25
Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001 584 RESUMO RESUMO Obesidade é uma doença complexa, de múltiplas etiologias e suficiente- mente comum para constituir um problema de saúde pública, assim como um dilema clínico importante. Especialistas da área clínica e cirúrgica são freqüentemente desafiados pelas alterações fisiopatológicas associadas com a obesidade. Essas alterações comprometem virtualmente todos os sis- temas do organismo, podendo apresentar-se como barreiras no diagnósti- co e na terapêutica. Há evidências marcantes de que obesidade acarreta risco excessivo para a saúde; de fato, a mortalidade aumenta de forma aguda quando o índice de massa corporal ultrapassa 30 kg/m 2 , principal- mente quando há distribuição central de tecido adiposo concomitante. O autor discute os efeitos da obesidade nos sistemas respitatório, cardiovas- cular, digestório e geniturinário. Os obstáculos enfrentados em procedimen- tos diagnósticos ordinários, prescrição de medicamentos, traumas, assim como descrições patológicas raras de lipomas, são apresentados. (Arq Bras (Arq Bras Endocrinol Metab 2001;45/6:584-608) Endocrinol Metab 2001;45/6:584-608) Unitermos: Unitermos: Obesidade; Diagnóstico; Exame físico; Exames complementares; Tratamento. ABSTRACT ABSTRACT Obesity is a complex and multifactorial disease, common enough to consti- tute a serious medical and public health problem. Medical and surgical spe- cialists are often challenged by pathophysiological changes associated with obesity. These changes, that compromise virtually all organ systems, may constitute barriers to the progress in diagnosis and therapeutics. There is over- whelming evidence that obesity carries excess risk; in fact, mortality rises sharply when body mass index surpasses 30 kg/m 2 , particularly with con- comitant central distribution of adipose tissue. The author discusses the effect of obesity on respiratory, cardiovascular, digestive and genitourinary sys- tems. The obstacles faced by physicians in common diagnostic procedures, drug prescription, traumatic injuries, as well as rare pathologic reports of lipo- mas, are presented. (Arq Bras Endocrinol Metab 2001;45/6:584-608) (Arq Bras Endocrinol Metab 2001;45/6:584-608) Keywords: Keywords: Obesity; Diagnosis; Clinical examination; Subsidiary examinations; Treatment. perspectivas perspectivas Obstáculos Diagnósticos e Desafios Terapêuticos no Paciente Obeso Marcio C. Mancini Serviço de Clínica Médica de Emergência e Grupo de Obesidade e Doenças Metabólicas do Serviço de Endocrinologia e Metabologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, SP. Recebido em 03/05/01 Revisado em 09/08/01 Aceito em 16/08/01

Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001584

RESUMORESUMO

Obesidade é uma doença complexa, de múltiplas etiologias e suficiente-mente comum para constituir um problema de saúde pública, assim comoum dilema clínico importante. Especialistas da área clínica e cirúrgica sãofreqüentemente desafiados pelas alterações fisiopatológicas associadascom a obesidade. Essas alterações comprometem virtualmente todos os sis-temas do organismo, podendo apresentar-se como barreiras no diagnósti-co e na terapêutica. Há evidências marcantes de que obesidade acarretarisco excessivo para a saúde; de fato, a mortalidade aumenta de formaaguda quando o índice de massa corporal ultrapassa 30 kg/m2, principal-mente quando há distribuição central de tecido adiposo concomitante. Oautor discute os efeitos da obesidade nos sistemas respitatório, cardiovas-cular, digestório e geniturinário. Os obstáculos enfrentados em procedimen-tos diagnósticos ordinários, prescrição de medicamentos, traumas, assimcomo descrições patológicas raras de lipomas, são apresentados. (Arq Bras(Arq BrasEndocrinol Metab 2001;45/6:584-608)Endocrinol Metab 2001;45/6:584-608)

Unitermos:Unitermos: Obesidade; Diagnóstico; Exame físico; Exames complementares;Tratamento.

ABSTRACTABSTRACT

Obesity is a complex and multifactorial disease, common enough to consti-tute a serious medical and public health problem. Medical and surgical spe-cialists are often challenged by pathophysiological changes associated withobesity. These changes, that compromise virtually all organ systems, mayconstitute barriers to the progress in diagnosis and therapeutics. There is over-whelming evidence that obesity carries excess risk; in fact, mortality risessharply when body mass index surpasses 30 kg/m2, particularly with con-comitant central distribution of adipose tissue. The author discusses the effectof obesity on respiratory, cardiovascular, digestive and genitourinary sys-tems. The obstacles faced by physicians in common diagnostic procedures,drug prescription, traumatic injuries, as well as rare pathologic reports of lipo-mas, are presented. (Arq Bras Endocrinol Metab 2001;45/6:584-608)(Arq Bras Endocrinol Metab 2001;45/6:584-608)

Keywords: Keywords: Obesity; Diagnosis; Clinical examination; Subsidiary examinations;Treatment.

perspectivasperspectivasObstáculos Diagnósticos e Desafios Terapêuticos no Paciente Obeso

Marcio C. Mancini

Serviço de Clínica Médica deEmergência e Grupo de Obesidade eDoenças Metabólicas do Serviço deEndocrinologia e Metabologia doHospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, SP.

Recebido em 03/05/01Revisado em 09/08/01Aceito em 16/08/01

Page 2: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

585

APREVALÊNCIA DE OBESIDADE é universalmentecrescente, tanto em países em desenvolvimento

como em países desenvolvidos, e está associada a umaincidência elevada de um largo espectro de patologiasclínicas e mesmo cirúrgicas. Como resultado, o clínicodefronta-se com freqüência cada vez maior com oatendimento de emergência de pacientes obesos, querseja no pronto socorro, na unidade de terapia intensi-va ou na sala de ressuscitação. Os doentes obesos têmcomplicações específicas associadas à obesidade (1,2),representando um desafio para o médico assistente dequalquer especialidade médica (tabela 1).

Um considerável conhecimento na forma deestudos bastante consistentes demonstra a necessidadede um manejo individualizado para o paciente comobesidade. Entretanto, várias barreiras limitam a boacondução no diagnóstico e tratamento desse grupo dedoentes, desde a ausência de material de suporte apro-priado ou limitações de exames convencionais durantea internação (que depende de estruturação do serviçode atendimento ou de conhecimento e uso de métodosdiagnósticos alternativos). Entre essas limitaçõesencontram-se até mesmo fatores psicológicos, como afalta de motivação do médico e dos demais profissio-nais de saúde envolvidos no atendimento, devido àpercepção negativa originada pela obesidade (quedepende de uma mudança na atitude do profissionalem relação ao paciente). A própria literatura médica éextremamente escassa na documentação destas bar-reiras diagnósticas e terapêuticas, valendo-se muitasvezes este manuscrito do depoimento pessoal de cole-gas em relação aos obstáculos enfrentados no dia-a-diadiante de seus pacientes obesos.

A compreensão de complicações específicas depacientes com obesidade e das dificuldades particularesenfrentadas no manejo desses pacientes permite umacondução clínica mais segura e um tratamento mais efi-ciente para esse grupo singular de pacientes. Essas com-plicações e dificuldades ocorrem desde o transporte atéo serviço de atendimento de emergência, passando pelaescassez de dados obtidos com as técnicas usualmenteempregadas no exame físico, até os obstáculos e limi-tações físicas enfrentados com os exames subsidiários.

Em especial, a confirmação das hipóteses diag-nósticas e a instituição da terapêutica acertada empacientes com obesidade “mórbida” constituem ver-dadeiramente um desafio ao clínico, requerendo algu-mas vezes criatividade e inovação.

Conceituação de obesidadeConceituação de obesidadeObesidade é uma doença onde existe excesso de gordu-ra corporal. A diferença entre a normalidade e a obesi-

dade é arbitrária, mas um indivíduo é considerado obesoquando a quantidade de tecido adiposo aumenta emuma extensão tal que a saúde física e psicológica são afe-tadas e a expectativa de vida é reduzida (3). A quanti-dade de tecido adiposo pode ser medida precisamentepor tomografia computadorizada ou ressonância mag-nética, e com precisão satisfatória através do método debioimpedância (que estima a quantidade de tecido adi-poso e massa livre de gordura através da avaliação daresistência e reactância a uma corrente elétrica de baixafreqüência), sendo normal em adultos de sociedades oci-dentais modernas valores entre 20% a 30% para a mul-her e 18 a 25% para o homem, em relação ao peso cor-poral total; um jogador profissional de futebol tem cercade 10% a 12% e um corredor de maratona cerca de 7%de massa de gordura (4).

O índice de massa corporal (IMC) é uma medi-da que relaciona peso e altura, tem excelente correlaçãocom a quantidade de gordura corporal e é largamenteusado em estudos epidemiológicos e clínicos. O IMC écalculado dividindo-se o peso corporal (em kg) pelaaltura (em m) elevada ao quadrado e é expresso emkg.m-2. Os valores considerados normais e a classifi-cação da obesidade em graus progressivamente maioresde morbimortalidade são apresentados na tabela 2.Indivíduos com IMC < 18,5kg.m-2 têm baixo peso erisco aumentado de doenças; o IMC < 25kg.m-2 é con-siderado normal; a faixa entre 25 e 29,9kg.m-2 édenominada pré-obesidade ou sobrepeso e os riscos decomplicações são ainda baixos. A partir do IMC de30kg.m-2, existe obesidade propriamente dita e a mor-bidade e a mortalidade aumentam exponencialmente(5), sendo a obesidade com IMC • 40kg.m-2 denomi-nada obesidade grave ou mórbida, embora este últimotermo esteja em desuso. Alguns autores denominamsuper-obesos os indivíduos com IMC • 55kg.m-2, de-vido às dificuldades particulares do próprio manejo pes-soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6).

Embora o IMC permita uma avaliação bastanterápida e prática da obesidade, é imperativo lembrarque esse índice possui algumas limitações, de modoque pessoas muito musculosas, edemaciadas, ou a pre-sença de cifose importante, podem apresentar IMC fal-samente elevado. Esses fatores, porém, são facilmenteavaliáveis durante o exame clínico do paciente.

Além disso, está bem estabelecido que o padrãode distribuição de gordura corporal pode estabelecer umprognóstico de risco para a saúde mais fidedigno que opróprio grau de obesidade. No tipo central, superior ouandróide de distribuição de tecido adiposo, maiscomum em homens, a gordura está distribuída prefe-

Page 3: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

586 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Categoria

Cardiovasculopatias

Doenças respiratórias

Endocrinopatias

Doença gastrintestinal

Doença dermatológica

Doença genitourinária

Neoplasias

Doença musculoesquelética

Disfunção psicossocial

Miscelânea

Exemplos

Morte súbita (arritmia ventricular); cardiomiopatia associada à obesidade; hipertensão;doença coronariana; cor pulmonale; doença cerebrovascular; doença vascular per-iférica; edema de extremidades; veias varicosas; trombose venosa profunda; trombosede veia renal; embolia pulmonar

Doença pulmonar restritiva; apnéia obstrutiva do sono; síndrome da hipoventilação daobesidade; policitemia secundária

Diabetes mellitus; dislipidemia; hipotiroidismo; infertilidade; hiperuricemia

Hérnia de hiato; litíase biliar; colecistite; esteatose hepática

Estrias; acantose nigricans; hirsutismo; intertrigo; calo plantar; papilomas, dermatite peri-anal

Anormalidades menstruais e anovulação; diminuição de performance obstétrica (tox-emia, hipertensão e diabetes durante a gestação, trabalho de parto prolongado, cesar-iana mais freqüente); proteinúria

Mama; cérvix; ovário; endométrio; próstata; colorretal; vesícula biliar

Osteoartrose de coluna e joelho; síndrome do túnel do carpo; gota; esporão de calcâ-neo; defeitos posturais

Prejuízo da auto-imagem; sentimentos de inferioridade; isolamento social; discriminaçãosocial, econômica e outras; susceptibilidade a psico-neuroses; perda de mobilidade;aumento de faltas ao trabalho e licenças médicas; aposentadoria mais precoce

Aumento do risco cirúrgico e anestésico; hérnia inguinal e incisional; diminuição de agili-dade física e aumento da propensão a acidentes; interferência com o diagnóstico deoutras doenças

Tabela 1.Tabela 1. Condições clínicas e cirúrgicas associadas com a obsidade.

Tabela 2Tabela 2. Classificação da obesidade recomendada pela Organização Mundial da Saúde(OMS), por graus progressivamente maiores de morbimortalidade utilizando o IMC.

IMC Denominação Grau de obesidade Risco de complicações(kg.m-2)

18,5-24,9 Peso saudável 0 025-29,9 Pré-obeso I Baixo30-39,9 Obeso II Moderado a alto• 40 Obeso grave III Altíssimo

rencialmente ao nível do tronco, com deposição aumen-tada em região intra-abdominal visceral. No tipo peri-férico, inferior ou ginóide, a gordura mais tipicamenteacumula-se na região dos quadris, nádegas e coxas, umpadrão mais feminino de distribuição (7). Assim, indi-víduos com circunferência abdominal (medida nomaior perímetro entre a última costela e a crista ilíaca)elevada apresentam aumento de tecido adiposo viscer-al, intimamente ligado a risco cardiovascular e à sín-drome meta bólica (Os componentes da síndromemetabólica segundo a Organização Mundial da Saúdesão: tolerância à glicose diminuída ou diabetes melli-tus, resistência à insulina, hipertensão arterial sistêmi-ca, dislipidemia, obesidade visceral e albuminúria.)

As populações, porém, diferem em relação aonível de risco associado com uma circunferência abdo-minal em particular, de modo que não é possível desen-volver pontos de corte globalmente aplicáveis, embora amaioria dos estudos epidemiológicos em populaçõesocidentais situe o nível de risco entre 90 e 100cm. Atítulo de exemplo, a associação entre adiposidadeabdominal e fatores de risco cardiovascular e diabetesmellitus tipo 2 é menos acentuada em mulheres negrasquando comparadas a mulheres brancas americanas (8),enquanto descendentes de algumas populações hindus epaquistanesas vivendo em sociedades urbanas modernasapresentam uma prevalência maior de muitas das com-plicações da obesidade quando comparados com outros

Page 4: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

grupos étnicos, apesar de um perímetro abdominalmenor (9). Finalmente, mulheres apresentam um riscorelativo de doença coronariana com medidas menoresde circunferência abdominal (10). É necessário, portan-to, desenvolver pontos de corte da circunferênciaabdominal, específicos para cada sexo e apropriados acada população. A tabela 3 apresenta esses pontos parauma amostra aleatória de 4.881 homens e mulheresholandesas de 20 a 59 anos (11).

MortalidadeMortalidadeA morbidade e mortalidade relacionadas à obesidadeaumentam de forma alarmante e exponencial a partirdo IMC 30kg.m-2. O risco de morte prematura dupli-ca em indivíduos com IMC • 35kg.m-2 (5). Mortesúbita inexplicada é 13 vezes mais freqüente em mu-lheres obesas com IMC • 40kg.m-2 quando compara-das a mulheres de peso normal (12). Nessa faixa depeso, o risco de morte por diabetes, doenças cárdio-respiratórias e cérebro-vasculares, certas formas deneoplasia, e outras doenças, é tremendamente maior(13-15) (tabela 1). Os homens com excesso de peso(>110%) que participaram do estudo de Framingham(16) tiveram uma taxa de mortalidade 3,9 vezes maiorque o grupo de peso normal. Para qualquer grau deter-minado de obesidade, o risco dos homens é maior queo das mulheres (17).

