Operação Satiagraha - Investigação por agentes da ABIN, Ilicitude por Derivação

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PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO SATIAGRAHA.PARTICIPAÇÃO IRREGULAR, INDUVIDOSAMENTE COMPROVADA, DE DEZENAS DE FUNCIONÁRIOS DA AGÊNCIA BRASILEIRA DE INFORMAÇÃO (ABIN) E DE EX-SERVIDOR DO SNI, EM INVESTIGAÇÃO CONDUZIDA PELA POLÍCIA FEDERAL.MANIFESTO ABUSO DE PODER. IMPOSSIBILIDADE DE CONSIDERAR-SE A ATUAÇÃO EFETIVADA COMO HIPÓTESE EXCEPCIONALÍSSIMA, CAPAZ DE PERMITIR COMPARTILHAMENTO DE DADOS ENTRE ÓRGÃOS INTEGRANTES DO SISTEMA BRASILEIRO DE INTELIGÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE PRECEITO LEGAL AUTORIZANDO-A. PATENTE A OCORRÊNCIA DE INTROMISSÃO ESTATAL, ABUSIVA E ILEGAL NA ESFERA DA VIDA PRIVADA, NO CASO CONCRETO. VIOLAÇÕES DA HONRA, DA IMAGEM E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. INDEVIDA OBTENÇÃO DE PROVA ILÍCITA, PORQUANTO COLHIDA EM DESCONFORMIDADE COM PRECEITO LEGAL. AUSÊNCIA DE RAZOABILIDADE. AS NULIDADES VERIFICADAS NA FASE PRÉ-PROCESSUAL, E DEMONSTRADAS À EXAUSTÃO, CONTAMINAM FUTURA AÇÃO PENAL. INFRINGÊNCIA A DIVERSOS DISPOSITIVOS DE LEI. CONTRARIEDADE AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, DA IMPARCIALIDADE E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL INQUESTIONAVELMENTE CARACTERIZADA. A AUTORIDADE DO JUIZ ESTÁ DIRETAMENTE LIGADA À SUA INDEPENDÊNCIA AO JULGAR E À IMPARCIALIDADE.UMA DECISÃO JUDICIAL NÃO PODE SER DITADA POR CRITÉRIOS SUBJETIVOS, NORTEADA PELO ABUSO DE PODER OU DISTANCIADA DOS PARÂMETROS LEGAIS.ESSAS EXIGÊNCIAS DECORREM DOS PRINCÍPIOS DEMOCRÁTICOS E DOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS INSCRITOS NA CONSTITUIÇÃO. NULIDADE DOS PROCEDIMENTOS QUE SE IMPÕE, ANULANDO-SE, DESDE O INÍCIO, A AÇÃO PENAL.1.Uma análise detida dos 11 (onze) volumes que compõem o HC demonstra que existe uma grande quantidade de provas aptas a confirmar, cabalmente, a participação indevida, flagrantemente ilegal e abusiva, da ABIN e do investigador particular contratado pelo Delegado responsável pela chefia da Operação Satiagraha.2. Não há se falar em compartilhamento de dados entre a ABIN e a Polícia Federal, haja vista que a hipótese dos autos não se enquadra nas exceções previstas na Lei nº 9.883/99.3. Vivemos em um Estado Democrático de Direito, no qual, como nos ensina a Profª. Ada Pellegrini Grinover, in "Nulidades no Processo Penal", "o direito à prova está limitado, na medida em que constitui as garantias do contraditório e da ampla defesa, de sorte que o seu exercício não pode ultrapassar os limites da lei e, sobretudo, da Constituição." 4. No caso em exame, é inquestionável o prejuízo acarretado pelas investigações realizadas em desconformidade com as normas legais, e não convalescem, sob qualquer ângulo que seja analisada a questão, porquanto é manifesta a nulidade das diligências perpetradas pelos agentes da ABIN e um ex-agente do SNI, ao arrepio da lei.5. Insta assinalar, por oportuno, que o juiz deve estrita fidelidade à lei penal, dela não podendo se afastar a não ser que imprudentemente se arrisque a percorrer, de forma isolada, o caminho tortuoso da subjetividade que, não poucas vezes, desemboca na odiosa perda da imparcialidade. Ele não deve, jamais, perder de vista a importância da democracia e do Estado Democrático de Direito.6. Portanto, inexistem dúvidas de que tais provas estão irremediavelmente maculadas, devendo ser consideradas ilícitas e inadmissíveis, circunstâncias que as tornam destituídas de qualquer eficácia jurídica, consoante entendimento já cristalizado pela doutrina pacífica e lastreado na torrencial jurisprudência dos nossos tribunais.7. Pelo exposto, concedo a ordem para anular, todas as provas produzidas, em especial a dos procedimentos nº 2007.61.81.010208-7 (monitoramento telefônico), nº 2007.61.81.011419-3 (monitoramento telefônico), e nº 2008.61.81.008291-3 (ação controlada), e dos demais correlatos, anulando também, desde o início, a ação penal, na mesma esteira do bem elaborado parecer exarado pela douta Procuradoria da República.(HC 149250/SP, Rel. Ministro ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RJ), QUINTA TURMA, julgado em 07/06/2011, DJe 05/09/2011)

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  • Superior Tribunal de JustiaRevista Eletrnica de Jurisprudncia

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    HABEAS CORPUS N 149.250 - SP (20090192565-8)

    RELATOR : MINISTRO ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DOTJRJ)

    IMPETRANTE : ANDREI ZENKNER SCHMIDT E OUTROSADVOGADO : TIAGO CEDRAZ LEITE OLIVEIRAIMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIOPACIENTE : DANIEL VALENTE DANTAS

    EMENTA

    PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. OPERAO SATIAGRAHA. PARTICIPAO IRREGULAR, INDUVIDOSAMENTE COMPROVADA, DE DEZENAS DE FUNCIONRIOS DA AGNCIA BRASILEIRA DE INFORMAO(ABIN) E DE EX-SERVIDOR DO SNI, EM INVESTIGAO CONDUZIDA PELA POLCIA FEDERAL. MANIFESTO ABUSODE PODER. IMPOSSIBILIDADE DE CONSIDERAR-SE A ATUAO EFETIVADA COMO HIPTESEEXCEPCIONALSSIMA, CAPAZ DE PERMITIR COMPARTILHAMENTO DE DADOS ENTRE RGOS INTEGRANTES DOSISTEMA BRASILEIRO DE INTELIGNCIA. INEXISTNCIA DE PRECEITO LEGAL AUTORIZANDO-A. PATENTE AOCORRNCIA DE INTROMISSO ESTATAL, ABUSIVA E ILEGAL NA ESFERA DA VIDA PRIVADA, NO CASO CONCRETO.VIOLAES DA HONRA, DA IMAGEM E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. INDEVIDA OBTENO DE PROVAILCITA, PORQUANTO COLHIDA EM DESCONFORMIDADE COM PRECEITO LEGAL. AUSNCIA DE RAZOABILIDADE.AS NULIDADES VERIFICADAS NA FASE PR-PROCESSUAL, E DEMONSTRADAS EXAUSTO, CONTAMINAMFUTURA AO PENAL. INFRINGNCIA A DIVERSOS DISPOSITIVOS DE LEI. CONTRARIEDADE AOS PRINCPIOS DALEGALIDADE, DA IMPARCIALIDADE E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL INQUESTIONAVELMENTE CARACTERIZADA. AAUTORIDADE DO JUIZ EST DIRETAMENTE LIGADA SUA INDEPENDNCIA AO JULGAR E IMPARCIALIDADE.UMA DECISO JUDICIAL NO PODE SER DITADA POR CRITRIOS SUBJETIVOS, NORTEADA PELO ABUSO DE PODEROU DISTANCIADA DOS PARMETROS LEGAIS. ESSAS EXIGNCIAS DECORREM DOS PRINCPIOS DEMOCRTICOS EDOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS INSCRITOS NA CONSTITUIO. NULIDADE DOS PROCEDIMENTOS QUESE IMPE, ANULANDO-SE, DESDE O INCIO, A AO PENAL.

    1.Uma anlise detida dos 11 (onze) volumes que compem o HC demonstra que existe uma grande quantidade de provas aptas aconfirmar, cabalmente, a participao indevida, flagrantemente ilegal e abusiva, da ABIN e do investigador particular contratadopelo Delegado responsvel pela chefia da Operao Satiagraha.

    2. No h se falar em compartilhamento de dados entre a ABIN e a Polcia Federal, haja vista que a hiptese dos autos no seenquadra nas excees previstas na Lei n 9.88399.

    3. Vivemos em um Estado Democrtico de Direito, no qual, como nos ensina a Prof. Ada Pellegrini Grinover, in Nulidades noProcesso Penal, "o direito prova est limitado, na medida em que constitui as garantias do contraditrio e da ampla defesa,de sorte que o seu exerccio no pode ultrapassar os limites da lei e, sobretudo, da Constituio."

    4. No caso em exame, inquestionvel o prejuzo acarretado pelas investigaes realizadas em desconformidade com as normaslegais, e no convalescem, sob qualquer ngulo que seja analisada a questo, porquanto manifesta a nulidade das dilignciasperpetradas pelos agentes da ABIN e um ex-agente do SNI, ao arrepio da lei.

    5. Insta assinalar, por oportuno, que o juiz deve estrita fidelidade lei penal, dela no podendo se afastar a no ser queimprudentemente se arrisque a percorrer, de forma isolada, o caminho tortuoso da subjetividade que, no poucas vezes, desembocana odiosa perda da imparcialidade. Ele no deve, jamais, perder de vista a importncia da democracia e do Estado Democrtico deDireito.

    6. Portanto, inexistem dvidas de que tais provas esto irremediavelmente maculadas, devendo ser consideradas ilcitas einadmissveis, circunstncias que as tornam destitudas de qualquer eficcia jurdica, consoante entendimento j cristalizado pela

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  • doutrina pacfica e lastreado na torrencial jurisprudncia dos nossos tribunais.

    7. Pelo exposto, concedo a ordem para anular, todas as provas produzidas, em especial a dos procedimentos n2007.61.81.010208-7 (monitoramento telefnico), n 2007.61.81.011419-3 (monitoramento telefnico), e n2008.61.81.008291-3 (ao controlada), e dos demais correlatos, anulando tambm, desde o incio, a ao penal, na mesmaesteira do bem elaborado parecer exarado pela douta Procuradoria da Repblica.

    ACRDO

    Prosseguindo no julgamento, Vistos, relatados e discutidos os autos em que so partes as acima indicadas, acordam os SenhoresMinistros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justia, por maioria, em conceder a ordem, nos termos do voto do Sr. MinistroRelator.Os Srs. Ministros Napoleo Nunes Maia Filho e Jorge Mussi votaram com o Sr. Ministro Relator.Votaram vencidos os Srs. Ministros Gilson Dipp e Ministra Laurita Vaz, que denegavam a ordem.Ausente, justificadamente, nesta assentada, o Sr. Ministro Gilson Dipp.SUSTENTOU ORALMENTE NA SESSO DE 01032011: DR. ANDREI ZENKNER SCHMIDT (P PACTE)

    Braslia (DF), 07 de junho de 2011(Data do Julgamento).

