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Os Atos Humanos 1. Definição do Ato Humano Os atos humanos são aqueles que procedem da vontade deliberada do homem; isto é, aqueles que o homem pratica com conhecimento e com livre vontade. Neles intervém, primeiro, o entendimento: o homem conhece o objeto e delibera se pode e deve tender para ele, ou não. Uma vez conhecido o objeto, a vontade tende para ele porque o deseja, ou afasta-se dele, rejeitando-o. Só neste caso — quando intervém entendimento e vontade — é que o homem é senhor dos seus atos e, portanto, plenamente responsável por eles. E só nos atos. Nem todos os que o homem realiza são propriamente «humanos», visto que, como já sabemos, podem ser: 1) meramente naturais: aqueles que procedem das potências vegetativas e sensitivas, sobre as quais o homem não tem domínio voluntário algum, e são comuns com os animais — por ex., a nutrição, a circulação do sangue, a respiração, a percepção visual ou auditiva, o sentir dor ou prazer...; 2) atos do homem: os que procedem do homem, mas a que falta, quer a advertência (caso dos dementes, das crianças pequenas, ou a distração total), quer a voluntariedade (por coação física, etc), quer uma e outra (p. ex., em quem está a dormir). 2. Divisão do Ato Humano Pela sua relação com a moralidade, o ato humano pode ser: 1) bom ou lícito, se estiver conforme com a lei moral (p. ex., dar esmola); 2) mau ou ilícito, se lhe for contrário (p. ex., mentir); 3) indiferente, quando nem é contrário nem conforme à lei moral (p. ex., o andar; cf. 6.1). Embora seja esta a divisão mais importante, interessa ainda observar que, em razão das faculdades que o aperfeiçoam, o ato pode ser: a) interno: o que é realizado mediante as faculdades internas do homem — entendimento, memória, imaginação, etc. (p. ex., a recordação de uma ação passada, ou o desejo de algo futuro);

Os Atos Humanos

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Os Atos Humanos1. Definio do Ato HumanoOs atos humanos so aqueles que procedem da vontade deliberada do homem; isto , aqueles que o homem pratica com conhecimento e com livre vontade. Neles intervm, primeiro, o entendimento: o homem conhece o objeto e delibera se pode e deve tender para ele, ou no. Uma vez conhecido o objeto, a vontade tende para ele porque o deseja, ou afasta-se dele, rejeitando-o.S neste caso quando intervm entendimento e vontade que o homem senhor dos seus atos e, portanto, plenamente responsvel por eles. E s nos atos.Nem todos os que o homem realiza so propriamente humanos, visto que, como j sabemos, podem ser:1) meramente naturais: aqueles que procedem das potncias vegetativas e sensitivas, sobre as quais o homem no tem domnio voluntrio algum, e so comuns com os animais por ex., a nutrio, a circulao do sangue, a respirao, a percepo visual ou auditiva, o sentir dor ou prazer...;2) atos do homem: os que procedem do homem, mas a que falta, quer a advertncia (caso dos dementes, das crianas pequenas, ou a distrao total), quer a voluntariedade (por coao fsica, etc), quer uma e outra (p. ex., em quem est a dormir).2. Diviso do Ato HumanoPela sua relao com a moralidade, o ato humano pode ser:1) bom ou lcito, se estiver conforme com a lei moral (p. ex., dar esmola);2) mau ou ilcito, se lhe for contrrio (p. ex., mentir);3) indiferente, quando nem contrrio nem conforme lei moral (p. ex., o andar; cf. 6.1).Embora seja esta a diviso mais importante, interessa ainda observar que, em razo das faculdades que o aperfeioam, o ato pode ser:a) interno: o que realizado mediante as faculdades internas do homem entendimento, memria, imaginao, etc. (p. ex., a recordao de uma ao passada, ou o desejo de algo futuro);b) externo: quando intervm tambm os rgos e sentidos do corpo (p. ex., comer ou ler). 3. Elementos do Ato Humano: A Advertncia e o ConsentimentoDissemos j que o ato humano exige a interveno das potncias racionais inteligncia e vontade , que so precisamente os elementos que o constituem: a advertncia, quanto inteligncia, e o consentimento, quanto vontade.3.1. A AdvertnciaPela advertncia, o homem percebe a ao que vai realizar, ou que j est a realizar. Esta advertncia pode ser plena ou semi-plena, consoante a ao seja advertida com toda a perfeio ou s imperfeitamente (p. ex., estando meio adormecido).Como bvio, todo o ato humano requer necessariamente essa advertncia, de tal modo que um homem que atue to distraidamente que no repara minimamente no que est a fazer no realiza um ato humano.No entanto, no basta ter advertncia do ato para poder ser moralmente imputado. ainda necessria a advertncia da relao do ato com a moralidade (p. ex., quem tem a conscincia de estar a comer carne mas sem reparar que fez um propsito de abstinncia, pratica um ato humano que, apesar disso, no imputvel moralmente).Portanto, a advertncia tem de ser dupla: do ato em si e da moralidade do ato.3.2. O Consentimento o que leva o homem a querer praticar esse ato previamente conhecido, procurando com isso um fim. Ato voluntrio ou consentido o que procede de um princpio intrnseco, com conhecimento do fim.Esse ato voluntrio consentido pode ser perfeito ou imperfeito, consoante seja realizado com pleno ou semi-pleno consentimento e direto ou indireto. Pela sua importncia prtica, estudaremos mais detidamente esta ltima diviso.

