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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3 Cadernos PDE I

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA … · cresceu, a televisão foi adotada como meio de comunicação da cultura em massa, jornais e revistas reformularam-se, surgiram

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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE

I

¹ Professora PDE 2014, graduada em Letras Português-Inglês e pós-graduada em Língua Inglesa pela Faculdade de Palmas - Pr. Pós -graduada em Ensino Lúdico pela Universidade Cidade de São Paulo. ² Orientadora IES UNICENTRO, graduada em Letras Português-Inglês pela Universidade Federal de Uberlândia-MG, Mestre e Doutora em Letras/Estudos Literários pela Universidade Estadual de Londrina, pós-doutoranda em Teoria e História da Literatura pela Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP.

SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCACAO – SEED

SUPERINTENDENCIA DA EDUCACAO - SUED DIRETORIA DE POLITICAS E PROGRAMAS EDUCACIONAIS – DPPE

RESGATANDO O SENTIDO DA LEITURA ATRAVÉS DO

LETRAMENTO LITERÁRIO E CÍRCULOS DE LEITURA.

Cláudia Regina Cachoeira¹

Stela de Castro Bichuette da Silva²

RESUMO: Considerando a função da escola enquanto formadora de leitores e percebendo a reação negativa dos alunos em relação à leitura, bem como seu papel de mero decodificador, surge então a necessidade de reavaliarmos nossas práticas e encontrarmos novas metodologias a fim de melhorá-las. Nesse sentido, este estudo tem como finalidade um repensar sobre estratégias metodológicas, os materiais didáticos e práticas pedagógicas utilizadas, com o intuito de incentivar nossos alunos a ler literatura e instigar-lhes a alcançar uma leitura eficiente. No decorrer deste artigo, buscou-se discorrer sobre A Importância da Literatura, A Literatura, A Formação do Leitor e a Escola, A História da Formação do Gênero Literário Infantil, A Literatura na Escola e O Trabalho da Literatura através do Letramento Literário e dos Círculos de Leitura. Baseando-se na pesquisa bibliográfica de autores renomados, dentre eles Rildo Cosson em suas obras Letramento Literário: teoria e prática e Círculos de leitura e letramento literário. Buscou-se elaborar uma Unidade Didática na qual desenvolveu-se a Sequência Básica do Letramento Literário, Memórias da Leitura e o Círculo da Leitura com as narrativas ‘Marcelo, marmelo, martelo’ de Ruth Rocha e ‘Prazeres do Pê’ de Cecília Vasconcellos, ambas desenvolvidas com uma turma de 6º ano do Ensino Fundamental II apresentando resultados muito satisfatórios.

PALAVRAS-CHAVE: Letramento. Memórias. Círculos de Leitura. Motivação.

I. Introdução

Através da literatura (ou leitura literária) é possível imaginar, indagar,

investigar, criar hipóteses, nos apaixonar e até mesmo sonhar com um mundo

diferente. Tendo isso em mente e considerando a constante preocupação com a

leitura literária nas escolas, propõem-se buscar caminhos por meio de aportes

teóricos que enriqueçam e até mesmo facilitem o trabalho com a Literatura Infantil,

culminando em um processo de leitura/formação de sentido e ampliação de

horizontes, visando melhorar o entendimento e o relacionamento entre a obra

literária e o próprio leitor/aluno.

A relação entre texto-aluno-professor deve ser harmoniosa e significativa,

capaz de preencher vazios e conduzir o leitor a auto compreensão. O conhecimento

e o gosto pela leitura são requisitos primordiais para a formação da competência de

leitores eficazes, que através das diversas interpretações que a obra literária suscita

sempre aprende com elas, descobre o prazer de ler, amplia sua criticidade, visão e

entendimento de mundo. Dentre as práticas que articulam a leitura, a literatura

ocupa uma posição privilegiada, pois proporciona o domínio da palavra a partir dela

mesma. Por essa característica, o letramento literário propõe à escola um tratamento

que enfatize a experiência da literatura totalmente diferenciado das atividades

mecânicas e enfadonhas que até então vinham sendo realizadas.

