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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
LETRAMENTO LITERÁRIO: O CONTO COMO ESTRATÉGIA
Lucimar Lazarin (Professora PDE/2013)
Níncia Cecília Ribas Borges Teixeira
(Professora Orientadora/Unicentro – PR.)
RESUMO: O presente artigo descreve e analisa uma intervenção pedagógica realizada em sala de aula, com uma turma do 8º ano do Ensino Fundamental, envolvendo o desenvolvimento do letramento literário, com o uso do gênero textual conto. O objetivo geral foi, por meio do letramento literário, estimular o exercício da prática social da leitura e da escrita. A metodologia utilizada foi a qualitativa, sendo as atividades desenvolvidas por meio de uma pesquisa-ação. Ao final da pesquisa-ação, foi possível constatar que as atividades (descritas em uma unidade didática), contribuem para que os alunos percebessem a leitura e a escrita como práticas sociais, encontrando nos contos, sobretudo os de Marina Colassanti, um gênero textual que suscita a atenção, instiga a imaginação e auxilia na aquisição de saberes que influem na produção textual dos educandos. Nesse sentido, o letramento literário é um recurso relevante para o docente que, quando devidamente planejado, consegue favorecer a aprendizagem do aluno. Palavras-Chave: Conto. Intervenção Pedagógica. Letramento Literário. Leitura e Escrita. 1. INTRODUÇÃO
A atuação docente, na leitura, precisa considerar o ato de ler como uma
prática social, que oportuniza ao estudante ter uma noção mais abrangente do que
está lendo, como também compreender e assimilar o conteúdo existente no texto,
para que possa empregá-la em situações como a análise de sua realidade social.
Essa percepção é destacada pelas Diretrizes Curriculares da Educação
Básica (PARANÁ, 2008), em que a leitura oportuniza ao estudante identificar
sentidos, compreender mensagens e relacionar tais aspectos com outras situações
e com a própria realidade social.
Maria Divanira de Lima Arcoverde (2007, p. 4) indica que “A inserção da
leitura na escola, nesse sentido, é necessária e obrigatória, tendo em vista se tratar
de uma responsabilidade social, antes de tudo, da qual a escola não pode se
desvencilhar”.
A escola, por meio da prática docente, necessita contribuir para que o
educando tenha gosto pelo ato de ler, como também reconheça sua importância
como recurso de compreensão da realidade, realçando que o ato de ler não se limita
a decodificação dos signos linguísticos.
Para que tenha essa abrangência, o professor pode desenvolver o letramento
literário que, conforme indica Rildo Cosson (2012), colabora para que se efetive uma
leitura mais significativa, no sentido de oportunizar o alcance de outros contextos
sociais, favorecendo ao leitor ter um nível de consciência maior acerca do que está
lendo, como também de seus sentidos, dos seus significados e dos seus contextos,
permitindo que surja um maior interesse pelo ato de ler.
Mediante essa percepção, foi desenvolvido um Projeto de Intervenção
Pedagógica no Colégio Estadual General Eurico Gaspar – EFEM, em uma turma do
8º ano do Ensino Fundamental, com o objetivo de estimular o letramento literário
com o emprego do gênero textual conto, que foi selecionado em virtude de, segundo
Rosane Gazolla Alves Feitosa e Juliana Reis do Amaral (2006, p. 27):
[...] ter uma estrutura simples (situação inicial, conflito, solução e situação final), com predomínio da ação, apresentação direta dos personagens, diálogos ágeis e textos enxutos que deixam muitas lacunas para serem preenchidas pela imaginação do leitor.
Devido a tais características, o conto oportuniza aos alunos terem condições
de empregar suas capacidades, como a imaginação, para aprofundar a leitura do
texto, como também, no âmbito do letramento literário, estabelecer relações com
outras referências, oportunizando um ato de ler com maior significado.
O desenvolvimento do projeto pautou-se em uma unidade pedagógica,
composta de quatro unidades, tendo como foco principal os contos de Marina
Colasanti, que estabelece uma relação importante entre elementos dos contos de
fadas com temas de natureza social, resultando em uma obra instigante e que
desafia o leitor a realizar conexões para compreender a história.
Ana Cláudia Tassiana (2009, p. 3) indica que Marina Colasanti, como autora
de contos, caracteriza-se por ser:
[...] detalhista, observadora, e com a maior delicadeza, Colasanti busca um novo rumo, novos critérios de caráter estético, utilizando maneiras alternativas e buscando incorporar em suas obras uma mensagem metafórica, além do simbólico e da sensualidade. Seus escritos, muito bem elaborados, trazem um trabalho artesanal de linguagem e a precisão no tecido das palavras, onde seu interesse e busca se voltam para o inconsciente, deixando ao leitor a possibilidade de identificação com aquilo que lê, sendo isso algo comum em suas obras.
