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I Simpósio Latino-Americano de Didática da Matemática 01 a 06 de novembro de 2016
Bonito - Mato Grosso do Sul - Brasil
OFICINA 1A - ASSOCIADA À CONFERÊNCIA 1
CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS E METODOLÓGICAS DA TEORIA DOS
CAMPOS CONCEITUAIS PARA A APRENDIZAGEM E O ENSINO DE
MATEMÁTICA
Rosinalda Aurora de Melo Teles
UFPE, Brasil
Veridiana Rezende
UNESPAR, Brasil
Resumo: Nesta oficina o objetivo principal foi abordar possíveis contribuições teóricas e
metodológicas da teoria dos campos conceituais para a aprendizagem e o ensino de matemática.
Para tanto, sob a ótica dessa teoria e das imbricações entre campos conceituais, discutiu situações
que dão sentido aos números irracionais e às fórmulas de área de figuras geométricas planas. A
análise prévia destas situações incluirá a reflexão sobre conceitos, propriedades e representações
simbólicas relacionadas aos diversos campos conceituais envolvidos. Com a intenção de discutir
possíveis teoremas em ação, falsos ou verdadeiros, que podem ser mobilizados por estudantes ao
experimentarem situações relacionadas aos números irracionais e às fórmulas de áreas de figuras
geométricas planas. Explorou antecipações de procedimentos de resolução, bem como possíveis
erros relacionados às imbricações entre campos conceituais e também a campos conceituais
específicos de cada situação analisada. A sistematização das reflexões emergidas no decorrer da
oficina deu-se a partir de resultados de algumas pesquisas, tais como Rezende (2013), Rezende e
Nogueira (2014; 2012), Teles (2010) e Teles e Bellemain (2010). Dentre os resultados produzidos
situa-se a elaboração de propostas para outras pesquisas neste tema, bem como reflexões
relacionadas às contribuições da compreensão das imbricações entre campos conceituais para a
aprendizagem e o ensino de matemática.
Palavras-chave: Ensino de Matemática. Números irracionais. Fórmulas de área e perímetro.
Introdução
Neste texto discutimos os aportes teóricos e as atividades que foram desenvolvidas
na Oficina Contribuições Teóricas e Metodológicas da Teoria dos Campos Conceituais
para a Aprendizagem e o Ensino de Matemática, associada à conferência 1 do I Simpósio
Latino-Americano de Didática da Matemática.
O principal aporte teórico das reflexões foi a Teoria dos Campos Conceituais, uma
teoria psicológica que se refere ao desenvolvimento cognitivo dos sujeitos, sobretudo
quando ligado à aprendizagem escolar e ao trabalho. Para Vergnaud (2009), um sujeito
aprende e se desenvolve em qualquer idade, inclusive na fase adulta. De acordo com este
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autor, um conceito não pode ser reduzido à sua definição. Para o estudo de um conceito são
necessários diversos outros conceitos, situações, símbolos, representações, propriedades e
teoremas interligados, formando o que o pesquisador denomina de campo conceitual.
O pesquisador atribui muita importância aos conhecimentos implícitos possíveis de
serem manifestados nas ações dos sujeitos, os quais podem ser identificados como
invariantes operatórios, que podem ser diferenciados em duas categorias: conceitos em
ação e teoremas em ação.
Um termo explorado na oficina, imbricações entre campos conceituais, é fruto do
estudo de doutoramento de Teles (2007), que investigou relações e articulações entre os
campos conceituais das grandezas, da geometria, numérico, algébrico e funcional na
matemática escolar, na formulação e no tratamento de problemas envolvendo as fórmulas
de área do retângulo, do quadrado, do paralelogramo e do triângulo. Para a autora,
Com o termo “imbricações” caracterizamos um tipo de relação em que os
campos conceituais se sobrepõem mutuamente, se articulam e a partir
dessa “interconexão dinâmica” são gerados novos significados para os
conteúdos matemáticos em foco (TELES, 2007).
