingressante estão aumentando
em todos os países selecionados e pelo menos dois deles, Argentina e Brasil,
se aproximam do valor observado em Portugal e Espanha (Tabela 9)
17
Compreende três etapas: a educação infantil (para crianças com até cinco anos), o ensino fundamental (para
alunos de seis a 14 anos) e o ensino médio (para alunos de 15 a 17 anos).
Um problema persistente em todos os países é, entretanto, a qualidade da
educação. A educação básica tem sido avaliada através do PISA (Programme
for International Student Assessment) que é um programa internacional de
avaliação comparada, aplicado a estudantes da 7ª série em diante, na faixa
dos 15 anos, idade em que se pressupõe o término da escolaridade básica
obrigatória na maioria dos países. As avaliações feitas estão relacionadas às
áreas do ensino de matemática, ciências e leitura. No caso da leitura, por
exemplo, há uma nota mínima de 625,6, para os estudantes capazes de
completar itens de leitura sofisticados e inferir qual informação é relevante
para o item, avaliar criticamente e estabelecer hipóteses; na nota mínima de
334,8, os estudantes são capazes apenas de responder os itens de leitura
menos complexos desenvolvidos para o PISA, entre outros requisitos. Em 2012,
em um conjunto de 64 países, Brasil, Argentina, Colômbia e Peru ficaram na
58ª, 59ª, 62ª e 64ª posições. Portugal e Espanha ficaram melhor situados na
31ª e 33ª, respectivamente (OCDE, 2014)
Conforme pode ser visto na tabelas a seguir todos os países selecionados
mostram evolução positiva das médias em matemática, leitura e ciências.
Espanha e Portugal se aproximam da média dos países da OCDE. As maiores
defasagens dos países da América do Sul em relação a Espanha e Portugal
estão nos campos da matemática e de ciências e, embora a diferença tenha
diminuído no decorrer dos anos, em 2012 ainda era bastante relevante
(Tabelas 10, 11, 12 ).
4.1.3. Condições de Vida
a) Nutrição
Apesar da desnutrição ser ainda um problema em algumas áreas e
populações da América Latina, já começa a chamar a atenção o sobrepeso.
Considera-se sobrepeso em adultos do sexo masculino com idades entre 15
anos e mais, aqueles indivíduos cujo Índice de Massa Corporal (IMC) é superior
a 25 kg/m218. Um percentual elevado da população com sobrepeso pode ser
refletir hábitos inadequados de alimentação e representa um fator de risco
para doenças crônicas. Como pode se observar na Tabela 13 o sobrepeso na
população masculina de 15 e mais cresceu em todos os países. Os índices
variam de 77,7% da população masculina na Argentina e 44,7% no Paraguai
em 2010. Portugal e Espanha apresentam um índice de 60,9% e 57,9%
respectivamente.
Também entre a população feminina o percentual de sobrepeso na população
maior de 15 anos cresce em todos os países analisados. É interessante
verificar que o percentual de sobrepeso na população feminina é maior do
18
O IMC é um índice baseado no peso em relação a altura, ou o peso em quilogramas dividido pelo quadrado da altura em metros
que entre a masculina em três países: Brasil, Paraguai e Peru (Tabela 13a)
b) Acesso a instalações sanitárias adequadas
Na América Latina 89,3% da população urbana tinha, em 2012, acesso a
instalações sanitárias adequadas. 19 Essa cobertura se reduz para 62,3% entre
a população de áreas rurais. Dos países selecionados da AL as maiores
cobertura são encontradas na Argentina, que se aproxima dos valores de
Espanha e Portugal, onde os percentuais de cobertura são próximos de 100%
para população urbana e rural. No demais países a cobertura em áreas
urbanas é superior a 80% da população, variando de 81,2% no Peru a 87% no
Brasil e 96,1% no Paraguai. Nas áreas rurais, a cobertura é mais baixa, vai de
44,8% no Peru a 65,7% na Colômbia. Brasil com 49,2%. Paraguai com 52,5% e
Peru com 44,8% de cobertura nas áreas rurais estão abaixo da média da
América Latina, que é de 62,3% em 2012 (Tabela 14).
19
O indicador refere-se a percentual da população com vasos sanitários com uma
conexão de rede de esgotos ou fossas sépticas.
c) Abastecimento de água
O abastecimento de água adequado refere-se à populaçãoem domicílio com
pelo menos um ponto de acesso a água potável. Neste item, a coberturra da
população urbana já é bastante razoável, com exceção do Peru (91,2%) e
Colômbia (96,9%), nos demais países o acesso é superior a 99% da população
urbana em 2012.
Na área rural a cobertura média da América Latina é de aproximadamente
82% da população. Dos países selecionados, Peru e Colômbia estão abaixo
dessa média. Brasil, um pouco acima, com 85%. Em Portugal e na Espanha a
cobertura populacional com abastecimento de água adequado nas áreas rurais
atinge a 99,9% e 100%, respectivamente. (Tabela 15)
d) Violência, Saúde Mental e Mobilidade Urbana
Indicadores importantes para avaliação das condições de vida são os níveis de
violência e as condições de mobilidade urbana. Na América Latina convive-
se, em certas regiões, em contextos que favorecem o aparecimento de
conflitos que são resolvidos por meio de ações violentas. Esses contextos tem
a ver com problemas de tráfico de drogas, em alguns países, com situações de
desigualdades sociais marcantes e de conflitos pela posse da terra em outros.
Na verdade, não existe um fator único que explique porque algumas pessoas
se comportam de forma mais violenta ou porque comunidades ou
sociedades são mais violentas do que outras (SOUZA; MINAYO, 2009).
Segundo a OMS, a compreensão do fenômeno da violência deve levar em
consideração uma série de fatores tais como: i) fatores individuais que dizem
respeito às características próprias de cada pessoa tornando-a mais suscetível
a ser uma vítima ou promotora de atos violentos; ii) fatores comunitários que
dizem respeito aos locais de moradia, trabalho, à escola e vizinhança; (iii)
fatores sociais que criam condições favoráveis à irrupção da violência como
as desigualdades econômicas, sociais e culturais, a miséria e a exclusão, bem
como o machismo e métodos violentos para solução de conflitos (OMS, 2002)
A mortalidade por homicídios nos países selecionados apresenta grande
variações. Portugal e Espanha apresentam taxas bastante baixas: em torno de
1 óbito por 100.000 habitantes, taxa que mantém entre 2000 e 2010. Nos
países sul americanos, a taxa mais baixa é a da Argentina: 4,3 óbitos por
100.000 habitantes em 2011. Colômbia e Brasil, apesar de mostrarem
pequena redução na mortalidade por homicídios entre 2000 e 2011, ainda
apresentam taxas bastante elevadas: Colômbia, 53 por 100.000 e Brasil, 26
por 100.000. (Tabela 16)
Se a taxa de homicídios apresenta grandes diferenças entre os países, o
mesmo não acontece em relação à taxa de suicídios, como demonstram os
dados da Tabela 17. De acordo com dados do ano de 2008, se verifica que as
taxas mais elevadas foram encontradas na Argentina e Portugal (7,5 e 6,7 por
100.000 habitantes, respectivamente) e as mais baixas no Paraguai e Brasil
(3,9 e 4,8 por 100.000 habitantes, respectivamente).
As cidades maiores, sobretudo as megalópoles, vem enfrentando,
especialmente nos países em desenvolvimento, problemas relacionados ao
crescimento desordenado e não planejado, com transporte público
insuficiente e aumento da frota de transporte individual.
O aumento da frota de veículos , o aumento da poluição, congestionamentos
e acidentes são problemas que desafiam o direito de ir e vir das pessoas de
forma rápida, eficiente e segura.
Um indicador das condições de mobilidade urbana é a mortalidade por
acidentes de trânsito. Dentre os países analisados, essa taxa é mais baixa na
Espanha: 5,4 óbitos por 100.000 habitantes em 2010. Em países da América do
Sul, como Brasil e Paraguai, a taxa é superior a 20 por 100.000, ou seja,
quatro vezes maior. (Tabela 18)
4.2. Condicionantes
4.2.1. Complexo Produtivo
a) Gasto com Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação em Saúde
A produção da saúde, especialmente a provisão de serviços médico
assistenciais, articula um conjunto de setores industriais e segmentos
econômicos (GADELHA, 2003) As indústrias que integram esse complexo, em
geral, caracterizam-se por possuir elevado grau de inovação e de
conhecimento científico e tecnológico, o que lhes confere alto dinamismo.
