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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE
I
Aspectos formais e conceituais da leitura: subsídios para a compreensão do texto
Cláudia Pessoa Xavier da Silveira1
Margareth de Souza Freitas Thomopoulos2
Resumo: O presente trabalho tem como objetivo compartilhar alguns processos fundamentais de construção da leitura a fim de contribuir para o desenvolvimento de práticas de leitura significativas, possibilitando aos alunos o aprimoramento de estratégias de abordagem dos vários gêneros textuais, consolidando o processo de leitura. Para tanto, propôs-se um conjunto de atividades, que foram desenvolvidas para oportunizar aos alunos a percepção das várias estratégias demarcadas pelos próprios gêneros, bem como conscientizá-los da necessidade de se definirem objetivos para a leitura. Foi, então, explorada a coerência temática e, posteriormente, a partir de teste de cloze, aspectos conceituais e formais da leitura, contemplando sequências tipológicas descritivas/injuntivas e dissertativas/argumentativas. O público-alvo foi uma turma do 6º ano do Ensino Fundamental. Os dados, analisados com base nas propostas de leitura de autores como Coscarelli (2002), Kato (1999), Kleiman (1995) e Leffa (1996), evidenciaram a defasagem dos alunos na habilidade da leitura, bem como indicaram a necessidade de um trabalho contínuo, que envolva aspectos formais e conceituais dessa habilidade, a fim de instrumentalizar o aluno para que adquira fluência e, a partir daí, possa desfrutar do prazer de ler.
Palavras-chave: Aspectos formais da Leitura, estratégias de leitura, aspectos conceituais da Leitura.
Formal and conceptual aspects of reading: subsidies for the understanding of the
text
Abstract: this work aims to share some fundamental processes of construction of reading in order to contribute to the development of meaningful reading practices, enabling students to improve strategies for addressing the various text genres, consolidating the process of reading. To this end, it was proposed a set of activities, that are designed to enhance students awareness of various demarcated by strategies, as well as make them aware of the need to define objectives for reading. It was then explored the thematic coherence and, later on, through cloze test, conceptual and formal aspects of reading, contemplating descriptive/injunctive and dissertative/argumentative typological sequences. The target audience was a class of sixth grade of elementary school. The data, analyzed on the basis of the theoretical statementes about reading, made by authors such as Coscarelli (2002), Kato (1999), Kleiman (1995) and Leffa (1996), showed the lag of the students in reading ability, as well as indicated the need for a continuous work, involving formal and conceptual aspects of this ability in order to train the student for acquiring fluency and enjoy the pleasure of reading. Keywords: formal aspects of reading, reading strategies, conceptual aspects of reading
1Especialista em Magistério de 1º e 2º Graus com concentração em Metodologia do Ensino pela
Faculdade de Ciências Humanas e Sociais de Curitiba. Licenciada em Letras (FECLI - Irati-PR). Professora do Colégio Estadual General Carneiro da Lapa - PR. email:[email protected] 2 Orientadora PDE. Doutora em Linguística pela Unicamp e Professora Associada da UTFPR- email:
1. Introdução
A prática da leitura é fundamental na busca de soluções para os problemas
associados ao pouco rendimento escolar, pois é por meio da definição de tarefas cada
vez mais complexas que os alunos redefinirão as tarefas para si. A formação de bons
leitores é fundamental para o desenvolvimento de todas as disciplinas, pois qualquer
processo de aprendizagem requer essa habilidade. Assim, a aprendizagem de
estratégias de leitura pode servir de ponte para o acesso aos vários saberes.
Porém, não se conseguirá formar bons leitores apenas incitando os alunos a ler
em sala de aula “porque o professor pede”, mas, antes, oferecendo-lhes uma
diversidade de gêneros textuais, levando-os a buscar nesses textos os elementos
definidos pelos objetivos de cada leitura, pois o texto é fruto de um processo
comunicativo e sua compreensão deve levar em conta quem fala, o quê, para quem e
com que objetivo. Ou seja, para que haja compreensão de um texto, há que se
considerar que ele foi produzido por alguém que tem a intenção de comunicar algo e de
que o produtor selecionou para seu texto elementos que vão permitir ao leitor recuperar
essa intencionalidade. É o que está proposto no texto dos Parâmetros Curriculares
Nacionais: “A leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de
construção do significado do texto, a partir dos seus objetivos, do seu conhecimento
sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe de escrita etc.” (PCNs, 1997. p.53).
Portanto, os procedimentos acima sugeridos compõem uma prática social que
encaminha a outros textos e outras leituras e é a partir daí que o professor poderá levar
os alunos a perceber que fora do ambiente escolar eles já buscam alternativas,
questionam, argumentam e, à sua maneira, resolvem até com certa habilidade seus
problemas.
