Upload
buidung
View
212
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE
I
SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO DIRETORIA DE POLÍTICAS E PROGRAMAS EDUCACIONAIS
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL
CANDOMBLÉ E UMBANDA: MITOS E VERDADES
DILMA ROVARIS GARLINI
CASCAVEL 2015
CANDOMBLÉ E UMBANDA: MITOS E VERDADES
Dilma Rovaris Garlini1
Vilmar Malacarne2
Resumo: Este artigo tem como objetivo apresentar os resultados do desenvolvimento da Unidade Didática, atividade obrigatório do Programa de Desenvolvimento Educacional do Estado do Paraná, cujo foco foi analisar a trajetória histórica das religiões africanas: Candomblé e Umbanda. A pesquisa bibliográfica realizada demonstrou que o Brasil do século XXI não comporta mais a reprodução de um pensamento mistificado sobre as religiões africanas. Assim, com o propósito de ações voltadas para problematização da História dos povos e das Religiões Africanas, foram realizadas oficinas temáticas com os alunos do 8º e 9º anos, do Colégio Estadual Pedro Viriato Parigot de Souza, do Município de São Miguel do Iguaçu - PR. As atividades desenvolvidas nestas oficinas compreenderam textos e documentários sobre as contribuições na formação religiosa do povo africano para a cultura brasileira, fazendo a discussão de questões em grupo e a montagem de textos sobre o que o aluno pensa sobre o assunto proposto: Candomblé e Umbanda: o que são mitos e o que são as visões ou concepções que permeiam o pensamento ou a transmissão do conhecimento em materiais didáticos. Nas oficinas, foram oportunizadas discussões sobre a relevância da reconstrução histórica do tema, abordando assim como utilizar as informações, as reflexões e os conhecimentos na elaboração de aulas e materiais pedagógicos para melhor atender a perspectiva das Diretrizes Curriculares Estaduais sobre os conteúdos do Ensino Religioso. Como resultado verificou-se que, mediante o uso do material didático produzido, pode-se levar os alunos a trabalhar de forma motivada, havendo ampla aceitação dos recursos e atividades propostas. Constatou-se ainda a contribuição da proposta da Unidade Didática desenvolvida para o fortalecimento de uma maior compreensão da questão na escola, no que diz respeito a aceitação deste conteúdo a ser trabalhado no Ensino Religioso. Palavras-chave: Mitos; Verdades; Escola; Ensino Religioso; Formação de professores.
Introdução
No Brasil, na atualidade, um conjunto de pesquisas educacionais tem se
concentrado na temática das religiões brasileiras de matrizes africanas. Dentre estas
pesquisas, podemos destacar Cintra (1985), Braga (1988), Silva (1994), Afonso
¹ Professora de História da rede Estadual de Educação e participante do PDE 2014. Núcleo Regional de Educação de Foz do Iguaçu- PR. [email protected] ; [email protected] ² Doutor em Educação. Professor do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação CECA/UNIOESTE. [email protected]
(2002), Gomes (2008), Mununga (2005), Bueno (2005) e Freire (2009). Estes
estudos, contudo, se intensificam principalmente em decorrência da inserção da
História da África e dos africanos, bem como da cultura religiosa dos
afrodescendentes, nos currículos escolares, por meio das Leis Federais nº
10.639/2003 e a 11.645/2008. Porém, percebe-se que pela falta de reflexões e
também de conhecimento desta história, ainda permanece a discriminação em
relação a cultura negra em nossa sociedade, e isso envolve a escola.
Na escola os professores de um modo geral, não se sentem suficientemente
capacitados para fazerem a abordagem dessa temática, e com um agravante a
mais, existe também a insuficiência de materiais didáticos. Em pesquisa realizada
por Mununga (2005, p. 8) o mesmo constatou que alguns dirigentes de escolas e
professores recusaram-se a cumprir a lei, justamente porque “não existem
preconceitos raciais em suas instituições”. Estes profissionais da educação, ao que
tudo indica, já têm impregnado em suas concepções de que não há preconceito, e
que a descriminação não existe.
A inserção da história e da cultura afrodescendentes e o estudo sobre as
religiões (Candomblé e Umbanda) na escola deveria ser compreendida como uma
nova forma de olhar para milhões de africanos, que foram escravizados na América.