OBESIDADE E SISTEMA RESPIRATÓRIOOBESIDADE E SISTEMA RESPIRATÓRIO

Síndrome da apnéia obstrutiva do sonoCerca de 5% dos pacientes com obesidade grau IIIapresentam síndrome da apnéia obstrutiva do sono(SAOS), que se caracteriza por freqüentes episódiosde apnéia ou hipopnéia (sendo significante a ocor-rência de cinco ou mais episódios por hora ou > 30por noite de sono) durante o sono (um episódio deapnéia obstrutiva é definido como dez segundos oumais de total interrupção de fluxo aéreo, a despeito deesforço respiratório contínuo contra uma via aéreafechada. Uma hipopnéia é definida como umaredução de 50% no fluxo aéreo ou uma redução sufi-ciente para levar à diminuição de 4% na saturaçãoarterial de O2), roncos (mais ruidosos à medida que avia aérea diminui de calibre e acompanhados deengasgos e tosse quando a patência é restaurada), sin-tomas diurnos (sonolência com aumento do risco deacidentes de tráfego (18), diminuição da concen-tração e da memória, cefaléia matinal devido à re-tenção de CO2 e vasodilatação cerebral) e alteraçõesfisiológicas (hipoxemia, hipercapnia, vasoconstriçãopulmonar e sistêmica, policitemia). Os pacientes com

SAOS apresentam risco elevado de doença cardíacaisquêmica e insuficiência cardíaca direita (19-25).

Os principais fatores predisponentes são: sexomasculino e obesidade. O problema pode ser agravadopela ingestão de álcool à noite ou de sedativos. A pre-sença de hipertensão arterial, acúmulo de gordura emregião abdominal e cervical, policitemia, hipoxemiae/ou hipercapnia, hipertrofia de ventrículo direito e,obviamente, a observação de episódios de apnéiadurante o sono, reforçam a presença de SAOS. A con-firmação diagnóstica é feita por poli-sonografia emlaboratório de sono (figura 1).

Estudos da circulação cerebral por dopplertranscraniano indicam que a auto-regulação cerebral éinsuficiente para proteger o cérebro das rápidasoscilações da pressão arterial durante episódios deapnéia, que levam a profundas mudanças no fluxosangüíneo cerebral. Dessa forma, a redução da per-fusão cerebral e a hipoxemia induzidas pelas apnéiaspredispõem os pacientes com SAOS à isquemia cere-bral noturna (21,26-29).

Síndrome da hipoventilaçãoO distúrbio ácido-básico da SAOS (acidose respiratória)é inicialmente limitado ao sono, com retorno à home-ostase durante o dia. Porém, uma conseqüência tardiada SAOS é uma alteração do controle respiratório, cujoachado característico é a presença de eventos apnéicoscentrais, isto é, a presença de apnéias sem esforço respi-ratório. Esses episódios, que são associados com umaprogressiva dessensibilização dos centros respiratórios àhipercapnia (noturna), limitam-se inicialmente ao sono,mas eventualmente levam à falência respiratória, comuma dependência crescente do drive respiratório hipó-xico para a ventilação (26,27). A síndrome de hipoven-tilação da obesidade, antigamente chamada de síndromede Pickwick (quando de sua primeira descrição, em1956, recebeu esse nome devido à semelhança entre asintomatologia desses pacientes e as características dojovem obeso Joe, personagem da obra Pickwick Papers, deCharles Dickens) é caracterizada por obesidade mar-cante, hipersonolência, hipóxia, hipercapnia, insuficiên-cia ventricular direita e policitemia (30).

Ventilação do paciente obesoUma avaliação cuidadosa e detalhada da via aérea supe-rior do paciente obeso é necessária antes de umaintubação traqueal eletiva e mesmo a ventilação commáscara pode ser consideravelmente difícil (31,32). Aincidência de dificuldades na intubação por anestesistasgira em torno de 13% (33). Esses problemas são cau-sados pela presença de depósitos gordurosos em face,

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

587Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Page 5: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

região malar, tórax, língua, e pelo pescoço curto comexcesso de tecidos moles em pálato, faringe e regiãosuperior e anterior da laringe. Além disso, pode haverrestrição à abertura da boca e limitações da flexão eextensão da coluna cervical e da articulação atlanto-occipital (33-35).

Em situação de emergência, com diminuição donível de consciência, a ventilação com máscara ouambu pode ser muito difícil devido à obstrução de viaaérea superior e redução da complacência pulmonar. Ainsuflação gástrica durante ventilação ineficaz commáscara aumenta ainda mais o risco de regurgitação easpiração de conteúdo gástrico. A intubação nasal àscegas deve ser evitada, uma vez que epistaxe com sub-seqüente deterioração das condições de intubação éuma possibilidade bastante real. Equipamento paracricotiroidotomia e ventilação transtraqueal deve estarsempre disponível (31-35).

Uma vez que a intubação de pacientes em umserviço de atendimento de emergência terciário é umprocedimento muito freqüente, o exame de pacientesobesos internados deve incluir uma análise da regiãocefálica e cervical, incluindo a flexão, extensão erotação lateral do pescoço, a mobilidade da mandíbulae a abertura da boca, inspeção da orofaringe, dentiçãoe patência das narinas. Embora seja importante ques-

tionar o paciente ou o acompanhante sobre dificul-dades anteriores na ventilação ou intubação dopaciente, qualquer alteração (como ganho adicional depeso, gestação ou radioterapia de cabeça e pescoço)pode ser relevante e agravar sensivelmente o quadro. Aobservação do paciente internado e a busca de achadosclínicos sugestivos de SAOS, como ronco excessivocom e sem apnéia e hipersonolência diurna deve ser sis-temática, pois esses dados podem implicar emobstrução de via aérea potencial em situações nas quaiso paciente seja submetido a sedação, anestesia, oumesmo por evolução da doença de base (31-35).

Se houver tempo disponível no período pré-operatório de uma cirurgia eletiva, a avaliação da viaaérea superior por raio-X ou mesmo tomografia com-putadorizada, assim como uma consulta otorrino-laringológica com laringoscopia direta ou indiretapodem fornecer informações úteis sobre a via aérea. Seas informações sugerem uma intubação difícil, aintubação com fibroscópio em vigília sob anestesia localda faringe deve ser considerada e discutida com opaciente. A posição correta da cânula endotraqueal devesempre ser confirmada através de ausculta (31,33).

Períodos de hipoxemia e hipercapnia podemaumentar a resistência vascular pulmonar e precipitarinsuficiência cardíaca direita. Pacientes muito obesos

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

588 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Tabela 3Tabela 3. Medidas de circunferência abdominal que conferem riscoelevado e muito elevado de complicações metabólicas associadasà obesidade em caucasianos na Holanda (11).

Risco de complicações metabólicasElevado Muito elevado

Sexo masculino Ž 94cm Ž 102cmSexo feminino Ž 80cm Ž 88cm

Figura 1. Figura 1. Traçado poli-sonográfico de paciente obeso do sexo masculino, observando-se uma longa apnéia obstrutiva de >60 sde duração, com freqüência cardíaca de 87 batimentos por minuto e saturação arterial de O2 de 74% (traçado poli-sonográfi-co gentilmente cedido pelo Dr. Flavio Aloe).

Page 6: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

com diminuição do nível de consciência ou sobsedação não devem ventilar espontaneamente, pois ahipoventilação é provável, com conseqüente hipóxia ehipercapnia (34,35).

Em geral, o paciente obeso requer ventilaçãomecânica com alta fração inspirada de O2 e muitoprovavelmente adição de PEEP. A adequação da ven-tilação minuto deve idealmente ser feita através de ga-sometrias arteriais seriadas (34,35).

Obesidade e trocas gasosasO efeito de massa dos componentes da parede torácicae abdominal em pacientes obesos na posição supinacausa anormalidades tanto dos volumes pulmonarescomo da troca gasosa.

Volumes pulmonaresA obesidade grave ou “mórbida” está associada comreduções na capacidade residual funcional (CRF), novolume de reserva expiratório (VRE) e na capacidadepulmonar total (36,37). A CRF declina exponencial-mente à medida que aumenta o IMC (36). Essas alte-rações são atribuídas ao efeito de massa e à pressão sobreo diafragma. A CRF pode estar de tal forma reduzida nopaciente obeso, que pode ocasionar oclusão das pequenasvias aéreas (38), distúrbio ventilação-perfusão, shuntingdireita-esquerda e hipoxemia arterial (37). Uma eventu-al anestesia agrava ainda mais essas alterações, já que levaa uma redução adicional de 50% da CRF em obesos,comparado a uma queda de 20% em indivíduos não obe-sos anestesiados (39). A CRF pode ser aumentada pelaventilação com grande volume corrente (exemplo, 15-20ml.kg-1), embora a melhora na pressão arterial de O2(paO2) seja pequena (40). A adição de pressão positivaexpiratória final (PEEP) leva a melhora tanto da CRFcomo da paO2, porém às custas de redução do débitocardíaco (41,42).

A redução da CRF diminui a capacidade dopaciente obeso tolerar períodos de apnéia. Indiví-duos obesos dessaturam rapidamente após aindução de anestesia a despeito de pré-oxigenação.Isso é resultado tanto de uma reserva de O2 menorcausada pela reduzida CRF, como também peloaumento no consumo de O2 causado pela obesidade(36,37).

Na maior parte dos pacientes obesos, a CRFestá reduzida como conseqüência de redução do VRE,com o volume residual (VR) permanecendo dentrodos limites normais (36). Porém, alguns pacientes obe-sos têm aumento do VR, sugerindo coexistência dedoença pulmonar obstrutiva. O volume expiratórioforçado em 1s e a capacidade vital forçada estão, em

geral, dentro da variação esperada, embora melhorasde 6-7% tenham sido documentadas após perda depeso (43).

Consumo de oxigênio e produção de dióxido decarbonoO consumo de O2 e a produção de CO2 estão aumen-tadas no paciente obeso como resultado da atividademetabólica do excesso de tecido adiposo e do tecidomagro, além do aumento de trabalho de carga sobre ostecidos de suporte (36,44). A atividade metabólicabasal por área de superfície corpórea está, em geral,normal. A normocapnia é mantida por aumento naventilação minuto (45), e muitos pacientes obesos con-servam uma resposta normal à hipoxemia e à hipercap-nia. Em exercício, o consumo de oxigênio aumentamais dramaticamente que em indivíduos não obesos,refletindo uma insuficiência relativa da musculaturarespiratória (36).

Troca gasosaPacientes com obesidade “mórbida” em geral apresen-tam defeitos discretos na troca de gases com reduçãoleve da paO2 e aumento da diferença alvéolo-arterial deO2. Essas alterações, usualmente de pequena monta,em geral não progridem nem levam a doença respi-ratória manifesta nos pacientes obesos. Entretanto, navigência de doença respiratória de outra etiologia oudurante a indução anestésica, deterioram rapidamentee esses pacientes podem requerer frações inspiradas deO2 mais elevadas para manter uma paO2 adequada(36,45,46).

Complacência e resistência pulmonaresÀ medida que aumenta o IMC, a complacência respi-ratória total declina exponencialmente, caindo a 30% doprevisto em casos mais graves (46). Muito embora o acú-mulo de gordura na região interna e na parede torácicapossa levar a uma modesta redução na complacência daparede torácica, estudos demonstraram que a redução dacomplacência total é principalmente secundária à dimi-nuição da complacência pulmonar, que por sua vez re-sulta de aumento do volume de sangue pulmonar(44,47). A redução da complacência está associada adiminuições da CRF e da troca gasosa (47).

Obesidade significativa está ainda associada aum aumento na resistência respiratória total, que resul-ta principalmente de um aumento da resistência pul-monar (46,47).

Estas alterações na complacência e resistênciapulmonares levam a um padrão respiratório rápido ede baixa amplitude, aumento do trabalho respiratório

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

589Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Page 7: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

e limitação da capacidade ventilatória máxima. Todasestas alterações são ainda mais marcantes e evidentesna posição supina (46,47).

Eficiência respiratória e trabalho ventilatórioComo pode ser concluído das seções anteriores, acombinação de aumento da pressão mecânica doabdome, redução na complacência pulmonar e aumen-to da demanda metabólica da musculatura respiratóriaresulta em ineficiência da musculatura respiratória eaumento do trabalho ventilatório.

Implicações na avaliação pré-operatória dopaciente obesoA avaliação pré-operatória desses pacientes deve, emcondições ideais e na dependência da urgência do pro-cedimento cirúrgico e da disponibilidade de tempo,incluir: hemograma (para excluir possível policitemia),raio-X de tórax, gasometria arterial, testes de função pul-monar e oximetria noturna. Deve-se considerar a realiza-ção de poli-sonografia em pacientes com sintomas deSAOS, que poderão se beneficiar de medidas no sentidode combater a obstrução noturna das vias aéreas, comopressão positiva aérea noturna contínua (CPAP) oubimodal (BiPAP) (25,27,48). Devem ser discutidos como paciente os riscos específicos e as possibilidades deintubação em vigília, ventilação pós-operatória e, even-tualmente, necessidade de traqueostomia (48,49).

Extubação do paciente obesoA traquéia deve ser extubada, no pós-operatório, ape-nas quando o paciente estiver completamente acorda-do, na sala de recuperação, em decúbito de 45º (50).Oxigênio umidificado deve ser administrado imediata-mente e assim que possível deve ser iniciada fisioter-apia respiratória. Pacientes com história de SAOSpodem beneficiar-se de CPAP noturno. As apnéias sãomais freqüentes durante a fase do sono de movimentosoculares rápidos (REM), que têm sua duração bastantediminuída no período pós-operatório inicial, mas queaumentam da 3a à 5a noite após a cirurgia, o que temimplicações óbvias na necessidade de manutenção deoximetria nesse período (32,49).

Complicações pulmonares no paciente obesoAs complicações pulmonares são muito mais comuns nopaciente obeso (51,52), embora o valor do IMC e ostestes de função pulmonar não sejam capazes de prog-nosticar de modo acurado esses problemas (53). Emrelação ao período pós-operatório imediato, os pacientesobesos são mais sensíveis aos efeitos de medicamentossedativos, analgésicos opióides e drogas anestésicas, be-

neficiando-se de ventilação pós-operatória para permitireliminação segura de agentes sedativos ou anestésicosresiduais. Um período mais prolongado de ventilação nopós-operatório pode ser necessário, com maior probabi-lidade em pacientes obesos com doença cardio-respi-ratória coexistente ou retenção de CO2 e naquelespacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos prolon-gados (54). Embora tecnicamente possam representarum desafio diante da adiposidade desses pacientes, oemprego de técnicas anestésicas regionais como bloqueiode nervo periférico e bloqueio epidural toracolombarpodem auxiliar na redução da incidência de várias dessascomplicações (55).

A obesidade visceral (devida à policitemia,aumento da pressão abdominal levando a estase venosanos membros inferiores e diminuição da atividade fi-brinolítica) leva a um estado de hipercoagulabilidade(56-58) e a um risco aumentado de trombose venosaprofunda e embolia pulmonar, sendo preconizado poralguns autores a anticoagulação profilática dessespacientes no pós-operatório (59). Trombose venosa pro-funda no pós-operatório de cirurgias abdominais (excluí-das as neoplasias malignas) ocorre em 48% dos pacientesobesos, comparativamente a 23% de pacientes com pesonormal (60), sendo a complicação mais comum de obe-sos mórbidos submetidos a cirurgia bariátrica (61).

