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Encontro Nacional de Pesquisa em Comunicação e Imagem - ENCOI
24 e 25 de novembro de 2014 • Londrina, PR
Os conceitos de iconomania e iconofagia nas composições visuais da página do
banco Bradesco no Facebook1
Suelen Fernanda de Camargo 2
Resumo: O artigo aborda os conceitos de iconomania e iconofagia na página do
Bradesco no Facebook. A iconomania surge em decorrência do excesso imagético. Já a
iconofagia é constatada à medida em que imagens devoram imagens. Elas não têm
significado próprio, mas reproduzem conteúdos precedentes. Além disso, imagens
devoram corpos, pois, em grande quantidade, cercam o internauta a todo instante; e
corpos devoram imagens, já que a sobrecarga visual não permite que o indivíduo
contemple tais mensagens, mas sim, que as devore. Em uma publicação, a agência
bancária estimulou os usuários da página para que postassem uma fotografia nos
comentários. Como resultado, outros 127 elementos visuais foram divulgados, causando
um excesso imagético. Em outras figuras, o banco divulgou uma selfie e uma fotografia
de bolo com café, apropriando-se, dessa maneira, de um repertório que é próprio do
internauta.
Palavras-chave: ambientes de imagens; iconomania; iconofagia; Facebook; banco
Bradesco.
Abstract: The article discusses the concepts of iconomania and iconofagia in
Bradesco's page on Facebook. The iconomania arises due to a great amount of images.
The iconofagia is regarded as images devour images. They don't have specific meaning,
but they reproduce previous contents. Besides, images devour bodies because, in a large
quantity, they surround the netizen all the time; therefore bodies devour images because
the visual overload doesn’t allow the individual to contemplate such messages, but
rather him to devour them. In a publication, the banking agency stimulated the users of
the page, so that they can put a picture in the comments. As a result, other 127 visual
elements were published, causing an imagistic excess. In other figures, the bank put out
a selfie and a photograph of cake with coffee, this way, appropriating of a repertoire that
is tipical of Internet users.
Keywords: images environments; iconomania; iconofagia; Facebook; Bradesco bank.
Introdução
O crescente povoamento das imagens nos espaços humanos é um
processo que ocorre desde o Renascimento, no entanto, com maior intensidade no
1 Trabalho apresentado no GT 2- Códigos da Publicidade, do Encontro Nacional de Pesquisa em
Comunicação e Imagem - ENCOI 2 Jornalista, estudante regular do Mestrado em Comunicação da Universidade Estadual de Londrina
(UEL). Contato: [email protected]
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século XX. Com o surgimento da internet e a popularização das redes sociais, o uso
excessivo das imagens se tornou ainda maior. Nesses ambientes de integração, as
imagens têm assumido papel primordial e de destaque. E mais do que isso, verifica-se
uma clara hegemonia das composições imagéticas em detrimento da silenciosa e
vagarosa escrita. Esse avanço célere dos ambientes de imagens ficou conhecido como
iconomania. Baitello Junior (2010, p. 84) salienta que “vivemos hoje em um mundo não
apenas de franco domínio da imagem, como de escalada aberta das imagens com uma
visível perda progressiva da escrita em favor de ícones”. A produção de imagens se
deslocou do âmbito artístico para o midiático, estando presente em meios como cinema,
jornais, revista, televisão, além da internet que, em seu interior, também contém outros
ambientes como you tube, blogs e fotoblogs. Nessas circunstâncias, Baitello Junior
(2010) diz que a produção imagética pode ser designada como oceânica, não sendo
possível quantificá-la, nem mesmo por estimativa.
É, portanto, oportuno ressaltar a existência dos ambientes de imagens.
Para Baitello Junior (2010, p. 83), ambiente é tudo o que rodeia os seres vivos e as
coisas, e “cada coisa ou pessoa gera em torno de si um ambiente saturado de
possibilidades de comunicação”. Nesses cenários, existe uma integração constante, pois
os ambientes configuram as pessoas e são por elas configurados. É o que se pode
verificar no Facebook, uma das redes sociais mais populares, que, até o primeiro
semestre de 2014, já tinha alcançado 1,23 bilhão de usuários em todo o mundo. Nesse
espaço cibernético, as empresas e marcas podem interagir com os seus consumidores
através das chamadas Fanpages. Por esse motivo, este trabalho tem o objetivo de
realizar um estudo a respeito das composições imagéticas presentes na Fanpage do
banco Bradesco. Nesse ambiente de iconomania, identifica-se os momentos nos quais a
agência bancária adapta o seu conteúdo a esse novo perfil de consumidor: o internauta.