    Ministro Jorge MussiPresidente

    Ministro Adilson Vieira Macabu (desembargador Convocado do Tjrj)Relator

    HABEAS CORPUS N 149.250 - SP (20090192565-8)

    IMPETRANTE : ANDREI ZENKNER SCHMIDT E OUTROSADVOGADO : TIAGO CEDRAZ LEITE OLIVEIRAIMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIOPACIENTE : DANIEL VALENTE DANTAS

    RELATRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJRJ) (Relator):

    ANDREI ZENKNER SCHMIDT E OUTROS impetram habeas corpus em favor de DANIEL VALENTE DANTAS contraacrdo proferido pela 5 Turma do Eg. Tribunal Regional Federal da 3 Regio, assim ementado, verbis:

    "HABEAS CORPUS - PENAL E PROCESSO PENAL - PARTICIPAO DE SERVIDORES DA AGNCIA BRASILEIRA DEINFORMAO (ABIN) EM INQURITO CONDUZIDO PELA POLCIA FEDERAL AUSNCIA DE PROVA PR-CONSTITUDA LEI 9.88399 QUE PERMITE COMPARTILHAMENTO DE DADOS ENTRE RGOS INTEGRANTES DO SISTEMABRASILEIRO DE INTELIGNCIA NULIDADES VERIFICADAS NA FASE PR-PROCESSUAL NO CONTAMINAM FUTURAAO PENAL ORDEM DENEGADA.1. Os impetrantes no instruram o writ" com elementos de prova suficientes para que esta Corte, neste passo, emita juzo devalor sobre a participao, ou no, de servidores vinculados Agncia Brasileira de Informao (ABIN) nos procedimentosinvestigatrios, relacionados com a denominada Operao Satiagraha. E mesmo que, por hiptese, se prestassem a permitiruma concluso positiva, tais documentos no esclarecem em que medida se deu essa participao, a ponto de autorizar, j nestemomento, um exame da sua legalidade.2. A autoridade impetrada nega a participao de agentes da ABIN na persecuo penal n 2008.61.81.008291-3, amparando-se,inclusive, em declarao da prpria autoridade policial que presidiu as investigaes que culminaram na denncia formuladapelo Ministrio Pblico Federal. mingua de quaisquer outros elementos de convico, robustos o suficiente para provar ocontrrio, medida de rigor prestigiar as informaes apresentadas pela autoridade impetrada, pois aquela que se encontraem contato mais direto com os fatos.

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  • 3. No que diz respeito aos demais procedimentos investigatrios verifica-se que, em relao a eles, tambm no foramapresentados a esta Corte, elementos de convico suficientes o bastante para que seja avaliada a participao e eventualilegalidade dessa atividade, por parte dos agentes da ABIN. A impetrao no indica um nico fato especfico, concreto, no qualhouve a participao de agentes da ABIN. As informaes prestadas pela autoridade impetrada indicam que, se houveparticipao de agentes da ABIN nos demais procedimentos investigatrios que integram a operao em apreo, esta deu-se deforma secundria, incapaz de justificar qualquer alegao de nulidade de prova, especialmente porque ausente demonstraoconcreta de prejuzo, conforme se viu do trecho das informaes j transcritas nesta deciso. H que se ter em mente que premissa bsica do processo penal a regra segundo a qual no se declara nenhuma nulidade sem a demonstrao do prejuzo. Oartigo 563 do Cdigo de Processo Penal firme nesse sentido.4. No h prova acerca de um prejuzo concreto experimentado pelo paciente, pelo fato de servidores da Agncia Brasileira deInformao, hipoteticamente, terem conhecido do contedo de conversas telefnicas interceptadas. certo que esse fato pode atvir a gerar a responsabilizao funcional daquela autoridade que eventualmente violou o seu dever de sigilo, contudo, talviolao, no possui o condo de macular a prova como um todo.5. A Lei 9.88399 que instituiu o Sistema Brasileiro de Inteligncia indica a possibilidade de rgos componentes do aludidosistema, compartilharem informaes e dados relativos a situaes nas quais haja interesse do estado brasileiro. Tanto a PolciaFederal como a ABIN, integram o Sistema Brasileiro de Inteligncia, como se infere dos incisos III e IV do artigo 4 do Decreton 4.37602, que regulamenta a Lei 9.88399.6. O compartilhamento de dados e informaes sigilosos entre os rgos encarregados da persecuo penal e outros rgosintegrantes do Estado, no novidade. Basta lembrar que, ordinariamente, IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dosRecursos Naturais Renovveis), Receita Federal, INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), BACEN (Banco Central do Brasil) eCVM (Comisso de Valores Mobilirios), os quais cita-se apenas a ttulo de exemplo, compartilham dados com a Polcia Federale o Ministrio Pblico Federal, visando o aprofundamento das apuraes criminais, e isso nunca causou perplexidade ousurpresa.7. Eventuais nulidades da fase pr-processual no possuem o condo de contaminar a ao penal. O Cdigo de Processo Penalconsagra a dispensabilidade do Inqurito Policial (artigo 39, 5), o que, tambm, corrobora o raciocnio de que eventuaisnulidades verificadas naquele mbito no contaminam a ao penal, que lhe posterior e ontologicamente distinta.8.Ordem denegada." (fls. 2.7032.705 - vol. 11)

    Consta dos autos que o paciente foi denunciado pela prtica do crime de corrupo ativa, como incurso no art. 333, caput,combinado com o art. 29, caput, ambos do Cdigo Penal.Em longo arrazoado, os impetrantes alegam, em sntese, que:a) a Operao Satiagraha resultado de uma investigao criminal oficiosa, realizada margem de inqurito policial, que foi,indevidamente, substitudo pela atuao clandestina da Agncia Brasileira de Inteligncia - ABIN e de investigador particular,contratado pelo Delegado Protgenes Queiroz - responsvel pela operao;a.1) aponta-se violao aos arts. 144, 1, IV, da Constituio Federal e 4, do Cdigo de Processo Penal, aduzindo que, embora a Agncia Brasileira de Inteligncia - ABIN tenha levado a efeito, por pessoas a seu servio, monitoramentos telefnico e telemticoem desfavor do ora paciente, no perodo compreendido entre fevereiro de 2007 e o incio de 2008, o Departamento de PolciaFederal s instaurou o inqurito em 25.06.08;b) clandestinidade e ilegalidade da investigao comprovadas mediante:b.1) a "informalidade" tanto na solicitao quanto na execuo das atividades realizadas pela ABIN;b.2) o custeio clandestino da operao realizado pela ABIN, mediante a utilizao, inclusive, das chamadas VS - "verbas secretas";b.3) a manipulao, pela ABIN, de arquivos de udio e de e-mail acobertados pelo sigilo;b.4) a interceptao e anlise de e-mails trocados entre a rea jurdica do Banco Opportunity, indicando monitoramento, pela ABIN,das aes de seus advogados;b.5) o acesso ilegal, pela ABIN, aos dados dos HDs do Banco Opportunity, acobertados por sigilo;b.6) o acesso ilegal, pela ABIN, ao Sistema Guardio, mediante senhas disponibilizadas por policiais federais;b.7) a prtica, pela ABIN, de atos de vigilncia tpicos de Polcia Judiciria;b.8) a realizao de diligncias (fotografias e filmagens) camufladas em torno da vida privada dos investigados, inclusive mediante autilizao de veculo tcnico da ABIN.c) a intromisso estatal abusiva e ilegal na esfera da vida privada, da intimidade, da honra e da imagem, proscrita submisso dopaciente condio de 'objeto' das investigaes, violando, assim, o Princpio da Dignidade Humana, bem como a obteno deprova ilcita, em virtude de tal prova ter sido obtida em contrariedade previso legal.Sustentam os impetrantes violao aos arts. 1, III, e 5, X, XII, LVI, ambos da Magna Carta e 157, do Cdigo de Processo Penal.Asseveram, tambm, que existe vedao ao compartilhamento de informaes, entre a ABIN e a Polcia Federal, salvo se os dadosforem endereados, diretamente, sua Diretoria de Inteligncia Policial, nos termos do art. 6, da Lei n 9.88399 e do art. 4, III eIV, do Decreto n 437602, o que no teria ocorrido, in casu;Por fim, requerem "a concesso da ordem de habeas corpus, a culminar com a decretao da nulidade dos Procedimentos n2007.61.81.010208-7 (monitoramento telefnico), 2007.61.81.011419-3 (monitoramento telemtico) e 2008.61.81.008291-3 (aocontrolada), sobre os quais inequivocadamente se projetaram as comprovadas ilegalidades, a fim de que, ulteriormente, se possaavaliar a derivao da nulidade a investigaes eou aes penais decorrentes de tais procedimentos. " (fls. 66 - vol. 01)Foram opostos embargos de declarao contra o acrdo ora impugnado, que restaram rejeitados, nos termos do acrdo s fls.2.7172.718 - vol. 11.

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  • Como no houve pedido de liminar, o Exmo. Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima, quando Relator do presente feito, solicitouinformaes autoridade apontada como coatora e, posteriormente, deferiu vista ao Ministrio Pblico (fl. 2.679 - vol. 11).No seu parecer, s fls. 2.7282.733 - vol. 11, o Ministrio Pblico Federal opinou pela concesso da ordem, " ex officio, para queseja expedida ordem, com fora para anular, desde o incio, a ao penal declinada nesta manifestao. Se tida como incabvel aconcesso da ordem de habeas corpus, nos moldes propostos, espero, como agente do Ministrio Pblico, o seu deferimento paraque seja anulado o acrdo em que o Tribunal Federal Regional da Terceira Regio, atravs de sua Quinta Turma, indeferiu asplica originria, para que em seu lugar outro seja proferido, com anlise e considerao, pelos seus integrantes, dosdocumentos que se recusaram a apreciar naquela oportunidade."Vieram-me os autos concluso, por atribuio, aps ter sido convocado para integrar esta eg. 5 Turma, em 17.12.10.Em 24.02.11 foi juntada aos autos, petio requerendo preferncia no julgamento., no essencial, o relatrio.HABEAS CORPUS N 149.250 - SP (20090192565-8)

    RELATOR : MINISTRO ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DOTJRJ)

    IMPETRANTE : ANDREI ZENKNER SCHMIDT E OUTROSADVOGADO : TIAGO CEDRAZ LEITE OLIVEIRAIMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIOPACIENTE : DANIEL VALENTE DANTAS

    EMENTA

    PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. OPERAO SATIAGRAHA. PARTICIPAO IRREGULAR, INDUVIDOSAMENTE COMPROVADA, DE DEZENAS DE FUNCIONRIOS DA AGNCIA BRASILEIRA DE INFORMAO(ABIN) E DE EX-SERVIDOR DO SNI, EM INVESTIGAO CONDUZIDA PELA POLCIA FEDERAL. MANIFESTO ABUSODE PODER. IMPOSSIBILIDADE DE CONSIDERAR-SE A ATUAO EFETIVADA COMO HIPTESEEXCEPCIONALSSIMA, CAPAZ DE PERMITIR COMPARTILHAMENTO DE DADOS ENTRE RGOS INTEGRANTES DOSISTEMA BRASILEIRO DE INTELIGNCIA. INEXISTNCIA DE PRECEITO LEGAL AUTORIZANDO-A. PATENTE AOCORRNCIA DE INTROMISSO ESTATAL, ABUSIVA E ILEGAL NA ESFERA DA VIDA PRIVADA, NO CASO CONCRETO.VIOLAES DA HONRA, DA IMAGEM E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. INDEVIDA OBTENO DE PROVAILCITA, PORQUANTO COLHIDA EM DESCONFORMIDADE COM PRECEITO LEGAL. AUSNCIA DE RAZOABILIDADE.AS NULIDADES VERIFICADAS NA FASE PR-PROCESSUAL, E DEMONSTRADAS EXAUSTO, CONTAMINAMFUTURA AO PENAL. INFRINGNCIA A DIVERSOS DISPOSITIVOS DE LEI. CONTRARIEDADE AOS PRINCPIOS DALEGALIDADE, DA IMPARCIALIDADE E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL INQUESTIONAVELMENTE CARACTERIZADA. AAUTORIDADE DO JUIZ EST DIRETAMENTE LIGADA SUA INDEPENDNCIA AO JULGAR E IMPARCIALIDADE.UMA DECISO JUDICIAL NO PODE SER DITADA POR CRITRIOS SUBJETIVOS, NORTEADA PELO ABUSO DE PODEROU DISTANCIADA DOS PARMETROS LEGAIS. ESSAS EXIGNCIAS DECORREM DOS PRINCPIOS DEMOCRTICOS EDOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS INSCRITOS NA CONSTITUIO. NULIDADE DOS PROCEDIMENTOS QUESE IMPE, ANULANDO-SE, DESDE O INCIO, A AO PENAL.

    1.Uma anlise detida dos 11 (onze) volumes que compem o HC demonstra que existe uma grande quantidade de provas aptas aconfirmar, cabalmente, a participao indevida, flagrantemente ilegal e abusiva, da ABIN e do investigador particular contratadopelo Delegado responsvel pela chefia da Operao Satiagraha.

    2. No h se falar em compartilhamento de dados entre a ABIN e a Polcia Federal, haja vista que a hiptese dos autos no seenquadra nas excees previstas na Lei n 9.88399.