O letramento literário é uma proposta de ensino da leitura literária na escola

básica, complementado com atividades que envolvem memórias da leitura e o

próprio círculo da leitura, desenvolvido a partir de uma sequência didática que

envolve e motiva o aluno a participar de todas as etapas, até atingir o ápice do

letramento literário, que é a real interação entre o leitor e o texto, desenvolvendo

nele a capacidade de ler literatura de uma maneira significativa, percebendo os

efeitos de sentido que dela decorrem, tornando-se capaz de interagir com o texto

construindo significados a partir de suas próprias experiências e conhecimentos

dando sentido ao mundo através das palavras, transcendendo os limites de tempo e

espaço.

II. A Importância da Literatura.

A literatura hoje não está tão presente nas salas de aula quanto deveria, para

muitos professores ela é um conteúdo que só tem valor se acompanhada de algum

cunho pedagógico e avaliativo, nos diz Antônio Candido em “A Literatura e a

Formação do Homem” (1972, p.82) que:

Há um momento crítico, que indaga sobre a validade da obra, e sua função como síntese e projeção humana, demarcando a literatura como força que humaniza e não como um sistema de obras. Algo que exprime o homem e depois atua na própria formação do homem.

Antônio Candido (1972) aponta ainda que devemos ter novas perspectivas de

pensar a literatura no ambiente escolar, a leitura literária precisa deixar de lado sua

posição estruturalista e formal e compreender as expectativas do leitor, voltando-se

para sua função humanizadora, possibilitando-lhe a identificação entre seu universo

e o universo expresso pela obra literária. A literatura sistematizada através da

fantasia, sentimentos e devaneios, permite a fruição de novas possibilidades

conferindo novos significados às palavras e ao mundo.

Nenhum professor deve relutar em diversificar práticas de leitura, estimulando

nos educandos a sensibilidade, o senso crítico e a capacidade argumentativa. Quem

lê desenvolve o lado sonhador e imaginativo, satisfazendo suas necessidades,

assumindo uma posição crítica, construtiva e significativa em relação ao mundo.

Através das reflexões que a literatura possibilita, faz-se necessário então,

incutirmos em nós e em nossos alunos que a literatura é algo bom e natural, que nos

dá prazer, sendo imprescindível o convívio com os livros e que isto não se limite ao

solicitado pela escola, pois segundo Candido (1972) a função educativa da literatura:

“É muito mais complexa do que pressupõe um ponto de vista estritamente

pedagógico, ou seja, ensinar regras, modelos comportamentais entre outros”. No

entanto, conceitos de estrutura e função das obras literárias precisam deixar de ser

relativos ao autor e ao valor social, enfocando a obra como objeto de aquisição e

produção do conhecimento humano.

Segundo Candido (1972), a função psicológica surge a partir da necessidade

e capacidade que o homem tem de fantasiar através de músicas, amor e sonhos, é

o fantástico expresso pela literatura vinculado à realidade, a forma mais rica de

literatura. Logo, a função formadora tem ligação com o real, atuando como

mecanismo da formação humana e de sua educação, mostrando realidades e

ideologias. Ainda, de acordo com Candido, a função social está ligada à

identificação do leitor com o universo representado na obra literária, possibilitando-

lhe reconhecer a realidade que o cerca transportando-a para o mundo da ficção e

imaginação.

Todo ser humano tem o direito de conhecer e ler, de forma fantasiosa ou

intelectual uma obra literária, ou como salienta Candido (1988), todos devem ter

acesso à obra literária, independendo do seu grau de formação, a compreensão se

dá a maneira que cada um se reconhece no mundo em que está inserido no

momento da interpretação, pois a literatura tem o poder de torná-lo cada vez mais

humano e sensível, sentindo-se parte real, total e significativa da humanidade.

III.A literatura, a Formação do Leitor e a Escola

História da Formação do Gênero Literário Infantil.

A literatura infantil tem sua origem marcada nos séculos XVII e XVIII, atrelada

às mudanças que ocorreram na estrutura familiar burguesa da época. A concepção

de infância que até então não existia, começou a ter representação e livros “infantis”

passaram a ser escritos transmitindo os valores burgueses. Sobre o assunto, Regina

Zilberman, em A literatura infantil na escola (1985, p.91), escreve que:

Visando a integração ao meio burguês ou à sua liberação e criatividade, a

literatura infantil evidencia sempre a preocupação do adulto para com a

criança. Nessa medida trata-se de um tipo de comunicação assimétrica em

que é endossada a influência do primeiro sobre a segunda, uma vez que

colabora na configuração de seus valores ideológicos.

