Os desafios para a paisagem ferroviária no Brasil - Reflexões a respeito da preservação da paisagem ferroviária do ramal de Ponta Grossa a Guarapuava no Paraná

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    OS DESAFIOS PARA A PAISAGEM FERROVIRIA NO BRASIL -REFLEXES A RESPEITO DA PRESERVAO DA PAISAGEM

    FERROVIRIA DO RAMAL DE PONTA GROSSA GUARAPUAVA, NOPARAN

    DESAFIOS PARA EL PAISAJE DEL FERROCARRIL EN BRASIL - REFLEXIONES SOBRE LAPRESERVACIN DEL PAISAJE DE EXTENSIN DE FERROCARRIL PONTA GROSSA -

    GUARAPUAVA, PARAN

    CHALLENGES FOR RAILWAY LANDSCAPE IN BRAZIL - CONSIDERATIONS ABOUT THEPRESERVATION OF LANDSCAPE OF RAILWAY EXTENSION OF PONTA GROSSA -

    GUARAPUAVA, IN PARAN

    PLANEJAMENTO, URBANISMO E APROPRIAO SOCIAL NA PRESERVAO DO PATRIMNIO

    Dbora Alice Pauluk (1) ; Alessandro Filla Rosaneli (2)(1) Graduanda do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFPR; (2) Arquiteto e Urbanista, Mestre eDoutor pela FAUUSP, Professor Adjunto no Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFPR.

    Resumo:O presente trabalho apresenta reflexes acerca da relao ferrovia, cidade e patrimnio cultural, delimitadocomo unidade de anlise o ramal frreo entre Ponta Grossa e Guarapuava que, ao longo da linha frrea,apresenta estaes ferrovirias abandonadas e demolidas. O objetivo do trabalho refletir sobre apaisagem ferroviria da regio, destacando a potencialidade paisagstica das edificaes (e) dos espaoslivres contguos s ferrovias, e de que modo a paisagem ferroviria pode funcionar como um elementounificador da cidade e dos municpios envolvidos atravs da recuperao da memria coletiva social daregio. Para fornecer base terica, o artigo divide-se em trs tpicos principais: inicialmente, a relaocidade-ferrovia no Brasil e no mundo, o tema paisagem cultural e sua relao com a ferrovia, finalmente asituao e potencialidades pasagsticas do ramal frreo compreendido entre Ponta Grossa e Guarapuava.Palavras-chave: Paisagem Ferroviria, Estaes Ferrovirias abandonadas, Patrimnio Cultural,Potencialidade da Paisagem Ferroviria, Ramal frreo Ponta Grossa a Guarapuava.

    Resum en: (neg rito , itlic o, arial 10, entr e linh as sim ples , maisc ula, pargrafo sem recu o,espaamento 30 pon tos antes, 0 pontos depois , alinh amento ju st i f icado ):Este artculo presenta reflexiones sobre la relacin del ferrocarril, la ciudad y el patrimonio cultural, que sedefine como la unidad de anlisis de la espuela de ferrocarril de Ponta Grossa a Guarapuava que, a lo largode la lnea ferroviaria, se ha abandonado y demolido las estaciones de ferrocarril. El objetivo es reflexionarsobre el paisaje ferroviario de la regin, destacando el potencial paisajstico de los edificios (y) de espacioabierto contiguo a los ferrocarriles, y cmo el paisaje ferroviario puede actuar como un elemento unificadorde la ciudad y la regin a travs de la recuperacin colectiva de la memoria social. Para proporcionar unabase terica, el tema se compone de tres discusin principal: primero, la relacin entre la ciudad y elferrocarril en Brasil y el paisaje mundial, cultural y de la relacin con el paisaje del ferrocarril y, por ltimo, lasituacin y el panorama potencial de la espuela de ferrocarril de Ponta Grossa a Guarapuava.Palabras-clave: Paisaje ferroviarias, estaciones de tren abandonadas, Patrimonio Cultural, Paisajepotencial del ferrocarril, ferrocarril de Ponta Grossa a Guarapuava.

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    Abstract :

    This study presents reflections about the relation railroad, town and cultural heritage, defined as the unit ofanalysis the railway of Ponta Grossa to Guarapuava that, along the railway line, it has abandoned anddemolished railway stations. The objective is to reflect on the region's railway landscape, highlighting thepotential landscape of buildings (and) of open space contiguous to railroads, and how the railway landscapecan act as a unifying element of the city and the region through collective social memory recovery. Toprovide theoretical basis, the theme consists of three main discussion: at first, the relationship between townand railroad in Brazil and worldwide, cultural landscape and the relationship with the railroad landscape and,finally, the situation and the landscape potential of the railway of Ponta Grossa to Guarapuava.Keywords :Landscape Railway, abandoned Railway Stations, Cultural Heritage, Landscape Potential of theRailway, Railway of Ponta Grossa to Guarapuava.

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    OS DESAFIOS PARA A PAISAGEM FERROVIRIA NO BRASIL -

    REFLEXES A RESPEITO DA PRESERVAO DA PAISAGEMFERROVIRIA DO RAMAL DE PONTA GROSSA GUARAPUAVA, NOPARAN

    INTRODUO: FERROVIA E CIDADE, UMA HERANA DO PERODO INDUSTRIAL

    At o sculo XVIII, o transporte de mercadorias e passageiros em grandes distncias eraum fator impeditivo para o desenvolvimento econmico e social das cidades (BENVOLO, 1998;CRONON, 1991). Mas desde o sculo XVI, experincias testadas por companhias mineradoras na

    Inglaterra estavam na direo de criar uma mquina que conseguisse transportar o carvo dasminas com rapidez e eficincia. A primeira locomotiva do mundo capaz de transportar um vagocom toneladas de carvo foi desenvolvida pelo inventor ingls Richard Thevithick, no incio dosculo XIX (BORGES NETO, 2011). Assim um novo elemento surge na zona rural, como umaprofunda ferida, onde os taludes e valetas necessrios para essa nova inveno permanecem pormuito tempo como uma rea inspita (MUNFORD, 1965).

    Em 1824, surge o primeiro experimento ferrovirio que podia ser produzido em grandeescala, desenvolvido por George Stephenson, chamado de Rocket. Um ano depois, a partirdessa primeira experincia, o cientista convidado a construir a primeira ferrovia pblica domundo, em solo ingls (BORGES NETO, 2011). Essa nova inveno permitia uma mobilidadeincomparavelmente maior: se anteriormente o transporte de mercadorias s era privilgio dos

    ricos, com o sistema ferrovirio, qualquer classe social poderia viajar alm de qualquer tipo demercadoria poder ser transportada para os locais solicitados, independente do valor ou dimenses(BENVOLO, 1998, p. 551). Viagens de um lado para outro do territrio que duravam semanas,com o sistema ferrovirio, demorariam apenas alguns dias (CRONON, 1991).

    Ao mesmo tempo, os espaos desperdiados pelos ptios ferrovirios dentro das cidadese pelas indstrias na periferia eram demandados para moradia, de forma precria. A cidade, aospoucos, tornava-se um fragmento disperso de terra, com formas estranhas e ruas e avenidasincoerentes, deixadas por entre as fbricas, ferrovias e ptios de embarque. A prpria ferrovia,juntamente com a mina e a fbrica, definiam o carter e os limites dessa nova cidade, a cidadeindustrial (MUNFORD, 1965).