    3. Vivemos em um Estado Democrtico de Direito, no qual, como nos ensina a Prof. Ada Pellegrini Grinover, in Nulidades noProcesso Penal, "o direito prova est limitado, na medida em que constitui as garantias do contraditrio e da ampla defesa,de sorte que o seu exerccio no pode ultrapassar os limites da lei e, sobretudo, da Constituio."

    4. No caso em exame, inquestionvel o prejuzo acarretado pelas investigaes realizadas em desconformidade com as normaslegais, e no convalescem, sob qualquer ngulo que seja analisada a questo, porquanto manifesta a nulidade das dilignciasperpetradas pelos agentes da ABIN e um ex-agente do SNI, ao arrepio da lei.

    5. Insta assinalar, por oportuno, que o juiz deve estrita fidelidade lei penal, dela no podendo se afastar a no ser queimprudentemente se arrisque a percorrer, de forma isolada, o caminho tortuoso da subjetividade que, no poucas vezes, desembocana odiosa perda da imparcialidade. Ele no deve, jamais, perder de vista a importncia da democracia e do Estado Democrtico deDireito.

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  • 6. Portanto, inexistem dvidas de que tais provas esto irremediavelmente maculadas, devendo ser consideradas ilcitas einadmissveis, circunstncias que as tornam destitudas de qualquer eficcia jurdica, consoante entendimento j cristalizado peladoutrina pacfica e lastreado na torrencial jurisprudncia dos nossos tribunais.

    7. Pelo exposto, concedo a ordem para anular, todas as provas produzidas, em especial a dos procedimentos n2007.61.81.010208-7 (monitoramento telefnico), n 2007.61.81.011419-3 (monitoramento telefnico), e n2008.61.81.008291-3 (ao controlada), e dos demais correlatos, anulando tambm, desde o incio, a ao penal, na mesmaesteira do bem elaborado parecer exarado pela douta Procuradoria da Repblica.

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJRJ) (Relator):

    Cuidam os autos de procedimentos adotados pela Polcia Federal durante a colheita de provas da conhecida Operao Satiagraha.

    fato pblico e notrio que se trata de uma operao que investigou possveis crimes de desvio de verbas pblicas, corrupo elavagem de dinheiro, desencadeada em princpios de 2004 e que resultou na priso - posteriormente revogada, determinada pela 6Vara da Justia Federal em So Paulo, de vrios banqueiros, diretores de banco e investidores, em 8 de julho de 2008, dentre elesDANIEL VALENTE DANTAS, o ora paciente.

    Os impetrantes visam, basicamente, com este habeas corpus, a nulidade dos procedimentos de monitoramento telefnico, telemticoe ao controlada que resultaram em ao penal instaurada contra o paciente, ao argumento que eles decorreriam de provas ilcitas.

    Como dito alhures, sustentam, em apertada sntese, que, no caso concreto, resta cabalmente demonstrada a atuao clandestina eilegal da ABIN - AGNCIA BRASILEIRA DE INTELIGNCIA e de um investigador particular - que teria sido contratado peloento Delegado responsvel pelas investigaes da Operao Satiagraha, realizando vrios atos tpicos de Polcia Judiciria, queresultaram num conjunto de provas ilcitas, em flagrante violao a diversos dispositivos legais.

    Asseveram que "a atuao da ABIN est a servio exclusivo dos interesses da Presidncia da Repblica - e no de outro Poder,rgo ou funcionrio da administrao pblica. De modo algum, portanto, pode-se compreender que suas atribuies englobem aprtica de atos tpicos de Polcia Judiciria, seja porque (a) ausente previso legal nesse sentido, seja porque (b) o destinatriode suas atividades (o Presidente da Repblica) absolutamente diverso do destinatrio de qualquer investigao criminal(Ministrio Pblico)" (STJ fls. 19 - vol. 01) (grifos no original)

    Aduzem, ainda, que as consequncias processuais dessa alegada atuao clandestina e ilegal da ABIN e do investigador particularredundam na nulidade da investigao criminal que resultou em ao penal e inqurito policial, em trmite perante a 6 Vara FederalCriminal de So Paulo, vez que as provas carreadas aos j mencionados processos estariam contaminadas pela ilicitude, quando desua colheita.

    Concluem que a eg. 5 Turma do Tribunal Federal Regional da 3 Regio, ao deixar de reconhecer a atuao da ABIN e deinvestigador particular na investigao criminal, contrariou os arts. 1, III, 5, X, XII, LVI, 144, 1, IV, todos da ConstituioFederal, bem como os arts. 4 e 157, ambos do Cdigo de Processo Penal.

    Com razo os impetrantes.

    No caso concreto, o Tribunal a quo denegou a ordem pretendida, afirmando, em brevssima sntese, que: (i) os impetrantes nocomprovaram a participao da ABIN nas investigaes, (ii) que perfeitamente aceitvel o compartilhamento de dados entrergos do Sistema Brasileiro de Inteligncia e (iii) que as nulidades porventura declaradas na fase pr-processual no tm o condode contaminar a futura ao. Assim est ementada a deciso:

    HABEAS CORPUS PENAL E PROCESSO PENAL PARTICIPAO DE SERVIDORES DA AGNCIA BRASILEIRA DEINFORMAO (ABIN) EM INQURITO CONDUZIDO PELA POLCIA FEDERAL AUSNCIA DE PROVA PR-CONSTITUDA LEI 9.88399 QUE PERMITE COMPARTILHAMENTO DE DADOS ENTRE RGOS INTEGRANTES DO SISTEMABRASILEIRO DE INTELIGNCIA NULIDADES VERIFICADAS NA FASE PR-PROCESSUAL NO CONTAMINAM FUTURAAO PENAL ORDEM DENEGADA.1. Os impetrantes no instruram o writ" com elementos de prova suficientes para que esta Corte, neste passo, emita juzo devalor sobre a participao, ou no, de servidores vinculados Agncia Brasileira de Informao (ABIN) nos procedimentosinvestigatrios, relacionados com a denominada Operao Satiagraha. E mesmo que, por hiptese, se prestassem a permitir

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  • uma concluso positiva, tais documentos no esclarecem em que medida se deu essa participao, a ponto de autorizar, j nestemomento, um exame da sua legalidade.2. A autoridade impetrada nega a participao de agentes da ABIN na persecuo penal n 2008.61.81.008291-3, amparando-se,inclusive, em declarao da prpria autoridade policial que presidiu as investigaes que culminaram na denncia formuladapelo Ministrio Pblico Federal. mingua de quaisquer outros elementos de convico, robustos o suficiente para provar ocontrrio, medida de rigor prestigiar as informaes apresentadas pela autoridade impetrada, pois aquela que se encontraem contato mais direto com os fatos.3. No que diz respeito aos demais procedimentos investigatrios verifica-se que, em relao a eles, tambm no foramapresentados a esta Corte, elementos de convico suficientes o bastante para que seja avaliada a participao e eventualilegalidade dessa atividade, por parte dos agentes da ABIN. A impetrao no indica um nico fato especfico, concreto, no qualhouve a participao de agentes da ABIN. As informaes prestadas pela autoridade impetrada indicam que, se houveparticipao de agentes da ABIN nos demais procedimentos investigatrios que integram a operao em apreo, esta deu-se deforma secundria, incapaz de justificar qualquer alegao de nulidade de prova, especialmente porque ausente demonstraoconcreta de prejuzo, conforme se viu do trecho das informaes j transcritas nesta deciso. H que se ter em mente que premissa bsica do processo penal a regra segundo a qual no se declara nenhuma nulidade sem a demonstrao do prejuzo. Oartigo 563 do Cdigo de ProcessoPenal firme nesse sentido.4. No h prova acerca de um prejuzo concreto experimentado pelo paciente, pelo fato de servidores da Agncia Brasileira deInformao, hipoteticamente, terem conhecido do contedo de conversas telefnicas interceptadas. certo que esse fato pode atvir a gerar a responsabilizao funcional daquela autoridade que eventualmente violou o seu dever de sigilo, contudo, talviolao, no possui o condo de macular a prova como um todo.5. A Lei 9.88399 que instituiu o Sistema Brasileiro de Inteligncia indica a possibilidade de rgos componentes do aludidosistema, compartilharem informaes e dados relativos a situaes nas quais haja interesse do estado brasileiro. Tanto a PolciaFederal como a ABIN, integram o Sistema Brasileiro deInteligncia, como se infere dos incisos III e IV do artigo 4 doDecreto n 4.37602, que regulamenta a Lei 9.88399.6. O compartilhamento de dados e informaes sigilosos entre os rgos encarregados da persecuo penal e outros rgosintegrantes do Estado, no novidade. Basta lembrar que, ordinariamente, IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dosRecursos Naturais Renovveis), Receita Federal, INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), BACEN (Banco Central do Brasil) eCVM (Comisso de Valores Mobilirios), os quais cita-se apenas a ttulo de exemplo, compartilham dados com a Polcia Federale o Ministrio Pblico Federal, visando o aprofundamento das apuraes criminais, e isso nunca causou perplexidade ousurpresa.7. Eventuais nulidades da fase pr-processual no possuem o condo de contaminar a ao penal. O Cdigo de Processo Penalconsagra a dispensabilidade do Inqurito Policial (artigo 39, 5), o que, tambm, robora o raciocnio de que eventuaisnulidades verificadas naquele mbito no contaminam a ao penal, que lhe posterior e ontologicamente distinta.8.Ordem denegada." (fls. 2.7032.705 - vol. 11) (publicada em 28052009)

    Contra essa deciso foram opostos embargos de declarao, que restaram rejeitados, ante os termos do acrdo acostado s fls.2.7122.715 - vol. 11.

    Peo vnia para transcrever trecho do acrdo dos declaratrios, que julgo de extrema importncia para o deslinde da controvrsia,verbis:

    "...omissis...Irretocveis as razes expostas por Sua Excelncia.Cumpre ainda ressaltar o entendimento pacfico desta Egrgia Turma no sentido de que cabe aos impetrantes promover a corretae suficiente instruo do pedido de habeas corpus, o qual, em virtude do seu rito especialssimo e clere, no comportadilao probatria.Em outras palavras, o pedido de writ" deve vir acompanhado de prova pr-constituda suficiente para o seu julgamento. No sejustifica o adiamento do exame de um pedido de habeas corpus, - a prestao da tutela jurisdicional relativa a bem jurdicoto precioso - em virtude de documentos apresentados na ltima hora, especialmente quando no h prova capaz de comprovarque os interessados somente os obtiveram naquela data.Alis, deve ficar registrado que o zeloso Juiz Federal Convocado, Dr. Hlio Egydio de Matos Nogueira, diligenciou no sentido deexaminar o teor das informaes contidas na mdia (DVD) juntada aos autos.Mesmo aps tentativas frustradas de acesso ao contedo da mdia em questo, no seu prprio gabinete de trabalho, o JuizFederal Convocado encaminhou o documento aos cuidados do Departamento de Informtica desta Corte, que, aps novastentativas infrutferas, certificou a existncia de um defeito no disco juntado aos autos, o que impedia o conhecimento do seucontedo.Diante de um quadro como o acima desenhado, outra soluo no se apresentava, seno o indeferimento do pedido de adiamentodo julgamento do writ.Ademais, nada impede que os impetrantes ajuzem um novo pedido de habeas corpus junto a esta Corte, cuidando agora de