Nas últimas cinco décadas, a área de saúde tem vivenciado um processo de
desenvolvimento científico e tecnológico sem precedentes. As tecnologias
médicas compreendem "todos os medicamentos, equipamentos e
procedimentos médicos e cirúrgicos usados no cuidado médico, bem como os
sistemas organizacionais de apoio imediato dos quais esse cuidado depende"
(OTA, 1994).
Alguns segmentos, como a indústria farmacêutica, se caracterizam como
oligopólios que tem como principais armas competitivas as atividades de
pesquisa e desenvolvimento (P & D) e as atividades de marketing (GADELHA,
2002). Agrupadas por grandes classes terapêuticas, as empresas líderes,
mantém forte relacionamento com as instituições científicas. GADELHA (2002
op. cit.) classifica essa indústria como um "oligopólio baseado nas ciências". A
área de medicamentos é um setor bastante protegido pelo instituto de
patentes. A quantidade de patentes registradas é, de certa forma, um
indicador da infraestrutura de P & D de diferentes países.
Ademais, as atividades com maior incorporação tecnológica se concentram
nos países desenvolvidos, ficando com os demais países, a depender do porte
de seus mercados, a produção final (formulação) dos medicamentos, mas não
dos insumos básicos. Esta configuração da estratégia de localização espacial
das atividades de pesquisa, desenvolvimento e produção, tem repercussão nos
registros de patentes e na balança comercial dos produtos da indústria da
saúde.
Para a área de pesquisa e desenvolvimento só foram identificados, em bases
internacionais20, os gastos estimados para apenas três dos países integrantes
do OIAPSS: Argentina, Espanha e Portugal. Nesse três países, entre 2005/2007
e 2011 houve crescimento dos gastos com pesquisa e desenvolvimento em
saúde. O crescimento apresentou taxas mais elevadas na Argentina e
Portugal. Estes países mais do que dobraram os valores aplicados. Contudo, o
gasto nesses dois países foi bastante inferior ao identificado para Espanha nos
anos de 2007 e 2011 (Tabela 19).
20
OCDE - Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
Apesar das diferenças nos valores absolutos, a participação percentual dos
gastos em pesquisa e desenvolvimento em saúde no gasto total em P & D
desses países não chega a ser tão diferente: em 2011 foi de 13,3% do gasto
total em P & D na Argentina, 18,6% na Espanha e 14,2% em Portugal.
Nesses três países, com base em dados estimados para 2005/2007 e 2011, o
gasto privado em pesquisa e desenvolvimento em saúde foi quase sempre
superior ao gasto público. Somente a Espanha, em 2011, apresenta gasto
público levemente superior ao privado (Tabela 20)
Os gastos com pesquisa e desenvolvimento em saúde é também mais elevado
na instituições de ensino superior da Espanha, do que nos outros dois países.
Dados de 2011, indicam um valor de US$ 810,7 milhões (em dólares PPP) na
Espanha e de US$ 215,8 milhões e US$ 207,5 milhões, para Argentina e
Portugal, respectivamente.
b) Registro de patentes
O número de patentes, segundo a origem do proponente, é uma
aproximação do grau de desenvolvimento de tecnologias médicas no país e o
resultado de uma cadeia de incentivos às políticas de desenvolvimento e
inovação.
Em relação a este indicador, Espanha e Brasil lideram o processo de
registro entre os países selecionados, ainda que o crescimento do número de
registros tenha sido maior na Espanha do que no Brasil. Enquanto o Brasil teve
um crescimento de 54% no número de registros no período de 2000 a 2011
(ano com maior número de registros), a Espanha teve um crescimento
superior no mesmo período, alcançando um incremento de 71%. Merece
também atenção o comportamento observado na Argentina, onde se verifica,
segundo os dados analisados, uma redução no período 2000 a 2006.
Da mesma forma, também nas patentes na área da indústria
farmacêutica, Brasil e Espanha são os países, entre o grupo selecionado, que
apresentam um número maior de registros. Na Espanha os registros mais que
quadruplicaram no período 2000 a 2012, enquanto que no Brasil o crescimento
não foi suficiente para duplicar o número de registros. Ademais, o número de
registros da Espanha é basntante superior ao do Brasil (Tabela 21a).
c) Balança Comercial
Todos os países tem saldo comercial negativo na balança comercial de
medicamentos, ou seja, as importações superam as exportações. É importante
notar, no entanto, que Espanha e Portugal apresentam, nos últimos, anos uma
redução do déficit em sua balança comercial de produtos farmacêuticos,
enquanto todos os países da América Latina apresentam déficits crescentes.
Chama também atenção o déficit comercial do Brasil, mais de US$ 6,0 bilhões
em 2012, que foi quase três vezes superior ao da Espanha e Portugal no
mesmo ano (Tabela 22).
E, em quase todos, o crescimento das importações no período de 2008 a 2012
foi maior do que as exportações (Tabelas 23 e 24). Espanha tem um
desempenho muito superior ao dos demais países no tocante ao volume das
exportações. As exportações da Espanha em 2012 tiveram um valor oito vezes
superior às realizadas pelo Brasil no mesmo ano, conforme indica a tabela 23.
Apenas Espanha e Portugal tiveram um crescimento das exportações superior
ao das importações, ainda que o saldo de suas balanças comerciais continuem
negativos (Tabela 22).
b) Incorporação de Tecnologia
As tecnologias em saúde podem ser agrupadas segundo a sua (i) natureza
(medicamentos, imunizantes, equipamentos, procedimentos médicos,
sistemas logísticos); (ii) propósitos (promoção, prevenção, diagnóstico,
tratamento, gestão); (iii) complexidade ou densidade tecnológica (GOODMAN,
1998).
A incorporação de novas tecnologias é responsável pelos avanços sem
precedentes na assistência à saúde, mas também pela espiral crescente dos
custos dos sistemas de saúde nas últimas décadas.
Diversos autores (CUTLER, 1992 E NEWHOUSE, 1995), creditam à incorporação
tecnológica principalmente na área de medicamentos e equipamentos, a
maior proporção do aumento exponencial de gastos em saúde verificado nos
últimos anos.
Tanto as questões relacionadas a eficácia, efetividade e segurança das novas
tecnologias, como a questão dos custos, tem obrigado os sistemas de saúde,
particularmente os majoritariamente financiados com recursos públicos, a
estabelecerem critérios de incorporação, inclusive regras de distribuição
espacial, no caso de equipamentos de diagnose e terapia de maior densidade
tecnológica, com o objetivo de facilitar o acesso e obter uma utilização mais
racional.
Este é o caso de equipamentos como, por exemplo, os aceleradores lineares e
os equipamentos de radioterapia, que são utilizados no tratamento do câncer.
Avaliada pela disponibilidade desses equipamentos, que representam um
determinado tipo de tecnologia, pode-se verificar que, entre os países
selecionados da América Latina, os países que apresentam maior grau de
incorporação de tecnologia seriam Argentina e o Brasil. Contudo, mesmo
assim o grau de incorporação, segundo o parâmetro de disponibilidade por
milhão de habitantes é bastante inferior, nos dois casos, à existente na
Espanha e Portugal (Tabela 25 e 26). Em 2013 havia na Espanha e Portugal
3,49 acelerador linear por milhão de habitante, enquanto que no Brasil, sem
levar em conta a área do país, a disponibilidade era de 1,43 acelerador por
milhão de habitante (Tabela 25)
Da mesma forma, disponibilidade de equipamentos de radioterapia por milhão
de habitantes é mais elevada na Espanha (4,16 por milhão) e Portugal (4,05
por milhão), do que nos países da América do Sul. Mesmo na Argentina, onde
a disponibilidade desse equipamento é maior, a taxa de unidades de
radioterapia, em 2013, é de apenas 2,75 por milhão de habitantes, caindo
para 0,59 por milhão no Paraguai. (Tabela 26).
4.2.2. Financiamento
a) Gasto Setorial
Os gastos com saúde têm crescido em todo o mundo. Representavam 3% do
PIB mundial em 1948. Passaram para 8,7% do PIB em 2004 (OPAS, 2007). No
período 1998-2003, a taxa média anual de crescimento dos gastos com saúde
(5,7%) superou a taxa média de crescimento da economia mundial que foi de
3,6% (HSIAO, 2007).
Maior nível de gasto total com saúde não significa automaticamente serviços
mais eficientes, efetivos e equitativos. Neste aspecto, os modelos de
financiamento e de organização dos sistemas parecem exercer grande
influência. Os Estados Unidos, por exemplo, cujo sistema é fundamentalmente
baseado em seguros privados, despende, anualmente, mais de 16% do PIB com
saúde. Não obstante, tem a mais alta taxa de mortalidade infantil e a mais
baixa expectativa de vida entre os países de renda-alta (HSIAO, 2006).