Nesse sentido, se faz necessário, para que o estudo da cultura
afrodescendente se efetive no Ensino Religioso e nas demais disciplinas da Base
Nacional Curricular Comum, entre outras medidas, investir na formação de
professores, no sentido de conhecer a importância das Religiões Africanas.
Sobretudo, porque essa é uma temática recente no sistema educacional brasileiro e,
por isso, ainda não contemplada na maioria das matrizes curriculares de formação
inicial dos professores atuantes na Educação Básica.
Nesse contexto este artigo tem como objetivo discutir a trajetória histórica do
povo negro, analisando as religiões africanas que foram trazidas para o Brasil e aqui
construíram sua história e desenvolveram uma nova cultura. Busca refletir ainda,
sobre a importância de estudo dos significados do Candomblé e da Umbanda na
formação religiosa do povo brasileiro. Apresenta também os resultados de um
projeto de intervenção pedagógica elaborada com vistas a contribuir para a ruptura
dos preconceitos enraizados no imaginário popular quando a questão é o negro e a
sua religiosidade, enfocando essas vertentes da religião afro.
O projeto de intervenção pedagógica faz parte das atividades que devem ser
propostas pelo professor que participa do Programa de Desenvolvimento
Educacional (PDE). O principal objetivo do PDE é oferecer aos professores que
atuam na Rede Pública Estadual, recursos teórico-metodológicos que possam
aprimorar sua prática educacional.
O PDE, Programa de Desenvolvimento Educacional, foi regulamentado pela
Lei Estadual Complementar nº 130, de 14 de julho de 2010, que estabelece o
diálogo entre professores universitários e professores da Educação Básica. O
resultado das atividades teórico-práticas orientadas visa a produção de
conhecimento e alterações qualitativas na prática pedagógica dos profissionais que
atuam nas escolas públicas (PARANÁ, 2010).
Desta forma, a partir dos pressupostos e dos objetivos do Programa de
Desenvolvimento Educacional, este projeto de intervenção pedagógico foi
implantado no Colégio Estadual Pedro Viriato Parigot de Souza, Ensino
Fundamental e Médio, do Município de São Miguel do Iguaçu/Pr, onde participaram
das atividades à Equipe Multidisciplinar da escola.
1. O Ensino Religioso e a Escola
Para Freire (2009), a educação deve servir para a libertação do ser humano
das várias formas de opressão, para que ocorra a transformação da realidade,
considerando que o homem só transforma a realidade quando ele mesmo se
transforma.
A escola é a fiel depositária das esperanças de um mundo melhor, mais justo,
menos desigual e solidário, sem esquecermos de que depois da família, a escola é a
mais importante instituição socializadora, participando cada vez mais cedo da vida
das crianças e trabalhando com crescente ênfase na formação de valores. É o lugar
onde não só se aprende conteúdos fundamentais, mas também é um espaço de
relações humanas, de construção de modelos, de reflexão e de experiências
(ROHDE, 2008).
Em se tratando de escola, o Ensino Religioso deve superar qualquer forma de
apologia ou imposição de um determinado grupo de preceitos e sacramentos. Na
medida em que uma doutrina religiosa ou moral impõe um modo adequado de agir e
pensar, ela não pode ser excludente, e sim ser um exercício da autonomia de
escolha, de contestação e até mesmo de criação de novos valores.
A atuação social ou cultural vem consolidando o reconhecimento da
diversidade religiosa, fruto das raízes culturais brasileiras. Nesse sentido, um dos
grandes desafios da escola e do Ensino Religioso na escola, é efetivar uma prática
de ensino voltado para superação do preconceito religioso, como também,
desprender-se do seu histórico confessional catequético.
É fundamental considerar que, sendo a escola um agente educacional, seus
mecanismos de como ensinar e o aprender, passa a ser compreendida como
elemento de formação integral, deve assim, desenvolver uma vivência e uma
filosofia fundamentada na ética, justiça, direitos humanos e na dignidade do ser
humano.
Nesta perspectiva o Ensino Religioso tem para o aluno, uma formação básica
social não se limitando a aulas sistemáticas, mas sim, envolve atividades educativas
da escola.