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  • promover a correta instruo do writ", nus que indiscutivelmente lhes cabe.O que no se pode admitir que a prestao da tutela jurisdicional reste obstada por fora de documentos trazidos aos autos naltima hora, especialmente nas circunstncias acima apontadas, em que a mdia apresentada pela defesa possua um defeitoimpeditivo do seu acesso.Plena de acerto a postura adotada pelo Ilustre Juiz Federal Convocado, Hlio Egydio de Matos Nogueira, que, no voto queserviu de paradigma para o acrdo lavrado na ocasio, deixou expresso o quanto segue: (...) No que diz respeito volumosadocumentao apresentada pelos impetrantes a este Relator na manh do dia de hoje disco de mdia com imagens dos autos doinqurito policial em curso na 7 Vara Federal Criminal de So Paulo - observo no ser possvel que a prestao da tutelajurisdicional, que deve ser especialmente clere no caso do Habeas Corpus, seja protelada pela juntada de novos documentos,cabendo salientar que o suposto constrangimento ilegal que estaria sofrendo o paciente deveria ser demonstrado por provapr-constituda no momento da impetrao. Nesta senda, confira-se o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justia: Ohabeas corpus, como writ constitucional que , no rende ensejo dilao probatria, razo pela qual exige, para seuconhecimento, prova pr-constituda do fundamento da impetrao (STJ 6T HC 7.277 Rel. Fernando Gonalves j.21.05.1998 DJU de 08.06.1998, p. 180).No mesmo sentido: STJ 5T HC 25.700 Rel. Jos Arnaldo da Fonseca j. 17.06.2003 DJU de 25.08.2003, p. 336. Alis,ressalto que o disco de mdia apresentado pelos impetrantes sequer pde ser aberto para que este Relator pudesse examinar oseu contedo. Tanto os computadores do gabinete, quanto aqueles do departamento de informtica desta Corte, no conseguiramacessar as imagens ali contidas. Pois bem. Os impetrantes deveriam ter trazido a esta Corte, em tempo hbil, a documentao emapreo, de modo a permitir, inclusive, a manifestao da Procuradoria Regional da Repblica.E no h elemento de convico apto a indicar que essa prova foi obtida pelos impetrantes somente agora, de modo a justificar aapresentao de ltima hora. Contudo, nada impede que os impetrantes aparelhem nova impetrao com os documentos acimamencionados, ocasio na qual esta Egrgia Turma examinar de forma adequada e detida a pretenso porventuramanifestada. A par disso, na augusta via do writ" no seria possvel o exame vertical da prova produzida em inqurito policialque apura supostos delitos perpetrados pela autoridade policial na conduo dos procedimentos criminais atinentes denominada Operao Satiagraha", at porque o referido inqurito sequer foi concludo. Neste sentido, incabvel, nesta sede, aanlise aprofundada da documentao nova colacionada pelos impetrantes, que demandaria pesquisa probatria ampla ecotejamento de elementos de convico para que comprovasse a existncia de manifesta nulidade do processo, tal como exigidopelo artigo 648, VI, CPP (...)" (fl. 623 v). (publicado em 26032009)Rejeito, portanto, a linha de argumentao apresentada pelo embargante a esse respeito. No procede a alegao de nulidade doacrdo por fora do no adiamento do julgamento do writ" .

    Data maxima venia, feita uma anlise acurada dos autos, diga-se de passagem, dos 11 volumes que compem o caso, possvelverificar que existe uma grande quantidade de provas aptas a confirmar, cabalmente - a meu ver, a participao indevida eflagrantemente ilegal da ABIN e do investigador particular contratado pelo Delegado Protgenes Queiroz.

    Dentre o farto material acostado aos autos, podemos destacar alguns documentos:

    - cpia do Ofcio enviado pelo Dr. Daniel Lorenz de Azevedo (ento Diretor de Inteligncia Policial da Polcia Federal)encaminhando ao Dr. Amaro Vieira Ferreira (tambm delegado da Polcia Federal e responsvel pelo Inqurito Policial n2-44472008, que apurava possvel violao de sigilo profissional no decorrer da Operao Satiagraha) cpias de 3 (trs) recibosem nome de Francisco Ambrsio do Nascimento, localizados no bojo da prestao de contas do processo n 08200.0013322008-22,o qual tem como suprido o DPF Protgenes Pinheiro de Queiroz, ex- coordenador da Operao Satiagraha - fls. 1.460 v1.462, vol. 6dos autos.

    - ofcio enviado pelo delegado Dr. Glorivan Bernardes de Oliveira ao Dr. Amaro Vieira Ferreira , confirmando que o Sr. MrcioSeltz - servidor da ABIN, esteve no Complexo Administrativo Sudoeste, local para onde foi transferido o efetivo da OperaoSatiagraha - fls. 1.408-v1.409, vol. 6 dos autos.

    - carta enviada pelo Dr. Paulo Fernando da Costa Lacerda ao Dep. Nelson Pellegrino - Relator da CPI das Escutas TelefnicasClandestinas, comprovando a participao de agentes da ABIN na Operao Satiagraha - fls. 2.2102.224 - vol. 9.

    - ofcio prestando informaes, enviado pelo Dr. Amaro Vieira Ferreira ao Procurador da Repblica Dr. Roberto Antnio DassiDiana, em 120309, no qual se l: "nessa linha investigativa verificou-se que servidores da Agncia Brasileira de Inteligncia -ABIN e um ex-servidor, por iniciativa do Delegado Protgenes Queiroz, sem autorizao judicial e sem qualquer formalizao,foram introduzidos ocultamente nos trabalhos da operao Satiagraha, tomaram conhecimento de dados que estavam sob sigilo,e, seguindo comando daquela autoridade e de outros servidores a ela subordinados, realizaram trabalhos de vigilncia,acompanhamento de alvos, registros fotogrficos, filmagens, gravaes ambientais, anlise de documentos igualmente sigilosos,geraram relatrios e produziram transcries a partir da audio de gravaes de conversaes telefnicas interceptadas pelosistema guardio, em situao que ultrapassa qualquer limite de entendimento de que fosse simples atuao pontual com troca dedados de inteligncia entre rgos integrantes do Sistema Brasileiro de Inteligncia - SISBIN, cuja razo de existir e finalidadede atuao, diferem diametralmente daquelas correspondentes Polcia Judiria da Unio." (fls. 2.274 - vol. 09)

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  • - s fls. 2.3422.385-v, vol.10 dos autos, encontra-se o relatrio oriundo do inqurito policial, instaurado em 240708 e relatadoem 070409, no qual o Delegado Amaro Vieira Ferreira apresenta, detalhadamente, ao Ministrio Pblico Federal o resultadodas investigaes que confirmam a participao indevida da ABIN e de investigador particular na Operao Satiagraha.Trata-se de um longo relatrio, mas peo vnia para transcrever 2 trechos que me parecem relevantissmos para o desfechodessa deciso.

    No que tange participao de investigador particular, contratado pelo Dr. Protgenes Queiroz, o relatrio consigna, expressamente,que:

    "...omissis...A participao de terceiro confirmada pelo depoimento de FRANCISCO AMBRSIO DO NASCIMENTO (fls. 795808),aposentado, ex-servidor da ABIN, que relata as circunstncias de seu chamamento para execuo de trabalhos de interesse daoperao, confirmando que tivera acesso a informaes sigilosas do bojo da operao." (fls. 2.365 - vol 10)

    Por sua vez, no verso da fl. 2.383, destaca-se, verbis:

    "...omissis...Desse modo, conclui-se que, restou evidenciado desrespeito ao disposto no artigo 8 e conseqente infrao ao disposto nasegunda parte, do artigo 10, da Lei n9.296, de 24 de julho de 1996, uma vez que em relao a atuao dos servidores da ABIN,constatou-se completo desvio de finalidade, tendo ocorrido para aqueles servidores, que assim atuaram, repasse de dados queestavam sob segredo de justia em procedimento judicial de interceptao de comunicaes telefnicas, autorizadaespecificamente para fazer prova em investigao criminal e em instruo processual penal, conforme dispe o artigo 1 da Lei9.29696, que regulamentou o inciso XII, parte final, do artigo 5, da Constituio Federal, situao que determinou oindiciamento dos policiais WALTER GUERRA SILVA (fls. 212421270, ROBERTO CARLOS DA ROCHA (fls. 22152218) eEDUARDO GARCIA (fls. 26302634), alm do delegado PROTGENES QUEIROZ (fls. 26302634), por infrao ao disposto nasegunda parte, do artigo 10, da Lei 9.296, de 24 de julho de 1996, sendo eles individualmente qualificados e interrogados, demodo geral se recusaram a responder aos questionamentos, optando pelo direito de faz-lo somente na justia" (grifos nooriginal)

    A meu sentir, bastante razovel que a defesa do paciente tenha apresentado documentos novos - praticamente na data do julgamentodos declaratrios, os quais no me parece ter sido possvel obter antes, haja vista que se encontrava em curso a investigao queculminou com o indiciamento do Delegado Protgenes Queiroz, como se depreende, por exemplo, da verificao da data em que foi relatado o resultado da investigao, qual seja, 070409, poucos dias aps o julgamento dos Eds.

    Ademais, como muito bem colocado pelo Parquet, em seu parecer fl. 273 dos autos, no se pode considerar protelatrio orequerimento do maior interessado no julgamento do writ, qual seja, o paciente:

    "...omissis...9. Pois bem: se o habeas corpus busca uma ordem proveitosa a um indiciado ou a um sujeito processual, que ao ver doimpetrante sofre ou acha-se na iminncia de suportar os efeitos de um constrangimento ilegal , parece-me extreme de dvida quea presteza do julgamento respeita, primordialmente, a ele e ao paciente, aos quais, por isso, assiste o direito de buscar seuadiamento, para que o julgador ou os julgadores considerem documentos que se afiguram relevantes para a motivao dadeciso, ainda que possam, no sopesamento das provas, proclamar a sua desvalia.10. Logo, tenho que, se corretamente compreendida, a regra invocada pelo eminente relator, para denegar o pretendidoadiamento, s autorizaria a concluso a que chegou o v. acrdo vergastado, se o alongamento do prazo (i) fosse prejudicial aoacusado, ou (ii) pudesse comprometer o exerccio da pretenso punitiva, pelo possvel pronunciamento, em detrimento doMinistrio Pblico,de prescrio prestes a consumar-se.11. A ilegalidade, aqui identificada, agrava-se pela circunstncia de terem os impretantes esclarecido, origem, que pretendiam,com a documentao apresentada na data do julgamento, evidenciar a ativa participao da Agncia Brasileira de Inteligncia -ABIN - , nas investigaes que se projetaram sobre o paciente, como, alis, testifica o v. acrdo que rejeitou os embargos dedeclarao, manejados logo aps a denegao do habeas corpus originrio."

    Feitas essas consideraes, passo anlise do mrito do presente writ.

    O art. 144 da Constituio Federal enumera e fixa a atribuio dos rgos responsveis pelas atividades de segurana pblica:

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  • " 144. A segurana pblica, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, exercida para a preservao da ordempblica e da incolumidade das pessoas e do patrimnio, atravs dos seguintes rgos:I - polcia federal;II - polcia rodoviria federal;III - polcia ferroviria federal;IV - polcias civis;V - polcias militares e corpos de bombeiros militares."

    Em seu 1, inciso IV, o mesmo dispositivo legal consigna que as atribuies da Polcia Judiciria, no mbito da Unio, cabemexclusivamente Polcia Federal e, na esfera dos Estados, devem ser exercidas pela Polcia Civil, ressalvada a competncia daPolcia Militar ( 4), verbis:

    " Art. 144 - 1 A polcia federal, instituda por lei como rgo permanente, organizado e mantido pela Unio e estruturado em carreira,destina-se a:...omissis...IV - exercer, com exclusividade, as funes de polcia judiciria da Unio....omissis... 4 - s polcias civis, dirigidas por delegados de polcia de carreira, incumbem, ressalvada a competncia da Unio, as funesde polcia judiciria e a apurao de infraes penais, exceto as militares."

    Dentro desse contexto, delimitado pela Constituio Federal, entendo que a atividade investigatria deve ater-se aos ditames fixados.Apenas em casos excepcionalssimos e desde que preenchidos os requisitos legais do art. 4, pargrafo nico, do Cdigo deProcesso Penal, permitir-se- que essa atividade seja exercida por rgo diverso da Polcia Judiciria.

    Por outro lado, a Lei n 9.88399 instituiu o Sistema Brasileiro de Inteligncia "que integra as aes de planejamento e execuodas atividades de inteligncia do Pas, com a finalidade de fornecer subsdios ao Presidente da Repblica nos assuntos deinteresse nacional" (art. 1) e criou a Agncia Brasileira de Inteligncia - ABIN, como rgo central de tal sistema, fixando suasatribuies, claramente descritas em seu art. 4, a saber:

    Art. 4o ABIN, alm do que lhe prescreve o artigo anterior, compete:I - planejar e executar aes, inclusive sigilosas, relativas obteno e anlise de dados para a produo de conhecimentosdestinados a assessorar o Presidente da Repblica;II - planejar e executar a proteo de conhecimentos sensveis, relativos aos interesses e segurana do Estado e da sociedade;III - avaliar as ameaas, internas e externas, ordem constitucional;IV - promover o desenvolvimento de recursos humanos e da doutrina de inteligncia, e realizar estudos e pesquisas para oexerccio e aprimoramento da atividade de inteligncia." (grifei)

    Da simples leitura dos acima mencionados dispositivos legais, pode-se concluir que a atuao da ABIN se limita s atividades deinteligncia que tenham como finalidade precpua e nica fornecer subsdios ao Presidente da Repblica nos assuntos deinteresse nacional.

