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Óculos escuros - Além do que se vê

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DESCRIPTION

Expondo uma realidade que aos poucos se interliga por meio dos olhos de um misterioso narrador oculto, Óculos Escuros escancara a sociedade contemporânea onde as relações humanas são constantes, mas também superficiais. Mas e se por um único momento fosse possível retirar nossos óculos, nossas proteções? O que veríamos? Conseguiríamos nos livrar do pesado incômodo de carregarmos na face um objeto estranho ou, ao enxergarmos pela primeira vez, correríamos de volta ao lugar seguro onde podemos descansar nosso olhar despercebidamente? A resposta está mais clara do que se imagina. Basta virar a primeira página e começar a leitura. Sem óculos escuros, por favor. Pode ser que as lentes atrapalhem a enxergar a realidade que sempre esteve, e está, diante dos olhos!

Text of Óculos escuros - Além do que se vê

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  • Coordenao Editorial Silvia Segvia

    Diagramao Abreus System

    Capa Monalisa Morato

    Preparao de Texto Andrea Bassoto

    Reviso Gleice Couto

    2014IMPRESSO NO BRASIL

    PRINTED IN BRAZILDIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIO

    NOVO SCULO EDITORA LTDA.CEA Centro Empresarial Araguaia II

    Alameda Araguaia, 2190 11 andarBloco A Conjunto 1111

    CEP 06455-000 Alphaville Industrial SPTel. (11) 3699-7107 Fax (11) 3699-7323

    [email protected]

    Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortogrfico da Lngua Portuguesa (Decreto Legislativo n 54, de 1995)

    copyright 2014 by Vincius Figueiredo Costa

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Costa, Vincius Figueiredoculos escuros / Vincius Figueiredo Costa. Barueri, SP: Novo

    Sculo Editora, 2014.(Coleo talentos da literatura brasileira)

    1. Fico brasileira I. Ttulo.

    14-03649 CDD-869.93

    ndices para catlogo sistemtico:1. Fico : Literatura brasileira 869.93

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  • minha me, Mrcia.Com eterno carinho.

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  • Agradecimentos

    Em especial a Dani e aos primeiros amigos que dispu-seram de seu tempo para ler a obra: Ana Lcia, Alexandre, Brbara, Rafael, Rafaella e Saulo. Obrigado pela amizade.

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  • 9Apresentao

    Os antagonismos irresolvidos da realidade retornam nas obras de arte como problemas iminentes da sua forma.

    A partir da epgrafe de Adorno, a obra culos Escu-ros faz uma refl exo sobre a sociedade contempornea nas grandes cidades. Apesar do tumulto e do excesso de pessoas nos grandes centros, o vazio existencial permeia a vida de mui-tos, que se enxergam isolados no meio da multido. Como caracterstica social, as pessoas habituaram-se a usar as negras lentes que do ttulo obra. Servindo mais para esconder as caractersticas humanas do que para a proteo contra a ilu-minao solar, os culos escuros funcionam como a metfora social da distopia contada. Por este escopo, a obra narra a histria de um homem desconhecido e no apresentado , que por retirar os seus culos escuros consegue enxergar as pessoas no meio de um centro urbano. A partir de tal viso narrado o dia a dia das seis primeiras pessoas que o homem sem culos enxerga, mostrando o que levou ao literal e me-tafrico uso dos culos escuros naquele dia. Neste contexto,

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    o livro mostra as histrias contadas de uma forma interligada e surpreendente, j que, apesar do aparente isolamento das cidades e das pessoas atravs da impessoalidade dos culos escuros h como imperativo social o relacionamento entre os seres. Como caracterstica estilstica, culos Escuros al-terna sutilmente as narraes entre terceira pessoa e primeira pessoa, provocando uma escalada de suspense medida que as histria se cruzam e a curiosidade de saber sobre o stimo personagem da histria, ou seja, o narrador sem culos escu-ros. Mistrio este s revelado ao fi nal da obra, (re)signifi cando toda a leitura.

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  • Sumrio

    PRLOGOA Sociedade dos culos Escuros

    PARTE 1Nova

    1. A Jovem de Vinte e Poucos Anos 19 2. O Homem de Terno 24 3. O Outro Homem de Terno 29 4. O Sbio que Sabia 34 5. O Antigo Professor 41 6. A Famlia de culos Escuros 45

    PARTE 2Crescente

    7. O Sbio que Sabia 53 8. A Jovem de Vinte e Poucos Anos 58 9. A Famlia de culos Escuros 6310. O Antigo Professor 6811. O Homem de Terno 7112. O Outro Homem de Terno 77

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  • PARTE 3Cheia

    13. O Homem de Terno 8514. O Outro Homem de Terno 9115. A Jovem de Vinte e Poucos Anos 9716. O Antigo Professor 10217. A Famlia de culos Escuros 10718. O Sbio que Sabia 112

    PARTE 4Minguante

    19. O Outro Homem de Terno 12120. O Antigo Professor 12721. O Sbio que Sabia 13422. A Famlia de culos Escuros 13723. O Homem de Terno 14424. A Jovem de Vinte e Poucos Anos 149

    EPLOGOO Observador dos culos Escuros

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  • Os antagonismos irresolvidos da realidade retornam nas obras de arte como problemas iminentes da sua forma.

