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Origem, transporte e deposição do ouro em Manica (Moçambique) F. L. C. d'OREY Centro de Estratigrafia e Paleobiologia da UNL, Faculdade de Ciências e Tecnologia, Quinta da Torre, P-2825 Monte de Caparica, Portugal. Ciências da Terra (UNL) Lisboa 11 pp. 39-64 .1992 figs. 3. 4 est.

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Origem, transporte e deposição do ouro em Manica(Moçambique)

F. L. C. d'OREY

Centro de Estratigrafia e Paleobiologia da UNL, Faculdade de Ciências e Tecnologia,Quinta da Torre, P-2825 Monte de Caparica, Portugal.

Ciências da Terra (UNL) Lisboa Nº 11pp. 39-64 .1992

figs. 3. 4 est.

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RESUMO

Palavras-chave: Cratão - Zimbabwe - Moçambique­"greenstone belt" - ouro - jazigos magmáticos ­

filonianos e estratôides - controlos estratigráficos eestruturais- tratamento mineral -prospecção.

Os vários tipos de jazigos arcaicos de ouro queocorrem no "greenstone belt" de Manica em Moçambiquesão caracterizados no seu contexto geológico. Dá-se par­ticular atenção à mineralogia e petrologia das jazidas, seuscontrolos geológicos, sua prospecção e, também, àscaracterísticas que o podem tomar refractário ao tratamentomineral. A génesedosjazigos foi controlada essencialmentepor processos estratigráficos, mas a intrusão dos granitostardios e os acontecimentos estruturais que lhe estão ligadosremobilizaram e concentraram o ouro em vários ambientesgeológicos.

A possibilidade de ocorrência de novos jazigos emdiversos tipos de rochas é discutida, assim como orientaçõespara a futura investigação e desenvolvimento.

RÉSUMÉ

Mots-clés: Craton - Zimbabwe - Moçambique ­"greenstone belt" -or-gisementsmagmatiques.filonienset stratoides - controles stratigraphiques et structuraux- traitement mineral- prospection.

On caractérise du pointde vue géologique les differentstypes de gisements archaíques d'or du "greenstone bclt" de

Manica, au Mozambique. Une attention particuliêre estconsacrée à la mineralogie et à la petrologie des gisements,ainsi qu'à leurs contrôles géologiques, sa prospection, etaux caractéres qui peuvent le rendrerefractaireau traitementminéral. La génese des gisements a été controléeessentiellement par des procédés stratigraphiques, maisl' intrusion des granites tardifs et les événements structurauxavec lesquels ils sont en rapport ontremobilisé et concentréror en divers environnements géologiques.

Les possibilités d'ocurrence de nouveaux gisementsen divers types de roches est discutée ainsi que des guidespour de futures recherches et développements.

ABSTRACT

Key-Words: Zimbabwe craton - Mozambique ­greenstone belt - gold - magmatic - vein and stratabound deposits- stratigraphic and structural controls­ore dressing - prospection.

The different types of Archean gold deposits in theManica greenstone belt ofwestem Mozambique are briefelydescribcd in the context of their geological setting. Particu­lar attention is devoted to the mineralogy, petrology, geo­logical controls, refractoriness to treatmentand prospectionof these gold deposits. The genesis of gold wasstratigraphically controled, but structural and metamor­phic events related to the intrusion of late granites haveconcentrated and relocated the gold in different geologicalenvironments. Thepossibility ofadditional goldoccurencesin differentrocks sequences is discussedas well as possibleguidelines for future research and development.

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INTRODUÇÃO

Após um ligeiro declínio na última década, aprodução aurífera no mundo ocidental atingiu 1373toneladas em 1987, o que significa um aumento de40% se comparada com a produção de 1981(BEUNDERMAN, 1989). Se este ritmo se mantiver,o ano de 1991 poderá testemunhar uma produçãoque, no Ocidente, ultrapassará as 1700 toneladas.

Ignora-se quando teria começado a extracção doouro na África austral. Parece haver indicações quesugerem que aextracção no Estado indiano de Mysoreteria inspirado os antigos trabalhos mineiros no Zim­babwe' que se desenvolveram a partir do século IIIdanossa era (SUMMERS, 1969).

A produção do ouro no cratão do Zimbabwe épequena em termos mundiais, mas as suas rochasarcaicas vangloriam-se de ter a maior produçãomundial em termos de área e provavelmente a maiorconcentração de minas de qualquer cratão arcaico nomundo.

Calcula-se que a produção aurífera acumuladado cratão do Zimbabwe tenha atingido entre 65 a 70milhões de onças. A produção de ouro nos doiscratões da África Austral (Zimbabwe e Kaapvaal)produziu por quilómetro quadrado o dobro do cratãocanadiano e o quádruplo do cratão da Austráliaocidental (ANHAEUSSER, 1974).

ANHAEUSSER (1974) demonstrou que os"greenstone belts" da África Austral contêm, emrelação ao Canadá e Austrália, uma proporção muitosuperior de rochas máficas e ultramáficas e sãorelativamente deficientes de rochas intermédias efélsicas. A preponderância daqueles conjuntosmáficos e ultramáficos indica uma antiguidade supe­rior para os cratões da África Austral, que sãoacompanhados por maior abundância de elementossiderófiloscomo, porexemplo, Au, Ni e Fe e elementosdo grupo da platina, assim como de crómio nas rochasdeficientes de sílica.