Dessa maneira, objetiva-se atrair sua atenção para que o mesmo desenvolva as
ferramentas básicas desta rede social que é “curtir”, “comentar” e “compartilhar” tais
publicações.
É nesta circunstância de sobrecarga visual que surge o termo iconofagia
em seus três vetores. São imagens devorando imagens, imagens devorando corpos e
corpos devorando imagens. Sendo assim, no primeiro instante, o que há são repetições,
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imagens que procedem de outras imagens, reproduzem conteúdos, são ecos. É o que se
pode verificar na Fanpage do banco Bradesco, quando, por exemplo, ocorre a postagem
de infografias que simulam selfies, além de fotografias registrando o momento da
refeição. Esse tipo de publicação não é característico de uma página institucional. O que
há são apropriações de conteúdos imagéticos advindos do próprio internauta, a fim de
que o mesmo, ao se identificar com tais posts, desenvolva ações de interatividade. É
importante, ainda, discutir as ocasiões nas quais imagens devoram corpos e corpos
devoram imagens. Tais fatos também surgem em decorrência do excesso de imagens, já
que o indivíduo, diante de tantas composições visuais nesse ambiente online, não
consegue apreciá-las, mas sim, devorá-las e ser por elas devorado.
Iconomania e ambientes de imagens
Flusser (2002, p. 7) define imagens como “superfícies que pretendem
representar algo”. O mundo não é acessível imediatamente e, por esse motivo, as
imagens têm o objetivo de mostrar o mundo. Já Baitello Júnior (2005) discorre sobre a
origem da imagem. Conforme ele, a primeira produção de imagem esteve relacionada a
uma tentativa de superar a morte. Para se afastar e se esquecer da morte, o homem
produziu a “imago”, uma máscara de cera colocada no rosto do defunto. Era o retrato de
um morto. Sendo assim, inicialmente, a imagem esteve presente nas cavernas, em
manifestações ritualísticas e de culto. Posteriormente, passou a ocupar galerias e
museus, por exemplo. Houve, no entanto, uma mudança nos processos da produção
imagética, fazendo surgir outros ambientes de imagens. Benjamin (1980 apud
BAITELLO JUNIOR, 2005) já mencionava essas transformações, explicando que
houve a passagem de uma sociedade que produzia suas imagens de maneira manual e
artesanal para uma sociedade que inventou máquinas reprodutoras de imagens.
Surgem então as imagens técnicas que, conforme Flusser (2002), são
produzidas por aparelhos. Assim, a imagem se deslocou do âmbito artístico para o
midiático. Baitello Júnior (2005, p. 13) salienta que as imagens passaram a ocupar todos
os espaços e há uma “multiplicação exacerbada de imagens cada vez mais
onipresentes”. Há uma iconomania nos ambientes de imagens. O mesmo autor chama
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isso de descontrole e enfatiza que houve um desdobramento da reprodutibilidade
imagética. Com isso, a carga excessiva de imagens passou a integrar o cotidiano,
criando ambientes de imagens. Tal fato leva ao que Dietmar Kamper (1997) chamou de
“Os padecimentos dos olhos”, uma doença que ataca o homem na atualidade. O autor
levanta questionamentos: será que o homem consegue enxergar alguma coisa ou será
que apenas imagina estar vendo? Ele assegura que os olhos não conseguem mais
acompanhar toda a produção imagética, seja pela abundância, seja pela maneira
acelerada em que ocorrem a aparição e desaparição das coisas.