Segundo as diretrizes Curriculares da Educação Básica do Estado do Paraná
(2008, p. 40):
A partir da promulgação da alteração do artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9.394 de 20 de dezembro de 1996), feita pela Lei 9.475/97, o Ensino Religioso tem se constituído um foco de grande interesse, discussão e pesquisa em âmbito nacional.
De acordo com seu artigo 33 da LDBEN, o Ensino Religioso confessional e
público só se concretizou legalmente na redação da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional de 1996, tendo sua correção em 1997, pela Lei 9.475, onde
essa lei recebeu a seguinte caracterização:
O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas da Educação Básica, assegurando o respeito à diversidade religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo (PARANÁ, 2008, p. 41)
Com este documento, e pela primeira vez na história da educação brasileira,
é incluso o tema religioso como modelo laico e pluralista com a intenção de impedir
qualquer forma de prática catequética nas escolas públicas.
O Ensino Religioso trabalhado nas escolas, assim, perdeu o aspecto
confessional e impôs aos profissionais responsáveis pela disciplina “[...] a tarefa de
repensar a fundamentação teórica sobre a qual trabalhar os conteúdos a serem
ministrados em sala, e a melhor metodologia a ser utilizada”.(PARANÁ, 2008, p. 49).
Em 1990 elaborou-se o currículo Básico da Escola Pública do Estado do
Paraná, porém a disciplina de Ensino Religioso não foi contemplado, os professores
estavam proibidos de falar em religião. Porém dois anos depois, foi publicado um
caderno para o Ensino Religioso, conforme os modelos do Currículo Básico. Sua
elaboração, no entanto, ficou sob a responsabilidade da Associação Inter-religiosa
de Educação (ASSINTEC), com a colaboração da Secretaria Estadual de Educação
(SEED). Contudo e até hoje é assim, não se pode falar em religião por se falar, mas
sim fazer uma explanação geral sobre valores.
As Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Estado do Paraná
(PARANÁ, 2008, p. 41) expressam que:
O conteúdo vinculado pelo sistema radiofônico teve como foco curricular as aulas de ensino moral-religioso nas escolas oficiais de primeiro grau. Em 1997, firmou-se um convênio entre a SEED e a ASSINTEC, com a proposta de implementar um Ensino Religioso nas escolas públicas de Curitiba. [...] no mesmo ano, com intermediária entre a Secretaria e os núcleos Regionais de Educação, nos quais foi instituído o Serviço de Ensino Religioso para orientar a proposta curricular da disciplina.
Nessa perspectiva, a SEED sustentou um longo processo de discussão, onde
se destaca as Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Estado do Paraná
(PARANÁ, 2008, p. 43), que apontam que:
[...] desde 1995, os debates instaurados pelo FONAPER (Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso), constituído por um grupo de educadores ligados às escolas, ás entidades religiosas, às universidades e às Secretarias de Educação, permitem rever aspectos relativos ao Ensino Religioso, em que se destaca a diversidade cultural e religiosa brasileira, e buscam encaminhamentos para uma nova forma curricular desta disciplina.
Somente a partir das discussões da LDBEN 9.349/96, realizada pela
sociedade civil organizada (diretores de escolas, coordenadores pedagógicos,
representantes de conselhos tutelares, promotores...), o Ensino Religioso passou a
ser compreendido como disciplina escolar e assim ocorreu sua regulamentação.
Em 2006, elaborou-se então a primeira versão das Diretrizes Curriculares de
Ensino Religioso para a Educação Básica, a mesma submeteu-se a discussões e ao
conhecimento por parte dos professores da rede Pública Estadual de Ensino.
1.1 O Candomblé
O Candomblé surgiu nos quilombos que, muitas vezes, tinham localizações
secretas. Funde, em muitos aspectos, religiões africanas e indígenas num único
culto, fortalecendo ainda mais o sincretismo.
Pierucci (1996), citado por Prandi (2001, p. 36) comenta que “[...] o
candomblé é visto dentro do próprio segmento afro-brasileiro como fonte de maior
poder mágico, o que atrai para o seio do candomblé muitos umbandistas”.
