264
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA (UnB) CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Obstáculos à exploração do baru (Dipteryx alata Vog.) no Cerrado Goiano: sustentabilidade comprometida? Rogério Marcos Magalhães Orientador: Donald Rolfe Sawyer Tese de Doutorado Brasília, DF, maio de 2011

Obstáculos à exploração do baru (Dipteryx alata Vog.) no ... · do Distrito de Caxambú e Bom Jesus, no Município de Pirenópolis, pela prestimosa colaboração, sem a qual este

  • Upload
    vodang

  • View
    224

  • Download
    1

Embed Size (px)

Citation preview

UNIVERSIDADE DE BRASLIA (UnB)

CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL

Obstculos explorao do baru (Dipteryx alata Vog.) no

Cerrado Goiano: sustentabilidade comprometida?

Rogrio Marcos Magalhes

Orientador: Donald Rolfe Sawyer

Tese de Doutorado

Braslia, DF, maio de 2011

ii

MAGALHES, Rogrio Marcos

Obstculos explorao do baru (Dipteryx alata Vog.) no

Cerrado Goiano: sustentabilidade comprometida? / Rogrio Marcos

Magalhes (UnB-CDS, Doutor, Poltica e Gesto Ambiental, 2011).

Braslia, 2011

p.: il.

Tese de Doutorado. Universidade de Braslia. Centro de

Desenvolvimento Sustentvel, Braslia.

1. Baru. 2. Cadeia produtiva. 3. Sustentabilidade. 4. Extrativismo

vegetal. 5. Modelo produtivo. 6. Cerrado. I. Universidade de

Braslia. CDS II. Ttulo.

concedida Universidade de Braslia permisso para reproduzir cpias desta Tese

e emprestar ou vender tais cpias somente para propsitos acadmicos e cientficos. O

autor reserva outros direitos de publicao e nenhuma parte desta Tese de Doutorado pode

ser reproduzida sem a sua autorizao por escrito.

Rogrio Marcos Magalhes

iii

UNIVERSIDADE DE BRASLIA

CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL

Obstculos explorao do baru (Dipteryx alata Vog.) no

Cerrado Goiano: sustentabilidade comprometida?

Rogrio Marcos Magalhes

Tese de Doutorado submetida ao Centro de Desenvolvimento Sustentvel da Universidade

de Braslia como parte dos requisitos necessrios para a obteno do Grau de Doutor em

Desenvolvimento Sustentvel, rea de concentrao em Poltica e Gesto Ambiental.

Aprovado por:

__________________________________________

Donald Rolfe Sawyer, Ph. D. (CDS/UnB)

(Orientador)

_________________________________________

Fernando Paiva Scardua, Doutor (FAG/CDS/UnB)

(Examinador Interno)

_________________________________________

Doris Aleida Villamizar Sayago, Doutora (CDS/UnB)

(Examinador Interno)

__________________________________________

Thomas Ludewigs, Doutor (CDS/UnB)

(Examinador Interno)

__________________________________________

Aldicir Osni Scariot, Ph. D. (Embrapa/Cenargen)

(Examinador Externo)

__________________________________________

Elimar Pinheiro do Nascimento, Ph. D. (CDS/UnB)

(Suplente)

Braslia-DF, 23 de maio de 2011

iv

Esta Tese foi realizada com o auxlio financeiro do Projeto FLORELOS: Elos Ecossociais

entre as Florestas Brasileiras: Modos de vida sustentveis em paisagens produtivas,

desenvolvido pelo Instituto Sociedade, Populao e Natureza (ISPN) com o apoio financeiro

da Unio Europeia. Este documento de responsabilidade do autor, no podendo, em caso

algum, considerar-se que reflete a posio de seus doadores.

v

DEDICATRIA

Solange, companheira incansvel de longas horas consumidas na elaborao desta Tese.

s minhas filhas, Mayra e Nayara, pela alegria que renova a minha vida a cada manh.

Aos meus pais, Jos Geraldo e Maria Aparecida, que me ensinaram a perseverar na busca

dos meus sonhos.

vi

AGRADECIMENTOS

Ao Professor Donald Rolfe Sawyer, orientador paciente, pelo aprendizado.

Ao Professor Fernando Paiva Scardua, pela valiosa contribuio.

Aos agricultores familiares do Assentamento Vale da Esperana, no Municpio de Formosa,

do Distrito de Caxamb e Bom Jesus, no Municpio de Pirenpolis, pela prestimosa

colaborao, sem a qual este trabalho no existiria.

Aos empresrios e presidentes de associaes e cooperativas que disponibilizaram seu

tempo e informaes fundamentais para a elaborao desse trabalho.

Aos membros da Banca, pela pertinncia das contribuies.

Ao amigo Juaci Vitoria Malaquias, da Embrapa-Cerrados, pela grande ajuda na parte

quantitativa do trabalho.

A Cynthia V. Magalhes, minha irm querida, Renata A. da Mata, Lucas de Q. Valena,

Laura Chamo, Javier Bonsen e ao colega Cludio Frate, pela ajuda oportuna nas horas de

maior necessidade.

A Valdinea Pereira da Silva (Val) pela reviso do texto num curto espao de tempo, mesmo

estando passando por um momento difcil.

Aos professores do CDS, em especial Professora Vanessa Maria de Castro.

Aos servidores do Centro de Desenvolvimento Sustentvel (CDS), pela simpatia e pela

constante disposio em ajudar.

Aos tcnicos do Instituto, Sociedade, Populao e Natureza (ISPN) pelas informaes

disponibilizadas sobre o baru.

Ao povo brasileiro que, por meio do seu trabalho, possibilitou que eu cursasse uma

universidade pblica desde a graduao.

vii

Este trabalho de pesquisa tem como inspirao o pensamento de Ignacy Sachs, para quem

o desenvolvimento sustentvel pode ser um modelo correto de desenvolvimento, desde que

se mantenha o equilbrio entre suas dimenses: ambiental, social, cultural, econmica e

poltica (SACHS, 2000, p. 60).

viii

Tudo que move sagrado...

Amor de ndio Beto Guedes

ix

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo verificar se a explorao do fruto do baru Dipteryx

alata Vogel (Fabaceae) no Cerrado do Estado de Gois, no Brasil Central, uma

alternativa sustentvel de gerao de renda para os agentes que participam da sua cadeia

produtiva. Para alcanar esse objetivo, optou-se pela mensurao das dimenses das

sustentabilidades ambiental, social, econmica, poltica e da sade, por meio de

indicadores, bem como entrevistas projetivas e semiestruturadas. Os resultados obtidos com

a aplicao da metodologia proposta mostram que nas condies atuais, a explorao do

baru nos municpios estudados no se configura como uma atividade sustentvel de

gerao de renda para os agentes que participam da sua cadeia produtiva, uma vez que

atende parcialmente ao pressuposto segundo o qual a atividade para ser considerada

sustentvel tem que apresentar um equilbrio entre as vrias dimenses da sustentabilidade.

Os agricultores alcanaram um grau de sustentabilidade mdio, com ndice de

Sustentabilidade variado entre as dimenses analisadas. As instituies privadas que

utilizam o baru alcanaram grau de sustentabilidade baixo, apresentando tambm grande

variao entre as dimenses avaliadas. Os maiores obstculos identificados pelos

agricultores so: dificuldade que encontram para gerenciar empreendimentos coletivos;

inexistncia de maquinrio adequado para despolpar e quebrar o fruto do baru. A legislao

que no est sendo aplicada no se configura como um obstculo para esses atores. Para

as instituies privadas que processam o baru, os maiores obstculos foram: fornecimento

irregular da castanha do baru em funo da sazonalidade do fruto e inexistncia de

equipamentos e tecnologias adequada s necessidades do ramo no qual atuam. O estudo

permitiu tambm identificar que o modelo produtivo do baru encontrado nos municpios

estudados apresenta caractersticas diferentes de modelos propostos por autores como

Homma, A. K. O. (1993), Rgo, J. F. do (1992) e Drummond, J. A. (1996) para o

extrativismo. O baru importante para os agricultores familiares que o exploram pelo fato de

se constituir em uma fonte de renda imediata da qual lanam mo quando necessitam de

dinheiro em espcie.

Palavras-chave: Baru, Cadeia produtiva, Sustentabilidade, Extrativismo vegetal, Modelo

produtivo.

x

ABSTRACT

This work aims to verify whether the exploitation of the baru fruit Dipteryx alata Vogel

(Fabaceae) in the Savanna of the state of Goias, Central Brazil, represents a sustainable

option to generate income for agents who participate in its production chain. To reach this

target, I measure the social, economic, political, and sustainable dimensions by using

indicators and some projected and semi-structured interviews, as well as by applying a

social-economic survey in a sample of family farmers from the State. The results obtained

with the proposed methodology show that under current conditions, barus exploitation in the

studied municipalities does not represent a sustainable activity to generate income for those

involved in its production chain, since it does only attends in a partial way the necessary

equilibrium among the various sustainable dimensions. The family farmers reached medium

sustainable development levels, with different indices among the analyzed dimensions.

Private institutions that explore baru reached low sustainable development levels, and

demonstrate a huge variability among the evaluated dimensions. The major obstacles

identified by the farmers were the management of collective enterprises and the lack of

appropriate machinery to remove and break the fruit. Considering the private institutions, the

main obstacles were the irregular baru nuts supply, due to the seasonality of the fruit, and

the lack of the appropriated equipment and technology required for the industry in which they

operate. Since the legislation is not being applied, it does not represent an obstacle to the

farmers or to the private institutions. The present study has also allowed us to identify that

the baru exploitation model in the studied municipalities shows different characteristics

regarding the extrativism exploitation models proposed by Homma, Rgo and Drummond.

The baru is important for family farmers, since it may become an immediate source of

income when they need cash.