4. O Ato Voluntrio IndiretoO ato voluntrio indireto d-se quando, ao praticar uma ao, alm do efeito que de modo direto se procura com ela, se segue outro, adicional, que no se pretende mas apenas se tolera por vir unido ao primeiro (p. ex., o militar que bombardeia uma cidade inimiga, sabendo que morrero muitos inocentes: diretamente, o que quer destruir o inimigo ato voluntrio direto , e tolera a morte de inocentes voluntrio indireto )., portanto, um ato de que se segue um efeito bom e outro mau, pelo que se chama ato voluntrio de duplo efeito.Importa precavermo-nos de que no se trata de um ato feito com duplo fim (como roubar ao rico para dar ao pobre), mas de um ato de que se seguem dois efeitos: duplo efeito, no duplo fim.Robin Hood ou o Zorro realizam aes com duplo fim: o fim imediato roubar o rico; o fim mediato dar aos pobres o dinheiro roubado. No uma ao de duplo efeito, mas uma ao com um fim prprio e um fim ulterior.Casos h em que lcito realizar aes em que, a um efeito bom, se seguir outro mau. Para ser lcito praticar uma ao de que se sigam dois efeitos, um bom (voluntrio direto) e outro mau (voluntrio indireto), indispensvel que se renam determinadas condies:1) QUE A AO SEJA BOA EM SI MESMA, OU PELO MENOS INDIFERENTE.Assim, nunca lcito realizar aes ms (mentir, jurar em falso, etc), ainda que com elas se atingissem timos efeitos, pois o fim nunca justifica os meios, e, portanto no se pode fazer o mal para obter um bem.Para saber se a ao boa ou indiferente, ser preciso atender, como veremos adiante, ao seu objeto, fim e circunstncias.2) QUE O EFEITO IMEDIATO, O PRIMEIRO QUE SE PRODUZ, SEJA O BOM EFEITO, E O MAU NO MAIS QUE CONSEQNCIA NECESSRIA. um princpio que se deduz do anterior: necessrio que o bom efeito derive diretamente da ao, e no do efeito mau (p. ex., no seria lcito que, para salvar a fama de uma jovem, se provocasse o aborto, pois o efeito primeiro o aborto; no seria lcito matar um inocente para depois conseguir atingir o culpado, visto que o efeito primeiro a morte do inocente).3) QUE A PESSOA SE PROPONHA O FIM BOM. ISTO , O BOM EFEITO, E NO O MAU, SOMENTE PERMITIDO.Se se procurasse o fim mau, embora atravs do bom, a ao seria imoral, por fora da perversidade da inteno. O fim mau apenas se tolera por ser impossvel separ-lo do bom, no que haver desgosto ou desagrado.Nem sequer lcito intentar os dois efeitos mas unicamente o bom, permitindo o mau s por ser absolutamente inseparvel do primeiro (p. ex., o empregado que, ameaado de morte, d o dinheiro aos assaltantes, deve ter como fim salvar a vida, no que roubem o patro). Mesmo que se tivessem os dois fins ao mesmo tempo, o ato seria imoral.Visto que o efeito mau ainda que esteja unido ao bom e s de modo indireto se permita sempre, materialmente, mau, e o pecado material em que no existe voluntariedade de pecar s por causa proporcionada pode ser permitido.No seria lcito, p. ex., que, para conseguir um pequeno arsenal de munies, se arrasasse uma povoao: o motivo no proporcionado ao efeito mau.Exerccios (I)1. Enunciar trs exemplos de atos meramente naturais, trs de atos humanos e trs de atos do homem, diferentes dos assinalados nos apontamentos.2. Explicar por que no sero moralmente imputveis as seguintes aes:a) comprar um objeto roubado, ignorando em absoluto que roubado;b) algum, profundamente adormecido, tem sonhos desonestos.3. Analisar a moralidade dos seguintes casos, de acordo com as quatro regras do ato voluntrio indireto:a) matar a criana no ventre materno para salvar a vida da me;b) disparar uma arma para defender a vida perante um injusto agressor;c) operar a um tumor maligno numa mulher grvida, com grave risco de se perder o filho;d) um guarda, ameaado pelo ladro, entrega as chaves que vo permitir o roubo do estabelecimento;e) declarar a guerra contra um agressor injusto, para salvar a ptria;f) submeter-se a uma operao muito perigosa de que pode sobrevir a morte , se h esperana de se curar dessa maneira;g) ler um livro que contm erros contra a F, para fazer um trabalho universitrio; h) vender um livro obsceno ou hertico, para ganhar dinheiro e sustentar a famlia;i) alugar uma casa, sabendo que os inquilinos a vo usar para fins menos honestos; j) vender Cds e Dvds para aumentar as receitas, sem querer saber da moralidade das msicas e dos filmes.