De acordo com Teles (2007), as imbricações podem ser vistas sob três pontos de
vista: explicação para índices elevados de ausência de resposta; como abertura de
possibilidades de procedimentos de resolução e fonte de erros oriundos dos vários campos
conceituais.
Dados coletados e analisados por Teles (2007) e também por Rezende (2013),
embora esta última autora não utilize a expressão imbricações entre campos conceituais,
apontam que o tratamento de situações nas quais estão envolvidas fortes imbricações exige
que os sujeitos naveguem de um campo conceitual para outros e que articulem seus
conhecimentos para tratar de maneira pertinente os problemas postos. Emergem daí os
questionamentos: quais são as consequências das imbricações para o desempenho dos
alunos? Quais são as consequências das imbricações para o ensino de Matemática? Embora
não intencionemos responder neste texto estes questionamentos, propomos elementos para
reflexão nesta perspectiva.
Assim, na condução da oficina, discutimos, inicialmente, teoremas em ação
possíveis de serem mobilizados por alunos de diferentes níveis de ensino em situações
envolvendo números irracionais, tendo como referência principal os estudos de Rezende
(2013). Na sequência, discutimos a influência das imbricações entre campos conceituais
em situações envolvendo fórmulas de área de figuras geométricas planas, que tem como
principal referencial os estudos de Teles (2007). Intencionamos sistematizar e encontrar
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pontos comuns oriundos destas duas reflexões a partir de resultados de pesquisas, tais
como Rezende (2013), Rezende e Nogueira (2014; 2012), Teles (2010) e Teles e
Bellemain (2010).
Teoremas em ação mobilizados por alunos de diferentes níveis de ensino em situações
envolvendo números irracionais
Ao resolver determinada tarefa, relacionada ou não ao contexto escolar, os
sujeitos mobilizam diversos conhecimentos que muitas vezes não são possíveis de serem
explicitados. Vergnaud (2003) atribui muita importância a este tipo de conhecimento,
implícito, pois, para Vergnaud, não é apenas a resolução de um problema pelos sujeitos
que interessa, mas sim o modo como eles resolvem e, principalmente, os conhecimentos
implícitos mobilizados por eles ao resolver um problema.
De acordo com Vergnaud (2009), é difícil para uma criança explicitar suas
competências em palavras, e, apesar de certa experiência em determinadas situações,
muitos adultos também não conseguem explicitar verbalmente boa parte dos
conhecimentos que utilizam na ação. É nesse sentido que Vergnaud introduz o conceito de
invariante operatório, e o define como os conhecimentos que um sujeito dispõe, na ação,
para resolver determinada situação.
Os invariantes operatórios são diferenciados em duas categorias: conceitos em ação
e teoremas em ação: “Um conceito em ação é um conceito considerado pertinente na ação.
Um teorema em ação é uma proposição tida como verdadeira na ação” (VERGNAUD,
2009, p.23). Os conceitos em ação e os teoremas em ação são de naturezas distintas. Os
primeiros não são passíveis de serem verdadeiros ou falsos, eles apenas são pertinentes ou
não para a situação. Já os teoremas em ação podem ser verdadeiros ou falsos, e a
desestabilização de teoremas em ação falsos pode ser fonte de aprendizagem para o aluno.
Por esse motivo, a escolha das situações apresentadas aos alunos deve ocorrer, sempre que
possível, com a intenção de propiciar reflexões, hesitações e desestabilização de
conhecimentos equivocados dos alunos, de modo a proporcionar avanços e aprendizagens
aos alunos.
