Orientações tecnicas PETI

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Ministrio do desenvolviMento social e coMbate FoMe

orientaes tcnicas

Gesto do ProGrama de erradicao do trabalho infantil no sUas

Braslia 2010

Presidente da Repblica Luiz Incio Lula da Silva Vice-presidente da Repblica Jose Alencar Gomes da Silva Ministra de Estado do Desenvolvimento Social e Combate Fome Marcia Helena Carvalho Lopes Secretrio Executivo Rmulo Paes de Souza Secretria de Avaliao e Gesto da Informao Luziele Tapajs Secretrio de Articulao para Incluso Produtiva Ronaldo Coutinho Secretria Nacional de Renda de Cidadania Lcia Modesto Secretrio Nacional de Segurana Alimentar e Nutricional Crispim Moreira Expediente Esta uma publicao tcnica do Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate a Fome/ Secretaria Nacional de Assistncia Social Secretria Nacional de Assistncia Social Maria Luza Rizzotti Diretora do Departamento de Gesto do SUAS Simone Aparecida Albuquerque Diretora do Departamento de Proteo Social Especial Margarete Cutrim Vieira Diretora do Departamento de Benefcios Assistenciais Maria Jos de Freitas Diretor Executivo do Fundo Nacional de Assistncia Social Antnio Jos Gonalves Henriques Diretora do Departamento de Proteo Social Bsica Aid Canado Almeida Diretora do Departamento da Rede Socioassistencial Privada do SUAS Claudia Sabia Coordenadora-Geral Maura Luciane Conceio de Souza Consultores ngela Maria Siman (subsdios para elaborao das orientaes tcnicas sobre a gesto do PETI) DataUFF Ncleo de Pesquisa da Universidade Federal Fluminense (Pesquisa Quantitativa) Herkenhoff & Prates Tecnologia e Desenvolvimento (Pesquisa Qualitativa) Sob Coordenao e Acompanhamento do Departamento de Avaliao da SAGI Colaborao Grfica e Ilustrao: Daniel Tavares e Carlos Arajo Colaborao Tcnica Juliana Marques Petroceli-DPSE Maria de Jesus Bonfim de Carvalho-DPSE Apoio Tcnico Adriana de Almeida Faustino (DPSE) Cristiane Bertotti (DPSE) Leticia Maria Tosto Cuoco (DPSE) Priscilla Maia de Andrade (DPSB) Rafael Voigt Leandro (DPSE) Zora Yonara Torres Costa (DPSE) Coordenao da Publicao Departamento de Proteo Social Especial/SNAS/MDS

O meu filho, ele tambm sonha muito... (Me beneficiria do PETI)1

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As falas que constarem neste documento se referem ao Estudo Qualitativo do PETI realizado, em 2009, pela Empresa Herkenhoff & Prates Tecnologia e Desenvolvimento, por solicitao e contratao do Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome.

APRESENTAo

O

enfrentamento ao trabalho infantil ocupa lugar de destaque na Agenda Social do Governo Federal, a exemplo do Programa de Erradicao do

Trabalho Infantil (PETI), que, consolidado com o advento do Sistema nico de Assistncia Social (SUAS), passou a compor os servios socioassistenciais. Durante os ltimos anos, foram contabilizados significativos avanos tanto no que concerne efetivao do Sistema nico de Assistncia Social quanto no aprimoramento dos programas voltados proteo e garantias de direitos, como o caso do PETI. A tnica que embasa este Caderno de Orientaes, editado pelo Minis-

trio do Desenvolvimento Social e Combate Fome (MDS), volta-se para a dupla dimenso do Programa em tela, que contempla, alm do contedo de transferncia de renda, o trabalho sociofamiliar e a oferta de atividades socioeducativas para crianas e adolescentes retirados do trabalho. Grande parte dos dados e subsdios aqui utilizados fundamentam-se em pesquisas quali e quantitativa realizadas em municpios que desenvolvem o Programa, sob coordenao e acompanhamento da Secretaria de Avaliao e Gesto da Informao do MDS (SAGI), que disponibilizou sua expertise e competncia para viabilizar o alcance dos resultados necessrios a esta produo, integrando-se de forma determinante construo coletiva - marca deste caderno. O Brasil tem fortalecido os mecanismos de implementao de aes integradas e intersetoriais para promoo e proteo dos direitos de crianas e adolescentes em todo o seu territrio. Nestes ltimos anos, estas aes caracterizaram-se pela articulao entre desenvolvimento econmico e incluso, o que permitiu alcanar resultados no enfrentamento ao trabalho infantil, com destaque no cenrio internacional.

Os contedos aqui postos reafirmam o compromisso com a preveno e a erradicao do trabalho infantil no Pas. Dentre as inovaes aqui contidas, encontra-se a integrao indispensvel dos nveis de Proteo Social Bsica (PSB) e Proteo Social Especial (PSE). Esse desenho permite ainda contribuir com os gestores de todas as esferas de governo no fortalecimento da gesto do PETI, por meio de aportes e subsdios tcnicos para a oferta com qualidade dos Servios de Convivncia e Fortalecimento de Vnculos para crianas e adolescentes de 6 a 15 anos. Esses servios responsabilizam-se pela constituio de espao de convivncia, formao para a participao e cidadania, desenvolvimento do protagonismo das crianas e dos adolescentes, conforme a Tipificao Nacional de Servios Socioassistenciais (2009). Vale destacar que, nos novos contornos do PETI, integrado necessariamente ao SUAS, a participao de crianas e adolescentes nos servios de convivncia passou a constituir-se condicionalidade e, ainda, o acompanhamento das famlias, aspecto central para a segurana de proteo. A participao de crianas e adolescentes retirados do trabalho precoce e inseridos nos Servios de Convivncia ou em outras atividades socioeducativas da rede de proteo dos direitos desse pblico considerada uma estratgia fundamental para a preveno e o enfrentamento ao trabalho infantil. A Proteo Social Bsica tem um papel essencial na preveno do risco e da reincidncia da prtica do trabalho infantil. O Servio de Convivncia e de Fortalecimento de Vnculos representa, assim, o compromisso do Governo Federal em garantir as seguranas sociais de acolhida, de desenvolvimento e de convvio familiar e comunitrio s crianas e adolescentes retirados do trabalho precoce.

No que concerne ao aprimoramento das aes operacionais, a Proteo Social Especial disponibiliza orientaes tcnicas sobre a gesto do PETI na dinmica do Sistema nico de Assistncia Social (SUAS). Essas orientaes so passadas por meio de um conjunto de diretrizes, conceitos, informaes e procedimentos que tm como propsito fundamental orientar e apoiar os estados, os municpios e o Distrito Federal na organizao, coordenao, planejamento, execuo e acompanhamento sistemtico do Programa. Esta publicao constitui-se importante instrumento para qualificar e dinamizar a organizao e implementao do PETI. As aes aqui previstas s podem ser efetivadas com a participao e o engajamento das trs esferas de governo e da sociedade, de forma articulada. Elas servem como ponto de partida para que estados, municpios e Distrito Federal atuem fortemente na preveno e erradicao do trabalho infantil e ampliem sua rede de proteo por meio da incluso de crianas e adolescentes no Servio de Convivncia e Fortalecimento de Vnculos.

Mrcia LopesMinistra do Desenvolvimento Social e Combate Fome

Maria Luiza RizzottiSecretria Nacional de Assistncia Social

LISTA DE SIGLASABNT Associao Brasileira de Normas Tcnicas BPC Benefcio de Prestao Continuada CAIXA Caixa Econmica Federal CRAS Centro de Referncia de Assistncia Social CREAS Centro de Referncia Especializado de Assistncia Social CNAS Conselho Nacional de Assistncia Social DATAUFF Ncleo de pesquisas, informaes e polticas pblicas da Universidade Federal Fluminense DPSB Departamento de Proteo Social Bsica DPSE Departamento de Proteo Social Especial IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica LoAS Lei Orgnica da Assistncia Social MDS Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome NoB Norma Operacional Bsica NoB-RH Norma Operacional Bsica de Recursos Humanos PAIF Servio de Proteo e Atendimento Integral Famlia PAEFI Servio de Proteo e Atendimento Especializado Famlia e Indivduos PBF Programa Bolsa Famlia PSB Proteo Social Bsica PETI Programa de Erradicao d0 Trabalho Infantil PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilio PNAS Poltica Nacional de Assistncia Social SAGI Secretaria de Avaliao e Gesto da Informao SCFV Servio de Convivncia e Fortalecimento de Vnculos SEAS Servio Especializado em Abordagem Social SGD Sistema de Garantia de Direitos SNAS Secretaria Nacional de Assistncia Social SUAS Sistema nico de Assistncia Social

CADERNO DE ORIENTAES TCNICAS Gesto do Programa de Erradicao do Trabalho Infantil no SUAS

SUMRIOINTRoDUo ...............................................................................................13 1. TRABALHo INFANTIL........................................................................ 161.1 Consideraes Gerais sobre o Trabalho Infantil no Brasil .. 17 1.2 Conceito de Trabalho Infantil....................................................19 1.3 As Causas do Trabalho Infantil no Contexto Brasileiro ........21 1.4 As Consequncias do Trabalho Infantil ................................. 28 1.5 Tipos de Trabalho Infantil ......................................................... 32

2. o PRoGRAMA DE ERRADICAo Do TRABALHo INFANTIL No SUAS .............................................................................392.1 Fundamentao Legal e Gnese do PETI ................................412.1.1 Marcos Legais ........................................................................................... 41 2.1.2 Aspectos Histricos do PETI............................................................... 42 2.1.3 Integrao PETI e Bolsa Famlia .........................................................43

2.2 Pesquisas sobre o PETI ............................................................. 47 2.3 O PETI no Sistema nico de Assistncia Social SUAS ...... 512.3.1 PETI e Proteo Social Especial .........................................................54 2.3.2 PETI e Proteo Social Bsica ............................................................58 2.3.3 O PETI no Contexto do Protocolo de Gesto Integrada dos Servios, Benefcios e Transferncia de Renda .................................... 60

2.4 Gesto Intergovernamental do PETI no mbito do SUAS ... 65 2.5 Comisses de Preveno e Erradicao do Trabalho Infantil . 68 2.6 Articulao intersetorial do PETI no Enfrentamento ao Trabalho Infantil ...........................................................................................712.6.1 PETI e a Poltica de Educao ........................................................73

