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1. INTRODUÇÃO 1.2. Delimitação do estudo Partindo da concepção de representação 1 de Jean Piaget que aponta a atividade motora como aquela que propicia a formação de representações mentais (Beyer,1999), este trabalho busca contribuir para a compreensão dos processos de aprendizagem utilizados por crianças na construção de seus saberes musicais ao freqüentarem aulas num ambiente formal de ensino de música. Para isto realizamos um estudo de caso múltiplo sobre o fazer musical dos alunos com idade de 6 a 12 anos durante o primeiro ano do Curso de Formação Inicial da Escola de Música Villa-Lobos – FUNARJ – Rio de Janeiro (doravante CFI EMVL). As aulas de instrumentos oferecidas aos alunos do CFI EMVL compreendem os seguintes instrumentos: Teclados: Piano/ Teclado, Cordas Friccionadas:Violino/ Violoncelo Cordas Dedilhadas: Violão/ Cavaquinho/ Guitarra, Sopros: Flauta Doce/ Flauta Transversal/ Clarineta. No entanto, como será explicitado no capítulo sobre a metodologia, nossa amostra será um recorte deste universo. As estratégias utilizadas pelo corpo docente para dialogar com a aprendizagem dos alunos também foram observadas sob o ponto de vista do método utilizado por eles para levarem seus alunos às adaptações sensório-motoras necessárias para a assimilação dos conceitos musicais programados como conteúdos das aulas no período de iniciação ao uso de instrumentos musicais. Quando dizemos “adaptações sensório-motoras” nos referimos às primeiras posições e técnicas empregadas nas aulas e que servem para a adaptação do corpo ao instrumento quando os alunos tocam. Já os “conceitos musicais” se referem às 1 Para fins de clareza na escrita, usaremos negrito para grifar termos técnicos e itálico para grifar expressões estrangeiras. No entanto, em algumas citações literais, os autores usam itálico para designar termos técnicos. Nesses casos respeitaremos a citação especificando a mudança de padrão entre parênteses.

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1. INTRODUÇÃO

1.2. Delimitação do estudo

Partindo da concepção de representação1 de Jean Piaget que aponta a

atividade motora como aquela que propicia a formação de representações mentais

(Beyer,1999), este trabalho busca contribuir para a compreensão dos processos de

aprendizagem utilizados por crianças na construção de seus saberes musicais ao

freqüentarem aulas num ambiente formal de ensino de música.

Para isto realizamos um estudo de caso múltiplo sobre o fazer musical dos

alunos com idade de 6 a 12 anos durante o primeiro ano do Curso de Formação Inicial

da Escola de Música Villa-Lobos – FUNARJ – Rio de Janeiro (doravante CFI EMVL).

As aulas de instrumentos oferecidas aos alunos do CFI EMVL compreendem

os seguintes instrumentos: Teclados: Piano/ Teclado, Cordas Friccionadas:Violino/

Violoncelo Cordas Dedilhadas: Violão/ Cavaquinho/ Guitarra, Sopros: Flauta Doce/

Flauta Transversal/ Clarineta. No entanto, como será explicitado no capítulo sobre a

metodologia, nossa amostra será um recorte deste universo.

As estratégias utilizadas pelo corpo docente para dialogar com a aprendizagem

dos alunos também foram observadas sob o ponto de vista do método utilizado por eles

para levarem seus alunos às adaptações sensório-motoras necessárias para a assimilação

dos conceitos musicais programados como conteúdos das aulas no período de iniciação

ao uso de instrumentos musicais.

Quando dizemos “adaptações sensório-motoras” nos referimos às primeiras

posições e técnicas empregadas nas aulas e que servem para a adaptação do corpo ao

instrumento quando os alunos tocam. Já os “conceitos musicais” se referem às

1Para fins de clareza na escrita, usaremos negrito para grifar termos técnicos e itálico para grifar

expressões estrangeiras. No entanto, em algumas citações literais, os autores usam itálico para designar termos técnicos. Nesses casos respeitaremos a citação especificando a mudança de padrão entre parênteses.

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2

estruturas do objeto musical que se manifestam através do fazer musical: numa maneira

pessoal de se movimentar ao ouvir uma música; de grafar o som que se ouve através do

uso da notação musical mediadora e/ou convencional, de tocar o seu instrumento lendo

partitura ou improvisando. Portanto, enquanto a primeira expressão está ligada ao corpo

do músico, a outra está ligada à própria música e a formalização da experiência musical.

Refletir sobre a passagem da ação motora à operação mental permeia toda esta

pesquisa. Partimos da premissa de que a ação sobre os objetos musicais propicia a

formação de representações destes objetos. Enquanto a criança age, as transformações

que ela impõe ao objeto são percebidas por ela e, posteriormente, ao pensar sobre suas

ações e as transformações que elas provocam, a criança as interioriza sob a forma de

operações mentais.

A capacidade de representar os estados do objeto e as transformações que o

sujeito lhe impõe não é inata, mas sim, construída ao longo do desenvolvimento da

criança. No livro Psicologia da Criança (2006), Piaget discute a descrição de Wallon2

sobre o pensamento como conseqüência imediata da ação. Para Piaget, somente a partir

da conquista do objeto permanente, que se dá por volta dos 18 meses de vida, a criança

começa a construir o pensamento simbólico. Tal conquista permite a ela evocar

situações ausentes, e é fundamental para a noção de conservação musical, assunto que

abordaremos no primeiro capítulo.

Defendemos a tese de que as formas que os professores utilizam para integrar o

estudo da teoria e da prática musical influenciam nas representações que as crianças

fazem de suas ações musicais, tanto no sentido de real aprendizagem, quanto no sentido

de mera reprodução sem compreensão. As aulas de Estruturação e Percepção Musical e

as aulas de instrumento devem estar interconectadas por ações significativas, que

2 Henri Paul Hyacinthe Wallon (1879-1962), filósofo, médico, psicólogo e político francês, tornou-se conhecido por seu trabalho científico sobre Psicologia do Desenvolvimento. Foi professor na Universidade Sorbonne, e é citado em algumas obras de Piaget.

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3

contribuirão para as aprendizagens e tomadas de consciência dos sujeitos envolvidos em

processos de musicalização. Antes de iniciar a leitura formal musical, seria necessário

que as crianças agissem sobre os instrumentos de variadas formas para deles extrair

conhecimentos necessários, mesmo que baseados em representações figurativas num

primeiro momento, que contribuirão para as representações operativas posteriores ao

tomarem consciência das relações entre execução e leitura musical.

As ações da criança sobre instrumentos musicais favorecem a assimilação dos

objetos musicais graças ao processo de abstração reflexionante3. Ao perceber que o som

é resultado de suas ações, o sujeito toma consciência da implicação causal destas ações

sobre o objeto musical. No entanto, como cada instrumento propicia uma adaptação

motora diferente, nosso estudo se propõe a observar estas diferenças, compará-las e

identificar as funções dos movimentos do sujeito no processo de assimilação-

acomodação ao objeto musical.

Construímos a hipótese de que as representações musicais estão intimamente

ligadas às configurações das relações do sujeito com o objeto musical, através das

coordenações de seus espaços práticos, envolvendo, além disso, o tempo e a

causalidade.

1.2.Apresentação do problema

O trabalho de Educação Musical em escolas de música no Brasil esteve

tradicionalmente voltado para o ensino de instrumentos musicais. Nestes ambientes,

algumas habilidades são trabalhadas em classes de leitura e escrita musical, com prática

de solfejo rítmico e melódico baseados no uso da voz. Por outro lado, para tocar um

instrumento, a criança freqüenta aulas em classes individuais ou coletivas, cujos

3 O conceito de abstração é muito importante na obra de Piaget e se refere ao processo pelo qual o sujeito retira informações do objeto (abstração empírica) ou das suas próprias ações sobre o objeto (abstração reflexionante). Aprofundaremos a explicação deste conceito no primeiro capítulo da tese.

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4

professores se limitam, cada um, ao ensino da técnica e do repertório específicos de seu

instrumento.

A estrutura deste tipo de ensino tem se apresentado fragmentada entre

disciplinas teóricas e práticas sendo que as primeiras servem de pré-requisitos para as

segundas. Esta premissa justifica algumas críticas encontradas na literatura do século

XX sobre a formação de músicos, a ponto de haver um desvio de foco do ensino da

música para o ensino do instrumento com forte apelo para a virtuosidade técnica.

(Andrade, 1991).

A crítica feita ao ensino tradicional europeu, especialmente por Jacques

Dalcroze na Suíça (apud Santos, 2001b), e por Carl Orff na Alemanha (apud Santos,

1994), denunciou, no início do século XX, as limitações do ensino de música daquela

época. Este ensino se apoiava exclusivamente na execução instrumental da música

escrita por outros compositores, sem desenvolver a musicalidade através do movimento

corporal e das habilidades que envolvem o aspecto da criação (improvisação,

composição e arranjo).

Do ponto de vista da técnica musical4, alguns problemas de aprendizagem em

leitura da notação musical têm sido detectados e apontados na literatura sobre pedagogia

instrumental como decorrentes da falta de relação direta da percepção auditiva com o

uso do instrumento (Gonçalves, 1985; Prestes, 2005). Cada instrumento musical é

constituído de uma topografia específica que sugere referências a serem relacionadas

com a notação musical.

Queremos acrescentar a esta crítica, a falta de diálogo entre alguns professores

de instrumentos em escolas de música, que ficam isolados dentro de seus problemas 4Adotamos o conceito de técnica musical criado por Swanwick (apud Del Ben e Hentschke, 2003, p.26) como um campo do conhecimento que, a serviço da música, é composto pela aquisição de habilidades que incluem controle técnico vocal ou instrumental, desenvolvimento da percepção auditiva, da leitura e da escrita musical.

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5

técnicos específicos e não integram suas atividades docentes às dos professores de

percepção e vice-versa. Acreditamos que o trabalho musical com crianças deve prever o

desenvolvimento de habilidades básicas que visam atingir a totalidade de sua

musicalidade.

A divisão de tarefas entre professores de Estruturação e Percepção Musical

(doravante EPEM) e de Instrumentos indica que nossa concepção de saber fazer e

conhecer música são tidas como redutíveis. Se um professor de instrumento não oferece

desafios ao aluno para que ele, ao aprender a tocar um instrumento, seja levado a

construir conhecimento neste domínio, que função tem sua atividade pedagógica?

Os alunos aprendem em situações diversas: quando ouvem e imitam o professor

ou seus colegas tocando, quando criam suas próprias músicas, quando estão escrevendo

e lendo a notação musical, etc. Swanwick (1994) destaca esta abrangência e dá

fundamental importância ao “engajamento intuitivo pessoal do aluno”. (p. 7-8). Este

engajamento pode facilitar as trocas entre o aluno e o professor no processo de ensino-

aprendizagem.

Segundo pesquisas na área da psicologia da música, as habilidades de ouvir,

fazer gestos relacionados com aquilo que se ouve, criar melodias e ritmos, tocar

instrumentos musicais, etc., envolvem operações mentais. Muitas dessas pesquisas

tomam como referência a Epistemologia Genética, ciência idealizada por Jean Piaget.

Este autor explicou que, por volta de dois anos de idade, a criança começa a representar

simbolicamente a realidade e este processo evolui através da maturidade do seu sistema

nervoso, da experiência com o meio, e do seu interesse natural em aprender.

Os dados coletados em nossa pesquisa foram analisados sob a ótica da

Epistemologia Genética, com o fim de explicar o processo de aprendizagem em música

através do uso de instrumentos musicais.

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6

1.3.Questões de estudo

1. Quais representações a criança constrói quando inicia o estudo de música através

de um instrumento musical?

2. Que solicitações são feitas pelos professores aos alunos nas aulas de instrumento

musical e nas aulas de EPEM (Estruturação e Percepção Musical) e quais as

representações que os alunos fazem a partir das ações que realizam?

3. Que mediações o uso dos instrumentos observados nesta pesquisa, estabelecem

no processo de conservação das estruturas musicais? (por exemplo: intervalos

sonoros, padrões rítmicos, melódicos, harmônicos, ou outros).

4. Quais referências topográficas dos instrumentos são usadas nos sistemas de

leitura musical adotados pelos métodos de ensino/aprendizagem dos

instrumentos observados? (através do dó central, de múltiplas tonalidades, dos

intervalos, ou outros).

5. Existem operações comuns (para classificar os movimentos nas ações de tocar,

para decodificar os signos musicais da notação), que resultam dos métodos de

ensino/aprendizagem dos instrumentos musicais abordados nesta pesquisa? Se

existem, quais são?

6. Como a equipe de professores trabalha a integração das diversas formas de

representação utilizadas pelos alunos nas atividades realizadas pelos alunos e

observadas no CFI EMVL?

7. Existe uma seqüência de conceitos musicais dentre os necessários para a etapa

inicial do ensino de instrumentos de cordas, de teclados, de sopros, que seja

coerente com a programação das atividades de percepção, improvisação,

composição, leitura, e performance no CFI EMVL?

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7

1.4. Justificativa/Importância do estudo

No Brasil temos uma carência de professores de música em escolas regulares.

Acreditamos que as escolas de música têm um papel importantíssimo a desempenhar no

processo de formação destes professores, a fim de que a música na escola venha a ser

um conteúdo trabalhado por profissionais competentes, que dominem profundamente o

fazer musical. Ao contribuirmos para a estruturação de um ensino de música em escolas

vocacionais, que leve em conta a integração dos processos de ensino/aprendizagem

(modos de aprender e de ensinar) estaremos contribuindo para o avanço da área.

Pretende-se que este trabalho, que trata dos fundamentos que sustentam o

ensino de música em nível básico com crianças, possa trazer contribuições para uma

integração das práticas pedagógicas dos professores no CFI EMVL e que possa servir

de referência para outras instituições de ensino de música no Brasil.

O curso de formação de crianças será focalizado nesta pesquisa como o ponto

de sustentação de uma escola de música. Acreditamos que este deva ser o espaço

reservado à criança para construir suas estruturas de assimilação básicas para a

assimilação dos saberes musicais, uma vez que nesta fase da vida ela estará formando

esquemas que poderão moldar seu modo de aprender em todos os campos do

conhecimento.

A delimitação da idade de 6 a 12 anos durante o primeiro ano do curso se deve

ao fato de nesta instituição ser esta a faixa de idade limite para ingresso no CFI EMVL.

Tratando de um tema que liga Música e Cognição, esta pesquisa trará grande

auxílio aos profissionais que atuam na área pedagógica de instrumento, assim como na

área de ensino de música em situações mais abrangentes, uma vez que observaremos

tanto o trabalho dos alunos com seus professores de instrumento como com os de

Estruturação e Percepção Musical (EPEM).

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Compositores e professores que se dedicam à criação de obras didáticas para

instrumentos e conjuntos instrumentais terão com este trabalho fonte preciosa de

informações sobre os recursos utilizáveis em obras com este objetivo.

Esperamos contribuir para a melhoria da atividade pedagógica em escolas de

música, levando em conta os processos de aprendizagem dos alunos, visando à

construção de um caminho mais sólido na formação musical destes, independentemente

se serão profissionais ou não.

A compreensão dos processos de construção do conhecimento que cada aluno

empreende pode ajudar os profissionais envolvidos no processo pedagógico a agir de

forma mais eficiente e integrada.

1.5.Objetivos

OBJETIVO GERAL: Esta pesquisa tem por objetivo compreender processos de

cognição na aprendizagem de música através de métodos de ensino de instrumentos

musicais. No decorrer desta pesquisa queremos observar, por meio de coleta de dados

provenientes de alunos e professores, quais representações mentais são construídas

pelos alunos de 6 a 12 anos, quando aprendem a tocar seus instrumentos musicais.

Com base neste trabalho, temos o objetivo de trazer à luz os fundamentos

metodológicos que norteiam as ações da equipe responsável pela integração dos

processos de ensino-aprendizagem nas aulas de instrumentos e nas aulas de

Estruturação e Percepção Musical desta instituição.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS:

1. Criar unidades de análise para métodos de ensino de instrumentos musicais

levando em conta o desenvolvimento cognitivo dos alunos e das representações

que criam a partir das ações que envolvem a aprendizagem musical através do

uso dos seus instrumentos.

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2. Observar quais são os tipos de representação (táteis, cinestésicas, auditivas,

visuais) construídos pelos alunos durante a aprendizagem de música através do

uso de instrumentos musicais.

3. Analisar como a aprendizagem de leitura e percepção musical pode ser

generalizada quando adaptada ao uso dos vários tipos de instrumento, cujas

emissões sonoras dependem de atividades motoras diferentes.

4. Listar os conteúdos técnicos e musicais programados pelos professores para

serem trabalhados com seus alunos do CFI EMVL durante o primeiro ano de

estudo e analisar o porquê da seqüência destes conteúdos e se mantém coerência

com o desenvolvimento musical dos alunos aos quais são dirigidos.

5. Descobrir que implicações estes processos de construção de representação

podem ter na elaboração de programas integrados de conteúdos das disciplinas

de instrumentos e de estruturação e percepção musical o primeiro ano do CFI

EMVL.

6. Relacionar os programas de conteúdos musicais trabalhados nas disciplinas

teóricas e práticas procurando pontos de integração entre eles nas aulas

observadas.

7. Trazer à luz os fundamentos metodológicos que norteiam as ações da equipe

responsável pela integração dos processos de ensino-aprendizagem nas aulas de

instrumentos e nas aulas de Estruturação e Percepção Musical desta instituição.

1.6. Revisão de bibliografia

1.6.1. Contextualização do Problema

Integrar programas de ensino de vários instrumentos aos programas de

conteúdos de conceitos musicais das aulas de percepção e teoria musical tem sido uma

tarefa difícil para equipes de professores em escolas de música. A estrutura de

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funcionamento das escolas de música no Brasil sofre com a dificuldade de comunicação

entre professores de instrumentos e os professores das chamadas matérias “teóricas”.

Acreditamos que teoria e prática são partes inseparáveis do processo de

aprendizagem. Na intenção de aprofundar a observação da relação entre a intuição e a

razão, entre a experimentação e a compreensão, e, a fim de pensarmos nesses termos

dentro do domínio da música trazemos para este estudo a contribuição da Epistemologia

Genética sobre os aspectos sensório-motor e o representativo na criança.

Queremos estabelecer uma analogia dos estudos piagetianos com o processo

de aprendizagem de conteúdos musicais no âmbito da técnica musical, ou seja, das

técnicas básicas de uso dos instrumentos musicais, da percepção auditiva e da leitura da

notação musical.

A situação problema colocada neste estudo nos faz recorrer ao debate sobre as

ações pedagógicas do professor buscando identificar pontos de integração entre os

processos de ensino-aprendizagem e a formação de conceitos musicais que apóiam

atividades musicais num sentido amplo (tocar lendo, improvisando, sozinho ou em

conjunto).

Consideraremos os processos de representação decorrentes da ação com

instrumentos musicais e aqueles decorrentes das atividades desenvolvidas em classes de

estruturação e percepção musical.

1.6.2.Quadro teórico/conceitual.

Com o avanço da psicologia, na passagem do século XIX para o século XX,

muitos conceitos sobre ensino-aprendizagem passaram a ser revistos. A criança passou a

ser concebida não como um adulto em miniatura, mas como um ser em formação que

apresenta uma forma particular de ver o mundo.

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Segundo Santos (2001 b), os pensamentos de Comênio (1592-1670), de Jean-

Jacques Rousseau (1712-1778), de Heinrich Pestalozzi (1746-1827) e Friedrich Fröebel

(1782-1852) influenciaram uma renovação no ensino europeu do século XVII e XVIII e

de certa forma abriram caminho para o surgimento de uma pedagogia renovada cuja

versão brasileira foi a “Escola Nova”.

As idéias da “Escola Nova” no Brasil foram introduzidas já em 1882 por Rui

Barbosa (1849-1923), mas foi em 1932 que alguns intelectuais brasileiros lançaram o

“Manifesto dos Pioneiros da “Escola Nova”5 que defendia uma escola pública gratuita,

laica e obrigatória. Dentre estes intelectuais se encontravam Lourenço Filho (1897-

1970) e Anísio Teixeira (1900-1971). Este último teve contato com as idéias do filósofo

John Dewey (1859-1952) quando estudou na Universidade de Columbia nos Estados

Unidos.

Dewey postulava que a escola deveria ser um prolongamento da vida real, e

dispensou especial interesse à ação da criança e aos seus próprios meios de construir o

conhecimento sobre o mundo à sua volta. Inspirado no engajamento humano observado

quando se está em atividades artísticas, Dewey (1974) afirma que a verdadeira

aprendizagem se dá através do que chama de “experiência estética”. Tal experiência é

caracterizada pela emoção à qual o sujeito se entrega durante a ação e que vem gerar

fluência e unidade durante o processo de aprendizagem.

Na Europa, Édouard Claparède (1859-1952), psicólogo suíço, defendia a idéia

de uma escola que se adaptasse à criança ao invés de obrigá-la a se adaptar a um modelo

pré-concebido. Claparède dirigia o Instituto Jean-Jacques Rousseau em Genebra e ao

conhecer os artigos do suíço Jean Piaget (1896-1980) sobre o raciocínio de crianças

5 www.educacional.com.br/glossariopedagogico/verbete.asp?idPubWiKi=9577

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12

francesas, convidou-o para dirigir o centro de pesquisas do instituto. Então com 25 anos,

Piaget começou a desenvolver a pesquisa à qual se dedicaria pelo resto da vida.

A Epistemologia Genética, nome dado por Piaget a sua atividade de pesquisa e

da qual falaremos com mais profundidade no primeiro capítulo da tese, trouxe bases

teóricas para os adeptos da Escola Nova. Ela nos informa que é a atividade mental do

aluno que determina aquilo que é escolhido, eliminado, ajustado, coordenado,

organizado dos conteúdos disponíveis na vida escolar.

Piaget era biólogo e tinha interesse em responder questões epistemológicas, em

especial sobre a gênese e crescimento dos conhecimentos. Em seus estudos, ele

procurava responder à questão de como os conhecimentos crescem, e partiu da premissa

kantiana da construção do objeto através do contato do sujeito com a realidade. Ao

invés de admitir verdades pré-estabelecidas, este autor fundamentou sua teoria na idéia

de que o real é construído pouco a pouco pelo sujeito através das ferramentas

intelectuais de que este dispõe.

A Epistemologia Genética se apóia em estudos multidisciplinares nos quais

estão incluídos conhecimentos de filosofia, psicologia, biologia, lógica, matemática, e

outros, e tem como modelo o sujeito epistêmico, universal, que serve para explicar o

desenvolvimento psicológico do sujeito real como uma prolongação de seu

desenvolvimento biológico. A interação entre suas estruturas internas e o mundo

exterior caracteriza-se por uma constante busca de equilíbrio que visa adaptar o sujeito

às condições do meio.

A teoria de Piaget tem influenciado grande parte da pesquisa sobre

desenvolvimento cognitivo musical nos Estados Unidos, na Europa e no Brasil, segundo

Fernandes (2007) esta teoria tem tido um impacto dominante na pesquisa sobre

processos cognitivos na educação musical.

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Hargreaves & Zimmerman (2006, p.231-269), ao fazerem uma resenha das três

principais teorias do desenvolvimento musical - o modelo espiral de Swanwick e

Tillman, a “Música como cognição” de Serafine, e a do “Projeto Zero de Harvard” de

Gardner, Davidson & Scripp, - destacaram nelas três influências diretas da teoria de

Piaget: a idéia de desenvolvimento como “uma série de estágios6 qualitativamente

diferentes e universais” (é o caso do “modelo espiral” de Swanwick e Tillman de 1986);

a explicação do pensamento simbólico através do conceito de “função simbólica”

piagetiano (também existente no modelo espiral), e o conceito de “conservação”

(adaptado nas explicações de Zimmerman para a “conservação musical”).

A literatura que relaciona a teoria de Piaget e desenvolvimento musical tem

confirmado a existência de um desenvolvimento regular que apresenta a mesma

seqüência dos tipos de pensamento de cada período, a partir do contato sistemático da

criança com a música, ou seja, a partir do momento em que a prática musical faz parte

da vida social da criança, seja na escola ou em outros espaços sociais.

No Brasil, alguns pesquisadores já realizaram estudos que abordam uma

“leitura” piagetiana do desenvolvimento musical. No segundo capítulo desta tese

comentaremos algumas pesquisas que tem contribuído para verificar os conceitos da

Epistemologia Genética na construção do conhecimento em música pelo sujeito.

No terceiro capítulo serão especificados os passos metodológicos deste trabalho.

6 Apesar de encontrarmos a palavra estádio nas traduções do termo francês stade presente na obra piagetiana, ela sempre nos parece artificial já que, na língua portuguesa, a palavra estádio é muito mais usada para designar o espaço onde se praticam os esportes. Em sua raiz etimológica (CUNHA, 2000, p.327) a palavra estádio tem o significado de medida espacial, já que vem do latim stadium que é derivado do grego stádiom, medida de uma pista de corrida, ou recinto onde se realizavam as mesmas na Grécia antiga. Em sua evolução etimológica (segundo o dicionário eletrônico da língua francesa, LE PETIT ROBERT, 2001) stadium (e seu derivado francês stade) ganhou conotação temporal, passando a designar as fases sucessivas de uma doença ou do desenvolvimento de um ser vivo. Como no Dicionário Eletrônico Houaiss da língua portuguesa, os dois termos são apresentados como sinônimos, optamos por traduzir o termo stade para estágio, pois, além de ser este termo popularmente utilizado para tal, nós o consideramos melhor para expressar, em nossa língua, a temporalidade contida nas etapas do desenvolvimento segundo a Epistemologia Genética.

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No quarto capítulo, faremos a análise dos dados levantados no curso para

crianças aqui pesquisado - o Curso de Formação Inicial da Escola de Música Villa-

Lobos no Rio de Janeiro. Este estudo de caso múltiplo nos dará elementos para

compreender o processo de construção das representações (táteis, cinestésicas, visuais e

auditivas) pelo qual crianças de 6 a 12 anos passam enquanto aprendem música em

aulas de Instrumentos Musicais e de Estruturação e Percepção Musical.

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CAPÍTULO 1 O REFERENCIAL PIAGETIANO PARA A PESQUISA EM

EDUCAÇÃO MUSICAL

1.1 Introdução

Neste primeiro capítulo da tese, procuramos introduzir o leitor no campo teórico

adotado, a saber, a Epistemologia Genética, em seu aspecto da construção das estruturas

funcionais do sujeito epistêmico e do desenvolvimento destas estruturas durante o

crescimento da criança.

Alguns exemplos musicais são levantados com o objetivo de aproximar o

contexto teórico ao tema desta pesquisa, cujo propósito é o de refletir sobre o ensino e a

aprendizagem musical através do uso de instrumentos musicais. Embora ao

descrevermos sucintamente o desenvolvimento das estruturas inteligentes utilizemos

alguns exemplos do funcionamento da inteligência no domínio da música para

exemplificá-los, a revisão da literatura sobre psicologia da música será exposta no

segundo capítulo deste trabalho.

O interesse de pesquisadores e instituições de ensino pela teoria de Piaget vem

das informações que ela traz a respeito do desenvolvimento cognitivo do aluno. As

abordagens educativas que levam em conta o processo de desenvolvimento do sujeito,

assim como foi descrito por Piaget, podem ajudar a elaborar intervenções pedagógicas

mais adequadas aos diversos níveis cognitivos dos alunos.

A importância da compreensão do funcionamento da inteligência para a

pedagogia vem da sua confrontação com os sistemas de ensino positivistas baseados no

“estimulo-reposta”. Nestes sistemas a resposta certa “supõe uma correspondência inata

e pré-estabelecida da resposta a cada solicitação externa”7 mas o que a Epistemologia

7 Il y a quelque chose de métaphysique dans la notion de stimulus-réponse. Car elle suppose la

correspondense innée et préétablie de la réponse à chaque sollicitattion externe. (Dolle, 2008, p. 12). Dolle, Jean Marie, professor Emérito da Universidade Lumière Lyon II, na cidade de Lyon na França, escreveu vários livros sobre a teoria de Jean Piaget, alguns traduzidos para o Português, e foi tutor da

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Genética nos ensina, é justamente o contrário. Segundo esta teoria, existe um processo

de adaptação do sujeito ao meio durante o seu desenvolvimento e por isso, a cada fase

deste processo, segundo a lógica do seu pensamento, diferentes respostas podem ser

construídas pelo sujeito.

Concebemos o conhecimento como fruto de uma construção endógena que se

estabelece por meio de uma relação dialética possível graças às adaptações das

estruturas mentais do sujeito ao meio, através de um processo de equilibração8.

Tomamos por verdade a afirmação de Dolle (2008) de que “aprender é uma atividade e

toda atividade precisa de estruturas para funcionar”, sendo assim, uma importante tarefa

da escola é favorecer o desenvolvimento das estruturas inteligentes do sujeito.

Considerando as possibilidades do sistema complexo que é a interação sujeito-

meio, procuraremos estudar a gênese do conhecimento musical nas crianças quando

estão inseridas no ambiente de escolas de música.

Neste capítulo, para a exposição de dados referentes ao funcionamento da

inteligência com base na Epistemologia Genética, tomaremos alguns autores para dar

suporte à nossa exposição. Além de Jean Piaget e seus colaboradores no Centro de

Epistemologia Genética de Genebra, citamos também os trabalhos de outros autores que

criaram grupos de pesquisa com base na Epistemologia Genética em outros países.

Entre eles, o professor Jean Marie Dolle, professor emérito da Universidade Lumière

Lyon 2, na França; Fernando Becker (UFRGS), Adrian Montoya (UNESP), entre outros

autores no Brasil.

pesquisadora durante seu estágio de doutorado na França entre março e julho de 2010. Foi a partir das discussões com este pesquisador que a autora desta tese reviu todo o capítulo referente à Epistemologia Genética e discutiu as relações hipotéticas deste referencial com a educação musical. 8 A Equilibração é um conceito central na teoria de Piaget. Ao se deparar com objetos novos, o sujeito entra em desequilíbrio cognitivo e necessita adaptar suas estruturas mentais para conseguir assimilar estes objetos. Este processo o leva acomodar seus antigos esquemas de assimilação, alcançando assim novos patamares de equilíbrio cognitivo.

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1. 2 Epistemologia Genética

Epistemologia, no sentido clássico, é definida por Piaget como um campo de

estudo que investiga o que é conhecimento e o subordina “a formas previamente

situadas no sujeito ou no objeto” (Piaget, 2002, p.2).

Se inicialmente a Epistemologia era constituída num campo estritamente

filosófico, seus pressupostos foram adotados posteriormente pela experimentação

científica, e é nesses termos que Piaget se insere no campo epistemológico.

A interação entre o sujeito e objeto, já pensada por Kant, porém sem levar em

conta o processo genético, foi retomada por Piaget justamente pelo estudo dos processos

envolvidos na construção do objeto (do real, ou seja, do meio) pelo sujeito.

Se em sua obra, Kant denomina de elementos apriorísticos do entendimento a

base sobre a qual o sujeito “entende” a realidade9, na Epistemologia Genética, Piaget

aprimora tais conceitos através do que ele chama de estruturas e invariantes

funcionais10

do sujeito.

As invariantes funcionais na teoria de Piaget são duas: a adaptação e a

organização. A partir da concepção da inteligência como um instrumento de adaptação

do sujeito ao meio, Piaget observa que ela funciona através dos processos de

assimilação e acomodação. No entanto, tal adaptação não ocorre sempre com a mesma

qualidade, mas varia de acordo com a complexidade das estruturas mentais construídas

gradualmente pelo sujeito durante a infância, e que, pela organização destas estruturas,

9 O conceito de esquema é descrito por Kant no livro da Analítica Transcendental da seguinte maneira: “Ora, é claro que precisa haver um terceiro elemento que seja homogêneo, de um lado, com a categoria e, de outro, com o fenômeno, tornando possível a aplicação da primeira ao último. Esta representação mediadora deve ser pura (sem nada de empírico) e não obstante de um lado intelectual, e de outro sensível. Tal representação é o esquema transcendental”. (Kant, 1996, p.145, grifos do original). 10 No vídeo <http://youtu.be/8UYz8cTBfgg>, Yves de La Taille esclarece muito bem o que vem a ser invariante funcional: diz que para Piaget, a inteligência pode ser definida, no que se refere à sua função, como um instrumento de adaptação do sujeito ao meio. Para este autor, a inteligência, no que se refere à estrutura, é uma organização de processos que permite níveis de conhecimento mais ou menos complexos, dependendo do estágio de complexidade em que se encontra a organização da inteligência do sujeito.

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o sujeito apreende o real segundo a organização de diferentes níveis do

desenvolvimento11.

Enquanto a Epistemologia tradicional12 só trata o conhecimento através da

especulação filosófica em seus “estados superiores, ou seja, certas resultantes” (Piaget,

2002, p.2), a Epistemologia Genética investiga o conhecimento através de sua gênese

usando o método científico e buscando observar o processo de formação e crescimento

do conhecimento.

Piaget foi estruturalista, mas, ao mesmo tempo, foi também construtivista13. Se

no Inatismo acredita-se que as estruturas do pensamento são inatas e no Empirismo que

elas são passíveis de serem adquiridas por via sensorial, na Epistemologia Genética,

tem-se em conta que elas são construídas através de um processo ativo do sujeito.

Para Piaget, o conhecimento não está pré-determinado no objeto nem no sujeito,

mas é resultante da ação física e mental do sujeito sobre o objeto, num movimento

interacionista.

O conhecimento não pode ser concebido como algo predeterminado nem nas estruturas internas do sujeito, porquanto estas resultam de uma construção efetiva e contínua, nem nas características preexistentes do objeto, uma vez que elas só são conhecidas graças à mediação necessária dessas estruturas, e que estas, ao enquadrá-las, enriquecem-nas (quando mais não seja para situá-las no conjunto dos possíveis). (Piaget, 2002, p.1).

11 Freitag afirma que com as descobertas sobre a psicogênese do pensamento infantil Piaget chegou a transformar a teoria do conhecimento de Kant, e isso faz com que sua teoria possa ser considerada “uma verdadeira epistemologia” (Freitag, 1985, p.20). O ‘esquematismo’ da razão pura é substituído pelos ‘esquemas psicogenéticos’, adquiridos no curso de uma história individual, através da interiorização das ações, a níveis cada vez mais complexos e mais abstratos.[...] podemos usar a linguagem de Kant, e dizer que tanto as formas a priori da sensibilidade, como o espaço e o tempo, quanto as categorias a priori do entendimento, como a causalidade, resultam, para Piaget, de um longo processo de elaboração e maturação, que vão desde a primeira infância até a adolescência (construtivismo). (Freitag, 1985, p.21, grifos do original). 12 Piaget (1967 apud Freitag 1985, p. 49) enumera as grandes formas de Epistemologia como sendo a metafísica (de Platão e Aristóteles), a paracientífica (de Kant, Hegel, Bérgson, Husserl e outros filósofos) e a científica (representada por Russel, Pooper, Poincaré, Gonseth e outros). 13 No que tange à origem, Piaget responde que os conhecimentos se constroem. A palavra construção alude a trabalho. Assim, as formas ou estruturas sob as quais epistemes existem, resultam de um processo produtivo. Em suma, enquanto no inatismo religioso e/ou biológico o apre(e)ndiz ganha totalmente de graça as estruturas de conhecimento, e na perspectiva empirista as acaba ganhando por efeito de uma paciente observação, já no construtivismo, ao contrário, deve laboriosamente conquistá-las. (Lajonquière, 2005, p.62, grifos do original).

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Para compreendermos a relação interacionista entre sujeito cognoscente e objeto

do conhecimento, é elucidativa a explicação do Professor Fernando Becker14 dos termos

sujeito e objeto. Segundo ele, a palavra sujeito é composta de um prefixo sub, que

quer dizer “escondido” e de sufixo ectum que quer dizer “aquele que jaz”. A palavra

objeto, ao contrário, traz o prefixo ob que quer dizer “oposição”. Portanto, enquanto o

sujeito é subjetivo (escondido no eu), o objeto é objetivo, é estabelecido pelo fenômeno,

pela aparência (está em oposição ao eu).

Se generalizarmos o termo objeto para o termo real15, estaremos utilizando o

termo adotado por Piaget, visto que a construção do real é a grande tarefa do sujeito

desde que nasce para que, a partir dele possa construir-se a si mesmo. É na interação

com o real que se constituem, no primeiro período do desenvolvimento, as categorias do

entendimento: o objeto, o tempo, o espaço e a causalidade. Como veremos logo adiante,

a construção do real se efetua em dois tempos, complementares e integrativos: o

sensório-motor e o da representação.

Ao definir a Epistemologia Genética, Piaget (2002) aponta algumas de suas

particularidades:

a. Esta teoria busca “distinguir as raízes das diversas formas de

conhecimento a partir de suas formas mais elementares, e acompanhar

seu desenvolvimento nos níveis ulteriores até, inclusive, o pensamento

científico.” (p.2)

b. Ensina que não existem começos absolutos dos conhecimentos, mas para

entender “suas razões e mecanismos, é necessário conhecer todas as

fases ou, pelo menos, o máximo possível.” (p.3).

14 Explicação dada pelo professor Becker, da UFRGS, no mini-curso “Abstração Reflexionante e Aprendizagem Escolar” no I Colóquio Internacional de Epistemologia e Psicologia Genéticas: Atualidade da Obra de Jean Piaget. Marília- SP, UNESP, 2009. 15 Dolle (2008b) compreende o “real” como “meio” e propõe que este deve levar em conta os elementos que o constituem: regras, objetos, pessoas, e os acontecimentos.

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c. A epistemologia genética possui natureza interdisciplinar e “pressupõe a

colaboração de especialistas da epistemologia da ciência considerada –

psicólogos, historiadores da ciência, lógicos e matemáticos,

ciberneticistas, lingüistas, etc.” (p.4-5).

Visto que a ênfase do pensamento piagetiano se dá nas seqüências invariantes do

desenvolvimento, e sendo que ele compreende as estruturas dos estados de

desenvolvimento16 filiados uns aos outros, vale perguntarmos: o que são e como se

desenvolvem as estruturas do conhecimento segundo a Epistemologia Genética?

1.3 Estruturas: Definições e Gênese

No contexto da Epistemologia Genética a definição do termo estrutura varia

muito. Ele é definido por Piaget no livro “Seis Estudos de Psicologia”:

Definiria a estrutura, da maneira mais ampla, como um sistema apresentando leis de totalidade enquanto sistema. Estas leis de totalidade, em conseqüência, são diferentes das leis ou das propriedades dos próprios elementos do sistema. Mas insisto no fato de que tais sistemas que constituem as estruturas são sistemas parciais em relação ao organismo ou ao espírito. (Piaget, 1978, p. 133) Encontramos também o termo estrutura sendo usado para de referir a um

esquema17 ou a um estágio, sempre que estes elementos dão suporte ao funcionamento

do sistema cognitivo.

É através dos esquemas que o sujeito consegue assimilar e incorporar novos

objetos à própria ação. Os esquemas são construídos pelo bebê a partir dos exercícios de

reflexos inatos. Os reflexos são como que respostas prontas que permitirão ao bebê

reagir às solicitações do meio, mas que só se consolidam e se firmam através de

exercícios reflexos18. Piaget (1973c) afirma que, exceto no caso dos esquemas reflexos

16 “No domínio dos estados de equilíbrio da inteligência...uma estrutura uma vez acabada pode ser integrada em estruturas ulteriores mais ricas” (Piaget apud Lerbet, 1990, p.5). 17 Um esquema é aquilo que é generalizante na ação. 18 Si fixe ou si bien monte soit-il, um mecanisme héréditaire tel que le reflexe a besoin d’un certain

exercice pour s’adapter réelment. Il est donc susceptible de s’accommoder au monde extérieur. C’est

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e hereditários, é através da assimilação que os esquemas se formam, uma vez que toda

ação é movida por uma energia cuja natureza é afetiva (necessidade e satisfação) e a

estruturação dos esquemas envolvidos é de natureza cognitiva. “Assimilar um objeto a

um esquema é pois simultaneamente tender a satisfazer uma necessidade e conferir uma

estrutura cognitiva à ação.” (Piaget, 1973c, p.67-68).

A extensão de um esquema é o conjunto de situações às quais ele se aplica. Por

exemplo, quando o bebê pega um chocalho ou pega uma mamadeira, está usando o

esquema de preensão. Depois de crescida, a criança usará este esquema também para

pegar uma flauta ou um arco de violino. A compreensão de um esquema é o conjunto

de propriedades comuns às situações semelhantes, ou seja, nos exemplos acima citados,

todos os objetos podem ser “pegados”.

Os esquemas seriam formas construídas pelo sujeito para adaptar-se ao meio e

aos seus objetos, assim como para ser adaptada ao parafuso a rosca de uma porca deve

ter sulcos que encaixem na espiral do parafuso, ou ainda, para a luva envolver à mão

deve conter, em seu interior, o desenho contrário desta, os esquemas são estas formas

flexíveis que o ser humano dá ao seu corpo e aos seus pensamentos, em todos os

momentos de sua vida porque, sem as particularidades dos encaixes entre as partes, a

adaptação não seria possível. São os esquemas que levam a mão do sujeito a se

posicionar de determinada maneira para pegar um objeto ou de outra maneira para

empurrá-lo.

Na interação do sujeito com o meio, quanto mais se dá a assimilação, mais são

os esquemas anteriores do sujeito que predominam na relação interativa, ou seja, a

donc em fonctionnant que le réflexe se consolide et s’effermit. Et c’est em fonctionnant également que Il

donnera lieu à la constituition de schèmes. [Por mais fixado e bem montado que esteja, um mecanismo hereditário, tal como o reflexo, necessita de um certo exercício para adaptar-se realmente. É susceptível, portanto, de acomodar-se ao mundo exterior. Assim, é funcionando que dará lugar à constituição de esquemas.] (Dolle, 1999, 104).

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interface do sujeito “tateia” o objeto com os esquemas que já possui, e um objeto é

assimilado somente quando ele corresponda a um esquema de assimilação.

Quando, ao contrário, no momento da interação os esquemas que o sujeito

possui não lhe permitem assimilar o objeto, vemos uma predominância do objeto e uma

busca do sujeito para adaptar seus esquemas a ele. Do conflito gerado por esta

inconformidade dos esquemas com o objeto, o sujeito é levado a “imprimir” as formas

do objeto à sua interface (seus esquemas). Esta modificação dos esquemas se dá por um

mecanismo adaptativo chamado acomodação. Assimilação e acomodação fazem parte

do processo que Piaget chamou de equilibração majorante19.

Os esquemas se apresentam nos diferentes patamares da inteligência. Existem,

portanto, esquemas sensório-motores, ligados à ação física, em presença do objeto,

assim como existem esquemas simbólicos, intuitivos, operatórios concretos e

operatórios formais, que se manifestam através da representação mental dos esquemas

de ação.

Pode-se compreender os esquemas também como estruturas cognitivas

referentes a diversas classes de seqüências de ação que lhe dão nome (por exemplo,

esquemas de sucção, de preensão, etc). No decorrer do desenvolvimento, os esquemas

vão se coordenando e formando estruturas que Piaget classifica pelo nome de grupos20

19 Equilibração Majorante é a força motriz do desenvolvimento cognitivo. Os conflitos cognitivos forçam o sujeito a buscar soluções mesmo que provisórias que propiciem o equilíbrio num nível mais elevado de compreensão, através da criação e da renovação de esquemas. Este movimento adaptativo o conduz a novos patamares de equilíbrio, aumentando assim, sua capacidade cognitiva. 20 “Geometricamente, essa noção aparece, segundo H. Poincaré, como um a priori necessário à interpretação dos deslocamentos. Psicologicamente, o ‘grupo’ é a expressão dos processos de identificação e de reversibilidade próprios dos fenômenos fundamentais da assimilação intelectual, em particular da assimilação reprodutora, ou ‘reação circular’.[...] se a definição lógica de ‘grupo’ é inesgotável e implica os processos mais essenciais do raciocínio, podemos, do ponto de vista puramente psicológico conforme o qual nos colocamos aqui, considerar como ‘grupo’ qualquer sistema de operações suscetível de possibilitar uma volta ao ponto de partida. Assim concebido, é evidente que existam grupos práticos antes de qualquer percepção ou consciência do grupo qualquer que seja ela. Existem desde o grupo postural e, podemos até chegar a dizer, desde as organizações espaciais e cinéticas mais elementares do ser vivo. É nesse sentido que podemos falar no caráter a priori dessa noção: ela atesta simplesmente o fato de que qualquer organização constitui um sistema fechado em si mesmo.” (Piaget e Inhelder, 2006, p.114-115).

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que são regidos por leis21. No acabamento do período sensório-motor, por exemplo, a

criança chega a adquirir o grupo prático dos deslocamentos, o que lhe permite deslocar

objetos e deslocar-se a si mesma.

A existência da estrutura só tem sentido pelo seu funcionamento, e este só

acontece através do contato do sujeito com o meio exterior. Assim, os esquemas de

assimilação são estruturas que se modificam através da experiência do sujeito em

relação ao meio, através de um processo dialético. O esquema abaixo visa sintetizar a

dialética constituída pelos elementos desta relação:

Assimilação

Sujeito Processo Dialético Real

Acomodação

Figura 1. Esquema representativo do processo dialético durante as assimilações dos objetos e das acomodações dos esquemas do sujeito aos objetos reais. Com base na Epistemologia Genética, podemos supor que para adaptar-se ao

fenômeno musical, o sujeito se coloca numa relação dialética complexa, através do

processo de assimilação-acomodação, que constitui o processo de adaptação do sujeito

ao objeto musical.

21 “O conceito de grupo na matemática pode ser explicado como um conjunto de elementos cujas relações mútuas apresentam, em primeiro lugar, certas propriedades que caracterizam leis de combinação desses elementos. Em segundo lugar, num grupo, qualquer combinação de três ou mais de seus elementos é associativa, ou seja, as combinações podem acontecer em qualquer ordem dos elementos. Outra exigência para se constituir um grupo, é que um dos elementos do grupo tenha a propriedade de elemento de identidade, cuja característica é a de manter-se inalterado ao ser associado a outro elemento do grupo (por exemplo, quando somamos um número inteiro ao zero, o zero é o elemento de identidade que mantém o número inteiro inalterado). Por último, deve existir para cada elemento do grupo o seu inverso, que combinado ao original resulte no elemento de identidade.” (Baldwin, Alfred. Teorias de desenvolvimento da criança. Ed. Pioneira, 1973, p.166.)

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Dolle (2008) define a dialética como a passagem de um aspecto de uma

realidade ao aspecto contrário dela mesma. Para exemplificar os estados de uma

estrutura ele usa um exemplo que vem a ser ilustrativo sobre algumas questões

envolvidas nas atividades motoras das crianças com instrumentos musicais, mas que

devem ser generalizadas para o contexto cognitivo.

Considerando a mão como estrutura, o autor distingue dois estados em que ela

pode se encontrar: o estado “aberto” ou o seu contrário, “fechado”. A estrutura “mão”

não pode apresentar os dois estados ao mesmo tempo, e para passar do estado 1 para o

estado 2, é preciso que haja uma transformação (abrir ou fechar). Visto desta maneira,

todo estado atualizado potencializa o seu estado contrário. A cada vez que se adapta,

uma estrutura adquire uma “experiência” e vai formando um sistema de “experiências

significantes em constantes transformações”. O funcionamento dos esquemas

construídos nestas adaptações possui a memória da maneira que deve tratar os objetos, e

que é “indissociável de seu próprio exercício. Memória em ato na presença do objeto

percebido e reconhecido pelo contato.” (Dolle, 2008, p.22)

Na interação sujeito-objeto, notamos que diferentes tipos de experiências do

sujeito constituem diferentes formas de conhecimento. As experiências físicas são

aquelas nas quais o sujeito age sobre os objetos para descobrir suas propriedades físicas,

tais como sua cor, seu peso, tamanho, etc. O sujeito chega a tais “descobertas”, graças

aos processos que Piaget chama de “abstrações simples ou empíricas”, que extraem

informações dos observáveis do objeto através da percepção, mas elas próprias são

contruídas por abstrações reflexionantes anteriores.

As experiências lógico-matemáticas também acontecem a partir da ação sobre

os objetos, porém, as informações que o sujeito retira dessas experiências provém das

propriedades que suas ações físicas ou mentais introduzem nos objetos, como por

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exemplo, quando, ao reunir objetos (mesmo que mentalmente) por alguma semelhança,

agrupa-os em conjuntos mediante classificações ou seriações. Estas ações são

chamadas de “abstrações reflexionantes”, pois refletem para o nível superior do

pensamento as transformações (físicas ou mentais) que o sujeito impõe ao objeto.

Embora para fins didáticos tenhamos que dissociar as experiências físicas das

lógico-matemáticas, na verdade elas são indissociáveis e estão sempre presentes em

graus variáveis em todas as experiências. É por meio das abstrações reflexionantes,

implícitas também nas pesudo-empíricas e refletidas, mas não nas empíricas, que as

experiências geram conhecimentos. As abstrações acontecem em todos os níveis de

desenvolvimento e podem tanto permanecer como mecanismos inconscientes como

levar a tomadas de consciência.

Focalizando nosso olhar para o sistema “sujeito-objeto musical”, vemos que

existe uma dialética que envolve a estrutura do sujeito, ou seja, o funcionamento

corporal e intelectual próprios desta, e a estrutura do objeto musical. Assim, mãos e

boca são exemplos de estruturas do sujeito que se ampliam através dos instrumentos

musicais e se aplicam às estruturas do objeto musical. Ao fazê-lo, elas se tornam cada

vez mais flexíveis às adaptações em jogo.

Ao imitar as ações do professor enquanto faz música, a criança coordena

estruturas motoras (pés, pernas, mãos, voz), coordenações estas subordinadas à intenção

de fazer o que o professor faz, ou seja, ao conteúdo musical destas ações. Nestas

atividades vemos a formação de sistemas complexos que coordenam a atividade de

estruturas tais como braços, mãos, etc. todas elas conectadas entre si, umas prolongando

as outras através de ações coordenadas sob o controle progressivo da visão e do ouvido.

Como afirma Dolle, é difícil tratarmos “das estruturas sozinhas, sem as interações que

elas estabelecem com os conteúdos que elaboram” (Dolle, 2008, p.26).

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Na relação complexa “sujeito-objeto musical” teríamos que levar em conta de

um lado o sujeito (físico, mental e social) prolongado pelo instrumento musical, que

envolve seu aspecto físico e as regras de seu uso (técnica), etc.; e de outro lado, o objeto

musical com tudo o que lhe diz respeito como, por exemplo, os parâmetros sonoros

articulados através das regras culturalmente estabelecidas para seu uso pelo meio social,

além de outros possíveis fatores.

Kebach (2003) propõe que as diferenciações e integrações dos parâmetros

sonoros se dão através de abstrações pseudo-empíricas e reflexionantes e que a criança

só transforma os objetos musicais através dos esquemas de que dispõe. No caso de

ausência de esquemas de assimilação, o objeto permanece indiferenciado.

Esta autora estudou o conhecimento sobre o objeto musical através das ações e

representações que os sujeitos de sua amostra possuíam sobre as relações existentes

entre cada parâmetro sonoro. Em nossa pesquisa, o objeto musical, assim como

concebeu Kebach, é considerado como estrutura complexa, compreendendo as

características de totalidade, transformação e auto-regulação.

Concluímos que, para que o sujeito chegue a assimilar estruturas musicais

complexas, tais como a forma, o ritmo, ou uma escala, ele deverá utilizar categorias

próprias para extrair do objeto musical o que lhe é acrescentado pelo seu próprio

raciocínio. Neste caso deverá utilizar o aspecto operatório do pensamento, que se dá

através de abstrações reflexionantes.

Segundo Piaget, as abstrações reflexionantes apresentam certas particularidades:

podem ocorrer através da ação ou através de operações. No caso de abstrações

reflexionantes sobre ações, elas são chamadas pseudo-empíricas, pois apesar de se

darem a partir da ação real sobre os objetos, elas comportam um reflexionamento num

nível superior, através de categorizações dos esquemas e/ou das ações.

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Quando o objeto é modificado pelas ações do sujeito e enriquecido por propriedades tiradas de suas coordenações (p. ex. , ao ordenar elementos de um conjunto), a abstração apoiada sobre tais propriedades é chamada “pseudo-empírica” (pseudo-empirique), porque, ao agir sobre o objeto e sobre seus observáveis atuais, como na abstração empírica, as constatações atingem, de fato, os produtos da coordenação das ações do sujeito: trata-se pois, de uma caso particular de abstração reflexionante e, de nenhum modo, de uma decorrência da abstração empírica. (Piaget, 1995, 274). A tomada de consciência das abstrações reflexionantes é o resultado da

“reflexão” sobre reflexionamentos. Piaget chama isso abstração “refletida” e diz que ela

pode ocorrer em qualquer nível.

Finalmente, chamamos abstração ‘refletida’ (réfléchie) o resultado de uma abstração reflexionante, assim que se torna consciente, e, isto, independentemente do seu nível. (Piaget, 1995, 274). A abstração reflexionante comporta, sempre, dois aspectos inseparáveis: o

reflexionamento e a reflexão. O ‘reflexionamento’ (réfléchissement), seria a projeção

sobre um patamar superior daquilo que foi tirado do patamar inferior. Já a ‘reflexão’

(réflexion) seria o “ato mental de reconstrução e reorganização sobre o patamar superior

daquilo que foi assim transferido do inferior.” (Piaget, 1995, p.274-275).

Sobre a natureza do reflexionamento, este é, em primeiro plano, o movimento de

interiorização das ações sob a forma de conceitos a partir da tomada de consciência pelo

sujeito. Piaget diz que o conteúdo de um conceito consiste nos observáveis. A retirada

do conteúdo dos observáveis acontece por meio de abstrações: a abstração empírica

capta o conteúdo, o que possibilita ao sujeito enquadrar suas formas, dependendo dos

esquemas que possui, mas, para assimilá-lo, deve haver uma abstração reflexionante, ou

seja, deve haver uma categorização dos conteúdos pelos esquemas de assimilação.

[...] em um sistema de conceitos, é necessário distinguir dois aspectos: sua forma e seu conteúdo. Ora, se o conteúdo pode consistir apenas em observáveis, revelando, pois, da abstração empírica, sua forma, que consiste em reunir objetos num todo, apoiando-se sobre relações de equivalência, em função de suas qualidades comuns, supõe a intervenção de uma abstração reflexionante: aquela que, a partir da assimilação sensório-motora dos objetos em um esquema (sem consciência de sua extensão), permite passar à assimilação destes mesmos objetos entre si, o que é constitutivo do conceito, enquanto classe. (Piaget, 1995, p. 276, grifos nossos)

Daí, podemos concluir que a reconstrução das ações num patamar superior

supõe um processo novo, diferente do anterior.

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[...] Até agora assistimos, pois, a um processo em espiral: todo reflexionamento de conteúdos (observáveis) supõe a intervenção de uma forma (reflexão), e os conteúdos assim transferidos, exigem a construção de novas formas devido à reflexão. Há, assim, pois, uma alternância ininterrupta de reflexionamentos� reflexões� reflexionamentos; e (ou) de conteúdos� formas� conteúdos reelaborados� novas formas, etc., de domínios cada vez mais amplos, sem fim e, sobretudo, sem começo absoluto. (Piaget, 1995, p. 276)22. Durante o desenvolvimento, através das experiências com o real, o sujeito vai

adquirindo esquemas de assimilação que lhe permitem conservar dados da realidade e

estes são atualizados nas experiências posteriores. A conservação de dados da realidade

alude à memória que, para Piaget é uma organização interna do indivíduo.

• Memória.

É a partir das coordenações sobre suas ações que o sujeito retira dos objetos

informações para organizá-las internamente, levando em conta as estruturas de ordem,

classe, número, causa, etc. Tais informações se conservam na memória através das duas

modalidades de funcionamento do pensamento: o figurativo (que se apóia nos dados

perceptivos das situações e objetos) e o operativo (que se apóia nas classificações destes

dados com base nos esquemas mentais).

A concepção de memória para os adeptos da Epistemologia Genética não se

opõe apenas à percepção, mas leva em conta os dados do real passíveis de serem

assimilados pelos esquemas mentais do sujeito. A memória é tratada por Piaget e

Inhelder (1968/1979) em três sentidos: no sentido biológico, que se refere às aquisições

do ponto de vista celular e que se generalizam no sujeito biológico; no sentido

esquemático ou intuitivo que se refere às aquisições mentais no que diz respeito aos

esquemas gerais; e no sentido estrito, ou seja, nas conservações dos conteúdos das

experiências do indivíduo com o real.

22 Lembremos de que os conteúdos que, nos estágios elementares, são, antes de tudo, os observáveis, podem ser, depois, constituídos por formas: tais são os casos, cada vez mais numerosos, em que se constroem formas de formas, e em que estas, então, são os conteúdos daquelas, e dão lugar, então, a abstrações ‘pseudo empíricas’. [nota exposta na página 291 da mesma obra].

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Piaget relaciona a memória de evocação com o pensamento simbólico (do qual

falaremos mais adiante), já que ela evoca objetos e situações ausentes, e a define como

um mecanismo de conservação que faz referência explícita ao passado. A memória no

sentido amplo, assim como a conservação dos esquemas, se atualiza sem fazer

referência ao passado, exceto quando vem acompanhada de lembranças (mnêmicas).

No entanto, a aplicação dos esquemas sensório-motores, que surgem antes da formação

da função simbólica, exige um certo reconhecimento (de situação ou índices) o que nos

faz pensar que, embora diferentes, estes mecanismos apresentam uma formação similar,

ou seja, são gerados pela experiência do sujeito com o real.

Para diferenciar os dois tipos de reconhecimento envolvidos, Piaget e Inhelder

definem que um tem um caráter mnemônico, e o outro se manifesta por um caráter

intuitivo, esquemático.

É a assimilação de uma situação a um esquema, como quando o bebê, diante de um novo objeto, porém suspenso no espaço, como outros que já havia conhecido, reconhece nele também um objeto que pode ser balançado. É justamente neste segundo sentido que a assimilação é sempre recognitiva, ao mesmo tempo que reprodutora e generalizadora.” (Piaget e Inhelder, 1979, p.8). Podemos relacionar o conceito de memória no sentido estrito com o de imagem

mental, e veremos que a imagem tem a função constitutiva deste tipo de memória. Ela é

individual, particular, não generalizante. Graças ao apoio dos esquemas de assimilação,

as imagens podem ser evocadas para apoiar novas situações e usos.

De maneira geral, as diferenças que existem entre o esquematismo e a memória parecem se prender essencialmente ao fato de que o primeiro traduz a organização interna e o dinamismo do comportamento, organização cuja conservação é a expressão de sua própria atividade, enquanto que a segunda é ou uma leitura figurativa ou uma reconstituição das resultantes desta atividade, sem chegar, ou antes de chegar, a atingi-la. (Piaget e Inhelder, 1979, p.9). Piaget e Inhelder (1979) contestam a perspectiva habitual dos teóricos da

aprendizagem segundo a qual o desenvolvimento mental se faz através de

aprendizagens, assim como contestam o conceito que se faz de memória como nada

além da conservação do que foi assimilado, incluindo aí os próprios esquemas. Nesta

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perspectiva, bastaria “distinguir no meio da lembrança, os elementos representados por

imagens ou simbólicos e os elementos motores.” (p.9).

Para serem coerentes com os trabalhos da escola de Genebra, os autores

diferenciam aquilo que o sujeito “aprende” do meio exterior, daquilo que, por outro

lado, comanda a aprendizagem, ou seja, os “fatores de auto-regulação e de equilíbrio”.

Estes fatores não resultam da aprendizagem, mas sim, a comandam. “[...] igualmente

todo organismo só se submete ao meio em função de processos internos de organização,

em interações sem nenhuma dúvida indissociáveis, mas que excluem a hipótese de

aquisições puramente exógenas.” (Piaget e Inhelder, 1979, p.9).

A situação da memória dentro das funções cognitivas (figurativas - FR e

operativas - FA) é discutida por Piaget e Inhelder. Ao compararmos o funcionamento

destas funções podemos depreender a dependência que as funções figurativas mantém

com o real; assim como a relativa independência do sistema de esquemas em relação às

experiências do sujeito.

Figura 2: Esquema do funcionamento do organismo em relação à organização das funções cognitivas. (Piaget e Inhelder, 1979, p.10). Legenda: E = Entrada (percepção das experiências com o objeto); O = Organização (sistema de transformações interiores); S (A) = Saídas ou ações que conduzem a TR = transformações do real; FR = feedbacks a partir dos resultados de TR; FA = feedbacks a partir das próprias ações transformando o real.

O organismo assimila o meio [E] através da percepção construindo e

conservando formas de organização [O (TI)] que lhe garantem a continuidade de trocas

O (TI)

S(A)�TR

FR

FA

E

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com o exterior. Após a organização interna, o organismo modifica o meio pelas suas

reações e comportamentos prolongando e especializando duas espécies de

transformações solidárias: FR (feedbacks a partir dos resultados das transformações do

real - TR); e FA (feedbacks a partir das próprias ações transformando o real). FR e FA é

que distinguem as funções figurativas e as funções operativas. Enquanto as figurativas

(FR) não visam transformar o objeto, as operativas (FA) se colocam justamente neste

propósito.

Das funções figurativas FR advém a imagem mental, que resulta da imitação

interiorizada. O jogo simbólico, a imagem gráfica, etc. também utilizam esta função.

A segunda grande distinção entre as funções cognitivas são as funções dos

significantes e dos significados. Piaget chama de “significados” a “própria significação,

isto é, o esquema ou o conceito (em compreensão) e não apenas os objetos (em

extensão) aos quais se aplicam.” (Piaget e Inhelder, 1979, p.12).

As significações compreendem significados, que são os esquemas de todos os

níveis, que constituem o esquematismo de O (TI), mas também [os] significantes. Piaget

distingue três espécies de significantes, dos quais dois primeiros são fornecidos pelos

instrumentos da função figurativa e os terceiros sendo coletivos e constituindo um

problema à parte.

Ao relacionar os aspectos figurativos do conhecimento com a função semiótica,

Piaget diz que há uma relação de interseção entre eles. Primeiramente, existem os

aspectos figurativos que não participam da função semiótica. Depois, existem os que

são simultaneamente figurativos e semióticos, a saber, a imagem mental, o jogo

simbólico, a imitação diferida, a linguagem por gestos, etc. Finalmente, existem os

instrumentos semióticos, que não são por si mesmos figurativos, mas sim, sistemas de

signos.

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Com estes conceitos da memória queremos analisar algumas formas de

construção do conhecimento musical que se dão sob uma condição figurativa dos

objetos sonoros e outras que se apóiam nas estruturas operatórias do sujeito. No último

capítulo da tese, ao descrevermos as aulas de música, algumas ações das crianças assim

como seus comentários poderão esclarecer como estes mecanismos cognitivos

funcionam no domínio da música.

• O Real e sua Representação

A inteligência existe antes mesmo da linguagem e, desde o nascimento, a criança

se desenvolve construindo “um sistema complexo de esquemas de assimilação, e de

organização do real de acordo com um conjunto de estruturas espacio-temporais-

causais” (Piaget e Inhelder, 2006, p.26).

Como veremos mais adiante, a conquista do esquema de permanência do objeto

é a finalização de um processo de descentração do indivíduo, que inclui a evolução das

categorias do tempo, do espaço e da causalidade.

A indissociação destas categorias já se evidencia quando procuramos descrevê-

las. O tempo, por exemplo, é descrito por Piaget como algo que pode ser sentido graças

aos movimentos e à velocidade dos corpos no espaço. Por sua vez, a causa do

movimento no tempo e no espaço é fundamental para compreender a existências destas

categorias como separadas e ao mesmo tempo irredutíveis. Para fins didáticos, no

entanto, teremos que tratá-las separadamente.

No livro sobre a noção do tempo na criança que Piaget publicou 15 anos depois

de ser questionado por Einstein sobre o assunto, ele diz:

O tempo constitui com o espaço um todo indissociável. [...] O tempo é a coordenação dos movimentos, quer se trate de deslocamentos físicos ou movimentos internos que são ações simplesmente esboçadas, antecipadas ou reconstituídas pela memória mas cujo desfecho e objetivo final é também espacial, o tempo desempenha a seu respeito o mesmo papel que o espaço em relação aos objetos imóveis. [Durante o processo de construção desta categoria na criança,] o tempo permanece uma simples dimensão, inseparável das dimensões espaciais, e solidário desta coordenação de conjunto que permite relacionar umas com as outras as transformações cinemáticas do universo. (Piaget, 1946/[s.d.], p. 11-12).

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Ao propor-se a estudar a gênese do tempo, Piaget se atém ao fato de que existe

um tempo operatório que consiste em relações de sucessão e de duração, fundadas em

operações análogas às operações lógicas; e um tempo intuitivo, que é limitado às

relações de sucessão e de duração dadas pela percepção imediata, externa e interna.

Importante é a delimitação que Piaget faz das propriedades de cada abordagem:

O próprio tempo operatório poderá ser qualitativo ou métrico, conforme permaneçam as operações que o constituem análogas às das classes e das relações lógicas, ou então façam intervir uma unidade numérica. É preciso sobretudo ater-se ao fato, se este é o caso, de que o tempo intuitivo é insuficiente para construir relações adequadas de simultaneidade ou sucessão e de duração (igualdade de durações sincrônicas, etc.) e que a intervenção das operações, qualitativas ou métricas, condiciona de maneira necessária a construção destas relações essenciais. (Piaget, 1946/[s.d.], p.12) Piaget afirma que, ao estudarmos o tempo, nos deparamos com as três situações:

“o tempo está ligado à memória, ou a um processo causal complexo, ou a um

movimento bem delimitado.” Em seguida conclui que “mesmo na memória, o tempo é

solidário da causalidade” (Piaget, 1946/[s.d.], p.15)

Para captar o tempo, é preciso então se dirigir às operações de ordem causal, que estabelecem um liame de sucessões entre as causas e os efeitos pelo próprio fato de que os segundos se explicam pelas primeiras. O tempo é pois inerente à causalidade: ele está para as operações explicativas como a ordem lógica o está para as operações implicativas. (Piaget, 1946/[s.d.], p. 16) Quanto à noção de espaço, Piaget afirma que ela não se forma a partir da

percepção de um continente, mas sim, a partir de seus conteúdos, ou seja, dos corpos

que nele estão. Sua gênese leva em consideração os grupos de deslocamentos do

objeto segundo Poincaré. Esta gênese corresponde às fases da conquista do objeto pelo

sujeito no período sensório-motor. São elas: a fase prática, a fase subjetiva, a fase

objetiva e por fim a representativa.

Além de Poincaré, os estudos do grupo Boubarki23 também foram importantes

para fundamentar o pensamento de Piaget sobre a construção do espaço na fase

23 Fundado por um grupo de matemáticos ex-formandos da Escola Normal Superior de Paris, o Grupo Boubarki foi responsável pela fundamentação da Teoria dos Conjuntos, e, a partir de 1935, começou a publicar livros que expunham a matemática avançada moderna. Os cinco membros fundadores do grupo

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representativa. Estes estudos apresentam três estruturas mães: Algébrica (grupo),

Ordem (rede de relações) e Topológica (contínuo e descontínuo: relações de vizinhança,

limite e continuidade).

Portanto, as estruturas lógico-matemáticas, que estarão prontas somente no

período das operações concretas, compreendem as estruturas algébricas - com as

classificações; e as estruturas de ordem - com relações (seriações). Ambas se aplicam

às estruturas topológicas ou seja, à infralógica: conservação do objeto e do espaço.

No período sensório-motor a criança apreende as qualidades do objeto através da

sucção, do tato e da visão. A partir deste contato físico, vai estabelecendo relações de

vizinhança, de separação, de ordem e de sucessão temporal, de circunvizinhança, de

envolvimento e de continuidade, todas estas constituindo relações topológicas.

Sobre o espaço topológico se estabelecem pouco a pouco, as noções de espaço

euclidiano e de espaço projetivo, que visam relações entre os objetos e isso conferirá à

criança do período das operações concretas um acesso a outro patamar de construção

espacial.

É por este motivo que nas análises que fazemos das ações dos alunos de música

nesta pesquisa, levamos em conta os feixes perceptivos estabelecidos na interação

sujeito-objeto, ou seja, entre o espaço prático “corpo-intrumento” e as estruturas

musicais trabalhadas. Acreditamos que as representações musicais estão intimamente

ligadas às configurações das relações do sujeito com o objeto musical, através das

coordenações de seus espaços práticos, envolvendo, além disso, o tempo e a

causalidade.

foram Henri Cartan, Claude Chevalley, Jean Delsarte, Jean Dieudonné e André Weil. http://pt.wikipedia.org/wiki/Nicolas_Bourbaki

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35

A representação auditiva e a noção de espaço

A questão da aquisição da representação em música é complexa, especialmente

quando focalizamos a situação de ensino de música dentro de um ambiente formal como

são as escolas de música. Nestes ambientes o conceito de representação se confunde o

da notação musical – que não deixa de ser uma forma de representação.

Para a compreensão da notação a criança precisa antes construir uma

representação figurativa do fazer musical, cuja imagem (tátil-cinestésica-aural-visual)

não se liga necessariamente à notação. Esta figuratividade do fazer musical deve ser

transposta voluntariamente pelo sujeito para um código arbitrário, socialmente

constituído.

Quando escrevemos a notação para uma criança, supomos que ela já adquiriu as

capacidades intelectuais para compreender o simbolismo das relações espaciais através

das quais esta notação é organizada, mas nem sempre isto é verdade.

Como já foi dito anteriormente, a gênese do espaço na criança é constituída de

um espaço topológico, a partir do qual se formam os espaços euclidiano e o espaço

projetivo. Somente após a aquisição das estruturas operatórias concretas é que a criança

diferencia estes dois tipos de espaço, e é capaz de compreender os significados da

representação gráfica na notação tradicional da música.

As formas de inteligência se desenvolvem desde uma primeira fase em que a

criança age sobre os objetos (fase prática), adquirindo assim esquemas de assimilação e

acomodação que vão tornando possível, gradativamente, a interiorização do mundo

exterior sob formas representativas. Do ponto de vista da assimilação, parte-se de uma

tendência a favorecer os esquemas anteriores do sujeito, ou seja, aquilo que é subjetivo

(interior ao sujeito), e em seguida, quando o sujeito acomoda seus esquemas às

características do objeto, vê-se uma objetivação, ou seja, a valorização do objeto.

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Conclui-se que a fase representativa é decorrente de um processo de equilibração

no qual o objeto chega a ser interiorizado não como cópia, mas como construção

significativa para o sujeito.

Piaget afirma que o termo “representação” é usado em dois sentidos diferentes:

no sentido lato, ela se confunde com o pensamento, ou seja, com toda inteligência que

não se apóia nas “percepções ou movimentos (inteligência sensório-motora) e sim num

sistema de conceitos ou esquemas mentais” (Piaget, 1975a, p.87). No sentido estrito,

refere-se “à imagem mental ou à recordação-imagem, isto é, à evocação simbólica das

realidades ausentes” (Piaget, 1975a, p.87).

é evidente que as duas espécies de representação, latas e estritas apresentam relações mútuas: o conceito é um esquema abstrato e a imagem um símbolo concreto mas, embora já não se reduza o pensamento a um sistema de imagens, poder-se-á admitir que todo pensamento se faz acompanhar de imagens, portanto, se pensar consiste em interligar significações, a imagem será um ‘significante’ e o conceito um ‘significado’. (Piaget, 1975a, p. 87, grifos nossos). A aquisição do esquema de permanência do objeto significa uma grande

diferença em relação à inteligência da criança sensório-motora, pois a partir deste

momento, o real não é somente o que está presente, mas também o que pode ser

lembrado, evocado, reconstituído pela memória.

Enquanto a criança está na presença do objeto, as abstrações empíricas vão

fornecendo informações sobre o real. Em seguida, a partir de abstrações reflexionantes e

da tomada de consciência da relação entre a causa e os efeitos de suas ações sobre o

objeto musical, as informações assim assimiladas enriquecem as reflexões que o sujeito

faz sobre elas, levando em conta as categorias da razão e as conservações dos esquemas

adquiridos em suas experiências anteriores. Portanto, a partir da conquista do objeto

permanente e da capacidade de representar as ações, o sujeito passa a refletir suas ações

para o plano representativo. Estes reflexionamentos podem alcançar, então, patamares

cada vez mais complexos da inteligência.

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No que concerne à temporalidade devemos diferenciar as ações e as operações.

Dolle (2008) afirma que as ações são transformações exercidas sobre as coisas, mas as

ações são irreversíveis24. Portanto, tudo o que depender da ordenação do tempo, não

pode ser repetido exatamente igual ao que já foi. É verdade que as ações podem, às

vezes, ser invertidas como, por exemplo, se deslocamos um jarro de um lugar para

outro, podemos devolvê-lo ao lugar inicial invertendo a ação.

Quando, no entanto, tratamos de ações no nível da representação (ou seja, das

operações), estas não levam em conta os limites do tempo real e são, portanto,

reversíveis. Isso se dá graças à memória que conserva os dados das ações no nível

representativo e permite ao sujeito refazê-las através da imagem mental. A isso Piaget

dá o nome de reversibilidade.

Ao retermos informações na memória fazemos isso através da imitação

internalizada dos observáveis. Esta imitação nada mais é que a imagem mental,

mecanismo fundamental para a formação de representações. Montoya (2005)

demonstrou que, dentro da teoria de Piaget, a imagem mental não é considerada uma

cópia da percepção, mas sim, fruto da imitação interiorizada, ou seja, aquilo que o

sujeito constrói a partir da assimilação-acomodação do objeto aos seus esquemas.

A imagem mental é solidária à interiorização dos esquemas de assimilação que,

por volta do quinto sub-estágio da inteligência sensório-motora, dentro do

comportamento de “busca de novidades por experimentação ativa”25, começam a se

interiorizar e a estabelecer novas coordenações, criando assim novos esquemas

24 Dentro do tempo real temos a irreversibilidade. Podemos dar um exemplo contundente: Se, ao jogarmos um jarro de vidro no chão ele se quebrar, por exemplo, não será possível reverter esta ação. Dolle (2008) diz: “Une action est une transformation exercée sur les choses; elle est irreversible. Au

mieux, renversable.” [trad: Uma ação é uma transformação exercida sobre as coisas; ela é irreversível. N melhor das hipóteses, reversível.” (p.35) 25 Nesta fase, por exemplo, a criança joga objetos no chão e observa o movimento do objeto e o lugar onde ele cai. Este comportamento em geral é tolhido pelo adulto que não conhece o processo de construção de esquemas a partir destas ações da criança. Piaget, ao contrário, observou estas ações em seus filhos e tirou delas as conclusões sobre a invenção de esquemas pelo sujeito.

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assimiladores, verdadeiras invenções por combinações mentais. Estas combinações

mentais ganham maior velocidade nesta fase.

A invenção não é outra coisa senão essa reorganização rápida, e a representação reduz-se a essa evocação, assim prolongando, uma e outra, os mecanismos em ação no decorrer das condutas precedentes em seu conjunto. (Piaget, 1975b, p. 322). Montoya conclui que para Piaget, “a acomodação ao modelo dos esquemas de

assimilação, depois de um longo exercício, é suficientemente emancipada da ação

imediata para funcionar autônoma e inteligentemente.” (Montoya, 2005, p.33). A

criança passa então a resolver problemas recorrendo à imaginação de cenas inventadas a

partir de dados anteriores construindo, assim, esboços de imitações possíveis. Ela não

precisa mais do modelo real para imitar e chega a produzir imitações a partir de imagens

mentais.

Como já foi dito, a imagem é uma forma de imitação do objeto, não como cópia,

mas como construção do sujeito. Assim, a imagem de um objeto conserva as

características significativas para o sujeito após ser assimilada através da percepção. A

imagem musical, portanto, é resultado da assimilação da música aos esquemas musicais

do sujeito naquilo que lhe é significativo.

Montoya (2005) afirma que na teoria piagetiana “conceito” e “imagem”

estariam, em princípio, em oposição. Este autor diz que explicar as suas fontes e ação

solidárias no desenvolvimento humano são um desafio para a pesquisa psicológica.

Na tabela abaixo, ilustramos as diferenças existentes entre os esquemas

sensório-motores e os conceitos operatórios segundo a revisão de Montoya (2005), que

se baseia na gênese destes conceitos por intermédio dos primeiros esquemas verbais.

Por sua vez, estes esquemas verbais só aparecem a partir do momento em que o sujeito

consegue realizar a imitação diferida, constituindo-se como formas simbólicas das ações

e objetos interiorizados.

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Quadro 1: Passagem dos esquemas sensório-motores para os esquemas conceptuais Período sensório-motor � � � � Período operatório

Anterior Intermediário Posterior

Esquemas da inteligência sensório-motora

Primeiros esquemas verbais Esquemas conceptuais

Imitação sensório-motora Imitação diferida Imitação representativa (envolve imagem mental)

Significantes simbólicos ou imagéticos

Palavras usadas pela criança (semi-signos)

Verdadeiros signos

Sendo a imagem mental um produto de “acomodação imitativa” dos esquemas

mentais do sujeito às particularidades do objeto, ela pode ser evocada na ausência do

objeto, assim como pode servir de modelo para o reconhecimento de objetos revisitados.

Ela só surge no final do período sensório motor e sua aquisição pode ser detectada pelo

comportamento no qual a criança imita um modelo mesmo que ausente. Esta imitação

“diferida” supõe uma interiorização do modelo e advém de uma lembrança que se

expressa pelo gesto, por vocalizações, etc. ou se transforma em pensamento

simplesmente. O conceito é adquirido posteriormente e se consolida através da

coordenação dos esquemas sensório-motores, das imagens e das trocas sociais.

Na descrição piagetiana encontram-se duas modalidades de funcionamento

cognitivo do sujeito epistêmico: os processos figurativos e os processos operativos.

Comparando as duas modalidades de adaptação, Dolle (2008) diz que os processos

figurativos se referem a tudo o que trata dos estados que se apresentam à percepção ou

à evocação. Nestes processos a dominância é espacial, de superfície (extensão do

objeto, etc.), portanto, as ações se concentram em ver, escutar, contemplar “o estado das

coisas”. Estas ações dizem “como é o real”. Nesta modalidade, o conteúdo é evocado

através da imagem mental construída pelo sujeito, e traz recordações de situações ou

objetos particulares.

Já os processos operativos põem em funcionamento as estruturas de atividade

do sujeito (física e ou mental). As ações nestes processos se concentram na

transformação exercida sobre as coisas e são reversíveis ou “invertíveis”.

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Mesmo diante da hiper-complexidade das relações dialéticas, não se excluem as

dominâncias que se estabelecem no processo e, de acordo com a Epistemologia

Genética, elas dependem da “natureza do objeto” ou do “estado do sujeito”.

Toda dominância sendo temporária e flexível, organiza e reorganiza hierarquicamente os sistemas em interação entre eles em função do que é necessidade para ele. É assim que todos os ‘recursos’ atuais do sujeito são solicitados em cada interação que ele estabelece, mas com relação à dominância que se ‘estabelece’ hierarquicamente segundo o que cada uma implica. (Dolle, 2008, p.27)26 Assim, cada estado implica seu estado contrário e cada transformação implica

também a transformação contrária. Dolle representa estes movimentos horizontais e

verticais através da Lamiscade de Bernouilli (duas curvas paralelas opostas que

representam momentos opostos que se invertem ciclicamente).

Figura 3. Esquema da dialética das estruturas cognitivas do sujeito epistêmico segundo Dolle (2008). “As flechas deste esquema dão o sentido dos movimentos contrários [...]. As que estão entrando significam que o movimento segue o precedente. As que saem indicam que o movimento de atualizações/potencializações contínuas. O alto de cada curva exprime a atualização (+), o baixo uma potencialização (-). A intersecção das duas curvas marca o ponto de mutação (I) lá onde há mudança de dominância, ou seja, lá onde as curvas se invertem.” ( Dolle, 2008, p.30).

26 Toute dominance étant temporaire et móbile, organise et reorganize hiérarchiquement tous les systèmes en interaction entre eux en function de ce qui est nécessité par elle. C’est ainsi que toutes “les resources” actuelles du sujet sont sollicitées en chaque interaction qu’il établit, mais dans des rapports de dominance qui se “placent” hiérarchiquement selon ce que chacune implique. (Dolle, 2008, p.27).

Primeiro momento Segundo momento

Atualizado (+)

Potencializado (-) Potencializado (-)

I

Primeiro momento Atualizado (+)

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Nestes pontos de mutação, segundo o autor citado, verificam-se as oscilações

cognitivas dependendo da referência psicológica com a qual o sujeito se coloca:

figurativo ou operativo.

É bastante complexa a questão da figuratividade e operatividade em música, já

que o objeto musical só se expressa numa dimensão temporal e por dar-se no transcorrer

do tempo, apresenta “estados” móveis, ricos de transformações sonoras no tempo.

A ação envolvida no fazer musical deve ser representada em sua totalidade. Ao

tocarmos uma música usando a voz ou um instrumento, podemos prever os

acontecimentos que ocorrerão durante a execução. Quando ouvimos alguém tocar, nos

colocamos também em “ação” auditiva.

Poderíamos perguntar nestes casos: como seria possível conceber a assimilação

de uma música no tempo? Quando se daria o momento da assimilação - no impacto do

seu início, ou na conclusão do seu final? E no decorrer de sua execução, como

poderíamos avaliar os aspectos operativos da assimilação? Esta assimilação estaria

sujeita a ajustes acomodativos? E as abstrações - como se dariam?

Devemos nos lembrar que um dos fundamentos da Epistemologia Genética é

considerar os conhecimentos em sua totalidade, e no caso da música, para tratarmos da

temporalidade e totalidade do fazer musical, devemos levar em conta a reversibilidade

adquirida pela criança no final do período sensório-motor.

Uma operação mental pode dublar uma ação no sentido inverso mentalmente –

ação direta e sua inversa. Leva-se em conta “o estado inicial durante a transformação, a

antecipação do estado final e a consciência do ir e voltar de um ao outro.” (Dolle, 2008,

p.35-36). Portanto, a assimilação em música parece ocorrer a cada instante vivido pela

percepção dos eventos sonoros, sendo o processo de equilibração completado em

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momentos posteriores, graças às idas e vindas acomodativas do pensamento

representativo.

Num primeiro momento, as relações interativas do sujeito com o real se dão

numa dominância figurativa, graças às abstrações empíricas, havendo portanto,

dominância da atividade perceptiva pelo sujeito. Num segundo momento, quanto mais o

sujeito age física ou mentalmente sobre o objeto, as abstrações pseudo-empíricas e

reflexionantes impõe transformações físicas ou mentais sobre o real, e a dominância

passa progressivamente a ter o aspecto operativo, pelo qual o sujeito estabelece relações

do real com suas categorias de análise.

Não há estado do real sem transformação nem transformação sem estado. Mas, o que se percebe mais naturalmente e espontaneamente, são os dados a ver pela percepção, ou seja, são os estados. É aliás, a razão pela qual os aspectos figurativos do conhecimento precedem sempre, geneticamente, os aspectos operativos. É também a razão pela qual a atualização ou a dominância do figurativo precede a atualização ou a dominância do operativo no nível dos estados. (Dolle, 2008, p.88). No esquema criado por Dolle (2008) podemos visualizar a implicação da

dominância figurativa sobre a operativa e vice-versa.