Tais características oportunizam que o processo de letramento literário seja
desenvolvido com textos instigantes, que dialoguem com outras obras de gêneros
textuais diversos, além do próprio uso da oralidade, que é uma forma importante de
expressão do conto.
Outro aspecto considerado na escolha do conto foi seu dinamismo, narrando
um fato inusitado que pode ocorrer no cotidiano das pessoas. Nesse sentido, a
escolha pelo letramento literário com a utilização do conto decorreu do
reconhecimento de que os educandos possuem pouco interesse pela leitura, devido
a alguns não terem sido devidamente estimulados ao longo da sua formação escolar
a se tornarem eleitos e a grande maioria preferir outras formas de entretenimento,
como os oriundos dos recursos tecnológicos.
Além dessas características, os contos apresentam uma diversidade temática,
condição que, no processo de letramento literário, contribui para que o educando
possa estabelecer relações com os conhecimentos que já possuem, propiciando
uma leitura mais profícua.
Nesse sentido, o objetivo principal do projeto consistiu em desenvolver uma
prática de letramento literário com a utilização do gênero conto para o exercício da
prática social da leitura e da escrita.
A metodologia empregada teve natureza qualitativa, desenvolvida por meio da
pesquisa-ação, com a intenção de estimular a capacidade de leitura do aluno por
meio do letramento literário.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Na alfabetização, reconhecida como um processo de desenvolvimento
intelectual relevante para o ser humano ocorre a aquisição da leitura e da escrita,
que são referenciais para que este tenha condições de codificar e elaborar textos a
partir dos signos linguísticos utilizados no âmbito social (SOARES, 2004).
Contudo, a alfabetização pode ter um maior alcance, quando tem como foco
oportunizar ao educando a possibilidade de compreender o que está lendo como
também elaborar um texto coerente e com significado, empregando-os de forma
relevante na comunidade em que está inserido.
Nesse contexto, a alfabetização se torna o letramento que, no entender de
Magda Soares (2003), propicia que a pessoa possa utilizar com frequência e de
modo competente a leitura e a escrita. Esse uso competente decorre do
desenvolvimento das quatro faculdades atinentes ao uso da língua, que são: falar,
escrever, ouvir e ler.
Essas faculdades não são importantes somente no processo de ensino, mas
também na própria participação social do estudante. Tais faculdades permitem ao
sujeito ter uma inserção crítica na sociedade, fazendo com que a aprendizagem da
leitura e da escrita não se constitua apenas em um ato pedagógico, mas também
político, no sentido de tornar o aluno autônomo, com condições de expressar seu
pensamento e suas opiniões (PARANÁ, 2008).
É importante ressaltar que a alfabetização não é suficiente para desenvolver
no aluno a condição de domínio crítico sobre o que está lendo ou escrevendo,
identificando que a capacidade de codificação e a de escrever palavras não é
suficiente para a compreensão do significado do que se está lendo, tampouco
garantia de coesão, coerência e profundidade no que está sendo escrito.
Essa condição é reconhecida por Edilaine Botão da Silva e Vera Lúcia
Martiniak (2013), ao apontarem que a alfabetização, entendida como um processo
de propiciar ao aluno apenas o reconhecimento das palavras e o domínio das
correspondências gráficas não contribui para este estabelecer uma compreensão
mais abrangente acerca do que está lendo ou do que está escrevendo, resultando
em uma forma de analfabetismo, denominado de analfabetismo funcional.
No analfabetismo funcional, o leitor consegue compreender informações
básicas ou simples em uma frase, mas quando um texto apresenta um nível maior
de exigência, não consegue fazer inferências ou identificar o significado do que está
escrito. Essa condição se reflete também na sua escrita, que não consegue elaborar
textos argumentativos coesos e coerentes, por falta de referenciais argumentativos
(ANDRADE, 2008).
O letramento procura estabelecer um significado maior ao ato da leitura e da
escrita, fazendo com que o educando, ao realizá-las, tenha consciência dos
significados, tornando-as uma prática social, que terá reflexos linguísticos e
cognitivos.