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2.6.2 PETI e as Polticas de Esporte e Cultura ....................................76 2.6.3 PETI e a Poltica de Sade ...............................................................79 2.6.4 PETI e as Polticas de Desenvolvimento Agrrio .................. 80 2.6.5 Interface do PETI com as Aes do Ministrio do Trabalho e Emprego ...................................................................................................81 2.6.6 Interface do PETI com as Aes do Ministrio Pblico do Trabalho .............................................................................................83

2.7 Controle Social do PETI ............................................................. 85 2.8 Financiamento do PETI ............................................................. 86 2.9 Os Sistemas Informatizados de Apoio ao Desenvolvimento do PETI: Cadnico, SIBEC, SICON, SISPETI .................................. 87

3. PRoCEDIMENToS oPERACIoNAIS Do PETI No SUAS ...................................................................................................... 933.1 Organizao e Funcionamento................................................. 95 3.2 Preveno do Trabalho Infantil ................................................ 98 3.3 Enfrentamento ao Trabalho Infantil........................................1023.3.1 Identificao do Trabalho Infantil .................................................. 104 3.3.2 Registro no Cadnico ..........................................................................113 3.3.3 Acesso a Direitos e sua Garantia .................................................... 116 3.3.4 Acompanhamento Familiar .............................................................. 119 3.3.5 Transferncia de Renda ..................................................................... 125 3.3.6 Insero da Criana/Adolescente no Servio de Convivncia e Fortalecimento de Vnculos SCFV ou na rede de promoo e proteo dos direitos da criana e do adolescente ................. 130 3.3.7 Gesto da Informao.......................................................................... 142 3.3.8 Fluxo de Aes para o Enfrentamento ao Trabalho Infantil... 144

3.4 Desligamento da Famlia do PETI ........................................... 145 3.5 Cancelamento do PETI no Municpio e no Distrito Federal.....146

4. ANEXoS ......................................................................................................147

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INTRoDUo

O

Caderno de Orientaes Tcnicas sobre a gesto do Programa de Erradicao do Trabalho Infantil (PETI) no Sistema nico de Assistncia

Social (SUAS) se constitui de um conjunto de diretrizes, conceitos, informaes, orientaes e procedimentos que tem como propsitos fundamentais orientar e apoiar os Estados, os Municpios e o Distrito Federal na coordenao, no planejamento, na execuo e no acompanhamento do Programa. Destina-se, portanto, a gestores, rgos de controle social, Centro de Referncia Especializado de Assistncia Social (CREAS) e/ou equipes tcnicas da Proteo Social Especial (PSE), responsveis pelo PETI, Centro de Referncia de Assistncia Social (CRAS) e/ou equipes tcnicas da Proteo Social Bsica (PSB), orientadores sociais e facilitadores de oficinas do Servio de Convivncia e Fortalecimento de Vnculo (SCFV), bem como aos demais atores envolvidos na promoo, garantia e defesa dos direitos das crianas e dos adolescentes em situaes de vulnerabilidade e/ou risco social e expostos violncia e explorao. Com a implantao do SUAS, iniciou-se o processo de reordenamento da gesto da assistncia social em todo o Brasil, tendo como instrumento norteador a Norma Operacional Bsica do SUAS (NOB/SUAS), aprovada pela Resoluo n 130, de 15 de julho de 2005. A partir de ento, os servios, programas, projetos e benefcios de Assistncia Social, inclusive o PETI, passaram a ser regulados, organizados e avaliados com base nos eixos estruturantes do SUAS. As aes da assistncia social passam a no se realizar mais de forma isolada, mas articuladas para a formao de uma rede de proteo socioassistencial. Nesse contexto, importantes documentos orientam a construo deste Caderno, a saber: o Protocolo de Gesto Integrada de Servios, Benefcios e Transferncias de Renda no mbito do SUAS, que acorda procedimentos para

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a gesto integrada dos servios, benefcios socioassistenciais e transferncias de renda para o atendimento a indivduos e famlias beneficirias do Programa Bolsa Famlia, PETI, Benefcio de Prestao Continuada (BPC) e Benefcios Eventuais, publicado em 10 de setembro de 2009 pela Comisso Intergestora Tripartite (CIT), por meio da Resoluo no 7; e a Tipificao Nacional de Servios Socioassistenciais, aprovada em 11 de novembro de 2009 pelo Conselho Nacional de Assistncia Social, por meio da Resoluo n 109, construda para homogeneizar a compreenso conceitual e estrutural dos servios de proteo social que compem a Poltica de Assistncia Social. O Caderno foi elaborado luz dos princpios e diretrizes do SUAS, com o propsito de estabelecer diretrizes e procedimentos necessrios melhoria da gesto e operacionalizao do PETI, considerando no somente a legislao atual e os processos operacionais j adotados, mas tambm a realidade concreta da oferta de servios socioassistnciais nos municpios, que tem sido apreendida por meio de estudos desenvolvidos pelo Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome (MDS). O Caderno est estruturado em trs captulos. O primeiro enfoca especialmente os direitos da criana e do adolescente que se contrapem prtica do trabalho infantil, violao de direito ainda presente na realidade brasileira. Esta parte ressalta ainda causas dessa explorao no contexto brasileiro e as consequncias na vida de crianas e adolescentes. O segundo captulo apresenta o PETI em suas dimenses conceituais, seus princpios norteadores e, fundamentalmente, sua insero no SUAS. O terceiro captulo trata, especificamente, da organizao e das bases operacionais do PETI no mbito do SUAS, ou seja, aborda como deve ser o seu funcionamento em termos de responsabilidades, critrios e condies, estratgias e fluxo operacional, referenciados pelo Protocolo de Gesto Integrada, pela Tipificao Nacional de Servios Socioassistenciais e pela contribuio de gestores e trabalhadores estaduais, municipais e do DF, conselheiros, pesquisadores e militantes da rea.

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1TRABALHo INFANTIL

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1.1 Consideraes Gerais sobre o Trabalho Infantil no Brasil

ralizam. Algumas culturas percebem o trabalho como fator positivo, acreditando que por meio de uma ocupao que as crianas e os adolescentes so protegidos e escapam de situaes de excluso e que, com a obteno de uma renda, no ingressam na criminalidade. Dessa forma, acreditam que o trabalho forma os valores morais dessas crianas e adolescentes2. O trabalho infantil fez parte da histria e da cultura do Brasil. Contudo, a percepo de naturalizao do trabalho de crianas e adolescentes foi fortemente questionada no pas, especialmente a partir da dcada de 1980 com a ampla mobilizao social de organizaes governamentais e no governamentais, que ganhou fora durante o Congresso Constituinte (1986-1988) e desembocou na promulgao da nova Constituio Federal em 1988. Portanto, o combate ao trabalho infantil no Brasil tem sido uma conquista social. A partir da dcada de 1990, o tema passou a ocupar lugar de destaque na agenda nacional. Os avanos na rea se deram tanto no reordenamen2 BRASIL. Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome. Secretaria Nacional da Assistncia Social. Departamento de Gesto do SUAS. Documento Tcnico com diagnstico sobre a incidncia e caractersticas do Trabalho Infantil no Brasil, com base nos microdados da PNAD.

A

literatura aponta para o fato de que o trabalho infantil tem origens histricas e socioculturais que o natu-

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to jurdico como nos resultados obtidos e reconhecidos em mbito nacional e internacional. No que diz respeito Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclio (PNAD), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), o trabalho infantil no Brasil est em queda, ano aps ano3. Em 2004, havia 5,3 milhes de trabalhadores de 5 a 17 anos de idade; em 2008, eram 4,5 milhes; e em 2009, 4,3 milhes. Ressalta-se que, em 2008, havia cerca de 123 mil trabalhadores na faixa etria de 5 a 9 anos de idade, 785 mil de 10 a 13 e 3,3 milhes de 14 a 17. A regio Nordeste apresentava a maior proporo de pessoas de 5 a 17 anos de idade ocupadas (11,7 %) e a Sudeste, a menor (7,6 %). Ao considerar a PNAD 2009, na faixa etria de 5 a 15 anos, na qual o PETI historicamente tem forte atuao, a quantidade de crianas e adolescentes ocupados caiu de 2.145.845 milhes, em 2008, para 2.060.503, em 2009. No que se refere ao respaldo legal para o enfrentamento ao trabalho infantil, os marcos protetivos se orientam pelos princpios estabelecidos na Constituio Federal, em especial no art. 227, que determina: so deveres da famlia, da sociedade e do Estado assegurar criana e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito vida, sade, alimentao, educao, ao lazer, profissionalizao, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e convivncia familiar e comunitria, alm de coloc-los a salvo de toda forma de negligncia, discriminao, explorao, violncia, crueldade e opresso. O art. 7, inciso XXXIII (alterado pela Emenda n 20, de 15 de dezembro de 1998), estabelece a idade mnima de 16 anos

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Release do IBGE/PNAD, 2009. A PNAD no apresenta dados agregados por municpios, o que torna necessria a construo de instrumentos que permitam a qualificao da identificao do trabalho infantil pelos municpios e Distrito Federal.

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para o ingresso no mercado de trabalho, exceto na condio de aprendiz a partir dos 14 anos. Esses marcos legais acolheram as principais Convenes e Recomendaes da Organizao Internacional do Trabalho (OIT) sobre o trabalho infantil e concretizaram os avanos nacionais. Portanto, as condies, tanto sociais como legais, esto dadas para a efetivao de um novo paradigma na maneira de abordar o trabalho infantil no Pas.

Estatuto da Criana e do Adolescente, Lei n 8.069/1990, arts. 60 a 69. Consolidao das Leis do Trabalho, art. 402, aprovada pelo Decreto-Lei n 5.452, de 1 de maio de 1943. Conveno n 138/1973, da OIT, sobre limites de idade mnima para o trabalho, promulgada pelo Brasil em 1999. Conveno n 182/1999, da OIT, sobre as piores formas de trabalho infantil. Lei n 10.097, de 19 de dezembro de 2000, que regulamenta a aprendizagem. Decreto n 6.481, 12 de junho de 2008, que define a lista das piores formas de trabalho infantil.