As ideologias burguesas no texto infantil comprometeram seu reconhecimento

como forma de expressão artística e o gosto das crianças pela leitura. Porém,

surgiram algumas obras que se diferenciaram, dentre elas os contos de fada,

direcionados realmente ao público infantil, os quais exploravam o fantástico e a

aventura, o que pode ser considerado realmente como o início da Literatura Infantil.

No Brasil, surgiu no final do século XIX, com algumas dificuldades, destacando-se

quatro fases distintas por suas concepções ideológicas.

Entre os séculos XIX e XX, surgem às primeiras tentativas de formação do

público leitor infantil, marcadas por um compromisso pedagogizante, incentivando os

valores patrióticos e algumas obras estrangeiras traduzidas e adaptadas.

Na segunda fase, 1920 a 1945, houve uma efervescência política, intelectual

e artística, a educação ficou fragilizada atingindo altos índices de analfabetismo,

criou-se então a Escola Nova, defendendo uma pedagogia laica. A literatura infantil

foi marcada como momento-histórico, em 1921 quando de acordo Saraiva (2001

p.37) “nasceu oficialmente, através das mãos de Monteiro Lobato”, algumas obras

com um novo caráter pedagógico surgiram, utilizando clássicos e o folclore

brasileiro, renovando a metodologia da escola tradicional. Nas décadas de 30 e 40

em meio à Segunda Guerra Mundial, surge o populismo, na literatura infantil

observa-se que autores contemporâneos restringem-se à reprodução da história

nacional, objetivando a ideologia nacionalista.

A terceira fase, de 50 e 60 é a década da democracia, houve ascensão

política e crescimento industrial. Em 1961 propõem-se reformas para sair da crise

que desagradam a classe média, instalando-se no país o movimento cívico-militar e

vários Atos Institucionais foram impostos com repressão e censura.

Na década de 50, constata-se a vigência da Reforma Capanema, voltada

para a educação, quando foi aprovada a Lei de Diretrizes e bases da Educação

Nacional. Surgem os primeiros movimentos de educação popular e a reforma da

Universidade de Brasília, extinguindo-se devido ao golpe de 1964. A cultura erudita

cresceu, a televisão foi adotada como meio de comunicação da cultura em massa,

jornais e revistas reformularam-se, surgiram revistas semanais e em quadrinhos

para crianças, ficção científica e investigação policial. A literatura infantil manteve um

caráter conservador, os temas abordados desprezavam o homem do campo e suas

características.

Perpassando as décadas de 70 e 80, a quarta fase foi a época de

transformações aceleradas, ascensão e queda econômica. Na literatura infantil, um

aumento significativo de autores e títulos relacionados à narrativa e a poesia. Com o

Modernismo de 1922, as obras perderam o padrão formal, apresentando gírias,

dialetos e falas regionais.

A poesia rompeu o tradicionalismo enfocando-se o cotidiano, a

independência, a criação e a rebeldia infantil, a relação criança-natureza, as

sensações e o mundo das cores, recuperando-se o folclore oral. Na Literatura

Infantil no Brasil ora predominava a quantidade, ora a qualidade, conquistando seu

status artístico.

Literatura na Escola.

A escola e os conteúdos eram dominados pela Igreja Católica, a pedagogia

baseada na memorização, acúmulo de conhecimentos, moralização, controle do seu

desenvolvimento intelectual e manipulação de suas emoções para que atender aos

padrões exigidos. Em A literatura Infantil na Escola, Regina Zilberman, (1985, p.13)

analisa que:

A nova valorização da infância gerou maior união familiar, mas igualmente

os meios de controle do desenvolvimento intelectual da criança e a

manipulação de suas emoções. Literatura infantil e escola, inventada a

primeira e reformada a segunda, são convocadas para cumprir esta missão.

Com as preocupações voltadas à criança, surge a necessidade de uma

literatura que contribuísse para sua formação como indivíduo, deixando de lado o

caráter que evidenciava a fragilidade infantil e a superioridade do adulto. No período

chamado por poetas românticos de “excelência da vida”, a criança vive ilhada do

mundo real, para manter essa autoridade e dominação adulta.