Esses reflexos, no caso da leitura, conforme identifica Soares (2004), envolve
o reconhecimento de que a decodificação é apenas a primeira etapa do ato de ler,
sendo incorporadas a este ato: a captação de significados, a interpretação de
sequências e ideias, analogias, comparações, linguagem figurada, relações
complexas, análogas e a habilidade do aluno em elaborar previsões iniciais acerca
do que lerá.
Tais atos são relevantes para que a leitura se torne “[...] a interação verbal
entre indivíduos, indivíduos socialmente determinados: o leitor, seu universo, seu
lugar na estrutura social, sua relação com o mundo e com os outros” (SOARES,
2003, p. 38). Assim, a leitura se torna um ato mais abrangente, instigando o
estudante a ter uma noção de que esta contribui na relação que efetiva com o
ambiente social e com seus semelhantes.
Silva (2004) expõe que, no âmbito escolar, a leitura necessita ser
desenvolvida de forma a levar o aluno a identificar o sentido do texto que está lendo,
para que tenha plena consciência dos significados propostos pelo autor,
compreendendo seus significados.
Em relação à escrita, tais reflexos referem-se a condição de empregar os
signos linguísticos para transmitir ideias e mensagens, de forma organizada, tendo
um significado capaz de ser compreendido e atendendo ao que o autor pretende
comunicar.
O letramento propõe, considerando esses aspectos, que a alfabetização
permita que o educando possa ter domínio da técnica da leitura e escrita, como “[...]
relacionar som/grafia, reconhecer letras, codificar e usar o papel e o lápis, como
também o domínio do uso social destes fatores, nas mais variadas situações,
propiciando uma interação ativa com as pessoas e com o meio onde está inserido”
(GALVÃO e LEAL, p. 13).
Em termos conceituais, o letramento, na percepção de Soares (2003),
representa a possibilidade do uso social de leitura e da escrita, permitindo que a
pessoa alfabetizada assuma condição de alfabetizado consciente, ou seja, tenha
condições de assumir posturas políticas, sociais e culturais, atendendo as
exigências sociais.
No caso específico da leitura, o letramento, segundo Silva (2004), favorece ao
aluno formular hipóteses e críticas em relação ao tema abordado, identificando sua
relevância na constituição de pessoas com senso crítico.
Sem o letramento, a alfabetização pode resultar na formação de analfabetos
funcionais que, mesmo dominando os mecanismos da leitura e da escrita, não
conseguem ter uma compreensão maior do que estão lendo ou escrevendo, devido
a não terem uma perspectiva social acerca destes fatores.
No âmbito do letramento, a leitura se torna uma imersão no texto em que está
sendo lido, propiciando que o leitor estabeleça interações com referenciais próprios
no que está sendo descrito pelo autor do texto. Nesse sentido, o professor colabora
para que o aluno, segundo Ângela Kleiman (1999, p. 48), possa “[...] interagir com o
texto, levando-o a questionar-se em relação às intenções do autor em abordar esse
tema, levantar hipóteses, ter um posicionamento positivo ou negativo, dentre outros
aspectos”.
Silva (2004), por sua vez, acentua que a leitura propicia ao ser humano extrair
significados acerca do que está lendo, resultando na assimilação de saberes que
influenciam no seu desenvolvimento intelectual e social.
Kleiman (1999) indica que a leitura, para que tenha um alcance maior no
processo educativo necessita ser efetivada contemplando os seguintes fatores: a
coerência e a formulação de hipóteses. A coerência relaciona-se ao engajamento do
leitor por meio de seus objetivos e propósitos, sendo que estabelecimento destes
aspectos representa uma estratégia meta-cognitiva, que propicia o controle do
próprio conhecimento. A formulação de hipóteses passa a ser desenvolvida com a
imersão no texto, fazendo com que o leitor vá construindo significados a partir de
questionamentos elaborados no decurso do ato da leitura.
Esses questionamentos demandam o emprego do conhecimento prévio do
leitor que, para Kleiman (1999, p. 67) possibilita a compreensão do texto: “A
compreensão de um texto é um processo que se caracteriza pela utilização de
conhecimento prévio: o leitor utiliza na leitura o que ele já sabe o conhecimento
adquirido ao longo de sua vida”.
Para oportunizar uma leitura mais relevante para o aluno, o letramento
literário se torna um elemento relevante, fazendo com que este possa desenvolver o
gosto pela literatura, como também efetivar um ato de ler com maior consistência.
Assim, no entendimento de Moura (2006, p. 29), o letramento literário permite que o
aluno “[...] seja capaz de processar as mais diversas informações escritas, desde
uma receita de bolo até uma demonstração financeira em níveis variados de
dificuldade. E, assim, vai se tornando um leitor com uma capacidade de letramento
mais avançada”.
