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Revista Olhares Sociais / PPGCS / UFRB, Vol. 03. Nº. 02 – 2014/ pág. 68 OS “NOVOS” UNIVERSITÁRIOS E OS (DES) CAMINHOS PARA A AFILIAÇÃO ESTUDANTIL E A PERMANÊNCIA Greyssy Kelly Araujo de Souza 1 Dyane Brito Reis Santos 2 RESUMO: Trazer para o debate questões relacionadas à permanência de estudantes oriundos de famílias sem tradição universitária na educação superior é enfrentar um conjunto de fenômenos complexos, principalmente no Brasil onde muito recentemente a educação entendida enquanto um direito social passou a fazer parte da agenda do governo. A educação superior brasileira vem atravessando um período de grandes transformações, momento de abertura do ensino superior que se iniciou em 2003, através de relatórios, programas e políticas de expansão, interiorização, que funcionam como mecanismos que tencionam o aumento de vagas e o fortalecimento do ensino superior no país. Contudo, as questões que envolvem a afiliação e a permanência na universidade ultrapassam o desafio do acesso à educação superior, incluem a adaptação à universidade, a sua rotina, seus rituais e normas. Envolvem compreender como é, ou deveria ser, um estudante universitário. Discutir acerca dos “novos” universitários é um desafio que se faz necessário, pois vivenciamos um momento importante em busca da democratização da universidade. Cabe à universidade brasileira novos desafios... Um deles é refletir sobre os estudantes que passam a acessa-la, ao tempo que também reflete sobre si mesmo - a (re) construção de valores e objetivos. Faz-se necessário compreender o emaranhado de questões que perpassam as diversas trajetórias dos estudantes na universidade. Para tanto, o presente artigo se propõe uma breve discussão sobre afiliação estudantil e permanência material e simbólica, fenômenos que dizem respeito aos processos de entrada e adaptação ao mundo acadêmico. Dentro desta problemática, estudos identificam a iniciação científica como lócus privilegiado para aprendizado do oficio de estudante, além de permitir o acompanhamento de todo o processo por parte do professor-orientador, bem como pelo contato em grupo com outros estudantes que também vivenciam a mesma etapa acadêmica. Nesta perspectiva, objetivamos destacar a relevância da iniciação científica como espaço estratégico que facilita a adaptação a educação superior, o que implica numa permanência qualificada. Palavras-Chave: Afiliação Estudantil; Permanência; Universidade. 1 Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre a Universidade (PPGEISU-IHAC/UFBA). Pesquisadora Bolsista FAPESB. Integrante do Observatório da Vida Estudantil (OVE-UFBA/UFRB). Colaboradora no Observatório da Educação (OBEDUC-FACED/UFBA). E-mail: [email protected] 2 Professora Adjunta CFP/UFRB, Permanente no Mestrado de Educação do Campo (UFRB) e Colaboradora no PPGEISU-IHAC/UFBA. Doutora em Educação (UFBA). Tutora do PET Afirmação: Acesso e Permanência de Jovens das Comunidades Negras Rurais no Ensino Superior. E-mail: [email protected]

OS “NOVOS” UNIVERSITÁRIOS E OS (DES) CAMINHOS PARA A ... · novos símbolos e significados. É necessário que se passe do status de aluno para status estudante. ... fora dos

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Revista Olhares Sociais / PPGCS / UFRB, Vol. 03. Nº. 02 – 2014/ pág. 68

OS “NOVOS” UNIVERSITÁRIOS E OS (DES) CAMINHOS

PARA A AFILIAÇÃO ESTUDANTIL E A PERMANÊNCIA

Greyssy Kelly Araujo de Souza1 Dyane Brito Reis Santos2

RESUMO: Trazer para o debate questões relacionadas à permanência de estudantes

oriundos de famílias sem tradição universitária na educação superior é enfrentar um

conjunto de fenômenos complexos, principalmente no Brasil onde muito recentemente a

educação entendida enquanto um direito social passou a fazer parte da agenda do

governo. A educação superior brasileira vem atravessando um período de grandes

transformações, momento de abertura do ensino superior que se iniciou em 2003, através

de relatórios, programas e políticas de expansão, interiorização, que funcionam como

mecanismos que tencionam o aumento de vagas e o fortalecimento do ensino superior no

país. Contudo, as questões que envolvem a afiliação e a permanência na universidade

ultrapassam o desafio do acesso à educação superior, incluem a adaptação à universidade,

a sua rotina, seus rituais e normas. Envolvem compreender como é, ou deveria ser, um

estudante universitário. Discutir acerca dos “novos” universitários é um desafio que se

faz necessário, pois vivenciamos um momento importante em busca da democratização

da universidade. Cabe à universidade brasileira novos desafios... Um deles é refletir sobre

os estudantes que passam a acessa-la, ao tempo que também reflete sobre si mesmo - a