Trabalho de investigao: Expor com brevidade a doutrina de Lutero acerca da justificao apenas pela F.5. Obstculos ao Ato HumanoTrata-se agora de analisar alguns fatores que afetam os atos humanos, quer impedindo o devido conhecimento da ao, quer a livre escolha voluntria; isto , as causas que de algum modo podem modificar o ato humano quanto sua voluntariedade ou quanto sua advertncia, e, por conseguinte, em relao com a sua moralidade.Algumas dessas causas afetam o elemento cognoscitivo do ato humano (a advertncia); outras, o elemento volitivo (o consentimento).Estes obstculos podem mesmo chegar a fazer de um ato humano um simples ato do homem.5.1. Obstculos por parte do conhecimento: A Ignornciaa) Noo de ignorncia: entende-se por ignorncia a falta de conhecimento de uma obrigao.Em Teologia Moral, costuma-se definir como a falta da devida cincia moral, num sujeito capaz de a ter; ou seja, a ausncia de conhecimento moral que se poderia e deveria ter. Deste modo, podemos distingui-la de:a nescincia, ou falta de conhecimentos no obrigatrios (p. ex., da Medicina em quem no mdico);a inadvertncia, ou falta de ateno atual a uma coisa que habitualmente se conhece;o esquecimento, ou privao atual ou habitual de um conhecimento que anteriormente se teve;o erro, ou seja o juzo equivocado acerca da verdade de uma coisa.

b) Diviso da ignorncia. A ignorncia pode ser vencvel ou invencvel. 1) Ignorncia vencvel: aquela que se poderia e deveria ultrapassar, se se quisesse fazer um esforo razovel (p. ex., consultando, estudando, pensando).Subdivide-se em: simplesmente vencvel, se nos esforamos um tanto por a vencer, mas de modo insuficiente ou incompleto; crassa ou supina, se nada ou quase nada se fez por sair dela e, portanto, provm de grave descuido em aprender as principais verdades da F e da Moral, ou os deveres prprios do estado e da profisso; afetada: quando nada se quer fazer para a vencer, a fim de pecar com maior liberdade; ignorncia, portanto, plenamente voluntria.