A escola assume um papel de duplicidade nesse processo: introduzir a

criança à vida adulta e protegê-la das agressões do mundo. O espaço escolar

continua sendo um ambiente separado da coletividade, pois muitas vezes mantem o

normativo, com isso a educação perde sua inocência, e a escola sua neutralidade.

Surge a elaboração de um conjunto de ideias, concepções e atividades, que

buscam validar a educação, a Pedagogia, porém, patrocinada pela burguesia

solidifica a valorização da infância com caráter diferenciado, mantendo a fragilidade

e a necessidade de proteção. Para Zilberman (1985, p.20) “a escola participa do

processo de manipulação da criança, conduzindo-a ao acatamento da norma

vigente”. No entanto, precisamos buscar instrumentos para que estas tornem-se

formadoras da reflexão infantil, bem como da sua condição de existência diante do

mundo.

A atuação da escola e da literatura sobre o indivíduo é ativa e dinâmica, e

este não permanece indiferente aos seus efeitos. A literatura utiliza recursos de

ficção para sintetizar uma realidade vivida pelo leitor através da fantasia, auxiliando-

o a se conhecer melhor. A escola possui uma finalidade sintetizadora, transformando

e apresentando aos estudantes através das disciplinas, uma realidade viva, por isso,

romper barreiras na escola, a fim de que o estudante exerça um papel ativo no

processo de mudança e reestruturação do trabalho com a obra literária, requer

algumas opções do professor, que podem ser delimitadas pela escolha do texto e

pela adequação deste ao leitor. Constatamos em Saraiva (2006 p.40) que:

A obra de arte e, em especial a literatura podem assumir a função de gerar,

criticar e renovar padrões sociais de comportamento, tendo em vista que,

pela identificação, provocam a adesão afetiva do leitor, traduzindo,

igualmente, o apelo à transformação da própria realidade social.

Com intuito de valorizar a literatura infantil implantou-se a disciplina de

Literatura Infantil em cursos universitários como Letras e Pedagogia, elencando

alguns objetivos, especialmente a preparação dos docentes e o fornecimento de

instrumentos adequados, para que este possa desempenhar com sucesso sua

função didática. Faz-se necessário um currículo universitário que forme um

profissional apto, que utilize recursos metodológicos que estimulem a leitura, a

compreensão e a verbalização do sentido apreendido pelos alunos, conhecendo um

bom acervo literário e ainda técnicas e métodos de ensino que auxiliem no processo

de estímulo à leitura, reiterando que este suporte deve ser obtido pelo futuro docente

junto à instituição de ensino superior.

O trabalho da Literatura Através do Letramento Literário e Círculos de

Leitura.

As Diretrizes Curriculares da Educação Básica de Língua Portuguesa, nos

apontam que a literatura está inerentemente ligada à vida social do leitor, sugerindo

que o ensino da literatura seja embasado na Teoria da Estética da Recepção

elaborada por Hans Robert Jauss (1994) e na Teoria do Efeito, elaborada por

Wolfgang Iser, as quais buscam o envolvimento entre obra/autor/leitor, formando um

leitor capaz de sentir, expressar-se e interagir através da prática da leitura, cabendo

à escola trabalhar a literatura em sua dimensão estética.

Partindo destes pressupostos, as professoras Maria da Glória Bordini e Vera

Teixeira de Aguiar elaboraram o Método Recepcional, sugerido nas DCEs como

encaminhamento metodológico para o trabalho com a Literatura. Proposta de

trabalho que divide-se em cinco etapas: a) momento de determinação do horizonte

de expectativa do aluno/leitor; b) atendimento ao horizonte de expectativas; c)

ruptura do horizonte de expectativas; d) direcionamento do sujeito a um

questionamento do horizonte de expectativas; e) ampliação do horizonte de

expectativas, e consequentemente de conhecimentos.

A leitura literária atende a diversas finalidades, entre elas, o prazer, a fruição

e a reflexão. Assim, repensar e ressignificar suas práticas implica a promoção do

letramento literário, uma discussão que vem sendo disseminada nas escolas. As

práticas que articulam a leitura, a escrita e a produção de textos em contextos

diversos, o desenvolvimento de comportamentos e habilidades de uso competente

da leitura e da escrita em práticas sociais são denominadas letramento.