    A ferrovia, assim, era uma caracterstica marcante da nova era, devido ao poder detransformao da paisagem, na qual difundia o modo de vida e um tipo de paisagem, mas,principalmente, o desenvolvimento econmico e social que este novo meio de transporte induzia(CRONON, 1991). O sistema ferrovirio possibilitou, tambm, trocas nas centralidades dasregies: como um grande eixo de ordenamento territorial, teve um impacto globalizador comomeio de transportar no apenas mercadorias, mas tambm ideias; redimensionaram as regies,tornando certos lugares acessveis e produtivos, os quais antes eram ignorados pelas rotas eitinerrios internacionais (BELTRN-BELTRN, 2011). As vantagens deste novo meio detransporte eram inegveis para a nova era: a rapidez no transporte de pessoas e mercadorias, aconexo entre regies, a facilidade de transporte mesmo no perodo de inverno e a padronizaode um fuso horrio em grandes regies (CRONON, 1991).

    Este trabalho discutir a potencialidade da paisagem ferroviria delimitado pelo ramalfrreo entre Ponta Grossa e Guarapuava, em termos histricos e sociais. Para tanto, inicia-se comuma breve recuperao dos momentos marcantes para a instalao ferroviria no pas. Depois,

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    consideraes tericas a respeito da relao da paisagem com o patrimnio cultural a fim de

    fornecer o aporte conceitual necessrio para a discusso do trecho entre Ponta Grossa eGuarapuava.

    FERROVIA NO BRASIL: DO PREENCHIMENTO DOS ESPAOS VAZIOS AODESENVOLVIMENTO REGIONAL

    No Brasil, at a chegada da ferrovia, o transporte terrestre de mercadorias era feito nolombo de burros em estradas adaptadas para carroas. Naquela poca, os portos de Parati eAngra dos Reis, no Rio de Janeiro, exportavam cerca de 100 mil sacas de caf, provenientes doVale do Paraba. No porto de Santos, em So Paulo, cerca de 200 mil bestas chegavam

    carregadas de caf e outros produtos agrcolas (DNIT, 2012). Em 1828, o Governo Imperialautorizou as primeiras ferrovias por iniciativas privadas com o intuito de se explorar o territrionacional. O governo cederia por 40 anos o privilgio de uso para as empresas que sepropusessem constru-las; porm, como no era rentvel, no despertou interesse eminvestidores. Somente em 1852, com isenes e garantias de juros sobre o capital investido, que surge a primeira ferrovia no Brasil, construda por Irineu Evangelista de Souza. O intuito eraligar o Porto Mau (interior da Baa da Guanabara) Raiz da Serra (Petrpolis). Dois anos maistarde, em 1854, foi inaugurada a primeira Estrada de Ferro no Brasil com 14,5km de extenso(SILVA, 1954 & DNIT, 2012).

    Durante o perodo imperial (1854 a 1890), as ferrovias brasileiras tinham como objetivoconectar os principais centros urbanos aos portos, construindo um primeiro tronco ferrovirio para

    as futuras ramificaes. Contriburam, ainda, para criar e desenvolver cidades por onde passavam(BORGES NETO, 2011). Segundo Setti (2005, p. 20), durante todo o perodo imperial, foramconstrudos apenas 9.583 km de ferrovias que serviam capital, Rio de Janeiro, e a quatorze dasvinte provncias.

    J em 1889, houve uma tentativa do Governo Federal de executar um plano deconstrues ferrovirias por todo o pas, que no se concretizou. Durante a poca republicana, aconstruo de ferrovias tinha um propsito: era destinada, segundo Demczuk (2011, p. 21), amelhorar a defesa do territrio brasileiro e preencher espaos vazios e pouco povoados,geralmente com conexes com os pases vizinhos. o caso da estrada de Ferro Itarar-Uruguai,que fazia a ligao entre So Paulo e Rio Grande do Sul, interligando, desta forma, o Rio deJaneiro, Curitiba, Porto Alegre, Santana do Livramento e Montevidu (SETTI, 2005, p. 20).

    A estrada de Ferro So Paulo Rio Grande do Sul foi a primeira ferrovia integradora doBrasil, pois contribuiu para o aceleramento do processo de comercializao interna, naurbanizao da regio e para o aumento da rea agropastoril e extrativista dessa poro do Brasil.Favoreceu, a ocupao populacional, principalmente relativa aos ncleos urbanos povoadores deimigrantes (MONASTIRSKY, 2005, p. 50). Outra caracterstica relevante na regio que, para asua construo, o governo brasileiro incentivou a entrada de imigrantes. Alguns ncleospovoadores foram implantados prximos s cidades, preferencialmente quelas melhor equipadase que tinham maior participao na economia da regio. Outros ncleos, por sua vez, foramimplantados ao longo das ferrovias, caracterizando-se os eixos de penetrao para o povoamentono Estado do Paran (MONASTIRSKY, 2005, p. 70).

    De acordo com Santos (1996), aps os anos de 1960, com a construo de rodovias nopas, o sistema ferrovirio entra em crise devido a nfase dada ao transporte individual, deixandoo planejamento das linhas ferrovirias em segundo plano, ao adotar o caminho para o trfego de

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    longas distncias. Assim, simplificadamente, um breve panorama da historia da ferrovia no Brasil

    pode ser simplificado pela Figura 1. Os 3 principais perodos1

    contriburam de maneira distintapara o desenvolvimento do pas no campo ferrovirio, delimitam os momentos especficos daimplantao da ferrovia pelo territrio nacional.

    Para Villaa (1998), o trem no Brasil, como meio de transporte de passageiros de longadistncia, manteve-se por um curto perodo de tempo em poucos pontos do territrio. Durante esteperodo, atendia apenas a elite brasileira. Como esse meio de transporte pouco se desenvolveuno espao intra-urbano, foi desprezado como modal dos abastados e transferido s camadaspopulares. A falta de investimentos no setor e o surgimento das rodovias; tornou o modalferrovirio cada vez mais precrio e passvel de ser ocupado pela populao de baixa renda.

    Figura 1 Panorama geral da ferrovia no Brasil.FONTE: os autores (2012), de acordo com Silva (1954), Setti (2005), Demzcuk (2011)

    Ao considerar a histria da ferrovia brasileira pode-se afirmar que a ferrovia desempenhou(e vem desempenhando) um papel segregador na sociedade, caberia questionar: a paisagemferroviria poderia funcionar como um elemento unificador da cidade atravs da recuperao damemria coletiva local?

    Desde a privatizao da malha ferroviria na dcada de 1990, operaes urbanas eprojetos de revitalizao tentam recuperar antigas reas ferrovirias abandonadas. Por outro lado,levantamento do BNDES apontou 64 trechos potenciais de ferrovia que poderiam receber trens depassageiros; destes, 14 trechos foram sinalizados pelo Ministrio dos Transportes para estudosde trens regionais de passageiros (Valor Econmico, 2013), alguns com claro foco no atendimentos demandas dos eventos internacionais no Brasil. No Paran, de acordo com o JornalOdiario.com Londrina (2012), destaca-se o projeto do Trem P Vermelho, proposta de linha depassageiros no eixo Londrina-Maring que foi sinalizado pelo Ministrio das Cidades como umdos que apresentam melhores condies de retorno financeiro.

    1 O autor faz a diviso em 5 perodos at o ano de 1954, ano de publicao de sua obra. Para os perodos seguintes(no numerados) foi utilizada a obra de Setti (2005).