1.2 Conceito de Trabalho InfantilAs bases de concepo, organizao e desenvolvimento do PETI no SUAS utilizam a referncia conceitual de trabalho infantil do Plano Nacional de

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Preveno e Erradicao do Trabalho Infantil e Proteo ao Trabalhador Adolescente, publicado em 2004. Nesse documento, o termo trabalho infantil refere-se s atividades econmicas e/ou atividades de sobrevivncia, com ou sem finalidade de lucro, remuneradas ou no, realizadas por crianas ou adolescentes em idade inferior a 16 (dezesseis) anos, ressalvada a condio de aprendiz a partir dos 14 (quatorze) anos, independentemente de sua condio ocupacional. Para efeitos de proteo ao adolescente trabalhador, ser considerado todo trabalho desempenhado por pessoa com idade entre 16 e 18 anos e, na condio de aprendiz, de 14 a 18 anos, conforme definido pela Emenda Constitucional n 20, de 15 de dezembro de 1998. O conceito guarda total consonncia com o marco normativo atual, que considera como trabalho infantil no Brasil: a)todo trabalho realizado antes dos 14 anos de idade;

b)todo trabalho realizado por adolescentes com idade entre 14 e 16 anos, requisitos legais dessa modalidade de profissionalizao;

que no se configure como aprendizagem, cumprindo integralmente os

c) todo trabalho realizado por crianas e adolescentes, ou seja, antes dos 18 anos de idade, que seja cara cterizado como perigoso, insalubre, penoso, prejudicial moralidade, noturno, realizado em locais e horrios que prejudiquem a frequncia escola ou que tenham possibilidade de provocar prejuzos ao desenvolvimento fsico e psicolgico. O estabelecimento dos limites de idade mnima para o trabalho encontra fundamentos, tais como: a) a garantia do desenvolvimento pleno de crianas e adolescentes que no podem ser prejudicados pelas consequncias provocadas pelo trabalho infantil;

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b) a garantia de concluso de escolaridade obrigatria no nvel bsico bilidades sociais. Ressalta-se que os limites de idade mnima para o trabalho nem sempre foram os mesmos no Brasil. Eles gradativamente receberam elevaes de

com tempo livre para estudar, brincar, acessar as variadas formas de lazer, arte, cultura e esporte, bem como a proteo contra as vulnera-

acordo com as condies e as necessidades de desenvolvimento social do pas. A ltima elevao foi realizada pela Emenda Constitucional no 20, de 15 de dezembro de 1998.

1.3 As Causas do Trabalho Infantil no Contexto BrasileiroO trabalho infantil no Brasil tem causas complexas, pois so variados os motivos que levam ao recurso da mo de obra infanto-juvenil. No entanto, existem trs causas especiais que predominam na deciso de incorporao de crianas e adolescentes em processo de desenvolvimento no mundo do trabalho: a)a necessidade econmica de manuteno da famlia;

b)a reproduo cultural dos mitos sobre trabalho infantil; e direitos de crianas, adolescentes e suas famlias.

c) a falta de universalizao das polticas pblicas de atendimento aos Ainda relevante a pobreza na incidncia do trabalho infantil, j que a PNAD 2009 continua apontando rendimentos domiciliares baixos nas famlias das crianas/adolescentes ocupados.

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Alm das necessidades econmicas da famlia, o trabalho infantil utilizado em larga escala porque se trata de uma mo de obra barata, dcil e disciplinada. A explorao do trabalho infantil no est dissociada das estratgias globais de precarizao das condies de vida dos trabalhadores e da reduo do custo do trabalho. As crianas e os adolescentes tambm trabalham, em grande parte, em razo dos mitos criados em torno do trabalho infantil, decorrentes de uma cultura de concordncia que legitima e reproduz a explorao e excluso social. So os chamados fatores culturais do trabalho infantil. Esses mitos culturais reproduzidos atravs de geraes apresentam relao com a legitimao da explorao da mo de obra de milhes de crianas e adolescentes. Veja algumas situaes ilustrativas: O trabalho da criana/adolescente ajuda a famlia! melhor trabalhar do que ficar nas ruas! melhor trabalhar do que roubar! A criana/adolescente que trabalha fica mais esperto! Quem comea a trabalhar cedo garante o futuro!

O Mito: o trabalho da criana/adolescente ajuda a famlia

Esse um argumento frequente de concordncia com o uso do trabalho infantil, ou seja, que preciso o trabalho precoce para a manuteno da subsistncia do ncleo familiar. No entanto, vale lembrar que:

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a)48% das crianas e adolescentes trabalhadores no recebem qualquer b)as demais crianas e adolescentes recebem valores insuficientes para alterar a sua prpria condio de vida, quanto mais a de sua famlia. Ora, se a famlia est sem condies de suprir suas condies bsicas, a alternativa mais efetiva o acesso universal s polticas pblicas e, consequentemente, aos direitos sociais de cidadania, e no a insero precoce de crianas e adolescentes no trabalho, que colabora com a manuteno do processo de excluso. Dessa forma, as causas culturais, estruturais e a sua prpria natureza e as causas da atividade econmica contribuem para a manuteno do trabalho infantil. Um exemplo que pode ser destacado o da agricultura familiarcamponesa, formada por pequenas unidades agrcolas, cooperativadas ou no, que constitui um modelo de posse da terra e produo agrcola alternativo ao modelo patronal-empresarial formado por mdias e grandes propriedades rurais calcado na necessidade econmica e sedimentado em motivaes culturais. Ao se observar as desigualdades regionais e territoriais, em especial as existentes entre o campo e a cidade na oferta de servios pblicos (como educao, esporte, cultura, sade, saneamento, assistncia social), constatamos significativa dificuldade no enfrentamento da violao de direitos no campo comparativamente s condies existentes nas cidades, o que fortalece a tendncia da naturalizao da ajuda da criana/adolescente famlia. No Brasil, a configurao territorial apresenta uma diversidade muito particular, comportando grande complexidade em relao s caractersticas regionais, contextos polticos, sociais, econmicos e culturais variados. Comparando-se territrios distintos, sabe-se que a incidncia do trabalho tipo de remunerao pelos servios prestados;

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infantil e o seu enfrentamento ocorrem de forma diferenciada, no cabendo afirmaes que justifiquem essa prtica apenas com o argumento da rentabilidade familiar, j que tambm so decisivas as motivaes culturais e a ausncia da atuao das polticas pblicas, facilitando a incidncia de trabalho infantil.

O Mito: melhor trabalhar do que ficar nas ruas

O mito representado pela expresso melhor trabalhar do que ficar nas ruas tem razes complexas e envolve a compreenso de variados fatores, dentre os quais se podem destacar: a)propagou-se, no contexto histrico do final do sculo XIX, tal afirmativa para legitimar a ausncia de responsabilidade do Estado em fornecer pecial o acesso educao; polticas universais de atendimento s crianas/adolescentes, em esb) uma falsa dicotomia, pois reduz as alternativas de ateno criana e ao adolescente a duas formas reconhecidas de violao de direitos: o situao de rua; uso do trabalho infantil e a exposio s vulnerabilidades do espao e c) uma falsa alternativa para a criana e o adolescente, pois retira a responsabilidade de cuidado com a infncia por parte da famlia, da sociemo de obra, o que precariza as condies gerais de trabalho;

dade e do Estado, deixando a infncia vulnervel explorao de sua

d)d margem para a compreenso de que para crianas e adolescentes em situao de vulnerabilidade social serve qualquer alternativa, Criana e do Adolescente;

desconsiderando os direitos conquistados a partir do Estatuto da

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e) estimula as antigas prticas de recolhimento de crianas e adolescentes do ambiente da rua, sem oferecer alternativas concretas de

atendimento e submetendo-os explorao, violando, inclusive, seu direito fundamental reconhecido na Constituio Brasileira relativo liberdade de ir, vir e permanecer;

f) atribui ao espao pblico um carter unicamente negativo, despolitisocializao e integrao.

zando os espaos comunitrios, abandonando o desafio de ressignificar o territrio para que possa ser reapropriado como um lugar de lazer,

O Mito: melhor trabalhar do que roubar

Esse mito cultural est assentado nas bases de uma viso superada sobre o tema da criminalidade, que atribua s ideias de trabalho e ocupao a soluo mgica ao problema da violncia e da criminalidade. Nesse sentido, preciso pensar: a)se o trabalho infantil fosse a soluo para a criminalidade, o problema da violncia j teria se resolvido, pois a histria brasileira mostra que a regra para a infncia e a adolescncia foi a explorao no trabalho; b)o mito favorece a ideia preconceituosa de que pobreza e criminalidade esto relacionadas;

c) o mito refora no imaginrio social a antiga concepo: menoridade + rua + cio = delinquncia. Matriz terica do pensamento autoritrio que legitimou o estabelecimento das prticas repressivas durante o sculo controle repressivo disciplinar sobre a infncia e a adolescncia; XX no Brasil e que colheu como resultados a reproduo da violncia e o

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d)o trabalho infantil no alternativa de uso do tempo livre da criana e do adolescente, mas sim a escola e as demais poltica sociais;

e)o acesso cultura, arte, ao lazer e ao esporte so direitos fundamennecessrios ao desenvolvimento integral da criana e do adolescente.

tais e devem ser oportunizados por meio de polticas pblicas, pois so

O Mito: a criana/adolescente que trabalha fica mais esperto A justificativa de que a criana que trabalha fica mais esperta e, assim, aprende melhor a lidar com as condies que a vida lhe impe refutada a partir de algumas reflexes: a)o trabalho infantil no antecipa as etapas de desenvolvimento da criana e do adolescente, ele subtrai seus direitos fundamentais;

b) a responsabilidade precoce com o trabalho impede as possibilidades c) o trabalho infantil nunca foi sinnimo de uma vida bem- sucedida. Se assim fosse, as crianas e adolescentes das elites optariam pelo traao esporte; balho infantil em detrimento da educao, do acesso cultura, arte e de desenvolvimento integral;

d)o trabalho infantil uma das principais causas de violao dos direitos da criana e do adolescente, restringindo a possibilidade de uma integrao digna no mundo do trabalho na fase adulta.