Key words: Baru, Production chain, Sustainability, Forest extrativism, Productive model

xi

RESUMEN

Este trabajo tiene como objetivo verificar si la explotacin del fruto del baru Dipteryx alata

Vogel (Fabaceae) en la Sabana en el estado de Goias, centro de Brasil, constituye una

alternativa sostenible de generacin de renta para los actores que participan de su cadena

productiva. Para alcanzar este objetivo se ha optado por la evaluacin de las dimensiones

de la sostenibilidad ambiental, social, econmica, poltica y de salud, por medio de

indicadores as como tambin entrevistas proyectivas y semi estructuradas, adems del

levantamiento socioeconmico de los agricultores muestreados. Los resultados obtenidos

com La metodologia propuesta muestran que en las condiciones actuales la explotacin del

baru en los municipios estudiados no se configura como una actividad sostenible de

generacin de renta para los actores que participan de su cadena productiva, ya que atiende

parcialmente al presupuesto segn el cual la actividad tiene que presentar un equilibrio entre

las varias dimensiones de la sostenibilidad para ser considerada sostenible. Los agricultores

alcanzaron un grado de sostenibilidad mediano, con ndice de Sostenibilidad variado entre

las dimensiones analizadas. Las instituciones privadas que utilizan el baru alcanzaron un

grado de sostenibilidad bajo, presentando tambin gran variacin entre las dimensiones

evaluadas. Los principales obstculos identificados por los agricultores son: gerenciamiento

de emprendimientos colectivos; inexistencia de maquinarias adecuadas para despulpar y

quebrar el fruto del baru. La legislacin que no est siendo aplicada no se configura como

un obstculo para estos actores. Para las instituciones privadas que procesan el baru, los

mayores obstculos fueron: abastecimiento irregular de la castaa de baru en funcin de la

estacionalidad del fruto, inexistencia de equipamientos y tecnologas adecuadas a las

necesidades del ramo en el cual actan. Para esas instituciones la legislacin tampoco se

configura como un obstculo. El estudio permiti tambin identificar que el modelo

productivo del baru encontrado en los municipios estudiados presentan caractersticas

diferentes a las descritas en los modelos propuestos por Homma, Rgo y Drummond para el

extractivismo. El baru es importante para los agricultores familiares que lo explotan

constituyendo una fuente inmediata de renta de la cual hacen uso cuando necesitan de

dinero en efectivo.

Palabras-clave: Baru, Cadena productiva, Sustentabilidad, Extractivismo forestal, Modelo

productivo.

xii

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Biomas brasileiros........................................................................................... 1

Figura 2 Distribuio geogrfica do bioma Cerrado no Brasil, com a indicao de

reas disjuntas.................................................................................................................. 2

Figura 3 Localizao dos Municpios de Formosa e Pirenpolis, no Estado de

Gois................................................................................................................................. 16

Figura 4 Possveis formas de utilizao do recurso natural depois da sua

transformao em recurso econmico............................................................................. 26

Figura 5 Estrutura hierrquica dos indicadores utilizados............................................ 86

Figura 6 Modelo geral de uma cadeia produtiva........................................................... 114

Figura 7 Representao grfica de uma cadeia produtiva de PFNM........................... 120

Figura 8 Modelo genrico da cadeia produtiva do baru no Estado de Gois............... 123

Figura 9 Dispositivo manual para extrao da amndoa do baru................................ 129

Figura 10 Mquina eltrica de despolpar e quebrar o fruto do baru............................. 130

Figura 11 Aspectos externos e internos do fruto e da semente de Dipteryx alata

Vogel................................................................................................................................. 140

Figura 12 Modelo conceitual de explorao do fruto do baru encontrado em trs

comunidades rurais dos Municpios de Pirenpolis e Formosa, Gois, 2010................. 149

Figura 13 Potencial de recurso extrativo, processo inicial e fase final do extrativismo

por coleta.......................................................................................................................... 150

Figura 14 Modelo sustentvel de explorao do fruto do baru em trs comunidades

rurais dos Municpios de Formosa e Pirenpolis, Gois, 2010........................................ 155

xiii

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Nmero total de espcies, espcies endmicas e endemismo (%) no Bioma

Cerrado.............................................................................................................................. 3

Tabela 2 Quantidade produzida na extrao vegetal por produto alimentcio extrativo

na Regio Centro-Oeste, em 2009, em toneladas........................................................... 5

Tabela 3 Grau de sustentabilidade das comunidades estudadas segundo os ndices

obtidos............................................................................................................................... 15

Tabela 4 Pronaf: Nmero de contratos e montante financiado por ano agrcola.......... 125

Tabela 5 Quantitativo de agricultores atendidos e valor repassado pelo MDS em R$

para o Estado de Gois, pelo Programa de Aquisio de Alimentos, at 2009............... 126

Tabela 6 Utilizao de terras no Municpio de Formosa (GO), em ha, em 2006........... 132

Tabela 7 rea dos estabelecimentos por utilizao de terras no Municpio de

Pirenpolis (GO), em 2006............................................................................................... 136

Tabela 8 Composio centesimal aproximada (g/100g) e valor energtico total (kcal)

da polpa de baru, com 1 e 136 dias de armazenamento (Goinia, GO, 2007)................ 141

Tabela 9 Composio centesimal aproximada e valor energtico de nozes

verdadeiras e de sementes comestveis.......................................................................... 142

Tabela 10 Composio em minerais de nozes verdadeiras e sementes

comestveis...................................................................................................................... 143

Tabela 11 ndices de sustentabilidade por agricultor, por localidade estudada............ 165

Tabela 12 Para quem vende o baru e forma de venda, por seis famlias do Distrito

de Bom Jesus, Pirenpolis, GO, em 2010........................................................................ 168

Tabela 13 Contribuio da venda do baru para a renda familiar, por faixa de

despesa........................................................................................................................... 169

Tabela 14 Trs principais fontes de renda dos agricultores e familiares entrevistados

em ordem decrescente de importncia........................................................................... 170

Tabela 15 Estratos de rea das unidades agrcolas visitadas, em ha......................... 171

Tabela 16 O que mais plantou no ltimo ano, versus produo animal predominante,

nas trs comunidades estudadas.................................................................................... 172

Tabela 17 Mo de obra utilizada na propriedade........................................................ 172

Tabela 18 Nmero de indicaes recebidas por ficha apresentada aos agricultores

das trs comunidades estudadas.................................................................................... 174

Tabela 19 Nmero de visitas do tcnico da assistncia tcnica propriedade do

agricultor para orient-lo sobre a explorao de baru nos ltimos doze meses............. 175

Tabela 20 Condies dos recursos (estradas, escolas, postos de sade) que o

Estado disponibiliza para a comunidade.......................................................................... 176

xiv

Tabela 21 Nmero de agricultores que conhecem a legislao sobre o uso de PFNM

no Cerrado...................................................................................................................... 176

Tabela 22 ndices de sustentabilidade Individual (Iw) por instituio estudada, em

2010................................................................................................................................. 178

Tabela 23 Nmero de indicaes recebidas por obstculo ao bom funcionamento e

crescimento das instituies que utilizam o baru............................................................. 181

xv

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Principais entraves encontrados na coleta, processamento,

beneficiamento e comercializao de produtos florestais no madeireiros.................... 107

Quadro 2 Produtos e subprodutos do baru e respectivos usos................................... 146

Quadro 3 Comparao entre modelos tericos propostos para o extrativismo........... 159

xvi

LISTA DE GRFICOS

Grfico 1 Quantidade de carvo vegetal produzida na extrao vegetal, de 1990 a

2009, nos Estados em que ocorre o Cerrado e no Brasil................................................. 4

Grfico 2 Evoluo do Produto Interno Bruto do Municpio de Formosa (GO), por

setor, de 1999 a 2007, em R$ mil.................................................................................... 130

Grfico 3 Produo de gros no Municpio de Formosa, Gois, em tonelada, no

perodo de 2004 a 2008.................................................................................................... 131

Grfico 4 Efetivo do rebanho bovino, por cabea, no Municpio de Formosa (GO), no

perodo de 2001 a 2008.................................................................................................... 131

Grfico 5 Quantidade produzida na extrao vegetal por tipo de produto extrativo, no

Municpio de Formosa, de 1990 a 2008........................................................................... 132

Grfico 6 Municpio de Formosa, n de estabelecimentos agropecurios, por grupos

de rea total, em 2006...................................................................................................... 133

Grfico 7 Evoluo do Produto Interno Bruto do Municpio de Pirenpolis (GO), por

setor, de 1999 a 2007, em R$ mil..................................................................................... 134

Grfico 8 Produo de gros do Municpio de Pirenpolis, Gois, em toneladas, no

perodo de 2004 a 2008.................................................................................................... 134

Grfico 9 Efetivo do rebanho bovino, por cabea, no Municpio de Pirenpolis (GO),

no perodo de 1998 a 2007.............................................................................................. 135

Grfico 10 Quantidade produzida na extrao vegetal por tipo de produto extrativo,

no Municpio de Pirenpolis, de 1990 a 2008................................................................... 135

Grfico 11 Municpio de Pirenpolis, nmero dos estabelecimentos agropecurios,

por grupos de rea total, em 2006.................................................................................... 137

Grfico 12 ndice de Sustentabilidade por localidade estudada.................................... 168

Grfico 13 ndices por comunidade, por dimenso da sustentabilidade....................... 169