Figura 4: Esquema das implicações entre dominâncias figurativas e operativas. “Os processos figurativos não excluem os processos operativos, eles os implicam ao contrário e inversamente. Nós não temos jamais uns e os outros, mas sempre uns e os outros, mesmo que nós não

Primeiro momento Segundo momento Processo operativo (+)

Processo operativo (-) Processo figurativo (-)

I

Primeiro momento Processo figurativo (+)

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possamos tratá-los em conjunto num mesmo ato de pensamento. Ou melhor, nós passamos de uns aos outros alternadamente.”27 (Dolle, 2008, p.41). A grande importância desta abordagem implicativa dos contrários figurativo-

operativo do pensamento é a compreensão da diferença entre saber e conhecer. Segundo

Dolle, “o que retiramos da percepção do real é apenas um saber sobre as coisas ou

objetos particulares [...] jamais um conhecimento. Saber e conhecer são duas realidades

diferentes, apesar de que não se pode conhecer sem saber.” (Dolle, 2008, p.37).

Com base nas reflexões anteriores sobre a dinâmica do funcionamento cognitivo

supomos que a assimilação do objeto musical se dá primeiramente sob o aspecto

figurativo através de formas captadas pela percepção auditiva, dos estados interligados

dentro do fenômeno musical real tais como: os parâmetros sonoros, a forma musical, as

texturas dentro da malha harmônica, tudo isso sendo construído num todo sincrônico

que só tem significado uma vez assimilado em sua totalidade. No entanto, o aspecto

operativo, implicado nesta primeira apreciação, organiza este todo a partir de

reconstruções dos esquemas anteriores do sujeito que possam ser identificados durante a

execução.

Devemos levar em conta que quanto maior a prática musical do sujeito, quer seja

ouvindo, tocando ou criando, maior será sua capacidade de assimilação, pois os

esquemas mentais, produzidos pelos esquemas sensório-motores, vão sendo

coordenados e integrados num sistema complexo e refletidos para um nível superior da

inteligência sempre que solicitados. Uma vez dono destas ferramentas cognitivas, o

sujeito será apto a reagir mais rapidamente e acomodar seus esquemas às

particularidades dos objetos musicais. Mas este é um processo individual, para o qual a

escola pode contribuir, como veremos nos próximos capítulos.

27 Les procedés figuratifs n’excluent pas les procedes opérativs; ils les impliquent au contraire et

inversement. Nous n’avons jamais ou bien les uns ou les autres, mais toujours et les et les autres, bien

que nous ne puissions les traiter ensemble dans um même acte de pensée. Au mieux, nous passons des uns

aux autres alternativement. (Dolle, 2008, p.41, grifos no original).

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44

1.4 Descrição da Teoria de Estágios de Desenvolvimento e levantamento de

conceitos relevantes para a observação em música

A descrição dos estágios do desenvolvimento, as definições e contextos em que

suas estruturas surgem no desenvolvimento do sujeito e especialmente os conceitos que

utilizaremos na análise dos dados serão iluminados neste tópico, e visam fornecer

ferramentas para que o leitor menos informado sobre a teoria do desenvolvimento possa

compreender nossas reflexões.

Piaget (1973b) chama de estágios das operações intelectuais a sucessão de

estruturas inteligentes que se formam no decorrer do desenvolvimento do indivíduo.

Estas estruturas vão se formando até atingirem estados de equilíbrio que serão

integrados aos estágios posteriores.

Os problemas que Piaget enumera na caracterização dos estágios são cinco: o

primeiro é que a “ordem de sucessão” deve ser constante, o segundo é o “caráter

integrativo das estruturas” de uma idade para a outra, o terceiro é a caracterização de

“estrutura de conjunto” das propriedades do estágio e não a justaposição de

propriedades estranhas umas às outras. O quarto é o fato de um estágio comportar “ao

mesmo tempo um nível de preparação, por um lado, e acabamento, por outro.” (Piaget,

1973b, p.52, grifos do autor). E por último, que em cada estágio, estão presentes

“processos de formação ou gênese e as formas de equilíbrio finais”. (Piaget, 1973b,

p.52, grifos do autor).

Lembrando que as idades são variáveis a cada amostra para pesquisas futuras,

esclarecemos que citaremos neste capítulo as idades indicadas por Piaget com base nas

suas amostras e que mesmo para Piaget, as idades são apenas médias.

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A divisão do desenvolvimento em estágios depende do ponto de vista que

adotamos e o próprio Piaget divide o desenvolvimento em diferentes números de

estágios no decorrer da sua obra.

Os três28 grandes períodos descritos por Piaget (1973b) representam uma visão

geral do desenvolvimento: o período da inteligência sensório-motora (de 0 aos 2 anos,

aproximadamente), seguido pelo período do meio (de 2 a 11-12 anos) que é o das

operações concretas. Este período apresenta uma fase de preparação, considerada

como um sub-estágio e conhecido por período simbólico ou pré-operatório (de 2 a 7

anos), e uma fase de acabamento, o sub-estágio da inteligência operatório-concreta (de

7 a 11-12 anos). O último período descrito por Piaget é o das operações formais (de 12

aos 15 anos), e dará ao jovem uma estrutura mental básica para o resto da vida.

A seqüência de estágios bem definidos além de prever variação de idades para

cada criança, prevê a possibilidade de haver defasagens cognitivas, chamadas por Piaget

de decalagens.

O conceito de decalagem (décalage em francês), que na Psicogenética tem um

significado de deslocamento temporal, vem aprimorar essa teoria de estágios explicando

a ocorrência de comportamentos do sujeito que sejam incompatíveis com seu estágio.

Há dois tipos de decalagem: a horizontal e a vertical. Chamamos de decalagem

horizontal a repetição de um processo cognitivo (que usa as mesmas operações) em

tarefas diferentes num mesmo nível de desenvolvimento. Já a decalagem vertical é

aquela repetição que ocorre em tarefas semelhantes (identidade de conteúdos), mas em

níveis de desenvolvimento diferentes (com operações diferentes).

28 O número dos estágios varia de um obra a outra de Piaget, sendo o período pré-operatório muitas vezes computado como um de quatro períodos. Trataremos desta questão mais adiante, durante a descrição dos estágios do desenvolvimento da inteligência.

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O conceito de decalagem horizontal explica a heterogeneidade observada

dentro de cada um dos estágios de desenvolvimento, assim como a decalagem vertical

explica a homogeneidade observada no desenvolvimento como um todo.

Nas reflexões sobre o aspecto construtor da dialética durante os três períodos do

desenvolvimento na criança descritos pela Epistemologia Genética (Piaget, 1973b;

Montoya, 2000; Dolle, 2008) ressaltam-se suas características de continuidade, dada a

seqüência integrativa das partes que o compõe, mas também, reconhecem-se suas

descontinuidades, ou seja, as particularidades de cada estágio.

Do ponto de vista das descontinuidades Dolle cita, no primeiro estágio, o

predomínio da motricidade. É o momento do estabelecimento dos grupos práticos dos

deslocamentos. Estes são baseados apenas na ação: direta, inversa, nula e associativa.

No segundo estágio a ação em presença do objeto se amplia e é integrada sob a

forma de representações. Estas representações são baseadas na evocação do objeto

através da imagem mental. Uma vez que a imagem mental decorre da evocação da

experiência sensorial, ela é carregada da particularidade e da singularidade do objeto

evocado. A permanência do objeto se dá de diferentes formas: pela distinção do próprio

corpo, do corpo dos outros, dos objetos exteriores. É assim que o “eu”, ao se organizar,

se afirma.

O acabamento do segundo estágio é marcado pela construção das estruturas de

classe. O objeto liga-se à categoria e é tratado na sua característica mais geral. É então

que ele pode ser pensado e, além disso, sofrer transformações em pensamento. Os

julgamentos encadeiam-se em raciocínios e o objeto percebido é suporte indispensável

para o pensamento.

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47

No terceiro estágio as estruturas organizam-se em todas as combinações

possíveis. O real se subordina ao possível e não é mais que um caso particular. (Dolle,

2008, p.33-34).

1.4.1 Estágio sensório-motor

O estágio sensório motor, é caracterizado por um tipo de inteligência prática,

sem pensamento propriamente dito. Há neste estágio a constituição de um “sistema de

esquemas que prefiguram as futuras operações, mas sem nenhuma reversibilidade

operatória”. (Ramozzi-Chiarottino, 2005, p.19). Para compreender o que são estes

sistemas, é importante partir de suas unidades básicas: os “esquemas”, já descritos

anteriormente. Eles são construídos pelo sujeito através do contato com o meio desde o

primeiro mês de vida.

As resistências que o real impõe ao sujeito o leva a desenvolver um conjunto de

esquemas de adaptação, e o faz sair de um estado de egocentrismo no qual não tem

consciência nem de si, nem do mundo exterior, para, por uma construção progressiva,

constituir a permanência dos objetos, do espaço, do tempo e da causalidade. Ao adquirir

a permanência destes elementos, o sujeito adquire a consciência de si mesmo e

consegue se situar dentro da realidade.

Ao tomarmos contato com a análise do pensamento de crianças do período

sensório-motor, salta aos olhos o seu aspecto “negativo”, no sentido daquilo que lhe

falta, especialmente a função simbólica, que posteriormente permitirá ao sujeito,

evocar objetos e situações ausentes. Positivamente, no entanto, é um período importante

para preparar as subestruturas posteriores. A inteligência sensório-motora funciona na

presença do objeto, se atendo, portanto, ao uso da percepção. Ela organiza o real

segundo estruturas espacio-temporais-causais que vão sendo construídas no decorrer

dos primeiros 18 meses de vida.

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O estádio sensório motor é subdividido em seis sub-estádios, descritos abaixo.

Sub-Estágio 1. (0-1 mês) – “Exercícios reflexos” (Piaget, 1973b, p.54): O

recém nascido traz reflexos inatos que se desenvolverão pelo exercício e contribuirão

para a sua sobrevivência. Assim, o bebê mama graças ao reflexo de sucção e agarra-se a

tudo que tocar suas mãos graças ao reflexo de preensão. Piaget considera os reflexos

inatos como ponto de partida do desenvolvimento, mas apenas quando se mostram

como “ações diferenciadas das atividades espontâneas e totais do organismo” e quando

tem a capacidade de apresentar uma atividade funcional que possa acarretar “a formação

de esquemas de assimilação” (Piaget, 2006, p.13).

Sub-Estágio 2 (1-4 meses) – “Primeiros hábitos” (Piaget, 1973b, p.54): as

reações circulares primárias que caracterizam este sub-estágio, são repetições de uma

resposta sensório-motora centradas no corpo da criança. Ex: sugar, pegar, olhar, ouvir,

vocalizar, etc.

No que se refere ao espaço, podemos dizer que nestes dois estágios iniciais,

funcionam os grupos práticos que são ainda heterogêneos. A criança está exercitando

estes espaços através de suas “portas de entrada” perceptivas: os espaços bucal, visual,

tátil, auditivo, além dos cinestésico, postural, etc. É verdade que nesta fase, espaços

específicos para cada ação do sujeito não constituem ainda um espaço único. “O espaço

e os seus conteúdos são divididos em quadros perceptivos, existindo, portanto, tantos

espaços práticos quanto os supostos para as diversas atividades do sujeito, que se ignora

ocupando um espaço qualquer.” (Montoya, 2005, p.73).

Piaget diz que, no começo, o tempo “se confunde com as impressões de duração

psicológica” (Piaget, 2006, p. 328) das atividades ligadas à expectativa, ao esforço e à

satisfação do indivíduo mas sem distinção entre o antes e depois. A seguir, a noção de

tempo começa a se ligar às referencias dos acontecimentos do mundo exterior.

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A causalidade experimentada nestes primeiros sub-estágios não vai além de uma

simples sensação ou uma impressão de que algo acontece como decorrência de sua ação

e, neste caso, Piaget identifica a causalidade como “um sentimento difuso de eficácia

que acompanharia a atividade própria, porém que seria localizado pela criança não em

um “eu”, mas no ponto de resultância da própria ação”. (Piaget, 2006, p. 238-239).

Sub-Estágio 3 (4-8 meses) – “Coordenação da visão e da preensão” (Piaget,

1973b, p.54) e começo das reações circulares secundárias, que são hábitos motores

repetidos sobre objetos, provocando efeitos interessantes para a criança no ambiente

circundante. Ex: balançar, jogar, esfregar, bater objetos, se aprazendo do efeito dessas

ações. Neste estágio a criança descobre o controle dos movimentos das mãos

inventando meios para atingir com elas os seus objetivos.

Com relação ao espaço, neste estádio os grupos práticos começam a se

coordenar. Esta mudança denota o início de uma intencionalidade do sujeito, e por isso

são chamados grupos subjetivos. As séries subjetivas consistem na aplicação do

tempo próprio da criança na sequencia dos acontecimentos, ou seja, “no antes e no

depois”, mas somente quando estes acontecimentos advém de suas próprias ações.

Nesta fase observa-se uma causalidade mágico-fenomenista, como é chamada

a causa geral ligada à eficácia da intenção. A criança supõe que a causa dos

acontecimentos advém do movimento do próprio corpo, dos objetos, do seu olhar.

Sub-Estágio 4 (8-12 meses). “Coordenação dos esquemas secundários” (Piaget,

1973b, p.54). As reações circulares secundárias começam a se coordenar. A

coordenação de um ou mais esquemas conhecidos, formam novas totalidades nas quais

um esquema tem função de meio e outro de objetivo. Os objetivos das ações são

definidos desde o início, havendo, portanto, um quadro de intencionalidade que é novo.

Duas aquisições marcam este estágio: remover obstáculos para atingir objetos

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parcialmente visíveis e o uso de signos e sinais para antecipar acontecimentos. Os

objetos novos interessam à criança no que se refere à sua utilidade, e é usando-os que

ela os compreende.

Sobre a permanência do objeto, nota-se no sujeito uma procura ativa pelo objeto

desaparecido, sem levar em conta a sucessão dos deslocamentos visíveis. A criança é

capaz de esconder um objeto sob um anteparo, mas se o objeto for removido, ela o

buscará no mesmo ponto onde o escondeu. Do ponto de vista da construção do espaço

sensório-motor, observa-se a passagem dos grupos subjetivos aos grupos objetivos e a

descoberta das operações reversíveis. A criança busca o objeto no lugar onde ela mesma

o escondeu, porque esta conservação é ainda subjetiva, ou seja, ligada à sua própria

ação. O tempo começa a ser aplicado aos acontecimentos independentes do sujeito.

Estes acontecimentos, assim como a sua duração, escapam à atividade do sujeito. A

causalidade se mostra numa fase intermediária entre a causalidade mágico-fenomenista

e a causalidade objetiva.

Sub-Estágio 5 (12-18 meses) Há uma “diferenciação dos esquemas de ação por

reações circulares terciárias” (Piaget, 1973b, p.54). Neste sub-estágio, também

conhecido como o momento da “descoberta de novos meios através da experimentação

ativa” (Flavell, 1975, p.113), a intencionalidade se intensifica através das condutas do

suporte, do barbante e do bastão que consistem no uso de objetos ou meios para

alcançar objetos desejados.

No que se refere ao espaço, chega-se aos grupos objetivos, no qual o sujeito

acompanha os deslocamentos sucessivos dos objetos, desde que este trajeto seja visível.

Além disso, o sujeito tem consciência de seus próprios deslocamentos. Relaciona os

deslocamentos de um objeto com os de outros e procura os objetos nos lugares onde

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eles desapareceram. No entanto, o sujeito não consegue ainda representar o objeto e

seus deslocamentos.

Neste sub-estágio, as relações de tempo se objetivam, ou seja, elas se

independem dos atos do sujeito. Ao elaborar uma “serie objetiva” dos acontecimentos

exteriores, desde que percebidos de maneira direta, a criança objetiva também a

causalidade, que não é mais considerada somente decorrente dos atos do sujeito. É

como se os acontecimentos se engendrassem através dos próprios objetos ou outros

sujeitos.

Sub-Estágio 6 (por volta dos 18 meses em diante) “Começo da interiorização

dos esquemas e solução de alguns problemas com a parada da ação e compreensão

brusca”. (Piaget, 1973b, p.54).

A descentração que ocorre progressivamente durante os primeiros 18 meses de

vida de uma criança é finalizada com a conquista do objeto permanente. Piaget

compara esta conquista a uma “revolução coperniciana (no sentido kantiano do

termo)29” (Piaget, 1973a, p.26), e explica que ao procurar um objeto escondido, saber

que ele existe, mesmo que não possa vê-lo, a criança demonstra que se reconhece como

alguém separado dos outros objetos no espaço. O eu egocêntrico inicial (aquele que nos

primeiros meses de vida não chega a procurar objetos quando escondidos por alguém,

agindo como se o resto do mundo fosse uma continuidade de si mesma), passa a ser o

“eu” separado do resto das coisas.

1.4.2 Estágio das operações concretas

Antes de continuarmos a descrição dos estágios é importante refletirmos sobre o

período que se inicia a partir da aquisição do esquema do objeto permanente. Será que

29 Copérnico, astrônomo e matemático polonês, foi o criador da teoria Heliocêntrica. Segundo esta teoria, a terra gira em torno do sol e não o sol em torno da terra. O sentido kantiano do termo “revolução coperniciana” se refere construção da permanência dos objetos num mundo real do qual o sujeito é parte integrante e não o centro.

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podemos chamar de “estágio” o período simbólico ou pré-operatório? Se partirmos da

afirmação de Piaget que caracteriza os estágios por estruturas mentais que contém

períodos de preparação e de acabamento, cujas etapas evoluem continuamente de uma

para outra, temos que encontrar a forma de equilíbrio alcançada neste período para

poder denominá-lo um estágio separado das operações30 concretas.

Em "A Psicologia da Criança" Piaget e Inhelder descrevem o

desenvolvimento das estruturas inteligentes em capítulos específicos para cada estágio.

Eles denominam como "Nível Sensório-Motor" aquele em que o equilíbrio é atingido

quando da conquista do esquema do objeto permanente. Depois disso eles descrevem a

re-elaboração do real no plano da representação, mas não definem esta fase como um

novo estágio, e afirmam o seguinte:

Em resumo, se encaramos neste capítulo o longuíssimo período que vai de 2-3 a 11-12 anos, em lugar de destacar um período pré-operatório; até cerca de 7-8 anos, do período ulterior das operações concretas, é que a primeira dessas duas grandes fases, embora dure 4 ou 5 anos, não passa, de fato, de um período de organização e preparação, comparável aos estádios I a III (ou IV) do desenvolvimento sensório-motor (cap.I parágrafo I), enquanto que o período de 7-8 anos a 11-12 anos é o do remate das operações concretas, comparável aos estádios IV ou V e VI da construção dos esquemas sensório-motores. Depois disso, somente um novo período operatório, característico da pré-adolescência, e que atinge o ponto de equilíbrio por volta dos 14-15 anos, permite concluir as construções, ainda limitadas e parcialmente lacunares, próprias das operações concretas. (Piaget e Inhelder, 2006, p.89). Uma vez conquistada a função simbólica, toda a construção de apreensão do

objeto feito por meio da percepção direta, passa a ser refeito no plano das

representações. Assim, concebemos o esquema do objeto permanente como uma forma

primitiva de reversibilidade, pois a imitação diferida é um “olhar para o passado” que

evoluirá até alcançar sua fase de equilíbrio com a reversibilidade presente nas operações

concretas.

Nesse sentido, a explicação do conceito de conservação feito por La Taille

(2006) contribui para elucidar ainda mais esta questão:

30 Em nota de rodapé, Piaget (1973b. p. 66) considera o termo “operações” como as ações interiorizadas, reversíveis e solidárias de estruturas de conjunto, tais como os “agrupamentos”, “grupos” e “redes”.

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Note-se que a noção de conservação é central na teoria de Piaget como um todo. Nós a encontramos em seus estudos sobre o pensamento operatório (noção de conservação de massa, peso, volume, número, etc.) e sobre a moral (a regra garante a conservação dos valores). A capacidade de “conservar” é característica de uma inteligência em momento de equilíbrio; por isso, só a encontramos no final do sensório-motor e no pensamento operatório. A fase pré-operatória é justamente o momento de transição entre a objetividade da inteligência prática e aquela do pensamento representativo." (La Taille, 2006, p.17).

Como no início do período simbólico, a criança ainda não apresenta a

reversibilidade das operações, suas representações se limitam às imagens interiorizadas

de objetos e ações particulares. Tais construções são figurativas, ou seja, se baseiam nas

percepções dos estados em que se encontram os objetos, sem abarcar as transformações

que as precedem ou sucedem. Ao adquirir, pouco a pouco, a reversibilidade, a criança

passa a representar também as transformações dos estados e isso lhe permite

compreender relações causais que no início não compreende. É só então que o estágio

operatório chega a um patamar de equilíbrio, e este será novamente desequilibrado com

as operações de dupla reversibilidade, características do estágio das operações formais.

1.4.2.1 Período simbólico ou Pré-operatório

Chamemos, portanto, de período pré-operatório, mas não de estágio, esta fase

em que a criança forma representações rudimentares da realidade e as combina

internamente para solucionar problemas antes de experimentá-los. Tais realizações

resultam na capacidade de imitar modelos ausentes, de engajar-se em jogos de faz-de-

conta, de imaginar a localização de objetos escondidos, de inferir causas objetivas por

efeitos percebidos, de reconstruir memórias de acontecimentos passados.

A conquista do espaço representativo, efeito da descentração do sujeito, o leva a

se considerar um objeto entre os outros e seus deslocamentos são situados no mesmo

espaço homogêneo onde estão situados os outros objetos. O tempo, por meio da

evocação de objetos e situações ausentes, é revelado nas relações de antes e depois dos

acontecimentos evocados. Ao constituir-se um universo permanente, também a

causalidade se dá representativamente, já que a criança pode tanto evocar as causas de

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um acontecimento, quanto prever os efeitos de uma ação mesmo sem tê-las percebido

diretamente.

A aquisição do esquema de permanência do objeto significa uma grande

diferença em relação à inteligência da criança sensório-motora, pois a partir deste

momento, o real não é somente o que está presente, mas também o que pode ser

lembrado, evocado, reconstituído pela memória.

Enquanto a criança está em ação na presença do objeto, as abstrações empíricas

vão fornecendo informações sobre o real. Em seguida, as abstrações pseudo-empíricas e

reflexionantes passam a enriquecer estas informações sobre o real graças às reflexões

construídas em planos superiores da inteligência, levando em conta as categorias da

razão e as conservações adquiridas em suas experiências anteriores. Portanto, a partir da

conquista do objeto permanente e da capacidade de representar as ações, o sujeito passa

a refletir dentro do plano representativo levando seus reflexionamentos a patamares

cada vez mais complexos.

A grande aquisição do período pré-operatório é a função simbólica, definida por

Piaget como a possibilidade de “representar alguma coisa (um ‘significado’ qualquer:

objeto, acontecimento, esquema conceptual, etc.) por meio de um ‘significante’

diferençado e que só serve para essa representação: linguagem, imagem mental, gesto

simbólico, etc.31” (Piaget, 2006, p.51, grifos do autor).

No livro “A formação do Símbolo na Criança” Piaget analisou como se dá o

processo de passagem do nível sensório-motor para o pré-operatório focalizando a

imitação e o jogo como manifestações inteligentes, complementares, que geram

representações cognitivas, porém sob diferentes enfoques.

31 O conceito de significado e significante em Jean Piaget é fundamentado na Semiótica de Ferdinand de Saussurre (1857-1913) e já foi discutido anteriormente na tese.

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A imitação é caracterizada como um processo tipicamente acomodador, uma

vez que se dá através de acomodações de esquemas anteriores às características do

objeto. Já o jogo acontece através da assimilação e se caracteriza pela repetição por

puro prazer funcional dos esquemas do sujeito ao objeto assimilado. A adaptação, que

se consolida pelo equilíbrio entre assimilação e acomodação, se mostra ainda em

desequilíbrio quando se manifesta através do jogo.

A imitação tem início desde o primeiro mês de vida do bebê, durante o estágio

sensório-motor, e pode ser observada com as características dos seus sub-períodos já

descritos anteriormente. No momento em que o indivíduo adquire a capacidade de

imitar um modelo ausente, Piaget diz que tem início a representação propriamente dita,

pois é então que se pode dizer que conseguiu criar uma imagem mental de um objeto,

ou de uma ação, para evocá-lo através da imitação. “A imitação diferida constitui o

início de representação e o gesto imitativo, princípio de significante diferençado”

(Piaget, 2006, p.53).

O jogo (ou jogo simbólico), por sua vez, confunde-se com a imitação nos três

primeiros sub-períodos do estágio sensório-motor. Piaget prefere se ater a esta

manifestação a partir do quarto sub-período (dos 8 a 12 meses), uma vez que a partir daí

é possível discernir comportamentos de “meios-fins”. No jogo, a criança abandona o

“fim” detendo-se aos “meios” por si só. Além disso, ela desenvolve rituais tais como o

que faz antes de dormir: deitar-se, chupar o dedo, etc. A partir do sexto sub-período, a

criança passa a ser capaz de fingir, ou fazer-de-conta, utilizando objetos que transforma

em objetos simbólicos como, por exemplo, quando brinca de fazer um bichinho de

pelúcia dormir, ou mesmo no exemplo citado por Piaget, quando uma criança diz que

uma concha em cima de um objeto qualquer é um “gato em cima do muro”. (Piaget,

2006, p.53). Nesses casos, “a representação é nítida e o significante diferençado é, de

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novo, um gesto imitativo, porém acompanhado de objetos que se vão tornando

simbólicos.” (Piaget, 2006, p.53).

Como já foi dito, a representação de 2 a 7 anos é diferenciada, ou seja, ela

acontece sem a presença do modelo, o que pressupõe a constituição da imagem mental.

Ao se perguntar quais seriam as relações entre a imagem e a percepção, Piaget

considera “a imitação como um simples prolongamento das acomodações do sujeito à

inteligência sensório-motora; e, por outra parte, a imagem mental nascente como uma

imitação interiorizada.” (Piaget, 1975a, p.97, grifos nossos).

Piaget afirma que, apesar de superada pela inteligência conceitual, a inteligência

sensório-motora é preservada durante toda a existência, e é necessária tanto para as

percepções como para a inteligência conceitual. A imagem é considerada um produto

da acomodação imitativa, mesmo antes do aparecimento da linguagem, e por isso,

quando a linguagem aparece, essa atividade assume uma função auxiliar para a

inteligência conceitual.

A imagem não é um derivado da percepção pura, mas o produto de uma acomodação imitativa, o que por si mesmo atesta a existência de uma atividade situada acima das percepções e movimentos mais abaixo do pensamento refletido: é essa atividade que nos parece prolongar a inteligência sensório-motora, anterior à linguagem, e que designaremos, após o aparecimento desta, por inteligência perceptiva ou, mais simplesmente, “atividade perceptiva”. (Piaget, 1975a, p.98, grifos nossos).

Esta mudança de denominação é muito importante, pois ao tratarmos das ações

de uma criança que já atingiu o pensamento simbólico, devemos levar em conta que sua

inteligência não se limita ao presente, mas pode recorrer aos recursos do pensamento

representativo, ou seja, da memória em todos os sentidos.

Como já foi dito anteriormente a respeito dos dois aspectos diferentes do

pensamento representativo, o figurativo se guia pelas percepções, se baseia na imagem

mental e se dirige às configurações dos objetos sem levar em conta as suas possíveis

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transformações enquanto que o operativo “é relativo às transformações e se dirige a

tudo o que se modifica no objeto” (Piaget, 1973c, p.72).

No nível das operações concretas, podemos observar que a partir dos sete anos o infralógico se dissocia do lógico-matemático até então confundidos. O operativo, que engloba o infralógico e o lógico-matemático nutre relações com o figurativo. [...] É o operativo que estrutura toda representação. No mais das vezes, a representação ou pensamento se acompanha de imagens.[...] A imagem é necessária para a representação dos estados, mas insuficiente para a compreensão das transformações. Assim, a respeito do espaço – contrariamente ao que se passa para o operativo sozinho – as imagens têm um papel muito importante [...] e cumpre tanto um papel coadjuvante como perturbador, para a construção geométrica por exemplo. (Dolle, 1999, 196)32.

Uma operação é considerada como a própria transformação do objeto, podendo

ser executada simbolicamente, porém, não pode ser reduzida a uma figura ou a um

símbolo, mas sim a uma ação completa. Para a nossa investigação a afirmação

piagetiana de que o esquematismo sensório-motor é a fonte das operações,

independentemente de se utilizar um símbolo ou uma representação figurativa para a

sua interiorização é assaz esclarecedora, pois comprova a necessidade de se partir da

ação da criança sobre a música para que ela possa atingir um conhecimento operatório

neste domínio.

Se admitimos essa distinção dos aspectos figurativo e operativo do pensamento, fica então imediatamente visível que as operações tiram sua fonte do esquematismo sensório-motor, mesmo se a função simbólica e a representação figurativa são necessárias à sua interiorização e à sua expressão. É necessário compreender, com efeito, que uma operação não é a representação de uma transformação: ela é, em si mesma, uma transformação do objeto, mas que pode ser executada simbolicamente, o que não é absolutamente a mesma coisa. Uma operação permanece pois uma ação e não se reduz nem a uma figura, nem a um símbolo. (Piaget, 1973c, p. 86).

O aspecto figurativo das representações é preponderante no período pré-

operatório, ou seja, na fase preparatória do estágio das operações concretas. Só a partir

do momento em que o sujeito começa a se centrar sobre as transformações é que

podemos dizer que ele está operando propriamente dito. Esta conduta corresponde ao

32 Pour ce qui est des estructures du niveau des operations concretes, nous pouvons remarquer qu’à partir de sept ans l’infralogique se dissocie du lógicomathématique jusque-là confondus. L’operatif, qui recouvrel’infra-logique et le logicomathématique nourrit des rapports avec le figuratif.[...]c’est toujours l’operatif qui structure toute répresentation. Le plus souvent, la répresentation ou pense s’accompagne d’images. [...] Il aparaît que l’image est nécessaire pour la répresentation des états, mais qu’elle est insuffisante pour la compréhension des transformations. Ainsi, au niveau de l’espace – et contrairement à ce qui se passe pour l’operatif seul -, les images jouent um rôle très important [...] dans la mesure où elles ont tantôt um rôle adjuvant, tantôt um rôle perturbant, pour la construction géométrique par exemple. (Dolle, 1999, p.196).

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esperado da criança na fase de equilíbrio do estágio das operações concretas. Piaget

(1973b) chega a dividir o estágio das operações concretas em dois, sendo que o

primeiro, denominado pré-operatório, é sub-dividido em três, que ele descreve da

seguinte maneira:

• (De 2 a 3 anos e meio): “aparecimento da função simbólica e começo da

interiorização dos esquemas de ação em representações”. (Piaget,

1973b, p.67).

A dificuldade de interrogar crianças nesta idade dificultou o estudo desta fase

por Piaget, mas isto evidencia a predominância da ação neste sub-período. Por outro

lado, o aparecimento da linguagem, do jogo imaginativo, e da imitação diferenciada são

marcos que indicam o começo da formação da imagem mental, precursora da

representação.

• (De 4 a 5 anos e meio): “organizações representativas fundadas seja

sobre configurações estáticas, seja sobre uma assimilação à ação

própria” (Piaget, 1973b, p.67).

Os estados dos objetos são compreendidos pela criança dessa fase como

definitivos. A criança ainda não tem a conservação de conjuntos e de quantidades, mas

vai tornando-se, a cada dia, mais apta “a se dedicar a uma tarefa específica e de aplicar a

inteligência adaptada a ela, em vez de simplesmente assimilá-la a um esquema lúdico

egocêntico.” (Flavell, 1975, p.164).

• (De 5 e meio a 7-8 anos): “regulações representativas articuladas”

(Piaget, 1973b, p.68).

Neste sub-período a criança passa a fazer o que Piaget chama de regulações, que

são compensações momentâneas e parciais, e que levam a criança a considerar vários

aspectos dos objetos que possam variar durante as transformações, corrigindo as

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avaliações distorcidas que a criança até então fazia. Crescem as articulações das

classificações, das relações de ordem, etc.

• Invariantes que preparam as estruturas operatórias

Uma vez identificados os três sub-estágios do que Piaget chama de período pré-

operatório, voltemos à fase dos dois anos, quando a criança entra na sua fase

preparatória, caracterizada pelo aparecimento do pensamento simbólico, pois nos

parece ser fundamental entender melhor como se processa este tipo de pensamento a

fim de compreendermos a representação musical.

Como foi dito, a atividade perceptiva permanece pelo resto da vida como um

tipo de inteligência que dá suporte às operações e isso nos leva a crer que, no domínio

da música, as construções imagéticas do aluno são decorrentes das “acomodações

imitativas” de suas “atividades perceptivas” do fazer musical. Portanto, se o professor

de música tiver consciência do processo de imitação interna das atividades perceptivas,

ele poderá conduzir melhor suas práticas pedagógicas.

Piaget (1973) descreve cada conquista dessa fase preparatória das operações

concertas, que prima por uma interiorização gradativa da inteligência, antes observável

pela simples ação do sujeito. Essa interiorização vai adquirindo reversibilidade, e é

explicada por Piaget através dos conceitos matemáticos de agrupamentos, grupos e

redes.

É sobre a base do esquema do objeto permanente, adquirido por volta dos dois

anos de idade, que começam a funcionar três tipos de atividades que irão se desenvolver

conjuntamente: as lógico-matemáticas, as conservações físicas e as infralógicas.

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Figura 5: Esquema construído por Dolle para sintetizar as atividades desenvolvidas a partir do esquema do objeto permanente. “Se o esquema acima expressa o estado do sistema no seu acabamento, é na sua constituição que nós tentamos nos ater, principalmente durante o período pré-operatório, que continua ainda mal conhecido.” (Dolle, 2008, p.98). Embora o esquema acima represente a fase de acabamento do período operatório

concreto e os três itens ali expostos sejam indissociáveis a partir da aquisição do

esquema do objeto permanente, é para elucidar como a construção das estruturas lógicas

se comportam no período simbólico que devemos separá-los relacionando-os com os

diferentes aspectos do pensamento que cada um deles contempla.

O lógico matemático (I) estrutura as “relações entre os objetos distintos, ou

discretos mas no plano das categorias lógicas nas quais podemos lhes inscrever e,

portanto, da generalidade” (Dolle, 2008, p.99). A quantificação das conservações físicas

(II) colhe do objeto seus dados quantificados, ou seja, sua matéria, peso, volume, etc.

No que se refere ao espaço do objeto em si, sem relações com os outros objetos, ou

seja, sua extensão, suas reentrâncias, suas partes, ele é conhecido pelo sujeito através do

pensamento infralógico (III).

Mas a permanência do objeto concerne tanto o objeto qualificado e quantificado como o objeto categorizado. Cada um de resto, tem seu próprio espaço e ocupa um lugar no espaço construído pelo sujeito como estrutura de suas ações. Repetimos [:] à direita, a vertical, a superficie, o volume, etc.,etc., são propriedades do sujeito que ele atribui aos objetos e aos estados que ele produz. (Dolle, 2008, p. 99)33.

33 Mais, la permanence de l’objet concerne autant l’objet qualifié et quantifié que l’objet catégorisé. Chacun, au surplus, a son espace propre et occupe une place dans l’espace construit par le sujet comme structure de ses actions. Répetons-le, la droite, la verticale, la surface, le volume, etc., etc, sont des proprietés du sujet qu’il attribue aux états qu’il produit. (Dolle, 2008, p.99)

Esquema do objeto permanente

I. Lógico Matemático II. Quantificação das conservações físicas III. Infralógico

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61

O pensamento lógico-matemático, sendo complementar ao infralógico,

estabelece relações entre objetos diversos pelas semelhanças, diferenças, construindo

assim as classificações, ordenações, seriações, etc. Na primeira fase do período

concreto, é através das comparações entre os objetos, que a criança vai somando

qualidades aos objetos permanentes. A partir das diferenciações destas qualidades, passa

então a quantificar as diferenças e a construir séries.

O que se encontrará no período que nós retemos, é a atividade de comparação que estabelece, entre objetos distintos, diferenças e semelhanças. Mas esta atividade se liga à sua complementar necessária que consiste em separar/reunir produzindo estados separado/reunido, daí diferenciar/estabelecer semelhanças com os estados diferentes/semelhantes. (Dolle, 2008, p.100)34. As conservações permitem à criança regular as transformações entre os estados

através do aspecto da realidade que se mantém inalterado. Assim, quando a criança

compara duas bolas de massa de modelar, das quais uma se mantém inalterada e a outra

é transformada numa salsicha, é através da comparação pela qual identifica os estados

diferentes das duas bolas que pode afirmar que elas têm a mesma massa, apesar das

transformações.

Em II, as operações de conservações quantitativas da matéria, do peso e do volume prolongam o esquema do objeto permanente criando permanências que sustentam os objetos discretos do lógico-matemático tanto como os objetos contínuos do infralógico. Elas fundem todas as conservações sejam elas lógico-matemáticas ou espaciais sem o que não haveria conhecimento possível: se tudo muda ao mesmo tempo, nada é estável. Os objetos constituídos em sub-classes de uma classe superior se conservam durante as transformações que nós lhes impomos ao passarmos de uma categoria à outra. Da mesma maneira o objeto espacializado conserva suas propriedades espaciais quando o deslocamos ou quando o integramos a conjuntos mais vastos. É porque a separação entre o lógico-matemático e infralógico não tem sentido na medida em que onde o primeiro estrutura tudo aquilo que é discreto, descontínuo então o segundo o faz de contínuo. Mas tudo é ligado dentro do fato. Deve-se, no entanto, efetuar as diferenciações para nelas se reconhecer e aprofundar a abordagem estruturo-funcionais da atividade do conhecimento. [...] O que resulta da atividade aqui é que em conseqüência das diferenças/semelhanças, o sujeito vai diferenciar e identificar as qualidades características dos objetos e determinar o que é permanente. (Dolle, 2008, p.100-101)35

34 Ce qui se rencontrera dans la période qui nous retient, c’est l’activité de comparaison qui établit, entre objets distincts, des différences et des ressemblances. Mais cette activité se lie à sa complémentaire nécessaire qui consiste à séparer/reunir produissant les états séparé/réuni, d’où différencier/ établir des ressemblances avec pour résultat les états différents/ressemblants. (Dolle, 2008, p.100) 35 En – 2 -, les operations de conservations quantitatives de la matière, du poids et du volume prolongent le schème de l’objet permanent em créant des permanences qui sous-tendent les objets discrets du logicomathématique tout autant que les objets continus de l’infralogique. Elles fondent touts les conservations qu’elles soitent lógico-mathématiques ou spatiales sans quoi il n’y aurait pas de connaissance possible: si tout change em même temps, rien n’est stable. Les objets constitués em sous-

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62

Dentro da totalidade das regulações iniciais do pensamento simbólico,

chamamos de infralógico o mecanismo intelectual pelo qual o sujeito assimila as

características espaciais internas do objeto, sem estabelecer relações com outros objetos.

Dentre os elementos do pensamento infralógico temos as relações de contigüidade do

objeto, sua extensão, suas partes constituintes e as relações de vizinhança entre estas

partes, etc. “Em – 3; é a construção do espaço dos objetos singulares ou particulares que

nós assistimos” (Dolle, 2008, p.104)36. Mas é graças à construção das características

espaciais do objeto singular que a criança pode estabelecer relações entre os objetos e

conseqüentemente, classificá-los e construir séries.

Na medida em que estes são deslocados/colocados, eles alimentam entre si relações de proximidade/distanciamento, de vizinhança e envolvimento, de posição: entre, ao lado de, à esquerda/à direita, em cima/em baixo, depois, de relações relativas: à direita de/ à esquerda de, a cima de/ abaixo de, etc. para chegar às “seriações espaciais” relativas, mais perto de/ mais longe de, mais alto/ mais baixo, com comparações sistemáticas, mais perto de...que/ mais longe de...que, mais alto que.../ mais baixo que..., etc. Esta geometria dita de posições ou topologia, toma todo seu sentido na organização do objeto particular qualificado (medida) com a construção que se seguirá das operações concretas.” (Dolle, 2008, p.104)37. A descrição das três atividades cognitivas citadas podem colaborar para

compreendermos a apreensão do objeto musical. Somos levados a supor que na

exploração inicial do espaço físico do instrumento musical, a criança estabelece

primeiramente relações entre as características topológicas da interação corpo-

instrumento e as “infralógicas” do som.

classe d’une classe emboîtante se conservent durant les transformations qu’on le déplace ou qu’on l’intègre à des ensembles plus vastes. C’est pourquoi la séparation em logicomathématique et infralogique n’a de sens que dans la mesure ou le premier structure tout ce qui est discret, discontinu alors que le second le fait du continu. Mais tout est lié dans le fait. Il faut bien pourtant effectuer des differenciations pour s’y reconnaître et appofondir l’approche structure-funtionnelle de l’activité de connaissance. […]Ce qui resort de l’activité ici meme, c’est que, en conséquence des différences/ressemblances, le sujet va différencier te identifier les qualités caracteristiques des objets et déterminer ce qui est permanent. (Dolle, 2008, p. 100-101) 36 Em – 3 -, c’est à La construction de l’espace dês objets singuliers ou particuliers que nous assistons. 37 Dans La mesure ou ceux-ci sont déplacés/placés, ils nourissent entre eux dês rapports de proximité/éloignement, d’entourage et d’enveloppement, de position: entre, à cote de.../ au-dessous de..., etc pour parvenir à dês “seriations spatiales” relatives, plus près de/plus loin de, plus haut/plusbas avec comparaisons systematiques, plus près de...que. / plus loin de...que..., plus haut que/plus bas que, etc. Cette géometrie dite dês positions ou topologie, prend tout son sens dans l’organisation de l’objet particulier qualifié, avnt que celui-ci ne devienne arithmétiquement, physiquement et géometriquement quantifié (mesure) avec la construction que s’em suivra dês operations concrètes. (Dolle, 2008, p.104).

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Estamos, evidentemente, utilizando a palavra “infralógico” no sentido

metafórico para conseguirmos verbalizar uma idéia complexa. Do ponto de vista da

relação corpo-instrumento, são as percepções do espaço infralógico do objeto

“instrumento” que instruem a criança sobre as funções de cada parte do instrumento na

produção do som. Por outro lado, os “movimentos do som” para o agudo (para cima)

para o grave (para baixo), etc. passa a ser representado através do pensamento

infralógico.

Assim, somos levados a considerar que a totalidade dos três invariantes

constituintes do pensamento simbólico podem explicar o caminho cognitivo que o

sujeito deve percorrer para alcançar as estruturas que o levam a representar o objeto

musical.

Nós podemos dizer, para completar a descrição do sujeito epistêmico piagetiano, que o período dito pré-operatório ou simbólico se apresenta como a conjunção de três invariantes funcionais em interação uns com os outros e intervindo em graus diversos no domínio mais especifico que cada um parece descrever, menos na análise que nós fazemos. Ou, para dizer de outra forma, o que domina este período, é a construção da particularidade do objeto qualificado (qualificação), agrupado ou separado (quantificação qualitativa) às localizações variáveis uns em relação aos outros (topologia ou geometria das posições). (Dolle, 2008, p.104).38

As qualidades contínuas (infralógicas) relativas aos parâmetros de cada som

(objetos descontínuos) quando agrupados passam a constituir unidades maiores

(contínuas) estabelecidas através das relações entre os sons. Estas unidades maiores, por

sua vez, são conservadas nos aspectos estruturais da música: o ritmo, a melodia, a

harmonia, a agógica, a dinâmica, as formas musicais, etc.

Se levarmos em consideração a presença destas invariantes no pensamento

musical, torna-se importante, do ponto de vista pedagógico, saber discriminar qual

38 Nous puvrons dire, pour compléter La description du sujet épistémique piagetien, que La périonde dite pré-operatoire ou symbolique se presente comme La conjonction dite pré-opératoire ou symbolique se presente comme La conjunction dês trois invarients fonctionnels em interaction lês uns avec lês autres et intervenant à dês degrés divers dans Le domaine plus especifique que chacun semble décrire, du moins dans l’analyse que nous em faisons. Ou, pour Le dire autrement, CE qui domine cette période, c’est La construction de La particularité de l’objet qualifié (qualification), groupé ou separe (quantification qualitative) à dês emplacements variables lês uns par rapport aux autres (topologie ou géométrie dês positions).

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64

invariante está sendo predominante na ação da criança e, no caso de haver dificuldades

por parte dela, poder solicitar-lhe atividades que a levem a superar seus limites e

alcançar o pleno funcionamento das estruturas operatórias.

A medida espacial é o meio pelo qual a criança constrói a noção métrica

temporal e, no caso da educação musical, tem-se buscado utilizar o movimento do corpo

para a construção da métrica rítmica. Embora a avaliação do ensino musical ocidental,

feita no início do século XX pelo músico e educador suíço Émile Jaques-Dalcroze, que

apontava a importância da sensação do ritmo por meio do movimento corporal como

base da pedagogia musical, ainda não tenha repercutido de forma a transformá-la

definitivamente (Santos, 2001b), muitos outros pedagogos musicais confirmam esta

premissa e, no Brasil, tem sido de grande repercussão o trabalho de vivência do ritmo

pelo movimento, revisitado no método “O Passo” de Lucas Ciavatta (2003).

Caso a criança apresente problemas para articular39 as durações com a pulsação,

pode ser que a sua noção de espaço ainda não tenha evoluído plenamente e se lhe for

solicitada a movimentação do corpo no espaço, realizando ritmos dentro de uma

pulsação constante, a criança poderá assim exercitar suas estruturas sensório-motoras. O

deslocamento corporal no espaço a ajudará a sentir a duração e ritmo dos eventos

sonoros e a visualizar, através do espaço percorrido, a relação temporal (métrica ou não

métrica) entre eles.

Para que a criança localize sons vizinhos, ou mesmo para localizar estes sons

num teclado do piano, ela utiliza operações que a levam a discriminar qualidades

“infralógicas” do objeto musical, que por sua vez, alimentam as quantidades lógico-

matemáticas e as conservações deste. Se lhe solicitarmos que diferencie as qualidades

dos sons, de melodias ou de ritmos diferentes, questionando o que eles têm de

39 O termo articulação é adotado por Ciavatta para se referir à realização de um ritmo dentro de uma referência temporal constante (pulsação).

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65

semelhante e de diferente, estaremos provocando o funcionamento de seu pensamento

operatório.

1.4.2.2 Sub-estágio Operatório Concreto (acabamento).

A fase de acabamento do período operatório é conhecido como “concreto”

porque os problemas que as operações tratam são relativos aos objetos. O que o difere

do operatório formal é que, no futuro, o sujeito fará operações proposicionais baseadas

em situações hipotéticas enunciadas verbalmente.

Para passar do nível da ação à operação, a criança enfrenta três obstáculos: o

primeiro é reconstruir no nível da representação tudo o que já faz no nível da ação. O

segundo é também no nível da representação, passar do estado egocêntrico para um

estado de descentração cada vez mais flexível, capaz de ajustamentos que levam em

conta muitos fatores externos à sua ação e ao seu corpo. O terceiro é a constituição de

um universo inter-individual e social onde as operações podem se realizar. (Piaget e

Inhelder, 2006, p.86-88).

A diferença principal entre a criança do pré-operatório ao operatório concreto, é

que enquanto a primeira tem um pensamento rígido, a segunda tem um pensamento

flexível, ajustável à realidade. Ao avaliar as transformações, a criança inicialmente

focaliza as configurações dos objetos e situações no antes e no depois sem prestar

atenção às mudanças que estão ocorrendo e por isso não consegue ter coerência nas

conclusões sobre as transformações dos objetos. A criança pré-operatória não chega a

fazer compensações que a criança operatória já faz.

Um dos motivos dessa flexibilidade é o equilíbrio da reversibilidade presente no

pensamento operatório. A reversibilidade consiste na capacidade de retornar ao ponto

inicial de um raciocínio e percorrer novamente suas etapas. Ela se apresenta na forma de

inversão, identidade, compensação ou reciprocidade.

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Piaget define as operações como transformações reversíveis, sempre relativas a

alguma invariante pois, se tudo mudasse ao mesmo tempo, uma transformação não teria

retorno.

As operações consistem em transformações reversíveis, podendo essa reversibilidade consistir em inversões (A-A= 0) ou em reciprocidade (A corresponde a B e reciprocamente). [...] Uma transformação operatória, portanto, é sempre relativa a uma invariante, e essa invariante de um sistema de transformações constitui o que denominamos até aqui noção ou esquema de conservação [...] dessarte, o esquema do objeto permanente é a invariante do grupo prático dos deslocamento etc. (Piaget e Inhelder, 1966/2006, p.88) Com a consolidação das conservações, a criança passa a compreender melhor as

transformações graças às invariantes funcionais (o lógico-matemático, as conservações

físicas e o infralógico) do pensamento operatório. No acabamento do período operatório

vemos consolidadas as conservações físicas: de substância, de peso, de volume; as

conservações espaciais: de comprimentos, de superfícies e dos volumes espaciais; e as

conservações numéricas.

Esta fase do período operatório-concreto - entre os 7 e 11 anos,

aproximadamente, é resultante de uma organização conceitual do ambiente externo cada

vez mais estável e da formação de estruturas cognitivas chamadas agrupamentos. Estas

estruturas comportam composições de operações diretas, inversas, idênticas,

tautológicas e parcialmente associativas.

As classes e as relações são os mais importantes grupamentos do período

operatório concreto. Enquanto as classificações constituem agrupamentos de objetos por

semelhança, as seriações consistem “ordenar os elementos segundo as grandezas

crescentes ou decrescentes” (Piaget, 2006, p. 92).

Estes grupamentos têm sua gênese em ações elementares tais como “amontoar,

dissociar, alinhar, etc.” que vão sofrendo “regulações cada vez mais complexas que

preparam e depois asseguram sua interiorização.” (Piaget, Gênese das Estruturas

Lógicas Elementares, p. 290 apud Dolle, 1999, 178). Assim como as seriações e

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67

classificações são resultado de um processo de construção através das ações acima

descritas, os números inteiros são o resultado de seriações e de inclusões de classes.

Sobre o espaço topológico se estabelecem pouco a pouco, as noções de espaço

euclidiano e de espaço projetivo, que visam relações entre os objetos e isso confere à

criança do período das operações concretas um acesso à construção de sistemas de

conjunto, por reunião de figuras seja por jogo de perspectivas ou eixos de coordenadas.

Figura 6. Esquema da derivação do espaço infralógico em espaços euclidiano e projetivo (Dolle, 1999, p. 168) Enquanto no espaço topológico observamos o interior da figura, no espaço

projetivo os objetos se situam uns em relação aos outros e através dele os objetos são

considerados segundo um certo ponto de vista. “A descoberta da perspectiva é

imputável a uma diferenciação e a uma coordenação reunidas dos pontos de vista, que

atesta um certo desapego com relação ao objeto acompanhado de uma tomada de

consciência da relação que o liga ao sujeito.” (Dolle, 1999, p. 168)

Já no espaço euclidiano, os objetos são coordenados segundo um quadro de

conjunto ou com relação a um sistema de referência estável que exige a conservação

tanto das superfícies quanto das distâncias. Ele repousa na noção de deslocamento, e o

deslocamento, como já foi dito, constitui matematicamente um “grupo”. As iterações de

deslocamentos levam à medida.

Exemplo notável é a medida espacial, que se constitui independentemente do número, mas em estreito isomorfismo com ele (com 6 meses de diferença, mais ou menos, porque, no contínuo, a unidade não é fornecida de antemão). A medida principia, de fato, com uma divisão do contínuo e um encaixe das partes em isomorfismo com a inclusão das classes. Mas, para constituir e

Espaço topológico

Espaço euclidiano (métrico)

Espaço projetivo

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utilizar a unidade, uma das partes deve ser aplicada sucessivamente sobre o todo por deslocamento ordenado (= sem cruzamentos, etc.), o que corresponde a uma seriação: a medida surge, assim, como síntese do deslocamento e da adição partitiva no mesmo sentido que o número é a síntese da seriação e da inclusão. (Piaget e Inhelder, 2006, p.96-97)

As medidas temporais também são construídas pela criança através da vivência

de eventos que apresentam freqüências regulares. No pensamento musical isso se

estabelece através da iteração de sons com durações regulares. Eventos naturais como a

pulsação do coração, a freqüência da respiração, o equilíbrio do movimento regular dos

passos numa caminhada, ou mesmo os acontecimentos iterativos do cotidiano, tais

como as gotas que pingam de uma torneira, o movimento regular do varrer o chão. Estes

eventos repetitivos formam unidades de medida temporal que podem servir de

referência para levarmos a criança a compreender a pulsação musical. É somente após a

aquisição da noção de pulsação que as durações dos sons podem ser classificadas e os

ritmos musicais podem ser articulados.

Assim como as durações, as alturas musicais também se organizam em séries. O

contínuo (infralógico) que se percebe nas variações de alturas do grave para o agudo ou

do agudo para o grave no assobio, no canto, ou no glissando provocado pelo escorregar

dos dedos nas teclas do piano, pode ser dividido em partes (grave, médio e agudo). As

escalas nada mais são que séries formadas por unidades regulares (tons e/ou semitons)

constituídas pelo uso dos sons pelas diferentes culturas.

Apesar de todos estes elementos serem vivenciados pela criança desde o

nascimento, é somente na fase de acabamento do estágio operatório concreto que a

criança tem mecanismos suficientes para operar sobre todas as relações envolvidas na

construção de objetos musicais tais como escalas ou ritmos. Se antes a criança

representava estes objetos através do aspecto figurativo do pensamento, a partir de

então, ela passa a utilizar as operações de classificação, seriação, etc. e através delas

constrói representações mais complexas dos elementos musicais.

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1.4.3 Estágio das Operações Formais

Nossa amostra é constituída de crianças que estão, em termos epistêmicos, no

período concreto. Elas tem idades que se relacionam com a média estabelecida por

Piaget para o estágio operatório concreto, mas nós não poderemos afirmar que elas estão

neste estágio de desenvolvimento, dado ao método de observação que adotamos.

Em todo caso, faremos a descrição da conduta do sujeito epistêmico do período

das operações formais – entre os 11 e 15 anos, aproximadamente, apenas para completar

a visão geral do desenvolvimento. A característica principal deste período é de

apresentar os pensamentos hipotético-dedutivo e proposicional. O sujeito, agora

adolescente, passa a lidar bem não apenas com situações reais, ou nas que acredita que

sejam reais, mas em situações hipotéticas mesmo que não acredite que sejam

verdadeiras.

Para pensar hipoteticamente, é necessário compreender as relações lógicas entre

as classes, coisa que a criança operatória concreta faz em situações concretas. O

adolescente prescinde das situações concretas e pode lidar com situações fictícias,

através de enunciados verbais, para que determinadas relações se estabeleçam em seu

pensamento. O equilíbrio destas construções virtuais leva em conta as condições

necessárias para que elas sejam possíveis.

Essa capacidade de formular hipóteses existe graças ao pensamento

combinatório, que leva o adolescente a construir internamente uma rede de combinação

de variáveis, o que lhe permite escolher a mais apropriada para a hipótese formulada.

Essa rede é o que Piaget denomina reticulado, e ela se integra a inversões e

reciprocidades num sistema único de transformações: o grupo INRC, do qual falaremos

na próxima página.

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Enquanto a criança operatória concreta combina os objetos através de

classificações contíguas, o sujeito do estágio operatório formal combina todos os

objetos possíveis, mesmo que eles pertençam a classes muito distantes umas das outras.

Além de combinar objetos, o sujeito operatório formal é capaz de combinar idéias ou

hipóteses. Piaget e Inhelder (1966/2006) citam as formas em que elas se apresentam:

“afirmações e negações, utilizando operações proposicionais, a implicação (se...então),

a disjunção(ou...ou...ou os dois) , a exclusão (ou...ou), a incompatibilidade (ou...ou...ou

nem um nem outro), a implicação recíproca, etc.” (Piaget e Inhelder, 1966/2006, p.121)

Piaget (1972/1973b) explica que o equilíbrio durante o desenvolvimento é

caracterizado por uma reversibilidade cada vez maior do pensamento. Esta

reversibilidade se apresenta do nascimento até o estágio operatório concreto sob a forma

de inversão, ou negação (aparecendo assim na lógica das classes), e também sob a

forma de reciprocidade (no caso das operações de relação). No entanto, estas duas

formas de reversibilidade não se integram até que o sujeito chegue ao estágio operatório

formal.

O pensamento formal é explicado por Piaget através de um sistema que integra

os reticulados e o modelo matemático de grupo INRC, que é formado por quatro

transformações: Identidade (I), Negação (N), Reciprocidade (R) e Correlatividade (C).

A Epistemologia Genética explica o comportamento cognitivo do adolescente a

partir da lógica das operações proposicionais:

Num sistema complexo de influencias, as operações concretas de classificações seriações, correspondências, medidas, etc, não bastam, e cumpre introduzir as ligações novas de implicações, disjunções, exclusões etc. que dependem das operações proposicionais e supõe ao mesmo tempo, uma combinatória e coordenações de inversão e reciprocidade (quaternalidade). (Piaget e Inhelder, 2006, p.131). Segundo Piaget e Inhelder (2006), quando questionamos um sujeito do período

das operações concretas sobre um problema onde existem muitos fatores envolvidos ele

não procura fazer um inventário destes fatores e estudar previamente suas implicações

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no problema. Já os sujeitos do período operatório formal tendem a se comportar de

forma diferente, estudando cada um dos fatores evolvidos no problema, tratam de

dissociá-los, criam hipóteses e em seguida fazem variar um a um os fatores deixando os

outros invariáveis.

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72

1.5 Considerações Finais do Capítulo 1

Conforme nos propusemos no início deste capítulo, fizemos a revisão do

referencial teórico no qual contextualizamos nossa pesquisa a fim de levantarmos os

conceitos que estaremos relacionando com a reflexão sobre ensino/aprendizagem em

música.

A continuidade do desenvolvimento é marcada por estruturas que se integram

aos novos patamares do pensamento transformando-se em novas estruturas. Portanto,

consideramos que os momentos de mudança geral das estruturas se configuram como

divisões deste contínuo.

A construção do real inclui a gênese do objeto e do espaço, e estas construções

evoluem a partir dos espaços práticos, heterogêneos no período sensório-motor. A

criança identifica as partes do seu próprio corpo como sendo as fontes geradoras dos

acontecimentos. Posteriormente, as noções de objeto e de espaço sofrem uma

“subjetivação” seguida de uma objetivação que finalmente é internalizada através do

pensamento simbólico resultando na representação do espaço e dos objetos nele

situados. Vê-se nestas construções a mesma descentração contínua que caracteriza a

gênese da inteligência na criança como um todo.

Por meio de abstrações reflexionantes sobre suas ações, o sujeito alcança

representações do objeto sem, contudo, abandonar os esquemas motores envolvidos

neste fazer. Sob este ponto de vista, podemos dizer que no domínio da música, a

atividade perceptiva prolonga a inteligência sensório-motora já integrada à inteligência

representativa e caracteriza, portanto, a passagem do sensório-motor ao pré-operatório.

Partindo do quadro teórico da Epistemologia Genética, a representação musical

tem um sentido estrito baseado na imagem mental construída por assimilação do objeto

musical pelo sujeito através de sua atividade perceptiva. No sentido amplo, a

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73

representação se baseia no conceito que o sujeito tem sobre o objeto musical. Logo,

podemos afirmar que a representação musical parte, em seu processo de construção, de

um sentido estrito, baseado na evocação do fazer musical, para alcançar um sentido

amplo, constituído dos esquemas mentais envolvidos na construção dos conceitos

musicais.

Enquanto a inteligência sensório-motora se baseia apenas na percepção (tátil-

cinestésica-auditivo-visual), sendo necessária a presença do objeto para que funcione, a

atividade perceptiva é prolongada pela imagem mental (dos mesmos canais perceptivos

anteriores). Através dela, o sujeito é capaz de evocar objetos e ações vividas e é assim

que podemos evocar a música. Esta evocação parte da imagem como imitação interna e

evolui pouco a pouco para uma construção conceitual da música.

Enquanto o sujeito se baseia apenas nas percepções, representa os objetos de

modo parcial. Só quando compreende os fenômenos é que consegue formar conceitos

operatórios e não só pré-operatórios, ou seja, pré-conceitos.

Procuramos neste capítulo contribuir para a área de pesquisa em Educação

Musical através da revisão da teoria piagetiana e da escolha de alguns de seus conceitos

a serem utilizados como base teórica para a parte empírica desta investigação.

Tal conjunto de conceitos interessa à aprendizagem musical especialmente no

que se refere à técnica musical - aspecto do fazer musical que compreende a ação

motora, leitura de partituras, solfejo etc - aliada à compreensão musical, e que nós

abordaremos no último capítulo da tese. No capítulo dois voltaremos a tratar destes

conceitos através da revisão de literatura sobre Psicologia da Música num recorte no

qual abordamos trabalhos que têm a Epistemologia Genética como referencial para

estudar os processos de aprendizagem da Música.

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74

CAPITULO 2

JEAN PIAGET NA ESCOLA DE MÚSICA: O ALUNO COMO O SUJEITO DA AÇÃO SOBRE OS INSTRUMENTOS MUSICAIS

2.1 Psicologia da Música

Este capítulo se propõe a rever a bibliografia sobre educação musical

relacionada ao trabalho de musicalização de crianças através de instrumentos musicais.

Além disso, a revisão procura focalizar abordagens construtivistas da educação musical,

passíveis de serem estruturadas segundo a teoria de Jean Piaget, para melhor

compreender os processos cognitivos dos alunos em atividades nas escolas de música.

Este direcionamento insere nosso trabalho no campo da psicologia da música.

Ilari (2006) afirma que desde 1983, com a publicação do livro The Music Mind:

The cognitive psychology of music do inglês John Sloboda, ficou estabelecida uma área

de estudos de natureza multidisciplinar que contou com algumas denominações:

“psicologia cognitiva da música, ciências cognitivas da música e cognição musical”

(Ilari, 2006, p.11). O interesse comum de especialistas de vários campos do

conhecimento que colaboram nesta grande área é o estudo de processos mentais

envolvidos nas atividades musicais humanas.

Dentro deste panorama, nossa revisão tratará das pesquisas em música que se

fundamentam na Epistemologia Genética, das pesquisas que tratam de ensino e

aprendizagem de instrumentos musicais e das que possam iluminar o estudo dos

processos cognitivos dos alunos entre 6 e 12 anos de idade, quando recebem instrução

em aulas de instrumentos musicais dentro dos ambientes formais de ensino como são as

escolas de música.

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75

No final deste capítulo apresentamos um quadro de conceitos cognitivo-musicais

de vários autores da área de psicologia da música distribuídos na seqüência de estágios

piagetianos do desenvolvimento (ver quadro 3, p.113).

Mesmo sem ter tido a intenção de explicar como funciona o nosso pensamento

quando aprendemos música, Jean Piaget contribuiu para nossa compreensão dos

processos de aprendizagem durante a infância. Através de uma ciência que chamou de

Epistemologia Genética, Piaget sistematizou o processo de desenvolvimento do

pensamento lógico-físico-matemático, e, graças a essa sistematização, pesquisadores de

diversos domínios, inclusive da música, têm procurado estudar como pensam as

crianças durante seu processo de desenvolvimento, especialmente quando se colocam

numa abordagem interacionista40 frente ao conhecimento.

Beyer (2000) diferencia esta abordagem especialmente de outras duas, que são

antagônicas: a empirista e a inatista. Pela primeira entende-se que o conhecimento está

nos objetos e o sujeito absorve informações que estão neles contidas. A realidade lhe

traz informações que serão absorvidas pelo sujeito tal como realmente são. Em

contrapartida, segundo a abordagem inatista, o sujeito já nasce com “talentos” que se

revelarão no decorrer da vida, de maneira quase determinista, pois a verdade é por ele

conhecida, cabendo-lhe apenas lembrar-se41 dela.

A visão interacionista explica a construção do conhecimento através da ação do

sujeito sobre os objetos. Decorrentes desta ação, as estruturas mentais, que são como

prolongamentos da constituição biológica do sujeito, se desenvolvem e possibilitam a

40 Beyer situa o interacionismo da teoria de Piaget, caracterizado por ver o “organismo e o meio como um todo indissociável” dentro de seis possibilidades de teorias epistemológicas existentes: 1) O realismo aristotélico (intelectualismo); 2) O apriorismo (denkpsychologie); 3) O convencionalismo ou pragmatismo (teoria da apalpadelas - ensaio e erro); 4) O empirismo (psicologia do associacionismo); 5) O fenomenológico (teoria da Gestalt); 6. O interacionismo (teoria opertória da inteligência). (Beyer, 1988, p.31-32). 41 Em A República, Platão desenvolve a teoria da reminiscência, que ele explica através do mito de Er. Ver em: Chauí, M. Convite à Filosofia. São Paulo, Ed. Ática, 1995, p. 70.

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76

construção de conhecimentos cada vez mais adaptados à realidade, além de possibilitar

a criação de novos conhecimentos.

Pela visão interacionista, o conhecimento e a inteligência estão intimamente

ligados. Segundo Dolle42, não existe estrutura sem funcionamento e são os conteúdos

que fazem funcionar as estruturas. Podemos concluir que o sujeito se desenvolve

estruturalmente graças ao contato com conteúdos novos e assim constrói o próprio

conhecimento.

Partimos da premissa já enunciada por outros pesquisadores (Beyer, 1988;

Kebach, 2003, 2008; Decker, 2006; Weiland; 2006), de que a construção do

conhecimento musical ocorre de forma mais ou menos homóloga aos níveis

investigados pelo Centro de Epistemologia Genética em Genebra para outros objetos de

conhecimento. (Kebach, 2003, p.18).

2.2 Princípios da teoria da cognição musical com bases piagetianas

Beyer (1988) foi uma das primeiras pesquisadoras no Brasil a lançar hipóteses

sobre a relação da psicogenética com a música. Em sua dissertação de mestrado, a

autora faz uma crítica ao ensino de música no Brasil, dizendo que, neste, a visão inatista

prevalecia sobre a visão cognitivista. A abordagem inatista levava a uma ênfase maior

no aspecto subjetivo da atividade musical ao invés do estabelecimento de parâmetros

objetivos de ensino voltados para o desenvolvimento da cognição musical.

2.2.1 A Percepção e a cognição musical

Para a construção de uma teoria cognitivista em música, Beyer fez uma revisão

crítica sobre a teoria da percepção e mais especificamente sobre a percepção musical.

Confrontando esta revisão com os estudos de Piaget sobre o assunto, Beyer conclui que

42Explicação dada no mini-curso “A Psicopedagogia Científica – Matriz de uma Pedagogia Científica.” no I Colóquio Internacional de Epistemologia e Psicologia Genéticas: Atualidade da Obra de Jean Piaget. Marília - SP, UNESP, 2009.

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a percepção está subordinada à cognição, cabendo à segunda o julgamento, a inferência,

a classificação e a reorganização do objeto.

A percepção desenvolve-se, portanto, sempre em dependência aos esquemas do estágio de desenvolvimento em questão. Por exemplo, se o esquema cognitivo for de natureza sensório-motora (conservação do objeto), a percepção estará se consolidando no sentido de uma constância perceptiva. É a inteligência sensório-motora e não a percepção que provê as bases para o desenvolvimento intelectual posterior. (Flavell, 1975, p.237 apud Beyer, 1988, p.63.).

Podemos estabelecer, como Piaget, uma correspondência de estruturas próprias

da percepção em relação às estruturas da cognição e verificar o quanto as afirmações

acima são verdadeiras.

Quadro 2. Quadro sintético baseado na comparação entre a Percepção e a Cognição (Beyer, 1988, p.63-64).

Percepção Cognição

Semi-reversibilidade Reversibilidade total do pensamento

Constâncias perceptivas Conservações representativas

Coleções figurativas Classes lógicas operacionais

Pré-inferência perceptiva Inferência lógica

O quadro acima sintetiza a descrição de Beyer sobre a evolução da cognição

durante o desenvolvimento do pensamento. O lado esquerdo do quadro mostra a

atividade perceptiva característica do período sensório motor e do pré-operatório. Pode-

se constatar que o sujeito inicia seu desenvolvimento centrando-se essencialmente na

percepção, necessitando da experiência real para estruturar, pouco a pouco, sua ação

mental. A cognição, a partir da fase preparatória do período operatório concreto, se

liberta cada vez mais da percepção através do progresso da reversibilidade e chega ao

pensamento operativo podendo realizar inferências lógicas sobre realidades não

presentes.

A conclusão a que chegamos com base na revisão de Beyer é que a importância

dada à percepção nos estudos formais de música pode ser reinterpretada. A valorização

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de respostas espontâneas da criança, como o “canto afinado”, ou até mesmo a do

“ouvido absoluto”, nos levam a superestimar um suposto talento musical “inato”, o que

em si pode mascarar uma avaliação de seu estágio de desenvolvimento musical.

Finalmente, se quisermos analisar o pensamento do aluno quando realiza

exercícios de solfejo, ditado, e outros, denominados exercícios de percepção, poderemos

concluir que o que está desenvolvendo mesmo são exercícios de cognição musical, pois

é por meio do funcionamento das estruturas lógicas, em resposta às suas percepções

sonoras e coordenações mentais, que o sujeito se desenvolve musicalmente.

Quando percebemos, realizamos abstrações empíricas, ou seja, extraímos dos

objetos suas propriedades. Mas quando aplicamos uma lógica sobre os dados

percebidos, ou seja, coordenamos mentalmente aquilo que ouvimos, percebemos e

sentimos, começamos, então, a agir mentalmente sobre o objeto para tentar retirar dele

novas informações que são inferidas por nós.

2.2.2 A Música como Linguagem: uma metáfora.

O uso de metáforas na comunicação professor/aluno ao agir sobre os

instrumentos, assim como aqueles observados no processo de construção significativa

dos saberes musicais de crianças e jovens, nos leva a um consenso sobre o uso

metafórico do conceito de música como linguagem. Este conceito é abordado por vários

autores quando relacionam a educação musical, assim como o uso de instrumentos

musicais, com temas relacionados ao fazer musical em geral, tais como interpretação,

composição, execução, expressividade, sonoridade, técnica e leitura musical.

A analogia entre o desenvolvimento do pensamento lógico-matemático e o

musical descrito por Beyer (1988) partia da premissa de que a música é uma forma de

linguagem, mas que se desenvolve depois da fala, se apresentando por meio do que

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Piaget identifica como uma décalage43 horizontal. Porém, de acordo com as

considerações da banca de defesa desta tese, Beyer reviu esta premissa durante sua

pesquisa de doutorado44 em 1996, na qual propôs que música e linguagem podem se

desenvolver ao mesmo tempo, caso os adultos proporcionem à criança a mesma

solicitação que fazem em relação à fala.

Sobre esta questão, é interessante a proposição de Deutsch (2006) a respeito do

ouvido absoluto45. Nos resultados parciais de uma pesquisa na qual se investigou a fala

de nativos de países de línguas tonais, demonstrou-se que estes indivíduos falam em

alturas absolutas, sendo que palavras idênticas pronunciadas em tons diferentes têm

significados diferentes.

A partir desta constatação, Deutsch afirma que o ouvido absoluto desenvolveu-

se originalmente para servir à fala, e acrescenta que tanto o ouvido absoluto para a fala,

quanto o para a música “compartilham mecanismos cerebrais”. Esta afirmação contraria

a idéia predominante de que “os mecanismos cerebrais subservientes à musica e à fala

são distintos e separados.” (Deutsch, 2006, p.21).

Queremos supor que a dificuldade de se comparar os parâmetros da fala com os

da música, vem do conceito de significação para cada caso. Na música as significações

são abstratas. Alguns elementos sonoros são, através de representações socialmente

constituídas, associados a determinados estados de ânimo, como, por exemplo, quando

relacionamos andamentos lentos a sentimentos como os de “seriedade”, “calma”,

“tristeza”, etc; ou mesmo algumas harmonias ricas em dissonâncias, que são associadas

à idéia de tensão, se contrapõe às mais consonantes, que dão a idéia de relaxamento. 43 O conceito de décalage , termo adaptado para o português como decalagem, pode ser mal traduzido como defasagem. Como já foi explicado no primeiro capítulo, pg. 31, trata-se de um “deslocamento temporal” no comportamento cognitivo, embora dentro de parâmetros normais de desenvolvimento. 44 BEYER, E. Musikalische und sprachliche Entwicklung in der frühen Kindheit. Em português: O desenvolvimento musical e da fala na infância precoce. Tradução: Adriana Bozzetto. Porto Alegre: Instituto de Artes - Departamento de Música, 1996. 45 Segundo Deutsch (2006), “ouvido absoluto é a capacidade de nomear ou produzir uma altura de freqüência pré-determinada na ausência de uma nota de referência”. (p.16).

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Molino (2003), num texto onde discute o que é e como podemos identificar a

pureza e a impureza na música, diz que a própria análise da organização mais elementar

da música esbarra nas impurezas da metáfora, pois ao descrever uma simples melodia

temos que recorrer a termos como, por exemplo: “contorno, esquemas de tensão e de

relaxamento.” (Molino, 2003, p. 663).

O foco do texto de Jean Molino se situa na tensão presente em toda a história da

música: a música em si versus a música no lugar de outra coisa, de uma emoção ou de

um significado. Molino (2003) diz que esta tensão está presente nas doutrinas

pitagóricas e perpassa toda a história da música: música pura e impura, teórica e prática,

estruturas matemáticas e materialidade do som, razão e afeto.

Carmo Jr (2005) compara frases musicais e a fala, lembrando que os músicos se

referem à melodia como uma composição de “semi-frases, frases e períodos”,

terminologia essa que, segundo este autor, parece derivar apenas da “intuição e do bom

senso”.

Uma frase musical é uma cadeia dotada de um sentido completo, muito embora este seja um sentido musical, muito difícil de circunscrever. Trata-se de uma dificuldade que reflete muito mais uma insuficiência metalingüística que uma complexidade de objeto. Não obstante esta dificuldade, pode-se dizer com segurança que as variáveis envolvidas na frase musical, ou seja, altura, duração e intensidade, também estão presentes na fala. (Carmo Jr, 2005, p. 108).

Piaget e Inhelder dizem que, apesar de a criança construir significações desde o

primeiro ano através dos “conteúdos dos esquemas relativos às ações em curso”, é só

por volta dos 18 meses de vida que ela adquire a função simbólica. Nesta fase a criança

começa a realizar a imitação diferida, ou seja, imitar um modelo ausente.

Se há desde o princípio significação, e portanto, dualidade entre “significados” (=os próprios esquemas com os seus conteúdos relativos às ações em curso) e “significantes”, estes são sempre perceptivos e, portanto, ainda não diferençados dos seus significados, o que não permite que se fale, nesse nível, em função semiótica. (Piaget e Inhelder, 2006, p. 52).

Pela imitação diferida a criança passa a criar imagens mentais que podem ser

evocadas para diversos fins. Piaget concluiu que a imitação é um prolongamento das

acomodações do sujeito à inteligência sensório motora, e que a imagem mental nasce

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como uma imitação interiorizada. A inteligência sensório-motora perdura a vida toda

como elo entre a percepção a inteligência conceitual. (Piaget, 1975, p.97).

Em algumas abordagens de educação musical é comum os professores proporem

a seus alunos a exploração de sons percebidos no ambiente. A representação de

imagens mentais derivadas dos fenômenos sonoros, tais como sons da chuva, do

movimento das folhas de árvores ao vento, das águas batendo nas pedras, etc, foi muito

bem exposta por Robert Murray Schafer (1991) em debates que este compositor

estabeleceu com alunos de 13 a17 anos em escolas do Canadá no ano de 1965. Como

fruto destes debates ele propõe exercícios para trabalhar a sensibilização dos alunos

através do desenvolvimento da percepção de “paisagens sonoras” e sua utilização em

trabalhos de composição.

Gostaríamos de aproximar o termo “paisagem sonora” de Schafer do conceito de

“imagens mentais” da teoria de Piaget, uma vez que ambas são imitações internas

decorrentes da percepção da realidade. São, portanto, o ponto de partida sobre o qual o

sujeito poderá criar representações de eventos sonoros do ambiente que o circunda.

Ao procurarmos compreender o conceito de linguagem musical, devemos levar

em conta, como o faz Borges Neto (2005, p.2) que diz existirem “coisas”

cognitivamente simples e “coisas” cognitivamente complexas. As simples podem ser

compreendidas diretamente, e as complexas são compreendidas por meio de metáforas.

A música parece possuir uma complexidade que se compreende mais facilmente

através de metáforas. Talvez daí venha a tendência de aproximarmos nossas

interpretações de significados da música com a significação que podemos verbalizar. A

complexidade da música está justamente em não ser possível um discurso sobre ela sem

que usemos esquemas emprestados de outras experiências humanas.

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Mór (2004) fez um estudo das metáforas usadas por professores de instrumentos

musicais ao darem aulas. Concluiu que existe uma tendência no uso de metáforas para

falar da sonoridade, da qualidade do som e dos meios de sua produção. Este autor

procurou estabelecer critérios para a avaliação de metáforas usadas pelos professores

baseando-se numa revisão deste conceito desde a sua origem. Segundo sua revisão da

literatura sobre o assunto, as metáforas podem ser usadas de acordo com a “teoria da

substituição” de uma palavra por outra, ou de acordo com a “teoria da tensão”, que

explica a causa de tensão da metáfora no conjunto da frase em que está inserida.

Em sua pesquisa, Mór, procurou identificar na fala dos professores de

instrumentos quando as metáforas usadas atuavam “como alguma coisa para significar

outra coisa”, ou quando se assemelhavam à coisa que substituíam. Outra condição foi a

de haver relação da fala desses professores com a música.

Segundo o autor, nesta condição manifestam-se aspectos ligados à execução e à

interpretação musical, que são diferenciados no sentido de que no primeiro se insere a

fidelidade à partitura e no segundo, a subjetividade do instrumentista. Além disso, a

interpretação é dividida por ele em dois aspectos: um relacionado “às questões

mecânicas”, e outro “mais abstrato, abrange conceitos e idéias da compreensão que o

intérprete tem da peça musical.” (Mor, 2004, p.47). Finalmente, este autor conclui que

“a interpretação é mais abrangente, pois ela contém dentro de si a execução.” (Mor,

2004, p.47).

A divisão da atividade do instrumentista entre execução e interpretação é

também abordada por França (2000), num estudo que visa avaliar a compreensão

musical em diferentes modalidades de produção musical de estudantes de música

(composição, apreciação e performance).

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Resultados parciais deste estudo, afirmam que, devido à sua complexidade, a

atividade de performance (termo equivalente ao termo execução na abordagem de Mór),

parece ser o indicador menos apropriado sobre a compreensão musical dos alunos. A

performance envolve a técnica instrumental, e por isso, se o aluno não tiver um bom

domínio da técnica poderá ser avaliado aquém do que realmente compreende

musicalmente. Já as atividades de composição e de apreciação, onde a técnica

instrumental tem papel secundário, segundo esta autora, poderão indicar melhor o nível

de compreensão musical do aluno.

Uma vez colocada a questão da música como linguagem, podemos concluir que,

mesmo sem chegar a um consenso sobre o assunto, a linguagem metafórica nos ajuda a

falar sobre música, é fundamental para compreendermos o pensamento musical como

uma forma de pensamento simbólico, e que no processo de aprendizagem da música

estão implícitas as significações que o sujeito dá às suas experiências musicais.

2.2.3 Ontogênese e Filogênese Musical

Para a construção de uma teoria sobre cognição musical Beyer relacionou

primeiramente o desenvolvimento musical do sujeito e a evolução da história da música

ocidental, estabelecendo assim o que ela chamou de “paralelos da ontogênese com a

filogênese”46 musical.

O paralelismo entre ontogênese e filogênese já foi considerado por alguns

pesquisadores. Fernandes (1998) procurou verificar a existência de um paralelismo

entre a construção da escrita do ritmo pela criança e a evolução da escrita do ritmo na

história da música ocidental. Este autor diz que não se pode afirmar um paralelismo

integral, pois cada elemento musical deve ser analisado separadamente. Nem todos os

46 Beyer, 1988, op.cit., p.80-83.

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elementos da música evoluem em conjunto durante a história da música, e assim

também acontece no desenvolvimento humano.

No entanto, Fernandes concorda com a existência de um paralelismo parcial e,

uma vez estipulado, este serve de base para a estruturação de um programa de ensino

sobre tal fundamento.

2.2.4 Inatismo e interacionismo

O segundo passo eleito por Beyer (1988), para a construção de uma teoria

psicogenética em música, foi fazer uma crítica à visão inatista que prevalecia na

educação musical brasileira, questão já desenvolvida anteriormente neste trabalho.

Para Beyer, a teoria de educação musical deveria ser construída sobre o “fazer

musical, decorrente da necessidade epistemológica em que o sujeito se encontra”

(Beyer, 1988, p.84). Tal postura leva o educador a não encarar a música como privilégio

apenas para os talentosos, uma vez que qualquer sujeito normal pode aprender música,

desde que se interesse por ela. Considera-se, assim, que os conflitos cognitivos

provocados pela interação com o objeto musical desencadeiam o desenvolvimento

musical em qualquer sujeito.

2.2.5 Subjetividade e objetividade – função simbólica da música

O terceiro parâmetro estabelecido por Beyer (1988) foi dar ênfase aos processos

intelectuais ao invés dos processos afetivos. Embora, segundo Piaget, o afeto seja a

energia que motiva a ação, Beyer acredita que a hiper-valorização do aspecto afetivo

leva a prática educacional a desconsiderar o aspecto cognitivo, e a cair na armadilha da

subjetividade musical, que é individual e, portanto, impossível de ser generalizada.

Dessa forma, a autora defende a objetividade na abordagem do discurso musical para

fugir da impossibilidade de se avaliar práticas calcadas apenas no aspecto subjetivo da

música.

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Neste aspecto, nos parece paradoxal conceber a música como linguagem e ao

mesmo tempo, diminuir a ênfase no aspecto subjetivo da música. A objetividade em

educação musical proposta por Beyer (1988) pode esvaziar seu conceito de linguagem

musical, uma vez que o conceito de linguagem pressupõe um conteúdo significativo.

Lembramos que, embora estejamos estudando o comportamento de crianças

maiores (de 7;8 a 9 anos), a aquisição do pensamento simbólico em música acontecerá

dependendo da idade em que a criança tiver contato com este domínio.

No entanto, o conceito de música e dos seus elementos têm sido discutidos no

campo da estética musical. Questões levantadas por Nattiez (2005), Molino (2003) e

Lazzarin (2006) nos levam a pensar em como a falta de um posicionamento do

professor em relação ao conceito de música, pode levar as aulas de instrumento ao

distanciamento da música em favor de um adestramento predominantemente técnico

com finalidade, apenas, de colecionar repertório de compositores consagrados.

A hipótese aqui levantada é a de que o signo musical compartilhado por sujeitos

de uma determinada cultura, é também resultado de um processo de construção

individual, mesmo que este sujeito, como já dissemos, percorra um desenvolvimento

cognitivo comum a todos os seres humanos.

O pensamento piagetiano, já incorporado ao campo da educação musical através

de teorias como as de Beyer (1988) e Swanwick (1988), ilumina a criança como sujeito

epistêmico. Isto contribui para rever criticamente este campo partindo da relação do

aluno com a música através de um processo de construção interna.

2.2.6 Os Estágios de Desenvolvimento Musical

O quarto parâmetro eleito por Beyer (1988) se refere aos estágios sucessivos e

gradativos em complexidade. A autora descreve os estágios de desenvolvimento

musical a partir de hipóteses que ela levanta sobre as características cognitivas musicais

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em cada estágio do desenvolvimento, em parte confirmadas em sua revisão de literatura,

e em parte feitas através de suas inferências a partir da teoria piagetiana.

A seguir descreveremos o desenvolvimento do pensamento musical, obedecendo

a sequência dos estágios de desenvolvimento estabelecida por Jean Piaget, relacionando

esta com as reflexões de vários autores que estudaram a atividade mental de criança

durante seu desenvolvimento enquanto fazem música.