O Mito: quem comea a trabalhar cedo garante o futuro

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Apresenta a tese de que a experincia adquirida com o trabalho infantil seria uma forma de garantir sucesso na vida adulta ou experincia para trabalhos futuros, quando na verdade: a)os trabalhos disponibilizados criana e ao adolescente geralmente b)as crianas e adolescentes normalmente no escolhem a atividade, mas so foradas a trabalhar em qualquer tarefa; so muito precrios e com baixo nvel de qualificao;

c) a ocorrncia de trabalhos realizados na infncia ou adolescncia no d)o trabalho infantil fator determinante para a evaso escolar, provoacesso aos trabalhos na fase adulta4. com nveis de escolarizao cada vez mais elevados;

contribui para uma sociedade que exige profissionais qualificados e

cando impactos gerais nos nveis de escolarizao, que prejudicaro o

A superao dos mitos legitimadores do trabalho infantil desafio permanente para as polticas pblicas. Por isso, as aes e estratgias intersetoriais de preveno e enfrentamento ao trabalho infantil, como as que se referem ao controle social e ao prprio PETI, precisam ir alm do afastamento de crianas e adolescentes do trabalho, para alcanar uma concepo de garantia integral dos direitos das crianas e dos adolescentes brasileiros. Por isso, o dilogo e a construo reflexiva com crianas, adolescentes e suas famlias e com a sociedade em geral sobre esses e outros mitos culturais so fundamentais para a superao de uma cultura de naturalizao do trabalho infantil e, portanto, pressupostos indispensveis para o seu enfrentamento.4 Segundo a PNAD/2008, a taxa de escolarizao das pessoas ocupadas na semana de referncia de 81,9%, menor do que a de pessoas no ocupadas.

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1.4 As Consequncias do Trabalho InfantilA partir da Constituio Brasileira de 1988, a criana e o adolescente passaram a ser vistos como pessoas em situao peculiar de desenvolvimento e sujeitos de direitos. Esse o principal motivo para a erradicao do trabalho infantil e no somente por causa de suas consequncias. No entanto, o trabalho infantil tem efeitos complexos, principalmente nas condies econmicas, sociais, educacionais, bem como no desenvolvimento fsico, psquico e cognitivo de crianas e adolescentes. Os principais efeitos do trabalho infantil envolvem:

Socioeconmico

a)precarizao das relaes de trabalho, remunerao inferior e explorab)reduo das oportunidades de emprego, ocupao e insero profisc) aumento da informalidade no mercado de trabalho. racional da excluso econmica para crianas, adolescentes e famlias; o do trabalho;

sional aos adultos, reforando o crculo vicioso de transmisso interge-

EducaoO trabalho infantil apresenta srias consequncias ao desenvolvimento educacional das crianas e dos adolescentes. Isso porque: a)crianas e adolescentes geralmente realizam suas atividades em detrimento da educao. E isso futuramente acresce o nmero de trabalha-

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dores com qualificao educacional insuficiente para as exigncias do b)o trabalho infantil impacta diretamente no acesso s oportunidades e c) a defasagem e o abandono escolar das crianas e dos adolescentes braele impede a educao, reforando a excluso social. no desempenho escolar com qualidade; mercado de trabalho;

sileiros foram profundamente influenciados pelo trabalho infantil, pois

SadeOs trabalhos desenvolvidos por crianas e adolescentes podem causar prejuzos a seu desenvolvimento fsico e psicolgico, tais como: a)trabalho infantil obriga as crianas e os adolescentes a assumirem responsabilidades incompatveis com as etapas de desenvolvimento;

b)exposio insalubridade, periculosidade, s doenas, afetando a sac) como esto em processo de desenvolvimento, crianas e adolescentes so mais vulnerveis s condies de trabalho, por terem capacidade de resistncia limitada, sujeitando-se fadiga, ao envelhecimento precoce, ao cansao, maior ocorrncia de doenas decorrentes da exposio s rduas condies climticas ou da realizao de d)as crianas e os adolescentes no esto preparados para avaliar os riscos que podem ser gerados pelo trabalho e seus efeitos a longo prazo, o que amplia a possibilidade de submisso s condies adversas. atividades repetitivas; de,violando e retardando o desenvolvimento fsico, psquico e cognitivo;

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As consequncias psicolgicas podem ser muito graves, pois se exigem das crianas e dos adolescentes no mundo do trabalho comportamentos prprios de adultos, substituindo as etapas essenciais de desenvolvimento. Isso acarreta: a)o amadurecimento precoce; adulta;

b)a perda da capacidade ldica, que pode gerar desequilbrios na fase

c) a limitao do direito de brincar e da manifestao do ldico, essenciais para o desenvolvimento do afeto e da afetividade.

Convivncia Familiar e Comunitria importante destacar que o trabalho infantil inverte a responsabilidade dos pais para os filhos, enquanto provedores das necessidades familiares. Dessa forma, retira da famlia, do Estado e da sociedade a responsabilidade de garantir os direitos das crianas e dos adolescentes. Pode, inclusive, levar ao afastamento da famlia e da comunidade, gerando como consequncias a fragilizao de vnculos familiares e de participao cidad. Ao se limitar ou impedir o direito de brincar e a manifestao do ldico, h a interferncia em pontos essenciais para o desenvolvimento do afeto e da afetividade, to importantes para o bom relacionamento na famlia e na comunidade. As consequncias do trabalho infantil so indubitavelmente complexas e especialmente agravadas de acordo com as situaes adversas. As consequncias fsicas, as quais repercutem na sade, podem interferir na convivncia social desse pblico infanto-juvenil. alvo, tambm, da nossa ateno as chamadas formas toleradas de trabalho infantil, como no esporte e nos meios de comunicao.

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O tempo de exposio e de dedicao aos treinamentos que requer a carreira de um atleta, aliados ao afastamento que se faz da famlia e da comunidade, seja dentro do prprio municpio, fora dele ou at mesmo em um contexto internacional, devem ser observados com ateno, a fim de evitar situaes de excesso e de descumprimento de direitos que prejudicam o desenvolvimento infanto-juvenil. As atividades artsticas tambm merecem destaque no sentido do necessrio monitoramento do tempo e tambm do impacto psicolgico nas crianas/adolescentes, tendo em vista, por exemplo, a exposio e as expectativas que geram uma carreira de ator, que possui grande instabilidade. Destacam-se igualmente as formas invisveis, como o trabalho em atividades ilcitas, a explorao sexual comercial e o trabalho infantil domstico. As atividades ilcitas, dentre elas a explorao sexual comercial, interferem diretamente na dinmica familiar, exigindo a interveno qualificada do Poder Pblico para dar suporte s famlias que vivenciam essa prtica. No trabalho infantil domstico, constatam-se as mesmas consequncias prejudiciais das demais modalidades de trabalho infantil, adicionando condies ainda mais gravosas, por realizar-se no mbito privado, tais como: a)exposio de crianas e adolescentes a longas jornadas de trabalho; na escola; b)sobrecarga de atividades cotidianas que impedem a permanncia

c) ruptura dos vnculos familiares quando o trabalho realizado em casa de terceiros ou lugares distantes da famlia;

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d)vivncia de experincias constrangedoras ao receber tratamento difee)maior exposio s vulnerabilidades associadas ao trabalho infantil, como o abuso sexual. renciado de outras pessoas da famlia;

1.5 Tipos de Trabalho InfantilA Conveno n 138 da OIT um importante instrumento jurdico internacional de preveno e erradicao do trabalho infantil, pois, alm de recomendar a elevao progressiva dos limites de idade mnima para o trabalho, estabelece esforos para que por meio de polticas pblicas possam se garantir a efetiva preveno e erradicao do trabalho infantil. J a Conveno n 182 define as piores formas de trabalho infantil e recomenda ao urgente e imediata para sua eliminao. De acordo com essa conveno, caracterizam-se como piores formas de trabalho infantil: a)todas as formas de escravido ou prticas anlogas escravido, tais de servo, e o trabalho forado ou obrigatrio de crianas para serem utilizadas em conflitos armados; b)a utilizao, o recrutamento ou a oferta de crianas para a prostituio no Brasil, denominada explorao sexual comercial , a produo de pornografia ou atuaes pornogrficas; c)a utilizao, o recrutamento ou a oferta de crianas para a realizaentorpecentes;

como a venda e trfico de crianas, a servido por dvida e a condio

o de atividades ilcitas, em particular a produo e o trfico de

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d)o trabalho que, por sua natureza ou pelas condies em que realizado, suscetvel de prejudicar a sade, a segurana ou a moral das crianas. Essas duas convenes internacionais foram ratificadas pelo Brasil e fazem parte do ordenamento jurdico brasileiro. Nesse sentido, destaca-se o Decreto n 6.481, de 12 de junho de 2008, que define a lista das piores formas de trabalho infantil no Brasil. Todavia, ressalta-se que existem alguns trabalhos exercidos por crianas e adolescentes no Brasil cuja caracterizao pode parecer complexa, pois esto incorporados de tal forma no cotidiano que, s vezes, no so percebidos como uma violao dos direitos humanos de crianas e adolescentes. Por isso, importante analisar e atentar para alguns tipos de explorao do trabalho infantil, tais como: aqueles realizados nas ruas, domsticos, em atividades esportivas, em atividades artsticas e culturais, em atividades ilcitas, na informalidade, eventuais, noturnos, perigosos, insalubres, prejudiciais moralidade; bem como para a jornada de trabalho.

Os trabalhos realizados nas ruasA realizao de trabalho nas ruas antes dos 18 anos de idade proibida desde a edio da Consolidao das Leis do Trabalho em 1943. A proibio deve-se natural falta de ateno das crianas e adolescentes que, nas ruas, esto sujeitos a um maior risco de acidentes e perigos. O trabalho realizado nas ruas no representa qualquer tipo de proteo criana e ao adolescente, expondo-os a uma srie de riscos que podero ter consequncias irreversveis ao seu desenvolvimento.

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O trabalho infantil domsticoA legislao brasileira probe esse tipo de atividade antes dos 18 anos de idade. O trabalho infantil domstico caracteriza-se por sua invisibilidade, por realizar-se no espao privado. Em regra, de fcil caracterizao quando executado em casa de terceiro. O trabalho infantil domstico se distingue da realizao de tarefas domsticas, na medida em que: a)as tarefas domsticas so atividades realizadas nos espaos de vivn-

cia e socializao, que respeitam a idade e o processo de desenvolvimento da criana e do adolescente, mediante o compartilhamento de responsabilidades no ambiente familiar, como arrumar o prprio quarto ou compartilhar as atividades na organizao do lar;

b)no entanto, possvel caracterizar a explorao do trabalho infantil domstico no mbito da prpria famlia, quando a criana ou o adolescente assume as responsabilidades tpicas de adultos, incompatveis com o seu processo de desenvolvimento, tais como: cuidar continuamente dos irmos para que os pais possam trabalhar, assumir integralmente a preparao da alimentao da famlia, ficar responsvel por toda a c) o trabalho infantil domstico est classificado como a pior forma de organizao da casa etc.;

trabalho infantil. Essa forma de trabalho para crianas/adolescentes, com frequncia, fere a convivncia familiar e comunitria, e mascara a explorao mediante contextos falsos de caridade e ajuda, os quais, na verdade, mantm relaes de subalternidade, sobrecarga de trabalho e atividades que prejudicam o desenvolvimento infanto-juvenil.