Grfico 14 ndice de Sustentabilidade das instituies privadas, por dimenso da

sustentabilidade, em 2010................................................................................................ 179

xvii

LISTA DE SIGLAS E ABREVIAES UTILIZADAS

Anvisa

Apat

APP

ART

Ater

CB

Ceasa

CEMAm

C&I

Cifor

Cites

CLA

CNPJ

Cnumad

Conab

Conacer

CONAMA

CPA

CPR

Cofins

CRC

CSA

CT

CTF

DAP

DOF

Embrapa

EPI

EVI

FAO

FGTS

Flona

Agencia Nacional de Vigilncia Sanitria

Autorizao Prvia Anlise Tcnica de Plano de Manejo Florestal

Sustentvel

rea de Preservao Permanente

Anotao de Responsabilidade Tcnica

Assistncia Tcnica Rural

Cadeia de Produtos da Biodiversidade

Centrais de Abastecimento SA

Conselho Estadual do Meio Ambiente de Gois

Critrio e indicador

Center for International Forestry Research

Conveno sobre o Comrcio Internacional das Espcies da Flora e da

Fauna

Comprovante de Licena Ambiental

Cadastro Nacional de Pessoas Jurdicas

Comisso Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento

Companhia Nacional de Abastecimento

Comisso Nacional do Programa Cerrado Sustentvel

Conselho Nacional de Meio Ambiente

Cadeia de Produo Agroindustrial

Compra da Agricultura Familiar com Doao Simultnea

Contribuio para o Financiamento da Seguridade Social

Conselho Regional de Contabilidade

Commodity System Aproach

Cadeia Produtiva Tradicional

Cadastro Tcnico Federal

Declarao de Aptido ao Pronaf

Documento de Origem Florestal

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria

Environmental Performance Index

Environmental Vulnerability Index

Food and Agriculture Organization

Fundo de Garantia por Tempo de Servio

Floresta Nacional

xviii

Funbio

Funrural

GEF

GPI

GPMG

GIZ

Ibama

ICMBio

ICMS

IDR

IDRC

IE

Imac

IN

Incra

INSS

IPI

IPTU

IRPF

IRPJ

IS

ISPN

ISS

IUCN

Iw

LDL

LEF

Mapa

MDA

MDS

ME

MF

MMA

MPOG

Fundo Brasileiro para a Biodiversidade

Contribuio Sobre a Produo Rural

Fundo para o Meio Ambiente Mundial

Genuine Progress Indicator

Poltica de Garantia do Preo Mnimo

Companhia Alem para a Cooperao Internacional

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis

Instituto Chico Mendes de Conservao da Biodiversidade

Imposto sobre Circulao de Mercadoria

Ingesto Diria Recomendada

International Development Research Centre

Imposto sobre Exportao

Instituto de Meio Ambiente do Acre

Instruo Normativa

Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria

Instituto Nacional da Seguridade Social

Imposto sobre Produtos Industrializados

Imposto Predial e Territorial Urbano

Imposto de Renda Pessoa Fsica

Imposto sobre Renda e proventos de qualquer natureza Pessoa Jurdica

ndice de Sustentabilidade

Instituto Sociedade, Populao e Natureza

Imposto sobre Servios

Unio para a Conservao da Natureza

ndice Individual de Sustentabilidade

Lipoprotena de Baixa Densidade

Licena de Explorao Florestal

Ministrio da Agricultura e Pecuria

Ministrio do Desenvolvimento Agrrio

Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome

Ministrio da Educao

Ministrio da Fazenda

Ministrio do Meio Ambiente

Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto

xix

MS

MFS

OAB

OECD

OMS

ONG

PAA

PEF

PESO

PGPM-Bio

PFNMs

PIB

PIS

PMFS

PNAE

PNPCT

POA

POP

PPP-Ecos

Pronaf

RDS

Resex

RL

SAF

SAF

SAG

SBACO

SBF

Sebrae

SFB

SISBI- IA

SISBI-POA

SISBI-POV

Ministrio da Sade

Manejo Florestal Sustentvel

Ordem dos Advogados do Brasil

Organisation for Economic Co-operation and Development

Organizao Mundial da Sade

Organizao No Governamental

Programa de Aquisio de Alimentos da Agricultura Familiar

Plano de Explorao Florestal

Projeto Extrativista Sustentvel Orgnico

Poltica de Garantia de Preos Mnimos Modalidade Produtos da

Sociobiodiversidade

Produtos Florestais No madeireiros

Produto Interno Bruto

Programa de Integrao Social

Plano de Manejo Florestal Sustentvel

Programa Nacional de Alimentao Escolar

Poltica Nacional de Desenvolvimento Sustentvel de Povos e

Comunidades Tradicionais

Plano Operacional Anual

Procedimento Operacional Padronizado

Programa de Pequenos Projetos Ecossociais

Programa Nacional da Agricultura Familiar

Reservas de Desenvolvimento Sustentvel

Reserva Extrativista

Reserva Legal

Secretaria de Agricultura Familiar

Sistema Agroflorestal

Sistema Agroalimentar

Sistema Brasileiro de Avaliao da Conformidade Orgnica

Secretaria de Biodiversidade e Florestas

Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas

Servio Florestal Brasileiro

Sistema Brasileiro de Inspeo de Insumos Agrcolas

Sistema Brasileiro de Inspeo de Produtos de Origem Animal

Sistema Brasileiro de Inspeo de Produtos de Origem Vegetal

xx

Sisnama

SNVS

Suasa

SUS

TL/TIP

UC

UN/UNDP

UnB

UNICEF

VLDL

ZEE

Sistema Nacional de Meio Ambiente

Sistema Nacional de Vigilncia Sanitria

Sistema Unificado de Ateno Sanidade Agropecuria

Sistema nico de Sade

Taxa de Limpeza e Taxa de Iluminao Pblica

Unidade de Conservao

United Nations/United Nations Development Program

Universidade de Braslia

Fundo das Naes Unidas para a Infncia

Protena de Muito Baixa Densidade

Zoneamento Ecolgico-Econmico

xxi

SUMRIO

Lista de figuras................................................................................................................... xii

Lista de tabelas.................................................................................................................. xiii

Lista de quadros................................................................................................................. xv

Lista de grficos................................................................................................................. xvi

Lista de siglas e abreviaes utilizadas............................................................................. xvii

Sumrio.............................................................................................................................. xxi

Introduo.......................................................................................................................... 1

1 Objeto e mtodos de pesquisa....................................................................................... 10

1.1 Identificao do problema.......................................................................................... 10

1.2 Hiptese..................................................................................................................... 11

1.3 Objetivo...................................................................................................................... 11

1.4 Objetivos especficos................................................................................................. 11

1.5 Mtodos e tcnicas de pesquisa............................................................................... 12

1.5.1 Mensurao da sustentabilidade....................................................................... 12

1.5.1.1 ndice individual de sustentabilidade............................................................... 13

1.5.1.2 ndice de sustentabilidade............................................................................... 14

1.5.1.3 Grau de sustentabilidade................................................................................ 14

1.6 Identificao dos obstculos enfrentados pelo agricultor e instituies no mbito

da cadeia produtiva do baru............................................................................................ 15

1.7 Origem dos dados..................................................................................................... 15

1.8 Amostragem.............................................................................................................. 16

1.9 Coleta de dados......................................................................................................... 17

1.10 Entrevistas semiestruturadas.................................................................................. 18

1.11 Modelo produtivo do baru........................................................................................ 18

2 Referencial terico.......................................................................................................... 20

3 Legislao....................................................................................................................... 37

3.1 Legislao Ambiental aplicada ao uso sustentvel de PFNMs................................. 40

3.1.1 Constituio Federal.......................................................................................... 40

3.1.2 Legislao Federal............................................................................................. 41

3.1.2.1 Manejo Florestal........................................................................................... 41

3.1.2.2 Licenciamento Ambiental............................................................................. 48

3.1.2.2.1 Produtos florestais no madeireiros........................................................ 48

3.1.2.2.2 rea de Preservao Permanente.......................................................... 51

xxii

3.1.2.2.3 Reserva Legal........................................................................................ 54

3.1.2.2.4 Floresta plantada com nativas............................................................... 56

3.1.2.2.5 Extrativismo sustentvel orgnico.......................................................... 57

3.1.2.2.6 Licenciamento ambiental de agroindstrias de transformao de

PFNMs................................................................................................................... 59

3.2 Legislao sanitria aplicada ao uso de PFNMs...................................................... 60

3.3 Legislao civil aplicada s atividades de comercializao de PFNMs por pessoa

fsica e jurdica na rea rural.......................................................................................... 66

3.3.1 Associaes...................................................................................................... 67

3.3.2 Cooperativas..................................................................................................... 69

3.4 Legislao sobre a explorao de PFNMs no Estado de Gois.............................. 72

4 Indicadores e dimenses da sustentabilidade............................................................... 75

4.1 Dimenses da sustentabilidade................................................................................ 75

4.2 Indicadores das dimenses da sustentabilidade...................................................... 81

4.2.1 Mensurao das dimenses da sustentabilidade............................................. 82

4.2.2 Critrios e verificadores.................................................................................... 87

5 Obstculos relacionados explorao do baru............................................................. 105

6 Cadeia produtiva do baru............................................................................................... 113

6.1 Cadeia produtiva: conceito........................................................................................ 113

6.1.1 Anlise de filire................................................................................................ 115

6.1.2 O enfoque do sistema de commodities (Commodities System Aproach)......... 117

6.1.3 Os agentes da cadeia produtiva........................................................................ 118

6.2 As cadeias de biodiversidade.................................................................................... 119

6.3 Cadeia produtiva do baru.......................................................................................... 122

6.4 Caracterizao do ambiente externo da cadeia produtiva do baru........................... 124

6.4.1 Polticas pblicas............................................................................................... 124

6.4.2 Caracterizao dos principais segmentos da cadeia produtiva do baru nos

Municpios de Pirenpolis e Formosa, Gois.............................................................. 128

6.4.2.1 Fornecedores de insumos............................................................................... 128

6.4.3 Unidades produtivas........................................................................................ 130

6.4.3.1 Municpio de Formosa, GO............................................................................. 130

6.4.3.2 Municpio de Pirenpolis, GO......................................................................... 133

6.4.4 Histria do uso do baru como alimento humano................................................ 137

6.4.5 Produo da amndoa do baru.......................................................................... 138

xxiii

6.4.6 Preo pago aos produtores................................................................................ 143

6.4.7 Distribuio........................................................................................................ 143