A reprodutibilidade imagética em enormes quantidades se tornou ainda
mais exacerbada com o advento de smartphones, tablets, e demais eletrônicos com
câmeras digitais. A popularização desses aparelhos, e a facilidade de conexão dos
mesmos com a internet, fez surgir, no ambiente online, espaços virtuais sobrecarregados
de elementos visuais. Flusser (2008, p. 55) discorre sobre a existência de uma
“sociedade informática”, que ordena as pessoas em torno de imagens. É uma sociedade
que está “programada a vivenciar, a conhecer, a valorizar, e a agir apertando teclas”. Os
indivíduos têm, em seu dia-a-dia, presença marcante das novas tecnologias, fato que,
consequentemente, acarreta no surgimento de mais imagens. Isso tudo promove
ambientes de integração, pois “todo indivíduo estará ligado a todos os demais
indivíduos do mundo inteiro através da imagem técnica que o está programando”
(FLUSSER, 2008, p. 56).
Atentando-se novamente para a produção de imagens nesses novos
aparelhos tecnológicos, verifica-se que o indivíduo, conectado às redes sociais, posta
constantemente fotografias pessoais que, normalmente, estão relacionadas ao seu
cotidiano. Houve uma popularização da imagem, tanto da sua produção, quanto da sua
veiculação. As mídias tradicionais abrem espaço para outros meios que permitem à
grande massa expor o seu próprio conteúdo. Com isso, o que se tem são ambientes cada
vez mais iconomaníacos. Convém, portanto, ressaltar o objeto de estudo deste trabalho,
o Facebook. Nesta rede social, tanto há a opção de ingresso com a criação de um perfil,
para pessoas físicas, como é possível a elaboração de páginas para empresas, marcas,
celebridades e organizações em geral. São as chamadas Fanpages ou Páginas de Fãs.
Estas páginas, além de transmitirem os valores e informações sobre os negócios que
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lhes deram origem, possuem um objetivo primordial e principal: a interação com o
internauta.
Até o dia 19 de outubro de 2014, a Fanpage do banco Bradesco, página
escolhida para análise deste estudo, possuía 5.072.182 usuários conectados. Esse é um
ambiente de franco predomínio das imagens, pois a grande maioria dos posts é
composta por elementos visuais. São postadas, principalmente, fotografias e infografias.
Além disso, a página exibe vídeos e também abre espaço para imagens feitas pelos
próprios internautas. Os elementos visuais sempre aparecem associados a uma legenda.
A página também exibe posts que contêm apenas textos, porém, numa quantidade bem
reduzida. Um aspecto marcante desta Fanpage é que há um predomínio de imagens com
a cor vermelha, que integra o logotipo do banco, além de um tom claro do azul, cor que
vem sendo frequentemente empregada pela agência bancária, principalmente, na
divulgação que ocorre no ambiente online. Os conteúdos dessas postagens não apenas
se relacionam a transações bancárias, mas também, enfatizam fatos do cotidiano do
internauta, além de outros assuntos que estejam em evidência no momento. Com isso, a
intenção é que o usuário, atraído pelas publicações, interaja com as mesmas, “curtindo”,
“comentando” e “compartilhando” tais mensagens.
Atentando-se para essas descrições, constata-se, na Fanpage do
Bradesco, entre tantas outras páginas institucionais, um ambiente de imagens. Baitello
Junior (2010, p. 82) explica que “ambiente” é uma palavra proveniente do latim e
“significa andar ao redor, cercar, rodear”. Observa-se que, nesta página, as imagens,
dada a quantidade excessiva, cercam e rodeiam o internauta, disputando a sua atenção.
O autor ainda enfatiza que “estar em um ambiente significa estar integrado a ele,
configurando-o e sendo configurado por ele” (BAITELLO JUNIOR, 2010, p. 82). É o
que se pode notar quando há imagens cuja composição tem a intencionalidade de
alcançar a interatividade do internauta. Dessa maneira, a página é configurada pelo
usuário e o usuário, configurado pela página. Por esse motivo, Baitello Junior (2010, p.
83) complementa, enfatizando que um ambiente comunicacional “não é apenas o pano
de fundo para uma troca de informações, mas uma atmosfera gerada pela
disponibilidade dos seres (pessoas ou coisas), por sua intencionalidade de estabelecer
vínculos”.