Identificar um teorema em ação nas respostas dos sujeitos nem sempre é uma tarefa
fácil para o pesquisador e para o professor. Para que isto aconteça, é preciso que seja
realizada uma análise cautelosa de respostas de diversos sujeitos, frente a várias situações,
para que com muita cautela o pesquisador, ou o professor, possa indicar possibilidades de
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teoremas ação mobilizados nas respostas dos sujeitos. Consideramos importante a
identificação de possíveis teoremas em ação mobilizados por alunos relacionados a
determinados conceitos matemáticos para que estas categorias de pensamento possam ser
divulgadas para outros professores, de modo que eles possam preparar suas aulas levando
em consideração estes conhecimentos que serão manifestados por seus alunos, diante de
determinadas tarefas matemáticas.
Com o respaldo da teoria dos Campos Conceituais, tanto para elaboração do
instrumento diagnóstico quanto para as análises de conhecimentos implícitos dos sujeitos
de sua pesquisa, Rezende (2013) desenvolveu sua tese de doutoramento com o objetivo de
analisar os conhecimentos mobilizados por alunos brasileiros, que finalizam o Ensino
Fundamental, Médio e Licenciatura em Matemática, e por alunos franceses de níveis de
ensino correspondentes, Collège, Lycée e Licenciatura em Matemática, em tarefas
matemáticas envolvendo números irracionais. A coleta de dados ocorreu pode meio de
entrevistas individuais, que foram filmadas, com tarefas matemáticas previamente
elaboradas para 42 alunos resolverem.
Para a realização de sua pesquisa, Rezende (2013) realizou diversos estudos,
incluindo estudos históricos e epistemológicos a respeito dos números irracionais,
documentos curriculares, livros didáticos, ementas de disciplinas escolares que envolvem
números irracionais (Educação Básica e Cursos de Licenciatura em Matemática). Com
estes estudos, a pesquisadora percebeu que a compreensão dos números irracionais está
relacionada ao conjunto das situações que envolvem equações algébricas de grau maior ou
igual a 2, representação decimal dos números irracionais, números racionais, conceitos de
infinito, potências, raízes (quadradas, cúbicas etc.), teorema de Pitágoras, medidas de
segmentos, figuras geométricas (quadrado, círculo etc.), entre outras, além dos diferentes
símbolos, propriedades, teoremas e formas de se representar um número irracional, o que
sob a ótica de Teles (2007) poderia ser considerado imbricações entre campos conceituais.
Para a elaboração das situações presentes no diagnóstico de pesquisa, Rezende
(2013) considerou diversos conceitos, símbolos, teoremas, propriedades e situações
presentes no campo conceitual dos números irracionais. O instrumento de pesquisa
consistiu de nove tarefas elaboradas com nível de dificuldade correspondente ao 9º ano do
Ensino Fundamental, que foram aplicadas a todos os sujeitos da pesquisa, e consistiu de
diversas situações, elaboradas, inicialmente, envolvendo representações simbólica
(numérica, algébrica), geométrica, gráfica e linguagem natural. Além disso, as atividades
foram elaboradas buscando contemplar dez ideias base de números irracionais:
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I.Compreender sobre as infinitas casas decimais de alguns números.
II.Compreender que alguns números podem ser representados como a razão
entre dois números inteiros e outros números não podem.
III.Diferenciar um número irracional de um número racional: saber que um
número irracional não pode ser escrito como a razão entre dois números
inteiros, e que um número irracional possui infinitas casas decimais não
periódicas.
IV.Considerar a existência de números irracionais e perceber pra quê esses
números servem.
V.Saber aplicar o teorema de Pitágoras.
VI.Aceitar a existência de segmentos de medidas Nnn , .
VII.Aceitar que a equação px 2 tem solução real, para todo Rp
(REZENDE, 2013, p.98).
Assim, considerando os estudos realizados por Rezende (2013), para esta proposta
de oficina, apresentou-se aos participantes uma das situações analisadas pela referida
pesquisadora:
a) Existe um quadrado de medida de área seja 213 cm ? Em caso positivo,
indique a medida do lado. Em caso negativo, justifique a sua resposta.
b) Considere a figura a seguir. Podemos afirmar que a área do quadrado ABCD
é 213 cm ? Em caso positivo, calcule a área do quadrado ABCD. Em caso
negativo, justifique a sua resposta.