Conforme propõe Coscarelli (2002, p.2), “a leitura pode ser dividida em duas
grandes partes, uma que lida com a forma linguística e outra que se relaciona com o
significado”. Assim, para um trabalho eficaz, faz-se necessário detalhar os processos
envolvidos na atividade de leitura para que se possa trabalhar conscientemente cada
um deles, possibilitando que os alunos sejam capazes de processar os vários tipos de
informações e construir um conceito. A autora orienta:
Essas informações poderão sinalizar para o professor que habilidades devem ajudar seus alunos a desenvolver para que se tornem leitores proficientes e, além disso, poderão ser tomadas como referência para facilitar o trabalho do professor na detecção das causas de problemas de leitura dos seus alunos. (COSCARELLI, op. cit., p. 01)
O estímulo ao desenvolvimento do hábito de ler levará os alunos a construir um
novo olhar sobre a leitura e sobre as diferentes formas de comunicação e expressão na
sociedade atual. São as Diretrizes Curriculares Estaduais que encampam esses
objetivos:
Trata-se de propiciar o desenvolvimento de uma atitude crítica que leva o aluno a perceber o sujeito presente nos textos e, ainda, tomar uma atitude responsiva diante deles. Sob esse ponto de vista, o professor precisa atuar como mediador, provocando os alunos a realizarem leituras significativas. (DCEs. 2008, p. 71)
Levar os alunos a tornarem-se leitores autônomos e produtores de texto
competentes é compromisso do professor. Sabe-se, porém, que esse não é um
trabalho fácil, pois as propostas pedagógicas não fornecem subsídios para a prática
docente. De toda forma, não se deve supor que o aprendizado de leitura e escrita seja
espontâneo e adquirido ao longo da experiência escolar. Por esse motivo, a leitura
deve ser feita cuidadosamente, com pleno controle da compreensão, buscando-se
palavras desconhecidas no dicionário, relendo-se o texto até a completa compreensão
do que é lido.
Ainda de acordo com as DCEs (2008, p.56), “ao ler, o indivíduo busca as suas
experiências, os seus conhecimentos prévios, a sua formação familiar, religiosa,
cultural, enfim, as várias vozes que o constituem”. Portanto, faz-se necessário
demonstrar aos alunos que, no processo de construção de sentido, ocorre uma relação
entre o texto, o leitor e o mundo, em que o subentendido ganha lugar de interesse e, na
relação entre o texto e o leitor, de acordo com as associações inferidas, um novo
conceito será formado. Diante disso, o leitor poderá deparar com novos desafios,
sendo levado a pensar, refletir e argumentar frente ao texto lido, pois é a partir daí que
a leitura passa a constituir um fator de amadurecimento.
Conhecendo a realidade das escolas, em que um número significativo de
alunos não compreende o que lê, apresentando dificuldades de interpretação, faz-se o
seguinte questionamento: como levar os alunos a ler, compreendendo que a leitura é
uma habilidade multifacetada?
A busca de mecanismos para responder a essa pergunta levou ao
desenvolvimento do presente estudo, apresentando aos alunos uma análise da leitura
em seus tópicos constitutivos, enfatizando o trabalho com aspectos formais e
conceituais, levando-os a tomarem consciência de realidades importantes para o
processamento da leitura, como é o caso da estrutura sintática canônica do português,
visando o desenvolvimento de estratégias de leitura eficientes.
Nesse contexto, a intervenção aqui relatada é relevante para a área na medida
em que propõe uma prática didático-pedagógica que proporciona um trabalho com
aspectos formais e conceituais da leitura, visando conscientizar os alunos da
importância de cada aspecto na constituição do todo complexo que é a habilidade da
leitura.
2. Revisão bibliográfica
Para a elaboração e implementação do projeto de intervenção que é objeto
deste trabalho, tomou-se como referencial teórico a proposta sociocognitivista,
representada por Coscarelli (op. cit.) e Kato (1999). Segundo aquela autora: “Ensinar a
ler bem é, ao lado do ensino da escrita, o maior desafio que as escolas têm enfrentado.
É desenvolvendo bons leitores que elas estarão realmente cumprindo o seu papel de
preparar indivíduos para a vida.” (COSCARELLI, op. cit. p.1).
Concebendo-se a leitura como elemento essencial para a aquisição dos saberes
propriamente humanos, compreende-se que esta deve ser incentivada durante todas
as etapas da vida. O desenvolvimento do “hábito de leitura”, que é um dos pilares do
chamado “letramento”, proporciona a construção de um novo olhar sobre o mundo,
sobre as várias formas de constituição da realidade e sobre si mesmo enquanto ser no
mundo, inserido em uma sociedade multifacetada.
