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1 Os observatórios de conflitos ambientais como instrumentos pedagógicos para fortalecer práticas e pesquisas em Educação Ambiental Anne Kassiadou - UNIRIO Celso Sánchez - UNIRIO Daniel Renaud - UNIRIO Resumo O presente trabalho tem por intenção estabelecer um diálogo entre os campos da Educação Ambiental e da Ecologia Política, no sentido de construir uma reflexão que ajude a compreender as dimensões pedagógicas dos conflitos ambientais. Uma vez assentada na revisão bibliográfica de autores destes campos, foram feitas análises dos dados levantados em estudos de Observatórios de Conflitos Ambientais, buscando compreender o potencial pedagógico dos conflitos. Para tal, foram utilizadas categorias conceituais Freirianas para subsidiar as análises. Considerando os pressupostos da Educação Ambiental Crítica, foi possível identificar que os Observatórios de Conflitos expõem com clareza as dimensões relacionais entre territórios, territorialidades e territorialização, o que permite revelar que no enfrentamento dos conflitos ambientais alguns grupos sociais produzem epistemologias e pedagogias outras, constituindo-se assim, um campo fértil para análises no campo da Educação Ambiental, levando em consideração que as disputas neste campo envolvem tanto questões políticas, quanto epistêmicas. Palavras-chave: Educação Ambiental; Ecologia Política; Observatórios de Conflitos Ambientais The Observatories of environmental conflicts as pedagogical instruments to strengthen practices and researches in Environmental Education Abstract The present work wills to establish a dialog between the fields of Environmental Education and Political Ecology, in order to build a reflection that helps to understand the pedagogical dimensions of environmental conflicts. Set in bibliographic revision of authors from this field, analysis of the data were researched in studies of Environmental Conflicts; with the objective to comprehend the pedagogical potential of the conflicts. Conceptual categories of Paulo Freire were used to subsidize the analysis. Considering the assumptions of Critical Environmental Education, it was possible to identify that the Conflicts Observatories show clearly the relational dimensions between territories, territorialities and territorialization. This allows us to reveal that in the confronting of environmental conflicts, some social groups produce epistemologies and other pedagogies; constituting a fertile field to analysis of Environmental Education, taking into account that the disputes in this field evolve political and epistemological issues. Keywords: Environmental Education; Political Ecology; Environmental Conflicts Observatory IX EPEA Encontro Pesquisa em Educação Ambiental Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

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Os observatórios de conflitos ambientais como instrumentos

pedagógicos para fortalecer práticas e pesquisas em Educação

Ambiental

Anne Kassiadou - UNIRIO

Celso Sánchez - UNIRIO

Daniel Renaud - UNIRIO Resumo

O presente trabalho tem por intenção estabelecer um diálogo entre os campos da

Educação Ambiental e da Ecologia Política, no sentido de construir uma reflexão que

ajude a compreender as dimensões pedagógicas dos conflitos ambientais. Uma vez

assentada na revisão bibliográfica de autores destes campos, foram feitas análises dos

dados levantados em estudos de Observatórios de Conflitos Ambientais, buscando

compreender o potencial pedagógico dos conflitos. Para tal, foram utilizadas categorias

conceituais Freirianas para subsidiar as análises. Considerando os pressupostos da

Educação Ambiental Crítica, foi possível identificar que os Observatórios de Conflitos

expõem com clareza as dimensões relacionais entre territórios, territorialidades e

territorialização, o que permite revelar que no enfrentamento dos conflitos ambientais

alguns grupos sociais produzem epistemologias e pedagogias outras, constituindo-se

assim, um campo fértil para análises no campo da Educação Ambiental, levando em

consideração que as disputas neste campo envolvem tanto questões políticas, quanto

epistêmicas.

Palavras-chave: Educação Ambiental; Ecologia Política; Observatórios de Conflitos

Ambientais

The Observatories of environmental conflicts as pedagogical instruments to

strengthen practices and researches in Environmental Education

Abstract

The present work wills to establish a dialog between the fields of Environmental

Education and Political Ecology, in order to build a reflection that helps to understand

the pedagogical dimensions of environmental conflicts. Set in bibliographic revision of

authors from this field, analysis of the data were researched in studies of Environmental

Conflicts; with the objective to comprehend the pedagogical potential of the conflicts.

Conceptual categories of Paulo Freire were used to subsidize the analysis. Considering

the assumptions of Critical Environmental Education, it was possible to identify that the

Conflicts Observatories show clearly the relational dimensions between territories,

territorialities and territorialization. This allows us to reveal that in the confronting of

environmental conflicts, some social groups produce epistemologies and other

pedagogies; constituting a fertile field to analysis of Environmental Education, taking

into account that the disputes in this field evolve political and epistemological issues.