Conceitualmente, letramento literário é “[...] o processo de letramento que se
faz via textos literários e compreende não apenas uma dimensão diferenciada do
uso da escrita, mas também e, sobretudo, uma forma de assegurar seu efetivo
domínio” (COSSON, 2012, p. 12).
Esse letramento realça que a atividade de leitura no âmbito escolar não se
prende a uma simples decodificação de símbolos, mas passa a ter o objetivo de
propiciar a interpretação e compreensão do que se está lendo, influindo também na
capacidade de escrita do estudante.
O letramento literário valoriza a literatura que, no entender de Cosson (2012,
p. 17) “[...] encontramos o senso de nós mesmos, e da comunidade a que
pertencemos. A literatura nos diz o que somos e nos incentiva a desejar e a
expressar o mundo por nós mesmos”.
É importante que o letramento literário permita que o leitor apreenda o sentido
do texto, onde não ocorre a mera decifração de signos lingüísticos, mas envolve
também a compreensão semântica da obra textual. O trabalho docente com o
letramento literário, no entender Cosson (2012), é desenvolvido a partir de uma
sequência básica, que contempla as seguintes etapas: motivação, introdução,
leitura, intervalo e interpretação.
A motivação consiste em preparar o aluno para a leitura do texto, como forma
de estimular seu interesse, desenvolvida a partir de ações como abordagem do tema
principal da obra e a estrutura do texto, entre outros. Essa abordagem é importante
para que o educando possa se sentir desafiado a ler o texto selecionado,
assimilando informações que podem motivá-lo.
A introdução envolve a apresentação do autor e da obra para o aluno,
incorporando a antecipação de parte da obra, como forma de aguçar ainda mais o
seu interesse pela obra, apresentação física do texto e exploração dos elementos
para-textuais, levantamento de hipóteses acerca dos rumos da história, por meio da
leitura da orelha, capa, contracapa e prefácio. É importante que essa etapa não se
prolongue muito, posto que sua intencionalidade é de contribuir para que o leitor
tenha uma postura inicial favorável ao texto.
A leitura refere-se ao desenvolvimento do ato de ler pelo aluno, sendo que,
neste processo, o professor necessita efetivar um acompanhamento para que se
atenda ao objetivo previamente proposto para o letramento literário. Andrade (2008)
aponta que essa postura do docente é determinante para que o aluno faça uma
leitura significativa, podendo perceber a função que o ato de ler no âmbito social, o
que indica a importância da sua efetivação nos mais diversos ambientes e não
somente em sala de aula.
Cabe ressaltar que a realização de intervalos no decurso da leitura é
relevante, posto que o docente possa identificar as dificuldades do aluno, podendo
ter um diagnóstico mais preciso acerca da compreensão deste acerca da obra que
está lendo.
A interpretação é a etapa onde se constrói o sentido do texto, por meio de
inferências, apreensão global da obra, construção de sentido, compartilhamento de
informações entre os alunos e o registro das interpretações.
Considerando essas etapas propostas por Cosson (2012), o docente pode
enfocar de uma nova maneira o texto literário em sala de aula, o que propicia o
estímulo a leitura, onde o ato de ler se torna mais dinâmica, desafiando o leitor,
como também colaborando para que este tenha uma compreensão mais abrangente
sobre o que está lendo.
Na perspectiva do letramento literário indicada por Cosson (2012),
corresponde a um processo dinâmico no qual o leitor estabelece uma relação de
interação com o autor, por meio do texto, identificando mensagens e interpretando
significados que compõe a narrativa de uma obra ou mesmo de situações do
cotidiano, como a leitura de outdoors, por exemplo, indicando assim que a leitura
sempre tem uma finalidade.
A leitura oportuniza ao educando, segundo Juliana Carli Moreira de Andrade
(2008) no âmbito do letramento literário a condição de descobrir novos caminhos
para a aprendizagem significativa, fazendo que, no ato de ler, consiga interpretar o
texto, adquirindo novos conhecimentos.
Representa também uma condição reflexiva, que proporciona a quem lê
subsídios para realizar uma análise do contexto que envolve o texto lido, indicando
um número grande de associações entre vários aspectos que, diretamente ou
indiretamente, influenciaram na elaboração do texto, como aspectos históricos,
políticos, filosóficos ou mesmo comportamentais, realçando sua condição de pessoa
autônoma e capaz de expressar seus posicionamentos nas mais diversas situações
de forma coerente e lógica (COSSON, 2012).