OBESIDADE E SISTEMA CARDIOVASCULAROBESIDADE E SISTEMA CARDIOVASCULAR

A morbidade e a mortalidade que se associam à presençade obesidade são dominadas pelas doenças cardiovascu-lares, manifestando-se na forma de doença cardíacaisquêmica, hipertensão e insuficiência cardíaca. Umrecente levantamento que estudou a prevalência de qual-quer doença cardiovascular em relação a diferentes grausde adiposidade em adultos encontrou 37% em IMC •30kg.m-2, 21% em IMC entre 25 e 29,9kg.m-2 e apenas10% em pacientes com IMC < 25kg.m-2 (62).Pacientes obesos, em especial os pacientes com adiposi-dade abdominal marcante, devem ser exaustivamenteinvestigados em relação à presença de doenças cardio-vasculares. A análise de 474 indivíduos atendidos noAmbulatório de Obesidade do Hospital das Clínicasmostrou um aumento do risco cardiovascular (63)segundo os critérios do NCEP (National CholesterolEducation Program) (64) (tabela 4).

AVALIAÇÃO CARDIOVASCULAR DO PACIENTE OBESOAVALIAÇÃO CARDIOVASCULAR DO PACIENTE OBESO

O coração do paciente obesoEstudos de autópsia demonstram haver uma relação li-near entre peso cardíaco e peso corporal até 105kg.

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

590 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Page 8: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

Acima desse peso a massa do coração continua a se ele-var em um ritmo menor (12,65). Depósitos de gordurasubepicárdica e pequenos graus de infiltração gordurosado miocárdio são comuns, afetando principalmente oventrículo direito. Os adipócitos podem estar interpos-tos entre os miócitos e pode haver acúmulo detriglicérides nas células musculares. Em casos graves(denominados adipositas cordis ou cor adiposum), a me-cânica normal do coração e a função do ventrículopodem ser prejudicadas, favorecendo o aparecimento deanormalidades do sistema de condução e arritmias porinfiltração gordurosa do miocárdio, do nodo sinusal oudo feixe de His (66-68). A alteração funcional promovi-da por depósitos localizados de tecido adiposo pode serimportante, tendo sido descrito um caso bizarro depaciente com obesidade “mórbida” associada a lipomamitral que necessitou de troca valvar (69).

Anamnese e exame físicoPacientes com obesidade mórbida apresentam com fre-qüência uma mobilidade muito comprometida e podemnão apresentar queixas sugestivas de cardiopatia, pare-cendo assintomáticos, mesmo que apresentem doençacardiovascular importante. Sintomas como angina oudispnéia aos esforços podem ocorrer em raras ocasiões,porém na realidade essas eventualidades coincidemcomumente com a maioria dos períodos de atividadefísica expressiva. Muitos desses indivíduos sentem-semais confortáveis dormindo em decúbito elevado ou emuma poltrona, negando sintomas de ortopnéia ou disp-néia paroxística noturna. Solicitar ao paciente que ca-minhe pelo corredor pode revelar uma tolerância aoexercício extremamente reduzida e assumir a posiçãosupina pode produzir ortopnéia significativa e mesmoparada cardiorrespiratória (70). A flexão da cabeça empacientes muito obesos, com depósitos de tecido adi-poso em região cervical e submentoniana pode levar àobstrução da via aérea superior e parada respiratória. Opaciente deve ser submetido a um exame físico detalha-do e cuidadoso, em busca de dados sugestivos de insufi-ciência cardíaca, como estase jugular, ritmo cardíaco

anormal, estertores crepitantes ou alterações da per-cussão pulmonar, hepatomegalia e edema periférico.Todos esses sinais, porém, podem ser difíceis de identi-ficar no paciente com obesidade mórbida, devendo serindicada investigação com exames complementares.

A aferição da pressão arterial de pacientes obe-sos deve ser realizada com aparelho com braçadeiraadequada à circunferência do braço do paciente, umavez que o uso do aparelho convencional tende a hiper-estimar o valor obtido.

Embora pareça óbvio que a obesidade pre-judique a ausculta cardíaca, poucos dados de literaturarelacionados à prevalência e causas de ausculta falso-negativa de sopros são disponíveis. Um estudo ana-lisou 294 pacientes por ecocardiografia com doppler eposteriormente submeteu esses pacientes à auscultapor examinadores cegos ao resultado do exame. A sen-sibilidade da ausculta variou de 0 a 37%, embora aespecificidade tenha sido elevada (85 a 100%). A pro-babilidade de resultado falso-negativo foi mais elevadaem pacientes obesos. Portanto, sopros silenciosos sãoaltamente prevalentes em indivíduos com obesidade euma ausculta negativa não é suficiente para excluir apresença de alterações (71).

EcocardiografiaO raio-X de tórax convencional pode revelar aumentoda área cardíaca, mas é normal com freqüência. Acú-mulo de gordura subepicárdica e junto aos grandesvasos pode confundir o examinador e levar a errosdiagnósticos.

A avaliação ecocardiográfica transtorácica damassa ventricular esquerda pode ser alterada por va-riáveis como idade, sexo e IMC, devendo ser corrigidapara superfície corporal quando do estudo de pacientesobesos, uma vez que a resolução sofre interferêncianesses pacientes devido à elevada impedância acústicatranstorácica acarretada pelo acúmulo de gordura sub-cutânea (72). Devido a traçados inadequados ou nãodiagnósticos com a eletrocardiografia transtorácica,alguns pacientes obesos podem requerer ou beneficiar-

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

591Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Tabela 4.Tabela 4. Características clínicas e metabólicas da população estudada (63).

Homens Mulheres Total

Número de pacientes 62 412 474 IMC (kg.m-2) 38,2 ± 6,9 39,0 ± 7,2 38,9 ± 7,2 Idade (anos) 37,9 ± 14,6 43,6 ± 13,0 42,9 ± 13,4 Hipertensão arterial (%) 41,9 54,9 54,4 Diabetes tipo 2 (%) 12,9 15,8 15,4 Hipercolesterolemia (%) 58,1 53,4 54,0 Hipertrigliceridemia (%) 28,3 18,6 19,8

Page 9: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

se de estudo complementar usando eletrocardiografiaendoscópica transesofágica, a qual elimina a interfe-rência transtorácica e até mesmo a promovida pordepósitos de gordura intratorácicos (73,74).

Pacientes obesos sem outras doenças diagnosti-cadas apresentam à ecocardiografia aumento do débitocardíaco, pressão diastólica final do ventrículo esquerdoaumentada e hipertrofia do ventrículo esquerdo. Alémdisso, a função sistólica do ventrículo esquerdo está prej-udicada (75,76), principalmente durante o exercício,uma vez que a fração de ejeção eleva-se menos e maislentamente, em comparação com indivíduos de pesonormal (77-79). A presença de disfunção diastólica aoecocardiograma é considerada um indicador precoce deenvolvimento cardíaco na obesidade (80) e parâmetrosalterados de avaliação ecocardiográfica da massa do ven-trículo esquerdo já são evidentes em crianças obesas nor-motensas desde a idade de 6 anos (81).

A localização de espaços “livres de eco” na eco-cardiografia pode levar à dificuldade em distinguir gor-dura pericárdica de fluido pericárdico. Embora essesespaços sem eco quando de localização exclusivamenteanterior costumeiramente representem acúmulo degordura subepicárdica e quando de localização pre-dominantemente posterior representem fluido, a pre-sença de gordura em regiões posteriores pode levar aodiagnóstico incorreto de derrame pericárdico ou peri-cardite. A tomografia computadorizada pode ser útilem estabelecer se achados inesperados de espaço “livrede eco” representam gordura subepicárdica ou der-rame pericárdico (82).

EletrocardiografiaA obesidade pode interferir no valor diagnóstico doscritérios eletrocardiográficos, associando-se inversa-mente com a sensibilidade para diagnóstico de hiper-trofia de ventrículo esquerdo, devido a um efeito dohábito corporal sobre o complexo QRS, atenuando asua voltagem e subestimando a gravidade da hiper-trofia (83,84). Recomenda-se a avaliação de hiper-trofia do ventrículo esquerdo pela voltagem de Cornell(a voltagem de Cornell é calculada pela equação RaVL+ SV3 (mm). Valor normal: < 20mm em mulheres e<28mm em homens), ou (ainda mais preciso) peloproduto da duração da voltagem de Cornell (produtoda duração do QRS e da voltagem, representando aárea tempo-voltagem sob o complexo QRS) (o produ-to da voltagem de Cornell é calculado pela equação(RaVL + SV3) x QRS, onde RaVL representa a vol-tagem da onda R na derivação aVL, SV3 representa avoltagem da onda S na derivação V3 e QRS represen-ta a duração do intervalo QRS (mm.ms). Valor nor-

mal: <1713mm.ms em mulheres e <2647mm.ms emhomens), que se mostraram menos dependentes doIMC que a avaliação da voltagem de Sokolow-Lyon (avoltagem de Sokolow-Lyon é calculada pela equaçãoSV1 + RV5/6 (mm). Valor normal ≤ 38mm) (insen-sível porém mais específico), embora ainda subes-timem a real incidência de sobrecarga (85,86). Algunsmodelos de aparelhos de eletrocardiografia já incluemajustes automáticos para peso corporal, minimizando oviés na predição da massa ventricular esquerda e mel-horando a correlação com a ecocardiografia (87,88).

Embora variáveis eletrocardiográficas comodiminuição da voltagem do complexo QRS, taquiar-ritmias, desvio para a esquerda do eixo e várioscritérios para hipertrofia ventricular esquerda(aumento da amplitude da onda R em aVL, da ondaS em aVR e da razão R/S em V1) sejam mais fre-qüentes em obesos “mórbidos” (89), o eletrocardio-grama é, porém, extremamente limitado em detectarhipertrofia ventricular e/ou aumento de câmarascardíacas nesses pacientes, devido à sensibilidademuito baixa (90). O eletrocardiograma de pacientesobesos com hipóxia crônica pode apresentar onda P-pulmonale e desvio do eixo para a direita, secundárioà hipertensão pulmonar (91).

Pacientes obesos apresentam um aumento linearda duração do intervalo QTc (corrigido para a fre-qüência cardíaca) em função da porcentagem desobrepeso. Um estudo mostrou a duração do QTc>0,44s em 4% dos pacientes obesos (91) e outro em14 de 30 obesos grau III (92). Para cada 10% deaumento de peso, o intervalo QTc apresentou umaumento de 1,0ms (91). A importância desta obser-vação é que um intervalo QT prolongado aumenta asusceptibilidade a taquiarritmias ventriculares e mortesúbita, devendo nestes pacientes ser excluída uma causasecundária, como uso de antidepressivos tricíclicos,lítio e anormalidades metabólicas ou eletrolíticas.

Alterações inespecíficas do segmento ST e daonda T são achados eletrocardiográficos comuns empacientes obesos, detectados em 50% de 1029pacientes obesos estudados por Frank (1986) (91).Achatamento da onda T nas derivações precordiais éuma alteração eletrocardiográfica comum em pacientescom obesidade mórbida.

A avaliação da tolerância ao exercício com testeergométrico em caso de suspeita de doença cardíacaisquêmica pode ser impossível ou inconclusiva emmuitos pacientes obesos.

Estudos eletrocardiográficos ambulatoriais de24 horas demonstraram, comparativamente a indiví-duos de peso normal sem hipertensão, um aumento de

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

592 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Page 10: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

10 vezes na freqüência de extra-sístoles ventricularesem pacientes obesos hipertensos e de 30 vezes em obe-sos hipertensos com hipertrofia de ventrículo esquer-do. Neste último grupo, em 14% dos pacientes ocor-reram extra-sístoles ventriculares em salvas (93).

Hipertensão arterial sistêmica e cardiomiopatiaHipertensão arterial sistêmica e cardiomiopatiainduzida pela obesidadeinduzida pela obesidadeHipertensão leve a moderada ocorre em 50-60% dosobesos e hipertensão grave em 5-10% (94). No estudode Framingham, 70% dos casos de hipertensão emhomens e 61% em mulheres puderam ser diretamenteatribuídos ao excesso de peso. Nesse estudo, de 26 anosde duração, foi calculado que, para cada quilo de pesoganho, a pressão arterial sistólica eleva-se em média1mmHg (95,96). Em nossos pacientes obesos atendidosno Ambulatório de Obesidade do Hospital das Clínicas,a incidência de hipertensão foi 54,4% (tabela 4) (63).

O mecanismo exato de desenvolvimento dahipertensão arterial em pacientes obesos provavel-mente envolve uma interação entre fatores genéticos,hormonais, renais e hemodinâmicos (97). A hiperinsu-linemia, característica da obesidade, pode contribuirativando o sistema nervoso simpático (com aumentodo nível basal de noradrenalina e aumento da respostada mesma a variações posturais e exercício isométrico)e levando à retenção de sódio. Além disso, a resistênciaà insulina pode ser responsável pelo aumento na ativi-dade pressórica da noradrenalina e da angiotensina II.A hipertensão e a vasoconstrição levam à redução dofluxo sangüíneo no músculo esquelético, levando àpiora da resistência à insulina e perpetuando o proces-so (95). Com o aumento da adiposidade, há umaumento do número de células intersticiais e da matrizextracelular renal, com compressão de vasa recta e

túbulos renais. Isso acarreta um aumento da pressãohidrostática do fluido intersticial e redução e lentifi-cação do fluxo sangüíneo medular (e tubular), aumen-tando ainda mais a reabsorção de sódio (98). Biópsiarenal de 17 pacientes com obesidade grau III sem ou-tras doenças sistêmicas mostraram a presença de lesõesrenais histológicas em 16, a saber: glomeruloesclerosefocal (9), nefropatia diabética (5) e lesões mínimas (2)(99) (tabela 5).

A hipertensão, per se, leva a hipertrofia concên-trica do ventrículo esquerdo numa fase inicial e a umaperda progressiva de sua complacência posteriormente,porém, obesidade é o mais forte preditor clínico damassa e hipertrofia ventricular esquerda. A expansãodo volume extracelular e o conseqüente estado hiper-volêmico, que é característico do paciente obeso, alémda elevação da resistência periférica secundária àhipertensão, elevam o risco de desenvolvimento deinsuficiência cardíaca (76,100-103). A etiopatogeniada cardiomiopatia da obesidade e sua associação cominsuficiência cardíaca direita, hipertensão sistêmica edoença coronariana é esquematizada na figura 2. Demaneira simplista, pode-se dizer que o aumento da adi-posidade produz um aumento do volume de sanguecirculante e do débito cardíaco, com conseqüentedilatação do ventrículo esquerdo e aumento do estresseda parede do ventrículo esquerdo, de acordo com a leide LaPlace. Resulta uma elevação da pós-carga, pre-dispondo a hipertrofia excêntrica do ventrículo, a qualpredispõe a disfunção diastólica. Se a hipertrofia forinadequada (falha da hipertrofia em acompanhar adilatação da câmara), o estresse da parede permaneceaumentado, favorecendo o desenvolvimento de dis-função sistólica do ventrículo esquerdo. O ventrículodireito parece responder de maneira similar, mesmo na

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

593Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Tabela 5.Tabela 5. Fatores etiopatogênicos envolvidos na hipertensão associada a obesidade.