A literatura ocupa uma posição privilegiada, pois proporciona o domínio da

palavra a partir dela mesma. Por essa característica, o letramento literário propõe à

escola um tratamento que enfatize a experiência da literatura, totalmente

diferenciado das atividades mecânicas e enfadonhas que até então vem sendo

realizadas.

No livro “Letramento Literário: teoria e prática”, para que a aprendizagem

literária ocorra de modo satisfatório, em que o leitor efetive um movimento contínuo

de leitura, promovendo uma reflexão acerca do uso da literatura para esta seja uma

prática viva em sala de aula, partindo do conhecido para o desconhecido a fim de

que o aluno consiga construir um sentindo, Rildo Cosson nos apresenta uma

proposta com o cunho de fortalecer e ampliar a educação literária no ensino básico,

buscando formar uma comunidade de leitores que vá além da escola e da sala de

aula com outros membros no tempo e no espaço. Para que o leitor possa construir a

si e ao seu mundo dentro de uma comunidade de leitores, para Cosson (2009, p.

45):

É necessário que o ensino da Literatura efetive um movimento contínuo de

leitura, partindo do conhecido para o desconhecido, do simples para o

complexo, do semelhante para o diferente, com o objetivo de ampliar e

consolidar o repertório cultural do aluno.

Pensando em leitura da literatura como fenômeno cognitivo e social, Cosson

relata que é possível agrupar as diversas teorias literárias em três grandes grupos,

um centrado no texto, outro que define o leitor como centro da leitura e um terceiro

grupo, que apresenta o leitor tão importante quanto o texto, fazendo com que essa

interação resulte na leitura.

Tem-se, então, os três modos de compreensão da leitura, que Cosson define

como as três etapas do processo de leitura, as quais guiam a proposta de

letramento literário por ele descrita: a) Antecipação – às várias operações que o

leitor executa antes de penetrar no texto propriamente dito; b) Decifração – a

entrada no texto através das letras e das palavras, a familiarização; c) Interpretação

– criação do sentido do texto.

No letramento literário, os interesses são a aquisição de habilidades de ler

gêneros literários e o aprendizado da compreensão e da ressignificação de textos

através da motivação de quem ensina e de quem aprende. “As práticas de leitura de

sala de aula precisam contemplar o processo de letramento literário e não apenas a

mera leitura da obra” (COSSON, 2009, p.44).

A literatura abrange três tipos de aprendizagem: a aprendizagem da literatura;

a aprendizagem sobre a literatura; e a aprendizagem por meio da literatura. Cosson

propõe uma reflexão acerca da literatura em sala de aula, a fim de que o aluno

consiga construir um sentido e apresenta duas formas para desenvolvermos

atividades com a literatura: a sequência básica e a sequência expandida, caminhos

cujas atividades a serem trabalhadas nas aulas de Literatura, podem se multiplicar

de acordo com o interesse e o contexto dos leitores, que devem ser vistas como

exemplos do que se pode fazer e não como modelos acabados, podendo ainda ser

complementadas com os Círculos de Leitura.

A sequência básica é constituída por quatro passos: motivação, introdução,

leitura e interpretação. A motivação é a preparação do aluno para que ele “entre” no

texto, se dá de forma lúdica, com uma temática relacionada ao texto que será lido

com objetivo de instigar a leitura proposta. De acordo com Cosson (2009, p. 50) “O

sucesso inicial do encontro do leitor com a obra depende de boa motivação”. Na

introdução é feita a apresentação do autor e obra, independente da estratégia

utilizada, o professor não pode deixar de apresentá-la fisicamente aos alunos.

Segundo Cosson não devemos perder de vista nossos objetivos; pois a leitura

escolar precisa de acompanhamento e direcionamento, convém ressaltar os

intervalos sugeridos, nesses espaços de tempo, o professor tem a oportunidade de

aferir as dificuldades de leitura dos alunos, e buscar possíveis soluções para que

este não perca o interesse ao longo da leitura. A interpretação constitui-se das

inferências para chegar à construção do sentido do texto, um diálogo que envolve

autor, leitor e comunidade, o importante na interpretação é que o aluno tenha a

oportunidade de fazer uma reflexão sobre a obra lida, e ainda externá-la

estabelecendo um diálogo entre os leitores da comunidade escolar. A interpretação

se dá em dois momentos: o momento interior, a decifração, é o encontro do leitor

com a obra, não pode ser substituído por nenhum tipo de intermediação como

resumo ou filme do livro; o momento exterior, a materialização da interpretação, é a

construção de sentido do texto em uma determinada comunidade.