Keywords: Environmental Education; Political Ecology; Environmental Conflicts

Observatory

IX EPEA Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

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Introdução

O avanço do capitalismo contemporâneo e o aumento da produção e exportação

de commodities têm gerado conflitos ambientais sem precedentes que aumentam a

degradação ambiental e as situações de injustiças socioambientais. Conforme nos conta

Galeano (2013) trata-se da América Latina e suas “Veias Abertas”. Etienne la Boètie,

chama de o “mal-encontro” o período em que o território latino-americano, a partir de

1492 vai se tornar a base da formação do chamado sistema-mundo moderno-colonial

(PORTO-GONÇALVES, 2002). O início dessa formação fundamenta tanto a

colonização e seu projeto Universal Europeu, quanto o processo de “encobrimento do

outro” como nos diria Dussel (1992). As Veias Abertas da América Latina sangram não

apenas por conta da exploração dos bens naturais, mas, por certo, também se refere ao

sangramento e expropriação dos diferentes povos, seus saberes, suas práticas e suas

vidas, ou seja, o maior eco-etnocídio da história do mundo.

Na medida em que o campo da Educação Ambiental se apropria da realidade

histórica de nosso continente, e se compromete com ele, surgem possibilidades de

construir outras formulações acerca da questão ambiental que considerem as “vidas

negadas” (COSTA; LOUREIRO, 2016, p. 142), sobretudo, daqueles grupos que

historicamente são invisibilizados e injustiçados. Defendemos a ideia de que este

caminho no campo da Educação Ambiental também possibilita revelar as relações de

poder e os diversos protagonistas que “re-existem” com e contra esse contexto, e que

são portadores de epistemologias potenciais que podem ajudar a legitimar outras práxis

educativas ambientais. Essa linha argumentativa passa necessariamente pela

compreensão dos processos atuais que envolvem os conflitos ambientais, pois, a causa

constituinte da questão ambiental tem origem nas relações sociais, nos modelos de

sociedade e de desenvolvimento prevalecentes (LOUREIRO; LAYRARGUES, 2013,

p.68).

Considerando esse horizonte, o presente trabalho tem por intenção estabelecer

um diálogo entre o campo da Educação Ambiental e da Ecologia Política, no sentido de

construir uma reflexão que nos ajude a compreender as dimensões pedagógicas dos

conflitos ambientais, de maneira que possa favorecer pesquisas e práticas de Educação

Ambiental no contexto latino-americano. Parte-se do pressuposto que esta aproximação

entre a Educação Ambiental e o campo teórico-político da Ecologia Política permite

fortalecer compromissos com povos e populações tradicionais que historicamente

sofrem com situações de injustiças ambientais e que tais povos e segmentos sociais, são

produtores de modos de vidas, saberes, conhecimentos e pedagogias outras que

emergem no contexto dos conflitos ambientais nos quais estão inseridos.

O trabalho foi conduzido a partir do diálogo entre autores do campo da

Educação Ambiental e da Ecologia Política por meio do qual foi possível estabelecer as

bases para análises e reflexões a respeito do objeto de estudo. Uma vez assentada numa

perspectiva teórica pautada na revisão bibliográfica de autores destes campos, foi feita

uma análise dos dados levantados pelos Observatórios de Conflitos Ambientais,

buscando compreender o potencial pedagógico dos conflitos socioambientais

destacando possíveis conexões entre a Educação Ambiental e a Ecologia Política.

Acreditamos que estas análises podem contribuir para evidenciar as dimensões

pedagógicas dos conflitos ambientais, para que a Educação Ambiental tenha um papel

importante nas lutas por justiça ambiental, indo além do reducionismo que hoje

caracteriza muitas práticas educativas ambientais.

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Uma breve análise sobre os Observatórios de Conflitos Ambientais

Os conflitos acerca da questão ambiental são influenciados por uma complexa

teia de relações que envolvem processos culturais, políticos, históricos, econômicos e

sociais. Das práticas tradicionais/comunitárias aos modelos de gestão pautados sob a

lógica da apropriação tecnocientífica da natureza, emergem diferentes significados e

formas de uso e distribuição dos bens naturais que como consequências produzem

disputas desiguais, injustiças e conflitos ambientais (MENEZES, ROCHA, 2016).

Destaca-se que nesse estudo a noção de conflitos ambientais foi fundamentada a partir

de Acselrad (2004) como sendo:

(...) os conflitos que envolvem grupos sociais com modos

diferenciados de apropriação, uso e significação do território, tendo

origem quando pelo menos um dos grupos tem a continuidade das

formas sociais de apropriação ameaçada por impactos indesejáveis –

transmitidos pelo solo, água, ar ou sistemas vivos – decorrentes do

exercício das práticas de outros grupos (ACSELRAD, 2004, p.26).