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Com a finalidade de ilustrar os conceitos mencionados, foram
selecionadas, para este momento da pesquisa, duas imagens da Fanpage consultada. A
figura 1 foi feita por uma internauta e publicada pelo banco Bradesco no dia 25 de abril
de 2014. Já a figura 2 foi postada por um outro usuário da página, no dia 28 de abril,
nos comentários, em resposta ao primeiro post. Associada à figura 1, o banco expôs a
seguinte legenda: “Chegar do trabalho cansado e se jogar na rede é #tudodeBRA.
Mande nos comentários a foto do seu momento de descanso também”. A expressão
#tudodeBRA, que aparece com hashtag, é um trocadilho com a frase “tudo de bom”, e é
frequentemente utilizada na página.
Atentando-se para a publicação, verifica-se que há uma imagem,
acompanhada por um texto, que tem a intenção de gerar outras imagens. Ou seja, a
agência bancária incentivou o internauta para que o mesmo também enviasse fotografias
que representassem o seu momento de descanso. Em decorrência disso, um usuário da
página postou a Figura 2. Não apenas esta, mas até o dia 17 de junho de 2014, outras
127 imagens haviam sido publicadas pelos internautas nos comentários. Tudo isso em
decorrência de uma única postagem feita pelo banco. Os elementos visuais respondiam
à proposta inicial, que era mostrar o registro de um momento de descanso. Além disso,
até a data citada, esta publicação do Bradesco tinha recebido 5.314 curtidas, sendo
compartilhada por 85 vezes. Torna-se, portanto, evidente, que este é um ambiente de
integração e iconomania, que configura o internauta e é por ele configurado.
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Vetores da iconofagia na Fanpage do banco Bradesco
Nesse cenário de sobrecarga visual, surgem tentativas de se compreender
qual é o vínculo existente entre a cultura das imagens e a cultura dos corpos. Baitello
Junior (2005, p. 91) constata que as imagens conquistaram “no mundo contemporâneo o
grau de igualdade em relação aos homens: ocupam o mesmo espaço, consomem o
mesmo tempo”. Para ele, o homem passou a servir de “comida” ou alimento para a
cultura das imagens. Tal consumo de elementos visuais é tão exacerbado que, ora as
imagens devoram, ora as imagens são devoradas. Isso é o que ficou conhecido como
iconofagia. No processo em que imagens devoram imagens, Baitello Junior (2005, p.
53), menciona sobre uma gula das próprias imagens. Conforme ele, “ao invés de
remeter ao mundo e às coisas, elas passam a bloquear seu acesso, remetendo apenas ao
repertório ou repositório das próprias imagens”. As composições imagéticas não
possuem referência, nem significados próprios, mas sim, constituem-se em meras
repetições de outras imagens. Ele explica que as imagens não passam de recordações,
reproduções dos mesmos repertórios já apresentados em outros elementos visuais.
[...] é notável a utilização de imagens precedentes como referência e como
suporte de memória. Assim, a representação de um objeto não é apenas a
representação de algo existente no mundo (concreto, das coisas, ou não
concreto, das não-coisas) mas também uma re-apresentação das maneiras
pelas quais este algo foi já representado. Em outras palavras, em toda
imagem existe uma referência às imagens que a precederam. Ou seja, toda
imagem se apropria das imagens precedentes e bebe nelas ao menos parte de
sua força (BAITELLO JUNIOR, 2005, p. 95).
No ambiente online, especificamente, nas redes sociais, essa iconofagia,
na qual imagens devoram imagens, é muito evidente. Isso porque, conforme já
mencionado neste estudo, atualmente, houve uma popularização de aparelhos
tecnológicos com câmeras digitais. Conectados à internet, os internautas publicam fotos
muito semelhantes, comumente relacionadas à gastronomia, cotidiano, também a
momentos de lazer, de trabalho, entre tantas outras situações idênticas. O internauta
passa, então, a viver em função das imagens. Há uma perda do real, pois ele não
contempla, nem vivencia inteiramente as situações nas quais está inserido, mas está
frequentemente reproduzindo cenas com o seu smartphone, tablet ou webcam e, ao
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lançá-las nas redes, aguarda com expectativa a quantidade de likes que tal postagem
pode alcançar. Nesse cenário, é importante ressaltar que Romano (1993 apud
BAITELLO JUNIOR, 2005) afirma existir um predomínio da mídia terciária, em
detrimento da primária. Ou seja, o contato pessoal perde espaço para as relações
estabelecidas por meio dos aparelhos eletrônicos, que, por sua vez, acabam criando mais
distância entre os indivíduos.
