34
FINOM – FACULDADE DO NOROESTE DE MINAS ANDRÉA REJANE GOMES SOUZA OS ORIXÁS E SUA CONEXÃO COM OS FILHOS-DE-SANTO NA CIDADE DE TEIXEIRA DE FREITAS

Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

FINOM – FACULDADE DO NOROESTE DE MINAS

ANDRÉA REJANE GOMES SOUZA

OS ORIXÁS E SUA CONEXÃO COM OS FILHOS-DE-SANTO NA CIDADE DE TEIXEIRA DE FREITAS

Teixeira de Freitas2013

Page 2: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

ANDRÉA REJANE GOMES SOUZA

OS ORIXÁS E SUA CONEXÃO COM OS FILHOS-DE-SANTO NA CIDADE DE TEIXEIRA DE FREITAS

Artigo científico apresentado à Faculdade de

Educação da FINOM como requisito parcial

para obtenção de titulo de Especialista em

História e Cultura da África.

Orientador: XXXXXXXXXXXX

Teixeira de Freitas2013

RESUMO

Page 3: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

O presente trabalho consiste em um estudo sobre a inserção do candomblé na cidade de Teixeira de Freitas e a relação entre os adeptos da religião afro-brasileira neste município com os seus orixás, qual a representação desses orixás na comunidade adepta do candomblé. Buscou-se por meio dessa, saber como os candomblecistas entendem sua relação com a sociedade local. Realizado por meio de levantamento teórico e entrevistas semi-estruturadas com sujeitos adeptos do candomblé. Os resultados obtidos com essa pesquisa é que a religião afro-brasileira tem em seu contexto uma relação de muita cumplicidade com suas entidades sendo influenciados por eles em suas condutas sociais.

Palavras-chave: Religião, candomblé, orixá.

Page 4: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa surgiu de uma inquietação desde os tempos de criança,

quando uma das várias coisas que aprendíamos sobre religião era que o candomblé

faz parte de atos demoníacos e não era bem visto pela religião cristã, só em ouvir o

som dos tambores já nos amedrontávamos. Com a maturidade percebemos o que

tínhamos era medo do diferente e nada melhor do que conhecer o que nos

amedronta para a partir daí tirarmos conclusões por nossa própria experiência.

Como já tinha um interesse especial pela religião afro-brasileira, ao entrar no curso

de Historia senti a necessidade de referenciar qual o espaço que o Candomblé

ocupa na cidade de Teixeira de Freitas. Creio que esta é uma proposta nova para a

região, pois a cidade esta em desenvolvimento e vemos muito pouco a religião afro-

brasileira inserida no contexto local, haja vista que a mesma ainda sofre com

preconceitos que a relacionam com toda sorte de magias. Apesar de estarmos em

um mundo que se diz moderno, essa idéia ainda prevalece na mentalidade das

pessoas.

Toda relação humana é passível de estudo, e o candomblé é um fenômeno religioso

que deve ser pesquisado como qualquer outro grupo, para que se possa

compreender como se dá a ligação entre a cuminidade-de-santo e principalmente de

que forma os mesmos interagem com os Orixás, que para os leigos são vistos como

demoníacos, mas para os seus seguidores são os guias espirituais que estão

ligados aos seus antepassados.

Para desenvolver este estudo trabalhamos com pesquisas na área de sociologia e

da antropologia, que segundo Lima “hoje está envolvido com questões sociais, com

o desenvolvimento e superação dos preconceitos e mitos herdados do colonialismo”

(Lima, 2005, p.13). Utilizamos da pesquisa bibliográfica e de campo. Na pesquisa

bibliográfica, muitos autores serviram de fundamentação para o meu trabalho, dentre

os de mais visibilidade Prandi (1996), Bastide (2001) e Verge (1980), são autores

que estudaram a fundo o Candomblé e nos da uma visão geral sobre o universo

dentro do Candomblé. Outro autor que se faz presente é Bourdieu, que traz a noção

de campo onde se da às disputas pelos bens simbólicos dentro da religião. O

Page 5: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

“campo é compreendido por Bourdieu como o espaço social das relações mais ou

menos desiguais”. Com Lépine entramos em um campo específico que seria a

relação direta entre os Orixás da nação Keto e os seus adeptos, revelando que essa

relação influência no cotidiano dos filhos e filhas-de-santo.