(re) construção de valores e objetivos. Faz-se necessário compreender o emaranhado de

questões que perpassam as diversas trajetórias dos estudantes na universidade. Para tanto,

o presente artigo se propõe uma breve discussão sobre afiliação estudantil e permanência

material e simbólica, fenômenos que dizem respeito aos processos de entrada e adaptação

ao mundo acadêmico. Dentro desta problemática, estudos identificam a iniciação

científica como lócus privilegiado para aprendizado do oficio de estudante, além de

permitir o acompanhamento de todo o processo por parte do professor-orientador, bem

como pelo contato em grupo com outros estudantes que também vivenciam a mesma

etapa acadêmica. Nesta perspectiva, objetivamos destacar a relevância da iniciação

científica como espaço estratégico que facilita a adaptação a educação superior, o que

implica numa permanência qualificada.

Palavras-Chave: Afiliação Estudantil; Permanência; Universidade.

1 Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre a Universidade

(PPGEISU-IHAC/UFBA). Pesquisadora Bolsista FAPESB. Integrante do Observatório da Vida Estudantil

(OVE-UFBA/UFRB). Colaboradora no Observatório da Educação (OBEDUC-FACED/UFBA). E-mail:

[email protected]

2 Professora Adjunta CFP/UFRB, Permanente no Mestrado de Educação do Campo (UFRB) e

Colaboradora no PPGEISU-IHAC/UFBA. Doutora em Educação (UFBA). Tutora do PET Afirmação:

Acesso e Permanência de Jovens das Comunidades Negras Rurais no Ensino Superior. E-mail:

[email protected]

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Abstract: Bringing to the debate issues related to the permanence of students from

families with no college tradition in higher education is to face a set of complex

phenomena, especially in Brazil where very recently education understood as a social

right became part of the government's agenda. Brazilian higher education is going

through a period of great change, time of opening of higher education that began in 2003,

through reports, programs and policies of expansion, interiorization, which act as

mechanisms that intend the increase in vacancies and strengthening higher education in

the country. However, the issues surrounding membership and continuity at the

university go further to the challenge of access to higher education, including adaptation

to the university, their routine, their rituals and rules. It involves understanding how, or

should be, a college student. Discuss about the "new" university is a challenge that is

necessary, because we experience an important moment in search of university

democratization. It is up to the Brazilian university new challenges. One is to reflect on

the students who come to access it, the time it also reflects on itself - the (re) construction

of values and goals. It is necessary to understand the tangle of issues that underlie the

different trajectories of the students at the university. Therefore, this article proposes a

brief discussion of student’s membership and material and symbolic permanence,

phenomena that concern the entry process and adaptation to the academic world. Within

this issue, studies identifying the scientific initiation as a privileged locus for student

office learning, and allows monitoring of the entire process by the teacher-supervisor and

the contact group with other students also experience in the same stage academic. In this

perspective, we aim to highlight the importance of scientific research as a strategic space

that facilitates adaptation to higher education, which implies a qualified stay.

Key-words: University; college affiliation; permanence

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Introdução

Por conta das novas ações de abertura do ensino superior no país e a adoção de políticas

afirmativas para o ingresso no ensino superior, muda-se consequentemente o perfil dos

estudantes que tem acessado universidade pública brasileira. Assim, universidade passa a

receber estudantes oriundos de escolas públicas, de setores menos favorecidos social e

geograficamente, de famílias sem uma tradição universitária, o que vem demandando

dessa instituição uma reorientação quanto aos seus valores e missão. Esses estudantes,

muitas vezes, não tem estabelecida uma rede de contatos com pessoas já inseridas no

ensino superior, em alguns casos é o primeiro (a) filho (a) a ingressar na educação

superior. O único contato estabelecido muitas vezes foi apenas com a escola, a qual, de

acordo a Coulon (2008), não possui a mesma comunidade de hábitos, por isto a transição

escola-universidade exige do estudante “recém-chegado” grande esforço de apreensão de

novos símbolos e significados.