6.4.8 Mercado consumidor.......................................................................................... 144

7 Modelo de produo do baru.......................................................................................... 145

7.1 Modelo de explorao do baru em trs comunidades rurais no Cerrado Goiano.... 145

7.2 Modelo de explorao sustentvel do baru em trs comunidades rurais nos

Municpios de Formosa e Pirenpolis, Gois.................................................................. 150

8 Resultados e discusso.................................................................................................. 163

8.1 Agricultores familiares............................................................................................... 163

8.1.1 ndice de sustentabilidade.................................................................................. 163

8.1.2 Resultados por comunidade.............................................................................. 167

8.1.3 Caractersticas socioeconmicas dos agricultores e da atividade de

explorao de baru..................................................................................................... 169

8.1.4 Obstculos apontados pelos agricultores explorao do baru............ 172

8.2 Instituies................................................................................................................. 177

8.2.1 ndice de Sustentabilidade................................................................................. 177

8.2.2 Obstculos apontados pelas instituies que utilizam o baru........................... 180

Concluses........................................................................................................................ 182

Recomendaes................................................................................................................ 188

Referncias bibliogrficas.................................................................................................. 190

Anexos............................................................................................................................... 216

1

INTRODUO

O Brasil conta com a maior floresta tropical mida do planeta a Floresta Amaznica

, que se constitui na maior rea de floresta tropical remanescente (40% das florestas

tropicais do planeta), com 3,7 milhes de km em territrio brasileiro (MMA, 1998). O pas

tambm possui outros biomas terrestres como o Bioma Cerrado, o Bioma Mata Atlntica, o

Bioma Caatinga, o Bioma Pantanal e o Bioma Pampa1 (Figura 1).

A variedade dos biomas brasileiros abriga uma das maiores biodiversidades do mundo

(MMA, 2007a). Uma parte significativa dessas espcies nativas ainda desconhecida para

a cincia a exemplo dos microorganismos do solo e insetos sendo que apenas uma

pequena frao foi classificada. Algumas espcies vegetais j foram domesticadas ou esto

em processo de domesticao, representando, atualmente, importncia econmica, tais

como a mandioca, o caju, o abacaxi, o amendoim, a seringueira, a castanha do Brasil, o

cupuau, a jabuticaba e o maracuj, entre outras.

Figura 1 Biomas Continentais Brasileiros Fonte: IBGE, 2004.

O pas tambm se destaca por possuir uma grande sociobiodiversidade, representada

por mais de 200 povos indgenas e por nmero significativo de comunidades locais com

estilo de vida tradicionais como os sertanejos/vaqueiros, caipiras/sitiantes, quilombolas,

ribeirinhos, pantaneiros (DIEGUES, 2001), que apresentam um inestimvel acervo de

conhecimentos sobre a conservao e sistemas tradicionais de manejo dos recursos da

biodiversidade.

1 O mapa de biomas continentais do Brasil pode ser encontrado em:

.

ftp://ftp.ibge.gov.br/Cartas_e_Mapas/Mapas_Murais/

2

O Bioma Cerrado, localizado na regio central do Brasil, ocupa 23,92% do territrio

nacional, em uma extenso de 2.036.448 km (IBGE, 2008). O termo Cerrado utilizado

para designar o conjunto de ecossistemas (savanas, matas, campos e matas de galeria) que

ocorrem no Brasil Central (EITEN, 1977). Esta fitofisionomia faz parte da paisagem do

Distrito Federal e dos Estados de Gois, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais,

Bahia, So Paulo, Tocantins, Maranho, Piau e Rondnia (Figura 2).

Figura 2 Distribuio geogrfica do bioma Cerrado no Brasil, com a indicao de reas disjuntas Fonte: Henriques (2005, p. 77).

O Cerrado tambm ocorre em reas disjuntas (encraves) ao norte dos Estados do

Amazonas (Campos de Humait), Rondnia (Serra dos Pacas Novos), Par (Serra do

Cachimbo), Bahia (Chapada de Diamantina) (MACHADO et al., 2004) e em pequenas ilhas

no Paran (RIBEIRO; DIAS, 2007).

Sua vegetao tpica desenvolveu-se sobre solos muito antigos, cidos, com altas

concentraes de alumnio e pobres em nutrientes. A classe de solo mais frequente neste

Bioma dos latossolos (46%), que na paisagem ocorrem em relevo plano a suave-

ondulado, com solos profundos, porosos, de textura homognea ao longo do perfil variando

de bem, forte e acentuadamente drenado (REATTO; MARTINS, 2005). Apresenta uma

grande diversidade de paisagens que determina uma grande diversidade florstica,

3

colocando o Cerrado como uma das savanas mais biodiversas do mundo (FELFILI et al.,

2005). Plantas herbceas, arbustivas e arbreas somam aproximadamente 12.070

espcies, sendo 4.208 endmicas (Tabela 1). A avifauna rica, e conta com 837 espcies

catalogadas, porm o nvel de endemismo baixo (4,3%) (Tabela 1).

Tabela 1 - Nmero total de espcies, espcies endmicas e endemismo (%) no Bioma Cerrado.

Total Espcies

endmicas Endemismo

(%)

Plantas 12.070 4.208 34,9

Mamferos 195 18 9,2

Aves 837 36 4,3

Rpteis 150-180 20 13,33 -11,11

Anfbios 113 - 150 32 28,31 21,33

Peixes de gua doce 1.000 - 0,0

Fonte: Forzza et al.(2010); Sabino; Prado (2005), com adaptao.

No domnio dos ecossistemas que constituem o Cerrado, podem ser encontradas

vrias espcies vegetais nativas exploradas pelas comunidades rurais e urbanas. Espcies

como Caryocar brasiliense Cambess. (pequ), Dipteryx alata Vog. (baru), Hancornia

speciosa Gomez (mangaba), Hymenaea spp. (jatob), Eugenia desinterica (cagaita),

Anacardium humile A. St.-Hil. (cajuzinho), Talisia esculenta Radlk. (pitomba), entre outras,

so utilizadas diretamente para alimentao (ALMEIDA, 1998) e comercializao. Espcies

lenhosas como Myracrodruon urundeuva Fr. All. (aroeira), Schinopsis brasiliensis Engl.

(brana), Tabebuia spp. (ip), Aspidosperma spp. (perobas) e Amburana cearensis (Fr. All.)

A. C. Smith (cerejeira) so utilizadas na construo civil (SCARIOT; SEVILHA, 2005).

Nas ltimas trs dcadas, tem-se assistido a um acelerado processo de transformao

da paisagem do Cerrado com a substituio da vegetao nativa por pastos ou monocultura

de gros e da cana-de-acar. De acordo com o MMA (2011), entre 2002 e 2008, a rea

desmatada desse Bioma foi de 85.047 km e at 2009 acumulava um percentual de

desmatamento de 48,2%.

Se por um lado essas mudanas contriburam para o desenvolvimento econmico da

regio, por outro trouxeram severos impactos ao meio ambiente, causando a contaminao

dos solos e das guas por agrotxicos, eroso da camada superficial dos solos, perda da

biodiversidade, alm das adversidades sociais, tais como a expulso dos trabalhadores

rurais para a periferia das grandes cidades, criando-se um exrcito de desempregados,

alm da desestruturao de comunidades tradicionais que tinham como atividade de

subsistncia a explorao das reas naturais (DUARTE, 2002).

4

So apontados, como causas que contribuem para o desmatamento desse Bioma, o

uso ilegal da vegetao nativa para produo de carvo vegetal e lenha, a impunidade dos

ilcitos ambientais, a existncia de reas subutilizadas, degradadas e abandonadas, o baixo

reconhecimento do valor dos servios ambientais e o baixo percentual de reas protegidas

por meio de unidades de conservao e terras indgenas (MMA, 2010).

Segundo Duboc et al. (2007), o carvo oriundo de florestas plantadas tem sido

insuficiente para abastecer o mercado, o que leva ao aproveitamento de resduos lenhosos

da expanso da fronteira agrcola, intensificando a presso sobre as florestas nativas,

especialmente o Cerrado. Os autores afirmam que do total de carvo vegetal produzido no

Brasil no ano de 2005, 34,5% foram originrios do Cerrado.

Segundo o IBGE (2009), desde 1999 a produo de carvo da extrao vegetal vem

apresentando uma tendncia de crescimento, somente sendo revertida a partir de 2006

(Grfico 1). Em 2004 o pas produziu 2.185.950 t Mato Grosso do Sul (23,64%), Minas

Gerais (9,85%), Maranho (19,70%); Gois (15,36%); e Bahia (10,54%). Em 2005, foram

produzidas 2.972.405 t Bahia (26,9%); Mato Grosso do Sul (18,8%); Maranho (16,9%);

Gois (10,8%); e Minas Gerais (10,4%). Em 2006, foram produzidas 2.505.733 t Mato

Grosso do Sul (24,0%), Maranho (19,0%), Bahia (14,5%), Gois (11,4%), Minas Gerais

(10,5%) e Par (8,6%) (IBGE, 2007). Em 2007, a produo voltou a crescer, com um

aumento de 1%, sendo produzidas 2.530.425 t Maranho (29,1%), Mato Grosso do Sul

(16,9%), Minas Gerais (16,6%), Gois (9,0%), Par (8,6%), Paran (7,4%), Piau (5,9%) e

Bahia (2,2%). Embora a produo de carvo oriunda dos estados onde ocorre o Cerrado

esteja diminuindo, mais provvel que venha ocorrendo em funo do esgotamento das

reservas de vegetao nativa e no de uma fiscalizao efetiva que coba o desmatamento.

De qualquer forma, o desmatamento de reas nativas do Cerrado para produo de

carvo vegetal reduz as reas onde os grupos humanos coletam espcies vegetais para a

sua automanuteno e comercializao de excedentes.

Grfico 1 Quantidade de carvo vegetal produzida na extrao vegetal, de 1990 a 2009, nos estados em que ocorre o Cerrado e no Brasil Fonte: IBGE, PEVS (2009).