Quando o leitor realiza a leitura, possui a condição de deduzir informações e
situações, estabelecendo uma reflexão durante e após o ato. A leitura também
permite uma influência do leitor com o texto e vice-versa, constituindo-se uma
atividade prazerosa, podendo incorporar o ato de ler a sua rotina.
2. METODOLOGIA
Esse artigo é resultante do emprego da metodologia qualitativa, por meio da
pesquisa-ação, oportunizando o desenvolvimento de atividades que oportunizem
atender ao objetivo proposto para sua elaboração.
Cabe ressaltar que a metodologia qualitativa caracteriza-se por permitir um
contato maior do pesquisador com o tema em estudo, principalmente com os
sujeitos que estão diretamente relacionados à sua efetivação no meio social.
Portela (2004) aponta que a metodologia qualitativa procura estabelecer um
aprofundamento maior acerca dos sentidos e dos significados do assunto em
estudo, sobretudo na sua ocorrência no meio social e as implicações que origina
junto às pessoas afeitas a sua ocorrência.
No desenvolvimento do Projeto de Intervenção Pedagógica, no Colégio
Estadual General Eurico Gaspar – EFEM, situado no município do Virmond-PR, em
uma turma do 8º ano do Ensino Fundamental, optou-se pela pesquisa-ação, que
demanda a atuação da pesquisadora junto às pessoas implicadas no processo
investigado, resultando em uma interação demarcada pela cooperação e pela
participação.
Andre Morin (2004, p. 28) aponta que a pesquisa-ação
Trata-se de uma démarche de compreensão e de explicação da práxis dos grupos sociais, pela implicação dos próprios grupos, e com intenção de melhorar sua prática. No entanto tem ainda, a pesquisa-ação, objetivo emancipatório e transformador do discurso, das condutas e das relações sociais.
Por meio da pesquisa-ação, considerando o posicionamento de Morin (2004),
no âmbito da educação, favorece o desenvolvimento da teoria na prática que, no
presente artigo, consiste no desenvolvimento do letramento literário em uma turma
do 8º ano do Ensino Fundamental.
Para ter uma condição propícia para seu desenvolvimento, foi desenvolvido
um caderno pedagógico, identificando que o planejamento é um elemento
determinante para o desenvolvimento do letramento literário, sendo que o mesmo
está disponível para consulta no Portal Dia a Dia Educação.
3. DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES PREVISTAS NO PROJETO
As atividades pedagógicas desenvolvidas no transcorrer da execução do
Projeto de Intervenção Pedagógica foram norteadas pelo método de “Sequência
Básica”, proposta por Cosson (2012), composta pela motivação, introdução, leitura e
interpretação. Esse método não era conhecido pelos alunos, o que oportunizou a
condição de terem uma percepção diferenciada da leitura, no sentido de ser
compreendida como uma prática social e não somente na decifração dos signos
linguísticos.
Foi realçado para os estudantes, desde os momentos iniciais desse projeto,
que a leitura, no contexto do letramento, possui a seguinte representatividade,
descrita por Michelle M. Devides (2009, p. 96):
[...] é um processo de interação de natureza social, não individual, vinculada às condições de comunicação que, por sua vez, vinculam-se às estruturas sociais. Deve ser significativo e propiciar uma maturidade ao leitor enquanto sujeito.
Nesse sentido, foi incentivada, a cada atividade realizada, a socialização da
opinião dos alunos acerca do que foi lido, como uma forma de evidenciar sua
capacidade de extrair significados dos textos, realçando o alcance que o ato de ler
pode ter.
No desenvolvimento do Projeto de Intervenção Pedagógica, a motivação
empregou músicas, que relatavam histórias que continham a mesma estrutura do
conto. Especificamente em relação à canção O rouxinol e a rosa, a letra remete
diretamente ao conto homônimo, de autoria de Oscar Wilde.
Nessa situação, foi possível destacar para os alunos que a literatura
consegue servir de meio para o exercício da criatividade humana, identificando a
sua natureza de prática social relevante.
A motivação conseguiu mobilizar a atenção dos estudantes, propiciando uma
participação mais significativa nas atividades propostas, oportunizando uma
interação maior no desenvolvimento do ato de ler com os textos disponibilizados. As
demais etapas do letramento literário (introdução, leitura e interpretação) foram
desenvolvidas em cada atividade proposta, sobretudo de oportunizar aos educandos
expor suas percepções constituídas ao término do ato de ler, realçando a
compreensão que tiveram.