É nesse contexto que surgem projetos que buscam articular grupos de pesquisas

e movimentos sociais e que acabam por revelar a potencialidade de se produzirem

conhecimentos sob outras lógicas, através do compartilhamento de experiências,

articulações e do diálogo de saberes. Em busca de exemplificar algumas destas

iniciativas, será exposto um breve panorama de projetos que trabalham com analises de

casos de conflitos ambientais. Este recorte nos é caro por acreditarmos que estes, podem

vir a ser reconhecidos como importantes instrumentos pedagógicos para pesquisas e

práticas de Educação Ambiental.

O primeiro estudo selecionado que abrange uma escala global é intitulado

Environment Justice Organisations Liabilities and Trade (EJOLT)1, sendo um projeto

de pesquisa que articula organizações sociais e grupos acadêmicos em nível

internacional que se dedica a catalogar e analisar os conflitos ambientais organizados

em um mapa global de conflitos, como forma de apoiar lutas sociais locais, nacionais e

internacionais em torno do movimento por justiça ambiental. O EJOLT se fundamenta a

partir do campo da Ecologia Política e trabalha com temáticas como dívida ecológica,

justiça climática, saúde ambiental, comércio injusto dentre outros. Com base em

informações obtidas no site oficial, o projeto busca identificar conflitos decorrentes do

modelo de desenvolvimento hegemônico cujos impactos ferem os direitos humanos e do

meio ambiente. Trata-se de um projeto apoiado pela Comissão Europeia que teve seu

Plano de Ação executado no período entre 2011-2015, com cerca de 2.000 casos

identificados neste período. O projeto tem por objetivo produzir e disponibilizar o Atlas

de Justiça Ambiental a partir de uma plataforma que permite ao cidadão pesquisar

informações específicas dos conflitos ambientais em diferentes territórios.

O EJOLT parte da premissa da pesquisa militante a partir da prática de uma

ciência engajada ou cidadã (MARTINEZ-ALIER, 2009). Sob uma perspectiva analítica

do projeto, Porto (2012) ressalta que o EJOLT reforça mecanismos solidários de

produção de conhecimento e atuação política em redes, considerando estes como

fundamentais para enfrentar as mazelas do atual modelo e construir as bases de novas

1 http://www.ejolt.org/

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relações sociais que reconfigurem outras formas de economia e metabolismo social.

Para o autor, este projeto se propõe desenvolver uma pesquisa que privilegia outras

formas de produção e compartilhamento de conhecimentos. Corroborando as análises de

Porto, onde é possível notar que o EJOLT não se reduz a listar territórios atingidos por

impactos ambientais, mas, sobretudo, busca reconhecer as diferentes territorialidades e

as suas populações como portadores de direitos.

O segundo projeto diz respeito ao Observatorio Latinoamericano de Conflictos

Ambientales (OLCA)2 que possui sua sede em Santiago, no Chile, e se propõe a analisar

os conflitos ambientais na América Latina e Caribe e a assessorar grupos sociais que

sofrem com situações de injustiças ambientais visando potencializar suas capacidades

de organização, em favor de seus direitos ambientais. Para tal, o projeto desenvolve

ações de pesquisas por meio de diagnósticos que buscam identificar as partes

envolvidas nos conflitos e seus distintos interesses, ligando-se a uma rede de

instituições e movimentos que atuam na mesma direção.

Como estratégia para publicização dos estudos, o OLCA possui um banco de

dados composto por livros, fascículos, artigos acadêmicos e matérias jornalísticas que

estão organizados no site oficial, onde ficam concentradas as descrições e análises dos

conflitos ambientais. Visando articular e consolidar intervenções diretas com as

populações que vivem situações de injustiças ambientais, o OLCA se dedica na

execução de projetos específicos que possuem fontes de financiamento, tais como

fundações e instituições públicas. A esse respeito, em 2015 o observatório realizou

projetos apoiados pela Fundação Rosa Luxemburgo, pela Fundação Tikva Grassroots

Empowerment dos Estados Unidos e pelo Ministério Federal de Cooperação Econômica

e Desenvolvimento da Alemanha.

O OLCA se revela como um instrumento importante para visibilizar e apoiar os

grupos sociais atingidos na América Latina embora se reconheça que as suas ações

possuem limites devido ao aumento dos conflitos territoriais a partir dos grandes

projetos de desenvolvimento, tendo como exemplo mais significativo a IIRSA

(Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana).