Fator envolvido Fator envolvido Mecanismos responsáveis propostos Mecanismos responsáveis propostos

Inicial Inicial Final Final

Genético Polimorfismos, mutações Alteração de adreno-receptores, etcAmbiental Aumento ingestão calórica Aumento da ingestão de Na Hormonal Hiperinsulinemia e RI Estímulo SNS com vasoconstrição

Estímulo SNS com retenção de Na Embotamento da vasodilatação usual

Retenção de Na Estímulo bomba Na-K-ATPase Estímulo bomba Na-H

Hiperleptinemia (?) Estímulo SNS a nível renal (?) Renal Aumento ph interstício Retenção de Na

Alterações histológicas Glomerulopatia com ou sem proteinúria Hemodinâmico Hipervolemia, aumento DM Resposta excessiva da PA ao estresse

RI = resistência à insulina; SNS = sistema nervoso simpático; DM = demanda metabólica; ph = pressão hidrostática.

Page 11: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

ausência de doença pulmonar vascular ou paren-quimatosa (19).

A redução de peso pode levar a regressão damassa ventricular esquerda independentemente damelhora dos níveis de pressão arterial (104). Em váriosestudos, a massa ventricular esquerda correlacionou-secom a perda de peso, mas não com variações da fre-qüência cardíaca ou da pressão arterial (88,104).

A associação entre obesidade e hipertensão temgrande importância clínica, uma vez que a redução depeso mesmo modesta (da ordem de 5-10% do pesoinicial), mas mantida a longo prazo (3-4 anos) temcomo conseqüência a redução da pressão arterialdiastólica em 0,35mmHg e da sistólica em0,45mmHg para cada quilo de peso perdido (105). Aredução pressórica é aditiva à observada comrestrição de sódio, álcool e medicações anti-hiperten-sivas, possibilitando em muitos pacientes a suspensãodessas medicações (95).

Na escolha da medicação anti-hipertensiva a serutilizada em pacientes obesos, deve-se considerar seusefeitos sobre a resistência à insulina e suas conse-qüentes alterações metabólicas sobre a redução de peso(e sobre a eventual hipertrofia ventricular esquerda quepode estar presente). Assim, os inibidores da enzimaconversora de angiotensina, os bloqueadores de canaisde cálcio e os antagonistas da angiotensina II têm sidorecomendados como drogas de primeira escolha, jáque não promovem redução de sensibilidade insulínica

ou alterações na tolerância à glicose e no perfil lipídi-co, ao contrário dos diuréticos tiazídicos e dos beta-bloqueadores (95).

Doença cardíaca isquêmicaDoença cardíaca isquêmicaNo presente, é universalmente aceito que obesidade éum fator de risco independente para doença cardíacaisquêmica (12,15,96), principalmente quando associadaa acúmulo visceral de gordura, que está presente em90% dos pacientes obesos com coronariopatia (106). Oganho de peso durante a vida adulta aumenta o risco dedoença coronariana e mortalidade em ambos os sexos,independentemente da presença de outros fatores derisco cardiovascular clássicos, sugerindo-se a implicaçãoda hiperinsulinemia no fenômeno trombogênico. Nãoobstante, esses outros fatores, todos comuns à presençade excesso de adiposidade abdominal, como hiperten-são, diabetes mellitus, hipercolesterolemia e redução docolesterol HDL, participam da etiopatogenia da doençana maioria dos pacientes (107).

Arritmias cardíacasArritmias cardíacasArritmias podem ocorrer no indivíduo obeso porvários fatores: hipóxia, hipercapnia, distúrbios hidroe-letrolíticos causados por diuréticos, doença coronari-ana, aumento da concentração de catecolaminas circu-lantes, SAOS, alteração da função autonômica cardía-ca e infiltração gordurosa do sistema de condução(44,53,96,108,109).

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

594 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Figura 2. Figura 2. Esboço etiopatogênico da cardiomiopatia induzida pela obesidade e sua interação comhipertensão arterial, doença coronariana e doença respiratória.

Page 12: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

Possíveis complicações e peculiaridades durantePossíveis complicações e peculiaridades durantea evoluçãoa evoluçãoOscilações ponderais são freqüentes em pacientesmuito obesos, dificultando a valorização de um even-tual aumento de peso como indicativo de deterioraçãoda função cardíaca. Administração rápida de fluidos,hipertensão pulmonar precipitada por hipóxia oumesmo intubação traqueal podem levar à piora da per-formance cardíaca. A monitorização da pressão venosacentral é desejável, uma vez que pode fornecer maisinformações sobre a função cardíaca e o acesso centralpode ser usado para infusões inotrópicas caso sejanecessário (33). Em pacientes com insuficiência cardía-ca documentada submetidos a cirurgia, a cateterizaçãoda artéria pulmonar pode fornecer dados de muita util-idade (54).

Medicamentos opióides e sedativos podem levarà depressão respiratória em pacientes com obesidademórbida e, idealmente, devem ser evitados, dando-sepreferência pelo uso de analgésicos e antiinflamatóriosnão hormonais. As vias intramuscular e subcutânealevam a absorção errática dos medicamentos, devendoser evitadas (54).

No pré-operatório de pacientes muito obesos, acombinação de bloqueador H2 e medicação procinéti-ca reduz o risco de pneumonite aspirativa quandoadministrados 2 e 12 horas antes da cirurgia. Inibi-dores da enzima conversora da angiotensina devem serinterrompidos na véspera da cirurgia, devido ao riscode hipotensão profunda durante a anestesia (33,54,110). A monitorização invasiva da pressão arterial estáindicada, exceto em procedimentos cirúrgicosmenores, quando um manguito apropriado deve serutilizado (33,54). São mandatórias a oximetria depulso, a eletrocardiografia e a capnografia (33,54).

Pacientes com obesidade grau III, que já têmuma mobilidade limitada no período pré-operatório eum aumento da coagulabilidade, freqüentemente per-manecem menos ativos no pós-operatório, apresentan-do um risco elevado de trombose venosa profunda.Enoxaparina ou heparinização em baixa dose devemser administradas como profilaxia e mantidas no perío-do pós-operatório até que o paciente esteja mais ativoe se movimentando. Outras medidas como meias-com-pressivas devem ser usadas sempre que possível, porémnovamente o tamanho ideal não está disponível parapacientes muito obesos (33,54).

Obesos “mórbidos” também apresentam riscoaumentado de infecção da ferida cirúrgica e podemrequerer antibioticoterapia profilática (33,54).

A maior parte das mesas das salas de reanimaçãoe das salas de cirurgia convencionais são designadas

para pacientes de até 120 a 140 kg. Podem ser neces-sárias mesas cirúrgicas especialmente projetadas oucolocação de duas mesas cirúrgicas lado a lado (54).Transferências desnecessárias devem ser minimizadas eo paciente pode ser anestesiado na própria sala decirurgia. Na mesa cirúrgica e mesmo no leito de inter-nação, medidas cuidadosas devem ser tomadas no sen-tido de proteger áreas de pressão, pois o risco de for-mação de escaras e danos neurais é maior em indivídu-os obesos (111). Em pacientes com diminuição donível de consciência ou sob anestesia, a colocação deuma cunha sob o colchão ou uma leve inclinação lateralda mesa cirúrgica pode protegê-lo de compressão daveia cava inferior.

As transferências do paciente com obesidade“mórbida” pelo ambiente hospitalar podem ser rea-lizadas no seu próprio leito de internação, uma vez queas macas convencionais são inadequadas. Obviamenterecursos humanos devem estar disponíveis quando danecessidade de mobilização desses pacientes.

O acesso intravenoso pode ser problemáticodevido ao excesso de tecido subcutâneo, e estabelecerum acesso central é desejável nesses casos.

OBESIDADE E SISTEMA DIGESTÓRIOOBESIDADE E SISTEMA DIGESTÓRIO

Exame do abdome obesoExame do abdome obesoMuito embora a prática clínica demonstre que o examefísico do abdome globoso e tenso de pacientes obesostransmita poucas informações, sendo tanto a per-cussão, como a palpação e a ausculta extremamentedificultadas pela presença de tecido adiposo subcutâ-neo abundante, poucos estudos abordam este tema.Um estudo que avaliou a percussão do espaço deTraube na avaliação de aumento esplênico, demon-strou que pacientes obesos (com avaliação ultra-sono-gráfica com aumento do baço) apresentaram resulta-dos falso-negativos freqüentemente (112).

Ultra-sonografia de abdome superior no pacienteUltra-sonografia de abdome superior no pacienteobesoobesoO ultra-som é um método diagnóstico baseado naemissão e captação de ondas eletromagnéticas na faixade 2 a 15 MHz (mega hertz), que são transformadasem imagens biplanas ou tridimensionais, em branco epreto ou coloridas, por um equipamento digital. Suasgrandes vantagens são: a boa acurácia diagnóstica comcusto relativamernte baixo, e sem a necessidade depreparos desconfortáveis ou uso de meios de contraste.As suas limitações principais são: 1) a avaliação deórgãos que estejam atrás de ar ou ossos, pois nessescasos as ondas são refletidas antes de formar as ima-

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

595Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Page 13: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

gens das estruturas que se pretende avaliar e 2) o usoem pacientes obesos.

A obesidade associa-se a um prejuízo na quali-dade da imagem obtida por ultra-sonografia pelo dis-tanciamento entre o transdutor e o órgão a ser exami-nado devido a depósitos de gordura subcutânea e intra-abdominal (113,114). O aumento da espessura dopanículo adiposo leva a uma atenuação do feixe deultra-som com conseqüente obscurecimento daimagem, podendo levar a falsos diagnósticos ou a resul-tados falso-negativos em pacientes obesos (115,116).Uma das alternativas possíveis para superar as dificul-dades criadas pelo panículo adiposo, em pacientes sele-cionados cujo ultra-som convencional e outros examessubsidiários não esclareçam suficientemente dúvidasimportantes relativas à região pancreática e vias biliaresextra-hepáticas, e onde o emprego de técnicas maisinvasivas seja justificável pela hipótese clínica, é a rea-lização de ultra-sonografia endoscópica (117).

Para o exame de ultra-som não há limitaçõesimportantes em pessoas pesando até cerca de 90kg.Acima desse peso, normalmente, em indivíduos comIMC >30 kg/m2, há duas limitações básicas. Além de adistância que o feixe de ultra-som deve percorrer paraatingir o órgão alvo ser maior, o que faz com que estechegue com menor potência e a imagem fique parcial-mente degradada (ou mesmo não possa ser adequada-mente identificada a estrutura), a esteatose hepática –freqüente nesse grupo de pacientes – faz com que a aten-uação do feixe seja ainda maior e, em muitos casos, nãopermita a avaliação das regiões posteriores do fígado.*

Para minimizar estas dificuldades técnicas pode-se usar transdutores (equipamento que emite e recebeas ondas) com menor freqüência, na faixa de 2 MHz.Deve-se lembrar que nos pacientes normolíneos usa-sea freqüência de 3 a 5 MHz* (Figura 3).

Nos equipamentos mais modernos existemalguns recursos que também melhoram a imagem nospacientes obesos, as assim chamadas “freqüências har-mônicas”, com as quais é possível suprimir parte dasondas que retornam com artefato técnico, e dessaforma penetrar mais profundamente e formar imagensde melhor qualidade.*

Alterações ultra-sonográficas sugestivas deesteatose hepática e/ou hiperaminotransferasemiaforam demonstradas em 20% de 135 crianças obesas(118). É importante citar que a presença de umexame ultra-sonográfico normal não exclui esteatosehepática, estando essa incidência subestimada, umavez que em um número significativo de pacientes as

transaminases podem encontra-se dentro do limite danormalidade (119).

Apesar da dificuldade de visualização de outrosórgãos intra-abdominais, o ultra-som apresenta umaalta sensibilidade (91%) e especificidade (100%) nadetecção de cálculos biliares, mesmo em pacientes“morbidamente” obesos (120).

A ultra-sonografia transvaginal pode ser útilcomo guia de punção para obtenção de líquido ascíti-co para análise em pacientes obesas mórbidas com sín-dromes edematosas e ascite, onde a presença de obesi-dade importante pode impossibilitar a paracentesetransabdominal (121).

Refluxo gastroesofágicoRefluxo gastroesofágicoA combinação de aumento da pressão intra-abdomi-nal, aumento de volume do estômago e baixo pH doconteúdo gástrico, além de incidência aumentada dehérnia de hiato e refluxo gastroesofágico, confere aopaciente com obesidade um risco aumentado de aspi-ração do conteúdo gástrico seguida de pneumoniaaspirativa (122).

Esteatose e esteato-hepatiteEsteatose e esteato-hepatiteA associação entre doença hepática e obesidade é bemdocumentada, podendo variar desde esteatose hepáticaaté cirrose gordurosa. Não obstante o elevado por-centual de pacientes com obesidade mórbida e anor-malidades histológicas no fígado, a maior parte delespermanece assintomática (123). Um estudo de bióp-sias hepáticas de 528 obesos submetidos a cirurgia ba-riátrica demonstrou alterações gordurosas em 74% dospacientes (124).

Litíase biliarLitíase biliarA associação de litíase biliar e obesidade mórbidaocorre em 50% dos pacientes estando associada tantocom o grau de sobrepeso como com a velocidade deperda de peso durante tratamentos mais agressivos (aincidência de colelitíase nestes pacientes varia de 10 a26%, contra 7% nos pacientes obesos com perda depeso lenta e menor) (125). Mulheres com IMC >45kg.m-2 apresentam um risco sete vezes maior de litíasequando comparadas com mulheres com IMC <24kg.m-2 (126). Os trabalhos com homens, muito em-bora sejam mais escassos, sugerem que a incidência decolelitíase em homens obesos é semelhante à de mu-lheres obesas (127).

A formação de cálculos em pacientes obesosdepende de vários fatores: aumento do índice de satu-

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

596 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

* Dr. Manoel Orlando da Costa Gonçalves, comunicação pessoal.

Page 14: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

ração de colesterol na bile (aumentado no obeso e maisaumentado ainda durante perda acentuada e rápida depeso), hipomotilidade vesicular (controverso, mas cer-tamente presente com dieta com baixo teor de gordu-ra) e diminuição no tempo de nucleação dos cristais decolesterol (pela diminuição dos ácidos biliares e da pro-dução de fosfolípides) (128).

Câncer colorretalCâncer colorretalSedentarismo, tabagismo, etilismo, genética e hábitosalimentares estão envolvidos na etiopatogenia do câncercolorretal. Particularmente dietas ricas em gordura,carnes vermelhas e ferro predispõem a esta patologia,enquanto dietas ricas em fibras, vegetais e frutas pro-tegem, sendo este um viés importante nas análisesestatísticas. Uma minoria de autores acredita não serdiretamente a obesidade o fator causal, mas sim a dietacompartilhada por muitos destes pacientes. Em algunsestudos, pacientes sedentários com IMC elevado apre-sentaram um risco relativo de 5 quando comparados apacientes ativos com peso normal (129,130).

HemorróidasHemorróidasO principal fator etiopatogênico das dilatações venosasanorretais é o aumento da pressão venosa. A prevalên-

cia de hemorróidas na população obesa é maior que napopulação geral.