No que diz respeito a aspectos educacionais, para os PCNS de Língua
Portuguesa (1997, p.54), um leitor competente é alguém que, por iniciativa própria, é
capaz de selecionar, dentre os textos que circulam socialmente, aqueles que podem
atender às suas necessidades. No ato de ler, esse leitor competente lança mão de
estratégias de leitura adequadas aos seus objetivos em relação a cada texto.
O leitor ideal deve possuir habilidades que possibilitem a construção de sentido
e, para que isso ocorra, este precisa convocar seus conhecimentos anteriores sobre o
tema do texto a ser lido. Desde a leitura do título e dos subtítulos do texto, já se
acionam esquemas de sua memória que garantem a atribuição de sentidos ao texto.
Portanto, quando se lê, não apenas se decodificam (decifram) palavras, pois a leitura é
um ato mais complexo na medida em que se apreendem significados. Assim, é
determinante que o leitor use seu conhecimento de mundo para compreender o texto e
a ele atribuir sentidos.
Segundo Kato, lembrando Vigotsky, há duas fases no desenvolvimento do
conhecimento: uma fase de desenvolvimento automático e inconsciente e uma em que
se observa um aumento gradual do controle ativo desse conhecimento. (cf. Vigotsky
apud KATO, op. cit., p. 124)
É no momento em que o aluno se familiariza com o conteúdo expresso no texto
que este dominará o modo de realizar a leitura, e esta deve fazer sentido para ele. A
escola deve, então, trabalhar e preservar a leitura em sua complexidade, explorando os
mais variados tipos de texto para que o educando experimente e aprenda na escola
que é mediante uma prática constante de leitura que poderá tornar-se um leitor
competente.
No entanto, por tratar-se de fenômeno complexo, um trabalho eficaz com a
leitura deve pressupor uma análise dessa habilidade, esmiuçando-se suas partes
constitutivas, como propõe Coscarelli:
O conceito mais comum de leitura é a transformação de “rabiscos” em ideias. A grosso modo não deixa de ser, mas essa é uma maneira muito simplista de perceber esse processo. Esse conceito traz em si uma noção de leitura como um todo sem divisões. Essa maneira de conceber a leitura dificulta o trabalho do professor de ajudar os alunos a desenvolver estratégias de leitura, pois o torna incapaz de identificar onde está o problema de cada leitor. Essa visão genérica e “compactada” da leitura impede que, nas situações de ensino-aprendizagem, problemas relacionados com o desenvolvimento da linguagem escrita sejam identificados e, conseqüentemente, faz com que eles não sejam solucionados. (COSCARELLI, op. cit., p.01-02)
Com essa perspectiva, o projeto de intervenção propôs-se a detalhar o
processo de leitura, considerando seus aspectos formais – lexical e sintático – e
conceituais – construção da coerência local, temática e externa. Nas palavras de Foss
(1988, apud COSCARELLI, op. cit., p. 02), “processamento lexical é o domínio da
leitura no qual as palavras são identificadas como tal, ou seja, nesse domínio são
ativadas as informações fonológicas, fonéticas, morfológicas, sintáticas e semânticas
das palavras”.
Posteriormente, dá-se a estruturação sintática das palavras pelo leitor. De
acordo com Coscarelli, “essa operação é normalmente realizada muito rapidamente e
sem o controle consciente do leitor, exceto no caso de o leitor encontrar problemas,
como, por exemplo, uma ambiguidade sintática.” (cf. COSCARELLI, op. cit., p. 06).
Ainda conforme essa autora, há fatores que influenciam o processamento
sintático, como a canonicidade e a complexidade da sentença, isto é, a forma como se
apresenta a sentença. Quanto mais simples ela for, maior o grau de entendimento. No
português brasileiro, a estrutura sintática padrão (canônica) é a que tem o sujeito
seguido do verbo, que, por sua vez, é seguido por seus complementos quando se trata
de verbo transitivo. Quando o texto apresenta uma estrutura alternativa (não canônica),
acrescenta-se um grau de dificuldade ao processamento sintático da leitura.
Para a autora, no âmbito do significado, tem-se a construção da coerência.
Esta se dá de forma local, quando é feita a análise do significado das frases e das
relações entre elas, e de forma temática, quando o leitor relaciona o significado das
sentenças entre si, construindo com elas uma representação semântica de partes
maiores do texto ou do texto inteiro. (cf. COSCARELLI, op. cit., p.14)
Já na construção da coerência externa ou processamento integrativo, o leitor
vai usar seu conhecimento prévio, ou seja, as informações conscientes e
potencialmente conscientes de que dispõe, para dar a sua interpretação das
informações do texto e para avaliar a pertinência dessas informações conforme seus
propósitos de leitura.