É necessário que se passe do status de aluno para status estudante. O estudante

vive uma verdadeira transformação, na qual ele apreende habilidades e técnicas que vão

auxilia-lo no desenvolvimento de tarefas próprias do ofício de estudante. Portanto, os

desafios que envolvem a formação universitária não se resumem unicamente nas questões

próprias da formação profissional, incluem os processos de adaptação institucional e

intelectual à universidade.

O mundo acadêmico requer do estudante certos modos de agir e habilidades, tais

habilidades são representadas por leitura densa, escrita de textos acadêmicos,

conhecimento de métodos e técnicas de pesquisa, domínio de ferramentas e programas de

coleta e análise de dados, noção de procedimentos para publicação e apresentação de

trabalhos em eventos científicos. A iniciação científica ganha destaque nesta discussão,

por mostrar-se um espaço que pode proporcionar ao estudante o aprendizado ou

aprimoramento da prática acadêmica, através do aprendizado em grupo e

desenvolvimento de planos de trabalho de iniciação científica, necessária para uma

permanência qualificada.

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Cabe pontuarmos que o papel da universidade vai além de cobrar habilidades específicas

dos estudantes e formar profissionais competentes, cabe a ela, sobretudo, sensibilizar-se

com os estudantes que passa a receber, criar novos mecanismos que ajudem na adaptação

à sua cultura, contribuindo para o aperfeiçoamento de indivíduos críticos, capazes de

relacionar-se com os demais sujeitos imensos na atmosfera acadêmica, e que tenham suas

práticas baseadas na responsabilidade social, que se dá através do fortalecimento da

relação universidade e sociedade. A iniciação científica é um lócus importante para

auxílio ao desenvolvimento de competências e posturas indispensáveis a estudantes de

graduação, é também caminho para maior comprometimento da universidade devolvendo

à sociedade parte do seu investimento, através de atividades e ações desenvolvidas pelos

grupos de pesquisa, fincadas na melhoria social e na equidade, que extrapolem os seus

muros.

Para apresentarmos a presente proposta, trazemos na primeira seção, intitulada

“Os novos estudantes na universidade”, as mudanças que vem sendo vivenciadas pela

universidade brasileira neste século XXI, e como reflexo destas, a mudança do perfil dos

estudantes que passam a acessa-la, em seguida, tratamos brevemente, através da seção

intitulada “Da afiliação à permanência”, dos conceitos de afiliação e permanência, e para

tratar da discussão sobre como a iniciação científica colabora no processo de afiliação e

permanência na universidade, trazemos a seção “A iniciação científica em questão”. Por

fim, nossas considerações finais objetivam indicar caminhos para que a universidade se

aproxime do “novo” estudante que tem a possibilidade de acessa-la, o tempo em que

reconhecemos a relevância do aprendizado do oficio de estudante.

Os “Novos” Estudantes na Universidade

A universidade brasileira, propriamente dita, é criada no século XX, década de 30, e

como espelho das primeiras instituições no mundo esteve projetada para servir aos filhos

das elites. O atual cenário da universidade no Brasil visa romper com essa lógica ao

trazer para o centro do debate a responsabilidade da educação superior para com o

desenvolvimento e a justiça social do país, assumindo a ideia de ser inseparável da

democratização do saber.

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Como consequência desses debates e das pressões do movimento negro, e de

outros movimentos sociais, a partir de 2003 acontece uma importante transformação no

cenário politico brasileiro. O governo Lula inaugura uma nova agenda na qual as

primeiras mudanças vão ao sentido da desaceleração das reformas neoliberais na

educação superior, expansão das universidades públicas, criação de novas universidades

fora dos grandes centros urbanos e de programas e políticas que visam contribuir com o

acesso e a permanência de estudantes com foco nos jovens oriundos de famílias sem

tradição universitária, , o que representa um passo importante em direção à concepção da

educação como um direito.