5

Quanto a polticas voltadas para a conservao da vegetao nativa do Cerrado, no

ano de 2010, o Governo Federal lanou o Plano de Ao para Preveno e Controle do

Desmatamento e das Queimadas no Cerrado (PP Cerrado), tendo como objetivo promover a

reduo contnua da taxa do desmatamento e da degradao florestal, e tambm a

incidncia de queimadas e incndios florestais no Bioma. At a data do lanamento desse

Plano no havia nenhum programa ou poltica de controle do desmatamento, sequer de

monitoramento sistemtico para o Cerrado (SAWYER, 2009a) a no ser aes pontuais que

no demonstravam ser muito efetivas.

Apesar da riqueza da flora do bioma, o pas ainda no se mostrou capaz de aproveitar

seus mltiplos recursos, transformando-os em bens e servios de alto valor agregado. As

reas do Cerrado que ainda no sofreram o processo de substituio da vegetao so

ainda carentes de estudos. Sabe-se pouco acerca da distribuio das espcies vegetais,

sua dinmica populacional, sua fenologia, pragas e doenas mais comuns, potencial de uso,

etc. Da mesma forma, so escassas as informaes sobre a produo extrativa e sobre

vrios aspectos das comunidades que tm na explorao de Produtos Florestais No

Madeireiros (PFNMs) uma atividade de subsistncia e produo para comercializao.

O Censo Agropecurio 2006 (IBGE, 2010) traz poucos dados sobre espcies

extrativas vegetais da Regio Centro-Oeste. Espcies como o baru e a gairoba, bastante

consumidas pela populao, so sequer mencionadas. Podemos afirmar que existe uma

produo oculta de PFNM nesta Regio, no considerada pelos rgos censitrios.

Nem mesmo aquelas espcies cujos frutos so processados na forma de polpas e que

so destinadas ao mercado das cidades (CARDOSO; TAVARES, 2008) aparecem nas

estatsticas oficiais. Nas feiras livres das pequenas cidades e distritos da Regio podem ser

encontrados frutos do Cerrado expostos venda e que no fazem parte das estatsticas do

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) e muito menos das estatsticas

estaduais.

Tabela 2 Quantidade produzida na extrao vegetal por produto alimentcio extrativo na Regio Centro-Oeste, em 2009, em toneladas

Censo Agrcola 2006 PEVS 2009

Produto Quantidade (tonelada)

Produto Quantidade (tonelada)

Amndoa de pequi 456 Castanha-do-Par 1.527

leo de copaba 27 Erva-mate cancheada 282

Palmito 94 Palmito 52

Fonte: IBGE, Censo Agrcola (2006), PEVS (2009).

6

As instituies engajadas na luta contra a destruio do Cerrado tm chamado a

ateno para a contnua perda das reas de vegetao nativa em razo do desmatamento e

de outras formas de uso do solo. Na tentativa de minimizar os efeitos do avano da

agricultura comercial sobre os remanescentes da vegetao do Cerrado, alguns rgos

pblicos vm tomando iniciativas que vo desde a criao de unidades de conservao at

aes direcionadas valorizao dos produtos provenientes da explorao sustentvel

desse Bioma. Apesar de se constiturem em iniciativas ainda bastante tmidas, as aes

voltadas para o fortalecimento das cadeias produtivas de produtos e servios gerados a

partir dos componentes da biodiversidade tem constado de projetos geridos por rgos

setoriais em nvel federal e estadual e tambm por organizaes no governamentais

(ONGs). Como resultado desses esforos, pequenas quantidades desses produtos

comeam a ser consumidas nos centros urbanos, como o caso da amndoa do baru e

polpas de frutas do cerrado (CARDOSO; TAVARES, 2008).

Apesar dos esforos para a viabilizao de iniciativas que promovam a

explorao/comercializao de PFNMs no pas, so poucos os mecanismos pblicos ou

privados voltados para o fortalecimento dos empreendimentos que j esto inseridos no

mercado, ou mesmo para promover o desenvolvimento local a partir da promoo de

produtos florestais, no mbito de iniciativas que fortaleam os atores locais para que sejam

sujeitos das suas prprias aes.

Da mesma forma, so escassas as informaes a respeito dos fatores que

condicionam o fracasso e o sucesso desses empreendimentos. A inexistncia de dados

dessa natureza impede a formulao de polticas pblicas mais realistas voltadas para o

segmento.

Para o agricultor familiar que tem na prtica da explorao de PFNMs um meio de

obter divisas, so vrios os obstculos que enfrenta para levar adiante as atividades de

coleta, transporte, processamento e comercializao desses produtos, e que costumam

inviabilizar a sua produo. Da mesma forma, as dificuldades se multiplicam ao longo da

cadeia produtiva desses produtos. Esses obstculos podem se apresentar nas mais

variadas formas: marcos regulatrios inadequados (sanitrios, ambientais e fiscais); falta de

capacitao do agricultor para as diversas etapas do processo produtivo; inadequao da

infraestrutura para explorao dos recursos; baixa capacidade de estoque; dificuldades de

acesso ao crdito; baixa eficincia e ausncia dos servios de extenso e orientao ao

produtor; incipincia da cadeia logstica de mercado (distribuio e comrcio) destes

produtos, ou mesmo na ausncia de condicionantes que deve atender o empreendedor para

o alcance de bons resultados: bom conhecimento do mercado em que atua; boa estratgia

7

de vendas; persistncia, perseverana e criatividade; boa administrao e busca de capital

prprio para o seu negcio (SEBRAE, 2007).

Os esforos para a remoo desses obstculos tm mobilizado alguns setores da

sociedade em razo dos benefcios que o uso sustentvel da biodiversidade pode trazer ao

pas, principalmente pela possibilidade de realizao de aes articuladas de

sustentabilidade que geram ganhos ambientais. O uso sustentvel da biodiversidade em

larga escala contribui para a manuteno das funes ecossistmicas (gua, biodiversidade

e clima) de vastas reas do territrio nacional, promove a gerao de renda complementar

para milhes de famlias e a segurana alimentar, alm de favorecer a produo de

alimentos (SAWYER, 2009b).

Os problemas ligados s cadeias produtivas baseadas em PFNMs exigem do poder

pblico, da sociedade civil organizada e da academia, solues que promovam a sua

sustentabilidade. Cadeias de produtos naturais bem estruturadas so estratgicas para o

pas do ponto de vista econmico, social e ambiental. Do ponto de vista econmico porque

geram renda para as famlias que exploram os recursos da natureza. Do ponto de vista

social porque criam postos de trabalho para grupos excludos das polticas econmicas

vigentes e promovem o seu bem-estar. Do ambiental, porque se apresentam como uma

alternativa sustentvel ao modelo de explorao adotado pela agricultura de exportao

que, apesar de trazer divisas ao pas, provoca severos danos sociais e ambientais.

So identificados diversos problemas ligados a estas cadeias produtivas, tanto os que

tm origem na situao socioeconmica do agente que explora o recurso, quanto aqueles

inerentes prpria atividade, tais como a falta de informaes, a carncia de infraestrutura

para transporte, armazenamento e processamento dos produtos explorados, a falta de

tecnologia para aumentar a produtividade, a falta de competncia negocial, a inadequao

da legislao, a carncia de crdito a este tipo de produo e dificuldades que se encontra

para se integrar ao mercado, entre outros.

Grande nmero de comunidades rurais estabelecidas na Amaznia e que exploram

PFNMs, mesmo enfrentando problemas de infraestrutura tais como a falta de saneamento

bsico e gua tratada, precariedade dos servios de educao e de sade fornecidos pelo

Estado e deficincia do servio de assistncia tcnica, orientam suas prticas de trabalho e

organizao social no sentido da conservao e uso dos recursos da biodiversidade (SILVA;

TAVARES, 2006). Como reconhecem a importncia desses recursos para a prpria

sobrevivncia, procuram conserv-los e utiliz-los da melhor maneira possvel.

Em outras regies do pas, grupos sociais que exploram extensivamente os recursos

naturais vegetais enfrentam os mesmos problemas enumerados acima. Alguns desses

8

grupos se organizam na busca de solues que os ajudem a superar as dificuldades,

abrindo-lhes perspectivas para um meio de vida mais sustentvel2.

O conjunto de normas que incidem sobre o uso e manejo de componentes da

biodiversidade, apesar de ser de fundamental importncia para a regulamentao dessa

prtica e mesmo para a sade de quem consome esses produtos, pode trazer dificuldades

para os grupos rurais que exploram os PFNMs. Em razo disso, dispositivos, que ao regular

a atividade econmica, impem procedimentos complexos e dispendiosos costumam ser

ignorados pela populao. Mais grave ainda, a falta de regulamentao da norma traz

insegurana institucional e confunde o cidado.

Para Sawyer (2009b), os entraves regulatrios no so muito evidentes e geralmente

s se manifestam quando a iniciativa levada a termo pelo agricultor. Enquanto no

esbarram com esses obstculos, poucos agricultores, tcnicos da extenso e estudiosos do

assunto, compreendem os limites apresentados pelos diversos marcos regulatrios

sanitrios, ambientais, fiscais e outros que incidem sobre o uso sustentvel da

biodiversidade no Brasil. No entanto, por situaes mais adversas que esses entraves

possam causar, no podem levar ao pensamento que as normas devem ser eliminadas ou

flexibilizadas. O que se defende a sua adequao para as realidades heterogneas que

caracterizam o territrio nacional.

Este trabalho consiste em verificar se a explorao da amndoa do baru em dois

Municpios do Estado de Gois pode ser caracterizada como uma alternativa sustentvel de

gerao de renda para os atores da cadeia produtiva deste produto, verificando o grau de

sustentabilidade da atividade a partir da mensurao das dimenses da sustentabilidade.