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A reflexo e o enfretamento do trabalho infantil domstico exigem a compreenso do valor do tempo da infncia e da juventude, que devem ser priorizadas com atividades que so importantes e essenciais ao desenvolvimento da criana e do adolescente.

O trabalho em atividades ilcitasO trabalho de crianas e adolescentes em atividades ilcitas, com destaque associao ao trfico de drogas, vedado - assim como aos adultos -, caracterizado como uma das piores formas de trabalho infantil. fcil constatar que a prtica ilcita caracteriza-se como trabalho, j que a maioria das relaes se d com: subordinao, continuidade, remunerao e pessoalidade. O agravante, alm da natureza ilcita, a total negao dos direitos trabalhistas e as limitaes que essa prtica exige, visto que crianas e adolescentes passam a ter seu ir e vir monitorado, restringido, e vivem na tenso diria entre a vida e a morte. Muitos dormem na rua, em telhados, lajes para monitorar, dia e noite, o movimento da favela. Na prtica das atividades ilcitas associadas ao trfico, observa-se: Relaes sociais: permeadas por alta periculosidade, o que implica perda de vida com frequncia e por motivos banais; Crime: reconhecido como ilcito, com manifestao de desejo de rompimento com a prtica, no entanto sem suporte concreto para este desligamento; Estado: presente por meio da polcia, que na maioria dos relatos tem sua interveno baseada na represso, no contribuindo com a ressocializao;

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Guerra: o trfico vive um estado de guerra, no qual a luta pelo domnio de uma faco sobre a outra constante. Assim, no raro, h esse enfrentamento, legitimando relaes que se baseiam no poder e na violncia; Futuro: nada promissor para a criana e adolescente, apontando, com grande probabilidade, cenrios de morte, cadeia ou deficincia fsica. A preveno e a erradicao do trabalho infantil em atividades ilcitas exigem polticas pblicas e aes intersetoriais integradas, para defesa, promoo e proteo dos direitos da criana e do adolescente, em carter de urgncia e emergncia.

O trabalho informalO trabalho informal igualmente proibido pela lei s crianas e aos adolescentes. A conquista dos direitos da criana e do adolescente se deu no somente para a preservao dos limites de idade mnima para o trabalho, mas tambm para a garantia ao adolescente de todos os direitos trabalhistas e previdencirios que no devem ser negligenciados.

O trabalho eventualA eventualidade do trabalho no descaracteriza sua proibio. Mesmo que o trabalho desenvolvido no seja permanente ou que tenha pequena carga horria, a legislao brasileira no permite a realizao de qualquer trabalho antes dos limites de idade mnima.

O trabalho noturnoO trabalho noturno permitido apenas a partir dos 18 anos. Entende-se por trabalho noturno:

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a)Nas reas urbanas, aquele realizado no perodo compreendido entre 22 b)Nas reas rurais, aquele realizado no perodo compreendido entre 20 horas de um dia at as 04 horas do dia seguinte. horas de um dia at as 05 horas do dia seguinte.

O trabalho perigoso e insalubre5O trabalho perigoso e insalubre proibido antes dos 18 anos de idade. Esto intrinsecamente relacionados com as chamadas piores formas de trabalho infantil descritas no Decreto n 6.481, de 12 de junho de 2008.5

O trabalho prejudicial moralidadeOs trabalhos prejudiciais moralidade esto previstos no art. 405, 3, da Consolidao das Leis do Trabalho, e envolvem todos os trabalhos realizados em teatros de revista, cinemas, boates, cassinos, cabars, dancings e estabelecimentos anlogos; nas empresas circenses, em funes de acrobata, saltimbanco, ginasta e outras semelhantes; na produo, composio, entrega ou venda de escritos, impressos, cartazes, desenhos, gravuras, pinturas, emblemas, imagens e quaisquer outros objetos que possam, a juzo da autoridade competente, prejudicar a formao; e tambm os trabalhos na venda, a varejo, de bebidas alcolicas.

5 Trabalho perigoso so todas as tarefas que pela sua natureza ou tipo tm efeitos nocivos na criana e adolescente e, por isso, so proibidos aos menores de 18 anos. So todas as tarefas perigosas ou desenvolvidas em locais perigosos (previstas em lei). Trabalho insalubre aquele prestado em condies que expem o trabalhador a agentes nocivos sade, acima dos limites de tolerncia fixados em razo da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposio aos seus efeitos (CLT, art. 189, e NR 15).

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A jornada de trabalho6Os adolescentes trabalhadores tm jornada de trabalho limitada e no podem realizar, em qualquer hiptese, horas extraordinrias. Alm disso, a jornada de trabalho no pode tornar incompatvel a frequncia escola, nem representar formas de violao dos direitos de crianas e adolescentes.6 Por fim, destaca-se que a proteo contra a explorao do trabalho infantil est inserida no campo mais amplo da garantia integral dos direitos humanos de crianas e adolescentes, e o estabelecimento de limites de idade mnima para o trabalho estabelece uma das estratgias de proteo integral da infncia.

6 A Carta Magna tem por princpio a formao integral da criana e do adolescente. Sendo assim, a jornada de trabalho deve guiar-se por esse princpio. O direito profissionalizao no pode ser interpretado isoladamente dos demais direitos. Assim, sua formao profissional deve assegurar-lhes tempo e condies para as outras atividades que tambm so de igual importncia. A CLT determina que a durao da jornada juvenil deve estar em conformidade com o art. 7, XIII, CF/88: durao do trabalho normal no superior a oito horas dirias. Trabalho do adolescente na condio de aprendiz, jornada de trabalho no superior a seis horas dirias, sendo vedadas a prorrogao e a compensao (art. 432, caput, da CLT).

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2o PRoGRAMA DE ERRADICAo Do TRABALHo INFANTIL No SUAS

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crianas e adolescentes com idade inferior a 16 anos da prtica do trabalho precoce, resguardado o trabalho na condio de aprendiz a partir de 14 anos, em conformidade com o que estabelece a Lei de Aprendizagem (10.097/2000). um programa de natureza intergovernamental e intersetorial que pressupe, nas trs esferas de governo, a integrao de um conjunto de organizaes governamentais e no governamentais em torno do desenvolvimento de iniciativas, estratgias e aes voltadas ao enfrentamento ao trabalho infantil. No mbito do MDS, contempla a) a transferncia de renda; b) o trabalho social com famlias, ofertado pela PSE e PSB; e c) os servios de convivncia e fortalecimento de vnculo para crianas e adolescentes retirados do trabalho infantil, com o objetivo de contribuir para o enfrentamento e erradicao de todas as formas de trabalho infantil. No MDS, coordenado pela Secretaria Nacional de Assistncia Social (SNAS), Departamento de Proteo Social Especial (DPSE); nos Estados, Municpios e DF, pelos rgos gestores da Poltica Pblica de Assistncia Social.

O

PETI um Programa de mbito nacional que articula um conjunto de aes visando proteger e retirar

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2.1 Fundamentao Legal e Gnese do PETI2.1.1 Marcos LegaisA implantao do PETI guarda ressonncia com a forte mobilizao da sociedade brasileira, na dcada de 1980, em torno dos direitos da infncia e da adolescncia no pas, que culminou na Constituio Federal de 1988. O art. 227 elegeu a criana e o adolescente como prioridade absoluta e o art. 7, inciso XXXIII, modificado pela Emenda Constitucional n 20/1998, proibiu o trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 anos de idade e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos de idade, salvo na condio de aprendiz, a partir de 14 anos de idade. O Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA), Lei n 8.069/1990, ratificou a proibio do trabalho infantil e considerou que a condio de aprendiz refere-se formao tcnico-profissional, condicionada garantia de acesso e frequncia obrigatria ao ensino regular, desenvolvimento de atividade compatvel com o desenvolvimento do adolescente e horrio especial para o exerccio das atividades, o que impe a exigncia de contrato de aprendizagem conforme dispe a legislao complementar. Mais especificamente, o ECA assegura s crianas e aos adolescentes o pleno desenvolvimento fsico, moral, espiritual e social, para alm dos direitos fundamentais consagrados na Constituio, tais como: o direito convivncia familiar e comunitria, o direito educao, sade, cultura, ao esporte e ao lazer. A Lei Orgnica de Assistncia Social, Lei n 8.742, de 1993, em consonncia com as determinaes e diretrizes da Constituio Federal de 1988, dispe sobre a organizao da Assistncia Social e postula, no Captulo 1,

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art. 2, entre seus objetivos, a proteo famlia, maternidade, infncia, adolescncia e velhice e o amparo s crianas e adolescentes. No art. 23, seo III, relativa aos Servios, a LOAS define em pargrafo nico que: na organizao dos servios ser dada prioridade infncia e adolescncia em situao de risco pessoal e social, objetivando cumprir o disposto no artigo 227 da Constituio Federal e na Lei n 8.069, de 13 de julho de 1990. No mbito da educao, a Lei de Diretrizes Bsicas, Lei n 9.394/1996, em seu art. 87, 5, estabelece a progresso das redes escolares pblicas urbanas de ensino fundamental para o regime de escolas de tempo integral, o que implica garantir s crianas e aos adolescentes atividades formadoras, ldicas, artsticas e culturais, fortalecendo, dessa maneira, o potencial do sistema de ensino na preveno e erradicao do trabalho infantil.

2.1.2 Aspectos Histricos do PETIO PETI foi lanado, pelo Governo Federal, no ano de 1996, em Mato Grosso do Sul, numa ao articulada entre os trs entes federados, com o apoio da OIT. Em seguida, sua cobertura foi ampliada para os estados de Pernambuco, Bahia, Sergipe e Rondnia, num esforo do Estado brasileiro de implantar polticas pblicas voltadas ao enfrentamento ao trabalho infantil, respondendo, assim, a demandas da sociedade, articuladas especialmente pelo Frum Nacional de Preveno e Erradicao do Trabalho Infantil (FNPETI)7. A partir de ento, o PETI foi progressivamente alcanando todos os estados do Brasil, o7 O Frum Nacional de Preveno e Erradicao do Trabalho Infantil foi criado em 1994 como instncia aglutinadora e articuladora de agentes sociais institucionais envolvidos com polticas e programas destinados a prevenir e erradicar o trabalho infantil no Pas.