Por outro enfoque, ao mesmo tempo em que há um distanciamento nas
relações interpessoais, há uma aproximação de conteúdo no âmbito virtual. Conforme
exposto outrora, há um anseio comum e predominante no âmbito online,
especificamente, nas redes sociais. As pessoas parecem estar em sintonia quando
produzem e reproduzem imagens em série, semelhantes, com as mesas posições diante
das câmeras, com cenários muito parecidos. As “selfies” são a grande tendência do
momento. Trata-se de autorretratos feitos em frente ao espelho, ou em um encontro com
amigos, na hora da refeição, entre tantas outras ocasiões. Em suma, o que se tem são
imagens citando outras imagens, reproduzindo composições antecedentes. Flusser
(2008, p. 56) antecipa que a sociedade espalhada não se constituirá num amontoado de
partículas individuais. O autor diz que haverá um vínculo entre as pessoas, pois, para
ele, “todo indivíduo estará ligado a todos os demais indivíduos do mundo inteiro através
da imagem técnica que o está programando, já que tal imagem se dirige a todos os
indivíduos indistintamente e da mesma forma”.
É essa tendência que pode ser observada na Fanpage do banco Bradesco.
Há uma tentativa de se assemelhar ao conteúdo produzido pelo internauta. Flusser
(2008) destaca que as imagens são “fiéis”, pois revelam como o ser humano
efetivamente se comporta. Por isso essa agência bancária busca descobrir, nas
composições imagéticas dos internautas, a tendência desse público consumidor.
Diferentemente das mídias tradicionais, que não permitem proximidade com o público-
alvo, nas redes sociais, o intuito principal das empresas é desenvolver um
relacionamento com os seus clientes, dada a interatividade que esse meio proporciona.
Sendo assim, as publicações não se referem apenas à propaganda dos seus produtos,
mas também revelam tentativas de aproximação com o internauta, daí a semelhança
com os conteúdos visuais que ele produz.
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Para identificar esses conceitos de iconofagia, foram extraídas outras
duas imagens da Fanpage mencionada. A figura 3 foi publicada no dia 7 de abril de
2014. Trata-se de uma fotografia produzida por um internauta e que, posteriormente, foi
postada oficialmente pela página, em nome do banco. Já a figura 4 é uma infografia
produzida pela equipe do Bradesco que foi divulgada no dia 17 de março de 2014.
A figura 3 apresenta a legenda: “Café na xícara ou no copo americano?
Bolo de fubá com café é #tudodeBRA!”. A imagem retrata um fato extraído do
cotidiano de um usuário da página, expondo itens muito comuns na mesa do brasileiro:
café e bolo de fubá. Elementos como a toalha, um copo americano e a faca posta
próxima ao bolo geram um aspecto de simplicidade na ocasião. Parte do corpo de um
homem está posicionado ao fundo, dando a entender que ele e, no mínimo, mais uma
pessoa (quem fez a fotografia) se reuniram para um lanche. Inclusive, o fato de ainda
haver café nos recipientes e, ao que parece, terem sido cortados poucos pedaços de bolo,
transmite a impressão de que os indivíduos interromperam a refeição para registrar
aquele momento e, em seguida, lançar no ambiente online. Abaixo da legenda, é
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atribuído o crédito da foto ao internauta “@mottafernando”. Em pesquisa realizada para
este trabalho, apurou-se que, inicialmente, o autor da imagem postou essa fotografia em
outra rede social chamada Instagram e, posteriormente, o Bradesco a veiculou
oficialmente em sua página. Na Fanpage, até o dia 18 de junho de 2014, a publicação
havia recebido 13.625 curtidas, com 593 compartilhamentos. Houve ainda 470
comentários, entre os quais, também há outros assuntos relacionados ao banco. No
entanto, a grande maioria é de pessoas que se manifestaram em resposta à pergunta feita
no post pelo banco.