Aprofundar o conhecimento a respeito das dificuldades encontradas pelos atores que

intervm nas cadeias de produtos florestais no madeireiros, levando-se em considerao a

sua perspectiva a respeito do assunto, ou seja, a sua percepo sobre os obstculos

enfrentados ao longo da cadeia produtiva torna-se uma medida importante que ir

proporcionar elementos para a criao de mecanismos que venham a super-los, alm de

fornecer subsdios para a formulao de polticas pblicas direcionadas ao uso sustentvel

de componentes da biodiversidade.

Estes conhecimentos, ao contriburem para uma maior compreenso dos limites da

explorao do baru, fornecero elementos que permitiro s instncias governamentais

competentes, contando com a participao democrtica dos atores da cadeia produtiva, a

busca por solues mais adequadas para os problemas que surgem a partir da explorao

do recurso natural, ou mesmo viabilizar mecanismos facilitadores da explorao sustentvel

2 De acordo com Scoones (1998), um meio de vida sustentvel permite enfrentar as possveis tenses e

transtornos e manter ou melhorar sua capacidade ou ativos (materiais e sociais) sem depauperar a base dos recursos naturais (p. 5).

9

da espcie, tornando a atividade uma possvel forma de produo e gerao de renda capaz

de conciliar a conservao ambiental e o desenvolvimento social e econmico das

populaes humanas que vivem no meio rural.

10

1 OBJETO E MTODOS DE PESQUISA

1.1 IDENTIFICAO DO PROBLEMA

A explorao de PFNMs, tendo como apelo o fato de ser uma atividade que contribui

para a manuteno da floresta em p, ou seja, para a conservao da biodiversidade, e

uma opo de gerao local de renda capaz de conciliar um desenvolvimento

economicamente vivel, socialmente justo e ambientalmente sustentvel, vem sendo

valorizada em aes dirigidas para a conservao e uso sustentvel do meio ambiente

(GUERRA et al., 2009; FIEDLER et al., 2008; CNDIDO et. al., 2008; BALZON, 2006; ROS-

TONEN, 2000; SAWYER et al., 1997; CAMPBELL; TEWARI, 1996).

A explorao da amndoa do baru, por estar inserida nesse contexto e no provocar

impactos significativos ao meio ambiente vem sendo apontada como estratgia para a

conservao sustentvel da biodiversidade (ARAKAKI et al., 2009; BASSINI, 2008; SANO et

al., 2004).

A produo da amndoa como atividade empreendedora recente e tem recebido

crticas favorveis e desfavorveis quanto sua viabilidade econmica. Para Arakaki et al.

(2009), seu uso amplia a gerao de renda e traz melhoria da qualidade de vida s

comunidades rurais. Os que se mostram cticos recomendam cuidadosos estudos de

mercado e planos de negcio antes de se incentivar tal atividade (NOGUEIRA et al., 2009).

Apesar do crescente interesse que a amndoa vem despertando como negcio, pouco

se conhece acerca da sua cadeia produtiva, seus limites e oportunidades e o papel exercido

por cada um dos seus atores.

Uma das caractersticas desfavorveis do produto quando chega ao mercado

particularmente no Estado de Gois a irregularidade no fornecimento, porm, acredita-se

que essa deficincia ocorra em funo de diferentes categorias de problemas que ocorrem

ao longo da cadeia produtiva. So problemas que podem ter origem na falta de informaes

sobre a espcie (ecologia, fenologia, usos, manejo, forma de processamento, etc.), na

dificuldade de atendimento aos dispositivos legais previstos na legislao fiscal, sanitria e

ambiental que regula a conservao e uso de componentes da biodiversidade no Brasil, e

at mesmo aqueles gerados pela competio de mercado.

Identificar esses obstculos, as suas origens e implicaes, mensurar a

sustentabilidade da cadeia produtiva do baru e ao mesmo tempo conhecer as condies

econmicas, sociais e ambientais em que este produto explorado, permitir identificar se a

explorao dessa amndoa se caracteriza como uma alternativa sustentvel de gerao de

renda.

11

Seguindo este raciocnio e tomando como objeto de estudo a cadeia produtiva do baru

no Cerrado Goiano, chega-se a seguinte indagao: A explorao do baru no Cerrado

Goiano nas circunstncias atuais uma alternativa sustentvel de gerao local de renda?

1.2 HIPTESE

Com base nos elementos apresentados, foi formulada uma hiptese de trabalho mais

ampla, descrita abaixo, seguida de outras duas sub hipteses:

A explorao do fruto do baru uma alternativa sustentvel de gerao de renda

para os atores da sua cadeia produtiva em dois municpios Goianos nos quais predomina a

vegetao do Cerrado.

a) Normas no regulamentadas ou que demandam comandos de difcil cumprimento

por parte dos atores se convertem em obstculos que interferem negativamente na

sustentabilidade da cadeia produtiva do baru.

b) O sistema de produo do baru no Cerrado possui caractersticas que o diferenciam

dos demais sistemas de explorao de PFNMs e que devem ser consideradas na

viabilizao da explorao sustentvel da espcie.

1.3 OBJETIVO

Identificar por meio de indicadores e de informaes socioeconmicas se a atividade

de explorao do fruto do baru nativo em dois municpios goianos do Bioma Cerrado pode

se caracterizar como uma alternativa sustentvel de gerao de renda para os atores da

cadeia produtiva deste produto.

1.4 OBJETIVOS ESPECFICOS

(i) Estudar as caractersticas do arranjo extrativista do baru a partir de trs comunidades

rurais da regio do Cerrado do Estado de Gois e dos atores que intervm nessa cadeia;

(ii) Analisar o grau de sustentabilidade da explorao do baru no mbito da sua cadeia

produtiva com o auxlio de ndice e indicadores;

(iii) Identificar os principais obstculos encontrados pelos atores da cadeia produtiva do baru

para viabilizar as operaes de produo, processamento, beneficiamento e distribuio

desse produto;

(iv) Verificar se a legislao ambiental, sanitria, civil e fiscal/tributria brasileira pode ser

considerada um obstculo na explorao da amndoa do baru;

(v) Propor um modelo para a explorao sustentvel do baru no Cerrado.

12

1.5 MTODOS E TCNICAS DE PESQUISA

Com o objetivo de verificar se a atividade de explorao do baru no Cerrado Goiano

pode ser considerada uma alternativa sustentvel de gerao local de renda, optou-se

inicialmente pela coleta de dados que possibilitasse a descrio da cadeia produtiva desta

amndoa. Com o uso de indicadores, foi realizada a mensurao da sustentabilidade dessa

cadeia em trs comunidades rurais do Estado de Gois (item 1.8) e junto a

empresas/associaes/cooperativas estabelecidas em Goinia, Alto Paraso e Braslia que

utilizam o baru como matria-prima.

Outra tcnica de coleta de dados consistiu na identificao dos principais obstculos

que enfrentam os agricultores familiares nas atividades de coleta, extrao, processamento,

comercializao e distribuio da amndoa do baru, bem como as dificuldades encontradas

pelas instituies de processamento, comercializao e distribuio dos produtos base

dessa matria-prima.

Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com formuladores de polticas pblicas

pertencentes s duas esferas de poder (Executivo e Legislativo) no sentido de conhecer

suas percepes sobre as iniciativas voltadas para o apoio explorao do baru.

1.5.1 Mensurao da sustentabilidade

Inicialmente procurou-se mensurar a sustentabilidade da cadeia produtiva a partir de

um ndice resultante da agregao de indicadores distribudos por cinco dimenses da

sustentabilidade: ambiental, econmica, social, poltico e da sade. Para cada dimenso da

sustentabilidade foram criados indicadores, tanto para medir a sustentabilidade da atividade

dos agricultores-coletores quanto das instituies privadas que utilizam o baru.

Os indicadores utilizados para aferir a sustentabilidade das atividades de explorao

do fruto do baru por agricultores familiares foram elaborados a partir de ampla reviso

bibliogrfica com destaque para a metodologia formulada por Ritchie et al. (2001) e

adaptada para a vegetao nativa do Cerrado.

J os indicadores para aferio da sustentabilidade das instituies processadoras do

baru foram criados aps reviso da bibliografia sobre sustentabilidade em empresas e

cooperativas, uma vez que muito pouco foi encontrado na literatura sobre sustentabilidade

em pequenas e micro empresas. A partir dessa constatao, procurou-se adaptar aqueles

indicadores s condies dessas empresas.

Partiu-se do pressuposto que um sistema de indicadores deve representar o mais

fielmente possvel o desenvolvimento sustentvel, no entanto, acredita-se que no existe

ainda o indicador perfeito, pois todos eles apresentam alguma deficincia quando se trata de

mensuraes envolvendo as dimenses da sustentabilidade.

13

m

m

Para chegar-se ao grau da sustentabilidade da atividade de explorao do baru, foi

adotado o seguinte procedimento:

(a) Aps o preenchimento dos questionrios contendo os indicadores, foi calculado

o ndice Individual de Sustentabilidade (Iw) para todos os agricultores amostrados e

para as cinco dimenses da sustentabilidade: ambiental, econmica, social, poltica e

da sade, e na sequncia, foi calculado o ndice de Sustentabilidade (IS) geral para as

comunidades estudadas;

(b) Foi calculado tambm o ndice Individual de Sustentabilidade (Iw) para cada

instituio a partir das respostas do questionrio aplicado e na sequncia, foi calculado

o ndice de Sustentabilidade (IS) para estas instituies;

(c) Finalmente, foi estabelecido o grau de sustentabilidade das comunidades

estudadas e das instituies privadas, por categoria, para fins de comparao.

1.5.1.1 ndice Individual de Sustentabilidade (Iw)

Este ndice foi calculado para as cinco dimenses empregando-se a seguinte frmula:

= (3)

Iw = ndices que comporo o ndice de sustentabilidade econmico, social, ambiental, institucional e da sade; Eij = Escore do i-simo indicador de Iw obtido do j-simo questionrio; Emax i = Escore mximo do i-simo indicador de Iw obtido do j-simo questionrio; i = 1,..., m, nmero de indicadores; j = 1,..., m, nmero de questionrios aplicados; w = 1,..., 5, nmero de ndices que comporo o ndice de sustentabilidade.