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    Com relao s obras que relacionam a ferrovia ao patrimnio edificado e paisagstico,

    poder-se-ia enumerar uma em Campo Grande (MS), cuja obra de recuperao e readequao daantiga estao ferroviria da cidade pretende desenvolver uma ao que ressalte a importncia dainstalao da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil e outra em Minas Gerais, o projeto TremTurstico Cultural Zez Leone e Expresso pai da Aviao que pretende ligar as cidades deMatias Barbosa a Barbacena (MG) atravs da Maria-fumaa intitulada Expresso Pai da Aviao.O trem faz parte de um projeto regional do Governo Federal com objetivo de resgatar o transporteferrovirio de passageiros por meio do Programa nacional de Revitalizao das Ferrovias (IPHAN,2009).

    Com mais de 200 anos de histria da ferrovia no Brasil, sem dvida, as estaesferrovirias foram o estopim para o desenvolvimento de muitas cidades, os setores de comrciose servios, e, em alguns casos, responsveis pelas primeiras atividades urbanas, estabelecimento

    de ruas e avenidas que at hoje compe a malha urbana de algumas cidades. A tentativa de sereaproveitar a malha ferroviria e incorpor-la no tecido urbano pode ser observada em todo oterritrio nacional, seja em escala municipal ou regional. No entanto, so poucos os projetosconsolidados que se concentram em stios histricos conhecidos cuja busca pela preservao damemria e das construes ferrovirias. Este trabalho pretende demonstrar esta potencialidade.

    A PRESERVAO DA PAISAGEM FERROVIRIA

    O termo paisagem, segundo Sandeville Jr (2005), tem a etimologia derivada do francspays que significa pas, cujo significado compete no apenas o espao fsico como tambm a

    apropriao peculiar do espao a fim de construir um territrio, um povo e, consequentemente,uma imagem desse territrio. J o sufixo agem remete a uma ideia de forma, semelhana,aspecto e aparncia. Essas palavras contm um forte contedo cultural no qual associa espao erepresentao: lugar, territrio, cultura e imaginao. Assim, paisagem pode ser descrita comoaparncia de um contedo, a alma do lugar do pitoresco, da construo de um lugar social,mesmo quando a ideia de natureza se torna determinante, cuja estetizao coloca, em primeiroplano, a forma das coisas [...] (SANDEVILLE JR, 2005, p. 3-4). Mesmo com essa simplificadadefinio, o termo paisagem complexo de ser descrito, uma vez que objeto de estudo dediferentes disciplinas acadmicas, sendo a geografia a que mais se interessou pelo assunto.Segundo Vasconcelos (2012, p. 54), a Geografia Cultural Tradicional e a Nova Geografia Culturalconcordam que a paisagem fruto da interao do homem com a natureza.

    Percebe-se ainda que a cada nova gerao, h o acrscimo de marcas na paisagem, quevo sendo continuamente modificados com o transcorrer da histria. A paisagem , portanto, umdocumento histrico construdo atravs do acrscimo de novos elementos ou da modificao dosexistentes, numa sobreposio linear e infinita de manifestaes culturais (VASCONCELOS,2012, p. 55). Dessa forma, o territrio tem deixado de ser visto como um espao em branco sobreo qual se projetam intervenes de desenvolvimento. Para uma melhor percepo da paisagem,mltiplas camadas devem ser sobrepostas para o entendimento prvio da realidade. Em umadestas camadas esto os elementos culturais e patrimoniais que, de certa maneira, determinam edistinguem um espao singular (BELTRN-BELTRN, 2011).

    Ao se entender o sistema ferrovirio como uma unidade homognea, as aespreservacionistas tendem a serem as mesmas em qualquer lugar. Muitos dos projetos de

    intervenes se limitam unicamente a preservar e valorizar a edificao, desconhecendo opotencial do patrimnio mvel, imaterial e regional (BELTRN-BELTRN, 2011).

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    As intervenes recentes em edifcios ferrovirios, sendo reconhecidas ou no por lei,

    carecem de fundamentos culturais, mesmo o bem vinculado a uma atividade cultural. Se, por umlado, os edifcios so escolhidos por seu interesse cultural, com o intuito de valorizar a imagem deuma instituio ou iniciativa, por outro lado, os aspectos documentais, formais, memoriais esimblicos passam despercebidos durante o processo projetual. Com frequncia, as prticas dasintervenes recentes no buscam entender e respeitar aquilo que distingue e caracteriza oedifcio ou o conjunto arquitetnico (KHL, 2012, p. 15). preciso entender a particularidade decada uma das edificaes e dos espaos livres presentes na paisagem ferroviria.Especificamente,

    No caso de vastos espaos abertos, inserem-se de modo indevido usos queresultam na implementao de elementos que fragmentam, atravancam ouobstruem de modo excessivo a conformao, perdendo-se a noo de proporo;

    quando, ao contrrio, so espaos fragmentados, por sua destinao originria, aexemplo de edifcios ou alas edifcios com funes administrativas, procede-se estripao para se obter configurao espacial livre, aberta. (KHL, 2012, p. 15)

    Lemos (1981, p. 30) critica as intervenes que tem em primeiro plano a questoeconmica, como o caso do turismo. Para uma interveno que tenha interesse patrimonial aspreocupaes deveriam girar em torno da arquitetura e da paisagem, destacando a importnciade se tratar o patrimnio histrico e cultural no somente sob uma tica especfica, mas numaviso global. Khl (2012, p. 15), defende que mesmo quando os bens ferrovirios so protegidospor lei, na prtica as intervenes nem sempre respeitam as caractersticas essenciais e, muitoraramente, os edifcios so entendidos como parte de um complexo ferrovirio, tratados,geralmente, de modo isolado. Assim, os critrios de identificao variam de acordo com o tempo e

    o mais importante agir de maneira consciente diante desses bens, entendendo que sem o seuconjunto, no ter sentido isolado.

    Deste modo, a partir da ideia que as obras e manifestaes que compe o patrimniocultural deve se relacionar entre si, superando assim a viso de monumentos isolados econsiderando o uso turstico conjugado com o patrimnio cultural, alguns princpios devem serlevados em conta, dentre eles: i) identificao de vrias categorias de patrimnio cultural; ii)estratgia de planejamento diferenciados para cada interveno; iii) aes fundamentadas nosocial, cultural, econmico ou poltico (BELTRN-BELTRN, 2011).

    Apesar de toda a paisagem ser cultural, s algumas merecem ser objeto de preservaopatrimonial. Portanto, a problemtica no gira em torno dos elementos culturais presentes na

    paisagem, mas sim, das paisagens dotadas de valores culturais e naturais dignos de seremreconhecidos e protegidos pelas polticas pblicas (VASCONCELOS, 2012, p. 55). O Instituto doPatrimnio Histrico e Artstico Nacional (IPHAN) instituiu em 2009 a chancela da PaisagemCultural Brasileira como mais um instrumento preservao, seguindo o caminho de outros pases.Evidencia-se, com esse instrumento, que a ampliao do conceito de patrimnio cultural constante e conta com esforos mundiais e nacionais. E, em razo desses trabalhos, o patrimniocultural tem sido entendido com base em trs categorias: i) paisagem cultural; ii) territrio cultural;iii) itinerrio cultural. (IPHAN, S/D)