A figura 4, por sua vez, vem acompanhada pelo texto: “Pose pra foto e
partiu pagar conta! Com o leitor de código de barras do app Bradesco pagar as contas é
rapidinho. #selfie”. Assim como a própria legenda diz, esta infografia simula uma selfie.
Uma jovem tira retrato de si mesma com um boleto bancário na mão. O ambiente parece
ser o quarto da personagem, com a noção de que ela está posicionada em frente a um
espelho. A moça usa um smartphone para fazer a “fotografia”. Ao fundo, há um
notebook sobre uma escrivaninha. Esses componentes geram uma noção de
modernidade e transmitem a impressão de que se trata de uma pessoa que faz uso das
novas tecnologias. Essa imagem, associada ao texto, mostra que alguém ocupado e com
excesso de atividades não precisa ficar em uma fila de banco para pagar contas. Pelo
contrário, é possível fazer isso sem sair de casa, usando o aplicativo que o banco
Bradesco disponibiliza para ser utilizado em celulares. Até o dia 18 de junho de 2014, a
referida publicação havia sido curtida 5.264 vezes, com 366 compartilhamentos. Houve
também 232 comentários, que tanto se relacionavam à postagem, como também a
críticas e dúvidas dos internautas com relação às operações bancárias.
Considerando estas observações sobre as imagens selecionadas, pode-se
constatar os conceitos de iconofagia outrora citados. Ambas as imagens repetem
conteúdos imagéticos produzidos pelo internauta. Não é característica de uma Fanpage
de agência bancária produzir selfies e fotografias de comida. Isso, nas redes sociais, é
próprio de perfis de pessoas físicas, não de páginas institucionais. Sendo assim, imagens
devoram imagens à medida em que fazem referência a outros conteúdos imagéticos,
neste caso, as composições do consumidor. Há uma tentativa de se aproximar do
público-alvo, desenvolver com ele um relacionamento por meio do ambiente online.
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Outro objetivo notável é que há, nesses posts, a intencionalidade de despertar a atenção
do internauta para que ele interaja com tais publicações.
Outros vetores da iconofagia identificados surgem em decorrência do
excesso de imagens. Neste sentido, o que se vê são imagens devorando corpos e corpos
devorando imagens. Baitello Junior (2005, p. 49) menciona sobre uma inversão. As
imagens buscam, de forma obsessiva e abusiva, pelos olhos humanos. Segundo ele, em
eras passadas, “raras imagens eram avidamente buscadas pelos nossos olhos, em livros,
em paredes, em quadros, em afrescos, em cavernas. Com a reprodutibilidade ocorre
portanto a primeira inversão: as imagens é que nos procuram”. Há uma voracidade e
gula das imagens. O seu alimento é o olhar humano, um gesto do corpo. Para ele,
quanto mais o indivíduo vê, menos ele vive, e quanto maior for a visibilidade, menor
será a capacidade de olhar. Segundo o pesquisador, “alimentar-se de imagens significa
alimentar imagens, conferindo-lhes substância, emprestando-lhes os corpos. Significa
estar dentro delas e transformar-se em personagem” (BAITELLO JUNIOR, 2005, p.
97). No caso da Fanpage do Bradesco, e tantas outras páginas, mais do que se tornar
alimento para esse excesso de imagens, o internauta desenvolve reações condicionadas,
já que é constantemente estimulado a acionar as ferramentas básicas desse ambiente
online.
Por outro enfoque da iconofagia, verifica-se corpos devorando imagens.
O fato também surge em decorrência da sobrecarga visual, pois o ser humano não
consegue mais desenvolver a capacidade contemplativa diante das composições
imagéticas. Flusser (2008, p. 56) diz que “as imagens alimentam os homens para serem
por eles realimentadas e para engordarem sempre mais”. Trata-se de um processo
cíclico, no qual, um alimenta o outro. Nesse grau de iconofagia, o indivíduo não
consome mais as coisas, mas sim, os seus atributos imagéticos, causando uma
superficialidade. Baitello Junior (2005, p. 53) diz que as imagens passam a ser
consumidas em “toda as suas formas: marcas, modas grifes, tendências, atributos,
adjetivos, figuras, ídolos, símbolos, ícones, logomarcas”. A proliferação compulsiva de
imagens no ambiente virtual estudado gera, no internauta, a compulsão por apropriação.
