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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
O GÊNERO CRÔNICA E O TEXTO MIDIÁTICO SOBRE O TEMA FAMÍLIA: UMA
ABORDAGEM DIALÓGICA NA PRÁTICA EDUCATIVA
Autora: Margarete de Souza. ¹
Orientador: Prof. Dr. Bruno B. A. Dallari. ²
RESUMO
O artigo em tela busca possibilitar aos professores da disciplina de Língua Portuguesa do Centro Estadual de Educação Básica Paulo Freire - Ensino Fundamental, Médio e Profissional, do município de Curitiba, um aprofundamento teórico-metodológico para criar estratégias a fim de motivar os alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) à leitura. Apresenta ainda o resultado da implementação pedagógica na escola que articulou momentos teóricos, com reflexão e discussões sobre a prática educativa docente e a proposição de um material didático pedagógico para os discentes da EJA. Esta proposta teve como objetivo principal uma abordagem dialógica entre o universo literário e o texto midiático, com a utilização do ambiente público blog, para que o professor pudesse pensar novas formas de atuação, percebendo que o estudo e a incorporação de outras práticas proporcionam um melhor direcionamento do trabalho pedagógico, principalmente, pode desenvolver no aluno a necessidade pela leitura.
Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos, prática educativa, gênero crônica,
texto midiático.
_______________
¹ Professora de Língua Portuguesa da Rede Estadual de Educação do Estado do Paraná. Especialista em Metodologia da Educação Básica e Educação a distância.
² Professor de Linguística na Universidade Federal do Paraná. Especialização em Artificial Inteligence Natural Language Processing, Mestrado e Doutorado em Linguística.
1. Introdução
Na disciplina de Língua Portuguesa é necessário buscar estratégias que
contribuam para novas práticas educativas, com o intuito de motivar o aluno à
leitura, para criar leitores e produtores do conhecimento, tendo em vista a falta de
interesse dos discentes em sala de aula, sendo esses aspectos que nos levaram a
desenvolver a pesquisa em questão.
Na Educação de Jovens e Adultos (EJA) é preciso, considerando os diversos
perfis do alunado, uma abordagem de ensino-aprendizagem diferenciada,
trabalhando os conteúdos estruturantes da Educação Básica de forma
contextualizada e articulada à realidade do aluno.
Nessa perspectiva, o projeto: “O gênero crônica e o texto midiático sobre o
tema família: uma abordagem dialógica na prática educativa” contemplou, nos
momentos teóricos do estudo, pontos pertinentes à prática educativa, levando em
conta a realidade do aluno da EJA, que já possui um conhecimento empírico. Para
tanto, enfocamos questões de reflexão com o professor da EJA, pois na formação
constante dos docentes, o momento principal é o da reflexão crítica sobre a prática
(Freire, 2013, p. 40).
Buscamos repensar a questão do processo de letramento e das práticas de
letramento na EJA, com intuito de motivar os alunos à leitura e à produção textual,
sendo que o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja, ensinar a ler e a escrever no
contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, de maneira que o individuo se
tornasse, ao mesmo tempo, alfabetizado e letrado (Soares, 2012, p.47)
Propomos também um material para o aluno da EJA, que articulou o gênero
crônica e o texto midiático, utilizando o ambiente público blog, com recorte na
temática família, visando desenvolver no alunado a necessidade pela leitura, pois o
aluno, tendo trabalhado sistematicamente como leitor e produtor, na revisão crítica
do universo midiático em que faz parte, ganha desenvoltura para se assumir como
sujeito nesse ambiente (Dallari, 2010, p.05).
Nesse sentido, o estudo se pautou em possibilitar ao professor da EJA, além
de refletir e discutir sobre sua prática educativa, buscar estratégias para auxiliá-lo
em relação ao ensino-aprendizagem, pois o aluno da EJA retornou aos bancos
escolares fora da idade-série, por razões de trabalho, de valorização pessoal,
continuação do processo educacional, dentre outros, e o professor enfrenta a
ausência de interesse dos alunos em sala de aula.
Dessa forma, visamos contribuir por meio de encaminhamentos teóricos e
metodológicos no estudo em pauta, para que o professor pudesse criar estratégias
para motivar os alunos à leitura, repensando novas práticas educativas para
melhoria da qualidade de ensino.