A metodologia utilizada a foi pesquisa de campo, fomos ao local a ser pesquisado e

tive o primeiro contato direto com o pai-de-santo responsável pela casa e após

algumas conversas com o mesmo, me foi indicado nome de algumas pessoas que

freqüentam o centro e já tem o saber necessário para ocupar cargos no local e por

tanto para se posicionar em relação a sua religião. Com as pessoas indicadas pelo

babalorixá utilizei o método de coletas de dados onde apliquei a entrevista semi-

estruturada, pois o contato direto com esses entrevistados era mais difícil por

questão do pouco tempo disponível que os mesmo tinham, são bastante atarefados.

Um dos sujeitos da minha pesquisa foi o babalorixá Jenilton fundador do centro de

candomblé Ilé Amnirá Axé Aláketò, que funciona aqui na cidade desde 1989. Ele

começou a freqüentar o candomblé desde os dois anos de idade, foi levado pela avó

para curar uma enfermidade e desde então não se desvinculou mais. O seu orixá é

Oxum que representa a deusa da fertilidade, da água e do amor.

Foi utilizado como critério na escolha das pessoas o fato que o babalorixá é o

membro que possui o poder legitimado pelos seus fiéis e por possuir um cargo que

lhe permite dirigir os bens sagrados de sua casa de culto e tem o conhecimento dos

fundamentos religioso que transmite a seus filhos e filhas-de-santo.

Pude contar também com a colaboração de mais quatro filhos e filhas-de-santo. Um

adolescente de 17 anos que é filho do orixá Ogum e desenvolve a função “axogun”

que é sacrificante dos bichos para o orixá que é dono da faca. Outra colaboradora

foi uma senhora de 55 anos que participa do candomblé há 25, o seu orixá é

Oxaguiã e sua função dentro da casa é a de “iyabassê”, responsável pela

preparação da comida dos orixás. A terceira pessoa foi uma senhora de 53 anos,

frequenta o centro há 20 anos e é do orixá Oxumaré atuando como “iyakekerê,

quem ajuda nas atividades da comunidade. E o qaurto entrevistado foi um jovem, de

25 anos que participa do grupo há oito anos e seu orixá Oxumaré, sua função é

Page 6: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

“babakekerê” a segunda pessoa da casa. Ele veio a participar do candomblé por

causa de uma enfermidade. Devido os afazeres dos sacerdotes a pesquisa não foi

muito demorada, pois eles são pessoas muito atarefadas e muito bem organizadas

em relação a seus afazeres.

O artigo intitulado como “Inserção do Candomblé em Teixeira de Freitas”, é

apresentada a pesquisa de campo, que são as entrevistas que foram efetivadas com

as pessoas escolhidas, sendo acrescida também uma análise do que foi observado

durante as conversas. Veremos como o candomblé esta inserido no contexto local e

de que forma os meus colaboradores se relacionam com suas entidades, o que

representa esse contato na vida dessas pessoas que entrevistei e como se dá a

conexão entre eles e a comunidade local.

Page 7: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

O CANDOMBLÉ EM TEIXEIRA DE FREITAS

QUAL A VISÃO QUE OS FILHOS DE SANTO TEM DA SUA REGIÃO

A cidade de Teixeira de Freitas, situada no extremo sul da Bahia, tem um

desenvolvimento político recente, pois foi emancipada em 1985. Apesar do pouco

tempo de sua formação, com certeza já existe nela uma memória local constituída

mesmo antes desta emancipação.

Sendo esta cidade formada basicamente por pessoas oriundas de outras regiões e

por sua proximidade com a BR 101, que facilita o fluxo migratório de pessoas que

chegam e que saem, que se estabelecem aqui ou não, ela é considerada por

algumas pessoas como uma cidades sem identidade. Mas onde há ser humano há

História e memória. E é em busca desta memória que nos propomos a conhecer

como a religião afro, em especial o candomblé, está inserida neste contexto local.

O centro de candomblé Ilé Amonirá Axé Aláketò, cujo significado é “Casa da

liberdade de uma força de aláketò”, situada na Rua Samuel Mosar, 64, no bairro

Santa Rita, atua na cidade há 21 anos. Ela foi aberta em 1989 pelo babalorixá

Jenilton, que o comanda até os dias atuais.