Charlot (2000) traz uma discussão sobre categorias sociais no intuito de designar

e definir os sujeitos que são pertencentes à famílias sem tradição universitária, que o

autor chama de “famílias “populares”. Dessa forma, o autor considera como populares

aquelas famílias que vivem em situação de pobreza, vulnerabilidade ou precariedade,

produzindo uma configuração e um modo de vida que traduz ao mesmo tempo sua

posição dominada e os meios implementados para sobreviver e enfrentar as questões

próprias dessa posição. O que toma como origem popular traduz à realidade de jovens

brasileiros, em sua boa parte negros ou afrodescendentes, portadores de necessidades

especiais, oriundos de escolas públicas, oriundos de famílias sem tradição universitária,

oriundos de comunidades rurais, indígenas, quilombolas, de periferias, aos quais a

universidade desde seu surgimento no Brasil sempre esteve distante. Assim, a educação

superior brasileira vem atravessando um período de grandes transformações (CHAUÍ,

2003; SANTOS, 2008). Vive um momento importante de abertura do ensino superior

iniciado em 2003, através da criação políticas e programas de expansão, interiorização,

tais como REUNI, PROUNI, FIES e UAB 3 , que funcionam como mecanismos que

3 O PROUNI, Programa Universidade Para Todos, foi criado pelo governo em 2004 e institucionalizado em

2005, é dirigido à estudantes do ensino médio da rede pública ou da rede particular na condição de bolsistas

integrais e parciais, oferecendo em contrapartida isenções de taxas de tributos às instituições ligadas ao

programa. O FIES, Fundo de Financiamento Estudantil, é uma das ações do ProUni, que permite ao

estudante bolsista parcial o financiamento das mensalidades do curso em até 100%. Recentemente foi

criado o programa Bolsa Permanência, bolsas destinadas aos estudantes beneficiários do ProUni para o

custeio das despesas acadêmicas. A UAB, Universidade Aberta do Brasil, é um programa criado em 2005,

que visa ampliar e interiorizar a oferta de cursos e programas da educação superior através da educação à

distância, oferecendo formação a professores da educação básica que ainda não possuem graduação. O

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tencionam o aumento de vagas e o fortalecimento do ensino superior no país. Nesta

mesma direção são adotadas políticas afirmativas como medidas que visam combater a

desigualdades historicamente acumuladas, buscando garantir a igualdade de

oportunidades para todos os jovens que desejarem acessar a universidade.

As políticas de ações afirmativas propõem de maneira específica a efetivação de

alguns aspectos referentes à democratização da educação de nível superior. Assim, para

Maciel (2007) as políticas de ações afirmativas representam um avanço em relação às

lutas pela valorização do cidadão negro, e os embates acerca da abertura da educação

para todos em descriminação. Ainda expõe que, “ao tocar na estrutura das desigualdades,

objetivando promover equidade entre negro, índios, brancos e amarelos nos bancos

universitários, reescreve-se a maneira de pensar, de produzir conhecimento, de ser

universidade no Brasil (SILVA, 2003, p. 49 Apud MACIEL, 2007)”.

É assim que o perfil do universitário muda e a universidade abre suas portas. Isso

vai demandar novos valores e uma nova postura, ou seja, vai implicar numa reorientação

da política de educação superior brasileira. Nas palavras de Guerreiro e Abrantes (2005),

a universidade vem deixando de ser privilégio das elites e tornando-se para muitos

jovens, um caminho importante para a melhoria das condições de vida – mobilidade

social.

No desenvolvimento desta transição, estudantes de origem popular ou não, muitas

vezes apresentam dificuldades em adaptar-se ao mundo acadêmico. Afinal, escola e

universidade são “mundos” totalmente diferentes. Faz-se necessário compreender o

emaranhado de questões da vida universitária que extrapolam o âmbito material de

auxílios sob a forma de bolsas ou outros (moradia, deslocamento, creches, alimentação,

recursos para livros, financiamentos para apresentação em eventos acadêmicos e etc.), e

REUNI – Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, instituído em 2007 com uma

das ações integrantes do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), tem como principal objetivo

ampliar o acesso e a permanência na educação superior pública, através de oferta de cursos noturnos,

promoção de inovações pedagógicas e o combate à evasão, e entre outras metas, o plano pretende diminuir

as desigualdades no país. Para maiores informações acessar: http://portal.mec.gov.br/index.php.

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se direcionam as dimensões simbólicas do acesso e da permanência no ensino superior

(Reis e Tenório, 2009).

Mostra-se imprescindível para a universidade (re) pensar valores, objetivos, currículos

universitários que sejam compatíveis com suas novas demandas, contribuindo com a

função de acompanhar o acesso e a trajetória dos novos estudantes. Mais ainda, nos

parece que a universidade e a política de ações afirmativas devem trabalhar juntas na

direção da construção e reconstrução de laços entre a escola e a universidade. Não basta

apenas abrir vagas, aumentar o número de instituições, interioriza-las, criar programas de

bolsas, para garantir que as ações afirmativas cheguem efetivamente aos seus

destinatários. É preciso criar condições reais de permanência desses jovens.