Segundo Santiago (2015, p.188) a IIRSA e seus denominados “eixos de

integração e desenvolvimento” não devem ser considerados como infraestruturas

“neutras”, pois trazem toda uma intencionalidade que permite reconhecer como sendo

“verdaderos dispositivos de poder técnico-espacial del capitalismo moderno/colonial”.

O autor ressalta a necessidade de analisar a crise e os desafios que envolvem a IIRSA

para o território latino-americano, evidenciando também, os processos emancipatórios

urgentes para a região. Este pensamento pode ser corroborado com Porto-Gonçalves

(2006, p.05), para ele, existem vantagens de falarmos a partir desse lugar de enunciação,

desde a América Latina e desde uma perspectiva emancipatória nesse momento

histórico em que velhos protagonistas, como os indígenas e os afrodescendentes, entram

em cena reinventando-se, agora com mais visibilidade.

Outro projeto analisado refere-se ao Mapa de Conflitos Envolvendo Injustiça

Ambiental e Saúde no Brasil3 que é um instrumento cujo principal objetivo é

sistematização, análise e divulgação de informações relativas aos conflitos ambientais

atualmente em curso no território brasileiro. Ele foi criado e formulado a partir de uma

parceria institucional entre a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e diversos grupos de

pesquisa, organizações não-governamentais, movimentos sociais e associações de base

2 http://olca.cl/oca/index.htm

3 http://www.conflitoambiental.icict.fiocruz.br/

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que num determinado momento se articularam em torno da Rede Brasileira de Justiça

Ambiental (RBJA). O acesso as informações nele veiculadas é público e ocorre a partir

de uma página na internet, onde cada um dos conflitos ambientais identificados é

plotado em uma plataforma de georreferenciamento, onde pessoas de diversas inserções

sociais e níveis educacionais podem facilmente resgatar informações sobre um

determinado conflito ou identificar os conflitos associados a algum processo produtivo

ou empreendimento. Com base em dados atuais referentes ao ano de 2017, foram

disponibilizadas informações a respeito de mais de 550 conflitos. De acordo com

Menezes e Rocha (2016) o Mapa de Conflitos foi pensado como um instrumento para

oportunizar uma valorização das lutas e das alternativas de produção de conhecimentos

e até mesmo o reconhecimento de outras epistemologias de base popular.

Ainda em relação à dimensão do território brasileiro, destaca-se o projeto Nova

Cartografia Social da Amazônia (PNCSA)4que é executado a partir de uma atividade

combinada entre o Projeto Novas Cartografias Antropológicas da Amazônia (PNCAA)

do Núcleo de Cultura e Sociedades Amazônicas (NCSA) do Centro de Estudos

Superiores do Trópico Úmido da Universidade do Estado do Amazonas e o Programa

de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Amazonas. O

PNCSA abrange regiões amazônicas, do cerrado e da floresta atlântica, agrupando

pesquisadores de diferentes instituições de ensino superior e de distintas formações

acadêmicas e tem como objetivo dar ensejo à auto-cartografia dos povos e comunidades

tradicionais. A cartografia neste caso é vista como instrumento para fortalecer o

processo de auto-afirmação de grupos sociais em situação de vulnerabilidade

socioambiental, buscando contribuir com as lutas de diferentes movimentos sociais

mediante a transparência de suas expressões culturais e suas territorialidades.

Desde 2005 o PNCSA desenvolveu diversos projetos em âmbito nacional e

internacional, não ficando apenas no território da Amazônia Legal. Por meio da

cooperação e financiamento de instituições públicas e do terceiro setor, o PNCSA

possui diversas ramificações que compõem um conjunto de projetos que são

desenvolvidos com povos e comunidades tradicionais, dando destaque ao amplo

repertório de categorias de auto-definição dos grupos envolvidos, além de pautas

reivindicatórias dos movimentos sociais. A partir do desenvolvimento de reflexões

teórico-metodológico sobre as identidades coletivas, suas formas organizativas e os

conhecimentos construídos a partir das situações de conflitos ambientais que compõem

as diversas territorialidades identificadas pelo projeto, o conjunto de informações são

publicadas em livros, fascículos, materiais didáticos e mapas temáticos, sugerindo que

estes sejam utilizados no contexto acadêmico e como instrumento para fortalecer as

lutas dos grupos envolvidos e de movimentos sociais engajados em causas

socioambientais.