Para manter viva a memória do barracão ele cataloga todas as fotografias dos

eventos que acontece no local, já que segundo ele “no candomblé não é permitido

divulgação dos seus conhecimentos através de filmagens”. Essas fotos são só das

festas, pois os fundamentos da religião são passados em particular e com todo sigilo

para o iniciado.

Pertencer a “nação” Keto é motivo de orgulho para ele, pois o coloca em ligação

com a sua matriz africana alaketó que deriva de uma cidade em África chamada

Keto. Percebe-se na conversa com o pai-de-santo Jenilton o orgulho em fazer parte

dessa cultura religiosa que é considerada por ele como a mais tradicional, a mais

pura. Ou seja, aquela que busca manter a maior fidelidade possível com os ritos

praticados em África. Em uma das suas falas ele coloca que “esta é a única casa de

Page 8: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

candomblé tradicional da cidade, as outras são de umbanda ou espiritismo, não tem

raiz em África”.

Esse depoimento vem a casar com o que diz Silva “candomblé é considerado pelos

seus participantes como mais puro ou superior aos demais porque nele teria sido

preservada a amor fidelidade às origens africanas”. (BARCELLOS, 2005, p. 30-31)

Se pensarmos nas adaptações e mudanças que esses cultos sofreram ao longo dos

tempos por necessidade de manter as suas raízes vivas é difícil compreender que

elas sejam tão puras assim como os seus fiéis acreditam, pois como foi ressaltado

no primeiro capitulo, ela recebeu influência de vários grupos étnicos tanto em África

quanto aqui no Brasil e não só da nação Keto.

Mesmo que se utilize de algumas práticas semelhantes as que são aplicadas em

África, vimos que para adaptar-se ao Brasil foi necessário mudar a forma de culto ao

orixá, que em nossa terra se resumiu ao terreiro ou barracão como eles chamam,

reunindo as divindades em um panteão de deuses e que muitos que existiam em

África não sobreviveram à nova terra, a prova disso é que o numero de divindades

aqui no Brasil é bem inferior ao que havia no continente africano.

Os entrevistados já são iniciados, participam a um bom tempo do candomblé e

exerce funções imprescindíveis para manter o culto nesse local. Eles conhecem os

fundamentos da religião e buscam efetivar suas funções com a maior

responsabilidade e dedicação porque isso faz parte da vida deles e é fundamental

para que tenha uma boa relação com o seu orixá e é a através da dimensão

espiritual que eles obtêm paz e tranqüilidade na vida.

Três dos entrevistados foram para o candomblé por vontade própria, entre estes há

um jovem de dezessete anos que disse que já nasceu dentro do candomblé e nunca

pensou em sair porque viu o quanto o candomblé era importante na vida das

pessoas. O jovem de 25 anos disse que foi levado ao candomblé por problemas

espirituais, por isso ele fez o santo.

Eles não podem fazer referência de quando foram iniciados, só nos informa qual é o

seu orixá. O segredo iniciático deve ser bem guardado, para conhecer é preciso

fazer o santo como eles dizem, ou seja, passar pelos ritos que levam ao

conhecimento sagrado.

Page 9: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

Outro fato identificado e que me deixou surpresa foi que todos se dizem católicos

mesmo participando há vários anos do candomblé, ou seja, eles não a identificam

como religião. Prandi atribui essa atitude a perseguição que a religião afro-brasileira

vem sofrendo desde o início de sua formação aqui no Brasil. Ele coloca que:

Até recentemente essas religiões eram proibidas e por isso duramente perseguida por órgãos oficiais. Continuam a sofrer agressões, hoje menos da policia e mais de seus rivais pentecostais e seguem sob forte preconceito, o mesmo preconceito que se volta contra os negros independentemente de religião. Por tudo isso, é muito comum, mesmo atualmente, quando a liberdade de escolha religiosa já faz parte da vida brasileira, muitos seguidores das religiões afro-brasilleiras ainda se declarem católicos, embora sempre haja uma boa parte que declara seguir a religião afro-brasileira que de fato professa. (PRANDI, 2003, p. 16)

Ele acrescenta também que essa atitude de auto denominar-se católico esta

relacionada à região, é uma característica local. A meu ver Teixeira de Freitas não é

uma região que as pessoas estejam abertas a compreender e aceitar o candomblé,

é uma questão cultural da nossa sociedade.