O nível de participação pública no financiamento do sistema também provoca
diferenças: a Índia, com um sistema médico-hospitalar que é basicamente
privado, onde predomina o pagamento no ato (out-of-pocket), gastou 4,8% do
PIB com saúde em 2003 e apresentou uma mortalidade infantil cinco vezes
maior que o Sri Lanka, que despendeu 3,5% do PIB, mas com serviços
financiados predominantemente com recursos públicos (HSIAO, 2007).
Entre os países analisados, o gasto per capita total cresceu no período 2000 a
2012 em todos os países. Os maiores crescimento ocorreram no Peru e Brasil,
com um crescimento 110% e 106%, respectivamente. As diferenças nos per
capita dos países da America Latina e Espanha e Portugal são importantes:
mesmo a Argentina que tem o maior gasto per capita em saúde dos países
selecionados da América Latina, ainda assim tem um gasto quase duas vezes
inferior ao de Portugal e duas vezes e quatorze décimos inferior ao da
Espanha em 2012 (Tabela 27).
Como proporção do PIB, com exceção do Peru e da Colômbia, todos os demais
países tem um gasto total bastante similar. Argentina, Brasil, Espanha e
Portugal comprometem com saúde o equivalente entre 8,5% e 9,6% do PIB.
Paraguai alcançou o equivalente a 10,3% do PIB em 2012 (Tabela 27a).
Esses dois indicadores, gasto per capita e gasto como proporção do PIB,
devem, entretanto, serem analisados em conjunto, para se ter um
entendimento mais preciso da condição de cada país. O percentual do PIB
reflete a prioridade relativa dos gastos com saúde, enquanto o gasto per
capita guarda relação com a magnitude do PIB de cada país e o tamanho de
sua população. Assim, por exemplo, apesar do Paraguai ter, entre os países
selecionados, o maior comprometimento do PIB com saúde, o seu gasto per
capita é um dos mais baixos, porque o tamanho de sua economia não é dos
maiores. (Tabela 27a). De outra parte, embora Argentina e Brasil gastem
com saúde percentuais do PIB quase equivalentes, a magnitude o PIB e o
tamanho da população de cada país determinam as diferenças no gasto per
capita. (Tabelas 27 e 27a)
b) Composição Público x Privada
O financiamento dos serviços de saúde é compartilhado entre fontes
públicas e privadas praticamente em todos os países. Em geral, tanto nos
países desenvolvidos como naqueles em desenvolvimento, a maior parte do
financiamento da saúde provém de fontes públicas21. Os recursos privados são
despendidos por meio de desembolso direto (out-of-pocket) ou mediante pré-
pagamento a empresas de planos e seguros privados de saúde. O desembolso
direto, tão antigo quanto a medicina, representa a forma mais iníqua e
instável de financiamento; paradoxalmente, tem papel mais relevante,
especialmente nos países mais pobres (OMS, 2000).
Nos países de renda alta a participação do setor público corresponde, em
média, a 62% do gasto total, enquanto que nos países de renda baixa, apesar
de ter aumentado nos últimos anos, não alcança 39% do dispêndio total (OMS,
2012).
Na maioria dos países analisados, com exceção do Brasil e do Paraguai, a
participação pública é maior que a privada. Esse é o caso da Argentina,
Colômbia, Espanha, Peru, Portugal e Espanha. Nesse subgrupo a participação
de fontes públicas no gasto total com saúde variou de 58% no Peru a 75% na
Colômbia em 2012. Colômbia e Argentina, com uma participação pública de
21
Duas importantes exceções são os Estados Unidos da América e o Brasil.
75% e 69% no gasto total em saúde, respectivamente, são os países latino
americanos que mais se aproximam de Espanha (73%) e Portugal (62%).
Situação diferente é encontrada no Brasil e Paraguai onde a participação de
fontes públicas é inferior ao gasto privado e foi estimada em 46% e 42%,
respectivamente, em 2012 (Tabela 28)
A composição do gasto privado também é importante em termos
analíticos. De uma maneira geral, há uma justificada preocupação com o
desembolso direto - out-of-pocket (OOP) decorrente de dois efeitos adversos
dessa prática no processo de construção de um sistema de saúde mais
equitativo e nas consequências que pode, eventualmente, causar às família.
Em primeiro lugar, o OOP pode restringir o acesso aos serviços (WHO, 2010),
sobretudo, quando utilizado como forma de participação no financiamento de
serviços públicos (copagamento). Em segundo, porque sistemas com forte
participação do desembolso direto, especialmente na ausência de um sistema
público com cobertura mais efetiva, podem sujeitar as famílias a realizar
gastos imprevistos com a saúde de seus membros que podem absorver parte
significativa do orçamento familiar, levando a família a restringir o consumo
de outros bens, vender ativos ou se endividar. Ou seja, a despesa com saúde
pode atingir proporções catastróficas para essas famílias. Já os esquemas de
pré-pagamento organizados sob a forma de pooling por planos e seguros
privados podem minimizar esses riscos que são diluídos entre todos os usuários
dessa modalidade de serviços. Por isto, também é interessante identificar, no
caso do gasto privado, qual é a evolução do desembolso direto e das formas
privadas de pré-pagamento. Nos dois países em que houve aumento da
participação do gasto privado (Colômbia e Portugal)(Tabela 28), o aumento
se deu principalmente por meio do gasto direto. Entre os países em que houve
aumento da participação do gasto público, em dois, Espanha e Brasil, houve
um aumento da participação do gasto com planos e seguro no gasto privado,
enquanto que nos demais mesmo com diminuição do gasto privado total,
houve um aumento na participação do gasto privado direto (Tabela 29).
A proporção do gasto com saúde no gasto público total representa, por sua
vez, o grau de prioridade da saúde vis a vis outras despesas governamentais.
Neste particular, a situação mais desfavorável é a do Brasil, onde o gasto
público com saúde representa apenas 7,6% do gasto governamental. (Tabela
30).
4.3. Desempenho
Acesso, efetividade e adequação técnica constituem três importantes sub-
dimensões para avaliação do desempenho ou qualidade dos sistemas de saúde.
4.3.1. Acesso
a) Cobertura
a1) Consulta Pré-Natal
Cobertura de cuidados pré-natais é um indicador de acesso e utilização dos
cuidados de saúde durante gravidez. O período de pré-natal apresenta
oportunidades para intervenções que podem ser vitais para a saúde e bem-
estar das gestantes e de seus filhos.
Consultas de pré-natal é um indicador cuja série está bastante incompleta,
além de não terem sido identificados dados para todos os países. Nada
obstante, os valores apresentados sugerem que as taxas de cobertura
estejam aumentando. Em 2008, 90,5% das mães de nascidos vivos do Paraguai
realizaram 4 consultas no pré natal, em 2004 o percentual ainda era de 78%.
Em 2009, no Brasil, esse percentual foi de 90,5% das mães. Foi de 88,6% na
Colômbia em 2010 e chegou a 94,4% no Peru em 2012 ( Tabela 31)
a2) Assistência ao Parto
Todas as mulheres devem ter acesso a cuidados especializados durante a
gravidez e o parto para assegurar a prevenção, detecção e tratamento das
complicações. Assistência por pessoal de saúde devidamente treinado e com
equipamento adequado é fundamental para reduzir a mortalidade materna. A
proporção de partos assistidos por pessoal de saúde qualificado é usado como
um indicador proxy para avaliação dos cuidados à saúde materna
Também com relação a este indicador não estão disponíveis, pelo menos
neste estudo, séries mais completas do percentual de parto realizado por
pessoal especializado. Os dados apresentando permitem, contudo, verificar
que apenas no Paraguai e no Peru o percentual é mais baixo: mais de 15% dos
partos não teriam sido assistidos por pessoal qualificado, a despeito dos
resultados terem melhorado no período considerado. Nos demais países o
percentual de partos assistidos por pessoal qualificado vai de 97% no Brasil
(dado de 2006) a 100% em Portugal (dado de 2010) (Tabela 32)
b) Oferta de Recursos (Leitos)
A oferta de leitos é influenciada por fatores socioeconômicos, epidemiológicos
e demográficos, tais como nível de renda, composição etária, oferta de
profissionais de saúde, políticas públicas assistenciais e preventivas. Em geral,
como não há regulação mais forte sobre a oferta privada de serviços, a maior
concentração de leitos está associada à áreas de renda mais alta e
urbanização, condições que atraem investimentos do setor privado de saúde.
Argentina (4,7 por mil habitantes), Espanha (3,0 por mil) e Portugal (3,0 por
mil) são os países com maiores taxas de leitos por mil habitantes em 2011 e
2012, o que guarda certa adequação com a estrutura populacional mais
envelhecida desses países. De qualquer forma,a taxa da Argentina, mais
elevada do que Espanha e Portugal, deve estar associada a outros fatores,
além da estrutura populacional mais envelhecida.