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que revela sua importncia no cenrio das polticas pblicas de atendimento aos direitos da criana e do adolescente, inscritos na Constituio Federal de 1988 e ratificados no Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA). Por meio da Portaria n 458, de outubro de 2001, a Secretaria de Estado da Assistncia Social (SEAS), vinculada ao Ministrio da Previdncia e Assistncia Social, estabeleceu as diretrizes e normas do PETI. O Programa foi definido no mbito da gesto intergovernamental, de carter intersetorial, com foco inicial no enfrentamento das piores formas de trabalho infantil, tendo como pblico prioritrio crianas e adolescentes de 7 a 14 anos de idade que estejam trabalhando em atividades consideradas perigosas, insalubres, penosas ou degradantes, com exceo para o atendimento de crianas com at 15 anos de idade em situaes de extremo risco, referentes explorao sexual. A referida portaria introduziu as comisses de erradicao do trabalho infantil no mbito estadual, do DF e municipal, de carter consultivo e propositivo, com participao do governo e da sociedade civil, tendo como objetivo, na poca, contribuir para a implantao e implementao do PETI. A famlia foi afirmada como lcus de ateno do Programa com indicao de registro e cadastramento no Cadnico. A responsabilidade na conduo das aes dos rgos de Assistncia Social e o financiamento se realizariam de forma compartilhada nas trs esferas de governo.

2.1.3 Integrao PETI e Programa Bolsa FamliaA Portaria n 666, de 28 de dezembro de 2005, efetivou a integrao do PETI com o Programa Bolsa Famlia8 , a qual no se pautou na extino,8 Criado pela Lei n 10.836, de 9 de janeiro de 2004.

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mas na integrao, dos dois programas,mantendo suas especificidades. Dessa forma, ao mesmo tempo, os dois Programas agem em sinergia, no que se refere aos objetivos de combater a pobreza e de erradicar o trabalho de crianas e adolescentes. A integrao tornou-se a forma concreta que permite a garantia da UNIVERSALIZAO DO PETI e maior interlocuo com o PBF. Todo municpio e o DF com situaes de trabalho infantil pode acessar o PeTI desde que cadastre as famlias no Cadnico. A portaria, ao disciplinar a integrao dos dois Programas, elencou como objetivos: a)racionalizao e aprimoramento dos processos de gesto do Programa Bolsa Famlia e do PETI;

b)ampliao da cobertura do atendimento das crianas e adolescentes c) extenso das aes do SCFV para as crianas e/ou adolescentes do Programa Bolsa Famlia em situao de trabalho infantil. Desse modo, a integrao dos dois Programas permitiu que as famlias com crianas e adolescentes em situao de trabalho, nos critrios de elegibilidade do Programa Bolsa Famlia, fossem includas no maior programa de transferncia de renda do Brasil, eliminando quaisquer possibilidades de duplicidade de recebimento de benefcios financeiros. Essa portaria tambm introduziu mudanas na Portaria n 458/2001. O PETI ampliou seu foco ao atender s diversas situaes de trabalho de crianem situao de trabalho infantil;

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as e adolescentes com idade inferior a 16 (dezesseis) anos, em atendimento idade mnima estabelecida pela Emenda Constitucional n 20/1998, ressalvado o trabalho na condio de aprendiz a partir dos 14 anos. As atividades da jornada ampliada passaram a ser denominadas atividades socioeducativas e de convivncia. Destaca-se com a integrao: ANTES Existncia de duplicidade de benefcios entre 1 os dois Programas,os quais envolvem transferncia de renda. Demanda reprimida e acesso limitado Jornada Ampliada destinada 2 s crianas e adolescentes e transferncia de renda para famlias em situao de trabalho infantil (Meta Pactuada). 3 Concorrncia entre o PETI e o PBF. AVANoS REALIZADoS PoR MEIo DA INTEGRAo Equalizao da transferncia de renda, de forma a garantir que as famlias recebam apenas um benefcio. Possibilidade de universalizao do acesso ao Servio de Convivncia e Fortalecimento de Vnculos/PETI (antes denominado Jornada Ampliada) e transferncia de renda para famlias identificadas em situao de trabalho infantil, a partir do cadastramento (Cadastro nico). Superao da concorrncia entre os dois Programas, a partir dos critrios de elegibilidade correspondentes.

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Repasse financeiro correspondente transferncia de renda, por meio do Fundo Nacional 4 de Assistncia Social (FNAS), aos municpios, para que estes repassassem s famlias (pagamento com intermediao do gestor municipal). Obrigatoriedade do registro dos No identificao das 5 famlias beneficirias do PETI pelo Governo Federal (Meta Pactuada). dados das famlias, crianas e adolescentes, pelos gestores municipais, no Cadastro nico, permitindo a identificao, pela esfera federal, das famlias/crianas e adolescentes beneficirias. Pblico-alvo do PETI 6 abrangia a faixa etria de 7 a 14 anos. Foco do atendimento 7 voltado apenas para as piores formas de trabalho infantil. Ampliao da faixa etria para crianas e adolescentes com at 16 anos. Ampliao do foco de atendimento para todas as formas de trabalho infantil. Repasse financeiro/transferncia de renda direto s famlias por meio de carto magntico da CAIXA.

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Aes Socioeducativas (Jornada Ampliada) no 8 extensivas ao PBF para crianas/adolescentes em situao de trabalho precoce.

Extenso das Aes Socioeducativas (Servio de Convivncia) para todas as crianas e adolescentes do PBF identificados em situao de trabalho precoce. Disponibilizao aos Estados,

Ausncia de sistema 9 especfico para monitoramento das Aes Socioeducativas.

Municpios e DF do sistema online de controle de frequncia e gesto do Servio Socioeducativo/Convivncia do PETI SISPETI, a partir de 2007.

2.2 Pesquisas sobre o PETI importante ressaltar tambm as contribuies do PETI no enfrentamento ao trabalho infantil a partir do olhar de pesquisas nacionais especficas, encomendadas pelo MDS. Entre outubro e dezembro de 2008, o MDS, por meio da Secretaria de Avaliao e Gesto da Informao (SAGI), realizou duas pesquisas sobre o PETI nas cinco regies do pas. A primeira pesquisa teve como orientao metodolgica um estudo quantitativo sobre o Programa. Em uma amostra de 120 municpios, realizaram-se entrevistas com gestores, coordenadores e monitores do PETI. A pesquisa ficou a cargo da Fundao Euclides da Cunha Ncleo de Pesquisas, Informaes e Polticas Pblicas da Universidade Federal Fluminense (DATAUFF).

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A segunda pesquisa teve como orientao metodolgica um estudo qualitativo sobre o Programa. Com uma subamostra de 40 municpios, dentre os 120 pesquisados do estudo quantitativo, adotaram-se as seguintes estratgias: entrevistas com gestores municipais de Assistncia Social, coordenadores dos ncleos de atividades socioeducativas do PETI, professores de escolas, monitores do servio socioeducativo; e grupos focais com crianas e adolescentes do PETI, bem como com suas mes. A realizao se deu pela Empresa Herkenhoff & Prates Tecnologia e Desenvolvimento. Os resultados demonstraram a contribuio do Programa para o combate ao trabalho infantil no Pas. A pesquisa quantitativa demonstrou que9: Mais de 95% dos gestores afirmam que aps a implantao do PeTI houve reduo do trabalho infantil no municpio. Os monitores dos ncleos de atividades socioeducativas e de convivncia10 tambm reconheceram a importncia do PETI: a)47,5% desses afirmam que o Programa conseguiu reduzir o trabalho infantil em mais de 71% no seu municpio; textos melhorou em mais de 51%;

b)49% acham que a capacidade das crianas de ler, escrever e interpretar c) 80% apontam que o PETI auxiliou com a reduo do trabalho infantil;

9 Resultados da pesquisa quantitativa realizada pela SAGI, entre outubro e dezembro de 2008, apresentados no Seminrio Diretrizes Metodolgicas e Operacionais do Programa de Erradicao do Trabalho Infantil. Braslia DF, 2010. 10 Atividades socioeducativas e de convivncia do PETI foram incorporadas, conforme Tipificao Nacional dos Servios Socioassistenciais, no Servio de Convivncia e Fortalecimento de Vnculo (SCFV).

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d) 12% consideram que, aps a implementao do Programa, o trabalho infantil em seu municpio foi erradicado. Com relao s famlias, a pesquisa apresentou a seguinte avaliao a respeito do PETI: a)88,5% dos entrevistados avaliam como bom ou timo, apenas 8,3% como regular e 1,6% como ruim ou pssimo;

b)71,2% dos respondentes afirmam que houve melhora na situao da dana e apenas 0,6% afirmam que piorou;

famlia aps a insero no Programa, 26,7% dizem que no houve mu-

c) 87,1% avaliam o relacionamento com a equipe do servio socioeducativo e de convivncia como bom ou timo. Por sua vez, o estudo qualitativo de Avaliao do PETI revelou: Para as crianas e adolescentes, o fato de eles estarem trabalhando foi o motivo principal de terem entrado no PeTI e afirmam tambm que a vida melhorou depois do PeTI, especialmente porque: conviviam com as piores situaes de violncia e maus-tratos; o dinheiro do PeTI auxiliou na convivncia familiar; a vida melhorou depois de entrar no PeTI porque brincam muito e aprendem a ter respeito com os outros. Para mais da metade das crianas/adolescentes, o principal espao que possuem para brincar o PETI. As mes foram enfticas quanto ao impacto positivo do PETI nas suas vidas e na de seus filhos. Elas consideraram o apoio financeiro da bolsa do

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PETI como sendo crucial para melhoria de suas condies de vida. Porm, a maioria considerou, tambm, que os ganhos advindos das atividades socioeducativas e de convivncia para as vidas de seus filhos eram incomparavelmente maiores do que os ganhos materiais. Elas reconheceram a afetividade existente entre os monitores e as crianas e adolescentes como sendo foras motrizes das mudanas de seus filhos. Segundo os gestores municipais, os principais resultados alcanados pelo PETI esto relacionados ao desenvolvimento fsico e psicolgico dos beneficirios, no que se refere melhoria na autoestima das crianas, adolescentes e suas famlias, e a mudanas positivas de comportamento. Para 88% dos professores escolares entrevistados, a participao de seus alunos nas atividades socioeducativas e de convivncia parece ser benfica, quer seja porque retiraria as crianas e adolescentes das ruas e do trabalho, quer seja porque impactaria positivamente no seu desempenho, aprendizado, rendimento escolar, comportamento e socializao. A pesquisa demonstrou que de suma importncia a manuteno do PETI, j que ele: a)cumpre o papel de proteo e cuidado de crianas e/ou adolescentes;

b)qualifica o tempo das crianas e adolescentes, na medida em que, se no estivessem no PETI, estariam trabalhando, em casa, realizando atividades domsticas, em situaes de risco; c) previne situaes de risco advindas da rua;

d)colabora para o bom relacionamento familiar;

