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Pormenores | Novembro.Dezembro 2010 38/ - OS NOVOS CAMINHOS DO VINHO LIMA MAYER & COMPANHIA EXPLICA-NOS COMO FAZ VINHO NO ALTO ALENTEJO Do ambiente romântico que povoa as nossas mentes quando pensamos no processo de produção de vinho, já pouco sobra nos dias de hoje, e quem usa ainda esses métodos tradicionais, fá-lo como representação etnográfica em benefício do enoturismo. Nas casas que hoje produzem os vinhos do Alentejo, os serões não são mais passados entre cantigas e a pisa da uva nas adegas e as mulheres não carregam mais os cestos à cabeça. Nos dias que correm, o controlo total do processo de produção é um ponto essencial para garantir a qualidade desejada e a Lima Mayer & Companhia é um excelente exemplo de como se alia uma pequena empresa agrícola, sediada no interior do Alentejo, às técnicas mais actuais na produção de vinhos de qualidade elevada. Thomaz de Lima Mayer, responsável pelo projecto, recebeu-nos numa manhã de sol a meio de Setembro. Chegámos já a meio da manhã de trabalho e uma equipa de pessoas ocupava-se na apanha do fruto, que se transformará em breve no néctar dos deuses, o Vinho. Texto Ângela Mendes Fotografia Paulo Barbosa A Casa Lima Mayer fica entre Monforte e Veiros, em pleno Alto Alentejo. Uma terra habitada desde que se conhece a história, rica em recursos e generosa com quem a trabalha e que é o palco para a produção de vinhos de excelência, apreciados a nível internacional. Fomos à propriedade para ver a vinha, as mulheres que se atarefavam de tesoura na mão pelas vastas carreiras de videiras e perceber como se faz hoje um vinho de qualidade. [Agricultura]

Os novos caminhos do vinho - Lima Mayer & Companhia explica-nos como faz vinho no Alto Alentejo

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Viagem pelo mundo do vinho alentejano. Novas formas de encarar o sector do vinho e de inovar num sector em crescimento na Região. Reportagem publicada na 9ª edição da Revista Pormenores em 2010.

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-OS NOVOS CAMINHOS DO VINHOLIMA MAYER & COMPANHIA EXPLICA-NOS COMO FAZ VINHO NO ALTO ALENTEJO

Do ambiente romântico que povoa as nossas mentes quando pensamos no processo de produção de vinho, já pouco sobra nos dias de hoje, e quem usa ainda esses métodos tradicionais, fá-lo como representação etnográfica em benefício do enoturismo. Nas casas que hoje produzem os vinhos do Alentejo, os serões não são mais passados entre cantigas e a pisa da uva nas adegas e as mulheres não carregam mais os cestos à cabeça.Nos dias que correm, o controlo total do processo de produção é um ponto essencial para garantir a qualidade desejada e a Lima Mayer & Companhia é um excelente exemplo de como se alia uma pequena empresa agrícola, sediada no interior do Alentejo, às técnicas mais actuais na produção de vinhos de qualidade elevada.Thomaz de Lima Mayer, responsável pelo projecto, recebeu-nos numa manhã de sol a meio de Setembro. Chegámos já a meio da manhã de trabalho e uma equipa de pessoas ocupava-se na apanha do fruto, que se transformará em breve no néctar dos deuses, o Vinho.

Texto Ângela MendesFotografia Paulo Barbosa

A Casa Lima Mayer fica entre Monforte e Veiros, em pleno Alto Alentejo. Uma terra habitada desde que se conhece a história, rica em recursos e generosa com quem a trabalha e que é o palco para a produção de vinhos de excelência, apreciados a nível internacional.Fomos à propriedade para ver a vinha, as mulheres que se atarefavam de tesoura na mão pelas vastas carreiras de videiras e perceber como se faz hoje um vinho de qualidade.

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A vinha estende-se à volta da Adega e todo o processo é bastante rápido e controlado, visto que a uva é colhida e imediatamente levada para a adega, onde é escolhida manualmente num tapete rolante e submetida a um choque térmico, com vista a descer a temperatura para os 8º C. Este choque térmico tem como objectivo impedir fermentações não controladas do fruto e este é apenas o primeiro dos processos controlados pelo frio a acontecer nas pequenas, mas modernas instalações da Adega.Estamos em pleno Alto Alentejo, o Sol de Setembro é ainda forte e a vindima corre a bom ritmo. Pelo chão estão ainda espalhadas as uvas dispensadas pela monda de cachos feita há algumas semanas.“Este ano deitámos para o chão cerca de 60% da produção, isto desde a floração até um mês antes da vindima. Este é um processo que visa deixar na videira apenas a quantidade de fruta que a árvore pode criar bem. Para que a uva seja boa, concentrada e com boa graduação”, explica-nos Thomaz Lima Mayer.