OBESIDADE E SISTEMA GENITOURINÁRIOOBESIDADE E SISTEMA GENITOURINÁRIO

Ultra-sonografia de rins e vias urinárias no obesoUltra-sonografia de rins e vias urinárias no obesoO aspecto ultra-sonográfico renal foi investigado em665 pacientes normais e obesos, demonstrando quenos obesos, a isoecogenicidade do rim direito emrelação ao fígado encontra-se diminuída, além de haveruma incidência menor de visibilidade da pirâmide renale de ectasia pélvica. Deve haver, portanto, cautela emusar estes parâmetros como indicadores de patologiarenal em pacientes obesos (131). A obesidade limita,com freqüência o diagnóstico preciso de patologias devárias estruturas abdominais profundas, como porexemplo, o envolvimento da veia cava inferior por car-cinoma renal (132).

Abordagens diagnósticas e terapêuticas urológiAbordagens diagnósticas e terapêuticas urológi--cas no obesocas no obesoEm pacientes com obesidade mórbida, com freqüência alitotripsia extra-corpórea com ondas de choque ultra-sônicas mostra-se ineficaz ou a corpulência e a circun-ferência abdominal desses pacientes impede o uso desta

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

597Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Figura 3. Figura 3. Fígado de um paciente obeso visto na mesma incidência, com freqüências diferentes. Na foto superior a freqüênciaempregada foi 3,5 MHz e na inferior foi 2,5 MHz. Nota-se que na foto inferior o contorno do diafragma tem uma melhor definição(seta branca), o parênquima hepático posterior pode ser analisado (P) e a veia hepática média está visível (seta preta), o que nãoocorre na imagem feita com a freqüência habitual (fotos gentilmente cedidas pelo Dr. Manoel Orlando da Costa Gonçalves).

Page 15: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

técnica. Há relatos na literatura, demonstrando aindaque, em alguns casos, nos quais a distância pele-cálculoultrapassava o comprimento do acesso percutâneo con-vencional com nefroscópio rígido, o urologista empre-gou aparelhos laparoscópicos ginecológicos (mais lon-gos) para acesso e fórceps broncoscópicos extra-longospara remover os fragmentos dos cálculos (133). Outrosestudos demonstram que a melhor posição para visua-lização adequada dos cálculos foi a lateral (134).

Em pacientes obesos com dilatação pielocalicialdiscreta e cálculos renais complexos, as tentativas deacesso renal percutâneo apresentam um alto índice deinsucesso. A combinação de ureteroscopia retrógradaflexível pode facilitar a punção percutânea simultâneanesses pacientes, embora mesmo esta nova técnicadescrita possa falhar em pacientes com obesidade“mórbida” (135).

A peniscopia é um procedimento urológico quenão encontra obstáculos técnicos em pacientes de pesonormal. Entretanto, em pacientes obesos, notavelmentenaqueles com grande panículo na região pubiana, ma-nifestam-se sérios problemas e dificuldades. É fre-qüente o pênis apresentar-se “embutido” no tecido sub-cutâneo pubiano, dificultando a aplicação de ácido acéti-co para os procedimentos diagnósticos relacionados àslesões sub-clínicas do HPV no homem. Difícil, pelomesmo motivo, é a realização de pequenas biópsias, quenestes pacientes exigem um auxiliar, o que édesnecessário em pessoas com peso normal.*

Procedimentos considerados banais e livres decomplicações, como o curativo da postectomia, umcurativo delicado, de caráter hemostático e que temtambém a função de minimizar o edema da região nasprimeiras 24 horas, nestes pacientes revelam-se comoimpeditivos. Esses curativos simplesmente não assen-tam na cicatriz e, via de regra, soltam assim que opaciente obeso assume a posição sentada.*

Ultra-sonografia fetal em gestantes obesasUltra-sonografia fetal em gestantes obesasA obesidade materna parece não influenciar o poder deacurácia e validade do ultra-som na estimativa do pesofetal (136). Um estudo comparativo da estimativa daidade fetal pela medida da altura do fundo uterino (dis-tância em cm entre a sínfise púbica e o fundo uterino)e da medida ultra-sonográfica mostrou que ambos osmétodos, entre 18 e 32 semanas de gestação, apresen-tam o mesmo poder preditivo na determinação daidade fetal (137). Porém, em mulheres obesas, a visu-alização da anatomia fetal (particularmente a visão dasquatro câmaras cardíacas, coluna vertebral e cordão

umbilical) é sub-ótima em 15% das pacientes e porvezes completamente comprometida, sendo obesidadeo maior fator, inversamente correlacionado à visualiza-ção. O aumento da duração do exame ou o avanço daidade gestacional não ofereceram melhora na resolução(138,139,140).

Ultra-sonografia pélvica em obesasUltra-sonografia pélvica em obesasA obesidade extrema pode mascarar a presença de tu-mores intra-abdominais, como em um relato de casode um tumor benigno gigante de ovário pesando 28 kg(141), assim como de outras massas pélvicas, sendonestes pacientes o ultra-som pélvico convencional umexame com uma margem de erro inaceitável (142).

Como citado anteriormente, o acesso vaginalguiado por vagino-sonografia pode facilitar a obtençãode líquido ascítico em pacientes com obesidade grau III,nas quais a paracentese transabdominal pode ser tecni-camente inviável ou potencialmente iatrogênica (121).

Além disso, a ultra-sonografia transvaginal, de-vido à proximidade do transdutor e do órgão ser estu-dado, melhora incrivelmente a resolução do exameultra-sonográfico, particularmente em pacientes obe-sas, nas quais problemas técnicos impedem a corretainterpretação dos achados no ultra-som transabdomi-nal convencional, facilitando o reconhecimento depatologias pélvicas nesse grupo de pacientes (143).

MISCELÂNEAMISCELÂNEA

Outros desafios diagnósticos particulares doOutros desafios diagnósticos particulares doobesoobeso

Estudo radiográfico convencionalO estudo radiográfico convencional utiliza raios X, umtipo de radiação eletromagnética, que transporta ener-gia através do espaço através de partículas de radiaçãodenominadas fótons. Os fótons dos raios X penetramno paciente com distribuição uniforme e, dependendodo seu biotipo (espessura e constituição), emergemcom um padrão de distribuição específica. Os fótonsinteragem com os diferentes tecidos do paciente:alguns são atenuados (têm sua intensidade reduzida àmedida que atravessam a matéria devido à absorção ouà deflexão dos fótons) e outros são transmitidos, sensi-bilizando o filme e formando a imagem radiográfica.Alguns tecidos atenuam mais os raios X que outros,assim como quanto maior a espessura do paciente,maior serão a atenuação e a dissipação (ou “radiaçãoespalhada”) do feixe. Estes fatores determinam o con-

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

598 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

* Dr. Homero Gustavo Campos Guidi, comunicação pessoal.

Page 16: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

traste na imagem radiológica, ou seja, a diferenciaçãoda densidade entre os diferentes tecidos * (144).

No paciente obeso, então, é necessária umamaior capacidade de penetração do feixe radiográfico,pois, neste biotipo, os feixes são atenuados e ocorremuita dissipação dos fótons. Em termos técnicos, issose traduz como maior quantidade de kVp para garan-tir um bom contraste radiológico e adequada interpre-tação por parte do radiologista * (144).

Na avaliação da coluna vertebral, estas conside-rações são fundamentais para se obter uma qualidaderadiográfica adequada. Habitualmente, estas avaliaçõessão obtidas em posição ortostática, porém, em indiví-duos muito obesos, preconiza-se a radiografia emdecúbito dorsal, a fim de reduzir a espessura ântero-posterior e diminuir a atenuação e a radiação espalha-da * (144) (Figura 4).

Com a radiografia digital, embora exista a pos-sibilidade de se manipular o contraste e o brilho daimagem obtida, ainda assim é necessário fazer as cor-reções técnicas, como, por exemplo aumentar a quan-tidade de kVp * (144).

Densitometria e avaliação corporal por DEXA emDensitometria e avaliação corporal por DEXA emobesosobesosA densitometria por dual-energy absorptiometry (DEXA)é um método com excelente acurácia e precisão paramedir tanto a massa óssea quanto os componentes cor-porais de gordura e massa magra, sob condições ideais.Os densitômetros são calibrados para a avaliação depacientes com até 125kg e/ou 28-30 cm de diâmetrosagital abdominal. A precisão do exame fica compro-metida com índices antropométricos acima destes valo-res, que correspondem a percentuais de gorduraabdominal maiores do que 50%. Não há, até o mo-mento, aparelhos no mercado que comportem indiví-duos com obesidade severa ou que sejam capazes deanalisar os componentes corporais com precisão nestespacientes. O exame de composição corporal, portanto,não pode ser realizado em pacientes com obesidade“mórbida” (144).

No entanto, as informações fornecidas peloexame de composição corporal por DEXA, que é con-siderado o método gold-standard para a avaliação demassa gordurosa e muscular, seriam muito úteis nestespacientes, particularmente no seguimento do trata-mento medicamentoso, cirúrgico ou de condiciona-mento físico.

Um outro ponto a ser lembrado, é que altera-ções de peso maiores do que 10 kg (perda ou ganho de

peso), podem implicar em distorções no cálculo doconteúdo mineral ósseo e prejudicar a precisão entreexames (144).

Avaliação do obeso por medicina nuclearOs aparelhos utilizados em Medicina Nuclear, em espe-cial as gama-câmaras, são desenhados para pacientescom peso não superior a 150 Kg. Embora exista umamargem de segurança, não é recomendado que se ultra-passe esses limites, principalmente em estudos tomo-gráficos denominados SPECT (single photon emissioncomputed tomography), pela dificuldade de posiciona-mento adequado. Existe a alternativa de uso de posi-cionamentos não convencionais, porém, estes sãoexames desconfortáveis e mais demorados e as imagensobtidas, via de regra, são de pior qualidade. Além disso,exames realizados por pacientes obesos sofremdegradação das imagens, provocada pela atenuação daradiação pelos tecidos moles (144).

Exemplificando, quando um isótopo radioativoé administrado ao paciente, este vai se localizar noórgão alvo. Podem ser utilizados diferentes isótopos,tanto isoladamente como como marcadores demoléculas, de tal modo que se acumulem ou se dis-tribuam na região de interesse. O paciente em questãoficará sob o detector da gama-câmara, que é um apa-relho que detecta as radiações gama (as mais usadas emmedicina) e as transforma em pontos luminosos visua-lizados em um monitor. A somatória desses pontosformarão uma imagem denominada cintilografia, ouseja, grafia das cintilações, ou pontos luminosos (àsemelhança de fotografia, ou grafia dos fótons ou luz).Nos obesos, o trajeto a ser percorrido pela radiaçãogama, desde o órgão alvo até o detector da gama-câmara, é maior do que em indivíduos não obesos,pela maior quantidade de tecidos moles, o que faz comque a radiação gama seja mais “atenuada”, gerandoimagens de qualidade inferior e, consequentemente, demais difícil interpretação (144).

Tomografia computadorizada e ressonânciaTomografia computadorizada e ressonâncianuclear magnéticanuclear magnéticaA tomografia computadorizada é um método que utilizaradiação ionizante com cortes programados a partir daradiografia digital, com espessura e incremento previa-mente determinados. A utilização desse método naavaliação de indivíduos obesos favorece a resolução deimagens, pois evidencia detalhes e evita a sobreposiçãode estruturas nos diferentes segmentos corpóreos. Temo inconveniente de utilizar radiação ionizante e ter

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

599Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

* Dra. Denise Tokechi Amaral, comunicação pessoal.

Page 17: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

maior custo que os exame radiológicos convencionais.No entanto, como a quantidade de raios X (kVp)necessária para a obtenção de imagens em indivíduosobesos já é maior, esse não é um fator limitante impor-tante neste grupo de pacientes.*

Aparelhos de tomografia computadorizada,mesmo os mais modernos, apresentam limites para aoperação do equipamento. Assim, a título de exemplo,o tomógrafo helicoidal Hispeed CTI – G.E. garanteuma exatidão de posição de 0,25 mm para carga demesa <180 kg, que diminui sensivelmente para 1,0mm para carga entre 180 e 205 kg. Em pacientes compeso superior a 205 kg, não há garantias na exatidãodo movimento (incremento) da mesa. Dessa forma,quanto mais obeso o paciente, mais comprometida ficaa exatidão de corte da imagem, podendo levar a falsosdiagnósticos.**

Outro fator limitante é a abertura do gantry dostomógrafo (em geral de até 80 cm), que pode ser umabarreira impeditiva em avaliações abdominais depacientes extremamente obesos. No equipamento exem-plificado acima, o diâmetro da abertura é 71 cm.**

Os estudos podem ser feitos sem ou com con-traste iodado, injetado por via endovenosa ou ingeri-dos pela via oral. Podem ser feitos exames com con-traste intratecal ou por via retal dependendo da indi-cação do estudo.*

Um fato interessante em relação à tomografia (etambém à ressonância magnética) é que moderadasquantidades de tecido adiposo, nos casos de exames deabdome, podem ajudar a fazer a análise das imagensporque esse tecido se interpõe entre os órgãos e alçaspropiciando uma melhor avaliação dos seus contornos edelimitando melhor os espaços ocupados pelas lesões.*

Os limites físicos são ainda mais restritos nosaparelhos de ressonância nuclear magnética, onde odesempenho do sistema depende de uma aberturamenor do equipamento.

O aparelho de ressonância Sigma 0.5 Tesla temum diâmetro da abertura do túnel de magneto de ape-nas 54 cm, enquanto que o Horizon 8.1 – G.E. e o 1.5Tesla apresentam uma abertura de 57 cm. A mesa detransporte móvel desses aparelhos pode ser retirada dasala de exame para simplificar o posicionamento dospacientes e acelerar a remoção dos mesmos da sala deexame em caso de emergência, porém suporta no má-ximo 158 kg.**

Colheita de líquor e anestesia epidural em obe-sosA análise de líquido cefalorraquidiano torna-se um examebásico em pacientes obesos com quadros sugestivos delesão em sistema nervoso central e que encontram limi-tações para realização de tomografia ou ressonância.

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

600 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Figura 4.Figura 4. Radiografias de coluna lombar, do mesmo paciente obeso, de frente (A e B) e em perfil (C). Nota-se uma qualidade maisadequada na foto B, realizada em decúbito dorsal horizontal com aumento de 10 kVp (fotos gentilmente cedidas pela Dra. DeniseTokechi Amaral).

* Dr. Antonio J. Rocha, comunicação pessoal** Fonte: Manuais Internos de Tomografia Computadorizada e Ressonância Magnética, Laboratório Fleury.

Page 18: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

Obesidade e edema, entretanto, freqüentementeocultam, tornando confusos, os limites e as referênciasanatômicas, resultando em dificuldades técnicas durantea colheita de líquido céfalo-raquidiano e/ou adminis-tração de anestesia epidural. Dessa forma, o acesso aoespaço subaracnóideo muitas vezes é prejudicado ou atémesmo imposibilitado pela obesidade.