A sequência expandida, apresenta as mesmas etapas da sequência básica,

no entanto, com dois momentos de interpretação, um é a compreensão global dos

textos, os aspectos formais, o segundo momento é o aprofundamento de um dos

aspectos do texto que seja mais pertinente para os propósitos do professor, a

diferença entre uma sequência e a outra está na complexidade do trabalho. A

sequência básica está mais próxima aos alunos dos anos iniciais 1º ao 5º ano e a

expandida pode ser solicitada aos alunos do fundamental e médio. Na fase de

expansão da sequência, Cosson enfatiza a importância de se destacar os processos

de intertextualidade, explorando os diálogos possíveis com outras obras.

Outro tópico ligado ao letramento literário abordado por Cosson faz referência

à avaliação, que devem ser apropriadas e atuais, nas quais o professor deve

considerar a literatura como uma experiência e não como um conteúdo, que alunos

possam ser avaliados de forma constante, com o objetivo de diagnosticar as

dificuldades, assim como os avanços obtidos por eles.

Os Círculos de Leitura são uma prática de leitura e compartilhamento coletivo

de textos, que em uma reunião de um grupo de pessoas objetivam discutir,

comentar e argumentar sobre a leitura de uma obra literária. No trabalho com o

Letramento Literário, este encontro é realizado como a parte de encerramento do

trabalho de leitura e envolve os alunos, professores de outras disciplinas, pais de

alunos e toda comunidade escolar.

Os círculos de leitura podem ser agrupados em três tipos: os estruturados: os

participantes seguem um roteiro com atividades bem definidas; os semiestruturados:

são controlados por um condutor, que organiza as atividades e orienta o processo; e

os abertos ou não estruturados: têm condução coletiva das atividades de leitura.

Criar o Círculo de Leitura na escola e divulgar a sua importância, é uma forma

de oportunizar novas perspectivas de incentivo à leitura. Observamos em Círculos

de Leitura e Letramento Literário, Rildo Cosson (2014, p.139)

Dentre as muitas e diversas maneiras de constituição explícita ou formal de

comunidades de leitores, isto é, de grupos de leitores que se reconhecem

como parte de uma comunidade específica, o círculo de leitura é uma

prática privilegiada.

Independentemente do formato as escolas têm adotado cada vez mais este

método, que quando aplicado corretamente tem alcançado a eficácia e o sucesso

esperado.

I. A Implementação Pedagógica

A elaboração e aplicação da Produção Didático Pedagógica, desenvolvida na

Implementação seguiu as teorias de Rildo Cosson e a LDB, tendo como base o

Letramento Literário e o Círculo de Leitura, com formato de unidade didática

seguindo os passos da sequência básica. Pode-se afirmar que esta teve uma boa

aprovação e aceitação na comunidade escolar. A referida Implementação

Pedagógica foi desenvolvida com os alunos do 6º ano “C” do Colégio Estadual Alto

Recreio, com os quais foram trabalhadas duas narrativas empregando a Sequência

Básica, “Marcelo, marmelo, martelo” de Ruth Rocha e “Prazeres do Pê” de Cecília

Vasconcellos.

Em “Marcelo, marmelo, martelo”, como motivação o professor conversou com

os alunos sobre os nomes de cada um, depois propôs a eles uma investigação

através de uma pesquisa o significado dos seus nomes, em seguida pediu-lhes que

fizesse seus nomes ilustrados/personalizados/estilizados em folhas, os quais ficaram

expostos na sala de aula. Depois assistiram ao clipe da música“ Gente tem

sobrenome” de Toquinho, e iniciou-se um questionamento oral sobre a origem dos

nomes das coisas, após a conversa, a professora passou uma caixa com figuras

escondidas relacionadas à obra “Marcelo, marmelo, martelo”, solicitando aos alunos

que dessem outros nomes para as figuras, que também foram recebidas em formato

menor em uma folha de sulfite para recorte e colagem no caderno, iniciando a

formação de um dicionário de palavras.