2. O aluno da EJA e o processo de letramento
A Educação de Jovens e Adultos prevista no Art. n° 37 da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional, Lei n° 9394/96 (BRASIL, 1996), passa a ser
considerada uma modalidade nas etapas do Ensino Fundamental e Médio e com
especificidade própria, destinada aos jovens e adultos que não tiveram acesso ou
continuidade de estudos na idade própria.
As Diretrizes Curriculares Estaduais da EJA comungam da ideia que os
conteúdos estruturantes da EJA são os mesmos do ensino regular, nos níveis
Fundamental e Médio, todavia, com encaminhamento metodológico diferenciado,
tendo em vista as especificidades dos alunos. Isso acontece pelo fato de que o
público adulto possui uma bagagem cultural e de conhecimentos adquiridos em
outras instâncias sociais, considerando que a escola não é o único espaço de
produção e socialização de saberes, sendo possível tratar do mesmo conteúdo de
formas e em tempos diferenciados, tendo em vista as experiências e trajetórias de
vida dos educandos da EJA. (Paraná, 2006, p. 26).
Nesse sentido, ao pensar em novas práticas pedagógicas, foi necessário
considerar as especificidades do jovem e adulto, trabalhando os conteúdos
estruturantes da modalidade de maneira que motivasse o alunado à leitura e
produção textual. Foi propícia, então, a articulação entre o gênero crônica e o texto
midiático – ambiente público blog, numa perspectiva dialógica, abordando a temática
família, contribuindo com a prática da leitura, escrita e oralidade.
Para Marcuschi (2001, p.43) todo o uso da língua se realiza em condições
particulares no espaço e no tempo, sendo que, estes usos são as práticas sociais
desenvolvidas e testadas, essas práticas sedimentam-se nos gêneros discursivos
tanto pela oralidade como pela escrita, salienta que, muitas vezes um gênero é uma
prática mais abrangente de forma a envolver letramento e oralidade.
Sobre a questão da oralidade convém reportar também a obra: Da fala para a
Escrita, do mesmo autor, na qual esclarece a diferença entre a fala e a escrita,
expõe que estas diferenças se fazem presentes no ato da comunicação, que cada
um apresenta, por meio de características próprias de cada modalidade, afirmando
que a oralidade e a escrita fazem parte da prática social. (MARCUSCHI, 2001, p.16).
O autor relata que até na década de 80, a oralidade e a escrita eram vistas
como opostas, atualmente, as duas são vistas como complementares. “Hoje, como
se verá adiante, predomina a posição de que se pode conceber oralidade e
letramento como atividades interativas e complementares no contexto das práticas
sociais e culturais”. (MARCUSCHI, 2001, p.16).
A escrita não pode ser considerada representação da fala, pois não apresenta
tudo o que a fala pode proporcionar, sendo práticas e usos da língua com
características próprias. Nota-se que a fala age como manifestação cultural e a
escrita é realizada em diversas situações, como: no trabalho, na escola, na família,
no cotidiano, tem influência em todos os momentos na sociedade, fazendo uso como
prática social nos mais variados e diversos contextos. (MARCUSCHI, 2001, p.17-
19).
Cabe ressaltar que embora a escrita não seja inerente ao ser humano, como
é o caso da oralidade, ela pode ser entendida como um bem social, sendo,
geralmente, aprendida mais tarde, nos meios escolares.
Convém mencionar as Diretrizes Curriculares de Língua Portuguesa que
expõe a leitura como um ato dialógico, interlocutivo, que envolve demandas sociais,
histórias, políticas, econômicas, pedagógicas e ideológicas de determinado
momento, sendo que ao ler, o indivíduo busca as suas experiências, os seus
conhecimentos prévios, a sua formação familiar, religiosa, cultural, enfim, várias
vozes que o constituem. (Paraná, 2008, p. 280).
É importante frisar que os alunos da EJA possuem conhecimento empírico de
acordo com o contexto em que estão inseridos numa cultura letrada, antes de
ingressar na educação formal, fazendo uso de componentes pessoais, de modo a
ocorrer a construção do letramento social.