Quanto mais prximo de 1 o valor do ndice Iw, melhor o desempenho do objeto de

estudo, ou seja, maior a sustentabilidade das atividades desenvolvidas pelas comunidades

rurais e instituies privadas que fazem parte da cadeia produtiva do baru. O indicador est

dentro do intervalo: 0 < Iw < 1.

Para esta metodologia, o valor do ndice nunca atingir zero, pois a partir do momento

que o agricultor ou a instituio privada explora o baru, j haver o acmulo de pontos.

Os questionrios contam com perguntas cujas respostas predeterminadas recebem

pontuao de 0 a 4. Para se calcular o ndice Individual de Sustentabilidade (Iw), soma-se a

pontuao obtida por cada respondente, por questionrio, dividido pelo nmero mximo de

pontos que pode ser obtido.

3 Rabelo e Lima (2007); Barreto et al. (2005); Khan e Passos (2001); Fernandes et al. (1997).

i=1

i=1

Eij

Emax i

1 n Iw

14

1.5.1.2 ndice de Sustentabilidade (IS)

Os indicadores utilizados para calcular o ndice de Sustentabilidade (IS) foram os

indicadores ambiental, econmico, social, poltico e da sade. Atribuiu-se peso igual a cada

dimenso analisada. O valor de IS a mdia aritmtica dos cinco ndices citados. Quanto

mais prximo de 1 maior o indicador de sustentabilidade nas comunidades e nas instituies

estudadas. O indicador est dentro do intervalo: 0 < IS < 1.

Para o clculo do IS a expresso utilizada foi a seguinte:

(4)

IS = ndice de sustentabilidade; w = valor do w-simo indicador; w = 1,...,k.

1.5.1.3 Grau de sustentabilidade

O grau de sustentabilidade obtido utilizando-se o valor dos ndices de

Sustentabilidade (IS). Desse modo, possibilita conhecer o atual grau de sustentabilidade da

atividade de explorao do baru nas comunidades e nas instituies estudadas. Est

colocado numa escala que vai de 0 at 1, divididos em trs graus distintos: baixo, mdio e

alto nvel de sustentabilidade (Tabela 3). Abaixo de 0,500 e acima de 0 a atividade se

caracteriza por no sustentabilidade devendo o poder pblico, em conjunto com a

sociedade, tomarem as medidas necessrias para sanear os problemas que fizeram o

ndice chegar at esse nvel e tentar tornar a atividade o mais sustentvel possvel. Quando

o valor do ndice fica entre 0,500 e 0,799 significa dizer que a atividade estudada

razoavelmente sustentvel, mas sujeita s vrias medidas para que chegue o mais prximo

possvel de 1. Assim, medida que crescem na direo de 1 vo aumentando as condies

de sustentabilidade.

Para a classificao da sustentabilidade das comunidades rurais e instituies

privadas, estabeleceu-se o seguinte critrio adaptado do ndice de Desenvolvimento

Humano (IDH) do UNDP (UNDP, 1998):

4 Rabelo e Lima (2007); Barreto et al. (2005); Khan e Passos (2001); Fernandes et al. (1997).

k

IS = 1/k Iw w=1

15

Tabela 3 Grau de sustentabilidade das comunidades estudadas segundo os ndices obtidos

Grau Intervalo do ndice

Baixo nvel de sustentabilidade 0 < IS 0,499 Mdio nvel de sustentabilidade 0,500 IS 0,799 Alto nvel de sustentabilidade 0,800 IS 1,000

Fonte: UNDP (1998, p. 224), com adaptao.

1.6 IDENTIFICAO DOS OBSTCULOS ENFRENTADOS PELO AGRICULTOR E

INSTITUIES PRIVADAS NO MBITO DA CADEIA PRODUTIVA DO BARU

Para a identificao desses obstculos, foi utilizada a entrevista projetiva5, que

consistiu na apresentao de cartes coloridos (21cm X 30cm) numerados, contendo frases

que indicavam obstculos explorao do baru, visando estimular a resposta do

entrevistado. A lista dos obstculos apresentados ao entrevistado teve como base o

Relatrio Final do Seminrio de Intercmbio Tecnolgico para Baru, Pequi e Babau (ISPN,

2007) ocorrido em Braslia, em 2007. Os cartes eram mostrados aos agricultores que,

depois de le-los, recebiam uma ligeira explicao sobre o seu contedo. Em seguida, eram

estimulados a responder se aquele era um problema que enfrentavam no mbito das

atividades de coleta, extrao, processamento, comercializao e distribuio da amndoa

do baru. Em caso positivo, a numerao das fichas era lanada no questionrio

socioeconmico do agricultor para posterior anlise.

Metodologia similar foi aplicada nas instituies privadas que utilizam o baru como

matria-prima para seus produtos. Foi apresentado ao entrevistado documento contendo

uma lista de obstculos ao bom funcionamento e crescimento dessas instituies (Anexo 7).

Em seguida, o entrevistado era estimulado a marcar aquelas que correspondessem s

dificuldades que sua empresa/associao/cooperativa vinha enfrentando.

As respostas obtidas foram tratadas por meio do teste de comparao de proporo

visando saber se eram estatisticamente significantes ao nvel de 95%. Aquelas

estatisticamente significantes foram consideradas como obstculos explorao do baru.

1.7 ORIGEM DOS DADOS

Para a realizao da pesquisa foram utilizados dados primrios obtidos a partir da

aplicao de questionrios junto aos atores da cadeia produtiva do baru e tambm a partir

de entrevistas com representantes do executivo federal e estadual e legislativo federal.

Os dados secundrios utilizados foram obtidos a partir da bibliografia pesquisada.

5 uma forma de entrevista baseada na utilizao de recursos visuais onde o entrevistador pode

apresentar ao entrevistado fotos, cartes, painis, filmes, etc.

16

1.8 AMOSTRAGEM

Os agricultores familiares foram selecionados pelo mtodo no probabilstico de

amostragem bola de neve. De acordo com este mtodo, um grupo inicial de agricultores

com caractersticas previamente definidas foi indicado por pesquisadores, agentes de

rgos pblicos federais e estaduais. Aquelas pessoas, aps terem sido entrevistadas,

identificaram outras elementos que pertenciam mesma populao-alvo. Essa forma de

amostragem bastante utilizada para estimar caractersticas raras na populao e sua

principal vantagem aumentar substancialmente a possibilidade de localizar a caracterstica

desejada na populao. No presente caso, a caracterstica desejada foi a explorao da

amndoa do baru.

Nesse entendimento, foram aplicados 19 questionrios em trs comunidades

diferentes, sendo duas no Municpio de Pirenpolis, nos Distritos de Caxamb e Bom Jesus

e uma no Municpio de Formosa, no Assentamento Vale da Esperana (Figura 3). No

Distrito de Caxamb, foram aplicados quatro questionrios, no de Bom Jesus, sete

questionrios e, no Vale da Esperana, 8 questionrios.

Figura 3 Localizao dos Municpios de Formosa e Pirenpolis, no Estado de Gois Fonte: IBGE (2010).

Embora o Distrito de Caxamb (16 00 47 S; 49 02 30.98 O) conte com 598

pessoas, o de Bom Jesus (15 45 49.76 S; 49 09 30.06 O) conte com 233 pessoas

(CARVALHO, 2001) e o Assentamento Vale da Esperana (15 00 08.06 S; 47 24 09.37

O) com 165 famlias (UnB, 2010), no foi possvel selecionar as amostras pelo mtodo

17

probabilstico pelo fato de todo este universo contar com somente 19 famlias que coletam e

extraem a amndoa da baru.

J as instituies privadas que participaram da amostra foram selecionadas pelo

mtodo no probabilstico, uma vez que dependeu do julgamento do pesquisador. De

acordo com este mtodo, as instituies so escolhidas para responderem ao questionrio

por preencherem critrios previamente definidos e relacionados com a relevncia das

informaes que poderiam fornecer. No caso do presente trabalho o principal critrio foi a

utilizao do baru como matria-prima para os produtos que so levados ao mercado

consumidor, ou a outras empresas processadoras. O outro critrio que estas

empresas/associaes/cooperativas deveriam estar estabelecidas prximas s regies

fornecedoras de baru (Formosa e Pirenpolis).

As entrevistas semiestruturadas foram realizadas com representantes de instituies

pblicas nas esferas federal e municipal do poder executivo, com a atribuio de

desenvolver aes na rea de polticas pblicas voltadas para a utilizao sustentvel da

biodiversidade e tambm com representante do poder legislativo federal com atuao na

rea de conservao do Cerrado. Essas instituies tambm foram selecionadas pelo

mtodo no probabilstico.

O modelo sustentvel de explorao do baru em trs comunidades rurais dos

Municpios de Formosa e Pirenpolis, Gois, foi submetido a dirigentes de quatro

instituies privadas comunitrias para validao (associaes e cooperativas). Essas

instituies operam com a amndoa do baru e esto domiciliadas nos Estados de Mato

Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins e Minas Gerais.

1.9 COLETA DE DADOS

A coleta de dados, no mbito deste estudo, foi realizada a partir de questionrios

aplicados, observao direta, entrevistas semiestruturadas e anlise de documentos. Foram

contatados 47 atores, assim distribudos: 19 agricultores familiares, 21 representantes de

instituies privadas (empresas/cooperativa/associao) e sete membros do executivo

federal e municipal e legislativo federal6.

Um dos questionrios aplicados aos agricultores familiares (Anexo 3) consistiu de 27

perguntas/indicadores distribudos pelas cinco dimenses da sustentabilidade e em outro

questionrio (Anexo 4) foram apresentadas perguntas sobre a situao socioeconmica dos

respondentes. Foram aplicados 19 questionrios nos Municpios de Pirenpolis e Formosa.

