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PORTUGUÊS, 11º ANO Caracterização de Portugal em “Os Maias” A Crítica Social: Crónica de Costumes Ao subtítulo de “Os Mais”, Episódios da Vida Romântica, corresponde a crónica de costumes. Estes episódios, descritos ao longo da obra, têm como objetivo fazer o relato da sociedade portuguesa na segunda metade do século XIX. Eça utiliza um desfile de personagens (personagens tipo) que representam grupos, classes sociais ou mentalidades por forma a mostrar aos leitores o estado de corrupção, providencialismo e parasitismo da sociedade portuguesa, bem como, seus costumes e vícios. 1 - O jantar no Hotel central Neste jantar, Ega pretende homenagear Cohen, o marido de Raquel, a quem Ega estava apaixonado e com a qual mantinha uma relação. Em roda da mesa surgiram assuntos do foro literário e politico que permitem ter uma noção da situação de Portugal. Literário: Alencar defende o Ultra-Romantismo enquanto que Ega o Realismo/Naturalismo (mostra uma sociedade dominada por valores tradicionais, que se opõe a uma nova geração, a geração de 70 representada por Ega). Este defende exageradamente a inserção da ciência na literatura. Político: Ega crítica a decadência do país e afirma desejar a bancarrota e a invasão espanhola. A maneira de ser português revelada, através das visões de Carlos (começa por pensar, a propósito da mouraria, que "esse mundo de fadistas, de faias" merecia um estudo, um romance) e de Craft, que fica impassível perante a feroz discussão entre Alencar e Ega (a propósito de um verso "o homem da ideia nova", o paladino do Realismo), discussão que quase termina em agressão física, reconhecendo que "a torpeza do Alencar sobre a irmã do outro fazia parte dos costumes de crítica em Portugal", até porque sabia que "a reconciliação não tardaria, ardente e com abraços".

Os Maias - Crítica Social

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PORTUGUÊS, 11º ANO

Caracterização de Portugal em “Os Maias”

A Crítica Social: Crónica de Costumes

Ao subtítulo de “Os Mais”, Episódios da Vida Romântica, corresponde a crónica de

costumes. Estes episódios, descritos ao longo da obra, têm como objetivo fazer o relato

da sociedade portuguesa na segunda metade do século XIX. Eça utiliza um desfile de

personagens (personagens tipo) que representam grupos, classes sociais ou mentalidades

por forma a mostrar aos leitores o estado de corrupção, providencialismo e parasitismo

da sociedade portuguesa, bem como, seus costumes e vícios.

1 - O jantar no Hotel central

Neste jantar, Ega pretende homenagear Cohen, o marido de Raquel, a quem Ega

estava apaixonado e com a qual mantinha uma relação. Em roda da mesa surgiram

assuntos do foro literário e politico que permitem ter uma noção da situação de Portugal.

Literário: Alencar defende o Ultra-Romantismo enquanto que Ega o

Realismo/Naturalismo (mostra uma sociedade dominada por valores tradicionais, que se

opõe a uma nova geração, a geração de 70 representada por Ega). Este defende

exageradamente a inserção da ciência na literatura.

Político: Ega crítica a decadência do país e afirma desejar a bancarrota e a

invasão espanhola.

A maneira de ser português revelada, através das visões de Carlos (começa por pensar, a

propósito da mouraria, que "esse mundo de fadistas, de faias" merecia um estudo, um

romance) e de Craft, que fica impassível perante a feroz discussão entre Alencar e Ega (a

propósito de um verso "o homem da ideia nova", o paladino do Realismo), discussão

que quase termina em agressão física, reconhecendo que "a torpeza do Alencar sobre a

irmã do outro fazia parte dos costumes de crítica em Portugal", até porque sabia que "a

reconciliação não tardaria, ardente e com abraços".

Provocando Sousa Neto, Ega percebe que este nada sabe do socialismo e não é capaz de

um diálogo consequente.

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2 - A Corrida de Cavalos

Objetivos:

Novo contacto de Carlos com a alta sociedade lisboeta, incluindo o próprio rei;

Visão panorâmica dessa sociedade (masculina e feminina) sob o olhar crítico de Carlos;

Tentativa frustrada de igualar Lisboa às capitais europeias, sobretudo Paris;

Cosmopolitismo (fingido) da sociedade;

Possibilidade de Carlos encontrar aquela figura feminina que vira à entrada do Hotel

Central.

Existem 4

corridas.