    Segundo o IPHAN (S/D), paisagem cultural definida como uma poro do territrio decarter peculiar, preservando deste modo a diversidade e riqueza dos cenrios urbanos e rurais,tendo em vista a massificao da vida. A grande motivao a expanso urbana, globalizao e

    massificao brasileira que pe em risco contextos de vida singulares e tradies culturais locais. o nico institucionalizado e possui vrios locais chancelados, isto , um tipo de selo que garantea excepcionalidade do local. O conceito de territrio cultural compreende a uma abrangncia

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    mais ampla que o anterior e ainda deve passar pelo processo de institucionalizao.

    caracterizado pela multiplicidade e tambm pela densidade das ocorrncias culturais arqueolgicas, arquitetnicas, paisagsticas, artsticas, simblicas -, compondo assim umverdadeiro mosaico do patrimnio cultural. Por fim, o conceito de itinerrio cultural, tambm emprocesso de institucionalizao, compreende a uma poro ampla do territrio e interpretamltiplas formas de patrimnio, seja material ou imaterial, dando maior coeso e significaohistrica a eles. Segundo o ICOMOS (2008), diferencia-se pela presena de vias de comunicaoque facilitaram a expanso e utilizao com um objetivo concreto e determinado. Alm dessafuno de via de comunicao ou transporte, necessrio com que haja tambm uma utilizaohistrica e favorecido a criao de elementos patrimoniais associados, refletindo, assim, aexistncia de influncias entre diversos grupos culturais durante um longo perodo da histria.

    Portanto, os Itinerrios Culturais no so simples vias histricas de comunicao

    que possuem elementos patrimoniais ou que servem como ligao entre si, masfenmenos histricos singulares que no podem ser criados com a imaginaoou a vontade de estabelecer conjuntos de bens atravs de uma associao deelementos com caractersticas comuns. (ICOMOS, 2008, grifo nosso)

    Pelas observaes dos aspectos analisados, apesar de a paisagem cultural, territriocultural e itinerrio cultural serem instrumentos de preservao relativamente novos, h muito parase explorar no campo patrimonial no Brasil. A viso errnea de se entender o patrimnioferrovirio de forma homognea, sem considerar as particularidades de cada regio, faz com quesolues prontas ou isoladas sejam as formas de intervenes mais frequentes. Ao se estudar apaisagem, percebe-a como um elemento constantemente mutvel, que com o passar do tempo,adquire novas caractersticas, sobrepondo-se com histria e cultura. Para o desenvolvimento

    sustentvel de uma regio, a conjugao da preservao patrimonial com a atividade tursticacontribui de maneira positiva, uma vez que garante com que os conhecimentos e histria do localpassem de gerao a gerao, sustentando essa dinmica com o subsdio econmico necessriopara o autodesenvolvimento.

    HISTRIA E PAISAGEM FERROVIRIA DO TRECHO PONTA GROSSA GUARAPUAVA

    A problemtica da preservao da paisagem ferroviria tem estado na agenda do IPHAN.Porm, de um modo geral, o discurso focado principalmente nos elementos fsicos que, muitasvezes, desconsideram o item principal de um bem patrimonial: a memria social, ou seja,elementos que possuem significado para a vida coletiva de uma regio (MONASTIRSKY, 2006.p.32). De acordo com a Lei Federal 11.483/2007, o rgo que possui as atribuies de administraros imveis de valor artstico, histrico e cultural oriundos da extinta Rede Ferroviria Federal S.A.(RFFSA) o IPHAN, fato que no necessariamente traz garantia de resguardo. Como lembraCavalcanti et alii(20--, p. 3), a maior parte das estaes ferrovirias no Brasil foram fechadas porno serem mais teis ao transporte de cargas agora privatizado. A falta de um uso e programacontemporneo s antigas estaes ferrovirias e s reas destinadas as manobras dos trens fazcom que haja abandono das reas, demolio de estaes e mesmo ocupaes irregularesnestes imveis.

    Tendo o exposto acima, delimita-se, a princpio, como paisagem ferroviria aquela

    observada da janela do trem ao longo das ruas ao redor das estaes ferrovirias do ramalcompreendido entre Ponta Grossa - Guarapuava. Sendo assim, tratar-se- como um itinerriocultural, devido as diferentes pocas de ciclos econmicos importantes para o Paran e para aregio. A paisagem composta e vivenciada diariamente pelos habitantes nas estaes e nas

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    vilas operrias e/ou casarios tpicos de madeira que se instalaram ao longo da ferrovia com a

    poca de ouro da regio. Formaram cidades e pequenos ncleos urbanos cuja delimitao era porruas estreitas e por poucas reas livres e, segundo Passarelli (2005, p. 06), no apresentavamdestaques de monumentalidades ou excepcionalidade nas edificaes ou tcnica construtiva.

    Para um estudo mais aprofundado, delimitou-se o tema no trecho frreo de Ponta GrossaGuarapuava localizado no Estado do Paran (Figura 2). O recorte foi escolhido devido regioser, at a dcada de 1930, o principal ncleo econmico do Paran, porm, devido a criseespecfica na regio, a rea entrou em decadncia econmica 2 (MONASTIRSKY, 2006. p. 5). Otrecho Ponta Grossa - Guarapuava compreende dois ramais distintos: So Paulo Rio Grande3 eo ramal de Guarapuava. O principal objetivo da ferrovia da linha frrea Ponta Grossa Guarapuava, como exposto anteriormente, era povoar as regies interioranas do Brasil e conectardois importantes eixos: So Paulo ao sul do Brasil (at Rio Grande do Sul) e, posteriormente, uma

    possvel conexo com Paraguai, Bolvia e Chile 4. J o ramal de Guarapuava tinha como objetivo,segundo Monastirsky (2005, p. 5), escoar a produo de madeira e erva mate de 1892 a 1930. Ouseja, participou de dois momentos distintos do Paran: o ciclo da erva-mate e a poca dasgrandes madeireiras.

    Figura 2 - Estrutura ferroviria paranaense e a regio dos Campos Gerais. Legenda dos Municpios dos Campos Gerais: 1Antnio Olinto; 2 Arapoti; 3 Catro; 4 Fernandes Pinheiro; 5 Imbituva; 6 Irati; 7 Ipiranga; 8 Iva; 9 Jaguarava; 10 Mallet; 11

    Palmeira; 12 Paula Freitas; 13 Paulo Frontin; 14 Pira do Sul; 15 Ponta Grossa; 16 Prudentpolis; 17 Rebouas; 18 Rio Azul; 19So Mateus do Sul; 20 So Joo do Triunfo; 21 Sengs; 22 Teixeira Soares; 23 Tibagi; 24 Ventania.

    Fonte: Monastirsky (2006), adaptado pelos autores

    2 Segundo Monastirsky (2005), o ciclo da erva-mate e madeira no Paran (1892 a 1930) foi o grande apogeu da regioem estudo. A partir da dcada de 1960, houve um agravamento da economia regional e ao processo dedesmantelamento e sucateamento da ferrovia, que culminou, em algumas, cidades, com a erradicao da linha frrea(MONASTIRSKY, 2006. p. 5). Cabe ressaltar ainda que, durante 1940 at 1960, com o declnio do ciclo da madeira e domate, a ferrovia ainda se mantinha economicamente ativa, fazendo parte da economia de muitos municpios da regioem estudo.3 Em alguns casos, denominada tambm Irarar-Uruguai, como o caso do IPHAN e de Giecrecht (2012). Adotar-se-

    a denominao So Paulo-Rio Grande como exposto por Monatirsky (2005).4 Atualmente, segundo Ministrio de Planejamento brasileiro, recursos do PAC esto sendo direcionados para arealizao do Corredor Biocenico, cujo objetivo principal consiste em conectar pases do Mercosul aos portosbrasileiros atravs de uma ferrovia com trens somente de cargas. Segundo o diagnstico do governo federal, nicaparte da ferrovia brasileira que ainda no existe para o projeto o trecho Guarapuava-Paraguai (BRASIL, 2012).