Da Afiliação à Permanência

Aos jovens universitários é demandado certos modos de agir necessários para uma boa

desenvoltura na sua formação, que faz parte do que chamamos de “perfil acadêmico”.

Este perfil diz respeito às habilidades práticas tais como escrita de artigos, leitura de

textos densos, habilidade oral para apresentação de trabalhos em eventos científicos, e do

mesmo modo está ligado ao conhecimento das regras e estatutos institucionais, os

departamentos a serem acessados em casos específicos, e etc.

Para além dessas questões ligadas ao saber técnico, igualmente se coloca a

importância da familiaridade com os espaços no interior da academia e nos seus

extramuros, na cidade universitária, com os colegas em sala e de outros cursos, nas

moradias universitárias. Adaptar-se, portanto, faz parte do métier estudantil, que deve ser

constantemente aperfeiçoado, contribuindo no processo que faz nascer o sentimento de

pertencimento à universidade, o que decorre no sucesso acadêmico dos seus membros.

Ao ingressar no ensino superior os recém-chegados vivenciam este processo de

aprendizado do oficio de estudante. Aprender o “ofício” significa, portanto, apreender a

cultura universitária – tornar-se um deles, para não ser eliminado nesse mundo novo.

Uma transformação que torna o estrangeiro um verdadeiro nativo, que se aproxima do

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que Santos (2009) chama de permanência qualificada na universidade.

No caso de estudantes pertencentes a famílias sem tradição universitária este

processo torna-se ainda mais difícil, pois a ausência de uma preparação prévia para

entrada no ensino superior referentes ao cultivo de uma postura intelectualizada através

do acesso a leitura de textos mais densos desde a escola, conhecimento de línguas

estrangeiras, manejo de instrumentos tecnológicos, dentre outros, podem ser pontos que

complexificam a adaptação ao ensino superior.

A este processo de aprendizagem Coulon (2008) denomina de afiliação estudantil.

Segundo o autor,

[...] seja qual for o país, a primeira tarefa a ser cumprida

por quem ingressa na universidade será aprender o seu

ofício de estudante universitário... Aprender o ofício é

afilia-se à universidade, tanto do ponto de vista

institucional como numa perspectiva intelectual. Não basta

entender as regras da universidade; convém, ainda, ser

capaz de jogar com elas, descobrir as exceções e até saber

como contorna-las. (COULON, 2008, p.10)

Parece uma receita simples, mas para os “iniciantes” afiliar-se é uma tarefa complicada,

pois na realidade a universidade requer do estudante universitário a habilidade de lidar e

saber equilibrar autonomia e disciplina. Muitos jovens, nem sequer tem estabelecida uma

rede de contatos com pessoas já inseridas no ensino superior, em muitos casos é o

primeiro representante de sua família à ingressar na universidade. Não tem ideia de como

a universidade funciona, do que é requisitado aos estudantes na vida universitária.

Segundo Souza e Souza (2013), ao ingressar na universidade, o estudante é surpreendido

com um mundo novo, é desafiado a estabelecer um novo vínculo educacional e a adquirir

competências e um maior grau de autonomia, que até então não eram exigidas a alunos de

Ensino Médio.

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A ausência de uma preparação prévia para entrada no ensino superior, tanto de

habilidades técnicas, quanto de uma maturidade para o estudo, podem ser pontos

complicadores da adaptação ao ensino superior. Pode ser interessante que a universidade

pense sobre a criação de espaços e momentos iniciais que funcionem como um primeiro

estágio para o ingressante, que prepare o espírito para os desafios da construção de um

saber mais completo, mais crítico e maduro, diferente do que estavam acostumados com

o aprendizado escolar. Pois, espera-se que o novo estudante chegue pronto, carregado de

atributos desejáveis ao meio acadêmico, no que na realidade quase ou nunca acontece.

Além da própria instituição, o professor é um ator que possui uma grande

importância neste processo, e em todos os processos de aprendizagem. É ele que, seja em

sala de aula, em grupos de pesquisa, extensão, nos corredores, junto aos estudantes

veteranos e funcionários que compõem a universidade, recebem os novos estudantes, e

tem a possibilidade de dialogar, debater e (re) construir conhecimento. A figura do

professor neste processo é duplamente central, suas ações podem fragilizar ou colaborar

positivamente para a afiliação.