Tendo como base as análises de Alfredo Wagner Berno de Almeida,

coordenador do PNCSA, os conflitos identificados no projeto chamam a atenção para

uma forma de resistência em que a noção de liberdade aparece conjugada a uma

dimensão coletiva manifestada pelas normas comunitárias de uso comum, e não

exatamente conjugada com uma ação individual (ALMEIDA, 2010, p. 329). Assim, no

que tange as contribuições do PNSCA para a Educação Ambiental, é possível avaliar

que se trata de um projeto que vai além de legitimar processos de auto-cartografia dos

grupos sociais, tratando-se de uma ferramenta em potencial para visibilizar lutas que se

4 http://novacartografiasocial.com/

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fortalecem através do compartilhamento de experiências, articulações e nos diálogos de

saberes, reorientando inclusive, categorias fundamentais de pensamento e organização

social como tempo e espaço (SANTOS, M, 2006). Um território que também merece atenção em relação aos conflitos ambientais

diz respeito ao Estado de Mato Grosso. Segundo dados da Comissão Pastoral da Terra

de 2016, foram registrados 41 conflitos no campo envolvendo um número superior a

6.000 famílias apenas no ano de 2016. Considerada umas das regiões que mais sofrem

com situações de injustiças ambientais, o Grupo Pesquisador em Educação Ambiental,

Comunicação e Arte (GPEA) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT)5 vêm

se dedicando a analisar essa realidade e desenvolveu um mapeamento dos grupos

sociais de Mato Grosso, evidenciando suas identidades e territórios, suas culturas e seus

processos de conflitos e injustiças ambientais. Busca-se contribuir com a geração de

conhecimentos das questões socioambientais a partir de ferramentas para visibilizar

grupos em condições de vulnerabilidade, tendo o campo da Educação Ambiental como

eixo orientador.

A partir dos projetos “Mapeamento dos Conflitos Socioambientais de Mato

Grosso: escala de resistência e ritmos de esperanças” do ano de 2012 e, o “Mapeando os

territórios e identidades de Estado de Mato Grosso, Brasil” de 2013, o grupo de

pesquisa produziu uma metodologia denominada Mapa Social para evidenciar os grupos

sociais de MT com suas identidades e seus territórios, suas culturas e suas múltiplas

sensibilidades, bem como, seus processos de conflitos e injustiças ambientais (SATO;

SILVA; JABER; QUADROS; ALVES, 2013, p.29).

Sob a ótica fenomenológica, a metodologia do Mapa Social parte do pressuposto

que todo processo deve ser construído com e pelas comunidades a partir das auto-

narrativas de representantes dos grupos sociais envolvidos nos projetos. O GPEA

trabalha com a noção de mapa, ou cartografia, fundamentada em conceitos de Deleuze e

Guattari, que compreendem que a cartografia não deve ser utilizada de forma

“engessada”, pois pode ser utilizada como ferramenta para conhecer as relações de

forças existentes num determinado território.

Uma abordagem acerca da questão ambiental a partir da metodologia do Mapa

Social desenvolvido pelo GPEA pode se aproximar da perspectiva de Carlos Walter

Porto-Gonçalves, que expõe: “São novos territórios epistêmicos que estão sendo

reinventados juntamente com os novos territórios de existência material, enfim, são

novas formas de significar nosso estar-no-mundo, de grafar a terra, de inventar novas

territorialidades, enfim de geo-grafar” (2002, p.09).

Outro estudo analisado diz respeito ao Mapa dos Conflitos Ambientais no

Estado de Minas Gerais6que é um projeto realizado desde 2007 pelo Grupo de Estudos

em Temáticas Ambientais da Universidade Federal de Minas Gerais (GESTA/UFMG)

em parceria com o Núcleo de Investigação em Justiça Ambiental da Universidade

Federal de São João del-Rei (NINJA/UFSJ) e o Núcleo Interdisciplinar de Investigação

Socioambiental da Universidade Estadual de Montes Claros (NIISA/UNIMONTES).

O projeto consolida-se a partir da interface entre pesquisa e extensão

universitária e tem por objetivo realizar um mapeamento qualitativo dos conflitos

5 http://gpeaufmt.blogspot.com.br/

6 http://conflitosambientaismg.lcc.ufmg.br/

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ambientais no Estado de Minas Gerais a partir da identificação, caracterização e

classificação dos casos de violação do direito humano e do meio ambiente.

Atualmente o Mapa de Conflitos de MG trabalha com um banco de dados com

cerca de 500 casos de conflitos ambientais. Para identificação dos casos, é considerada

a existência de denúncias institucionalizadas e/ou manifestação de sujeitos sociais, de

forma que as informações tenham uma funcionalidade para contribuir com a defesa dos

direitos ambientais e dos grupos envolvidos, assim como, contribuir para a elaboração e

execução de políticas públicas voltadas à sustentabilidade e à democratização da

apropriação dos territórios e condições naturais para grupos política e economicamente

fragilizados.