A partir desta revisão pretendemos analisar nossa amostra, tomando como

referência os conceitos da psicogenética adaptados ao pensamento musical durante o

desenvolvimento dos sujeitos.

2.2.6.1 Estágio Sensório-motor

Segundo Beyer (1988), a percepção auditiva, que é a mais primitiva de todas as

percepções, está se formando no período sensório-motor. A criança nessa fase exprime

no choro as necessidades a serem supridas. Inicialmente, a percepção é global e

indiferenciada. Formam-se os esquemas sensório-motores que engendram a formação

das noções, e mais tarde também, conceitos e outras estruturas.

Illari (2002) pesquisa a atividade musical de bebês e afirma que o bebê passa por

um processo de aculturação até completar dois anos de idade. Durante esse processo,

seus estudos comprovam que a criança de três dias reconhece a voz da mãe assim como

muitos outros sons que já ouvia durante o último trimestre de gravidez. Durante o

primeiro semestre de vida o bebê demonstra preferências por sons agudos. Com relação

ao timbre, os bebês preferem as vozes humanas aos sons de instrumentos musicais.

Mialaret (1990), autor que estudou a atividade musical espontânea de crianças

bem pequenas, discute a definição de que a música é “um bem do sonoro construído e

reconhecido por uma cultura” (Molino, 1975, p.53 apud Mialaret, 1990, p. 147), ao

constatar que as produções dessas crianças não podem ser analisadas tendo como

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referência um sistema musical fixado sócio-culturalmente. Segundo ele, há dificuldades

específicas para se estudar a significação destas produções. No entanto, o autor acredita

que a produção da criança nesta idade pode dizer muito sobre o processo psicológico

que envolve essas condutas musicais.

A realização deste ato [musical] espontâneo da criança implica relações entre seus componentes cinestésicos, visuais e auditivos; a especificidade da gênese e evolução desses três componentes podem ser estudadas e então analisadas em termos de processos psicológicos de relações entre o gesto sonoro e seu efeito. (Mialaret, 1990, p.147). Este autor considera que uma produção sonora é musical, e não apenas ruído, a

partir da intencionalidade da produção sonora por si, mesmo que inicialmente tenha

ocorrido por acaso. Esta conclusão é decorrente de uma afirmação de Wallon47, que

situa a origem do desenho na infância quando o traçado vem a ser o motivo do gesto,

mesmo que ele tenha começado acidentalmente, por acaso.

Preocupado em definir a origem do som produzido no instrumento como um

som musical, Mialaret afirma que, a partir do estabelecimento da relação causal gesto-

som para a criança, acontece a tomada de consciência do seu poder sobre o som. Esta

intencionalidade é percebida pelo autor quando o gesto pode ser repetido

sistematicamente. A partir desta aquisição, podemos dizer que há uma evolução no

desenvolvimento musical da criança.

Esta evolução é sugerida a partir da observação do processo de exploração

gráfica, feita por L.Luçart (1974, apud Mialaret, 1990), segundo o qual, em primeiro

lugar, há o nível motor, que é caracterizado pelo rabisco, “e se exprime sob a forma de

trocas motoras e de reabastecimento” (Mialaret, 1990, p.148). Em seguida, “o nível

perceptível, ou nível das associações visuais-cinestésicas, é detonado pelo exercício de

um controle visual e cinestésico. As descargas musculares transformam-se em

movimentos controlados e permitem o aparecimento dos arabescos” (L.Luçart, 1974, 47 As reflexões de Luçart (1974, apud Mialaret, 1990) a respeito do desenho espontâneo da criança pequena se apóiam sobre o trabalho de Wallon. Posteriormente, Mialaret parte da reflexão de Luçart para analisar, através dos conceitos piagetianos, a improvisação instrumental de uma criança ao metalofone.

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p.31 apud Mialaret, 1990, p.148). Finalmente chega-se ao “nível da representação

durante o qual a criança tornar-se-há capaz de reproduzir um modelo” (Mialaret, 1990,

p.148).

Ao comparar esse trabalho com o seu estudo sobre as produções sonoras,

Mialaret diz que a criança que explora instrumentos também passa por um processo

semelhante. Assim, este autor prevê encontrar as dimensões aleatória, parcialmente

organizada, e intencionalmente organizada na produção musical da amostra de sua

pesquisa composta de crianças de 2 a 6 anos.

2.2.6.1.1 Produções instrumentais sensório-motoras

A experiência de Florence, uma criança de 2 anos e 10 meses, é descrita por

Mialaret (1990). Ela explora um metalofone cromático com o uso de uma baqueta,

numa produção de 1 minuto e 27 segundos. São percebidos três momentos distintos: 1)

batidas sobre as placas; 2) varreduras com gestos horizontal e lateral; 3) reprise das

batidas.

Através da teoria piagetiana, Mialaret analisa o jogo que Florence faz ao

metalofone como um jogo intencional: o de fazer sons no instrumento. Certas

características deste jogo parecem corresponder às do 4º e também do 5º subestágio do

desenvolvimento da inteligência sensório-motora. Ele argumenta que quando a criança

se vê confrontada a uma experiência nova, ela utiliza esquemas familiares (pegar, bater,

esfregar, etc) para se adaptar à estrutura do instrumento, efetuando uma assimilação

generalizadora.

As notas produzidas por Florence não fazem parte de um discurso musical. Elas

se integram, segundo a análise de Mialaret, ao movimento exploratório global ligado à

topografia do teclado.

O desenvolvimento do gesto instrumental parece aqui, depreender da configuração espacial do instrumento, as regulações visuais-motoras parecem ocupar um lugar determinante na constelação das coordenações sensório-motoras do jogo de Florence. O som, produzido pelo

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gesto, é entendido, mas parece-nos, indiferenciado do conjunto perceptivo-motor; ele não provoca diretamente a organização dos gestos seguintes, exceto talvez quando certos sons são repetidos com insistência. (Mialaret, 1990, p.157). O que nos parece muito interessante, é que este autor analisa a experiência de

uma criança passando da fase sensório-motora para a pré-operatória, que ao usar um

instrumento musical, o faz através de uma abordagem sensório-motora. Ela se guia, não

por um sistema de sons, determinado pela cultura de seu ambiente mas, sim, por

coordenações motoras que não se separam da percepção sonora nem da estrutura física

do instrumento.

Acreditamos que tal experiência deve ser a base do fazer musical em qualquer

estágio do desenvolvimento do sujeito, uma vez que a inteligência sensório-motora não

deixa de existir, ela é integrada nos próximos estágios. Esta integração entre o

movimento do corpo, e o instrumento é fundamental para a fluência musical.

2.2.6.2 Período Pré-operatório

Segundo Beyer (1988), nessa fase há diferenciação gradativa na percepção que

vai se especificando segundo os órgãos dos sentidos. Já existem estruturas de

pensamentos capazes de captar mais profundamente as propriedades dos parâmetros do

som e formas novas de lidar com eles. As cognições motoras (abstrações empíricas) vão

sendo substituídas por representações (derivadas das abstrações pseudo-empíricas).

Neste período, portanto, a música é assimilada primeiramente por imagens, em

seguida por imagens símbolo, até que, com a consolidação da função simbólica, a

criança assimilará a música pela representação.

Irá primeiramente imitar sons, depois passagens principais da canção, em seguida as extremidades até adquirir a representação da música por inteiro. O jogo simbólico, incluindo a relação entre significante e significado, desenvolve-se neste período no que diz respeito a cada um dos parâmetros musicais. (Beyer, 1988, p.92). A descrição do desenvolvimento musical no período pré-operatório, segundo

Beyer, nos lembra a interpretação de Luçart (apud Mialaret, 1990) sobre o

desenvolvimento do desenho. Enquanto para Luçart, o nível da representação no

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desenho se manifesta pela capacidade de reprodução de um modelo, Beyer considera,

como manifestação do nível de representação musical, a capacidade de reproduzir uma

melodia.

Três pesquisadoras brasileiras desta década se propõem a mapear processos

mentais em música durante a passagem do período pré-operatório para o operatório

concreto, e fazem isso através de conceitos da teoria piagetiana: Deckert (2006),

Weiland (2006), Kebach (2003).

Deckert (2006) aborda a imitação como o ponto de partida para compreender o

pensamento musical da criança pré-operatória, pois esta é uma das duas formas de

manifestação da inteligência durante o desenvolvimento nesta fase, e que estão

intimamente ligadas à construção do pensamento simbólico: a Imitação e o Jogo.

Deckert (2006) escolhe crianças com cinco e sete anos de idade para identificar,

através de intervenções pedagógicas musicais, como se dá o processo de passagem da

imitação à representação nas condutas musicais dessas crianças.

As propostas de atividades da intervenção abordam atividades rítmicas através

de: 1) exploração de materiais 2) atividades imitativas; 3) representação pictórica; 4) a

representação musical convencional.

A pesquisadora justifica sua pesquisa através da relação constitutiva que a

função simbólica tem nos aspectos figurativos do pensamento. Esta forma utilizada pelo

sujeito para assimilar a realidade caracteriza-se como uma “cópia” do real, mas de um

real que é “construído pela criança através de suas ações.” (Deckert, 2006, p.8).

A autora explica que Piaget descreve três tipos de conhecimento figurativo: 1) a

percepção, que funciona exclusivamente na presença de um objeto e por meio de um

campo sensorial; 2) a imagem mental que funciona na ausência do objeto e por meio de

reprodução interiorizada; 3) a imitação no sentido amplo, pois abarca a imitação

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91

visual, gestual, fônica, gráfica, etc e funciona na presença ou ausência do objeto, mas

através da reprodução motora manifesta. (Deckert, 2006, p.9, grifos nossos).

Dada a décalage horizontal da atividade musical dentro do desenvolvimento, os

resultados da pesquisa de Deckert demonstraram que as crianças iniciam seu processo

de imitação musical no nível da imitação esporádica e, a partir deste nível, passam por

todos os sub-estágios da imitação, descritos por Piaget, até atingir a representação.

A autora observou que o resultado da imitação musical foi semelhante às

características de cada fase da imitação descritas por Piaget (1975a) nos dois grupos de

crianças, havendo diferença apenas na representação pictórica: as de cinco anos

representavam um som através de vários desenhos e as de sete anos representavam cada

som com um desenho.

Nas suas conclusões Deckert convenceu-se da importância do corpo ser o

“primeiro instrumento musical” das crianças, através do qual elas podem usar esquemas

de ações que já conhecem para realizarem imitações em música. Além desta conclusão,

a autora observou que quando há dificuldade na construção da noção de tempo pela

criança, isso afeta o seu nível de representação da música devido à sucessão dos sons no

tempo.

Weiland (2006) utiliza os conceitos de figuratividade e operatividade para

caracterizar as condutas musicais de seus alunos de flauta-doce, e conclui que quando a

criança se centra nos aspectos figurativos da atividade (aspecto físico do instrumento,

por exemplo) é porque é ainda egocêntrica, e usa uma inteligência pré-operatória. A

partir do momento que começa a se centrar na ação sobre o instrumento, através dos

constructos dos parâmetros sonoros, segundo esta autora, pode-se dizer que a criança

está operando sobre a ação. Esta evolução se dá pela reversibilidade do pensamento

operativo, prestes a se estabelecer neste estágio.

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92

Em suas conclusões, Weiland afirma que a flauta doce oferece ao aluno a

oportunidade de agir concretamente sobre a música, e através desta ação “integrar

conceitos teóricos e ampliá-los.” (Weiland, 2006, p.123). A autora avisa, no entanto,

que o ensino da flauta doce, assim como de qualquer outro instrumento, pode ficar

restrito a aspectos figurativos e que é preciso intervir propondo ações que os levem a

operar, analisar, estabelecer relações entre os dados sonoros que ouvem e a grafia.

Nós concordamos com Weiland (2006) sobre a necessidade de intervir para que

o aluno analise musicalmente sua ação sobre o tocar, e acreditamos ser possível o uso de

instrumentos musicais como um meio de aprendizagem ativa em escolas de música.

A dissertação de Kebach (2003) utiliza os conceitos piagetianos das abstrações,

procurando caracterizar as mudanças de conduta da criança em seu modo de

compreender a música. Segundo esta autora, as crianças costumam confundir os

parâmetros do som e, portanto, a primeira coisa a observar na estruturação do

pensamento musical da criança é sua capacidade de dissociar os parâmetros do som,

assim como sua capacidade de diferenciar e integrar “em novas totalidades as possíveis

modificações ocorridas em cada parâmetro.” (Kebach, 2003, p.99).

O conceito de abstração reflexionante em Piaget explica a assimilação de

qualidades dos objetos através da reflexão do sujeito sobre uma ação. Quando esta

abstração se dá apenas sobre as características materiais dos objetos, Piaget diz que

acontece a abstração empírica. Quando a abstração é tirada da ação exercida sobre os

objetos, é chamada abstração reflexionante, sendo esta uma característica do

pensamento que leva em conta dados não observáveis na realidade em questão.

É bom lembrar que nos níveis elementares do pensamento sensório-motor e pré-

operatório também ocorrem abstrações reflexionantes, mas elas não chegam a se tornar

conscientes.

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Ao adotar o conceito de abstração reflexionante, o objetivo de Kebach foi

investigar as ações e/ou representações cognitivas de crianças de 4 a 12 anos,

procurando caracterizá-las como pré-operatórias, intuitivas (nível pré-operatório que

prepara as operações concretas) e/ou ações e/ou conceitos operatórios, em função do

modo pelo qual estes sujeitos estruturavam os elementos básicos da linguagem musical,

ou seja, como eles diferenciavam o objeto musical através das abstrações feitas sobre os

parâmetros do som (altura, duração, intensidade e timbre).

Além disso, Kebach queria saber de que modo estes sujeitos conseguiam

integrar (ou não) esse conhecimento a seus esquemas de ação, generalizando a

aprendizagem feita sobre cada elemento abordado nas provas clínicas, especialmente

concebidas pela autora para esta pesquisa.

Após aplicar as provas, Kebach classificou as crianças segundo os níveis I, II e

III, de acordo com alguns critérios que apresentaremos a seguir:

As crianças do nível I são aquelas ainda autocentradas, e que explicam os

fenômenos pelas percepções ligadas ao seu próprio corpo. Seus esquemas de

assimilação são ainda muito restritos, e elas não conseguem adquirir a ampliação desses

esquemas de ação sobre o objeto musical. Mesmo em situações desafiantes, dão

respostas desvinculadas das questões em jogo, pois as propostas apresentadas não

chegam a ter significado para elas. Suas abstrações são empíricas, ou seja, as crianças

exploram o material sonoro através de ações automáticas e imediatas.

Kebach afirma que “os jogos complexos de diferenciações, seriações,

conservações, compensações e de inversões comportam coordenações que resultam da

abstração reflexionante.” (Kebach, 2003 p. 180, grifos nossos). Tais operações só

ocorrem plenamente no estágio operatório concreto.

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De acordo com a maneira como reagem às provas propostas, Kebach identifica a

média de idade de 7 anos e 9 meses como aquela em que as crianças começam a intuir

os problemas propostos sobre os parâmetros do som na música. A autora afirma que já

existe mudança de nível (nível II), no entanto, as respostas são consideradas ainda pré-

operatórias por não apresentarem a reversibilidade em sua totalidade. Isto é

evidenciado pelas explicações das crianças se darem pelas propriedades do objeto

musical e ou por relações não reversíveis.

Sobre o nível III, referente ao estágio operatório, Kebach diz que só então a

criança chega a equilibrar as acomodações e assimilações sobre o objeto musical,

agindo sobre abstrações pseudo-empíricas e/ou refletidas para explicar as

transformações do som na música.

Em sua pesquisa Kebach não separou os dois estágios de nível operatório

(concreto e formal), pois sua amostra era composta de crianças ainda não musicalizadas,

e estava em jogo “apenas seu pensamento espontâneo sobre a música, e não, o

construído através de uma instrução mais formal.”(Kebach, 2003, p.183). A média de

idade dos sujeitos operatórios ficou em 9 anos e 6 meses, o que significa uma

decalagem em relação aos estágios estudados nas provas piagetianas.

2.2.6.2.1 Produções instrumentais pré-operatórias

Ao tentar explorar os processos simbólicos que a música compartilha com outras

formas discursivas, Swanwick (1994) mostra que através da performance musical é

possível estabelecer uma conexão da música com os esquemas construídos para outras

atividades da vida por meio de metáforas.

Colocando-se no lugar de um aluno de violoncelo, Swanwick (1994) sugere

recorrer às metáforas para aprender novidades técnicas no instrumento, fazendo com

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95

que o aluno utilize seus próprios esquemas anteriores. Para entender, por exemplo,

como colocar os dedos na posição correta de segurar o arco, ele sugere que este aluno

faça um “plano de ação” através de esquemas corriqueiros:

Eu poderia por minha mão e braços num balde d’água ‘imaginário’, tirá-la, e sacudí-la para tirar as gotas – agora a mão e o braço estão livres e relaxados. Então – seguindo uma idéia de Phillis Young – imagino que estou segurando um morango bem macio entre o polegar e o indicador, e aplico este mesmo ‘plano’ ao arco. (Swanwick, 1994, p. 8).

Tais metáforas são mediações que auxiliam o aluno no processo de

aprendizagem. A interação nas práticas de conjunto numa escola de música pode

favorecer a multiplicação dessas metáforas. Numa primeira aula de violoncelo

Swanwick propõem que o aluno siga algumas instruções do livro para iniciantes do

instrumento, mas com o objetivo de realizar música desde a primeira aula, através de

atividades de criação e improvisação. Ele conclui:

Logo me tornarei um pianista que se especializou em estruturas vernaculares baseadas nas cordas soltas do violoncelo, estruturas essas que podem organizar a nossa maneira de fazer música. Elas incluem toques de “chamada” (com a trompa), tremolos dramáticos, divisões flutuantes da pulsação que nos levam à próxima mudança de corda. (Swanwick, 1994, p.12).

No exemplo acima, o professor conduz o aluno ao fazer técnico utilizando

apenas signos verbais conhecidos pelo aluno e que são usados simbolicamente para

sugerir ações no contexto da aula de violoncelo. A partir dos esquemas motores

subjacentes a estes símbolos, o aluno inicia uma construção endógena motivada por

uma equilibração majorante.

Quando um professor de instrumento sugere imagens elas facilitam tanto a

compreensão do aluno sobre os movimentos usados para fazer música, quanto para

provocar a construção de idéias musicais. Esta conduta do professor permite ao aluno

criar pontes entre o mundo real e o mundo simbólico que constituem a arte da música.

Em obra posterior, Swanwick (2003) insiste na idéia de uma didática musical

que ajude o aluno a integrar a música à vida estabelecendo relações entre as ações em

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música e seus esquemas anteriores por meio de metáforas. Ele explica que o processo

metafórico em música funciona em três níveis cumulativos:

1. “Quando escutamos notas como se fossem melodias, soando de formas expressivas”; [...] 2. “Quando escutamos essas formas expressivas assumirem novas relações como se tivessem ‘vida própria’”; [...] 3. “Quando essas novas formas parecem fundir-se com nossas experiências prévias, ou, para usar a frase de Suzane Langer, quando a música ‘informa a vida do sentimento’” (Langer, 1942: 243 apud Swanwick, 2003, p.23). A análise das atividades do projeto Tower Hamlets feita por Swanwick (2003)

nos interessa em especial, porque ela traz informações acerca do ensino de música

através de instrumentos de cordas. Com base nos três princípios de ação em educação

musical previstas no modelo C(L)A(S)P48, Swanwick avalia as atividades deste projeto

como o “resultado do desenvolvimento sistemático das habilidades técnicas e

auditivas”, com apelo ao controle dos materiais sonoros e à performance musical

expressiva e estruturada. Ele afirma que “a maioria dos eventos observados caiu nas

categorias de técnica ou de performance musical”.

Em sua análise, Swanwick observou que “existia um claro cuidado da música

como uma forma significativa de discurso – o primeiro princípio” (p.72), e que o

segundo princípio era também contemplado uma vez que “os alunos estavam

envolvidos em tomar suas próprias decisões, especialmente quando contribuíam com

idéias musicais, como improvisadores.”

Ao comentar a diversidade do material utilizado no projeto, Swanwick ressalta o

fato de a criança mais velha neste projeto ter 11 anos, lembrando que, segundo

pesquisas recentes, os sistemas de valores musicais se desenvolve com as idades e que,

48 As letras da sigla C(L)A(S)P representam (na língua inglêsa) os três modos principais de atividades em que verdadeiramente é possível conhecer música na concepção do Professor Keith Swanwick (da Inglaterra). Estes modos principais, Composition (C), Audition (A) e Performance (P), teriam então que estar presentes nas aulas de música, sempre apoiados por atividades ditas secundárias, embora importantes: Literature (L), e Skills (S) . Em português esta sigla foi traduzida pelas professoras Krüger e Hentschke (2003) como TECLA, T de Técnica Musical, E de Execução, C de Composição, L de Literatura, e A de apreciação.

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por isso, as crianças mais jovens aceitam uma variedade maior de idiomas musicais do

que os adolescentes.

Recapitulando as análises de atividades musicais de crianças no estágio pré-

operatório citadas neste tópico, concluímos ser possível interpretar a cognição musical

nesta fase por enfoques diferentes. O enfoque adotado por Kebach se pauta pela questão

epistemológica. Já o enfoque adotado por Swanwick, por exemplo, é marcado pela

questão estética e pedagógica.

Ao analisarmos tais abordagens do ponto de vista da construção do

conhecimento musical, tanto a preocupação com o modo como se explica a diferença

existente no comportamento cognitivo da criança no estágio pré-operatório e no

operatório concreto, quanto do ponto de vista metodológico usado para levar a criança a

se engajar no fazer musical, vemos que o reconhecimento de esquemas desenvolvidos

pelo sujeito anteriormente contribuem para a análise de situações de ensino formal de

música.

2.2.6.3 Estágio operatório-concreto:

A passagem de dominância da figuratividade para a dominância da

operatividade caracteriza a conduta da criança no período de transição entre o pré-

operatório e o operatório concreto, como vimos nas pesquisas aqui citadas. Portanto, a

partir do estágio operatório uma maior mobilidade do pensamento musical da criança ao

tocar seu instrumento é dada pelo aumento da sua capacidade de operar sobre suas

ações.

Segundo Beyer (1988), nessa fase, é possível o aprendizado da escrita musical,

embora a autora pense ser interessante que este processo comece pela criação de

códigos próprios da criança e, só se for necessário, se passe então para a aprendizagem

do símbolo musical convencional (notação convencional da música erudita).

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A notação musical convencional para se tocar um instrumento, exige uma

abstração complexa que envolve várias construções conceituais: da música em sua

totalidade, incluindo aí os parâmetros sonoros e as significações da linguagem musical,

bem como outros fatores, como a execução.

A leitura musical reduz a atividade musical aos parâmetros de duração e alturas,

enquanto que o seu fluxo, no sentido citado por Swanwick (2003), abrangeria um

amálgama difícil de ser decodificado somente através da leitura. Portanto,

compartilhamos o mesmo princípio que Gonçalves (1985), de que a leitura da notação

deve ser resultado da experiência musical e não condição para ela.

Partindo da análise desta autora sobre a construção didática do seu método de

ensino de piano “Educação Musical através do Teclado”, e da nossa revisão sobre a

psicologia da música, queremos generalizar a reflexão sobre abordagens pedagógicas

musicais no trabalho didático para vários instrumentos diferentes. Por isso,

concordamos com esta autora quando ela diz que, no início dos estudos, a ação sobre

instrumentos musicais deve passar por descobertas de novidades sobre a topografia do

instrumento, sobre as percepções auditiva e visual, além da criatividade.

Beyer diz que neste estágio, “subjacente à capacidade de alfabetização musical

encontram-se as estruturas cognitivas de seriação, classificação, relação e

conservação” e que para a formação gradativa do esquema de tonalidade são

mobilizadas as estruturas de seriação, classificação e relação. (Zenatti, 1967, p.22 apud

Beyer, 1988, p.93, grifos nossos). Estas estruturas, típicas do estágio operatório, foram

descritas no nosso primeiro capítulo.

No presente capítulo aprofundaremos o estudo dos Agrupamentos Básicos das

Operações Concretas, procurando construir categorias para a futura análise que faremos

no capítulo 4, sobre as ações dos alunos observados durante aulas do CFI EMVL.

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• Composição Aditiva de Classes

As duas capacidades inerentes ao agrupamento I: a composição e decomposição

de classes numa hierarquia, e a relação de inclusão de subclasses em classes superiores

a elas, como já vimos, vão se tornando mais eficientes nas crianças de nível operacional

concreto.

Sugerimos a hipótese de considerar a classificação de intensidades dos sons de

uma peça, ou, as durações da figuras rítmicas incluídas num ritmo, como exemplos de

composição de classes em música. A criança pode até realizar tarefas desse tipo

intuitivamente, mas deverá ter a capacidade de operar usando este agrupamento para

compartilhar socialmente tais informações.

• Adição Secundária de Classes

As classificações secundárias dentro de um mesmo grupo de objetos dispostos

numa hierarquia (agrupamento II) possibilitam à criança agrupar objetos de uma

coleção total (B), e em seguida classificar, dentro desta, as coleções de objetos A1 +

A1’, como também de objetos A2 + A2’, e assim por diante.

A classificação dos instrumentos através do timbre classificando-os em famílias

dentro de conjuntos musicais pode ser um exemplo de agrupamento II. Seriam as

escolhas de diferentes posições para realizar uma mesma nota, uma forma de

classificação por meio dos diferentes timbres que elas oferecem ao músico?

• Multiplicação Biunívoca de Classes

As correspondências termo a termo (agrupamento III), são aquelas em que a

criança relaciona elementos de um conjunto a elementos de outro conjunto, formando

um produto lógico de duas ou mais classes. O domínio dessas operações de

correspondência parece ocorrer no nível das operações concretas.

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Em música, podemos relacionar a classificação de frases de tamanhos idênticos,

ou frases compostas de alturas idênticas apresentando, no entanto, ritmos diferentes. A

criança pode ter que utilizar-se de tal agrupamento ao diferenciar frases em que várias

combinações rítmicas mantém o mesmo número de pulsações; ou quando frases com o

mesmo tamanho formam desenhos melódicos idênticos, mas que variam para alturas

diferentes (transposições).

• Adição de Relações Assimétricas (Seriação)

A operação de seriação, através da qual a criança relaciona os elementos através

de uma ordem crescente do menor para o maior ou vice-versa, pode ser identificada nas

relações transitivas assimétricas que formam séries tais como as de sons agrupados por

alturas diferentes (do mais grave para o mais agudo e vice-versa). Essas séries podem

formar escalas (por graus conjuntos) ou os arpejos (por intervalos maiores). No uso de

instrumentos, a relação que se estabelece entre os dedos de das mãos e a construção de

graus conjuntos sobre as teclas (piano) ou sobre as cordas (violino, violoncelo e violão),

podem ilustrar este tipo de operação durante a interação sujeito-instrumento-objeto

musical.

• Adição de Relações Simétricas

A propriedade de simetria pode ser observada nas relações intervalares

ascendentes sendo simétricas às descendentes. Por exemplo, uma quinta ascendente é

simétrica à uma quinta descendente.

Num outro nível, podemos identificar este agrupamento nas formas musicais, ao

percebermos a simetria do tamanho das frases, na distribuição de movimentos

melódicos que devem ser contrapostos por movimentos inversos em obras de muitos

períodos da história da música.

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• Multiplicação Biunívoca de Relações

A capacidade de construir séries assimétricas isoladas e estabelecer

correspondências entre elas pode ser requisitada na aprendizagem musical, quando as

crianças criam finais diferentes para uma mesma frase musical, por exemplo. Desta

forma exercitam relações entre séries de notas que apresentam finais diferentes, embora

apresentem semelhanças entre elas ao conservarem alguma característica da frase A

antes de transformar-se em frase A’.

O conceito de conservação, muito pesquisado por Piaget, nas mais variadas

noções, está presente em todos os agrupamentos. Ele tem sido explorado também em

pesquisas de cognição musical. Zimmerman (1990) exemplifica tal conceito pela

capacidade de conservação do compasso. Neste caso, a quantidade de tempos

permanece sempre igual, mas as durações dos sons dentro do ritmo variam. “A

reversibilidade do pensamento permite a um indivíduo buscar os tempos que o

compõem, conservar a métrica e compreender a sua função.” (Zimmermann, 1990, p.

28).

A seriação de estruturas musicais pode variar de acordo com algum parâmetro

sonoro, como, por exemplo, se tocamos a mesma frase musical repetidamente em

intensidades gradualmente mais suaves ou mais fortes, em andamento mais rápido ou

mais lento, além de outras relações assimétricas que possamos supor.

Até mesmo a identificação de um gênero musical, por exemplo, exige que o

sujeito identifique algum elemento que se conserva de uma música para outra: um ritmo

peculiar, uma levada, um início, um apoio métrico, etc.

• A Igualdade (ou Equivalência pura)

Neste agrupamento, a equivalência de dois objetos prevê, nesse caso, apenas a

igualdade em todos os aspectos.

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Na música encontramos a igualdade em qualquer repetição do som, de modo que

o reconhecimento de notas iguais, de durações iguais, de instrumentos iguais, e de

intensidades iguais, assim como de frases rítmico-melódicas iguais que possam ser

identificadas pela criança, pressupõe este agrupamento.

A construção do esquema de tonalidade, que como diz Beyer (1988), se dá no

estágio operatório concreto. Portanto, vale a pena explicarmos melhor o conceito de

harmonia e como ele é elaborado na mente humana.

O pensamento harmônico é um dos mais complexos em música. Spossobin

(2007) define harmonia como um grupo de consonâncias ou até mesmo consonâncias

isoladas que podem aprofundar e enriquecer a expressão da obra musical. Além deste

sentido, o autor concebe o termo harmonia como “o aprendizado da construção e

progressão de consonâncias”.

Chama-se consonância a combinação de algumas notas simultâneas. Consonâncias de três, quatro ou cinco sons, distintos em nome e altura, representam o acorde, se estes sons: a) estão dispostos em terças, b) ou podem ser dispostos em terças com mudança de posição de oitavas. (Spossobin, 1955, p.5).

Zenatti (1967 apud Beyer, 1988, p.71 e 72) explica que a hierarquia dos sons,

típica do sistema tonal, propicia aos indivíduos que são expostos ao tonalismo, a

formação do próprio esquema geral sobre as tonalidades.

Para verificar a aquisição destes esquemas foram feitos testes sobre cadências no

discurso musical e a percepção destas cadências em diversas idades. Duas faixas etárias

são usadas como parâmetro: de 6 a 8 anos quando se nota “um esquema apenas parcial

de tonalidade”, e de 11 a 13 anos, “que revelam uma aculturação semelhante à do

adulto” (Zenatti, 1967 apud Beyer, 1988, p. 72-73).

Na busca da seqüência evolutiva do sentimento de consonância, os

pesquisadores (Imberty, 1966, Teplov, Chailey, Frances, 1958, apud Beyer, 1988)

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chegaram ao consenso “de que na faixa de 6 a 8 anos a criança está indiferente à

harmonização e mais voltada à melodia, enquanto que dos 10 aos 12 anos já percebe

dissonância e consonância da harmonia subjacente à melodia.” (Beyer, 1988, p.73).

Do ponto de vista pedagógico, Costa Giomi (2001) lembra que testes de

inteligência musical tem demonstrado que devido à complexidade das operações

envolvidas na percepção harmônica, somente a partir do período operatório concreto

pode-se aprender formalmente conteúdos de harmonia.

Em contraponto a esta opinião, estudos mais recentes mostram que até o bebê

não é indiferente ao resultado de sons harmônicos. Illari (2002) diz que ao completar

um ano de vida, a criança distingue acordes consonantes e dissonantes preferindo, no

entanto, harmonias simples e consonantes. A pesquisa de Pecker (2009) comprovou que

a criança pré-operatória não é insensível aos aspectos harmônicos da música e que há

um percurso para a completa aquisição de esquemas de tonalidade possível de ser

identificado mas, por ser a harmonia uma “construção social”, há necessidade de

influência externa para a construção deste conhecimento.

Para trabalhar o ouvido harmônico das crianças, alguns autores sugerem que se

trabalhe ativamente com canções, levando a criança a tentar conservar a melodia através

de “manipulações” de seu material. São aconselhadas também atividades corporais que

façam analogias do movimento sonoro com o gesto, desenhos, atividades de perguntas e

respostas tonais, ou atividades propondo variações de elementos da melodia, que podem

levar a criança a desconstruir e reconstruir a melodia ao ponto de internalizá-la. Assim,

o sentido de resolução das tensões harmônicas será captado e a criança começará a

formar esquemas de tonalidade.

2.2.6.3.1 Produções instrumentais operatórias

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104

As pesquisas citadas demonstram que o pensamento musical no estágio

operatório concreto permite ao sujeito compreender e responder às propostas educativas

presentes em escolas de música através de uma atividade operatória. No entanto, ainda

precisamos estudar como isso é incorporado à atividade do estudante de música quando

está em ação, aprendendo a tocar seu instrumento.

Alguns trabalhos sobre métodos de ensino de instrumento são interessantes para

visualizarmos alguns objetivos presentes no trabalho formal desta prática pedagógica.

Embora a análise de métodos em geral não esteja dentro dos nossos objetivos,

gostaríamos de citar o trabalho de Lartigot (1999), que analisa alguns métodos de

instrumentos diferentes (piano, violino e clarineta) e afirma que eles indicam um

modelo de aprendizagem acumulativa. Este autor afirma que os criadores de métodos

decompõe as competências terminais do instrumentista – um conjunto que representa o

que eles devem ser capazes de fazer ao final de um primeiro ano de estudos, por

exemplo - em dificuldades intermediárias. Assim, os problemas técnicos, tais como

produção do som, leitura, e diferenças de estilo, são apresentados nos livros didáticos

em ordem - do mais simples ao mais complexo- alternadamente.

Fugindo da análise dos métodos em si, mas aproveitando algumas informações

colhidas nas observações da relação pedagógica de nossa população, podemos citar

alguns aspectos musicais desenvolvidos de forma operatória nos métodos utilizados

pelos professores.

• Harmonia

Já que no estágio operatório concreto podemos esperar que a criança já possa

construir o conceito de tonalidade, o exemplo do trabalho com instrumentos de teclado

traz a vantagem de a criança experimentar a simultaneidade dos sons tocados com uma

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só mão intervalos harmônicos ou tríades, que podem acompanhar melodias aprendidas

por imitação até mesmo com um dedo só.

Para crianças do período pré-operatório ou operatório concreto a proposta de

Gonçalves (1989) nos parece muito adequada. Ela apresenta em seu livro didático para

crianças “Educação Musical através do Teclado” o uso de mãos alternadas e depois

mãos juntas, trabalhando assim a sucessão e simultaneidade dos sons. Ao apresentar o

uso da mão em quintas vazias, posição que ela chama de arco, ela leva a criança a

vivenciar a base harmônica de canções que poderão ser tocadas por imitação, ou por

leitura de cifras, levando-a a experimentar as funções harmônicas enquanto toca. Estará,

no entanto, formando esquemas mentais de simultaneidade, de consonância e de tensões

musicais que se encadeiam nas seqüências harmônicas.

Apesar de não constar no livro, Gonçalves (1989) aconselha que se ensine à

criança o nome de cada arco pelo nome de sua nota mais grave. Isso a leva a vincular o

som do arco ao seu “espectro intervalar”, ou seja, aos sons que estão contidos nos

harmônicos da nota fundamental deste intervalo de quinta harmônica.

Mais tarde, a criança terá oportunidade de tomar consciência daquilo que faz

através de uma construção didática que preveja várias operações mentais prévias à

compreensão das regras da harmonia tonal.

Cordas

O trabalho com instrumentos de cordas parece ser bastante complexo, dada a

multiplicidade de coordenações motoras envolvidas na ação de tocar estes instrumentos.

O exemplo de Furth (1972) sobre a abordagem do pensamento musical com

fundamentação piagetiana, mostra algumas características diferentes e outras

semelhantes das apresentadas por Gonçalves no ensino do piano.

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No exemplo de aula de instrumentos de cordas, a importância dada à interação

entre as crianças na atividade de grupo nos parece fundamental para a motivação

inerente à aprendizagem. Outro aspecto importante é a solicitação que o professor faz

para que os alunos inventem combinações dos elementos musicais trabalhados, em

ações simples com as cordas soltas.

Às crianças de terceiro e quarto anos (provavelmente em torno dos 9 anos de

idade) o professor se apresenta tocando violino com acompanhamento de piano com a

intenção de estimulá-los a quererem imitá-lo.

Usando instrumentos de cordas (violinos e violoncelos) e estantes com partituras

desde o primeiro momento, o professor trabalha com 12 crianças numa sala.

Primeiramente, as crianças recebem instrução sobre como segurar o instrumento.

Depois, imitando o professor, tocam a corda “lá”, e seguem-no tocando juntos os

mesmos sons em pizzicati49

, numa pulsação quaternária. Em seguida o professor vai

modificando a partitura, apresentando as pausas para um grupo de instrumentos, e sons

para outro, o que modificava o resultado sonoro do conjunto.

“Juntos tocavam quatro compassos de quatro tempos. A notação estava bem

defronte a cada uma das cadeiras; a pauta, a armadura da clave, as barras de compasso,

as notas. Tudo era real, como numa execução real.” (Furth, 1972, p.204).

Em seguida o professor ia acrescentando outras dificuldades técnicas que

traziam novidades de execução, tais como, ao usar o arco, fazer as durações se

prolongarem ou, ao usar os dedos da mão esquerda, descobrir outros sons da escala.

Esta experiência teve muito sucesso entre as crianças e especialmente entre os

pais e professores que requisitavam o conjunto para tocar sempre.

49 Pizzicati é o plural de pizzicato, nome dado ao tipo de toque feito com os dedos da mão direita diretamente sobre as cordas, sem o uso do arco.

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Na análise de Furth, os elementos constantes de altura e as durações faziam com

que os alunos sentissem a pulsação, ou seja, fazia com que realizassem abstrações

empíricas do objeto musical. Quando o autor descreve a solicitação que o professor de

música fazia às crianças para que inventassem combinações diversas para os colegas

tocarem, em pizzicati, mostra a importância da experiência através da qual os sujeitos

abstraem pseudo-empiricamente as qualidades do objeto musical.

Discordamos do autor quando ele afirma que os elementos da partitura faziam

com que os alunos sentissem a pulsação. Acreditamos que, mais do que a representação

arbitrária da notação convencional, seria a imitação dos gestos propostos ao tocarem

música em conjunto que os levava a sentir o fenômeno da pulsação e a constituírem,

assim, uma medida de tempo reiterada. Assim, os alunos realizavam abstrações pseudo-

empíricas, sem a quais não poderiam assimilar as durações dos sons da melodia.

Sem entrar em diálogo com as crianças, mas expondo-as a situações nas quais

era possível realizarem abstrações empíricas, este professor havia feito um trabalho

inicial importante, mas, somente ao solicitar que as crianças propusessem formas de

execução diferentes da partitura, por meio da técnica dos instrumentos de cordas, o

professor estimulava a invenção e a tomada de consciência dos elementos rítmicos e

melódicos que estavam sendo utilizados.

Apesar de tais invenções provocarem antecipações, mobilizando a operatividade

do pensamento representativo, este professor poderia solicitar aos alunos tarefas práticas

seguidas de diálogos, que lhes levassem a tomadas de consciência da causalidade

implicada nos resultados sonoros de suas ações.

Talvez assim, estas crianças chegassem a realizar abstrações pseudo-empíricas e

reflexionantes, chegando à representação operatória subjacente aos seus atos. Mas se

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108

não houver um momento no qual as crianças possam verbalizar tais reflexões, não é

possível saber se elas têm ou não consciência destas implicações.

2.2.6.4 Estágio formal:

Com o pensamento hipotético dedutivo aumenta o número de possibilidades do

fazer musical.

a percepção musical que era analítica linear, passa a ser analítica estrutural, isto é, comporta explorações no sentido vertical direcional, além das já existentes no sentido horizontal bidirecional. Também o pensamento proposicional torna-se viável pela capacidade hipotético-dedutiva da cognição. (Beyer, 1988, p.93).

Em música o pensamento hipotético-dedutivo, pode ser observado por exemplo,

na produção de improvisações no sistema tonal, uma vez que para isso o músico tem

que utilizar “estruturas de operações combinatórias, de proporções, de probabilidade

e previsão”. (Beyer, 1988, p.94). Outro exemplo, seria o do pensamento harmônico, no

qual se processa a simultaneidade dos sons, e que, neste estágio, encontra-se numa nova

dimensão dada a ampliação da reversibilidade que caracteriza o pensamento formal.

Beyer exemplifica o pensamento proposicional em música com a adequada

relação entre antecedente e conseqüente em frases musicais, e afirma que a

improvisação melódica assim como a harmônica é muito facilitada pela consciência da

verticalidade existente na melodia, a partir da aquisição do esquema de tonalidade que

se dá neste estágio.

Um dos trabalhos que relaciona a psicogenética com a música trata de

musicalização de adultos. A construção do conhecimento musical tanto por crianças

como por adultos obedece, segundo Kebach (2008), as mesmas etapas, sendo que o

corpo serve de instrumento para as primeiras apropriações musicais, para, em seguida,

serem elaboradas pela capacidade de diferenciação e integração, possíveis graças aos

processos de reflexionamento e reflexão, e pela capacidade de cooperação nas

execuções e produções coletivas. “Ao contrário do que o senso comum imagina, os

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adultos, se lhes forem possibilitadas formas de interações musicais ricas e experiências

diversas, demonstrarão um progresso cognitivo em curto espaço de tempo, em relação à

sua musicalidade.” (Kebach, 2008, p.38-39).

2.3 Considerações Finais do Capítulo 2

Composto pela revisão da bibliografia sobre Psicologia da Música com enfoque

nas obras com referencial na Epistemologia Genética e no ensino de música em

ambientes formais de ensino de música, este capítulo visou ampliar nosso referencial

teórico para a construção de critérios de observação da amostra desta pesquisa.

Nosso trabalho buscou atualizar os princípios de Beyer (1988) para a construção

de uma teoria sobre cognição musical. Sua afirmação sobre a subordinação da

percepção frente à cognição nos levou a reinterpretar o papel e o conceito dos exercícios

de solfejo e ditado em aulas de “percepção” em escolas de música. Concebemos estas

atividades como momentos de reflexão sobre o fazer musical, que favorecem a

reversibilidade do pensamento, as conservações representativas, a classificação e a

inferência lógica.

Vimos que a complexidade da linguagem musical é superada mais facilmente

através de metáforas, que são constantemente usadas para falar sobre música e para

ensiná-la. Através de esquemas emprestados de outras experiências humanas, as

crianças constroem imagens mentais de seu fazer musical, e os professores devem se

valer disso para colaborar nesta construção.

Uma vez estabelecido o paralelismo parcial entre ontogênese e filogênese da

música através de pesquisas como a de Beyer (1988), Fernandes (1998), este

paralelismo vale, quando devidamente comprovado nos elementos estudados, como

base para a estruturação de programas de ensino.

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Reafirmamos que através de uma abordagem interacionista, todo ser humano

normal pode aprender música, desde que se interesse por ela. Discutimos também a

necessidade de se valorizar a objetividade do discurso musical e não sua subjetividade,

como uma questão ainda sem consenso, pois ao mesmo tempo que a criança deve se

valer de parâmetros objetivos da linguagem musical para aprendê-la, a significação

desta experiência, sendo subjetiva, dá sentido às metáforas que possibilitam o discurso

sobre música e sua interpretação.

Nesta pesquisa buscamos rever a literatura sobre trabalhos voltados para a

produção instrumental e também em atividades de apreciação, de crianças durante seu

período de desenvolvimento. Estas pesquisas mostram que o desenvolvimento musical

também se dá por estágios assim como em outros campos do conhecimento,

corroborando assim a pertinência de se considerar o sujeito epistêmico segundo o

descreve a Epistemologia Genética.

No estágio sensório-motor considera-se que a produção sonora é musical, e não

apenas ruído, a partir da intencionalidade do sujeito em determinados elementos da sua

produção sonora. Tal produção passa por um processo onde encontram-se as dimensões

aleatória, parcialmente organizada, e intencionalmente organizada. Ela não se guia por

um sistema de sons, determinado pela cultura de seu ambiente, mas sim por

coordenações motoras, que não se separam da percepção sonora nem da estrutura física

do instrumento.

No período pré-operatório temos a conquista da representação musical que

também passa por um processo: a música é assimilada primeiramente por imagens, em

seguida por imagens símbolo, até que, com a consolidação da função simbólica, a

criança assimilará a música pela representação.

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Encontramos esta evolução também nas produções instrumentais desta fase, uma

vez que a criança tem capacidade de passar da centração nos aspectos físicos de suas

ações sobre o instrumento (figuratividade) para a flexibilidade dos conceitos musicais

(operatividade).

Nesta revisão a pesquisa de Kebach (2003) estabelece a média de idade de

sujeitos pré-operatório como aquela em que as crianças começam a intuir os problemas

propostos sobre os parâmetros do som na música como a de 7 anos e 9 meses, e os

sujeitos operatórios na idade média de 9 anos e 6 meses, o que significa uma décalage

em relação aos estágios estudados nas provas piagetianas. No estágio operatório-

concreto, jogos complexos de diferenciações, seriações, conservações, compensações

e de inversões comportam coordenações que resultam de abstrações reflexionantes.

O estágio operatório formal foi menos rico em informações sobre produções

instrumentais, o que demonstra que é uma área que deve ser mais pesquisada, mas

encontramos o estudo sobre o pensamento harmônico desde Zenatti (1975 apud Beyer,

1988) alcançado plenamente neste estágio (de 11 a 13 anos) se apresentando já na forma

de uma aculturação semelhante à do adulto. Nesta revisão de literatura pudemos

levantar alguns relatos de atividades que trabalham o pensamento harmônico desde o

primeiro ano de estudo de instrumentos de teclado e de cordas.

Nossa pesquisa pretende contribuir com informações sobre o processo de

construção musical através de produções instrumentais no período do desenvolvimento

em que a criança já representa suas ações, ou seja, a partir do pré-operatório, atingindo

em seguida as operações concretas. Nada impede, no entanto, que possamos encontrar

crianças que apresentem condutas do estágio operatório formal, uma vez que as idades

são flexíveis neste modelo teórico.

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112

A reflexão sobre abordagens da música no trabalho didático para vários

instrumentos musicais passou pelas descobertas de novidades sobre a topografia do

instrumento, sobre as construções de representação relacionadas à percepção

cinestésica, auditiva e visual, decorrentes das atividades observadas em nossa amostra.

Esperamos que esta pesquisa contribua para avanço do conhecimento sobre o

pensamento musical da criança a partir das representações construídas durante suas

descobertas musicais através de instrumentos, e que possa trazer subsídios para o ensino

em escolas de música.

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Quadro 3. Relação dos conceitos sobre cognição musical presentes na bibliografia com os Estágios de Desenvolvimento de Piaget

ESTÁGIO ou

PERÍODO

Fonte

Eventos durante o desenvolvimento cognitivo-musical humano citados na bibliografia.

Beyer (1988)

A percepção auditiva é a mais primitiva - existe desde a vida intra-uterina – a ponto de o bebê ter capacidade de reconhecer a mãe pela voz ao nascer.

Bruscia (1991) No líquido amniótico os sons são vivenciados pelo feto como vibrações. A mais forte delas é a de seu próprio coração, que se relaciona com as do coração de sua mãe. A segunda vibração mais forte é a do cordão umbilical e a periodicidade desta vibração, vem a ser a “reminiscente das frases musicais.”(p.2). Alturas graves e agudas são distinguidas como vibrações lentas e rápidas. Assim, pulsação e altura são os dois elementos sonoros principais na vida intra-uterina.

Ilari (2002) “A partir dos 32ª semana de gestação o feto tem o sistema auditivo completo e escuta relativamente bem, ainda dentro do útero[...] O ambiente acústico uterino não é silencioso, mas sim, um universo sonoro rico e único, que proporciona ao bebê uma grande mistura de sons externos e internos”. (p.84) V

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Taylor (1997) As crianças são capazes de responder a barulhos altos (repentinos) 30 dias antes do seu nascimento. Beyer (1988) Neste período há formação de esquemas sensório-motores que serão os elementos básicos necessários para

o posterior fazer musical da criança. Formação da percepção auditiva, assim como outros órgãos dos sentidos. Percepção é global e indiferenciada. Elementos precursores de cada um dos parâmetros do som.

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Ilari (2002) Com três dias de vida o bebê reconhece a voz da mãe, reconhece histórias, rimas, parlendas e canções ouvidas durante o último trimestre de gravidez. Bebês expostos à música durante a gravidez exibem mudanças em batimentos cardíacos e movimentos corporais quando a mesma música é tocada após o nascimento. Estudos sugerem que o aprendizado musical pode começar quando o bebê ainda está no útero. Do terceiro trimestre de gravidez ao 3º. mês de vida pós-natal os bebes preferem sons mais agudos. Por volta dos 6 meses de vida pós-natal os bebês preferem sons mais agudos. Por volta dos dois anos de idade a audição dos bebês para sons agudos vai estar semelhante à de um adulto normal. O contorno melódico aparenta ser vital na percepção musical do bebê. Os bebês chegam ao mundo com uma capacidade de ouvir qualquer escala (tanto oriental, quanto ocidental...) capacidade que também pode se perder com a exposição à música de sua própria cultura. Antes de completar um ano de vida os bebes fazem distinções entre acordes

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consonantes e dissonantes e preferem os consonantes. Os bebês têm certa preferência por harmonias simples. Em relação à percepção de timbres, os bebês preferem as vozes humanas do que os timbres dos instrumentos. Os bebês de 8,5 meses conseguem distinguir entre duas versões de uma mesma obra complicada (ex: Ravel), tocadas por um piano ou uma orquestra. Os bebês demonstraram estar atentos às frases musicais, inclusive preferindo ouvir as frases musicais com pausas naturais àquelas com pausas artificiais. Antes mesmo de completar 1 ano de idade os bebês conseguem distinguir células rítmicas contrastantes e fórmulas de compasso distintas, habilidades que tendem a melhorar com o desenvolvimento. A memória musical de um bebê de 7 meses pode se estender por até três semanas. A música e a linguagem que frequentemente se confundem no início da vida, tornam-se completamente distintas quando as crianças aprendem a diferenciar o canto da fala.

Mialaret (1990) O Jogo da criança de 2 anos e 10 meses ao metalofone parece corresponder às do 4º e também do 5º subestágio do desenvolvimento da inteligência sensório-motora. Quando se vê confrontada a uma experiência nova, a criança utiliza esquemas familiares (pegar, bater, esfregar, etc) para se adaptar à estrutura do instrumento, efetuando uma assimilação generalizadora.

Moog (1976) Em estudo do canto espontâneo percebeu o uso de tons determinados combinados em padrões melódicos simples, sem o uso de palavras. Intervalos melódicos usados: (no início) segundas e terças maiores e menores. A partir do segundo ano: intervalos de 4ª., e 5ª. As pausas acontecem apenas pela necessidade de respiração. O ritmo é extremamente simples.

Taylor (1997) Por volta do 8º. dia, os bebês geralmente param de se alimentar quando escutam o barulho da campainha. Bebês de cinco meses mostraram, em estudos, um distúrbio nas batidas (ritmos) do coração, em forma de desaceleração, em resposta a mudanças de posição temporal de todas as notas de um padrão melódico. Bebês de 7 meses sentem distúrbio nas batidas do coração em resposta a alterações tanto no contorno melódico quanto no rítmico. Reações ao ritmo são mais fortes do que reações à melodia, entre crianças de 9 a 31 meses de idade. Bebês abaixo de 6 meses podem ser ensinados a combinar o som repetindo a altura que foi cantada para eles. No 2º. Ano as crianças começam a reconhecer melodias específicas que têm um significado no meio ambiente e a repetir certas canções e frases com contorno replicável e ritmo coerente, mas com relacionamentos que variam de altura e intervalo.

Sloboda (1985) A percepção auditiva é a mais primitiva de todas as percepções. Aos 18 meses surge o canto espontâneo dos bebês, comumente acompanhados de movimentos corporais não sincronizados com a música.

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Andress (1990) Jogo simbólico primeiramente centrado em si mesmo evoluindo para o jogo com um objeto substitutivo. Exercícios repetitivos pelo prazer de poder fazer. Pequenos instrumentos de percussão e espaços reduzidos favorecerão o jogo solitário e paralelo. Aos 3 anos: Jogo solitário, paralelo e associativo (por exemplo, de classificação de sinos). O jogo neste período inclui o uso de objetos representativos; de representação de papéis (por exemplo, papéis de personagens de canções); jogos coletivos com regras (em grupo numeroso, sentar-se junto aos outros, sentindo-se um indivíduo dentro do grupo); e imitação cada vez mais exata de modelos. Aos 4 anos: O jogo cooperativo predomina nesta idade. Acontece o começo da experimentação intelectual. Podem ordenar e classificar fontes sonoras. Podem criar e interpretar papéis dramáticos, e se adaptam cada vez melhor às atividades em grupos grandes para cantar juntos.

Lino (1998) É neste período que a imagem aural (imitação interiorizada de estímulos sonoros vivenciados) é conquistada quando o sujeito tem uma experiência significativa com a música.

Kebach (2003) A criança conceitua os parâmetros do som com 6 anos e 7 meses (em média). Dissocia e diferencia os parâmetros do som com 5 anos e 3 meses (em média). Diferencia os intervalos aos 7 anos (em média). Conserva a pulsação e generaliza as subdivisões de tempos com 5anos e 4 meses (em média). Conserva a duração de uma nota frente ao deslocamento de uma pausa com 5anos e 2 meses (em média).

Beyer(1988) Diferenciação gradativa da percepção. Estruturas do pensamento capazes de captar mais profundamente as propriedades dos parâmetros. Representação. Jogo simbólico (relação entre significado e significante). Operações unidirecionais. Manutenção do movimento entre percepção global e auditiva. Exige reflexão. Música assimilada por imagens, depois imagens-símbolo, e em seguida a representação (imitar sons). Reconhecer passagens principais da canção , depois as extremidades dela, e por ultimo a música por inteiro (domínio figurativo).

Moog (1976) Não reconhecem padrões rítmicos como música. Reconhecem música apenas como melodia. No canto espontâneo as crianças limitam-se a cantar intervalos melódicos de segundas e terças maiores e menores. A partir do segundo ano, experimentam quartas e quintas. As pausas ocorrem pela necessidade de respiração. Com três a quatro anos cantam canções mais longas, fazem repetições intencionais.

Taylor (1997) De três a cinco anos: consegue imitar a canção inteira. O Canto espontâneo vai desaparecendo enquanto aumenta o interesse em adquirir a precisão na imitação. Os movimentos corporais diminuem aos 4 anos e praticamente desaparecem aos cinco anos.

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Weiland (2006) Desde a conquista da função simbólica, considera-se que há o pensamento representativo, que possui o aspecto figurativo e operativo. O aspecto figurativo é relativo à percepção, à imitação e à imagem mental e

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116

tem papel preponderante no período pré-operatório. Já o aspecto operativo, que é relativo às transformações do objeto, é preponderante no período das operações concretas.

Sloboda (1985) O desenvolvimento musical ocorre de forma isolada em relação ao desenvolvimento da linguagem verbal. Zimmerman (1990)

A conservação só é possível quando há uma composição de variações quantitativas. Apresenta-se como compensação de relações ou uma composição aditiva de partes, por exemplo, a conservação do compasso. A reversibilidade permite ao indivíduo buscar os tempos que compõe o compasso, conservar a métrica e compreender a sua função. As identidades qualitativas, ao contrário, apresentam um tipo de identidade que está dissociada das qualidades variáveis. Por exemplo, um indivíduo pode abstrair idênticos esquemas de alturas com ritmos variáveis. A inteligência musical é uma estrutura organizada com base na percepção, da qual derivam os conceitos operativos musicais através de “transformações relacionais tais como transposição, modulação, inversão, aumento e diminuição”.

Andress (1990) Capacidade de pensar de maneira mais abstrata, formando conceitos. Paralela ao jogo de normas. Atividades de grupo podem seguir normas sociais, oferecendo maior possibilidade de se responder musicalmente à ação proposta. Por exemplo: canto coral, banda infantil, etc.

Beyer (1988) Passagem do domínio figurativo para o operativo na música, possível pela reversibilidade nas operações. Compreensão de seqüências de escalas e arpejos, etc. (seriação). Distinção entre a qualidade e a distância de intervalos, entre uma melodia ascendente ou descendente e também entre os valores musicais (classificação). Percepção do contraste entre parâmetros como, por exemplo, grave e agudo, forte e fraco, etc. (relação). Montagem e desmontagem de uma melodia pela análise de suas partes, com reconhecimento das relações entre as mesmas. Reconhecimento de uma mesma melodia executada com timbres diferentes (conservação).

Kebach (2003) Conceitua os parâmetros do som com 9 anos e 3 meses (em média). Dissocia e diferencia os parâmetros do som com 8 anos e meses (em média). Diferencia os intervalos e faz a seriação da escala temperada aos 9anos e 5 meses (em média). Conserva a pulsação e generaliza as subdivisões de tempos com 9anos e 5 meses (em média). Conserva a duração de uma nota frente ao deslocamento de uma pausa com 10anos e 4 meses (em média).

OP

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AT

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Taylor (1997) Conservação e reprodução de padrões rítmicos e melódicos. Percepção de mudanças de duração. Reconhecimento de uma mesma melodia executada em alturas diferentes. Reconhecimento de padrões rítmicos em melodias modificadas e também do ritmo invertido. Conservação da velocidade, seriação imediata e dupla seriação. Entre 7 e 8 anos, é possível a conservação da melodia e do ritmo.

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117

Zimmerman (1990)

O pensamento não está mais dominado pela percepção, o sujeito raciocina antes de agir musicalmente. Pela experiência vivenciada na aprendizagem musical seqüenciada, são formados conceitos relacionados aos elementos experimentados e também à própria melodia. O pensamento concreto operativo inicia seu desenvolvimento no pensamento, através de ações internalizadas.

Sloboda (1985) Este autor pesquisou a capacidade de organização sobre seqüências musicais: Notou progresso gradativo no julgamento de consonâncias e dissonâncias e pequenas modificações estruturais dos cinco anos à idade adulta, primeiramente quanto às dissonâncias e depois quanto à estrutura. Identificação de regras e estilos de extratos musicais: A partir de 6 anos dão respostas sobre os parâmetros do som; aos 8 anos usam metáforas para explicar o que percebem na estrutura da música; a partir dos 11 anos se apóiam na instrumentação, no caráter rítmico e textura; aos 14 anos - justificam suas repostas através dos estilos.

Beyer (1988) O pensamento hipotético-dedutivo possibilita abstrações ilimitadas. Assim, a percepção musical, até então analítica-linear passa a ser analítica-estrutural: o sujeito passa a demonstrar relações adequadas entre antecedente e conseqüente nos trechos musicais. Compreensão do conceito de tonalidade: pode improvisar musicalmente com consciência da tonalidade e harmonia envolvidas nesta atividade; a partir daí pode comparar harmonias e identificar formas, comparar formas e identificar estilos e, por conseqüência, compreenderá períodos históricos e teorias dos movimentos estéticos. O

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Andress (1990) O pensamento formal coincide com o final do desenvolvimento do jogo.

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118

CAPÍTULO 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

3.1 Contexto e participantes

3.1.1 População

A população deste estudo é composta por alunos e professores do Curso de

Formação Inicial da Escola de Música Villa-Lobos (CFI EMVL) na cidade do Rio de

Janeiro.

A escola estudada é subordinada à Secretaria de Cultura do Estado do Rio de

Janeiro, e possui um Curso Técnico, gratuito. A escola oferece também dois outros

cursos de nível básico, pagos pelos alunos, promovidos pela Associação de Amigos da

Escola de Música Villa-Lobos (AMAVILLA). Um deles - o Curso Básico - atende ao

ingresso de pessoas maiores de 13 anos, tem duração de 2 anos e meio; e o outro - o

Curso de Formação Inicial (CFI EMVL) – atende ao ingresso de crianças entre 6 e 12

anos de idade, e tem duração de 9 anos.

O CFI EMVL, curso a ser analisado nesta pesquisa, apresenta em sua grade

curricular duas aulas semanais obrigatórias em todos os anos do curso: uma de

instrumento, que pode ser individual ou em grupo de dois ou três alunos, e outra, de

Estruturação e Percepção Musical (EPEM), em grupos de 15 a 20 alunos. Além das

duas disciplinas obrigatórias, a criança deve freqüentar aulas semanais de percussão e

de prática vocal durante um ano do curso. As aulas de instrumentos que a escola

oferecia no período de coleta de dados eram de Teclados: Piano/Teclado, Cordas

Friccionadas: Violino/Violoncelo Cordas Dedilhadas: Violão/Cavaquinho/Guitarra,

Sopros: Flauta Doce/Flauta Transversal/Clarineta.

Tais aulas propiciam diferentes abordagens do conhecimento por parte dos

alunos e entre professores e alunos, e essas diferenças nos ofereceram a oportunidade de

observar vários tipos de ação musical dos sujeitos.

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119

Nas aulas de EPEM, por exemplo, os alunos se encontram numa sala onde o piso

é especialmente feito para que possam se movimentar livremente pelo espaço, sentar-se

no chão, deitar, etc. Por este motivo eles tiram os sapatos logo que entram. Nesta sala,

os alunos também usam cadeiras com braço para aprenderem a escrever a notação

musical. A sala tem um quadro negro que o professor usa constantemente para

representar os sons pela escrita.

O instrumento adotado pelo professor nas aulas é o piano, com o qual propõe

atividades de escuta e expressão musical através do uso da voz e do movimento

corporal. Além do piano, a sala contém vários instrumentos de percussão e entre eles,

embora não tenham sido utilizados durante as aulas observadas, alguns instrumentos

ORFF (xilofones e metalofones em vários registros).

Com a dupla experiência de aulas de EPEM e de instrumentos, os alunos têm a

oportunidade de refletir e transferir conhecimentos que constroem sobre música, de

modo a organizar os conteúdos de cada disciplina de acordo com suas necessidades no

uso dos instrumentos que escolhem individualmente (piano, violino, flauta, etc.).

As aulas de instrumento favorecem a ação musical através da produção sonora

nos instrumentos, obedecendo as regras da técnica de cada instrumento que os alunos

aprendem com instrumentistas experientes. Assim, as representações decorrentes das

ações nas aulas de EPEM precisam ser adaptadas ao aspecto motor do uso dos

instrumentos.

Apesar de não termos tido tempo nem espaço para descrever todas as atividades

que os alunos exercem na escola de música em questão, devemos considerar também

que depois de iniciados nos estudos musicais podem se submeter a uma avaliação para

conquistar uma vaga em conjuntos como o Coral Infantil, a Orquestra Infantil, a

Orquestra de Flautas ou a Orquestra de Percussão.

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O objetivo do nosso estudo foi observar como acontecia a integração entre as

ações realizadas pelos alunos nas aulas de EPEM e de instrumentos, a fim de conhecer o

processo de construção de suas representações musicais. Partimos da hipótese de que

nas aulas do CFI EMVL os alunos de diversos instrumentos representavam a música

como uma linguagem simbólica através das abstrações empíricas e pesudo-empíricas de

suas práticas, o que tornava possível a comunicação entre crianças e professores durante

o processo de ensino-aprendizagem em música. Mas o mais importante era que o

significado dado pelos sujeitos a estas ações, apesar de particulares, poderia trazer

generalizações importantes para a pedagogia em escolas de música.

3.1.2 A amostra

1. Selecionamos os sujeitos através das classes de primeiro ano de EPEM nas quais

a escolha do instrumento feita pelos alunos havia apresentado maior diversidade

de instrumentos.

2. Primeiramente foram escolhidas duas turmas de EPEM de uma mesma

professora: uma de manhã e outra à tarde, para que pudéssemos observar três

instrumentos de manhã (violão, violino e piano) e dois outros à tarde (violoncelo

e clarineta). Ambos os trabalhos (EPEM e instrumentos) foram observados

durante dois meses no primeiro semestre e dois meses no segundo semestre de

2009.

Apesar de termos coletado informações dos dois grupos escolhidos até o final do

ano, alguns problemas nos fizeram diminuir o número de sujeitos e de tempo de

observação na hora de analisar as amostras.

O primeiro problema foi o fato de o número de dados coletados ser incompatível

com o tempo disponível e o método de análise, que exigia a descrição e análise

de cada ação dos alunos durante todas as aulas.

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O segundo problema foi a necessidade de mudança de horário da aluna de

clarineta para outra turma de EPEM, logo no início do ano, e por isso, a

observação de suas aulas de EPEM se tornou inviável devido ao fato de estarmos

observando outra aula no seu novo horário.

O terceiro problema foi a substituição da professora de EPEM na turma da tarde

por outro professor, o que alterou a dinâmica da turma e a metodologia adotada

nestas aulas.

Por estes motivos, optamos por diminuir o número de dados, analisando apenas

as aulas do primeiro semestre (maio e junho) da turma da manhã, cujos alunos

tem entre 7;850 a 9 anos, e mantivemos apenas a aluna de violoncelo (11;8) da

turma da tarde.

3. Nas turmas de instrumento o número de alunos, em comparação com as turmas de

EPEM, é menor. Diferente da maioria das escolas de música onde o atendimento

ao aluno de instrumento é individual, nesta escola as aulas de instrumento são

em grupo de dois ou três alunos. Nem sempre a turma era composta somente

com alunos da turma EPEM 12 e estes alunos “extras” só foram citados quando

estavam envolvidos nas atividades com os alunos da amostra.

4. Dos dois grupos observados (A e B), somente o grupo A de EPEM foi analisado:

Grupo A: a turma denominada EPEM12 apresentava 15 crianças de 7;8 a 9 anos,

as aulas aconteciam no turno da manhã. Desta turma resultaram os seguintes

sub-grupos de instrumento:

A1 (violino): BEA (8;0 ), AGA(8;9 ).

A2 (piano): ISA (7;8 ) e JHEN (9;0)

A3 (violão): ISI (8;5).

50 Assim como faz Piaget na especificação das idades do sujeito, o primeiro algarismo se refere aos anos e o segundo aos meses. Neste caso, a criança tem 7 anos e 8 meses.

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122

Grupo B: da turma denominada EPEM16, cujas aulas foram observadas, mas

não foram analisadas, as aulas aconteciam no turno da tarde. Desta turma

resultou o seguinte sub-grupo de instrumento:

B1 (violoncelo): FRA (11;8)

Todos os alunos começaram os estudos na escola em 2009 e seus nomes não

serão divulgados para preservar suas identidades.

3.2 Procedimentos e instrumentos de coleta de dados

Por se tratar de um estudo de caso múltiplo, a coleta de dados teve três fases,

caracterizadas por Nisbet e Watt (apud Lüdke e André, 1996, p. 21), como: uma

primeira aberta ou exploratória, uma segunda mais sistemática em termos de coleta de

dados, e a terceira consistindo na análise e interpretação sistemática dos dados e na

elaboração do relatório. Estes autores alertam para a superposição destas fases, sendo

difícil precisá-las cronologicamente no projeto de pesquisa, e realmente, durante a

pesquisa de campo, tivemos que reestruturar alguns itens de cada uma das fases.

Na primeira fase, fizemos um levantamento das turmas de EPEM e dos

Instrumentos escolhidos pelos alunos destas. Escolhemos alguns horários que nos

permitiam observar os alunos nas duas aulas e iniciamos a observação, procurando

registrar em um bloco de anotações, quais os processos de ensino/aprendizagem

adotados, quais as atividades sensório-motoras trabalhadas e as representações que daí

poderiam ser construídas pelos alunos. Neste período procuramos levantar hipóteses

sobre os conceitos de aprendizagem estabelecidos, assim como procuramos aperfeiçoar

os instrumentos de coletas de dados para atender aos objetivos desta pesquisa.

Na segunda fase fizemos a coleta de dados propriamente dita, filmando as aulas

e registrando num bloco de notas as atividades que observamos.

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123

O método de observações clínicas utilizado por Piaget com crianças no estágio

sensório-motor, nos inspirou na formulação do nosso método de observação. Piaget

anotava cada ação da criança em protocolos sobre os quais refletia tendo como base

num vasto campo teórico. Assim, em nossas observações, levamos em conta as

atividades propostas pelos professores e as ações dos alunos: como respondiam às suas

solicitações, se compreendiam, se obtinham sucesso nas tarefas ou não e, se os

professores perguntavam alguma coisa, buscávamos entender o porquê das respostas

obtidas dos alunos.

Ao final das observações das aulas de instrumento e de EPEM, realizamos

entrevistas semi-estruturadas com os professores envolvidos, já que alguns aspectos

técnicos e musicais, por serem saberes particulares sobre cada instrumento, poderiam

passar despercebidos por nós nas observações clínicas.

Estes dados foram importantes para esclarecer o aspecto sensório-motor dos

processos observados e do caminho adotado pelos professores para dirigir a construção

de conceitos musicais pelos alunos. Em especial, foram importantes para conhecer as

abordagens que os professores faziam da questão da notação musical através dos

métodos de ensino adotados; e finalmente, embora sem muito aprofundamento,

procuramos conhecer a opinião dos professores sobre as características cognitivas de

seus alunos quanto às idades.

As questões das entrevistas, assim como os protocolos com as análises das aulas

estão anexadas no final da tese.

Na terceira fase da pesquisa, graças à oportunidade do recebimento de uma bolsa

de Estágio de Doutorado no Exterior com ônus Capes, tivemos a colaboração do co-

orientador, o professor Dr. Jean Marie Besse, que nos acolheu na Universidade Lumière

Lyon II, na cidade de Lyon na França, e nos permitiu ter acesso aos seminários do

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124

Laboratório de Pesquisa em Psicologia da Educação, onde apresentamos nosso projeto

de pesquisa e discutimos com os pesquisadores daquele centro de estudos.

Gostaríamos de destacar o grande privilégio que foi, por ocasião de nossa

estadia na França, podermos estudar sob a orientação do professor emérito Jean Marie

Dolle, um dos grandes nomes da Epistemologia Genética naquele país. A revisão de

literatura sobre este campo que havíamos começado a realizar no Brasil ganhou novo

enfoque após este contato com o professor Dolle, que nos instigou a rever nosso

primeiro capítulo da tese, aprofundando conceitos e aprimorando nossa capacidade de

analisar os dados.

3.3 Análise dos dados:

A partir dos quadros montados durante a coleta de dados (Anexos 1 a 6)

procuraremos verificar se as operações mentais que ocorrem no pensamento musical,

descritas na bibliografia, se confirmam nas atividades observadas nas aulas de EPEM e

de instrumentos. As condutas das crianças em aula foram analisadas com base na

Epistemologia Genética e a relação pedagógica estabelecida entre os professores e os

alunos foi analisada criticamente a partir das entrevistas e das aulas observadas.

Ao redigirmos o relatório final, tendo como base a revisão da literatura e a

Epistemologia Genética, definimos que as unidades de análise levarão em conta que na

interação sujeito-objeto, o pensamento representativo do sujeito se organiza por

meio das suas aquisições estruturo-funcionais sempre em dois momentos dialéticos:

primeiro figurativo, depois operativo; ou, operativo atualizado � figurativo

potencializado51.

51

Conforme já foi explicado no primeiro capítulo da tese (p.38 a 43), cada estado do objeto implica seu estado contrário e cada transformação implica também a transformação contrária. Assim, as relações interativas do sujeito com o real quando apresentam-se em dominância figurativa, potencializam uma possível dominância operativa que poderá ocorrer posteriormente.

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Lembramos que no sistema de construção hierárquica dos estágios de

desenvolvimento, as estruturas superiores integram as inferiores de modo que o aspecto

figurativo está sempre disponível, mesmo quando há dominância do aspecto operativo.

Portanto, mesmo que os aspectos figurativo e operativo tenham sido adotados como

guias de nossas análises, no momento de expor os exemplos das análises, nomearemos

as representações pelo espaço prático em evidência na ação do sujeito (representação

auditiva, cinestésicas, tátil, postural, vocal), mesmo sabendo que os outros espaços estão

integrados a este. Na exposição dos exemplos indicaremos, através das inferências

sobre as ações, o aspecto do pensamento representativo dominante na ação: figurativo

ou operativo.

Consideramos que o conhecimento adquirido através das atividades

desenvolvidas em aula chega a ser representado através da constituição de esquemas

motores a partir do contato dos espaços práticos do sujeito com o real. Assim,

partiremos da observação das seguintes ações geradoras de representações:

• Tátil – sobre a topografia do instrumento, das posições das mãos para o fazer

musical.

• Cinestésica - dos movimentos corporais usados para tocar – incluindo aí o

aspecto temporal destes movimentos.

• Auditiva - percepção da direção do som, da relação intervalar, do ritmo, das

texturas.

• Visual - da relação do som com o lugar em que é produzido no instrumento, da

topografia do instrumento e das notações mediadoras e tradicionais para

representar estas relações.

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Para redigir os protocolos e analisá-los foram utilizados os seguintes critérios:

• Ação: a atividade observada em aula e os objetivos que se mostram

evidenciados nestas atividades;

• Objeto Musical: a estrutura musical trabalhada em aula e considerada por nós

como objeto musical;

• Espaços Práticos utilizados pelos alunos: A identificação destes espaços foi

uma referência, a partir da qual pudemos inferir sobre o tipo de representação

decorrente da ação do aluno: tátil, a visual, auditiva, cinestésica ou postural.

• Inferências sobre a Representação Musical: descrição de conflitos cognitivos

dos sujeitos frente às ações solicitadas, inferências sobre operações necessárias

às ações musicais observadas, constatação de conservações musicais nos

resultados musicais observados, os espaços representativos coordenados pelo

sujeito no seu fazer musical, o funcionamento das estruturas lógico-matemáticas

(classificações e seriações) evidenciadas pelas respostas musicais dos sujeitos.

3.4 Cronograma

Devemos considerar como parte do cronograma da pesquisa, todo o estudo do

referencial teórico e a revisão de literatura que aconteceram desde o início de 2007 e tal

revisão se estendeu até o final da terceira fase. A pesquisa de campo, que consiste o

estudo de caso do CFI EMVL, foi dividida em três fases.

A primeira fase (exploratória) aconteceu nos meses de março e abril de 2009. A

segunda fase aconteceu no ano de 2009, através de duas coletas de dados: uma nos

meses de maio e junho e outra nos meses de novembro e dezembro de 2009.

A terceira fase transcorreu durante o ano letivo de 2010 sendo prorrogada até o

mês de agosto de 2011.

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CAPÍTULO 4 A INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO

NO PENSAMENTO MUSICAL. ANÁLISE DA RELAÇÀO PEDAGÓGICA NA ESCOLA DE MÚSICA VILLA-LOBOS

Este capítulo se baseia na reflexão sobre as informações colhidas nas entrevistas

com os professores e na análise das aulas que foram observadas na Escola de Música

Villa-Lobos. Esta reflexão visa integrar numa totalidade os percursos feitos pelos alunos

na construção de seus conhecimentos musicais, percursos estes que se constituem por

vezes através de processos figurativos, explicitamente perceptivos, ligados à ação real

do sujeito enquanto faz música, e por vezes através de processos operativos, num

movimento reflexionante das ações musicais para o plano representativo.

Nas atividades observadas, consideramos como verdadeiramente musicais

aquelas onde pudemos descrever atos de tocar (lendo e/ou improvisando), cantar,

compor, reger, com uma intenção expressiva do sujeito através de parâmetros sonoros.

A partir da experiência realizada por Miallaret (1990) citada no capítulo 2 (p.83),

confirmamos a idéia de que a intenção é a energia que promove um fazer musical

resultante da interação sujeito-objeto musical, ultrapassando as ações exploratórias

iniciais.

A partir da concepção de figuratividade do pensamento, podemos usar a

metáfora de “movimento” para explicar a representação auditiva. Assim, o

“movimento” do som, por ser simbólico, é um padrão usado pelo sujeito para

representar o resultado sonoro dos movimentos usados na técnica dos diferentes

instrumentos. No entanto, para construí-la, o sujeito passa antes pela aquisição de

esquemas motores específicos das técnicas de seu instrumento, que estarão sempre

disponíveis nos processos tanto figurativos quanto operativos do pensamento musical.

A necessidade de abstração do resultado audível da ação pode levar ao engano,

por parte do observador, de que as próprias ações do sujeito (relativas aos espaços táteis,

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128

visuais, cinestésicos, posturais, etc) ao tocar um instrumento não fazem parte da

constituição dos esquemas mentais construídos por ele durante seus fazeres musicais.

Como nos ensina a Epistemologia Genética, nossos esquemas sensório-motores são

conceitos práticos que nos informam sobre a totalidade de nossa interação com os

objetos e fenômenos.

Nas análises que exporemos neste capítulo procuramos responder se seria

possível conhecer as operações mentais envolvidas na técnica desses instrumentos e de

que forma elas ajudam a organizar a aprendizagem musical desses alunos.

4.1 A construção do conhecimento musical sob o ponto de vista da instrução

No contexto educacional que elegemos para nossa pesquisa, o CFI da EMVL,

observamos uma típica relação “estímulo-resposta”, onde o “estímulo” é a pedagogia

do professor e a resposta, aquilo que o aluno faz. No entanto, ao observarmos esta

relação sob a ótica da Epistemologia Genética, o que mais nos interessa é entender

como o aluno atualiza os conteúdos trabalhados, e avaliar se os processos utilizados por

ele são predominantemente figurativos ou operativos. É somente a partir deste

diagnóstico que se torna possível oferecer uma intervenção pedagógica adequada ao seu

nível cognitivo.

Quando nos propusemos a ouvir o relato dos professores de como organizam seu

trabalho com os alunos, tínhamos o interesse, primeiramente, de nos preparar melhor

para a análise da “observação clínica” da nossa amostra ao compreendermos melhor as

ações dos alunos e suas conseqüências no processo de assimilação-adaptação de

conteúdos musicais por meio do uso do corpo e de seus instrumentos.

A relação dos conteúdos com a técnica neste relato veio a se mostrar quase

impossível de dissociar. Falar em “conteúdos” com professores de instrumento é quase

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a mesma coisa que falar de técnica. Afinal, a técnica só serve para fazer música, e fazer

música com instrumentos esbarra na resistência do objeto “instrumento”.

Outro grande problema que se colocou foi que, estando num ambiente de ensino

formal, os métodos de ensino-aprendizagem de instrumentos são, a maioria deles,

organizados com base na leitura da notação musical convencional, pois existe a

expectativa de que estes alunos venham a dominar um repertório de obras de

compositores consagrados e que escreveram estas obras em partituras. Este objetivo das

instituições formais de ensino musical requer o desenvolvimento de uma adaptação da

leitura da notação à técnica do instrumento.

Na atitude de observador do nível dos alunos, o professor que se utiliza do

conhecimento da Epistemologia Genética pode diagnosticar o nível de desenvolvimento

dos alunos e adaptar os objetos ao nível de compreensão dos alunos. Assim recomenda

a pedagogia científica proposta por Dolle (2008).

Um observador experiente e avisado deveria então possuir a capacidade de revelar durante a atividade de seus alunos, tanto o estado atual da construção como o da construção em andamento. Porque o funcionamento indica os procedimentos de adaptação e de transformações estruturais em obra. (Dolle, 2008, p.185)52. Na maioria das vezes, no entanto, os professores de instrumento tem um

conhecimento intuitivo das diferenças que as crianças apresentam do ponto de vista

cognitivo em relação aos adultos. Em geral, a inteligência musical é confundida com o

talento ou com facilidade de assimilação auditiva ou motora que a criança apresenta.

Embora estejamos cientes da irredutibilidade das relações pedagógicas,

abordaremos, num primeiro momento, as concepções epistemológicas dos professores

de nossa população. A primeira parte deste capítulo enfoca, portanto, o ponto de vista

das intenções presentes na instrução.

52 Un observateur averti et expérimenté devrait ainsi posséder la capacité de déceler dans le fonctinnement de ses élèves autant l’état actuel de la construction que celui de la construction en cours. Car le fonctionement indique les precédures d’adaptation et de transformations structurales en oeuvre.

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Constituída pela análise das entrevistas feitas com os professores das aulas

observadas, a primeira parte deste capítulo é ordenada pelos instrumentos observados

tomando como referência o modo de execução53 destes instrumentos. Em nossa amostra

estes são classificados pelo agrupamento dos Cordofones - dedilhados (violão),

friccionados (violino e violoncelo) e de teclado (piano).

Num segundo momento, as “respostas” observadas através das ações dos alunos

em aula, vêm complementar nosso conjunto de dados, e nos ajudam a inferir sobre as

construções dos conhecimentos musicais dos alunos. Aí também exporemos os critérios

adotados para a análise daqueles dados acompanhados dos seus resultados.

4.1.1 Critérios usados para as análises das entrevistas com os professores

Embora os critérios escolhidos para a análise das entrevistas contemplem partes

integrantes da totalidade da suas atividades pedagógicas, fomos forçados a tratá-las em

separado para possibilitar nosso diálogo com os professores, e posteriormente a

descrição e a análise dos dados. As informações que procuramos colher nas entrevistas

serão expostas em quatro tópicos que explicaremos a seguir.

4.1.1.1 Seqüência dos Conteúdos Musicais

Este primeiro tópico propõe investigar se há intenção por parte do professor em

organizar uma seqüência cumulativa, ou não, dos conceitos musicais e dos saberes

técnicos do fazer instrumental com o objetivo de integrar a construção musical do

sujeito. Sob a intervenção do professor, podemos perceber em nossa descrição, um

fluxo de informações que caminha de fora para dentro, da música para o aluno, do

objeto (via professor) para o sujeito.

53 Segundo a Organologia, esta é apenas uma das referências, e muitos livros sobre os instrumentos de orquestra, classificam os instrumentos como sendo de “sopros” ou de “percussão”, etc. Embora esta premissa nos afaste um pouco dos princípios acústicos defendidos pelo sistema de classificação de Hornbostel e Sachs (1914), nosso interesse em explicar a formação de representações musicais do sujeito através do processo de adaptação sujeito-instrumento-objeto musical justifica tal organização.

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4.1.1.2 Relação da técnica com os Espaços Práticos

Este tópico diz respeito à interação corpo-instrumento. Ao abordar seu

instrumento, o sujeito é levado a adaptar-se a ele através de seus esquemas sensório-

motores. Acreditamos que este processo de adaptação interfere na construção de

esquemas mentais pelo sujeito durante as atividades propostas em aula.

Nas questões desenvolvidas neste bloco buscamos mapear quais espaços práticos

do aluno são solicitados por meio de determinadas atividades propostas pelo professor:

espaço visual, tátil, cinestésico, postural, vocal, bucal, auditivo, etc.

Estes espaços práticos formam aquilo que Dolle (2008b) chama de “sistema de

registro” do sujeito. Consideramos que é através destes espaços práticos que o sujeito

recebe as informações das propriedades dos estados do objeto musical e coordenando

suas ações e seus pensamentos imprime-lhe transformações. Desta forma assimila os

estados e as transformações do objeto adaptando seus esquemas sensório-motores.

Para estabelecermos comparações entre os processos de construção de imagens

mentais resultantes do fazer musical dos alunos de diferentes instrumentos, foi

necessário compararmos as descrições da técnica pelos professores para, identificando

detalhes deste processo, chegarmos às funções musicais dos movimentos e percepções.

Por exemplo, para cada instrumento aqui estudado, o uso das mãos indica funções

diferentes para cada uma delas tanto é que estas coordenações foram explicitadas várias

vezes pelos professores. Para facilitar a redação e a leitura deste relatório usaremos a

abreviação de Mão Esquerda e Mão Direita como ME e MD respectivamente.