A maior parte da produção aurífera do Zimba­bwe derivou de jazigos filonianos que ocorrem emzonas xistentas sulfurizadas e silicificadas, em zonasde cizalhamento e em filões de quartzo maciço emdiferentes tipos de rochas. A maioriadesses filões foi,em parte, ditada pela profundidade da crusta ondeocorreu adeslocação e, em parte, pelaheterogeneidadelitológica das sucessões vulcano-sedimentaresdeformadas (FOSTER, 1989).

A região de Manica, em território moçambicano,faz parte da porção mais oriental do cratão do Zimba- .bwe (Fig. 1). São numerosas as regiões do Distritoonde se procedeu desde finais do século passado àextracção do ouro, podendo computar-se em mais deduas centenas o número de concessões que aliexistiriam (ARAÚJO & GOUVEIA, 1965). Aprodução de ouro atingiu o máximo em 1914 com15.263 onças, incidindo especialmente sobre filõesde quartzo aurífero e aluviões recentes (ARAÚJO &GOUVEIA, 1965). A actividade mineira quaseparalizou em 1949devido a três factores: manutençãodo preço oficial do ouro em US $35/onça, aumentodos custos de mão de obra e por a maior parte dasexplorações dos jazigos filonianos ter atingido ochamado nível dos sulfuretos, isto é a zona nãooxidada ou protominério. Este último facto exigiriauma tecnologia completamente diferente notratamento das mineralizações refractárias de ouro,muito mais sofisticada do que os métodos gravíticossimples, utilizados na zona superficial oxidada ealterada.

A Mina Bragança, abandonada no início da IªGuerra Mundial, atingiu a profundidade de 80 metroscom um teormédio de 7,5g/t(ARAÚJO & GOUVEIA,1965). Os concessários da mina de cobre e níquel daMondunguara recebiam até 1975 um prémio variáveldos importadores japoneses pelo ouro extraído dosconcentrados nas suas refinarias, cujo teormédio nãoandava longe dos 0,5 g/t. (com.pess.deJ.Borrowdale).Certas zonas deste jazigo magmático, particularmente as que têm baixos teores de cobre por

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Fig. 1 - Mapa esquemático da distribuição dos "greenstone belts" nos cratões da África Austral, rodeados por "belts"

móveis altamente metamorfizados.

serem enriquecidos em pirrotite hexagonal,apresentam, neste sulfureto de alta temperatura,inclusões de ouro contemporâneas, e o teor de ourodessaszonasvariaentre27e 121 ppm(OREY, 1989).Nas zonas de onde se extraem os concentrados decalcopirite, os teores de ouro não excedem 8 pprn,sendo a média muito próxima ou mesmo inferior a 1ppm (OREY, 1989).

À datada independênciade Moçambique (1975),a mina Mondunguara era a única em funcionamento;procedia-se a trabalhos simbólicos nas minas Mon­arch, Bragança, Cantão, Guy Fawkes e Two Fools.Infelizmente, a guerra civil pôs termo a essasactividades, precisamente na altura em que o preçodo ouro subiu vertiginosamente.

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CARACTERÍSTICAS GEOLÓGICAS

o cratão do Zimbabwe (Fig. 1) é composto poruma grande variedadede rochas graníticas, vulcânicase sedimentares. Dispersos nas rochas graníticas,existem vinte e cinco "greenstonebelts" importantes,sendo o "greenstone belt" de Manica, que se prolongapara o Zimbabwe com os nomes de Umtali e Odzi, oque se situa na zona mais ocidental do cratão (OREY,1989a). O cratão do Zimbabwe está envolvido porcinturões móveis altamente metamorfizados, comoos do Limpopo, Moçambique e do Zambeze, querepresentam material cratónico arcaico remobilizado(OREY, 1989a).

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As sucessões vulcânicas e sedimentares queexistem nos "greenstones 00118", são caracterizadaspor grande variedade de metavulcanitos máficos/ultramáficos e rochas plutónicas, intercalados comvulcanitos félsicos, rochas piroclásticas e sedimentosquímicos tais como formações ferríferas bandadas,chertes e rochas calco-silicatadas (OREY, 1989a;ANHAEUSSER, 1975; BLISS & STIDOLPH, 1969;WILSON, 1973).

O conjunto de metavulcanitos máficos eultramáficos, que, no seu conjunto, é denominadoSebakwiano, foi com frequência invadido,fragmentado e granitizado pela intrusão de grandevariedade de rochas granitóides. Sobre esta unidadehá uma brusca mudança na natureza do vulcanismo,alternando ciclicamente vulcanismo máfico,intermédio e ácido, com intercalações de sedimentosquímicos e piroclásticos entre os quais chertes,formações ferríferas bandadas, calcários e filitos,assim corno de basaltos toleíticos,dacitos e riodacitos.Este conjunto é denominado Bulawaiano. Sobre assequências vulcano-sedimentares dos "greenstonebelts" depositaram-se rochas de característicasessencialmente sedimentares, que constituemconjuntos argiláceos, grauvaques, xistos argilosos eprecipitados químicos, ou conjuntos arenáceosconstituidos por conglomerados, quartzitos, grés e,subordinadamente, chertes jaspilíticos e formaçõesferríferas bandadas. Este conjunto sedimentar édenominado Shamvaiano.