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    O trecho ferrovirio corta 6 Municpios do Paran: Ponta Grossa, Teixeira Soares,

    Fernandes Pinheiro, Irati, Incio Martins e Guarapuava (Figura 3). Cabe destacar que, segundoGiesbrecht (2012), esse trecho transportou passageiros at 1983, quando ocorreu adesestatizao da RFFSA nos anos oitenta. A economia dos Campos Gerais do Paran foimotivada por trs importantes ciclos econmicos, ciclo do ouro, do gado e da erva-mate. Somentea ltima teve a participao da linha frrea Itarar-Uruguai em sua histria. (ORREDA, 1981) Aerva-mate representava, no ano de 1853, a maior fonte de riqueza da Provncia (ORREDA, 1981 eORREDA, 1972) 5.

    Figura 3 Estaes ferrovirias do ramal Ponta Grossa Guarapuava. Legenda das Estaes Ferrovirias: 1 Ponta Grossa; 2Oficinas; 3 Rio Tibaji; 4 Roxo Roiz; 5 Guaragi; 6 Valinhos do Sul; 7 Rio das Almas; 8 Teixeira Soares; 9 Diamantina; 10

    Fernandes Pinheiro; 11 Florestal; 12 Irati; 13 Engenheiro Gutierrez; 14 Monjoloo; 15 Arroio Grande; 16 Governador Ribas; 17gua Clara; 18 Cerro Leo; 19 Incio Martins; 20 Rocha Lourdes; 21 Ges Artigas; 22 Padre Chagas; 23 Afonso Camargo; 24

    Engenheiro Joo Passos; 25 Guarapuava; 26 Rebouas; 27 Roberto Helling; 28 Rio Azul; 29 Mi ndu; 30 Mallet.Fonte: Silva (2005, anexo 4), editado pelos autores

    NOTA: Base cartogrfica: IPHARDES, 2011

    Segundo Monastirsky (2005, p.77), a maioria das cidades dos Campos Gerais do Paranoriginou-se devido instalao de uma estao de cargas que servia de convergncia ao sistemavirio das reas produtores e/ou alguma serraria ou engenho de erva-mate importante. Vriosncleos povoadores foram estabelecidos ao longo das linhas ferrovirias durante o perodo deimplantao e ampliao da ferrovia (1890 a 1934). Durante este perodo, cerca de 80% docontingente de imigrantes vieram para o estado trabalhar na implantao da ferrovia. Ainda, osimigrantes exerceram atividades junto s madeireiras, no trecho Ponta Grossa Guarapuava, aolongo dos trilhos (MONASTIRSKY, 2005, p. 71).

    Para estes estados polarizaram-se as correntes imigratrias e, ao contrrio das

    grandes lavouras para o comrcio exterior, estabeleceu-se na regio oparcelamento de propriedade fundiria para atender produo e ao

    5 Em meados do sculo XIX, o Paran pertencia ainda a provncia de So Paulo.

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    abastecimento interno do pas. [...] Assim, dirigiam-se para esta regio [trecho

    ferrovirio Ponta Grossa Guarapuava] poloneses, ucranianos, alemes, italianos,franceses, austracos, espanhis, russos, ingleses, suos, etc., os chamadosrepresentantes da Europa progressista. (MONASTIRSKY, 2005, p. 69)

    A fixao de ncleos coloniais de imigrantes holandeses, poloneses, ucranianos ealemes, pelo governo federal nas primeiras dcadas do sculo XX, foi complacente com aconstruo da ferrovia. Ocorreram algumas modificaes, com menor expressividade no meiorural, sobretudo em Irati, Unio da Vitria e Paulo Frontin. O assentamento dessas etnias empequenos lotes transformou consideravelmente o cenrio rural, que trouxeram consigo os novosaspectos construtivos delineados pelas casas de madeira em forma de chals (LUZ, 2003, p. 40).

    Segundo Luz (2010, p. 167), ao longo do traado desta ferrovia, erigiu-se uma diversidade

    de edificaes, das quais se podem destacar estaes, paradas, oficinas, depsitos, guaritas,pontes, residncias, armazns, vilas operrias rurais dentre outros bens. Assim, com o adventoferrovirio na regio, configurou-se uma configurao espacial peculiar na qual se funde umapaisagem tanto rural quanto urbana.

    Dessa forma, a ferrovia ficou marcada na memria e no imaginrio dos habitantes, sejapelo som do trem que avisava a chegada de pessoas, seja pela espera pela passagem do trempelos trilhos que cortam a malha urbana. Em uma poca em que ainda no existia o ramalrodovirio, a ferrovia desempenhava um papel importante. Alm de transportar pessoas emercadorias de um lugar a outro rapidamente, deixou marcado o hbito de as pessoasacompanharem a chegada dos trens cidade ou se reunir prximo estao para apreciar omovimento de passageiros e trocar ideias a respeito de outras regies e ideologias

    (MONASTIRSKY, 2005, p. 98). Como afirma Sandeville Jr (2005, p. 5), a paisagem mais do queo espao observado, trata-se do espao vivenciado, da sensibilidade das pessoas com o seuentorno na qual convergem numa discusso de cultura.

    Com a privatizao ferroviria as estaes foram mudadas de funo, abandonadas e atdemolidas. As estaes de Ponta Grossa, Teixeira Soares, Roberto Helling e Unio da Vitria,atualmente presentes na malha urbana da cidade ou na periferia da regio, foram restauradas.Outras ainda foram protegidas por meio de tombamento como a de Ponta Grossa (LUZ, 2010, p.181). possvel observar o uso modificado, segundo Giesbrecht (2012), nas estaes de PontaGrossa (utilizado atualmente como Biblioteca), Irati, Incio Martins (ambas como moradia),Fernandes Pinheiro (com funo atual de Escola Municipal), Roberto Helling (restaurante) e RioAzul (como estao rodoviria). Mas em geral, nota-se o abandono das estaes e demais

    instalaes ferrovirias encontrando-se em situao de descaso, como gua Clara, RochaLourdes, Ges Artigas e Mindu (GIESBRECHT, 2012). comum encontrar estaes ferrovirias,principalmente na divisa entre ParanSanta Catarina, em plena situao de descaso, situando-se em uma rea da faixa de domnio da ferrovia que contm habitaes irregulares (LUZ, 2010,p. 177). H ainda aquelas que no se encontram em nenhumas das citadas e que, por motivos desegurana ou mesmo antieconmicas, foram demolidas. o caso das estaes de Oficinas, RioTibagi, Arroio Roiz, Guaragi, Rio das Almas, Diamantina, Florestal, Engenheiro Gutierrez, Monjolo,Arroio Grande, Governador Ribas, Cerro Leo, Rebouas e Mallet (GIESBRECHT, 2012). Assiim,diante do exposto, possvel ter um panorama das condies das estaes desta rea, comovisto na Figura 4. Apenas seis estaes so reutilizadas de alguma forma, seja moradia,restaurante, biblioteca, escola municipal ou rodoviria municipal. E quatro so utilizadas para usoferrovirio. O restante foi demolida ou abandonada.