Visão caricatural:

O hipódromo parecia um palanque de arraial;

As pessoas não sabiam ocupar os seus lugares;

As senhoras traziam "vestidos sérios de missa";

O bufete tinha um aspeto nojento;

A 1ª corrida terminou numa cena de pancadaria;

As 3ª e 4ª corridas terminaram grotescamente.

Conclusões a retirar:

Fracasso total dos objetivos das corridas;

Radiografia perfeita do atraso da sociedade lisboeta;

O verniz da civilização estalou completamente;

A sorte de Carlos, ganhando todas as apostas, é indício de futura desgraça (Sorte no

jogo…).

A corrida de cavalos

É uma sátira ao desejo de imitar o que se faz no estrangeiro, por um esforço de

cosmopolitismo, e ao provincianismo do acontecimento. As corridas de cavalos

permitem apreciar de forma irónica e caricatural uma sociedade que vive de aparências.

O comportamento da assistência feminina é naturalmente caricaturado. A conformidade

do vestuário à ocasião parece não ser a melhor e acaba por traduzir a falta de gosto e,

sobretudo, o ridículo de uma situação que se pretende requintada sem o ser.

As corridas servem, para Eça, criticar a mentalidade e o comportamento da alta burguesia:

- O aborrecimento, motivado pelo facto das pessoas não revelarem qualquer

interesse pelo evento.

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- A desordem, originada pelo jóquei que montava o cavalo "Júpiter" e que insultava

Mendonça, o juiz das corridas, pois considerava ter perdido injustamente em

detrimento do Pinheiro, que montara o Escocês e que obtivera a vitória por

ser íntimo de Mendonça. Tomava-se partido, havia insultos, até que Vargas

resolveu com um encontrão para os lados desafiar o jóquei – foi, então, que se ouviu

uma série de expressões como "Morra" e "Ordem", se viram chapéus pelo ar, se

ouviam baques surdos de murros.

3 - O Jantar dos Gouvarinho

Objetivos:

reunir a alta burguesia e aristocracia;

reunir a camada dirigente do País;

radiografar a ignorância das classes dirigentes.

Os alvos visados neste jantar são:

Conde de Gouvarinho

o voltado para o passado;

o tem lapsos de memória;

o comenta muito desfavoravelmente as mulheres;

o revela uma visível falta de cultura;

o não acaba nenhum assunto;

o não compreende a ironia sarcástica do Ega;

o vai ser ministro.

Sousa Neto

o acompanha as conversas sem intervir;

o desconhece o sociólogo Proudhon;

o defende a imitação do estrangeiro;

o não entra nas discussões;

o acata todas as opiniões alheias, mesmo absurdas;

o defende a literatura de folhetins, de cordel;

o é deputado.

Nota-se assim a superficialidade dos juízos dos mais destacados funcionários do Estado;

incapacidade de diálogo por manifesta falta de cultura.

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O jantar na casa do Conde Gouvarinho

O espaço social permite através das falas, observar a gradação dos valores sociais, o

atraso intelectual do país, a mediocridade mental de algumas figuras da alta burguesia e

da aristocracia.

Desfilam perante Carlos as principais figuras e problemas da vida política, social e cultural

da alta sociedade lisboeta: a crítica literária, a literatura, a história de Portugal, as

finanças nacionais, etc. Todos estes problemas denunciam uma fragilidade moral dessa

sociedade que pretendia apresentar-se como civilizada.

No jantar podemos apreciar duas conceções opostas sobre a educação das mulheres:

salienta-se o facto de ser conveniente que "uma senhora seja prendada, ainda que as

suas capacidades não devam permitir que ela saiba discutir, com um homem, assuntos

de carácter intelectual" (Ega, provocador, defende que "a mulher devia ter duas prendas:

cozinhar bem e amar bem").

A falta de cultura dos indivíduos que são detentores de cargos que os inserem na

esfera social do poder – Sousa Neto (oficial superior de um cargo de uma grande

repartição do Estado, da Instituição Pública), desconhece Proudhon, começando por

responder a Ega que, provocante, lhe pergunta a sua opinião sobre o socialista, que não

se recorda textualmente, depois "que Proudhon era um autor de muito nomeada", e

finalmente, perante a insistência de Ega, sintetiza a sua ignorância, afirmando que não

sabia que "esse filósofo tivesse escrito sobre assuntos escabrosos", como o amor,

acrescentando que era seu hábito aceitar "opiniões alheias, pelo que dispensava as

discussões". Posteriormente, perguntará a Carlos se existe literatura em Inglaterra.

O deslumbramento pelo estrangeiro – Sousa Neto manifesta a sua curiosidade em

relação aos países estrangeiros, interrogando Carlos, o que revela o aprisionamento

cultural de Sousa Neto, confinado ás terras portuguesas.