    E mais. No h qualquer possibilidade de se caracterizar a participao da ABIN e de ex-servidor do SNI com o intuito de "merocompartilhamento de informaes", como consignado no acrdo vergastado, especialmente, porque o prprio acrdo categricoao afirmar que esse compartilhamento de informaes de dados admitido em casos excepcionais "a situaes nas quais hajainteresse do estado brasileiro.", conforme simples leitura da ementa no item n 5.

    Sendo pblico e notrio que o presente writ teve origem em processos investigatrios de possveis delitos de desvio de verbaspblicas, corrupo e branqueamento de capitais, como dizem os portugueses, indaga-se: onde reside o interesse nacional naapurao de tais crimes?

    Vivemos em um Estado Democrtico de Direito regido por um conjunto de leis que disciplinam e estabelecem os comportamentos

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  • permitidos ou proibidos, visando como finalidade principal a tranquilidade pblica e garantindo a convivncia harmnica dos maisvariados grupos sociais. Dentro desse conjunto de normas, destaca-se o Princpio da Legalidade, consagrado em nossa Constituiono art. 5, inciso II - ningum ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa seno em virtude de lei.

    Alexandre Rezende da Silva, em artigo intitulado " Princpio da Legalidade", publicado em agosto de 2002, no stio eletrnico JusNavigandi, nos ensina que: " o Princpio da Legalidade a expresso maior do Estado Democrtico de Direito, a garantia vitalde que a sociedade no est presa s vontades particulares, pessoais, daquele que governa. Seus efeitos e importncia sobastante visveis no ordenamento jurdico, bem como na vida social. O Devido Processo Legal e a Reserva Legal so os seus maisimportantes desdobramentos. na Administrao Pblica que se percebe o quanto importante este princpio, posto que aque o Estado se faz sentir mais diretamente junto aos cidados. Trata-se do princpio maior do nosso sistema legal, que, como osistema que , tem vrios princpios norteadores, os quais atingem tanto a aplicao do Direito como a sua elaborao."

    Segundo o renomado jurista Luis Roberto Barroso, in Princpio da Legalidade, Delegaes Legislativas, Poder Regulamentar,Repartio Constitucional das Competncias Legislativas, artigo extrado do site Infojus, - www.infojus.com.br: "O Estado deDireito, desde suas origens histricas, envolve associado ao princpio da legalidade, ao primado da lei, idealmente concebidacomo expresso da vontade geral institucionalizada".

    "Neste sentido, na busca de uma efetiva vida em sociedade preciso que cada funo do Poder respeite o limite das outrasfunes, sob pena de uma quebra do equilbrio das funes pblicas que essencial para a existncia do denominado EstadoDemocrtico de Direito.

    Por fora destas premissas, que no decorrer dos anos tm se mostrado verdadeiras, se uma pessoa comete um ilcito, civil, penal,administrativo, tributrio, ou qualquer outro, somente poder ser processada e julgada pelo Poder Judicirio, onde devero serassegurados a ampla defesa e o contraditrio com todos os recursos a eles inerentes.

    A observncia dos princpios processuais no significa a busca da impunidade e nem mesmo um incentivo criminalidade. Se oEstado estiver devidamente aparelhado este conseguir por meio de procedimentos lcitos produzir as provas necessrias quepossam demonstrar a culpabilidade de um acusado, ainda que o crime praticado pelo infrator possa causar repulsa aos seussemelhantes em razo de preceitos ticos ou morais.

    A partir do momento em que existe a quebra de todos as garantias estabelecidas na Constituio Federal pode-se afirmar que oEstado de Direito tambm est sendo fragilizado, uma vez que as Instituies perdem o seu sentido e a promoo da Justia transferida para terceiras pessoas, o que fere o princpio da imparcialidade e do devido processo legal.

    A liberdade de informao um direito do cidado, mas esta liberdade no pode e no deve ultrapassar os limites que tambmforam estabelecidos no texto constitucional, como o respeito a dignidade da pessoa humana, a integridade fsica, a preservaoda vida, a preservao da imagem, entre outros direitos fundamentais que se encontram enumerados no artigo 5, da ConstituioFederal, e tambm nos instrumentos internacionais que foram subscritos pelo Brasil, como a Conveno Americana de DireitosHumanos, Pacto de So Jos da Costa Rica.

    A busca ou mesmo a transmisso de uma informao no pode e no deve ser confundida com uma execrao pblica, ou mesmocomo a realizao de julgamentos antecipados, com a imposio de penas que no so provenientes do Poder Judicirio, rgocompetente para processar e julgar uma pessoa na Repblica Federativa do Brasil.

    ...omissis...

    Todos crimes devem ser reprimidos pelo Estado na busca da manuteno e preservao da ordem pblica e da paz social, maisisto no significa que o Estado possa fazer justia com as prprias mos. Os acusados ainda que tenham praticado crimesconsiderados hediondos devem ser processados e julgados em conformidade com a Lei, que o instrumento escolhido pelasociedade para a resoluo dos conflitos sociais.

    ...omissis...

    Os postulados ora apresentados fazem parte daquilo que as pessoas muitas vezes at mesmo sem ter o pleno conhecimento ou oalcance do significado costumam chamar de Estado Democrtico de Direito. Nesta espcie de Estado, o principal mandamento a Lei, a qual deve ser cumprida e respeitada.

    O devido processo legal no se confunde com a impunidade, e todos os infratores devem ser condenados, mas as pessoasindependentemente do crime praticado possuem o direito lquido e certo de se defenderem, o que no significa que ao final deum processo se provado a autoria e materialidade do ilcito, as pessoas ficaro livres do cumprimento de uma pena.

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  • Apesar de todas essas consideraes, se a sociedade chegar a concluso que os princpios estabelecidos na Constituio Federalno possuem eficcia, e que estes princpios no devem mais ser observados e respeitados preciso ento que a Justia, aLiberdade, a Democracia, sejam abandonadas e que se proceda a um retrocesso no tempo e no espao e se volte a promover aJustia na sociedade com o emprego das prprias mos, tendo como base o princpio do olho por olho, dente por dente.

    Uma anlise imparcial dos fatos leva concluso que na realidade o que precisa ser feito um aprimoramento do sistema, sejana funo executiva, legislativa, ou judiciria, uma vez que a sociedade somente pode conviver em paz e em harmonia, buscandoa realizao dos objetivos coletivos e individuais, e at mesmo nacionais, quando tem como base a Lei e tambm um sistemajurdico.

    ...omissis...

    Assim funciona o Estado Democrtico de Direito que foi o sistema escolhido pelo legislador constituinte originrio quando dapromulgao da Constituio da Repblica Federativa do Brasil, no dia 5 de outubro de 1988. Somente no Estado de Direito que permite esse tipo de discusso, pois fora do imprio da lei no existe democracia, e tambm no existe liberdade, e ainda noexiste devido processo legal. Pode-se afirmar que a Justia pelas prprias mos causa muito mais mal e muito mais sofrimentosdo que a observncia dos preceitos processuais que foram estabelecidos quando da promulgao da vigente ConstituioFederal. (ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues, disponvel na internet www.ibccrim.org.br, 14.08.2006.)."

    Ora, se uma lei determina, expressamente, frise-se bem, as funes e o modus operandi da ABIN, no aceitvel que tais limitaessejam extrapoladas, ainda mais, porque o rol de funes disposto na Lei no permite uma interpretao elstica e emdesconformidade com o esprito do legislador.

    No se pode admitir que em um Estado Democrtico de Direito, margem da lei e de vrios Princpios consagrados, como o dalegalidade, do devido processo legal e da impessoalidade, se corrobore com o direcionamento e, por que no dizer, com o compl,de uma investigao criminal que ultrapassou todos os limites legais, tornando-se, ouso dizer, uma querela pessoal para incriminardeterminada pessoa, valendo-se, para tanto, do uso efetivo de agentes da ABIN e at de um ex-servidor do finado SNI, por parte daautoridade administrativa, em induvidoso e inaceitvel desvio de poder, maculando todo e qualquer ato administrativo ouinvestigativo praticado.

    E mais. O Delegado Protgenes Queiroz, encarregado de chefiar as investigaes da Operao Satiagraha, at por dever de ofcio,deveria atuar nos estritos limites da legislao vigente e dentro dos Princpios j mencionados, especialmente, o da Impessoalidade.Alis e a propsito, valiosa a lio de Jos dos Santos Carvalho Filho, in Processo Administrativo Federal, 3 Edio, Ed. LumenJuris:

    " ... omissis...Em relao ao processo administrativo, certo que, embora nem sempre haja litgio a ser solvido, h interesses e direitos dosadministrados a serem resguardados, de modo que no e de menor relevncia a situao de equidistncia exigida doadministrador em relao aos interessados. Em outras palavras, o administrador deve situar-se em condio jurdica de nveltal que possa transmitir confiana aos administrados para enfrentar as questes e os pedidos a seu cargo, sem que suaatuao desperte suspeitas e desconfianas por parte daqueles que precisam socorrer-se do processo administrativo.Se o administrador no tem imparcialidade para conduzir e decidir processos administrativos porque favorece ou prejudica ointeressado, conduta totalmente antagnica ao objetivo que lhe deve nortear a atividade , ou seja, o interesse pblico.Vcio dessa ordem revela claro desvio de poder, conduta ilegal que deve ser corrigida na via administrativa ou judicial."(grifei)

    Sobre o mesmo tema trago, ainda, transcrio da obra "O controle dos Atos Administrativos", de Juarez Freitas, 4 Edio, 2009,Editora Malheiros, p. 82, perfeitamente adequada situao em anlise:

    "...omissis...Segundo o princpio em tela, a Administrao Pblica precisa dispensar tratamento isonmico a todos, sem privilgiosesprios, tampouco manobras persecutrias, sequer as movidas por supostas boas intenes. Intenta-se a instaurao,a cimade sinuosos personalismos, do governo dos princpios e dos objetivos fundamentais, em lugar do idiossincrtico imprio'emotivista' dos projetos de cunho faccioso, antagnicos, por definio, filosofia da boa administrao."

    No foi por motivo diverso que o douto Procurador da Repblica, que opinou nos autos, asseverou de forma categrica:

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  • " ... omissis...13. Sim, porque como rgo central do Sistema Brasileiro de Inteligncia (Lei n 9883, de 1999, atr. 3, caput), a AgnciaBrasileira de Inteligncia - ABIN - no deve, sob nenhum pretexto, atuar alm de sua competncia institucional, que se encerra:(i) no conhecimento e na execuo de aes, sigilosas ou no, destinadas colheita e anlise de informes, que vierem a serconsiderados necessrios ou teis ao assessoramento da Presidncia da Repblica; (ii) no planejamento, na execuo e naproteo de conhecimentos sensveis, relativos segurana do Estado e da sociedade; (iii) na avaliao de ameaas, internas eexternas, ordem constitucional; e (iv) na formao e desenvolvimento de recursos humanos, na elaborao de uma doutrina deinteligncia e na realizao de estudos em ordem a aprimor-la ( Lei n 9883, de 1999), art. 4, caput, I a IV)14. natureza exauriente desse elenco de atribuies, cabe agregar o bice ao compartilhamento dos dados, coligidos emrazo do seu exerccio, que s pode ser removido pelo Chefe do Gabinete Institucional da Presidncia da Repblica, embenefcio das autoridades dotadas de poderes para solicit-los, que, mesmo assim, comprometem-se com a guarda do sigilolegalmente imposto, pena da trplice responsabilidade administrativa, civil e criminal ( Lei n 9893, de 1999, art. 9, caput, e 1 e 2)....omissis...16. Remarque-se: uma coisa a Agncia Brasileira de Inteligncia - ABIN - representar ao Departamento de Polcia Federal,sugerindo que as autoridades, nele lotadas, cuidem de desvendar um fato de que os seus agentes vieram a tomar conhecimento;outra, bem diferente, ocultar pessoas a seu servio em investigaes em curso, com o fito de propiciar a prtica, por elas, deatos reservados a agentes policiais, a exemplo da manipulao e da anlise de dilogos captados por eficincia deinterceptaes telefnicas, como ocorreu no caso vertente" (fls. 2.7312.733 - vol. 11) (grifos nos original)

    Por todas essas consideraes, parece-me que est claramente demonstrado que: (i) no funo da ABIN investigar possveiscrimes que no tenham qualquer conexo com assuntos de interesse nacional, como no caso concreto e (ii) inadmissvel aparticipao de um investigador particular contratado diretamente pelo Delegado encarregado de chefiar a operao e pago comdinheiro pblico, o que nos leva a uma nica e possvel concluso: a ABIN extrapolou suas funes ao participar das investigaesda Operao Satiagraha.