A hipótese de existirem sucessões mais antigaspré-sebakwianas no interior dos granitos (STOWE,1971)não é de considerar, pois trata-se de equivalentesxenolíticos metamorfizados de conjuntos que seencontram no Sebakwiano (OREY, 1989a).

Os granitos, que ocupam quase oitenta e cincoporcento da área do cratão do Zimbabwe, constituemdois grupos: os potássicos (granodioritose adamelitos)e os sódicos (trondhjemitos e tonalitos). Os primeirossão predominantes na porção oriental do cratão e ossegundos na porção ocidental.

OURO NO CRATÁO DO ZIMBABWE

No cratão do Zimbabwe, a maioria dos jazigosde ouro ocorre no Sebakwiano. Seguem-se os queocorrem no Bulawaiano e Shamvaiano. Só poucosjazigos se localizam no granito (ANHAEUSSER,1976).

Embora uma grande parte dos filões de ouroocorrano Sebakwiano, eles têm uma maior tendênciapara se desenvolverem nas pilhas maciças vulcânicasdo Bulawaiano, pois- as características físicas dosconjuntos máfico/félsicos deram origem a um maiornúmero de sistemas de fracturas, que actuaram comolocais ideais para a deposição de filões de quartzoaurífero. As soluções hidrotermais, entrando nestasfracturas, são geralmente responsaveis pela alteraçãodo encaixante lávíco (propilitização).

Distiguem-se dois tipos principais de jazigos deouro no cratão do Zimbabwe (ROBERTS, 1987):

- filões quártzicos geralmente associados ametavulcanitos;

-jazigos estratóides em sedimentos químicos.

Há provas evidentes que os dois tipos de jazigossão epigenéticos e foram introduzidos tardiamenteno ciclo de formação dos "greenstone 00118" durantea cratonização precâmbrica ou estabilização desegmentos da crusta.

OURO NO GREENSTONE BELT DE MANICA

O "greenstone belt" de Manica (Fig. 2)compreende uma grande sequência vulcânica basal aque se sobrepõem sucessões sedimentares (OREY,1989a). A história tectónica desenvolveu-se em duasfases distintas. A primeira envolveu "slumping" e"downfolding" sobre umacrustamuito fina e instável.Durante esta deformação, induzida essencialmentepor fenómenos gravíticos, formaram-se dobrasisoclinais, um sinclinório, falhas verticais ou muitoinclinadas e escorregamentos. A fusão das zonas deraiz dobradas do "greenstone belt" produziu plutõesdiapíricos de tonalitos/trondhjemitos e de peridotitos,intruídos nas zonas marginais do "greenstone belt",Este diapirismo foi responsável por novadeformação, seguindo-se novos períodos dedeformação sobreposta envolvendo dobramento,falhamento, fracturação, cizalhamento e, finalmente,arqueamento do "greenstone belt" (OREY, 1989a)(Fig. 3).

a) • Classificação dos jazigos de ouro

As estruturas associadas com osjazigos auríferosmagmáticos, filonianos e estratóides de Manicaparecem claramente posteriores ao vulcanismo esedimentação, assim como à maior parte dosacontecimentos magmáticos e metamórficos. NoZimbabwe, tanto os dados de campo como osgeocronológicos demonstram que a formação dosjazigos auríferos filonianos e estratóides é, mesmo,posterior à intrusão dos plutões graníticos pós­tectónicos nas sequências supracrustais dobradas einclinadas dos vários "greenstone belts"(ANHAEUSSER, 1976).

Os mais importantes tipos de ocorrênciasauríferas conhecidos em Manica são os seguintes:

- intrusões magmáticas de sulfuretos de cobre eníquel com algum cobalto em rochassebakwianas, associados a intrusões deperidotitos de idade claramente pósBulawaiano e possivelmentepós Shamvaiano,na margem sul do "greenstone belt" (MinaMondunguara).

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Nota: não se representam os doleritos

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Fig. 2 - Esboço geológico do sinclinal de Manica.

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fracturaman+élica

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1- Dep osicão de lavas máficas eultramáficas

Formação de uma fossa

2- Inicio de "downsagging e slumping"

- Deposição de sedimentos argilaceos(águas profun das)

3 - Deposição de sedimentos arenáceos(águas pouco profundas)

Intensificação da deformação gravítica

Aumento da espessura da crosta

- Efeitos compressivos dos granitos

4- Invasão de t oncüto s e trondhjmitosassimilando lavas sebackwianas

- Escorregamento e falhamento induzidospor gravidade

rNTRuSÕES PERIDOTíTlCAS EDEPOSiÇÃO DE SULFURETOS

MAlOMÁTICOS COM ClIRO

STOKS GRANíTICOS E FILÕESOUÁRTZICOS COM OIllO

5 - Ero são intensa

- Intrusão de peridotitos

Intrusão de "stocks" graníticos

- Metamorfi smo e metussomnti smo

Fig. 3 - Modelo diagramático da evolução do "Greenstone Belt" de Manica e formação dos jazigos auríferos.

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- impregnações estratóides de sulfuretos emformações ferríferas bandadas do Bulawaiano(Mina Monarch).

- filões de quartzo aurífero de idade nitidamentepós-Shamvaiano (Minas Two Fools, Cantão,Guy Fawkes e Bragança).

- aluviões arcaicos no Shamvaiano, que, no finaldo século passado, foram muito prospectados,embora nada se saiba sobre a sua produção.Contudo, no vale do Rio Zambuzi observeidisseminações muito irregulares de sulfuretosem formações conglomeráticas e quártzicas,potencialmente portadoras de ouro.