Para a Apresentação, mostrou-se o livro aos alunos chamando atenção para

a capa, a fim de que todos visualizassem, lessem o nome da história e da autora.

Através de alguns slides fez-se uma breve apresentação sobre Ruth Rocha e outras

obras dela chamando atenção para “Marcelo, marmelo, martelo”, solicitando aos

alunos uma pesquisa sobre a biografia da autora, para que na aula seguinte,

fizessem a leitura e confeccionassem um cartaz.

Com relação à Leitura, o professor iniciou a leitura da primeira página da

obra, em seguida convidou os alunos a seguirem a leitura, individualmente e de

forma silenciosa. Quando estavam com a leitura na página 14, fez-se um intervalo

para verificar o andamento da mesma, a professora conversou com os alunos sobre

fatos que aconteceram até aquele momento, após essa troca de informações

retomou-se a leitura. Quando todos finalizaram a leitura, fizeram a leitura coletiva

possibilitando uma aproximação maior com a leitura feita.

Ao chegar na Interpretação: o professor possibilitou aos alunos a construção

do sentido do texto através de um diálogo que envolveu texto e leitor através de

atividades diversificadas.

Imagem 1. Atividades realizadas pelos Imagem 2. Atividades realizadas pelos alunos

alunos(Motivação e Apresentação) (Motivação, Interpretação e Memórias)

Memórias da Leitura - desafiando a memória...: a professora apresentou

alguns exemplos de palavras que mudaram com o tempo para incentivar os alunos,

em forma de slide, em seguida, a propôs aos alunos que fizessem uma pesquisa

com os pais, avós e pessoas mais experientes que conhecessem outras palavras

que assim como as que foram apresentadas tiveram mudanças em seus nomes, as

quais deveriam ser apresentadas no próximo encontro/aula. Os alunos fizeram a

leitura das palavras pesquisadas que foram listadas no quadro, organizaram-se em

grupos, dividindo tarefas e confeccionaram um painel com as palavras pesquisadas

para expor aos demais alunos da escola.

Imagem 3. Painel confeccionado pelos Imagem 4.Coletânea de atividades realizadas

alunos(Memórias da Leitura) pelos alunos.

Círculo de Leitura: A professora convidou os alunos, e os demais

colaboradores participantes da comunidade escolar (diretora, pedagoga, secretária,

bibliotecário, agentes educacionais I e II, professores, pais e outros que quiserem

participar) para se sentarem formando um círculo, com o propósito de discutir sobre

a obra “Marcelo, marmelo, martelo” de Ruth Rocha.

Iniciou-se então a conversa sobre a obra, na qual cada componente do círculo

teve liberdade para colocar o que achou da história, das personagens, do que

gostou mais, se não gostou de alguma coisa, lembrando que os demais poderiam

levantar a mão e acrescentar informações concordando ou não com quem estivesse

falando e a professora poderia fazer algumas inferências a fim de nortear a

discussão. Finalizada a conversa no círculo de leitura, a professora solicitou a todos

que escrevessem um pequeno texto “Diário da Leitura”, falando sobre a obra lida e

comentada neste círculo de leitura. As produções foram arquivadas em um portfólio.

Com a obra “Prazeres do Pê” de Cecília Vasconcellos, na Motivação

apresentou-se um slide com a capa do livro “Prazeres do Pê” com a intenção que

alunos levantassem hipóteses sobre o assunto que seria tratado, após ouvir a

opinião dos alunos, estes assistiram um clipe com a Canção do Dicionário do Grupo

Cocoricó, em seguida conversaram sobre a importância do dicionário e a professora

pediu para que escrevessem duas palavras que achassem curiosas/diferentes

entregando dicionários para que procurassem o significado de cada uma para

compartilharem com a turma.

Para a Apresentação a professora mostrou o livro aos alunos chamando

atenção para a capa, fazendo com que todos conseguissem visualizar, dizendo o

nome da história e do autor da obra que será lida, depois distribui aos alunos, uma

folha contendo uma foto da autora Cecília Vasconcellos, e levou os alunos até o

laboratório de informática para pesquisarem a biografia da autora, que ficará exposta

em forma de um varal após sua finalização.