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e)oferta atividades que colaboram com o desenvolvimento da criana e f) colabora na manuteno e no bom desempenho na escola. entre outras;

do adolescente, como o brincar, as atividades esportivas, artsticas,

2.3 O PETI no Sistema nico de Assistncia Social SUASEm 2004, com a aprovao da Poltica Nacional de Assistncia Social (PNAS), que apontou como imperativo a implementao do SUAS de modo a materializar a regulao e a organizao do modelo de gesto descentralizado e participativo em todo o territrio nacional, iniciou-se o reordenamento da gesto da assistncia social, tendo como instrumento norteador a NOB/SUAS, aprovada pela Resoluo n 130, de 15 de julho de 2005. A partir de ento, os servios, programas, projetos e benefcios de Assistncia Social, incluindo o PETI, passaram a ser regulados, organizados e avaliados com base nos eixos estruturantes do SUAS. As aes da assistncia social no se realizam de forma isolada, mas se articulam para a formao de uma rede de proteo social. So princpios que norteiam a proteo social, estabelecidos no texto da PNAS, e que devem ser observados por todas as aes a serem desenvolvidas no mbito do SUAS: a) Matricialidade sociofamiliar: a famlia o ncleo bsico de acolhida, convvio, autonomia, sustentabilidade e protagonismo social, e, portanto, sustento, na guarda e na educao de suas crianas e adolescentes;

deve ser apoiada e ter acesso a condies para responder ao seu papel no

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b)Territorializao: a proteo social orientada na perspectiva do alaplicao do princpio de preveno e proteo proativa por meio de no planejamento da localizao da rede de servios a partir do territrio c) Integrao Seguridade Social: reafirma que a rede de proteo social brasileira compe-se da Previdncia Social, da Sade e da Assistncia Social; de maior incidncia de vulnerabilidade e riscos;

cance de universalidade de cobertura entre os indivduos e famlias, na aes que objetivam reduzir a ocorrncia de riscos e de danos sociais, e

d)Integrao s polticas sociais e econmicas: refere-se dinmica e vulnerabilidades e dos riscos est embrincada nos dois setores, exigindo-se, portanto, aes intersetoriais e de integrao territorial. Nessa perspectiva, so princpios do PETI:

gesto da Assistncia Social, considerando-se que grande parte das

a)Reconhecimento da criana e do adolescente como sujeitos de direito e pessoas em condio peculiar de desenvolvimento que no podem, em momento ser protegidas dessa prtica; hiptese nenhuma, vivenciar situaes de trabalho, devendo a todo o b)Garantia dos direitos da criana e do adolescente retirados da prtica do trabalho infantil;

c) Reconhecimento de que o trabalho infantil proibido no Brasil, exigindo a eficaz e imediata interveno pblica para a interrupo, no reincidncia e preveno dessa situao.

A partir desses princpios, reafirmam-se as seguintes diretrizes do PETI:

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a)Mobilizao e sensibilizao da sociedade quanto ao enfrentamento ao trabalho infantil;

b)Controle social e garantia de espaos de participao da sociedade civil c) Intersetorialidade, envolvendo diferentes segmentos governamentais d)Universalidade do acesso das famlias com crianas e adolescentes em e Fortalecimento deVnculo (SCFV), bem como rede socioassistencial; e no governamentais no enfrentamento ao trabalho infantil; no enfrentamento ao trabalho infantil;

situao de trabalho transferncia de renda e ao Servio de Convivncia

e)Gesto e financiamento do Programa compartilhados pela Unio, Estaf) Gesto integrada com os Servios e Benefcios; bilizados pelo MDS. dos, Municpios e Distrito Federal; g)Gesto da informao por meio de sistemas informatizados disponiNesse contexto de mudanas e de construo de normativas, foi aprovada pelo Conselho Nacional de Assistncia Social (CNAS), em atendimento deliberao da VI Conferncia Nacional de Assistncia Social, a Tipificao Nacional dos Servios Socioassistenciais, na qual se traduz a concepo de que o enfrentamento ao trabalho infantil, na poltica de Assistncia Social, dar-se-, tambm, por meio de Servios de Proteo Social Bsica e Proteo Social Especial, desenvolvidos de forma articulada entre si. No mbito do MDS, o PETI se fortalece como um programa integrante do SUAS, com papel estratgico, no sentido de assegurar, alm da transferncia direta de renda s famlias via integrao com o Programa Bolsa Famlia:

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1) a incluso das crianas e adolescentes em situao de trabalho infantil no SCFV; 2) o aprimoramento do processo de identificao das situaes de trabalho infantil, nos espaos pblicos, por meio do Servio Especializado em Abordagem Social; 3) a orientao e o acompanhamento das famlias por meio do Servio de Proteo e Atendimento Especializado a Famlias e Indivduos (PAEFI) e do Servio de Proteo e Atendimento Integral Famlia (PAIF), por referenciamento e contrarreferenciamento dos usurios no Sistema, conforme especificidades das situaes vivenciadas, dentro da perspectiva do trabalho em rede concebido pelo SUAS. Desse modo, o SCFV, tipificado na PSB, destinado a crianas e adolescentes de 6 a 15 anos, incorporou as aes socioeducativas e de convivncia previstas nas normativas do PETI. Isso significa que o municpio, ao estruturar o servio SCFV, por meio da PSB, dever assegurar, prioritariamente, a incluso e a permanncia de crianas e adolescentes identificados em situao de trabalho, observando a condicionalidade de frequncia prevista na normativa.

2.3.1 PETI e Proteo Social EspecialOs servios de PSE destinam-se a famlias e indivduos em situao de risco pessoal e social e/ou violao de direitos por ocorrncia de situaes como: abandono, maus-tratos fsicos e/ou psquicos, abuso e explorao sexual, situao de rua, situao de trabalho infantil, entre outras. So servios que requerem especializao na ateno e maior flexibilidade nas solues protetivas. Comportam intensa articulao com os demais servios da rede socioassistencial, tendo em vista a efetividade dos encaminhamentos e da ateno protetiva s famlias, e exigem uma gesto mais complexa e articulada com outras polticas pblicas, com o Poder Judi-

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cirio, Ministrio Pblico, Conselhos Tutelares e outros rgos de defesa de direitos, com definio de fluxos de referncia e contrarreferncia. Os nveis de complexidade diferenciados da PSE mdia e alta complexidade consideram a especificidade do atendimento e da ateno ofertada de acordo com o agravamento e as demandas observadas nas situaes vivenciadas. Os servios de PSE de Alta Complexidade se propem a ofertar servios especializados com vistas a afianar a segurana de acolhida a indivduos e/ou famlias afastados temporariamente do ncleo familiar e/ou comunitrios de origem. Os servios de PSE de Mdia Complexidade so aqueles que oferecem atendimento especializado s famlias e aos indivduos em situao de risco pessoal e social e/ou violao de direitos. A PSE de mdia complexidade oferta dois servios que contribuem diretamente para o enfrentamento ao trabalho infantil: o PAEFI, ofertado no CREAS, e o Servio Especializado em Abordagem Social, que pode ser ofertado no CREAS ou em unidade especfica referenciada. O CREAS constitui-se na unidade pblica estatal de prestao de servios especializados e continuados a indivduos e famlias em situao de risco pessoal e social e/ou violao de direitos, promovendo a integrao de esforos, recursos e meios para enfrentar a disperso dos servios e potencializar a ao para os seus usurios. Opera a referncia e a contrarreferncia com a rede de servios socioassistenciais da proteo social bsica e especial, com as demais polticas pblicas e com outras instituies que compem o Sistema de Garantia de Direitos.

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O Servio Especializado em Abordagem Social, por meio do trabalho social desenvolvido nos territrios, pode identificar a incidncia de trabalho infantil em espaos pblicos, situaes nas quais dever comunicar pessoa de referncia da PSE responsvel pelo PETI e fazer os devidos encaminhamentos para o PAEFI para incio do acompanhamento da famlia. A pessoa de referncia na PSE responsvel pelo PETI dever garantir a insero das famlias no Cadnico e das crianas/adolescentes no SCFV e/ou em outras aes socioeducativas da rede de promoo e proteo dos direitos da criana e do adolescente, assegurando o acompanhamento da frequncia e registro no SISPETI. O PAEFI oferta atendimento especializado de apoio, orientao e acompanhamento das famlias com um ou mais de seus membros em situao de risco pessoal e social e/ou violao de direito, buscando a promoo dos direitos e o fortalecimento da funo protetiva da famlia. Tem, portanto, papel fundamental na orientao e acompanhamento das famlias, de modo a contribuir para a retirada imediata da criana e do adolescente da situao de trabalho. Contribui, tambm, para o cumprimento das condicionalidades inerentes ao PBF e ao PETI, por meio do trabalho social com as famlias, quando os motivos do descumprimento se referirem a quaisquer situaes de risco pessoal e social e/ou violao de direitos, dentre as quais a prpria reincidncia de trabalho infantil. Ressalte-se que, quando identificadas as situaes de trabalho infantil, o PAEFI proceder ao acompanhamento familiar por no mnimo 3 meses, com vistas a contribuir para a imediata retirada de crianas e adolescentes do trabalho, para o cumprimento das condicionalidades de frequncia ao SCFV, escola, e para a sade, proporcionando orientao e acompanhamento da famlia. Visa tambm superao de outras situaes de risco pessoal e social e/ou violao de direitos identificadas. Aps interveno do PAEFI, a famlia deve ser encaminhada ao CRAS para o devido acompanhamento no territrio pelo PAIF.