    Apenas a ttulo informativo, a investigao instaurada para averiguar os excessos cometidos pelo Delegado responsvel pelaoperao, resultou, pelo Juzo da eg. 7 Vara Criminal de So Paulo, nos autos n 0011893-69.2008.4.03.61681, na sua condenaopela prtica dos crimes de violao de sigilo funcional e fraude processual, arts. 325, 2, e 347, cc arts. 69 e 71, todos do CdigoPenal, pena privativa de liberdade de 3 (trs) anos e 11 (onze) meses, sendo 2 (dois) anos de deteno, a ser cumprida em regimeprisional aberto, ficando substituda pelas restritivas de direitos de prestao de servios comunidade e proibio de exerccio demandato eletivo, cargo, funo ou atividade pblica, conforme assinalado acima, e pena pecuniria de 52 (cinquenta e dois)dias-multa, no valor unitrio de um salrio mnimo, corrigida monetariamente a partir do trnsito em julgado da sentena. Alm do jexposto, a perda do cargo pblico ocupado pelo acusado no Departamento de Polcia Federal, nos termos do art. 92, I, do CdigoPenal, bem como o pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais) a ttulo de reparao dos danos morais causados coletividade.

    Ressalto que o processo acima se encontra em grau de recurso no e. STF, tendo sido distribudo em. Ministra Ellen Gracie, emfevereiro do corrente ano.

    Por estas razes, tenho que todas as provas colhidas por agentes da ABIN e pelo investigador particular contratado indevidamente, no curso da operao, so ilcitas.

    Podemos definir prova ilcita como sendo aquela obtida com violao de regra ou princpio constitucional.

    Em relao s provas ilcitas, nosso ordenamento jurdico adotou o sistema da inadmissibilidade das obtidas por meios ilcitos, ouseja, toda e qualquer prova nessa situao no poderia, em tese, sequer, ingressar nos autos, conforme o disposto nos arts. 5, LVI,da Constituio Federal e 157, do Cdigo de Processo Penal. E, na hiptese de vir a acontecer, ela deve ser excluda (exclusionaryrules).

    Consoante LUIZ FRANCISCO TORQUATO AVOLIO, a prova ilcita, em sentido estrito, pode ser definida como a prova colhidainfringindo-se normas ou princpios colocados pela CF e pelas leis, freqentemente para a proteo das liberdades pblicas edos direitos da personalidade e daquela sua manifestao que o direito intimidade. (AVOLIO, Luiz Francisco Torquato.Provas ilcitas - interceptaes telefnicas e gravaes clandestinas. 2. ed. So Paulo: RT, 1999, p. 43.)

    Uma vez reconhecida a ilicitude das provas colhidas, necessrio verificar os desdobramentos da advindos.

    A Teoria dos Frutos da rvore Envenenada ( The fruit of the poisonus tree) teve origem na Suprema Corte Americana, que adotou oentendimento de que os vcios da "rvore so transmitidos aos seus frutos", ou seja, havendo uma origem ilcita, como in casu, uma

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  • investigao eivada de inconstitucionalidade, toda a prova dela decorrente, mesmo que no ilcita em si, no poder ser admitida,pois j estaria contaminada.

    Alis, o 1, do art. 157, do Cdigo de Processo Penal, com a redao dada pela Lei n 11.69008, admite a adoo da Teoria dosFrutos da rvore Envenenada, ressalvando a hiptese de no se comprovar o nexo de causalidade entre as provas derivadas e asilcitas ou caso as derivadas possam ser obtidas por intermdio de uma fonte diversa das ilcitas.

    Discute-se muito acerca da aplicabilidade da teoria ao Direito Ptrio. No entanto, o excelso Supremo Tribunal Federal j semanifestou sobre o tema, em brilhante voto da lavra do em. Ministro Seplveda Pertence, cuja ementa transcrevo a seguir:

    "PROVA ILCITA: ESCUTA TELEFNICA MEDIANTE AUTORIZAO JUDICIAL: AFIRMAO PELA MAIORIA DAEXIGNCIA DE LEI, AT AGORA NO EDITADA, PARA QUE, "NAS HIPTESES E NA FORMA" POR ELA ESTABELECIDAS,POSSA O JUIZ, NOS TERMOS DO ART. 5., XII, DA CONSTITUIO, AUTORIZAR A INTERCEPTAO DE COMUNICAOTELEFNICA PARA FINS DE INVESTIGAO CRIMINAL; NO OBSTANTE, INDEFERIMENTO INICIAL DO HABEAS CORPUSPELA SOMA DOS VOTOS, NO TOTAL DE SEIS, QUE, OU RECUSARAM A TESE DA CONTAMINAO DAS PROVASDECORRENTES DA ESCUTA TELEFNICA, INDEVIDAMENTE AUTORIZADA, OU ENTENDERAM SER IMPOSSVEL, NA VIAPROCESSUAL DO HABEAS CORPUS, VERIFICAR A EXISTNCIA DE PROVAS LIVRES DA CONTAMINAO E SUFICIENTESA SUSTENTAR A CONDENAO QUESTIONADA; NULIDADE DA PRIMEIRA DECISO, DADA A PARTICIPAO DECISIVA,NO JULGAMENTO, DE MINISTRO IMPEDIDO (MS 21.750, 24.11.93, VELLOSO); CONSEQUENTE RENOVAO DOJULGAMENTO, NO QUAL SE DEFERIU A ORDEM PELA PREVALNCIA DOS CINCO VOTOS VENCIDOS NO ANTERIOR, NOSENTIDO DE QUE A ILICITUDE DA INTERCEPTAO TELEFNICA - A FALTA DE LEI QUE, NOS TERMOSCONSTITUCIONAIS, VENHA A DISCIPLIN-LA E VIABILIZ-LA - CONTAMINOU, NO CASO, AS DEMAIS PROVAS, TODASORIUNDAS, DIRETA OU INDIRETAMENTE, DAS INFORMAES OBTIDAS NA ESCUTA (FRUITS OF THE POISONOUSTREE), NAS QUAIS SE FUNDOU A CONDENAO DO PACIENTE." (HC 69912 segundo RS, Relator Min. SEPLVEDAPERTENCE, Julgamento: 16121993 rgo Julgador: Tribunal Pleno, Publicao DJ 25-03-1994 PP-06012, EMENT VOL-01738-01 PP-00112 RTJ VOL-00155-02 PP-00508)

    Nesse mesmo sentido, cita-se brilhante precedente da lavra da i. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, verbis:

    "PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. 1. AO PENAL INSTAURAO. BASE EM DOCUMENTAOAPREENDIDA EM DILIGNCIA CONSIDERADA ILEGAL PELO STF E STJ. AES PENAIS DISTINTAS. IRRELEVNCIA.PRINCPIOS DA ISONOMIA E SEGURANA JURDICA. 2. ILICITUDE DA PROVA DERIVADA. TEORIA DA RVORE DOSFRUTOS ENVENENADOS. DENNCIA OFERECIDA COM BASE EM PROVA DERIVADA DA PROVA ILCITA.IMPOSSIBILIDADE. TRANCAMENTO. 3.ORDEM CONCEDIDA.1.Tendo o STF declarado a ilicitude de diligncia de busca e apreenso que deu origem a diversas aes penais, impe-se aextenso desta deciso a todas as aes dela derivadas, em atendimento aos princpios da isonomia e da segurana jurdica.2. Se todas as provas que embasaram a denncia derivaram da documentao apreendida em diligncia considerada ilegal, de se reconhecer a imprestabilidade tambm destas, de acordo com a teoria dos frutos da rvore envenenada, trancando-se aao penal assim instaurada.3. Ordem concedida para trancar a ao penal em questo, estendendo, assim, os efeitos da presente ordem tambm ao co-ru namesma ao LUIZ FELIPE DA CONCEIO RODRIGUES." (HC 100.879RJ, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA,SEXTA TURMA, julgado em 19082008, DJe 08092008) (grifei)

    Na mesma linha de entendimento, merecem destaque, ainda, os seguintes precedentes desta Corte Superior:

    "HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. DELITO DE FALSIDADE IDEOLGICA. PEDIDO DE TRANCAMENTO DA AOPENAL. "PRIVILGIO CONSTITUCIONAL CONTRA A AUTO-INCRIMINAO: GARANTIA BSICA QUE ASSISTE GENERALIDADE DAS PESSOAS. A PESSOA SOB INVESTIGAO (PARLAMENTAR, POLICIAL OU JUDICIAL) NO SEDESPOJA DOS DIREITOS E GARANTIAS ASSEGURADOS" (STF, HC 94.082-MCRS, REL. MIN. CELSO DE MELLO, DJ DE25032008). PRINCPIO NEMO TENETUR SE DETEGERE. POSITIVAO NO ROL PETRIFICADO DOS DIREITOS EGARANTIAS INDIVIDUAIS (ART. 5., INCISO LXIII, DA CONSTITUIO DA REPBLICA): OPO DO CONSTITUINTEORIGINRIO BRASILEIRO DE CONSAGRAR, NA CARTA DA REPBLICA DE 1988, "DIRETRIZ FUNDAMENTALPROCLAMADA, DESDE 1791, PELA QUINTA EMENDA [ CONSTITUIO DOS ESTADOS UNIDOS DA AMRICA], QUECOMPE O BILL OF RIGHTS" NORTE-AMERICANO (STF, HC 94.082-MCRS, REL. MIN. CELSO DE MELLO, DJ DE 25032008). PRECEDENTES CITADOS DA SUPREMA CORTE DOS ESTADOS UNIDOS: ESCOBEDO V. ILLINOIS (378 U.S. 478,1964); MIRANDA V. ARIZONA (384 U.S. 436, 1966), DICKERSON V. UNITED STATES (530 U.S. 428, 2000). CASO MIRANDA V.ARIZONA: FIXAO DAS DIRETRIZES CONHECIDAS POR "MIRANDA WARNINGS", "MIRANDA RULES" OU "MIRANDA

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  • RIGHTS". DIREITO DE QUALQUER INVESTIGADO OU ACUSADO A SER ADVERTIDO DE QUE NO OBRIGADO APRODUZIR QUAISQUER PROVAS CONTRA SI MESMO, E DE QUE PODE PERMANECER EM SILNCIO PERANTE AAUTORIDADE ADMINISTRATIVA, POLICIAL OU JUDICIRIA. INVESTIGADA NO COMUNICADA, NA HIPTESE, DE TAISGARANTIAS FUNDAMENTAIS. FORNECIMENTO DE MATERIAL GRAFOTCNICO PELA PACIENTE, SEM OCONHECIMENTO DE QUE TAL FATO PODERIA, EVENTUALMENTE, VIR A SER USADO PARA FUNDAMENTAR FUTURACONDENAO. LAUDO PERICIAL QUE EMBASOU A DENNCIA. PROVA ILCITA. TEORIA DOS FRUTOS DA RVOREENVENENADA (FRUITS OF THE POISONOUS TREE). ORDEM CONCEDIDA....omissis...6. Evidenciado nos autos que a Paciente j ostentava a condio de investigada e que, em nenhum momento, foi advertida sobreseus direitos constitucionalmente garantidos, em especial, o direito de ficar em silncio e de no produzir provas contra simesma, resta evidenciada a ilicitude da nica prova que embasou a condenao. Contaminao do processo, derivada daproduo do laudo ilcito. Teoria dos frutos da rvore envenenada.7. Apenas advirta-se que a observncia de direitos fundamentais no se confunde com fomento impunidade. mister essencialdo Judicirio garantir que o jus puniendi estatal no seja levado a efeito com mculas ao devido processo legal, para que aobservncia das garantias individuais tenha eficcia irradiante no seio de toda a sociedade, seja nas relaes entre o Estado ecidados ou entre particulares (STF, RE 201.819RS, 2. Turma, Rel. Min. ELLEN GRACIE, Rel. p Acrdo: Min. GILMARMENDES, DJ de 27102006).8. Ordem concedida para determinar o trancamento da ao penal, sem prejuzo do oferecimento de nova denncia com base emoutras provas." (HC 107.285RJ, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 09112010, DJe 07022011) (grifei)

    Assim, no h outro caminho a no ser a descontaminao da investigao, expurgando dos autos todos os elementos colhidos emdesconformidade com a lei.