2) Ignorncia invencvel: aquela que no pode sei superada pelo sujeito que dela sofre, quer por no ter nenhuma advertncia dela (p. ex., o aborgine que no adverte a ilicitude da vingana), quer por ter tentado em vo sair dela (perguntando ou estudando).Em certas ocasies, pode equiparar-se ignorncia invencvel o esquecimento ou a inadvertncia (p. ex., uma pessoa que, tendo uma enfermidade, come carne sem saber que faz mal, de maneira que no a comeria se soubesse).A ignorncia invencvel surge principalmente entre pessoas rudes e no-civilizadas. Numa pessoa com preparao humana e escolar, a ignorncia em matria de F e de Moral quase sempre vencvel.c) Princpios morais acerca da ignorncia:1. A ignorncia invencvel retira toda e qualquer responsabilidade perante Deus, uma vez que involuntria e por isso inculpvel aos olhos de quem conhece o fundo dos nossos coraes (p. ex., no peca a criancinha que, sem saber, faz uma coisa m). fcil entender este princpio moral se considerarmos o adgio escolstico nihil volitum nisi praecognitum: nada desejado sem antes ser conhecido.2. A ignorncia vencvel sempre culpvel, em maior ou menor grau, conforme a negligncia em averiguar a verdade. Assim, maior a responsabilidade por uma ao m realizada com ignorncia crassa, do que com ignorncia simplesmente vencvel. Conseqentemente, pode ser pecado mortal se depender de grave descuido.3. A ignorncia afetada, longe de diminuir a responsabilidade, aumenta-a, porque pressupe malcia maior.d) Dever de conhecer a lei moral:Como j se disse, a ignorncia pode, por vezes, eximir de culpa e, em conseqncia, de responsabilidade moral. No entanto, convm acrescentar que h o dever de conhecer a lei moral, para ir adequando a ela as nossas aes.Esse conhecimento no se deve limitar a determinada poca da vida a infncia ou a juventude , mas deve desenvolver-se ao longo de toda a vida humana, com especial referncia tarefa que cada um desempenha na sociedade. Daqui deriva o conceito de moral profissional, como aplicao dos princpios morais de ordem geral s circunstncias concretas de determinado ambiente. Portanto, o dever de sair da ignorncia ganha especial obrigatoriedade em tudo o que se refere ao campo profissional e aos deveres de estado de cada pessoa.5.2. Obstculos por parte da VontadeOs obstculos que dificultam a livre escolha feita pela vontade so: o medo, as paixes, a violncia e os hbitos.a) O medo. um vacilar do nimo perante um mal presente ou futuro que nos ameaa, que influi na vontade de quem atua.De modo geral, o medo ainda que grande no destri o ato voluntrio, a no ser que a sua intensidade faa perder o uso da razo.O medo no razo suficiente para cometer um ato mau, embora o motivo seja considervel: salvar a vida, salvar a fama, etc. Seria ilcito, p. ex., renegar a F por medo do castigo ou da morte.Ao contrrio, se, apesar do medo, a pessoa realiza a ao boa, maior ser o valor moral da ao.Ao longo da Histria da Igreja, deram-se casos incontveis de pessoas de natureza de certo modo tmida e pouco audaciosa, que superaram o medo a fim de cumprir a vontade de Deus. o caso, por exemplo, de Jos de Armateia, que, sendo discpulo oculto de Cristo por temor dos Judeus (Jo 19,38), soube vencer-se e dar a cara quando outros fugiram, foi ele que reclamou audacter: audaciosamente (Mc 15,43) de Pilatos o corpo morto do Senhor.Por vezes, contudo, o medo pode escusar do cumprimento de leis positivas (isto , de leis puramente eclesisticas) que mandam praticar um ato bom, se causarem grande incomodidade; nestes casos, subentende-se que o legislador no tem inteno de obrigar. Seria, p. ex., o caso da esposa que para evitar um grave conflito familiar, deixasse de jejuar ou de ir ao culto. Trata-se da aplicao do princpio que diz que as leis positivas no obrigam sob grave incmodo.Note-se que falamos apenas de leis positivas ou meramente eclesisticas. O cumprimento da Lei Divina p. ex , amar a Deus sobre todas as coisas obriga sempre, mesmo custa da prpria vida (caso dos cristos martirizados por se negarem a incensar os dolos).b) As paixes. Designam as emoes ou impulsos da sensibilidade que inclinam a agir ou a no agir. So componentes naturais do psiquismo humano; constituem a transio entre a vida sensvel e a vida do esprito.Exemplos de paixes so o amor e o dio, o desejo e o medo, a alegria, a tristeza e a ira.As paixes so, em si mesmas, indiferentes, mas convertem-se em boas ou ms consoante o objeto a que tendam. Devem, pois, ser dirigidas pela razo e regidas pela vontade, para no conduzirem ao mal.Por exemplo: a ira santa quando leva a defender os valores divinos ( a ira de Jesus Cristo ao expulsar os vendilhes do Templo: cf. Mc 11,15-19); o dio agrada a Deus se dio ao pecado; o prazer bom quando regido pela reta razo. Se os objetos a que tendem as paixes forem maus, afastam-nos do Fim ltimo: tais so o dio ao prximo, a ira por motivos egostas, o prazer desordenado...Se as paixes vm antes da prtica da ao e nela influem, diminuem a liberdade por ofuscarem a razo. Em arrebatamentos de grande violncia, podem mesmo chegar a destruir essa