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Nas vivncias de trabalho infantil, podem ser encontrados adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa em meio aberto (LA e PSC). Nesses casos, a coordenao ou pessoa responsvel pelo PETI buscar articular-se com o CREAS, por meio do Servio de Proteo Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida Socioeducativa (LA e PSC), para que, em conjunto, mantenham as aes de enfrentamento ao trabalho infantil, sem prejuzo do cumprimento de medida socioeducativa pelos adolescentes em conflito com a lei, de modo a respeitar o carter impositivo de sua aplicao conforme determina o ECA. Tambm podem ser encontradas em situao de trabalho crianas e adolescentes com vnculos familiares muito fragilizados e /ou j afastados do convvio familiar e/ou comunitrio de origem, cujas famlias ou responsveis no esto conseguindo cumprir sua funo protetiva ou se encontram impossibilitados temporariamente de prover cuidados parentais e de proteo. Nessas situaes, a coordenao ou pessoa de referncia do PETI e o CREAS devero, num trabalho articulado com o Conselho Tutelar, buscar o resgate do convvio familiar. Quando necessrio, devem ainda realizar articulaes com a Justia e com a pessoa responsvel pelos servios de alta complexidade para promover o imediato atendimento nos servios de acolhimento, materializando assim a segurana de acolhida. Ao longo de todo esse processo, a PSE no deve perder de vista a manuteno das aes para a retirada da criana e do adolescente do trabalho. Nesse contexto, vale registrar que, como o trabalho infantil constitui-se violao de direitos, a coordenao ou pessoa de referncia responsvel pelo PETI dever estar vinculada PSE e ter a atribuio de apoiar o gestor da Assistncia Social a promover a articulao do PETI no SUAS, a intersetorialidade com outras polticas pblicas, a interface do PETI com os rgos de defesa de direitos, dentro de suas competncias tcnicas.

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2.3.2 PETI e Proteo Social BsicaA PSB tem como objetivos prevenir situaes de risco, destinando-se populao que vive em vulnerabilidade social decorrente da pobreza, privao (ausncia de renda, precrio ou nulo acesso aos servios pblicos, entre outros) e/ou fragilizao de vnculos afetivos relacionais e de pertencimento social. Deve articular-se com as demais polticas pblicas locais, para garantir a sustentabilidade das aes desenvolvidas e o protagonismo das famlias e indivduos atendidos, de forma a superar as condies de vulnerabilidade e a prevenir as situaes que indicam risco potencial. Esses objetivos devem ser concretizados por meio de programas, projetos, benefcios, servios s famlias, conforme identificao da situao de vulnerabilidade apresentada, tendo como principal servio o PAIF, ofertado na unidade central desse nvel de proteo o Centro de Referncia da Assistncia Social (CRAS). A Proteo Social Bsica tem um papel fundamental na preveno do risco e da reincidncia da prtica de trabalho infantil, pois oferta o Servio de Proteo e Atendimento Integral Famlia (PAIF). Alm disso, por meio do Servio de Convivncia e Fortalecimento de Vnculos (SCFV) para crianas e adolescentes de 6 a 15 anos, acolhe, com prioridade, aqueles que foram retirados do trabalho infantil e foram contrarreferenciados a um CRAS. Isso reafirma a necessidade de que a PSE e a PSB estejam articuladas e de que fluxos de referncia e contrarreferncia sejam definidos. O CRAS uma unidade pblica estatal que tem por atribuies a organizao da rede socioassistencial e a oferta de servios de proteo social bsica do SUAS nas reas de vulnerabilidade e risco social dos municpios e Distrito Federal. Dada sua capilaridade nos territrios, caracteriza-se como principal porta de entrada do SUAS, ou seja, uma unidade que possibilita

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o acesso de um grande nmero de famlias rede de proteo social de assistncia social.11 A gesto territorial da PSB responde ao princpio de descentralizao do SUAS e tem como objetivos promover a atuao preventiva, disponibilizar servios prximos do local de moradia das famlias, racionalizar as ofertas e traduzir o referenciamento dos servios do CRAS em ao concreta, tornando a principal unidade pblica de proteo bsica uma referncia para a populao local e para os servios setoriais. Aes de gesto territorial da PSB que guardam estreita relao com o PETI: a)Articulao da rede socioassistencial de PSB referenciada ao CRAS: viade assistncia social; contribui para a definio de atribuies das unidades, para a adoo de fluxos entre o PAIF e os servios de convivncia; e promove a gesto integrada de servios e benefcios, permitindo o acesso dos beneficirios de transferncia de renda aos servios sociob)Busca ativa: tem como objetivo identificar as situaes de vulnerabilidade e risco social, ampliar o conhecimento e a compreenso da sobre as situaes de vulnerabilidade, risco e potencialidade social identificadas e apoia-se em informaes disponveis, como aquelas sobre famlias ou jovens em descumprimento das condicionalidades do Programa Bolsa Famlia. realidade social, sendo, portanto, essencial ao preventiva. Atua assistenciais locais, com prioridade para os mais vulnerveis;

biliza o acesso efetivo da populao aos servios, benefcios e projetos

11 Centro de Referncia de Assistncia Social (CRAS). Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome.1.ed. Braslia: Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome, 2009. 72 p.

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Cumpre destacar a importncia de articulao do PETI com o PROJOVEM, j que, no art. 10 da Lei n 11.692, de 10 de junho de 2008, se afirma que o Projovem Adolescente Servio Socioeducativo destina-se aos jovens de 15 (quinze) a 17 (dezessete) anos: a)pertencentes famlia beneficiria do Programa Bolsa Famlia;

b)egressos de medida socioeducativa de internao ou em cumprimento de Lei n 8.069, de 13 de julho de 1990 Estatuto da Criana e do Adolescente;

outras medidas socioeducativas em meio aberto, conforme disposto na

c) em cumprimento ou egressos de medida de proteo, conforme dispose) egressos ou vinculados a programas de combate ao abuso e explorao sexual. No pargrafo nico desse artigo, explicita-se que os jovens devem ser encaminhados ao Projovem Adolescente Servio Socioeducativo pelos programas e servios especializados de assistncia social do Municpio ou do Distrito Federal, entre outros. Dessa forma, atribuio da coordenao ou pessoa responsvel pelo PETI fazer o encaminhamento que se refere ao pblico desse programa. d) egressos do Programa de Erradicao do Trabalho Infantil PETI; ou to na Lei n 8.069, de 13 de julho de 1990;

2.3.3 o PETI no Contexto do Protocolo de Gesto Integrada dos Servios, Benefcios e Transferncia de RendaBuscando cumprir os pressupostos do SUAS de concretizar, de fato, a gesto Integrada de Servios, Benefcios e Transferncia de Renda, o Pro-

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tocolo, pactuado por meio da Resoluo da CIT no 07/2009, prope mecanismos de fortalecimento da articulao da rede socioassistencial, com o propsito de romper com a prtica de no articulao dos benefcios e transferncias de renda aos servios socioassistenciais. O Protocolo, ao afirmar que o pblico prioritrio dos servios socioassistenciais so as famlias do PETI, do Programa Bolsa Famlia e Benefcio de Prestao Continuada (BPC), vincula segurana de renda s seguranas de convvio familiar, comunitrio e de desenvolvimento da autonomia, previstas no texto da Poltica Nacional de Assistncia Social (PNAS), de modo a reafirmar que a gesto integrada dos servios, benefcios e transferncia de renda materializa direitos socioassistenciais. Alm disso, o Protocolo favorece a identificao das situaes de vulnerabilidade e risco que podem causar o descumprimento das condicionalidades previstas no Programa Bolsa Famlia e PETI como violncia, trabalho infantil, entre outras e assegura a oferta de acompanhamento familiar no sentido de contribuir para sua superao. O descumprimento de condicionalidades inerentes ao Programa Bolsa Famlia e ao PeTI pode constituir situaes reveladoras do alto grau de vulnerabilidades das famlias. Pode tambm revelar a insuficincia por parte das polticas sociais envolvidas. Tal fato indica a necessidade de acompanhamento familiar, a ser realizado pela PSB, por meio do CRAS, quando os motivos se configurarem como situaes de vulnerabilidades, e pela PSe, por meio do CReAS, quando os motivos se configurarem como situaes de ameaa e/ou violao de direitos. importante destacar que nos casos em que a causa do descumprimento das condicionalidades for a falta de acesso das famlias s polticas de

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Assistncia Social, Sade e Educao, a Unio, os Estados, o DF e os Municpios devem elaborar conjuntamente estratgias para sanar lacunas existentes na oferta dos servios no territrio. Na inexistncia desses equipamentos nos municpios com cobertura do PETI e do Programa Bolsa Famlia, cabe equipe de referncia da PSB e/ou da PSE, vinculada ao rgo gestor, realizar o acompanhamento. Isso porque as condicionalidades tm por finalidade responsabilizar, de forma conjunta, o Estado e as famlias pela garantia dos direitos de crianas e adolescentes. Ademais, o Protocolo norteia o planejamento e a execuo de aes orientadas pela perspectiva da Vigilncia Social, uma vez que, a partir do processamento e anlise das informaes, feita a identificao das famlias, assim como sua localizao no territrio, viabilizando a busca ativa e a insero delas nos servios socioassistenciais. Para tanto, estabelece objetivos especficos: a)adoo do Cadnico e Cadastro do BPC como base de dados para a realizao do diagnstico de vulnerabilidade e risco no territrio, e do cessidades, habilidades e potencialidades das famlias; planejamento da oferta dos servios socioassistenciais, conforme neb)padronizao dos procedimentos de gesto para o atendimento s c) padronizao dos instrumentos de coleta de dados e gerao de informaes e indicadores para o monitoramento e avaliao do atendimento s famlias; d)estabelecimento do fluxo de informaes entre os Entes Federados; famlias;

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e)construo de mecanismos que fortaleam a articulao da rede socioassistencial, de educao e de sade. Com referncia implementao do Protocolo, cabe:

Unio instituir as diretrizes e parmetros para o atendimento a beneficirios do Programa Bolsa Famlia e do PETI nos servios da PSB e PSE; disponibilizar para o secretrio municipal de Assistncia Social a relao das famlias beneficirias do Programa Bolsa Famlia e do PETI; ao final de cada perodo de acompanhamento das condicionalidades dos Programas, disponibilizar para o secretrio municipal as informaes sobre as famlias em descumprimento de condicionalidades.

Estados estabelecer, quando for o caso, fluxos de referncia e contrarreferncia regionalizados entre a PSB e a PSE, inclusive nos territrios sem cobertura de atendimento do CRAS ou do CREAS; estabelecer, em conjunto com os municpios, estratgias para o atendimento das famlias nas regies metropolitanas, nas reas fronteirias, nas reas com cobertura de CREAS Regional e em locais com maior incidncia de descumprimento das condicionalidades;

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garantir o repasse das informaes referentes s condicionalidades de frequncia escolar das crianas e dos adolescentes matriculados em escolas estaduais e da condicional