Este tópico leva em conta o que Lartigot (1999) bem elucidou na análise de

alguns métodos de instrumento na França, onde ele chega a detectar o claro objetivo

destes métodos em economizar raciocínios nas referências práticas utilizadas pelos

instrumentistas no seu fazer musical.

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Esta análise esclarece o perfil do saber fazer dos aprendizes-instrumentistas postos para funcionar pelas análises do conteúdo dos métodos instrumentais, não é a capacidade de nomear os conceitos teóricos e de conduzir as operações intelectuais com a ajuda de conceitos mas a capacidade de lhes colocar em prática e de utilizar os pontos de referência psicomotores como ferramentas práticas permitindo ao aluno se estruturar – fazendo economia do raciocínio. É esta operação que os métodos instrumentais efetuam em nome da racionalização das aprendizagens instrumentais mas ao preço de uma desincretização e descontextualização completa dos saberes musicais54. (Lartigot, 1999, p. 141) Tais pontos de referência psicomotores que ajudam o aluno a estruturar suas

ações musicais, são aqui compreendidos, através do referencial piagetiano, como

esquemas motores a serviço do fazer musical.

4.1.1.3 A Notação e o Fazer Musical sobre a Topografia do Instrumento

Este tópico trata da interação do sujeito com a notação musical ao tocar um

instrumento. Representação arbitrária, socialmente constituída, o domínio da notação

pela leitura musical exige do instrumentista uma decodificação ligada ao fazer musical

no instrumento. Temos aí um sistema complexo que envolve a interação entre duas

organizações lógicas: a do funcionamento da técnica sobre a topografia do instrumento,

onde estão incluídos os esquemas motores e as imagens mentais criadas pelo sujeito a

partir da representação do fazer musical sobre o instrumento, e a interação deste

conjunto de dados com a organização da escrita musical.

Música Agudo

Técnica � Topografia do Instrumento Antes � Depois

Imagens Mentais Grave

Figura 7: Sistema interativo entre a Lógica do Fazer Musical e a Notação Musical

No esquema acima, procuramos representar o sistema complexo mediado pelo

professor onde, de um lado, temos a ação do aluno e do outro lado os eixos usados na 54 Cette analyse éclaire le profil du savoir-faire des apprenant-instrumentistes mis au jour par ler analyses du contenu des méthodes par les objetivs : ce qui est visé et qui se réalise dans les méthodes instrumentales, ce n’est pas la capacité de les mettre en pratique et à l’aide de ces concepts mais la capacité de les mettre en pratique et d’utiliser des points de repère psychomoteurs comme autant d’outils pratiques permettant à l’élève de se structurer - dans l’evolution de la maitrise de son instrument – en faisant l’économie du rasonnement. C’est cette opération que les méthodes instrumentales effectuent au nom de la rationalisation des apprentissagens instrumentaux mais au prix d’une désyncrétisation et décontextualization complétes des savoirs musicaux. (Lartigot, 1999, p.141).

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notação musical: vertical para as variações de alturas, e horizontal para a sucessão dos

sons no tempo.

Supõe-se que ao fazer música, o sujeito cria imagens mentais do seu fazer e estas

imagens são carregadas de um sentido topológico (continuidades e descontinuidades do

movimento sobre o espaço do instrumento). Por este motivo, as particularidades físicas

de cada instrumento são tratadas também neste tópico. Muitas vezes, para verbalizar

sobre esta interação complexa, os professores justificaram suas estratégias descrevendo

características físicas do instrumento.

Com base nas informações colhidas nas entrevistas e na bibliografia consultada,

construímos alguns desenhos da topografia dos instrumentos para procurar representar

através deles algumas referências utilizadas pelo instrumentista, ou mesmo, alguns

“trajetos” realizados por ele sobre o espaço do instrumento ao tocar.

4.1.1.4 As idades das crianças e a prática musical com instrumentos

Ao receber uma criança, o professor naturalmente se adapta ao nível cognitivo

deste aluno. Ele tenta se comunicar usando um vocabulário próprio para aquela relação

em que um é adulto e o outro não. Neste tópico procuramos saber se os professores

percebem dificuldades particulares às diferentes idades dos seus alunos referentes à

compreensão musical, ao desenvolvimento das habilidades almejadas por meio das

atividades propostas e de como lidam com estas diferenças.

4.1.2 A Fala dos Professores de Instrumento

Nas aulas, o funcionamento da técnica inicial dos instrumentos toma grande

parte das preocupações do professor, mas são vários os conteúdos musicais envolvidos

em sua atividade. Como levar o aluno a compreender e realizar a coordenação dos

parâmetros sonoros durante a sua execução e a chegar à tomada de consciência destes

elementos que estão sempre amalgamados no discurso musical?

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Os elementos envolvidos neste processo estão de tal forma imbricados, que ao

serem questionados sobre o tratamento que davam a um elemento durante a instrução,

muitas vezes os professores falavam de outro. O mesmo aconteceu quando procuramos

enquadrar suas respostas dentro dos critérios de análise.

4.1.2.1 Instrução em Violão

O professor de violão entrevistado diz que o gosto pela técnica do seu

instrumento veio do contato com o professor Sérgio Assad que lhe mostrou uma nova

maneira de estudar:

E aí ele me apresentou essa maneira de estudar, que é você perceber, isso é uma coisa (uma célula melódica), isso é outra (mostrando ao violão) e a conseqüência dos movimentos, ligados à análise musical. Então, essa percepção do caminhar motor, essa beleza plástica que são os dedos/bailarinos, você estudar os movimentos. Então, eu falei: ah, isso é música, legal. Era isso que eu queria aprender. (Professor de violão)

Este professor conta que para lecionar criou um método simples e conciso de

ensinar técnica e leitura baseado na análise musical das obras que o aluno toca. Os

interesses do aluno - que ele nomeia “a chama do querer” – é a base sobre a qual ele

monta o repertório do aluno e que de tempos em tempos vai atualizando de acordo com

as descobertas que o aluno faz do instrumento e da música em geral: “o mais importante

é essa chama e o prazer, você dar aula buscando o prazer nas pessoas, buscando que elas

sejam mais felizes na vida. E que se ela for um virtuose ou se ela vai tocar duas ou três

músicas muito bem, não importa.” (Professor de violão).

A. Sequência dos Conteúdos Musicais no violão

O trabalho do professor de violão é feito sempre a partir da notação musical. Ele

escreve algumas notas no caderno (durações e alturas), que o aluno pratica solfejando e

tocando no violão. No seu entender, a notação guia o pensamento do aluno e sua

percepção da ação: “associando, ele está vendo a altura também, está ouvindo aquilo

que ele está lendo”. Depois este trabalho de notação é aplicado num repertório adequado

aos conteúdos trabalhados tanto na leitura quanto na técnica.

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Somos levados a interpretar uma concepção de aprendizagem empirista

carregada de associacionismo nesta ação pedagógica. A transferência associacionista55,

contrária à concepção de Piaget, concebe os esquemas de assimilação como “meros

conjuntos de transferência associativa”.

Apesar de dizer que parte sempre da análise musical no trabalho com seus

alunos, o aspecto formal não parece ser relevante no programa de conteúdos deste

curso. Os parâmetros de intensidade, assim como as noções de fraseado não são citados

na fala deste professor enquanto ele discorre sobre as atividades que desenvolve com os

alunos em aula.

Nota-se que ele trabalha o uso da notação no violão pois cita, principalmente,

dois dos parâmetros sonoros dentro do seu programa de conteúdos: durações e alturas.

No parâmetro duração, vemos o trabalho com o tempo métrico, desde o início atrelado

à notação convencional da música erudita, como meio de manter a atenção do aluno ao

que é pedido na partitura. Nos exercícios escritos no caderno, o professor trabalha o

solfejo com ritmos de compassos simples, anacruse, contratempo e síncope, utilizando

também as subdivisões por quatro.

Eu começo com as figuras (mínima, semínima e colcheia) e pausas, escrevo, explico as unidades, aquela numeração toda de compasso [...] faço ritmos aonde eles escrevem esse mesmo ritmo pra semínima e transferem pras unidades de mínima e unidade de colcheia. [...] você já trabalha de cara com essa relatividade e com relação também matemática. (Professor de violão, grifos nossos). O parâmetro da altura aparece na dimensão melódica e harmônica do uso do

violão. Antes de tudo, o som de cada uma das cordas (mi-si-sol-ré-lá-mi) e a partir

deles, as notas da escala de Dó maior na primeira posição, e depois na segunda posição.

55 Montoya (2009, p. 39) relata que “a doutrina da transferência associativa interpreta que os esquemas adquiridos mais simples foram constituídos graças a uma sucessão de associações independentes. Assim, a criança contraiu o hábito de sugar a língua, o polegar, procurar o seio quando está em posição de mamar devido as seguintes razões: certas sensações dos lábios e da língua são regularmente precedidas pelos movimentos da última e, tendo esses movimentos acarretado sensações agradáveis de sucção, as primeiras sensações (contato da língua com os lábios) ter-se-iam convertido numa espécie de sinal que deflagra automaticamente os movimentos da língua e leva ao resultado desejável.”

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É sobre a base das notas da escala que algumas músicas são ensinadas, primeiro

melodicamente e em seguida, a harmonia que é tocada enquanto o aluno canta a

melodia que aprendeu. Os acordes ensinados são os básicos na tonalidade de Dó maior,

(Dó maior, Lá menor, Ré menor, Sol com sétima, Dó Maior) e em seguida na de Ré

maior.

Antes de eu dar essa escala, lógico, eu tenho que dar a seqüência, a afinação básica. Mi-si-sol-ré-lá-mi. [...] Até hoje eu não tive nenhum aluno que não aprendeu, em menos de dois minutos, três minutos mi-si-sol-ré-lá-mi. Aí eu brinco, mi-si-sol, ré-lá-mi, fala comigo. Aí eu fico brincando com as três primeiras pra ele falar o nome. Qual é a primeira? Mi. Segunda? Si. Até ele fixar. Depois eu boto a quarta e fico alternando as notas. (Professor de violão). O parâmetro timbre é vivenciado pelo aluno de violão através da ênfase que o

professor dá ao posicionamento das mãos do aluno para que ele consiga extrair um

timbre “agradável” durante a execução dos exercícios e peças do repertório musical.

Ela estava tocando com a mão direita entrando pelo braço, sai menos som, um som muito doce, extraímos diversos timbres conforme o posicionamento da mão direita, um som médio (mão na frente da boca do violão), som meio metálico (à direita da boca do violão) e som muito metálico (bem à direita da boca do violão). Temos essas nuances de timbre. Então, geralmente eu peço pra tocar em cima da boca do violão, nessa região aqui de um som mais alto, bem confortável. (Professor de violão) B. Os Espaços Práticos do sujeito na técnica para tocar o violão

O fato de o professor tomar a notação tradicional como referência geral para as

atividades, faz com que o espaço visual do aluno seja sobrecarregado. Segundo ele,

para colocar as mãos nos lugares corretos do instrumento, no início, o aluno tende a

olhar para a mão para saber se está acertando o lugar de tocar (principalmente para a

mão direita).

Visual: Deve-se trabalhar esta ação separadamente antes de juntar com a ação da mão esquerda. Quando há leitura de partitura, deve-se aproximar a partitura da região em que a mão esquerda atua, para facilitar o trânsito do olhar. Em resumo, precisa se desenvolver uma visão tripla, para a mão direita, a mão esquerda e a partitura. (Professor de violão, grifos nossos).

O espaço vocal é solicitado como apoio à concentração, pois para o professor de

violão, a leitura em voz alta evita que o aluno pense em outra coisa enquanto seus dedos

se movimentam.

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Espaço vocal: Eu peço sempre pra eles cantarem muito, lendo a partitura, falar o nome da nota, porque isso faz com que ele esteja aqui e agora e concentrado. Ao passo que, se ele não falar o nome da nota, se ele não cantar pra dentro, aí a cabeça fica muito vaga e ele perde a referência. (Professor de violão). Acreditamos que esta falta de concentração se deve aos conflitos cognitivos

derivados do aspecto figurativo do pensamento que precisa acompanhar cada ação (ler a

partitura, olhar a ação de uma mão, depois da outra) e não estabelece um plano anterior

que envolva a ação toda sobre a estrutura musical que está sendo trabalhada. Neste

sentido, a leitura adotada sem que o aluno tenha vivenciado antes a música com

fluência, acentua a particularização de cada ato dificultando a reversibilidade do

pensamento operatório.

A postura para acondicionar o violão ao corpo é baseada no uso das mãos, e

para que o sujeito tenha maior domínio da coordenação das duas mãos, o braço do

violão fica em diagonal ao tronco.

Postural: A postura, que é a postura clássica do violão onde ele vai formatar a mão dele, colocação de mão direita, de mão esquerda.[...] mas que coloca as mãos de uma forma que você tire bastante som e de uma forma relaxada. E a respiração, que vai dar [ao aluno] mais tranqüilidade tanto muscular quanto em termos de concentração. [...] Ele relaxa o ombro e apóia aqui [aponta para o cotovelo direito sobre a caixa de ressonância] essa mão serve [como] uma alavanca aqui, ela só faz esse movimento aqui [mostra o movimento do braço direito pra cima e pra baixo]. (Professor de violão). Para realizar uma melodia no violão, o sujeito deve tanger com a mão direita

alternadamente várias cordas. Os dedos da mão esquerda definem o comprimento destas

cordas, soltando ou pressionando pontos específicos delas, que vibram quando tangidas

pela mão direita. Esta coordenação, apesar de sincrônica, apresenta defasagens no

tempo porque a mão esquerda deve preparar o comprimento das cordas algumas frações

de segundos antes do ataque da mão direita.

Desta maneira, vemos que cada uma das mãos desempenha funções

predominantemente diferentes no que diz respeito aos parâmetros do som. No caso da

mão esquerda vemos uma predominância do controle do parâmetro das alturas, mesmo

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levando em conta que as mudanças de posição desta mão também são determinadas

pelo tempo de duração de cada som. Enquanto a mão esquerda se ocupa das alturas, a

mão direita é predominantemente responsável pelo ritmo (variação das durações durante

discurso musical), pela dinâmica (variação das intensidades durante o discurso musical)

mas também pelas alturas, já que varia constantemente a corda a ser tangida.

O professor de violão descreve a instrução sobre a técnica para mão direita, em

que o aluno deve trabalhar a coordenação da leitura com os movimentos dos dedos da

mão direita sobre as cordas. As iniciais dos nomes dos dedos são usadas para nomear os

dedos, como por exemplo, polegar, indicador, médio e anular (p, i, m, a) e são

acrescentados junto de cada nota da partitura (ou pelo menos no início de cada

exercício).

Se levarmos em conta que temos todos os parâmetros já atingidos pela mão

direita, podemos afirmar que a mão esquerda tem a função de ampliar a variação das

alturas e a tessitura, pois, se contássemos apenas com as alturas fixas das seis cordas, o

repertório do instrumento se tornaria muito limitado.

O espaço cinestésico referente aos movimentos mais amplos realizados pelo

sujeito é pouco solicitado no violão. Talvez a amplitude dos movimentos dos braços,

seja importante num outro estágio do desenvolvimento técnico do instrumentista.

Notamos, através da fala do professor, que é solicitada uma atenção especial ao espaço

tátil - referente ao toque dos dedos sobre as cordas. Esta atenção visa o

desenvolvimento de um controle motor bastante sutil para que o aluno seja capaz de

produzir um som de boa qualidade.

Tátil: A mão direita sobe aqui (coloca a mão direita sobre as cordas do violão), o polegar em “xis”, pra não atrapalhar essa pegada, ele forma um “xis” com o indicador. Essa é a postura clássica. [...] Então ele vai usar “i.m.” pra as escalas e os arpejos. [...] E também faço aquecimentos, dessa consciência aqui da mão, do caminhar da escala, o “i.m.” ou o “m.a.”, ficar andando numa corda só e aí já com os acentos métricos, já dou a pulsação com o acento métrico. [...]

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E depois andando nas cordas, fazendo quatro vezes em cada corda, ou três vezes. E depois, só com o polegar. Trabalhar só o polegar nesse movimento pra ter consciência dele, sem a preocupação da mão esquerda. Isso facilita muito. E depois, pequenos arpejos, arpejos simples, pra ter essa consciência. (Professor de violão). No trabalho para a mão esquerda o professor defende que a correta posição dos

dedos (com a ponta dos dedos “de frente” para as cordas) é condição para uma melhor

movimentação de todos os dedos, além de evitar que eles impeçam a corda de vibrar

livremente. O polegar atrás do braço do instrumento parece desempenhar uma função

equilibradora da posição geral da mão.

Postura da mão esquerda: E essa mão (esquerda), a entrada do dedo quatro reto, de maneira que os dedos fiquem de frente e que não encostem aqui no braço (aponta a parte de baixo do braço do violão). [...] E essa última falange aqui entra de frente pra corda. Entra de frente pra não encostar na corda de baixo. Pra não apagar e você ter todos os sons claros. [...] Se você for fazer isso aqui (toca todas as cordas de cima pra baixo) temos todos os sons claros, soando. Ao passo que, se você deita a mão aqui, você abafa algumas cordas. Então, é essa entrada aqui. [...] O polegar atrás aqui no meio do braço que é o que proporciona essa entrada de mão. É muito comum eles colocarem esse dedo aqui (e passa o polegar por cima do braço do violão). Então, isso aqui é um hábito muito ruim, porque abafa muito a nota. Aí ele perdeu o quarto dedo. Então, se ele botar o polegar aqui (escorrega para o meio do braço), os dedos entram de frente e eu ganho a ação do quarto dedo. (Professor de violão) Resta saber se o aluno atualiza este controle do som pelo seu próprio espaço

auditivo, ou se depende da fiscalização do professor neste sentido. Poderemos

responder a tal questão através da segunda parte deste capítulo onde analisaremos as

aulas e poderemos conhecer a realidade da prática pedagógica.

C. A Notação e o Fazer Musical sobre a Topografia do Violão

Segundo o professor de violão, o fato de o violão ser um instrumento de origem

popular, existem várias maneiras de se aprender a tocá-lo: por leitura (partitura, cifras,

tablatura) ou por ouvido e até mesmo usando uma notação das posições dos acordes no

braço do violão, tão comum em revistas de música popular vendidas em bancas de

jornal. Ele explica que aqueles “desenhos” representam o lugar sobre o qual os dedos

tocam no braço do violão. Estas posições variam dependendo do timbre que o estilo

pede.

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Pra dizer qual acorde que ele está pedindo ali, porque tem acordes que podem ser feitos em várias regiões do violão. Tem alguns que soam especialmente, em certa música, com arranjo feito para aquela sonoridade. (Professor de violão) O trabalho com tablatura, apesar de popular, é evitado pelo professor

entrevistado, mas ele reconhece que cedo ou tarde o violonista acaba conhecendo este

modo de notação, que foi muito utilizado na Idade Média e sobrevive ainda hoje.

Não uso porque eu acho que ela é tão mais fácil, mas ela não é mais completa. Então, ele fica ali e acaba que pode ser que ele se acostume àquilo ali e goste daquilo e fique ali. E poucas pessoas escrevem pra tablatura, você não tem pra tudo como é música. (Professor de violão).

No ensino dos instrumentos de cordas tais como o violão, o violino e o

violoncelo, existe a particularidade de usar-se o som da corda solta como referência. A

partir desta referência são construídas as outras alturas nestes instrumentos. A grafia dos

sons que tiverem que ser executados com a corda solta são acompanhados na partitura

pelo algarismo “0”. Os outros dedos da mão esquerda são denominados numericamente

(indicador-1, médio-2, anular-3, mínimo-4).

As seis cordas do violão, tensionadas e presas entre as cravelhas e o próprio

tampo, numa espécie de cavalete baixo, são numeradas em ordem crescente do agudo

para o grave mas, quando observadas pelo ouvinte e da maneira como o professor nos

mostrou, são localizadas de baixo para cima no instrumento, ou seja a corda mais aguda

fica em baixo e a mais grave fica em cima – usando eixos exatamente opostos aos eixos

que a notação tradicional propõe para a grafia das alturas!

Grave 6ª. Mi _____________________________________________________ 5ª. Lá _____________________________________________________ 4ª. Ré _____________________________________________________ 3ª. Sol ____________________________________________________ 2ª. Si _____________________________________________________ 1ª. Mi _____________________________________________________

Agudo Figura 8: Representação da ordenação das cordas no violão

É o início da escala no violão. Daqui partem as notas onde [sic] vão gerar as escalas de cada nota, a escala ascendente de cada nota, onde você vai encontrar as notas em cada uma das cordas. Então, são esses acordes básicos e a escala de Dó maior básica, tudo na primeira posição. (Professor de violão)

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A idéia de topologia na qual nos inspiramos para construirmos o conceito de

movimento musical parece ganhar mais coerência na fala deste professor. Se

observarmos com mais cuidado, ele se refere à corda solta como se ela fosse um “lugar”

de onde partem os outros sons da escala. Progressivamente, o aluno vai aprendendo

novos posicionamentos dos dedos sobre as cordas que, ao ser pressionada e tangida,

produz outras alturas.

Ao pedirmos para o professor que nos mostrasse graficamente os lugares

precisos onde os alunos tocam as primeiras notas neste instrumento, ele fez um desenho

das cordas e dos trastos do violão e colocou os números dos dedos da mão esquerda

sobre as diversas linhas que representavam as cordas. Este desenho mostrava o braço do

violão virado para o lado esquerdo exatamente como o vemos quando estamos de frente

para o instrumentista.

Apesar de nos mostrar as posições através de um desenho, este modo de

representar não é usado pelo professor com seus alunos. Para ensinar o aluno a tocar as

notas da escala de Dó Maior ele utiliza desde o início o pentagrama e a clave de sol.

Como podemos tocar um mesmo som em várias cordas diferentes, alguns números

indicam os dedos a serem usados, e são indícios da localização onde ele deve ser

tocado. Assim, se junto do Mi estiver o número dois, o aluno aprende que ele deve ser

tocado no 2º trasto da corda Ré, ou seja, na primeira posição.

Eles demoram duas ou três músicas pra associarem esse Mi com o dedo dois aqui, com qual o Mi que ele vai ler. Ele lê um Mi e, às vezes ele está até indicado com o dedo dois, mas eles ficam: qual o Mi? Com o tempo eles vão matando essa charada, que local é, e qual altura correspondente.

[...] Você pode tocar esse mi aqui (primeira corda solta), esse mi aqui (segunda corda, quinta casa), esse mi aqui (terceira corda, nona casa), o mesmo mi em regiões diferentes. Você pode fazer a mesma melodia mi-fá-sol, mi-fá-sol, mi-fá-sol (mostra nas três cordas) em regiões diferentes. Mas isso é mais tarde. No segundo ano ele começa a ler aqui [mostra a região mais à direta do braço]. (Professor de violão).

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Concluímos que durante o primeiro ano, o professor trabalha a constituição de

uma “impressão digital56” sobre a topografia do braço do violão, ensinando as notas da

escala de Dó maior na primeira posição. Este trabalho visa levar o aluno a adquirir

um esquema mental da seqüência de posições que servem de referência para tocar as

peças do seu repertório usando um espaço limitado do instrumento.

Tal uso do espaço instrumental é assimilado pelo aluno da mesma forma como

ele assimila o caminho de casa até a escola, ou da sua cama até o banheiro. É através da

constituição de relações de vizinhança entre os pontos de referência (cordas e trastos)

relacionados com as direções dos movimentos dos dedos sobre o espaço topológico do

instrumento que o sujeito constrói os trajetos que seus dedos percorrem durante o fazer

musical. Destes pontos de referência derivam os espaços projetivos e euclidianos que

especializam todas as relações espaciais envolvidas nas ações do sujeito sobre o

instrumento.

Os quadros que apresentamos logo a seguir servem para visualizarmos as

coordenações espaciais realizadas pelo instrumentista ao movimentar os dedos sobre

cada corda para tocar a escala de uma oitava em Dó maior na primeira e na segunda

posição do violão (primeira e segunda figura, respectivamente).

56 O termo “impressão digital” usado nesta frase tem o mesmo sentido usado por Lartigot (1999) no seu livro “L’aprenti d’instrumentiste”, (p.143) e é muito adequado como imagem mental da série de posicionamentos dos dedos das mãos dos instrumentistas. Ele também nos dá uma ótima imagem simbólica para pensarmos no instrumento como objeto sobre o qual o músico “imprime” estruturas musicais tais como escalas, arpejos, melodias, etc.

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Grave Ordem dos trastos

12º. 11º. 10º. 9º. 8º. 7º. 6º. 5º. 4º. 3º. 2º. 1º. Corda solta

Corda Mi 6ª.

Mi Ré Dó Si La Sol Fa Mi 0

Corda Lá 5ª.

Lá Sol Fá Mi Ré Dó 3

Si La 0

Corda Ré 4ª.

Do Si La Sol Fa 3

Mi 2

(Ré) 0

Corda Sol 3ª.

Sol Fá Mi Ré Do Si Lá 2

(Sol) 0

Corda Si 2ª.

Si Lá Sol Fá Mi Ré Dó 1

(Si) 0

Corda Mi 1ª.

Mi Ré Dó Si La Sol Fa Mi 0

Agudo Figura 9: representação das posições que o instrumentistas faz para tocar a escala de Dó maior na 1ª. posição.

Na segunda figura, foram deixadas algumas setas indicativas dos movimentos

feitos pela mão esquerda (na primeira posição) para demonstrar que alguns pontos são

comuns entre a primeira e a segunda posição, mesmo que o dedilhado seja diferente. É

importante ressaltar que, embora tenhamos indicado um movimento direcionado para

além da primeira casa (ou pestana) quando as notas devem ser executadas pela corda

solta, esta indicação é meramente simbólica, pois a mão esquerda, na verdade, fica em

modo de espera até que dedo pressione a corda em outra casa para fazer soar o som

seguinte.

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Ordem dos trastes

12ª. 11ª. 10ª. 9ª. 8ª. 7ª. 6ª. 5ª. 4ª. 3ª. 2ª. 1ª. Corda solta

Corda Mi 6ª.

Mi Ré Dó Si La Sol Fa Mi 0

Corda Lá 5ª.

Lá Sol Fá Mi Ré 4

Dó 2

Si La 0

Corda Re 4ª.

Do Si La Sol 4

Fa 2

Mi 1

(Ré) 0

Corda Sol 3ª.

Sol Fá Mi Ré Dó 4

Si 3

Lá 1

(Sol) 0

Corda Si 2ª.

Si Lá Sol Fá Mi Ré Dó 1

(Si) 0

Corda Mi 1ª.

Mi Ré Dó Si La Sol Fa Mi 0

Figura 10: Escala de Dó maior – 2ª. posição D. As idades das crianças e a prática musical com o Violão

O professor diz que crianças muito pequenas deveriam aprender música de outra

maneira antes de abordar o violão, pois este é um instrumento incômodo para elas. Ele

indica a idade de sete ou oito anos, sendo que a partir dos nove anos é a idade ideal para

iniciar a prática musical através do violão. Segundo sua opinião, a criança nesta idade já

tem mais autonomia para se dedicar ao instrumento.

Fazendo restrições a iniciar crianças menores do que sete anos, pela falta de

concentração das crianças desta faixa etária, o professor de violão afirma no entanto,

que, o mais importante ao se levar em conta as diferentes idades do aluno é “a maneira

de passar os conteúdos e não o que está se dando”.

Ao trabalhar com crianças de sete ou oito anos, nas quais a parte motora ainda

não está desenvolvida, o professor se preocupa em ajudá-las a estruturar as mãos

tecnicamente, pois são, em geral, muito pequenas, e se ressentem pela resistência das

cordas (no início, até a criança adquirir um mínimo de técnica, as cordas do violão

chegam a machucar seus dedos).

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Apesar de que, nesta fase é preciso fazer um trabalho que exige muita paciência,

baseado no uso de escalas e melodias simples, o professor ensina sempre algum

“rockzinho”, estilo musical com o qual as crianças nesta idade costumam se identificar,

para estimular seu interesse e levá-los a praticar com mais vontade. Este material tem

também uma finalidade técnica - trabalhar a posição da mão em que ela usa inclusive o

quarto dedo.

4.1.2.2 Instrução em Violino

A. Sequência dos Conteúdos Musicais no Violino

A professora de violino afirma que existe uma seqüência dos conteúdos musicais

que ela costuma utilizar, mas ela parte dos conhecimentos prévios dos alunos para

introduzir estes conteúdos em suas aulas. Ela inicia o trabalho solicitando aos alunos o

reconhecimento da pulsação e das durações em melodias que eles já conhecem, e

ensina-os a tocar no violino as músicas que eles já conhecem fora dele. Cada música é

um meio para descobertas de novos movimentos usados para tocar.

A professora relata que, em contrapartida, alguns alunos têm procurado inventar

músicas com os recursos técnicos que adquirem nas aulas. Por exemplo, uma de suas

alunas inventou músicas usando sons longos (arco inteiro), sons curtos (meio arco).

Assim, procurando estimular seus alunos a sentirem o prazer de tocar

relacionando o bom resultado sonoro ao conforto de uma boa posição a professora

favorece o apuro técnico e, ao mesmo tempo, o desenvolvimento do gosto pela música.

Do ponto de vista dos parâmetros sonoros trabalhados nas atividades iniciais

propostas pela professora, percebemos a predominância das alturas e durações, mas

esta escolha tem relação direta com a construção da técnica da mão direita (com ou sem

uso do arco).

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As durações são trabalhadas primeiramente com sons curtos e longos, associados

aos movimentos do ante-braço ou braço inteiro, usando a metade superior do arco para

sons curtos e o arco inteiro para os sons longos. Já para as alturas, a professora utiliza

como referência a ordenação dos sons da escala do Dó Maior.

Percebemos que, assim como nas aulas de violão, a escala maior é a estrutura

sobre o qual as atividades técnicas ganham uma consistência musical e é através dela

que a operações mentais dos alunos são solicitadas.

Eu não peço pra que eles decorem, eu peço pra que eles contem. Ouve o som (canta uma nota), ouve assim (canta um intervalo de segunda maior ascendente), é a próxima? Pulou? Foi (canta uma quinta justa ascendente). Tenta contar. Então, pra ir repetindo a escala, que eles contem na escala. Eu não ligo pra que eles decorem nota porque a conseqüência óbvia é que a gente repete tanto que eles acabam decorando. Então, pra que eles, no início, eles não deixem de fazer essa associação da seqüência dos graus conjuntos. Então, no início cantamos muito a escala (canta a escala maior ascendente e descendente), várias vezes. Aí eu peço pra que eles durmam cantando cinco vezes subindo a escala, primeiro ascendente, depois descendente... (Professora de violino, grifo nosso). Na verdade, o que a professora chama de associação é a relação. Trata-se da

construção da relação entre as notas do intervalo melódico. A estrutura tonal é de tal

maneira pré-existente nesta abordagem, que não existe a possibilidade de o aluno

explorar livremente seu instrumento. Antes que a escala tonal tenha sido construída

auditivamente pela criança nenhuma atividade verdadeiramente musical é realizada por

ela. Daí a necessidade de dar todas as ferramentas de informação do sistema: audição e

nomeação das notas através do canto, localização dos dedos para sua produção no

violino e a notação convencional.

Temos aí uma conduta empirista associacionista, que relega para segundo plano

a atividade estruturante do sujeito. Assim, ao pensar nos sons que faz no violino, a

criança não constrói por si mesma as possibilidades sonoras do instrumento, mas sim, a

relação sonora sinalizada pela professora: Dó, Ré, Mi, ...

Após a ordenação das notas nas linhas e espaços, formando a escala, a relação de

proximidade entre os sons é identificada através da diferenciação de tons e semitons,

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estes sendo elementos formadores dos conjuntos de cinco sons (pentacorde) que as

crianças praticam nas quatro cordas.

Com as quatro [cordas], mas aprendendo por seqüência. Por exemplo, sempre como espelho. O que eles sabem tocar na corda Lá, eles repetem exatamente a mesma melodia na corda Ré, exatamente na corda Mi e exatamente na corda Sol. (Professora de violino). A forma para realizar os quatro sons que completam o pentacorde acaba se

constituindo como o elemento de identidade da escala diatônica maior. Com esta fôrma,

a criança consegue tocar nas quatro cordas na primeira posição (parte do braço que fica

mais próximo das cravelhas do violino). É um esquema sensório-motor de que se utiliza

a criança para praticar as alturas.

Para a professora de violino ao adaptar a mão esquerda no braço de instrumento,

o ato de apoiar o dedo indicador no lugar certo, e somente então acrescentar os outros

dedos, facilita a aprendizagem do aluno. Se pensarmos no som que a criança toca com

esta posição na corda Lá, seria como se ela tocasse a partir do “Si” apoiando a mão no

primeiro dedo para poder mover os outros apoiados sempre no si. (Lá) Si-Do-Ré-Mi; ou

apoiando todos os dedos e ir tirando

Eu estou começando sempre de uma seqüência em que a mão (esquerda) está apoiada. [...] Antigamente, eu começava com a mão que estava no ar e depois ia baixando os dedos. Mas o problema é que esse abaixar ia pra qualquer lugar. Então, agora, a seqüência, eu já começo com este dedo (indicador) definido. Todas as outras vão afinadas. [...] E partindo muito do mi também, do quarto dedo. É bem fácil tirar [os dedos] do que colocar. [...](Professora de violino) O repertório é montado para que os alunos vivenciem os cinco sons iniciais da

escala nas quatro cordas tomando o cuidado de partir de notas em que a criança usa um

dedo como referência para a colocação dos outros dedos, ou seja, o segundo grau da

escala. Vemos que a afinação exata das alturas é privilegiada em detrimento da noção

de nota fundamental, já que a corda solta seria a base da estrutura do pentacórdio. Com

base em sua experiência com as dificuldades que as crianças apresentam na questão da

afinação do instrumento, a professora criou um método que parece facilitar a difícil

construção na criança.

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Então, agora, a seqüência das músicas que eles estão tocando sempre começando com o primeiro dedo e essa seqüência que eu fico repetindo várias vezes até que eles tenham essa facilidade de abaixar um dedo depois do outro [...]

Todos os exercícios que a Ana Clara [aluna] inventou, esses que eu falei pra você, [são] sempre partindo do mi tirando até o si e colocando de novo, tirando até o si e colocando de novo. Então, como a mão está pertinho e não sai da forma, fica fácil. Aí, se faz muito exercício com isso, e quando você vê, já está mexendo rapidamente todos os cinco dedos. Mas sempre com o si colocado. Si, dó, ré, mi (mostra dedo um, dois, três e quatro). Tirando e colocando, mas sempre com um apoio. (Professora de violino)

Como podemos perceber, os conteúdos programados pela professora criam um

amálgama de estruturas musicais e estruturas técnicas do instrumento que possibilitam

que os alunos façam música e, através dessa vivência, possam estruturar os elementos

da escala maior como uma ordenação dos graus conjuntos, nas quais existem diferenças

de relações intervalares de tons e semitons; ao mesmo tempo, a posição dos dedos da

mão esquerda sobre as cordas, afinação precisa, e duração sentida pelos movimentos do

arco e pelo colocar e tirar dos dedos das cordas, tudo assimilado pelo aluno como partes

integrantes do seu conhecimento musical.

Porque todas as melodias que eu estou ensinando pra eles agora, têm esse primeiro conjunto de movimentos que são os quatro dedos. Então, todas as melodias, aquelas que elas tocam, a do Beethoven, a Ode à Alegria, o Frère Jacques, Trenzinho do Caipira. Todas essas melodias têm apenas cinco notas. Aí, eles podem tocar em qualquer nota e eles vão conhecendo a densidade das outras cordas que é mais grossa, mais fina e tem mais pressão ou menos pressão. Então, eles conhecem as outras cordas por espelho, ainda. [...] joga pra outra corda exatamente a mesma coisa. C. Os Espaços Práticos do sujeito na técnica para tocar o Violino

O trabalho técnico no violino depende em grande parte da aceitação do

instrumento pelo aluno. Por isso o trabalho desta professora com o espaço postural do

aluno é muito cuidadoso e, ao mesmo tempo, ela não se excede no tempo de solicitação

da atenção do aluno para este aspecto.

No início, as aulas não são longas e há grande variação de atividades curtas onde

os espaços práticos são equilibradamente solicitados. Segundo esta professora, a posição

correta da cabeça em relação ao violino é primordial.

É, eu dou uma organização simples para que fique claro e fácil. A número um é a colocação da cabeça no violino. Dois: a direção para a qual a cabeça fica virada; e três: a inclinação da cabeça no violino. Essa é a primeira coisa. Inclusive, fazemos vários exercícios. Então, esse é um

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primeiro conteúdo.[...] No início, é muito difícil ficar muito tempo com o violino na posição. Então, eles tocam três, cinco minutos e é necessário abaixar o braço.

Depois da cabeça, o espaço cinestésico começa a ser trabalhado em atividades

também curtas. A criança tenta passar a crina do arco sobre a corda, fazendo para isso

um movimento com o braço direito em coordenação com o ritmo. Primeiro movimentos

mais simples: o antebraço; e depois passa para o movimento do braço inteiro. Dessa

forma, a condução do arco fica reta, paralela ao cavalete. Em seguida deve-se coordenar

a sincronia das ações do braço direito com a preparação da corda pela mão esquerda,

pois ela deve acontecer antes do ataque do arco pela ação da mão direita.

O meu objetivo é que a criança tenha essa sensibilidade. [Quero] despertar essa sensibilidade nas duas mãos. Na mão esquerda, através da afinação, pressão na corda e na mão direita em movimentos grandes, separação desses. (Professora de violino). No início, só a sustentação do tronco e do braço segurando o violino já é

bastante difícil para a criança e consiste num trabalho de isometria para o braço

esquerdo. O espaço tátil da criança é estimulado na sensibilização do contato da ponta

dos dedos da mão esquerda ao pressionar as cordas e dos dedos da mão direita ao

segurar o arco.

A professora faz questão de afirmar que trabalha “a posição definitiva” quando

ela ensinar o aluno a segurar o arco, ou seja, a posição que o aluno usará pelo resto da

vida para tocar. Esta maneira de trabalhar é diferente de outras metodologias que partem

de uma maneira espontânea de segurar o arco pela criança e só depois corrige a sua

técnica.

No violino, diz ela, “tudo é invisível”, pois a própria posição do instrumento em

relação ao rosto da pessoa que toca dificulta o olhar para o lugar onde os dedos agem.

Além disso, no violino não há trastos, tudo tem que ser desenvolvido pelo tato e

conferido pelo ouvido. Mesmo assim, a professora afirma que para “compreender como

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a corda marca a ponta do dedo que a pressiona, é necessário ver” (Professora de

violino, grifos nossos).

Para que a criança tome consciência do posicionamento dos dedos sobre as

cordas, a professora chega a pintar um “traçozinho com caneta pilot laranja”, sobre a

marca que a corda faz na ponta dos dedos. Isso, diz ela, “serve para eles imaginarem a

posição do dedo na corda (inclinado, e não de frente como no piano)”. Vemos que há aí

uma preocupação de levar a uma conscientização exata - a partir da coordenação dos

espaços tátil e visual - dos esquemas sensório-motores de adaptação às cordas. Estes

deverão ser progressivamente desenvolvidos na técnica violinística, favorecendo ao

máximo o tato em detrimento da visão.

O espaço visual é bastante útil também para desenvolver o senso crítico no

aluno já que é somente observando os problemas técnicos no colega que os alunos

podem imaginar os próprios problemas, que não conseguem enxergar enquanto estão

tocando. Fora isso, no entanto, a visão é quase totalmente reservada para seguir a

partitura. Vemos que o aluno deve construir uma imagem mental de sua ação a partir

dos indícios da ação do professor, dos outros colegas, e das informações táteis,

cinestésicas e auditivas de sua própria ação.

No violino, nada é tão explícito como no piano. [...] Não tem teclas, não tem marcas, não tem referências de nenhum tipo e, o que é pior, nada é visível no instrumento. O violino tem quatro cordas e está afinado por quintas. É bastante comum, inclusive, a associação que alguns fazem com o pentagrama. Acham que as cordas do violino são as linhas do pentagrama, como nos métodos de violão em que se desenham as cordas para mostrar a posição dos dedos. (Professora de violino) O espaço auditivo do aluno é solicitado constantemente pela professora para

que ele construa os sons que eles efetivamente usarão para tocar. Tudo parte da audição

dos intervalos de 5ª que existe entre a afinação de cada corda, justamente “para que eles

adquiram o hábito daquela afinação das cordas”.

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Exatamente como já vimos acontecer na técnica do violão, é sobre a afinação das

cordas soltas que serão produzidos os outros sons, com a ajuda dos dedos da mão

esquerda.

Então, eles vão descobrindo que aqui eles têm uma quinta, têm cinco notas entre uma corda e outra - o que é muito importante. E que essas cinco notas, elas estão complementadas pelos dedos, porque ele vai usar quatro dedos. Então, essa diferença depois ele vai fazer com os dedos. Então, é muito complexo chegar a explicar isso. [...] fazer uma associação de que tem algumas notas que são mais confortáveis na formação da mão deles, [...] que obedecem a essa organização, de tons e semitons. (Professora de violino) Nas atividades citadas pela professora vemos que ela solicita o espaço auditivo

coordenado com o espaço visual, mas através da percepção do teclado do piano, onde, a

partir dos sons iguais aos das cordas soltas, os alunos vêem o número de teclas

correspondente aos sons existentes entre o som de uma corda e outra.

E aí eu começo a mostrar pra eles, toco no piano, vamos ver qual é essa? No piano, ouve. Qual é essa outra? Ah, canta! é igual? É igual. Agora, ouve essa outra, é igual? É. Agora vamos ver quais são as que temos no violino. Agora, ouve aqui, aí eu toco, ah. E qual é o nome? É um ré. (Professora de violino) Um dos maiores enigmas para se trabalhar a representação sonora através do

violino é justamente a complexidade da construção do instrumento. Podemos variar

muito de posição para realizar alturas idênticas já que as cordas, de diferentes calibres,

estão ali disponíveis ao pressionar dos dedos. Assim, sons distantes podem ser próximos

e os vizinhos distantes.

Tudo leva a crer que a professora procura ajudar o aluno a construir uma

“visualização possível”, através da escrita convencional, para que eles possam estruturar

sua compreensão musical. Esta compreensão, no seu entender, seria impossível de

explicar diretamente no instrumento para o aluno.

Então, ficam meio parados aí, achando que o difícil é tocar violino. Não é difícil. Essa complexidade da construção do instrumento que não tem nada visual. Tudo tem que estar absolutamente construído [pela notação], bem construído e rapidamente tem que atender a qualquer necessidade. Por exemplo, em frente ao si, si na corda sol, se eu for pra uma outra corda, não tem uma outra... Em frente à corda sol está o ré. Sol, lá, si, dó, ré, uma quinta. Se eu toco si - si, dó, ré, mi, fá -, já vai dar um fá sustenido. É a quinta. Então, em frente ao si já tem um fá sustenido... (Professora de violino).

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A professora de violino considera a escrita do que foi realizado pelo aluno, uma

forma visual de trabalhar o conteúdo. “Como eles vão conseguir tocar no violino só

depois que eles construíram a escala, depois que eles construíram auditivamente, eu

peço pra que eles construam visualmente no pentagrama. Isso seria a parte visual

também.” (Professora de violino).

Esta afirmação nos leva a concluir que existe uma intenção deliberada desta

professora, e do método que ela adota, em construir uma “ilusão visual” e anular as

abstrações empíricas e pseudo-empíricas resultantes do espaço visual do aluno - a partir

do qual ele poderia construir outras formas de representação baseadas nas imagens

mentais dos movimentos que faz ao tocar. Talvez a representação simbólica deste fazer

tornaria sua representação algo não socializável.

Esta “ilusão visual” tem como objetivo condicionar o saber-fazer ao saber-

escrever a representação do som, usando para isso os eixos verticais e horizontais da

notação convencional.

C. A Notação e o Fazer Musical sobre a Topografia do Violino

A notação convencional da música erudita é a única praticada pelos alunos de

violino de nossa amostra. Ela é usada como complemento da ação de cantar, ouvir e

tocar, e se apresenta como um elemento concreto, desta vez visual, da música. Assim,

eles aprendem a escrever e reconhecer as alturas da escala diatônica de Dó Maior nas

linhas e espaços do pentagrama logo no início do curso.

Só a seqüência, sem firmar qualquer nota, pra que eles compreendam. Porque muitos vêm confusos. Eles acham que a seqüência das notas tem que ser nas linhas. Dó, ré na outra linha, mi na outra linha, fá. Isso que eu tento esclarecer pra eles primeiro. Linhas e espaços que atendem a seqüência das notas que eles estão conhecendo.[...] Logo depois que eu faço os exercícios […] pra que eles dominem […] a escala, eles escrevem a seqüência nos espaços e linhas e eles não têm mais dúvida, aí eu parto pra diferença auditiva dos tons e semitons. (Professora de violino) No método observado em nossa amostra, a construção do conhecimento musical

através do violino, é feita através de instruções de como realizar um som no violino e,

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enquanto o aluno realiza, ele ouve a professora cantando o nome das notas, ou as

pulsações das durações que ele está tocando. Em seguida é solicitado que ele registre o

que fez no pentagrama, usando notas nas linhas e espaços, mínimas e semínimas.

Assim, se ele tocou sons curtos e longos, por exemplo, toca usando metade do

arco contando “1, 2” e em seguida escreve a representação destes sons: “nota de dois

tempos, ‘vazadinha’ ou de um tempo, ‘pintadinha’”. (Professora de violino, grifos

nossos).

A professora afirma que faz uma associação entre os sons que eles ouvem,

cantam e fazem através das posições que aprendem, com a notação musical. Parece que

o espaço visual do aluno é logo encaminhado para a representação da grafia.

Quando eles vão colocando os dedos (ela canta a escala), eu canto e eu peço pra que eles [se] sentem e escrevam (canta a escala novamente), eles vejam na partitura do caderno deles como é que, no som, a associação que a gente faz pro agudo, que não tem nada a ver com ‘pra cima, pra baixo’ [no instrumento], mas, que na notação, está associado. Se os sons que vão pro agudo, eles estão subindo no pentagrama. (Professora de violino, grifos nossos). O eixo vertical das alturas no pentagrama é associado ao movimento do som e às

regiões onde eles são produzidos no violino. Tal associação não pode a acontecer com

base na lógica do aspecto visual dos movimentos dos dedos, mas sim através de uma

convenção, ou melhor, de uma sugestão de “eixos virtuais” que seguem o movimento

dos sons. Por isso, a instrução parece ser fundamental neste sentido, pois o aluno não

poderia descobrir sozinho uma representação socialmente constituída.

A associação que desenvolvo quando escrevem o que tocam é que o som que tem caraterísticas de ser da região média da tessitura do instrumento [conhecido pelo resultado sonoro] se localiza na região média do pentagrama e, os sons mais agudos, na região mais alta do pentagrama. Para a leitura consciente que desenvolvo, isto é muito importante. A associação das diferentes alturas que se tocam no instrumento com a relação de alturas no pentagrama. (Professora de violino). Dada a complexidade do sistema de posições das notas sobre as cordas, ou seja,

a imagem total da “impressão digital” sobre a topografia do violino, a ser construída

gradativamente pelo aluno, esta professora não faz a relação direta entre estes pontos de

referência e os signos musicais que ele lê para tocar as músicas do seu repertório.

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Segundo o que compreendemos da fala da professora, seria muito complexo

refletir teoricamente sobre os conceitos musicais utilizando a localização das posições

usadas para tocar o violino.

Porque, no violino, até que eu consiga explicar pra ele que aquelas notas [sons das cordas soltas] não são uma seguida da outra, [mas que] elas estão por quintas, eu tenho que ter chegado mais ou menos a essa percepção auditiva de [ela canta intervalos de quintas justas descendentes como se fossem as cordas soltas do violino], sabe, ele tem que perceber [...] por isso a minha preocupação é que eles aprendam a fazer todas, a maior quantidade, todas as notas que entram no pentagrama. Desde a primeira aula, eles começam a desenhar. (Professora de violino) Nós nos perguntamos: o processo de construção da imagem mental da partitura,

ao partir representações arbitrárias sobre as transformações do som, não se torna muito

mais complexo do que construir esquemas figurativos dos movimentos do corpo sobre o

instrumento?

Embora saibamos que, durante séculos, muitos rabequeiros e violeiros tocam

instrumentos semelhantes sem necessidade de saber o nome das notas que tocavam,

poderíamos perguntar: seria tão necessário que o aluno de hoje em dia, que freqüenta

uma escola de música, saiba o nome da nota para tocar cada posição destes

instrumentos? Haveria uma maneira de levar a criança a encadear várias posições

diferentes nestes instrumentos sem que ela saiba o nome das notas de uma melodia?

Acreditamos que a criança pode ser convidada a descobrir as características

topográficas de instrumentos de cordas sem necessariamente nomear as cordas e a ler

notas na partitura. A partir do ensino por imitação, relacionando ações que a criança já

conhece com as que vai fazer para tocar, podemos levá-la a descobrir as características

do som que produz perguntando-lhe “como é o som que ela fez”.

D. As idades das crianças e a prática musical com o Violino

Para falar sobre a relação entre idade e a atividade desenvolvida pelos alunos nas

aulas de violino, a professora afirmou definir a idade de 7 anos como a idade mínima

para o aluno ser aceito nas aulas de violino. Segundo ela, as crianças menores do que 7

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anos demoram muito para conseguir algum resultado no trabalho com o instrumento e

acabam perdendo o interesse na aula.

Eu acho que [a criança menor que 7 anos] não tem amadurecimento para perceber pequenos movimentos. A diferença da posição de uma nota para outra no violino é muito pequena. [...] Da forma como eu trabalho, não [funciona]. A partir de sete anos, já é diferente... [...] Eu sei que existe esse aprendizado com menos idade, mas eu não conheço. Não tem muito resultado, e aí acaba cansando. (Professora de violino)

4.1.2.3 Instrução para o Violoncelo

A professora de violoncelo trabalha utilizando o método Suzuki57 para o seu

instrumento. Este método parte do princípio de que toda criança pode aprender a tocar

um instrumento assim como aprende a falar. Por isso, no Japão, as mães são as

primeiras a aprender a tocar o repertório escolhido pelo método enquanto ainda estão

grávidas. Quando o bebê nasce, elas cantam as melodias que a criança irá aprender a

tocar no futuro. Assim, quando a criança tem sua primeira aula de violino (na presença

da mãe, evidentemente), a música que ela fará na aula é apenas uma transposição, para o

instrumento, daquilo que ela já ouviu e cantou. É um método que pressupõe um

envolvimento afetivo da criança com a mãe mediado pela música. Segundo a professora

entrevistada, “o método parte do princípio natural da aprendizagem: a curiosidade que

gera a vontade de saber mais.”

A. Sequência dos Conteúdos Musicais no Violoncelo

No primeiro semestre do estudo de violoncelo as atividades musicais realizadas

pelo aluno o fazem entrar em contato com as figuras simples: semibreve, mínima,

semínima, colcheia e semicolcheia. Porém, as ligaduras entre dois sons num mesmo

arco não são trabalhadas.

Eu já posso estar trabalhando, já no primeiro semestre, todas as figuras mais simples, semínima, etc. E colcheia pontuada com semicolcheia, eu já posso trabalhar. Eu ainda não trabalho ligadura de duas notas no mesmo arco ou quatro notas no mesmo arco. Não no primeiro semestre. No final do primeiro ano a gente já trabalha. A gente até trabalha duas notas no mesmo arco, porém,

57 O método Suzuki, criado logo após a segunda guerra mundial no Japão por Shiniki Suzuki, ficou conhecido no ocidente como um método de ensino para crianças realizado inicialmente com violino, mas que posteriormente foi adaptado para outros instrumentos e hoje até o canto pode ser ensinado por este método.

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separadas, que é aquela figura que é a ligadura com a tratina em cima ou com o ponto de staccato ou com dois arcos, duas direções de arco. Ou seja, o aluno vai até o final do arco e ele vai dividir. Está na mesma direção, porém com duas articulações. (Professora de violoncelo)

A estrutura escalar, assim como vimos ocorrer nas aulas de violão e de violino, é

uma das primeiras construções do aluno no violoncelo. A professora nos explica como

se estivesse dando aula, e notamos que seu vocabulário é pleno de metáforas. O

movimento do som representado verticalmente na notação convencional é sugerido, por

exemplo, pela metáfora de subir de um andar ao outro de um edifício.

A naturalização da relação projetiva do som (grave – em baixo, agudo – em

cima) diretamente sobre a disposição espacial das cordas no instrumento não é feita

através da leitura, mas sim pela passagem da ação do sujeito de uma corda para a corda

um pouco mais aguda, que não estão dispostas desta maneira no espaço quando o

sujeito está tocando.

Na primeira semana, no primeiro mês, ele já pode fazer escala, [...] mas a escala, no instrumento, ela é igual. O que acontece na primeira corda vai acontecer na segunda. Então, ré, mi, fá sustenido, sol (em uma corda), lá, si, dó sustenido, ré (na outra corda). Então, o que ele fez aqui, nessa linha, se correu bem, agora, se eu mudo de andar, faço a mesma coisa no “apartamento de cima”. É a mesma coisa, sigo os mesmos passos. (Professora de violoncelo, grifos nossos) A professora afirma que o repertório é ensinado junto com o solfejo do nome das

notas das músicas tocadas, porque assim é feita a associação do nome das notas, com a

leitura que eles fazem e com o resultado sonoro que eles devem procurar realizar no

instrumento. Esta conduta evidencia que, neste aspecto, o ensino de violoncelo

observado se baseia na teoria associacionista, pois o simples sinal dos nomes das notas

seriam suficientes para induzir a ação do sujeito.

Ele [Suzuki] trabalha com a audição de gravações e com solfejos, você tem que solfejar. As crianças, se você olhar, eles cantam tudo assim “re, re, re, re, la, la, la, la, si, si, si, si, la", tudo com o nome das notas. Pra já associar, pra fazer a associação geral, solfejo, com a leitura, aquela nota tem aquele som, tem que afinar. Sempre antes a gente canta a música. A música, ela é assim. Vai pra casa, ouve o disco. Ouve o disco pra que? Pra ver como um violoncelista está tocando. Qual o final? E tentar chegar lá. (Professora de violoncelo) A associação do som com seu nome nos parece menos perigosa do que a

associação do som com a escrita do som no pentagrama. Como já mencionamos, há um

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processo de adaptação significativa entre os espaços práticos do sujeito e a

decodificação dos signos musicais convencionais que, por serem arbitrários, precisam

ser trabalhados através de um professor. Quando se espera que a própria criança realize

descobertas sobre signos eles podem gerar conflitos cognitivos difíceis de serem

contornados pela própria criança.

Numa abordagem coerente com a visão piagetiana da construção do

conhecimento, o aluno poderia ser convidado a explorar o instrumento como um objeto

sonoro, adaptando seus esquemas anteriores à técnica através de sugestões, de imagens

que o professor usaria como exemplos similares de movimentos, e sobretudo, pela

observação que o aluno faria da ação do professor.

O solfejo seria resultante de uma análise dos intervalos das melodias aprendidas,

através da comparação dos intervalos que são iguais e dos que são diferentes. Este

método levaria o aluno a criar esquemas auditivos pela diferenciação dos intervalos que

lê e toca no instrumento.

A seqüência de conteúdos que a professora segue em suas aulas se baseia na

seqüência existente no livro do método Suzuki. Segundo ela, este livro é organizado

levando em conta a construção gradativa dos conteúdos técnicos e musicais importantes

para os primeiros passos no instrumento.

Nessa metodologia do Suzuki é perfeito. Foi um estudo muito apurado realmente, de encaixar toda a mecânica do instrumento, num repertório bonito cuja leitura é aquela. Então, é perfeito, é feito pro instrumento. Como é que essa teoria se materializa no instrumento de cordas?. [...] às vezes eu vou trabalhar só o início do tetracorde, só. Mas não tem a escala completa? Não tem escala, nem exercício de escala. Às vezes só esse iniciozinho já tem música [repertório para o aluno tocar] pra aquilo. (Professora de violoncelo) No primeiro semestre de estudo os aluno aprendem duas arcadas diferentes no

violoncelo: détaché e martelé. “são arcadas terrestres, que a gente chama, quer dizer, o

arco não desgruda da corda. Porém, elas têm aspectos diferentes”, diz a professora de

violoncelo.

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Musicalmente, estas arcadas levam o aluno a realizar sons ligados, pois o arco

não desgruda da corda. O détaché por exemplo é uma arcada que produz sons sem

interrupção, mas que permitem ao músico articular os ritmos.

Eu estou tocando détaché, é um tipo de arcada que você toca as notas sem interrupção[ ...] Ou seja, o arco está grudado na corda, ele não sai da corda e você vai com o braço pra lá e pra cá, [...] ela tem um legato ali, um legato de som, não é um legato de arco. “Táta táta ta” [sem interrupção]. E o martelé que é a mesma coisa só que eu vou rápido, eu chego no ponto rápido “ta, ta” (faz o movimento do braço). (Professora de violoncelo) Para levar a criança a realizar os efeitos sonoros no violoncelo, o professor não

explica a técnica como ele o faz com adultos. A estratégia é sugerir imagens. Assim,

para realizar as idas e vindas das arcadas criando a ilusão de que o som não termina no

final da arcada, é solicitado ao aluno que realize partes do movimento e depois ir

tornando as solicitações cada vez mais complexas.

No primeiro ano, ele vai até o fim e volta. A gente diz: “olha, vai igual nadador profissional, dá aquela volta olímpica que a gente vê, já está no meio da piscina.” Cria essa imagem, no início. Porque a gente não vai falar que ele tem que tirando o peso, mas mantendo a pressão, mas ao mesmo tempo... A gente não tem como falar isso. Faz imagem do que deve ser feito. [...] Aí ele cria um jeitinho lá interno de fazer “a virada olímpica” dele. Torneia, faz um “oito” na ponta. Não faz um “z”, chega lá e volta. Chega na ponta e dá uma “torneada”. Ele faz esse movimento mesmo, tem esse pequeno movimento, você já consegue alongar o som, alongar o arco, criar uma ilusão. (Professora de violoncelo) Vemos, portanto, que o resultado sonoro destes conteúdos técnicos apresentam

sutilezas do ponto de vista musical, muito mais complexos do que a criança poderia

compreender pela explicação lógica. Na verdade, a criança chega a realizar coisas

musicalmente complexas, desde que lhe seja solicitado de uma maneira prática, que lhe

sugere ações do seu fazer cotidiano. Ao professor cabe a habilidade de sugerir imagens,

que levam a criança a vasculhar, dentro do seu repertório de esquemas mentais, qual

esquema se aproxima do movimento solicitado pelo professor.

É muito interessante ver o processo de diferenciação dos sons que tais

experiências vão possibilitando ao aluno. Ao final de um semestre de estudo do

instrumento, o domínio técnico lhe possibilita controlar o som do instrumento para

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realizar durações diferentes, criando ritmos, que carregam significações tão diversas,

pelo modo como os movimentos são construídos pelo sujeito.

Então, ele vai saber que esse arco não está desgrudando da corda nunca. Porém, ele vai ter todo tipo de touché, de toque com esse arco. Détaché, ou seja, está monitorando, “tatatata” (notas curtas), está monitorando só lá no talão ou no arco todo, “taaaaa”, nota longa e volta, vai até a ponta, não faz nenhuma intromissão, não treme no meio. No meio, há uma compensação, começa a ficar leve o arco, você dá um peso, muita coisa... Então dá uma tremidinhas às vezes. Alcançar essa tranqüilidade de esse movimento lento, difícil, não é fácil não. (Professora de violoncelo)

Posteriormente virão outros tipos de arcada, como as “aéreas” que permitem

realizar staccatos e spiccatos, que para soarem o arco deve sair da corda.

E depois, esse movimento num pulso só, não está saindo da corda ali. Porque depois é que vêm as arcadas aéreas, você entra e sai da corda. Aí você tem que os staccatos vão virar spiccatos, aí vai virar bastante coisa. (Professora de violoncelo) B. Os Espaços Práticos do sujeito na técnica para tocar o Violoncelo

Para tocar violoncelo, é preciso muita receptividade do aluno, pois é um

instrumento grande que fica colado ao corpo: “Além disso, você está atrás dele e precisa

tocar à frente”, diz a professora de violoncelo. Como primeiro desafio a pedagogia

inicial é fazer música ao mesmo tempo que trata das particularidades técnicas do fazer

instrumental: a forma de se sentar, de acondicionar o instrumento ao corpo, de segurar o

arco, de estruturar a forma da mão esquerda e articular movimentos.

Os primeiros sons são realizados através da coordenação dos espaços tátil e

auditivo. Com o toque pizzicato, que é feito beliscando a corda com o dedo indicador, o

aluno é convidado a identificar a qualidade do som como primeira referencia do

resultado de suas ações. “tirando um som bonito de dentro do instrumento e espalhando

o som pelo instrumento todo”. (Professora de violoncelo)

A função desempenhada pelas mãos é especificada pela professora. A mão

esquerda, ao determinar as alturas pelo lugar onde pressiona a corda, tem um

treinamento específico que leva o aluno a memorizar um espaçamento entre os dedos

desta mão.

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No primeiro livro do Suzuki, que vai o primeiro ano todo, ele aborda duas fôrmas de mão esquerda, que são a fôrma fechada e a forma por extensão. Esse formato em que eu tenho os quatro dedos por cima e o polegar atrás é a fôrma fechada, quer dizer, não tem extensão, todos os dedos estão na mesma distância. [...] E eu vou trabalhar, dentro desses quatro dedos em cima com uma formatação só, que é utilizar o primeiro, o terceiro e o quarto (dedo). Tem um repertório enorme pra mim. Primeiro, terceiro e quarto dedos. Não vou usar o segundo ainda. (Professora de violoncelo) A postura da mão esquerda é muito importante pois a afinação dos sons no

violoncelo depende do ataque dos dedos da mão esquerda em lugares precisos na corda.

Se o movimento dos dedos não for ágil, também o ritmo sofre, porque, como já

mencionamos anteriormente, eles preparam as cordas antes de ela vibrar pela ação da

mão direita ou do arco. Assim como qualquer outro instrumento, os dedos devem

praticar estes movimentos para adquirir a sua independência. A professora cita o

exemplo dos exercícios propostos para os pianistas de Cortot58, que visam adquirir a

independência dos dedos.

Como estratégia para a construção destes esquemas motores digitais a professora

pede que o aluno faça primeiro a articulação do intervalo maior, delimitando os pontos

que os dedos extremos (1º e 4º dedos, baixando o 2º-3º-4º dedos ao mesmo tempo)

atingem sobre o braço do violoncelo. Este espaço vai sendo sub-dividido posteriormente

pelos dedos intermediários.

Então, ela sobe, tem que sentir que é uma dobradiça, que ela tem um limite e volta. Vou trabalhar primeiro e quarto. Então, primeiro e dois-três-quatro, pra não trabalhar isso (com o dois e três levantados), que aí vai fechando aqui (o espaçamento do quarto dedo) e vai desafinando. (Professora de violoncelo) Este trabalho depende da continuidade do exercício diário em casa. No ensino

para crianças usa-se um adesivo sobre o espelho do instrumento pois, assim como o

violino, o violoncelo não tem trastos. Por isso, o lugar onde o dedo deve cair sobre a

corda é marcado e o aluno, através do espaço tátil pode sentir, a cada vez que o dedo

pressiona a corda sobre o espelho, o lugar exato onde deve tocar a corda.

58 Alfred Denis Cortot (1877-1962) músico suíço, publicou um livro sobre princípios técnicos para o piano, onde sugere exercícios para serem feitos levantando as articulações dos dedos, sempre arredondadas, para cima do nível dos outros dedos antes de executar o ataque sobre as teclas. Este exercício tem a finalidade de aumentar a força muscular e a independência do movimento dos dedos.

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Estas experiências, sendo repetidas, funcionam como um exercício reflexo e vão

se transformando em esquemas motores, específicos para a técnica do violoncelo, e que

são agregadas a uma representação tátil-espacial-auditiva através do contato da ponta do

dedo com o adesivo, do espaçamento regular entre os dedos, e do resultado obtido que é

conferido pelo espaço auditivo.

Por este motivo, as melodias são os primeiros conteúdos que o método Suzuki

busca fazer a criança conservar. Elas são as estruturas musicais de referência. Através

da memória destas melodias, a criança confere cada um dos sons que ela realiza com o

som que ela imagina antes de tocar. Depois da memória auditiva, vem a memória tátil-

espacial, mas se os esquemas motores não forem suficientemente treinados, as posições

dos dedos não se conservam e a criança desafina.

Então, tem que fazer a afinação. Fazer como? Não adianta ter um bom ouvido se a minha parte motora não responde ao som que eu estou imaginando. Aí, então ele diz: “eu sou desafinado”. Não é desafinado, é sua mão, a mãozinha está caindo pra cá (pra direita). Quando cai pra cá, você está tocando o terceiro mas, na verdade, está empurrando pra cima, está desafinando.[...] É difícil eles fazerem isso. Os exercícios [do método Suzuki] são para estes dedos: é tudo primeiro e terceiro, primeiro e terceiro, ou, primeiro, terceiro e quarto, primeiro, terceiro e quarto. (Professora de violoncelo) Nesta fala nos parece que a professora consideraria uma criança “desafinada”

somente se ela não percebesse que o som que realiza não é igual ao que imagina antes

de fazer. Mas quando ela própria percebe e se diz desafinada, já demonstra que seu

problema é de ordem motora, e por isso, poderá ser capaz de corrigi-lo com seus

critérios de afinação.

Acreditamos que a opção em adotar melodias tradicionais como referência dá ao

método Suzuki uma excelente consistência no trabalho com crianças pequenas, porque

estas melodias tem uma significação expressiva para a criança. Seria diferente do que

representaria as estruturas que usamos para teorizar sobre a música (tais como as escalas

e os arpejos).

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Neste aspecto, por serem as melodias, em sua maioria, do repertório europeu,

melhor seria que este fosse adaptado ao contexto cultural do aluno para funcionasse

com maior significação para a criança. Tal adaptação exigiria do professor um trabalho

de pesquisa de repertório que atendesse tanto o gosto do aluno quando a necessidade de

desenvolvimento dos conteúdos técnicos a serem trabalhados no instrumento.

Além do contexto cultural do repertório, o método peca por não propiciar

momentos de criatividade, tão importantes para a verdadeira invenção que leva o sujeito

agilizar seu pensamento durante as ações musicais que expressam sua própria

musicalidade, partindo da exploração aleatória e chegando às escolhas musicais

intencionais.

Sob o aspecto do desenvolvimento técnico, a professora diz que, no programa

gradativo do método, além de as peças escolhidas permitirem que o aluno construa a

fôrma da mão através de um dedilhado próprio para este exercício, esta peças podem ser

tocadas em apenas um corda.

Ele [Suzuki] fez a compilação de músicas tradicionais européias, todas pensando nessa fôrma primeiro, terceiro e quarto, numa corda só, pra não ter troca de cordas ainda. Quer dizer, eu estou numa linha só pra que não tenha isso [dedo esticado para atingir a outra corda]. (Professora de violoncelo) Percebemos que, ao denominar corda como “linha”, a professora de violoncelo

concebe a ação do aluno num espaço projetivo sobre o qual o espaço métrico é

construído. Este processo se dá pelas iterações dos ataques dos dedos em pontos

assimétricos das cordas para a produção dos sons do tetracorde. Sendo o tetracorde a

metade exata da escala diatônica maior, ela funciona como unidade de medida que,

sendo reiterada no espaço do braço do instrumento, constrói uma “métrica” a serviço do

sistema tonal.

Outro aspecto, presente nesta fala, diz respeito ao método cumulativo de

conteúdos a serem trabalhados. Ao diminuir o número de transformações da ação no

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espaço geral do instrumento, o método favorece o exercício de esquemas motores a

serem conservados em espaços menores. Somente depois de dominar os movimentos

para a estrutura de quatro sons (tetracorde) sobre uma corda, o aluno é levado a transpor

esta estrutura para outros espaços, ou seja, outras cordas e assim constrói a escala

diatônica.

Mas a escala, no instrumento, ela é igual. O que acontece na primeira corda vai acontecer na segunda. Então, ré, mi, fá sustenido, sol (em uma corda), lá, si, dó sustenido, ré (na outra corda). Então, o que ele fez aqui, nessa linha, se correu bem, agora, se eu mudo de andar, faço a mesma coisa no apartamento de cima. É a mesma coisa, sigo os mesmos passos. (Professora de violoncelo)

Quanto maior o instrumento, maiores os movimentos envolvidos na técnica de

execução. Comparando a entrevista da professora de violino e de violoncelo, notamos

uma diferença na quantidade de sons que os alunos realizam em cada corda para

construir a escala. Enquanto no violino é trabalhada a estrutura de cinco sons

(pentacorde), no violoncelo usa-se a estrutura de quatro sons (tetracorde). Isto se deve

ao fato de que o espaçamento entre os dedos no violoncelo precisar ser maior do que é

no violino. Também a tensão das cordas sendo maior neste instrumento, dificulta a ação

de dedos separados, pela necessidade de mais força destes. Assim, o grupo de dedos 2-

3-4 funciona, no início, como se fosse um só e aos poucos o aluno vai trabalhando a

independência de cada um.

A professora acredita que existe uma memória cinestésica que perdura mesmo

quando esquecemos as notas, quando não nos prendemos à leitura, e que ela é resultante

de um trabalho de repetição do movimento, que obedece a ordem em que os dedos são

usados para tocar uma melodia.

[Tem a parte] cinestésica, que é de sentir mesmo, de você ver e você desenhar aquelas notas, sentir dedilhar aquelas notas que estão sendo tocadas, não tem isso? De você, às vezes, a sua memória, falha a sua leitura, falha tudo, vem o que? O movimento que você fazia. Tem que decorar isso, o movimento. Eu digo, decorar, o Suzuki daria o dedilhado, ele põe o dedilhado em cima das notas. Ah, está botando pra facilitar? Não. Pra você saber o caminho dos dedos. Porque, às vezes, depois quando repete aquela frase, já tira as notas, já tira o dedilhado, você vai automaticamente. (Professora de violoncelo)

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Quanto à técnica do arco, que é, segundo a professora entrevistada, “uma nova

articulação ligada às duas articulações do braço”, vemos a solicitação ainda maior do

espaço cinestésico do sujeito. A professora cita a angulação do arco, que exige um

afastamento e uma aproximação do ombro, num abrir e fechar do corpo.

Ele tem que saber que o responsável pela mudança de arco é essa angulação. Essa mudança de corda, é [realizada pela] a angulação que você faz com abrir e fechar do seu ombro, com o corpo. Afastar o ombro do corpo e aproximar o ombro do corpo. (Professora de violoncelo) O funcionamento do corpo na técnica de arco leva em conta os movimentos de

pronação e supinação, assim como os de abdução e adução do braço direito. Na

pronação giramos o pulso para o a direção do polegar, e na supinação giramos o pulso

para a direção ao dedo mindinho. Para pressionar o arco sobre as cordas usamos a

pronação. A abdução e a adução são os movimentos do antebraço usados para afastar e

aproximar o arco. Na técnica do violoncelo estes movimentos são indicados na partitura

pelos signos de ponta e talão.

Ao se comunicar com uma criança a professora sugere os movimentos da técnica

através de imagens. “Abrir e fechar as asas”, ou “brincar de polichinelo”, são sugestões

para que a criança faça naturalmente os movimentos que levam à mudança do ângulo do

arco nas trocas de uma corda à outra.

Por isso que a gente brinca. “Ah, o meu arco está sempre saindo da corda”. Por quê? Porque você está assim, relaxado, você está, como a gente diz, supinado, você não está pronado. Você está sempre relaxado, seu braço está sempre assim [girando pra fora]. Então, vamos trazer pra cá. [...] Na hora de passar pra criança, a gente passa a brincadeira de: “vamos afastar do corpo”, “olha o polichinelo grudado, vamos lá, polichinelo, o espantalho, vamos trabalhar de espantalho”. Então, todo esse trabalho de conhecer seu corpo. (Professora de violoncelo) Quanto ao espaço visual, a professora de violoncelo afirma que, no início, para

conhecer o movimento, o aluno tem que controlar os seus movimentos pelo olhar. O

ângulo do arco em relação às cordas, por exemplo, tem que ser rigorosamente

controlado pelo olhar no início, pois deste ângulo depende o ponto de contado entre o

arco e a corda e, o modo como o arco fará a corda vibrar. Conseqüentemente, a precisão

deste ângulo afeta o resultado sonoro.

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[O arco] vai tocar nessa região entre o espelho e o cavalete, tem um espaço enorme. [...] Então, tem um ponto onde vai ficar […] o aluno tem que, quando está estudando, ficar olhando pra esse ponto e não sair dali.[...] O arco tem que estar perpendicular à corda. Se estiver mudando o ângulo, vai afetar a sonoridade também. [...] A corda é enrolada por um [fio de] aço, e você tem que aproveitar esse enrolar, puxar ela, girar em cima desse aço, você não pode atravessar a corda assim, esses segmentos. Você tem que fazer ela vibrar […] Tem que aprender a ver essa seção, como se fosse geometria. (Professora de violoncelo) Também a digitação feita pela mão esquerda deve ser controlada pela visão

porque, olhando, a criança só pode construir a imagem interna de seus movimentos a

partir da visão que ela tem da ação que ela faz sobre o objeto material.

também tem que olhar, porque não basta eu dizer um, três, quatro. Mas qual distância? Tem que olhar,[...] “Ah, a sua mão está caindo...” “não está”[diz o aluno]. “Olha pra mão!”. Tem que olhar, olhar muito. Depois vai ter que olhar a partitura, esquecer que pode olhar pra cá. (Professora de violoncelo) Em geral, os instrumentistas que tocam por leitura de partitura são estimulados a

não olhar para a ação das mãos sobre o instrumento. Isso porque a leitura é tão

valorizada na atividade destes músicos, que eles parecem negar a importância do espaço

visual na construção da atividade musical real. Nesta pesquisa verificamos que isso é

um mito, e que olhar o que se faz é fundamental para a criança nesta fase dos estudos.

C. A Notação e o Fazer Musical sobre a Topografia do Violoncelo

Assim como os outros cordofones que estudamos até agora, as cordas soltas do

violoncelo são ordenadas da mais aguda para a mais grave. Os sons que o violoncelo

produz vão desde a região grave até a região média. A ordem das cordas quando o

violoncelista está tocando se apresenta (do ponto de vista do observador) da direita para

a esquerda da seguinte maneira: 1ªcorda-Lá2; 2ªcorda-Ré2; 3ªcorda-Sol1; 4ªcorda-Dó1.

Esta descrição da topografia do instrumento ficará mais clara através do quadro

abaixo onde procuramos ilustrar, assim como o fizemos com o violão e o violino, os

espaços onde o instrumentista toca os dedos da mão esquerda ao realizar as notas na

primeira posição.

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VIOLONCELO: 1ªcorda-Lá2; 2ªcorda-Ré2; 3ªcorda-Sol1; 4ªcorda-Dó1

DIREITA CRAVELHAS ESQUERDA +Agudo + Grave 1ª.Corda – Lá 2ª.Corda – Ré 3ª.Corda – Sol 4ª.Corda – Dó

Posição

Dedilhado Sons Dedilhado Sons Ddedilhado Sons Dedilhado Sons 0 Lá 0 Ré 0 Sol 0 Dó 1 Si 1 Mi 1 Lá 1 Ré 2-3 Dó# 2-3 Fá# 2-3 Si 2-3 Mi

1ª.

4 Ré 4 Sol 4 Dó 4 Fá

2ª.

CAVALETE

Figura 11: Representação dos pontos de contado dos dedos do violoncelista sobre as cordas do violoncelo na primeira posição (do ponto de vista do observador).

Para pensarmos na seqüência dos sons da região grave em direção à aguda

teremos o seguinte quadro de ordem das cordas:

Quadro 4: Representação da ordenação das notas da escala sobre as quatro cordas do violoncelo, da mais grave à mais aguda.

Ordem Nome da corda Notas na primeira posição 1ª. La lá, si, do, ré 2ª. Re ré, mi, fá, sol 3ª. Sol sol, la, si, do 4ª. Do Do, re, mi, fa

Até aqui não tratamos da notação usada pelo violoncelista, mas a numeração das

notas “Dó1” ou “Lá2” já indicam certas referencias na pauta para quem lê música. A

numeração das notas é feita para indicar em que região devemos grafar aquele som, e

isso indica também a clave usada no pentagrama. No caso do violoncelo, a clave usada

é a de Fá, justamente a clave dos sons graves.

Por ser a região grave mais apropriada para os sons produzidos por instrumentos

grandes, evidentemente, ela é imprópria para ser usada para a leitura de vozes infantis.

Talvez por este motivo, em geral, as primeiras notas que as crianças aprendem são as da

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clave de Sol, exceto quando trabalhamos com a leitura relativa, na qual qualquer ponto

do pentagrama pode ser o Dó, ou o som1.

Por este motivo, segundo a professora de violoncelo, a interação entre o

programa de EPEM e o de seu instrumento tem sido difícil. Todo o trabalho com a

notação é feito na sua aula com o uso da clave de Fá no pentagrama e na sua maneira de

ver, isso tem gerado dificuldades de leitura para as crianças e faz com que os programas

não possam ser concomitantes.

Um dos aspectos que mais nos intrigaram nos instrumentos de cordas é que uma

determinada altura pode ser produzida em diversas cordas e que a escolha varia a cada

situação. No caso dos alunos iniciantes, vemos que eles conhecem apenas a primeira

posição, e no máximo também a segunda posição. Esta particularidade vai sendo

assimilada pelo aluno no decorrer dos anos de prática com o instrumento.

No processo inicial de aprendizagem da leitura convencional este aspecto não foi

mencionado por nenhum dos professores de instrumentos de cordas. No entanto, todos

eles citaram que as notas que os alunos lêem não têm “lugar marcado” no instrumento.

Será que está na primeira posição ou na quarta? Porque as mesmas notas você tem em várias posições. Você tem lá, si, dó aqui, tem lá, si, dó na segunda corda. Todas as cordas podem fazer os sons das outras. As cordas graves podem fazer os sons das cordas agudas, mesma altura. Então, você diz, nossa, ele está tocando na terceira corda na posição, poderia estar tocando na primeira. (Professora de violoncelo) Uma reflexão que podemos fazer sobre a fala da professora de violoncelo diz

respeito ao papel dos professores de instrumento na explicação da adaptação da leitura

da notação convencional ao instrumento. Cada instrumento prevê uma teoria musical

específica e esta teoria compõe com a prática uma totalidade que deve ser vivenciada

pelo aluno sem a fragmentação limitada à técnica e ao repertório específicos do

instrumento. Quando o professor se coloca como músico, ele pode ajudar o aluno a

percorrer o caminho da construção de seus conhecimentos musicais usando o

instrumento escolhido, com suas particularidades técnicas e acústicas.

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Esta reflexão, no entanto, é permeada pela cristalização de uma pedagogia

fragmentada, presente na estrutura conservatorial tradicional, onde professores de teoria

e de instrumento têm papeis diferenciados e excludentes. Percebemos, pela citação

abaixo, que a professora de violoncelo desconhece que o método adotado pela

professora de EPEM é o de leitura relativa.

O caso do instrumento voz, a gente aqui vai até avançar porque é clave de Fá. O aluno lê clave de Fá, ele é alfabetizado em clave de Fá. E tudo o que é feito no EPEM, no início, é na clave de Sol, que está na tessitura da voz. Toda a vida da gente, de qualquer escola, você estuda os princípios de ler em qualquer clave, mas treina na clave de Sol, porque é a clave da tessitura da voz, pra qualquer um. Então, na realidade, isso já é um ponto que a gente já está fazendo a divergência. Eu acho pior ainda o professor de viola, que é em clave de Dó que ninguém nunca lê. Porque leu clave de Sol e clave de Fá, já toca todos os instrumentos, menos viola, clave de Dó na terceira linha. Então, isso já é um ponto que a gente quebra entre a gente. Eu preciso... Se tivesse que auxiliar a aula de violoncelo, é necessário que o aluno solfejasse também... Você assistiu às aulas, você viu há uma dificuldade, no início, do aluno solfejar, porque ele lê si onde está escrito sol, ele vai lendo as notas em terças. Por intervalos, não, ele vai tentando fazer as terças. Está escrito mi, ele lê dó. (Professora de violoncelo) Outra incompatibilidade encontrada entre o programa de violoncelo e o de

EPEM se dá, segundo esta professora de violoncelo, por uma característica do

instrumento. No violoncelo é mais fácil realizar melodias com saltos do que melodias

por graus conjuntos. Acreditamos que esta visão é um tanto alarmista, já que os saltos

são estruturas sonoras compostas por graus conjuntos, portanto, esta não seria razão

para incompatibilizar as condutas pedagógicas previstas para desenvolver os programas

das duas disciplinas.

A leitura está ligada à mecânica do instrumento. Por exemplo, pra nós, às vezes é mais fácil ler alguns saltos do que ler grau conjunto. [...] Certas pessoas têm muita dificuldade, às vezes só trabalha o primeiro dedinho. [...] Então, se ele só vai colocar o primeiro dedo, eu vou precisar de saltos de quinta. Ele vai ler isso logo. (Professora de violoncelo, grifo nosso) A necessidade de tocar determinados intervalos pela facilidade mecânica que

existe para produzi-los no instrumento é confundida por esta professora com a

necessidade de ler estes mesmos intervalos.

Então, ré-mi, lá-si. Então, ele vai ler isso ré-mi, um grau conjunto aqui, lá-si aqui. Já vai ter que ler esses pulos. O Suzuki já faz isso na primeira música, re-re-re-re, la-la-la-la, si-si-si-si. Já deu esse pulo, porque, pra gente é fácil, porque só trocou de corda, é corda solta. (Professora de violoncelo)

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Vemos nesta fala da professora de violoncelo um mal entendido metodológico.

O método Suzuki não prevê que o aluno iniciante leia as melodias que ele toca, mas

sim, que ele reconheça auditivamente o que aprende a tocar no instrumento por

imitação. Quando a notação convencional é apresentada, ela deve ser trabalhada

metodicamente pelo professor de instrumento, pois é uma adaptação motora a uma

decodificação de significantes cujo resultado sonoro é conhecido, mas a ação que

produz o som ainda deve ser aprendida e exercitada.

Então, às vezes, ler intervalos maiores... Eu estou te falando. Eu acho que a teoria musical é feita pra pianista. Toda ela é construída pro pensamento de um pianista, nem de um cantor é. Nem de um violoncelista é, imagina. Quando você fala assim em décimas, você fala, meu deus, décimas. Pro violoncelo, intervalos gigantes, você está pulando de corda, na mesma posição. Já pulou uma quinta, na mesma posição. Décima, fazendo, não tem problema nenhum pra gente. (Professora de violoncelo)

A professora conclui que é importante que o próprio professor de instrumento

ensine a teoria específica para o instrumento, e que o autor do método Suzuki

contestava o que se chama comumente de ensino de teoria. Tal afirmação parece

reconhecer que o programa da disciplina EPEM não precisa oferecer conteúdos

específicos para o instrumento, pois a teoria é mais abrangente do que os conteúdos

musicais que a criança usará nas aulas de violoncelo.

Não depende da teoria que [a criança] saiba. Depende de como aquela teoria serve pro meu instrumento, de como ela está materializada no meu instrumento. Seria muito importante o professor de teoria... por isso é que é bom o professor do instrumento dar a teoria direto. Ele já sabe como, que aspecto... eu já vou dar logo Lá maior. O Suzuki, ele abole as aulas de teoria assim, nesse sentido. (Professora de violoncelo) A seguir, a professora de violoncelo conclui que a “teoria”, no sentido dado à

disciplina EPEM, não é o que ela chama de teoria na aula de instrumento.