    Th eodor Adorno

    Na sociedade dos culos Escuros os homens se relacionam, mas ningum v ningum.

    Somos, todos, propositalmente cegos.

    Ivin Tirsias Bartimeu

    Sobre aquilo de queno se pode falar, deve-se calar.

    Ludwig Wittgenstein

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  • PRLOGO

    A Sociedade dosculos Escuros

    Eu andava na rua. No sei se andava ou parado assistia ao movimento da cidade. A sociedade dos culos escuros era r-pida. Uma mulher loira passava rpida e chorosa. Passou. Outra mulher caminhava no sentido inverso. Reparei. A jovem de vinte e poucos anos usava culos escuros. Grandes. Bem maiores do que seus olhos. Quer dizer, no vi seus olhos, apenas imaginei.

    Vi um homem de terno. Vi outro homem de terno. Ansiei pelo encontro dos dois. Discretos, seus culos escuros eram fi rmes. Aros fortes. Intransponveis pela escurido da lente. Os homens cumprimentaram-se. Andavam em sentidos opostos. Apertaram as mos. Foram embora sorrindo apenas com a parte inferior dos lbios na despedida. O barulho de uma sirene me fez virar repen-tinamente a cabea.

    Avistei uma famlia. O pai e a me usavam culos escuros. Curioso... O fi lho de sete anos tambm. O menino tinha culos escuros azuis. Ainda no eram pretos iguais aos dos pais, mas o

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    garoto usava. Ou melhor, estava aprendendo a usar. Aquela lente, de alguma maneira, incomodava a criana. Sempre caa do seu rosto. Seus pais, no entanto, a todo o momento recolocavam os pequenos culos azulados na face do pequenino. Deviam servir para proteger da intensidade da luz...

    Um senhor de idade passava do outro lado da rua. Era de grau, mas o homem tambm usava culos escuros. O moo-velho me parecia experiente. Talvez um sbio que sabia. No sei. Seus culos escuros tamparam sua fi sionomia. No o vi mais.

    Em um relance de olhar avistei um professor antigo de co-lgio no ponto de nibus. Assoviei. Um txi parou. O professor entrou no txi estacionado, acredito, pelo meu assovio. Ao entrar no txi, seus culos escuros despencaram de sua face. Ele me viu. Acostumado com seus protetores negros, que lhe difi cultavam a vi-so, creio que fi ngiu que no me viu. No queria ser incomodado. Apanhou os culos escuros e os recolocou. O txi arrancou.

    Algum, por fi m, chamou-me com uma voz suave que vi-nha por trs dos meus ombros. No sei o porqu, mas me sen-ti estranhamente emocionado. Virei-me e a vi. Era a garota dos grandes culos escuros. Retirando seus culos, perguntou se naque-le ponto passava a linha que seguia toda a avenida. Sorri e disse que sim. Tambm subiria a avenida. O nibus se aproximou e com difi culdade adentrei. Ela no subiu. Botou seus grandes cu-los escuros e disse que esperaria o prximo. Fez apenas um sinal querendo dizer que o nibus estava cheio. Na lotao, lembrara que havia visto os olhos da mulher. Eram belos. Lembrei-me dos seus culos escuros. Eram grandes. Desci do nibus. Andei pela rua. Suspirei pela moa que vira. Vesti os meus culos escuros....

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  • PARTE 1

    Nova

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  • 11A Jovem de

    Vinte e Poucos Anos

    A linda menina na foto usava um vestido amarelo de bolas laranja. Bem antigo, possivelmente uma he-rana da famlia de sua me ou at mesmo de sua av. A roupa era suave como o rosto, j em tom spia, da criana na imagem. Um lao prendia o dourado vestido, que era to brilhante como a fi ta rsea que enlaava os cabelos cheios da criana. O sorriso doce na face combinava perfeitamente com o olhar vibrante e esbugalhado da garota. Com menos de um metro e meio, a doce menina sorria com um pequeno dente na mo que, segurado fi rmemente, era mostrado para a cmera. O lateral ausente no canto da boca no incomodava a jovem, que parecia divertir-se com o espao vazio entre seus lbios. Os lisos joelhos dobravam-se para dentro e pareciam querer se

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    encontrar mediante o largo sorriso da pequena. Aquela foto bem protegida pelo porta-retrato j havia envelhecido nas bor-das, mas a face daquela linda menina, no canto superior direi-to do retrato, continuava em destaque, encantando qualquer ser que olhasse aquela imagem.