Coulon indica que o processo de afiliação universitária vai ocorrer em três tempos

distintos, esses tempos correspondem às fases que os estudantes vão superando as

dificuldades ao se familiarizarem com a universidade. Cabe destacarmos que este é um

processo contínuo, que se constrói e se reconstrói ao longo da permanência do estudante,

não se trata, portanto, de apenas “adquirir a competência, é necessário igualmente

aprender a maneira de mostrar que eles a possuem” (COULON, 2008, p.41).

Os dois primeiros tempos, tempo de estranhamento e tempo de aprendizagem, são

os momentos de maior instabilidade do estudante, pois estão rompendo com seu passado

recente, mas ainda não possuem um lugar concreto e seguro, estão começando a decifrar

a existência de códigos implícitos, conhecendo as regras que fazem parte do cotidiano

universitário. A angústia inicial é aos poucos transformada numa progressiva

familiarização com os códigos, com a estrutura institucional, com o inicio do trabalho

intelectual. Começa a conhecer as regras, pode então arriscar à transgredi-las.

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O terceiro tempo, tempo de afiliação, é dividido em dois momentos. O primeiro

momento diz respeito à afiliação institucional, que compreende a adaptação às regras da

universidade, seus estatutos e normas; o segundo momento se refere à parte intelectiva da

questão, afiliação intelectual, que indica a percepção das competências intelectuais

adquiridas, e a competência de demonstrá-las. Este é considerado por Coulon (2008) o

período que o estudante se torna definitivamente um membro. Nas palavras do autor,

A vida social cria-se constantemente, através das ações

práticas “dos membros”. Estes são aqueles que

compartilham os mesmo etnométodos, isto é, as mesmas

práticas locais e interativas de categorização e interpretação

e, portanto, os mesmos códigos implícitos. (COULON,

2008, p. 12)

A obtenção da afiliação sugere que o estrangeiro tornou-se nativo, que partilha de uma

linguagem comum, que transformou em rotina sua competência. Desse modo, “temos

sucesso quando somos capazes de criar, conscientemente, a equivalência entre regra,

norma ou instrução e problema prático, graças á identificação de marcadores acadêmicos,

que são os inúmeros códigos invisíveis que acompanham a vida de um estudante”

(COULON, 2008, p.253).

Uma vez membro é possível permanecer. É numa relação de retroalimentação que

os conceitos de permanência e afiliação aproximam-se. A permanência material e

simbólica (SANTOS, 2009) aparece-nos como dimensões importantes diante deste novo

momento que a universidade brasileira vem vivenciando. Permanecer materialmente é

possuir condições físicas e econômicas para/de estar na universidade. Já permanecer

simbolicamente, diz respeito às questões ligadas ao pertencimento, a sensação de

familiaridade, os meios designados para manter-se na universidade.

Para conceituarmos permanência recorremos ao trabalho realizado por Santos

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(2009), no qual a autora faz uma discussão filosófica e sócio-antropológica sobre os

significados matérias e simbólicos que envolvem o estar e manter-se na universidade.

Concordamos com a essência desta construção teórica na medida em que insiste na ideia

de que a universidade através das políticas de ações afirmativas, apesar de cumprir um

papel importante, precisa pensar para além das cotas - a inclusão simbólica dos

estudantes. Ao abarcar estudantes pobres, negros, quilombolas, indígenas e oriundos de

escolas públicas as ações afirmativas instauram uma dupla problemática, por um lado a

adaptação das instituições aos novos estudantes que passa a receber, que faz com que seja

demandado às universidades um olhar voltado a realidade das desigualdades do nosso

país, e por outro a adaptação desses estudantes à universidade e a vida universitária que a

circunda.

Permanência diz respeito a um estar ligado a concepção de tempo e

transformação. Para Santos (2009) permanecer significa o ato de durar no tempo de

maneira que possibilite a constância dos sujeitos, e, sobretudo, a possibilidade de

transformação e existência. É estar imerso no tempo, nas possibilidades de transformação

e formação no tempo através da troca e construção de saberes, na relação com o diverso.