4.3.2. Efetividade
a) Mortalidade Evitável
a1) Mortalidade Infantil
A taxa de mortalidade infantil expressa a probabilidade de sobrevivência de
uma criança no seu primeiro ano de vida. Expressa também as condições
sociais, econômicas e ambientais em que vivem as crianças e suas famílias e
permite inferir de forma indireta o acesso, efetividade e a qualidade dos
serviços de saúde. Como os dados de morbidade, muitas vezes não estão
disponíveis, as taxas de mortalidade têm sido usadas para identificar
populações vulneráveis. É um dos melhores indicadores de saúde e condições
de vida, sendo amplamente utilizado em estudos de desigualdade (VIANNA,
2001).
A mortalidade infantil pode ser desdobrada em três componentes principais
de acordo com o perfil de causas básicas associadas a cada um dos períodos
do primeiro ano de vida. O período neonatal precoce (0 a seis dias) que é
fortemente influenciado pelas condições de gestação e parto; o período
neonatal tardio (7 a 29 dias) que é marcado pela presença de alguns efeitos
do parto e também pela presença de infecções, e, finalmente, o período pos
neonatal (30 a 364 dias), sensível ao meio ambiente no qual a criança se
desenvolve.
Em 2000 as taxas de mortalidade infantil dos países selecionados da América
Latina eram elevadas. A Argentina, país que apresentava a menor taxa (18
por mil nascidos vivos), tinha uma taxa quase quatro vezes a observada, no
mesmo ano, em Portugal e Espanha (5,7 e 5,4 por mil nascidos vivos,
respectivamente). No período de 2000 a 2012 todos os países apresentaram
reduções significativas na mortalidade infantil, com destaque para o Brasil e
Peru que apresentaram uma queda de 58% e 53%, respectivamente. A
despeito dessa redução, a taxa do Brasil em 2012 ainda foi mais quatro vezes
à registrada em Portugal e três vezes a da Espanha no mesmo ano (Tabela 34).
As menores taxas de mortalidade infantil na América do Sul são encontradas
no Chile e Uruguai que já em 2010 apresentavam uma taxa de 8 por mil
nascidos vivos.
A redução da moralidade infantil e da mortalidade entre 1 e 4 anos,
principalmente esta última, tem sido associada a ação sobre alguns fatores
determinantes, tais com nutrição, saneamento básico, melhorias de renda,
aumento do nível de educação das mães e aumento da cobertura dos
programas de imunização, bem como da atenção primária de saúde (PAHO,
2012)
a2) Mortalidade Neonatal
A mortalidade neonatal estima o risco de um nascido vivo morrer durante os
primeiros 27 dias de vida. Reflete, de maneira geral, as condições de
assistência pré-natal, ao parto e ao recém-nascido. A mortalidade neonatal é
subdividida em neonatal precoce (mortalidade de 0 a 6 dias) e mortalidade
neonatal tardia (de 7 a 27 dias). A taxa de mortalidade neonatal,
principalmente a neonatal precoce, é de redução mais difícil do que a
mortalidade pós-neonatal. Quanto maior a participação dos óbitos no período
neonatal precoce, mais complexo é atuar sobre as causas das mortes e mais
importantes se tornam as ações e os serviços de saúde relacionados ao pré-
natal, ao parto e ao puerpério. A mortalidade neonatal já está bastante baixa
na Espanha e Portugal onde a taxa era de 2,1 e 2,4 óbitos por mil nascidos
vivos em 2011. No mesmo ano, a mortalidade neonatal no Brasil e Peru
atingiam as taxas de 10,7 e 8 óbitos por mil nascidos vivos, respectivamente
(Tabela 35)
a3) Mortalidade Pós-neonatal
A mortalidade pós-neonatal estima o risco de um nascido vivo morrer dos 28
aos 364 dias de vida. De maneira geral, denota o desenvolvimento
socioeconômico e a infra-estrutura ambiental, que condicionam a desnutrição
infantil e as infecções a ela associadas. O acesso e a qualidade dos recursos
disponíveis para atenção à saúde materno-infantil são também determinantes
da mortalidade nesse grupo etário. Quando a taxa de mortalidade infantil é
alta, a mortalidade pós-neonatal é, frequentemente, o componente mais
elevado.
As taxas de mortalidade pós-neonatal do Brasil e do Paraguai tiveram redução
superior a 50%, entre 2000 e 2011 (Brasil) e 2000 e 2010 (Paraguai). A taxa no
Brasil diminuiu de 9,9 para 4,6 por mil nascidos vivos. No Paraguai passou de
9,2 para 4,0 por mil nascidos vivos. A taxa mais elevada é encontrada no
Peru: 8 por 1000 nascidos vivos em 2011 e as menores na Espanha e Portugal
(Tabela 36).
a4) Mortalidade em menores de 5 anos
A taxa de mortalidade em menores de 5 anos expressa a probabilidade de que
uma criança nascida em um ano ou período específico venha a morrer antes
de completar cinco anos. Expressa também as condições sociais, econômicas e
ambientais em que vivem as crianças e suas famílias. Ademais, permite inferir
de forma indireta o acesso, efetividade e a qualidade dos serviços de saúde
A redução da mortalidade em menores de 5 anos foi uma dos Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio pactuados pela Organização das Nações Unidas. O
objetivo pactuado foi de redução em dois terços a taxa de mortalidade na
infância estimada para 1990, até o ano de 2015. No caso da América Latina e
Caribe isso significa reduzir a taxa de 54 por mil nascidos vivos em 1990 para
18 por mil em 2015. Naturalmente, a meta de redução de dois terços incide
sobre a taxa de cada país. De qualquer forma, segundo relatório de 2014
(ONU,2014), a América Latina está muito próxima de alcançar a meta de
redução. Os dados de 2000 a 2012 confirmam essa tendência de redução e
verifica-se que apenas o Paraguai não havia atingido a meta regional em 2012
(Tabela 37).
A mortalidade em menores de 5 anos, ocorre principalmente no primeiro ano
de vida. Em 2009, por exemplo, das 131.000 mortes em menores de 5 anos
ocorridas na América do Sul, 129.000 ocorreram no primeiro ano de vida. A
mortalidade de menores de 5 anos vem declinando em todos países,
obviamente de forma mais acelerada naqueles que possuíam índices mais
altos. Contudo, as diferenças das taxas entre Espanha e Portugal (4,5 e 3,6
por mil, respectivamente, em 2012) e a dos países selecionados da América
Latina ainda é muito expressiva, mostrando o esforço que ainda deve ser
desenvolvimento em relação à saúde das crianças nestes países. (Tabela 37)
a5) Mortalidade Materna
A taxa de mortalidade materna está, basicamente, relacionada ao estado de
saúde geral da gestante, nível de educação e serviços disponíveis.
Complicações durante a gravidez e no parto são a principal causa de morte e
invalidez entre as mulheres em idade reprodutiva nos países em
desenvolvimento. O indicador reflete a capacidade dos sistemas de saúde
para proporcionar medidas eficazes para prevenir e tratar as complicações
que ocorrem durante a gravidez e o parto.
A redução da mortalidade materna foi outro objetivo pactuado pelos países
até 2015. O objetivo é reduzir em três quartos a mortalidade materna por
100.000 nascidos vivos entre 1990 e 2015. Para 1990 a mortalidade materna
da América do Sul foi estimada em 188 por 100.000 nascidos. Desta forma,
reduzir em três quartos significa alcançar a meta de 47 mortes por 100.000
nascidos vivos em 2015. Em 2009 a taxa já havia descido para 75 (PAHO,
2012). Contudo, dificilmente a meta regional de 47 por 100.000 nascidos vivos
será alcançada até 2015.
Apesar dos progressos, a taxa de mortalidade materna nas regiões em vias de
desenvolvimento - 230 mortes maternas por 100 000 nados-vivos em 2013 – foi
catorze vezes superior à das regiões desenvolvidas, que registraram somente
16 mortes maternas por 100 000 nascidos vivos em 2013. (ONU, 2014).
Na América do Sul os países com menor mortalidade materna, segundo dados
de 2009, são Uruguai (11/100.000) e Chile (17/100.000). Entre os países
selecionados, Espanha e Portugal apresentam taxas inferiores à média das
regiões desenvolvidas e apresentam taxas bastantes inferiores aos países
latino-americanos selecionados. Entre os países selecionados da América do
Sul, em 2010, o Brasil era o que apresentava menor taxa de mortalidade
materna, assim mesmo, sua taxa era 7 vezes maior do que a de Portugal e 9,3
vezes superior à da Espanha no mesmo ano de 2010 (Tabela 38).