    Luana observava-se na foto sentindo uma imensa sau-dade de seu tempo de criana. Seu sorriso no era mais o mesmo. Nem seus olhos. A jovem ainda guardava o vestido daquela foto como lembrana da infncia. O lao, que antes prendia o cabelo, estava em algum canto do guarda-roupa, mas j no era to rosado devido ao desbotamento. Objetos e memria eram apenas fragmentos de um tempo que volta e meia preenchiam o corao da Jovem de Vinte e Poucos Anos.

    Os primeiros raios solares do dia j clareavam aquela manh de quarta-feira, mas Luana no tinha, ainda, tido co-ragem de levantar-se e cumprir sua rotina. Deitada em sua cama, localizada estrategicamente ao lado da parede para que a jovem pudesse amparar-se em caso de acidentes noturnos, a garota teve difi culdade de mover seu corpo, apesar de sua mente ter despertado ansiosamente.

    Em suas refl exes, a faculdade de Direito, que cursava desde os 18 anos, no fazia mais sentido como antes. A so-nhadora menina da Justia se tornara a pragmtica conhece-dora das leis. As esperanas da colegial em relao profi sso eram bem diferentes da realidade que enfrentava. O sentido, h tempo, sentia-se de sentir.

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    A preguia dominava a garota, mas no havia jeito. Necessitava levantar-se. Levantou-se. As quatro paredes de seu quarto pareciam espremer seu corpo. Resolveu sair da-quele ambiente e ir ao banheiro. Escovou os dentes. Lavou o rosto. Tomou um banho. Voltou para o quarto e deitou-se outra vez, j cansada de toda aquela movimentao rotineira diuturna. Parara mais uma vez ali, a fi tar a foto do velho vestido e a deixar seu pensamento vaguear pelas memrias da infncia.

    O smartphone, localizado na escrivaninha ao lado da cama do pequeno quarto, vibrou, soltando as primeiras notas de Creep, da banda Radiohead, que embalava as chamadas da garota, despertando a jovem do transe que a saudade havia lhe proporcionado. Luana esperou, como de costume, a voz de Th om Yorke comear a melodia com seu verso inicial When you were here before... para atender a chamada.

    O localizador do celular j mostrava a foto que Fernan-da, sua amiga e parceira de faculdade, usava no Facebook. A garota loira do outro lado da linha tinha aquele hbito estranho, comum s suas colegas de turma, de tirar fotos de lado, fazendo algum sinal para a cmera. Cientes do fenme-no das redes sociais, as pessoas no mais tiravam fotos para guardarem lembranas, mas, sim, para exibindo-se iden-tifi carem-se com uma imagem falsa sobre si mesmas. Assim pelo menos pensava Luana, enquanto sua mente plasmava uma interessante rima visual, que sobrepunha a imagem de Fernanda de Luana em sua infncia que a garota acabara de examinar. Riu para si mesma pensando que aquela sua foto de criana s poderia ser mostrada para os outros no Dia das Crianas do Facebook, j que a maioria dos seus colegas consider-lam-ia ridcula.

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    A voz de Th om Yorke j embalava o fi nal da primeira es-trofe de Creep, repetindo a frase I wish I was special, youre so very special..., quando Luana percebeu que precisava aten-der ao smartphone que vibrava, agora, em sua mo. Esperou mais um segundo, no entanto, para que o cantor entoasse a primeira frase do refro But Im a creep, Im a weirdo..., para atender. Aproveitou para suspirar profundamente antes de co-mear a encarar mais um dia, j de cara com um telefonema.

    Sem ao menos um bom-dia, a menina do outro lado da linha acabara de perguntar se Luana iria aula naquela ma-nh. No controlando seus prprios lbios, Luana disse que no. Repensou. Disse que sim. Fernanda suspirou aliviada. As duas jovens deveriam apresentar um trabalho em Filosofi a do Direito. Mais precisamente, as duas discutiriam as diferenas e implicaes de dois campos da tica: o deontolgico e teleo-lgico. Luana sempre conduzia as apresentaes e sem a jovem de vinte e poucos anos, Fernanda no saberia nem problemati-zar a pergunta feita pelo orientador da disciplina que norteava o trabalho: por que devemos agir moralmente?

    Vem logo, ento! despediu-se Fernanda com certa rispidez, mesmo aps ouvir a resposta positiva da amiga de que estaria presente.

    No havia jeito. Luana levantou seu corpo. Uma tristeza dominava seu corao, causando uma angstia desconfortan-te. Havia uma forte ausncia de vida na rotina que a menina experimentava nos ltimos tempos.

    Um suspiro profundo marcou a sada da jovem de sua casa. Era hora de caminhar.

    Um grande pedao de cho.Esta foi a melhor defi nio que a mente da jovem conse-

    guiu produzir. Ao pisar na rua desanimou mais uma vez. Resta-

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    va uma ltima lembrana daquela foto de cabeceira da menina dos olhos esbugalhados. A lembrana passou como se passa re-pentinamente a sensao grandiosa de um abrao maternalmen-te fraterno, quando o menino chega machucado de uma queda de bicicleta na rua. O sol comeava a sair.Era hora de pegar na bolsa seus grandes culos escuros para encarar a realidade.

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