Para o Candomblé, que está mais perto do pensamento africano que a
umbanda, o bem e o mal não se separam, não são campos distintos. No
Candomblé, são bastante valorizados os serviços mágicos e sempre foi grande a
sua clientela, apesar de enfrentar hoje a concorrência de incontáveis agências de
serviços mágicos e esotéricos, de todo tipo e origem, sem falar de outras religiões,
que inclusive se apropriam de suas técnicas, sobretudo as oraculares.
O surgimento desta religião ocorreu quando os escravos foragidos e
posteriormente libertos começam a montagem das tendas, anteriormente terreiros.
Alguns Candomblés também começaram a incorporar Caboclos (índios das terras
brasileiras como Pajés e Caciques) que foram elevados à categoria de ancestral e
passaram e ser louvados. O exemplo disso são os ditos “Candomblés de Caboclos”,
muito comuns no norte e nordeste do Brasil até hoje.
Segundo Cintra (1985, p. 74), o Candomblé é uma “[...] denominação dada
aos cultos sincréticos africanos, com influência indígena ou ameríndia. São cultos
populares derivados do modelo nagô”.
Os primeiros cultos sincréticos surgiram no século XX, e constituem um largo
passo no sentido da interpretação e da nacionalização dos cultos africanos. O
Candomblé é uma religião de pequenos grupos que se congregam em torno de uma
mãe ou pai-de-santo, denominando-se terreiro também cada um desses grupos.
Para Concone e Negrão (1987, p. 59):
As federações do candomblé, que supostamente uniriam os terreiros, não funcionam, pois não há autoridade acima do pai ou da mãe-de-santo. Além disso, os terreiros competem fortemente entre si e os laços de solidariedade entre os diferentes grupos são frágeis e circunstanciais. Não há organização empresarial e não se dispõe de canais eletrônicos de comunicação.
Para estes autores o Candomblé, em suas diferentes denominações, não têm
quem fale por ele, muito menos quem o defenda. Diferente das modernas
organizações empresariais das igrejas evangélicas, as quais usam de técnicas
modernas de marketing, que treinam seus pastores-executivos para a expansão e a
prosperidade material das igrejas, que contam com canais próprios e alugados de
televisão e rádio, e com representação aguerrida nos legislativos municipais,
estaduais e federal.
Desta forma e com essas representações e mudanças, o Candomblé não é
capaz de se massificar, mesmo porque a vida religiosa de um afro-brasileiro se
pauta principalmente pelo desempenho de papéis sacerdotais dentro de um grupo
de características eminentemente familiares. Não é à toa que o grupo de culto é
chamado de família-de-santo. Mais que isso, as cerimônias secretas das obrigações
e sacrifícios não são abertas sequer a todos os membros de um terreiro, havendo
sempre uma seleção baseada nos níveis iniciais, não sendo aceita a sua exposição
a todos, muito menos sua divulgação por meio das televisões.
Além de se constituírem em pequenas unidades autônomas, reunindo, em
geral, não mais que cinquenta membros, os terreiros de candomblé geralmente
desaparecem com o falecimento da mãe ou pai-de-santo. Tal fato decorre, via de
regra, pelas disputas de sucessão ou pelo fato, bastante recorrente, de que os
herdeiros civis da propriedade não se interessam pela continuidade da comunidade
religiosa.
1.2 A Umbanda
A Umbanda, outra religião de matriz africana, nasceu no Brasil, mais
precisamente no Rio de Janeiro, no século XVIII, originada nas experiências e
características do Candomblé do Nordeste brasileiro. Essa religião tem como
entidade principal o Caboclo e o culto aos orixás. Para os praticantes da Umbanda
os orixás são reconhecidos como espíritos evoluídos, o que se constitui como
princípio de diferenciação com o culto Candomblé.
Segundo essa doutrina o homem precisa encontrar a evolução espiritual e a
mesma só será encontrada através da prática da caridade, do bem e o amor para
com seus semelhantes.
Um dos pontos centrais dessa religião é a crença na reencarnação. E isso
ocorre através dos Espíritos, que acabam incorporando o corpo do Médium. Dentro
desse contexto nasceram os alicerces para a constituição da Umbanda enquanto
organização religiosa organizada.
A Umbanda constituiu-se, portanto, como uma forma religiosa intermediária entre os cultos populares já existentes. Por um lado, preservou a concepção Kardecista do carma, da evolução espiritual e da comunicação com os espíritos, por outro lado, mostrou-se aberta às formas populares de culto africano. (SILVA, 1994, p. 112).