É também com base nos propósitos do leitor em relação a cada texto, além de
outros fatores, que se constituem as estratégias de leitura. Assim, de acordo com
Kleiman (1992, p.15), o professor deve propiciar contextos a que o leitor deva recorrer,
simultaneamente, a fim de compreendê-lo em diversos níveis de conhecimento -
gráficos, linguísticos, pragmáticos, sociais e culturais. O processamento interativo
corresponde ao uso de dois tipos de estratégias, segundo as exigências da tarefa e as
necessidades do leitor: aquelas que vão do conhecimento de mundo para o nível de
decodificação da palavra, envolvendo um tipo de processamento denominado “top-
down”, ou descendente, juntamente com estratégias de processamento “bottom-up”3,
ou ascendente, que começam pela verificação de um elemento escrito qualquer para, a
partir daí, mobilizar outros conhecimentos. O leitor iniciante usa predominantemente o
processamento ascendente, ou seja, a decifração da letra ou palavra escrita que
precede a ativação do conhecimento semântico, ou pragmático, ou enciclopédico.
Como afirma Kato (op. cit., p. 50), “esses dois tipos de processamento podem
servir de base para descrever tipos de leitores”. Assim, o leitor fluente, que privilegia o
processamento descendente, assimila com facilidade as ideias principais do texto, mas
faz excessos de adivinhações. Já o segundo tipo é lento e pouco fluente e tem
dificuldade em sintetizar as ideias do texto, pois não consegue saber o que é mais
importante nele. O leitor maduro, que tem controle ativo e consciente de seu
comportamento, comporia um terceiro tipo de leitor, aquele que lança mão das duas
estratégias de acordo com a necessidade do momento.
Para se atingir o nível de leitor maduro, o contato com os vários gêneros
textuais é imprescindível. No entanto, o trabalho com elementos linguístico-cognitivos,
que permitem ao leitor obter fluência na leitura, é também de suma importância. Assim,
o presente projeto parte do princípio de que o dever da escola não termina com o
ensino da decodificação/decifração no processo de leitura, mas se consolida ao
proporcionar ao aprendiz de leitor o instrumental que lhe permitirá atingir o nível da
compreensão/interpretação, que de fato o caracterizará como sujeito letrado.
3. Metodologia
Com o intuito de cooperar com a prática dos professores de Língua Portuguesa,
enriquecendo suas propostas de trabalho com a leitura, elaborou-se uma unidade
3 nomenclatura típica dos estudos de leitura dos anos 60 e 70 do século passado para se referir às estratégias de leitura ascendente ou descendente.
didática focada no desenvolvimento de práticas de leitura significativas para os alunos,
viabilizando o aperfeiçoamento de seus conhecimentos linguísticos e discursivos e
levando-os a tomarem consciência da estrutura sintática canônica do português
brasileiro e das variações possíveis nessa estrutura, conhecimento fundamental para o
processamento sintático fluente.
Nas práticas empreendidas, foram utilizadas estratégias de antecipação de
leitura para motivar o aluno a mobilizar seus conhecimentos prévios e aventar
hipóteses de leitura. Na exploração de palavras-chave objetivando a composição do
sentido, aplicou-se uma espécie de teste de Cloze4 às avessas, em que, em vez de
preencher lacunas, o aluno deveria completar o contexto linguístico para atribuir sentido
àquelas palavras. A avaliação das atividades objetivava levar os alunos a refletir sobre
o que os levou a escolher uma ou outra forma.
Visando atingir o objetivo de levar os alunos a perceber a importância da busca
das ideias principais do texto, como estratégia que explora a coerência temática,
utilizou-se um texto, buscando-se a compreensão a partir de palavras-chave. O mesmo
texto foi apresentado aos alunos em forma de teste de Cloze.
Já a prática das estratégias de leitura “top-down e bottom-up” objetivou
despertar a consciência da necessidade de se definir objetivos de leitura, quando
foram explorados textos com predominância de sequências descritivas/injuntivas e
textos com predominância de sequências dissertativas/argumentativas.
Assim, foram propostas práticas de leitura significativas, possibilitando a
interação entre conhecimento linguístico e conhecimento discursivo, fornecendo-se
elementos para que os alunos compreendessem os discursos que os cercam, com
condições de interagir com eles, buscando contribuir para sua formação enquanto
leitores proficientes.
4. Apresentação e análise dos resultados
4 Técnica de pesquisa, ensino e avaliação que consiste no lacunamento de um texto a ser preenchido
pelo leitor. (cf. LEFFA, 1996, p. 88)
Para levar os alunos a tomarem consciência da estrutura sintática canônica do
português brasileiro e das variações possíveis nessa estrutura, considerando esse
conhecimento como parte do processamento sintático fluente, foram trabalhadas
paráfrases a partir de gêneros variados.