O incentivo a socialização é decorrente da identificação de que, segundo
Silva e Martiniak (2013, p. 60) “[...] a leitura só se torna significativa para o aluno
quando ele decifra as palavras, apropria-se das ideias e fala sobre o que leu a seu
modo, como ele interpretou o texto”.
Outro aspecto a ser realçado foi à receptividade em relação à participação de
duas pessoas da comunidade, que narraram o conto O tesouro escondido,
apresentando visões particularizadas acerca deste tema. Essa participação suscitou
até a atenção da diretora da escola, que acompanhou o desenvolvimento da
atividade.
A participação das pessoas, além de oportunizar aos estudantes a terem
contato com o conto oral, teve como intenção, baseada na perspectiva elaborada
por Alessandra Giordano (2013, p. 6) estabelecer
[...] uma relação baseada no prazer de poder apresentar um conto como uma porta para abrir o imaginário e também apresentar o mundo das diferentes culturas, pois se trata de oportunizar a apropriação (que o ouvinte faz) da palavra do contador, dando sentido a ela e integrando-a em seu universo pessoal
Os educandos questionaram muito os participantes, procurando obter maiores
detalhes, que foram empregados na produção textual que elaboraram a partir dos
fatos descritos.
A produção textual foi incentivada ao longo das atividades desenvolvidas,
oportunizando aos alunos exporem suas percepções e suas opiniões acerca do que
compreenderam no decurso da realização do ato de ler.
Houve, assim, a intenção de estabelecer uma relação entre leitura e escrita,
identificando que, conforme preceitua o letramento literário, os conhecimentos
adquiridos no ato de ler fundamentam a elaboração de textos escritos pelos
educandos, propiciando maior profundidade as ideias e aos argumentos
estruturados (COSSON, 2012).
Essa produção se tornou mais significativa com a utilização dos contos de
Marina Colasanti que consegue incorporar temáticas de relevância social nas
histórias que narra, estimulando os educandos a buscarem os significados contidos
no texto, como também estabelecer relações com situações existentes no âmbito
social.
Um fator que colaborou para a elaboração dos textos por parte dos alunos foi
à divisão em grupos, que oportunizou a condição de haver uma interação constante,
com o intercâmbio de opiniões, resultando em uma atividade onde estes puderam
posicionar-se diante dos contos lidos.
Contudo, cabe ressaltar que houve a necessidade de intervenção da docente
em um dos grupos formados devido à falta de compartilhamento e de diálogo entre
os componentes. Para resolver a situação, os componentes desse grupo foram
redistribuídos entre os demais grupos, não havendo mais problemas disciplinar
significativos no transcorrer do Projeto de Intervenção Pedagógica.
A leitura dos contos de Marina Colasanti demandou uma maior participação
da docente, sobretudo pelo fato dos estudantes terem algumas dificuldades em
compreender algumas passagens do texto, devido à linguagem simbólica utilizada.
Outro aspecto percebido foi o vocabulário reduzido de parte dos estudantes, sendo
realçada, neste momento, a importância da leitura para a incorporação de novas
palavras ao repertório vocabular.
As dificuldades foram superadas também com a relação do texto de Marina
Colasanti com outros textos enfocando a temática constante no conto. A experiência
que mais suscitou a atenção ocorreu com o conto A morte e o rei (COLASANTI,
2005) e a história em quadrinhos Dona Morte em boa ação, (SOUZA, 2002), onde os
alunos puderam identificar as percepções diferenciadas acerca da morte abordadas
pelos autores, oportunizando um aprofundamento maior em relação ao conto, que
apresenta uma história mais complexa, mas também mais atrativa em função de
instigar o leitor a compreender a mensagem proposta pela autora.
Em cada conto abordado, foram realizadas diferentes atividades, como
cruzadinhas e caça-palavras, mas houve um enfoque maior na interpretação, com a
utilização de questões e socialização da interpretação efetivada pelos educandos,
favorecendo o debate em sala de aula acerca dos sentidos e dos significados
propostos pelos contos de Marina Colasanti.
A valorização da interpretação decorre do fato de representar, segundo
Cosson (2012), a criação do sentido do texto, possibilitado pelo desenvolvimento de
um diálogo que abrange o leitor, autor e a comunidade, sendo esta representada
pela interação realizada com os demais colegas em sala de aula, contribuindo para
que se tenha uma compreensão mais significativa do texto.
Essa compreensão foi elaborada com a utilização de instrumentos como a
pesquisa, na biblioteca e no laboratório de informática, permitindo que os estudantes
pudessem estabelecer uma relação mais significativa com os contos, como também
tomando ciência acerca da autora e das características históricas relacionadas ao
enredo e aos personagens.