É reconhecido que os pesquisadores do GESTA/UFMG possuem uma tradição

em analisar as deficiências e as contradições das políticas ambientais assim como, suas

ferramentas que estimulam a mediação de conflitos de maneira que „prevaleça a crença

de que os conflitos entre diferentes seguimentos da sociedade possam ser resolvidos por

meio da “gestão”, do diálogo entre os atores, com a finalidade de se alcançar um

“consenso” (ZHOURI, 2014, p. 12).‟ Essa configuração revela a necessidade de

aprofundar análises a partir do campo da Educação Ambiental, tendo em vista que os

educadores ambientais têm sido envolvidos a partir de projetos ligados ao licenciamento

ambiental e outros (executados por ONG´s e/ou empresas de consultorias), para

desenvolverem este papel de “mediação de conflitos”, que por vezes, levam ao

estabelecimento de consensos e ao negligenciamento das contradições e os conflitos

sociais, assim como, das dimensões pedagógicas dos conflitos ambientais.

Considera-se que a via adotada pelo GESTA/UFMG revela um horizonte de

possibilidades para o campo da Educação Ambiental ao explicitar as contradições das

políticas ambientais e o complexo debate envolvendo questões políticas, sociais e

culturais a partir dos conflitos ambientais analisados em MG. O posicionamento

teórico-metodológico do grupo traz uma inegável contribuição para o pensamento

crítico ambiental, sustentando a relevância da articulação entre a Educação Ambiental e

a Ecologia Política e a busca por sentidos outros de mobilização e participação social na

esfera pública das políticas ambientais.

Considerando que o foi apresentado até agora e observada devida importância de

trabalhar a dimensão dos conflitos ambientais nas práticas educativas ambientais,

salienta-se outro projeto que vem sendo desenvolvido no âmbito das pesquisas do

Grupo de Estudos em Educação Ambiental Desde el Sur (GEASUR)7 da Universidade

Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), que se concentra em estudar práticas

pedagógicas de Educação Ambiental nos contextos formal e não-formal. Assumindo a

perspectiva da decolonialidade, o grupo se propõe a investigar as dimensões

pedagógicas dos conflitos ambientais emergentes em lutas populares, movimentos

sociais, populações tradicionais, povos indígenas e grupos em situação de

vulnerabilidade socioambiental no cenário latino-americano, a partir do projeto de

pesquisa Observatório das Pedagogias dos Conflitos Ambientais.

Cabe ressaltar que o Observatório das Pedagogias dos Conflitos Ambientais não

tem como foco a análise dos conflitos ambientais, pois se parte do levantamento de

outros estudos para a identificação destes conflitos, construindo assim, uma ferramenta

de sobreposição cartográfica. Alguns destes estudos já foram retratados neste artigo,

todavia, mesmo com diferentes abordagens, esses direcionam suas análises para uma

7 https://geasur.wordpress.com/

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perspectiva descritiva dos conflitos ambientais o que por consequência, revelam que as

formas de resistências, enfrentamentos e lutas destes grupos em situação de conflitos

ambientais são construídas a partir de epistemologias outras, constituindo-se assim, um

campo fértil para análises a respeito das pedagogias que emergem desses contextos.

Nesse sentido, o GEASUR/UNIRIO a partir do Observatório das Pedagogias dos

Conflitos Ambientais, visa analisar as práticas educativas que emergem dos grupos

sociais envolvidos em situações de conflitos ambientais, sobretudo, as pedagogias

oriundas dos grupos mais vulnerabilizados que a partir de suas estratégias de

resistências, lutas e organização política, produzem epistemologias e pedagogias outras.

Pretende-se com o Observatório alimentar as práxis em Educação Ambiental,

considerando o ponto de vista de Costa e Loureiro (2013, p.84) que nos alerta que

„várias práticas educativas ambientais supostamente voltadas para a emancipação não

estão inseridas numa trajetória de lutas sociais, que foram ignoradas, silenciadas ou

esquecidas em nossa caminhada pedagógica.‟ É fato também que existe a necessidade

de ampliar a visibilidade para as diferentes estratégias de enfrentamentos aos conflitos

ambientais contemporâneos que emergem de movimentos sociais, lutas populares,

povos tradicionais e indígenas que sofrem e resistem às situações de injustiças

ambientais das quais estão expostos.