As causas de mortalidade materna são diferentes a depender do nível de
desenvolvimento e do grau de cobertura dos sistemas de saúde de cada país.
Nos países de melhor nível de desenvolvimento e sistemas de saúde com
maior cobertura as principais causas de mortalidade materna estão
relacionadas ao aborto inseguro, problemas hipertensivos na gravidez e
hemorragias. Nos países mais pobres, com serviços de saúde com baixa
cobertura, pessoal de saúde menos qualificado, a maioria das mortes
maternas ocorrem no trabalho de parto (PAHO, 2012).
a6) Mortalidade proporcional por doença diarreica
A mortalidade proporcional por diarreias em menores de cinco anos depende
da morbidade dessa doença no grupo etário, da gravidade dos casos e do
acesso ao tratamento adequado. A sua magnitude está associada a incidência
de infecções virais, bacterianas e parasitárias, ocorrência de desnutrição e
condições de saneamento básico, principalmente do abastecimento de água
(VIANNA, 2001).
A mortalidade proporcional, também utilizada para a mortalidade por
infecção respiratória aguda, não é um indicador de risco, uma vez que o
denominador não é a população exposta. É uma medida relativa, que mede a
importância da doença diarreica e das infecções respiratórias agudas, no total
de óbitos em menores de cinco anos. Assim, se houver um aumento dos
óbitos por outras causas, pode ocorrer uma redução na proporção de óbitos
por diarreia ou por infecção respiratória aguda, sem que isso signifique
redução do risco (VIANNA, 2001).
A importância da diarreia aguda como causa básica de óbito em menores de
cinco anos vem diminuindo em todos os países selecionados da América
Latina. Em 2010 variou de 2% dos óbitos em menores de cinco anos na
Argentina e 5% no Paraguai.
a7) Mortalidade proporcional por infecção respiratória aguda (IRA)
Da mesma forma, observa-se uma redução, neste caso não tão acentuada, na
proporção de óbitos por Infeçcão Respiratória Aguda (IRA). Em relação a
Espanha e Portugal a mortalidade por IRA nos países latino americanos
selecionados tem maior participação nos óbitos infantis. Em 2010, a
mortalidade por IRA variou 1% dos óbitos em menores de cinco anos em
Portugal e 10% dos óbitos infantis na Colômbia e Peru, chegando a 11% dos
no Paraguai. Também chama atenção a diminuição de 5 pontos percentuais no
período 2000 a 2010 observada no Brasil e o aumento da proporção no caso da
Argentina (Tabela 40).
Tanto a doença diarreica, como a infecção respiratória aguda são
consideradas causas de morte infantil evitáveis através melhorias na área de
saneamento básico, no caso específico da doença diarreica, e de
intervenções, programas e acesso aos serviços de saúde em ambos os casos.
Como dito anteriormente, uma das metas de Desenvolvimento do Milênio é
reduzir em dois terços, de 1990 a 2015, a taxa de mortalidade de menores de
cinco anos. O acompanhamento dos indicadores de mortalidade proporcional
por doença diarreia e por IRA e, sobretudo, indicadores de mortalidade
específica, permitem avaliar as tendências destas doenças em relação às
metas nacionais e internacionais.
a8) Mortalidade por doenças isquêmicas
As doenças do aparelho circulatório e as neoplasias constituem as dois
principais grupos de causa de morte da população idosa. No Brasil,
correspondem a 45% do total de óbitos nessa população. Entre as doenças do
aparelho circulatório, as doenças cerebrovasculares e as doenças isquêmicas
do coração são as mais frequentes em ambos os sexos. (LIMA COSTA, 2009).
Existem evidências que a detecção precoce e consequente tratamento, ou
seja, medidas de prevenção secundária, podem reduzir a mortalidade tanto
por doenças do aparelho circulatório, como por neoplasias.
Óbitos por doenças do coração incluem mortes prematuras relacionadas a
estilos de vida potencialmente evitáveis por medidas de promoção e atenção
médico-hospitalar adequada. Taxas elevadas de óbitos por doenças
isquêmicas do coração e por doenças cerebrovasculares podem expressar
funcionamento inadequado dos serviços de saúde, especialmente no controle
da hipertensão e ausência de políticas voltadas a promoção de hábitos
saudáveis de vida. Reflete também o envelhecimento da população.
A hipertensão arterial é a doença crônica mais frequente entre os idosos e
está fortemente associada aos acidentes vasculares cerebrais e é, também,
um fator de risco importante para as doenças cardiovasculares.
Espanha e Portugal, apesar de virem apresentando taxas decrescentes, ainda
possuem as taxas mais elevadas entre os países analisados, embora essa
situação seja decorrente de uma estrutura populacional mais envelhecida.
Nos países da América Latina, com exceção da Argentina, a tendência é de
crescimento, o que também é compatível com a participação, ainda
relativamente pequena, mas crescente, de pessoas de maior idade na sua
pirâmide populacional. Nada obstante, as taxas da Colômbia e Brasil são
elevadas em relaçõa aos demais países sul-americanos integrantes do OIAPSS.
(Tabela 41)
a9) Mortalidade por doenças cerebrovasculares
Com relação às doenças cerebrovasculares o comportamento das taxas nos
países analisados é bastante similar ao verificado para as doenças isquêmicas
do coração. As taxas mais elevadas, mas decrescentes, são encontradas na
Espanha e Portugal e, em grande parte, são explicadas por uma estrutura
populacional mais envelhecida. Contudo, ao contrário das doenças
isquêmicas, a maioria dos países selecionados da América do Sul apresentam
taxas com alguma tendência a redução, o que pode ter relação com os
programas de controle da hipertensão arterial (Tabela 42)
a10) Taxa de mortalidade por diabetes
Estima o risco de morte por diabetes e dimensiona a magnitude da doença
como problema de saúde pública. Reflete o envelhecimento na população.
Expressa também as condições de diagnóstico e da assistência médica
dispensada, pois as complicações agudas da diabete são causas evitáveis de
óbito.
Em geral, as mortes por diabete abaixo dos 40 anos de idade são consideradas
evitáveis. Está associada à mortalidade por doenças do aparelho circulatório,
em especial o acidente vascular cerebral, à doença hipertensiva e à doença
isquêmica do coração.
A incidência de diabetes está crescendo em todo o mundo, atingindo um
prevalência de 5,1% em 2003. A prevalência do diabetes é maior nos países de
alta renda onde atinge uma prevalência de 7,8%, contudo a maior parte carga
da doença do diabetes (70%) está concentrada nos países em desenvolvimento
que apresentam grandes populações (Banco Mundial, 2006)
Os principais fatores de risco das doenças cardiovasculares e do diabetes são
obesidade, inatividade física e dieta pouco saudável, ou seja, no seu controle
são exigidas intervenções que busquem alterar estilos de vida. A educação
ainda parece ser a medida mais importante, mas o estimulo de bons hábitos
alimentares, a prática de atividades física e intervenções urbanas que
facilitem o uso de transporte não motorizado são exemplos de ações de
promoção à saúde. Entre os países selecionados da América Latina, as
maiores taxas de mortalidade por diabetes são encontradas no Paraguai (37,6
por 100.000 habitantes em 2010) e Brasil (32,6 por 100.000 em 2010). Chama
atenção a mortalidade bem mais acentuada em Portugal (47 por 100.000 em
2010) do que na Espanha (24 por 100.000 em 2010) (Tabela 43)
b) Morbidade Evitável
b1) Percentual de crianças com baixo peso ao nascer
A ocorrência de baixo peso ao nascer, ou seja, menos de 2.500 g, expressa
retardo do crescimento intrauterino ou prematuridade e representa
importante fator de risco para a morbimortalidade neonatal e infantil.
O peso ao nascer é um preditor da sobrevivência infantil. Quanto menor o
peso ao nascer, maior a probabilidade de morte precoce. Em países
desenvolvidos, observam-se valores em torno de 5 a 6% de crianças com baixo
peso ao nascer. De acordo com o padrão internacional, valores acima de 10%
são considerados inaceitáveis. Proporções elevadas de nascidos vivos de baixo
peso estão associadas, em geral, a baixos níveis de desenvolvimento
socioeconômico e de assistência materno-infantil.
O baixo peso ao nascer, geralmente associado à prematuridade, é um fator
de risco importante, principalmente entre mães muito jovens e de nível
socioeconômico mais baixo. Prematuridade e baixo peso também se associam,
geralmente, ao acesso não regular aos serviços de saúde durante a gestação.
Ademais, prematuridade de baixo peso são fatores de risco muito importantes
de mortalidade perinatal.