Ao desenvolver essas ações, foi possível evidenciar aos alunos que o leitor
não se resume a ler um determinado texto, mas de buscar constituir conhecimentos
e significados sobre o que leu, buscando referências em outros textos ou em outros
contextos, como os disponibilizados pela internet, evidenciando a condição de
prática social da leitura (SOUZA e COSSON, 2007).
As produções textuais realizadas após a aplicação das etapas do letramento
literário foram socializadas com a comunidade escolar, por meio da rádio escola,
sendo lido o conto escolhido pela turma, no programa denominado de “A Hora do
Conto”, e, ao término do Projeto de Intervenção Pedagógica, a publicação de uma
coletânea com os contos selecionados, que foram lidos para os alunos dos demais
anos do colégio.
Os estudantes participaram ativamente nessas atividades, sendo que alguns
até superaram o embaraço inicial em interagir com outras pessoas, principalmente
na interação com os colegas na leitura dos contos selecionados na coletânea, além
de realçarem o gosto pelos contos de Marina Colasanti.
Nos intervalos, previsto por Cosson (2012), os alunos puderam esclarecer
suas dúvidas, como também entrar em contato com outros autores de contos,
identificando um interesse genuíno tanto pelo gênero como pela prática da leitura,
identificando que, ao longo do desenvolvimento do Projeto de Intervenção
Pedagógica, houve alguns avanços em relação ao ato de ler.
Nesse contexto, é importante que o docente desenvolva práticas como o
letramento literário, como uma forma de estabelecer uma perspectiva diferenciada
em relação ao ato de ler para o aluno, que pode incorporá-la como um hábito.
Além das atividades desenvolvidas no referido colégio, o material didático
empregado para o Projeto de Intervenção Pedagógica ficou disponíveis no Grupo de
Trabalho em Rede (GTR), no Portal Dia a Dia Educação, gerenciado pela Secretaria
de Estado da Educação do Paraná.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O letramento literário revelou-se, ao longo do desenvolvimento do projeto,
como um importante recurso pedagógico para propiciar aos alunos terem uma noção
mais significativa da leitura, sobretudo de sua natureza de prática social, que
favorece até a compreensão da realidade.
Foi possível identificar que o ato de ler, na escola, ainda é pautado na
decodificação dos signos linguísticos, não sendo promovida uma interação maior
entre os gêneros textuais, tampouco o estímulo ao aluno verbalizar sua
compreensão, fazendo com que se atenha a produção de resenhas, resultando em
um desenvolvimento parcial de sua capacidade de leitura e, em consequência, da
sua escrita.
A realização das atividades conseguiu motivar os alunos do 8º ano do Ensino
Fundamental, sendo que a obra de Marina Colasanti teve grande destaque, devido
às características de sua obra, sobretudo de conciliar aspectos relacionados aos
contos de fadas com temáticas de natureza social, demandando do educando maior
atenção para compreender o que está lendo, como também empregar sua
imaginação para preencher as lacunas, fazendo com que percebesse a riqueza do
ato de ler.
O projeto de intervenção priorizou a formação de um leitor ativo, onde o
educando passasse a empregar seus conhecimentos para a construção de sentidos
do texto. Nas atividades propostas, esse objetivo foi alcançado, mas é importante
ressaltar que o letramento literário demanda continuidade, para que ocorra a
formação de um leitor crítico, com condições de reconhecer a condição de prática
social da leitura.
REFERÊNCIAS
ANDRADE, Juliana Carli Moreira de. O letramento literário em uma comunidade rural do Pontal do Paranapanema. Dissertação de Mestrado. Maringá: UEM, 2008. ARCOVERDE, Maria Divanira de Lima. Leitura, interpretação e produção textual. Natal: UFRN, 2007. COLASANTI, Marina. 23 histórias de um viajante. São Paulo: Global, 2005. COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2012. DEVIDES, Michelle M. A leitura na instituição escolar enquanto prática sociocultural. Revista Espaço Pedagógico, v. 16, n. 2, p. 94-107, julho/dezembro de 2009. FEITOSA, Rosane Gazolla Alves; AMARAL, Juliana Reis do. O conto como incentivo à leitura, análise e produção de textos. São Paulo: UNESP, 2006.