Visando atingir o objetivo de levar os alunos a perceber a importância da busca
das ideias principais do texto, como estratégia que explora a coerência temática, foi
trabalhado um texto buscando-se a compreensão a partir de palavras-chave. O mesmo
texto foi apresentado aos alunos em forma de teste de Cloze, a fim de contrapor
algumas palavras que foram retiradas do texto e que não prejudicam a compreensão
àquelas consideradas palavras-chave. Essa técnica tem sido usada não só para medir
a inteligibilidade do texto, mas também a proficiência em leitura e a competência
linguística. (cf. LEFFA, 1996, p.71)
Já na prática das estratégias de leitura “top-down e bottom up”, visando
conscientizá-los da necessidade de se definirem objetivos de leitura, explorou-se textos
com predominância de sequências descritivas/injuntivas e textos com predominância
de sequências dissertativas/argumentativas.
Assim, buscaram-se práticas de leitura significativas, possibilitando
conhecimento linguístico e discursivo, fornecendo-se elementos para que os alunos
compreendam os discursos que os cercam, com condições de interagir com eles,
buscando contribuir para sua formação enquanto leitores eficazes.
A implementação do Projeto de intervenção que engendrou este artigo ocorreu
no Colégio General Carneiro, na Lapa – PR, e teve como público alvo uma turma de 6º
ano A matutino com 31 alunos.
A primeira atividade teve como objetivo levar os alunos a perceber a
importância da busca das ideias principais do texto como estratégia que explora a
coerência temática, levantando hipóteses a respeito do significado do texto. Para
ativação dos conhecimentos prévios, foi feita a discussão sobre o Título do texto: “A
borboleta e o grilo”. A partir das discussões realizadas, percebeu-se primeiramente que
era um assunto de interesse dos alunos e que havia uma compreensão sobre o tema a
ser trabalhado. Alguns comentaram que o tipo de texto poderia ser um poema, outros
que seria um conto. A partir daí, foram feitos questionamentos sobre a borboleta e o
grilo e o que eles conheciam sobre esses insetos.
Em um segundo momento, os alunos assistiram a dois vídeos em que um
falava sobre borboletas e o outro sobre grilos. Depois disso, surgiram vários
questionamentos sobre o simbolismo dos dois, e os alunos deram exemplos desses
significados, mostrando que conheciam o assunto. Também ocorreram alguns
questionamentos sobre o tipo de alimentação dos insetos.
A segunda atividade tem como objetivo a exploração de palavras-chave para a
compreensão do sentido. Foram escolhidas algumas palavras do texto original e estas
foram escritas no quadro. Os alunos, em duplas, deveriam produzir um texto usando as
palavras destacadas tal como estavam escritas. Observou-se que houve dificuldade na
utilização das palavras – alguns usaram a palavra “pousada” no sentido de
hospedagem, outros não conseguiram substituir palavras já utilizadas por seus
sinônimos, utilizaram diálogo.
A montagem do texto fatiado foi a terceira atividade, que tinha como objetivo
refletir sobre os elementos responsáveis pela coesão dos parágrafos e construção do
sentido do texto. Cada dupla recebeu a cópia do texto fatiado e deveria reorganizá-lo.
Houve certa apreensão quanto ao início do texto, mas percebeu-se que os alunos
discutiam sobre cada parágrafo e diálogos que o texto apresentava.
Das propostas teóricas sobre os aspectos da coerência dos textos, a de
Charolles (1988) é frequentemente citada em estudos descritivos e aplicados. Partindo
da noção de textualidade apresentada por Beaugrande e Dressler, Charolles entende a
coerência como uma propriedade ideativa do texto e enumera as quatro metarregras
que regem sua coerência. A “metarregra da relação” diz que um texto articulado
coerentemente possui relações estabelecidas, firmemente, entre suas informações, e
essas têm a ver umas com as outras. A relação em um texto refere-se à forma como
seus conceitos se encadeiam, como se organizam, que papéis exercem uns em
relação aos outros. As relações entre os fatos têm que estar presentes e ser
pertinentes.
Com base nessa metarregra de Charolles, o Quadro 1 apresenta uma amostra
dos resultados da atividade, no que tange à coerência local.
Quadro 1
AMOSTRAS DE INCOERÊNCIAS LOCAIS
TEXTO DE
REFERÊNCIA
EXCERTOS
TEXTO 1 “Encantado com a beleza da borboleta, Cricri disse:
O grilo Cricri falou para Leleta:”
(Falta de atenção. Há duas introduções de fala. Ele não observa que há repetição
da mesma oração com pequena mudança lexical apenas: “Cricri disse”/”O grilo
Cricri falou”)
TEXTO 2 “Leleta, com pena do grilo, respondeu:
Prefiro ser eu mesmo, um grilo verde que vive feliz pulando pelo jardim!”