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    Figura 4 - Mapa de uso e ocupao existente no trecho Ponta Grossa - GuarapuavaFonte: os autores, 2013.

    Nota: Base cartogrfica IPHARDES. Bases Informacionais: GIEBRECHT (2012) e IPHAN

    visvel que neste trecho, h uma intercalao entre a paisagem rural e urbanaconstantemente. As estaes de Ponta Grossa, Oficinas, Irati, Incio Martins e Guarapuava estodentro da malha urbana da cidade. A primeira, segundo Giebrecht (2012), foi durante muito tempopouso dos tropeiros e os trilhos foram colocados apenas em 1894. Atualmente utilizado comouma biblioteca pblica municipal. A segunda, devido ao desenvolvimento da cidade de PontaGrossa, foi removida. Havia, no entorno, as vilas operrias. A terceira, Irati, sofre com osconstantes problemas da ferrovia na malha urbana, ocupaes irregulares nas reas de faixa de

    domnio, porm a estao ferroviria foi a grande incentivadora do desenvolvimento urbano domunicpio e, hoje, o municpio-polo da regio centro-sul do Paran.

    Em virtude dos fatos mencionados, conclui-se que a ferrovia trouxe para a regio noapenas uma forma de locomoo de mercadorias e pessoas, mas tambm um grande dissipadorde ideias, ideologias e culturas. O ciclo da erva-mate, da madeira e a implantao da ferroviaforam os grandes estmulos para a ocupao da regio dos Campos Gerais, sobretudo com achegada de imigrantes, a criao de pequenos ncleos urbanos e a transformao tanto noscenrios urbanos quanto rural.

    O abandono de estaes ferrovirias um grande problema para a regio se consideradade forma isolada, uma vez que dificilmente encontram-se nos ncleos urbanos. Grande parte

    delas encontra-se em reas rurais e, por este motivo, foram demolidas com a erradicao dotransporte de passageiros depois da privatizao das ferrovias.

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    POTENCIAIS DA PAISAGEM FERROVIRIA DO TRECHO PONTA GROSSA

    GUARAPUAVA

    Khl (2012) afirma que as estaes ferrovirias tm sido um dos tipos mais estudados eum dos objetos de aes de tombamento mais concretizados. No entanto, mesmo com ocrescente nmero de bens protegidos, so quantitativamente e qualitativamente inexpressivas emrelao ao legado das ferrovias. O IPHAN esfora-se para estudar e caracterizar o sistema detransporte como um todo, depois que os bens da antiga RFSSA tornaram-se parte de seu acervo.Assim, segundo Khl (2012, p. 15), trabalhar com o patrimnio ferrovirio em seu conjunto ainda muito restrito e as aes dificilmente tratam o transporte ferrovirio de modo abrangente. Paratanto, a mesma autora aponta a necessidade de um estudo multidisciplinar consistente queidentifique os bens em seu conjunto e em suas inter-relaes, relevncia a partir de anlises devrios campos do saber, tanto das humanas quanto das cincias exatas e biolgicas,

    considerando, tambm, as vrias formas de apreenso atuais.

    So estudos absolutamente necessrios para identificar aquilo que consideradoum bem cultural, pois indesejvel, alm de materialmente impossvel, preservartudo de maneira indistinta. Mas essa identificao tem de ser feita de maneiracriteriosa e embasada; pois essa seleo ser feita de todo modo, ou por escolherconscientes e fundamentadas atravs dos instrumentos oferecidos pelashumanidades, ou pela ausncia [de] aes propositivas, que tero porconsequncia a sobrevivncia aleatria dos bens. (KHL, 2012, p. 16)

    Essa autora ainda defende ainda a necessidade de se levar em considerao os valoresentendidos de maneira ampla que so de interesse para a coletividade, inclusive de natureza

    memorial e simblica. Para tanto, deve-se ter em mente os preceitos tericos do restaurorelacionados diretamente com aquilo que motiva a preservao, relacionando-a de maneiraplurissecular razes de cunho cultural, cientfico e tico. Portanto, mesmo os bens sendoprotegidos por lei, no se garante que, na prtica, as intervenes recentes respeitem suascaractersticas.

    Quanto regio em estudo, acabados os ciclos da madeira e da erva-mate, os CamposGerais do Paran entraram em estagnao econmica (ORREDA,1981; DEMCZUCK eMONASTIRSKY, 2010; IRATI, 2005). Como uma possvel soluo, tanto o Plano Diretor de Irati(2005) quanto Demczuk&Monastirsky(2010), apontam a explorao turstica aliada ao uso daferrovia.

    Essa atividade [turismo] proporciona um maior contato com a comunidade,fazendo com que a identidade local seja mantida e remetida aos visitantes. [...] conveniente ressaltar que o turismo cultural, ao relatar a histria de umacomunidade, permite que a comunidade mantenha sua identidade e valorize seupatrimnio, seja ele caracterizado por manifestaes materiais ou imateriais, a fimde valorizar as razes e manter sua histria. [...] Ao identificar os elementosferrovirios que configuram os marcos de identidade cultural, foi possvel percebera ferrovia enquanto patrimnio em diversas maneiras, especialmente em funoda carga simblica que a mesma contm. (DEMCZUK&MONASTIRSKY, 2010, p.16)

    Assim, para identificar os elementos que compem a paisagem ferroviria do trecho, ahistria e os potenciais de cada estao sero apontados por meio de fotografias, histrias e

    caractersticas percebidas encontradas com referncia disponvel. Esta seo tentar, na medidado possvel, abordar o assunto de forma multidisciplinar, haja vista que um diagnstico completo

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    demandaria meses e vrios profissionais. Portanto, o material exposto ser um breve panorama

    de cada uma das estaes para se apontar possveis potencialidades.

    Para tanto, utilizar-se- o mtodo desenvolvido pela interveno na linha ferroviria deMadrid - Alicante, Espanha. A proposta consiste em revalorizar a paisagem local, utilizando doconceito de itinerrio cultural. Assim como no trecho em estudo, ambas possuem/possuamestaes ferrovirias abandonadas e deterioradas alm de atravessarem mltiplas reas, comourbanas, interurbanas e zonas agrcolas. Para delimitar a rea de estudo no caso de Alicante,segundo Marti (2011), foi necessrio identificar os parmetros territoriais que permitem acompreenso morfolgica dos municpios: i) localizar os ncleos urbanos e as vias de conexoentre elas; ii) existncia de zonas verdes urbanas e espaos naturais mais destacveis da rea; iii)situao da infraestrutura existente; iv) presena de montanhas e depresses naturais; v) redehdrica. Deste modo, para familiarizar-se tanto com a paisagem urbana e rural, localizar um

    padro ecolgico e evidenciar as potencialidades e deficincias do local, dividiu-se a paisagem emtrs unidades bsicas de paisagem: i) paisagem ecolgica; ii) paisagem urbana; iii) paisagemvisual ou panormicas.

    Paisagem ecolgica

    Segundo Marti (2011), denominou-se, no estudo Madrid Alicante, paisagem ecolgica osespaos naturais de alto valor ecolgico e bom estado de conservao, limpeza eacondicionamento. No trecho Ponta Grossa - Guarapuava, a ferrovia encontra como principalbarreira a transpor a Serra da Esperana, divisora entre o Primeiro e Segundo Planaltosparanaenses. Como se pode ver na Figura 5, percorre reas acidentadas, transpassando vrios

    rios e, consequentemente, h a presena de pontes e viadutos. A paisagem rica embiodiversidade da regio e, por ser divisora de guas, encontra-se em rea de preservaopermanente.