Nas punções subaracnoideas, a dificuldade deacesso à cisterna magna se dá basicamente por proble-mas na localização do espaço para a introdução da agu-lha em virtude da grande quantidade de tecido adiposo,associada à baixa mobilidade do pescoço. A flexão força-da do pescoço, em pacientes extremamente obesos comdepósitos adiposos cervicais e submentonianos, poderesultar em interrupção do fluxo aéreo por colabamentoda orofaringe e parada cardiorrespiratória. As punçõeslombares são as mais indicadas nestes pacientes, porémressalte-se que o grau de dificuldade será tanto maiorquanto mais obeso for o paciente. Além do tecido adi-poso dificultar a localização do espaço intervertebral, namaior parte das vezes o paciente não consegue assumira posição fetal, muito útil para abrir o espaço e facilitara sua localização e a introdução da agulha.*

A ultra-sonografia pode auxiliar, permitindo aidentificação da linha média no espaço intervertebral,medindo a distância e marcando o local de punção paraintrodução perpendicular da agulha. Em alguns casos apunção pode ser impossibilitada pela ausência de agul-ha suficientemente longa para vencer o panículo adi-poso e alcançar o espaço subaracnóideo * (145).

Apresentações patológicas não usuais deApresentações patológicas não usuais delipomaslipomasFoi citado anteriormente um caso singular de troca devalva cardíaca por uma localização extremamente rarade lipoma (69).

Lipomas epidurais da coluna vertebral são rarose os sintomas de radiculopatia usualmente desaparecemou regridem parcialmente com a perda de peso, sendoo tratamento cirúrgico reservado para os casos em queos sintomas não desaparecem com a terapêutica conser-vadora (146). Os angiolipomas podem ser extraduraise intramedulares e são mais comuns em mulheres(23/14), podendo piorar durante a gestação, podendocausar, além de compressão medular, infiltração eerosão óssea com fraturas patológicas; necessitam detratamento cirúrgico (eficaz nos 37 casos documenta-dos) para ressecção das lesões epidurais e descom-pressão interna das lesões extra-medulares (147).

Outra patologia de ocorrência bastante rara,

porém associada na maioria dos casos com obesidade,é o mielolipoma adrenal, um tumor benigno com altorisco de hemorragia espontânea, quando, em geral,torna-se sintomático (dor abdominal) (148,149).

Grandes lipomas podem levar à palpação demassas abdominais, algumas vezes fixas, que podemaderir e deslocar estruturas levando à cirurgia por vezesdesnecessária e a quadros clínicos variáveis de acordocom a localização (Figura 5).

Farmacocinética: distribuição e depuração deFarmacocinética: distribuição e depuração dedrogas em obesosdrogas em obesosIndivíduos obesos possuem características únicas quepodem afetar e induzir a erros de prescrição de váriosmedicamentos, uma vez que a maioria dos dados far-macocinéticos são obtidos em estudos com pessoas depeso normal. A constituição corporal dos obesos ca-racteriza-se por uma maior porcentagem de gordura euma menor porcentagem de tecido magro e água,quando comparada com indivíduos de peso normal.Apesar do débito cardíaco e o volume sangüíneo totalestarem aumentados na obesidade, o fluxo de sanguepor grama de tecido adiposo é menor que o de indiví-duos não obesos. Alterações histológicas hepáticas,hiperaminotransferasemia e taxa de filtração glomeru-lar aumentada são alterações comuns em obesos (150).

A absorção de medicamentos em indivíduosobesos parece não estar alterada. O volume de dis-tribuição, porém, encontra-se muito aumentado porum acúmulo marcante em tecido adiposo (levandoconseqüentemente a um aumento da meia-vida deeliminação) para alguns medicamentos, como a maiorparte dos benzodiazepínicos, carbamazepina, tra-zodona, sufentanil, tiopentona, fenitoína, verapamil elidocaína e aumentado para ibuprofeno, metilxantinas,aminoglicosídeos, vancomicina, prednisolona e hepari-na. As distribuições de digoxina, cimetidina e pro-cainamida estão inalteradas em indivíduos obesos,enquanto as de propranolol e ciclosporina estão dimi-nuídas (indicando que outros fatores além da solubili-dade lipídica, como por exemplo, alteração de fluxosangüíneo em tecido adiposo, podem estar inter-ferindo). O mecanismo que modifica o volume de dis-tribuição de alguns medicamentos na obesidade podeenvolver o caráter lipofílico da molécula (150, 151).

A ligação de drogas à albumina e a outras pro-teínas plasmáticas e a biotransformação oxidativa nãoparecem estar significativamente alteradas na obesi-dade, com exceção do ibuprofeno e da prednisolona,cuja depuração aumenta em função do peso corporal.

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

601Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

* Dr. Hélio Rodrigues Gomes, comunicação pessoal.

Page 19: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

A conjugação uniformemente aumenta com o peso,tendo sido estudada em particular com o paracetamol,lorazepam e oxazepam. A acetilação da procainamidanão se altera em função do hábito corporal. A depu-ração renal encontra-se inalterada para algumas drogas(digoxina, cimetidina), sugerindo-se que devam por-tanto ser calculadas com base no peso corporal ideal, eaumentada para outros medicamentos (aminogli-cosídeos, verapamil, procainamida), onde estaria justi-ficado um ajuste (aumento) de dose no sentido de atin-gir concentrações terapêuticas adequadas (151).

Foi proposto um ajuste de dosagem de algumasdrogas baseado na distribuição, embora existam algu-mas exceções. Drogas com distribuição restrita a teci-dos magros deveriam ter sua dose baseada no peso cor-poral ideal dos pacientes, enquanto drogas com dis-tribuição notável em tecido adiposo deveriam ter adosagem ajustada e baseada no peso corporal total(Tabela 6) (151).

Trauma no obesoObesos estão mais inclinados a sofrer lesões traumáti-cas. Vários fatores podem contribuir para essa predis-posição, entre eles sonolência causada por uma possí-vel SAOS e o estilo de vida, como diminuição da agili-dade física e menor treinamento e prática de esportes.

O excesso de carga sobre os ossos e as articulações desuporte, particularmente em coluna vertebral e mem-bros inferiores, também predispõe esses pacientes alesões, por vezes com uma nítida desproporção entre otrauma e a lesão traumática (Figura 6). Um estudointeressante demonstrou que lesões traumáticas dedentes são mais comuns em crianças obesas (prevalên-cia de 30,8 vs. 20% em crianças não obesas), havendouma correlação inversa entre a prática de atividade físi-ca e a ocorrência de lesões (152).

Existem padrões de trauma específicos de víti-mas obesas. Pacientes obesos mais comumente sofremtrauma em acidentes de trânsito e são mais susceptíveisa fraturas de costelas, contusões pulmonares, fraturaspélvicas, hérnias traumáticas da parede abdominal efraturas de extremidades, enquanto que os trauma-tismos cranioencefálicos e as lesões de fígado sãomenos comuns (153). Em pacientes obesos, as herni-ações traumáticas do pulmão e da parede abdominal,com avulsão da musculatura, estão em geral rela-cionadas a acidentes de trânsito e posicionamento ele-vado do cinto de segurança, devido ao aumento da adi-posidade abdominal (154,155). Além disso, a obesi-dade está associada à diminuição do uso de cinto desegurança, já que não é incomum que eles simples-mente não alcancem o fecho (156). Por outro lado, o

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

602 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Figura 5. Figura 5. Tomografia computadorizada pélvica de paciente feminina de 52 anos, com 108 kg e quadro clínico de dor abdomi-nal e massa palpável em fossa ilíaca D. Nota-se a presença de lipoma gigante em fossa ilíaca D, palpável ao exame físico, aderi-do ao cólon e deslocando-o.

Page 20: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

risco de fratura de quadril durante o impacto de umaqueda de altura é menor em pacientes obesos, poden-do estar relacionado à atenuação de forças pelos tecidosmoles circunjacentes a/ou ao aumento de densidadeóssea (157).

Todas as etapas de atendimento de um pacienteobeso politraumatizado são comprometidas, desde otransporte, realização de exames radiológicos e mor-mente os procedimentos cirúrgicos necessários (156).

O diagnóstico por raio-X convencional de fra-turas sacrais transversas encontra-se comprometido emobesos (Figura 5) (158).

CONCLUSÃOCONCLUSÃO

Obesidade é uma doença universal de prevalência cres-cente e que vem adquirindo proporções alarmante-mente epidêmicas, sendo um dos principais problemas

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

603Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Figura 6. Figura 6. Radiografia de lesão por escorregamento de cabeça de fêmur E (epifisiolistese femoral proximal), ocorrida sem trauma,em criança de 10 anos de idade pesando mais de 100 kg antes (A) e após (B) correção cirúrgica por fixação in situ.

Tabela 6.Tabela 6. Classificação de drogas quanto a lipofilicidade e recomendações de ajuste de dose.

Droga Droga Lipofilicidade Lipofilicidade Ajuste de dose recomendado Ajuste de dose recomendado

Digoxina Fraca Não Cimetidina Fraca Não Ranitidina Fraca Não Ciclosporina Elevada* Não Propranolol** Elevada* Não Prednisolona Elevada* DI baseada no PCI, freqüência reduzida Metilprednisolona Elevada* DI baseada no PCI, freqüência reduzida Gentamicina Moderada DI baseada no PCI + 40% Tobramicina Moderada DI baseada no PCI + 40% Amicacina Moderada DI baseada no PCI + 40% Diazepam Elevada DI e DM baseadas no PCT Lorazepam Elevada DI e DM baseadas no PCT Nitrazepam** Elevada DI e DM baseadas no PCT Trazodona Elevada DI baseada no PCT, DM baseada no PCI Verapamil Elevada DI baseada no PCT, DM baseada no PCI Sufentanil Elevada DI baseada no PCT, DM reduzida

Abreviações e símbolos: * = farmacocinética discrepante em relação ao grau de lipofilicidade; ** = administração por via oral(as demais drogas foram estudadas em administração endovenosa); DI = dose inicial; DM = dose de manutenção; PCI = pesocorporal ideal; PCT = peso corporal total.

Page 21: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

de saúde pública da sociedade moderna. Paralelamente,vem crescendo tanto a pesquisa de fatores etiopa-togênicos, como de medicamentos com ação em diver-sos sítios, colaborando para a aceitação de que obesi-dade é uma doença passível de prevenção e tratamento.

Cada vez mais os médicos clínicos gerais e ou-tros profissionais de saúde que trabalham em atendi-mento primário defrontam-se com o desafio de diag-nosticar e tratar pacientes obesos e complicações asso-ciadas à obesidade. Outros especialistas, no dia-a-dia,enfrentam obstáculos na boa condução clínica de seuspacientes, devido ao excesso de massa adiposa.

Este manuscrito propôs-se a revisar pela pri-meira vez este assunto, esperando encorajar os colegasa colaborar com o enriquecimento da literatura médi-ca, documentando através de relatos de caso ou cartasao editor, a experiência pessoal em relação ao assunto.

AGRADECIMENTOSAGRADECIMENTOS

O autor agradece aos colegas Dr. Antonio J. Rocha, Dra.Denise T. Amaral, Dr. Flavio Aloe, Dr. Hélio R. Gomes,Dr. Homero G. C. Guidi, Dr. Manoel O. C. Gonçalvese Dr. Mario Kehdi Carra, aos laboratórios Fleury eDigimagem pelas colaborações gentilmente recebidas, aoDr. Mauricio Gattaz pelo incentivo na revisão deste temae ao Sr. Tadeu C. Mancini pelo cuidado profissional naconfecção de ilustrações e trabalho fotográfico.

REFERÊNCIASREFERÊNCIAS

1. Björntorp P. Obesity. Lancet 1997Lancet 1997; 350:423-6.

2. VanItallie TB. Obesity: adverse effects on health andlongevity. Am J Clin Nutr 1979Am J Clin Nutr 1979;32:2723-33.

3. National Institutes of Health Consensus Development Con-ference Statement. Health implications of obesity. AnnAnnIntern Med 1985Intern Med 1985;103:147-51.

4. Adams JP, Murphy PG. Obesity in anaesthesia and intensivecare. Br J Anaesth 2000Br J Anaesth 2000;85:91-108.

5. Garrison RJ, Castelli WP. Weight and thirty-year mortality ofmen in the Framingham study. Ann Intern MedAnn Intern Med19851985;103:1006-9.

6. Bray GA. Pathophysiology of obesity. Am J Clin NutrAm J Clin Nutr19921992;55:488S-494S.

7. Ashwell M, Chinn S, Stalley S, Garrow JS. Female fat distrib-ution – a simple classification based on two circumferencemeasurements. Int J Obes 1982Int J Obes 1982;6:143-52.

8. Dowling HJ, Pi-Sunyer FX. Race-dependent health risks ofupper body obesity. Diabetes 1993Diabetes 1993;42:537-43.

9. World Health Organization. Report of a WHO consultationon obesity. In: Obesity – Preventing and Managing theObesity – Preventing and Managing theGlobal EpidemicGlobal Epidemic. World Health Organization, Geneva,1998.

10. Larsson B et al. Is abdominal body fat distribution a majorexplanation for the Sex difference in the incidence ofmyocardial infarction? The study of men born in 1913 andthe study of women, Goteborg, Sweden. Am J EpidemiolAm J Epidemiol19921992;135:266-73.

11. Han TS et al. Waist circumference action levels in the iden-tification of cardiovascular risk factors: prevalence study ina random sample. Br Med J 1995Br Med J 1995;311:1401-5.

12. Duflou J, Virmani R, Rabin I, Burke A, Farb A, Smialek J. Sud-den death as a result of heart disease in morbid obesity.Am Heart J 1995Am Heart J 1995;130:306-13.

13. Garfinkel L. Overweight and cancer. Ann Intern MedAnn Intern Med19851985;103:1034-6

14. Kannel WB, Brand N, Skinner JJ, Dawber TR, McNamara PM.The relation of adiposity to blood pressure and the devel-opment of hypertension: The Framingham Study. Ann InternAnn InternMed 1967Med 1967;67:48-59.

15. Kannel WB, LeBauer JE, Dawber JR, McNamara PM. Relationof body weight to development of coronary heart disease:The Framingham Study. Circulation 1967Circulation 1967;35:734-44.

16. Harris T, Cook F, Garrison R, Higgins M, Kannel W, GoldmanL. Body mass index and mortality among son-smoking olderpersons: the Framingham Heart Study. JAMAJAMA19881988;259:1520-4.

17. Kushner RF. Body weight and mortality. Nutr RevNutr Rev19931993;51:127-36.

18. Martikainen K, Hasan J, Urponen H, Vuori I, Partinen M. Day-time sleepiness: a risk factor in community life. Acta NeurolActa NeurolScand 1992Scand 1992;86:337-41.

19. Alpert MA, Hashimi MW. Obesity and the heart. Am J MedAm J MedSci 1993Sci 1993;306:117-23.

20. Jennum P, Sjol A. Epidemiology of snoring and obstructivesleep apnoea in a Danish population age 30-60. J SleepJ SleepRes 1992Res 1992;1:240-4.

21. Young T, Palta M, Dempsey J, Skatrud J, Webber S, Bader S.The occurrence of sleep-disordered breathing among mid-dle-aged adults. N Engl J Med 1993N Engl J Med 1993;328:1230-5.

22. Mancini MC, Halpern A, Radominski R, Azzolini R, YamagutiIN, Wajchenberg BL. Sonolência excessiva diurna emobesidade mórbida: correlação com sexo, grau de obesi-dade e relação abdômen-quadril. Arq Bras EndocrinolArq Bras EndocrinolMetab 1994Metab 1994;38(Supl.2):146.