(Sem ter opções disponíveis, ele encaixa as peças restantes, gerando incoerência
local, pois não atentou para a incongruência entre o autor da resposta – o grilo – e
o autor da resposta anunciado pelo narrador: a Leleta.)
TEXTO 3 “Depois de algum tempo, o casulo se abriu. Prefiro ser eu mesmo, um grilo verde
que vive pulando pelo jardim”
(embora acerte a frase final do texto original, esta não é congruente com aquela
que a antecede, isto é, não há nexo entre os dois enunciados, que apenas estão
justapostos – a metarregra da relação, proposta por Charolles)
TEXTO 4 “Leleta, com pena do grilo respondeu:
Que maravilha! Eu havia me transformado em uma linda borboleta!”
(A sequência formal dos enunciados é compatível, pois, além de ter sido
anunciada uma resposta – pelo uso da fórmula: “...respondeu:”, a referida
resposta, conforme anunciada, foi de fato dada por Leleta. Porém, as falas não se
encaixam em termos semântico-pragmáticos, já que houve o anúncio de uma
resposta de Leleta motivada pela “pena do grilo”, que não se efetivou, pois o
conteúdo semântico-pragmático da referida resposta não expressava esse
sentimento.)
TEXTO 5 “Eu queria ser como você, mas só vivo pulando pelo jardim. Prefiro ser eu
mesmo, um grilo verde que vive feliz pulando pelo jardim.”
(Como diria Michel Charolles, há uma contradição de ideias, pois os enunciados
só fazem sentido quando colocados, como no texto original: o primeiro no início
da história e o segundo no final, pois assim percebe-se a mudança de perspectiva
do grilo. Da forma como foi proposta pelo aluno, é como se, num primeiro
momento, o grilo dissesse “X” e, na sequência, “não X”).
TEXTO 6 Dentro do casulo era escuro e apertado, mas eu não me importava, pois ali eu
estava me transformando, passando pela “metamorfose”.
TEXTO 7 “Como você demorou a se transformar em uma borboleta!” (no original 24)
“Eu não teria tanta paciência.” (no original 25)
“Depois de algum tempo, o casulo se abriu”. (no original 15)
(O aluno soube intercalar os comentários do grilo sobre o lento processo de
metamorfose com o relato das fases dessa transformação pela Leleta sem
prejudicar a coerência. Percebe-se que prestou atenção ao sentido dos
comentários, que eram referentes à morosidade do processo de metamorfose e à
paciência da borboleta em passar por esse processo. Ele os encaixa logo após a
borboleta ter relatado a sua percepção do casulo em que esteve envolvida e
mencionado os termos “transformando” e “metamorfose”, retomados, no
comentário que o aluno encaixa a seguir, por meio do verbo “transformar”)
TEXTO 8 “Eu não teria tanta paciência” (25)
Leleta, com pena do grilo respondeu: (05)
- Você acha que eu sempre fui bonita? (06)
Que maravilha! Eu havia me transformado em uma linda borboleta!” (21)
(O grilo fala em paciência e a borboleta responde com uma pergunta sobre
beleza. Talvez o aluno tenha se influenciado pela presença “coesiva” de palavras
do mesmo campo semântico na pergunta e na suposta resposta:
bonita/linda/maravilhosa. Mas nem sempre a presença de palavras
relacionadas atribui coerência às sequências de enunciados.)
A quarta atividade: “Leitura em movimento”, buscava levar os alunos a
refletirem sobre a transformação, tanto nos insetos, como nas pessoas; instigando-os a
perceber a importância da busca das ideias principais do texto como estratégia que
explora a coerência temática. Antes de apresentar os slides aos alunos, foram feitas
perguntas para prepará-los para a leitura, antecipando o título do livro, estimulando-os
a identificar o gênero do texto, mostrando a capa e sua ilustração e lendo a contracapa.
Durante a leitura foram apresentados objetivos orientadores, focalizando aspectos que
os auxiliassem na construção dos significados do texto. Depois da leitura foram feitas
atividades objetivando uma melhor compreensão da obra através de perguntas orais.
Posteriormente foram trabalhados novos conceitos com a utilização do dicionário, pois
verificou-se que os alunos não tinham conhecimento de alguns termos empregados.
As próximas atividades foram o texto instrucional e a receita embaralhada.
Durante a apresentação das atividades, pode-se perceber o interesse dos alunos pelo
assunto, pois este faz parte de seu cotidiano. Foram feitas perguntas a partir do título:
“Bolo de chocolate”. Em seguida, fizeram a montagem de uma receita de bolo e,
mesmo tendo sido colocadas as partes da receita: ingredientes, modo de fazer e
cobertura, alguns alunos não perceberam (ou não estavam atentos à) a sequência
correta deste tipo de texto, visto que possui um esquema cognitivo com características
próprias.