    Figura 5 - Vistas da Serra da EsperanaFONTE: os autores, 2013

    NOTA: Fotos tiradas da rodovia PR 364

    Paisagem urbanaMarti (2011) define como paisagem urbana aquela que permite que a histria seja contada

    atravs da relao entre a populao e o territrio; no caso, os locais onde formaram

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    concentraes urbanas devido ferrovia. A estao de Ponta Grossa foi a primeira estao

    urbana a ser construda no trecho Ponta Grossa - Guarapuava. Era antigo pouso de tropeiros e,na cidade, j existia um pequeno ncleo urbano. Inicialmente houve a construo de umapequena estao para a conexo So Paulo - Curitiba, porm, como Ponta Grossa se tornaria umentroncamento de linhas norte-sul com a construo da ferrovia So Paulo Rio Grande do Sul,houve a construo de uma nova estao, cuja inaugurao aconteceu em 1900 (GIESBRECHT,2012). A edificao possui dois pavimentos e expe um conjunto singular de elementos eclticos.Um dos motivos de sua importncia histrica estadual o fato desta estao ser o ponto inicial dalinha norte-sul do trecho ferrovirio Itarar-Uruguai (SECRETARIA DO ESTADO DA CULTURADO PARAN, 2012).

    importante salientar que no caso do municpio de Ponta Grossa, com o aumento daexpanso urbana, optou-se pela remoo dos trilhos do centro com um desvio para fora do

    permetro urbano. Esta deciso ocorreu devido construo de uma nova ligao ferroviria como sul do estado de So Paulo (LUZ, 2003, p. 94). Houveram oposies quanto retirada dostrilhos e pela qualidade dos projetos implementados. Segundo Monastirsky (2005, p. 99), a sadados trilhos do centro causou insatisfao na populao devido ao distanciamento causado entreas pessoas e a ferrovia. possvel aferir que, ao observar a Figura 6, com a retirada dos trilhos aestao ferroviria ficou sem seu contexto original.

    Figura 6 Estao de Ponta Grossa respectivamente em 1909 e 2002Fonte: Acervo livraria Fgaro e Fernando Picarelli apud GIESBRECHT, 2012

    A Estao Oficinas, hoje desativada, tinha uma funo exclusivamente tcnica. No seuentorno, havia somente as casas dos operrios da ferrovia; porm, com a presso imobiliria, todaessa rea de Ponta Grossa j est urbanizada. A estao de Irati tambm se localiza em reaurbana da cidade e paralela a um rio local. A facilidade dos transportes e sua localizao

    central, fez com que a rea se fosse propcia para o comrcio e servios. O ncleo urbano inicialsurgiu em meados de 1890 e, no ano de 1908, tornou-se municpio emancipado (ORREDA, 1981).Segundo Giesbrecht (2011), a estao de Irati era inicialmente um edifcio de madeira pequeno,velho, sem higiene, sem segurana e desconfortvel. No comportava qualquer tipo de consertonem modificao. A nova construo foi executada em 1935 e ainda se mantm at hoje em bomestado.

    Como se pode aferir na Figura 7, a edificao singela, feita em alvenaria, com estruturaem madeira e cobertura em telha cermica, no fundo de um vale. Mesmo localizada na reaurbana, possvel verificar reas livres, em torno da estao, composta pelo leito do rio das Antase faixa de domnio da ferrovia. Passarelli (2006, p. 371) afirma que devido localizao desse tipode estao (em fundo de vale) a estao ferroviria e a estrada de ferro no compem marcos

    visuais significativos. Para esse autor, os marcos visuais de referncia da paisagem urbana dopovoado-estao so as chamins das indstrias e as torres das igrejas, implantados sempresobre elevaes do terreno.

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    Figura 7 - Estao de IratiFonte: os autores, 2012

    J a estao Engenheiro Gutierrez, mesmo demolida em 2002, foi o entroncamento doramal de Guarapuava e continuao da linha Itarar-Uruguai, conhecida neste trecho em diantecomo linha do Contestado (GIESBRECHT, 2008). A rea urbana, como se pode observar naFigura 8, ainda continua convivendo com a passagem do trem. uma rea que possui escolas equadras esportivas prximas a linha do trem.

    Figura 8 - Distrito rural de Gonalvez Jnior e os trilhosFONTE: os autores, 2012

    Paisagem visual ou panormica

    Paisagem visual ou panormica definida por Marti (2011) como os pontos ou lugares quepermitem ter uma viso conjunta da paisagem, com uma viso ampla do territrio. Constituem-sede locais elevados e geralmente amplos. A partir da estao do Rio Tibagi, no sentido PontaGrossa Guarapuava, possvel perceber a dificuldade com que os engenheiros tiveram aoimplantar a ferrovia So Paulo - Rio Grande do Sul. O relevo fortemente ondulado, e em vriospontos, so necessrias tcnicas mais avanadas para conseguir transpor as barreiras fsicas daregio. Existem reas em que a paisagem ferroviria est muito presente e em outros ela se diluiou mesmo desaparece. A contnua conexo visual da paisagem com a linha frrea uma

    caracterstica desse tipo de rota (MARTI, 2011).A paisagem ferroviria do trecho Ponta Grossa Guarapuava marcada pela presena de

    uma intercalao entre uma paisagem rural e urbana. As estaes ferrovirias deste trecho,

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    exceto as de Ponta Grossa e Guarapuava, na maior parte das vezes, originaram povoados -

    estaes6

    . o caso da cidade de Irati, de Incio Martins, Fernandes Pinheiro e dos distritos ruraisde Gonalvez Jnior, gua Clara, Guaragi.

    Apesar da demolio da estao Tibagi, seu entorno deixou um legado caracterstico, umaponte sobre o rio Tibagi, como possvel ver na Figura 9. Para chegar estao esta ponte onico caminho, ou seja, somente possvel chegar at a estao (em segurana) pelo modalferrovirio (GIESBRECHT, 2012). possvel perceber a paisagem natural que, pelo menos emtorno do rio, est preservado, com a mata nativa ao redor. Essa biodiversidade caracterstica daregio.

    Figura 9 - A ponte sobre o rio Tibagi, em 10/2005.

    Fonte: Nilson Rodrigues apud GIESBRECHT, 2012

    A estao de Arroio Ruiz recebeu o nome devido a um vilarejo da regio, porm, hoje olocal onde se encontra a estao ermo. No possui nenhum sinal de moradias anteriores, sendocircundado por extensas reas rurais. Foi demolida em 1997 (GIESBRECHT, 2008). Contudo, noapenas estaes ferrovirias foram construdas ao lado da ferrovia: possvel observar nestetrecho antigas madeireiras. Na rea da estao do Florestal, j demolida, possui em frente, umexemplar de madeira tombado pelo Governo do Estado do Paran: a Fazenda Florestal, antigaresidncia da Famlia Miranda, proprietrios de uma das madeireiras da regio. O conjuntocorresponde a uma manso e uma antiga capela em madeira, ambas localizadas em frente estao de trem demolida. Como pode ver na Figura 10, a casa est em estado de abandono.Segundo a Secretaria do Estado da Cultura do Paran (201-), este bem tombado desde 30 de

    julho de 1990 pelo Estado do Paran. A propriedade o prprio estado especificamente o InstitutoAgronmico do Paran. O bem descrito como:

    [...] uma magnfica manso, implantada em meio a ampla rea ajardinada. Possuidois pavimentos e sto, com rea total construda de aproximadamente 400metros quadrados. O aspecto mais notvel dessa edificao o seu partidoarquitetnico. Construda totalmente em madeira, foge, porm, completamente,dos modelos usuais dessa tcnica difundidos no estado do Paran; tendo comoparmetros comparativos as manses anglo-americanas do sculo passado. Isso revelado no sistema construtivo das paredes estrutura embutida, recheando osparmetros externo e interno formados por tabuado estreito e horizontal e nautilizao de elementos muito caros tradio britnica e norte-americana obow-window (sic) e os prticos de entrada.