Soares (2012, p. 16 - 18) expõe que novas palavras são criadas ou velhas
palavras aparecem com um novo sentido, quando surgem novos fatos, novas ideias,
nova maneira de compreender a escrita no mundo social, se a palavra letramento
não é muito antiga, outras do mesmo campo semântico nos foram familiares como
analfabetismo, analfabeto, alfabetizar, alfabetização, alfabetizado e mesmo letrado e
iletrado. O termo letramento tem origem no vocábulo inglês literacy que significa o
resultado da ação de ensinar ou de aprender a ler ou escrever, ou seja, o estado ou
condição que adquiri um grupo social ou indivíduo ao ter-se apropriado da escrita.
Nesse contexto, antes, uma pessoa letrada era considerada erudita,
contemporaneamente, letramento significa a capacidade de usar a leitura e a escrita
para uma prática social. Na EJA, o aluno torna-se sujeito na construção do
conhecimento, pois já possui saberes adquiridos para além da educação escolar,
nas experiências da própria vida, sendo que a oralidade já faz parte do seu meio
social.
Entendendo que letramento é o que as pessoas fazem com as habilidades de
leitura e de escrita em certo contexto específico e como essas habilidades se
relacionam com valores, sendo um conjunto de práticas sociais, é necessário refletir
sobre a prática pedagógica num contexto das práticas de letramento.
Para Marcuschi (2001, p. 36 -38) as práticas de letramento consistem nos
usos da leitura e da escrita em contextos contínuos, reais, etnograficamente
desenvolvidos e não isolados, ou seja, as práticas de letramento são modelos que
construímos para os usos culturais em que produzimos significados na base da
leitura e da escrita. A carta pessoal é um evento de letramento, mas a sua leitura e
comentário entre os amigos, familiares é uma prática de letramento que envolve
mais do que apenas a escrita.
Assim, convém observar o poder da linguagem, pois ela não se restringe
apenas a veicular informações, sua função é a de comunicar ao ouvinte a posição
que o falante ocupa ou acha que ocupa numa sociedade. Pessoas falam para serem
ouvidas, respeitadas e também para exercer uma influência sobre as outras. O
poder da palavra é o poder de mobilizar por meio dos discursos políticos, sermão de
igreja, aula. (GNERRE, 2009, p.05).
3. O gênero crônica, o texto midiático e o espaço público
Para se aprimorar os métodos a serem utilizados em sala de aula,
considerando a importância da linguagem, da leitura e da escrita, foi importante
discutir e refletir sobre as práticas pedagógicas aplicadas, que contemplam as
especificidades do aluno da EJA e se tais práticas são motivadoras. Para tanto, foi
relevante analisar as estruturas dos gêneros discursivos no contexto escolar.
Os gêneros discursivos são amplos, pois são inesgotáveis as possibilidades
da atividade humana, sendo que esses três elementos - conteúdo temático – estilo e
construção composicional estão interligados a todo o enunciado, orais e escritos,
considerando que cada enunciado particular é individual, porém, cada campo de uso
da língua elabora tipos relativamente estáveis na composição dos enunciados,
assim são conceituados os gêneros do discurso (BAKHTIN, 2003, p. 262).
No material didático para o aluno da EJA, trabalhamos o gênero crônica por
reproduz a realidade por meio do registro de fatos do cotidiano; é um gênero que
atrai o leitor por falar de assuntos sérios com muita sutileza. Utilizamos também o
ambiente público blog para leitura e análise de fragmentos de textos sobre a
temática família, na busca de motivar os jovens e adultos à leitura e à produção
textual, associando o gênero crônica por meio do dialogismo com o uso do blog.
O diálogo não se constitui senão uma das formas, é verdade que das mais
importantes, da interação verbal. Entretanto, pode-se compreender a palavra
“diálogo” em um sentido mais amplo, não apenas como comunicação em voz alta,
de pessoas colocadas face a face, mas toda comunicação verbal, de qualquer tipo
que seja (BAKHTIN, 2009, p.127).