Não é uma teoria, é como você inicia, como você ensina a teoria. A teoria é a mesma. Mas como você vai, qual é a guia, qual é o índice que você vai fazendo pra aquilo. (Professora de violoncelo)

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D. As idades das crianças e a prática musical com o Violoncelo

O fato de o violoncelo ser um instrumento grande e sem recursos mediadores

para a produção do som traz exigências particulares que, em alguns casos, podem

chegar a dificultar a aprendizagem da técnica do instrumento.

[No violoncelo] você tem que, além de gerar o som, você tem que fazer a altura dele. É difícil, tudo depende de você. Os espaços são enormes (mostra com dois dedos). Isso aqui (espaço menor) já está desafinado. (Professora de violoncelo) Para ensinar crianças a professora afirma que é necessário trabalhar mais a

percepção auditiva e motora através de jogos. É o caso dos exercícios para controlar os

movimentos do arco, que a professora pede que sejam feitos em aula entre uma música

e outra.

Exercícios iniciais para o arco: (gira do antebraço pra fora e pra dentro), o que a gente já faz, “pescaria”, pra relaxar a mão, pra trabalhar essa posição (antebraço apoiado na perna com o punho dobrando pra cima), trabalhar com “limpador de pára-brisa” (antebraço), trabalhar como, vamos “escrever o nome com o arco”, mas olha [pede] “a caligrafia tem que estar bonita!” (Professora de violoncelo) Quando os alunos são mais velhos a didática é mais verbal, e os exercícios

podem ser explicados pela lógica dos recursos que trazem para a técnica.

Com adolescentes e adultos explicar, explanar todo esse conteúdo é suficiente para que ele tenha como estudar em casa, pois nessa faixa etária o processo de aprendizagem é o da atenção, percepção, raciocínio, memorização e julgamento. Um jovem ou adulto já tem muitas experiências em outras áreas que requerem ações do pensamento, como os estudos escolares ou acadêmicos avançados. Com criança tem que ser de forma lúdica, quando se usa bastante a percepção auditiva e motora e os jogos. (Professora de violoncelo) Podemos afirmar que a professora de violoncelo constrói seu próprio método de

acordo com suas concepções epistemológicas, que não tem um viés apenas: às vezes é

associacionista, às vezes faz referência ao lúdico, às vezes ao Suzuki, mesmo que nem

sempre bem compreendido.

4.1.2.4 A Instrução para o Piano

A. Seqüência dos Conteúdos Musicais no Piano

A seqüência dos conteúdos adotada pela professora de piano visa à construção

do objeto musical pelo aluno, mas sem a preocupação que ele chegue aos conceitos de

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tudo o que ele vivencia. “No início, o mais importante é a experiência, o envolvimento

do aluno numa relação comigo na qual ele faz brincadeiras para descobrir e inventar no

piano”.

Procurando que o aluno atinja primeiro a compreensão da experiência musical

geral para chegar depois às mais específicas, as alturas são vivenciadas pelo aluno

através da exploração do teclado, para que ele conheça o lugar dos sons graves ou

agudos. O movimento de ida e volta do som entre as regiões grave, média e aguda é

trabalhado antes da relação de tons e semitons.

A música é um objeto em constante transformação. Estamos no grave e chegamos ao agudo por um movimento de transformação dos sons. A criança apreende intuitivamente estas noções de grave-agudo. Mas quando queremos levá-la a compreender as transformações do som devemos começar pela diferenciação dos estados “grave e agudo”, “longo-curto” “forte-suave”. Aos poucos vamos solicitando a reversibilidade destas transformações e a criança vai tomando consciência dos parâmetros sonoros. (Professora de piano) A exploração do teclado começa por imitação de ações da professora, dando

chance ao aluno de perceber por si a diferença dos sons que produz ao pressionar as

teclas. Depois a criança é convidada a imitar sons de diversos animais, e, por último, ela

faz jogos nos quais tem que tocar o que se pede nos cartões (grave, longo, forte, suave,

etc) e, progressivamente, estes cartões são substituídos por figuras quadradas (clusters)

e redondas (posição fechada).

O método que eu adoto é o do livro “Educação Musical através do Teclado” de Maria de Lourdes Junqueira Gonçalves e Cacilda Borges Barbosa. A criança aprende a usar as posições Cluster e Fechada, e consegue tocar melodias simples, por imitação, por ouvido, ou improvisando tanto nas teclas pretas (o que faz com que eles vivenciem a escala pentatônica) como nas teclas brancas (escalas modais e tonal). Só depois que eles já tocaram várias músicas por imitação, é que eles começam a ler signos musicais. (Professora de piano, grifos nossos) Com estes “esquemas motores básicos” o aluno consegue tocar sons simultâneos

e consecutivos e isso lhe dá muitas possibilidades musicais por todo o teclado. Parte-se

então para a ação dos dedos alternadamente, em graus conjuntos e disjuntos formando

melodias, assim como o toque simultâneo dos dedos - posição de arco - num intervalo

de quinta.

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Vamos trabalhando a coordenação motora dos dedos com a compreensão dos intervalos melódicos de segunda (passo) e terça (salto). Mais tarde estes intervalos serão nomeados e mais especificados em segundas e terças maiores e menores. Ao tocar com a posição de arco (quinta), depois dos blocos de segunda e terça, o aluno vivencia a simultaneidade dos sons. (Professora de piano) A aquisição da forma do arco na técnica do aluno traz a possibilidade de

atividades que interessam muito às crianças. “A melodia acompanhada por arcos, é

trabalhada sobre a letra de músicas que eles conhecem, que os pais conhecem, e isso

gera muita animação nos alunos”. (Professora de piano).

Quando a criança toca com todos os cinco dedos alternadamente, pode conseguir

tocar melodias com a extensão de até dez graus conjuntos. Pode também tocar uma

melodia de cinco sons numa mão e a harmonia em arcos na outra.

Ao tocar com os 5 dedos (alternadamente) o aluno pode fazer um toque com

característica de legato, o que no piano é uma aquisição importantíssima. É através

deste toque que aproximamos o som do piano da emissão dos cordofones friccionados

ou da voz, pois, na verdade, não é possível conseguir no piano um verdadeiro legato.

Depois de pressionar a tecla, o pianista não domina mais o som. Mas, ao manter a tecla

pressionada, e soltá-la após pressionar a próxima, temos a ilusão de que o som anterior

“se ligou” ao som seguinte.

B. Os Espaços Práticos do sujeito na técnica do Piano

No piano, a dialética das ações do aluno num movimento sincronico/diacronico

produz resultados sonoros, melódicos ou harmônicos, dependendo da coordenação das

mãos e dedos tocando juntos ou alternados.

Podemos afirmar que, no método utilizado por esta professora para a construção

da técnica pianística, o espaço tátil/cinestésico é solicitado a partir das posições

escolhidas para realizar atividades sobre o teclado usando as duas mãos separadas,

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juntas ou alternadas. No primeiro ano de estudo as posições usadas são as de cluster59,

fechada, de arco e aberta. Elas ajudam na exploração dos parâmetros de alturas,

intensidades e durações no instrumento, e se configuram também como uma forma

gradativa para levar o aluno a um controle dos gestos mais simples aos mais complexos.

A posição de Cluster consiste em juntar as pontas dos quatro dedos maiores com

o polegar arredondado para tocar sons simultâneos em graus conjuntos, com a mesma

mão. O aluno toca apenas com a base formada pela parte macia dos dedos agrupados

sobre as teclas.

A posição de cluster permite que o aluno explore o teclado todo sentindo os agrupamentos de duas ou três teclas pretas do instrumento pelo olhar e pelo tato. Nestas explorações ele ouve as diferenças de alturas que o som apresenta ao tocar da esquerda para a direita no teclado [grave, médio e agudo] e vice versa. (Professora de piano, grifos nossos) A posição fechada, que consiste tocar com a ponta do dedo indicador apoiado

sobre o polegar, é usada para tocar sons individuais e permite que o aluno explore

melodias; 3) a posição de arco, consiste em tocar com os dedos 1 e 5 ao mesmo tempo

(intervalo de quinta vazia). Cada arco é nomeado pela sua tecla mais grave e é usado

para realizar acompanhamentos harmônicos de melodias simples; 4) a posição aberta

(ou de cinco dedos) que consiste em tocar com os 5 dedos alternadamente sobre cinco

graus conjuntos, é usada para explorar as relações espaciais e as combinações de

dedilhados possíveis para tocar os intervalos de 2as e 3as melódicas.

O espaço tátil é coordenado com o cinestésico para realizar os movimentos

verticais necessários para atacar o som e manter suas durações (ações de tocar e soltar

as teclas) e também, os movimentos laterais (que levam as mãos da esquerda para a

direita e vice-versa) dirigidos pelos braços para realizar as transformações de alturas do

som. A criança ouve o som resultante destas ações (quando o professor toca) e aprende

59 Cluster é uma palavra em inglês quer dizer “cacho”.

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que para tocar um som agudo deve dirigir suas mãos para a direita, mas para tocar sons

graves, deve dirigi-las para a esquerda.

Para trabalhar as durações, a professora solicita a coordenação dos espaços

visual, auditivo, cinestésico, vocal e tátil. Primeiramente as durações são vivenciadas

através da imitação da professora. Neste caso, esquemas visuais e auditivos são

seguidos por esquemas táteis, visuais e auditivos.

Posteriormente as durações são praticadas por meio de jogos de cartões que as

crianças lêem batendo palmas, cantando e verbalizando com as palavras “longo” ou

“curto”. Busca-se aí a internalização de um tempo não métrico (longo ou curto) através

dos espaços visuais, táteis, vocais e auditivos. Neste momento, considera-se que as

crianças possam apresentar diferenças de velocidade na percepção do tempo e que a

métrica é adquirida a partir da conservação da noção de pulsação.

Ao ensinar a criança a tocar de ouvido melodias que ela às vezes pede para tocar,

e que já conhece de ouvido, a professora solicita que os alunos usem seus esquemas

auditivos para explorar nas teclas brancas e pretas, os ajustes necessários para realizar as

melodias como eles as conhecem.

C. A Notação e o Fazer Musical sobre a Topografia do Piano

A notação mediadora60 é utilizada inicialmente pela professora em jogos de

cartões que os alunos organizam uns para os outros, e logo em seguida o uso de figuras

quadradas que representam as durações não métricas (longo ou curto) e são tocadas com

as posições de cluster ou fechada.

60 Notação mediadora é uma forma de registro dos sons pela escrita, compreendida por meio de alguma convenção pré-estabelecida pelo grupo que a constrói ou a utiliza e, em geral, é mais simples e menos precisa do que a notação convencional da música erudita, pois não leva em conta todas as regras envolvidas nesta.

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Posteriormente através da coordenação dos espaços visual, tátil e vocal, as

durações são representadas por notas redondas, são lidas e verbalizadas através das

sílabas: “Ta”- semínima. “Táa”- mínima. “Táaa” - mínima pontuada.

Resta saber se, nas aulas, o aumento de precisão solicitado dos alunos é

resultado de uma atividade de comparação entre as durações (Tá é a mais curta; Táa é

mais longa do que Tá; e Táaa é a mais longa de todas) o que indicaria a gênese de um

processo operativo (classificação das durações).

Do ponto de vista do parâmetro de alturas, o teclado do Piano oferece uma

organização visual que facilita a compreensão da lógica da notação convencional. Cada

tecla a ser tocada corresponde a um determinado signo de altura a ser localizado na

pauta.

As teclas brancas do piano são organizadas de maneira que podemos tocar a escala diatônica de Dó Maior sem usar as teclas pretas. As teclas pretas são facilmente associadas às alterações de # ou b. Mas isso é uma ilusão. Sabemos que as teclas brancas podem ser usadas para tocar sons alterados, e que tudo depende do ponto de partida do movimento melódico...por isso acredito que não é pelas particularidades que devemos começar. Antes de dar nome às teclas elas devem ser conhecidas pela descrição dos lugares que ocupam no teclado pelas noções de lateralidade e vizinhança. (Professora de piano) Como se sabe, os esquemas táteis se coordenam com os visuais e auditivos

desde o período sensório-motor, após se instalarem sobre os reflexos pré-formados do

sujeito. Talvez por este motivo, a criança apresenta uma tendência natural em controlar

a ação das mãos pelo olhar ao tocar um instrumento musical.

No método adotado pela professora de piano, mesmo na notação mediadora, os

signos são configurados, desde o início, através de eixos imaginários no sentido vertical

(grave-agudo) e horizontal (seqüência temporal).

Espaço visual: As primeiras peças que a criança toca por leitura são escritas com semínimas e mínimas dispostas no papel sem pauta em três alturas diferentes, para serem tocadas nas teclas do grupo de três teclas pretas. A criança bate palmas falando o ritmo, depois aponta o dedo sobre as figuras e vai falando: “sobe, repete, desce...”. Esta atividade é muito praticada nos primeiro ano, como uma forma de solfejo, mas sem os nomes de notas. Eu digo: “Bata falando Tás ou Taás”; ou eu peço: diga o “desenho melódico”, e eles já sabem o que eu estou pedindo.

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Esta configuração presente na representação gráfica da música contraria alguns

movimentos realizados pelas mãos sobre o teclado. A ação sobre o teclado se realizando

sem o uso da notação, desde o início do contato do aluno com o piano, pressupõe uma

assimilação dos movimentos laterais realizados pelos braços e mãos aos esquemas táteis

e visuais que o aluno constrói sobre tais movimentos.

No caso da professora de piano, ela procura levar os alunos a desenvolver a

percepção tátil para localizar as teclas pelas pontas dos dedos, sem olhar para elas,

porque, além do tempo que se perde ao deslocar os olhar do papel para o teclado,

constata a ocorrência de um conflito cognitivo no processo de adaptação dos alunos na

assimilação das direções do movimento das mãos durante o fazer musical e o do

movimento dos olhos para a leitura da notação convencional.

Este conflito vem da solicitação do olhar para acompanhar a escrita da esquerda

para a direita. Este sentido horizontal “esquerda-direita” indica uma significação

temporal de sucessão para a lateralidade, de começo-meio-fim. No instrumento, no

entanto, o uso da lateralidade (esquerda-direta-esquerda) sobre o teclado tem a função

de realizar transformações de alturas do som (grave-agudo-grave).

A leitura de melodias escritas sem a pauta já leva em consideração a seqüência ordenada dos sons, e é representada da esquerda para a direita, como na escrita tradicional. Este movimento também exige uma organização do olhar para ler a partitura, e é independente daquele usado para encontrar os lugares certos de tocar no teclado. As partituras nas quais as notas são escritas sem o uso de linhas e espaços, mas

obedecendo a ordem exposta da esquerda para a direita, em eixos horizontal (tempo) e

vertical (altura) levam a criança a perceber pelo “solfejo”, o movimento do som (sobe,

repete, desce). Antes de tocar, ela aprende a controlar o olhar através destes mesmos

eixos. Vemos aí o pensamento operatório sendo exercitado através do que Piaget chama

de relações projetivas e euclidianas na construção do espaço.

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Para estabelecer a correspondência termo a termo entre os signos da notação e os

lugares onde eles são tocados no teclado do piano, a professora pede que os alunos

descrevam as teclas a partir das relações de vizinhança. Esta atividade parte da idéia do

teclado como objeto e suas propriedades infralógicas se caracterizam por relações de

vizinhança e de ordem.

No grupo de duas e três teclas pretas temos a primeira e a segunda do grupo de duas pretas, assim como a primeira, segunda e terceira do grupo de três pretas. Na frente delas, temos a localização das teclas brancas que são ordenadas também da esquerda para a direita e podem ser localizadas em relação às pretas. Assim, temos a tecla branca que fica antes da primeira do grupo de duas; a que fica entre a primeira e a segunda tecla preta do grupo de duas; e a que fica depois da segunda do grupo de duas. Este esquema de organização espacial se repete nas que ficam na frente do grupo de três teclas pretas. (Professora de piano) Segundo a professora de Piano, somente depois de levar a criança a exercitar as

relações topológicas do teclado, é ensinado o nome das teclas brancas: Dó, Ré, Mi, Fá,

Sol, Lá, Si. Desta maneira, a relação entre os sons na pauta e no teclado é estabelecida

por uma coincidência eficaz entre a seriação do sons (percebido pelo espaço auditivo

nas relações das alturas) e a ordenação estabelecida para a nomeação das teclas: o Dó,

que é mais grave fica à esquerda do Ré, que é mais agudo que Dó, e fica à sua direita. O

Ré fica à esquerda do Mi, etc. - tal como acontece quando escrevemos a escala no

pentagrama.

Assim que a criança aprende o nome das notas, a fôrma de arco produzindo o

intervalo harmônico de quinta (arco) é muito interessante para introduzir a notação

mediadora de Cifras61 e, com elas, a vivência dos princípios da harmonia. Os arcos

recebem o nome de suas teclas mais graves, que são representados pelas letras que

nomeiam as notas nos países de línguas anglo-saxônicas: A, B, C, D, E, F, G. Portanto,

ao ler “A” a criança pensa no bloco de sons “La-Mi”.

61 A bibliografia sobre Educação Musical considera a existência de três tipos de notação: a convencional, a mediadora e a contemporânea. A Cifra, também chamada de notação alfabética, é considerada como uma notação mediadora.

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A pauta é introduzida gradativamente, e as crianças levam em conta o ponto de

partida da melodia e a relação intervalar entre os sons. As relações projetivas são

estabelecidas através de um sistema de referência estável que, neste momento, são as

teclas e as alturas produzidas pelo sujeito que as toca. Posteriormente, as claves na pauta

substituirão a referência concreta do teclado tornando-se, então, uma representação

desta referência auditiva e espacial.

A Pauta é construída aos poucos e fica completa no final do primeiro ano ou início do segundo ano. Começamos com uma linha e depois duas, para representar sons repetidos nas linhas e espaços e vamos construindo a pauta gradativa, acrescentando linhas e espaços de acordo com a necessidade de representar mais alturas, e sempre relacionando estas representações dos dedos das mãos e das teclas usadas no instrumento, concomitantemente. (Professora de piano) Existe uma coerência entre a escrita no pentagrama, o dedilhado sobre as teclas

e o resultado sonoro no piano. Assim, para os movimentos sonoros iniciais temos os

seguintes dedilhados:

Quadro 5. Organização dos sons, dedos e teclas nos movimentos iniciais ao piano Sobe

Auditivo Visual na partitura Esquema tátil Visual topográfico Passo acima (movimento de 2ª. ascendente)

linha para espaço; espaço para linha

Toca um dedo e o dedo vizinho M.D. (1-2; 2-3; 3-4; 4-5) M.E. (5-4; 4-3; 3-2; 2-1)

Tecla vizinha (da esquerda para a direita)

Salto acima (movimento de 3ª. ascendente)

linha para linha; espaço para espaço

Toca um dedo, pula um dedo, toca outro dedo M.D.(1-3; 2-4; 3-5) M.E (5-3; 4-2; 3-1)

Toca uma tecla, pula uma tecla, toca a tecla seguinte.

Fica no mesmo lugar na mesma linha Toca com o mesmo

dedo (1-1; 2-2; 3-3; 4-4; 5-5)

Toca na mesma tecla Notas repetidas

no mesmo espaço Toca com o mesmo dedo (1-1; 2-2; 3-3; 4-4; 5-5)

Toca na mesma tecla

Desce Passo abaixo (movimento de 2ª. descendente)

linha para espaço ou espaço para linha

Toca um dedo e o dedo vizinho MD (5-4; 4-3; 3-2; 2-1) ME (1-2; 2-3; 3-4; 4-5)

Tecla vizinha (da direita para a esquerda)

Salto abaixo (movimento de 3ª. descendente)

linha para linha ou espaço para espaço

Toca um dedo, pula um dedo, toca outro dedo MD (5-3; 4-2; 3-1) ME (1-3; 2-4; 3-5)

Toca uma tecla, pula uma tecla, toca a tecla seguinte (da direita para a esquerda).

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D. As idades das crianças e a prática musical com o Piano

A maior dificuldade da professora de piano ao trabalhar com crianças menores

do que sete anos de idade foi a memória. Ela conta que as crianças se esqueciam do que

haviam aprendido na aula anterior.

Desenvolvimento Musical: A minha experiência com crianças abaixo de 7 anos e não alfabetizadas é menor do que com crianças desta outra condição, mas o que me impressiona é que às vezes em que trabalhei com crianças menores, elas não conseguiam se lembrar do que haviam conseguido realizar na aula anterior. Tínhamos que repetir sempre as mesmas coisas. Talvez a memória exigisse o desenvolvimento de estruturas mentais que elas ainda não haviam adquirido... Talvez o método que eu utilizei para ensiná-las não tenha sido adequado. (Professora de piano) De acordo com o conceito de memória de Piaget, encontramos coerência na

dificuldade exposta pela professora, pois a assimilação das atividades requer uma

organização interna do indivíduo, que não pode ser dissociada dos processos externos.

Se os esquemas do sujeito não conseguem assimilar os conteúdos da maneira como são

trabalhados pela professora, essas crianças não os assimilam e consequentemente, não

os retém na memória.

4.1.3 A Fala dos Professores de Estruturação e Percepção Musical

4.1.3.1 A instrução em Estruturação e Percepção Musical - EPEM 1

Ao abordarmos o trabalho feito nas classes de Estruturação e Percepção Musical,

salta aos olhos a presença de um espaço maior para a movimentação de um grupo

grande de crianças, a presença de carteiras e de cadernos para os alunos se sentarem e

escreverem música.

O método usado pela professora é permeado de referências metodológicas já

consagradas na história da educação musical do século XX. Notamos a presença de

idéias de Jaques Dalcroze, de Lucas Ciavatta, assim como de Gazzi de Sá.

Como a relação sujeito-objeto nesta aula não depende do instrumento musical

como objeto intermediário, quase tudo na aula é voltado para uma reflexão sobre o

fazer. Mas é um fazer que usa o corpo como instrumento. Inserido no espaço, o corpo

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expande sua ação por toda a sala, e a partir desta experiência, procura-se verbalizar

sobre a música e assim, construir conceitos musicais.

A diferença de objetivos para os quais se voltam os professores das duas

disciplinas se evidencia: nas aulas de instrumento têm-se o objetivo de construir a

técnica para um fazer musical posterior e a eficácia da execução musical é a finalidade

de todo o trabalho do professor e do aluno, enquanto que nas aulas de EPEM, a técnica

é ampliada para um uso global do corpo, da voz, dos limites e possibilidades que estes

“instrumentos”, por serem usados pelas crianças desde o nascimento, propiciam um

fazer musical mais próximo do uso cotidiano do corpo. Sobretudo, tal ampliação visa

um apropriação da experiência física para o plano representativo, e em seguida para a

construção da leitura e da escrita da notação convencional da música erudita.

A. Sequência dos Conteúdos Musicais em EPEM 1

A disciplina EPEM foi a primeira para a qual a equipe pedagógica da Escola de

Música Villa-Lobos formalizou62 um programa de conteúdos a ser seguida por todos os

professores. Embora neste programa os conteúdos sejam distribuídos principalmente

pelos parâmetros de duração e alturas, a professora afirmou que a intenção de privilegiar

algum dos parâmetros do som nas atividades de uma aula é meramente didático, pois na

verdade, “o som não é destituído de outros parâmetros, os parâmetros estão ali

interligados, mas a gente tem o foco.” (Professora de EPEM).

Para levar os alunos a construírem seus próprios conceitos sobre o som, a

professora propõe atividades nas quais eles têm que criar sons. Por exemplo, sons que

sugerem os eventos de uma estória. Para contá-la eles têm que se expressar sem o uso

de palavras, e assim, ao agir sobre o som, acabam construindo conhecimento.

62 Esta formalização ocorreu no ano de 2004, quando foi redigido um Plano de Curso, ao qual, infelizmente, não tivemos acesso durante a coleta de dados.

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Vemos neste exemplo a típica interação sujeito-objeto. Os sons passam a ser

tratados como imitação do real. Passam a ter significados, ou melhor, passam a ser

significantes.

A partir do tema, a gente vai criar a história [...] A partir do momento em que está criada, a gente relembra a estória, brinca [...]. Aí tem um momento que eu falo: “agora a gente está numa turma em que as pessoas não falam [...] a gente vai contar essa estória através de sons, mas esses sons não podem ser palavras. Não pode ser: o menino caiu no chão. [...] o que acontece quando um menino cai no chão? Vem um aqui....” Aí, geralmente todo mundo cai. “Bom, que som que a gente fez? Agora, como é que a gente pode fazer esse som sentado no lugar usando a boca? Agora usando a mão? agora usando o pé?” Então, pra eles poderem compreender que o corpo pode imitar esse som ou o contrário. A gente pode fazer, com um objeto, o som que o próprio corpo faz, a imitação desse som. (Professora de EPEM). Os conteúdos trabalhados no primeiro ano, do ponto de vista dos parâmetros

sonoros, são derivados da tentativa de registrar as experiências físicas que os alunos

vivenciam primeiro com o próprio corpo. Esta escrita, no início não convencional, é um

caminho para entrar no âmbito da escrita convencional, que é apresentada

gradativamente sempre como a culminância de uma atividade prática.

Então, começa assim: primeiro bimestre é muito mais trabalho corporal e pouca coisa, nada ainda do formal, da linguagem formal de música, a escrita é não-convencional. Aí a gente puxa esse gancho do que eles já estavam fazendo e jogo direto as figuras, sem muita preocupação. São duas colcheias, é a semínima, sabe? Mesmo que ele não aprenda, que ele faça confusão com aqueles nomes, pra mim o importante é que ele reconheça o símbolo e o nome, com o uso, ele vai aprendendo. E aí a gente vai nesse crescendo até o final do ano, quando ele já está trabalhando a divisão binária, a ternária menos um pouquinho e quaternária, e escrevendo na clave de Fá e na clave de Sol e fazendo transposição de uma clave pra outra. (Professora de EPEM, grifos nossos).

Ao se movimentar pela sala o aluno expressa os parâmetros que ouve

separadamente: o ritmo ou as alturas. No entanto, quando os alunos estão representando

os parâmetros de altura e duração por meio de exercícios de ditado, a professora acha

importante não separar os parâmetros do som.

Um ditado às vezes muito simples, que acontece lá pro final [da aula]. Aí eles têm a preocupação de pegar o ritmo e a altura, tudo ao mesmo tempo. [Também tem que] dividir compasso,[...] desde o início, eu não faço ditado separando nada. A partir do momento que entra aquele componente [ritmo, melodia, divisão de compasso] ele passa a fazer parte [do ditado]. Eles não ficam “toca isso”, “agora pega o ritmo”. A gente faz, sim, separado, [quando é para se movimentar]: eu vou tocar e eles vão levantar e vão fazer o ritmo, vão descobrir qual o compasso [é] fazendo os passos. Quer dizer, a gente fragmenta. Mas, eu apresento a melodia e aí depois quando eles sentam pra escrever, eles sentam pra escrever tudo. (Professora de EPEM, grifos nossos).

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Além dos parâmetros de duração e alturas, outros itens presentes na partitura,

referentes à interpretação da forma musical fazem parte das atividades promovidas pela

professora de EPEM.

Não é o ritmo e a altura, mas são as outras coisas que estão ali [na música tocada]: se teve um ritornelo, se teve um da capo, se teve um forte, um suave, um crescendo, um decrescendo, stacatto, legatto. Então, a gente começa com uma melodia simples pra poder trabalhar esses parâmetros. Não são só parâmetros, né? Tem os parâmetros ali envolvidos, mas também tem a questão da lógica. (Professora de EPEM, grifos nossos).

Esta professora enfatizou sua preocupação em levar seus alunos a vivenciarem a

continuidade do som. Para que a criança não associe a descontinuidade dos símbolos

musicais com um “vazio” temporal entre um ataque e outro do som, ela usa gestos que

ajudam o aluno a compreender a continuidade do som. Além disso, mostra como eles

devem se movimentar pela sala usando um andar sem fazer movimentos bruscos, ou ao

bater palmas faz gestos e canta acompanhando o movimento das mãos.

Quer dizer, o som, ele, você emite o som, mas ele continua soando. [...] Isso é uma coisa que eu tenho uma preocupação muito grande, porque a maioria [dos alunos] se eles querem a semínima, [fazem] assim “ta, ta, ta” (três sons curtos junto com palmas). Fez a semínima e (acabou). Não! [...] a semínima tem uma duração. Ela só termina, o pulso, né, o pulso só termina pertinho do início do outro, tem um tempo inteiro pra ele fazer. [...]A mudança e a transformação que [o som] tem, a partir do movimento que ele [o aluno] faz, ele consegue ligar o que ele ouve e o que ele emite. (Professora de EPEM) De uma forma prática, a professora de EPEM leva seus alunos a vivenciarem a

continuidade do tempo através do movimento de seu corpo no espaço. As crianças

assim podem entrar em contado com os elementos constituintes do espaço topológico,

ou seja, das continuidades do objeto musical inserido num espaço euclidiano onde seu

corpo se relaciona com as descontinuidades dos passos, dos sons, do bater palmas.

Dessa maneira, elas vão criando com seu próprio corpo, inserido no espaço, outras

dimensões do contínuo e do descontínuo musical.

B. Os Espaços Práticos do Sujeito nas atividades de EPEM 1

Como as atividades desta aula se caracterizam pela vivência do ritmo

corporalmente e pela busca em representar as transformações do som através de gestos,

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os espaços práticos – no sentido que têm de serem as “portas perceptivas” do sujeito - se

ampliam pelo corpo. O cuidado com a postura dos alunos para uma boa emissão da

voz, ou uma boa movimentação dele no meio do grupo, é importante para o melhor

aproveitamento de suas experiências.

A professora diz passar boa parte do tempo da aula solicitando a atenção dos

alunos para estes detalhes. Mesmo, que o corpo todo faça parte das atenções dos

professores de instrumento, vemos que naquelas aulas os professores solicitam um

cuidado especial para o uso das mãos sobre o instrumento. Aqui, o instrumento

privilegiado é o corpo em movimento e a voz.

A postura, [...] é relacionada à respiração, [...] no EPEM a gente trabalha com canto, mesmo que seja em nível de solfejo [...] Então, quando a gente faz algum exercício, mesmo sentado, eu tenho sempre essa preocupação de como é que [o aluno] vai sentar, com as perninhas no chão. Nem todos conseguem colocar a perninha no chão porque a gente não tem cadeira, então apóia aqui assim nessa gradezinha aqui de baixo [da carteira]. Bom, tem esse lado postural pensando em como ele consegue cantar bem sem esforço. E aí ele vai conseguir também, às vezes só pela postura, aqueles que cantam tudo muito grave, só pela mudança de postura, ele já consegue emitir um som mais agudo. (Professora de EPEM) Ao distribuir a técnica por todo o corpo, vemos o trabalho para que os pés

adquiram uma sutileza que raramente lhe é solicitada. A suavidade dos movimentos

precisa ser construída para que o tempo ganhe uma continuidade, marcada suavemente

pelo descontínuo toque dos pés pelo chão.

Então, o movimento, andando suavemente. E isso a gente tem trabalhado bastante, essa suavidade nos pés, pra que o pé não passe a ser um metrônomo. Nada que fique marcando o pulso, sabe? Ele anda, ele tem que sentir a pulsação internamente, andar naquela pulsação, mas sem marcar sonoramente aquele pulso. (Professora de EPEM) As atividades do método O Passo, desenvolvido por Lucas Ciavatta (2003), tem

sido muito utilizadas por esta professora para desenvolver a representação do ritmo em

seus alunos de EPEM. Este método parte de quatro princípios: o pulso, a representação,

o grupo e a cultura. Mas o que mais chama a atenção da professora é a possibilidade

fazer a criança situar a métrica e as durações da música que canta, através do

movimento do andar.

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Quando a criança faz o passo, o corpo a ajuda a perceber o “lugar” do evento

sonoro. Este lugar é uma sugestão, já que o som não fica no lugar, mas como o som

acontece no momento em que ele está pisando e falando o “um” ou o “dois”, fica claro a

ordenação do som, e também que o som tem a mesma duração do movimento.

A preocupação com a lateralidade, que será importante para o aluno também na

técnica de qualquer instrumento, tem sido trabalhada nas aulas através deste método. A

professora afirma que para as crianças na idade em que eles começam os estudos na

EMVL (de 7 a 12 anos), é uma necessidade. Quanto menos idade, menos escolaridade,

mais dificuldades de lateralidade as crianças apresentam.

Quando acontece de a criança não ser destra (ser canhota), sua particularidade

motora é respeitada, e em geral a criança é colocada numa posição onde pode observar a

ação do colega de frente.

Então, O Passo tem a questão da lateralidade. Com esse movimento, fazendo aqueles passos que, inicialmente, é um quaternário, você [...] respeita o aluno que é destro e o aluno que é canhoto. [...] Então, quem é destro de um lado, quem é canhoto do outro e aí eles fazem o movimento juntos, [...] Agora, a partir do momento que é definido quem é quem, sempre os passos começam [no mesmo pé]. Porque aí você também vai fixando aquela memória do: um é o pé direito, ou o um é o pé esquerdo. (Professora de EPEM) Assim como o movimento dos pés, o movimento dos braços também é usado

para representar a métrica. Obedecendo a lei da gravidade, a professora combina com os

alunos que o “um” será contado colocando os dois braços voltados para baixo, o “dois”

com as mãos espalmadas no tórax. O “três” é representado pelo movimento dos braços

abertos na altura dos ombros e o “quatro” com os braços esticados levantados para

cima.

Eu gosto disso porque, em geral, os movimentos das crianças não são amplos. Tem a timidez, tem também a repressão. Eu acho que às vezes a gente é tão oprimido no dia-a-dia que tudo da gente fica muito pequeno. [...] Então, tem criança que faz três (braços ao lado, mas flexionados), quatro (braços pra cima, mas flexionados). Então eu trabalho muito [falando para eles]: “não! três (braços bem esticados para os lados), tem que ter espaço, ninguém grudado um no outro, e quatro (braços bem esticados pra cima)”. [...] Então é um movimento que é muito braço, mas ao mesmo tempo tem tórax envolvido, tem espaço, abre o plexo, acho que tem outras coisas que são trabalhadas aí. (Professora de EPEM)

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Vemos aí a representação da métrica nos quatro pontos estipulados, mas também

a duração do som representada pela transformação de uma posição em outra. A intenção

de levar as crianças a experimentarem a sensação de “se abrir” nos faz pensar na relação

entre expansão do espaço corporal e integração do corpo no espaço. A dialética “sujeito-

meio” ganha, se assim podemos chamar, um exercício figurativo de expansão do “eu”

no meio.

Outras formas de aprofundar os conceitos de tempo musical, primeiramente por

meio da representação física destes, e posteriormente repetindo novos elementos

musicais através da leitura, do canto, da escrita, são trabalhadas na aula de EPEM. A

vivência da subdivisão métrica é proposta pela professora por meio dos movimentos

coordenados das palmas com o uso da voz, assim como com o passo sentindo o dobrar

dos joelhos.

Trabalhando a subdivisão, que eu faço, por exemplo, eu tenho o pulso, ou então eu faço “pá-pá, pá-pá, pá-pá” (o primeiro pá mais agudo e o segundo mais grave, batendo palmas no primeiro), [...] Eu estou andando no pulso e essa subdivisão, esse meio, a segunda colcheia, ela não coincide com o pé [...] e o próprio movimento d’O Passo, a gente faz “um” e (pisa com o pé direito e levanta o joelho), o joelho dá esse movimento da colcheia, ele trás [a noção da metade do pulso]. (Professora de EPEM) Também a referência da pulsação é melhor assimilada se o aluno relacionar os

momentos de sincronia e diacronia entre o ritmo de sons mais curtos feito pelas palmas

e o ritmo com sons mais longos feito pelos pés.

O movimento é super importante pra ele compreender [o ritmo] (bate palma duas vezes rápido) e não é (bate palma duas vezes lento). [...] São duas batidas, são dois pulsos. [Alguém pode argumentar:] “Ah, mas foram duas batidas.” Então, qual a diferença de duas batidas mais rápidas, que são as colcheias e duas batidas no pulso que são duas semínimas, ou duas semínimas e duas mínimas, qual vai ser a diferença? A diferença está vinculada ao movimento que ele faz e esse movimento não é no instrumento, é feito mais no corpo físico. (Professora de EPEM) Diferente da lógica estabelecida entre o tempo-espaço perceptível na

representação do parâmetro de duração, o parâmetro de alturas contemplado nas

atividades corporais desenvolvidas nas aulas de EPEM, exige um tratamento anterior

via notação. Notamos, pela fala da professora, que este trabalho é posterior a uma

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sugestão feita graficamente através da escrita não convencional. As crianças, então, são

convidadas a movimentar as mãos e os braços para representar o que ouvem.

A gente faz o movimento com a mão, porque é tão legal como eles reagem bem a esse (levanta os braços), a maioria, raras exceções o contrário. Quando eles não estão preocupados com as notas, que eles estão fazendo o movimento só pelo som, eles têm mais facilidade de fazer a subida e a descida, porque a gente já trabalhou isso sem a grafia convencional. Então, quando eu faço “uh” (canta em glissando do grave pro agudo e volta pro grave). [Quando a gente] desenha isso, geralmente faz isso (faz duas retas no ar, como uma ponta de triangulo). Se eu faço “ah” (uma nota longa bem aguda), ele faz uma linha lá em cima no caderno, ele não faz uma linha lá embaixo no grave. Ele está relacionando com o agudo e não com o grave. Então, quando a gente está trabalhando altura, eu gosto de brincar um pouco com eles com as mãos. (Professora de EPEM) O piano é usado nas aulas como referencial auditivo para as alturas. A

professora toca ao piano e pede que os alunos façam gestos com as mãos representando

as alturas, e também às vezes pede para algum aluno tocar ao piano, enquanto ela

observa. Ela fica olhando para ver como eles representam o som que o colega tocou. A

própria criança deve controlar o gesto dos colegas e alertá-los, demonstrando

reconhecer o gesto correspondente ao som que tocou.

Porque ele tem que saber se ele está vendo certo também. Eu tenho que saber se ele, ele tocou mais pro agudo e a maioria subiu e um não subiu, ele está reconhecendo que aquele um está errado, que aquele um está certo ou a maioria não subiu e um subiu e ele foi com a maioria, [...] Se ele está ligando o fato desse movimento “ascendente” do piano indo pro agudo, se ele está conseguindo visualizar isso no movimento que o coleguinha está fazendo. (Professora de EPEM) Ao falar “movimento ascendente do piano” a professora naturaliza o conceito de

alturas com a conotação ascendente-descendente da disposição dos sons no plano

topográfico do piano. Nós professores somos conduzidos a esta analogia dos planos

verticais (devido à sugestão da escrita vertical para as alturas) com o sentido esquerda-

direita da disposição dos sons no teclado do piano.

Eis um dos dilemas da educação musical quando tentamos partir da

representação dos sons para o fazer musical. Se a construção endógena do

conhecimento musical tem que ser feita a partir do contato dos espaços práticos do

sujeito com o meio, com o seu fazer sobre o objeto, concluímos que a representação não

deveria ser direcionada para a escrita antes que seja construída internamente.

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Num segundo momento, para ser socializado, este conhecimento precisa das

convenções. Como levar a criança a construir o conceito de alturas, por exemplo, sem

que ela tenha que aceitar as “meias verdades” dos símbolos da notação convencional?

Acreditamos que, desde que ela tenha passado pelo processo de construção interna e de

que seja alertada para o fato de que, para falar sobre algo precisamos definir códigos de

identidade, isso pode ser feito sem negar a própria inteligência da criança.

C. A Notação e o Fazer Musical no espaço da sala de aula de EPEM 1

Para sistematizar o fazer musical, na sala de aula de EPEM parte-se do fazer

para o registrar através da notação musical. Para dominar esta competência, é necessário

partir da referência auditiva. Sendo esta referência uma altura que se produz numa

determinada freqüência, ela é representada na notação convencional por uma nota na

linha ou no espaço, referendada por uma clave que determina qual é o nome daquela

altura.

No teclado do piano, por exemplo, do lado esquerdo temos os sons graves. A

clave usada para referendar os sons graves na pauta, é a clave de Fá. Quanto mais para

o lado direito do teclado, mais os sons vão ficando agudos e eles vão sendo

representados por notas cada vez mais para cima no pentagrama. Quando chegamos na

região média do piano, podemos escrever tanto com linhas suplementares superiores no

pentagrama da clave de Fá, como construir outra pauta, agora para os sons agudos. Para

estes usamos outra clave, a de sol, que vem referendar os sons agudos que se tocam do

meio para o lado direito do teclado.

Na aula de EPEM, onde a professora não utiliza outro instrumento de alturas

definidas além do piano, vemos que, necessariamente, no momento de grafar as alturas

definidas, este instrumento é uma referência visual para as particularidades do sistema

tonal ao qual nossos ouvidos estão impregnados pela cultura em que vivemos.

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Ao tocarem a escala diatônica nas teclas brancas começando na tecla Dó do

piano, tudo parece fácil. O teclado deste instrumento foi construído para ser didático.

Também quando começamos numa outra tecla, os ajustes necessários através das teclas

pretas ilustram perfeitamente a organização diatônica do sistema.

A professora de EPEM entrevistada afirma que para a construção das noções de

altura pelo aluno, há uma maior solicitação de seus espaços visual e auditivo do que do

espaço cinestésico.

Então, eles vão até o piano, e [a gente] delimita [um espaço] começando no dó3, na região da voz deles. Procuro o dó, procuro o fá e procuro o sol. Fazemos a escala tocando notinha por notinha e aí eles vão descobrindo que, “opa”, a escala ficou diferente porque eles só tocaram a branca. “Por que ficou diferente?” Então a gente mostra esse espaço que tem entre o mi-fá, e entre o si-dó. [...] Então, o teclado do piano me ajuda muito nesse sentido, porque visualmente é fácil. [...] é bom porque a criança pode brincar e ela descobrir que ela tem que subir na alteração, [...] vai juntando o melódico com [...] o visual e a sensação auditiva, mais do que com o próprio movimento. (Professora de EPEM). Para sugerir a distribuição vertical dos sons na notação, a professora chega a

posicionar o teclado de um metalofone de maneira a fazer os alunos visualizarem a ação

de tocar de baixo para cima. Assim fica sendo coerente com a grafia que se usa na

notação convencional para o resultado sonoro do grave para o agudo.

O que é “subiu e desceu”, principalmente quanto eu toco um piano que não sobe nem desce? Ele fica (e mostra o plano horizontal). Então, eu gosto de pegar o metalofone e botar ele em pé pra mostrar o som subindo, pra mostrar essa relação. (Professora de EPEM).

Para começar a escrever música nesta aula o material usado inicialmente é um

caderno de desenho e posteriormente um caderno com pauta especialmente planejado

para crianças - o “Pautando as Sete”. Este caderno tem poucas pautas e elas são mais

largas, o que facilita a construção da escrita e leitura musical pelos iniciantes.

Na fase inicial do curso as representações que a criança cria para suas vivencias

na aula são registradas no caderno de desenho. São tentativas de construção de uma

grafia não convencional pela criança, e nestas são usados gráficos sobre o movimento

sonoro. “É registrar cada um do seu jeito” – diz a professora.

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Eu faço alguma coisa com desenho, [...] e peço, sim, pra eles criarem um som pra aquilo que eu estou fazendo de desenho. Eu não dou o som e o desenho. Eu dou o desenho, a grafia e peço pra eles sonorizarem. (Professora de EPEM) Além de fazer o exercício da representação do desenho pelo som, a professora

pede que as crianças façam um desenho para um determinado som. Para conduzir a

criação de critérios para a leitura a professora apresenta figuras e pede para eles

sonorizarem, ou faz um som para que eles escolham o desenho adequado. Assim, vai

colocando problemas para eles criarem critérios próprios para a escrita.

Algumas coisas [desenhos] que podem ser [ou representar] aquele mesmo som, pra eles não acharem que [...] ah, toda vez que eles ouvirem um som forte, eles vão desenhar isso, senão eles partem pra isso, eles partem pra cópia. Então eu coloco várias coisas: “Esse?”, aí o outro fala: “não! eu acho aquele”. “Ah, esse também”. Quer dizer, aí eles começam a ver que tem várias maneiras deles representarem aquilo.[...] começamos então a criar, a fazer o inverso. Eu faço um som e eles vão escrever. (Professora de EPEM) Para a turma dos alunos mais novos, que não são alfabetizados, a professora tem

que combinar uma convenção gráfica para representar os sons.

Então, por exemplo, [...] eu coloco um círculo. Agora, alguém fez um grito, você tem que representar. Esse círculo é o símbolo desse grito, como é que você representa? Aí ele muda, pinta tudo forte ou ele faz bem forte em volta e grande. (Professora de EPEM) A verticalidade e horizontalidade da representação gráfica da música é uma

questão muito importante nesta fase pois mesmo antes de introduzir a notação musical,

o eixo horizontal, para crianças não alfabetizadas deve ser trabalhado:

Para trabalhar a grafia não convencional, seja ela como for, [...] Eu trago alguma coisa, peço a eles pra sonorizar. Claro que eu vou conduzindo, se eu quero um som ascendente, porque principalmente quando eu tenho as crianças pequenas, que ainda não tem aquela maturidade, se eu mostro um risco assim (mão esquerda mais embaixo e mão direita mais acima), é muito fácil pra eles fazerem “ah” (glissando do agudo pro grave) ao invés de “ah” (glissando do grave pro agudo). [...] Pra eles, pode começar de qualquer lado, [...] pode começar da direita pra esquerda como da esquerda pra direita. Eles ainda não têm esse conceito da leitura que é o nosso, que é da esquerda pra direita. (Professora de EPEM) A professora comenta que as convenções da escrita também são questionáveis

mesmo pelos os alunos mais velhos e é importante o professor conduzir o olhar deles e

reforçar estas convenções.

Então, quando a gente for ler, não importa se está lá em cima, porque às vezes, o “em cima” é mais forte pra eles do que a esquerda e a direta. [...] Então, é essa [...] que é a minha condução, pra evitar que eles leiam de trás pra frente, ou que tenha uma linha subindo e eles façam descendente. (Professora de EPEM)

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Dentre as tentativas de invenção do registro, a professora conta que solicita ao

aluno a criação da grafia do som de alguém sussurrando, ou de alguém gritando. Além

disso, ela faz aproximações com outros tipos de grafia de sons, tais como aquela usada

para representar sons nas histórias em quadrinhos.

Tem muita coisa, que é falada, contando a história, tem letra, tem palavras, [por exemplo, se] ele está dormindo, aparece aquele “zzzz”. [...] Então, a gente brinca com isso e às vezes monta uma coisinha aqui na aula. É coisa rápida, mas que depois eu vou trabalhando, eles têm que escrever. (Professora de EPEM)

Depois desta fase inicial, trata-se de introduzir a notação convencional das

durações e alturas. Para isso ela usa o caderno com pauta e para as alturas, canta alguma

canção que apresente os nomes das notas na letra, as crianças aprendem a cantar, depois

a escrever, tudo de forma mais tradicional, já que é uma fase de transposição do plano

não convencional, criado pelo aluno, para o plano da representação socialmente

constituída.

No caso das durações, esta professora conta que já usou para iniciar, as figuras

mais longas (semibreve e mínimas), mas atualmente tem usado figuras mais curtas

como semínimas e colcheias obtendo melhores resultados. Segundo ela, estas figuras

combinam melhor com a velocidade da conduta infantil.

A criança, ela tem um ritmo mais rápido. [...] A própria pulsação dela é bem rapidinha.[...] Então, a gente começa a trabalhar com a figura e nome de nota. E aí, às vezes, uma nota só, mas pra já colocar a figura, o ritmo. E o contrário depois. Aí eu tenho o ritmo, eu tenho que colocar uma ou duas notas. (Professora de EPEM) A pauta e as claves constituem outro elemento importante da notação a ser

construído nesta fase. Elas introduzem a abrangência das regiões grave –médio-agudo, e

a adequação de seu uso para a representar o instrumento ou a voz que irá cantar.

Assim, dou a ênfase na [clave de] Dó, depois eu jogo logo [a clave de] Sol e Fá. [...] eles não conseguem cantar na clave de Fá. É muito grave pra eles cantarem. Então eu faço [eles] ouvirem na clave de Fá e depois, quando eu toco, eu toco na região do dó2 e também na do dó3 ao dó4, que é pra eles cantarem na região que eles podem cantar, mas ouvindo, relacionando, já àquele som mais grave. Porque aí eles sabem que eles vão ter que escrever na clave de Fá ou se eles vão ter que escrever na clave de Sol. (Professora de EPEM)

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Assim as crianças vão se especializando no uso da clave que aparecerá nas

partituras que irão ler para tocar o instrumento escolhido por elas.

E a clave de Dó fica pra mim, pra eu brincar com ela ali no meio e, mais tarde, se alguém vai pra viola [...] ele já tem isso aí, é uma questão dele relembrar e começar a trabalhar, não tem problema. (Professora de EPEM) Os pontos de referência nos instrumentos para a notação são abordados na aula

de EPEM. Por volta do segundo bimestre, os alunos são levados a passear pela escola,

visitando as salas de aulas, ouvindo o som e os comentários dos professores de vários

instrumentos. Depois voltam para a sala e discutem sobre as famílias dos instrumentos,

em que região soam e quais claves são usadas para a escrita feita para eles. Além disso,

relacionam as tessituras dos instrumentos. Chegam até a construir a lei de que a relação

grave-agudo depende do som que é o ponto de partida.

Aí a gente começa a discutir, em cada família, se tem agudo e grave. Chamar a atenção pro tamanho do instrumento. Quanto maior o corpo do instrumento, mais grave o som que ele emite. Mas ele só emite sons graves? […] ou o contrário? Ou ele também faz agudo? Porque às vezes a tendência é: o contrabaixo é grave. Tudo bem. Mas ele faz som agudo? Qual é o agudo que ele vai? Esse agudo que ele vai coincide com outro, com as notas que o outro instrumento toca? Coincide. Ah, mas olha só, é agudo, mas isso aqui não é agudo ainda pra esse outro instrumento, é mais ou menos. Pra ver que grave, médio e agudo, depende do meu ponto de partida. [...] Tento trazer algumas gravações e fazer essa relação, principalmente quando eu estou estudando clave. (Professora de EPEM) Para contribuir com a construção da noção de ritmo pelos alunos, a professora

incentiva os alunos a utilizarem seus esquemas sensório-motores estabelecendo, assim,

referências cinestésicas para esta construção. Exercícios que “personificam” pés e mãos

como “inteligentes”, baseados em Dalcroze, são exemplos da veia metodológica que ela

utiliza.

quando a gente começa a trabalhar com Dalcroze, aquela coisa do movimento, a estabelecer um pulso,[...], a partir daí ele brinca e o pé faz um movimento rítmico e não a marcação do pulso. [...](Professora de EPEM) Dalcroze não privilegia a marcação da métrica, mas faz com que o aluno

vivencie o ritmo através de um movimento plástico, ou seja, os membros inferiores e

superiores alternam a função métrica e rítmica que são coordenadas desde os exercícios

mais simples. O corpo anda pela sala toda, as mãos dançam o ritmo que está escrito

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sobre o quadro negro, as crianças utilizam objetos que são lançados ritmicamente, ou

são incorporados à plástica rítmica que eles criam para expressar um tempo quantitativo

(durações) e qualitativo (expressão do movimento).

eu vi que eram as duas mãos e achei super interessante isso, porque aí você dá a continuidade ao movimento, ele não pára, ele não fica “pá pápá pá” (com uma mão só), sabe? Ele dá essa coisa do movimento que é do som, e eu gostei muito. E eu trabalho isso com eles. [...] Eu posso fazer semínima, colcheia, colcheia, semínima (batendo palma nesse ritmo) como eu posso fazer mínima, semínima, semínima, mínima. [...] Se a minha unidade de tempo é a semínima, eu estou uniformizando ali,[...] quem vai durar um tempo é a semínima. Então, agora vamos marcar esse pulso. Então, esse pulso aqui, ou andando no pulso ou no lugar, pés alternados, eles estão marcando o pulso. E marcando o pulso, eles ouvem esse movimento (palmas). Aí, marcando o pulso, eles também batem palma, fazem “tatatá” ou faz na cadeira, do jeito que eles quiserem. E aí eles vão escrever aquele ritmo que eu estou propondo. (Professora de EPEM) O sistema de contagem das figuras rítmicas é outra estratégia usada para a

construção da escrita musical. Mas o assunto preocupa a professora. Em sua experiência

com outras turmas ela diz que chegou a usar a verbalização do método Gazzi de Sá63.

No entanto, com o tempo notou que sua forma de verbalizar levava a deformações na

acentuação rítmica.

Quando começa a surgir “tatuitu”, por exemplo. O “i”, tatuíto, tatuíto, [...] quando tem “tuí”, quer dizer que você fez uma ligação ali, e o “i” [...] fica muito forte. Tatuíto, tatuíto (acentuando o i). Tanto que eu falava tatuito, tatuito (suavizando o i). Eu achava que essa acentuação criava uma dificuldade pra eles escreverem, porque ficava tão evidente aquela vogal sem o “t” que às vezes a escrita saía errada por conta disso. (Professora de EPEM) Hoje ela prefere usar palavras que ilustram a acentuação musical desejada. Esta

estratégia é lançada por exemplos propostos inicialmente pela professora e, em seguida,

os alunos buscam palavras para as figuras ou células rítmicas dadas.

Hoje em dia, se, por exemplo, eu vou usar a semínima como unidade de tempo, tenho duas colcheias. Então, a semínima eu falo sol, a colcheia eu falo lua (separando as sílabas). Sol, lua, sol, lua, lua. [...] Aí peço a eles pra escolherem [...] sempre com a acentuação tônica na primeira sílaba, pra não ficar “maré”[...] pra trabalhar com as colcheias, lua, uva, nabo...ou seja, usando palavras que sejam fiéis à acentuação musical. [...] Eu bato aqui (bate palmas). Agora fala, coloca essas palavras sol e lua. Aí, depois, agora não vou fazer isso com sol e lua não. Vamos escolher dois animais, um com uma sílaba e outro com duas, ah, cão e gato. Ótimo. Então, agora, eu bato o ritmo e vocês falam as palavras e aí eles vão associando. (Professora de EPEM)

63 Gazzi de Sá é o nome do músico brasileiro, nascido na Paraíba, autor do método de musicalização que leva o seu nome. Segundo Paz (2000) a silabação é um dos recursos que Gazzi de Sá sugere para que os estudantes vivenciem a subdivisão da unidade de tempo. A silabação citada pela professora é a da subdivisão da semínima: Tá = semínima; Ta-ti = duas colcheias; Ta-tu-ti-tu = quatro semicolcheias.

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D.As idades das crianças e a prática musical em EPEM 1

Existe uma turma para crianças não alfabetizadas e menores que sete anos, que

tem o nome de etapa de Musicalização, mas para as crianças que vêm para as turmas de

EPEM só há idade mínima e máxima: de sete a doze anos. Embora a coordenação

pedagógica da EMVL procure evitar turmas com crianças de idades muito diferentes,

não há turmas divididas por idades. Elas são agrupadas pelo conteúdo a ser trabalhado.

Ao entrarem na escola, as crianças fazem um teste de nivelamento e,

dependendo das respostas às solicitações musicais, elas são encaminhadas para turmas

que trabalharão um programa de conteúdos mais ou menos complexo.

Eu não tenho turma de seis e sete, de oito e nove ou de... Eu tenho EPEM1, EPEM2 e EPEM3. É pra criança de todas as idades. Então, eu tenho que pensar na menor, porque o outro, eu sei que ele pode ir além, mas eu tenho que pensar até aonde esse aqui pode ir pra poder dar igualdade ao trabalho. (Professora de EPEM)

Entre as características das diferentes idades das crianças que freqüentam as

turmas de EPEM, a professora nota que nas mais novas, o maior problema é a

lateralidade, mas em geral, os alunos iniciantes quase todos vêm com uma coordenação

motora pouco desenvolvida. Tal coordenação inclui aquilo que eles fazem com os pés e

mãos e voz - juntos ou alternadamente.

Com os mais novos, [o trabalho] é muito voltado nesse início pra organizar a lateralidade deles que chega bem confusa. Agora, pra todos não é a lateralidade, mas é a sincronização pé-mão, a coordenação motora. É trabalhar essa coisa, a mão está fazendo uma coisa, o pé fazendo outra, a voz fazendo outra. [...] E a gente precisa ir trabalhando pra ir facilitando esse aspecto na vida deles, que eu acho que é coisa que eles vão [levar] pro resto da vida e também pro instrumento, eles vão precisar muito. (Professora de EPEM)

O ideal da equipe pedagógica é ter um programa que atenda às várias idades das

crianças que procuram a escola. Mesmo esperando crianças a partir de seis anos de

idade, a escola recebe uma grande maioria de alunos iniciantes com cerca de dez anos

de idade. Por este motivo, o programa prevê atividades e conteúdos que sejam possíveis

de serem trabalhados com crianças num nível de desenvolvimento musical mais

elementar.

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As dificuldades evidenciadas pela idade são a coordenação e agilidade motora

nas crianças mais novas para realizar atividades rítmicas e a grafia. Nestes casos, a

estratégia didática é fazer a criança reconhecer as figuras em cartões. Dessa maneira ela

tem sucesso na atividade sem se ver constrangida pelo seu nível de desenvolvimento.

Com as crianças na faixa de nove – dez anos, a professora afirma que tudo fica

fácil quando é trabalhado como brincadeira: “na brincadeira, vai acontecendo” diz ela.

Com essas crianças [mais velhas], a gente pode fazer um trabalho mais elaborado, até trabalhar na semicolcheia, mas sem a cobrança formal. [...] Mas eu quero uma compreensão num nível mais elementar um pouquinho porque eu tenho que abrir esse espaço pra essa criançada que entra mais nova. (Professora de EPEM) No entanto, se o aluno não fez o curso desde pequeno na escola e não está

acostumado com a metodologia ativa, ao começar os estudos de música na adolescência,

ele fica mais inibido para realizar atividades com movimento.

Então, quer dizer, você tem um ritmo ou tem uma melodia, você quer que ele represente corporalmente, pro adolescente já fica mais difícil. [...] quando adolescentes, principalmente menina, esbarra, ela muda o comportamento. Ela vem fazendo e tal e de repente ela começa a ficar mais, sabe? Ela não quer aparecer. Então [...] você vai ver a menina que está lá fazendo, e vai ter aquela que está toda dura, tipo assim, “me tira daqui pelo amor de Deus” [...] Essas diferenças eu acho que são bem claras. (Professora de EPEM) Mesmo reconhecendo que hajam diferenças de atitudes da criança para a

aprendizagem nas diferentes idades, a professora de EPEM afirma que nesta escola não

se prevê uma adequação do programa às necessidades do desenvolvimento cognitivo

dos alunos.

Para sintetizar o conteúdo das entrevistas, apresentamos a seguir alguns quadros

nos quais vemos a atenção dada pelos professores aos espaços práticos envolvidos na

ação dos alunos em suas aulas no CFI EMVL.

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Quadro 6: Síntese das solicitações de espaços práticos pela Instrução em Violão

POSTURAL TÁTIL – ME TÁTIL – MD CINESTÉSICO VISUAL VOCAL AUDITIVO Posicionamento do corpo e o acondicionamento do violão. O braço do violão deve ficar em diagonal ao tronco para aproximar os braços e assim, manter o relaxamento dos ombros, facilitando os deslocamentos e movimentos dos dedos

Predominância do controle das alturas Melodias: mudanças mais ligadas ao ritmo. Harmonias: mudanças mais ligadas às frases.

Predominância do controle das durações e das intensidades, mas também das alturas e do timbre. Acorde: você pode fazer “p.i.m.a.” tudo junto, com a mão direita em “concha”. Arpejo: “p.i.m.a.” separadamente. Polegar em “xis” com o indicador.

Não foi citado. Os olhos tendem a acompanhar a ação das mãos ao violão. Por isso, deve-se trabalhar cada mão separadamente e a partitura deve ser colocada num lugar que lhe permita desenvolver uma “visão tripla”: para a mão direita, a mão esquerda e a partitura

A criança tem que falar o nome da nota enquanto toca os exercícios.

Não foi citado.

Quadro 7: Síntese das solicitações de espaços práticos pela Instrução em Violino

POSTURAL TÁTIL – ME TÁTIL – MD CINESTÉSICO VISUAL VOCAL AUDITIVO A. Cabeça: 1. A colocação da cabeça no violino 2. A direção para a qual a cabeça fica virada 3. A inclinação da cabeça no violino B. Braço: eles tocam três, cinco minutos e é necessário abaixar o braço

Tomada de consciência dos esquemas sensório-motores de adaptação às cordas : Depois de o aluno tocar, a professora faz um traço com caneta hidrocor sobre a marca da corda no dedo indicador, que toca inclinado ao pressionar a corda

Posição definitiva ao segurar o arco

Braços/ Mãos: o movimento do braço direito em coordenação com o ritmo. 1. Movimento do antebraço; 2. Movimento do braço inteiro 3. A sincronia das ações do braço direito com a preparação da corda pela mão esquerda

- “Tudo é invisível no violino” - O aluno aprende observando os problemas técnicos no colega

Cantar os nomes das notas que toca

1. Audição dos intervalos de 5ª que existe entre a afinação de cada corda (durante as afinações do instrumento e pelo canto da professora). 2. Afinação das notas do pentacorde maior (ao ouvir a professora e os colegas cantando a escala ou as notas das melodias)

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Quadro 8: Síntese das solicitações de espaços práticos pela Instrução em Violoncelo

POSTURAL TÁTIL – ME TÁTIL – MD CINESTÉSICO VISUAL VOCAL AUDITIVO - se sentar - acondicionar o instrumento em frente ao corpo, - segurar o arco, - estruturar a forma da mão esquerda - articular movimentos

ME determina as alturas pelo lugar onde pressiona a corda. Técnica de dedos: levantando os dedos acima dos outros e baixando sobre a corda - sentir a marca do adesivo sobre o braço do violoncelo para guiar o exercício do espaçamento entre os dedos - o aluno memoriza o espaçamento entre os dedos da ME em: - fôrma fechada os quatro dedos ficam por cima e o polegar atrás, todos os dedos estão na mesma distância e resultam no tetracorde - o 1º e o 4º dedos (2º, 3º e 4º dedos juntos) - fôrma por extensão espaçamento entre os quatro dedos é maior

Pizzicato - é feito beliscando a corda com o dedo indicador da MD Détaché – Martelé -

Técnica de Arco: - pronação: usado para pressionar o arco sobre as cordas - supinação: usado para suspender o arco das cordas � Metáforas usadas para sugerir postura dos exercícios segurando o arco: “pescaria” , “limpador de para-brisas” e “caligrafia” - abdução e adução: os movimentos do antebraço usados para afastar e aproximar o arco � Metáforas usadas para sugerir postura dos exercícios: “abrir e fechar asas” “brincar de polichinelo”

Controles visuais no início da aprendizagem: - o ângulo do arco em relação às cordas é perpendicular - visualizar as distâncias dos espaçamentos entre os dedos da ME - seguir o desenho das notas da partitura convencional presente no método Suzuki

- cantar as melodias do CD usando o nome das notas enquanto toca

- reconhecer as melodias do método ouvidas das gravações do CD - controlar o resultado das ações da mão: “tirar” um som bonito de dentro do instrumento e “espalhar” o som pelo instrumento todo - tetracorde é reconhecido pelo ouvido ao tocar com a fôrma fechada nas quatro cordas na primeira posição

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Quadro 9: Síntese das solicitações de espaços práticos pela Instrução em Piano

POSTURAL TÁTIL – ME TÁTIL – MD CINESTÉSICO VISUAL VOCAL AUDITIVO Tocar e soltar as teclas usando as posições: - Cluster - Fechada - Arco - Cinco dedos (“toca-solta” e legato), regulando alturas, durações e intensidades (forte e suave) - O intervalo corresponde ao número de teclas brancas sentido pelo tato: 2ª - duas teclas; 3ª – três teclas

Dedilhados para tocar nas teclas brancas com posição de cinco dedos

Para tocar segundas ascendentes com dedos vizinhos da ME (5-4; 4-3; 3-2; 2-1)

Para tocar segundas ascendentes com dedos vizinhos da MD (1-2; 2-3; 3-4; 4-5)

Para tocar terças ascendentes com dedos vizinhos da ME (5-3; 4-2; 3-1)

Para tocar terças ascendentes com dedos vizinhos da M.D.(1-3; 2-4; 3-5)

- Em pé para se movimentarem por todo o teclado; - Sentados com os pés apoiados no chão; - cotovelo na altura do teclado; - pulso flexível;

Para tocar sons repetidos com o mesmo dedo (1-1; 2-2; 3-3; 4-4; 5-5)

Para tocar sons repetidos com o mesmo dedo (1-1; 2-2; 3-3; 4-4; 5-5)

Mãos juntas -harmonia Mãos alternadas - melodia Movimento para a direita e para a esquerda para transformar a altura do som

- Localização das teclas para a imitação dos gestos e desenhos melódicos tocados pela professora - Conservação do ponto de partida pela localização das teclas - Ordenação das teclas pretas da esquerda para a direita (1ª e 2ª do grupo de duas pretas e 1ª 2ª e 3ª do grupo de três pretas) - O intervalo corresponde ao número de teclas brancas percebidas pela visão: 2ª - duas teclas; 3ª – três teclas - A grafia do desenho melódico segue o sentido vertical para as alturas (sobe, desce, repete) e a direção “esquerda-direita” relativa à sequencia dos sons no tempo (antes e depois) - Cada tecla corresponde uma nota na pauta - As teclas pretas são associadas às alterações das notas ( # ou b)

Verbalizações das durações: - Longo e Curto -Tá, Táa, Táaa Verbalizações dos desenhos melódicos: - salto (ou 3ª) acima, - salto (ou 3ª ) abaixo, - passo (ou 2ª) acima, - passo (ou 2ª) abaixo, - repete Canto das melodias com letras

Diferenciação dos sons: Agudo �

Grave Exploração das teclas brancas e pretas para os ajustes melódicos seguindo os esquemas auditivos das melodias que aprende a tocar por ouvido ou por imitação. Reconhecimento de intervalos de 2ª e 3ª ascendentes e descendentes.

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Quadro 10: Síntese das solicitações de espaços práticos pela Instrução em EPEM

POSTURAL Membros superiores e inferiores

CINESTÉSICO VISUAL VOCAL AUDITIVO

O cuidado com a postura dos alunos para uma boa emissão da voz: - sentar com as pernas no chão para conseguir emitir melhor o som da voz (inclusive os sons mais agudos) - Manter um bom espaçamento entre os alunos para os movimentos serem aproveitados por todos

Método O Passo – para sentir a métrica com o andar, começar sempre com o pé direito (tempo 1). Se for canhoto ficar de frente para o colega destro e usar o pé equivalente. Movimento dos braços para expressar a métrica ouvida. “Um” - braços para baixo “Dois” - mãos espalmadas no tórax. “Três”- braços abertos altura dos ombros “Quatro” - braços esticados para cima.

- Suavidade nos movimentos dos pés para manter a continuidade do tempo musical - sincronia e diacronia dos movimentos dos pés e das mãos (subdivisão das pulsações) - movimento do joelho e molejo do corpo para a metade da pulsação

- Os gestos (ou desenhos) para cima e para baixo são sugeridos para associar os esquemas auditivos do parâmetro sonoro das alturas à sua representação visual de movimentos verticais. - inventar sons para representar figuras que a professora mostra - nomeação e identificação das teclas do piano.

- cantar e ouvir o resultado de uma boa emissão - verbalização dos tempos do compasso 1,2,3 e4. - verbalização da subdivisão da pulsação com a conjunção “e” - inventar sons com a voz ou com o corpo para contar uma estória criada pela turma - verbalização do ritmo com sílabas de acordo com o ritmo (Ta, Táa, Táaa) - verbalização do ritmo com palavras cuja acentuação tônica coincida com o ritmo: Sol=semínima Lu-a= colcheias

- ouvir o som e silêncio - sensação de pulsação das músicas conhecidas - Ouvir e reconhecer o tempo forte na métrica - inventar desenhos para representar sons que a professora toca (gravações de ruídos) - ouvir e reagir ao tempo em semínimas e colcheias através dos passos - construir a escala diatônica no teclado do piano pela referencia melódica da escala de Dó

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4.2 A construção do conhecimento musical sob o ponto de vista da ação do aluno

Nesta parte trataremos da análise dos dados coletados nas aulas observadas na

EMVL durante o ano de 2009. Primeiramente, explicaremos os critérios utilizados para

as análises e em seguida, discutiremos os resultados das análises com base nos conceitos

da Epistemologia Genética.

No anexo II deste trabalho encontram-se os quadros das análises das aulas

observadas, onde inferimos sobre as estruturas lógicas envolvidas nos conhecimentos

que estão sendo abordados na interação dos sujeitos com o objeto musical, assim como

sobre os processos mentais usados pelos alunos nesta interação. Para expor esta

abordagem das aulas seguiremos os critérios abaixo relacionados.

4.2.1 Critérios usados para as análises das aulas

Para criar os critérios de análise das aulas levamos em conta quatro aspectos: 1.

Ação: a atividade observada em aula e os objetivos que se mostram evidenciados nestas

atividades; 2. Objeto Musical: a estrutura musical trabalhada em aula e considerada por

nós como objeto musical; 3. Espaços Práticos: a coordenação dos espaços práticos

envolvidos na ação do aluno; 4. Inferências sobre a Representação Musical:

descrição de conflitos cognitivos dos sujeitos frente às ações solicitadas, inferências

sobre operações necessárias às ações musicais observadas, constatação de conservações

musicais nos resultados musicais observados, os espaços representativos coordenados

pelo sujeito no seu fazer musical, o funcionamento das estruturas lógico-matemáticas

(classificações e seriações) evidenciadas pelas respostas musicais dos sujeitos.

4.2.1.1 Ação

Este tópico consiste na descrição da atividade dos sujeitos em aula a partir das

propostas feitas pelo professor. Estas propostas, em geral, têm um objetivo – tratam de

algum conteúdo técnico e/ou musical. Através dos dados explicitados neste item

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podemos fazer novos recortes para discorrer sobre outros aspectos interessantes para

nossa reflexão, tais como o das estruturas musicais trabalhadas, os conflitos cognitivos

dos sujeitos, etc.

4.2.1.2 Objeto Musical

Este tópico trata dos conteúdos musicais envolvidos na ação descrita.

Encontraremos algumas pequenas análises das peças que o aluno toca, sob o enfoque da

forma, ou da harmonia, ou do desenho melódico, ou do ritmo ou da sua dependência em

relação à letra cantada pela criança ou pelo professor. Trata-se do conteúdo musical

presente na ação do aluno ou na explicação do professor. Este será o objeto a ser

considerado na relação “sujeito-objeto musical” analisada.

4.2.1.3 Espaços Práticos utilizados pelo aluno

Neste tópico estabelecemos a relação entre a coordenação dos diversos espaços

práticos envolvidos na ação do sujeito e a gênese da representação musical.

Para apreender a ação do aluno durante os momentos de interação pedagógica

com o professor, não havendo possibilidade, durante as observações das aulas, de

constituir uma intervenção clínica através de diálogos diretos com os sujeitos, optamos

por estabelecer que, dos aspectos presentes dentro da totalidade da ação, os espaços

práticos do sujeito guiariam nosso olhar para a análise que seria feita posteriormente.

A adaptação motora ao instrumento é o aspecto observável da ação e envolve o

contato do corpo do aluno com o instrumento. Como estas ações envolvem as noções de

objeto e também de espaço, nós tomamos os conceitos usados por Piaget para a

explicação da gênese de tais noções na criança. Assim como este autor, adotamos a

mesma denominação de Poincaré para seguir os canais perceptivos observados nas

ações dos sujeitos. Para ele, os “espaços práticos” são: bucal, visual, auditivo, táctil,

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cinestésico, postural, ou seja, os espaços práticos recebem o nome da parte do corpo que

se dirige ao objeto no momento da interação.

No entanto, é importante frisarmos que os espaços práticos serão aqui descritos

separadamente com a finalidade de descrevermos o processo de interiorização das ações

do sujeito, mas eles funcionam concomitantemente dentro da totalidade da ação

descrita.

4.2.1.4 Inferências sobre a Representação Musical

Nossas inferências sobre os comportamentos observados foram direcionadas

para as estruturas previstas segundo a descrição do sujeito epistêmico por Piaget

relacionando-os com os comportamentos observados nas crianças de nossa amostra (de

7;8 a 9 anos)64, ou seja, das estruturas pré-operatórias e operatórias-concretas. Assim,

em nossas análises nos guiamos pela identificação e diferenciação de aspectos

figurativos e operativos do pensamento musical nos comportamentos observados nas

ações dos sujeitos.

Levando em conta que a coordenação dos movimentos sobre os instrumentos, ou

sobre seu próprio corpo durante o fazer musical, procuramos inferir como a criança

interioriza o objeto musical para a formação de suas representações musicais: se

por meio de abstrações pseudo-empíricas, reflexionantes ou reflexivas. Neste tópico

descrevemos as coordenações dos espaços práticos que favoreceram esta interiorização

e que evidenciaram a ocorrência da assimilação das estruturas musicais pelo sujeito.

Ao descrevermos a coordenação dos esquemas utilizados na atividade dos

sujeitos utilizando para isso apenas o que era visível nas suas ações com instrumentos

sobre os objetos musicais, pudemos encontrar pistas para compreender seus

64 Não foi incluídas nesta faixa etária uma criança da amostra de 11 anos que é de outra turma de EPEM mas cujas aulas foram observadas e analisadas para tratar de um instrumento a mais: o violoncelo.

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comportamentos musicais, suas dúvidas e dificuldades, assim como para explicar as

suas ações.

Mesmo considerando que todo conhecimento apresenta aspectos figurativos e

operativos, como já explicamos no primeiro capítulo da tese, este dois aspectos serão

separados em nossa exposição dos dados apenas para ser possível explicar suas

características nas ações onde pudemos identificar momentos em que houve

predominância de um dos dois aspectos nas representações inferidas por nossas análises.

Devido ao grande número de dados colhidos, a exposição deles será feita por

meio de casos exemplares onde as especificidades dos espaços práticos do sujeito em

interação com o objeto musical podem indicar representações que denominamos

auditiva, cinestésica, etc. Assim, somente alguns casos serão extraídos dos resultados

das análises presentes nos 25 quadros integralmente expostos nos anexos de número 2

até 6.

Ao optarmos pela narração de apenas alguns exemplos das atividades analisadas

em nossas observações, chamamos de representações musicais de aspecto figurativo,

aquelas nas quais encontramos recordações de experiências particulares vividas pelo

sujeito ao realizarem imitações diferidas, ou algumas situações onde o conceito de

imagem mental se mostrava claramente presente.

Já as representações musicais de aspecto operativo foram aquelas nas quais

percebemos ajustes dos esquemas de assimilação do sujeito através de operações

mentais que acompanhavam as transformações do objeto e das situações e podiam ser

reversíveis. Elas ficam evidentes no funcionamento do pensamento do sujeito quando

ele realiza operações através de estruturas algébricas – como a das classificações; as

estruturas de ordem – como as relações (seriações); e ambas se aplicam às estruturas

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topológicas inerentes ao pensamento infralógico, ou seja, à conservação do objeto nas

suas localizações e deslocamentos no espaço.

4.2.2 Análise das aulas observadas

Nesta parte exporemos os dados colhidos nas aulas classificando-os pelos tipos

de representação identificados no desenvolvimento das aulas de instrumentos – violino,

violoncelo, violão e piano - e de EPEM observadas.

4.2.2.1 Representação auditiva

4.2.2.1.1 Aula de violino (08 de junho de 2011)

Esta aula foi escolhida para exemplificar a representação auditiva com

dominância figurativa, já que a imagem auditiva foi a geradora de todo o processo e a

intervenção pedagógica não fez as solicitações necessárias para que a aluna avançasse

para outro nível.

A partir da imaginação de sons, BEA resolve criar uma música. No entanto não

consegue ainda se expressar de modo a ser compreendida pela professora. A professora

tenta levá-la a se expressar, mas como sua abordagem foi centrada no conteúdo técnico,

ela não guia BEA através de questionamentos. Assim a representação permanece no

nível figurativo e BEA não chega a representar conceitualmente os elementos utilizados

em sua criação.

A forma musical, concretizada com a ajuda da professora, é evocada por BEA a

partir da imagem auditiva da melodia cantada pela professora, e repetida por BEA com

os nomes das notas. O nome das notas é uma referência para a localização do dedo

indicador no instrumento, já que a didática-técnica visa a criação de uma impressão dos

sons sobre as cordas do violino. BEA recorre à seqüência memorizada auditivamente.

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Ação: 1. Enquanto BEA espera sua vez de tocar, ela fica escrevendo no caderno de música. EL

é chamado para tocar. Eu observo BEA. Ela canta: “dim,dim di-im; tem,tem, te-em;...”.

BEA está criando uma música com o ritmo de duas semínimas e uma mínima. Enquanto

a professora afina o violino, BEA pega a folha e, olhando para o que está escrito, faz

movimentos com o corpo, como que estivesse acompanhando a leitura de um ritmo.

2. A professora, alheia a isto, pega a folha da mão de BEA e diz: “Está faltando resina

no seu arco, você tem resina, não tem? ” “- Tenho”, diz BEA. “ Então, pega lá.” Solicita

a professora. BEA vai buscar.

Neste momento, a professora lê em voz alta o que estava escrito na folha:

“pam,pam,pa-am;

tom,tom,to-om;

pim,pim, pi-im; chim,chim,chi-im;”

Ela pergunta para BEA: “o que é isso?”

BEA lê: “ Tem, tem, te-em...é que eu estou fazendo ainda...” A professora se

entusiasma: “Você está fazendo uma música? Vamos ver como é” - e pede que BEA

cante. BEA então começa a cantar sua música. A professora, ao ouvir, começa a

improvisar um acompanhamento ao piano.

3. Como BEA não consegue cantar as alturas da melodia com boa afinação, a professora

sugere um desenho melódico para aquele ritmo, usando as notas de Lá até Mi, que BEA

está aprendendo a tocar no violino. Ao piano, a professora toca alguns exemplos e

pergunta qual deles BEA prefere. BEA fica indecisa. Começa a tocar com posição

fechada nas teclas da região aguda do piano, sem obedecer ao ritmo proposto.

A professora pega o violino e coloca no queixo de BEA, que se deixa à disposição da

intervenção da professora, mas sem muito entusiasmo.

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“Vamos tentar outra vez para ver o que você quer fazer” - diz a professora.

BEA tenta pegar o arco, e a professora diz:

“Sem arco ainda, para primeiro pegar as notas”. Pede que BEA toque para definir que

notas ela vai querer usar. BEA toca: La, mi, mi-i; La, mi, mi-i.

4. A professora corrige a posição da mão direita de BEA, que deve tocar com o dedo

indicador “de lado”. Ela vai mexendo na mão de BEA para ajudá-la a chegar na posição

correta. Elogia quando BEA consegue. BEA não mantém a posição e a professora refaz.

Em seguida, com uma caneta hidrocor colorida, a professora desenha um ponto no lugar

do dedo indicador que BEA deve tocar na corda, e em seguida belisca de leve em volta

deste ponto para sensibilizá-lo. Pergunta: “Sentiu?” BEA abaixa a cabeça

afirmativamente. A professora então pede que BEA toque na corda usando este ponto

do dedo que está sentindo. Neste momento a professora ajuda BEA a colocar o dedo na

posição e a aluna vai tentando até que a professora diz que está correto.

5. A professora define um uso para as notas Lá e Mi, com o ritmo composto por BEA.

A professora então pega o violino e diz: “Você vai fazer o que eu vou mostrar para

você” - e toca:

I. La, La, La-a, Mi, Mi, Mi-i;

II. La, La, La-a, Mi, Mi,Mi-i;

III. La, Mi, Mi-i; La, Mi, Mi-i;

IV. La, Mi, Mi-i; La, Mi, Mi-i.

6. Em seguida a professora toca ao piano e canta a melodia com o nome das notas.

Depois pede que BEA repita cantando com o nome das notas como ela ouviu a

professora tocando. Enquanto BEA canta, a professora vai mostrando os dedos da mão

numa contagem das frases, e dizendo: I.e em II: “repete as mesmas notas”, III.“agora o

misturado”.

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7. Depois de BEA cantar duas vezes com os nomes das notas, a professora pede que ela

toque no violino (uma vez sentada, e outra vez de pé). Quando a aluna se posiciona para

tocar em pé, a professora a ajuda a aperfeiçoar a posição da mão direita em pizzicato

para tirar uma foto.

Durante a preparação da foto, a inclinação do dedo indicador, a altura do cotovelo e a

inclinação da cabeça são pontos que tanto a professora como a aluna procuram manter

na posição correta. Depois de feita a foto, a professora mostra a foto da posição do dedo

para a aluna e pede que ela repita a posição para não esquecer.

Objeto Musical:

O objeto parte da criação de um ritmo por BEA, que apresenta dois sons curtos e

um longo, falado com sílabas: “Pam,pam, pa-am; Tom,tom, to-om; Pim,pim, pi-im;

chim,chim, chi-im;” e depois de modificado pela professora, toma a forma de uma

melodia binária AABB, mantendo o ritmo de BEA:

I. La, La, La-a, Mi, Mi, Mi-i;

II. La, La, La-a, Mi, Mi,Mi-i;

III. La, Mi, Mi-i; La, Mi, Mi-i;

IV. La, Mi, Mi-i; La, Mi, Mi-i.

Espaços práticos utilizados pela aluna:

No início: Espaço visual ao ler as palavras, cinestésico ao movimentar o corpo

no ritmo e vocal ao pronunciar as sílabas ritmicamente.

No final: espaço postural para segurar o violino e manter-se em pé; tátil e

cinestésico ao tocar em pizzicato nas cordas Lá e Ré; auditivo ao regular os sons

produzidos pelo tato.

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Inferências sobre as representações musicais:

1. BEA tem uma representação auditiva rítmica. Como não sabe expressar isso no

violino, nem escrever com notação convencional da música, expressa suas idéias

musicais através de sons onomatopaicos imitando sons de instrumentos. Podemos dizer

que, na medida em que BEA expressa de maneira pessoal, seu objeto musical é ainda

subjetivo.

2. Quando a professora pergunta o que é aquilo, BEA não denomina seu objeto com um

conceito. Como sua representação é figurativa, ela repete os sons exatamente como os

imagina. O ritmo já está bem definido, mas como as alturas não estão, a professora

procura compor sobre o objeto de BEA uma forma musical constituída de ritmo e

harmonia induzido-a a compor uma melodia. Se BEA se engajasse nesta proposta, a

professora poderia trabalhar o conteúdo técnico previsto para aquela aula: sons nas

cordas Lá e Mi na primeira posição.

3. Notamos pouco acolhimento às opiniões de BEA por parte da professora. Ela parece

ter muita pressa de incluir os conteúdos técnicos que precisa trabalhar com BEA e

assim, BEA, que não sabe bem como escolher, não toma decisões. Talvez ela pudesse

propor que BEA tocasse usando as notas que sabe tocar e, esperando a ação ocorrer,

poderia levá-la a analisar o que fez. Assim provocaria BEA a reverter seu pensamento, e

operar sobre sua ação através de abstrações reflexionantes chegando a identificar o

objeto conceitualmente.

No método adotado pela professora, BEA realiza abstrações empíricas sobre as

ações da professora tocando ao piano, mas não realiza reflexionamentos nem reflexão

no nível superior da inteligência.

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208

4. A exploração tátil realizada por BEA tem como objetivo chegar à posição correta de

tocar, demonstrada pela professora através da sensibilização da região e da sensação do

ângulo com que o dedo que deve tocar a corda.