Na atividade da receita embaralhada, os alunos não conseguiram pensar,
levando em conta o seu conhecimento sobre receitas/preparo de alimentos/coerência
entre os itens que compõem uma receita em consonância com o título, para atingir o
objetivo da atividade, que era separar os itens que caracterizavam a receita de bolo
daqueles que pertenciam à receita de macarrão, os quais foram apresentados
embaralhados.
Os alunos observaram que o modo de fazer do bolo era composto apenas pelo
comando: “Junte todos os ingredientes e mexa com uma colher”. Usaram como
estratégia para a separação das receitas a marcação, ao lado de cada item, da letra B,
para bolo, e da letra M, para macarrão.
Ao longo do desenvolvimento da atividade, surgiu a dúvida sobre o significado
da palavra “pirex”, pois muitos conheciam o utensílio como “travessa” e outros o
confundiram com pires. Foi usado o dicionário para obter o significado de cada palavra.
Surgiram então questionamentos, como: um pirex vai ao forno? Pode-se fazer um bolo
e assar num pirex? Ah! Mas minha mãe faz lasanha e coloca num pirex para assar;
então, vai ao forno.
Quando chegaram ao item “misture separadamente a nata com a salsa picada e
o queijo ralado e adicione ao macarrão”, ficaram em dúvida se poderiam colocar a nata
no bolo e, a partir de alguns questionamentos, chegaram à conclusão de que esse
ingrediente poderia sim ser colocado no bolo, mas um aluno mais atento percebeu que,
nesse item, aparece a preposição “com”: a nata com a salsa picada”, donde se pode
concluir que a nata não faz parte da receita do bolo, mas do macarrão, uma vez que
“salsa picada” não é ingrediente para bolo.
Pode-se dizer que essa atividade atingiu seus objetivos, pois teve como
resposta o envolvimento dos alunos trazendo experimentações e enriquecimento dos
saberes construídos em sala. O trabalho permitiu a socialização de ideias, experiências
e opiniões sobre o gênero textual em questão, bem como o desenvolvimento do aluno
trazendo diferentes associações e leituras de mundo.
A atividade seguinte constituiu-se na aplicação de teste de cloze de leitura a
uma turma de 31 alunos do 6º ano do Ensino Fundamental de uma escola pública.
Para o teste, utilizou-se o texto “O menino que mentia”, de William J. Bennett. Este foi
estruturado segundo a técnica tradicional de cloze em que a quinta palavra foi retirada,
num total de 22 lacunas a serem preenchidas. O último período do texto foi preservado.
Para a análise dos resultados do teste, levou-se em conta os estudos de
Bormuth (1968), que propõe categorias que consideram os níveis de compreensão
identificados com base na porcentagem de acertos obtida, a saber, nível de frustração
(menos de 44% de acertos), que equivale à não compreensão da informação lida; nível
instrucional (de 44% a 56% de acertos), que equivale a uma compreensão apenas
suficiente, necessitando da intervenção do professor, e nível independente (acima de
56% de acertos), que equivale a uma compreensão crítica, criativa e autônoma do
texto.
O teste foi aplicado durante uma aula de Língua Portuguesa pela professora da
turma. Inicialmente, foi explicado o objetivo da atividade e foram dadas as instruções
para que os alunos lessem todo o texto, apesar das lacunas presentes, e, em seguida,
voltassem ao início para completarem as lacunas. As palavras omitidas do texto foram:
seu – aldeia – uma – lobo – vai – vizinhos – saíram – para – encontraram-se – lobo –
ele – todos – caçoou – dia – fato – as – o – lobo – vizinhos – era – o rebanho.
Quanto à idade, os alunos assim se dividiam: 01 aluno com 10 anos; 01 aluno
com 12 anos; 01 aluno com 14 anos; 24 alunos com 11 anos; 04 alunos com 13 anos.
Os resultados foram os seguintes:
- Nível de frustração: 01 aluno com média de acertos de 23%
- Nível instrucional: 06 alunos com média de acertos entre 45% e 54%
- Nível independente: 24 alunos com média de acertos entre 59% e 81%
Os gráficos 1 e 2, a seguir, mostram que os alunos que obtiveram maior número
de acertos foram os que conheciam o texto, o que pode ter sido um facilitador para o
nível alcançado; porém, consideramos pouco provável que esses alunos se
lembrassem do texto ipsis literis, isto é, exatamente como estava escrito. Portanto, eles
tiveram que lançar mão de sua capacidade de desenvolver associações apropriadas
entre o conhecimento prévio e os dados do texto.