Vivemos em uma comunidade onde ainda permeia as velhas idéias e os conceitos

cristãos ainda dominam, aprova disso é a predominância da religião católica e a

expansão de igrejas evangélicas, que no momento é uma das pregadoras mais

atuantes contra o candomblé.

Em suma, os meus colaboradores buscam manter acessa a chama da matriz

africana mesmo que não conheçam a fundo suas raízes, pois para eles o encontro

com as suas divindades os proporciona paz, alegria e tranqüilidade.

A RELAÇÃO ORIXÁ FILHO-DE-SANTO

Page 10: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

No segundo capítulo, vimos como os orixás se relacionam com seus filhos aqui na

terra a partir de conhecimentos teóricos. Pudemos entender toda relação familiar

que os envolve e como a divindade está ligada a personalidade da pessoa que o

recebe e determina ou induz o seu comportamento.

As pessoas que entrevistei têm uma relação íntima com a sua entidade, elas fazem

os sacrifícios e oferendas para mantê-los satisfeitos e garantir a proteção que

necessitam. Elas relataram que para entrar em sintonia com seus orixás é preciso

todos os dias seguir um ritual: “levanta em jeju, bate a cabeça no chão para ter

contato com a terra, tudo vem do chão. Conversa com o orixá como se fosse uma

pessoa, pois ele já mora na nossa vida. É preciso respeitar as regras que ele exige

ter atitudes de acordo com o orixá. Tem um dia da semana que é especial. Para

manter a energia tem que tomar banho com as folhas dele e passar o dia em casa

se guardando para o orixá”.

Em relação a essa intimidade Lépine afirma que “o adepto estabelece uma relação

íntima com o seu orixá pessoal, que corresponde a um dos tipos culturalmente

definidos da personalidade, com o qual ele passa a identificar-se”. (Lépine, 2000, p.

60)

As pessoas entrevistadas reconhecem a influência que recebem de suas divindades

e afirmam que eles não interferem na sua vida, mas percebe-se que eles as

direcionam, identifica-se isso quando analisamos a fala deles “já mora na nossa

vida”. Elas demonstram um enorme prazer e alegria ao falar do candomblé e

principalmente da entidade ao qual está ligado e isso faz com que quem esta

ouvindo sinta a vibração e a energia que esse devoto recebe do seu orixá.

Todos os dias quem é feito no santo entra em contato com sua entidade, mas há

determinados momentos que comunicação com o orixá se dá através dos búzios,

para qualquer ato, decisão ou orientação é feita a consulta ao santo que é mediada

pelo pai-de-santo, e a partir das respostas é que serão tomadas as providências

orientadas pelos orixás, que também pode prever acontecimentos desagradáveis no

futuro da pessoa.

O orixá orienta e ajuda seu filho a alcançar seus objetivos, definidos de acordo com os ideais da classe a qual pertence. Nada se faz sem consultar

Page 11: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

o santo: negócios, viagens, mudanças, visitas, casamentos, etc. (Lépine, 2000, p. 160)

Para freqüentar o centro não é necessário fazer o santo, é possível participar, fazer

o jogo de búzios para identificar seu orixá, ser devoto e cumprir as obrigações com o

santo sem ser iniciado. O processo de iniciação se estende a quem deseja fazer

parte do corpo de sacerdotes do candomblé. Perguntei ao pai-de-santo Jenilton qual

é o numero de adeptos que freqüentam o centro, mas ele disse que não sabe

exatamente porque são muitos, mas nos dias de cultos ou festas não é possível o

encontro de todos, pois existem pessoas em várias localidades e até no exterior.

Eles vão aparecendo de acordo à ocasião da festa e conforme a necessidade de

orientação. Em relação às festas, seguem um calendário litúrgico que determina o

mês e data das festas.