6 Todas as entrevistas foram realizadas com o consentimento dos entrevistados. Antes de iniciar cada

entrevista, foi informado ao entrevistado que seu nome e o nome da instituio que representava seriam mantidos em sigilo.

18

Outro mtodo consistiu na apresentao de 35 fichas coloridas preenchidas com

obstculos pr-escolhidos referentes coleta, beneficiamento e comercializao da

amndoa do baru. As mensagens contidas na ficha se encontram listadas no Anexo 5. Estas

fichas eram apresentadas ao agricultor que escolhia aquele obstculo que julgava mais

pertinente. A escolha do agricultor era, em seguida, anotada.

J o questionrio aplicado nas instituies privadas (Anexo 6) consistiu de 38

perguntas/indicadores distribudos pelas cinco dimenses da sustentabilidade. Foram

aplicados 21 questionrios em instituies domiciliadas nas cidades de Pirenpolis, Braslia,

Goinia e Alto Paraso. Foi apresentada aos representantes das instituies privadas uma

lista (Anexo 7) com obstculos que enfrentam para viabilizar o seu empreendimento. Os

respondentes marcaram aqueles obstculos mais pertinentes.

1.10 ENTREVISTAS SEMIESTRUTURADAS

Foram realizadas sete entrevistas semiestruturadas com um deputado federal e com

formuladores de polticas pblicas nas esferas federal e municipal do poder executivo. A

entrevista consistiu em perguntas dirigidas diretamente ao entrevistado, cujas respostas

eram gravadas e depois transcritas. Foram entrevistados dirigentes dos seguintes rgos:

Ministrio do Meio Ambiente (MMA), Ministrio do Desenvolvimento Agrrio (MDA),

Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento (Mapa), Servio Florestal Brasileiro

(SFB), Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e Secretaria Municipal de Meio

Ambiente de Pirenpolis.

1.11 MODELO PRODUTIVO DO BARU

Para a proposio do modelo foi realizado levantamento de dados junto aos atores de

cada segmento da cadeia produtiva do baru o que permitiu a confrontao com os modelos

de explorao de recursos naturais vegetais propostos por Homma (1993), Rgo (1992) e

Drummond (1996). Os resultados dessa confrontao levaram a proposio de um modelo

para a explorao do baru no Cerrado Goiano.

Este novo modelo produtivo foi analisado luz das dimenses da sustentabilidade

ecolgica, social, econmica e poltico propostas por Sachs (1993) e da sustentabilidade

da sade (MATIAS; NUNES, 2004), de modo a avaliar se a atividade de explorao do baru

no Cerrado Goiano pode ser considerada uma alternativa sustentvel de gerao local de

renda.

Para fins de validao, o modelo sustentvel de explorao do baru foi apresentado a

dirigentes de instituies privadas que operam com a amndoa. As alteraes sugeridas

foram incorporadas a esse modelo. As instituies que participaram dessa etapa do trabalho

foram: Cooperativa dos Agricultores Familiares e Agroextrativista Grande Serto (Montes

19

Claros, MG), Centro de Produo Pesquisa e Capacitao do Cerrado (Ceppec) (Nioaque,

MS), Cooperativa Mista de Produtores Rurais de Pocon (Comprup) (Pocon, MT) e

Cooperfruto (Santa Maria do Tocantins, TO).

20

2 REFERENCIAL TERICO

O extrativismo foi a primeira atividade realizada pelo homem para manter a sua

subsistncia.

Com as transformaes ocorridas na Terra no fim do paleoltico, quando ocorreu um

novo aquecimento do clima, aliado ao degelo das calotas polares que elevaram o nvel dos

mares, e o surgimento de novas formaes florestais nos continentes, o Homo sapiens teve

que se adaptar a essas novas condies colocando em prtica novas formas de explorao

dos recursos naturais. A pesca e a caa aos grandes e pequenos animais foi aperfeioada

com a inveno de novas armas, armadilhas e apetrechos. Os caadores e extrativistas,

com a escassez dos recursos locais, se deslocavam para outra regio que lhes permitisse

manter a prtica da caa e da coleta de subsistncia (MAZOYER; ROUDART, 1998).

Essas atividades fizeram parte do modo de vida dos indgenas brasileiros, que tiveram

na exuberncia da floresta tropical ou mesmo nas savanas do Planalto Central uma fonte

inesgotvel de recursos naturais. Tendo na atividade extrativa de recursos naturais uma

estratgia de sobrevivncia, a interao com os elementos naturais proporcionou, inclusive,

a domesticao de algumas espcies, como a mandioca, o amendoim e o abacaxi, entre

outros.

O fato que as florestas, alm de contriburem para a manuteno da vida humana,

influenciaram profundamente a sua conscincia e cultura. A secular interao desses povos

com o meio ambiente fez surgir os conhecimentos, inovaes e prticas tradicionais que

formam seu extenso patrimnio sociocultural.

O extrativismo vegetal sempre fez parte da histria econmica brasileira, seja em

maior ou menor intensidade. No Sculo XVII, o Estado do Maranho e Gro-Par j se

constituam em um imenso emprio de produtos florestais, as chamadas drogas do serto

(SILVA, 1990). Tais produtos no eram somente explorados por grupos indgenas, como

fizeram parte da vida do colono portugus, que assimilou muitas caractersticas da cultura e

dos hbitos dos primeiros habitantes do Brasil.

Atualmente, inmeras famlias que fazem da agricultura seu principal meio de

sobrevivncia, tm na extrao de PFNMs um elemento de complementao de renda e

subsistncia. Em alguns casos, chegam a colocar a agricultura de subsistncia em segundo

plano em funo dos ganhos econmicos alcanados com a atividade extrativa.

Vrias so as denominaes para os componentes da biodiversidade manejados por

grupos sociais: Homma (1993) trata-os como recursos extrativos, Rgo (1992) como

recursos naturais, Van Rijsoort (2000), Santos et al. (2003), Alexiades e Shanley (2004)

como produtos florestais no madeireiros. Estas denominaes surgem como expresses

21

para a grande diversidade de produtos animais e vegetais oriundos da floresta, mas que no

se referem diretamente madeira ou seus derivados.

No entanto, o conceito de produtos extrativos ao longo do tempo vem gerando

divergncias. Para alguns, o termo produtos no madeireiros insuficiente porque pode

excluir produtos como o combustvel da madeira e madeira com pequeno dimetro

destinada construo. Por outro lado, uma m interpretao do conceito pode incluir na

definio produtos como a polpa da madeira (UNASYLVA, 1991).

Embora a tendncia atual seja pelo emprego do termo produto florestal no

madeireiro, o problema da conceituao para esses componentes da biodiversidade

somente ser resolvido quando prticas de uso de florestas e polticas pblicas forem

ajustadas para que recebam a ateno que merecem (UNASYLVA, 1991).

Alguns autores entendem o extrativismo como uma prtica econmica (HOMMA,

1993; LESCURE et al., 1994), e ainda outros a entendem como uma alternativa econmica

fundada no modo de vida e cultura dos grupos sociais que exploram recursos naturais

(RGO, 1992). Por ser uma atividade que provoca controvrsia quanto a sua viabilidade

econmica, alguns estudiosos vm se debruando sobre o assunto na tentativa de conhecer

as suas implicaes como fenmeno social, econmico e cultural.

Para Drummond (1996), o extrativismo um modo de produzir bens, consistindo na

retirada de recursos naturais diretamente da sua rea de ocorrncia natural, em contraste

com outras atividades econmicas praticadas pelo homem. Para ele, a caa, a pesca e a

coleta de produtos vegetais so os trs exemplos clssicos de atividades extrativas, embora

em algumas sociedades contemporneas existam grupos que praticam essas atividades

como parte das suas estratgias de sobrevivncia e ao mesmo tempo desenvolvem

agricultura, pecuria, comrcio, artesanato, servios ou indstria.

O autor afirma que o termo extrativismo tambm se aplica a atividades realizadas por

certos setores econmicos de sociedades complexas com a intermediao de tecnologia e

mquinas mais sofisticadas, como o caso da indstria mineradora, da extrao de petrleo

e do corte de rvores em larga escala, entre outros.

Classifica esta atividade em extrativismo de baixa tecnologia e de alta tecnologia. No

extrativismo de baixa tecnologia esto includas aquelas prticas em que no exigem

mediaes tecnolgicas ou mecnicas complexas entre os humanos e os recursos naturais.

Caracteriza-se por ser uma atividade importante apenas em reas "remotas" ou de

"fronteira" (onde tecnologia, capital e infraestrutura so escassos). Esto includas nesta

categoria a caa, a pesca e a coleta vegetal. Esse tipo de extrativismo que forma a base

exclusiva ou quase exclusiva de sustento caracteriza um tipo de sociedade que pode ser

qualificada de "primitiva" ou "tribal". Pode conviver com o extrativismo de alta tecnologia

22

numa mesma regio e em um mesmo setor da economia como uma forma "tradicional" que

sobrevive "modernizao".

A atividade extrativa de alta tecnologia seria aquela em que certos materiais naturais

so retirados no seu local de ocorrncia natural, por intermdio de tecnologia e maquinrio

mais sofisticados. Incluem-se nesta categoria a minerao, a extrao de petrleo e gs

natural e o corte de rvores em grande escala. Nesses casos, o extrativismo no caracteriza

a sociedade como um todo, e sim certos setores econmicos de sociedades complexas

dotadas de agricultura, pecuria, comrcio, artesanato, indstria transformativa e servios.

O extrativismo de baixa tecnologia de produtos de origem vegetal se caracteriza por

no utilizar grandes insumos de capital e tecnologia. No entanto, a curto prazo, podem surgir

formas mais modernas de extrair esses mesmos bens. Esse extrativismo se aplica a bens

cujos estoques so repostos por processos naturais numa escala de tempo compatvel com

a cultura humana.

caracterstica desse extrativismo, quando voltado para o mercado, concentrar-se em

praticamente um nico bem de valor