4 - A Imprensa

"A Corneta do Diabo":

o diretor é o Palma "Cavalão", um imoral;

a Redação é um antro de porcaria;

publica um artigo contra Carlos mediante dinheiro;

vende a tiragem do número do jornal onde saíra o artigo;

publica folhetins reles, de baixo nível.

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"A Tarde":

o diretor é o deputado Neves;

recusa publicar a carta de retratação de Dâmaso porque o confunde com um seu

correligionário político;

desfeito o engano, serve-se da mesma carta como meio de vingança contra o

inimigo político;

só publica artigos ou textos dos seus correligionários políticos.

Aspetos a notar: o baixo nível; a intriga suja; o compadrio político; assim como os jornais, está o

País.

Os Jornais, “A Corneta do Diabo” e “A Tarde”

Critica-se, neste episódio, a decadência do jornalismo português, pois os jornalistas

deixavam- se corromper, motivados por interesse económicos (é o caso de Palma Cavalão,

do Jornal A Corneta do Diabo) ou evidenciam uma parcialidade comprometedora,

originada por motivos políticos (é o caso de Neves, diretor do Jornal A Tarde).

A Corneta do Diabo: Carlos dirige-se, com Ega, a este jornal, que publicara uma carta,

escrita por Dâmaso Salcede, insultando e expondo, em termos degradantes, a sua relação

amorosa com Maria Eduarda. Palma Cavalão revela o nome do autor da carta e mostra

aos dois amigos o original, escrito pela letra de Dâmaso Salcede, a troco de "cem mil réis"

A Tarde: Neves, o diretor do jornal, acede a publicar a carta em que Dâmaso Salcede se

confessa embriagado ao redigir a carta insultuosa, mencionando a relação de Carlos e de

Maria Eduarda, por concluir que, afinal, não se tratava do seu amigo político Dâmaso

Guedes, o que o teria levado a rejeitar a publicação.

5 - Sarau do Teatro da Trindade

Objetivos:

ajudar as vítimas das inundações do Ribatejo;

apresentar um tema querido da sociedade lisboeta: a oratória;

reunir novamente as várias camadas das classes mais destacadas, incluindo a família real;

criticar o ultra-romantismo que encharcava o público;

contrastar a festa com a tragédia.

Neste sarau, destacam-se dois personagens:

Rufino

o o bacharel transmontano;

o o tema do Anjo da Esmola;

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o o desfasamento entre a realidade e o discurso;

o a falta de originalidade;

o o recurso a lugares-comuns;

o a retórica é oca e balofa;

o a aclamação por parte do público tocado no seu sentimentalismo.

Alencar

o o poeta ultra-romântico;

o o tema da Democracia Romântica;

o o desfasamento entre a realidade e o discurso;

o o excessivo lirismo carregado de conotações sociais;

o a exploração do público seduzido por excessos estéticos estereotipados;

o a aclamação do público.

N.B.: As classes dirigentes estão alheadas da realidade (nota-se isso pela indignação do

Gouvarinho). Caracteriza-se a sociedade como sendo deformada pelos excessos líricos do

ultra- romantismo.

O sarau do Teatro da Trindade

Evidencia-se o gosto dos portugueses, dominados por valores caducos, enraizados num

sentimentalismo educacional e social ultrapassados. Total ausência de espírito crítico e

analítico da alta burguesia e da aristocracia nacionais e a sua falta de cultura.

Rufino, o orador “sublime”, que pregava a “caridade” e o “progresso”, representa a

orientação mental daqueles que o ouviam: a sua retórica vazia e impregnada de

artificialismos barrocos e ultra-românticos traduz a sensibilidade literária da época, o seu

enaltecimento á nação e à família.

Cruges, que tocou Beethoven, representa aqueles que, em Portugal, se distinguiam pelo

verdadeiro amor à arte e que, tocando a Sonata patética, surgiu como alvo de risos

mal disfarçados, depois de a marquesa dizer que se tratava da Sonata Pateta, o que o

tornaria o fiasco da noite.

Alencar declamou “A Democracia”, depois de “um maganão gordo” lamentar que nós

Portugueses, não aproveitássemos “herança dos nossos avós”, revelando um patriotismo

convincente. O poeta aliava, agora, poesia, e política, numa encenação exuberante, que

traduzia a sua emoção pelo facto de ter ouvido “uma voz saída do fundo dos séculos” e

que o levava a querer a República, essa ”aurora” (e os aplausos foram numerosos) que

viria com

Deus.