A Umbanda defende a natureza e a pureza da alma, conceitos profundos
sobre a purificação da alma, e que se tornam difíceis de se colocar em prática nos
dias atuais.
Como toda religião, na Umbanda também existe uma hierarquia que deve ser
ouvida e respeitada, no caso o líder espiritual é o pai de santo ou a mãe-de-santo. É
importante ressaltar que qualquer culto de matriz africana é indispensável o uso dos
tocadores dos atabaques (Instrumento musical semelhante a um Tambor), que são
eles que iniciam os rituais e as invocações aos orixás.
Com o resultado do processo de legitimação social, a Umbanda aos poucos foi adquirindo permissão legal e apoio institucional dos órgãos governamentais para a realização de suas festas em espaços públicos, o Rio de Janeiro, o dia 31 de dezembro, por ser uma data dá na qual milhares de umbandistas vão às praias para levar presentes (perfumes, flores, colares) a Iemanjá, foi proclamado, em 1967, o Dia dos Umbandistas (SILVA, 1994, p. 113).
O Caderno Pedagógico do Estado do Paraná – Ensino Religioso (2008, p. 55)
comenta que:
As organizações religiosas afro-brasileiras ou afrodescendentes nasceram das tradições culturais trazidas do continente africano para o Brasil na época da escravatura. Os navios negreiros que chegaram entre os séculos XVI e XIX traziam mais do que africanos para trabalhar como escravos nos Brasil Colônia. Em seus porões, viajava
também toda a cultura dessas pessoas, incluindo a religião, a reguladora da vida social de onde vinham, a qual era estranha aos colonizadores portugueses. Considerada feitiçaria pelos colonizadores, ela se transformou, pouco mais de um século depois da abolição da escravatura, numa das religiões mais populares do país. A Umbanda surgiu do sincretismo (mistura) dos ritos africanos, crenças católicas, espíritas e pajelança indígena, entre outros. A Umbanda é uma religião tipicamente brasileira.
A palavra Umbanda possui vários significados. Segundo o Caderno
Pedagógico do Estado do Paraná – Ensino Religioso (2008, p. 55), um deles é: 'Um'
(Deus), 'banda' (lado), ou seja, “ao lado de Deus”, “do lado do bem”. Vale ressaltar,
que sempre houve, entre seus seguidores, a busca por manter a pureza do culto
religioso ancestral.
Os chefes religiosos da Umbanda podem ser homens (babalorixás) e
mulheres (ialorixás). São também chamados de pais e mães-de-santo. Eles são os
intermediários para a manifestação dos Orixás, que é como são chamadas suas
divindades, durante as reuniões de culto. Há regras que devem ser observadas
pelos babalorixás na sua vida religiosa e na vida religiosa do terreiro sob a sua
direção. Atualmente, devido a expansão dessas religiões de cultos afro-brasileiros,
muitos sacerdotes não são de origem africana.
2. O Projeto de Intervenção e sua ação
Considerando que a presente pesquisa está inserida no âmbito do Programa
de Desenvolvimento Educacional - PDE, sua importância é a valorização dos
Professores da Rede Pública de Ensino do Estado do Paraná e produzir material
didático pedagógico que atenda a necessidade de aprendizagem dos alunos.
Com a construção da Unidade Didática, desenvolveram-se conteúdos no
campo religioso das origens e história das religiões de matriz africana, sobre
Candomblé e a Umbanda, a fim de que as aulas de história pudessem ter um bom
encaminhamento abordando esta temática com toda a problemática que a envolve.
O projeto desenvolveu, em forma de oficinas, quinze encontros, com carga
horária total de 32 hora/aula. Caracterizaram-se como público desta pesquisa os
alunos do 8º B (oitavo - B) e 9º B (nono - B) ano do Ensino Fundamental fase II,
totalizando 53 alunos. A ênfase do projeto esteve sobre a cultura, a história e a
origem de matrizes das religiões africanas, especificamente o Candomblé e a
Umbanda: mitos e verdades. O projeto previu três etapas, assim definidas:
Quadro 1 – Etapas de Desenvolvimento do Projeto de Intervenção.