Entre os países analisados, Brasil e Colômbia são os que apresentam maiores
de crianças com baixo peso ao nascer com 8,5% e 9% dos nascidos vivos,
respectivamente (Tabela 44).
Estudos para identificação dos fatores de risco mais prevalentes podem
ajudar a identificação de medidas que possam ser tomadas pelos serviços de
saúde.
b2) Taxa de incidência de aids na população de 15 a 49 anos
Em toda a América Latina, é estimado que haja 1,6 milhão de pessoas
portadoras do HIV. A maioria dos casos (mais de 75%) se concentra em cinco
países : Brasil, Argentina, Colômbia, México e Venezuela, sendo que o
Brasil concentra 47% dos casos registrados na América Latina. (UNAIDS,
2014).
A região teve queda de 3% em novas infecções entre 2005 e 2013, mas os
índices variam de país para país. O Ministério da Saúde do Brasil estimava, em
2012, a existência de 718 mil pessoas com HIV/aids no país, correspondendo a
uma taxa de prevalência de 0,4% da população. Dessas, 574 mil haviam sido
diagnosticadas, 436 mil estavam sendo monitoradas e 313 mil recebia a
terapia antirretroviral (TARV). A prevalência pode ser considerada baixa e se
concentra em determinados grupos mais vulneráveis, entre os quais a
prevalência pode chegar a 10%.
A taxa de incidência de Aids no Brasil está estabilizada em torno de 20 casos a
cada 100 mil habitantes, o que representa cerca de 39 mil casos novos da
doença ao ano. Nos demais países selecionados da região a taxa de incidência
é muito mais baixa como pode se verificar na Tabela 45.
c) Programas e Intervenções
c1) Tratamento diretamente observado (DOT) de casos de tuberculose com
baciloscopia positiva
A tuberculose continua sendo uma das enfermidades transmissíveis de maior
letalidade. Segundo Relatório da Organização Mundial de Saúde de 2014 se
calcula que em 2013 cerca de 9 milhões de pessoas contraíram a enfermidade
e que 1,5 milhões, das quais 360.000 eram HIV positivos, morreram por essa
causa (OMS, 2014). Apesar dos esforços realizados a mortalidade continua
sendo inaceitavelmente alta. O combate à tuberculose também teve metas
estabelecidas para 2015 no contexto dos Objetivos de Desenvolvimento do
Milênio (ODM).
Em 2009, somente na América do Sul, foram registrados mais de 288.000 casos
de tuberculose, com uma taxa de prevalência de 73 casos por 100.000
pessoas. Nesse ano foram registradas mais de 47.800 mortes por tuberculose
na América do Sul. Na América do Sul as mais altas taxas de incidência
ocorrem no Peru, Bolívia e Guiana (PAHO, 2012).
A maioria das mortes por tuberculose são evitáveis e existem diagnósticos e
tratamentos eficazes. Contudo, por ser geralmente prolongado, o tratamento
nem sempre alcança a eficácia desejada, sobretudo quando associado a outras
enfermidades como o HIV-Aids. Por isso, a taxa de cura da tuberculose pode
ser considerado um indicador de efetividade de programas de saúde.
A estratégia de tratamento diretamente observado (DOT) busca aumentar a
efetividade do tratamento por meio de uma acompanhamento dos portadores
do bacilo da tuberculose por parte dos profissionais de saúde.
O sucesso do Tratamento Diretamente Observado (DOT) é um indicador de
desempenho atividades de controle da tuberculose e representa o percentual
de casos com baciloscopia positiva que tiveram seu tratamento concluído.
Além da vantagem óbvia para pacientes individuais, o sucesso do tratamento
de casos infecciosos de tuberculose por DOT é essencial para evitar a
propagação da infecção. Detectar e tratar com sucesso uma grande proporção
de casos de tuberculose deve ter um impacto imediato sobre a prevalência e
mortalidade da tuberculose. Ao reduzir a transmissão, tratar com sucesso a
maioria dos casos também diminuirá a incidência da doença.
Todos os países apresentaram em 2010 uma proporção de tratamentos
concluídos superior a 70%. A exceção foi a Argentina que nos anos observados
ficou sempre abaixo desse percentual.
4.3.3. Adequação Técnica
a) Procedimentos não esperados
a1) Proporção de partos cesáreos
As taxas de partos cirúrgicos estão aumentando em todo o mundo, inclusive
nos países de renda baixa e média, mas os determinantes desse aumento
ainda não são consensuais. Estudos apontam que a proporção de partos
cesáreos (cirúrgicos) é influenciada pelo modelo de assistência obstétrica
adotado, por fatores comportamentais, pelas condições socioeconômicas e de
saúde da gestante e pela disponibilidade de recursos especializados
(tecnologias e serviços). Estudo recente procurou identificar a importância de
fatores ligados à paciente e à assistência ao parto. A ocorrência de cesárea
prévia foi identificada como um dos mais importantes fatores para o
incremento da taxa geral de cesáreas, por induzir sua realização nos eventos
seguintes (VOGEL, J. P. et al, 2015)
Estudos recentes também identificaram a maior frequência de prematuridade,
síndrome de angústia respiratória, maior probabilidade de ocorrência de
menores escores de Apgar, de demanda por maior suporte respiratório,
dentre outros problemas, entre os recém nascidos por parto cesáreo em
relação aos recém nascidos por parto normal (RAJU et al, 2006; op cit.
FRANÇA e LANSKY, 2009).
No Brasil as taxas elevadas de cesáreas, cerca de 50% em média, tem sido
objeto de intervenções regulatórias, sem muitos resultados. A maior
proporção de cesáreas ocorre no grupo social de melhor nível socioeconômico
e na população assistida por planos e seguros privados de saúde.
Segundo a Organização Mundial de Saúde, não existem evidências que
justifiquem proporção de partos cesáreos superior a 15% (WORLD HEALTH
ORGANIZATION, 1985), mas, nos últimos anos, esse parâmetro tem sido
questionado (VOGEL, 2015, op. cit). Apesar da série de dados estar bastante
incompleta, pode-se obsevar uma tendência do aumento dos partos cesáreos
no período 2000 a 2012 e todos os países, com exceção da Argentina para a
qual não foram identificados dados, apresentam proporções bastante
superiores ao valor preconizado pela OMS.
Capítulo 5. Constatações e Tendências
Não é tarefa simples tentar sintetizar a situação de saúde ou as
características e desempenho do sistema de saúde de um país. Por outro
lado, são relativamente raras as situações em que um índice composto,
tentação mais atraente, tenha obtido aceitação na mensuração de condições
que dependem de diversas variáveis.
Um exemplo positivo dessas tentativas é o Índice de Desenvolvimento Humano
(IDH) adotado pelo ONU a partir de 1975, o qual sumariza o desenvolvimento
humano de uma população com base em indicadores como expectativa de
vida, educação e renda. Tentativa feita pela OMS, em 2000, de avaliar o
desempenho dos sistemas de saúde com base em índices que combinavam
vários aspectos da saúde e dos sistemas não teve a mesma aceitação22.
Há algum tempo, metodologias para avaliação de sistemas de saúde foram
elaboradas em diversos países e instituições internacionais23. A proposta do
OIAPSS, como dito anteriormente, se inspirou na experiência do PRO-ADESS24
no Brasil. A matriz desenvolvida para o OIAPSS propõe uma abordagem
integrada que inter-relaciona quatro grandes áreas (determinantes,
construção social da política de saúde, condicionantes, desempenho), além de
incorporar nós críticos, tais como, relação público-privado, complexo
produtivo da saúde, força de trabalho em APS. Contudo, o monitoramento de
algumas destas últimas áreas ainda não pode ser viabilizado, particularmente
a relacionada à atenção primária de saúde.
A análise dos sistemas de saúde tem mostrado, sistematicamente, uma série
de elementos comuns decorrentes de situações como transição demográfica e
epidemiológica, custos crescentes, incorporação acelerada de novas
tecnologias e difusão de diretrizes de políticas patrocinadas por organismos
internacionais. Ademais, em relação a estes sistemas se observam que
arranjos distintos com relação à política, organização, regulação e
financiamento produzem diferenças importantes que podem ser de interesse
comum.
Visto desta forma, a comparação, mesmo tendo-se em consideração todos os
problemas intrínsecos, é um recurso importante para identificar tendências,
similaridades e discrepâncias ou ainda para avaliar intervenções que possam
contribuir para o melhor desempenho dos sistemas.
22
O World Health Report 2000: health systems; improving performance utilizou um índice que
combinava medidas de vários aspectos da saúde e dos serviços de saúde como expectativa de vida,
gastos das famílias com saúde e equidade e capacidade de resposta do sistema de saúde do país.