    6 O termo povoado-estao citado por Passareli (2005) com o intuito de evidenciar a surgimento de ncleos urbanosa partir da estao.

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    significativo tambm o classicismo que impregna a arquitetura atravs do rigor

    simtrico da composio, o emprego de colunas jnicas no imponente prticoprincipal e os jardins com a suas touceiras dispostas ordenadamente e moldadascom formatos geomtricos (cones e esferas). (SECRETARIA DA CULTURA DOPARAN, 2012)

    Figura 10 Casa da Famlia Miranda, em frente a estao ferroviria Florestal demolida.Fonte: os autores, 2012

    A estao gua Clara localiza-se ao p da serra e foi inaugurada em 1940. Na Figura 11, aestao e um conjunto de casas de madeira no ptio ferrovirio foram implantados ainda nesta

    poca. Estas casas esto conservadas e ainda so habitadas. J a estao teve o assoalho e asesquadrias roubadas (GIESBRECHT, 2008). Na Figura 12 observa-se que, apesar da desativaoda estao ferroviria, ainda permanece um pequeno povoado, que continua vivendo na rea.

    Figura 11 - O ptio da estao gua Clara em 1935 e Estao ferroviria em 2006Fonte: acervo Nilson Rodrigues e Rogrio Carlos Born GIESBRECHT, 2012

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    Figura 12 - Distrito rural de gua Clara e, ao fundo da imagem, a antiga estao ferroviria.FONTE: os autores, 2013

    A estao de Guaragi (inicialmente chamada de Entre Rios), desde 1983 (aps aprivatizao da RFFSA) at 2004 esteve abandonada. Neste ano, a estao pegou fogo e aconcessionria da linha (ALL 7) foi obrigada a reconstru-la (GIESBRECHT, 2012). Tanto aestao de Guaragi quanto a de Fernandes Pinheiro, como se pode observar na Figura 13, soconstrues de madeira, singelas e pouco representativas do ponto de vista arquitetnico.

    Figura 13 - Estaes de Guaragi ( esquerda) e Fernandes Pinheiro ( direita).FONTE: A esquerda, Thiago Terada, 2006 apud GIESBRECHT, 2012; a direita, Carlos Roberto de Almeida, 2012 apud

    GIESBRECHT, 2012

    A estao Incio Martins corresponde a um complexo ferrovirio com 3 edificaes: 2estaes e uma vila ferroviria. Possui arquitetura similar as de Irati e gua Clara, porm emdimenses maiores. Atualmente apenas 2 das 3 edificaes so utilizadas como moradia. A outrase encontra em estado de abandono. Como se pode observar nas Figura 14 e Figura 15, possuiuma vasta rea livre na frente da ferrovia cuja utilizao era para carregamento de madeira. Noano de 2009, a estao serviu como ponto final e de retorno para um trem turstico a vapor quepartiu de Guarapuava.

    7 A ALL (Amrica Latina Logstica) a concessionria responsvel pelo trecho aps a privatizao nos anos 90. Aoperadora possui 6 concesses no Brasil e na Argentina.

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    Figura 14 - Conjunto ferrovirio de Incio MartinsFONTE: os autores, 2013

    Figura 15 - Trem a vapor chegando ou retornando de Incio Martins em 2009Fonte: Prefeitura Municipal de Incio Martins, 2012 apud GIESBRECHT, 2012

    As estaes de Rocha Lourdes, Ges Artigas e Afonso Camargo esto localizadas emrea rural. Todas, como se observa na Figura 16, encontram-se praticamente em mesmo estadode abandono, alvo de vandalismo e destruindo-se sozinhas. Com relao estao de GesArtigas e Afonso Camargo ambas possuem um conjunto de casas dos trabalhadores ferrovirioscomo pode se ver na Figura 17. possvel perceber seu uso como moradia e ocupao irregularno local.

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    Figura 16 Estao de Ges Artigas, no municpio de IncioMartins.

    Fonte: os autores, 2011

    Figura 17 - Conjunto de casas dos trabalhadores ferroviriosde Ges Artigas e, a ltima, uma construo posterior.

    Fonte: os autores, 2011

    Como afirma Khl (2012), houve, a partir dos anos 1860 em So Paulo, a padronizaodos projetos das estaes ferrovirias. Um exemplo que a autora expe a utilizao l do tijoloaparente se disseminando como material principal na construo das estaes ferroviriasnaquele Estado. possvel perceber nas estaes estudadas, a padronizao das estaesmenores e projetos diferenciados nas maiores, como afirma Khl tambm em So Paulo. Asempresas buscavam-se diferenciar das outras a partir destes elementos e/ou padronizaes,como se indica a Figura 18. Ainda, como legado, utilizou-se em grande escala materiais

    industriais, trazendo esses novos materiais para ser utilizado no campo da arquitetura com maisfrequncia.

    Figura 18 - Smbolo da RVPSCFonte: os autores, 2011

    CONSIDERAES FINAIS

    Este artigo props recuperar alguns elementos da paisagem ferroviria do trecho frreocompreendido entre Ponta Grossa e Guarapuava. Para isso, procurou-se discorrer sobre questesconceituais e histricas, como forma de desenvolvimento regional e preservao do patrimniocultural. Como se verificou a maior parte das edificaes foi demolida ou abandonada depois daprivatizao da RVPSC.

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    Em 2000, a Associao dos Municpios da Regio Centro Sul do Estado do Paran

    (AMCESPAR) concebe o projeto Trem da Vida cujas aes propem um resgate tcnico-operacional dos trilhos, adequao e implementao de sub-projetos, programas, atividades eagendas no mbito da linha frrea entre Teixeira Soares-Guarapuava, incluindo as estaesurbanas e rurais, ptios e Vilas Ferrovirias. Pretende tambm resgatar a locomotiva a vaporSanta F 204, a qual era movida a briquete industrializado a partir de serragem refugada naindstria madeireira. Indica o Ministrio de Turismo como parceiro para implantao de projetosestaduais na rea do turismo-rural e do eco-turismo. Ainda, busca diversificar o transporte decargas e implementar o de passageiros, realizar feiras de produtores orgnicos, extensionismorural e servios pblico em geral (sade, educao, treinamento e capacitao, lazer, cultura,eventos abertos) (SILVA, 2005; IRATI, 2005).

    Em virtude do mencionado, o potencial paisagstico da rea de grande diversidade seja

    pelos aspectos ecolgicos, ferrovirios, urbanos ou visuais. Compreende a um conjunto formadono apenas pelas estaes ferrovirias ao longo da linha frrea, mas tambm pela biodiversidadeda Serra da Esperana, rea de preservao permanente, pela particularidade urbana da cidadede Irati, que divisor de trs bacias hidrogrficas, e exemplares da arquitetura de madeiras comgrande valor histrico.

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