A função do babalorixá segundo o Sr. Jenilton é a de zelar pelos orixás, zelar pelos

fiéis e orienta-los. Consultar através dos búzios para saber se o problema a ser

resolvido é com o orixá, se estiver tudo bem entre a pessoa e o orixá o mesmo

indicará a quem procurar para resolver o problema. Ex: se problema não for de

ordem espiritual, ele indicará que procure um médico ou outro especialista que

possa resolver.

Ele se coloca como orientador dos que o procuram, pois segundo ele “a sua função

não é separar os casais ou fazer mal as pessoas e sim ajudá-las”, e acrescenta, “o

orixá não aceita quem faz mal, busca é prosperar a vida da pessoa”.

Ao contrário do que o senso comum pensa a casa de candomblé é completamente

organizada e tem uma forte hierarquia, pois para que tudo funcione bem é preciso

que cada um desempenhe bem a função que lhe foi designada. O pai-de-santo é

quem comandada e decide tudo, mas ele conta com colaboradores de confiança que

é escolhido pelo orixá reinante da casa. As pessoas que tive a oportunidade de

entrevistar tem cargos de confiança dentro do centro pesquisado e isso lhe atribui

respeito perante a sociedade religiosa a qual participa. As funções dos meus

colaboradores estão relacionadas abaixo:

Page 12: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

Babakekerê

Ou Yakekerê

São os segundos na hierarquia da casa-de-santo, os que substituem o pai

ou a mãe-de-santo. Assim como o babalorixá eles têm a função de

orientar, mostrar o melhor caminho para o filho de santo. Só podem

assumir essa função quem é feito no santo há no mínimo sete anos.

Axogum

Cargo essencialmente masculino, ele deve cuidar dos animais a serem

sacrificados e ele mesmo deve matá-los e separar os miúdos (axé) e o

couro que também é utilizado nos sacrifícios. Para se tornar um axogum é

preciso receber “mão-de-faca”

Yabessê

É um cargo particularmente feminino, ela cuida do preparo da comida do

santo, é a cozinheira do axé. O requisito para o cargo é que seja feita no

santo e receba a autorização do zelador.

Existem várias funções dentro do terreiro e cada uma tem sua importância, pois é

imprescindível que todos desempenhem sua tarefa para o bom andamento da casa.

Aqueles que já tenham feito o santo, mas encontra dificuldades em realizar sua

tarefa será acompanhado por alguém mais velho até estar totalmente preparado

para assumir suas funções com segurança. Podemos perceber também que há

cargos definidos para o sexo masculino e para o feminino, mas também existem

cargos que podem ser realizados por qualquer um dos sexos.

Para quem não conhece e acreditava que era algo de badernas e desordem, pude

comprovar que existe um aparato bem montado e definido que coloca o candomblé

em ponto de igualdade em relação às outras religiões nas questões da fé,

organização e hierarquia.

O CONVÍVIO COM A SOCIEDADE LOCAL

Page 13: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

De acordo com o babalorixá Jenilton a relação com a vizinhança é tranqüila, pois ele

não a incomoda e nem é incomodado por ela. O que se percebe na fala dele é que

não esta nem um pouco preocupado em ser aceito pelos outros, ele tem convicção

de sua religião e não vai fazer diferença o que o outro pensa.

Nos dias de festa fazem sua batucada, mas como essas festas não acontecem

todos os dias, só em ocasiões especiais, nunca recebeu reclamação em relação ao

barulho. Ao ser perguntado se já participou de festas junto com a igreja católica, ele

respondeu que não, pois na cidade as pessoas não estão preparadas para isso e

quanto ao preconceito, ele diz: “As pessoas é que se incomodam, que tem a

preocupação com eles, enquanto isso nos não discriminamos ninguém, qualquer um

que chegar a nossa porta é bem recebido independente de religião, conduta ou

posição social”.

Essa fala do Sr. Jenilton me remete a Prandi, que diz:

O candomblé não distingue entre o bem e o mal do modo como aprendemos com o cristianismo, ele tende a atrair também toda sorte de indivíduos que tem sido socialmente marcados e marginalizados por outras instituições religiosas ou não-religiosas. (1996, p. 182)

Nas festas chamadas de sincréticas que costumamos ver acontecer na cidade de

Salvador e isso acontece hoje porque já houve muita resistência e luta por parte do

candomblecistas e dos afro-descendentes contra a perseguição a que vinham

sofrendo desde os tempos da colônia. Em salvador houve o fato de alguns

estudiosos darem o ponta-pé no estudo da religião afro o que contribuiu para

disseminar o conhecimento sobre tal religião a partir do século XIX.