A Leitura é iniciada pela professora na primeira página da obra com os

alunos, que em seguida convidou-os a seguirem a leitura individualmente e de forma

silenciosa. O primeiro Intervalo: Ao chegarem à página 6, a professora fez uma

pausa na leitura e questionou seus alunos se estavam compreendendo o texto, o

que eles imaginavam que iria acontecer dali em diante, o que será que a menina

encontrou e prosseguiu-se a leitura. Pelo fato de a obra não ser extensa, não foram

necessários outros intervalos.

Na interpretação foram desenvolvidas atividades que permitiram o aluno

interagir com o texto possibilitando-lhe a construção de sentido dentro do próprio

texto.

Imagem 5. Atividades realizadas pelos alunos (Motivação, Leitura,

Apresentação, Interpretação e Memórias)

Memórias da Leitura – desafiando a Memória...: relembrando a brincadeira da

língua do Pê e resgatando as brincadeiras que nossos pais, tios e avós costumavam

brincar na época de escola, quase esquecidas com o passar do tempo. A professora

verificou se os alunos sabiam fazer a separação silábica corretamente, em seguida

colocou algumas palavras como exemplo para iniciar a brincadeira, assim que

recordaram a brincadeira foram sendo inseridas palavras maiores e frases. A

professora pediu aos alunos que pesquisassem com os pais, avós, tios, vizinhos,

quais eram as brincadeiras que costumavam brincar antigamente e trouxessem para

o próximo encontro. No encontro seguinte as brincadeiras foram reunidas e

elaboraram um Manual de Brincadeiras Antigas.

Imagem 6. Material confeccionado pelos alunos. (Memórias da Leitura)

Círculo de Leitura: O procedimento do Círculo de Leitura foi o mesmo citado

anteriormente na obra ‘Marcelo, marmelo, martelo’ de Ruth Rocha. Realizou-se o

círculo para o debate sobre a obra lida e depois finalizou-se com o registro no Diário

de Leitura.

Considerações Finais

Tanto o Projeto de Intervenção Pedagógica quanto a Produção Didático-

Pedagógica foram elaboradas a partir de uma ampla observação através da qual se

percebeu o grande problema enfrentado com relação à leitura, especialmente a

leitura literária, sendo assim optei em pesquisar novas metodologias para melhorar a

prática e incentivar os alunos a ler literatura. Desde o início o público alvo foi o sexto

ano do Ensino Fundamental II, como a maioria está chegando à escola torna-se

mais acessível iniciar um trabalho.

O primeiro desafio surgiu quando me pediram para a ampliar o trabalho,

mesmo depois de estar com o projeto pronto, postado e com parecer emitido, nesse

momento passou-se a desenvolver a Produção Didático Pedagógica, estendendo a

proposta do letramento literário a duas obras, envolvendo memórias e círculos de

leitura. Apesar de ter sido mais trabalhoso e ter exigido um número maior de aulas, o

fato de envolver os familiares e a comunidade escolar foi muito gratificante.

Algumas lacunas ficaram abertas relacionadas a participação dos colegas,

compreende-se que todos são muito atarefados, porém na hora de queixar-se que

os alunos não sabem ler e interpretar existem muitas vozes, mas no momento em

que foram convidados a participar do Círculo de Leitura, houve pouquíssima

participação dos mesmos, comprometendo um pouco a qualidade no

desenvolvimento do trabalho, por outro lado tivemos boa aceitação por parte dos

alunos, que não faltaram, participaram com entusiasmo das atividades propostas e

demostravam-se sempre ansiosos para os próximos encontros.

Todas as atividades e práticas pedagógicas utilizadas nesta Implementação

foram embasadas no Letramento Literário e Círculos de Leitura sempre englobando

memórias, proposta defendida pelo autor Rildo Cosson.

Senti-me plenamente realizada com a Implementação deste Projeto

desenvolvido no programa PDE, foi difícil devido às circunstâncias, mas valeu muito

a experiência, as leituras realizadas, o conhecimento adquirido e aprofundado foi de

um valor imensurável, porém minha maior felicidade foi quando os alunos disseram

que não gostariam que o Projeto acabasse, que queriam trabalhar mais obras, creio

eu que a semente foi plantada, agora é só regarmos e preservarmos para que ela

germine e possa produzir bons frutos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Cidades, 1988.

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COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. São Paulo: Editora Contexto,

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