BEA assimila a maneira de realizá-la através de abstrações pseudo-empíricas

sobre as posições experimentadas, criando uma imagem mental da posição. Em seguida

procura imitá-la através de ações repetidas, tocando ao violino da maneira como

assimilou. Após algumas tentativas acomodadoras, o esquema motor constituído por

BEA para tocar pizzicato chega ao ponto em que a professora aprova a posição.

5. Temos aqui uma renovação do objeto, já que a professora efetuou transformações

criando uma seqüência com elementos que se repetem, outros que são contrastantes. A

assimilação do objeto dependerá de abstrações pseudo-empíricas por parte de BEA, mas

para que esta ocorra, o conteúdo deverá estar dentro de uma forma.

6. Estas frases das intervenções da professora se revelam como uma forma de classificar

os desenhos melódicos já executados e através delas a professora leva BEA a montar

um plano para sua ação baseado na memória de reconhecimento dos elementos da ação

anterior a partir de uma forma.

7. Na didática da professora há uma supervalorização da técnica em detrimento do valor

do pensamento sobre as ações. Apesar de acolher a expressão da aluna, percebe-se uma

tentativa de canalizar esta expressão para a técnica, sem reflexão sobre a origem da

invenção de BEA. A representação figurativa fica mais evidenciada na valorização dada

ao congelamento, numa imagem fotográfica, à boa forma da posição da mão direita

alcançada por BEA nesta aula. Os aspectos operativos do conhecimento que BEA

poderia abstrair, através das explicações das transformações musicais que ocorriam na

sua composição, foram ignoradas pela pedagogia adotada nesta aula. É por este motivo

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209

que a aluna tem oportunidade de realizar apenas abstrações empíricas e não

reflexionantes.

4.2.2.1.2 Aula de EPEM 12 (16/06/2009)

Esta aula foi escolhida para exemplificar a representação auditiva com

dominância operativa, já que, apesar de a atividade ter início na ação, os esquemas

auditivos são alcançados graças à reversibilidade do pensamento operatório. Inspirada

na metodologia de Jaques Dalcroze a professora solicita ações que levam os alunos a

realizarem antecipações e retroações no pensamento musical. Através de seus esquemas

auditivos os alunos assimilam o ritmo e realizam uma imitação deste pelo movimento.

Durante a realização da música, os parâmetros sonoros são assimilados todos ao

mesmo tempo, mas durante a realização dos movimentos desta atividade os sujeitos

expressam somente o parâmetro das durações.

Ação:

1. A professora bate ritmos com palmas (sempre 4 pulsações de cada vez) usando

sempre semínimas e colcheias. Os alunos ouvem parados e em seguida andam pela sala

realizando o ritmo com os passos.

2.Em seguida a professora vai ao piano e toca pequenas melodias harmonizadas que eles

ouvem parados, e em seguida repetem com os passos.

3. A professora toca duas vezes cada compasso. Os alunos ouvem a primeira e andam

durante a segunda. A professora comenta que o exercício de hoje tem uma semelhança

com o exercício do passo, pois é o movimento do corpo que faz o ritmo. Só que ao invés

de ficarem no mesmo lugar [mostra o movimento para frente e para traz como o d’O

Passo], eles fazem passos pela sala [mostra como é o andar ritmado pela sala].

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Objeto Musical:

Modelos rítmicos com semínimas e colcheias executados primeiramente com

palmas e em seguida ao piano,a professora toca melodias curtas harmonizadas ao piano,

mudando sempre o desenho melódico. Os ritmos são organizados em semínimas e

colcheias: três duplas de colcheias e uma semínima, ou duas duplas de colcheias e duas

semínimas, ou quatro semínimas. Além das variações melódicas a professora também

varia os andamentos a cada nova melodia. Abaixo representamos simbolicamente os

ritmos tocados:

1. Ritmo 1:

2. Ritmo 2:

3. Ritmo 3:

Espaços Práticos utilizados pelos alunos:

1 e 2. Vemos a coordenação dos espaços auditivo e tátil-cinestésico no ouvir e reagir

através do movimento dando passos leves pela sala.

Inferências sobre as representações musicais:

1. Para enfatizar a qualidade do movimento a professora se utiliza de imagens

simbólicas “pés inteligentes e leves como pluma” e do “ato de marchar” que são

acompanhadas por gestos contínuos e descontínuos. Assim, polariza atitudes

antagônicas que servem de modelos para os alunos imitarem ou evitarem. Os alunos são

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211

levados a valorizar a continuidade do tempo presente no ritmo ao invés das unidades

descontínuas que o compõe. Assim, partindo da polarização “ouvir parado-ouvir

andando”, os alunos avançam para um nível de precisão superior: “ouvir parado – andar

com continuidade”.

2. O aspecto figurativo do pensamento ocorre por meio de uma imitação interior, ou

seja, no momento em que a professora atua e os alunos ficam parados, eles estão

construindo uma imagem mental do ritmo pela audição. Os movimentos feitos em

resposta ao que ouviram evidenciam a presença de esquemas auditivos que

possibilitaram sua assimilação na forma de sucessão das durações. Os movimentos

feitos, por sua vez, são expressão dos esquemas motores acomodados ao ritmo ouvido.

Ao modificar os desenhos rítmicos, a professora está solicitando uma diferenciação em

relação a cada um dos modelos anteriores. Assim, os alunos são levados a conservar o

esquema de pulsação e acomodar os esquemas de cada unidade de tempo

(descontinuidades) que compõe o desenho rítmico através de novas diferenciações para

semínimas e colcheias. Portanto, ao compararem os diferentes elementos percebidos, os

alunos extraem daí um conhecimento por abstrações pseudo-empíricas.

O piano oferece informações simultâneas que são percebidas e tratadas pelas estruturas

do sujeito. No momento em que a professora toca e os alunos ouvem parados, eles estão

construindo uma imagem mental do ritmo através de um processo de assimilação-

acomodação do ritmo através do acionamento de seus esquemas auditivos anteriores.

Para que eles possam executar os movimentos corretos depois, deve ocorrer uma

coordenação dos esquemas auditivos e esquemas motores guiada pela memória, ou seja,

com base na imagem mental construída pelo sujeito.

Há alternância de figuratividade e operatividade: durante a construção do

esquema auditivo, na primeira parte da atividade, a figuratividade domina e a

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operatividade fica em segundo plano pois o sujeito está centrado na configuração do

ritmo que irá imitar em seguida. Na segunda parte da atividade há uma sincronia de

ações mentais: durante a expressão do ritmo através do movimento, a ação é guiada

pelos esquemas motores apoiados sobre a imagem mental do ritmo. Tal sincronia entre

ação e audição nos remete à reflexão de Dolle (2008b, p.88) sobre o pensamento

operatório. O pensamento aí passa dos “estados” às “transformações”, combinando

retroações e antecipações, chegando ao domínio do tempo, do espaço e da causalidade

tornados reversíveis.

4.2.2.1.3 Aula de EPEM 12 (16/06/2009)

Nesta cena veremos um exemplo de representação auditiva operativa por meio

da classificação de ritmos segundo quatro modelos dados. A classificação é decorrente

da conservação e dissociação dos ritmos e das melodias ouvidas.

Ação:

Depois de a turma ter vivenciado quatro ritmos compostos de semínimas e

colcheias escritos no quadro, a professora pede que os alunos identifiquem qual deles

ela escolheu para tocar ao piano em forma de melodias. Ao ouvirem as melodias, os

alunos procuram identificá-las com os ritmos escritos no quadro. Algumas vezes a

professora toca um mesmo ritmo com melodias diferentes.

Objeto musical:

Ritmos a serem identificados nas melodias tocadas pela professora sobre os

trabalhados:

1. Ritmo 1: 1 2 3e 4 | 1e 2 3e 4 ||

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2. Ritmo 2: 1e 2e 3 4 | 1e 2 3 4 ||

3. Ritmo 3: 1 2e 3 4e | 1 2 3e 4 ||

4. Ritmo 4: 1e 2 3e 4e | 1 2e 3e 4e ||

Melodias tocadas pela professora para os alunos abstraírem o ritmo conhecido

anteriormente:

1. Melodia 1:

Ritmo dois:

2. Melodia 2:

Ritmo um

3. Melodia 3:

Ritmo dois

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4. Melodia 4:

Ritmo três:

5. Melodia 5:

Ritmo um:

6. Melodia 6:

Ritmo três:

7. Melodia 7:

Ritmo um:

8. Melodia 8:

Ritmo um

9. Melodia 9:

Ritmo quatro:

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Espaços práticos utilizados pelo aluno:

Espaço auditivo e visual: Os alunos ouvem a professora tocando ao piano

enquanto olham para os exemplos rítmicos escritos no quadro.

Inferências sobre as representações musicais:

Os quatro ritmos são modelos representados pela notação musical convencional.

O objetivo da atividade é perceber em que tempo da métrica a dupla de colcheias

aparece nos ritmos apresentados auditivamente. Se o sujeito puder identificar o lugar

delas, significa que alcançou sua conservação. Mas, além disso, ele deve relacionar o

desenho melódico ouvido com um dos quatro modelos grafados no quadro e diferenciá-

los.

Sendo o ritmo o elemento que as crianças abstraem das melodias apresentadas

pela professora, apesar de haver mudança de ordem das células rítmicas em cada

modelo, a métrica não varia, o que permite a diferenciação dos ritmos pela ordem em

que as colcheias aparecem.

Graças à reversibilidade do pensamento operatório a criança reconstrói os ritmos

utilizando a memória de reconhecimento. A partir da notação, ela relaciona cada um dos

modelos com o ritmo ouvido na melodia. Enquanto ouve, seus olhos devem passar por

todos os ritmos e excluir aqueles cujas primeiras células rítmicas são diferentes do ritmo

da primeira pulsação da melodia.

Quanto mais ela conseguir conservar os ritmos dos modelos, mais rapidamente

poderá exercer esta diferenciação (células iguais e diferentes). O sujeito tem que

reconhecer o ritmo conservado (por imagem mental, mesmo que representado pela

notação no quadro negro) e reconhecer o mesmo ritmo no objeto musical ouvido.

Vemos aqui um reflexionamento sobre dados concretos para relacionar os elementos em

jogo o que caracteriza esta abstração como pseudo-empírica.

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4.2.2.1.3 Aula de piano (10/06/2009)

Esta aula foi escolhida como exemplo de representação auditiva figurativa, mas

onde a pedagogia solicita a operatividade da aluna. Seus esquemas auditivos são

solicitados para a diferenciação dos parâmetros sonoros. A reversibilidade do

pensamento operatório sobre a ação da aluna leva-a a uma categorização desta ação a

partir de um sistema de conceitos musicais que, no caso, é o do parâmetro sonoro de

intensidade.

Ação:

JEN lê a partitura de Verde mar obedecendo o método de decodificação da

notação usado em todas as peças do livro: leitura rítmica com “Ta” e “Taás”, leitura do

desenho melódico através da verbalização do movimento de saltos conservando as

durações, porém sem tocar; e por último, tocar cantando a letra e, ao mesmo tempo,

conservar todas as qualidades do som grafadas na notação musical.

Obedecendo a dinâmica, a professora canta a melodia: primeira frase p e a

segunda frase f, e pergunta para a aluna: “o que eu fiz de diferente na primeira frase e na

segunda?”

A aluna pensa e responde: “essa aqui é mais aguda e...”

“Aguda?” Diz a professora e começa a cantar uma oitava mais aguda.

“Não! Essa aqui é mais piano e essa aqui é mais forte.” E depois acrescenta:

“Olha! está até escrito aqui!”

“Isso mesmo” - diz a professora - “quando eu cantei eu fiz p e f, mas quando a

gente toca também tem um jeito de fazer p e f, vamos tentar fazer?”

“Ah, tá!” - diz JEN.

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Ao fazer a primeira frase, foi tudo bem. Na segunda, a aluna ia continuar sem

mudar nada, e a professora quis ajudar cantando forte. A aluna quis então tocar mais

forte, mas errou a tecla. A aluna toca de novo, e desta vez consegue coordenar alturas e

intensidades, embora as durações tenham sido um pouco afetadas, pois ela teve que

ralentar um pouco para pensar na sua ação nos momentos de mudança (de p para f).

JEN reage figurativamente, ou seja, se apóia na percepção de que alguma coisa

mudou no som, mas para identificar qual dos parâmetros mudou, deve exercer a

reversibilidade operatória que lhe permite operar classificando o parâmetro em questão.

Através da solicitação da professora, que evidencia suas respostas por meio da

transformação dos trechos musicais seguindo as resposta da aluna, JEN reconhece seus

erros e se corrige. No final, seu pensamento a guia, mesmo que mais lentamente, a

realizar o que interiorizou da partitura.

Objeto Musical: Melodia com duas frases, escrita na pauta gradativa (três

linhas) com intervalos de terça (saltos) escritos de espaço para espaço com a indicação

de dinâmica (p e f).

Espaços práticos utilizados pelo aluno:

O controle da ação se dá interiormente através da coordenação dos espaços

práticos. Tal coordenação é aqui descrita separando cada ação prática para ilustrar como

a coordenação ocorre. No entanto, como já afirmamos anteriormente, tudo acontece ao

mesmo tempo e a coordenação de todas as operações envolvidas no pensamento do

sujeito para dominar seu próprio corpo durante o fazer musical é algo bastante

complexo, o que demanda uma diversidade de ações sobre o objeto musical para que o

sujeito dele se aproprie.

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Visual: os olhos seguem a leitura da esquerda para a direita, e de cima para

baixo seguindo o desenho melódico. Tátil: a mão esquerda pressiona as teclas brancas

com 2º e 4º dedos alternadamente. O controle do quarto dedo é mais difícil, pois este

dedo em geral acompanha os movimentos do 5º e 3º dedos. Os dedos agem com menos

ou mais força para pressionar as teclas dependendo das indicações na partitura (de p

para f) . Auditivo: o ouvido controla o resultado sonoro e diferencia as intensidades do

som.

Inferências sobre as representações musicais:

Conservações físicas: a pedagogia utilizada solicita a separação dos parâmetros

para verbalizar cada um antes de juntar todos eles na versão final da leitura quando a

aluna toca ao piano. No entanto, ao ouvi-los todos juntos na voz da professora, JEN

percebe que houve uma mudança (f e p), mas oscila na diferenciação dos parâmetros de

intensidade e altura.

As abstrações empíricas realizadas por JEN informam a mudança, mas as

abstrações reflexionantes pseudo-empíricas levam JEN a pensar num plano das

operações de classificação no momento em que compara as duas execuções e chega a

identificar qual é a classe da mudança operada na voz da professora. Para isso tem que

utilizar a reversibilidade do pensamento e coordenar mentalmente os dados para inferir

sobre eles.

Mesmo diminuindo a velocidade das ações, ao tocar depois de refletir sobre os

conceitos, JEN regula as diferenciações dos parâmetros ao executar todos eles durante a

leitura.

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4.2.2.2 Representação visual

4.2.2.2.1 Aula de violoncelo. (14 de maio de 2009)

Esta aula foi escolhida para exemplificar o modo de funcionamento das

estruturas operatórias concretas dos alunos com alternância de dominância operativa e

figurativa durante a interação pedagógica. Quando a professora explica aos alunos em

que momento eles devem passar de uma corda para a outra ao tocarem a melodia “Ode à

Alegria” de Beethoven, ela o faz com a intenção de provocar no aluno uma ação mental.

A criança deve montar um plano de ação sobre a imagem auditiva da melodia e sobre a

imagem de cada posição das mãos sobre o instrumento interligando-as mentalmente

pelos movimentos que farão para tocá-las.

Assim, a construção da representação da melodia é feita não apenas pelo

desenho melódico que é retido na memória de sentido estrito, mas também pela

transformação de estados do corpo sobre o instrumento durante a execução da peça.

No entanto, o processo de construção deste conhecimento começa desde o

momento em que faz a afinação dos instrumentos e os alunos fazem abstrações

empíricas dos sons que as cordas soltas tem no violoncelo (Lá/Ré/Sol/Dó).

Ação:

A professora afina os instrumentos e em seguida solicita à turma o uso do arco.

Mostra como devem fazer e vai solicitando o uso de diferentes partes do arco (ponta ou

talão), cada vez numa corda (Lá/Ré/Sol/Dó). Ao mesmo tempo, a professora observa e

corrige os movimentos dos alunos. Os alunos imitam os gestos da professora e ouvem o

resultado sonoro de suas ações sobre o instrumento.

Em seguida a professora escreve as notas desde o Dó grave da clave de Fá

(Do1), passando por todas as notas até o Re3. Ela marca as notas Dó1; Sol1; Ré2; La2

no quadro, como referência para as cordas soltas do violoncelo. Além das notas em

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seqüência escalar, a professora escreve as notas da melodia “Ode à Alegria” de

Beethoven, mostrando aos alunos os pontos de referência na partitura para a mudança

de corda no violoncelo.

Finalmente, os alunos chegam a tocar a melodia trabalhada primeiramente em

pizzicato e depois usando o arco. Recebem a instrução de não olhar para os dedos.

Embora a melodia já fosse conhecida e os alunos pudessem se concentrar na ação sem

olhar as notas, a professora enfatizou que olhar para a partitura era importante para

estabelecer o hábito de fazê-lo sempre ao tocar.

Enquanto os alunos tocavam usando o arco, obedecendo as indicações de talão e

ponta escritas na partitura a professora corrigiu o braço de FRA, que devia deixar o

cotovelo mais para baixo.

Objeto Musical:

Primeiramente a vibração das cordas de alturas definidas: (Lá/Ré/Sol/Dó).

Depois, a exploração física das partes do instrumento, com a colocação do arco perto do

cavalete para melhor fazer vibrar as cordas.

Notação musical convencional das notas da escala diatônica (desde o Dó1 até o

Ré3) no pentagrama com a clave de Fá com as indicação das notas que são tocadas nas

cordas soltas do violoncelo.

Figura12:Escala diatônica de Dó maior na extensão de Dó1 a Ré3 para identificação das alturas das cordas soltas do violoncelo

Notação da melodia “Ode a Alegria” de Beethoven, com as indicações de

cordas soltas ou dedos da mão esquerda que devem pressionar as cordas, assim como

as indicações de ponta ou talão do arco.

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Figura13: Notação da melodia “Ode à Alegria” de Beethoven com indicação de arcadas e dedilhado da ME e das cordas soltas do violoncelo.

Espaços Práticos utilizados pelo aluno:

Espaço visual: é através da decodificação dos signos musicais que os alunos

imaginam o som e suas ações para tocar.

Espaço auditivo: ao cantar a melodia, a professora reforça a memória de

reconhecimento auditivo dos alunos para o desenho melódico que eles estão lendo.

Coordenação final: Auditivo, visual e Tátil- cinestésica: os dedos da ME

definem o comprimento das cordas e o movimento dos dedo da MD e do braço direito

no uso do arco, controlam as durações e mudanças de corda.

Inferências sobre as representações musicais:

O método adotado pela professora parte da representação auditiva e visual da

notação da melodia que ela procura relacionar com as cordas onde os sons serão tocados

no instrumento. Enquanto ela canta o nome das notas, ela aponta cada uma delas na

notação e faz marcas nas notas referentes à corda solta.

Os sons das cordas soltas são pontos de referência para as mudanças de corda e

por isso, na notação, estes são pontos de referência importantes. É graças a eles que

FRA e seus colegas podem localizar a ação das suas mãos sobre o instrumento enquanto

pensam nas transformações do som que a partitura sugere. Tais coordenações mentais

nos levam a identificar as referências topográficas do instrumento no sistema de leitura

musical adotado: cada nota produzida em corda solta é um indício das notas possíveis

de serem ali tocadas até a próxima corda solta marcada na partitura. As notas ao lado

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daquelas marcadas deverão ser tocadas na mesma corda, que serão acionadas pelo uso

dos coordenado dos dedos das duas mãos.

O uso coordenado das cordas do violoncelo se caracteriza pela passagem da ação

das mãos (com ou sem o arco) de uma corda à outra. Tal técnica implica na antecipação

da imagem mental das posições que os dedos ocuparão no instrumento e dos

movimentos das mãos.

Quando a professora, ao invés de mostrar a ação sobre o instrumento, dá indícios

desta ação através de sinais na notação musical feita no quadro negro, ela trabalha a

dominância da representação visual da partitura em detrimento da tátil-cinestésica sobre

o instrumento. No entanto, ao indicar as notas na pauta que representam a mudança de

corda, ela retoma a representação figurativa da ação sobre o violoncelo que é a base real

sobre a qual os alunos constroem a representação simbólica da partitura. Para que a ação

posterior a partir destas representações seja adequada, os alunos devem realizar uma

abstração reflexionante a partir de representações das ações, compreender e planejar a

ações posteriores.

O desafio cognitivo que se apresenta quando os alunos tocam é o da

coordenação dos espaços práticos, e a realização musical sem o apoio visual, já que a

professora instrui os alunos a ocupar a visão somente com a decodificação da notação

musical. Tal coordenação exige tanto a representações dos espaços práticos pela

criança, quanto a representação auditiva da melodia.

Ao centralizar a atenção ao movimento do braço e no deslizar do arco sobre as

cordas, haveria possibilidade de FRA realizar abstrações pseudo-empíricas sobre as

durações. Mas para a tomada de consciência destas abstrações, seria importante que a

professora questionasse os alunos sobre o resultado de suas ações. No entanto, a

professora corrige apenas com a posição do braço de FRA, sem levá-la a refletir sobre a

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razão de uma boa posição no resultado sonoro. Ela poderia questionar FRA sobre o que

ela percebe e descobre do som resultante de sua ação com o uso do arco.

4.2.2.2.2 Aula de piano (17 de junho de 2009)

Esta aula foi escolhida para exemplificar a representação visual com dominância

figurativa, já que a imagem visual do teclado é o foco para o qual a atenção da aluna é

direcionada. No decorrer da atividade há alternância de dominância figurativa e

operativa para a construção da representação dos sons do instrumento.

É bom esclarecer que nas primeiras aulas de piano, a aluna explorou o piano

inteiro, sendo solicitada a identificar as mudanças ocorridas no som quando tocava em

diferentes regiões do teclado (grave, média ou aguda). Em seguida, experimentou a

vibração das cordas, tocando nas mesmas com as pontas dos dedos, observando seu

tamanho e espessura. Também realizou atividades lúdicas, tais como imitar os sons de

animais tocando nas diferentes regiões do teclado. Exercitou, assim, seus esquemas

táteis, cinestésicos, visuais e auditivos através de abstrações empíricas do parâmetro de

altura do som produzido no instrumento.

A aluna foi convidada também a localizar as teclas brancas do piano usando a

lateralidade (ordenando as teclas da esquerda para a direita) e tendo as teclas pretas

como referência visual (por exemplo, tecla branca antes da 1ª do grupo de duas teclas

pretas).

Na aula aqui descrita, a aluna está, finalmente, aprendendo o nome das teclas.

Enquanto ela toca em todas as regiões do piano, o desenho do teclado dá apoio à

memória visual e os nomes das teclas e, sendo cantados, são memorizados também pela

audição.

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Ação:

A partir do diagrama do teclado impresso no livro, a professora solicita à ISA

que nomeie cada uma das teclas. ISA já conhece a seqüência das notas da escala e

reponde prontamente à tarefa.

A professora então a leva a conhecer como é escrito o nome das teclas no livro

americano da coleção Hall Leonard. No diagrama do teclado daquele livro, nas teclas

Dó-Ré -Mi, lêem-se as letras C-D-E. A professora pede que ISA toque por todo o

teclado, somente as teclas brancas que ficam na frente dos grupos de duas pretas e, ao

mesmo tempo, cante o nome destas teclas Dó-Ré –Mi. Enquanto ISA toca e canta, a

professora a acompanha harmonicamente usando outro piano.

Depois de tocarem os Dó-Ré -Mi, a professora pergunta: “Como se chamam as

teclas que ficam na frente dos grupos de três pretas?

ISA pensa um pouco e responde: Fá, Sol, La e Si.

A professora mostra como estão escritas estas notas no livro americano: F-G-A-

B e explica que lá nos EUA é assim que os americanos chamam estas notas. Depois elas

tocam as teclas Fá, Sol, La e Si por todo o teclado enquanto a professora toca um

acompanhamento com ritmo de blues.

A professora pede que ISA envolva os grupos de dois no diagrama do teclado do

livro brasileiro. Depois pede que ela escreva os nomes das teclas Dó-Ré-Mi que estão

neste diagrama e diga quantos são.

Objeto musical:

A série de sons que compõe a escala de Dó maior é a estrutura musical

subjacente a esta atividade. Como no piano os sons são organizados através do teclado,

disposto pela série de alturas em graus conjuntos, o nome das teclas do instrumento é

dado primeiramente pela sua localização (etapa já vivenciada anteriormente pelas

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alunas) e em seguida, pelo nome dos sons das cordas que as teclas fazem soar quando

tocadas.

A correspondência dos nomes das notas Dó-Ré-Mi com a notação alfabética,

está sendo apresentada como etapa preparatória para o conhecimento das cifras, que

neste método, será ensinada como “os nomes dos arcos” (intervalo harmônico de 5ª).

Espaços práticos utilizados pelo aluno:

Espaço visual: identifica as teclas Dó-Ré-Mi pelos grupos de duas teclas

pretas e as teclas Fá, Sol, La e Si pelos grupos de três teclas pretas.

Espaço postural-tátil-cinestésico: A aluna fica em pé e vai caminhando ao

longo do teclado, da esquerda para a direita, e toca todas as teclas Dó-Ré-Mi que

encontra, usando a mão direita em posição fechada (só com o dedo indicador) .

Espaço vocal: ao cantar os nomes das notas, ISA ouve sua própria voz com som

de cada altura coordenado ao nome da nota.

Espaço auditivo: ao tocar reiteradamente a mesma relação intervalar existente

entre estas alturas, ISA vai assimilando uma estrutura sonora que alimenta os

esquemas auditivos na sua memória no sentido lato. Esta experiência se

enriquece de significados através dos campos harmônicos oferecidos ao ouvido

pelo acompanhamento realizado pela professora.

Inferências sobre as representações musicais:

O processo de nomeação das teclas parte da construção da seriação por meio de

abstrações pseudo-empíricas sobre as ações sobre as teclas. A seguir, é solicitada a

localização dos sons no espaço físico do instrumento, segundo as relações topológicas

projetadas sobre o teclado (por meio de operações infralógicas). Nesta aula completa-se

a construção simbólica da estrutura da escala pela aluna com base na atividade de tocar

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226

enquanto os nomes das teclas, previamente localizadas, são cantados (ou seja, seus

signos Dó-Ré-Mi e depois Fá-Sol-Lá-Si).

Mas será que a criança efetivamente interiorizou a seriação?

Com base nas ações solicitadas somente na aula aqui descrita não seria possível

afirmar isto. Seriam necessárias intervenções clínicas para podermos confirmar tal

hipótese. No entanto, considerando que, em aulas anteriores, a criança foi exposta a

experiências que lhe ofereceram oportunidades de realizar abstrações pseudo-empíricas

sobre o som produzido ao tocar as teclas, supomos que a gênese da seriação da escala

diatônica pode ter ocorrido.

Reproduzir pelo canto e pelo toque os sons Dó-Ré-Mi e localizar a ordenação

dos sons nas teclas contribui para a construção da seriação dos sons pela criança pois o

Dó é mais grave que Ré e fica mais à esquerda; o Mi é mais agudo do que o Ré e fica

mais à direita, etc. Porém, é a tomada de consciência das diferenças por meio da

comparação dos sons produzidos, que se torna possível a abstração pseudo-empírica das

relações assimétricas (seriação) entre eles.

4.2.2.2.3 Aula de EPEM 12 (19/05/2009)

Esta aula foi escolhida como exemplo de representação visual, considerando a

organização dos signos no papel, uma forma de representação que é solicitada enquanto

o sujeito lê a partitura. Vemos um sistema de conceitos sendo trabalhado: o das

durações e do ritmo.

A formação do conceito de ritmo musical como algo possível de ser socializado,

ou seja, possível de ser feito ao mesmo tempo por mais de uma pessoa, ganha a

contribuição da escrita como signo socialmente constituído. Após vivenciar um ritmo

organizado, a turma de EPEM 12 formaliza esta experiência escrevendo os signos

musicais em seus cadernos. Graças às atividades realizadas anteriormente, nas quais os

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227

alunos realizaram dissociações dos parâmetros de duração e altura, neste momento eles

podem compreender a solicitação da professora sobre a escrita do ritmo executado por

ela.

Ação:

Após terem praticado alguns ritmos com o movimento dos passos e falando os

números de cada tempo do compasso, (sons e silêncios), os alunos transcrevem os

ritmos lidos com números, substituindo-os por semínimas ou pausas de semínima.

Durante esta atividade, a professora observa e instrui os alunos quanto à organização

espacial da escrita: quando há duas vozes, elas devem ser escritas paralela e

simetricamente, com as barras de compassos atingindo as duas vozes, para que ambas as

vozes sejam lidas ao mesmo tempo.

Objeto Musical: O ritmo deste exercício se organiza em métrica quaternária,

com sons e pausas, em duas vozes simultâneas: a da voz e a das palmas.

Espaços práticos utilizados pelo aluno: Para organizar a escrita no papel, o

aluno coordena a visão com a técnica manual de desenhar as notas numa organização

espacial sobre o papel. A ordenação é distribuída pelo movimento das mãos no sentido

da esquerda para a direita e esta mesma direção é acompanhada pelo movimento dos

olhos.

Inferências sobre as representações musicais:

A sincronia dos sons é representada na notação pelo paralelismo de dois planos

horizontais. Afirmamos que para o aluno compreender a escrita, deve realizado antes

um reflexionamento do conteúdo da sua ação no espaço físico para o plano

representativo. Este conteúdo, que foi organizado no método adotado primeiramente

pela leitura de números representando a ordem de sucessão dos sons no tempo do

compasso, deverá agora ser representado por signos (notação musical convencional).

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228

Assim como a imagem tátil-cinestésica das batidas dos pés e palmas informam ao

sujeito as pontuações feitas no espaço da sala de aula, levando o aluno a testemunhar a

causa do som na música, podemos afirmar que, na atividade agora iniciada, os

elementos descontínuos da escrita (notação de figuras e pausas) vem pontuar a

continuidade - agora numa representação significante através da escrita no papel –

informando ao aluno, no plano da representação simbólica da escrita, aquilo que foi

vivido por ele através do gesto e da audição.

Estrutura infralógica: A representação temporal e espacial são correlacionadas

na notação musical: A organização linear da escrita representa a continuidade do tempo

musical, e as figuras são descontinuidades que compõe a organização rítmica da música.

Nota-se que a professora induz a representação temporal pela representação espacial da

escrita ao instruir a turma a respeitar uma distribuição uniforme dos signos musicais no

espaço do papel como representação do tempo métrico distribuído em porções

equivalentes de papel para cada pulsação.

Relação espaço-temporal: A sincronia dos sons das duas vozes é representada

arbitrariamente no papel pelo paralelismo dos dois planos horizontais da escrita.

Considerando que os alunos desta escola devem compreender as regras da

notação para realizarem atividades em aulas de instrumento, e nos ensaios da orquestra,

avaliamos que a abordagem desta professora foi adequada, visto que garantiu que os

alunos realizassem abstrações empíricas e pseudo-empíricas a partir de situações

práticas para só então levá-los a identificar tais conteúdos pelo código convencional.

Assim, a pedagogia adotada ajudou a organizar o pensamento da criança instruindo-a

sobre as regras socialmente instituídas do código da notação musical convencional.

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229

4.2.2.3 Representação tátil

4.2.2.3.1 Aula de violão (26 de maio de 2009)

Esta aula foi escolhida como exemplo da representação tátil com dominância

figurativa pois a imagem tátil foi o foco da ação da aluna. No caso em questão, a aluna

está aprendendo o lugar das notas da escala de Dó na primeira posição do violão.

A representação tátil é muito importante na prática instrumental, pois dela

depende a independência do olhar do instrumentista em relação às ações das mãos na

localização das partes do instrumento, mas ela deve vir coordenada necessariamente

com a representação auditiva.

Ação:

O professor convida ISI a aprender a tocar a Escala de Do, pois assim, sabendo

as notas [onde tocá-las no violão], ela poderá tocar várias melodias.

O professor e aluna, cada um com seu violão, olham para a partitura. Nela estão

escritas as notas com o número dos dedos.

O professor aponta para o livro e explica que os dedos estão representados por

bolinhas (1, 2, 3 e 4).

DÓ - “Começando pelo Dó com dedo 3, na corda 5, casa 3”.

Neste momento ISI havia colocado o dedo 2 na corda 5 mas na casa 2. O

professor pede que ISI olhe para a mão dele, e mantendo sua posição correta, vai

orientando a mudança que ISI tem que fazer com a mão esquerda: “mais uma casa pra

cá, agora o dedo 3.” ISI corrige olhando para a própria mão e comparando com a mão

do professor.

Objeto musical:

Escala do Dó Maior tocada na primeira posição do violão e a localização das

posições para tocá-la do violão.

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Espaços Práticos utilizados pelo aluno:

Espaço tátil: Mão direita, através do toque dos dedos indicador e médio, produz

a vibração das cordas do instrumento (soltas ou reguladas no comprimento pela

mão esquerda).

Espaço auditivo: ISI reage a cada som que ouve cantando, fazendo

comentários... apesar de o professor não solicitar tomadas de consciência deste

aspecto da percepção.

Espaço visual: Para acertar a posição das mãos sobre o instrumento ISI olha

para as elas. É como se os olhos colocassem a mão no lugar certo.

Espaço vocal: O cantar é usado como forma de linguagem pois a nomeação das

notas conduz a uma conceitualização de toda a ação pela criança e contribui para

a ampliação do espaço auditivo.

Inferências sobre as representações musicais:

Para conceber o espaço onde uma nota é realizada no instrumento, o sujeito

utiliza o aspecto infralógico do pensamento. Todos os elementos da motricidade

envolvidos para a concretização do som [objeto] estão em jogo no pensamento de ISI. A

coordenação de todos os espaços práticos utilizados por ISI para realizar a Escala exige

uma representação da totalidade do objeto que está sendo construído: a escala de Dó

maior. Podemos supor que esta totalidade é envolvida por um conceito que a criança

denomina pelo nome da escala e que é composta por todas as sete notas (e ainda a

oitava da tônica, que é tocada em outra posição).

O fato de a aluna conferir com o olhar os lugares para onde dirige sua mão

demonstra o quanto a coordenação das posições está impregnada do controle visual. Na

medida em que o espaço tátil se coordena com o auditivo, não será mais necessário o

visual e mais veloz fica a coordenação geral das ações.

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Porém, como pudemos verificar na análise das concepções epistemológicas

deste professor de violão (ver quadro 5 do capítulo 4) não existem evidências de que ele

considere as tomadas de consciência do espaço auditivo pela criança uma coisa

importante em sua ação pedagógica.

4.2.2.3.2 Aula de piano (17 de junho de 2009)

Esta aula foi escolhida como exemplo de representação tátil operativa já que é

centrada na explicação do movimento feito pelos dedos sobre o teclado para realizar um

intervalo de 3ª no piano.

Ação:

A professora pergunta para JEN “O que é o salto, mesmo?” JEN coloca a mão

no teclado e diz: “salto pra cima” ao mesmo tempo que toca uma terça ascendente no

teclado. “O salto só pode ser pra cima?” - pergunta a professora.

A professora pede que JEN imagine como explicaria para ISA, o que é o salto.

JEN acha difícil explicar. A professora insiste: “Treina comigo: se você estiver tocando

uma tecla, pra fazer o salto, o que você terá que fazer lá no teclado?” JEN diz: “ah!

Tenho que pular uma”. “Pular o quê?”- pergunta a professora. “Uma tecla” – diz JEN.

“Qualquer tecla?- pergunta a professora.

JEN toca saltos e vai pensando e diz: “a que estiver do lado”.

A professora toca um semitom (de uma tecla branca para uma tecla preta) e diz:

“esta tecla está do lado desta, se eu pular esta eu faço um salto?” JEN responde: “tem

que ser tecla branca”.

A professora então diz: “se eu estou numa tecla branca salto uma branca e vou

para outra branca, eu faço um salto. Muito bem. E o dedo? ” JEN não se lembrava. A

professora coloca a mão sobre as teclas e vai dizendo: “se você toca uma tecla com um

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dedo, pra fazer o salto você vai saltar uma tecla branca, e em cima dessa tecla que você

saltou tem um dedo! Então você vai saltar tanto a tecla, quando vai saltar o dedo!”

Objeto musical

A explicação da aluna sobre o intervalo melódico de terça quando usamos as

teclas brancas do piano

Espaços práticos utilizados pela aluna

Para JEN, mais fácil do que falar sobre os intervalos, é tocá-los. Este saber é

figurativo, parte da percepção (táctil-visual) sobre a experiência de tocar.

Inferências sobre as representações musicais

As explicações da JEN partem das ações que ela faz no teclado, estabelecendo

relações da estrutura da mão (uso dos dedos) com a estrutura das teclas (brancas). As

operações infralógicas sobre cada uma destas estruturas são subjacentes às operações

lógicas que se busca estabelecer entre elas.

A pedagogia adotada leva JEN a rever todas as invariantes envolvidas na sua

ação tais como a sequencia dos sons sobre as teclas brancas, os dedos da mão que

pousam sobre elas e a distancia do som realizado por ela. A comparação com uma

situação que poderia ser descrita da mesma forma fez com que JEN chegasse a

especificidade do objeto “salto”: “tem que ser nas teclas brancas”[...] “tem que pular

uma tecla”.

4.2.2.4 Representação cinestésica

4.2.2.4.1 Aula de EPEM 12 (19/05/2009)

Os esquemas cinestésicos presentes nos exercícios propostos favorecem a

operatividade dentro da própria ação. Posteriormente estes esquemas poderão ser

utilizados como imagem mental (cinestésica) relacionada ao objeto musical vivido pela

criança em outras atividades.

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Ação:

A professora relembra a aula anterior em que a turma trabalhou uma música a

duas vozes, e diz que as duas linhas devem ser lidas ao mesmo tempo. Ela explica que

no método O Passo65, a leitura do número sem parêntese na voz superior indica que se

deve pronunciar o som com números. Já o número sem parêntese na voz inferior indica

que se deve bater palmas. Os alunos ainda não conhecem as figuras musicais

convencionais, mas já reconhecem a simbologia expressa pelos números sem parênteses

(som) e entre parênteses (silêncio) utilizada no método citado.

As crianças fazem a leitura rítmica a duas vozes (voz e palmas) ao mesmo tempo

que mantém o movimento dos passos para frente e para trás em quatro pulsações

reiteradas.

Objeto Musical: O ritmo deste exercício se organiza em métrica quaternária,

com sons e pausas distribuídos em duas vozes simultâneas.

Espaços práticos utilizados pelo aluno:

Os espaços práticos envolvidos na ação são olhos, passos, palmas e fala.

Espaço Visual: os olhos seguem a ordem da escrita da esquerda para a direita

onde cada passo é representado por um número cardinal (1, 2, 3, 4).

Espaço Tátil-Cinestésico: Ao andar, o sujeito “traça” um quadrado virtual no

espaço físico, em cujos vértices ele estará apoiando os pés durante a realização

do exercício.

Espaço Vocal: os alunos coordenam o tempo de falar e o tempo de calar de

acordo com a ordem de sucessão expressa ordinalmente (1º passo, 2º passo, 3º

passo, 4º passo).

65 Método de musicalização denominado O Passo de Lucas Ciavatta (2003).

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Inferências sobre as representações cinestésicas musicais:

A ordenação dos tempos da métrica musical se organiza no espaço, de modo que

quando o sujeito recomeça o ciclo de passos com o pé direito no vértice inicial, ele

recomeça o mesmo ciclo de 4 pulsações. Esta reiteração a partir da unidade de medida

espaço-temporal do passo estabelece uma correspondência do espaço métrico (passo)

com o tempo métrico (pulsação).

Os eventos sonoros identificados pelos números com ou sem parênteses (figuras

ou pausas respectivamente) são, então, vivenciados pelos alunos dentro desta

organização espaço-temporal. A ação de falar ou bater palmas passa a ser a causa do

resultado sonoro produzido pelo aluno. Há indícios de internalização da organização

rítmica quaternária na forma de tempo objetivo construído através das abstrações

pseudo-empíricas ocorridas durante a atividade.

A estrutura infralógica solicitada é evidenciada pela coordenação estabelecida

entre a continuidade do tempo e a descontinuidade das figuras ou pausas que são

executadas em meio ao equilíbrio de movimentos contínuos e descontínuos feitos pelos

alunos.

A estrutura lógico-matemática solicitada é da relação de termo a termo:

Cada número lido pelos alunos tem seu correspondente na ordenação rítmica. O tempo

de duração de uma pulsação é idêntico ao tempo do passo a ser dado pelo aluno. Assim,

tanto o tempo do silêncio na pausa como o som das palmas são equivalentes dentro da

estrutura temporal. Há uma diferenciação clara entre dois elementos antagônicos na

dialética musical: o som e o silêncio. Há também uma ordenação métrica: ao falar o

número correspondente da ordenação dos tempos da métrica, o aluno relaciona a

experiência sonora com as relações de ordem entre os tempos.

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4.2.2.4.2 Aula de violão (30 de junho)

Esta aula foi escolhida como exemplo de representação cinestésica figurativa

pois as mudanças de posição da mão para tocar são apoiadas nas imagens dos

movimentos laterais e verticais da mão sobre o braço do violão.

Ação:

A aluna toca a Escala Do maior no violão coordenado a ação das duas mãos ao

tocar 2 vezes em cada espaço.

Objeto Musical:

Escala de Dó maior escrita no pentagrama com clave de Sol.

Espaço práticos utilizados pelo aluno

Espaço Tátil-cinestésico: Nesta ação vemos a coordenação das duas mãos.

Os dedos da ME pressionam e soltam a corda e se deslocam verticalmente para a

cordas mais aguda que fica abaixo da anterior. Já os dedos da MD, dedilham com os

dedos indicador e médio, nas cordas onde se encontram as afinações das alturas

necessárias para montar a estrutura da escala na primeira posição.

Figura14: Representação dos pontos de contato da ação dos dedos da MD nas cordas do violão para tocar a escala de Dó Maior na primeira posição

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Figura15: Representação dos pontos de contado da ação dos dedos da ME do violonista sobre as cordas

do violão para tocar a escala de Dó Maior na primeira posição.

Inferências sobre as representações musicais:

Nesta atividade ISI treina os esquemas motores com movimentos das duas mãos,

porém as repetições favorecem a preparação das mudanças de posição.

Há uma centração no construção do desenho contínuo da escala que é composto

das descontinuidades das mudanças de posição das duas mãos. A escala é formada no

estado final das transformações de alturas do som e estas transformações se realizam

pela ação de ISI sobre pontos descontínuos do espaço topológico do violão.

Quadro 11: Quadro informativo das relaçòes dos dedos e cordas usados na coordenação tátil na primeira posição do violão para a Escala diatônica de Dó maior

Dedos ME Cordas notas Dedos MD 3º dedo 5ª Dó I

corda solta 4ª Ré M

2º dedo 4ª Mi I

3º dedo 4ª Fá M

corda solta 3ª Sol I

2º dedo 3ª Lá M

corda solta 2ª Si I

1º dedo 2ª Dó M

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4.2.2.4.3 Aula de piano (24 de junho de 2009)

Esta aula foi escolhida como exemplo de representação tátil figurativa visto que

é voltada para a experiência de objetos musicais complexos, que só futuramente serão

conceituados pela aluna. No entanto, a pedagogia solicita um avanço na atividade

cognitiva ao reapresentar o objeto modificado pela aluna como forma de levá-la à tomar

consciência do erro por si mesma.

Ação:

1.Tocando as cifras e melodia de Cai Cai Balão: ISA e a professora estão

sentadas em frente ao piano. A professora mostra como fazer e ISA imita sua ação para

deslocar a ME nas teclas com a posição de arco.

Para que este deslocamento funcione bem, é essencial “não modificar a posição da mão”

diz a professora para ISA.

2. Harmonia e melodia: coordenação de duas ações diferentes com as duas

mãos juntas.

Ao começar a tocar com as duas mãos juntas ISA apresenta dificuldade para

tocar simultaneamente. Se toca a esquerda, não toca a direita (é como se sentisse a ação

da esquerda como a continuação da ação da direita).

A professora a interrompe para mostrar e explicar como fazer: “a mão direita

toca o primeiro som e as duas tocam o segundo som ao mesmo tempo” diz. Pede que

ISA faça apenas esta parte. Ela faz e consegue.

ISA continua mas repete três vezes ao invés de duas o sol inicial da melodia. A

professora canta como seria se a letra fosse igual o que ISA tocou: Cai cai cai balão.

ISA ri e repete a ação, agora sem o erro. A professora elogia: “Muito bem! Ótimo!”

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Objeto Musical:

Melodia tradicional brasileira, em Dó maior, começando na Dominante e

terminando na Tônica, cuja extensão é de um intervalo de sexta. Como foi apreendida

tátil e auditivamente pela aluna, não é grafada em partitura, mas é representada pela

letra da música no papel. Seus intervalos melódicos se mantém em segundas ou terças

formando um desenho melódico que favorece o raciocínio sobre a seqüência de sons

repetidos e também sobre a repetição de séries de sons.

A harmonia é escrita através de cifras obedecendo o padrão usado na música

popular: localiza-se sobre as sílabas da letra da música nos momentos em que o “arco” é

tocado. As cifras são grafadas com letras maiúsculas.

C Cai Cai Balão, C Cai Cai Balão, C G Aqui na minha mão, G G

Não cai não, não cai não, não G

cai não, G C

Cai na Rua do Sabão. Figura 16: Notação Alfabética da música Cai Cai Balão utilizada na aula de piano

1. O arco de Dó (C) é composto das teclas Dó e Sol tocadas pelos 5º e 1º dedos da mão

esquerda. Assim, quando ISA tocar com a ME, deverá prestar atenção na tecla ocupada

pelo 1º dedo no arco de Dó (tecla Sol), pois ao transferir a ME para o arco de Sol (G),

que é composto pelas teclas Sol-Ré, a tecla Sol deverá ser o ponto de referencia para

posicionar o 5º dedo da ME.

Figura17: Diagrama do teclado com as localizações das teclas e dos dedos nos arcos de Dó e de Sol

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239

2. A coordenação dos movimentos das duas mãos envolve os espaços auditivo,

cinestésico e tátil guiados pela visualização do esquema escrito no caderno.

C

Cai Cai Balão,

Figura 18: Representação gráfica da coordenação dos movimentos sonoros realizados da MD e ME na música Cai Cai Balão.

Espaços Práticos utilizados pelo aluno:

1. Coordenação dos espaços visual, auditivo e tátil: ISA olha para as cifras e

busca os arcos no teclado mantendo a posição da ME em arco para localizar o espaço do

teclado onde colocará o 5º dedo.

2. Tátil-cinestésico: Na segunda ação, ISA tem que coordenar seus espaços

práticos em duas ações dferentes: a MD toca vários sons sucessivamente e deslocando a

mão da direita para a esquerda no teclado e ME abaixa as teclas num movimento

vertical com dois dedos simultaneamente no momento em que a MD toca seu segundo

som.

Coordenação dos espaços visual, tátil e auditivo: ISA olha pra o teclado e

coordena os movimentos das duas mãos. Seus olhos caminham de uma região a outra do

teclado para localizar as teclas. Já pela audição ISA regula o tempo exato das

simultaneidades. ISA programa os momentos em que deve tocar com as duas mãos se

baseando na leitura da letra com cifras e na audição da melodia cantada pela professora.

Inferências sobre as representações musicais:

A forma da mão em arco é uma unidade de medida espacial que ISA usará para

deslocar a ME sobre o teclado e realizar a estrutura do intervalo harmônico de 5ª. Na

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primeira ação, ISA centrou-se nos espaços tátil e cinestésico. Na segunda centrou-se na

representação auditiva que deve regular a coordenação dos movimentos das duas mãos.

Ao ouvir o resultado de sua ação na voz da professora, ISA compara, através da

reversibilidade do pensamento operatório, o modelo representado que tentou imitar e o

modelo atualizado pela professora. Assim, toma consciência de seu erro e corrige sua

ação.

Na coordenação dos movimentos das duas mãos podemos acompanhar a

dialética do pensamento de ISA que apresenta momentos de sincronia e de diacronia

para realizar uma linha melódica contínua que sofre interferência das continuidades e

descontinuidades harmônicas. No “A-qui”, a mão direita sai do Sol e vai para o Lá. A

mão esquerda permanece repetindo o arco de Dó (C).

Consideramos que a intervenção pedagógica favoreceu a construção e integração

das representações conceituais e práticas da aluna e levando-a a coordenar movimentos

complexos dificilmente alcançados sem as solicitações e cooperações pontuais da

professora. ISA conseguiu reagir ao código da cifra (conceito de sons simultâneos

realizados por uma mão só) e coordenou-o com a melodia chegando a articular os

elementos musicais durante a continuidade temporal com equilíbrio crescente.

4.2.2.5 Representação vocal

4.2.2.5.1 Aula de EPEM 12 (26 de maio de 2009)

Esta aula foi escolhida como exemplo de representação vocal figurativa, pois os

alunos vivenciam as alturas pelo canto, mas esta figuratividade oscila com a

representação auditiva operativa. Nota-se que outros espaços estão sendo utilizados para

dar apoio à formação de esquemas vocais que apóiam o reconhecimento dos intervalos

nas assimilações auditivas do sujeito.

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Ação:

Parte 1: Na leitura de partitura não convencional (em vez de notas, são números

que ocupam as linhas e espaços do pentagrama) a professora pede que os alunos digam

qual é o primeiro som. Eles lêem no papel e respondem que é o 5. (Alguns ficam

cantando agudo: “cinco”...) A professora toca o som “1” no piano e pede que eles

cantem do 1 até chegar no 5. Depois ela convida-os a fazerem um movimento com as

mãos e acompanha-os tocando e fazendo gestos com a MD: mostra o número de dedos

correspondente ao número que eles devem cantar (sempre em graus conjuntos subindo e

descendo), e eleva ou abaixa a mão dependendo do movimento da linha melódica. Os

alunos imitam estes gestos enquanto cantam.

A professora acrescenta mais uma modificação: no momento de cantar o som 4

ela coloca a mão atrás da cabeça “como se os dedos fossem chifres” - como ela mesma

diz - e pede que eles cantem este som só “dentro da cabeça”, ou seja, imaginem o som

da escala que eles deveriam cantar na ordem [da escala que dá suporte à melodia que no

caso, do 5 para o 3, devem imaginar o 4], mas em vez de cantar, fiquem em silêncio.

As crianças também imitam o movimento de subir e descer das mãos que

representa a direção das alturas: quanto mais agudo mais para cima e vice versa.

A professora então faz uma analogia do intervalo com o som do “Relógio-do-

Cuco” e treina os alunos a cantarem como o passarinho: “Cu-co” em 3ª descendente

Parte 2: A leitura da partitura é realizada pela primeira vez com as crianças

sentadas. É dado o tom ao piano, e eles começam a cantar. A dificuldade acontece no

intervalo de terça 5-3, que muitos não conseguem afinar. Cantam como se o 3 fosse o 4.

A professora os corrige cantando o 3 e dizendo: “olha o cuco aí! ‘Cu-co’, 5-3”.

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Objeto Musical:

Parte 1: Escala diatônica maior em vários tons, depois o intervalo de terça

menor descendente é trabalhado vocalmente com apoio visual dos gestos

representativos do movimento melódico usando a relação do movimento vertical dos

braços e mãos no espaço. Finalmente, o intervalo de terça menor descendente é

associado ao esquemas sonoro conhecido pelas crianças do relógio “cu-co”.

Parte 2. Melodia constituída de cinco graus da escala, escritos com números

sobre o pentagrama onde o intervalo melódico do 5º para o 3º grau é preparado por

graus conjuntos e pelo salto melódico de 3ª descendente.

Figura 19: Destaque do intervalo de terça menor descendente representado pelos números e pelo gesto na atividade.

Espaços práticos utilizados pelo sujeito:

Espaços Vocal, auditivo, visual e cinestésico: a coordenação de todos estes

espaços visa a constituição da imagem mental do som de terça menor descendente.

Inferências sobre as representações musicais:

Parte 1: Através da coordenação dos espaços práticos vemos a interiorização da

ordenação os sons da escala (através dos números de dedos das mãos e das alturas no

espaço). Ao serem cantados, os sons vão sendo percebidos e comparados através da sua

concretização real pela voz do próprio sujeito. É o sujeito que o produz mais grave ou

mais agudo através da ação de sua voz. As abstrações pseudo-empíricas realizadas pelo

sujeito através desta ação levam-no a construir uma organização onde há uma ordem

hierárquica de elementos assimétricos cantados do mais grave ao mais agudo e vice-

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versa já que a escala é realizada ascendente e descendentemente. Assim, solicita-se uma

ação e sua inversão.

Como a criança já conhece a ordenação numérica, ela generaliza para a série de

notas a mesma ordem dos algarismos numéricos criando uma relação de ordenação

entre os sons hierarquicamente distribuídos do grave para o agudo.

Parte 2. Trata-se da solicitação da representação do som, que não é realizado

naquele momento, através do gesto de esconder a mão, como se o som estivesse

“escondido” no silêncio. O som é imaginado, e se já está representado, a criança

consegue cantar o som seguinte.

Interessante é que o tempo para imaginar este som é respeitado por todos, e é

necessário que a criança aguarde este tempo para imaginar o som “ausente”. Assim

estará construindo um esquema possível de se transformar num conceito operatório,

pois passível de ser reconstruído através da reversibilidade.

Vemos duas representações sobrepostas nesta ação: a do silêncio e a do intervalo

de 3ª que faz com que o sujeito tenha que se lembrar do som entre os dois. É como se

fosse um objeto atrás de um anteparo. A criança sabe que ele está lá, mas não pode vê-

lo. No caso do som, a criança sabe que a altura existe, imagina o seu som, mas não o

ouve. O silêncio funciona como um “anteparo” para o som saltado.

Apoiando-se num esquema auditivo externo à situação real da sala de aula, a

professora leva a associação deste esquema ao canto do intervalo de 3ª descendente.

Desta forma, as crianças assimilam o objeto (o intervalo de terça) recorrendo à memória

auditiva de outra experiência para a qual já construíram um esquema auditivo. Ao

utilizar uma representação que se encaixa na construção do esquema de terça

descendente, procura-se aumentar a velocidade do pensamento durante o solfejo. Assim,

não se torna mais necessário o uso do esquema sensório-motor do intervalo de terça.

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244

Temos aí num novo esquema auditivo, já representado, sendo treinado por um exercício

de assimilação.

4.2.2.6 Representação postural

4.2.2.6.1 Aula de violino (11 de maio de 2009)

Esta aula foi escolhida como exemplo de representação postural pois durante o

desenrolar da atividade a solicitação da postura permitiu diferenciações dos parâmetros

sonoros graças à mudança de forma de produzir som no violino com ou sem o uso do

arco.

Como as alunas são principiantes, a repetição de apenas dois sons permite que

elas sejam inseridas numa atividade musical e, ao mesmo tempo, adquiram resistência

física para sustentar o instrumento por um tempo cada vez mais prolongado.

Ação:

1. A professora pinta as notas do caderno que a aluna deve tocar e vai apontando para

que ela leia e toque.

AGA segura o violino e toca 10 vezes na corda La e Mi em pizzicato.

2. A professora toca no piano a melodia de Ode a Alegria enquanto as alunas fazem

movimentos diferentes usando as cordas La e Mi:

• BEA toca em pizzicato,

• AGA toca os mesmos sons usando o arco.

Em seguida a professora pede que BEA escreva as notas em todas as linhas e espaços e,

em seguida, pede que ela preencha as notas Lá e Mi com cores. A professora escreve os

signos destes sons na pauta, solicitando que a aluna relacione tais signos aos sons que

ela tocou anteriormente (Mi e Lá) quando usou apenas cordas soltas.

Objeto Musical:

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1. Audição da melodia Ode a Alegria de Beethoven, construída dentro dos 5 graus

conjuntos (La, Si, Do, Ré, Mi) tocada pela professora ao piano.

2. Intervalo melódico de 5ª justa tocado na pulsação. Estes sons funcionam como apoio

harmônico da melodia tocada pela professora.

Espaços Práticos utilizados pelo aluno:

Espaço postural para equilibrar o corpo na posição vertical e sustentar o

instrumento.

Coordenação dos espaços: Auditivo ao ouvir o som e o que a professora toca ao

piano nos tempos de espera entre um ataque e outro das notas; Tátil ao tanger as cordas

em pizzicato. Cinestésico no movimento de mudança de cordas no toque pizzicato.

Visual ao ler as notas na partitura;

1. Coordenação de vários espaços, mas principalmente:

Na ação de BEA: o espaço tátil do dedo indicador da mão direita (para tanger as

cordas em pizzicato).

Na ação de AGA: controle da duração do som através do movimento do membro

superior direito (no uso do arco)

Inferências sobre as representações musicais:

O conhecimento físico possibilitado pela ação das alunas envolve a construção

da continuidade do objeto musical através de participações descontínuas realizadas por

elas. Existe uma coordenação global da postura e dos movimentos físicos necessários

para a produção do intervalo melódico de 5ª justa dentro da pulsação, que solicitam o

funcionamento de esquemas mentais para a leitura das notas na pauta e para tanger os

dedos da mão direita em momentos exatos e em espaços precisos das cordas. Tal

coordenação é apoiada pela colaboração da professora que apontada e canta o nome das

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246

notas na partitura das alunas. A imagem mental da melodia, que já havia sido tocada e

escrita anteriormente, também serve de guia para a ação de AGA e de BEA.

Apesar da simplicidade da partitura, vemos que a possibilidade de variar as

formas de tocar propicia à BEA e AGA realizarem abstrações pseudo-empíricas das

durações do som no ritmo que tocam. Ao realizarem durações diferentes

simultaneamente, as alunas devem coordenar a medida do tempo, através de uma

mesma pulsação. Graças aos diferentes movimentos que realizam no instrumento,

ambas realizam abstrações empíricas destas diferenças.

A continuidade do som pelo uso do arco permitiria a abstração pseudo-empírica

do som contínuo, e a descontinuidade do pizzicato permitiria a abstração pseudo-

empírica dos sons descontínuos e, com os momentos de ataque e de espera até o

próximo ataque, poderiam levar à tomada de consciência da duração do som que a

colega faz. Além destas abstrações, a audição da melodia tocada pela professora

funciona como um espaço sonoro (contínuo) dentro do qual as duas alunas atuam com

elementos sonoros descontínuos.

No entanto, como não houve solicitação para a tomada de consciência de todos

estes elementos na aula de instrumento, as abstrações empíricas sobre estes cumprem a

função de construir suas representações musicais no nível figurativo. Se estas

representações fossem solicitadas nas aulas de EPEM, por exemplo, poderiam vir a

contribuir para reflexionamentos e destas representações e suas reflexões no nível

operatório.

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247

4.4 Considerações Finais do capítulo 4

Ao observar crianças submetidas ao ensino formal de música, partimos da

premissa de que as estruturas mentais em jogo nas suas interações com o meio já teria

alcançado o nível do período pré-operatório e que elas estariam desenvolvendo as

estruturas operatório-concretas. Para tal, levamos em conta as idades e também o fato de

que todas eram crianças alfabetizadas. Tratava-se, pois, de esclarecer se os processos

utilizados por elas na assimilação-acomodação do objeto musical apresentavam

dominância figurativa ou operativa, e de que modo as ações solicitadas pelos

professores as levavam a desenvolver suas estruturas operatórias.

Embora sem utilizar o método clínico, no qual teríamos que perguntar

diretamente à criança para analisar suas estruturas, procuramos descrever as ações dos

sujeitos observados a fim de seguir a lógica destas ações identificando as noções

envolvidas no funcionamento do pensamento dos sujeitos ao fazerem música.

Nas análises que fizemos no ambiente de escola de música observado, nos

interessou saber se era possível conhecer as operações mentais necessárias para

abstrações pseudo-empíricas do objeto musical a partir da técnica dos instrumentos

usados pelos sujeitos, e de que forma elas ajudam a organizar a aprendizagem musical

destes alunos.

A comparação do trabalho de duas disciplinas tidas como complementares

comprovaram a necessidade de se consolidarem trocas entre os professores no sentido

de conhecerem o método utilizado pelos colegas ao trabalharem com os mesmos alunos.

A partir das informações sobre a programação de conteúdos e do método adotado pelos

professores, tanto de EPEM como de instrumentos, concluímos que a pedagogia

adotada por eles atendia a alguns objetivos comuns e a outros diferentes, apesar de os

objetos musicais envolvidos nos programas de todos serem muito semelhantes.

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248

Enquanto a professora de EPEM levava os alunos a realizarem atividades onde o

som cantado por eles, ou batido com palmas tinha como objetivo levá-los a abstraírem

propriedades do som para compreenderem a leitura e aprenderem a escrever,

predominava entre os professores de instrumento, a tendência de levarem seus alunos a

adaptarem a leitura de partituras ao uso do instrumento com um programa progressivo

de aprimoramento da técnica do instrumento.

No entanto, apesar do nosso respeito por todos os professores que nos acolheram

em suas aulas, devemos manifestar nossa preocupação quanto à pedagogia dos

instrumentos adotada nas aulas que observamos.

Em geral, percebemos que os professores de instrumento não eram conscientes

da importância de suas solicitações no processo de construção simbólica que favorece a

aprendizagem da música pela criança. Mesmo tornando-se a música um objeto

significativo para as crianças, podemos supor que esta construção poderia ter sido muito

mais significativa se as crianças fossem levadas a improvisar e a criar sobre os sons do

instrumentos e se, a partir daí, os professores perguntassem aos alunos sobre a qualidade

do som que eles produziam. Em geral, as intervenções dos professores tendiam mais

para a explicação da técnica e para o estabelecimento dos acordos simbólicos para a

compreensão da notação musical convencional pelo grupo.

Talvez por falta de uma reflexão sobre o papel das abstrações pseudo-empíricas

e para as necessárias tomadas de consciência dos alunos sobre os aspectos da música

que resultam de suas ações, a construção do conhecimento musical manteve-se

predominantemente sob o aspecto figurativo do pensamento musical, sendo raras as

ocasiões em que as crianças foram convidadas a improvisar música nas aulas de

instrumento e de EPEM. Assim, a notação foi sendo interiorizada sem um processo de

construção subjetiva dos sujeitos.

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249

A descrição sobre o ensino da técnica dos instrumentos nos leva a concluir que

os espaços práticos utilizados pelos alunos determinam o tipo de representação

figurativa do objeto musical construída pelo sujeito. Tal conclusão nos ajudou a

confirmar a hipótese inicial de que as representações musicais são construídas sobre

ações bastante diferentes dependendo do instrumento usado.

Os músicos que tocam instrumentos de cordas (tais como o violino e o

violoncelo) produzem imagens mentais de seus atos ao fazerem vibrar as cordas do

instrumento, usando o pinçar dos dedos ou a fricção do arco, devagar ou rápido. Já para

os pianistas, elas são construídas sobre o gesto de permanecer ou retirar os dedos do

fundo das teclas, e assim como no violão, no qual as durações são construídas sobre o

beliscar das cordas, deve-se aguardar e ouvir a duração da corda vibrando entre uma

ação e outra dos dedos.

Portanto, o espaço tátil é aquele que faz vibrar a corda e produzir o som. Mas,

para isso, cada instrumento solicita representações cinestésicas diferentes, pois o espaço

de cada instrumento supõe um domínio do espaço cinestésico do corpo, que faz, ou não,

movimentos mais ou menos amplos dos braços, do tronco, das pernas e dos pés.

Enquanto os pianistas representam as variações de alturas dos sons por

movimentos laterais (direita ou esquerda), os violinistas e os violonistas representam

estes sons por movimentos do braço esquerdo se aproximando ou se afastando do corpo,

e também do movimento dos dedos para cima ou para baixo ao mudarem de corda. Os

violoncelistas, por sua vez, representam as transformações do grave para o agudo com

base nos movimentos descendentes do braço esquerdo, com o objetivo de encurtarem o

comprimento das cordas com a pressão dos seus dedos, e do agudo para o grave através

do movimento ascendente do braço.

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Na iniciação de crianças aos instrumentos percebemos que elas sentem uma

grande necessidade de olhar para onde suas mãos se dirigem, ou para a direção de onde

vem o som, como se o olhar fosse o responsável pelo tato ou pela audição. Mesmo que

digamos para a criança que ela não precisa olhar para as teclas, ou para as cordas (ou

que não são os olhos que tocam, mas sim a ponta dos dedos), a criança naturalmente

dirige o olhar para a sua ação sobre o instrumento.

Esta tendência comprova que o espaço visual continua sendo um importante

apoio às operações mentais do sujeito, mesmo que a criança já tenha atingido a

capacidade de representar seus próprios espaços práticos, quando já chegou aos estágios

das estruturas operatórias. Impedir que a criança olhe para o instrumento é o mesmo que

pedir, durante as aulas de matemática, que as crianças não contem com os dedos para

operarem sobre os dados.

Construir imagens dos movimentos não é fácil quando temos pressa de ajustá-las

às representações da notação convencional, pois existe uma lógica no movimento que

não encontra semelhança na lógica da notação. Por este motivo, os métodos de

instrumentos, em geral, suprimem esta etapa levando o aluno pelo caminho da

associação. Podemos concluir que eles levam o aluno tocar, mas dificilmente o levam

ao conhecimento musical autônomo.

Pelas observações que fizemos, pudemos inferir que os sujeitos assimilavam a

música através de abstrações empíricas sobre as ações musicais realizadas por eles ou

pelo professor, mas que as abstrações pseudo-empíricas, reflexionantes e refletidas

foram pouco solicitadas pela pedagogia dos instrumentos. Quando foram identificadas,

as abstrações pseudo-empíricas foram elucidativas sobre as construções internas do

sujeito e de como podem levá-lo a representar a música.

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Concluímos que as conservações dos dados das experiências às quais os alunos

foram expostos durante as aulas, puderam ser alcançadas através dos processos de

assimilação e acomodação aos objetos musicais.

As classificações dos objetos musicais foram feitas sobre as qualidades dos sons

tomando os parâmetros sonoros como classes. Estas operações puderam ser conhecidas

nas atividades onde as crianças eram solicitadas a comparar as qualidades sonoras dos

objetos agrupando-os por semelhanças e diferenças. Ver exemplo da aula de EPEM 12,

do dia 16 de junho (item 4.2.2.1.3, da pg. 216) ou na aula de piano (item 4.2.2.3.2, da

pg.231).

Já as seriações foram conhecidas nas atividades em que as crianças comparavam

e graduavam as diferenças dos objetos construindo coleções seriadas por categorias de

classificação: mais agudo, mais grave; ou, mais lento, mais lento ainda; ou, mais rápido,

mais rápido ainda; ou mais piano, mais piano ainda. Ver exemplo da aula de Epem

(item 4.2.2.5.1, da pg.240) em que os alunos cantavam o intervalo de terça descendente

imaginando o som que estava entre os dois que ela cantava.

No contexto pedagógico observado pudemos constatar que sempre houve

solicitação do professor para que os alunos pudessem exercitar esquemas sensório-

motores, mas nem sempre os alunos foram levados a comparar os conteúdos de suas

ações sobre os objetos musicais. Em geral, as explicações musicais aconteciam em

momentos de constatação dos resultados pelas crianças. É o caso por exemplo, da aula

ISI, que ao tocar com a MD deslocada da boca do violão constata que o som é diferente:

“Caraca! Que som!” ao que o professor simplesmente pede que ela mude a posição da

mão, sem levá-la à exploração dos diferentes lugares das cordas experimentando os

vários sons que poderia tirar, para comparar e conhecer timbres diferentes para a mesma

altura.

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Assim, nem sempre avançaram das abstrações empíricas para as pseudo-

empíricas. Perderam-se assim, oportunidades de realizar operações mentais através das

categorias de classificação e seriação a partir dos esquemas mentais de que dispunham.

Acreditamos que levar a criança a explicar as transformações do som que

resultam da sua ação sobre o espaço do instrumento os leva a coordenar o resultado

sonoro destas ações. Portanto, mais importante do que o aluno dizer o nome das notas

que faz, seria ele ser levado a criar músicas com algum material sonoro identificado

anteriormente, ou ser solicitado a explicar como faz para produzir o som que ele ouve

como resultado de suas ações. Assim, ao constatar que elas são a causa das

transformações do som, poderá se tornar capaz de conceituar as formas musicais

vividas. Como fazer isso virar um método de trabalho criativo e interessante, eis a tarefa

do professor.

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CONCLUSÃO

Ao concluirmos este trabalho, propomo-nos recapitular nossos passos e

responder às questões levantadas na introdução deste relatório para, a partir destas

respostas, compreender os caminhos tomados por crianças para a construção de suas

representações mentais em música.

Partimos de uma reflexão sobre a Epistemologia Genética visando iluminar o

conceito de representação e sua adequação ao domínio da música. Podemos afirmar

que a representação musical parte, em seu processo de construção, de um sentido estrito,

baseado nas imagens mentais e na evocação do fazer musical, para alcançar um sentido

amplo, constituído dos esquemas mentais envolvidos na construção dos conceitos

musicais.

Antes de tomar consciência do resultado de suas ações a criança se empenha na

eficácia de suas intenções. Para isso, ela abstrai do objeto aquilo que está disponível aos

seus espaços práticos - espaços visuais, auditivos, cinestésicos, posturais, vocais, ou

qualquer outro que estabeleça uma relação espacial do seu corpo com o real. Assim, os

fenômenos são assimilados pelo sujeito por acomodação de seus esquemas anteriores,

visando a uma adaptação, e são imitados através de ações ou de imagens mentais

(imitações diferidas).

Afirmamos que a criança constrói representações figurativas ao interiorizar suas

ações musicais cantando ou se movimentando, mas estas representações adquirem

novas configurações ao serem adaptadas ao uso dos instrumentos. É, portanto, graças à

construção de imagens táteis, visuais, cinestésicas, auditivas resultantes destas

adaptações do sujeito ao aspecto físico dos instrumentos que ele realiza novas

abstrações pseudo-empíricas que tornam suas representações musicais figurativas mais

especializadas.

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Neste sentido denominamos as representações musicais visuais, auditivas,

cinestésicas, táteis, posturais, vocais ou bucais, para definir estas formas

representativas decorrentes da internalização de ações do sujeito quando faz música,

tendo como referencia o que Piaget considera como representação no sentido estrito,

ou seja, as imagens mentais, evocações e lembranças de ações particulares.

Tais representações são figurativas e confirmam nossa hipótese de que as

representações musicais estão intimamente ligadas às configurações das relações do

sujeito com o objeto musical, através das coordenações de seus espaços práticos,

envolvendo, além disso, o tempo e a causalidade.

Quando realizam abstrações pseudo-empíricas, os sujeitos reorganizam suas

representações figurativas sob a forma de esquemas simbólicos e operativos decorrentes

da assimilação conceitual dos fenômenos musicais. No caso das representações

conceituais, estas superam as imagens mentais, mesmo sendo apoiadas nelas no seu

processo de construção. Elas ajudam a aumentar a velocidade do pensamento do sujeito

que, ao invés de fixar-se nos estados descontínuos dos sons particulares, passa a

relacioná-los construindo conceitualmente estruturas musicais cada vez maiores e com

relações cada vez mais abrangentes. Estas construções utilizam as estruturas operatórias

de classificação, de relação e de seriação, ou seja, as estruturas lógico-matemáticas, que

são construídas progressivamente desde o nível da ação no estágio sensório-motor,

passando pelo nível simbólico, até chegarem ao nível da representação.

Os conceitos musicais são construídos através das ações do sujeito, ou seja,

constituem a própria forma musical, mas não são nem ação nem sons. Eles representam

aquilo que o próprio sujeito empresta de suas estruturas categorizantes aos fenômenos

sonoros. Neste sentido, como discutimos no capítulo dois, a música alcança tal

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complexidade que passa a ser descrita através de metáforas e pode, assim, ser concebida

como uma linguagem.

Os aspectos figurativo e operativo da representação musical determinam também

o tipo de representação: tudo o que estiver ligado à evocação mnêmica do fazer musical

estará a serviço de uma representação figurativa da música. No entanto, o que faz

parte da memória de reconstituição das transformações entre os elementos estruturais da

música, como, por exemplo, as continuidades e descontinuidades temporais, melódicas,

rítmicas, o reconhecimento de frases, de tonalidades, de formas, estas dizem respeito

aos esquemas conceituais do fazer musical e trabalham em prol da representação

operativa da música.

Nas aulas de EPEM, o sistema de leitura adotado foi o de solfejo numérico, tanto

para praticar as durações temporais, que se apóiam nos esquemas auditivos das relações

temporais de sucessão métrica; como para praticar as alturas, que se apóiam sobre os

esquemas auditivos de seriação das relações sonoras assimétricas, assentadas nos

intervalos da escala diatônica maior. Estes últimos são assimilados visualmente a partir

do teclado do piano, auditivamente por imitação da voz da professora, vocalmente pelo

canto de melodias solfejadas por leitura de números dispostos em eixos sobrepostos

verticais e horizontais, e, posteriormente por leitura de figuras convencionais sobre o

pentagrama.

Para a construção da representação figurativa musical, cada instrumento oferece

uma estrutura física e pressupõe uma forma de adaptação diferente do sujeito ao seu

espaço físico. Para operar sobre as estruturas musicais utilizando estes espaços, o sujeito

assume formas posturais, táteis e cinestésicas que lhe permitem, ao exercitá-las

consecutivamente, construir objetos musicais integrados ao seu próprio corpo.

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Assim, no piano, por exemplo, as representações táteis do sujeito ao realizar

sons desligados ou ligados (no método utilizado pelos sujeitos de nossa amostra, isso

era feito usando posição fechada ou aberta dos dedos) lhe permitem abstrair intervalos

melódicos de graus conjuntos e disjuntos. Enquanto a posição fechada (toque com o

dedo indicador) permite uma idéia de melodia como soma de sons descontínuos, a

posição aberta (toque com todos os dedos da mão) contribui para a idéia de melodia

como a continuidade do som através de transformações de alturas na forma melódica.

Nas aulas observadas, eles se delimitaram aos intervalos melódicos de primeiras,

segundas e terças. Com a posição de arco, o esquema motor permite a abstração

empírica do intervalo harmônico de 5ª justa.

Em algumas ocasiões, os alunos de piano realizam reflexionamentos desta

abstração nas aulas de EPEM quando, ao tocarem um intervalo harmônico de quinta

usando um xilofone, por exemplo, alguns dizem: “É igual ao ‘arco’!” Neste caso, ao

coordenarem a reversibilidade do pensamento, por meio de uma abstração reflexionante,

reconstroem o conceito de intervalo de 5ª num contexto prático diferente, o que

significa que atingiram a representação operatória.

A representação auditiva da relação intervalar no teclado do piano é mediada

pela representação visual do teclado, pois os intervalos podem ser produzidos por teclas

dispostas linearmente. A posição do instrumentista em relação ao piano lhe permite ver

o que as mãos tocam sem prejudicar sua ação. Há uma interação entre as representações

visuais da tecla, dos dedos, e da escrita nas linhas e espaços que dão uma significação

coerente àquilo que conceituamos como “desenho melódico” formado pelas alturas.

No caso dos instrumentos de cordas dedilhadas e friccionadas, tal representação

auditiva é mediada pela representação tátil, com controle preciso do movimento e

ângulos dos dedos sobre as cordas. Existem nestes instrumentos muitas possibilidades

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de combinação entre cordas soltas ou presas para produzir alturas idênticas, mesmo com

mudança no parâmetro timbre. Estes sons são pouco a pouco dominados tecnicamente

no toque pizziccato, com o qual temos o mesmo fenômeno das somas de

descontinuidades que acontece no piano.

No trabalho inicial feito com crianças, como foi o observado em nossa amostra,

as representações táteis, trabalhadas no violino e no violoncelo, são construídas a partir

da afinação das cordas soltas que, pelo acréscimo ou decréscimo gradativo dos dedos da

mão esquerda sobre cada corda na primeira posição, formavam seqüências de sons por

intervalos de graus conjuntos.

A estrutura musical básica sobre a qual é montada a técnica inicial dos

instrumentos melódicos (caso do violino e do violoncelo) é a escala diatônica maior

dividida em pentacordes (caso do violino) ou tetracordes (caso do violoncelo). Sobre a

estrutura escalar são praticadas melodias ensinadas por imitação, mas praticadas com o

uso da partitura como referência visual. Assim, sobre os esquemas melódicos anteriores

são assimiladas novas formas de combinações de sons que se relacionam à estrutura

escalar dominada pela técnica.

No violão, o trabalho melódico se limita às somas de sons descontínuos pelo

dedilhar das cordas que, por não serem abafadas, dão a ilusão de continuidade sonora,

Temos também neste instrumento a possibilidade de realizar abstrações empíricas e

pseudo-empíricas de sons harmônicos, assimilados por meio do esquema motor da

posição de “acordes” nas quais os dedos da mão esquerda pressionam várias cordas que

são, ao mesmo tempo, tangidas pelos dedos da mão direita.

Nas aulas de violão observadas, os esquemas motores exercitados foram os

usados para realizar acordes na tonalidade de Dó maior, assim como os usados para a

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construção de melodias sobre a escala diatônica de Dó maior por meio de diferentes

dedilhações das cordas pelas duas mãos.

No violino, os esquemas motores utilizados nas posições com o uso do arco ou

sem arco (em pizziccato) permitiram as abstrações empíricas e pseudo-empíricas de

durações contínuas e descontínuas respectivamente. A troca de corda (nas cordas soltas

de Lá e Mi) usando o toque pizziccato permitiram as alunas realizarem abstrações

empíricas do intervalo de quinta justa.

No violoncelo, os esquemas motores diversos, exercitados como “ponta” e

“talão”, por exemplo, foram muito ilustrativos na construção de imagens mentais para a

técnica detaché e martelé necessárias para a diferenciação de sons longos e curtos em

intensidades diferentes.

As referências topográficas utilizadas pelos alunos de piano para a localização

das notas da partitura são as relações espaciais entre as teclas brancas e as pretas que são

identificadas pela ordenação da esquerda para a direita e organizadas sobre a noção de

lateralidade (para a direita, sons mais agudos, para a esquerda, sons mais graves).

Nas aulas de piano, o trabalho de descrição do movimento da mão para tocar

uma composição foi a forma de realizar abstrações pseudo-empíricas sobre as relações

de alturas, que, em seguida foram nomeadas simbolicamente pelo desenho melódico das

notas em partituras. O conceito de desenho melódico foi representado em eixos verticais

para alturas e horizontais para a sucessão temporal. Posteriormente, estes eixos foram

traduzidos para uma conceituação de leitura intervalar.

Nos instrumentos de cordas dedilhadas ou friccionadas, as referencias

topográficas utilizadas por todos eles para a adaptação da leitura de partituras foram as

cordas soltas, identificadas pelo nome das notas nas quais são afinadas. , e em todos eles

o sistema de leitura adotado foi o da leitura absoluta, ou seja, aquela que utiliza o nome

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das notas no solfejo de partituras escritas no pentagrama com claves de Sol (violino e

violão), ou Fá (violoncelo).

Não foi possível determinar, através da comparação dos movimentos usados

pelos alunos ao tocarem instrumentos diferentes, quais operações concretas seriam

comuns entre as representações operativas inferidas a partir das ações dos alunos de

cada instrumento de nossa amostra. Acreditamos que a idéia inicial que nos levou a

formular tal questão de estudo se baseava numa intuição sobre o conceito de

operatividade que se desfez com o aprofundamento de nossa compreensão da

Epistemologia Genética. Não é pelo fato de se darem por ações diferentes que os

conceitos podem diferir, mas sim por resultados sonoros aos quais eles se referem.

As imagens mentais se apóiam nas ações anteriores do sujeito e podem ser

acessadas da memória de sentido estrito para permitir a repetição dos fenômenos

concretos. Os conceitos permitem aumentar a velocidade dos comandos motores do

sujeito, interligando as ações por meio do resultado sonoro desejado, sem se apoiar em

cada uma das imagens que compõe a ação complexa que os envolve.

Em todas as entrevistas constatamos que os professores não se comunicam sobre

as formas de representação que utilizam em suas respectivas aulas. Estas entrevistas

evidenciaram uma diferença de objetivos nas ações dos professores, o que caracterizou

uma variação de tarefas, e da concepção epistemológica destes. Quando é descrito pelos

professores de instrumento, na maioria das vezes, a instrução se caracteriza pela técnica

instrumental e interpretação musical de repertório de aplicação desta técnica. Quando

descrito pela professora de EPEM, notamos que a dimensão reflexiva sobre as ações são

buscadas para a construção do conhecimento musical.

Nas aulas de EPEM, verificou-se que os alunos eram incentivados a comprovar,

por meio da fala, da escrita e do solfejo, a aquisição de competências tais como:

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reconhecimento de sons e identificação dos códigos da notação tradicional da música

ocidental, compreensão do funcionamento das estruturas básicas do sistema tonal,

reconhecimento e posterior grafia de alturas e ritmos ouvidos.

Nas aulas de instrumentos verificou-se que os alunos eram orientados a serem

eficazes na produção sonora a partir dos instrumentos com o objetivo de tocarem peças

do um repertório onde aplicavam a técnica assimilada e praticada durante as aulas. No

entanto, tal eficácia partia de uma acomodação motora dos conceitos musicais

assimilados por meio dos instrumentos.

As análises realizadas a partir das observações das aulas levaram em

consideração por um lado, a programação pedagógica, e por outro lado, aquilo que os

alunos faziam nas aulas de música. Ao interpretar a relação pedagógica que

observamos, o mais importante foi descrever quais espaços práticos estavam dominando

na ação do aluno para, a partir desta constatação, determinar o tipo de representação

possível de ser construída.

Em decorrência desta identificação, observamos a variação dos comportamentos

das crianças no decorrer do processo de ensino-aprendizagem, procurando mostrar

como eles diferenciavam e integravam os conteúdos aos quais procuravam se adaptar.

Assim, para interpretar esta interação através do que nos ensina a Epistemologia

Genética, nos guiamos pelos dados que indicam o aspecto figurativo ou operativo do

pensamento do sujeito epistêmico e a partir deles definimos as dominâncias nas quais se

enquadravam as representações musicais inferidas a partir das ações dos sujeitos de

nossa amostra.

Os comportamentos que indicavam imitação ou reprodução de um modelo,

foram classificados como de dominância figurativa e os que indicavam uma construção

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lógica, decorrentes de abstrações pseudo-empíricas, foram classificados como de

dominância operativa.

Nos comportamentos observados pudemos descrever as imitações que a criança

fazia na presença do modelo, e as que eram internalizadas e manifestadas

posteriormente, sendo re-criações do modelo, e que mesmo sendo quase perfeitas

apresentavam sempre uma maneira própria de assimilação do objeto pelo sujeito,

assimilações estas que eram integradas ao seu nível de desenvolvimento.

Num sujeito que apresenta um comportamento compatível com o das operações

concretas, todos os comportamentos anteriores são integrados neste nível. Portanto,

mesmo apoiando-se sobre imagens musicais mentais quando toca um instrumento, as

operações mentais atuam, algumas reversíveis, embora parcialmente66. O objetivo da

pedagogia musical deve ser, portanto, que o sujeito adquira domínio das operações

concretas e formais possíveis no pensamento sobre música.