liberdade (p. ex., o pai que, levado pela ira, matasse um filhinho pancada).Se vm em conseqncia da ao e so diretamente provocadas, aumentam a voluntariedade (p. ex., aquele que, para aumentar a ira e o desejo de vingana, recorda as ofensas recebidas).Quando surge um movimento passional que nos inclina ao mal, a vontade pode atuar de duas maneiras:- negativamente, no o aceitando nem o rejeitando; - positivamente, aceitando-o ou rejeitando-o, num ato formal.Para lutar eficazmente contra as paixes desordenadas, no bastante uma resistncia negativa, visto que ela significa deixar-nos expostos ao perigo de nelas consentirmos. necessrio rejeit-las formalmente, orientando o nimo para outro objeto: este o meio mais fcil e mais seguro, sobretudo para combater os movimentos da sensualidade e da ira.O naturalismo a falsa doutrina que defende no se dever pr freio s paixes humanas, sob pretextos pseudo-psicolgicos (dar origem a traumas, p. ex.). Cai ela no erro basilar de esquecer que o homem tem, em conseqncia do pecado original, as paixes desordenadas e inclinadas ao pecado. A reta razo, como potncia superior, iluminada e fortalecida pela graa, deve submeter e reger esses movimentos no homem.c) A violncia. E o impulso de um fator externo que nos leva a atua r contra a nossa vontade.Esse fator externo pode ser fsico (pancadas, etc.) ou moral (promessas, lisonjas, rogos insistentes e inoportunos, etc), e d origem violncia fsica ou moral.A violncia fsica absoluta que se d quando a pessoa violentada ops toda a resistncia possvel, sem a poder vencer destri a voluntariedade, desde que se resista interiormente para no consentir o mal.A violncia moral nunca destri a voluntariedade, pois, debaixo dela, a pessoa permanece a todo o momento senhora da sua liberdade.A violncia fsica relativa diminui a voluntariedade em proporo com a resistncia que se lhe ops.d) Os hbitos. Muito relacionados com o consentimento, esto os hbitos ou costumes contrados pela repetio de atos, e que se definem como firme e constante tendncia para agir de certa maneira. Podem ser bons e nesse caso damos-lhes o nome de virtudes ou maus: estes constituem os vcios.O hbito de pecar vcio arraigado diminui a responsabilidade se houver esforo para o combate; mas s neste caso, uma vez que quem no luta para desarraigar um hbito mau contrado voluntariamente se faz responsvel no s dos atos que comete advertidamente, mas ainda dos inadvertidos: quando no se combate a causa, querer a causa querer o efeito.Ao invs, quem luta contra os seus vcios responsvel pelos pecados que comete com advertncia, mas no pelos que comete inadvertidamente, pois no h na causa o elemento voluntrio.Exerccios (II)1. Qual a diferena entre inadvertncia e ignorncia?2. Indicar trs acepes de cada um dos seguintes termos:a) intelignciab) vontadec) liberdade.3. Qual dessas acepes se ajusta melhor ao sentido utilizado nos apontamentos?4. Explica: Nas paixes, enquanto impulsos da sensibilidade, no h bem nem mal moral.5. De que depende que uma paixo se torne boa ou se torne m?6. Indicar os aspectos da cincia moral que tem maior obrigao de conhecer:a) o advogado que se dedica ao Direito do Trabalho.b) a dona de casa, esposa e me de famlia.c) o mdico ginecologista.d) o estudante de uma universidade anti-religiosa.e) o estudante que viva num ambiente frvolo.7. Ajuizar da moralidade dos seguintes casos, justificando:a) mdico que prejudica o seu doente por falta de conhecimentos. _b) homem rude ou no-civilizado, que no cumpre tudo o que pertence a justia.c) cristo recm-convertido do paganismo, que, ameaado de morte, adora Csar.d) universitrio cristo que ignora os mandamentos e por isso no os cumpre.e) demente que mata o mdico que o trata. f) jogador que, no entusiasmo ofuscante de um encontro desportivo, lesiona gravemente o adversrio.g) quem gravemente doente e com medo da morte, faz uma promessa a Deus, e depois no a cumpre. h) quem, arrependido do hbito de mentir e usando dos meios para no recair, mente inadvertidamente por fora do costume.i) me que, com medo de perder o bom nome da famlia, aconselha a filha solteira a abortar.Trabalho de investigao: Fazer um estudo (2 ou 3 folhas) sobre as paixes: quantas e quais so, e como poderiam ser orientadas para o bem ou para o mal.6. A Moralidade do Ato HumanoO ato humano no uma estrutura simples, mas sim composta de elementos diversos. Em quais deles assenta a moralidade da ao?A esta pergunta, chave para o estudo da cincia moral, responde-se dizendo que, no juzo acerca da bondade ou da maldade de um ato, preciso considerar:a) o objeto do ato em si mesmo;b) as circunstncias que o rodeiam;c) a finalidade que o sujeito se prope com esse ato.Para considerar a moralidade de qualquer ao, importa refletir sempre sobre esses trs aspectos.6.1. O ObjetoO objeto o dado fundamental: a ao mesma do sujeito, mas olhada do ponto de vista moral.Note-se que o objeto no o ato puro e simples, mas o ato juntamente com i sua qualidade moral. Um mesmo ato fsico pode ter objetos muito diversos, como se pode ver pelos exemplos seguintes:

ATOOBJETOS DIVERSOS

matarassassnio

defesa prpria

aborto

pena de morte

falarmentir

orar

insultar

adular

abenoar

difamar

jurar

blasfemar

A moralidade de um ato depende principalmente do objeto: se o objeto mau, o ato ser necessariamente mau; se o objeto bom, o ato ser bom se forem boas as circunstncias e a finalidade.Por ex., nunca lcito blasfemar, perjurar, caluniar, etc, por mais que as circunstncias ou a finalidade sejam boas.Se o ato em si mesmo no tem moralidade alguma (p. ex., passear), recebe-a da finalidade que se tenha em vista (p. ex., descansar e conservar a sade), ou das circunstncias que o acompanhem (p. ex., ms companhias).A Teologia Moral ensina que, embora possa haver objetos morais indiferentes em si mesmos, nem bons nem maus , na prtica no existem atos indiferentes (a sua qualidade moral vem-lhes, neste caso, da finalidade ou das circunstncias). Da que, em concreto, qualquer ao ou boa, ou m.6.2. As Circunstnciasa) NooAs circunstncias (de circum-stare = estar em redor) so diversos fatores ou modificaes que afetam o ato humano. Podemos considerar, em concreto, as seguintes:1) quem realiza a ao (p. ex., peca mais gravemente quem, tendo autoridade, d mau exemplo); 2) as conseqncias ou efeitos que se seguem da ao (um leve descuido do mdico pode ocasionar a morte do paciente);3) quem rouba uma coisa: trata-se da qualidade de um objeto (p. ex., o roubo de uma coisa valiosa) ou da sua quantidade (p. ex., a soma roubada);4) onde: o lugar em que se realiza a ao (p. ex., um pecado cometido em pblico mais grave, pelo escndalo que provoca);5) com que meios se realizou a ao (p. ex., orar com ateno ou distraidamente, castigar os filhos com excesso de crueldade);6) o modo como se realizou o ato (p. ex., se houve fraude ou engano, se se utilizou a violncia);7) quando se praticou a ao, visto que o tempo influi, por vezes, na moralidade (p. ex., comer carne sabendo que no pode com-la).b) Influxo das circunstncias na moralidadeH circunstncias que atenuam a moralidade do ato, circunstncias que a agravam e, finalmente, circunstncias que acrescentam outras conotaes morais a esse ato. Por exemplo, atuar sob o impulso de uma paixo pode, consoante os casos, atenuar ou agravar a culpabilidade. Insultar sempre mau; mas insultar um semelhante menos grave que insultar uma pessoa doente. claro que, no exame dos atos morais, devem ter-se em conta aquelas circunstncias que tm influxo moral. Assim, no caso do roubo, p. ex., tanto faz ter sido feito na 3 como na 5 feira...Circunstncias que agravam ou diminuem o pecado, sem lhe mudar a espcie (p. ex., mais grave dar mau exemplo s crianas que aos adultos; menos grave a ofensa que provm de um surto repentino de ira ao fazer desporto).6.3. A FinalidadeA finalidade a inteno que o homem tem ao praticar um ato, e pode coincidir ou no com o objeto da ao. No coincide (p. ex.) quando dou um passeio pelo campo (objeto) a fim de recuperar a sade (finalidade).Coincide, naquele que se embriaga (objeto) com o desejo de se embriagar (finalidade).Em relao moralidade, o fim de quem atua pode influir de diversos modos:a) se o fim bom, junta ao ato bom nova bondade (p. ex., ir o culto objeto bom para louvar a Deus fim bom );b) se o fim mau, vicia por completo a bondade de um ato (p. ex., ir ao culto s para ver, com maus desejos, determinada mulher fim mau );c) quando o ato , em si mesmo, indiferente, o fim transforma-o em bom ou mau (p. ex., passear diante de um Banco objeto indiferente a fim de preparar o prximo roubo fim mau);d) se o fim mau, junta nova malcia a um ato mau em si (p. ex., roubar objeto mau , para depois se embriagar fim mau); e) o fim bom de quem atua nunca pode converter em boa uma ao m em si mesma. Diz Paulo: No se devem fazer coisas ms para se conseguirem coisas boas (cf. Rm 8,3); p. ex., no se pode jurar falso objeto mau para salvar um inocente fim bom ; ou dar a morte a algum para o libertar do sofrimento; ou roubar ao rico para dar aos pobres).6.4. Determinao da Moralidade no Ato HumanoO princpio bsico para ajuizar da moralidade