23. Mancini MC, Radominski R, Azzolini R, Yamaguti IN, HalpernA. Use of Epworth Sleepiness Scale in morbid obesity: rela-tionship to gender, body mass index and fat distribution. IntIntJ Obes 1996J Obes 1996;20 (Suppl.4):154.

24. Mancini MC, Vale SSP, Coelho BP, Tavares SM, Aloe F. Cor-relação clínico-polissonográfica em 94 pacientes com sín-drome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS). Arq BrasArq BrasEndocrinol Metab 1996Endocrinol Metab 1996;40(Suppl.1):60.

25. Mancini MC, Halpern A. Síndrome da Apnéia Obstrutiva doSono e Obesidade. Rev Bras Clin Terap 1997Rev Bras Clin Terap 1997;23(2):43-7.

26. Mancini MC, Aloe F, Tavares S. Apnéia do sono em obesos.Arq Bras Endocrinol Metab 2000Arq Bras Endocrinol Metab 2000;44(1):81-90.

27. Mancini MC, Aloe F. Obesidade, apnéia obstrutiva do sonoe distúrbios respiratórios. In: ObesidadeObesidade, Lemos Editorial, 1aedição, São Paulo, 153-170, 1998.

28. Chervin RD, Guilleminault C. Obstructive sleep apnea and

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

604 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Page 22: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

related disorders. Neurol Clin 1996Neurol Clin 1996;14:583-609.

29. Balfors EM, Franklin KA. Impairment of cerebral perfusionduring obstructive sleep apneas. Am J Resp Crit Care MedAm J Resp Crit Care Med19941994;150:1587-91.

30. Burwell CS, Robin ED, Whaley RD, Bickelman AG. Externalobesity associated with alveolar hypoventilation – a Pick-wickian syndrome. Am J Med 1956Am J Med 1956;25:815-20.

31. Hood DD, Dewan DM. Anesthetic and obstetric outcome inmorbidly obese parturients. Anesthesiology 1993Anesthesiology 1993;79:1210-8.

32. Lee JJ, Larson RH, Buckley JJ, Roberts RB. Airway mainte-nance in the morbidly obese. Anesth Rev 1980Anesth Rev 1980;7:33-6.

33. Buckley FP, Robinson NB, Simonowitz DA, Dellinger EP.Anaesthesia in the morbidly obese. A comparison of anaes-thetic and analgesic regimens for upper abdominalsurgery. Anaesthesia 1983Anaesthesia 1983;38:840-51.

34. Brodksy JB. Anesthetic management of the morbidly obesepatient. Int Anesthesiol Clin 1986Int Anesthesiol Clin 1986;24:93-103.

35. Williamson JÁ, Webb RK, Szekely S, Gillies ER, Dreosti AV. TheAustralian Incident Monitoring Study. Difficult intubation: naanalysis of 2000 incident reports. Anaesth Intens CareAnaesth Intens Care19931993;21:602-7.

36. Biring MS, Lewis MI, Liu JI, Mohsenifar Z. Pulmonary physio-logic changes of morbid obesity. Am J Med SciAm J Med Sci19991999;318:293-7.

37. Ray C, Sue D, Bray G, Hansen JE, Wasserman K. Effects ofobesity on respiratory function. Am Ver Respir DisAm Ver Respir Dis19831983;128:501-6.

38. Hedenstierna G. Gas exchange during anaesthesia. Br JBr JAnaesth 1990Anaesth 1990;64:507-14.

39. Damia G, Mascheroni D, Croci M, Tarenzi L. Perioperativechanges in functional residual capacity in morbidly obesepatients. Br J Anaesth 1988Br J Anaesth 1988;60:574-8.

40. Bardocczky GI, Yernault JC, Houben JJ, d’Hollander AA.Large tidal volume ventilation does not improve oxygena-tion in morbidly obese patients during anesthesia. AnesthAnesthAnalg 1995Analg 1995;81:385-8.

41. Santesson J. Oxygen transport and venous admixture in theextremely obese. Influence of anaesthesia and artificialventilation with and without positive end-expiratory pres-sure. Acta Anaesthesiol Scand 1977Acta Anaesthesiol Scand 1977;21:56-61.

42. Pelosi P, Ravagnan I, Giurati G, Panigada M, Buttoni N,Tredici S. Positive end-expiratory pressure improves respira-tory function in obese but not in normal subjects duringanesthesia and paralysis. Anesthesiology 1999Anesthesiology 1999;91:1221-31.

43. Halaka K, Mustajoki P, Aittomaki J, Sovijarvi AR. Effect ofweight loss and body position on pulmonary function andgas exchange abnormalities in morbid obesity. Int J ObesInt J Obes19951995;19:343-6.

44. Luce JM. Respiratory complications of obesity. ChestChest19801980;78:626-31.

45. Hunter JD, Reid C, Noble D. Anaesthetic management ofthe morbidly obese patient. Hosp Med 1998Hosp Med 1998;59:481-3.

46. Pelosi P, Croci M, Ravagnan I, et al. The effect of body masson lung volumes, respiratory mechanics, and gasexchanges during general anesthesia. Anesth AnalgAnesth Analg19981998;87:645-60.

47. Pelosi P, Croci M, Ravagnan I, Vicardi P, Gattioni L. Total res-piratory system , lung and chest wall mechanics, and gasexchange in sedated-paralysed postoperative morbidlyobese patients. Chest 1996Chest 1996;109:144-51.

48. Schafer H, Ewig S, Hasper E, Luderitz B. Failure of CPAP ther-apy in obstructive sleep apnoea syndrome: predictive fac-tors and treatment with bilevel-positive airway pressure.Resp Med 1998Resp Med 1998;92:208-15.

49. Aloe F. Tratamento Farmacológico e Comportamental daSAOS. In: Ronco e Apnéia do SonoRonco e Apnéia do Sono, 1a edição, Revinter, Riode Janeiro, 1999, 77-84.

50. Vaughan RW, Bauer S, Wise L. Effect of position (semire-cumbent versus supine) on postoperative oxygenation inmarkedly obese subjects. Anesth Analg 1976Anesth Analg 1976;55:37-41.

51. Söderberg M, Thomson D, White T. Respiration, circulation,and anaesthetic management in obesity. Investigationbefore and after jejunoileal bypass. Acta AnaesthesiolActa AnaesthesiolScand 1977Scand 1977;21:55-61.

52. Pasulka PS, Bistrian BR, Benotti PN. The risks of surgery inobese patients. Ann Intern Med 1986Ann Intern Med 1986;104:540-6.

53. Shenkman Z, Shir Y, Brodsky JN. Perioperative managementof the obese patient. Br J Anaesth 1993Br J Anaesth 1993;70:349-59.

54. Cooper JR, Brodsky JB. Anesthetic management of the mor-bidly obese patient. Semin Anesth 1987Semin Anesth 1987;6:260-70.

55. Rawal N, Sjöstrand U, Christofferson E, Dahlström B, Arvill A,Rydman H. Comparison of intramuscular and epidural mor-phine for postoperative analgesia in the grossly obese.Influence on postoperative ambulation and pulmonaryfunction. Anesth Analg 1984Anesth Analg 1984;63:583-92.

56. Alessi MC, Peiretti F, Morange P, Henry M, Nalbone G,Juhan-Vague I. Production of plasminogen activator factorinhibitor 1 by human adipose tissue. Possible link betweenvisceral fat accumulation and vascular disease. DiabetesDiabetes19971997;46:860-7.

57. Janand-Delenne B, Chagnaud C, Raccah D, Alessi MC,Juhan-Vague I, Vague P. Visceral fat as a main determinabtof plasminogen activator inhibitor-1 level in women. Int JInt JObes 1998Obes 1998;22:312-7.

58. Wajchenberg BL. Tecido adiposo como glândula endóc-rina. Arq Bras Endocrinol Metab 2000Arq Bras Endocrinol Metab 2000;44:13-20.

59. Nishikawa N, Kurabayashi T, Tomita M, Matsushita H, Aoki Y,Tanaka K. Use of the abdominal wall fat index determinedultrasonographically assessing the risk of post-operativepulmonary embolism. Int J Gynaecol Obstet 2000Int J Gynaecol Obstet 2000;68:241-7.

60. Clayton JK, Anderson JR, McNicol GP. Preoperative predic-tion of postoperative deep vein thrombosis. Br Med JBr Med J19761976;2:910-12.

61. Eriksson S, Backman L, Ljungstrom KG. The incidence of clin-ical postoperative thrombosis after gastric surgery for obe-sity during 16 years. Obes Surg 1997Obes Surg 1997;7:332-5.

62. Lean ME. Obesity and cardiovascular disease: the waistedyears. Br J Cardiol 1999Br J Cardiol 1999;6:269-73.

63.Cercato C, Silva S, Sato A, Mancini MC, Halpern A. Riscocardiovascular em uma população de obesos. Arq BrasArq BrasEndocrinol Metab 2000Endocrinol Metab 2000;44:45-8.

64. The Expert Panel. Summary of the second report of theNational Cholesterol Education Program (NCEP). Expertpanel on detection, evaluation and treatment of highblood cholesterol in adults (Adult treatment panel II). JAMAJAMA19931993;269:3015-23.

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

605Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Page 23: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

65. Smith HL, Willius FA. Adiposity of the heart. Arch Intern MedArch Intern Med19731973;52:929-31.

66. Amad KH, Brennan JC, Alexander JK. The cardiac patholo-gy of chronic exogenous obesity. Circulation 1965Circulation 1965;32:740-5.

67. House AA, Walley VM. Right heart failure dur to ventricularadiposity: adipositas cordis – an old diagnosis revisited.Can J Cardiol 1996Can J Cardiol 1996;12:485-9.

68. Balsaver AM, Morales AR, Whitehouse FW. Fat infiltration ofmyocardium as a cause of cardiac conduction defect. AmAmJ Cardiol 1967J Cardiol 1967;19:261-5.

69. Dollar AL, Wallace RB, Kent KM, Burkhart MW, Roberts WC.Mitral valve replacement for mitral lipoma associated withsevere obesity. Am J Cardiol 1989Am J Cardiol 1989;64:1405-7.

70. Tsueda K, Debrand M, Zeok SS, Wright BD, Griffin WO. Obe-sity supine death syndrome: reports of two morbidly obesepatients. Anesth Analg 1979Anesth Analg 1979;58:345-7.

71. Kinney EL. Causes of false-negative auscultation of regurgi-tant lesions: a doppler echocardiographic study of 294patients. J Gen Intern Med 1988J Gen Intern Med 1988;3:429-34.

72. Shub C, Klein AL, Zachariah PK, Bailey KR, Tajik AJ. Determi-nation of left ventricular mass by echocardiography in anormal population: effect of age and Sex in addition tobody size. Mayo Clin Proc 1994Mayo Clin Proc 1994;69:205-11.

73. Ansari A. Transesophageal echocardiography. Indian HeartIndian HeartJ 1993J 1993;45:227-58.

74. Matsuzaki M, Kusukawa R. [Clinical applications of trans-esophageal echocardiography, abstract]. Rinsho ByoriRinsho Byori19901990;38:626-36.

75. Agarwal N, Shibutani KJ, SanFilippo JA, Del Guercio LRM.Hemodynamic and respiratory changes in surgery of themorbidly obese. Surgery 1982Surgery 1982;92:226-34.

76. Alpert MA, Lambert CR, Terry BE, et al. Influence of left ven-tricular mass on left ventricular diastolic filling in normoten-sive morbidly obesity. Am Heart J 1995Am Heart J 1995;130:1068-73.

77. Alauddin A, Meterissian S, Lisbona R, MacLean LD, Forse RA.Assessment of cardiac function in patients who were mor-bidly obese. Surgery 1990Surgery 1990;108:809-20.

78. Alpert MA, Singh A, Terry BE. Effect of exercise on left ven-tricular function and reserve in morbid obesity. Am J CardiAm J Cardi--ol 1989ol 1989;63:1478-82.

79. Ferraro S, Perrone-Filardi P, Desiderio A, et al. Left ventricu-lar systolic and diastolic function in severe obesity: aradionuclide study. Cardiology 1996Cardiology 1996;87:347-53.

80. Berkalp B, Cesur V, Corapcioglu D, Erol C, Baskal N. Obesi-ty and left ventricular diastolic dysfunction. Int J CardiolInt J Cardiol19951995;52:23-6.

81. Kono Y, Yoshinaga M, Oku S, Nomura Y, Nakamura M,Aihoshi S. Effect of obesity on echocardiographic parame-ters in children. Int J Cardiol 1994Int J Cardiol 1994;46:7-13.

82. Rifkin RD, Isner JM, Carter BL, Bankoff MS. Combined pos-teroanterior subepicardial fat simulating the echocardio-graphic diagnosis of pericardial effusion. J Am Coll CardiolJ Am Coll Cardiol19841984;3:1333-9.

83. Abergel E, Tase M, Menard J, Chatellier G. Influence ofobesity on the diagnostic value of electrocardiographic cri-teria for detecting left ventricular hypertrophy. Am J CardiAm J Cardi--ol 1996ol 1996;77:739-44.

84. Levy D, Labib SB, Anderson KM, Christiansen JC, Kannel WB,Castelli WP. Determinants of sensitivity and specificity ofelectrocardiographic criteria for left ventricular hypertro-phy. Circulation 1990Circulation 1990;81:815-20.

85. Okin PM, Roman MJ, Devereux RB, Kligfield P. ECG identifi-cation of left ventricular hypertrophy. Relationship of testperformance to body habitus. J ElectrocardiolJ Electrocardiol19961996;29(Suppl):256-61.

86. Okin PM, Jern S, Devereux RB, Kjeldsen SE, Dahlöf B, for theLIFE Study Group. Effect of obesity on electrocardiographicleft ventricular hypertrophy in hypertensive patients. TheLosartan Intervention for endpoint (LIFE) Reduction in Hyper-tension Study. Hypertension 2000Hypertension 2000;35:13-18.

87. Rautaharju PM, Manolio TA, Siscovick D, Zhou SH, GardinJM, Kronmal R, Furberg CD, Borhani NO, Newman A. Utilityof new electrocardiographic models for left ventricularmass in older adults. The Cardiovascular Health Study Col-laborative Research Group. Hypertension 1996Hypertension 1996;28:8-15.

88. Rautaharju PM, Zhou SH, Park LP. Improved ECG models forleft ventricular mass adjusted for body size, with specificalgorithms for normal conduction, bundle branch blocks,and old myocardial infarction. J ElectrocardiolJ Electrocardiol19961996;29(Suppl):261-9.

89. Alpert MA, Terry BE, Cohen MV, Fan TM, Painter JÁ, MasseyCV. The electrocardiogram in morbid obesity. ChestChest20002000;117:657-61.

90. Nath A, Alpert MA, Terry BE, Kelly DL. Sensitivity and speci-ficity of electrocardiographic criteria for left and right ven-tricular hypertrophy in morbid obesity. Am J CardiolAm J Cardiol19881988;62:126-30.

91. Frank S, Colliver JA, Frank A. The electrocardiogram in obe-sity: statistical analysis of 1,029 patients. J Am Coll CardiolJ Am Coll Cardiol19861986;7:295-299.

92. Shalom FM, Santora LJ, Iseri LT, Henry WL. Electrocardio-gram observations before, during and after rapid weightloss in morbidly obese subjects. Circulation 1981Circulation 1981;64:81.