Em Teixeira de Freitas o estudo sobre o candomblé esta engatinhando. Espera-se

que as pessoas possam conhecer e respeitar essa religião que faz parte da nossa

sociedade há tanto tempo e ainda vive marginalizada.

Page 14: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

Quanto à relação dos outros entrevistados com a sociedade fora do candomblé é

tranqüila segundo eles, que foram bem sucintos na resposta. Convivem muito bem

com os não-adeptos do candomblé, até porque procuram se relacionar com pessoas

que tem bastante afinidade. Vale lembrar que meus colaboradores não exercem

nenhuma atividade fora do centro de candomblé, são pessoas que não tem um

emprego no meio social, extra religioso.

Falar com essas pessoas sobre a relação deles como candomblecistas e a

sociedade local, foi complicado porque eles não se abriram muito sobre isso. A

análise que faço sobre esta questão é que eles fazem a política de boa vizinhança

para que não perturbem e principalmente não sejam perturbados. Diante do silêncio

deles sobre isso dá para sentir que a discriminação é muito forte e latente por parte

da sociedade local.

Page 15: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

CONSIDERAÇOES FINAIS

Conhecer as religiões afro-brasileiras é buscar compreender um universo bastante

complexo e surpreendente aos nossos olhos, principalmente porque o que

achávamos que sabíamos sobre esse tema até o momento era errôneo e

supersticioso. É difícil falar em conclusão de um trabalho quando se sabe que ele da

margem a novas pesquisas e há inúmeras possibilidades dentro desse mundo da

religião afro-brasileira.

Vivendo em uma sociedade em que o preconceito é latente, desenvolver um

trabalho como este é um desafio, as pessoas se dizem mais modernas, mas dentro

de si guardam resquícios das imposições e conveniências de outrora.

Para desenvolver essa pesquisa foi preciso superar algumas barreiras que estavam

dentro de mim. O trabalho do pesquisador histórico é diferenciado, pois quando

escolhe um objeto ele se despe de qualquer preconceito e com isso consegue

analisar o foco da sua pesquisa sem fazer juízo de valor, Bloch afirma “que é

fundamental criar uma distinção entre o historiador e o juiz, porque não é função da

pesquisa histórica julgar o passado, mas sim compreendê-lo”. Foi com esse olhar

que consegui efetivar nossa pesquisa em um local que entra em choque com os

nossos conceitos, mas que nos faz perceber que é preciso conhecer e analisar o

que nos é diferente para que possamos respeitar mesmo quando não

compreendemos.

O contato que tive com os meus colaboradores me fez compreender melhor como

se da o relacionamento dos mesmos com suas entidades, o que os teóricos

escreveram pude comprovar na fala de quem é feito no santo e sabe muito bem o

significado disso na sua vida. No imaginário popular acredita-se que o orixá desce

de qualquer forma em qualquer lugar e em qualquer pessoa, mas está longe da

verdade, pois quando a entidade vem a terra ele sabe que há alguém a sua espera e

que tem relações bem estreitas com ele.

O estudo sobre a religião afro-brasileira já vem sendo feito desde o século XIX, mas

é preciso que seja mais divulgado nas regiões do interior, tal como Teixeira de

Freitas para que se possa conhecer melhor e diminuir a descriminação em relação à

Page 16: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

mesma e a seus adeptos. Pois, enquanto religião, ela tem os mesmos preceitos que

as dominantes, que são a fé, organização e hierarquia.

Este estudo é de grande relevância para a sociedade local e para os fiéis do

candomblé, pois abre um espaço para que a sociedade passe a conhecer melhor

essa religião diminuindo assim o preconceito em relação à mesma. Nesse sentido

faz-se necessário que o conhecimento produzido com essa pesquisa possa ficar

acessível às pessoas das comunidades acadêmica e local. Que a partir dela, sujam

oportunidades de desenvolver projetos sobre o tema nas escolas onde é um espaço

próprio para as discussões em relação a mudanças de atitudes e pensamentos.