o seguinte:Para que uma ao seja boa, necessrio que o sejam os seus trs elementos: objeto bom, finalidade boa e circunstncias boas; para que o ato seja mau, basta que seja mau qualquer dos seus elementos A razo disto clara: estes trs elementos formam unidade indissolvel no ato humano e, ainda que s um deles seja contrrio Lei Divina, se a vontade operar apesar desta oposio, o ato moralmente mau.6.5. A Ilicitude de Agir s por prazerA ilicitude de agir s por prazer um princpio moral que tem na vida prtica numerosas conseqncias. As premissas so as seguintes:a) Deus quis que algumas aes sejam acompanhadas de prazer, dada a sua importncia para a conservao do indivduo ou da espcie.b) Por isso mesmo, o prazer no tem em si mesmo razo de fim, antes apenas um meio que facilita a prtica desses atos: Delectatio est propter operationem et non ex converso: o deleite em vista da operao, e no ao contrrio.c) colocar o deleite como fim de um ato implica trocar a ordem das coisas estabelecida por Deus, e essa ao passa a estar corrompida com mais ou menos gravidade. Por isso, nunca lcito operar somente por prazer (p. ex., comer e beber s pelo prazer pecado; igualmente, realizar o ato conjugal exclusivamente pelo deleite que o acompanha).d) Podemos atuar com prazer; mas no sendo o deleite a realidade pretendida em si mesma (p. ex., lcito comer e beber com gosto, mas no exclusivamente por gosto: lcito o prazer conjugal em ordem aos fins do casamento, mas no quando procurado como finalidade nica. O mesmo se pode dizer de quem busca a diverso pela diverso).e) Para que os atos tenham retido, sempre bom referi-los a Deus, fim ltimo do homem, ao menos de modo implcito: Quer comais, quer bebais, fazei tudo pela glria de Deus (I Cor 10,31). Se, nalgum ato, exclussemos a inteno de agradar a Deus, ele seria pecaminoso, embora esta excluso da vontade de agradar a Deus apenas torne o ato pecaminoso se a fizermos de maneira direta no se a omitirmos inadvertidamente.7. A Reta compreenso da LiberdadeUma das notas prprias da pessoa entre todos os seres visveis que habitam a Terra, s o homem pessoa a liberdade. Por ela, o homem sai do reino da necessidade e capaz de amar e de obter mritos. A liberdade caracteriza os atos propriamente humanos: s na liberdade o homem pai dos seus atos.H ocasies em que se pode considerar a liberdade como a capacidade de fazer o que se quiser sem norma nem freio. Seria uma espcie de corrupo da liberdade, como o tumor cancergeno num corpo. A liberdade verdadeira tem um sentido e uma orientao:A liberdade o poder, fundado na razo e na vontade, de agir ou no agir, de fazer isto ou aquilo, praticando, assim, aes deliberadas por si mesmo.A liberdade posterior inteligncia e vontade, radica nelas, ou seja, no ser espiritual do homem. Portanto, a liberdade deve obedecer ao modo de ser prprio do homem, e nele uma fora de crescimento e amadurecimento na verdade e na bondade. Por outras palavras, alcana a sua perfeio quando se ordena a Deus.Enquanto se no fixa definitivamente no seu bem ltimo, que Deus, a liberdade implica a possibilidade de escolher entre o bem e o mal, e portanto de crescer na perfeio ou de falhar e pecar. ela que propriamente caracteriza os atos humanos. Torna-se fonte de louvor ou de censura, de mrito ou demrito. liberdade engrandecedora chama-se liberdade de qualidade. Essa liberdade engrandece o homem por ser sequi naturam, isto , conforme com a natureza, que no devemos entender como inclinao de ordem biolgica, pois diz respeito principalmente natureza racional, caracterizada pela abertura Verdade e ao Bem e comunicao com os outros homens. Por outras palavras, a liberdade de qualidade posterior razo, apoia-se nela e de ela extrai seus princpios. Exatamente ao contrrio do conceito errneo de liberdade como liberdade de indiferena, em que a liberdade est antes da razo, e pode ir impunemente contra ela. a liberdade que no est sujeita a norma nem a freio, aquela que postula a autonomia da indeterminao. Libertinagem ilusria e inatingvel, mas destruidora do homem e da sua felicidade.