Com a intenção de propiciar aos participantes da oficina reflexões a respeito de
antecipação de respostas de alunos de diferentes níveis de ensino diante dessa situação,
considerando erros, acertos e indicativos de teoremas em ação, falsos e verdadeiros, foi
solicitado que os participantes se organizassem em duplas ou trios para realizarem as suas
reflexões a respeito desta situação, e as registrassem numa ficha.
Na sequência, houve um momento de discussão conjunta entre todos os
participantes, conduzido pelas duas pesquisadoras ministrantes da oficina, a respeito dos
conhecimentos e possíveis respostas de serem mobilizadas por alunos de diferentes níveis
de ensino ao resolverem a situação proposta.
Para sistematizar as discussões emergidas na oficina, as pesquisadoras
apresentaram parte dos resultados da pesquisa de doutorado de Rezende (2013),
juntamente com alguns exemplos de protocolos de alunos, sujeitos da pesquisa, que
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resolveram a esta situação. Para sistematização foram apresentados aos participantes os
teoremas em ação, falsos e verdadeiros, que foram modelados por Rezende (2013), em
função das respostas e possíveis conhecimentos implícitos mobilizados pelos sujeitos da
pesquisa.
Para exemplificar parte do que foi abordado na oficina para a sistematização das
informações indicadas pelos participantes, apresentamos na sequência deste texto alguns
protocolos e fragmentos das entrevistas com os alunos, juntamente com parte das análises,
extraídos da pesquisa de Rezende (2013).
Quadro 1: Fragmento de respostas de alunos relacionados a existência ou não de um
quadrado de medida de área 213 cm
Fragmentos de respostas dos alunos TA
F2: Não, porque eu não consigo encontrar um número que vezes ele mesmo dá 13, né.
Porque 13 não tem raiz exata, né... Só se for um número quebrado. Essa eu não sei...
TAF8 e
TAF10
C1: Não, porque seria um número com vírgula e muitos dígitos... seria preciso uma régua
com muitos milímetros.
TAF8 e
TAF10
M1: Ah, é possível, mas... é complicado... (silêncio). O lado é infinito. (silêncio) Ah, eu
diria que existe... eu acho que é exato na aproximação, né?
TAF10
G6: Não! Raiz quadrada de treze é irracional. [...] Não, não existe.
TAF10
M6: Só vai existir o quadrado se 3,605551275x3,605551275 der 13 [a aluna realizou tal
multiplicação na calculadora e o resultado foi 13 e conclui que não existe].
TAF5, TAF8 e
TAF10
G3: Ah, eu não acredito não! Porque daí, o lado dele vai ter que medir 13 ... Apesar de
que 13 é um número construtível! Então, a rigor existe. [...] Então, tá, existe também
um quadrado com área
TAV4 e
TAV6
Fonte: Rezende (2013)
Após a análise das respostas de todos os sujeitos de sua pesquisa, Rezende modelou
onze teoremas em ação falsos e oito teoremas em ação verdadeiros, possíveis de serem
manifestados nas respostas dos sujeitos participantes de sua pesquisa, no que se refere à
compreensão dos números irracionais. No quadro 1, a sigla TAF corresponde a teorema em
ação falso e a sigla TAV corresponde a teorema em ação verdadeiro. Alguns TAF e TAV
que serão explorados na oficina, em função da situação proposta são:
TAF5: Se Rp não é quadrado perfeito, então p é o número decimal exibido
pelo visor da calculadora.
TAF8: Se Rp , não é quadrado perfeito, então não existe Rx tal que
px 2
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TAF10: Se Rb não é quadrado perfeito, então não existe um quadrado cuja
medida de área é bA 2cm .