    Em decorrncia dos desmandos e abusos praticados, as provas obtidas por meios ilcitos, circunstncia plenamente evidenciada, nopodem mais figurar nos autos do processo, sendo certo que a Constituio de 88 as repudiou, na dico contida em seu art. 5, LVI,ao estatuir como clusula ptrea o princpio de que so inadmissveis, no processo, as provas obtidas por meios ilcitos.

    Portanto, estamos diante de garantia que integra o postulado do devido processo legal, que exige, na apurao da prtica de umainfrao penal e de sua autoria, a observncia da forma legalmente prescrita na norma jurdica.

    A propsito, cabe transcrever o entendimento do Ministro do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello, ao assinalar, no RHC90376-3-RJ, Segunda Turma, Julgado em 030407:

    A ao persecutria do Estado, qualquer que seja a instncia de poder perante a qual se instaure, pararevestir-se de legitimidade, no pode apoiar-se em elementos probatrios ilicitamente obtidos, sob pena de ofensa garantiaconstitucional do due process of law, que tem, no dogma da inadmissibilidade das provas ilcitas, uma de suas maisexpressivas projees concretizadoras no plano do nosso sistema de direito positivo.

    No mesmo diapaso j posicionou-se Ada Pellegrini Grinover, in Nulidades no Processo Penal. 9 Ed. Revista dos Tribunais, SoPaulo, 2006, p. 145-146, ao enfatizar que o direito prova est limitado, na medida em que constitui as garantias docontraditrio e da ampla defesa, de sorte que o seu exerccio no pode ultrapassar os limites da lei e, sobretudo, daConstituio.

    Seguindo idntico prisma o magistrio da insigne professora ao discorrer em sua obra Liberdades Pblicas e Processo Penal Asinterceptaes telefnicas. Saraiva. 1976, pg.189, quando assinala a inadmissibilidade processual da prova ilcita torna-seabsoluta, sempre que a ilicitude consista na violao de uma norma constitucional, em prejuzo das partes ou de terceiros.Nesses casos, irrelevante indagar se o ilcito foi cometido por agente pblico ou por particulares, porque, em ambos os casos,a prova ter sido obtida com infringncia aos princpios constitucionais que garantem o direito da personalidade. Sertambm irrelevante indagar-se a respeito do momento em que a ilicitude se caracterizou (antes ou fora do processo ou nocurso do mesmo); ser irrelevante indagar-se se o ilcito foi cumprido contra a parte ou contra terceiro, desde que tenhaimportado em violao a direitos fundamentais; e ser, por fim, irrelevante indagar-se se o processo no qual se utilizariaprova ilcita deste jaez de natureza penal ou civil.

    Acompanhando a linha do pensamento de ADA PELLEGRINI GRINOVER, o Supremo Tribunal Federal, julgando o habeascorpus 90.376-2, em brilhante voto da lavra do e. Ministro Celso de Mello, assim decidiu:

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  • Prova penal. BANIMENTO CONSTITUCIONAL DAS PROVAS ILCITAS (CF, ART. 5o. LVI) ILICITUDE (ORIGINRIA E PORDERIVAO) INADMISSIBILIDADE BUSCA E APREENSO DE MATERIAIS E EQUIPAMENTOS REALIZADA, SEMMANDATO JUDICIAL, EM QUARTO DE HOTEL AINDA OCUPADO IMPOSSIBILIDADE (...) GARANTIA QUE TRADUZLIMITAO CONSTITUCIONAL AO PODER DO ESTADO EM TEMA DE PERSECUO PENAL, MESMO EM SUA FASEPR-PROCESSUAL (...) PROVA ILCITA INIDONEIDADE JURDICA (...) PORQUE IMPREGNADA DE ILICITUDEORIGINRIA. Doutrina. Precedentes (STF). ILICITUDE DA PROVA INADMISSIBILIDADE DE SUA PRODUO EM JUZO(OU PERANTE QUALQUER INSTNCIA DE PODER) INIDONEIDADE JURDICA DA PROVA RESULTANTE DATRANSGRESSO ESTATAL AO REGIME CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS. A aopersecutria do Estado, qualquer que seja a instncia de poder perante a qual se instaure, para revestir-se de legitimidade, nopode apoiar-se em elementos probatrios ilicitamente obtidos, sob pena de ofensa garantia constitucional do due process oflaw, que tem, no dogma da inadmissibilidade das provas ilcitas, uma de suas mais expressivas projees concretizadoras noplano do nosso sistema de direito positivo. A Constituio da Repblica, em norma revestida de contedo vedatrio (CF, art. 59,LVI), desautoriza, por incompatvel com os postulados que regem uma sociedade fundada em bases democrticas (CF, art.1o.),qualquer prova cuja obteno, pelo Poder Pblico, derive de transgresso a clusulas de ordem constitucional, repelindo, porisso mesmo, quaisquer elementos probatrios que resultem de violao do direito material (ou, at mesmo, do direito processual),no prevalecendo, em consequncia, no ordenamento normativo brasileiro, em matria de atividade probatria, a frmulaautoritria do male captum, bene retentum. Doutrina. Precedentes. A QUESTO DA DOUTRINA DOS FRUTOS DA RVOREENVENENADA (FRUITS OF THE POISONOUS TREE): A QUESTO DA ILICITUDE POR DERIVAO. Ningum pode serinvestigado, denunciado ou condenado com base, unicamente, em provas ilcitas, quer se trate de ilicitude originria, quer secuide de ilicitude por derivao. Qualquer novo dado probatrio, ainda que produzido, de modo vlido, em momentosubsequente, no pode apoiar-se, no pode ter fundamento causal nem derivar de prova comprometida pela mcula da ilicitudeoriginria. A excluso da prova originariamente ilcita ou daquela afetada pelo vcio da ilicitude por derivao representaum dos meios mais expressivos destinados a conferir efetividade garantia do due process of Law e a tornar mais intensa,pelo banimento da prova ilicitamente obtida, a tutela constitucional que preserva os direitos e prerrogativas que assistem aqualquer acusado em sede processual penal. Doutrina. Precedentes. A doutrina da ilicitude por derivao (teoria dos frutosda rvore envenenada) repudia, por inconstitucionalmente inadmissveis, os meios probatrios, que, no obstante produzidos,validamente, em momento ulterior, acham-se afetados, no entanto, pelo vcio (gravssimo) da ilicitude originria, que a eles setransmite, contaminando-os, por efeito da repercusso causal. Hiptese em que os novos dados probatrios somente foramconhecidos pelo Poder Pblico, em razo de anterior transgresso praticada, originariamente, pelos agentes da persecuopenal, que desrespeitaram a garantia constitucional. (...) Revelam-se inadmissveis, desse modo, em decorrncia da ilicitude porderivao, os elementos probatrio a que os rgo da persecuo penal somente tiveram acesso em razo da provaoriginariamente ilcita, obtida como resultado da transgresso, por agentes estatais, de direitos e garantias constitucionais elegais, cuja eficcia condicionante, no plano do ordenamento positivo brasileiro, traduz significativa limitao de ordem jurdicaao poder do Estado em face dos cidados.

    No foi outro o sentido dado pela Lei 11.69008, que traduziu, de forma expressa, o mandamento constitucional que ordena odesentranhamento das provas obtidas por meios ilcitos, estabelecendo no art. 157, do Cdigo de Processo Penal, a seguinte redao:

    So inadmissveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilcitas, assim entendidas as obtidas emviolao a normas constitucionais ou legais.

    Gostaria de registrar, antes de finalizar o voto, que no se trata de mais um caso rumoroso que ficou impune. No! Na realidade, oseventuais delitos cometidos pelo ora paciente podem e devem ser investigados e, se comprovados, julgados, desde que observadosSEMPRE E EM QUALQUER CASO, a legalidade dos mtodos empregados na busca da verdade real, respeitando-se o EstadoDemocrtico de Direito e os Princpios da Legalidade, da Impessoalidade e do Devido Processo Legal.

    No caso em exame, inquestionvel o prejuzo acarretado pelas investigaes realizadas em desconformidade com as normas legais,e no convalescem, sob qualquer ngulo que seja analisada a questo, porquanto manifesta a nulidade das diligncias perpetradaspelos agentes da ABIN e um ex-agente do SNI, ao arrepio da lei.

    Insta assinalar, por oportuno, que o juiz deve estrita fidelidade lei penal, dela no podendo se afastar a no ser queimprudentemente se arrisque a percorrer, de forma isolada, o caminho tortuoso da subjetividade que, no poucas vezes, desembocana odiosa perda da imparcialidade.

    Num estado de direito efetivo e verdadeiro, o magistrado deve julgar sem paixes e em absoluta sintonia com a estrutura normativaexistente, mesmo porque no lhe cabe legislar, mas apenas aplicar as regras elaboradas por outro poder, o legislativo, que na

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  • sistemtica adotada pela nossa Constituio Federal, no seu art. 2, tambm goza de independncia, consoante a lio advinda doprincpio da separao de poderes.

    Ora, se todos so iguais perante a lei, em consonncia com o princpio da isonomia insculpido no art. 5 da Lei Maior, no se podeaceitar que uma investigao manipulada, realizada a lattere, discriminatria em sua essncia e inspirada em interesses ilegtimos,tais como motivaes polticas e eleitoreiras, possa gerar consequncias desastrosas, atingindo a liberdade das pessoas e asgarantias processuais, independentemente de quem esteja sendo processado e da natureza da infrao penal atribuda ao paciente.

    Assim, no caso em exame, induvidoso que as investigaes efetivadas pela ABIN, fora de suas atribuies legais elencadas elimitadas, expressamente, no art. 4, da Lei 9.88399, em verdadeira usurpao de suas funes e com indisfarvel desvio de poder,na medida em que foi contratado um ex-agente do SNI para realizar atos prprios da polcia judiciria e, o que mais grave, pagocom verbas secretas, ou seja, dinheiro pblico, sem previso legal para tanto, constituem uma das mais graves violaes aoEstado Democrtico de Direito.

    Portanto, inexistem dvidas de que as referidas provas esto irremediavelmente maculadas, devendo ser consideradas ilcitas einadmissveis, circunstncias que as tornam destitudas de qualquer eficcia jurdica, consoante j demonstrado acima peladoutrina pacfica e lastreada na torrencial jurisprudncia dos nossos tribunais.

    evidncia, no h como embasar uma denncia ou a formao do convencimento do juiz para uma prestao jurisdicional revestidada indispensvel imparcialidade inerente a todos que exercem, com grandeza e dignidade, a nobre misso de julgar, semsubjetivismos ou tendncias ideolgicas que no condizem com o verdadeiro sentimento de justia.

    Jamais presenciei, eminentes Ministros, ao defrontar-me com um processo, tamanho descalabro e desrespeito a normasconstitucionais intransponveis e a preceitos legais.

    Pelo exposto, concedo a ordem para anular, todas as provas produzidas, em especial a dos procedimentos n2007.61.81.010208-7 (monitoramento telefnico), n 2007.61.81.011419-3 (monitoramento telefnico), e n2008.61.81.008291-3 (ao controlada), e dos demais correlatos, anulando tambm, desde o incio, a ao penal, na mesmaesteira do bem elaborado parecer exarado pela douta Procuradoria da Repblica.

    como voto.