Mesmo que, ao observarmos as atividades da criança em aula, elas estejam sob o

domínio figurativo, o fato de a criança agir sozinha indica que suas próprias idéias a

guiam, e que seu comportamento, embora predominantemente figurativo, não exclui

algumas operações, não completamente integradas ao grupo das operações concretas

(transformações executadas mentalmente e reversíveis), mas que indicam o progressivo

direcionamento do seu pensamento para o domínio das representações operatórias. Uma

vez atingido este nível plenamente, estas representações levarão a criança a ultrapassar a

técnica numa execução inteiramente voltada para a música e dirigida pelo pensamento.

Durante a execução de uma frase musical ou de uma obra, o pensamento do

aluno se apóia na representação figurativa que ele construiu, seja se lembrando dos

movimentos de seu professor, seja pela memória dos sons de uma obra, seja apoiando-

66 Como já dissemos anteriormente, o período pré-operatório é considerado por Piaget como a fase de preparação das operações concretas, sendo portanto parte integrante deste período que atingirá o seu equilíbrio quando a criança adquirir a reversibilidade operatória.

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se na notação musical. Ao se apoiar sobre estes indícios (gestos, sons, notação) ele usa

sua percepção e realiza a coordenação de ações mentais para gerar representações

operativas evidenciando, assim, que a obra é pensada.

Se a leitura de partituras for desenvolvida a partir de significados emprestados

pelo próprio sujeito, isso pode valorizar a interpretação, já que é a externalização de um

encadeamento de idéias musicais dentro daquela forma de representação da linguagem

musical. O desenvolvimento da musicalidade apoiada sobre as operações mentais pode

levar o sujeito a uma libertação do texto musical, e favorecer a recriação da obra,

tornado assim a sua interpretação uma verdadeira recriação, pois faz com que ela não só

ultrapasse o texto escrito, mas dê vida a ele porque é o sujeito que o faz viver enquanto

ele mesmo o revive.

Confirmamos a tese de que o uso de instrumentos musicais favorece as

abstrações empíricas, pois traz informações sobre os objetos musicais, e que as

abstrações pseudo-empíricas, ou seja, a coordenação mental sobre os dados concretos,

devem ser incentivadas pelas intervenções do professor no sentido de levar a criança a

explicar o que faz ao tocar ou cantar, e a estabelecer relações entre os objetos musicais

vivenciados, permitindo a ela generalizar os resultados de suas ações.

Ao constatarmos a boa realização de uma ação e a sua generalização para outras

situações semelhantes podemos inferir que o sujeito construiu a representação de uma

ação. Ao observarmos como as crianças constroem representações em ambientes de

ensino formal de música, buscamos levantar indícios destas construções dentro de uma

situação real. No entanto, para comprovar estas construções seria necessária a adoção de

uma metodologia de pesquisa similar ao método clínico piagetiano, o que não foi

possível realizar dada a situação problema colocada em nosso objeto de pesquisa.

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Recomendamos aos professores que queiram fundamentar sua pedagogia na

Epistemologia Genética que questionem seus alunos sobre “o que” fazem quando estão

tocando, e “como” o fazem. Para se apropriar mais profundamente do objeto musical,

portanto, o aluno deve ser um ativo pesquisador!

Aos interessados em realizar pesquisas correlatas, recomendamos recorrer às

nossas análises onde poderão encontrar os princípios da investigação epistemológica

que levam em consideração os processos figurativos e operativos das atividades

musicais com o uso de instrumentos para a construção de provas clínicas para a

comprovação de muitas construções internas do sujeito no domínio da música.

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264

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ANEXO 1

QUESTÕES DAS ENTREVISTAS COM OS PROFESSORES DE INSTRUMENTO E

DE ESTRUTURAÇÃO E PERCEPÇÃO MUSICAL (EPEM)

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Questões das entrevistas professores de instrumento (A) e de EPEM (B)

Tema 1: Conteúdos técnicos e musicais programados pelos professores para serem

trabalhados com seus alunos do CFI EMVL durante o primeiro ano de estudo.

1A.Que aspectos técnicos do seu instrumento você acha importante que os seus alunos,

iniciantes no instrumento, aprendam durante o primeiro ano de estudo do seu

instrumento?

1B. Que atividades corporais (esquemas motores) os alunos utilizam no primeiro ano

do curso de EPEM?

2. Se a gente pensar nos parâmetros sonoros: altura, duração, intensidade, timbre, e por

outro lado, na interpretação musical, expressividade, que conceitos, dessas duas áreas,

você costuma abordar com seus alunos que estão iniciando nesse primeiro ano?

3. Você tem uma seqüência de conteúdos musicais pré-determinada para trabalhar com

seu aluno iniciante?

4A. Você acompanha o programa de conteúdos das aulas de EPEM que o seu aluno faz?

4B. Você acompanha os programas de instrumentos de seus alunos para estabelecer

uma relação entre o que eles fazem na sua aula e na do outro professor? Você sente

dificuldades comuns entre alunos que toquem determinados instrumentos, por exemplo,

ou dificuldades específicas que o aluno de tal instrumento costuma apresentar?

Tema 2: Questões motoras e suas representações mentais (táteis, cinestésicas, auditivas,

visuais) construídas pelos alunos durante a aprendizagem de música através do uso de

instrumentos musicais (observação e entrevistas)

5. Você poderia resumir que movimentos são trabalhados nas atividades do aluno

durante este primeiro ano de estudo?

5B. Você poderia resumir que movimentos estão sendo trabalhados nas atividades dos

alunos durante esse primeiro ano do estudo?

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6A. As posições das mãos usadas pelo aluno no primeiro ano de estudo do seu

instrumento podem ser relacionadas com conceitos trabalhados nas aulas de EPEM?

Quais relações espaciais do instrumento os dedos do aluno estarão sentido ao realizá-

las? (representação tátil)

6B. não foi feita

7. Você poderia descrever, que aspectos espaciais o aluno pode perceber visualmente

enquanto está realizando os movimentos propostos nas aulas? (representação visual)

8. A partir da resposta anterior, você poderia dizer que resultados sonoros o aluno pode

ouvir enquanto está em ação? (representação auditiva)

Tema 3: analisar como a aprendizagem de leitura e percepção pode ser generalizada

quando adaptada ao uso dos vários tipos de instrumento, cujas emissões sonoras

dependem de atividades motoras diferentes.

9. A leitura de partituras é feita pelo aluno (de instrumento ou de EPEM) desde o inicio

do curso?

10. A notação usada é a convencional?

11. Quais são os pontos de referencia dos instrumentos (teclas, cordas, posições) a partir

dos quais o aluno deve fazer relações com a leitura da notação convencional nas regiões

grave, média e aguda?

12. Você acha que existe uma lógica entre a construção da técnica inicial e a construção

da escrita usada pelo aluno durante o primeiro ano de estudo?

12B. Você acha que existe uma lógica entre a atividade motora nas atividades da aula e

a construção da escrita usada pelo aluno durante o primeiro ano de estudo?

Tema 4: Desenvolvimento da capacidade cognitivo musical dos alunos de instrumentos

13. Você percebe diferenças na capacidade de compreensão dos alunos em relação ao

aprendizado de música dependendo da idade em que eles começam a estudar?

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14. Se a resposta for positiva: que diferenças são estas?

15. Existe uma razão técnico-motora ou de compreensão do aluno para a escolha da

seqüência dos conteúdos musicais ensinados?

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ANEXO 2

ANÁLISES DAS AULAS DE EPEM 12

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Quadro 1 Aula de EPEM 12. 19/05/2009 Sujeitos: LAU, MA, BEA, ISA, DIO, AGA, VINI, ISI, HEN.

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Leitura Rítmica a duas vozes (voz e palmas), para viver a sensação métrica dos passos. Ao relembra a aula anterior em que a turma trabalhou uma música a duas vozes, a professora diz que há duas linhas que são lidas ao mesmo tempo. No método O Passo, a leitura do número sem parêntese na voz superior indica que se deve pronunciar o som com números. Já o número sem parêntese na voz inferior indica que se deve bater palmas. Os alunos ainda não conhecem as figuras, mas podemos dizer que reconhecem a simbologia expressa pelos números sem parênteses (som) e entre parênteses (silêncio).

O ritmo deste exercício se organiza em métrica quaternária, com sons e pausas.

Os espaços práticos envolvidos na ação são passos, palmas e fala. Tátil-Cinestésico: Ao andar, o sujeito “traça” um quadrado virtual no espaço físico, em cujos vértices ele estará apoiando os pés durante a realização do exercício.Visual: os olhos seguem a ordem da escrita da esquerda para a direita. Vocal: os alunos coordenam o tempo de falar e o tempo de calar de acordo com a ordem expressa ordenadamente (1º 2º 3º 4º ) e numericamente (1, 2, 3, 4).

A ordenação dos tempos da métrica musical se organiza no espaço, de modo que quando o sujeito recomeça o ciclo de passos com o pé direito no vértice inicial, ele recomeça o mesmo ciclo de 4 pulsações. Esta reiteração a partir da unidade de medida espaço-temporal do passo estabelece uma correspondência o espaço métrico (passo) com o tempo métrico (pulsação). Os eventos sonoros identificados pelos números com ou sem parênteses (figuras ou pausas respectivamente) são então, vivenciados pelos alunos dentro desta organização espaço-temporal. A ação de falar ou bater palmas passa a ser a causa do resultado sonoro produzido pelo aluno. A organização rítmica quaternária, estão em vias de serem internalizados na forma de tempo objetivo construído através das abstrações pseudo-empíricas ocorridas durante a atividade. A estrutura infralógica solicitada é

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evidenciada pela coordenação estabelecida entre a continuidade do tempo e a descontinuidade das figuras ou pausas que são executadas em meio ao equilíbrio de movimentos contínuos feitos pelos alunos. A estrutura lógico matemática solicitada é da relação de termo a termo: Cada número tem seu correspondente na ordenação rítmica. O tempo de duração de uma pulsação é idêntico ao tempo do passo. Assim, tanto o tempo do silêncio na pausa como o som das palmas são equivalentes dentro da estrutura temporal. Há uma diferenciação clara entre dois elementos antagônicos na dialética musical: o som e o silêncio. Há também uma ordenação métrica: ao falar o número correspondente da ordenação dos tempos da métrica, o aluno relaciona a experiência sonora com as relações de ordem entre os tempos.

Substituição dos números pelo “Tá”: a professora demonstra como os alunos usarão a voz dando importância para a duração de cada tempo. Duração do som: o ataque de

Duração do som: o ataque de cada pulsação dá início a uma nova contagem que termina no ataque do próximo tempo do compasso. Para realizar a duração de

Espaço cinestésico: o movimento do passo Espaço vocal: o prolongamento do som pela voz

Vemos que esta atividade leva os alunos a realizarem uma abstração pseudo-empírica do parâmetro de duração. Para representar a duração de cada tempo, o aluno deve coordenar o movimento do corpo no espaço e a

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cada pulsação dá início a uma nova contagem que termina no ataque do próximo tempo do compasso.

cada tempo, o aluno deve coordenar o movimento do corpo no espaço e a sustentação da voz durante o movimento assim como o início do silêncio ou novo som no tempo seguinte. A conservação trabalhada é da continuidade do tempo definida em música pelo termo “pulsação”. Conserva-se a continuidade da pulsação apesar das transformações dos ritmos que estabelecem relações de descontinuidades simétricas ou assimétricas dentro da continuidade temporal. O tempo de uma pulsação pode ser preenchido por um só som ou silêncio assim como pode ser subdividido, desde que se permaneça, no entanto, dentro da equivalência do tempo de uma pulsação.

sustentação da voz durante o movimento, assim como o início do silêncio no tempo seguinte. Uma vez conservada a ordenação dos tempos pela métrica na atividade anterior, os sons passaram a ser generalizados para a sílaba “Tá” nesta atividade, porém sua duração é resultado da intenção de prolongar o som até o início do próximo tempo do compasso. Concluímos que acontece necessariamente uma abstração pseudo-empírica do parâmetro duração.

Explicação da professora e exercício dos alunos para que os números da partitura sejam substituídos por semínimas ou

Compasso em métrica quaternária, figuras e pausas de semínimas. Neste exercício, o que se

Para realizar a escrita no papel, o aluno coordena a visão e com a técnica manual de desenhar as

Generalização: O mesmo conteúdo organizado pela ação do aluno no espaço físico e representado no papel pela ordenação

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pausas de semínima. Durante a atividade a professora observa e instrui os alunos quanto a organização espacial da escrita, especialmente quando há duas vozes, que devem ser escritas paralela e simetricamente. Além disso, as barras de compassos devem abranger as duas vozes, pois elas serão lidas ao mesmo tempo.

solicita é que o aluno substitua a representação numérica pela notação musical. A sincronia dos sons é representada no papel pelo paralelismo em dois planos horizontais

notas numa organização espacial sobre o papel. A ordenação é distribuída pelo movimento das mãos no sentido da esquerda para a direita e esta mesma direção é acompanhada pelo movimento dos olhos. Os olhos realizam movimentos que abrangem os dois planos paralelos horizontais das vozes.

dos sons no compasso, deverá agora ser representado por símbolos musicais convencionais. Assim como as batidas dos pés e palmas pontuaram o espaço da sala de aula, levando o aluno a testemunhar a causa do som na música, elementos descontínuos (notação de figuras e pausas) pontuam a continuidade do papel transportando para o plano da representação visual aquilo que foi vivido pelo gesto e pela audição. Estrutura infralógica: A representação temporal e espacial são correlacionadas na notação musical: A organização linear da escrita representa a continuidade do tempo musical, e as figuras são descontinuidades que compõe a organização rítmica da música. Nota-se que a professora induz a representação temporal pela representação espacial: o tempo musical deve ser uniformemente representado, utilizando porções equivalentes de papel para cada pulsação. Relação espaço-temporal: A sincronia dos sons é representada no papel pelo paralelismo em dois planos horizontais

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Quadro 2 Aula de EPEM 12. 26/05/2009 LAU, MA, BEA, ISA, DIO, AGA, VINI, ISI, HEN,

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno

Inferências sobre as representações musicais

A professora diz que vão começar a aula cantando uma escala. Pede que os alunos se levantem, e andem pela sala seguindo a pulsação. Enquanto isso ela toca ao piano as notas de uma escala maior acompanhadas de uma seqüência de acordes.

Escala diatônica maior. Pulsação. Harmonia.

Espaço auditivo e tátil-cinestésico: ao acompanharem o que ouvem com movimentos do andar - tocar os pés no chão (táctil) - os alunos vivem a experiência de cada som através do tempo de uma pulsação.

Abstração empírica: o alternar dos passos apresenta a característica do tempo como durações reiteradas (pulsação). A idéia de pulsação é resultante dos reflexionamentos sobre a ação de andar no ritmo do som que o sujeito ouve. Estes reflexionamentos podem manter-se inconscientes para darem lugar à tomadas de consciência posteriores. Ao coordenar os passos com as alturas, o sujeito aumenta sua percepção da descontinuidade de cada som. Ao mesmo tempo, a continuidade dos passos em coordenação com a transformação das alturas o leva a abstrair a continuidade da escala.

A professora pede que eles se agachem de cócoras e que à medida que forem cantando a escala, que se levantem dosando a altura do corpo até que, ao

Alturas da escala diatônica maior. Os membros inferiores se articulam com o tronco e os membros superiores na

O aluno tem a intenção de movimentar o corpo para demonstrar a compreensão das diferenciações percebidas na estrutura escalar e que, entre o primeiro e o último som,

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ficarem de pé, estejam cantando o 1º grau no agudo.

sustentação da coluna em diversos ângulos para manter o a cabeça em alturas progressivamente mais altas

existe uma graduação equilibrada de níveis de altura. O movimento vertical do corpo representa o movimento ascendente da escala e assim, vemos uma abstração empírica da relação parte-todo: cada som é vivido como uma parte do todo que é a escala, e cada uma destas partes tem seu lugar representado pelo aluno, num espaço real, com o uso de seu próprio corpo.

Depois de corrigir alunos que não chegavam a graduar bem as alturas do corpo, a professora avisa que pode ser que ela mude alguma coisa no que está tocando no piano, e eles terão que reagir com o movimento do corpo. Toca várias vezes de 1 a 5 voltando para o 1 e raramente subindo até o 6,7 1 agudo. Começa então a repetir o 5 retornando diretamente ao 1 grave.

Melodia sobre uma escala diatônica valorizando os 1º e 5º graus.

Aqui o movimento do corpo deve variar para cima e para baixo, dependendo da melodia tocada, e cada aluno vai determinando pontos de referencia na extensão da melodia 1º, 5º, repetição do 1º no agudo, fazendo analogia com a extensão da própria altura.

Novas relações espaço-causais são acrescentadas para que os alunos diferenciem mais as alturas: alturas acima do 5 e abaixo do 1 agudo aumentam a graduações espaciais, com o objetivo de desenvolver a noção de vizinhança dos sons, a direção ascendente ou descendente dos sons, e também, a memorização do 1º e 5º graus da escala. O movimento sonoro e está sendo manifestado pelo movimento corporal do sujeito, caracterizado como um gesto simbólico.

Leitura de partitura não convencional: em vez de notas, são números que ocupam as linhas e espaços do pentagrama.

Escala diatônica maior em vários tons. Noção de ordem: organização dos sons hierarquicamente do mais grave

Coordenação dos espaços: Vocal , auditivo e visual e cinestésico

Através da coordenação dos espaços práticos vemos a internalização da ordenação os sons da escala (através dos números de dedos das mãos e das

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A professora pede que eles digam qual é o primeiro som. Eles lêem no papel e respondem que é o 5. (Alguns ficam cantando agudo: “cinco”...) A professora toca o som “1” no piano e pede que eles cantem do 1 até chegar no 5. Depois ela acompanha o movimento dos alunos fazendo um jogo com uma das mãos: mostra o número de dedos correspondente ao número que eles devem cantar (sempre em graus conjuntos subindo e descendo), e eleva ou abaixa a mão dependendo do movimento da linha melódica. Os alunos imitam estes gestos enquanto cantam.

ao mais agudo e vice-versa. A escala é realizada ascendente e descendentemente. Assim, solicita-se uma ação e sua reversibilidade.

alturas no espaço). Como a criança já conhece a ordenação numérica, ela generaliza para a série de notas a mesma ordem dos algarismos numéricos criando uma relação de ordenação entre os sons hierarquicamente distribuídos do grave para o agudo.

1. A professora acrescenta mais uma modificação: no momento de cantar o som 4 ela coloca a mão atrás da cabeça “como se os dedos fossem chifres” - como ela mesma diz - e pede que eles cantem este som só “dentro da cabeça”, ou seja, imaginem o som da escala que eles deveriam cantar na ordem [da escala que

1. Intervalo de terça menor descendente.. 2. Direção sonora agudo-grave e sua representação espacial pelo movimento vertical dos braços e mãos no espaço.

1. Espaço auditivo e visual-cinestésico coordenados.

1. Trata-se da solicitação da representação do som que não é realizado naquele momento através do gesto de esconder a mão, como se o som estivesse “escondido” no silencio. O som é imaginado, e se já está representado, a criança consegue cantar o som seguinte. Interessante é que o tempo para imaginar este som é respeitado por

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dá suporte à melodia que no caso, do 5 para o 3, devem imaginar o 4], mas em vez de cantar, fiquem em silêncio. 2. As crianças também imitam o movimento de subir e descer das mãos que representa a direção das alturas: quanto mais agudo mais para cima e vice versa.

2. Espaço cinestésico e visual.

todos, e é necessário que a criança aguarde este tempo para imaginar durante ele o som “ausente”. Assim estará construindo um esquema possível de se transformar num conceito operatório, pois passível de ser reconstruído através da reversibilidade. 2. Vemos duas representações sobrepostas nesta ação: a do silêncio e a do intervalo de 3ª que faz com que o sujeito tenha que se lembrar do som entre os dois. É como se fosse um objeto atrás de um anteparo. A criança sabe que eles está lá mas não pode vê-lo. No caso do som, a criança sabe que a altura existe, imagina o seu som, mas não o ouve. O silêncio funciona como um “anteparo” para o som saltado.

A professora faz uma analogia do intervalo com o som do “Relógio-do-Cuco” e treina os alunos a cantarem como o passarinho: “Cu-co” em 3ª descendente

Recordação do som do relógio “cu-co”, que é um intervalo de terça menor descendente.

Espaço auditivo e vocal.

Exposição do intervalo de terça como estrutura sonora real situada num contexto cotidiano. Desta forma, as crianças assimilam um objeto (o intervalo de terça) recorrendo à memória auditiva de outra experiência para a qual já construíram um esquema auditivo. Ao utilizar uma representação que encaixa na construção do esquema de

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terça descendente, procura-se aumentar a velocidade do pensamento durante o solfejo. Assim, não se torna mais necessário o uso do esquema sensório-motor do intervalo de terça. Temos aí num novo esquema auditivo, já representado, sendo treinado por um exercício de assimilação.

1. A leitura da partitura é realizada pela primeira vez com as crianças sentadas. É dado o tom ao piano, e eles começam a cantar. 2. A dificuldade acontece no intervalo de terça 5-3, que muitos não conseguem afinar. Cantam como se o 3 fosse o 4. A professora os corrige cantando o 3 e dizendo: “olha o cuco aí! ‘Cu-co’, 5-3”. 3. Pede que eles recomecem e vai mostrando novamente o número dos dedos, e além disso, flexiona os joelhos quando eles cantam 5-3. A professora pede que eles repitam agora em pé e que no

2. Melodia constituída de cinco graus da escala, escritos com números sobre o pentagrama.

2. e 3. Intervalo de terça menor descendente destacado da melodia através do canto e do gesto.

1.Espaço visual, auditivo e vocal. 2. Espaço visual, auditivo e vocal. 3. Espaço auditivo, visual e cinestésico.

1. Realização da decodificação numérica, através do canto com o suporte do ouvido. 2. A construção sensório-motora do intervalo é substituída aqui pela solicitação da memória “no sentido estrito” (representação do esquema do intervalo de terça) de um motivo melódico idêntico ao modelo solicitado, e que funciona como um símbolo auditivo do mesmo. 3. O movimento do joelho funciona como um “lembrete”. Ele fica associado à memória do esquema, descontextualizada da construção conceitual da inteligência sensório-motora.

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momento em que eles cantarem 5-3, eles façam o mesmo movimento com os joelhos. Depois disso eles começam a leitura de outra melodia que apresenta o 6º, 7º, e 1º agudo da escala diatônica. Como as crianças estão aprendendo a cantar, a Professora comenta que às vezes quando vamos cantando para o agudo, esticamos, sem perceber, o pescoço. Ela explica que eles devem permanecer com o pescoço relaxado. Eles repetem o exercício, e no momento de atingir o som mais agudo (1), ela pede que eles façam um gesto com o corpo como uma reverência, abaixando um pouco o tronco, ou seja, associem o canto para o agudo com uma postura que não estica o pescoço.

Solfejo de melodia constituída dos sete graus da escala, escritos com números sobre o pentagrama.

O espaço vocal tende a se esticar quando cantamos sons agudos, apesar de isso dificultar a emissão.

Instrução sobre a técnica vocal torna os esquemas de assimilação mais especializados. Ao cantar sons agudos a criança vai fazendo-o com níveis de sensibilidade auditiva mais apurados, e com controle maior sobre a afinação. Seu corpo se instrumentaliza para realizar a ação com maior eficiência. As abstrações são pseudo-empíricas, já que o objeto (som) é manipulado por ações do sujeito e o resultado obtido é percebido pelo aluno. Percebemos que as modificações do som pela ação, reforçam a memorização do 1º grau no agudo e somam-se aos reforços já feitos para o 5º, o 3º graus com ajuda de movimentos.

Mudam para a folha 2. A melodia usa os sons de 1 a 6 da escala diatônica. 1. A professora pede que eles ouçam a escala de 1 a 5 que ela toca ao piano e em seguida pede

Preparação para o solfejo que virá a seguir: melodia com sons de 1 a 5 da escala diatônica: 1234|5432|151-||

1. Espaço auditivo. 2. Espaço vocal, auditivo e cinestésico.

1. Assimilação da melodia pela audição do piano e acomodação da melodia aos esquemas vocais do canto por graus; 2. Coordenação dos esquemas vocais das alturas aos esquemas cinestésicos

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que eles repitam cantando os números que ela tocou: 1234|5432|151-|| 2. Em seguida pede que eles solfejem ao mesmo tempo que fazem “o passo” levando em conta as durações e pausas que ocorrem na partitura

de tempo e métrica.

1.. A representação do 5º grau vai sendo cada vez mais solicitada. Quando as crianças se cansam começam a cantar qualquer nota. A professora diz que não adianta eles fazerem o passo falando os números cantando sempre na mesma altura, mas que eles tem que “guardar” o som do 5 e quando tiverem que cantá-lo, ligarem a antena “opa! é o 5, é aquele som”. Qual é o som?” e canta: “Cinco...” as crianças cantam com a afinação desigual. Ela retoma o “1” - eles afinam- volta ao 5 – sai melhor. A professora diz: “Então, liguem a anteninha agora, e não façam sem pensar não, ta?” 2. Os alunos cantam e fazem o passo. A afinação melhora.

Solfejo melódico rítmico com sons de 1 a 6 da escala diatônica: 1234|5432|151-|| 2. idem 3. idem

1. Espaços auditivo e vocal. 2. Espaço visual, auditivo, vocal e cinestésico. 3. Espaço auditivo e visual. Para a turma

1. Ao solicitar a afinação dos graus, a professora está tentando focalizar a atenção dos alunos para o parâmetro de altura que ainda não apresenta conservação quando as crianças cantam – o 5º grau. Ela os leva a cantar novamente a escala desde o 1º grau - esquema que eles já conservaram - para, sobre este, construir o intervalo de 5ª através do canto. Ao cantarem este intervalo, os alunos estarão construindo um esquema de assimilação musical. 2. Esta atividade propicia a abstração empírica da coordenação rítmico-melódica.

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3. A professora pede que metade da turma cante e a outra metade ouça. Depois a turma que cantou ouve a turma que ouviu antes.

que canta também o espaço vocal.

3. Ao dividir a turma, a professora quebra a dicotomia professor-aluno, e divide com eles a avaliação da atividade.

1. A professora pede que eles se sentem (muitos manifestam o prazer de se sentar) e pede que eles peguem o caderno “pautando as 7” e escrevam: “ditado melódico”. Alguns alunos demoram mais para se organizar com o material de escrever (caderno, lápis e borracha). 2. Como é a primeira vez que eles fazem isso, a professora explica como eles devem distribuir a escrita nos compassos. Explica que o ditado que eles farão é parecido com a folha que eles acabaram de solfejar. Eles escreverão com números no lugar certo do pentagrama usando pausas se for preciso. 3. No quadro negro a professora já havia esquematizado 3 compassos no pentagrama e ela

1. O caderno “Pautando as 7” é um caderno de música especial para crianças pois apresenta um pentagrama com espaços grandes entre as linhas e uma parte de cada página em branco. 2. A escrita dos solfejos não é tradicional, mas apresenta o pentagrama, e os números tomam o lugar das notas. 3. Divisão do pentagrama por barras de compasso, e cada compasso tem seu espaço medido (pulsações) por marcações distribuídas igualitariamente, a olho, pelos alunos.

1. Instrução 2. Instrução

1, 2 e 3. A instrução sobre a escrita utiliza a representação das alturas de que os alunos já dispõe (cada número representa um som da escala e também os tempos do compasso) e visa levá-los a construir, através da representação gráfica, as relações entre os números-alturas e os números-métrica. Enquanto a representação das alturas se dá do ponto de vista espacial na direção vertical, a da métrica se dá na direção horizontal. É interessante notar que, como estes números foram utilizados durante as atividades corporais, as crianças não confundem seus usos.

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pede que eles façam 4 traços pequenos em baixo de cada compasso - ela faz então 4 pequenas marcas demarcando o espaço de cada pulsação. E diz: “a distancia é mais ou menos igual entre um e outro porque eles representam cada passo: 1º, 2º, 3º, 4º. Se o primeiro passo for o número 1, você vai escrever o número 1 na direção do primeiro traço. Aí tem o segundo passo, vamos dizer que aqui seja o número 5, aí na direção do segundo “passo”, você escreve o número 5, só pra ficar bonitinho no caderno e vocês já aprenderem estas distâncias. Então, são 3 compassos, cada compasso tem 4 pulsos , por isso a gente fala dos passos, porque são os 4 passos que a gente faz.”

1. Explicação das regras de escrita no pentagrama: “Antes de tocar, deixa eu falar: nesse primeiro ditado, o número 1 vai ser na primeira linha [e escreve 1 na primeira linha]. Se o número 1 vai ser na primeira

Estabelecimento do ponto de partida (primeiro som) da melodia e sua representação gráfica na pauta.

Instrução – “olhos e ouvidos atentos”.

Apesar de os alunos já terem solfejado através desta mesma representação de números nas linhas e espaços, vê-se que nem todos tinham consciência da representação das relações de vizinhança dos sons representadas nas linhas e espaços.

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linha, onde vai ser o número dois?” “Na segunda...” responde um aluno. “Não!” - diz a professora. “Primeiro espaço” diz outro aluno. “Muito bem... uma nota na linha, a outra é no espaço. E o número 3? ...” Assim a professora vai solicitando que a turma organize verbalmente como deve ser representação gráfica das alturas no pentagrama. 2. As regras do ditado melódico são expostas: a. As crianças ouvem a escala b. A professora toca o som inicial c. As crianças dizem qual é o número deste som, e depois escrevem d. Depois ouvem (não precisam pedir pra repetir, porque a professora vai repetir várias vezes. [Porque se falar atrapalha o colega que está ouvindo].

2. Instrução.

2. Instrução.

Esta é uma forma de relação “topológica” que se tornou uma convenção na representação musical através da escrita: sons vizinhos são representados em linhas e espaços vizinhos. A forma como a professora solicitou a participação dos alunos foi boa no sentido de levá-los a tomada de consciência destas convenções e a relação destas com os pré-conceitos que eles já tinham. 2. A nota inicial do ditado é parte do sistema de sons (escala) que é apresentado antes de tudo. Relação parte-todo. A identificação deste som pressupõe uma representação auditiva do som dentro da totalidade da escala inicial.

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As crianças ouvem o que a professora toca: 1234/5432/1*51//. Algumas escrevem. Notamos alguns comportamentos : uma criança ouve e mexe com os dedos formando números. Outra fala o número dos sons que ouve sem emitir som. Outras esperam. Outra criança pega emprestado a borracha do colega para corrigir o que está fazendo... [Uns demonstram no olhar que estão pensando nos sons, mas parecem se perguntar mentalmente: “como representar isto?” Parece ser um mistério, apesar de todas as explicações anteriores. A professora termina, e encoraja: “vai escrevendo...” Este será um processo individual mas aos poucos, alguns alunos olham para o caderno do colega, à procura de alguma confirmação da eficácia de suas hipóteses (?).

Ditado melódico-rítmico que a professora toca ao piano: 1234/5432/1*51// [* representa a pausa de uma pulsação]

O espaço auditivo, e cinestésico (gestos com dedos, e com a boca)

Os gestos que percebemos dão pistas sobre o pensamento das crianças, pois elas precisam ainda de um fato concreto para não se perderem na ação de ouvir e representar. Isto explica os gestos que tentam identificar numericamente os sons, com dedos, com a fala sem som. Estes gestos são esboços - formas mais ágeis de representar os sons e que dão um aspecto mais concreto ao som que se esvanece com o tempo.

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Na terceira vez que a professora toca, alguns alunos começam a solfejar com números, bem baixinho. A professora sugere que eles cantem, mesmo que não tenham acabado de escrever, para que confiram o que estão pensando. Alguns já começam a corrigir os erros.

Solfejo espontâneo do ditado. Espaço vocal Depois de escreverem, os alunos querem verificar suas hipóteses, e o canto coletivo traz respostas para este anseio.

Em seguida a professora canta com “tas” e faz o passo. Um dos alunos diz: “ah! Entendi!” A professora pede que todos olhem para ela e refaz a ação. Eles percebem a coordenação dos tempos dos passos (durações) com as alturas cantadas por ela.

Reexposição da melodia pelo solfejo acompanhado de passos pela professora.

Espaço visual e auditivo são os canais de entrada para assimilação das relações de durações dos sons com o movimento que a professora faz ao cantar.

Tomada de consciência do objeto que está sendo assimilado dentro das relações de altura e tempo graças ao aspecto temporal da performance. Ao observar a professora, um aluno compreende a ordenação dos acontecimentos pois acompanha passo a passo a coordenação dos eventos que já estava em vias de representar. Apesar de haver simultaneidade de eventos (tempo-gesto e altura-canto), eles são direcionados para espaços práticos diferentes do receptor (olhos e ouvidos) e organizados dentro da sucessividade de eventos da performance.

AGA diz que não entendeu. A professora pergunta a ela: “AGA, o que acontece quando a

Representação da pausa dentro da melodia do solfejo

Espaço visual e auditivo

Através das reconstituição das ações e das perguntas da professora, AGA tomou consciência de que havia um

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gente faz o exercício da folhinha [do Passo] quando a gente dá o passo e não canta.” AGA diz: “quando a gente faz uma pausa”. A professora prossegue fazendo o passo e cantando: “Então, o que aconteceu aqui: 1* Ta-Ta”? Este passo 2, aconteceu o que aqui? Teve uma?” E AGA responde: “Pausa”.

momento de silêncio e também levou-a a localizar este momento no compasso. Seria então uma abstração empírica, pois o objeto não foi modificado por AGA. Houve um reflexionamento: fazer referencia à imagem mental da pausa em outro contexto, trazê-la para uma ação real e solicitar da aluna seu conceito. Trata-se de um reflexionamento de terceiro patamar, como diz Piaget (1995, p. 275), que é feito a partir de comparações da ação total com outras análogas ou diferentes.

Os outros alunos começaram a confirmar: “eu fiz assim, eu corrigi, etc...” A professora então pergunta o que deve ser escrito no pentagrama no espaço de cada um dos passos. Além disso confere se os números devem ficar na linha ou no espaço. E escreve o que eles respondem. O mais difícil é o último compasso, pois eles tem que pensar no salto do 1 ao 5 sendo que a pausa acontece entre estes dois sons.

Correção da escrita do ditado: 1234/5432/1*51// [* representa a pausa de uma pulsação]

Espaço auditivo e visual: após ouvirem a explicação, conferem a própria escrita.

A explicação feita para AGA serviu de confirmação das hipóteses lançadas pelos outros alunos.

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A professora canta o 5 e propõe que eles cantem enquanto ela toca no piano. Ela toca intervalos harmônicos, mantendo o 5 com 1,2, 3, 4 e 5. Os alunos não expressam que compreenderam esta demonstração.

Harmonização ao piano de um som cantado e mantido pelos alunos: Sol-Dó, Sol-Ré, Sol-Mi, Sol-fá, Sol-Sol.

Espaço vocal e auditivo.

Apesar de os alunos não expressarem qualquer tomada de consciência, a professora lhes colocou numa situação de aprendizagem. Esta experiência poderá servir para a construção de esquemas de assimilação da harmonia entre os sons da esacala.

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Quadro 3. Aula de EPEM 12. 02/06/2009 Sujeitos presentes: LAU, MA, BEA, ISA, DIO, AGA, VINI, ISI, HEN. Nesta aula a turma recebe a visita de SOF (3 anos) que tenta participar das atividades. A criança, filha de uma professora da escola, se sente parte da turma mesmo se, às vezes, as outras crianças riem de suas intervenções.

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno

Inferências sobre as representações musicais

Solfejo a uma e a duas vozes escrito para ser executado através do método “O Passo”: Os alunos colocam a partitura no chão, lêem dando passos para frente (1-2) e para trás (3-4). O primeiro exercício (A) é a uma voz. O segundo (B) é a duas vozes. Nestes exercícios a professora propôs que uma das vozes será executada pelo uso das baquetas e quando tem duas vozes, a segunda é executada com estalos da língua. No começo algumas crianças se confundem e estalam a língua no lugar da pausa das baquetas. A professora pára e chama a atenção deles, mas alguns ainda não haviam compreendido as regras.

Ritmos quaternários a uma voz (A) e com duas vozes: (A) – para ser executada por batidas entre as baquetas; (B) – para serem executadas pelas baqueta e pelos estalos de língua.

Espaços cinestésico (passos), bucal (estalos de língua), visual (decodificação dos signos), tátil (segurar a baqueta)

Na simultaneidade de ações corporais para a realização dos ritmos, o passo serve para medir o tempo e o espaço do chão delimita o ciclo das pulsações. O ciclo se reinicia a cada “1” , e isso torna mais clara a organização métrica dos compassos. É graças ao “desenho” do quadrado, que se propõe como objeto concreto, que o aluno parece realizar abstrações pseudo-empíricas devido aos reflexionamentos: do tempo que leva de um passo ao outro no espaço a ser percorrido, e na reiteração do ciclo a cada quatro passos.

1. A professora explica que no exercício seguinte o estalo

O ritmo a duas vozes apresenta a simultaneidade de sons e silêncios.

Espaços cinestésico (passos), bucal

1. Ao executar um exercício no qual eles lêem uma linha somente, sem

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acontece no mesmo momento em que, na voz da baqueta, existe uma pausa. Mas o estalo não pode ser confundido com a pausa. Nova repetição, e alguns alunos continuaram estalando a língua na pausa. A professora perguntou “quem estalou? Porque?” Um aluno diz: “pensei que era pra estalar no silêncio”. A professora diz: “silêncio é?” O aluno responde: “silêncio”. 2. Nova repetição do exercício com continuação para os próximos. “lembra que quando entra na letra B tem estalo e batida”- diz a professora. Os alunos realizam melhor o primeiro exercício, mas na sequencia para o B esquecem da baqueta no primeiro tempo. A professora pára e pede que prestem atenção, realiza sozinha a passagem para que vejam o correto e eles repetem mais uma vez. Eles conseguem fazer melhor, e a professora diz que eles devem continuar praticando estes exercícios em casa.

(estalos de língua), visual (decodificação dos signos), tátil (segurar a baqueta)

estalos, faz com que o estalo do exercício seguinte seja confundido com o silêncio concomitante do linha rítmica da baqueta. Passar de um plano linear para um plano duplo parece confundir o aluno na etapa de tratamento da informação. Como no primeiro exercício não existe a linha rítmica do estalo, a aluno parece ter criado uma síntese das duas linhas numa só. 2. Ao executar o exercício para os alunos a professora está solicitando deles a percepção da ordem dos acontecimentos, para que eles imitem com base na imagem que retém da execução (aspecto figurativo). Como sabemos, a percepção retém na memória a sequencia de estados sob forma de imagens mentais o que já é o suficiente para que eles imitem. Quanto mais eles repetirem, mais especializados ficarão os esquemas de assimilação do objeto.

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Ditado rítmico: 1. A professora escreve o esquema métrico no quadro e pede que eles copiem no caderno e explica que no exercício de agora eles não têm nada escrito. É diferente do exercício anterior, em que existia uma escrita e a turma executava tocando com baquetas e estalos de língua. Neste exercício seria o contrário: eles não têm nada escrito, e terão que escrever o que a professora executar. 2. Ela faz os passos e bate o ritmo. Eles olham, vêem os passos que ela dá e onde ela está quando o bate o ritmo durante cada um dos passos (1º, 2º, 3º ou 4º passo). Onde ela estiver batendo, eles devem desenhar uma: “semínima”. Onde ela der o passo e não bater nada, eles devem desenhar uma: “pausa”.

1. Instrução sobre as regras da atividade. 2. Ritmo com semínimas e pausas de semínima.

Espaço visual e auditivo.

1. Observação da instrução sobre as regras da atividade. 2. Os alunos observam a ação da professora. Eles devem construir a imagem (através de imitação interna) da sequencia de ações que se apresentam. Durante a continuidade do ritmo, devem identificar e relacionar para cada pulsação (descontinuidade) uma destas duas possibilidades: som ou silêncio.

Depois desta explicação ela orienta o procedimento para conseguir escrever. Combina que eles deverão: 1. Na 1ª. vez, olhar pra professora porque assim eles poderão saber em que pulso ela bate o ritmo,

Passo acompanhando ritmos com semínimas e pausas de semínimas.

1.Espaço visual e auditivo. 2. Espaço auditivo,

1. assimilação da execução rítmica da professora. 2. Para passar da assimilação da

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conforme o passo que ela estiver dando. 2. 2ª. vez tentar escrever o que acharem que foi batido.

visual. ação para a representação gráfica é necessária uma acomodação dos esquemas sensório-motores à representação dos sons através de signos musicais. Este é o desafio proposto pelo exercício.

1. O primeiro exercício é executado. 2. Depois da execução a professora aconselha aos alunos que ouçam mais uma vez, agora tentando escrever.

.*.*/.*.*/.**.// Legenda: . = semínima *= pausa de semínima.

1. Equilíbrio entre o espaço auditivo e visual. 2. Domínio do espaço auditivo para a assimilação, e do visual para a escrita –representação.

1. Assimilação – através do processo de reflexionamento, os alunos abstraem os dados do ritmo pela percepção e organizam estes dados no nível da representação. Este é um exemplo de abstração pseudo-empírica. 2. Na passagem do nível representativo para a representação gráfica – escrita de signos, os alunos passam por outro nível de reflexionamento agora do interno para para o externo. É o mesmo processo de aquisição da fala: é necessária a articulação de um código socialmente constituído que exige novas acomodações esquemáticas do sujeito.

Depois de executar o ritmo, a professora dá outra dica: já que eles ainda escrevem música lentamente, a cada som que eles ouvirem, podem fazer um sinal no papel, e desenhar a figura depois

.*.*/.*.*/.**.// Legenda: . = semínima *= pausa de semínima.

Domínio do espaço auditivo para a assimilação, e do visual para a escrita –representação.

Nesta instrução, a professora solicita uma representação bem simples da diferenciação de estados contrários: som e silencio. Esta é uma maneira de trabalhar a conservação da matéria pelos principio de identidade

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com calma. “E o resto [nos tempos em que eles não ouvirem sons] é pausa”.

e de sua negação. Como o ritmo não é modificado pelo sujeito, mas é organizado internamente por ele antes de sua representação escrita, diremos que é através de abstrações pseudo-empíricas que esta representação ocorre.

3. Correção do exercício: Repete várias vezes e pede que um aluno de cada vez escreva um dos compassos no quadro.

.*.*/.*.*/.**.// Legenda: . = semínima *= pausa de semínima.

Domínio do espaço auditivo para a assimilação, e do visual para a escrita –representação.

3. A correção é feita pelos próprios alunos, cada um escrevendo uma parte da totalidade da sequencia rítmica, dando tempo aos alunos de avaliarem suas próprias tentativas, e é, ao mesmo tempo, uma forma de encorajar as trocas entre as crianças. No método clínico Piaget utiliza uma contra-pergunta dando o exemplo de uma resposta do colega e pergunta à criança se ela concorda com a resposta da outra criança. Acredito que na aula de EPEM as dúvidas de um aluno suscita no outro uma resposta que se compara à do colega. Através destas trocas eles constroem conhecimento espontaneamente.

Novo ritmo é executado pela professora para que os alunos escrevam. Batidas em semínimas com baquetas e pausas de

Novo ritmo: .*../.**./..**// Legenda: . = semínima

1.Espaço visual e auditivo

1. Observação:Ao observarem a ação da professora os alunos coordenam os espaços sensoriais (olhos e ouvidos), mas a proposta de

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semínima. BEA escreve e depois aproveita a repetição do exercício para conferir se fez certo. E comemora: “Acertei!” Em seguida outros colegas fazem a mesma coisa. 2. ISA movimenta a ponta do pé direito enquanto ouve a execução do ritmo (para baixo quando é semínima, para frente quando é pausa). 3. MA que estava parada, ao ouvir os colegas comemorando o sucesso na atividade, toma coragem e começa então a escrever. A professora passa pelas cadeiras olhando o trabalho dos alunos e resolve repetir o ritmo e pede para os alunos que já escreveram, que levantem e façam o ritmo com ela. Encoraja MA a continuar a escrever, pois eles repetirão “quantas vezes for preciso para que ela consiga”.

*= pausa de semínima. 2. Espaço auditivo, visual e cinestésico. 3. Espaço auditivo e visual.

escrever deve provocar uma agilidade no processo de assimilação, predispondo os esquemas das duas possibilidades: semínimas e pausas. Diríamos que eles devem “antecipar” a conservação da seqüência, confirmando ou descartando hipóteses e fixando os resultados na memória. 2. Imitação: ISA representa os sons através do gesto dos pés. Quando imita um objeto, está deslocando-o para si mesma, ou seja,o objeto é assimilado tornando-se subjetivo. Esta imitação é agregada aos esquemas de assimilação e memorizada. 3. Representação: A aluna MA, geralmente passiva em relação às atividades da escola, se engaja no ditado e começa, mesmo que depois dos colegas, a escrever seus esboços. Sua atitude é valorizada pela professora que procura envolver toda a turma em atividade de execução do exercício para dar mais tempo à MA de resolver suas dúvidas.

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4. Alguns alunos erram a execução. A professora chama a atenção deles e pede que repitam. Novos erros e mais uma repetição. A professora pede que eles façam só o último compasso para MA ouvir. Alguns, começam a bater os pés com mais força e a professora lembra que o pé não deve ser ouvido porque ele serve só pra saber em que pulso estamos. No final, os alunos batem para que ela ouça mais uma vez e consiga escrever. MA demorou mais tempo para realizar a tarefa, em parte porque começou a escrever depois dos outros. 5. Os alunos disputam para ter a chance de escrever, cada um, um dos compassos no quadro. Alguns levam seu próprio caderno para transferir para o quadro negro o que já haviam feito no caderno.

4. Espaço cinestésico, visual e auditivo. 5. Espaço visual.

4. Imitação: notamos que mesmo já tendo escrito corretamente o ritmo no caderno, ao executarem a ação representada, os alunos passam por outro processo de imitação, agora, da representação escrita para a ação. Os erros demonstram que a ação não é espontânea, mas é resultado de um raciocínio lento que envolve esquemas sensório-motores mediados por esquemas representativo. 5. Ao escreverem no quadro, os alunos, imitam agora pela escrita, o que haviam imitado internamente, antes de escrever no caderno.

Intervalo 1. Exercício de escrita de alturas no pentagrama, relacionando esta com a escrita em números do ditado melódico da aula anterior.

Exercício de escrita das notas nas linhas e espaços do pentagrama.

1. Espaço auditivo e visual.

1. Observação: enquanto a professora explica os alunos ouvem atentamente. Estão assimilando informações sobre as regras da

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A professora escreve o enunciado no quadro, eles copiam e depois fazem o que ele pede: que eles reescrevam substituindo os números usados na pauta por semibreves. A professora explica e demonstra no quadro negro como escrever semibreves nas linhas e nos espaços. 2. Os alunos começam a escrever e a professora supervisiona, explicando para alguns como fazer. Observa-se que alguns crianças fazem e olham para o caderno do colega para se certificarem do que estão fazendo.

2. Espaço visual e coordenação manual – para a escrita.

escrita no pentagrama. Os números tinham a função de localização dos sons no sistema escalar. A substituição dos números pelas semibreves supõe a internalizaçào daquele sistema pelos alunos e, a partir de agora, o signo musical poder agregar novas informações tais como duração, formas de execução, etc. 2. O ato de conferir com o colega denota que há dúvida. É uma atividade nova e todos estão experimentando fazer algo que eles acreditam haver uma maneira certa de fazer. Não é qualquer coisa, e não dá para inventar.

1. A professora chama ISA, corrige o exercício da aluna no caderno e pede que ela escreva no quadro. A professora vai até o grupo, e deixa a aluna fazendo, mas ISA não desenha bem as notas. 2. A professora volta e mostra para ela como se escreve a semínima e a pausa na pauta, respeitando os limites das linhas e espaços.

1.Escrita das semínimas e pausas de semínima nas linhas e espaços. 2. Organização vertical e horizontal da escrita musical.

1. Espaço visual. 1. ISA escreve o que já fez no caderno. É uma atividade baseada apenas na representação, uma simples repetição do desenho que ela já realizou. Poderíamos dizer que a própria professora poderia escrever, e a atitude de pedir para um aluno, é a de compartilhar o espaço de professor com os alunos valorizando seus saberes. 2. Esta instrução visa levar os alunos a diferenciarem a estrutura de linhas

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Explica que a nota de linha é aquela que a linha corta a nota, diferente do conceito que eles já têm de “escrever palavras nas linhas do caderno” (que é feito acima das linhas). Além disso, a professora alerta para a importância de distribuir os signos em correspondência às marcações de tempo e no espaço da pauta (métrica/ espaço do papel/ compasso).

para a escrita de sons no pentagrama daquela que eles já estão habituados (para a escrita de palavras na pauta do caderno). A organização horizontal do espaço no papel é referente ao tempo. A música, por ser um objeto temporal, precisa de significantes que indiquem esta particularidade do objeto. Esta característica da escrita é particularmente importante para organizar a escrita de mais de uma fonte sonora. Desta maneira, a sucessividade de entradas das vozes é visível na escrita pela sucessividade com que aparecem da esquerda para a direita no papel.

1. Primeiramente as crianças são levadas a cantar todos os graus da escala. 2. Depois de 1 até 5, e ainda depois, só o 5. 3. O 5 é o ponto de partida da melodia A, que os alunos cantam enquanto a professora os acompanha com harmonias ao piano. A: 54321/ 5434/ 5353/ 543211

Folha de leitura melódica que apresenta os intervalos de 8ª. (1-1- 1) e de 5ª. (1-5-1). Estes intervalos são trabalhados separadamente, antes da leitura da folha, sempre com o número dos graus da escala. Melodia A: 54321/ 5434/ 5353/ 543211

Espaço visual, vocal e auditivo.

Se a melodia é vista como objeto, e o sistema visto como meio, o sujeito se ambienta através do canto de todos os graus, que parecem servir de referencia para a leitura do desenho melódico. Podemos dizer que existe aí uma referencia esquemática do sistema tonal, que é ordenado por alturas vizinhas. Depois o pentacórdio é destacado do todo para finalmente atingir a localização do ponto de partida da

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melodia (5º grau). Este método parece criar condições de o sujeito assimilar o significado de cada som, pois o situa dentro do sistema.

A professora pede que eles fiquem em pé para cantar melhor a melodia B, e avisa que eles vão começar no 5 e vão subir. Os alunos usam o passo mesmo sem ser pedido. Como desafinam, a professora para, toca a sequência 12345, prolongando o 5 para que eles memorizem e, então, recomeçam. 5671/54321/5671/5432/1-1/1. Afinação: Ao fazerem as oitava ascendente e descendente ( 1-1-1), alguns cantam qualquer nota no agudo. A professora chama a atenção de uma aluna, “AMA: não é qualquer som” – demonstra cantando: ( 1-1-1). Todos são levados a repetir este intervalo.

Melodia: 5671/54321/5671/5432/1-1/1

Nesta melodia o 5º grau funciona como um eixo entre os dois tetracórdios da escala maior. 12345671

Espaço cinestésico, visual, vocal e auditivo.

Ao cantarem a sequencia de 12345, os alunos estão construindo o 5º grau. Ele não é um som sozinho, mas sim, um elemento que cumpre uma função dentro do conjunto. A escala acaba sendo naturalizada como uma sequencia a priori na música. É através desta estrutura que os outros intervalos são construídos depois. É o caso do intervalo de oitava que a professora repete várias vezes nesta atividade. Através da percepção os alunos assimilam esta relação intervalar e criam esquemas. Trata-se de uma construção da qual praticipa a memória no sentido estrito, para em seguida ser incorporada na memória no sentido amplo. Graças à aquisição destes esquemas intervalares [além do desenvolvimento da técnica no uso do aparelho fonador] os alunos adquirem maior controle da afinação durante os exercícios de solfejo.

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Quadro 4. Aula de EPEM 1.2. 09/06/2009. Sujeitos presentes: LAU, MA, BEA, ISA, DIO, AGA, VINI, ISI, HEN,

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Exercício do passo para a vivência do contratempo:

1. Para começar, os alunos são convidados a fazer o passo tentando alongar o som da voz para a contagem dos números.

2. Em seguida, a professora dá o exemplo do passo dobrando exageradamente o joelho na subdivisão de cada pulsação (contratempo).

AGA comenta: “parece que você está andando de bicicleta”. [Além do joelho subir, o corpo abaixa um pouco também, como se a pessoa estivesse dançando.] Todos ficam em roda e se põe a fazer igual. Alguns não andam, e assim não constroem o “espaço” do movimento. Outros não equilibram o movimento por todas as articulações: tronco baixando com o movimento do joelho, movimento das pernas para frente e para trás. A professora pede que os alunos

O Passo com movimento de levantar os joelhos e verbalização da contagem numérica: 1, 2, 3, 4.

Espaço Tátil-cinestésico, visual, e auditivo. A coordenação do movimento de andar e o de balançar o corpo ao dobrar os joelhos entre cada passo, são importantes para passar da métrica à sub-divisão do tempo.

Com o contratempo representado pelo movimento exagerado do joelho, temos presentes o “contínuo” (na pulsação e na métrica) e também o “descontínuo” (tempo e contratempo). Se pensarmos na unidade de tempo como o domínio de um objeto descontínuo, domínio este onde não se tratam das relações entre objetos, mas sim de particularidades internas do objeto, chegaremos ao pensamento infralógico. Este é parte integrante da totalidade do pensamento opertório. Durante a atividade descrita podemos observar a alternância de dominância entre o pensamento infralógico e o lógico-matemático. Ao passarmos da continuidade da pulsação e da métrica (lógico-matemático) para a subdivisão das unidades de tempo, entramos no interior destas unidades-objeto (infralógico). A medida do espaço utilizado pelo movimento da perna ao dobrar o joelho, e a medida de tempo que o aluno leva entre o passo e o balanço, são alternâncias entre o

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fiquem em roda e imaginem que formam uma tribo de índios, e continuem a praticar o mesmo exercício.

tempo e o espaço que caracterizam a dialética sincrônico-diacronica do pensamento operatório.

1. BEA fixa o joelho dobrado, o que não está correto. A professora pede que só os meninos façam o movimento e vai acompanhando cada aluno, ficando ao lado daqueles que apresentam dificuldade. Depois faz o mesmo com as meninas. 2. MA está trocando o pé direito pelo esquerdo, e se guiando pelo movimento invertido da professora, que está de frente para MA. Ao invés de dar um passo para frente, MA dá o passo no mesmo lugar e depois para trás. MA então é acompanhada pela professora, que a envolve com o braço direito e faz o passo com ela.

O Passo com verbalização da contagem numérica: 1, 2, 3, 4; com o contratempo representado pelo movimento exagerado do joelho.

Espaço auditivo, visual, tátil e cinestésico.

1. Quando BEA não dobra o joelho, ela não sente esta alternância, apesar de poder ver a mesma no movimento da professora. Sua atividade perceptiva está centrada no próprio passo (contínuo). Ela deverá ser levada a valorizar o balanço para sentir a subdivisão entre cada passo. 2. No caso da aluna MA, parece que a visão está comandando sua ação. A coordenação dos movimentos espelhados requer uma conservação de lateralidade que esta aluna parece ainda não possuir. As conservações físicas exigem a reversibilidade que, neste caso, supõe imaginar a ação invertida. A solução encontrada pela professora foi adequada, pois ao se colocar ao lado de MA pode ajudá-la a sentir o movimento que deve imitar sem que ela tenha que reverter a imagem. A percepção cinestésica apoiará assim sua ação ajudando-a a construir a imagem da ação por operação direta.

Depois de ajudar casos isolados a professora volta para o grupo como um todo e, convidando-os (“A tribo

O Passo com verbalização da contagem numérica:

Espaço auditivo, tátil e cinestésico.

A instrução de não olhar para o chão parece buscar a conservação do movimento independente da visão. O que as crianças

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inteira agora?”), pede que eles não olhem para o chão: “A gente não precisa olhar para o chão para andar, precisa? Quero olhar no olho de vocês”. A professora improvisa uma letra para conduzir o exercício, e todos vão fazendo o movimento com domínio cada vez maior. Ao pararem, alguns alunos reclamam do cansaço.

1, 2, 3, 4; com o contratempo representado pelo movimento exagerado do joelho.

olham quando dirigem o olhar para o chão é o ato de pisar, ou seja, tentam coordenar a ação dos pés através do espaço visual. Podemos relacionar esta aquisição com aquela do 3º para o 4º sub-estágios do período sensório-motor, em que a criança, que só coordenava os espaços práticos (visão e preensão) passa a internalizá-los, tornando-os subjetivos. Quando a criança imagina a ação dos pés, internaliza esta ação transformando este espaço prático em subjetivo e chega assim a construir a imagem de si mesma em ação.

A verbalização dos tempos é proposta pela professora. 1. Contando só os tempos 1, 2, 3, 4. 2. A professora mostra e os alunos repetem em seguida falando 1e2e3e4e... 3. Sem parar a professora enfatiza o “e”, sendo imitada pelos alunos. Ela também varia as alturas do “e”, o que os alunos acham engraçado e imitam também. 4. A turma repete falando só o “e”. 5. A professora propõe uma ação para que eles imitem em seguida: bate palmas enquanto faz o passo com o

1. Dominância dos tempos dentro da métrica. 2. Dominância do tempo com potencialização do contratempo. 3. Potencialização do contratempo e diminuição da dominância do tempo. 4. Dominância do contratempo. 5. Dominância do tempo e potencialização do

Espaço visual, auditivo, vocal, tátil e cinestésico.

O funcionamento dialético da estrutura se apóia na percepção do movimento dos pés e no raciocínio A percepção do equilíbrio do tempo em que um pé toca o chão enquanto o outro se movimenta, e novamente, no movimento que faz no ar enquanto o outro pé está apoiando o corpo até o primeiro pé tocar novamente o chão. O raciocínio que relaciona este moviemento aos tempos do compasso: Pé no chão = tempo (1,2,3,4) Pé no ar = contratempo (e) A dialética observada na atividade evidencia uma alternância de dominância no tempo ou no contratempo até o momento que surge um novo desequilíbrio: o

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movimento dos joelhos na subdivisão. 6. A turma repete com palmas, mas alguns começam a acelerar o andamento.

contratempo. 6. Métrica, tempo e contratempo. Há falta de conservação do andamento.

6. Espaço visual, auditivo, tátil e cinestésico.

andamento. Com um domínio cada vez maior dos esquemas motores, graças ao exercício, os movimentos ganham velocidade. Mas em música a velocidade por si não é vantagem, já que o andamento constante é um significante e deve ser conservado do começo ao final da execução.

1. Para controlá-los a professora começa a declamar falando ritmicamente uma parlenda: “Bate, bate, carambola, um de dentro e um de fora.” 2. A professora continua a comandar a turma. Pede que eles observem o que ela faz e repitam. Ela bate o ritmo da parlenda anterior com palmas fazendo o passo. A turma vai repetindo na seguinte sequencia: a. passo e palmas b. passo, palmas e parlenda c. passo sem palmas só falando [ao reorganizar a roda alguns alunos recomeçaram com a ação completa: passo, palmas e fala, mas ao observarem a professora, param as palmas]. d. Dois ciclos com a fala, e seguem mais dois ciclos só com passos. [Neste

O ritmo da parlenda é em compasso quaternário simples, composto de pares de colcheias: || || || || / || || || || //

A letra: Bate, bate, carambola, um de dentro e um de fora. Legenda:

||= duas colcheias

/= barra de compasso

//= barra dupla

Espaço auditivo, vocal, visual, tátil e cinestésico.

1. Como a imitação do gesto não bastou para conservar o andamento, o texto traz sentido rítmico e colabora para esta conservação, já que preenche o tempo entre um passo e outro, ajudando a controlar o tempo da coordenação entre o gesto do joelho e o dos pés. 2. Alternando o foco de atenção para espaços práticos diferentes, a professora vai fortalecendo a coordenação entre estes. O espaço visual vai se tornando cada vez mais voltado para as relações interpessoais, pois dele dependem as mudanças de movimento. Os espaços auditivo e vocal garantem a conservação do andamento; e os espaços tátil e cinestésico garantem a conservação do objeto, já que todo o exercício é voltado para a execução do som motivada pelo movimento. Ao retirar a fala, mas mantendo o tempo da duração de toda a parlenda, vemos que os alunos internalizaram o andamento, já que

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momento percebo que BEA não acompanha a ação da professora - olha para a câmara e faz uma careta] e. A professora segue mais dois ciclos de passos com palmas sem fala. f. Em seguida começa a emitir o “e”.

parece haver uma internalização da fala.

O importante agora na ação é pensar no contratempo. Ao recomeçar, alguns alunos falam o “e” no 1º tempo. A professora corrige, lembrando que o “e” vem depois do 1º tempo. Um dos alunos pergunta se não pode começar pelo “e”. A professora diz que pode sim, mas que só não pode começar junto com o 1, e mostra: “e,1,e,2,e,...” todas as crianças acompanham sua ação. Ela propõe: “olha a ginga! Ginga de carioca!” e faz um molejo com o corpo que é imitado com gosto pelas crianças.

O Passo com verbalização da contagem numérica: 1, 2, 3, 4; com o contratempo - representado pelo movimento de levantar o joelho.

Espaço auditivo, vocal, visual, tátil e cinestésico.

Do ponto de vista do ritmo da parlenda, vemos que a igualdade de durações (sempre duas colcheias) pode criar um deslocamento do tempo para o contratempo. A pergunta do aluno evidencia uma abstração pseudo-empírica sobre a continuidade da pulsação. O movimento do passo vem contribuir para a localização da métrica no tempo. Afinal, o apoio do pé no mesmo espaço, em todo primeiro de cada grupo de quatro passos é um “significante” para a noção de métrica que engendra a noção de tempo e contratempo.

Revisão da folha de ritmos do caderno trabalhados na semana anterior é feita pela classe usando agora o movimento do joelho no passo. 1. Primeiramente a letra A com números, e em seguida batendo palmas nas semínimas. A execução com base na leitura do solfejo a uma voz é feita sem problemas. 2. Letras E e F com palmas e estalos

1. solfejo rítmico A: 1***|**3*|*2**|***4|| 2. solfejo rítmico E e F: Palmas 1*3*|1*3*|| Estalos *2*4|*2*4|| Legenda:

A aplicação do movimento do joelho durante o solfejo envolve a coordenação dos espaços visual, tátil-cinestésico, auditivo e bucal (estalos de língua).

A leitura do solfejo a uma voz foi decodificado sem problemas, pois na atividade anterior, a parlenda já havia sido uma experiência similar. 2. A decodificação de duas linhas simultâneas, e a coordenação de dois espaços práticos ao mesmo tempo, exige uma antecipação da imagem antes da ação. Este processo é mais rápido e nem todas as crianças conseguem realizar.

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de língua. Algumas crianças apresentam problemas de coordenação das palmas e estalos ao lerem o solfejo a duas vozes. 3. A professora propõe que a turma observe sua performance para depois fazer a leitura. Ela começa, mas VINI não consegue ficar parado. Faz o exercício junto com a professora, que o pede que ele primeiro olhe. Ele olha para ela, mas continua agitado, balançando os braços, embora fora do ritmo. A professora faz o exercício duas vezes e os alunos observam. Ela comenta: “agora eu estou toda ‘quebradinha’ (com referência ao movimento de subdivisão feito com o joelho e o tronco). A turma toda faz o ritmo usando palmas e estalos de língua assim como o passo. 4. DIO comenta que a turma fez errado, mas ele é que havia se enganado, ao não perceber os símbolos das palmas para uma voz e da língua para a outra. Isso é esclarecido pela professora, e pelo colega que está ao lado dele.

Números = semínima.

* = pausa de semínima. 3. Ao executar o solfejo para a turma, a professora oferece a oportunidade de as crianças criarem uma imagem da totalidade do exercício para depois imitarem, mesmo que acompanhem a própria ação com a leitura do solfejo.

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Ditado rítmico a duas vozes: As crianças copiam a divisão dos compassos para palmas e estalos que a professora fez no quadro deixando espaço para escrever as duas vozes: Palmas// / / // //1234/1234/1234// Estalos// / / // Antes de executar o ditado, a professora ajuda os alunos a copiarem o “esqueleto” da partitura no caderno. A escrita à duas vozes: Antes de bater o ritmo que eles irão escrever, a professora explica como eles deverão se organizar no espaço do caderno: senta-se com eles e ajuda-os a montar os compassos, e explica como será a escrita a duas vozes. Os cadernos que os alunos usam têm pentagramas tomando apenas metade da página do lado direito, e uma parte da página em branco. Para este exercício eles deverão usar a parte em branco. Através do exemplo da escrita dos exercícios E e F do método “O Passo”, que eles já leram (um plano em cima e outro em baixo, que são lidos ao mesmo tempo), a professora explica que eles deverão escrever o

Organização espacial para a escrita rítmica: // .... / .... / .... // //1234/1234/1234// // .... / .... / .... // Os números marcados entre as duas vozes servem para orientar a escrita dos sons pela ordem em que são ouvidos pelos alunos (da esquerda para a direita). Se eles ouvem palmas escrevem na voz de cima, sobre o número do passo em que ocorrem as palmas. Se ouvem estalos, escrevem na voz de baixo sob o número do passo em que ocorre o estalo.

Espaço visual e auditivo, ao receber a instrução.

Não houve busca por uma escrita espontânea com base nos pré-conceitos dos alunos. A escrita do esqueleto da partitura serve para organizar o espaço no papel para a representação dos ritmos seguindo a instrução dada pela professora.

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ditado com o mesmo formato. A professora aponta para o quadro no espaço reservado ao primeiro tempo e pergunta: “Este passo é o 1, não é?” Os alunos respondem: “é”. “Se eu der um estalo [diz a professora estalando a língua], onde é que vocês vão colocar a semínima - na linha de baixo ou de cima?” Ouvem-se respostas opostas ao mesmo tempo. A professora pede que eles olhem no caderno [para a disposição do esquema de organização do ditado]. Eles olham onde está escrito estalo na partitura do caderno e dizem: “na linha de baixo.” “Agora vejam e digam como vamos escrever: [ e faz o passo, ao mesmo tempo que bate: palma, estalo, palma, estalo]”. DIO responde: “em cima, em baixo, em cima, em baixo”... - e continua: “quando tiver silêncio na voz, como vamos escrever isso?” Os alunos respondem: “com uma pausa”. A professora pergunta: “Primeiro, onde eu faço a semínima no número 1?” Os alunos respondem: “na palma”. “E

Instrução para a escrita do ditado dentro da organização espacial para a escrita rítmica: // .... / .... / .... // //1234/1234/1234// // .... / .... / .... // Durante a explicação a professora usa alguns exemplos: * . * . // 1 2 3 4 // . * . * // (ou) . . . .// 1234// . . . .//

Legenda:

. = semínima.

* = pausa de semínima.

Espaços visual e auditivo.

Observação – enquanto ouvem, os alunos observam os gestos da professora, observam a representação escrita que ela utiliza para exemplificar o que está explicando, e vão construindo um plano de ação para usarem no momento da execução do ditado. Mas são apenas simulações, pois o ritmo que ouvirão será totalmente novo. As perguntas que a professora faz durante a explicação se referem ao espaço que os alunos supõe que deveriam escrever o som que ela fez. Para responder a estas perguntas os alunos utilizam a memória (lembrança do som) e, através das estruturas de agrupamentos multiplicativos, estabelecem correspondências entre os sons de estalos (A) - linha de baixo, e sons de palmas (B) – linha de cima. Eles já possuem a reversibilidade, por isso podem retroceder no tempo, imaginar o que ouviram, e relacionar esta imagem com o esquema que têm no quadro negro. A representação nestes casos se apóia na imagem mental retida após a execução pela professora; e se relaciona com a imagem da escrita que eles já conhecem dos exercícios a duas vozes do método “O Passo”. Podemos afirmar que as crianças estão

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aí, no número 2 foi aonde?” - “no estalo” - e no número 3? [silêncio...a classe está distraída]. Então a professora retoma do início para escreverem os silêncios do estalo e de palmas que aconteceram enquanto os sons eram executados. “No número 1, o que aconteceu com o estalo? Era silêncio ou era som?” “Era silêncio” diz ISI. “Isso - diz a professora – eu bati palma, mas eu estalei ao mesmo tempo? – “Não” respondem os alunos. “Então o que eu escrevo aqui? pergunta a professora, enquanto aponta a linha do estalo”. “Pausa” - diz outra aluna. No número 2: eu fiz o estalo”[e estala a língua] “bati palma também?”- “Não” diz DIO. A professora propõe: “a palma ficou em?...”. “Silêncio” – respondem os alunos. “Então, quando tem silêncio eu escrevo a...?” “Pausa” completam os alunos. “E no número 3? Eu bati palma e estalei ao mesmo tempo? No pulso numero 3, eu só...bati palma [a professora já responde pelas crianças,

realizando abstrações pseudo-empíricas, já que colaboram com as explicações da professora com base nas representações anteriores e nas percepções do real.

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que estão dispersas] A professora dá o exemplo de um compasso em que há palmas e estalos em todas as pulsações, faz e escreve. Uma criança se surpreende com a simultaneidade dos eventos, que até agora não havia ocorrido e diz: “caraca!” A professora avisa que repetirá a sequencia várias vezes, e que eles devem esperar sem ficar pedindo que ela repita. 1. Depois de executar o ritmo, a professora comenta que os alunos parecem “desesperados”. Sorri, e diz que a partir da próxima repetição eles poderão começar a escrever. 2. Ela repete. Silêncio total na sala. Ela sorri, e diz que vai repetir. Olha para o caderno de um aluno, e avisa: “Cuidado! Você está ouvindo eu bater três palmas direto assim? Olha para o meu pé pra ver em que tempo eu estou batendo!” Vira-se para a classe e pergunta: “Mas...vocês acham que precisa sempre olhar o meu pé? – “Não”- respondem alguns. A professora explica: “Sabem por quê? Porque o pulso, a gente vai

Palmas . .** /.*.* /****// 1234/1234/1234// Estalos **. ./ ****/ .*.*// Legenda:

. = semínima.

* = pausa de semínima.

A professora utiliza os espaços tátil-cinestésico, visual, bucal (estalos), e auditivo. Os alunos observam a ação utilizando os espaços auditivo e visual e tátil (ao escreverem).

Observação- enquanto observam a professora executando o ritmo a atividade perceptiva dos alunos está funcionando no seu aspecto “percepção”, (Dolle, 2008b,p.10) , ou seja, captam as propriedades do objeto que está sendo executado, objeto como “estado”. A criança faz “a leitura da experiência a partir de sistemas de tratamento e de significações disponíveis”. Abstrai os aspectos figurativos do conhecimento traduzindo-os em forma de percepção e imagens mentais. “Seu produto consiste num ‘quadro’ imaginativo, mesmo quando se tratasse de um quadro dinâmico” (Dolle, 2008b, p.10) Abstração pseudo-empirica: as respostas das crianças às questões da professora são resultado de deduções em que relacionam os

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ficando com ele dentro da gente”. 3. E repete de novo. 4. E mais uma vez.

dados perceptivos com as representações já construídas através de experiências anteriores. Representação: Os alunos já tem consciência da interiorização do pulso? Não sabemos, mas eles parecem entender a explicação da professora sobre o “ficar dentro da gente”.

1. Observando a classe vemos uma aluna (ISI) copiando o que a colega escreveu. Ela nem tentou fazer sozinha. 2. A professora diz: “o silêncio é a pausa da semínima” - “o som é a semínima” DIO pergunta: “se eu tiver que escrever o estalo, como eu faço?” A professora diz que ele deve escrever uma semínima na linha de baixo, e se for palma, deve escrever a semínima na linha de cima. DIO balança a cabeça afirmativamente. [Parece que entendeu o que tem que fazer] 3. HEN ficou na dúvida se tinha escrito certo nos compasso em que na linha de palmas ou na de estalos só têm silêncio. A professora afirmou que, neste caso, tem que se escrever pausa em todos os espaços. HEN verificou que ele

Palmas . .** /.*.* /****// 1234/1234/1234// Estalos **. ./ ****/ .*.*// Legenda:

. = semínima.

* = pausa de semínima.

1 a 3 – Abstração pseudo-empírica: De certa forma os alunos estão procurando explicar o que perceberam, em forma de grafia. Vemos que as dúvidas das crianças são relacionadas aos meios de organizar a grafia dos sons que ouviram, provenientes de duas fontes (estalos e palmas) usando os signos que já conhecem (representações de sons e pausas). A professora adianta algumas reflexões sobre a ação que são fundamentais para a realização da tarefa: “O silêncio é a pausa da semínima” - “O som é a semínima”. Se ela tivesse levado os alunos a enunciar estas frases, eles teriam chegado a abstrações reflexivas.

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escreveu certo.

4. Alguns alunos ainda tem dúvida e a professora então pede que eles parem de escrever e se levantem e tentem realizar o ritmo junto com ela. Eles fazem o primeiro compasso com bastante segurança [ muitos já haviam conseguido escrever] mas no segundo compasso, alguns titubeiam. Ao final do terceiro compasso, todos queriam escrever, mas a professora pediu que eles repetissem a ação. Eles fizeram, agora com mais segurança em todos os compassos. Rapidamente querem se sentar para escrever. Um aluno diz: eu errei! – ao que a professora responde: “Corrige agora então!” 5. Ela chama um aluno para que leia o que escreveu usando passo, palmas e estalos. Enquanto ele realiza a ação, AGA observa.

Palmas . .** /.*.* /****// 1234/1234/1234// Estalos **. ./ ****/ .*.*// Legenda:

. = semínima.

* = pausa de semínima.

Espaços tátil-cinestésico (passos e palmas), visual, bucal (estalos), e auditivo.

4- Abstração reflexionante: A ação é retomada agora pelos próprios alunos, para que os que já conseguiram escrever exponham suas hipóteses pela ação, e avaliem se elas funcionam. Já os que não haviam conseguido escrever ainda, tem aí a chance de relembrar. Vemos aí exemplos de novas abstrações sobre objeto: Alguns alunos tomam consciência dos erros da própria escrita através da incompatibilidade desta com a própria ação, nem sendo preciso, para isso, que a professora os corrija. A decodificação dos signos que haviam escolhido lhes pedia uma ação e a memória auditiva e/ou cinestésica, assim como a ação do grupo, lhes pedia outra. 5. Abstração empírica: A execução do aluno é observada por AGA ainda uma vez para uma releitura dos dados pela percepção.

BEA, ISA, MA não conseguiram escrever o ditado. A professora então as ajuda fazendo uma linha e organizando o espaço no caderno para elas escreverem. Pede que HEN faça o ritmo e que elas observem o colega e o

Palmas . .** /.*.* /****// 1234/1234/1234// Estalos **. ./ ****/ .*.*// Legenda:

A organização do espaço da escrita é o ponto de partida para ajudar as alunas com dificuldades. Em seguida, a reexposição do fenômeno para novas abstrações empíricas. Acreditamos que ao rever os dados

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que elas escreveram para corrigir o problema. Depois disso pede que todos os alunos executem o que escreveram. A professora diz para as três alunas que não conseguiram, que elas copiem a correção do quadro, e que na próxima vez elas irão conseguir fazer melhor.

. = semínima.

* = pausa de semínima. empíricos estas alunas podem ser levadas a acomodações de esquemas que estão ainda sendo testados para a assimilação dos dados. As dificuldades encontradas pelas alunas BEA, ISA e MA, foram maiores que as das outras crianças. Pelas observações que temos acompanhado nas aulas de instrumento seria possível chegar a alguma conclusão sobre as razões destas dificuldades? Talvez elas não possuam as estruturas necessárias para a representação do espaço e tempo e causalidade, fundamentais para a realização desta atividade. Talvez não tenham compreendido a proposta da professora.

A professora pergunta aos alunos quem gostaria de fazer o primeiro compasso no quadro. Muitos querem fazer. A Professora chama LAU que, ao escrever, não distribui bem as figuras não espaço. A professora havia escrito o número das pulsações em baixo de cada tempo, e neste momento pede que LAU observe estas marcações. O segundo compasso foi escrito no quadro por ISI. Ela teve dificuldade em desenhar a pausa. A professora a encorajou, e depois de algumas feitas, foi até o quadro e refez

Desenho das figuras e pausas formando o ritmo do ditado.

Espaço visual e tátil-cinestésico.

A destreza manual para a escrita, a conservação do espaço e a representação da ação física ao realizar o ritmo estão em jogo nesta atividade. Ela é resultado das abstrações empíricas e reflexionantes descritas nos quadros anteriores, mas nesta fase, os alunos estão tendo a oportunidade de expor para o grupo a técnica de escrita que estão desenvolvendo: em que lugar devem escrever o primeiro som do compasso, como é o desenhos das figuras e suas pausas, etc.

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o desenho para que ela continuasse fazendo os outros com base no modelo correto. O último compasso foi escrito no quadro por LEO. Colcheia/ Contratempo. A professora escreve o título “e – contratempo” no quadro negro e alguns ritmos que pede para os alunos copiarem. Em seguida ela explica que o exercício do passo com movimento do joelho para cima, e a contagem 1e2e3e4e [os alunos começam a “recitar” a contagem] feito no início da aula, tinha o objetivo de levá-los a conhecerem mais uma figura. Antes eles só conheciam a semínima, que tem a duração de um pulso; ou a pausa da semínima que tem a duração de um pulso de silêncio. Agora, eles estão fazendo dois sons dentro do “1”. [ ela dá o exemplo fazendo o passo e recitando as diferentes figuras: “Ta_ ta_; papa; papa...”]. Ao desenhar as figuras no quadro compara: “É como se fossem duas semínimas, só que elas estão ligadas uma na outra” [mostra o traço que liga as colcheias escritas no quadro negro].

Nova figura rítmica: colcheia. Sequências rítmicas contendo semínimas, pausas de semínima e colcheias. A || . . * * || 1 2 (3) (4) B || |_| . * * || 1e 2 (3) (4) C || |_| . . . || 1e 2 3 4 D || |_| . |_| . || 1e 2 3e 4 Legenda:

semínimas (.), pausas de semínima (*) dupla de colcheias (|_|).

Espaços auditivo e visual (ao ouvirem e explicação) e tátil-visual para a escrita.

A conceitualização das ações anteriores é feita através de uma instrução na qual a professora apresenta um signo, explicando seu significado pela ação que eles fizeram anteriormente. Os alunos não são levados a formular perguntas sobre esta construção simbólica. Assim, eles perdem a oportunidade de realizar uma abstração reflexionante e chegarem, por si mesmos, a formular a questão sobre o significado de signo. Os alunos são levados simplesmente a constatar um signo convencional (estático) e a relacioná-lo com a imagem mental de ações anteriores. Haveria alguma maneira que fazê-los descobrir uma escrita que já existe, sem fazer uso de instrução? Acredito que não. Mas talvez seria possível propor atividades nas quais eles fossem levados a inventar uma escrita intermediária para ser substituída posteriormente por um o signo convencional. Assim eles compreenderiam a necessidade de criar formas sintéticas para representar a multiplicidade de elementos dos sons.

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Esta figura aqui tem um nome diferente: ela se chama colcheia” [e escreve “colcheia” no quadro]. “entao aqui eu tenho, na verdade, duas colcheias, uma ‘abraçadinha’ na outra”. A professora vai falando e chamando a atenção de alguns alunos que não estao mais concentrados. Ela pede que eles copiem no caderno para fazerem depois, porque, “tudo o que a gente faz a gente entende” diz ela. Enquanto os alunos copiam, ela supervisiona, ajudando os alunos que têm dificuldades para escrever e elogiando os que fazem bem.

As alunas MA e BEA são orientadas em como escrever as colcheias: a professora havia notado que MA desenhava um “fone de ouvido”distribuindo as hastes das colcheias dos lados de fora da nota. “vocês estão colocando as hastes do lado errado” diz. E senta-se ao lado delas e desenha no caderno da aluna a maneira correta. Explica também que, como estão fazendo com as hastes para cima, devem fazer as hastes do lado direito. Observo que depois que a professora

Escrita do signo musical: traços verticais e horizontais das colcheias. O desenho da cabeça da nota, já assimilado pelos alunos em outras atividades, ganha outros elementos com a função de estabelecer relações rítmicas. Enquanto os traços verticais estabelecem a descontinuidade dos

Espaços visual e tátil cinestésico.

As dúvidas que pudemos perceber na conduta de BEA não foram diagnosticas pela professora. Ao propor que os alunos copiassem um desenho, ela explicou como ele era feito e identificou para o grupo em que situações ele seria usado. Mas o significado dos traços verticais não foi reconstruído pelo grupo. Assim, para BEA, estes detalhes não são percebidos (por não serem significantes) e por isso ela erra sem saber o por quê do erro. A abstração empírica se limitou, neste caso, a extrair do signo sua configuração, sem

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sai de perto, BEA continua com dúvidas sobre a distribuição das figuras no espaço (1:08:55): onde colocar o traço das colcheias – na segunda metade do primeiro tempo (demarcado pelo “1-e” sob a linha) ou no segundo tempo (demarcado pelo 2 - um pouco mais a frente)? Ela escreve e apaga o que fez várias vezes, mas não pergunta para a professora. Quando questionada se acabou de copiar, não diz nada, a professora pede que ela se sente perto do quadro, e ela continua a copiar.

sons, os traços horizontais estabelecem relações de continuidade, de parte-todo a cada pulsação. Sequências rítmicas contendo semínimas, pausas de semínima e colcheias. A || . . * * || 1 2 (3) (4) B || |_| . * * || 1e 2 (3) (4) C || |_| . . . || 1e 2 3 4 D || |_| . |_| . || 1e 2 3e 4 Legenda:

semínimas (.), pausas de semínima (*) dupla de colcheias (|_|).

levar em conta o significado de cada um de seus elementos na ação que dá origem a eles (ou seja, seu significado).

Enquanto os alunos terminam de copiar os ritmos, a professora trabalha com os que já terminaram.

Sequências rítmicas contendo semínimas, pausas de

1. Espaços vocal (falando os números), tátil-cinestésico

As ações propostas visam explorar várias maneiras de excutar os ritmos. Os alunos percebem que quando falam podem

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1.Pede que eles façam o passo, dobrando bem o joelho como no inicio da aula. ISI olha para a câmera e levanta os ombros ao invés de levantar os joelhos. 2. Depois pede que eles olhem para o quadro (letra A) e digam que números eles vão falar. A classe responde “1 e 2”. Ela pede que falem só a letra A repetindo este compasso 3 vezes. 3. Depois pede que eles batam palmas em cada semínima do ritmo “A”. Alguns alunos perguntam: “1e 2?” A professora responde: “em cada semínima”. 4. Depois pede que eles não batam palmas mas só falem o ritmo da letra “B”. O que acontece na letra B? o que vamos falar? Os alunos começam a falar: “1e2...” Fazem o mesmo com os ritmos das letras “C” e “D”. 5. A professora faz com que eles

semínima e colcheias. A || . . * * || 1 2 (3) (4) B || |_| . * * || 1e 2 (3) (4) C || |_| . . . || 1e 2 3 4 D || |_| . |_| . || 1e 2 3e 4 Legenda:

semínimas (.), pausas de semínima (*) dupla de colcheias (|_|).

(passos e joelhos dobrados), visual e auditivo (acompanham a ação do grupo). 2. Espaço vocal (falando o ritmo A), espaço cinestésico (fazendo o passo e dobrando os joelhos), visual (leitura) e auditivo (ouvindo o resultado das ações). 3. Espaço tátil (palmas), espaço cinestésico (fazendo o passo e dobrando os joelhos e palmas), visual (leitura) e auditivo (ouvindo o resultado das ações). 4. Espaço vocal (falando o ritmo B, C e D), espaço cinestésico (fazendo o passo e dobrando os joelhos), visual (leitura) e auditivo (ouvindo o resultado das ações).

dominar melhor a duração do som (uumm, doois...) do que quando batem palmas, no entanto, o ataque das palmas desvincula a execução da ordenação dos sons no compasso, coisa que resulta numa maior ação do ouvido. 2. Quando pergunta o que os alunos tem que falar no compasso “A”, os alunos tiveram que se lembrar do significado das figuras e pausas (como eles deveriam ser executados). 3. Ao insistir na resposta pelo nome da figura e não pela numeração dos passos, a professora está solicitando que o significante seja estabelecido pelo nome da figura musical, elemento novo no vocabulário das crianças. Temos aí a dominância no aspecto conceitual. 4. Em compensação, ao solicitar a descrição da execução dos ritmos B, C e D, a professora está trabalhando com a numeração, e sua forma de vocalização, ou seja, o vocabulário que explica a ação e não sua representação.