23 Reino Unido, Canadá, Austrália, Estados Unidos, OMS e OECD
24 Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ). Projeto Desenvolvimento de metodologia de avaliação do
desempenho do sistema de saúde brasileiro - PRO-ADESS. Rio de Janeiro: FIOCRUZ; 2003 [acesso em
2015 Março 17]. Disponível em: www.proadess.icict.fiocruz.br/
Dentro dessa perspectiva, verificou-se que o contexto social e econômico,
que têm forte relação com o desenvolvimento da área de saúde, teve boa
performance na América Latina e nos países incluídos neste relatório, pelo
menos até a crise de 2008/2009. Entre 2000 e 2010, o crescimento médio da
América Latina foi de 5%. A partir desse período, as performances dos países
selecionados, sul-americanos e ibéricos, passam a apresentar peculiaridades
decorrentes de suas situações internas, em termos econômicos e políticos, e
das formas de inserção na economia mundial.
Os anos de crescimento do PIB proporcionaram inclusão e melhoria no
mercado de trabalho e expansão de programas de transferência de renda que
propiciaram a redução da pobreza e da indigência na América Latina. Entre
2000 e 2014 cerca de 60 milhões de pessoas deixaram de ser consideradas
pobres e perto de 30 milhões indigentes na América Latina (CEPAL 2014).
Nada obstante, em 2014 estimava-se que 167 milhões de pessoas ainda
viviam em condição de pobreza e 71 milhões em condições de indigência,
segundo dados da Cepal. Apesar desse esforço, a região continua sendo uma
das mais desiguais do mundo. Em 2010, os 10% mais ricos da população se
apropriavam de 32% dos rendimentos, enquanto os 40% mais pobres, apenas
15%.
O crescimento econômico impulsionou o mercado de trabalho e o crescimento
de recursos fiscais, condições que terão de ser retomadas, uma vez que as
projeções de crescimento para o próximo anos ainda são pouco animadoras.
Para 2015, por exemplo, estimativas de crescimento do feitas pela Cepal em
2014 já apontavam para um crescimento muito pequeno para a América
Latina e Caribe (1,0%) e nulo (zero) para a América do Sul. Nesta região, as
estimativas de taxas negativas para Brasil (-0,95); Argentina (0,0%) e
Venezuela (-3,5%), anularam crescimentos positivos estimados para Colômbia
(3,6%), Peru (4,2%) e Paraguaia (4,2%) e outros países. Também para os países
da zona do euro são estimadas para 2015 e 2016 taxas médias de crescimento
baixas pela OCDE: 1,1% em 2015 e 1,7% em 2016. Para a Espanha foram
estimadas para dois anos, taxas superiores à média (1,7% em 2015 e 1,9% em
2016) e para Portugal mais próximas à média (1,3% em 2015) e (1,5% em 2016)
(Boletim Mensal da Economia Portuguesa, nov, 2014).
No campo demográfico a América do Sul, e os países selecionados em
particular, vem apresentando redução acentuada da taxa de natalidade,
sobretudo em países como o Brasil. A taxa de crescimento populacional vem
se reduzindo nas últimas décadas e começam aparecer importantes alterações
no perfil demográfico. No período de 1990 a 2010, a população total da
América do Sul cresceu 33% no período, mas a população de menos de 15
anos cresceu apenas 1,2% e a população de 65 anos e mais cresceu 87,8%
(PAHO,2012). A participação do grupo de 15 a 64 anos que era de 62,2% da
população total em 2000, passou para 65% em 2012. Os menores de 15 anos
representavam 32,2% do total da população em 2000, passaram a representar
28,2% em 2012 e a população de 65 anos e mais passou de 5,6% em 2000 para
6,7% em 2012 (CEPAL, 2014a).
O alto percentual de participação da população de 15 a 64 anos na população
total cria uma situação favorável ao crescimento econômico, pois
proporcionalmente há menos crianças na população e o percentual de idosos
ainda não é alto, como acontece, por exemplo, na Espanha e Portugal.
Contudo, para que essa janela de oportunidade não seja desperdiçada é
preciso que a economia responda positivamente, gerando empregos e
empregos de boa qualidade. Mas para crescer e gerar empregos, além dos
gargalos externos, os países da América do Sul tem que enfrentar seus
constrangimentos internos, entre os quais se situa a baixa produtividade do
trabalho.
Para aumentar a produtividade, no entanto, é preciso, entre outros
condicionantes, melhorar a qualidade da educação. Neste ponto, fica
bastante visível a diferença entre os países da América do Sul e Espanha e
Portugal. Apesar dos avanços na cobertura da educação fundamental ainda é
grande o descompasso em relação às coberturas dos ensinos secundário e
terciário e a qualidade, ainda bastante precária, do ensino fundamental fica
patente quando se compara os valores do PISA dos países ibéricos e aos dos
países da América do Sul.
As condições de saúde e a própria configuração dos sistemas são influenciadas
pelo contexto econômico e social, mas também por fatores políticos internos
e pela visão sobre o crescimento, papel do estado e sobre prioridades e a
própria organização dos serviços de saúde. Neste último ponto, nos países da
América Latina e de outras regiões em desenvolvimento é grande a influência
das propostas de políticas emanadas de organismos internacionais, como foi a
proposta de atenção primária de saúde (APS) na década de 1970 e, mais
recentemente, a proposta de cobertura universal de saúde (UHC), apoiadas
por organismos da área setorial (OPAS, OMS) e por organismos de fomento
(Banco Mundial e Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID).
No aspecto político, os sistemas da América do Sul enfrentam dois problemas
fundamentais. O primeiro é da segmentação que é comum a todos os países e
o segundo é da cobertura ainda insuficiente, sendo que, em muitos países,
ainda existem parcelas de população ainda não cobertas pelos sistema
público. Espanha e Portugal, por seu turno, como decorrência da crise
econômica que se iniciou em 2008, começam a adotar medidas de controle
de gastos e propostas de medidas privatizantes.
Entre os indicadores das condições de vida vem se observando bons resultados
na cobertura populacional com abastecimento de água e instalações sanitárias
adequados, principalmente nas áreas urbanas. Nas áreas rurais da América
Latina, no entanto, um percentual razoável da população não desfruta da
mesma cobertura, sendo que, em alguns países, esse percentual fica em torno
de 30%. Nessas áreas os progressos tem sido mais modestos.
Ainda que a desnutrição siga sendo um problema principalmente em algumas
áreas e entre determinados segmentos populacionais, a questão que começa a
chamar a atenção, tanto na América Latina como na Espanha e Portugal, é o
sobrepeso, tanto na população masculina como na feminina de 15 anos ou
mais. O problema ganha relevância porque hábitos alimentares inadequados
são fatores de risco para doenças crônicas. A urbanização que se deu de
forma acelerada na América do Sul, hoje mais de 80% da população vive em
áreas urbanas, contribui para um estilo de vida mais sedentário, além de criar
condições mais propícias para o aparecimento de outros problemas como
adição a álcool, drogas, acidentes e violências (PAHO, 2012)
Dois dos indicadores propostos para avaliar as condições de vida mostram
dados preocupantes sobretudo em alguns países. O primeiro é a elevada
mortalidade por homicídios, principalmente na Colômbia e Brasil. Além da
sobremortalidade verificada, estudos mostram que, em alguns países, este
verdadeiro genocídio incide de forma mais intensa sobre populações bem
definidas (jovens, não brancos, pobres).
A mortalidade por acidente de trânsito, indicador utilizado par avaliar as
condições de mobilidade urbana, apresenta valores preocupantes no Brasil,
Colômbia e Paraguai.
A violência e as condições de mobilidade urbana são bons exemplos de
fatores que se encontram fora do escopo estrito das ações de saúde, no
entanto, cabe à saúde colocar luz sobre esses problemas, seja por meio da
apresentação e análise de indicadores, seja promovendo ações conjugadas
com outras políticas públicas.
A capacidade de resposta dos sistemas de saúde é condicionada por uma série
de fatores entre os quais se destacam o grau de sustentabilidade do ponto de
vista de insumos essenciais, as condições de financiamento e o marco político-
institucional.
A geração de conhecimento, o desenvolvimento de tecnologias e a dimensão
do complexo produtivo local, bem como o grau de dependência externa em
termos de medicamentos e outros insumos essenciais, são fatores importantes
na definição da sustentabilidade e do desenvolvimento qualitativo do sistemas
nacionais de saúde. Nesse ponto, há um grande hiato entre a situação de
Espanha e Portugal em relação aos países da America do Sul.
Os registros de patentes de tecnologias médicas e de medicamentos, dois dos
indicadores utilizados, dão uma indicação do grau de desenvolvimento
científico e tecnológico de cada país na área da saúde. Neste particular,
apenas Espanha e Brasil apresentam um crescimento mais expressivo de
registros no período.