TAV4: Sejam p e Rq , .2qpqp
TAV6: Se Rb então existe um quadrado de área bA
2cm
cuja medida dos lados é b cm .
No que se refere ao item a) da situação apresentada, que diz respeito à existência ou
não de um quadrado de medida de área 213 cm , onze alunos (dentre quatorze)
entrevistados do Ensino Fundamental (e Collége) responderam que não existe o quadrado
de medida de área 213 cm porque não existe um número cujo quadrado resulta em 13,
indicando a mobilização dos teoremas em ação falsos TAF8 e TAF10.
Em relação aos alunos do Ensino Médio (e Lycée), predominou respostas
relacionadas à existência de um quadrado de medida de área aproximadamente igual a
213 cm , ou alegaram a possiblidade de existir o quadrado em questão, porém, neste caso,
os alunos não souberam exprimir a medida do lado do quadrado. Segue um fragmento de
diálogo com um dos alunos do Ensino Médio, que diz respeito a medida de área
aproximadamente igual da 213 cm :
Aluno: Vai existir o quadrado. O lado mede 3,605551275... E a área vai ser 12,9999. Vai
faltar 1cm.
Pesquisadora: Então, você acha que existe o quadrado de medida de área 213 cm ?
Aluno: (Silêncio) Não existe! Eu acho que não... Porque eu não sei se tem fim (aponta
para o número 3,605551275) ou não tem fim.
Em relação aos alunos do Ensino Superior, as análises das entrevistas mostraram
avanço no desempenho dos alunos franceses, pois os cinco alunos franceses entrevistados
responderam de modo rápido e correto à questão, indicando a mobilização dos teoremas
em ação verdadeiros TAV4 e TAV6. Dentre os alunos brasileiros do Ensino Superior,
quatro, dentre os sete entrevistados, mobilizaram os TAV6 e TAV8. Rezende (2013)
percebeu nos alunos brasileiros do Ensino Superior dúvidas, equívocos e hesitações
durante as reflexões acerca da questão proposta, indicando que se tratou de uma situação
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nova para a maioria dos alunos entrevistados, sendo possível perceber momentos de
aprendizagens a cada nova situação, conforme o diálogo a seguir:
Aluno: De cara eu responderia que não, mas... eu tô desconfiado de todas as
questões (risos). Mas eu desconfio que não.
Pesquisadora: Então você acha que não existe o quadrado de área 213 cm
Aluno: Eu acho que não.
Pesquisadora: Por que você acha que não existe?
Aluno: Mas pera lá, eu posso usar a calculadora? (o aluno digita raiz de treze na
calculadora e diz) Se eu fizesse a representação deste número aqui numa reta, eu
poderia fazer um quadrado, a partir desta representação com esta medida. Dá sim.
Pesquisadora: Com estes números que aparece no visor da calculadora?
Aluno: Não, não com estes números, mas com uma representação igual a gente faz
com raiz de dois.
A influência das imbricações entre campos conceituais em situações envolvendo
fórmulas de área de figuras geométricas planas: fator de entrave e de possibilidades
De acordo com Teles e Bellemian (2010), ao olharmos fórmulas de área de figuras
geométricas planas sob a ótica das imbricações entre Campos Conceituais, podemos vê-las
como um elemento do campo conceitual das grandezas geométricas e também como um
elemento que articula vários campos conceituais. São elementos do campo das grandezas
geométricas, pois expressam relações entre comprimentos de figuras geométricas planas e,
entre outros aspectos, desempenham papel importante na aprendizagem do conceito de
área. Por outro lado, uma fórmula, enquanto representação algébrica de uma relação entre
variáveis, pressupõe aspectos algébricos e funcionais; a área de uma figura é uma
grandeza; figuras geométricas planas pertencem ao campo geométrico; o resultado obtido
por meio da aplicação de uma fórmula para calcular a área de uma figura, dada a unidade
de área, é um número resultante de operações.