Discussões preliminares

Considera-se que a reflexão sobre ferramentas pedagógicas e metodológicas para

o campo da Educação Ambiental seja pertinente devido ao fato de existirem disputas

internas neste campo e pela necessidade de superar uma visão hegemônica na Educação

Ambiental que se baseia nas tendências conservadoras e comportamentalistas. Além

disso, é comum identificar ações e discursos na Educação Ambiental que optam por não

trazer as dimensões dos conflitos ambientais no contexto das práticas educativas, o que

favorece o apagamento tanto das situações conflituosas, como dos atores sociais

envolvidos nos conflitos, havendo assim, um enfraquecimento da dimensão política da

Educação Ambiental.

Entende-se que os Observatórios de Conflitos Ambientais podem auxiliar ações

de Educação Ambiental na medida em que apontam e problematizam as configurações

geopolíticas dos territórios e as diferentes territorialidades. Isso também contribui para

recuperar determinados conceitos que são valiosos para compreender as relações de

poder que envolvem a questão ambiental tal como, a noção de território. Como vêm

demonstrando Porto-Gonçalves, o território é uma categoria espessa que pressupõe um

espaço geográfico que é apropriado e esse processo de apropriação – territorialização –

enseja territorialidades – que estão inscritas em processo sendo, portanto, dinâmicos e

mutáveis. Estamos diante de uma tríade relacional: território – territorialidade –

territorialização (2002, p. 13).

É comum verificarmos em alguns projetos de Educação Ambiental a realização

de diagnósticos ambientais nos territórios para assim, serem definidas as estratégias das

ações pedagógicas. Partindo desta premissa, verifica-se que as metodologias utilizadas

nos Observatórios de Conflitos Ambientais levam a expor com clareza os atores sociais

envolvidos nos conflitos, as diferentes formas de uso e distribuição dos bens naturais, a

caracterização do perfil das populações mais vulnerabilizadas, os impactos e riscos

ambientais, os problemas associados à saúde da população, a dimensão territorial do

conflito, os processos e atividades que produzem os casos de injustiças ambientais, os

apoiadores dos grupos mais atingidos, dentre outras caracterizações.

Desta forma, para além de uma caracterização da ocupação territorial e os

impactos ambientais, ampliam-se as possibilidades de diagnóstico ambiental na

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Educação Ambiental de forma a associar os bens naturais existentes com as diferentes

formas de utilização e distribuição, assim como, identificar os “novos sujeitos que se

insinuam, instituindo novas territorialidades” (PORTO-GONÇALVES, 2002). A esse

respeito, como assinalado por Sánchez e Menezes (2015, p.230), a territorialidade e a

conflituosidade ambiental assumiriam as centralidades necessárias para fazer emergir as

temáticas de justiça ambiental, racismo ambiental entre outras demandas dos

movimentos sociais. E na medida em que a Educação Ambiental se aproxima desta

linha argumentativa, ampliam-se os debates acerca da dimensão política da Educação

Ambiental assim como o seu potencial crítico e emancipatório.

Apesar de se reconhecer esforços de teóricos que sustentam a pertinência da

articulação entre a Educação Ambiental e a Ecologia Política, trazendo assim, a

dimensão dos conflitos ambientais (LOUREIRO; LAYRARGUES, 2013) no entanto,

ainda é comum verificar práticas educativas ambientais (seja em projetos ligados ao

licenciamento ambiental ou de organizações não governamentais), que revelam um

cenário „sendo uma prática que mais tem servido à mediação dos conflitos e à resolução

negociada nos processos concretos que envolvem a efetivação de políticas e

empreendimentos‟, tal como afirmam Machado e Santos (2013).

Contudo, para avançar nesse horizonte, sugere-se que certas categorias

Freirianas podem contribuir para dar visibilidade às dimensões pedagógicas dos

conflitos ambientais, de forma a potencializar práticas e pesquisas na Educação

Ambiental, levando em consideração que as disputas neste campo envolvem tanto

questões políticas, quanto epistêmicas.

Buscando aprofundar as discussões sobre os Observatórios de Conflitos

Ambientais e as possibilidades para que estes estudos possam ser vistos como

ferramentas pedagógicas para a Educação Ambiental, foram eleitas as categorias

“situação-limite”, “ato-limite” e “inédito-viável” (FREIRE, 2014) no sentido de

compreender como tais categorias estão presentes nas representações e práticas que

envolvem as populações vulnerabilizadas diante de casos de conflitos ambientais.

Considera-se relevante lembrar que Paulo Freire entendia que toda ação humana

tende à práxis. Práxis que, sendo reflexão e ação verdadeiramente transformadora da

realidade, é fonte de conhecimento reflexivo e ação (FREIRE, 2014, p.127). Assim,

cabe ressaltar que se compreende como “situação-limite”, os problemas ambientais

enfrentados pelas populações que vivem situações de conflitividade no contexto

socioambiental, pois determinada situação crítica pode vir a levar para reflexões e

reações frente à esta situação.