Nas relações dos países selecionados com outros países, todos, sem exceção,
apresentam balança comercial negativa, ou seja, tanto no campo de
equipamentos como de medicamentos, as importações superam as
exportações. Alguns, como a Espanha e Portugal, vem apresentando um
diminuição das importações e crescimento nas exportações, diminuindo a
negatividade da balança comercial. Naturalmente, só um estudo mais
detalhado da composição das importações pode definir um quadro mais
compreensivo da situação de sustentabilidade dos sistemas frente a essa
situação.
No tocante ao financiamento, a análise deve ser feita considerando um
conjunto de indicadores. Assim, no gasto total como proporção do PIB não há
grande diferença entre Espanha, Portugal e Brasil, Argentina, por exemplo. A
diferença se estabelece quando se analisa a evolução dos gastos per capita
em dólares PPC. Neste caso, o gasto de Portugal e Espanha é de duas a três a
três vezes superior ao gasto da Argentina e do Brasil, respectivamente. Estes,
dentre os países selecionados a América do Sul, são aqueles que tem gastos
com saúde mais elevados.
Outro referencial importante é a participação de recursos públicos e privados
no financiamento dos serviços. Em quase todos, com exceção do Brasil e do
Paraguai, a participação das fontes públicas é maior do que as privadas.
Ademais, em quase todos a participação pública tem sido crescente. As duas
exceções no período de 2000 a 2012 foram Colômbia e Portugal. Nestes
países, apesar da participação pública continuar sendo maior do que a
privada, houve uma diminuição na participação pública. No gasto privado,
observa-se uma tendência de aumento dos gastos intermediados por seguros e
planos privados de saúde. A tendência é de que em situações de crise
econômica, paradoxalmente, possa ocorrer um aumento dos gastos privados
diretos sobretudo com medicamentos, devido a restrições na distribuição
pública.
O desempenho dos sistemas de saúde é medido pelas condições de acesso, de
efetividade e por sua adequação técnica. Na mensuração das condições de
acesso são utilizados os indicadores de cobertura com consulta pré-natal e de
oferta de leitos hospitalares.
Em relação ao primeiro indicador foi tomado como parâmetro a realização
de 4 consultas de pré-natal. Contudo, nos bancos de organismos
internacionais consultados não foi possível levantar esse indicador para
Espanha e Portugal. Nos países selecionados da América Latina observou-se
um aumento importante de cobertura. Com base no último ano informado, a
cobertura é superior a 88% das gestantes. Seria interessante, no entanto,
acompanhar as desagregações desse indicador por áreas geográficas (urbana e
rural) e se ter em mente que o parâmetro utilizado ainda é muito modesto
em termos de concentração de consultas.
A oferta de leitos é outro indicador utilizado como "proxy" do acesso aos
serviços de saúde. Neste caso existe uma grande diferença na oferta entre
Argentina, Portugal e Espanha e os demais países. A oferta é bem mais
robusta nos primeiros. Em relação este indicador é necessário levar em conta
as dimensões geográficas e a distribuição dos leitos dentro de cada país, para
se ter um posição mais fidedigna sobre o acesso aos serviços de saúde.
A efetividade dos sistemas é acompanhada pelo OIAPSS por meio da
morbimortalidade evitável e da performance de programas de intervenções
setoriais. Os indicadores de mortalidade evitável estão focados na
mortalidade da mãe e da criança e em doenças crônicas de maior prevalência.
Para avaliar a mortalidade evitável, um dos indicadors foi a mortalidade na
infância, que engloba a mortalidade infantil. A mortalidade na infância é,
inclusive, uma das metas inseridas nos Objetivos de Desenvolvimento do
Milênio para 2015. O objetivo pactuado foi de reduzir em dois terços a taxa
de mortalidade na infância estimada para 1990. A meta é adaptada a situação
de cada país, mas em 2012 apenas o Paraguai, entre os países selecionados a
América Latina, não havia ainda atingido a meta regional para 2015 que é de
18 por mil nascidos vivos. Apesar de vir diminuindo em todos os países
selecionados a América Latina a mortalidade na infância nesses países ainda é
de quatro a sete vezes superior às taxas verificas em Espanha e Portugal em
2012.
Cada vez mais a mortalidade na infância se concentra na mortalidade em
menores de 1 ano e entre estes começa a se sobressair, em quase todos os
países, o componente da mortalidade neonatal (de 0 a 27 dias),
principalmente a mortalidade neonatal precoce (de 0 a 6 dias). Quanto maior
a participação dos óbitos do neonatal precoce entre os óbitos de menores de
um ano, mais complexa se torna a atuação sobre as causas de morte.
Na mortalidade materna, somente Uruguai e Chile possuem, na América do
Sul, taxas compatíveis com os países desenvolvidos. Portugal e Espanha, por
seu turno, apresentam taxas mais baixas que a taxa média dos países
desenvolvidos. Os países selecionados da América Latina, sem exceção,
apresentam taxas bastantes elevadas: em 2010 as taxas de Espanha e Portugal
foram de 6 e 8 por 100.000 nascidos vivos, enquanto a dos países selecionados
a AL variou entre 56/100.000 no Brasil e 99/100.000 no Paraguai. A
diminuição da mortalidade materna foi outro dos objetivos de
desenvolvimento do milênio. Neste caso, o número de países da América do
Sul que não cumprirão a meta é maior, do que no caso da mortalidade na
infância. A redução da mortalidade materna está, de certa forma,
condicionada à redução, em alguns países, do problema do aborto inseguro e
de prover um acesso mais qualificado aos serviços de saúde, em outros
termos, da provisão oportuna e de boa qualidade.
Os resultados alcançados em relação à mortalidade evitável na infância e por
problemas relacionados à gravidez e ao parto guardam relação com o nível de
desenvolvimento socioeconômico dos países da América Latina e dependem
da melhoria das condições de vida e da cobertura e qualidade dos serviços de
saúde.
Como dito anteriormente, mudanças no perfil demográfico e socioeconômico
da AL levaram a mudanças no perfil epidemiológico da população. Como
consequência cresceram em importância as situações crônicas de morbidade,
os acidentes e a violência. Doenças crônicas, entre as quais se destacam as
cardiovasculares e isquêmicas, são as causas mais importantes de morte e
que tendem a aumentar ainda mais nos próximos nos países da América
Latina. O mesmo sucederá com o diabetes. Daí a necessidade se atuar sobre
os principais fatores de risco que são obesidade, inatividade física e dieta
pouco saudável, ou seja, no seu controle são exigidas intervenções que
busquem alterar estilos de vida.
Junto com essa mudança, mantêm-se, contudo, em alguns países a incidência,
em alta intensidade, de doenças transmissíveis, especialmente entre a
população mais pobres e de áreas rurais. Em alguns países, epidemias de
doenças de transmissão vetorial, como é o caso da dengue, não são
controladas e praticamente seguem sua evolução natural.
A efetividade dos sistemas de saúde também pode ser analisada por meio de
fatores de risco e enfermidades evitadas ou ainda pelo sucesso em
determinados tratamentos. Fator de risco importante, o baixo peso ao nascer,
sobretudo quando associado a prematuridades, não apresenta grande
diferença nas proporções observadas no conjunto de países analisados. A taxa
de incidência de aids na população de 15 a 49 anos de idade é um problema a
desafiar os serviços de saúde do Brasil. Uma taxa de incidência de próxima de
20 por 100.000 habitantes, bem superior à observada nos outros países, vem
sendo mantendo nesse patamar.
A efetividade no tratamento da tuberculose segue sendo um grande desafio
dos serviços de saúde, uma vez que a tuberculose é enfermidade transmissível
de alta letalidade e que exige tratamento prolongado. Os dados de
tratamento com êxito ficam entre 73% e 78% na maioria dos países. Valores
extremos ficam por conta da Argentina (52%) e Portugal (85%).
Uma última dimensão analisada foi a adequação técnica do sistema. Para essa
finalidade foi escolhido como indicador de partos cesáreos. Com percentuais
crescentes em todo mundo, apesar de ter indicações precisas, o percentual de
partos cirúrgicos também aumenta em todos os países analisados e ficam
muito acima do parâmetro de 15% preconizado pela OMS. Em 2012,
percentuais mais baixos foram registrados na Espanha (26%) e Peru (25%) e o
mais alto no Brasil (50%). Medidas recentes adotadas no Brasil buscam, mais
uma vez, reduzir o alto percentual de partos cirúrgicos, com foco no
segmento de planos e seguros privados de saúde, onde as taxas apresentam os
valores mais elevados.
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