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Figura 1: Elementos de diferentes campos conceituais que influenciam as fórmulas
de área de figuras geométricas planas
Ao mapear situações que conferem significado ao conceito de fórmula, Teles
(2007) identificou várias classes de usos para as fórmulas: calcular a área de figuras;
calcular comprimentos que caracterizam a figura; comparar áreas de figuras; produzir
figuras em condições dadas; estabelecer relações entre grandezas; otimizar e operar com
grandezas de mesma natureza. Como exemplo, apresentamos uma questão envolvendo
fórmula de área para comparar:
Figura 2: Exemplo do uso da fórmula para comparar áreas
Neste exemplo, o campo conceitual geométrico está relacionado à leitura e a
interpretação das figuras geométricas: retângulo e quadrado e suas propriedades; o campo
conceitual das grandezas à mobilização das fórmulas de área do retângulo e do quadrado; o
campo conceitual algébrico à modelização e manipulação simbólica das expressões
geradas pela escrita das fórmulas e o campo conceitual funcional ao papel da letra como
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variável, caracterizado inclusive pela ausência de unidades de medida na questão, que
implica em aceitar que para qualquer valor (restrito a um domínio) e para qualquer unidade
vale a relação estabelecida.
Na investigação de imbricações entre os campos conceituais das grandezas, da
geometria, numérico, algébrico e funcional na matemática escolar, na formulação e no
tratamento de problemas envolvendo as fórmulas de área do retângulo, do quadrado, do
paralelogramo e do triângulo, e especificamente ao identificar conhecimentos oriundos dos
diversos campos conceituais em foco, assim como suas imbricações no tratamento de
situações envolvendo fórmulas de área do retângulo, do quadrado, do paralelogramo e do
triângulo e mapear invariantes operatórios e representações simbólicas referentes às
fórmulas de área do retângulo, do quadrado, do paralelogramo e do triângulo subjacentes
aos procedimentos de resolução de alunos do ensino médio, Teles (2007) aponta que as
imbricações podem ser vistas sob três pontos de vista: explicação para índices elevados de
ausência de resposta; como abertura de possibilidades de procedimentos de resolução e
fonte de erros oriundos dos vários campos conceituais. Passamos a seguir a discutir cada
um destes modos de pensar as imbricações entre campos conceituais, tal como foi feito na
oficina em tela.
a) Explicação para índices elevados de ausência de resposta:
Nesta perspectiva as imbricações podem ser vista como fator de entraves,
caracterizado principalmente pela ausência de respostas, ou seja, nenhuma tentativa de
solução pelos sujeitos da pesquisa de Teles (2007), como no exemplo a seguir:
Uma região retangular tem 42 cm de perímetro e 104 cm2 de área. Quais são as dimensões
dessa região?
Esta questão foi extraída de um livro didático1, propõe o cálculo das dimensões do
retângulo em função do perímetro e da área e coloca em jogo as seguintes variáveis e seus
respectivos valores: uso da fórmula para calcular; tipo de figura - retângulo; ausência da
figura no enunciado; domínio numérico - números naturais; unidade de comprimento –
cm e de área cm2. Neste problema o campo algébrico intervém como uma ferramenta a
serviço da resolução de problemas (GARCIA, 1997), possibilitando a formulação e a
resolução desta questão por meio de equações através de regras para manipulação de
símbolos algébricos. Porém, para escrever a expressão algébrica que poderá conduzir à