Salientamos que o gênero crônica escolhido para o desenvolvimento do
projeto foi bem aceito pelos professores pelas características próprias do gênero,
cabendo mencionar Jorge de Sá:
Na crônica, embora não haja a densidade do conto, existe a liberdade do cronista. Ele pode transmitir a aparência de superficialidade para desenvolver o seu tema, o que também acontece como se fosse “por acaso”. No entanto o escritor sabe que esse “acaso” não funciona na construção de um texto literário (e a crônica também é literatura), pois o artista que deseje cumprir sua função primordial de antena do seu povo, captando tudo aquilo que nós outros não estamos aparelhados para depreender, terá que explorar as potencialidades da língua, buscando uma construção frasal que provoque significações várias (mas não gratuitas ou ocasionais), descortinando para o público uma paisagem até então obscurecida ou ignorada por completo. (Sá, 2005, p. 9-10)
Nessa perspectiva, o gênero crônica aliado à temática família, abordada como
pano de fundo para atrair o aluno da EJA à leitura, bem como a articulação com o
ambiente público blog, cujos textos midiáticos foram utilizados em sala de aula ou no
Laboratório de Informática, contribuíram para novas ideias na prática educativa.
Salientamos que o espaço público não é definido como virtualidade ou de
forma negativa e nem um espaço em branco, aberto, no qual qualquer pessoa
poderia expor qualquer coisa, mas positivamente, como algo que é partilhado no
curso das conversações e das interações linguísticas de toda ordem,
particularmente as midiáticas (Dallari, 2010, p.11).
Dessa forma, foi oportuno o trabalho com o ambiente público blog, que faz
parte de uma esfera constituída por comunidades semióticas, estas que são
pessoas que se reúnem em torno de um determinado tema, sendo que tal ambiente
público é dialógico, pois veiculam opiniões e manifestações sociais, podendo
adquirir um discurso de valor.
4. Aplicação do projeto no GTR (Grupo de Trabalho em Rede)
O projeto: “O gênero crônica e o texto midiático sobre o tema família: uma
abordagem dialógica na prática educativa” também foi implementado com os
professores de Língua Portuguesa da Rede Estadual de Ensino, de março a maio,
concomitante à implementação na escola, denominado Grupo de Trabalho em Rede
– GTR, que é uma atividade do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE,
caracterizada pela interação virtual entre a docente PDE e os professores da Rede
Pública Estadual. Participaram do projeto 15 (quinze) profissionais da disciplina de
Língua Portuguesa de diferentes instituições de ensino, os quais contribuíram para
os resultados obtidos no estudo dessa temática e na elaboração deste artigo, por
meio das discussões sobre a proposta e a utilização do material didático.
No GTR, os professores expuseram suas opiniões sobre a elaboração da
proposta e sua pertinência para a escola pública, o resultado foi positivo, devido ao
gênero abordado, à temática escolhida e à articulação ao texto midiático para
motivar o aluno da EJA à leitura, preocupação constante de todos os professores
das escolas, com destaque para o que disse uma das professoras:
Vejo o projeto como algo bastante positivo, com uma metodologia muito interessante, pois temos que partir do conhecimento empírico do aluno e a crônica baseada no tema família nos traz isso, por ser algo muito próximo do aluno. Além do mais, o gênero crônica reproduz a realidade de fatos do cotidiano fazendo com que o leitor seja atraído pelo texto.
Convém salientar que os professores refletiram sobre as atividades
direcionadas em relação aos textos e aos vídeos selecionados para discussões
sobre a prática educativa, cabendo observar o seguinte relato:
O que eu destacaria nesta proposta, além dos textos, vídeos e as atividades propostas, é a parte teórica que está voltada para os docentes, realmente é muito interessante para nós porque sempre precisamos nos atualizar com novos teóricos, novos métodos, enfim novas falas que ajudarão a viabilizar nosso trabalho.
Pelo fato do trabalho com o GTR ter sido desenvolvido concomitante à
implementação do projeto na escola, houve uma abordagem mais eficaz da
proposta, pois na medida em que eu ia relatando a implementação na escola, os
docentes do GTR podiam discutir e expor suas opiniões. Falaram dos aspectos
relativos à reflexão para o corpo docente e do material didático-pedagógico.