Para elucidar o conceito trazemos ainda as contribuições de Reis e Tenório

(2009), segundo os autores “permanecer é uma palavra que vem do latim permanescere e

significa conservar, continuar, perseverar, insistir. O substantivo permanência, por sua

vez, deriva do latim permanentia e se constitui no ato de permanecer; significa, portanto,

perseverança, constância, continuidade (REIS E TENÓRIO, 2009, p.42)”.

Novamente segundo Santos (2009), o conceito permanência apresenta uma dupla

condição (material e simbólica), que interfere diretamente na estada dos jovens no campo

acadêmico, principalmente dos jovens abastados, em sua grande maioria negros,

advindos de escolas públicas, os quais a universidade fora historicamente negada. A

universidade para estes sempre fora um espaço improvável, ou quando inseridos o

fracasso e o insucesso sempre foram os caminhos esperados. Nas palavras da autora:

É necessário dinheiro para comprar livros, almoçar, lancha,

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pagar o transporte, etc. Mas é necessário também o apoio

pedagógico, a valorização da auto-estima, os referenciais

docentes, etc. Sendo assim, entendemos que a permanência

na Universidade é de dois tipos. Uma permanência

associada às condições materias de existência na

Universidade, denominada por nós de Permanência

Material e outra ligada às condições simbólicas de

existência na Universidade, a Permanência Simbólica.

Antes vale dizer que entendemos por condições simbólicas

a possibilidade que os indivíduos têm de identificar-se com

o grupo, ser reconhecido e de pertencer a ele. (SANTOS,

2009, p. 70)

Diante da elucidação dos conceitos, refletimos que o aprendizado e treinamento das

habilidades requeridas pela universidade são realmente necessários, e que nesta direção o

processo de afiliação à universidade revelar-se necessário para o que Santos chama de

permanência qualificada.

Não basta apenas ter a bolsa, poder tirar a xerox, alimentar-se, é preciso sentir-se

membro da universidade. Esta condição simbólica, que perpassa as condições materiais, é

na verdade a base delas. Do mesmo modo, compreende-se que não basta incluir

estudantes de setores menos favorecidos na universidade, é preciso refletir, criar novos

programas e até mesmo políticas que pensem a permanência, que colaborem com o

manter-se na universidade.

A Iniciação Científica em Questão

De acordo a Coulon (2008), a escola e a universidade por não possuírem as mesmas

rotinas, exigem dos estudantes que ingressam no ensino superior uma mudança de status,

de aluno para estudante universitário. É preciso traçar estratégias para substituir as

práticas cotidianas de uma cultura de estudante de ensino médio, na qual ele já estava

acostumado, para substituí-la por uma nova cultura, que é bem mais complexa, e requer

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modos de agir tidos como mais “sofisticados” e que fazem parte do meio acadêmico.

Diante da discussão traçada, a educação científica mostra-se como estratégia de

afiliação estudantil, uma vez que soma a experiência em grupo e o acompanhamento do

professor-orientador, maneira eficiente de iniciar-se no meio acadêmico, forma

privilegiada de aprendizagem do ofício de estudante.

Estar em um grupo de pesquisa ou extensão vai favorecer na formação não só do

aluno enquanto pesquisador dotado de habilidades acadêmicas, mas de uma rede de apoio

formada por colegas de pesquisa e pelo professor-orientador. Nesta direção, estudos

realizados por Castro (2011) nos dizem que o papel do professor-orientador está para

além de guiar a produção de conhecimento, eles precisam transmitir confiança, apoiando

e estimulando os jovens estudantes a buscarem pelo conhecimento, em outras palavras, a

lançar-se na aventura das descobertas.

Sob este ponto de vista não nos parece equivocado dizer que a pesquisa se torna

uma estratégia de sobrevivência, proporcionando ao estudante, através de suas diversas

atividades em grupo, o estabelecimento de relações entre os seus iguais, uma maneira de

dialogar, debater, conhecer outros estudantes que estão em mesma situação e partilham

do mesmo mundo, ainda que de ângulos diferenciados.

Segundo Castro (2011), as habilidades que o saber fazer da pesquisa proporciona

são úteis e desejáveis na trajetória acadêmica, contribuem para minimizar ou até superar

entraves que surgem no decorrer da formação, servindo desta maneira como experiência

no fazer profissional no âmbito das organizações e da mesma maneira na atividade

docente.