1. Elaboraram-se atividades a serem trabalhadas com os alunos do8º B (oitavo ano - B) e 9º B (nono ano - B) ano do Ensino Fundamental fase II.
2. Fez-se a apresentação dos textos, vídeos, visitas, pessoas a serem entrevistadas, leituras entre outros, como coleta de dados para ser utilizadas como dados no final do projeto como um todo.
3. Finalização com apresentação dos trabalhos feitos pelos alunos participantes com toda a comunidade escolar. Fonte: Produção Didático-Pedagógica (CHIELLA, MALACARNE, 2014).
A primeira fase compreendeu a seleção de textos e a formulação de
atividades a serem aplicadas para os alunos na segunda etapa. Nessa ação foram
definidos oito atividades de interação do pesquisador com os participantes do
projeto, o quadro a seguir apresenta os objetivos e o tema de cada encontro:
A segunda fase resultou em um conjunto de materiais, que foram elaborados
pelos alunos participantes, durante os oito encontros, entre eles: Realizou-se a
confecção de um mural apresentando o pluralismo religioso brasileiro; mapa
conceitual do universo religioso da Umbanda e Candomblé, baseado nas relações
com o mundo natural, o mundo civilizado, o mundo marginal, o mundo rural e os
estrangeiro; slides sobre os símbolos, os mitos, os ritos, as danças de origem afro-
brasileiras, a relação do batuque com a cultura afro-indígena; entrevista com Dona
Aurora, um remanescente quilombola, contando tudo sobre sua vida, familiares, o
grupo no geral, (culinária, medicina, usos e costumes).
A terceira fase aconteceu com a apresentação dos trabalhos desenvolvidos
durante a implantação do projeto de intervenção, com data marcada para o dia 20
de novembro, dia da Consciência Negra, além de ser um período quase que
histórico para a escola, pois nos últimos anos já tem desenvolvido atividades
alusivas em comemoração a cultura afro. A idéia foi de concentrar os projetos
realizados na escola e integrar as temáticas de pesquisa, promovendo a
interdisciplinaridade e a compreensão da diversidade étinico-racial, cultural e
religiosa.
Partindo-se de todo o contexto e da necessidade, dentro da comunidade
escolar, de se conhecer para poder respeitar e valorizar as diferentes “religiões
africanas”, e, também, por conta da Lei nº 10.639/2003, que prevê uma nova visão
sobre o afro descendente e sua cultura, foi elaborado e implementado este projeto.
Para a efetuação e aplicação do projeto de intervenção pedagogia, o mesmo
foi dividido em duas partes num total de 32 horas, que foram aplicadas no primeiro
semestre de 2015 nas aulas de História.
Na primeira parte da aplicação do projeto, foi realizada a contextualização
da história da vinda dos povos africanos para o Brasil (textos). Realizou-se uma
conversação sobre a origem do homem e como ele chegou a América. Questionou-
se os alunos como imaginavam a África, utilizando mapas para melhor compreensão
das falas.
Na sequência as turmas, divididas em grupos, pesquisaram em livros e
revistas imagens sobre o negro na sociedade hoje e imagens da escravidão. Após a
pesquisa, produziram cartazes sobre a escravidão. Os cartazes foram utilizados para
fazer uma exposição para a comunidade escolar.
Foi realizada uma conversação sobre como iniciou-se esse processo de
libertação e as consequências das fugas para os quilombos.
Para instigar os conhecimentos e analisar a visão que o aluno tem do negro
dentro do contexto social (passado/presente) foram realizadas as seguintes
atividades: Conversação sobre a Comunidade Renascentes de Quilombolas: a
Comunidade Apepú localizada perto do Parque Nacional do Iguaçu. No município de
São Miguel do Iguaçu, a líder dessa comunidade Quilombola, a D. Aurora Correia
Florentino, teve uma participação importante no projeto, pois a mesma, sendo
remanescente quilombola, trouxe para os alunos, através de sua fala, a história da
sua vida, de sua comunidade e como aconteceu a grande luta pela sobrevivência e
por uma vida melhor.
Na atividade seguinte os alunos pesquisaram como é composto um ritual de
Candomblé e Umbanda, sendo que a mesma foi realizada em grupos. Nesta
atividade houve o manuseio de imagens dos orixás, que foram trazidos para a
escola pela professora pesquisadora, onde os alunos conheceram a característica
de cada orixá, realizando um comparativo com os santos católicos.