1 Dante, Luiz Roberto. Tudo é Matemática. Editora Ática: São Paulo, 2002. 8ª série.
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resposta correta, é preciso também mobilizar conhecimentos do campo das grandezas
geométricas: os conceitos de área e perímetro e as relações que podem ser estabelecidas
entre eles e ainda conhecimentos do campo geométrico: propriedades do retângulo. Apesar
de ser esperado um procedimento algébrico, as análises de Teles (2007) apontam que
37,5% dos 46 alunos que responderam a questão utilizaram “procedimento numérico”,
procurando por tentativas, pares de números cujo produto seja 104 e a soma 21. Por outro
lado, além dos sujeitos que mobilizaram conhecimentos dos vários campos conceituais
para resolver a questão, Teles (2007) evidenciou um alto percentual de ausência de
respostas (quase 50% dos alunos testados) evidenciada na análise quantitativa, ao que
Teles (2007) afirma que pode ser pelo menos parcialmente explicada pela dificuldade de
mobilizar conhecimentos importantes dos campos conceituais: das grandezas, da geometria
e o da álgebra. O quadro a seguir ilustra, no universo de 46 alunos testados a quantidade de
acertos, erros e ausência de resposta:
b) Abertura de possibilidades de procedimentos de resolução:
Para ilustrar as imbricações nesta perspectiva de abertura de possibilidades de
procedimentos de resolução retomamos o exemplo proposto na Figura 2: Uso da fórmula
para comparar áreas. Ao refletirmos sobre quais seriam os conceitos matemáticos
necessários para resolvê-la corretamente? Que procedimentos poderiam ser utilizados para
resolvê-la? E quais erros os estudantes poderiam cometer? Retomamos, neste texto e na
oficina, os resultados obtidos por Teles (2007) para um grupo de 50 alunos do segundo ano
do ensino médio. Chama a atenção o percentual de acertos acima de 50% na questão,
conforme ilustrado no gráfico a seguir:
Fonte: Teles(2007)
No entanto, Teles (2007) destaca os variados procedimentos de resolução e
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justificativas adotados pelos estudantes, relacionados aos diversos campos conceituais. Por
exemplo, justificativas baseadas nas expressões algébricas, como esta a seguir:
Figura 3: Procedimento e justificativa baseada na expressão algébrica
Ou baseada num procedimento numérico como este a seguir:
Figura 4: Procedimento numérico
c) Fonte de erros oriundos dos vários campos conceituais
As imbricações entre campos conceituais como fator de entrave foi uma das
constatações mais evidenciadas no estudo de Teles (2007). Em praticamente todas as
questões utilizadas no teste diagnóstico elaborado pela autora, foi possível associar os
erros cometidos pelos sujeitos à ausência ou a mobilização de teoremas em ação falsos
relacionados aos diversos campos conceituais envolvidos.
Neste exemplo a seguir, baseado numa questão extraída de um livro didático, que
possui como variáveis e seus respectivos valores: uso da fórmula para otimizar; tipo de
figura – retângulo; figura ausente do enunciado; domínio numérico do dado é natural,
porém, resultado decimal, possui um aspecto importante, que inclui conhecimentos
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dos vários campos conceituais: “dado um perímetro fixo, o retângulo de maior área
construído com este perímetro é um quadrado”. É necessário que o aluno caracterize
geometricamente as figuras geométricas: retângulo e quadrado. Se o aluno dominar
esta propriedade, pode ir diretamente à resposta da questão dividindo 30 em 4 partes
iguais, já que o perímetro do quadrado corresponde à soma dos comprimentos dos
quatro lados e os lados do quadrado são congruentes. Neste problema, um
procedimento possível é a elaboração de uma tabela atribuindo valores numéricos às
dimensões do retângulo e o respectivo cálculo da área, como faz o aluno no protocolo
abaixo:
No entanto, não obtém a resposta correta, pois neste procedimento, embora
aparentemente estritamente numérico, o aluno precisa mobilizar conhecimentos relativos
ao conceito de área e perímetro, ou seja, é necessário compreender que a soma das medidas
dos quatro lados do retângulo é 30m, portanto o aluno precisa distribuir estes 30m em
partes iguais duas a duas, o que mobiliza um aspecto geométrico relacionado à propriedade
do retângulo e também numérico, haja vista que a divisão de 30 em partes iguais duas a
duas resulta em um número racional provavelmente expresso de forma decimal. Feito isto,
precisa mobilizar a fórmula da área do retângulo. A atribuição dos valores às variáveis
também pressupõe a análise do domínio e do contradomínio da função área.