São corpos tridimensionais que devoram “não-coisas”, em substituição de outras
apropriações sensoriais. É importante notar que a tendência atual é de pessoas que ficam
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constantemente conectadas à internet, acessando, várias vezes ao dia, redes sociais
como o Facebook. Nesse ambiente de iconofagia, o que resta é consumir, em um
número cada vez maior, as composições imagéticas.
Considerações finais
A sociedade contemporânea passa por constantes transformações. Com o
surgimento de aparelhos reprodutores de imagens, houve uma massificação da produção
imagética, fazendo-a se deslocar do âmbito artístico para o midiático. O indivíduo tem à
sua disposição, smartphones, tablets, notebooks com suas webcams e tantos outros
aparelhos eletrônicos capazes de produzir fotografias. Não obstante, o surgimento da
internet gerou indivíduos cada vez mais conectados e com um anseio em comum:
registrar momentos e lançá-los nas chamadas redes sociais. O resultado foi o
surgimento, no meio virtual, de ambientes iconomaníacos, nos quais há um franco
predomínio de imagens. Um exemplo disso é a rede social que mais cresce no mundo, o
Facebook. Nesse ambiente, as imagens assumem papel predominante, pois se
apresentam em uma grande quantidade. Há, portanto, a presença de ambientes de
imagens. Ou seja, cenários nos quais imagens cercam e disputam constantemente pela
atenção do internauta. Resta, portanto, às empresas, marcas e organizações em geral, a
missão de se integrar a esses novos hábitos do consumidor. Por este motivo, essas
instituições ingressam na rede por meio das chamadas Fanpages ou Páginas de Fãs.
Diante dessas circunstâncias, este estudo observou as publicações da
Fanpage do banco Bradesco. Neste espaço, a tendência encontrada é a mesma, um
ambiente de iconomania. Há uma notável hegemonia visual com relação à escrita. Em
um primeiro instante, foram selecionadas duas imagens da referida página. A primeira
delas, veiculada pela agência bancária, tinha a intenção de gerar outras imagens. O
banco estimulava as pessoas a postarem, no campo dos comentários, fotografias que
retratassem um momento de descanso. A segunda figura foi enviada por um usuário da
página, em resposta à primeira. Com isso, nos comentários de um único post,
internautas publicaram outras 127 imagens. Fica clara, portanto, a iconomania presente
nesse espaço. Além disso, constata-se que esse ambiente de imagens configura os
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indivíduos e é por eles configurado. Isto porque ele leva as pessoas a desenvolverem
determinadas ações de interatividade, publicando outras fotos, curtindo, comentando e
compartilhando as postagens feitas pelo banco. Por outro lado, este ambiente também é
configurado pelo usuário, já que esta instituição, bem como tantas outras, busca se
adequar a este novo perfil de consumidor: o internauta.
Outro fato marcante, apresentado por este estudo, foi a constatação, na
referida página, dos três vetores da iconofagia. Isso porque foram destacadas,
primeiramente, imagens devorando imagens. São composições visuais que repetem
produções de outras imagens. Por isso, este artigo apontou a Figura 3, uma fotografia de
café e bolo de fubá; além da Figura 4, uma infografia com a selfie de uma personagem
segurando um smartphone e um boleto bancário. Essas composições não estão
relacionadas a uma página institucional, mas sim, a um perfil de internauta. Sendo
assim, há uma apropriação de um conteúdo advindo dos usuários da rede, para que os
mesmos se identifiquem com tais publicações e acionem as ferramentas de
interatividade. Em uma outra etapa, o trabalho expôs os outros dois vetores da
iconofagia, o momento em que imagens devoram corpos e corpos devoram imagens. O
fato também é proveniente do excesso imagético. As informações visuais, dada a
sobrecarga, buscam constantemente pelos olhos do internauta, na tentativa de devorá-
los. Por outro enfoque, o próprio indivíduo devora tais mensagens, já que, diante de
tantas opções, não consegue mais apreciá-las, como era feito anteriormente, mas sim,
devorá-las.
Referências
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______. O universo das imagens técnicas: elogio da superficialidade. São Paulo:
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