Expuseram a relevância do estudo para a escola, bem como salientaram que se
mostrava atrativo para os alunos da EJA pelo interesse que eles têm pelo gênero em
pauta e pela temática abordada. Sugeriram também outras crônicas sobre o tema
família de outros cronistas e mesmo de Luís Fernando Veríssimo.
Alguns docentes que fizeram parte do projeto trabalhavam na EJA e outros no
Ensino Regular, todavia merece notar o que expõe uma professora:
Às vezes nos surpreendemos com a prática pedagógica. Esse trabalho, coloquei em prática com três turmas de 8º ano e o interesse foi ótimo. Achei que o material da EJA não chamasse atenção dos adolescentes, principalmente o tema. Os textos curtos e perguntas bem elaboradas despertou o interesse dos estudantes. Houve a participação muito boa na escrita e na oralidade em decorrência da excelente elaboração do material didático. Pretendo dar continuidade com a aplicação do restante do material.
5. A implementação do projeto na escola
Participaram deste estudo 10 (dez) professores da disciplina de Língua
Portuguesa do Ensino Fundamental e Ensino Médio do Centro Estadual de
Educação Básica para Jovens e Adultos Paulo Freire – Ensino Fundamental, Médio
e Profissional, do município de Curitiba – PR.
Do mês de fevereiro ao mês de junho de 2014 ocorreu a implementação da
proposta na escola, foram realizadas 06 (seis) ações, as quais aconteceram em
momentos agendados com os professores de Língua Portuguesa em dias e horários
diferenciados, nos turnos: manhã, tarde e noite, com pequenos grupos e até de
forma individual, repetindo as ações para os docentes da sede e das Ações
Pedagógicas Descentralizadas (APEDs), totalizando 18 (dezoito) encontros.
No primeiro momento, realizei a apresentação do projeto aos professores por
meio de slide, além da investigação da prática pedagógica, com entrevistas
gravadas. Foi abordada a questão da prática educativa com os professores a partir
da leitura do texto: “Ensinar exige reflexão crítica sobre a prática”, da obra
Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire, com a utilização do vídeo: “A escola
serve para quê?”.
Os professores relataram suas dificuldades quanto ao ensino na EJA, uma
vez que atendem diferentes perfis e muitas vezes se sentem desmotivados pelas
condições de trabalho. Entretanto, eles falaram da necessidade de se discutir e
participar de grupos de estudos sobre o assunto, visando à melhoria da prática
educativa na escola.
Relataram também que, a pesar das dificuldades, o trabalho com o aluno da
EJA é muito gratificante, pois é um público diferenciado que exige uma metodologia
que realmente contribua para motivá-lo à leitura. Eles demostraram interesse pelo
projeto, sendo que as discussões foram significativas e contribuíram para uma
reflexão crítica sobre o ensino-aprendizagem, como declara uma docente:
Utilizaria a proposta, pois o tema é pertinente ao aluno da EJA. Todos os textos são adequados. Relevante à inferência que o aluno pode fazer, pois para leitura e interpretação é importante. E a questão família é uma constante na EJA.
Na segunda ação, foi abordado o texto: “O que é letramento e alfabetização”,
da obra “Letramento: um tema em três gêneros”, de Magda Soares. Vários foram os
apontamentos sobre o assunto na EJA, alguns professores que trabalhavam
também na Educação Infantil, da Rede Municipal, contribuíram com as discussões,
fundamentados na autora indicada e em outros autores. A troca de experiência foi
importante para refletir sobre o processo de letramento e práticas de letramento,
enriquecendo o projeto em questão. O recurso utilizado para o debate foi o vídeo:
“Um mundo de Letras”, que aborda questões relativas à alfabetização, letramento e
cidadania.
Nas discussões, os professores expuseram que o público da educação de
jovens e adultos é diferenciado e para atendê-lo é preciso não só técnicas de
alfabetização, mas que o educador entenda as diferenças individuais e permita o
contato do aluno com textos que realmente façam sentido para o seu contexto, ou
seja, textos que se vinculem à prática dos indivíduos em seu contexto social, sendo
o letramento uma prática indispensável no cotidiano do aluno da EJA porque lhes
abrem as possibilidades de agir no mundo por meio da leitura e da escrita.