Para a realização da Unidade Didática, deixou-se os alunos fazerem suas
observações pessoais sobre o tema proposto.
As atividades deste módulo ocorreram a partir da conversação sobre a origem
de como esse homem chegou a América. Questionando-se o aluno como ele
imaginava ser a África. Também foram utilizados mapas para melhor compreensão
sobre o assunto exposto. Leitura e discussão do texto proposto “O Berço da
humanidade: África3”.
Conversou-se sobre como iniciou o processo do Tráfico Negreiro, suas
consequências para o homem negro, sua cultura e sua nova vida no novo lar.
Realizou-se trabalho em grupo, pesquisando-se em livros e revistas imagens sobre
o negro na sociedade hoje e buscaram-se imagens da escravidão.
Continuando o trabalho os alunos assistiram ao vídeo: “Menina bonita de laço
de fita” e como sugestão da segunda atividade, os alunos produziram um texto e o
ilustraram.
Dando continuidade às atividades, visitou-se e foram feitas entrevistas com
integrantes da Comunidade Apepu, onde vivem Renascentes de Quilombolas.
Assistiram ainda os filmes: “Vista a minha pele”4, “A cor do xadrez5”;“Aonde
você guarda o seu racismo6” e “O Besouro7”.Através destes os fizeram pesquisas
investigando sobre suas crenças para com os Deuses no dia a dia.
Pesquisaram, por fim, como é composto um ritual de Candomblé e de
Umbanda. Nessa pesquisa observou-se toda a opressão e o preconceito que existe
sobre o assunto.
Como proposta de trabalho do PDE, o material produzido pelos alunos ficou
na escola em forma de apostila como fonte de pesquisa para a comunidade em
geral e para as futuras turmas que vierem a ingressar na escola.
Considerações Finais
3Formação e desenvolvimento, a sociedade brasileira, sobretudo no período do tráfico negreiro; importância na história mundial no âmbito cultural e econômico. http://pt.slideshare.net/eiprofessor/frica-o-bero-da-humanidade-20489241
4 Filme: Vista minha pele. Em ttps://www.youtube.com/watch?v=LWBodKwuHCM. É uma divertida paródia da realidade brasileira. Serve de material básico para discussão sobre racismo e preconceito em sala de aula. 5 Curta metragem "O Xadrez das Cores" (2004, 21 minutos), dirigido por Marco Schiavon. O Vídeo narra a história de uma senhora branca que fica sob a guarda. http://www.youtube.com/watch?v=NavkKM7w-cc. Agosto/2015. 6O filme apresenta a negação do racismo que não sobrevive à realidade que se sobrepõe.. http://www.youtube.com/watch?v=61scz6LBWA4. 7 O Filme “O Besouro” conta a história de um menino que, ao se identificar com o inseto que ao voar desafia as leis da física -- desafia ele mesmo as leis do preconceito e da opressão. https://www.youtube.com/watch?v=7JjFbIRVtB8.
A cada atividade desenvolvida os alunos foram percebendo que precisamos
conhecer para poder respeitar, e esse conhecimento só é possível quando
queremos mudar, fazer a diferença.
Compreendeu-se que os fundamentos religiosos, possibilitam o entendimento
de que não há absurdos nas religiões afrodescendentes, são simplesmente, culturas
que os negros trouxeram de seu país de origem. Compreendeu-se, também, que as
religiões afrodescendentes, de certa maneira a Umbanda e o Candomblé, nos
mostram que a eternidade da vida começa aqui, vivendo feliz, junto das pessoas de
quem se gosta. Que precisamos conhecer para poder compreender e não somente
criticar.
O desenvolvimento de um projeto de intervenção didático-pedagógica na
escola, como critério de participação do Programa de Desenvolvimento Educacional
(PDE) significou, nessa corrente de formulação de uma nova mentalidade, a
oportunidade de ações que considerem no processo educativo a valorização da
história, da cultura, das origens e da religiosidade dos povos africanos e de seus
descendentes.