- aluviões recentes (especialmente os do RioRevué),

b) - Mineralogia

Nas intrusões magmáticas da Mondunguara(OREY, 1989), o ouro ocorreessencialmente asociadoa elementos do grupo da platina em corpos desulfuretos maciços tabulares e verticais, directamenteassociadoscom intrusões de composiçãoperidotítica.O ouro localiza-se no interior de pirrotite hexagonalde alta temperatura (FigA), associada acobaltopentlandite e pirite cobaltífera euédricas,atingindo concentrações da ordem dos 126 ppm. Apirrotite hexagonal maciça constitui precisamente aparte proximal dos filões, isto é, situa-se na zona decontacto com a rocha mãe peridotítica. Nas zonasintermédias dos corpos tabulares mineralizados, aparagéneseé constituída por calcopirite, pirrotitemonoclínica com exsoluções de pentlandite comume rara esfalerite. Nas zonas distais observam-sefenómenos de alteração hidrotermal e propilitização,ocorrendo o ouro sob a forma de electro associado ateluretos vários e prata nativa, sendo um mineralnitidamente tardio. Os teores de ouro destas duasúltimas zonas são extremamente baixos e irregulares.

Osjazigosquártzicos filonianos têm mineralogiamuito simples. Pirite e galena são sempre os mineraispredominantes. Por vezes pode existir algumacalcopirite e tetraedrite (Bragança e Cantão). Comfrequência, a pirrotite pode ser importante (Cantão,GuyFawkes eTwo Fools). Em nenhumadas amostrasdestes jazigos filonianos foi detectada arsenopirite, oque é de acentuar, pois utilizava-se muit.oo arsénicono Zimbabwe para a prospecção geoquímica destetipo de filões. Em todos os jazigos filonianosobservam-se dois tipos de pirite: pirite euédricaprimária e pirite com texturas relíquia de pirrotite,devidas à sulfurização deste mineral. O ouro ocorre,essencialmente, sob a forma de glóbulos arredondadosmicroscópicos (Fig.5) no interior da pirite euédrica.Parece ter sido depositado simultaneamente com apirite euédrica, embora por vezes essas inclusões

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apresentem texturas que revelam a sua nítidaulterioridade (Fig.6) acompanhando a sulfurizaçãoda pirrotite. Texturas preenchendo fracturas na piriteou, mesmo, substituindo este sulfureto são em geralraras (Fig. 7 e 8). Algumas análises químicasefectuadas nas mineralizações da Mina de Bragança,em 1973, revelaram que as zonas onde a galena eramineral predominante eram particularmente ricas deouro. Na realidade ele ocorre primordialmente nointerior do quartzo tardio, o que tomará o minérioainda mais refractário ao tratamento. Na mina Cantãoobservou-se electro no interiorde calcopirite; é aindamais rara a sua associação a tetraedrite, que é, aliás,um mineral muito pouco comum.

Nas formações ferríferas bandadas, os sulfuretosocorrem como impregnações nas bancadas ferríferas.Nesta classe de jazigos, a mina Monarch era a únicaonde se procedia a trabalhos simbólicos. Asmineralizações estão intimamente associadas arochasbasálticas e rochas argiláceas, interestratificadascom as bancadas ferríferas. Ao contrário dasmineralizações filonianas a galena é aqui inexistente,a pirite é o mineral predominante, a pirrotite e acalcopirite são comuns, e a arsenopirite temdistribuição irregular, podendo, porvezes, sercomum,mas nunca abundante. No interior de um cristal deolivina do encaixante basáltico da mina Monarchobservou-se um grão de ouro (Fig.9).

Nos conglomerados do Shamvaiano, ossulfuretos associam-se a rochas conglomeráticasondese observam pirite euédricadecontornos arredondadose alguma galena. Nos finais do século passado, foramconcedidos "claims" nestes tipos de formaçõesconglomeráticas e, embora nenhum tenha produzidoquantidades importantes de ouro, também é duvidosoque tenham sido adequadamente prospectados. NoShamvaiano do Zimbabwe existem exploraçõesrentáveis nos conglomerados dos "greenstone belts"de Victoria, Salisbury/Shamva e Sinoia(ANHAEUSSER,1976).

GÉNESE

Com exclusãodos grandesjazigos sedimentaresde tipo "placer", a maior parte do ouro extraído nonosso planeta proviria de jazigos epigenéticos denatureza hidrotermal (EMMONS, 1937).

A associação espacial de filões auríferos e rochasintrusivas ácidas levou EMMONS (1937) a concluirque existiria uma afinidade muito grandeentre granitose ouro.

McGREGOR (1951), baseado na sua grandeexperiência da geologia da então Rodésia, sugeriuque o ouro se teria originado no SIMA e teria sidotransportado para a superfície do planeta em lavasbasálticas. Após esse transporte, a instalação dosgranitos forneceria água e outros fluxos necessáriospara a extracção do ouro das lavase sua redistribuição

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em filões hidrotennais no interior de porções dogranito já cristalizado, ou nas rochas adjacentes dos"greenstone belts".

BOYLE (1959), após estudos geológicos egeoquímicos, sugeriu que o ouro no distrito deYellowknife no Canadá teria origem em rochassupracrustais vulcânicas de composição máfico/ultramáfica, e não nos granitos intrusivos que se lheassociam.