Souza e Souza (2013) destacam através do seu trabalho a relevância da prática da

pesquisa na formação do graduando. De acordo as autoras, a pesquisa é entendida como

processo investigativo que possibilita uma contínua atualização do aprender-fazer-

profissional, tanto para o estudante quanto para o professor, a pesquisa vai funcionar

como algo que liga a teoria à realidade, retroalimentando o conhecimento já adquirido em

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pesquisas bibliográficas e na sala de aula. Mostra “na vida real” aquilo que vemos nos

livros.

A iniciação científica (IC) 4 mostra-se como é um mecanismo importante no

auxílio do desenvolvimento de competências e posturas indispensáveis a estudantes de

graduação, e também um caminho para um maior comprometimento da universidade e de

sua responsabilidade social, devolvendo à sociedade uma parte do seu investimento,

através de atividades e ações fincadas desenvolvidas pelos grupos de pesquisa e extensão

fincados na melhoria social, aproximando universidade da sociedade, e vice-versa.

Considerações Finais

Apesar de reconhecermos a importância do aprendizado das habilidades acadêmicas,

necessárias aqueles estudantes que ingressam à universidade e que desejam pertencer e

adaptar-se ao novo mundo, reconhecemos também que cabe igualmente a universidade a

tarefa de pensar novos valores e mecanismos de maneira a aproximar-se do seu novo

público.

Assim, a universidade precisa reconhecer o saber que cada estudante traz consigo,

pois é um erro acreditar que os estudantes são como “folhas em branco” à serem

rabiscada, até um padrão de estudante universitário se firme. Os jovens trazem consigo

um saber que é “consigo mesmo, com o outro e com o mundo” tal como nos indica

Charlot (2000), carregado de sentidos e significâncias que demarcam seus territórios,

seus espaços, lugares sociais e políticos. Que os fazem pertencentes a um lugar no

mundo, e que os significam neste mundo.

4 A iniciação científica (IC) é uma modalidade de formação e incentivo à pesquisa, através do Programa

Institucional de Bolsas de Iniciação Científica - PIBIC. Na Bahia, temos a Fundação de Amparo à Pesquisa

do Estado da Bahia - FAPESB, que busca fomentar a inserção da ciência e da tecnologia na solução de

problemas econômicos e sociais que afetam o desenvolvimento sustentável do Estado. Esses dados foram

retirados das páginas do CNPQ e FAPESB. Para maiores informações acesse: http://www.cnpq.br/ e

http://www.fapesb.ba.br.

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Segundo Boaventura5, essas outras leituras, os outros saberes, as outras formas de

conhecer a realidade devem de ser trazidas para a universidade. E, ainda mais, esses

outros saberes obrigam à universidade a fazer uma justiça cognitiva, e rever o próprio

conhecimento científico que se produz sobre a sociedade brasileira. Devendo o

conhecimento estar voltado para o desenvolvimento do seu povo, para a democratização

dos seus espaços, repensando a nossa Nação.

É possível compreendermos a afiliação como um ritual de passagem. É o processo

de naturalização de modos de agir, pensar, de habilidades práticas necessárias para a

permanência dos estudantes no meio acadêmico. Ao inserir-se na universidade, esses

novos estudantes tem a possibilidade de colaborar com novas formas de produção,

reprodução, compartilhamento e difusão de conhecimentos científicos, tecnológicos,

culturais e artísticos.

A afiliação e a permanência mantem uma relação de retroalimentação, na medida

em que afiliar-se faz parte e contribui na permanência simbólica, qualifica a permanência

material, e, em contrapartida, permanecer simbolicamente permite que os estudantes

vivenciem em tempo e em transformação o seu processo de afiliação à universidade.

A relevância da discussão sobre os estudantes que ingressam e desejam

permanecer se assenta na possibilidade de contribuirmos para que a universidade esteja

cada vez mais aberta e democrática, para que construa saberes diversos que possam

repensar sua própria estrutura. Desejamos através deste estudo, colaborar com as

questões que envolvam a afiliação e a permanência na universidade, entendendo que a

adaptação à universidade de jovens oriundos de famílias sem uma tradição universitária

tem um papel importante para a democratização do saber e a justiça social que se faz por

meio do acesso a educação.

5 Numa entrevista a Revista Diversa da Universidade Federal de Minas Geral, em 2005, o sociólogo

Boaventura de Souza Santos fala sobre o diálogo entre o saber científico e os outros saberes. Para maiores

informações ver: https://www.ufmg.br/diversa/8/entrevista.htm

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