93. Messerli FH, Nunez BD, Ventura HO, Snyder DW. Weight andsudden death: increased ventricular ectopy in cardiopathyof obesity. Arch Intern Med 1987Arch Intern Med 1987;147:1725-8.

94. Alexander JK. Obesity and cardiac performance. Am J CarAm J Car--diol 1964diol 1964;14:860-5.

95. Zanella MT. Obesidade e anormalidades cardiovasculares.In: ObesidadeObesidade, Lemos Editorial, 1a edição, São Paulo, 171-180, 1998.

96. Hubert HB, Feinleib M, McNamara PM, Castelli WB. Obesityas na independent risk factor for cardiovascular disease: a26-year follow-up of participants in the Framingham HeartStudy. Circulation 1983Circulation 1983;67:968-77.

97. Villares SM, Mancini MC, Gomez S, Charf AM, Frazzato E,Halpern A. Associação entre polimorfismo Gln27Glu doreceptor beta2-adrenérgico e hipertensão arterial sistêmi-ca em obesos mórbidos. Arq Bras Endocrinol MetabArq Bras Endocrinol Metab20002000;44:72-80.

98. Mikhail N, Golub MS, Tuck ML. Obesity and hypertension.Prog Cardiovasc Dis 1999Prog Cardiovasc Dis 1999;42:39-58.

99. Kasiske BI, Crosson JT. Renal disease in patients with mas-sive obesity. Arch Intern Med 1986Arch Intern Med 1986;146:1105-1109.

100.Alpert MA, Terry BE, Lambert CR, et al. Factors influencingleft ventricular systolic function in nonhypertensive morbidly

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

606 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Page 24: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

obese patients, and effect of weight loss induced by gas-troplasty. Am J Cardiol 1993Am J Cardiol 1993;71:733-7.

101.Alpert MA, Lambert CR, Panayiotou H, et al. Relation ofduration of morbid obesity to left ventricular mass, systolicfunction, and diastolic filling, and effect of weight loss. AmAmJ Cardiol 1995J Cardiol 1995;76:1194-7.

102.Alpert MA, Lambert CR, Terry BE, et al. Interrelationship ofleft ventricular mass, systolic function and diastolic filling innormotensive morbidly obese patients. Int J ObesInt J Obes19951995;19:550-7.

103.Gottdiener JS, Reda DJ, Materson BJ, Massie BM, Notardia-como A, Hamburger RJ, Williams DW, Henderson WG.Importance of obesity, race and age to the cardiac stru-tural and functional effects of hypertension. The Depart-ment of Veterans Affairs Cooperative Study Group on Anti-hypertensive Agents. J Am Coll Cardiol 1994J Am Coll Cardiol 1994;24:1492-8.

104.Himeno E, Nishino K, Nakashima Y, Kuroiwa A, Ikeda M.Weight reduction regresses left ventricular mass regardlessof blood pressure level in obese subjects. Am Heart JAm Heart J19961996;131:313-9.

105.Stevens VJ, Obarzanek E, Cook NR, Lee I-M, Appel LJ; WestDS, et al, for the Trials of Hypertension Prevention ResearchGroup. Long-term weight loss and changes in blood pres-sure: results of the trials of hypertension prevention, phase II.Ann Intern Med 2001Ann Intern Med 2001;134:1-11.

106.Matsuzawa Y, Shimomura I, Nakamura T, Keno Y, Kotani K,Tokunaga K. Pathophysiology and pathogenesis of visceralfat obesity. Obes Res 1995Obes Res 1995;3(Suppl 2):187S-194S.

107.Manson JE, Colditz GA, Stampler MJ, Willet MC, Rosner B,Manson RR, Speizer FE, Henneckens CH. A prospectivestudy of obesity and risk of coronary heart disease inwomen. N Engl J Med 1990N Engl J Med 1990;322:822-9.

108.Bharati S, Lev M. Cardiac conduction system “involvement”in sudden death of obese young people. Am Heart JAm Heart J19951995;129:273-81.

109.Valenzi P, Thi BN, Lormeau B, Paries J, Attali JR. Cardiacautonomic function in obese patients. Int J ObesInt J Obes19951995;19:113-8.

110.Vila P, Valles J, Canet J, Melero A, Vidal F. Acid aspirationprophylaxis in morbidly obese patients: famotidine vs. rani-tidine. Anaesthesia 1991Anaesthesia 1991;46:967-9.

111.Jupiter JB, Ring D, Rosen H. The complications and difficul-ties of management of nonunion in the severely obese. JJOrthopaed Trauma 1995Orthopaed Trauma 1995;9:363-70.

112.Barkun NA, Camus M, Meagher T, Green L, Coupal L,DeStempel J, Grover SA. Splenic enlargement and Traube’sspace: how useful is percussion? Am J Med 1989Am J Med 1989;87:562-6.

113.Shmulewitz A, Teefey SA, Robinson BS. Factors affectingimage quality and diagnostic efficacy in abdominalsonography: a prospective study of 140 patients. J ClinJ ClinUltrasound 1993Ultrasound 1993;21:623-30.

114.Ochs A, Sommer B, Wenz W, Farthmann EH, Schafer HE,Scholmerich J. [Clinical value of ultrasonography and com-puterized tomography prior to abdominal interventions -abstract]. Medizinische Klinik 1991Medizinische Klinik 1991;86:617-22.

115.Haberkorn U, Rudat V, Layer G, Zuna I, Lorenz A, VanKaickG. [Influence of abdominal wall composition and thicknesson ultrasound B scan – abstract]. Rofo Fortschr Geb RontRofo Fortschr Geb Ront--genstr Neuen Bildgeb Verfahr 1991genstr Neuen Bildgeb Verfahr 1991;155:327-31.

116.Wildgrube HJ, Dehwald H. [Value of gray scale analysis forthe assessment of ultrasound detected structures in thearea of the abdomen]. Bildgebung 1990Bildgebung 1990;57:11-6.

117.Kaplan DS, Heisig DG, Roy AK, Wojtowycz AR, Spirt BA.Endoscopic ultrasound in the morbidly obese patient: anew indication. Am J Gastroenterol 1993Am J Gastroenterol 1993;88:593-4.

118.Iughetti L, Bacchini E, Doti I, Bianchi A, Caselli G, Cozzini A,Ottaviani A, Bernasconi S. [Liver damage and obesity inpediatric age]. Pediatr Med Chir 1996Pediatr Med Chir 1996;18:57-9.

119.Ochs A, Rottler RM, Scholmerich J. Clinical relevance ofabdominal liver findings with ultrasound. HepatogastroenHepatogastroen--terology 1994terology 1994;41:9-15.

120.Silidker MS, Cronan JJ, Scola FH, Moore MM, Schepps B,Thompson W, Dorfman GS. Ultrasound evaluation ofcholelithiasis in the morbidly obese. Gastrointest RadiolGastrointest Radiol19881988;13:345-6.

121.Deutinger J, Dadak C, Forstinger C, Laczika K. Vagi-nosonographically guided paracentesis in a woman withsevere thrombocytopenia. Arch Gynecol ObstetrArch Gynecol Obstetr19931993;253:149-51.

122.Vaughan RW, Bauer S, Wise L. Volume and pH of gastricjuice in obese patients. Anesthesiology 1975Anesthesiology 1975;43:686-9.

123.Powell E, Cooksley G, Hanson R, Searle J, Halliday J, PowellL. The natural history of nonalcoholic steatohepatitis: a fol-low-up study of forty-two patients up to 21 years. HepatolHepatol--ogy 1990ogy 1990;11:74-80.

124.Luyckx F, Desaive C, Thiry A, et al. Liver abnormalities inseverely obese subjects: effect of drastic weight loss aftergastroplasty. Int J Obes 1998Int J Obes 1998;22:222-6.

125.Amaral J, Thompson W. Gallblader disease in the morbidlyobese. Am J Surg 1985Am J Surg 1985;149:551-7.

126.Stampfer M, Maclure K, Colditz G, Manson J, Willet W. Riskof symptomatic gallstones in women with severe obesity.Am J Clin Nutr 1992Am J Clin Nutr 1992;55:652-8.

127.Yang H, Petersen GM, Roth MP, Schoenfield LJ, Marks JW.Risk factors for gallstone formation during rapid loss ofweight. Dig Dis Sci 1997Dig Dis Sci 1997;37:912-8.

128.Gebhard RL, Prigge WF, Ansel HJ, Schlasner L, Ketover SR,Sande D, Holtmeier K, Peterson FJ. The role of gallbladderemptying in gallstone formation during diet-induced rapidweight loss. Hepatology 1996Hepatology 1996;24:544-8.

129.Giovannucci E, Ascherio A, Rimm EB, Colditz GA, StampferMJ, Willett WC. Physical activity, obesity, and risk of coloncancer and adenoma in men. Ann Intern MedAnn Intern Med19951995;122:327-34.

130.Giovannucci E, Colditz GA, Stampfer MJ, Willett WC. Physi-cal activity, obesity, and risk of colon cancer and adeno-ma in women. Cancer Causes Control 1996Cancer Causes Control 1996;7:253-63.

131.Emamian SA, Nielsen MB, Pedersen JF, Ytte L. Sonographicevaluation of renal appearance in 665 adult volunteers.Correlation with age and obesity. Acta Radiol 1993Acta Radiol 1993;34:482-5.

132.Webb JÁ, Murray A, Bary PR, Hendry WF. The accuracy andlimitations of ultrasound in the assessment of venous exten-sion in renal carcinoma. Br J Urol 1987Br J Urol 1987;60:14-7.

133.Giblin JG, Lossef S, Pahira JJ. A modification of standardpercutaneous nephrolithotripsy technique for the morbidlyobese patient. Urology 1995Urology 1995;46:491-3.

134.Kiely EA, Madigan D, Ryan PC, Butler MR. Ultrasonic imag-ing for extracorporeal shockwave lithotripsy: analysis of fac-

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

607Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001

Page 25: Obstáculos Diagnósticos e Desafios perspectivas ... · soal e à extensa gama de complicações clínicas que inci-dem nesses pacientes (6). ... cor pulmonale; doença cerebrovascular;

tors in successful treatment. Br J Urol 1990Br J Urol 1990;66:127-31.

135.Grasso M, Lang G, Taylor FC. Flexible ureteroscopicallyassisted percutaneous renal access. Tech Urol 1995Tech Urol 1995;1:39-43.

136.Field NT, Piper JM, Langer O. The effect of maternal obesi-ty on the accuracy of fetal weight estimation. ObstetObstetGynecol 1995Gynecol 1995;86:102-7.

137.Euans DW, Connor PD, Hahn RG, Rodney WM, Arheart KL. Acomparison of manual and ultrasound measurements offundal height. J Fam Pract 1995J Fam Pract 1995;40:233-6.

138.Wolfe HM, Sokol RJ, Martier SM, Zador IE. Maternal obesity:a potential source of error in sonographic prenatal diagno-sis. Obstet Gynecol 1990Obstet Gynecol 1990;76(3 Pt 1):339-42.

139.Martin GR, Ruckman RN. Fetal echocardiography: a largeclinical experience and follow-up. J Am Soc EchocardiogrJ Am Soc Echocardiogr19901990;3:4-8.

140.Allan LD, Chita SK, Sharland GK, Fagg NL, Anderson RH,Crawford DC. The accuracy of fetal echocardiography inthe diagnosis of congenital heart disease. Int J CardiolInt J Cardiol19891989;25:279-88.

141.Ottesen M, Rose M. Giant ovarian tumor masked by obesi-ty. Acta Obstet Gynecol Scand 1994Acta Obstet Gynecol Scand 1994;73:349-51.

142.Voss SC, Lacey CG, Pupkin M, Degefu S. Ultrasound andthe pelvic mass. J Reprod Med 1983J Reprod Med 1983;28:833-7.

143.Freimanis MG, Jones AF. Transvaginal ultrasonography.Radiol Clin North Am 1992Radiol Clin North Am 1992;30:955-76.

144.Curry C, Thomas S, Dowdey JE, Murry RC. Christensen’sChristensen’sPhysics of Diagnostic RadiologyPhysics of Diagnostic Radiology, 4th edition, Malvern, Penn-sylvania, 1990.

145.Wallace DH, Currie JM, Gilstrap LC, Santos R. Indirect sono-graphic guidance for epidural anesthesia in obese preg-nant patients. Reg Anesth 1992Reg Anesth 1992;17:233-6.

146.Qasho R, Ramundo OE, Maraglino C, Lunardi P, Ricci G.Epidural lipomatosis with lumbar radiculopathy in oneobese patient. Case report and review of the literature.Neurosurg Rev 1997Neurosurg Rev 1997;20:206-9.

147.Preul MC, Leblanc R, Tampieri D, Robitaille Y, Pokrupa R.Spinal angiolipomas. Report of three cases. J NeurosurgJ Neurosurg19931993;78:280-6.

148.Tanaka T, Matsuo N, Ishikura H, Takagi D, Takeyama N.Adrenal myelolipoma: a case report and review of the liter-ature. Jpn J Surg 1989Jpn J Surg 1989;19:597-606.

149.Olivier CM, Carballido JA. [Myelolipoma of the adrenalgland: preoperative diagnostic approach]. Actas Urol EspActas Urol Esp19891989;13:155-60.

150.Cheymol G. Clinical pharmacokinetics of drugs in obesity:an update. Clin Pharmacokinet 1993Clin Pharmacokinet 1993;25:103-14.

151.Abernethy DR, Greenblatt DJ. Drug disposition in obesehumans. Clin Pharmacokinet 1986Clin Pharmacokinet 1986;11:199-213.

152.Petti S, Cairella G, Tarsitani G. Childhood obesity: a risk fac-tor for traumatic injuries to anterior teeth. Endod Dent TrauEndod Dent Trau--matol 1997matol 1997;13:285-8.

153.Boulanger BR, Milzman D, Mitchell K, Rodriguez A. Bodyhabitus as a predictor of injury pattern after blunt trauma. JJTrauma 1992Trauma 1992;33:228-32.

154.Damschen DD, Landercasper J, Cogbill TH, Stolee RT.Acute traumatic abdominal hernia: case reports. J TraumaJ Trauma19941994;36:273-6.

155.Jacka MJ, Luison F. Delayed presentation of traumaticparasternal lung hernia. Ann Thorac Surg 1998Ann Thorac Surg 1998;65:1150-1.

156.Beck LA. Morbid obesity and spinal cord injury: a casestudy. S C I Nurs 1998S C I Nurs 1998;15:3-5.

157.Robinovitch SN, McMahon TA, Hayes WC. Force attenua-tion in trochanteric soft tissues during impact of a fall. JJOrthop Res 1995Orthop Res 1995;13:956-62.

158.Savolaine ER, Ebraheim NA, Rusin JJ, Jackson WT. Limita-tions of radiography and computed tomography in thediagnosis of transverse sacral fracture from a high fall. Acase report. Clin Orthop 1991Clin Orthop 1991;272:122-6.

Endereço para correspondência:Endereço para correspondência:

Marcio Corrêa ManciniHospital das Clínicas da FMUSPSecretaria do Serviço de Clínica Médica de Emergência, 1ªCaixa Postal 809105403-0900 São Paulo

Desafios Diagnósticos e Terapêuticos no ObesoMancini

608 Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 6 Dezembro 2001