Outros autores, como RIDLER (1970) eVILJOEN et ai. (1970), aceitam que os granitosintrusivos tiveram um papel importante na produçãode calor e ambientes estruturais necessários para amigração e redeposição de ouro de modo a formarempseudo-jazigos hidrotennais. Estes últimos autoresacentuaram que as rochas vulcânicas que estão naorigem do ouro foram, nalguns casos, modificadas aum tal grau que as relações das mineralizaçõesauríferas com as rochas vulcânicas se apagaram, eque os granitos são aparentemente responsáveis pelasmineralizações auríferas.

Os dados geoquímicos sobre a distribuição deelementos em rochas magmáticas indicam que o teorde ouro das rochas básicas e ultrabásicas é cerca detrês a quatro vezes superior ao teor de ouro das rochasácidas (SHERBAKOV & PEREZHOGIN, 1963;GASS, 1974; BOYLE, 1979; ROCK & GROVES,1988; PERRAULT, 1989).

A rocha mãe das mineralizações cupro­niquelíferas com ouro e platinóides na minaMondunguaraé um diferenciado máfico/ultramáfico,intrusivo em komatiitos basálticos e peridotíticos. Aanálise química destes komatiitos colhidos no inte­rior da mina e, portanto, aparentemente nãometeorizados, indicam que as rochas sofreram grandehidratação com teores de H20 da ordem dos 5,1 a11,6 porcento, o que também é indicado pelapresençade abundantes actinolite e antigorite. Esta hidrataçãopoderia ser acompanhada pela extracção de metaiscomo o ouro.

Os dados experimentais sobre a solubilidade doouro foram revistos por ANHAEUSSER (1976).Segundo este autor, o ouro em soluções hidrotennaisalcalinas seria solúvel num intervalo de 100 a 200ppm a temperaturas da ordem dos 150 a 280°Cdevido à formação de complexos de ouro estáveisenvolvendo H2S e HS. Em soluções aquosas desulfuretos com pH igual a 6, a solubilidade do ourosob a forma de tio complexos entre temperaturas de160 e 300°C varia de 40 a 230 ppm.

Durante o Arcaico, os líquidos komatiíticospossuem maior capacidade para dissolver tanto oouro como o enxofre que os sistemas magmáticosmais recentes de menor temperatura; transferiramesses elementos do manto para a crusta durante a faseextensional de formação das bacias (KEAYS, 1984).Uma ulterior remobilização e enriquecimento deouro e sulfuretos teria ocorrido em interacções água­rocha entre as lavas quentes e a água do mar (KEAYS& SCOTT, 1976). O ouro extraído dos basaltos

ocearucos fixou-se nos sulfuretos existentes nossedimentos inter-escoadas, produzindo, assim,elevadas concentrações estrat6ides de ouro esulfuretos. Este é o caso da Mina Monarch.

Um enriquecimento adicional de ouro esulfuretos ocorreu durante a fase de compressão dabacia, que resultou no levantamento, erosão eredeposição de sedimentos turbidíticos econglomerados, especialmenteem estruturaslinearesassociadas com importantes cavalgamentos. Osfluidos foram expelidos para zonas de cizalhamentode deformação frágil e dúctil. Parece evidente que apresença do ferro influencia esta deposição do ouro,pois em muitas das jazidas ocorrem litologias ricas deferro tais como toleitos vulcânicos, sedimentos ricosem silicatos de ferro e sedimentos químicos ricos demagnetite.

As intrusões graníticas tardias são conhecidaspor serem particularmente favoráveis aodesenvolvimento de mineralizações auríferashidrotennais, visto que, em primeiro lugar, intersectamsedimentos ricos de ouro e sulfuretos e, em segundolugar, a interacção de fluidos com sedimentos ricosde ferro promovem a decomposição dos tiocomplexosde ouro e a redeposição do ouro e sulfuretos de ferro.

Embora no jazigo magmático da Mondunguarao ouro esteja predominantemente associado asulfuretosde alta temperatura, nomeadamentepirrotitehexagonal, cobaltopentladite e pirite cobaltífera, aanálise dos jazigos filonianos tardios indica que asmineralizações auríferas estão mais associadas comsulfuretos de baixa temperatura, como galena ecalcopirite, do que com sulfuretos de altatemperatura,como pirrotite, arsenopiritee esfalerite. Estadiferençaradical da sequênciahidrotennal típica apoia a tese deque a mineralização filoniana em Manica não éproduto directo da génese e instalação dos plutõesgraníticos que envolvem o "greenstone belt", Osgranitos actuaram então unicamente comofornecedores de água e calorpara a extracção de ourodos sedimentos e lavas, e sua redistribuição em filõespseudo-hidrotennais (Cantão, Two Fools, Bragançae Guy Fawkes). Estes jazigos filonianos encontram­se unicamente no interiordo "greenstone belt", sendoraros no granito circundante (Fig.2). Neste últimocaso, os jazigos filonianos restringem-se a uma faixaenvolvente que não ultrapassa um quilómetro. Se osgranitos fossem responsáveis pela génese do ouro,era natural que existissem jazigos filonianos nosgrandesespaços graníticos entreos "greenstonebelts"do cratão do Zimbabwe, o que nunca é o caso.