    CERTIDO DE JULGAMENTOQUINTA TURMA

    Nmero Registro: 20090192565-8 HC 149.250 SP

    Nmeros Origem: 200761810012852 200761810102087 200761810114193 200803000441657 200861810082834 200861810082913 200861810089191 200861810089361 200861810089968 200861810090028 200861810097333 200861810101361 200861810101695 200861810108264 200861810114343 200861810126370 200861810134998

    MATRIA CRIMINALEM MESA JULGADO: 01032011

    RelatorExmo. Sr. Ministro ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJRJ)

    Presidente da SessoExmo. Sr. Ministro JORGE MUSSI

    Subprocurador-Geral da RepblicaExmo. Sr. Dr. OZRIO SILVA BARBOSA SOBRINHO

    SecretrioBel. LAURO ROCHA REIS

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  • AUTUAO

    IMPETRANTE : ANDREI ZENKNER SCHMIDT E OUTROSADVOGADO : TIAGO CEDRAZ LEITE OLIVEIRAIMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIOPACIENTE : DANIEL VALENTE DANTAS

    ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Praticados por Particular Contra a Administrao em Geral - Corrupo ativa

    SUSTENTAO ORAL

    SUSTENTOU ORALMENTE: DR. ANDREI ZENKNER SCHMIDT (P PACTE)

    CERTIDO

    Certifico que a egrgia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epgrafe na sesso realizada nesta data, proferiu a seguintedeciso:

    "Aps o voto do Sr. Ministro Relator concedendo a ordem, no que foi acompanhado pelo voto antecipado do Sr. Ministro NapoleoNunes Maia Filho, pediu vista o Sr. Ministro Gilson Dipp."Aguardam os Srs. Ministros Laurita Vaz e Jorge Mussi.

    HABEAS CORPUS N 149.250 - SP (20090192565-8)

    RELATOR : MINISTRO ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DOTJRJ)

    IMPETRANTE : ANDREI ZENKNER SCHMIDT E OUTROS

    ADVOGADO : TIAGO CEDRAZ LEITE OLIVEIRA

    IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIO

    PACIENTE : DANIEL VALENTE DANTAS

    VOTO

    (MINISTRO NAPOLEO NUNES MAIA FILHO)

    1.Senhor Presidente, com sua permisso.

    2.Ouvi com a mxima ateno o voto do douto Relator e acho-me sob o impacto de sua erudio.

    3.Senhor Presidente, por favor, algum tempo atrs em livro que merecidamente no teve nenhumarepercusso escrevi o seguinte:

    Ningum diverge da proclamao, alis, enfatizada em muitas decises judiciais e igualmente numerosaslies de oradores mais excelentes que a criminalidade de qualquer nvel ou natureza deve ser combatidacom denodo e eficincia constantes e crescentes, mas esse objetivo essencial a segurana e a sociedadeno poder servir de biombo para ocultar as suas causas e nem justificativa moralmente idnea para que asautoridades responsveis pela sua consecuo procedam com brutalidade, disfarando na eficincia doformalismo e do procedimento a conflituosidade real que se manifestam na apurao da prtica de ilcitos.A atividade incontrolada da investigao ou a sua realizao segundo as percepes particulares dosinvestigadores quanto ao sistema de garantia jurdica dos investigados sob a alegao pragmtica de

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  • realizaes produtivas conduz a mistificao daquela conflituosidade real e a eleio dos inimigos dosistema, permitindo transcender para a esfera do formalismo ou para a razo normativa formalmenteonipotente todos angustiantes problemas humanos das pessoas sob investigao.

    4.Contudo, Senhor Presidente, parece fora de dvida que a indispensvel tarefa de coleta desses dados ouelementos indiciveis de crimes somente se pode realizar, sob pena de invalidade, com a observncia deregras imperativas, cuja infrao torna juridicamente desvalioso o rduo e difcil trabalho de suaidentificao e coleta, independentemente de quais sejam os resultados apurados. Senhor Presidente, nessecaso, tenho como induvidosa, em face do voto do eminente Ministro Relator, a participao de servidores daABIN na operao policial de que se trata. Verifico tambm um esforo imenso para se legitimar a posterioriessa participao, chegando-se at mesmo, surpreendentemente, a assemelhar a ABIN ao MinistrioPblico, no que tange ao poder de investigar. Com isso, no posso de maneira alguma concordar; sei queno se pode evitar os abusos, mas se pode combat-los e o combate eficaz a nulificao do seu resultado.

    5.Por isso, peo vnia para acompanhar antecipadamente o voto do eminente Ministro Relator edesculpando-me com o eminente Ministro Gilson Dipp, que pediu vista. Sei que usual aguardar-se o votodo julgador que pede vista.

    6.Senhor Presidente, nesse caso, em vista do impacto que me causou o voto do eminente Ministro Relatorde mais de quase duas horas de erudio, preciso, demonstrao minuciosa de toda operao e oreconhecimento da participao dos servidores da ABIN, pelo Ministrio Pblico, pelo Juiz e por autoridadesoutras, peo desculpas mais uma vez ao Ministro Gilson Dipp e aos demais pares para assim me manifestar.

    7.Agradeo a V. Exa e acompanho o voto do Senhor Ministro Adilson Vieira Macabu, concedendo a ordem dehabeas corpus.

    HABEAS CORPUS N 149.250 - SP (20090192565-8) (f)

    VOTO-VISTA

    O EXMO. SR. MINISTRO GILSON DIPP:

    O paciente foi denunciado perante a Justia Federal pela atribuda prtica do crime de corrupo ativa, previsto no art. 333, caput,combinado com o art. 29, caput do Cdigo Penal. A ao penal que se instaurou terminou pela condenao do paciente, pendenteainda o julgamento da apelao apresentada contra a mesma sentena.Entrementes, com respeito aos procedimentos de investigao prvios ao penal, foi impetrado junto ao Tribunal RegionalFederal da 3 Regio pedido de habeas-corpus (HC 34.848SPTRF3) buscando livrar o paciente de alegada insanvel nulidade dasentena, haja vista a atuao da ABIN na investigao preparatria, de natureza policial penal. Em face disso, alegaram mais: todasas provas colhidas ao longo da operao correspondente deveriam ser consideradas ilcitas e portanto inadmissveis e ineficazes,sendo destitudas de valor jurdico.A ordem contudo foi denegada pelo Regional ao fundamento de que o magistrado apontado como coator e a autoridade policialnegavam esse fato e porque no havia nos autos documentos capazes de evidenci-lo, resumindo-se a prova das supostas arguies arecortes de jornal.Disse o Tribunal que, mesmo quando tivesse havido a colaborao da Agncia, esta se deu de forma secundria sendo todas asmedidas de apurao promovidas pela autoridade policial e, conforme o caso, deferidas pela autoridade judicial.Alm disso, assentou a Corte local, o compartilhamento de informaes medida rotineira entre diversas instituies e a PolciaFederal (v.g. IBAMA, INSS, BACEN, CVM, Receita Federal, e outros estaduais ou municipais).Em resumo, a 5 Turma do TRF3 Regio considerou a inexistncia de ilegalidade ou abuso de poder na sentena proferida pelaautoridade tida por coatora, o Juiz Federal da 6 Vara Federal de So Paulo.

    Eis a ementa do julgado, que foi confirmado por embargos declaratrios:

    HABEAS CORPUS PENAL E PROCESSO PENAL PARTICIPAO DE SERVIDORES DA AGNCIA BRASILEIRA DEINFORMAO (ABIN) EM INQURITO CONDUZIDO PELA POLCIA FEDERAL AUSNCIA DE PROVA PR-CONSTITUDA

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  • LEI 9.88399 QUE PERMITE COMPARTILHAMENTO DE DADOS ENTRE RGOS INTEGRANTES DO SISTEMABRASILEIRO DE INTELIGNCIA NULIDADES VERIFICADAS NA FASE PR-PROCESSUAL NO CONTAMINAM FUTURAAO PENAL ORDEMDENEGADA.1. Os impetrantes no instruram o writ com elementos de prova suficientes para que esta Corte, neste passo, emita juzo devalor sobre a participao, ou no, de servidores vinculados Agncia Brasileira de Informao (ABIN) nos procedimentosinvestigatrios, relacionados com a denominada Operao Satiagraha. E mesmo que, por hiptese, se prestassem a permitiruma concluso positiva, tais documentos no esclarecem em que medida se deu essa participao, a ponto de autorizar, j nestemomento, um exame da sua legalidade.2. A autoridade impetrada nega a participao de agentes da ABIN na persecuo penal n 2008.61.81.008291-3, amparando-se,inclusive, em declarao da prpria autoridade policial que presidiu as investigaes que culminaram na denncia formuladapelo Ministrio Pblico Federal. mngua de quaisquer outros elementos de convico, robustos o suficiente para provar ocontrrio, medida de rigor prestigiar as informaes apresentadas pela autoridade impetrada, pois aquela que se encontraem contato mais diretocom os fatos.3. No que diz respeito aos demais procedimentos investigatrios verifica-se que, em relao a eles, tambm no foramapresentados a esta Corte, elementos de convico suficientes o bastante para que seja avaliada a participao e eventualilegalidade dessa atividade, por parte dos agentes da ABIN. A impetrao no indica um nico fato especfico, concreto, no qualhouve a participao de agentes da ABIN. As informaes prestadas pela autoridade impetrada indicam que, se houveparticipao de agentes da ABIN nos demais procedimentos investigatrios que integram a operao em apreo, esta deu-se deforma secundria, incapaz de justificar qualquer alegao de nulidade de prova, especialmente porque ausente demonstraoconcreta de prejuzo, conforme se viu do trecho das informaes j transcritas nesta deciso. H que se ter em mente que premissa bsica do processo penal a regra segundo a qual no se declara nenhuma nulidade sem a demonstrao do prejuzo. Oartigo 563 do Cdigo de Processo Penal firme nesse sentido.4. No h prova acerca de um prejuzo concreto experimentado pelo paciente, pelo fato de servidores da Agncia Brasileira deInformao, hipoteticamente, terem conhecido do contedo de conversas telefnicas interceptadas. certo que esse fato pode atvir a gerar a responsabilizao funcional daquela autoridade que eventualmente violou o seu dever de sigilo, contudo, talviolao, no possui o condo de macular a prova como um todo.5. A Lei 9.88399 que instituiu o Sistema Brasileiro de Inteligncia indica a possibilidade de rgos componentes do aludidosistema, compartilharem informaes e dados relativos a situaes nas quaishaja interesse do estado brasileiro. Tanto a Polcia Federal como a ABIN, integram o Sistema Brasileiro de Inteligncia, como seinfere dos incisos III e IV do artigo 4 do Decreto n 4.37602, que regulamenta a Lei 9.88399.6. O compartilhamento de dados e informaes sigilosos entre os rgos encarregados da persecuo penal e outros rgosintegrantes do Estado, no novidade. Basta lembrar que, ordinariamente, IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dosRecursos Naturais Renovveis), Receita Federal, INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), BACEN (Banco Central do Brasil) eCVM (Comisso de Valores Mobilirios), os quais cita-se apenas a ttulo de exemplo, compartilham dados com a Polcia Federale o Ministrio Pblico Federal, visando o aprofundamento das apuraes criminais, e isso nunca causou perplexidade ousurpresa.7. Eventuais nulidades da fase pr-processual no possuem o condo de contaminar a ao penal. O Cdigo de Processo Penalconsagra a dispensabilidade do Inqurito Policial (artigo 39, 5), o que, tambm, robora o raciocnio de que eventuaisnulidades verificadas naquele mbito no contaminam a ao penal, que lhe posterior e ontologicamente distinta.8.Ordem denegada.

    A propsito, vale registrar que na discusso dos embargos declaratrios foi suscitada questo relacionada com o oferecimento deprovas pelos impetrantes na vspera do julgamento do habeas-corpus, as quais, contidas em CD-ROM, cuja leitura teria sido entoinvivel, deixaram de ser consideradas pelo Desembargador Relator.Sustentou-se nos declaratrios essa omisso, mas o argumento no prosperou pela razo antes indicada.Contra esse acrdo em habeas-corpus, que no acolheu as arguies contra a sentena condenatria, os impetrantes oferecem agorao presente habeas-corpus -- como se fosse originrio.O acrdo local transitou em julgado em 28.08.2009, e esta impetrao -- entrada no STJ em 30.09.2009 -- revela-se assimsubstitutiva de possvel recurso ordinrio naqueloutro habeas-corpus, por sua vez concomitante com a apelao ainda pendente dejulgamento no TRF3 Regio (Processo 0010136-40.2008.4.03.6181).Buscam os impetrantes, aqui, especificamente seja declarado ilegal o ato de julgamento do habeas-corpus anterior da 5 Turma doTRF3 Regio que deixou de reconhecer a nulidade dos procedimentos 2007.61.81.010208-7 (monitoramento