Ainda, ao refletirmos sobre esta mesma questão proposta no teste diagnóstico por
Teles (2007), destacamos a possibilidade de serem utilizados para resolução procedimentos
geométricos; procedimentos algébricos e/ou procedimentos numéricos. Mais uma vez
refletimos que, ao mesmo tempo em que as imbricações podem possibilitar a mobilização
de diferentes procedimentos associados aos diversos campos conceituais; pode também
gerar erros relacionados aos diferentes campos. Ainda neste exemplo, Teles (2007)
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evidenciou, em protocolos de duas escolas diferentes, alunos que responderam totalmente
o teste, acertando quase 100% das questões. No entanto, se depararam com a limitação do
domínio numérico restrito aos naturais, como ilustrado na figura a seguir:
Num estudo específico envolvendo fórmulas de área para otimização, sob a ótica
das imbricações, Teles e Bellemain (2010), identificaram, nos erros cometidos pelos
alunos, fortes imbricações entre campos conceituais. Por exemplo, interpretação da figura,
relacionado ao campo geométrico, erros de confusão entre área e comprimento, ligado ao
campo das grandezas, reforçando a necessidade de trabalhar a dissociação entre área e
comprimento na abordagem do conceito de área, erro de manipulação algébrica, no campo
algébrico; erro no procedimento numérico, situado no campo numérico. Em alguns
procedimentos foi possível identificar aspectos dos vários campos, evidenciando o papel
das imbricações como entrave para resolução de determinadas situações.
O uso de fórmulas de área em problemas de otimização, está relacionada às
aplicações do conceito de máximo e de mínimo no estudo das funções, recorrente em
livros didáticos de Matemática para o último ano do Ensino Fundamental (9º ano ou 8ª
série) e para o 1º ano do Ensino Médio, conforme identificado na análise de livros
didáticos realizada por Teles (2007). Quando as fórmulas são utilizadas para otimizar, está
em jogo de maneira central o aspecto funcional, pois elas expressam relações de
dependência entre variáveis (comprimentos e área). Trata-se, por exemplo, de determinar a
maior área possível em função de um comprimento fixo.
Considerações
Tomando como ponto de partida o principal objetivo desta oficina - abordar
possíveis contribuições teóricas e metodológicas da teoria dos campos conceituais para a
aprendizagem e o ensino de matemática, esperamos, a partir das situações propostas aos
participantes, indicadas no corpo deste texto, propiciar reflexões e discussões no que tange
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às contribuições da teoria dos campos conceituais, com foco na identificação e modelação
de teoremas em ação, falsos e verdadeiros, e das imbricações entre campos conceituais,
possíveis de serem revelados nas aulas de matemática.
As situações selecionadas para as reflexões desta oficina dizem respeito à fórmulas
de área e perímetro de figuras planas, e podem ser discutidas a partir das imbricações entre
campos conceituais, a saber, os campos conceituais geométrico, numérico, algébrico,
funcional, bem como a partir da identificação de teoremas em ação falsos e verdadeiros,
possíveis de serem manifestados nas respostas dos alunos, bem como situações que possam
desestabilizar esses possíveis conhecimentos equivocados dos alunos.
Além disso, dentre os resultados esperados, situa-se a elaboração de propostas para
outras pesquisas neste tema decorrente da coleta de dados junto aos participantes da
oficina, com a autorização dos participantes, principalmente no que se refere às
contribuições das imbricações entre campos conceituais e da importância da identificação e
possível desestabilização de teoremas em ação falsos.
Referências
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Franceses Relacionados ao Campo Conceitual dos Números Irracionais. Perspectivas
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