Quanto às formações ferríferas bandadas, deque é exemplo o jazigo Monarch, os corpos auríferosparecem ser essencialmente controlados pelaestrutura, sendo as dimensões e teores dos jazigosdefinidos de forma complexa pelo comportamentofrágil e dúctil dos metassedimentos, juntamente coma acti vidade hidrotennal. A sulfurizaçãodas unidadesferruginosas, especialmente da magnetite, constitui

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um importante mecanismo deposicional. Apirrotização da magnetite durante os movimentos decizalhamento, poderá influir positivamente naductilidade, aumentando o potencial para grandesdeslocações e, daqui, gerar jazigos significativos.

TRATAMENTO DO OURO

Nas amostras não alteradas colhidas nas minasCantão, Guy Fawkes, Two Fools, Bragança e Mon­arch o ouro ocorre sob a forma de inclusõesmicroscópicas, da ordem de poucas micra, geralmenteno interior da pirite. Na mina Mondunguara, o ouroocorre em maior abundância no interior de pirrotitehexagonal de alta temperatura. É muito possível que,em qualquerdestes jazigos, o ouro ocorra em soluçãosólida nos diversos sulfuretos, óxidos e silicatos,emboranão haja provas concretasde que isto aconteça.

A granularidade destas ocorrências exigemoagem extremamente fina, que poderá inviabilizareconomicamente jazigos de tão baixo teor. O métodode tratamento destes minérios refractários de. ouro,seguido tanto no Zimbabwe como na África do Sul,consiste em calcinar o minério de modo a oxidar ossulfuretos, obtendo-se uma hematite porosa, paraexpor ou libertar as inclusões de ouro, preparando-oassim para a cianidação (LIEBENBERG, 1972).

Com muita frequência,alguns produtos dedecomposição dos sulfuretos na solução de cianetospodem tornar o ouro mais refractário, nomeadamentepela formação de tiocianatos e cianetos complexos decobre, o que poderá acontecer unicamente nas minasMonarch e Mondunguara, onde a calcopirite pode serabundante.

Nas restantes minas, muito em especial nas deBragança e Guy Fawkes, onde a galena é abundante,há perigo de formação de "coated gold" comcompostos de chumbo ou pior ainda, na formação deuma liga insolúvel de ouro/chumbo.

Para a mina Mondunguara, há ainda o problemada abundância de pirrotite. Aqui o ouro ocorrefundamentalmente no interiorda pirroti te hexagonal,a qual interfere muito negativamentecom os processosde cianidação.

Nos últimos anos têm sido obtidos resultadosexcelentes com oxidação a pressão em autoclaves(ANÓNIMO, 1988). Outro processo que estápresentemente a ser desenvolvido, embora ainda nãotenha passado dos testes piloto, consiste numabiodegradação, na qual os sulfuretos são destruídospela acção de bactérias, expondo o ouro à acçãolixiviante do cianeto (STEWART, 1989).

As minas de Bragançae Guy Fawkes apresentamum problema particularmente difícil, pois, nas zonasonde a galena é mineral predominante, o ouro ocorrefundamentalmente sob a forma de inclusõesmicroscópicas em quartzo e silicatos. Estas zonasenriquecidas de galena apresentam teoresparticularmente elevados de ouro, o que levou em

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1973 a administração da mina a seleccionar zonasgaleníferas numa exploração um pouco artesanal e aobter um "matte" enriquecido de chumbo pois,admitia-se erradamente que o ouro ocorreriapreferencialmente no interior da galena. Nestasmineralizações de ouro, a moagem do quartzo para oaproveitamento integral do metal precioso deverá serextremamente fina, possivelmente poucoeconómica.

PROSPECÇÃO DO OURO

O teor médio dos minérios de ouro do Zimba­bwe é em geral baixo, variando entre 3,5 e 35 glt.Pouco se sabe sobre os teores das minas outroraexploradasno "greenstonebelt" de Manica. ARAÚJO& GOUVEIA (1965) afirmam que a Mina Bragançateria teores da ordem dos 7,5 glt, enquanto que, paraa Mina Mondunguara, os seus concecionários lheatribuiam teores médios da ordem de 0,5 glt. Aqui, oouro distribui-se de uma forma zonada, chegando,nas zonas mais ricas em pirrotite hexagonal, a atingir126 ppm (OREY, 1989).

Nos jazigos filonianos, o ouro visívelmegascopicamente só se observou na zona oxidada,onde se deu um enriquecimento supergénico. Natotalidade das minas de Manica, as operaçõesmineirascomeçaram nazona dos minérios oxidados; cessarama produção no início deste século, quando se atingiua zona dos sulfuretos, isto é, o minério primário.

Considerando a sequência da deposição tal comopostulada por EMMONS (1924), é de esperar que afineza do ouro aumente em profundidade, visto que oouro tende a depositar-se a maior profundidade doque a prata. Em termos gerais, pode-se afirmar queisto se passa assim nos cratões do Kaapvaal e Zimba­bwe (GAY, 1964; EALES, 1961).

No cratão do Zimbabwe tem sido dadaimportância exagerada aos controles estruturais dasmineralizações filonianas, sem atenderà importânciamuito significativa que os controles estratigráficospoderão terna deposição dos jazigos auríferos. Comoo ouro ocorre com muita frequência em vários tiposde fissuras, e como estas são controladas pormodelosestruturais, a importância da rocha hospedeira foi, nageneralidade, ignorada.