Exerccios (III)1. Indicar os objetos morais que se poderiam atribuir aos seguintes atos;a) escreverb) baterc) dar prendas.2. Determinar o objeto, o fim e as circunstncias das seguintes aes, dando o diagnstico da sua moralidade:a) tirar a vida ao ladro armado, que entra de noite para roubar;b) jogar futebol para descansar dos exames, mas deixando-se levar pela vaidade diante dos companheiros;c) trabalhar excessivamente ao Domingo, sem grave necessidade, para obter um pouco mais de lucros;d) a ao descrita em Mc 12,42-44; e) ler um romance durante o culto;f) agir exclusivamente para ser elogiado pelo chefe;g) roubar a caixa de uma igreja, para ir com uns amigos ver um filme imoral.3. Dar exemplos das seguintes combinaes:a) objeto bom fim bom circunstncias boasb) objeto bom fim bom circunstncias msc) objeto bom fim mau circunstncias msd) objeto mau fim bom circunstncias boase) objeto mau fim mau circunstncias ms.4. Em face do que se viu neste captulo, justificar que as prprias leis humanas castiguem com maior rigor o homicdio premeditado do que o cometido por paixo.5. Relacionar o passo de Mt 6,1 com os temas desta seco.6. Fazer o mesmo com os textos de Mt 12,36 e Rm 3,8.7. Determinar as espcies de circunstncias que haveria a considerar em relao aos pecados seguintes:a) infanticdio;b) agresso premeditada e aleivosa;c) adultrio;d) fraude;e) calnia contra um professor.8. Explica as frases seguintes:

A liberdade caracteriza os atos propriamente humanos;

Na medida em que o homem mais faz o bem, vai-se tornando mais livre;

A escolha da desobedincia e do mal um abuso da liberdade e conduz 'escravido do pecado' (Rm 6,17);

A liberdade torna o homem responsvel dos seus atos;

A liberdade atinge a perfeio quando est ordenada a Deus.

Trabalho de investigao: Escrever acerca da liberdade e da sua relao com o cumprimento de preceitos obrigatrios.