Conclui-se que a criação de ambientes e espaços de diálogo na escola para
educação das relações étnico-raciais são de vital importância para aqueles que
projetam a igualdade de oportunidades na sociedade e que tem como principal
objetivo a ruptura dos preconceitos sedimentados na sociedade em relação a cultura
e a religiosidade afro.
Referências
AFONSO, L. Oficinas em dinâmicas de grupo: um método de intervenção psicossocial. Belo Horizonte: Edições do Campo Social, 2002. BRAGA, J. Fuxico de Candomblé: Estudos Afrobrasileiros. Feira de Santana: UEFS, 1988. BRASIL. Lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003. Altera a Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 10 jan. 2003. Brasília, 2003. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/10.639.htm. Acesso em 26 ago. 2015. BRASIL. Lei 11645, de 10 de março de 2008, altera a Lei n. 9394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e
Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. Diário Oficial de União, 11 de março de 2008. Brasília, 2008. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ ato 2007-2010/2008/lei11645. htm>. Acesso em: 26 de agosto de 2015. BRASIL. Presidência da República – Casa Civil, subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 9.475, de 22 de julho de 1997. Acesso em 20 de agosto de 2015 em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9475.htm BUENO, R. M. da R. Diversidade Religiosa e Direitos Humanos. Assembléia Legislativa do Estado do Paraná. Curitiba: 2005. CINTRA, R. Candomblé e Umbanda: O desafio Brasileiro. São Paulo: Paulinas, 1985. CHIELLA, I. V. F.; MALACARNE, V. Produção Didática Pedagógica/Unidade Didática: Candomblé e Umbanda na escola: cultura, história e a origem das religiões de matriz africana. Secretaria de Estado da Educação. Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE. Cascavel-PR, 2014. CONCONE, M. H. V. B.; NEGRÃO, L. N. Umbanda: da repressão a cooptação. Umbanda & política. Cadernos do Iser, 18. Rio de Janeiro, 1987, p. 39 – 57.
FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. 39. Ed., São Paulo: Editora Paz e Terra, 2009. GOMES, N. L. Diversidade e Currículo. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. do (orgs). Indagações sobre o currículo. Brasília: MEC/SEB, 2008, p. 17-48. MUNUNGA, K. Superando o racismo na escola. 2. ed. Brasília: Ministério da Educação. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005. OLIVEIRA, F. R. http://quilombosnoparana.spaceblog.com.br/348322. Quilombo Apepu de São Miguel do Iguaçu/Paraná. Acesso: 04/11/2015, ás 16:14 minutos. PARANÁ. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO PARANÁ Caderno Pedagógico de Ensino Religioso. O sagrado no Ensino Religioso. Secretaria do Estado da Educação. Curitiba: 2008. ______. Cadernos Temáticos. Educação para as relações étnico-raciais. Curitiba: SEED/PR: 2008. ______. Diretrizes Curriculares Da Educação Básica Ensino Religioso, Paraná, 2008. 72, p. ______. Lei Estadual Complementar n. 130, de 14 de julho de 2010. Diário Oficial n. 8262. Casa Civil/Palácio do Governo. Curitiba: Sistema Estadual de Legislação, jul. 2010.
PIERUCCI, A. F.; PRANDI, R. A realidade social das religiões no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1996. PRANDI, R. Os príncipes do destino: histórias da mitologia afro-brasileira. São Paulo: Cosac & Naify Edições, 2001. ROHDE, O. C. Elo – Espaço para Leitura – um projeto para 20 anos. Cascavel: ASSOESTE, 2008. SARTESCHI, R. A Lei 11.645/08 e o ensino de literatura afro-brasileira em Perspectiva: cuti e sua poética do confronto. In: CONGRESSO LUSO BRASILIERIO DE CIÊNCIAS SOCIAIS, XI, 2011, Salvador, Bahia, Anais... Salvador: Universidade Federal da Bahia, 2011, p. 1-16. Disponível em http://www.xiconlab.eventos.dype.com.br. Acesso em 17 de agosto de 2015. SILVA, V. G. da. Candomblé e Umbanda. Caminhos da devoção brasileira. São Paulo: Ática, 1994. SILVA; L. H. O. Por uma história, e cultura afro-brasileira e africana. Olhares em Convergência. Ponta Grossa. UEPG, 2007. p. 139 – 151.