PHAUP (1964) cita alguns exemplos daimportância estratigráfica na deposição do ouro, talcomo a acção dos serpentinitos que, actuando comobarreiras impermeáveis aos fluidos, tiveram umaimportância fundamental na deposição deste metal.Também certas rochas, tais como os quartzitos,facilmente sujeitas a deformação frágil, originaraminúmeras fracturas. Estão neste caso as formaçõesferríferas bandadas, deformadas desta forma, e quesão excelentes rochas hospedeiras para odesenvolvimento de jazigos de substituição desulfuretos contendo ouro. A Mina Monarch, é umexemplo deste tipo de jazigo em Manica. Segundo

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FRIPP (1979), vinte e cinco por cento do ouro doZimbabwe provém de formações feniferas bandadas,ocorrendo o ouro sob a forma de inclusões e filonetessubstituindo sulfuretos maciços. A Mina Monarchem territóriomoçambicano, constitui o prolongamentode mineralização semelhante do outro lado dafronteira. Pouca atenção foi dada em Manica àprospecção sistemática destas formações feniferasbandadas, que são potencialmente locais ideais paraaocorrênciade ouro. As formações feniferas bandadassão abundantes em Manica, não só no Bulawaianocomo no Shamvaiano; são, além disso, excelentes"marcadores estratigráficos". Os mais importantestêm possanças superiores a 20 metros e há inúmeroscom possanças que não atingem 1 metro. NoBulawaiano ocorrem interestratificados comandesitos, basaltos, vulcanitos félsicos e rochaspiroclásticas, enquanto que no Shamvaiano estãopredominantemente interestratificados com rochasargiláceas e arenáceas.

PHAUP (1964) afirma que a pirite se encontrapor todo o lado nos filões quártzicos do cratão doZimbabwe e que a pirrotite chega a ser importante nasua parte ocidental, sendo inexistente na zona orien­tal. As secções polidas na Mina Bragança e GuyFawkes revelam texturas que indicam a existência dealguma pirrotite inicial que posteriormente foisulfurizada, originando pirite secundária. As texturasrelíquias globulares indicam muito claramente que setrata de uma sulfurização da pirrotite (Fig.6). Ochumbo e o zinco são muito importantes na vizinharegião zimbabweana de Mutare, especialmente nasminas Penhalonga, Clutha & Old West (pHAUP,1964). O chumbo é particularmente abundante emtodas as minas filonianas de Manica, chegando agalena, em certos pontos, a ser o mineralpredominante(Mina Bragança). O arsénico, que tem grandeimportância nas minas filonianas da zona norte docratão do Zimbabwe, é praticamente inexistente emManica, onde só se observou rara arsenopirite naMina Monarch. Assim, e ao contrário do norte docratão, o arsénico não deve ser utilizado para aprospecção do ouro, pois em Manica ele não éelemento indicador.

Há hoje uma tendência bem clara de desvio dasteorias clássicas da génese dos minérios, e muitosgeólogos afirmam que, em grande parte os jazigos sedevem ligar geneticamente ao ambiente das rochashospedeiras. Assim, para a futura prospecção dosjazigose paraestabeleceros controles estratigráficos,os jazigos potenciais para fins de prospecção devemser classificados do seguinte modo:

-jazigos em granitos-jazigos em rochas intrusivas ultrabásicas-jazigos em rochas félsicas-jazigosem formações ferríferas do Bulawaiano- jazigos em lavas do Bulawaiano-jazigosem formações feniferas do Shamvaiano- jazigos em formações conglomeráticas do

Shamvaiano.

A maior parte do terreno em Manica émontanhoso ou, pelo menos, tem relevo bastanteacentuado. Aexposição geológica varia de excelentea muito má. Contudo, a rede fluvial é muito boa, oque permite que, pelo menos, parte da geologia sejavista em cortes junto dos cursos de água. Assim, numprogramade prospecção, teríamos os seguintespassos:

- utilização da bateia em sedimentos fluviaispara obtenção de ouro visível e análise dosconcentrados. A fineza do ouro aumenta parajuzante do curso de água; isto é importantepara determinaro seu ponto de entradana redefluvial;

- geoquímica dos sedimentos fluviais, não sópara o ouro como para os elementosindicadores. O As não deve serusado, mas simo Pb, Cu e, talvez, o Zn;

- geoquímica de solos no seguimento dasanomalias dos sedimentos fluviais;

- geoquímica de vegetação em folhas de solosflorestados e geoquímicade ninhos de térmitas(OREY, 1975);

- Geoquímica de cobertura profunda;

- amostragem de rochas numa fase dereconhecimento que se segue à investigaçãode anomalias geoquímicas. Nesta fase é porvezes necessário cavar trincheiras e poços.

A experiência recente no Zimbabwe e África doSul indica que a prospecção geofísica destes jazigos,tal como utilização de polarização induzida,resistividade e electromagnetismo, teve resultadosdecepcionantes. As técnicas mais interessantes são autilizaçãoda bateia e a análise geoquímica,conjugadoscom a análise dos controles estratigráficos eestruturais.

CONCLUSÕES

O estudo das rochas basálticas e komatiíticas docampo filoniano de ouro de Steynsdorp, no Arcaicoda África do Sul, revelou que estas rochas conteriamaté 20 ppb deste elemento (SAAGER, 1973). Estaassociação é também apoiada pela presença de umainclusão de ouro nos basaltos que ocorreminterestratificados com as formações ferríferasadjacentes à Mina Monarch (Fig.9).