Nas palavras de Freire (p.126) desta forma, é próprio dos homens é estar, como

consciência de si no mundo, em relação de enfrentamento com sua realidade em que,

historicamente, se dão as “situações-limite”. E este enfrentamento com a realidade para

a superação de obstáculos só pode ser feito historicamente, como historicamente se

objetivam as “situações-limite” (FREIRE, 2014. p. 126).

No que tange ao “ato-limite”, entende-se a participação e reação concreta das

populações, ou seja, as lutas e formas de enfretamentos aos conflitos. A categoria

“inédito-viável” aponta para a perspectiva dos sonhos e das utopias sobre novas

realidades, „cuja concretização se dirigirá sua ação‟ (FREIRE, 2014. p.130).

Na medida em que se busca compreender o que se apresenta como “situação-

limite”, “ato-limite” e o “inédito-viável” em situações de conflitos ambientais

identificados nos observatórios de conflitos, a Educação Ambiental pode servir como

lente tanto para evidenciar esses processos quanto para contribuir com a construção de

outros horizontes de possibilidades, a partir do inédito-viável. Acredita-se, portanto, que

os projetos que analisam conflitos ambientais são importantes ferramentas tanto para

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visibilizar os atores sociais mais vulnerabilizados e as suas formas de enfrentamentos

aos conflitos, quanto para oportunizar uma valorização das alternativas de produção e

compartilhamento de conhecimentos e o reconhecimento de outras epistemologias de

base popular, assim como, outras práticas pedagógicas.

Considerações Gerais

Considera-se que o diálogo entre os campos da Educação Ambiental e da

Ecologia Política pode ser uma estratégia para revelar condições desiguais nas disputas

políticas que envolvem questões ambientais, além de criar possibilidades para visibilizar

e legitimar as lutas e formas de enfrentamentos que emergem dos conflitos ambientais,

apontando até mesmo para outras epistemologias e pedagogias de base popular. Desta

forma, acredita-se na importância da incorporação das dimensões pedagógicas dos

conflitos ambientais às práticas de Educação Ambiental, uma vez que a Educação

Ambiental se constitui como um campo da ciência dinâmico, complexo e permeado por

disputas político-ideológicas.

Considera-se também que a perspectiva de análise apresentada pode favorecer o

estreitamento do diálogo entre a Educação Ambiental e a Ecologia Política,

fortalecendo tanto estes campos específicos quanto o próprio movimento por justiça

ambiental, tendo em vista que ambos buscam problematizar, refletir e sugerir

alternativas para o projeto societário vigente. Acredita-se que a aproximação entre os

campos de conhecimento possibilita revelar as condições de expropriação dos recursos

ambientais e de grupos mais vulnerabilizados, que sofrem pelas condições de

desigualdades que giram em torno das formas de uso e distribuição dos bens naturais.

Diante destas breves discussões e análises apresentadas no presente artigo,

entende-se que as populações vulnerabilizadas produzem conhecimentos, saberes,

práticas e determinadas pedagogias que emergem no contexto dos conflitos

socioambientais das quais estão inseridas. Além disso, considera-se que a produção e

divulgação destes estudos de Observatórios de Conflitos Ambientais podem contribuir

para municiar pesquisas e práticas em Educação Ambiental e no enfrentamento dos

projetos que apontam para medidas conservadoras e pragmáticas do campo.

Entendendo a necessidade de ampliação das investigações mais engajadas e

militantes no campo da Educação Ambiental, acredita-se que os Observatórios de

Conflitos podem também contribuir com outras formas de pesquisa na Educação

Ambiental, de maneira que os atores vulnerabilizados estejam como protagonistas das

pesquisas, alimentando questões pesquisadas a partir dos “saberes situados” e não

apenas, vistos, como sujeitos a serem pesquisados.

Isso posto, longe de defender apenas estes instrumentos como forma de

alimentar práticas em Educação Ambiental, parte-se do pressuposto que os

Observatórios de Conflitos Ambientais possuem grande potencial pedagógico, pois

possibilitam dar voz aos grupos e povos que historicamente são invizibilizados,

injustiçados e por vezes criminalizados. Este potencial pedagógico é ampliado na

medida em que se possibilita enxergar o protagonismo dos sujeitos que estão nos

conflitos como produtores de conhecimentos e de outras formas de enfrentamentos aos

processos emancipatórios, apontando assim, caminhos para questões que por décadas

estão sendo debatidas e disputadas no campo da Educação Ambiental, refletindo na

potencialização das discussões políticas neste campo específico.

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