Page 17: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

REFERÊNCIAS

BAHIA. Constituição do Estado da Bahia. Disponível em: http://www.ba.gov.br/arquivos/constituição. Acesso em 13/09/2009.

Barcellos, Mário César. Os orixás e o segredo da vida: lógica, mitologia e ecologia / Mário César Barcellos. 4 ed. Rio de Janeiro: Pallas, 2005.

Bloch, Marc Leopold Benjamin. 1886-1944. Apologia da história, ou, oficio do historiador / Marc Bloch; prefácio, Jacques Le Goff; apresentação a edição brasileira, Lilia Moritz Schwarcz; tradução. André Talles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.

Bourdieu, Pierre. 1930-2002. A economia das trocas simbólicas / Pierre Bourdieu: introdução, organização e seleção Sérgio Miceli. 5 ed. – São Paulo: Perspectiva, 2004. – (coleção estudos; 20/ dirigida por J. Guinsburg).

BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Obra da autoria de editora Atlas com a colaboração de Alexandre de Moraes. 29 ed. Atual e ampliada. São Paulo. Atlas 2008.

BRASIL. Decreto Presidencial 6.040/2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6040.htm. Acesso em 20/07/2009.

Lépine. Claude. Os estereótipos das personalidades no candomblé Nagô. In: Moura, Carlos Eugenio Marcondes de (org). Candomblé: religião do corpo e da alma: tipos psicológicos nas religiões afro-brasileiras/ organização de Carlos Eugenio Marcondes de Moura. Rio de Janeiro. Pallas, 2000.

Lima, Fábio Batista. Os candomblés da Bahia: tradições e novas tradições. Salvador: Universidade do Estado da Bahia, 2005.

Lima, Vivaldo da Costa. O conceito de “Nação” nos candomblés da Bahia. Departamento de Antropologia F.F.C.H. Universidade Federal da Bahia. In: Afroásia, nº 12, p. 65.

Prado Junior, Caio. 1907-1990. A formação do Brasil contemporâneo: colônia/ Caio Prado Junior. São Paulo: Brasiliense, 2004.

Prandi, Reginaldo. As religiões afro-brasileiras e seus seguidores. In: Civitas – Revista de Ciências Sociais, v. 3, nº 01, junho de 2003.

Page 18: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

_____________Segredos Guardados: orixás na alma brasileira. Ed. Companhia das Letras, 2005.

_____________Deuses africanos no Brasil contemporâneo. In: Reginaldo Prandi. Segredos guardados: Orixás na Alma Brasileira. Companhia das Letras, 2005.

_____________O Candomblé e o Tempo: concepção de tempo, saber e autoridade da África para as religiões afro-brasileiras. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais - RBCS, nº 47, outubro de 2001.

Silva, Vagner Gonçalves. Terreiros de candomblé. In: Revista História Viva Grandes Religiões – Cultos Afros a Segregação do Sincretismo. Ed 6. Duetto.

Soares, Cecília Moura. Resistência negra e religião: a repressão ao candomblé de Paramerim, 1853. In: Estudos Afro-Asiáticos (23): 133-142; dezembro de 1992.

Verger, Pierre Fatumbi. Orixás. Salvador: Corrupio, 1981.

Page 19: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

ANEXO – fotos de festas no centro Ilé Amnirá Alaketó

Fotos cedidas pelo babalorixá Jenilton

FIGURA 1. Iniciação do babalorixá Jenilton (1979)

Page 20: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

FIGURA 2. Babalorixá Jenilton com seu orixá Oxum e acompanhado do seu pai-de-santo Rômulo

Page 21: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

FIGURA 3. Orixá Yemanjá - obrigação de sete anos

Page 22: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

FIGURA 4. Orixá Euá - serpente fêmea

Page 23: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

FIGURA 5. Ialorixá com rum de Oxalufan

Page 24: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

FIGURA 6. Festa de Imbeji - caruru de Cosme e Damião

FIGURA 7. Yalorixá fazendo jogo de búzios

Page 25: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

FIGURA 8. Rum de Yemanjá

FIGURA 9. Filhas-de-santo e o babalorixá Jenilton

Page 26: Os Orixas e Sua Conexao Com Os Filhos-De-santo Na Cidade de

FIGURA 10. Formatura de obrigação de sete anos.