O modelo proposto por BOYLE (1959),atribuindo a origem primária do ouro no "greenstonebelt" de Yellowknife no Canadá às rochassupracrustais de composição máfico/ultramáfica, foiapoiado por inúmeros estudos ulteriores realizadostanto no Canadá como na África do Sul. Os granitostiveram como papel fundamental fornecer água ecalor necessários para a redeposição do ouro sob a

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forma de jazigos pseudo-hidrotennais. Como foiacentuado por VILJOEN et al., (1970) as rochasvulcânicas foram, em muitos casos, de tal modomodificadas e assimiladas que as relações dasmineralizações auríferas com as rochas vulcânicas seapagaram e, por vezes, os granitos parecem serresponsáveis pela génese dessas mineralizaçõesauríferas. Este é o caso dos jazigos que ocorrem nostonalitos de contacto norte do "greenstone belt" deManica, que contêm inúmeros xen6litos de rochasmáficas e ultramáficas do Sebakwiano.

Dos estudos de distribuição de modelosestatísticos levados a cabo por PRETORIUS &HEMPKINS (1967)no cratão do Zimbabwe, conclui­se que as mineralizações auríferas nos granitos,greenstones e rochas xistentas pertencem a umapopulação,e que as das formações ferríferas bandadaspertencem a outra população. O ouro estariaprimariamente contido nas rochas máficas eultramáficas; teria sido redistribuido através dosgranitos, xistos e greenstones, por processosmetassomáticos associados primordialmente àinstalação dos granitos. Este ouro teria sidoretransportado para formações sedimentaresestratigraficamente superiores por processosmecânicos ou químicos, e foi depois redistribuidonestas rochas pornovos processos ligados à actividadegranítica tardia (Fig.3).

As paragéneses típicasdos sulfuretos associadosao ouro dos jazigos filonianos indicam muitoclaramente que as mineralizações mais ricas estãopredominantemente associadas a minerais detemperaturas relativamente baixas, como a galena, enão a minerais de alta temperatura, como aarsenopirite, pirrotite e esfalerite. Esta diferençaradical da sequência hidrotennal típica apoia a tesede que as mineralizações auríferas em Manica nãosão o produto directo da génese e instalação dosplutões graníticos que envolvem o "greenstone belt".

Assim, no modelo da evolução do sinclinal deManica (Fig.3) teríamos, após a deposição dossedimentos gresosos de tipo molasso, a intrusão derochas ultramáficas, porrefusãode rochaskomatiíticasa que estão associados jazigos magmáticos desulfuretos de alta temperatura, sendo o ouro um dosminerais iniciais incluido em pirrotite hexagonal.Intrusões de rochas félsicas (rio-dacíticas) e "stocks"graníticos, teriam estado na origem da remobilização

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do ouro e sua redeposíção em "greenstones", xistos,sedimentos e nos próprios granitos, sob a forma defilões quártzicos. Fen6menos exalativos vulcano­génicos estariam na origem da mineralização do ouroe sulfuretos associada às formações ferríferasbandadas. Durante a deposição dos conglomeradosdo Shamvaiano, a erosão foi intensaehouvedeposiçãosedimentar de ouro e sulfuretos de forma muitosemelhante à do Witwatersrand. Embora sem aimportânciadestes jazigos, a distribuição do ouronosconglomerados será certamente influenciada porcontroles sedimentol6gicos. Os conglomerados nãosão uniformemente mineralizados e, sem acompreensãodo estilo de sedimentação,não épossíveldelimitar as zonas pagantes.

Sem o aumento dramático dos preços do ouronas duas últimas décadas, a recente corrida ao ouronunca teria tido lugar. Os custos médios de extracçãona Austrália, Canadá e Estados Unidos excedemligeiramente os $200/onça, o que, a preços actuais, dáconsiderável margem de lucro e constitui um grandeincentivo à prospecção (BEUNDERMAN, 1989).

A zona de Manica,bem servidade infraestruturase onde a mão de obra é relativamente abundante, temtodas as condições para voltar a ser produtiva. Aprospecção do ouro nas últimas décadasda dominaçãoportuguesa nunca foi incentivada devido aocongelamento artificial do preço do ouro. A mudançadeste factorcriou um grande incentivoque, conjugadocom a novas teorias sobre a génese do ouro e factoresque controlam a sua distribuição, permitirão aplicarcom sucesso as técnicas de prospecção maisadequadas, que levarão à descobertade novos jazigose reavaliação dos existentes. As ocorrências até agoraconhecidas caracterizam-se pela sua pequenagranularidade no interior de pirite e também nointeriorde silicatos, o que poderá tomarproblemáticaa extracção do ouro. Sem o conhecimentopormenorizado da mineralogiados diferentesjazigosnunca será possível estabelecerum bom diagrama detratamento de minérios.

Ninguém poderá prever durante quanto tempose manterá a grande procura de ouro e durante quantotempo se manterá o seu preço aos níveis correntes.Nestas circunstâncias de dúvida, a melhor políticaserá desenvolver em Manica somente os projectoscujos custos operacionais se situem abaixo da médiada indústria.

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DOCUMENTAÇÃOFOfOGRAFICA

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ESTAMPA 1

Fig. 4 - Inclusão de ouro em pirrotite hexagonal. Mina Mondunguara..

Fig. 5 - Inclusão de ouro (au) em pirrotite (py), apresentando uma textura poligonal convexa. Ouro e pirite são

possivelmente contemporâneos. Mina Bragança.

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