Este é um pormenor que nos apresenta todo o conceito. Na Lima Mayer, a qualidade é sempre colocada em primeiro lugar. A quantidade não é um factor equacionado.Nos dias que correm, o comprador procura experiências únicas em cada garrafa de vinho e a qualidade é cada vez mais o factor diferenciador, num mercado complexo e tão vasto como é o do vinho.Seguimos a rota das uvas, desde a videira, passando pelas mãos das senhoras de chapéu de abas largas, depois pelos cestos e o transporte, até chegarmos ao tapete onde são escolhidas e retiradas as folhas. É aqui, neste tapete rolante, que a uva faz a sua entrada na adega e inicia o seu ciclo de transformação.A qualidade da uva está garantida, agora os passos seguintes e a mestria do enólogo responsável, Rui Reguinga, ditarão a qualidade do vinho que se beberá daqui a dois ou três anos, conforme o lote de que estejamos a falar.Rui Reguinga foi considerado o “Melhor Enólogo do Ano”, pela Revista Vinhos e é, segundo Thomaz

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Lima Mayer, na sua capacidade de inovar e de prever a evolução dos vinhos, um dos segredos dos excelentes vinhos produzidos até aqui. Mas a uva tem de ser a melhor e isso só é possível com o controlo apertado das condições de produção.“Temos cinco variedades de uva: Petit Verdot, Cabernet, Aragonês e Alicante Bouschet. Esta é uma vinha que passa muita sede propositadamente para conseguir a melhor qualidade de fruto. Quanto mais sofre a planta, desde que não morra, claro, mais doce e saborosa é a uva e nós apostamos muito nisso”, explica-nos Thomaz Lima Mayer, referindo que existe ainda assim um sistema de rega: “Temos obviamente rega e bastante sofisticada, que consiste numa série de sensores espalhados pela vinha, que estão ligados a um computador no escritório. Estes sensores fazem uma leitura permanente daquilo a que chamamos o stress hídrico a várias profundidades e em função disso e das previsões meteorológicas, fazemos uma

dotação de rega, conforme os objectivos pretendidos e as características de cada casta”.Dentro da adega, todo o processo é controlado pelo frio, desde o choque térmico à entrada até à fermentação dentro das cubas, que são controladas tendo em vista os diferentes objectivos pensados para o vinho que está no seu interior.

BARRICAS DE CARVALHO FRANCÊS E O VINHO DOS DIAS DE HOJE

A adega onde o vinho estagia em barricas de Carvalho francês, é um velho curral recuperado. As suas paredes grossas garantem uma excelente protecção contra as grandes amplitudes térmicas da região. É neste espaço que o vinho Lima Mayer passa 18 meses em barricas de carvalho francês, que são substituídas a cada três anos. As barricas novas são destinadas aos vinhos reservas e edições especiais.

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“A barrica tem uma vida tão curta porque perde qualidades com o tempo. O papel fundamental da barrica não é dar gosto ao vinho, é amaciar os taninos através de um fenómeno chamado microxigenação. Este processo é possível porque a barrica é porosa e permite a passagem de oxigénio”, esclarece Thomaz Lima Mayer.Uma consequência deste processo, é o sabor mais ou menos saliente das madeiras, esse sabor a madeira que é um dos condimentos do que o produtor chama “cozinha”, e que ajuda a definir o vinho. No entanto, deixa a ressalva de que os vinhos Lima Mayer querem dar mais relevo à fruta, porque esta é de grande qualidade.E esta é uma das preocupações do enólogo e também onde se encontram as suas qualidades, na capacidade de fazer sobressair sabores, na mistura de castas e no doseamento dos “condimentos da cozinha” que diferenciam os vinhos uns dos outros.Numa adega de pequena dimensão como esta, tudo é feito numa dimensão quase familiar, muitas

LIMA MAYER & COMPANHIA

A Lima Mayer & Companhia está instalada no Alto Alentejo, entre Monforte e Veiros.A propriedade é constituída por montado de azinho e sobro e delimitada por duas ribeiras, Almuro e Leca.A propriedade é também reserva de caça e um santuário para a vida animal, onde se podem encontrar lebres, perdizes, patos ou outras espécies raras como a abetarda e javali.Persistem na propriedade provas de ocupação ancestrais desde a idade do bronze, passando pelo longo período romano e visigótico.A Ermida de São Sebastião, anexa ao monte hoje existente, foi construída por uma comunidade de religiosos que se dedicavam à terra e é umas das provas da longa ocupação humana naqueles terrenos.

VINHOS LIMA MAYER

A Lima Mayer & Companhia coloca regularmente no mercado três grandes vinhos: o Subsídio, o Lima Mayer e o vinho Rosé.Ocasionalmente, produz vinhos especiais como o Lima Mayer Reserva, ou um vinho monocasta de Petit Verdot.

tarefas como o engarrafamento são feitas em “outsoursing” e a altura do ano mais intensa é mesmo a das vindimas.Esta empresa de pequena dimensão trabalha com um grande sucesso para o mercado de exportação, sendo que neste momento 70% do vinho produzido é consumido em países como Angola, Brasil, Macau, China ou Canadá. Apenas 30% da produção entra no circuito do mercado nacional de restaurantes e de retalho.Foi lançado este ano um lote de vinhos em formato “Bag in Box”, que segundo Thomaz Lima Mayer tem sido um grande sucesso. É apenas vendido na Adega e nos bons restaurantes da região. “Eu gosto que a comunidade local tenha acesso aos meus produtos. Reconheço, no entanto, que são vinhos que não estão acessíveis a todos. Com este novo produto Bag in Box, os nossos vinhos estão mais acessíveis à região e é uma prova da forte ligação que a Lima Mayer tem com a comunidade, sublinha Thomaz Lima Mayer. [P]