Gráfico 1
Gráfico 2
Já no gráfico 3, é possível notar uma correlação entre a percentagem de acertos
e o fato de o aluno estar ou não na série escolar ideal correspondente a sua idade.
Assim, o maior número de acertos (63,3%) está na faixa etária dos 11 anos, que
engloba a maioria dos alunos e corresponde à idade mais representativa da série em
questão. O aluno de 14 anos, por outro lado, foi o que obteve a menor percentagem de
acertos, evidenciando sua defasagem em relação aos demais. Especialmente esses
casos, que apresentam dificuldades acentuadas na compreensão leitora, demandam
práticas pedagógicas mais eficientes no trabalho com a leitura.
Gráfico 3
Após a implementação do projeto na escola, aconteceu a socialização, por meio
do Grupo de Trabalho em rede - GTR, no Ambiente Virtual de Ensino e Aprendizagem
“e-escola”, da Secretaria de Estado de Educação do Paraná. Nesse grupo,foi
promovido um debate entre os professores cursistas sobre o material produzido. Dentre
as opiniões colhidas, destacamos a seguinte “[...] as atividades são desafiadoras e
promovem a ação mental dos alunos. A borboleta e o grilo nos deixa claro a
importância que cada indivíduo representa no todo, é importante para trabalharmos o
respeito e o cuidado que devemos ter com o meio ambiente e com os seres vivos. Este
tema provoca bastante interesse e curiosidade nas crianças. [...] Dessa forma, a vida
também, muitas vezes, pode ser comparada a uma metamorfose, pois no dia-a-dia, as
pessoas, a natureza e o próprio mundo sofrem grandes e pequenas mudanças que
podem ser significativas e fazer parte da história. [...] é excelente para trabalhar a
mudança, a idealização dos sonhos e do aperfeiçoamento!
Podemos ser melhores a cada dia!!!”
5. Considerações Finais
Integrando as atividades do PDE, o projeto implementado propiciou alguma
colaboração no ensino e aprendizagem da leitura, na medida em que adota várias
tipologias textuais, buscando possibilitar aos alunos diferentes formas de compreensão
textual.
Por meio da leitura de vários gêneros textuais foram utilizadas várias estratégias
que foram pertinentes para que os objetivos propostos fossem atingidos, permitindo ao
educando o conhecimento de vários gêneros e levando-o a perceber que ao utilizar-se
de estratégias de leitura poderão melhorar sua compreensão leitora, fazendo
inferências e refletindo sobre a importância da leitura e sua compreensão.
Nas atividades de leitura, foi dado destaque aos conhecimentos prévios dos
alunos, o que contribuiu para que o ato de ler não se apresentasse como atividade
mecânica, mas prazerosa e significativa. É necessário induzir, cativar o leitor para
melhor compreensão da realidade que o cerca, pois, quanto maior o interesse pela
leitura, maior será a busca por outros gêneros textuais.
Acredita-se que o professor deve ser um conhecedor e que este deve sempre
estar pesquisando para que em seu trabalho possa utilizar-se de novas metodologias
de forma a melhorar a qualidade do processo de ensino/aprendizagem, fazendo-se
necessário instigar a curiosidade do aluno motivando-o, pois o leitor não compreenderá
aquilo que não conhece e a leitura deve ter um objetivo visando o êxito nas etapas
subsequentes.
A utilização do projetor de slides em sala de aula fez com que os alunos
pudessem visualizar melhor os textos selecionados, gravuras e os problemas em
relação aos textos produzidos, dos quais foram escolhidos três para este trabalho, pois
não se estava avaliando em termos de certo ou errado e que estes deveriam seguir as
instruções onde o que importava, ao final, era sempre o sentido que se conseguiu
atribuir ao texto, o que tornou a atividade mais dinâmica, pois, quando se usa
tecnologia, deve-se ter em mente os objetivos que levam a utilizá-la para que a aula
não se torne maçante. Deve existir sim uma relação professor/aluno/tecnologia/sala de
aula.
Ao estimular a participação ativa dos alunos em todas as atividades, orientando-
os para que reflitam de modo crítico, o professor tem aí um papel importante na
formação desses leitores, fazendo-os tornarem-se capazes de transformar significados
a partir da leitura e assim dar margem ao desenvolvimento da sua criatividade,
aprimorando seu poder de interferir no seu dia a dia.
Ao término da intervenção na escola, pôde-se pensar sobre a importância de se
usar novas metodologias para que estas promovam a leitura em sala de aula,
buscando-se a interação dos alunos com os textos propostos, instigando-os a utilizar-
se de estratégias de leitura para melhorar sua compreensão leitora.
Referências Bibliográficas
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