Os professores relataram ainda que o aluno passa de alfabetizado a letrado
quando entende que os signos linguísticos nunca são neutros de valores e sentidos,
sendo a palavra escrita e falada um espaço de lutas, que repercute ou contradiz os
valores de certos indivíduos ou grupos sociais. Assim, para que o sujeito possa agir
nesta sociedade é preciso que ele conheça não apenas os mecanismos formais da
escrita e leitura, mas também os mecanismos ideológicos.
Na terceira ação, realizei a apresentação, por meio de slide, passo a passo do
material elaborado para os alunos da EJA, com entrega de material de apoio: CDs
sobre o gênero crônica e o último Episódio da Grande Família, veiculado no ano de
2013, além de cópia impressa da produção.
O material pedagógico proposto destinado aos jovens e adultos foi uma
abordagem dialógica entre o universo literário e o ambiente público blog, envolvendo
crônicas do escritor Luíz Fernando Veríssimo e o texto midiático, com recorte na
temática família, ressaltando aspectos contemporâneos da temática por meio do
posicionamento das pessoas no ambiente público blog.
Foram selecionadas as seguintes crônicas de Luís Fernando Veríssimo: Pais,
Pai e Mãe, Dona Leonor e A Bola, com atividades de interpretação e produção
textual, além de questões relativas à análise do texto midiático no ambiente público
blog e na mídia televisiva.
Após a apresentação do material didático, os docentes expuseram a
importância de se articular a mídia tanto televisiva como virtual ao ambiente escolar
a fim de se abordar o conteúdo programático de forma que motive o aluno ao ensino
e aprendizagem, principalmente, levando em conta um trabalho que priorize um
gênero atrativo aliado a uma temática que faz parte do cotidiano do aluno.
Na quarta ação, houve a análise da proposta desenvolvida para o aluno da
EJA, bem como os professores responderam algumas perguntas referentes ao
material, salientaram a intertextualidade entre o texto literário e o texto midiático,
expuseram que utilizariam a proposta com seus alunos, pela pertinência do tema
que é uma constante na EJA, além dos textos estarem adequados à modalidade em
tela.
Na sequência, trabalhamos textos não literários da revista: “A Família
Educadora no Mundo de Comunicação”, 49ª (quadragésima nona), da Escola de
Pais, com a finalidade de ampliar a discussão sobre o tema família.
Os professores fizeram a leitura dos textos complementares da revista para
serem utilizados em sala de aula, sendo que, eles discutiram e expuseram a
necessidade de material de apoio para ampliar o assunto trabalhado, pois na EJA há
carência de materiais para enriquecer as aulas e motivar o aluno à leitura.
É importante mencionar o que disse uma docente que utilizou a revista em
sala de aula: “Na leitura da revista sobre o tema família, houve bastante participação
e discussão por parte dos alunos”.
Cabe demonstrar ainda o que expôs outra professora que aplicou o projeto:
“Utilizei bastante os textos, principalmente, as crônicas e a revista para discussões
sobre a família. As leituras geraram discussões e o desejo dos alunos de
continuarem lendo crônicas”.
As atividades da quinta ação foram realizadas no Laboratório de Informática,
onde os professores fizeram análises dos blogs sugeridos no material do aluno da
EJA sobre o tema família. O assunto permitiu ampliar as discussões para outros
contextos do tema família: adoção, vícios, dentre outros, sendo que os blogs
indicados tratavam das novas famílias. A proposta foi utilizar os blogs já existentes
no espaço público para trabalhar a leitura e a produção textual com os alunos a
partir da análise dos textos midiáticos. Foi proposto aos professores que, em sala de
aula, após análise e leitura dos textos midiáticos, na forma impressa ou no próprio
laboratório, o aluno fosse motivado a responder uma postagem no blog, fazendo sua
produção textual. A atividade realizada com os professores foi muito produtiva e
despertou o interesse para a utilização do ambiente público blog com os discentes,
sendo que o aluno passaria de leitor a autor.
Eles comentaram que tal atividade possibilitou ampliar estratégias de leitura e
produção textual, articulando o ambiente público blog também como: “espaço de
expressão e debate”.