GALVÃO, Andréa; LEAL, Telma Ferraz. Há lugar ainda para métodos de alfabetização? Conversa com professores (as). In: Alfabetização: apropriação do sistema de escrita alfabética. Belo Horizonte: Autêntica, 2005, p. 12-28. GIORDANO, Alessandra. A arte de contar histórias e o conto de tradição oral em práticas educativas. Construção Psicopedagógica, v. 21, n. 22, 2013. KLEIMAN, Ângela. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. Campinas: Pontes, 1999. MOURA, Gehilde Reis Paula de. Letra, letramento e liberdade. São Paulo: SENAC, 2006. MORIN, Andre. Pesquisa-ação integral e sistêmica – uma antropopedagogia renovada. São Paulo: DP&A, 2004. PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação do Paraná. Diretrizes Curriculares da Educação Básica – Língua Portuguesa. Curitiba: SEED/PR, 2008. PORTELA, Girlene Silva. Pesquisa quantitativa ou qualitativa? Eis a questão. Feira de Santana: Universidade Estadual de Feira de Santana, 2004. SILVA, Edilaine Botão da; MARTINIAK, Vera Lúcia. A leitura como uma prática social na escola: um estudo com alunos dos anos iniciais. Revista Profissão Docente, v. 13, n. 28, p. 58-69, janeiro/junho de 2013. SILVA, Ezequiel Theodoro da. A produção da leitura na escola: pesquisas x propostas. São Paulo: Ática, 2004. SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2003. _______________. Alfabetização e letramento: caminhos e descaminhos. Revista Pátio, v, 15, n. 9, p. 106-108, 2004. SOUZA, Maurício. Dona morte em boa ação. Revista em Quadrinhos Cebolinha, ed. 186, Rio de Janeiro: Editora Globo, 2002, p. 19-21. SOUZA, Renata Junqueira de; COSSON, Rildo. Letramento literário: uma proposta para a sala de aula. São Paulo: UNESP, 2007. TASSIANA, Ana Cláudia. Um pouco de Marina Colasanti. Contos & Encontros, ed. 8, abril de 2009. ANEXOS
ANEXO 1 – IMAGENS
IMAGEM 1 – PESSOAS DA COMUNIDADE ACOMPANHANDO O DESENVOLVIMENTO DE UMA ATIVIDADE JUNTO COM OS ESTUDANTES Fonte: Arquivo Pessoal (2014)
IMAGEM 2 – ALUNOS FAZENDO UMA ATIVIDADE EM GRUPO Fonte: Arquivo Pessoal (2014)
IMAGEM 3 – RÁDIO DA ESCOLA ONDE ERA TRANSMITIDA A LEITURA DOS CONTOS PARA A COMUNIDADE ESCOLAR Fonte: Arquivo Pessoal (2014)
IMAGEM 4 – CAPA DA COLETÂNEA DOS CONTOS SELECIONADOS PELOS ALUNOS AO LONGO DO DESENVOLVIMENTO DA PROPOSTA DE INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA Fonte: Arquivo Pessoal (2014) ANEXO 2 – CONTO ELABORADO POR UM GRUPO DE TRABALHO
O tesouro escondido
Três amigos trabalhavam juntos, não estudaram na esperança de encontrar
algum tesouro escondido.
Certa vez um dos amigos teve um sonho, que deveria procurar o tesouro. No
dia seguinte correu para contar aos amigos.
Então um sonhou que não deveria ir porque encontrariam fantasmas. Já o
outro que não teve nenhum sonho começou a insistir que deveriam ir à procura. O
que estava em dúvida teve mais um sonho, que encontrariam o tesouro ao lado de
uma porteira embaixo de uma figueira branca.
Ficaram muito tempo a procura da tal fazenda, mas nenhuma tinha a figueira
branca. Depois de muita procura os amigos encontraram, mas não podiam contar
nada para o patrão, porque ele iria tirar e ficar com tudo. Deveriam esperar porque
cada sonho tinha um procedimento diferente para a retirada do tesouro. Em uma
noite as escondidas do patrão começam a cavar e encontraram o tão sonhado
tesouro. Começam a dividir por partes iguais porque era o que um dos sonhos dizia.
Um dos amigos sugere ir buscar pinga e no caminho acha um jeito de ficar
com o tesouro para si, colocando veneno na bebida. Mas os outros também
pensavam em não dividir porque enquanto eles trabalhavam o outro passeava a
cavalo atrás de pinga e também pensando um jeito de livrar-se dele e resolvem
matá-lo com um tiro. Quando ele chegava deram um tiro e o mataram e se
encontrassem o corpo diriam que foi um assalto. Tomaram a pinga sem pensar que
ela estava envenenada e os três acabaram morrendo e o tesouro volta a se
encantar e enganar outras pessoas.