Nas análises dos blogs, os professores observaram a linguagem empregada
com a finalidade de expor os pontos de vista de cada um, ou seja, neles ela se torna
uma prática sócio comunicativa. Em um dos blogs, destacaram a importância do
tema família, uma vez que nele postaram alunos de vários cursos, bem como seu
caráter de suporte educacional, utilizado como prática estimulante de acesso à Web,
em outro, o uso informal da língua, podendo ser usado para comparar os diferentes
usos da língua (mais culta no primeiro e menos culta no segundo), como também
destacando a questão dos outros discursos que perpassam as discussões (discurso
religioso, político), sendo que o tema família suscitou muitas discussões no
ambiente público blog porque é uma questão da qual todos têm conhecimento, ainda
que empírico, evidenciando o que disse uma professora: “[...] ajudou a repensar a
prática e a aproximação, no mesmo contexto, do texto literário com os textos
veiculados na mídia”.
A última ação foi pautada na análise geral da proposta, os professores
responderam algumas questões sobre os limites e as possibilidades do projeto.
Após o trabalho, os professores relataram a relevância da abordagem da pesquisa
para a Educação de Jovens e Adultos. Houve também a exposição dos resultados
da proposta à Equipe Pedagógica do CEEBJA Paulo Freire – Ensino Fundamental,
Médio e Profissional.
Segue o depoimento de uma professora sobre a motivação docente e a
articulação entre o universo literário e o texto midiático, a saber:
1. Sem dúvida que a proposta me motivou a melhorar minha prática em sala de aula. A utilização de diversos materiais de apoio contribuiu para a melhor exploração do tema. Centrar a análise e as leituras dos textos em crônicas que destacavam o aspecto “família”, conhecido dos alunos, também foi importante para motivá-los a participar.
2. A possibilidade de articular o universo das crônicas (literário) ao universo das mídias tanto televisiva quanto digitais amplia as possibilidades de letramento, na medida em que o aluno observa que existem vários tipos de leitura. Acredito que a prática possa ser aplicada a outros projetos, favorecendo a aprendizagem dos alunos.
Desse modo, percebi muito interesse dos professores na participação em
todas as ações desenvolvidas, possibilitando a realização de um trabalho de
reflexão e discussão sobre a prática educativa, ressaltando que a troca de
experiência foi importante para a socialização do grupo e para enriquecer o estudo
em pauta.
6. Considerações finais
Esperamos que o projeto aplicado tenha contribuído com a prática educativa
dos professores do CEEBJA Paulo Freire – Ensino Fundamental, Médio e
Profissional, bem como para levar ideias aos professores do GTR que participaram
da proposta.
A aplicação do projeto, desde o início, foi uma experiência enriquecedora para
esta professora PDE, considerando o estudo da fundamentação teórica e a troca de
saberes com os vinte e cinco professores, da escola e do GTR, que contribuíram
para o efetivo resultado do trabalho que objetivou, além de motivar o aluno à leitura
e produção textual por meio da articulação entre o universo literário e o texto
midiático, motivar também os docentes com um material didático e subsídios
teóricos-metodológicos para desenvolver novas estratégias em sala de aula.
Visamos ainda contribuir com outras pesquisas que articulem o universo
literário e o texto midiático, na busca pela motivação da leitura dos jovens, adultos e
idosos, buscando minimizar a falta de interesse pelo estudo.
Podemos afirmar que a proposta desenvolvida trouxe discussões pertinentes
sobre o processo de ensino-aprendizagem e a questão do letramento e prática de
letramento na EJA, sendo necessário abordar tais questões na prática educativa
docente, na busca de despertar no discente a necessidade pela leitura.
Um aspecto que merece destaque no resultado do estudo tanto dos
professores do CEEBJA Paulo Freire – EFMP como dos docentes do GTR foi a troca
de experiências, pois a grande maioria já havia participado do PDE e contribuiu
muito com as discussões para motivar os alunos ao ensino-aprendizagem, sendo
uma preocupação constante das escolas públicas do Estado do Paraná.
Por fim, neste estudo, com base na reflexão e discussões ocorridas no
desenvolvimento das ações e na fundamentação da referência bibliográfica,
buscamos repensar novos métodos para auxiliar o professor em sala de aula, para
além do convencional, visando contribuir para a melhoria da qualidade de ensino.
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