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repitam para melhorar o movimento do joelho. Às vezes os alunos se deixam levar pelo grupo e não lêem o que estão fazendo. A professora chama a atenção do grupo para isso, [mas o fato de repetirem o mesmo compasso 3 vezes, me parece que faz com que eles se desconcentrem (a repetição fica sendo exercício reflexo?)]. 6. A professora divide o grupo em dois e pede que um deles faça os ritmos e o outro observe. Depois pergunta aos alunos o que poderia ser feito para melhorar. HEN diz que deveriam abrir mais a roda (ter mais espaço para o movimento). DIO diz que tem que falar 1e2, 3...sem o falar o “e” [no lugar onde não tem colcheia]. A professora completa que mesmo assim o joelho deve dobrar [para sentir a subdivisão de cada pulso]. 7. Em seguida pede que o outro grupo faça e o primeiro observe. Os alunos notaram que seus colegas não levantaram bem os joelhos, e a

5. Idem. 6.idem. 7. Idem.

5. Fazer e compreender, mas depois de compreender, exercitar sem se distrair do que está fazendo. Esta me parece ser a dificuldade. O exercício reflexo da inteligência sensório-motora não supõe uma representação, o que é diferente do exercício de um movimento para crianças operatórias. Embora possamos executar ações inconscientemente, especialmente quando repetimos uma ação com o objetivo de aperfeiçoá-la, a finalidade desta repetição não pode ser omitida. Eis o que parece ser necessário valorizar na ação dos alunos. Repetir uma ação para que? 6 e 7. Vemos que a distração das crianças na atividade levou a professora a solicitar a atenção das crianças nesta atividade. Identificar problemas os leva a rever as regras estabelecidas para a ação do passo, da necessidade de sentir o movimento no espaço (abrir a roda), da verbalização na qual eles ordenam os tempos musicais e expressam suas durações pela voz.

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professora completou “a gente está lendo o exercício, não é? Então a gente não pode ficar só olhando para o chão, a gente deve olhar para o quadro. Convida todos os alunos a fazerem e pede que eu [pesquisadora] observe a classe toda. Enquanto os alunos fazem o passo, falam os números ligados por “e” no lugar das colcheias, a professora sempre dobra o joelho no mesmo momento em que eles devem dobrar. No final ela pergunta: “e aí?”. Eu digo que alguns alunos “pensam que estão ainda fazendo o exercício “C” e não o “D”, mas foi bastante bom!”. 8. A professora pergunta para a classe: “Qual a diferença do C para o D? Um aluno diz: “é 3-4”, a professora completa: “não tem a divisão” , LEO diz “o ‘e’”. “E como é na letra ‘D’?” 3-e 4 responde outra aluna. “Então vamos repetir as letras C e D? Duas vezes a letra C, pára, e duas vezes a letra D” propõe a professora. 9. Os alunos começam e logo a professora pára o grupo e diz: “opa, eu

8. Espaço auditivo e visual. 9. Espaço vocal

8. Minha intervenção foi no sentido de levá-los a comparar os objetos para, através da diferenciação, indentificá-los. A professora solicitou exatamente isso com suas perguntas. Ao sair da ação inconsciente para a análise dos elementos dos compassos, as crianças entram nas explicações. Fazem assim uma abstração reflexionante, pois a partir da representação gráfica da ação (notação) elas explicam, utilizando um vocabulário simbólico, como deverão ser corrigidas as ações. 9. Há uma comunicação gestual significante

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estou ouvindo um ‘e’ aqui, aqui... Vamos lá, mais uma chance!” Enquanto os alunos lêem, a professora abre os braços nos tempos com semínima representando com o gesto a duração do som. Nos tempos com duas colcheias, ela faz dois gestos repetidos na direção vertical com as mãos.

(falando os ritmos C e D), espaço cinestésico (fazendo o passo e dobrando os joelhos), visual (leitura e observação dos gestos da professora) e auditivo (ouvindo o resultado das ações).

entre a professora e os alunos. Os gestos das suas mãos demonstram, através de uma linha contínua imaginária, a continuidade dos sons mais longos. Já os gestos que pontuam com gestos mais curtos, dois movimentos que se repetem enquanto o passo mantém a mesma pulsação, denotam a descontinuidade da duração, em reiterações mais freqüentes dos ataques. Através destes indícios, as crianças realimentam suas representações através de abstrações empíricas.

A professora pede que os alunos façam o exercício do “pé inteligente”. Senta-se ao piano e toca uma musica com colcheias. Os alunos devem caminhar pela sala reagindo ao que estão ouvindo, mas a turma fica um pouco perdida sem saber o que fazer. A professora diz que “esse pé esqueceu tudo!”. A professora pára e mostra como eles estão andando [andando como eles] e que o que ela está tocando é diferente [ mostra como devem andar cantando a melodia em semínimas]. A classe toda conhece a melodia e continua a cantar. Ela volta ao piano e eles começam a andar no ritmo certo, embora alguns alunos, como é o caso de MA,

Exercício extraído da metodologia de Jacques Dalcroze. Consiste em as crianças caminharem livremente pela sala reagindo gestualmente ao ouvirem mudanças na música que a professora toca.

Espaço auditivo, visual e cinestésico. Se o ritmo coincide com a pulsação do compasso, os pés se alternam na mesma duração. Se o ritmo tocado ao piano é subdividido, os passos se alternar no mesmo tempo.

Coordenação dos espaços práticos através da audição do tempo, das durações e dos ritmos que são expressados por movimentos do corpo. Há uma sincronia temporal entre o que ouvem e as durações dos movimentos. Notamos que algumas crianças reagem prontamente, outras mantém o passo como na metodologia predominante: “O Passo”. Notamos que, nestes casos, não há o reflexionamento da ação de ouvir para ser transformada em ação motora. Estamos no nível da imitação, ou seja, na acomodação dos esquemas sensório-motores (auditivos) para os esquemas cinestésicos, que podem ocorrer antes mesmo do reflexionamento. Isto se explica por não haver interiorização

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apresente uma certa dificuldade em se entregar ao ritmo. A aula acaba e eles se despedem.

do conceito. As crianças não entenderam que a regra era ouvir e fazer com os pés o movimento ouvido. A intervenção da professora realizando o gesto esperado serviu como modelo e foi imitado em seguida. Não houve abstração reflexionante no sentido clássico, pois a imitação não chegou a ser explicitada pela verbalização. Mas houve uma reflexão de nível sensório-motor para o nível representativo, já que a expressão corporal denota um reflexionamento. Para que haja a coordenação do espaço prático auditivo com o espaço prático cinestésico é necessária uma interiorização dos observáveis auditivos.

A imagem não é um derivado da percepção pura, mas o produto de uma acomodação imitativa, o que por si mesmo atesta a existência de uma atividade situada acima das percepções e movimentos mais abaixo do pensamento refletido: é essa atividade que nos parece prolongar a inteligência sensório-motora, anterior à linguagem, e que designaremos, após o aparecimento desta, por inteligência perceptiva ou, mais simplesmente, “atividade perceptiva”. (Piaget, 1975, p.98).

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Quadro 5. Aula de EPEM 12. 16/06/2009 Sujeitos presentes: LAU, MA, BEA, ISA, DIO, AGA, VINI, ISI, HEN, PED, JOPE Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno

Inferências sobre as representações musicais

Alunos copiam no caderno os 4 ritmos escritos no quadro. Os ritmos contém semínimas e colcheias. Um dos alunos pergunta o por quê do nome das notas. A professora promete trazer uma pesquisa sobre a história dos nomes das notas, mas conta que elas foram definidas através da letra de um texto em latim. Discorre sobre “o por quê” de as coisas precisarem ter um nome. “por que a janela se chama janela?”. Uma aluna diz: “mas isso não tem nada a ver com a música!”. A professora diz: “é verdade, mas tem a ver com o nome das coisas.”

Nomes dos signos musicais: figuras rítmicas – semínima e colcheias. Alturas: o nome das notas vem de um texto em latim. O nome das notas: a designação dos nomes das sete notas da escala diatônica nas línguas latinas derivam do hexacorde Guidoniano. Guido d’Arezzo desenvolveu por volta do ano 1028 um sistema de notação precisa de alturas valendo-se de linha e espaços, representando as alturas definidas por letras (claves) adotava as sílabas ut, ré, mi, fá. Sol, Lá para a leitura a primeira vista. A língua inglesa adota as letras de A a G.

Espaços visual e auditivo.

O porquê do nome das coisas: A resposta adiada da professora para o aluno se basearia em fatos históricos que determinaram a nomeação das notas. Para nós interessa saber a origem da pergunta. O que será que ele realmente queria saber? Teria alguma suposição? Como teria sido melhor aproveitada esta pergunta? Ao nomearmos um objeto estamos criando um significante para nos referirmos a ele. O nome Dó é o significante de um som com determinadas características acústicas, está situado numa série de sons determinada por relações assimétricas de altura (escala), pode ser o som referencia na aprendizagem de leitura das notas num instrumento, etc... Estaríamos diante de uma busca de causalidade do nome?

Professora e alunos sentados em roda no chão. A professora bate com palmas os ritmos que os

Pulsação, ritmo, métrica e andamento.

Espaço tátil-cinestésico, visual e auditivo.

Primeiramente os alunos observam e em seguida imitam. Nesta ação o tato é coordenado com o movimento

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alunos imitam em seguida. Ela faz ritmos com 4 pulsações e quando as crianças repetem, começam a adiantar o tempo (aumento de velocidade). Ela comenta que eles são “uns bichos muito apressados!” e imita a maneira que eles fizeram, acelerando o andamento exageradamente. Recomeça o jogo, batendo também com as mãos nas pernas, ou no chão; às vezes mantém a pulsação mais lenta, e os alunos tem que perceber as mudanças e imitar. Convida os alunos a se levantarem e lembrarem da aula passada.

dos braços, em função de imitar os sons e movimentos produzidos pela professora. O resultado da imitação é a vivencia de um conteúdo. Através desta vivencia eles podem realizar abstrações empíricas da ação sobre o objeto musical tais como sua pulsação, métrica e o andamento. Assim estão construindo esquemas de assimilação musical.

Vivencia corporal do ritmo com semínimas e colcheias dentro da métrica 1. Professora pergunta quem se lembrava da novidade da última aula. Alguns alunos se lembraram do ditado melódico, ou rítmico, mas a aluna LAU se lembrou do movimento do joelho “a gente fazia assim com a perna [levanta o joelho]”. “E falava uma...?” uma aluna lembrou do “e” [contratempo]. Muitos então

1e 2. Revisão do conceito de subdivisão da pulsação trabalhado na aula anterior, através do movimento do passo com o joelho sendo levantado na subdivisão, e com o acompanhamento da verbalização com números ligados pela conjunção “e”.

1. Espaço auditivo, visual e cinestésico.

1. A solicitação da memória no sentido estrito (um conceito trabalhado na aula anterior: colcheia e contratempo) fez a aluna LAU evocar o esquema sensório-motor trabalhado anteriormente. Isso foi feito para que eles compreendessem, através do movimento, o que se passaria na música quando lessem o signo das colcheias.

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repetiram o “e” e fizeram o movimento do joelho. 2. A professora propôs que eles se lembrassem fazendo. Começaram juntos a fazer o passo com o contratempo marcado pelo movimento do joelho. VINI estava fora da roda e levou mais tempo para sincronizar o passo com o dos colegas, mas depois de algumas repetições, se deu conta e acertou o passo por si mesmo. 3. A professora continuou fazendo o passo com os alunos e, ao mesmo tempo, deu nova instrução para a continuação do jogo: propôs que eles não falassem os números da contagem, mas só falassem o “e”. Eles começaram um pouco sem cuidado com a sincronia. Notei que era mais um exercício de aperfeiçoamento do movimento que cada um começava a fazer, e aos poucos iam se dando conta do tempo geral do grupo. VINI estava desencontrado do grupo, mas aos poucos entrou em sincronia.

3. Valorização da subdivisão e internalização dos tempos da métrica.

2. Espaço vocal, auditivo, visual e cinestésico. 3. Espaço vocal, auditivo, visual e cinestésico.

2. Ao retrabalhar o esquema sensório-motor procura-se articulá-lo com as relações de métrica, tempo e contratempo, apreendidas por meio de experiências anteriores e que integram-se ao novo conceito. Esta aquisição não é automática, e precisa de exercício motor e intelectual. 3. Com a verbalização do contratempo, a imagem auditiva do tempo tem o suporte do passo, mas a sua representação é necessária para que os alunos não invertam a dominância do tempo sobre o contratempo. Neste momento a professora deixa que os alunos procurem entrar em sincronia pela assimilação do movimento dela e dos colegas. Para isso, a coordenação da visão e audição são fundamentais. Temos aí um exemplo de abstração empírica, graças ao reflexionamento da ação do passo (tempos) para sua internalização.

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4. A professora então mostrou no quadro, uma dupla de colcheias ligadas e disse: “lembra que eu escrevi para vocês verem, quem era esta ‘mocinha’ aqui ‘dando a mão pra esta daqui’? ”

4. Reapresentação do signo que representa duas colcheias ligadas.

4. Espaço auditivo e visual.

4. A visualização do signo leva a uma recordação do conceito ligado à atividade motora que eles acabaram de realizar (memória no sentido estrito). É possível inferir que há uma integração entre a atividade perceptiva e a representativa.

1. O movimento do corpo que faz o ritmo. A professora propõe outra atividade: “Quero que vocês ouçam o que eu faço, mas quando forem repetir, não vão fazer exatamente o que eu fiz, mas vai ser como fizemos nas primeiras aulas, em que eu tocava no piano. Lembram que vocês tinham que fazer o ritmo com os pés? O pé inteligente? [ e se move com leveza sobre as pontas dos pés] .” A professora dá o exemplo batendo palmas e em seguida anda no mesmo ritmo que bateu. Pára, bate outro ritmo, e anda novamente no ritmo que bateu. Os alunos já começam a reagir, mesmo durante

1. Execução de passos obedecendo a ritmos com figuras simples: semínimas e colcheias.

1. Coordenação dos espaços auditivo e tátil-cinestésico: ouvindo o piano em posição estática e, em seguida, andando pela sala no ritmo ouvido.

1. Descontinuidade do ritmo na continuidade do tempo sendo imitado pelo andar. A qualidade do movimento é enfatizada pela professora no sentido de os alunos valorizarem mais a continuidade do ritmo em vez das unidades descontínuas que o compõe. Ela faz isto através das imagens simbólicas “pés inteligentes e leves como pluma” e do “ato de marchar dos militares”. Além disso, ela executa o gesto de duas maneiras: uma contínua e outra descontínua. Assim, polariza duas atitudes antagônicas que servem de modelos para os alunos imitarem ou rejeitarem. Partindo da polarização “ouvir parado e ouvir andando”, os alunos avançam para um nível de

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seu exemplo, e a professora pergunta: “nós estamos num quartel aqui? Ninguém está aprendendo a marchar” [e imita o jeito pesado de pisar] . “É pé inteligente e leve como uma pluma.” Diz ela. Em seguida a professora corrige a postura dos alunos: a maneira de pisar deve ser mais leve, o corpo sendo direcionado para frente como se fosse puxado pela barriga. Bate o primeiro ritmo, e os alunos fazem, mas ainda com muito peso em cada tempo. Ela diz: “Epa! O quartel voltou!” eles riem. Ela então bate o ritmo e em seguida anda levemente. Chama a atenção dos alunos para a continuidade do movimento dos pés. “vocês se lembram que eu falei que o pé não pode ficar paradão [e mostra o movimento com o pé se fixando a cada passo] porque o tempo não pára! Vai andando como se estivesse numa bicicleta: a perna não pára...vai andando...[ andando entre os alunos].

precisão superior: “ouvir parado e ouvir andando com continuidade”. Podemos inferir que, a partir da ação da professora para a imitação que os alunos realizam em seguida, houve uma abstração pseudo-empírica.

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2. Depois a professora bate ritmos com palmas (sempre 4 pulsações de cada vez) usando sempre semínimas e colcheias. Os alunos ouvem parados e em seguida andam pela sala realizando o ritmo com os passos.

2. Modelos rítmicos com semínimas e colcheias executados com palmas.

2. Coordenação dos espaços auditivo e tátil-cinestésico: ouvindo as palmas em posição estática e, em seguida, andando pela sala no ritmo ouvido.

2. Ao modificar os desenhos rítmicos a professora está solicitando uma diferenciação em relação a cada um dos modelos anteriores. Assim, os alunos são levados a conservar o esquema de pulsação e acomodar os esquemas de cada unidade de tempo (descontinuidades) que compõe o desenho rítmico através de novas diferenciações para semínimas e colcheias.

3. Em seguida a professora vai ao piano e toca pequenas melodias harmonizadas variando os ritmos a cada modelo proposto, mas mantendo as mesmas células rítmicas: só utiliza duplas de colcheias e semínimas. Cada compasso é tocado 2 vezes. Os alunos ouvem a primeira vez parados, e andam durante a segunda vez. A professora comenta que o exercício de hoje tem uma semelhança com o exercício do passo, pois é o movimento do corpo que faz o ritmo. Só que ao invés de ficarem no mesmo lugar [mostra o movimento para frente e

3. Os ritmos utilizados nas melodias tocadas ao piano podem ser representados por: três duplas de colcheias e uma semínima,

ou duas duplas de colcheias e duas semínimas, ou quatro semínimas.

3. Coordenação dos espaços auditivo e tátil-cinestésico.

3. O piano oferece informações simultâneas que são percebidas e tratadas pelas estruturas do sujeito. Os movimentos feitos em resposta ao que ouviram possibilitam ao sujeito uma abstração pseudo-empírica do ritmo da melodia. No momento em que a professora toca e os alunos ouvem parados, eles estão construindo uma imagem mental do ritmo. Deve acontecer uma acomodação dos esquemas motores a cada modelo para que eles possam executar os movimentos corretos depois. Podemos considerar como a resposta certa o aluno conseguir executar o ritmo corretamente. Mas

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para traz como o do passo], eles fazem passos pela sala [mostra como é o andar ritmado pela sala].

como ele chega a esta resposta certa? Será consciente dela? Nas aulas de instrumento, a resposta certa basta. A função da aula de EPEM é favorecer a reflexão para além da ação para saber se a criança construiu o conhecimento além de saber fazer. “É esta capacidade de restituição que denominamos figuratividade ou capacidade de reproduzir – neste sentido, evocar uma transformação anteriormente constatada não é executá-la: trata-se aí de imitação interior – os estados e as transformações por oposição à operatividade ou capacidade de produzi-los, quaisquer que sejam.” (Dolle, 2008b, p.87-88). Em seguida enquanto a professora repete o que tocou, os alunos “agem” sobre a imagem mental do ritmo ouvido. “Passar dos estados às transformações, como tais, comporta passar da constatação perceptiva ou evocativa à produção destas transformações e à atenção sobre o que elas comportam em si mesmas e sobre o que engendram.

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Mas isto supõe descentração em relação ao que é percebido, focalização sobre o que se passa, sobre as propriedades empregadas e suas conseqüências. Em uma espécie de sobrevôo que combina, de maneira extremamente móvel, retroações e antecipações. O que comporta domínio do tempo, do espaço e da causalidade, tornados reversíveis.” (Dolle, 2008b, p.88). Vemos um típico exemplo de atividade cognitiva onde há uma alternância de figuratividade e operatividade em sincronia e diacronia: durante a construção do esquema auditivo, a figuratividade domina e a operatividade fica em segundo plano. Logo em seguida, durante a expressão do esquema auditivo através do espaço tátil-cinestésico há ação guiada por uma operação direta sobre a imagem mental.

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1. A professora pede que os alunos olhem para as figuras presentes nos ritmos escritos no quadro negro, e com base na atividade que eles acabaram de fazer, pergunta: “com qual dessas figuras a gente dá o passo ‘rapidinho’?” E aponta uma semínima, eles dizem: “Não” até que ela aponta a dupla de colcheias e eles dizem “sim”. 2. Leitura dos ritmos do quadro: a. falando com números e “e”: Ela pede que eles digam como podem falar estes ritmos. Vai apontando cada figura de uma sequencia rítmica escrita no quadro e as crianças dizem se tem ‘e’ naquele pulso ou não.

Transcrição dos ritmos escritos em números para figuras convencionais. (representadas neste quadro por barras agrupadas: semínima=barra; duas colcheias=duas barras ligadas) 1. 1 2 3e 4 | 1e 2 3e 4 ||

2. 1e 2e 3 4 | 1e 2 3 4 ||

3. 1 2e 3 4e | 1 2 3e 4 ||

4. 1e 2 3e 4e | 1 2e 3e 4e ||

1. Espaço visual. 2. a. Espaço visual.

1. Ao olharem para as figuras escritas no quadro as crianças relacionam o conceito “Passo rapidinho” (símbolo usado pela professora) com a imagem do movimento feito pela professora e imitado anteriormente pelas crianças quando ouviram o ritmo. Esta coordenação entre esquemas mentais e imagens simbólicas apóia a memória de reconhecimento do signo ( figura que representa esta ação ritmica). Com a relação de “mais passos por tempo” indicados pelo maior número de figuras em cada pulsação. Cria-se assim um conceito de velocidade para a figura que, na verdade, não tem este conteúdo. A “imagem” sonora é de maior freqüência devido a um maior numero de ataques de sons curtos. 2. a. Nesta atividade solicita-se a memória de reconhecimento da figura (colcheia) que representa o símbolo (“e”) da ação analisada.

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b. Falando: Depois disso pede que eles falem uma seqüência de um compasso inteiro: 1, 2, 3e 4.

b. 1, 2, 3e 4||

b. Espaço visual e vocal.

b. A verbalização induz ao reflexionamento, pois as palavras se apóiam nas noções de ordem dos tempos e de suas durações, noções estas que só existem no pensamento do sujeito. Temos portanto uma abstração pseudo-empírica sobre a ordem (métrica) e sobre as durações dos sons no ritmo.

c. Andando: Em seguida pede que “façam o ritmo” [exemplifica ‘andando’ o ritmo pela sala]. O grupo a compreende e a segue.

c. 1, 2, 3e 4||

c. Espaço visual vocal, cinestésico e auditivo.

c. A velocidade do movimento do próprio corpo no espaço constitui o tempo psicológico. O sujeito concebe o tempo através desta experiência. Por isso, o exercício do deslocamento do corpo é fundamental e tanto para Dalcroze como para Ciavatta. Piaget diz que o tempo é a coordenaçào dos movimentos. “O tempo constitui uma coordenação de movimentos de diferentes velocidades: movimentos do objeto para o tempo físico, ou movimento do sujeito para o tempo

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d. A professora pede então que eles falem o outro ritmo escrito no quadro: 1e 2, 3e 4. [Alguns alunos andam ao mesmo tempo que falam]. Em seguida a professora pede que todos eles andem. e. A professora pára a atividade dos alunos e dá algumas instruções. Diz que os pulsos com sons mais longos devem ter passos mais demorados, mas o corpo não deve parar; que o corpo deve preparar o próximo passo, tanto no som curto quanto no som longo. Além de falar a professora dá o exemplo andando como deve ser e os alunos imitam.

d. 1e 2e 3 4 | 1e 2 3 4 ||

e. 1 2e 3 4e | 1 2 3e 4 ||

d. Espaço visual vocal, cinestésico e auditivo. e. Espaço visual, auditivo, cinestésico

psicológico” (Piaget, 1946/[s.d.], p. 293). d. depois da vivencia corporal, vem a verbalização, que induz a uma maior conscientização. Os números verbalizados ordenam a métrica e o tempo usado para a fala é uma nova ação depois da reflexão sobre o movimento. e. A professora apela para a transformação do corpo no espaço durante o movimento das crianças ao andarem “em colcheias”. Esta transformação se internaliza sob forma de imagem mental e, ao solicitar o reconhecimento de sua representação, a professora apela para uma forma de operatividade do pensamento da criança levando-as a rever as ações (reversibilidade) sempre apoiando-se nas imagens destas (figuratividade).

f. A professora chama um aluno de cada vez para executar um ritmo com a ponta dos dedos sobre a escrita e depois com o corpo. A aluna LAU tenta fazer mas não subdivide bem o tempo. [Assim, o ritmo perde a proporção e a

f. 1e 2e 3 4 | 1e 2 3 4 ||

f. Espaços visual, tátil, cinestésico e auditivo.

f. Para executar bem o ritmo, o aluno deve conservar a pulsação e compensar o tempo de cada subdivisão pela subdivisão seguinte. Esta compensação não é bem realizada pela aluna LAU. Ela ataca o tempo, mas não volta a atacar a

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pulsação.] A professora pede que ela ande no ritmo, falando. A aluna tem dúvidas, mantém a pulsação, mas não subdivide os primeiros tempos corretamente. Aos poucos vai ganhando confiança mas a proporção das figuras não é exata em sua execução. DIO é o segundo aluno a fazer o mesmo ritmo. Ele consegue bater o ritmo com as pontas dos dedos, sem dificuldade. g. A professora pede que todos os alunos batam o ritmo escrito com palmas sobre as pernas. Em seguida pede que JOPE o realize sozinho. Ele, que no início da aula não realizava nenhum ritmo com o andar, nos surpreende fazendo a leitura muito bem. Os alunos fazem todos juntos. A professora pede que os alunos façam movimentos mais longos quando executarem as semínimas e movimentos mais “rápidos” quando executarem as colcheias. h. Em seguida HEN realiza sozinho o terceiro ritmo. Ele começa sem manter a pulsação ou subdivisão dos tempos, como se

g. 1e 2e 3 4 | 1e 2 3 4 ||

h. 1 2e 3 4e| 1 2 3e 4 ||

g. Espaços visual, tátil, cinestésico e auditivo. h. Espaços visual, cinestésico e auditivo.

subdivisão do tempo antes da próxima pulsação e por isso erra. Já DIO conserva a pulsação compensando as subdivisões com novos ataques dentro da mesma pulsação. g. Depois de ouvirem as tentativas, erros e acertos de dois alunos da turma, o grupo todo é levado a executar o ritmo. Vemos que a audição recente da versão correta ajuda a turma a acertar as compensações rítmicas presentes nas subdivisões. Observa-se que a professora busca no gesto longo ou “rápido” promover a conscientização da criança a respeito da duração do tempo, tentando conscientizá-la das durações dos movimentos observáveis sobre o espaço do quadro negro. h. o equilíbrio temporal dos movimentos ainda não foi representado por HEN. Parece que ele tende a ler cada figura

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estivesse fazendo um esboço da seqüência de desenhos rítmicos que teria que ler. A professora pede que ele leia mentalmente uma vez e só depois execute o ritmo. Todos ficam em silencio acompanhando a leitura. Em seguida HEN executa o ritmo com a ponta dos dedos sobre a escrita, mas não mantém a pulsação. i. A professora explica para HEN que devemos pensar na próxima figura. Dá o exemplo andando no ritmo parando em cada figura e dando continuidade. Pede para todos os alunos fazerem o ritmo falando com os números (apesar de a escrita ser em semínimas e colcheias). Quando eles hesitam ela interrompe e pergunta: “Onde eu tenho as colcheias eu tenho o número e tenho a sílaba?... “E..” completa a turma. j. A turma toda é convidada a falar o ritmo com números e os “es”. A turma hesita e a professora percebe que eles ainda não entenderam a

i. 1 2e 3 4e | 1 2 3e 4 ||

j. 1 2e 3 4e | 1 2 3e 4 ||

i. Espaço visual e auditivo: os alunos acompanham as explicações olhando para os números escritos no quadro. j. Espaço visual (leitura); espaço vocal e auditivo (ouvindo a

separadamente (descontinuidades) sem relacioná-las com a continuidade do tempo métrico. Sua representação é figurativa e ele hesita entre a tarefa de realizar cada figura e a tarefa de manter a continuidade do movimento. i. Ao retornar à referencia do movimento com subdivisões do método O Passo, o tempo das durações é representado por movimentos simétricos, o que favorece a inclusão das descontinuidades do ritmo na continuidade das pulsações métricas. A hesitação dos alunos parece decorrente da equilibração dos esquemas de assimilação para representar as durações no tempo métrico. Cada duração é representada pelo movimento dos pés num espaço métrico, que repousa sobre a noção de deslocamento. j. e k. a professora busca relacionar as durações com a

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diferença entre semínimas e colcheias, e revisa o processo do método O Passo. Em seguida vai perguntando para os alunos sobre cada figura se tem ‘e’ ou não tem. Depois os alunos batem o ritmo sobre as pernas falando os números e também sem falar. k. Escreve um compasso de cada uma das figuras no quadro e vai indicando com a ajuda dos alunos onde tem só o número, e onde tem o número e o “e”. l. Em seguida explica que no ritmo que eles estavam executando há uma mistura de “tempos só de números” e de “tempos com números e ‘e’”. A professora se dirige para alguns alunos e diz que eles estão errando porque ao invés de olharem para a seqüência escrita no quadro, olham para a professora e erram. Pede que eles olhem para o quadro, e ela se senta e observa os alunos. A turma executa o ritmo uma vez falando os números e andando “no passo”, e outra vez só falando.

1e 2e 3e 4e | 1e 2e 3e 4e || k. 1 2 3 4 || e ||1e2e3e4e|| l. 1 2e 3 4e | 1 2 3e 4 || 1e 2e 3e 4e | 1e 2e 3e 4e ||

explicação e o exemplo da professora) k. Espaço visual e auditivo: os alunos acompanham as explicações olhando para os números escritos no quadro. l. Espaço visual: os alunos tentam imitar a ação ao invés de agir como reação ao signo da escrita (números). m. Espaço visual,

continuidade do tempo. l. Ao olhar para a professora a ação já ocorreu, e as reações acontecem com atraso. Quando os olhos seguem os números, há uma antecipação do pensamento que ajuda o sujeito a planejar a ação antes do tempo. m. e n. A leitura é feita a partir dos

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m. LEO faz um ritmo sem indicação de números usando a “mão inteligente” corretamente. A professora diz que foi bem, mas poderia ser mais “musical”. n. DIO, XXX e LAU fazem individualmente os ritmos da série e, em seguida, a turma toda repete os ritmos. Aos poucos, eles vão reagindo melhor e obedecendo a proporção das colcheias dentro da pulsação.

m. 1 2e 3 4e | 1 2 3e 4 ||

Tátil- cinestésico (com a ponta dos dedos sobre as notas) e auditivo.

signos da notação convencional. Nota-se que houve uma adaptação ao símbolo: no lugar dos números agora o sujeito reconhece nas figuras rítmicas (significante) a ação correspondente (significado) e, para ser eficaz, faz movimentos grandes ou pequenos para medir o tempo através do espaço usado no gesto.

Relacionando ritmos com melodias. Depois de a turma ter vivenciado os quatro ritmos com seminimas e colcheias escritos no quadro, a professora ordena os 4 ritmos e pede que os alunos identifiquem qual deles ela escolheu para tocar ao piano. Ela toca melodias, eles ouvem e procuram identificar as melodias ouvidas com os ritmos escritos no quadro 1. MAR logo responde: “Dois!” 2. Um Depois da resposta deste exemplo a professora pede que eles batam o ritmo enquanto ela toca. Eles fazem

Melodias criadas pela professora sobre os ritmos trabalhados: 1.

Ritmo dois:

2.

Ritmo um

Espaço auditivo e visual. Os alunos ouvem a professora tocando ao piano enquanto olham para os exemplos rítmicos escritos no quadro.

Os quatro ritmos são modelos. Eles variam, mas suas células são as mesmas. O objetivo da atividade é perceber a conservação da dupla de colcheias que muda de lugar nos ritmos. Se o sujeito puder identificar o lugar delas, significa que alcançou sua conservação. A métrica é invariante na transformação feita pelas variações de alturas dentro das melodias ouvidas. Graças à reversibilidade do pensamento operatório a criança reconstrói os ritmos a partir da escrita e relaciona cada um deles com o ritmo ouvido na melodia.

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isso olhando para o ritmo escolhido e confirmam a escolha. 3. Dois 4. Dois... não, é o três... Como a turma estava em dúvida, a professora perguntou: “quem pensa que é um? E dois?” Em seguida ela tocou de novo. Todos ficaram atentos à leitura e concluíram que era o “dois”. 5. Três 6. Um 7. Três 8. Um 9. Quatro!!!!

3.

Ritmo dois

4.

Ritmo três:

5.

Ritmo um:

Enquanto ouvem seus olhos passam por todos os ritmos e vão excluindo aqueles cujas primeiras células rítmicas são diferentes do ritmo da primeira pulsação da melodia. Quanto mais ela conseguir conservar a colcheia dentro da métrica, mais rapidamente poderá exercer esta diferenciação (células iguais e diferentes). Esta operação ocorre graças a abstração reflexionante, pois o sujeito tem que reconhecer o ritmo conservado (por imagem mental, ou pela representação da notação no quadro negro) e reconhecer no objeto ouvido o ordem na qual as colcheias são apresentadas no ritmo.

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6.

Ritmo três:

7.

Ritmo um:

8.

Ritmo um

9.

Ritmo quatro:

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b. Conservação dos ritmos e ordenação. A diferença deste exercício para o anterior é que enquanto naquele os exemplos podiam ser repetidos, ou apresentar transformações melódicas, neste, a professora toca um ritmo de cada vez, e ao ouvir, o aluno anota no caderno, ao lado do ritmo identificado com o som ouvido, a ordem em que foram tocados: “3ª.- 4ª.-1ª.-2ª.”

b. A ordem dos ritmos usados foi “3ª.- 4ª.-1ª.-2ª.”

b. Espaços auditivo e visual

b. Ao ouvir o modelo, a criança deve relacioná-lo com os ritmos escritos realizando uma operação de classificação: “conjuntos de ritmos iguais e diferentes do modelo ouvido”. Ao encontrar o ritmo igual, ela exclui aquele ritmo das possibilidades e espera o próximo ritmo para relacionar com os ritmos ouvidos. Ao ouvir a seqüência sem ouvir a opinião do grupo ou ter a confirmação deste, o sujeito revê, a cada ritmo ouvido, as opções que fez nos anteriores. Cria assim autonomia nas suas opções de ordenação, ainda que estas estejam representadas pela notação musical no caderno.

Intervalo Folha 1: das alturas: a. Os alunos, sentados em suas carteiras, apóiam os pés no chão com as costas retas, e cantam a escala pelo número dos graus acompanhados ao piano pela

a. Escala diatônica maior ascendente e descendente, com salto de oitava (ascendente e descendente) no final.

a. Espaço postural: os alunos estão sentados, mas a professora pede que eles se sentem com os pés apoiados

A ação da leitura se resume em antecipar a visão do canto. Enquanto os olhos lêem da direita para a esquerda, a voz se mantém realizando o que foi lido. As abstrações são reflexionantes:

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professora. No final, cantam a oitava da Tonica: 1 -1 -1. b.Os alunos cantam de 1 a 5 e repetem o 5. c. A professora corrige a postura deles, pede que se sentem corretamente com os pés no chão, costas retas. d. A professora pede que cantem o “5”. Os alunos permanecem sentados e cantam lendo a partitura numérica enquanto a professora toca ao piano as mesmas notas com acompanhamento harmônico.

A. 5432154345353543211. Correção da postura dos alunos: dois pés encostados no chão. Repetem a letra A e novamente a professora trabalha a postura dos alunos. Recomenda aos alunos que façam aula de prática vocal. Em seguida os alunos são convidados a cantar o próximo exercício: B. 56715432156715432111.

b. intervalo de 5ª ascendente. 5 5 1 c. não há. d. Solfejos com números dos graus da escala diatônica maior. A. 5432154345353543211

B. 56715432156715432111

porque desta maneira a emissão da voz é facilitada. b. Espaço vocal e auditivo. c. Espaço postural: noto que alguns alunos não conseguem apoiar os pés no chão e, ao mesmo tempo, manter as costas apoiadas na cadeira por causa do tamanho da cadeira. A postura dos alunos continua problemática durante todo o exercício. d. Espaço vocal e auditivo para afinação do 5º grau. Ao ler, o espaço visual segue da esquerda para a direita e o vocal canta os grau decodificados seguindo a

enquanto lê a partitura, o sujeito abstrai dos signos seu conteúdo, ou seja, a voz irá realizar o que o pensamento já imaginou antes. As imagens mentais vão sendo estabelecidas lentamente a cada exercício de solfejo. Na letra “a”, a escala é cantada em ordem ascendente e o som de cada grau é numerado. O 1º grau tem um realce pela repetição em oitava. Nas letras “b”, “c”, “d” é a vez de realçar o 5º grau já que a melodia a ser solfejada começa neste grau da escala. Este cuidado de repetir o 5º grau muitas vezes tem a função de criar uma referencia auditiva à qual os alunos podem ser levados a se lembrar. O mesmo ocorre com o intervalo melódico de 5ª justa.

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referencia auditiva que o piano dá.

a. Folha 2: Os alunos cantam ao mesmo tempo que fazem o passo.

A. 5*4*3*2*12321***5*1* (tem uma criança que desafina muito). A professora comenta que os alunos já conseguiram fazer isso mais afinado do que estão fazendo. Corrige a afinação pedindo que eles cantem o “1”. Alguns cantam o agudo e ela pede “o grave”. Ouvem-se vários sons que vão se afinando até chegar na altura certa. A professora pede que eles ouçam e toca o “1” no piano. Pede que eles repitam. Ouve-se então uma afinação mais homogênea entre as crianças. Eles cantam de 1 a 5 e em seguida cantam novamente a letra A. A professora faz a preparação tonal num tom mais agudo para que eles cantem a letra B. B. 1234565-654321654321

1234565-654321654321 Preparação: cantam 12345

a. Os números representam o grau da escala e o asterisco representa as pausas. A. 5*4*3*2*12321***5*1*

B.

a. Vocal e cinestésico: coordenação do canto com o ritmo através do uso do passo.

a. O desafio do exercício é a coordenação dos parâmetros de altura e de duração usando o movimento dos passos dentro da métrica quaternária. A coordenação dos esquemas cinestésicos do andar trazem a significação musical deste movimento para estes sujeitos, e visa facilitar a compreensão da relação espaço temporal para os sons da partitura. A ordenação dos passos fica como um estrutura subjacente ao canto. Nos momentos de pausa, o sujeito sabe exatamente o tempo que tem que esperar, porque o movimento delimita este tempo através do espaço que tem que percorrer. Além disso, vemos que o intervalo de 5ª tem um tempo de ser preparado (três pausas-passos). Nestes momentos o pensamento se ocupa em imaginar os graus de distancia entre o 1º e 5º graus enquanto os passos se encarregam de “contar” o tempo de pausa. Desta maneira, a atenção do sujeito

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B. Não fazem C. 5-4-3-2-1-565-432111

151-1155665544332211

C.

se alterna entre o canto e os passos a ponto de podermos representá-los através das lamniscates de Bernouilli: os estados em que o sujeito canta ou silencia implicam no tempo sentido pelo andar. Alturas Tempo métrico...

Tempo métrico Alturas

Jogo de cartões: Duas rodas: meninos e meninas Alunos sentados no chão. Dois grupos: meninas de um lado meninos de outro. A professora toca uma melodia e os alunos têm que montar a seqüência rítmica usando cartões de pausas, semínima e colcheias. A professora distribui cartões para os dois grupos. Os cartões contém figuras rítmicas. Regras explícitas: A. A professora pede que eles

Cartões: Pausas de semínima; Semínimas (| ); Colcheias( |_| ) Desenho melódico dentro de um pentacórde maior:

Os alunos batem o ritmo com palmas:

Espaço auditivo: Ao ouvirem o desenho melódico. Espaço visual: os alunos visualizam os cartões. Espaço tátil-cinestésico: Ao bater palmas, os alunos internalizam o ritmo e formam uma imagem tátil-cinestésica da ação que produz também

Este jogo parte da representação de células rítmicas que os alunos tem praticado em diversas atividades. 1. Ao ouvirem a melodia os sujeitos realizam uma abstração empírica da melodia. Seus esquemas auditivos são ativados e os alunos os adaptam à ordem em que aparecem na melodia tocada construindo assim uma imagem mental auditiva. 2. Ao ouvirem pela segunda vez, a memória de reconhecimento é reforçada confirmando a imagem construída ou corrigindo-a.

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ouçam o ritmo que ela vai tocar. B. Não podem colocar as mãos nos cartões, só depois que ela acabar de tocar. C. Então eles terão 10 segundos para colocar os cartões no lugar. Ação: 1.Ela toca: 2. Ela repete em seguida. 3. Ela toca mais uma vez e eles batem palmas junto com ela. 4. “Pronto e já!” É o sinal para os alunos montarem a escrita com os cartões. Os dois grupos se debruçam sobre os cartões e constroem seus ritmos baseados nas imagens auditivas que construíram durante a percepção da melodia. Quando todos terminaram, a professora olhou para as montagens que eles fizeram e disse: “Meninos, o que eu toquei foi assim, ouçam.” E repetiu o desenho melódico. Ao acompanharem a audição do ritmo lendo o que escreveram, os meninos se deram conta do erro que fizeram.

E escrevem com os cartões.

uma imagem auditiva da mesma.

3. Ao baterem o ritmo a abstração passa a ser pseudo-empírica, pois os alunos agem sobre o som que haviam percebido e externalizam o parâmetro das durações que haviam abstraído empiricamente. 4. Ao organizarem o ritmo com cartões os sujeitos refletem os conteúdos empíricos para o nível da representação e para isso operam sobre seus elementos fazendo relações entre as classes das smínimas, pausas e colcheias. Cada som ouvido é analisado, classificado e relacionado com os cartões disponíveis, que são então organizados na construção do desenho rítmico. Tal associação entre os cartões envolve a decomposição e classificação dos elementos da melodia e posterior recomposição do desenho com os cartões. Na primeira tentativa os alunos confundiram a ordem dos elementos. Ao ouvirem o ritmo pela segunda vez, compararam o real com a representação que fizeram, constataram o erro e corrigiram.

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As meninas acertaram. Ação: 1. Novo desenho melódico é tocado. Enquanto a professora toca, percebo os gestos dos meninos, seguindo o som com o movimento das mãos para apontar os cartões que pensam ser correspondentes aos sons que ouvem. 2. Ela repete: 3. Os alunos batem o ritmo. 4. Eles montam a escrita. 5. A professora observa o resultado e percebe que eles estão inseguros. Ela então pede que os dois grupos batam o ritmo que escreveram. 6. Os meninos vão batendo e vão se dando conta de que estão corretos. 7. A professora pede que as alunas vejam o que eles escreveram para que corrijam as colcheias que elas não escreveram no delas. 8. Depois da correção feita, a professora pede que todos os alunos devolvam os cartões onde estão escritas colcheias, depois pausas de semínimas e semínimas.

Espaço auditivo: audição da melodia tocada Espaço visual: os alunos visualizam os cartões. Espaço tátil-cinestésico: Ao bater palmas, os alunos internalizam o ritmo e formam uma imagem tátil-cinestésica da ação que produz também uma imagem auditiva da mesma.

O mesmo processo se repete, mas desta vez, as meninas erraram e não se deram conta. A professora pediu que elas vissem o ritmo montado pelos meninos. As meninas só compreenderam o erro que fizeram quando reconheceram as colcheias na escrita do grupo dos meninos. 8. Ao devolverem os cartões os alunos vão classificando as figuras ao agrupá-las em montes que entregam para a professora.

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Quadro 6. Aula de EPEM 12. 23/06/2009 Sujeitos presentes: AMA, LAU, MA, BEA, ISA, DIO, AGA, VINI, ISI, HEN.

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Folha d’O Passo: A professora explica a notação usada nos exercícios do passo. Duas alunas da turma anterior esperam pela correção do exercício, e a turma parece mais interessada na presença delas que na explicação da professora, mas mesmo assim, alguns fazem a atividade. 1. Os alunos executam os ritmos da folha da semana anterior usando o movimento do passo, agora com o “e” quando há a presença de colcheias no ritmo e falando os números e “e”. Ao lerem o primeiro exercício, os alunos são acompanhados pela professora, mas no momento da colcheia ela pára de falar, muitos ficam inseguros, e olham para ela. Ela recomenda que eles olhem para a folha e não para ela.

A notação convencional usada nesta atividade está representada aqui por traços para semínima e dois traços ligados para duas colcheias. 1.

2.

3.

4.

Espaço visual, tátil-cinestésico e auditivo:

A decodificação da notação se apóia na percepção da ação da professora, da sua voz e entonação. Quando estes elementos se ausentam, os alunos ficam inseguros.

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2. Ao perceber que os alunos tem dúvida, a professora explica a notação das durações das semínimas e colcheias, e sua leitura: esta leitura deve ser feita ao mesmo tempo que os alunos fazem os movimentos correspondentes, ou seja, passos com ou sem levantar os joelhos. A seguir é proposto um exercício escrito que consiste em colocar a numeração (verbalizada no exercício anterior) sob cada tempo dos compassos do exercício escritos na semana anterior.

1.

1 2 3e 4 | 1e 2 3e 4 || 2.

1e 2e 3 4 | 1e 2 3 4 || 3.

1 2e 3 4e | 1 2 3e 4 ||

Espaço visual. Ao substituir a fala pela escrita, o sujeito se apóia na imagem mental da verbalização, na percepção da escrita e no conceito de semínima e colcheias.

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4. 1e 2 3e 4e | 1 2e 3e 4e ||

Exercício do passo todos juntos, lendo a folha da aula anterior. A professora faz algumas vezes com eles, uma só com o passo e voz, depois ela bate o ritmo e os alunos mantém pés e voz. Depois ela deixa que a turma faça o segundo exercício sozinha, mas corrige a cada vacilo do grupo. Por exemplo, quando eles dizem “e” no tempo que só tem uma semínima, ela faz a turma parar e corrige. Depois pede que todos façam a seqüência de 4 exercícios com um compasso em branco entre eles. Depois disso pede que todos pratiquem o 4º exercício, que eles estão com dúvidas.

1.

1 2 3e 4 | 1e 2 3e 4 || 2.

1e 2e 3 4 | 1e 2 3 4 || 3.

1 2e 3 4e | 1 2 3e 4 ||

4. 1e 2 3e 4e | 1 2e 3e 4e ||

Espaços visual, auditivo, vocal, e tátil-cinestésico.

Os alunos verbalizam as durações pelo signo verbal estabelecido: o da ordem dos eventos sonoros dentro da sucessão temporal em cada compasso. Esta ordem de sucessão é reiterada a cada novo compasso. O problema colocado nesta atividade é o da significação da notação que representa uma sucessão de durações contíguas e sua imediata acomodação aos esquemas motores pelo sujeito. Ao fazer o exercício com os alunos, a professora oferece, além dos recursos visuais da partitura, a emissão dos ritmos lidos pela sua voz. Portanto, os alunos podem se centrar tanto na própria leitura e imaginação, quanto na audição e visualização da ação da professora.

1. Os alunos devem praticar individualmente, mas ao invés disso ficam conversando. Depois de advertidos pela professora,

Espaço visual. Ao lerem sem vocalizar os alunos tem que construir imagens sonoras daquilo que estão lendo. O problema colocado nesta situação é

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observo que eles lêem individualmente a folha. DIO mexe os lábios e, enquanto faz isso eu percebo que ele está verbalizando o ritmo com números. Depois de deixar os alunos praticarem sozinhos, a professora pede que alguns executem individualmente o exercício para a turma ver.

1e 2 3e 4e | 1 2e 3e 4e || a dificuldade de imaginar o tempo das durações, já que o pensamento representativo é muito mais rápido do que o da ação. DIO, por exemplo, mexe os lábios, simulando dentro do plano físico a ação que fará em voz alta.

LEO é o primeiro a fazer, mas suas pernas não coordenam bem a subdivisão em todas as pulsações. Quando a professora o corrige, ela diz que ele tem que levantar os joelhos no momento exato de falar o “e”. Faz o movimento do andar, para que ele veja como é, mas não fala o ritmo. Quando o aluno faz de novo, noto que ele não sabe a diferença do movimento das pernas para o tempo com semínima (sem subdivisão) e o com colcheias (com subdivisão). A professora diz que melhorou, mas que ele deve dar continuidade ao movimento do

1e 2 3e 4e | 1 2e 3e 4e ||

Espaços visual, vocal, cinestésico e auditivo.

LEO parece se centrar na representação da ordem numérica dos passos. No entanto, entre um passo e outro ele não regula bem as durações e por isso, às vezes atrasa o “e”. Ao fazer referencia com o”reloginho”, a professora sugere uma continuidade que lhe dê mais equilíbrio nos movimentos e, consequentemente, maior compreensão das durações entre um passo e outro.

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corpo como se fosse um “relóginho” (faz movimentos com as mãos pra frente e pra traz alternadamente para que ele visualize a continuidade deste). 3. ISA faz o exercício, falando bem baixinho, mas corretamente.

1e 2 3e 4e | 1 2e 3e 4e ||

Espaços visual, vocal, cinestésico e auditivo.

4. ISI também faz. Ela está engajada na atividade. A professora comenta que todos estão se esquecendo do “e” depois do 2º tempo. A professora não pede que ISI repita sozinha.

1e 2 3e 4e | 1 2e 3e 4e ||

Espaços visual, vocal, cinestésico e auditivo.

5. A professora chama todas as meninas para fazerem juntas.

1e 2 3e 4e | 1 2e 3e 4e ||

Espaços visual, vocal, cinestésico e auditivo.

6. Depois chama também todos os meninos. Depois de corrigir algumas vezes eles chegam a fazer muito bem.

1e 2 3e 4e | 1 2e 3e 4e ||

Espaços visual, vocal, cinestésico e auditivo.

Ao individualizar a atividade vemos que os sujeitos se engajam mais. Existe um prazer em compartilhar a experiência de executar e ser ouvido, depois ouvir o outro a executar. Através das repetições desta mudança de posição, as representações vão se deslocando pelos espaços práticos de cada um, hora ouvindo, hora falando, sempre se movimentando.

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7. A professora então pede que todos batam o ritmo com palmas enquanto fazem o passo e falam os números. Quando todos fazem juntos, depois de tantas repetições, me parece que o interesse na atividade já se desgastou e a atenção dos alunos diminui muito. A professora fala sobre a importância de estudar em casa, dá o exemplo do “andar de bicicleta”, atividade que se praticamos bastante, aprendemos mais rapidamente do que se não praticamos.

1e 2 3e 4e | 1 2e 3e 4e ||

Espaços visual, vocal, tátil, cinestésico e auditivo.

A função da voz é de ler as figuras e dos pés a de manter a pulsação, joelhos a subdivisão. Com a introdução das palmas nesta versão do exercício, vemos que a coordenação de mais uma ação pode desequilibrar um sistema motor. Alguns alunos se confundem, e batem palmas no ritmo simétrico das pulsações feitas pelos pés. É necessário mais dissociação das representações de cada voz para coordenar estes movimentos.

Folhas de leitura melódica 1 e 2. 1. Escala de 5 sons.: “vamos cantar a escalinha até o 5?” Os alunos cantam enquanto a professora acompanha harmonizando ao piano e propõe que cantem a escalinha até o 5: 1,2,3,4,5,4,3,2,1. Diz que alguém fez uma coisa que ela gostou: 1,2,3,4,5,4,3,2,1,5,1. Propõe que todos contem assim.

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A professora chama a atenção de AMA e BEA para que se sentem na ponta da cadeira e apóiem os pés no chão. A professora pede que eles comecem do “5”. Pergunta para a turma: “quem se lembra como se canta o “5”? Alguns cantam, mas cada um pega um tom diferente. A professora toca o “5” para dar a afinação do piano, e canta com eles. Alguns afinam, mas outros continuam desafinando, especialmente no “4”. A professora fala num tom bem desanimado: “5-4, é falado...” e docemente: “Eu quero cantadinho!” A partir da nota dada, eles continuam a leitura com apoio do piano.

Partitura não convencional. Números são escritos em planos horizontal para a sucessão dos sons e vertical para as alturas. O primeiro exercício trabalha os 5 primeiros sons da escala, criando uma polarização entre 5º e 1º grau.

Espaços postural e vocal: ao solfejar os alunos precisam liberar o espaço toráxico para um melhor controle do ar para cantar, por isso a professora enfatiza este aspecto. Ao mesmo tempo, o espaço visual se mantém ligado à partitura.

A afinação das alturas pela voz supõe uma representação auditiva do som. Ao tocar ao piano e cantar junto com os alunos, a professora está oferecendo a oportunidade de os alunos perceberem o som para imitá-lo. No entanto às vezes isso só não é o suficiente para que eles reproduzam o som na altura correta. A polarização “voz falada e voz cantada” é enfatizada pela professora pelo tom desanimado ou entusiasmado com que pede que eles cantem ao invés de falar. A memória auditiva do som é a experiência necessária para que o sujeito possa construir os esquemas auditivos e depois os esquemas vocais. Há uma dialética do ouvir-cantar que começa por uma necessária diacronia para chegar a uma posterior sincronia. Ou seja, tudo leva a crer que os esquemas auditivos são anteriores aos esquemas vocais.

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Letra B da folha1: A professora pergunta para a turma: “O que acontece na letra B?” Eles olham para a partitura e respondem: “Começa no 5, mas ao invés de descer, sobe.” A professora dá o tom para os alunos ao piano, mas espera ouvi-los cantando e, em seguida, reforça o som com o seu próprio canto e o do piano. Enquanto as crianças cantam, às vezes representam o movimento do som por gestos. VIN, por exemplo, ao cantar uma oitava descendente abaixa a cabeça. BEA brinca com a voz nos ataques do som. A professora chama a atenção dos alunos que brincam “fora de hora”. Ela solicita que, mesmo que eles já saibam o exercício décor, que eles “olhem para o papel, e façam direitinho e não fiquem ouvindo o colega e repetindo, pois isso é trabalho de

O segundo exercício trabalha os sete sons da escala diatônica, enfatizando a polarização entre 5º e 1º grau.

O espaço visual é o primeiro a ser utilizado quando os alunos analisam a partitura e descrevem o desenho melódico. Alguns gestos dos alunos evidenciam uma representação cinestésica da partitura que estão lendo, como o movimento que VINI faz com a cabeça para cima e bara baixo no salto de 8ª.

Solfejo: Ao perguntar sobre o desenho melódico, a professora espera que os alunos façam um plano de ação que implica em operações mentais de antecipação das transformações na emissão vocal ao lerem as alturas da melodia. Memória auditiva: Ao esperar o resultado vocal das crianças a professora testa se os alunos já representam os esquemas auditivos das alturas e se conseguem expressar as alturas que imaginam através de esquemas vocais. A professora deixa transparecer em seu cmentários, que seu objetivo é favorecer uma técnica vocal que permita aos alunos uma boa emissão vocal e, consequentemente, uma boa afinação. No entanto, a ação por gestos pode estar favorecendo a criação de representações cinestésicas para o movimento sonoro diretamente ligado ao eixo vertical da partitura.

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papagaio”. Se eles não olharem para a partitura podem errar como no caso de alguém da turma que cantou “5-6” com o som do 5º e 4º graus (e canta imitando a pessoa). Folha 2 leitura melódica A professora pede que os alunos cantem os desenhos melódicos e, ao mesmo tempo, façam os passos. Os alunos cantam em pé lendo a partitura, mas alguns não coordenam os passos. Às vezes esquecem de fazê-los, como é o caso de BEA que, no final da letra B, faz gestos com o corpo que expressam sua musicalidade. Mesmo assim, a falta é alertada com bom humor pela professora que lhe pede para fazer, além do “ballet”, os passos que eles aprenderam. Na letra D, a professora divide a turma e pede que as meninas façam sozinhas e os meninos observem. Depois chama os meninos para cantarem e em seguida todos juntos.

A folha 2 apresenta desenhos melódicos escritos em notação não convencional. Nela os números representam semínimas e são alternados com pausas de semínimas. Localizados na pauta de três linhas e dois espaços, os signos são distribuídos em compassos quaternários. Letra A: Desenho como os cinco graus do pentacorde maior.

Letra B: Desenho como os seis graus da escala diatônica maior. Apresenta pontos de repetição.

Letra D: Desenho como os seis graus da escala diatônica maior e pausas de semínima.

Espaço visual, ao ler a partitura, auditivo, no reconhecimento da afinação, vocal, ao cantar e cinestésico ao fazer o passo, ou os gestos expressivos que alguns alunos fizeram espontaneamente.

Para a leitura na pauta gradativa, os alunos cantam sons de uma escala tonal e, assim, vão criando referencias auditivas através da memória figurativa das relações de proximidade existentes entre os graus da escala. Ao gravar uma relação melódica com os números dos graus os esquemas vão sendo construídos junto com esta informação conceitual. Como todos os exercícios foram cantados na mesma tonalidade, é possível que os alunos memorizem estes sons, embora este não seja o foco da atividade.

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Antes de cantar a letra E, a professora pede que eles cantem o salto. Pergunta: como é o salto? Cada um canta um intervalo diferente, alguns cantam a 8ª. A professora corrige dizendo que aquele é o 1-1 (cantando e tocando). Toca então o 5º grau no piano e canta ao mesmo tempo fazendo uma introdução ao tom.

Letra E: Desenho com saltos de 5a justa, sons repetidos e pausa, envolvendo seis graus da escala diatônica maior.

Atividade – Vizinhos das Notas: A professora descreve a escrita das alturas do solfejo nas linhas e espaços. Escreve notas no quadro negro. Para que os alunos compreendam melhor o significado de “sons vizinhos” ela dá o exemplo dos prédios de apartamentos e das casas. Em seguida diz que na música os vizinhos são só os sons que “moram” bem ao lado um do outro. Usa como exemplo os próprios alunos: pede que um aluno imagine que é o “Dó” e pergunta: “Quais são os seus

Sons vizinhos escritos na pauta: Dó Ré Mi Fá Sol Lá Si Ré Mi Fá Mi Fá Sol Fá Sol Lá Sol Lá Si Lá Si Dó

Espaço visual. Ao adotar metáforas, a professora envolve rapidamente a turma num discurso simbólico. Eles compreendem o que são sons vizinhos e são capazes de responder corretamente aos problemas, pois estão conversando metaforicamente sobre o conceito de sons vizinhos. No entanto, eles estão lidando com representações dos sons e não com sons já que os nomes dos sons não são os sons. Embora seja importante o exercício sobre a série dos nomes dos sons, a atividade peca por não propiciar abstrações empíricas sobre o conceito tratado. As crianças não cantaram os sons

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vizinhos?” O aluno então responde: “o Si e o Ré.” Pergunta para toda a classe: “Quais são os vizinhos do Ré?” eles respondem: “Dó e Mi”. Qual é o vizinho que vem antes do Ré?” Eles dizem: “Dó”. E depois do Ré?” Eles dizem: “Mi”. A professora envolve toda a turma determinando um nome de nota para cada aluno e perguntando quais seriam seus vizinhos.

vizinhos, nem ouviram a professora tocar as alturas. Portanto, estão falando de formas sem conteúdo.

A professora desenha degraus no quadro e escreve: MI, degrau de cima FA e degrau de abaixo MI. Em baixo de cada desenho, escreve na pauta uma nota de linha outra de espaço e de novo na mesma linha. Os alunos levam uma folha de exercícios para fazer em casa (folha 3).

Espaço visual ao ver o desenho dos degraus com os nomes dos sons da escala e correspondencia deste com o desenho das linhas e espaços da pauta.

Embora toda a explicação seja feita com base na vizualização de uma representaçàoa da ordem dos sons na forma escalar, os alunos não realizam abstrações sobre o objeto musical. Eles são levados a imaginar a lógica da organização da escala sem cantar nem ouvir seus sons. Os sujeitos “substituem” as partes do objeto numa forma de representação da infralógica da escala. Eles fazem uma analogia da organização espacial deles próprios na sala com organização infralógica da escala. Há uma

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aproximação lógica, sem abstração empírica. No entanto, a representação da escala diatônica como objeto onde suas partes seriam analisadas sob o ponto de vista infralógico, precisariam passar por experimentação sonora destas partes. Se fosse realizado desta maneira, os sons , e não apenas os seus nomes seriam abordados do ponto de vista lógico matemático pelas relações assimétricas que se estabelecem entre uns e outros (o mais grave, o mais grave ainda). Assim, os sujeitos poderiam compreender as relações entre as alturas como séries assimétricas através da lógica do pensamento operatório.

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ANEXO 3

ANÁLISE DAS AULAS DE VIOLÃO

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QUADRO 1 : Aula de VIOLÃO - 26/05/09 Horário: terça feira as 8hs. ISI (8 anos). Começou o estudo do violão em fevereiro de 2009. EPEM 12

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Para manter-se na posição para tocar violão, ISI está sentada, seu pé esquerdo apoiado num banquinho, o violão colocado sobre a perna esquerda de modo que o braço do violão fica em diagonal com relação ao tórax de ISI. Dessa forma a ação das mãos de ISI se aproximam do centro do tórax. 1. Exercício de aquecimento: tocar com a MD, polegar na 6ª. corda, e ir “caminhando” [a alternância de dedos faz analogia à alternância de pés no movimento de andar] com os dedos indicador (I) e médio (M) pelas 4 primeiras cordas. ISI repete cada corda 4 vezes usando I e M alternadamente sempre na pulsação. A aluna está com as duas mãos posicionadas e o professor pede que ela use só a MD. Ela começa pela mais aguda e vai descendo até a mais grave. Quando iria tocar a 5a corda diz: “ah, aqui não vale…” e começa a linha ascendente. 2. Agora coloca os 3 dedos nas primeiras cordas e o polegar toca 4 vezes em cada corda. “O dedo faz...” – diz o prof mostrando o movimento bem grande do polegar. A aluna corrige o próprio movimento.

Pulsação e métrica. Sons repetidos com as alturas de todas as cordas soltas do violão: 1ª. Mi, 2ª. La, 3ª. Ré, 4ª. Sol, 5ª. Si, 6ª. Mi Arpejo do acorde perfeito menor com cada som repetido 4 vezes.

Tátil: no movimento descendente, ISI usa o polegar direito apoiado na 6ª. corda, e os dedos indicador (I) e médio (M) tocam alternadamente em cada corda fazendo-as vibrar, e vai mudando de corda para trocar as alturas. Já no movimento ascendente, a mão direita mantém-se em concha, e quem tange as cordas é o polegar. Auditivo: a coordenação do tato com o ouvido é evidenciado quando ISI não olha para a própria mão e conserva o movimento numa ordenação métrica e rítmica.

A aluna está exercitando esquemas motores na ação dos dedos para que façam o movimento preciso de dedilhar a corda desejada. Abstração empírica: ao exercitar esquemas motores de tanger as cordas, numa ação dos dedos para que façam o movimento preciso de dedilhar a corda desejada, ISI sente a tensão das cordas, a distância de uma corda para a outra e ouve o resultado de sua ação (sons indo para o grave ou para o agudo). Ao repetir esta ação por quatro pulsações, sente

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(Técnica): o professor chama a atençao de ISI para manter a mão em concha: a forma correta da mão dará à aluna mais flexibilidade e portanto mais agilidade quando precisar utilizar outras sequências de sons possíveis dentro do sistema tonal. Região das Cordas sobre a boca do violão. Espaço – tempo – causalidade sobre o espaço topográfico do instrumento: As cordas vibram e são amplificadas porque a criança toca no lugar correto. Há mudança de altura, porque ela toca diferentes cordas. Existe uma regularidade rítmica pois ela respeita esta regularidade, tocando exatamente no tempo certo. O professor não faz comentário sobre o conteúdo musical, só sobre a técnica.

também a métrica que resulta da reiteração do toque, numa freqüência constante, mediante a alternância dos dedos I e M sobre a corda.

Agora o polegar na 5ª. corda e os dedos “I-M-A” [ indicador, médio e anular]. Depois que a aluna realiza o exercício, o professor a convida a tocar acordes assim em “arpejo”. A aluna olha como quem não entendeu.

Estrutura do arpejo é testada como exercício motor. A proposta de tocar acordes em arpejos aparece como um conflito cognitivo. “O que é isso?”

Espaço tátil-cinestésico: no exercício motor, a independência dos dedos é testada com cada dedo em uma corda diferente.

Abstração empírica ao coordenar o uso independente dos dedos, segundo a lógica espacial do instrumento: polegar toca as cordas mais próximas dele e os outros dedos as cordas da outra extremidade.

1. O professor explica ao mesmo tempo que toca um arpejo com sua mão direita no violão:

1.Professor demonstra como os acordes - lidos em cifras

Espaço visual: a aluna observa a ação do

Representação visual por abstração empírica:

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“isso é um arpejo, quando você faz assim [toca usando cada um dos dedos em corda diferentes sucessivamente] você está arpejando em cima de um acorde. Vamos fazer com este acorde: do maior.” 2. A aluna olha para o caderno depois olha para o braço do violão e posiciona sua ME. [O professor arruma o violão para que sua curva de baixo fique sobre a perna esquerda de ISI. A aluna reage reposicionando a perna esquerda ao mesmo tempo que olha atentamente para os dedos da ME]. O professor pergunta sobre o polegar esquerdo se está bem posicionado. ISI então toca P-I-M-A num movimento ascendente-descendente usando a MD para controlar os ataques e a ME para regular as alturas das notas. 3. A cada mudança de acorde a aluna faz uma pausa para arrumar os dedos da ME olhando para esta mão. “Todos os dedos descem uma corda. Este é o acorde de Re menor” diz o professor. “Re menor, essa é a ISI”. ISI ri. “Vai: PIMA” diz o prof. ISI posiciona o polegar e pergunta: “mas agora é nesse?”. “Isso mesmo! é na outra corda” responde o professor.

(sons escritos na posição vertical na partitura) - podem ser tocados em arpejos (sons sucessivos). 2. Arpejos tocados pela aluna com base no modelo proposto pelo professor.

professor e vai assimilando o modo como usará suas mãos através de imagens. Em seguida irá imitar esta ação.

a aluna observa a ação do professor e em seguida imita esta ação para adquirir pela experiência, os esquemas motores para realizar acordes arpejados.

Professor pergunta: “Quais são as cordas do violão?” ISI responde recitando décor da mais aguda à mais grave: “Mi, Si, Sol, Ré, Lá, Mi!”

Nomeação e identificação das cordas soltas do violão, segundo a sua ordenação.

Espaço visual e representativo (imagem das cordas é de certa forma descrita).

Representação imagética do instrumento através da descrição verbal da

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O professor pede que ela diga o nome das cordas perguntando a ela aleatoriamente: Entao, 1ª corda? –Mi, e a 6ª? – Ela para e pergunta: “6a?” Ela pensa e responde “– Mi”. Ele continua: “E a 2a?” Ela olha para as cordas do violão e diz: “-Si”; e a 3ª? “-Sol.” E a 5ª?” “– Lá”. “E a 4ª?” “- Ré.” Ele elogia: “Muito bom!”

ordenação das cordas soltas.

O professor convida ISI a aprender a tocar a Escala de Do, pois assim, sabendo as notas [onde tocá-las no violão], ela poderá tocar várias melodias. O professor e aluna, cada um com seu violão, olham para a partitura. Nela estão escritas as notas com o número dos dedos. O professor aponta para o livro e explica que os dedos estão representados por bolinhas (1,2,3 e 4). DÓ - “Começando pelo Dó com dedo 3 na corda 5 casa 3”. Neste momento ISI havia colocado o dedo 2 na corda 5 mas na casa 2. O professor pede que ISI olhe para a mão dele, e mantendo sua posição correta, vai orientando a mudança que ISI tem que fazer com a mão esquerda: “mais uma casa pra cá, agora o dedo 3.” ISI corrige olhando para a própria mão e comparando com a mão do professor.

Escala do Dó Maior tocada na primeira posição do violão. Descrição detalhada do aspecto motor para a ação de tocar a escala.

Espaço tátil: Mào direita produz a vibração nas cordas do instrumento Soltas ou reguladas no comprimento pela mão esquerda. Espaço auditivo: ISI reage a cada som que ouve cantando, fazendo comentários... Espaço visual: Para acertar a posição das mãos sobre o instrumento ISI olha para as elas. É como se os olhos colocassem a mão no lugar certo. Espaço vocal: O cantar é usado como forma de linguagem pois a nomeação das notas conduz a uma conceitualização de toda

Para conceber o espaço onde uma nota é realizada no instrumento, o sujeto utiliza o aspecto infralógico do pensamento. Todos os elementos da motricidade envolvidos para a concretização do som [objeto] estão em jogo no pensamento de ISI. A coordenação de todos os espaços práticos utilizados por ISI para realizar a Escala exige uma representação da totalidade do objeto que está sendo construído: a escala de Dó maior. Podemos supor que esta

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a ação pela criança.

totalidade é envolvida por um conceito que a criança denomina pelo nome da escala e que é composta por todas as sete notas (e ainda a oitava da tônica, que é tocada em outra posição).

Em seguida, a instrução sobre a ação da mão direita: “O polegar fica parado [na 6ª corda] e vai tocando I e M [ na 5ª corda] quatro vezes. Só no Dó.” O professor toca e canta e pede que ISI cante o nome da nota: “Dó, Dó, Dó, Dó:||” ISI toca a nota Ré sem o professor pedir. “Ré, Ré, Ré, Ré||”[ esta nota é tocada na 4ª corda solta, portanto, é controlada pela mão direita somente]. O professor pede que ela retorne para o Dó. “Dó, Dó, Dó, Dó|| Ré, Ré, Ré, Ré||” O professor elogia e continua a instrução: “Agora o Mi é com dedo 2 na 2ª casa.” ISI procura a posição e o professor a ajuda colocando a ponta do dedo 2 na 4ª corda. ISI olha para a própria mão esquerda para realizar a ação e segue o olhar para a mão direita – coloca o polegar na 4ª corda e é corrigida pelo professor: “É com I e M”. Ela corrige e toca cantando ao mesmo tempo: “Mi, Mi, Mi, Mi||” Ao ouvir o som ela se surpreende: “Caraca! Sai

Exercício para mão direita em escala de Dó Maior.

Espaço vocal: canto. Espaço Tátil: coordenação dos dedos da mão direita na função de ataque do som e conservação da pulsação. Espaço auditivo: Controle do ajuste da afinação, e da pulsação Espaço visual:

A Imitação das posições que o professor faz enquanto toca junto com a aluna é importante para a construção da imagem mental do esquema motor em construção. Através destas ações ISI está realizando abstrações empíricas do ritmo, da altura e das posições da mão com as quais ISI realiza os sons da escala de Dó Maior. A representação desta escala está sendo preparada pela nomeação dos esquemas motores que

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um som estranho!” O professor pede: “Volta para o Ré – na corda solta” ISI se atrapalha e o professor lembra: “4ª corda!” E finalmente “Dó, Dó, Dó, Dó||”. Eles recomeçam a escala e atingem agora o Fá, que o professor mostra tocando e dizendo: “o Fá com dedo 3, aqui” [ mostra para ISI como coloca o dedo 3 na mesma corda mas ao lado da posição do Mi] – “O Mi está aqui e o Fá aqui”. Ao tocarem a escala descendente o professor vai verbalizando a ação que ISI tem que fazer cantando no tom com o nome das notas que estão executando.

estão sendo cantados ao mesmo tempo que tocados. O nome das notas são signos que se fixam ao esquema motor com a altura cantada. Todos estes elementos são partes de uma totalidade que é o esquema de cada altura.

O professor elogia ISI e, enquanto ela descansa, ele mostra os signos na partitura e explica seus significados: “os números escritos junto com as notas indicam o dedo”. DÓ - com dedo 3, corda 5, casa 3. RÉ - o ‘zero’ que significa que é corda 4 solta. MI - com dedo 2. FÁ - com dedo 3. O professor programa o que farão em : SOL - 3ª corda solta. LÁ - com dedo 2. SI - 2ª corda solta. DÓ - com dedo 1. ISI pergunta: “Nessa corda ‘Zero’ aqui, como é que é mesmo?” O professor não responde, pois está prestes a tocar uma música que quer ensinar para ISI.

A representação simbólica usada na grafia da escala de Dó maior para ser tocada no violão é feita através de notas escritas da pauta, acompanhadas de números que indicam os dedos a serem usados pela mão esquerda nas cordas.

Espaço visual e auditivo: ISI ouve a explicação do professor e acompanha com os olhos a grafia no pentagrama que ele lhe mostra.

Para consolidar os esquemas motores, vemos que os aspectos figurativos da ação são organizados e explicados com cuidado pelo professor. Os signos convencionais (notas musicais) estão sendo apresentados assim como a linguagem é transmitida socialmente para a criança simbólica. Há uma seriação das notas, mas cada nota é imaginada

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através de seu signo (nota na pauta) e seu símbolo (imagem da posição com que é tocada). Podemos analisar esta narração do professor como sendo do aspecto infralógico do objeto “Escala de Dó” no violão , ou seja, há um desenho virtual a ser percorrido pela mão numa localização especifica para produzir os sons. Solicita-se assim a memorização de cada nota ligando todos estes dados à representação da nota no pentagrama.

O professor toca e canta a melodia “do re mi fa fa fa (etc.)”. ISI sorri.

Melodia “ Havia uma pastorzinho” do folclore brasileiro. A letra do refrão da melodia é a narração das notas que a compõe. Construída sobre as cinco primeiras notas da escala do Dó maior, a última nota de cada frase é repetida no final.

Espaço auditivo: ISI ouve e parece reconhecer a melodia [demonstra isso sorrindo]. Espaço visual: ao observar o professor tocando, ISI é levada e notar que as notas que usará na melodia são as

Ao oferecer uma melodia tradicional da cultura da aluna, o professor está solicitando sua memória auditiva (no sentido estrito). Isso facilitará o processo de aquisição dos esquemas

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“Do Ré Mi Fa Fa Fa (etc.)” notas que acabou de aprender a tocar.

motores, pois a estrutura melódica, já assimilada anteriormente pela aluna, é um esquema auditivo ao qual ela irá buscar acomodar os esquemas motores (cada uma das posições/ notas) ainda em desenvolvimento.

O Professor pergunta: Vamos aprender a escala toda? 1. a escala ascendente 2. escala ascendente e descendente.

Movimento ascendente e descendente dos sons da escala de Dó Maior. O objeto é revisto agora em movimento direto e invertido.

Espaço tátil, auditivo, cinestésico coordenados através da passagem de uma posição à outra com a mão sobre o braço do violão e da mudança de cordas no toque da mão direita.

A passagem do descontinuo ao contínuo: ao passar de uma descontinuidade à outra (notas da escala), a sequência das notas se torna um objeto contínuo.

Melodia 1ª. frase. 1.O professor toca a primeira frase e explica que IM (indicador e médio) “vão andando”. ISI olha atentamente para a mão direita do professor. 2. ISI se propõe a repetir o que o professor fez, mas como só havia observado o movimento de IM da sua mão direita, começou a repetir somente o Dó. Para fazer o Ré, o professor precisou lembrá-la: “Ré- corda de baixo”. Depois deste alerta, ISI passou a olhar só para a mão esquerda.

Do, Ré, Mi, Fá, Fá, Fá.

1.Visual e Auditivo (na observação da ação do professor): a mão direita dedilha as cordas sobre a boca do violão e a esquerda regula os comprimentos das cordas sobre o braço do violão. A coordenação das funções das duas mãos: M.D. – o ataque do início

No que concerne ao espaço, a conduta de IRI sugere uma decalagem desta noção com relação ao espaço do violão para realizar as atividades propostas. Assim retoma a condutas espaciais que lembram aquelas do período sensório motor.

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das notas (produção da vibração da corda) e escolha das cordas (alturas) , dão às mãos funções mistas que só se realizam durante as coordenações. 2. Visual e Tátil e Auditivo: Movimento de alternância dos dedos I e M da mão direita, nas cordas referentes às notas reguladas pela ME: DÓ - com dedo 3, corda 5, casa 3. RÉ - o ‘zero’ que significa que é corda 4 solta. MI - com dedo 2 na corda 4. FÁ - com dedo 3 na corda 4.

Os espaços parecem separados e vão passando a se coordenar até finalmente serem internalizados. 1. Da totalidade de esquemas utilizados pelo professor, ISI está centrada naquele verbalizado por ele: Mão direita com I e M alternados. 2. Num processo de imitação, ISI olha para sua mão esquerda e seu olhar parece ‘colocar’ sua mão no lugar idêntico ao da imagem da mão do professor. O mesmo acontece quando tem que mudar de corda com a mão direita. Ela olha e procura o lugar onde deve beliscar a corda.

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1. Enquanto descansa a mão de tocar, a aluna ouve a explicação do professor sobre o pentagrama (5 linhas e 4 espaços). ISI diz que já sabe aquilo, pois está aprendendo na aula de EPEM. O professor desenha a clave de sol no pentagrama do caderno e pede que ISI copie em casa. 2. O professor pede que ISI fale o nome das notas de uma partitura. Pela velocidade em que a ação foi realizada, a aluna não consegue responder às solicitações do professor e ele antecipa a resposta. ISI repete a resposta em seguida.

1. Clave de Sol - Representação gráfica de um sinal de referencia na pauta para a futura localização das notas. 2. Identificação das notas na pauta pelo nome, sem cantar.

Espaço tátil e visual: ao escrever no pentagrama ISI será levada a estabelecer relações do seu traço com as linhas da pauta através do tato e da visão. 2. Espaço visual e linguagem.

Na etapa de observação, a apresentação do signo “clave de sol” não foi vinculado com sua significação. Como ISI já aprendeu este conceito em outra aula, talvez ela realize a tarefa sem demonstrar dificuldades utilizando os significados que sua memória dá aos signos musicais. 2. Na tarefa de nomear as notas a aluna deve fazer relações do espaço simbólico da seriação das alturas, e

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reconstituir os esquemas mnêmicos convencionados para sua nomeação. Como esta memória ainda não se firmou, a aluna não consegue, mas não se sente à vontade para perguntar e “finge” que lê.

3. O professor vai mostrando as partituras de dever de casa, nas quais ISI deverá ler dizendo os nomes das notas. De repente ISI pergunta: “Porque que o Mi é essas bolinhas [sic]?” O professor não entende a pergunta e pergunta pra ela: “porque ele fica embaixo? [ISI não responde]. É porque ele é mais grave. Quanto mais grave o som, mais em baixo no pentagrama, quanto mais agudo mais para cima, como uma escadinha!” [o professor canta as notas da escala de Dó e mostra o sentido do som com seu indicador sobre o pentagrama do caderno]. ISI fala aliviada: “Ah!...”

Leitura dos nomes das notas em partituras do livro de violão. A partitura representa os sons por semínimas no pentagrama.

Espaço visual e auditivo.

O conflito que já vinha se apresentando desde a atividade anterior se transforma numa questão não analisada pelo professor: “O que é Mi, e porque ele é representado por bolinhas?” Ao responder sobre a relação grave e agudo o professor “dá pistas” para a aluna, já que ela conhece a relação grave e agudo, mas como na aula de EPEM as figuras ainda não foram apresentadas, e IRI ainda representa as alturas por números nas

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linhas e espaços, seu conflito tem um fundo semântico: Mi é a posição que ela usa na corda, mas ainda não é a ‘bolinha’ na pauta.

Acordes: Assim que ISI coloca os dedos na posição do acorde que irá tocar, o professor aponta para a ponta dos dedos de ISI e diz: “olha só as notas que nós aprendemos hoje na escala: Dó, Mi e Dó.” [ISI sorri, afinal está aprendendo sobre o que já fazia sem saber que fazia! – está conhecendo o que já sabia!] Agora a mão direita deve tocar arpejos (Polegar, Indicador, Médio, Anular). Cada acorde é montado pela aluna com as instruções do professor sobre o lugar de cada dedo da mão esquerda [parece ser difícil posicionar os dedos pois a mão de ISI é pequena e ela tem que abrir muito os dedos para prender a corda].

Acorde de Dó maior (Dó, Mi, Dó).

Espaço Tátil-cinestésico: Neste tipo de toque o uso da mão direita é responsável pela transformação da harmonia (movimento vertical = simultaneidade dos sons) em melodia (movimento horizontal= sucessividade dos sons) pois faz o ataque do som numa corda e em seguida troca de corda para mudar de altura dando continuidade à melodia.

Abstraçào empírica e pseudo-empírica: IRI sente a troca de harmonias à custa de dificuldades motoras. Constrói assim uma plasticidade da mào esquerda que vai agregando significado sonoro. A posição da harmonia de Dó maior traz consigo o 3º dedo esticado, etc. Além disso, o movimento da dialética entre harmonia e melodia se evidencia nesta atividade. Se observamos esta cena pelo aspecto infralógico, vemos a seqüência de sons individuais (descontínuos) sendo

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agrupada num objeto contínuo (posição da mão esquerda) num só momento (1). Em seguida, através do arpejo dedilhado pela mão direita, vemos a sucessividade de sons (seqüência de posições da mão sobre o espaço do instrumento) até o próximo acorde do momento seguinte (2). Das transformações ocorridas entre as harmonias constrói-se a música, formada por vários estados harmônicos que dão sentido à estrutura musical. O sistema tonal dá suporte aos ajustes de tensões e relaxamentos que ocorrem neste movimento (transformação).

Sucessão de acordes professor descreve os dedos e o lugar em que IRI deve colocá-los e ela obedece: C, Am, Dm, G7.

Acordes de Dó maior, lá menor, ré menor, Sol com sétima: C, Am, Dm, G7.

Tátil e cinestésico: Mão esquerda pontua as cordas dando limite ao

Abstração empírica, por instrução verbal: Os signos da partitura,

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1. Dó maior: “PIMA” duas vezes em cada acorde - Do, Mi, Do. “Polegar retinho atrás, e os outros dedos redondos” 2. lá menor: “o dedo três em baixo do dois e o dedo 1 atrás.” 3. ré menor. “Desce todos os dedos uma corda, [IRI modifica a posição] isso! Dedo três na terceira casa... Aí!!!” 4. Sol com sétima: dedo 1 na primeira casa, [IRI faz um esforço para colocar o dedo no lugar mas acaba desistindo]. 5. Procurando conversar com a aluna sobre seus interesses o professor pergunta: “O que você canta em casa?” Ela pensa uma pouco e depois diz que anda muito ocupada com muitos deveres escolares, e que mora muito longe (Méier). Quando o professor pergunta se ela quer tocar mais, ela sorri e diz que sim. Eles retomam os acordes, que ela realiza vagarosamente e recorrendo aos símbolos das posições escritos no livro. Também olha vezes para a mão direita sobre o braço do violão e ora para a direita que dedilha as cordas sobre a boca do violão. Logo depois disso a aula acaba.

espaço vibratório da corda. Mào direita tem que fazer as cordas escolhidas vibrarem. Para cada acorde duas cordas não são tocadas, mas o movimento vertical que os dedos percorrem se dá sempre das cordas mais graves para as mais agudas, ou seja, de cima para baixo.

que deveriam fazer a aluna lembrar qual posição ela deve usar para tocar o acorde, ainda não se transformaram em significantes para IRI. O professor ainda descreve cada detalhe da ação que ela deve fazer. Caso estas ações sejam praticadas regularmente, elas funcionariam como exercício de esquemas motores, no entanto, não notamos um interesse próprio da aluna para fazê-lo.

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QUADRO 2 : Aula de VIOLÃO - 02/06/09 Horário: terça feira as 8hs. LUI (8 anos). Começou o estudo do violão em fevereiro de 2009. EPEM 12 A aluna ISI faltou, por isso eu observei o outro aluno que está no mesmo nível e no mesmo horário.

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

O aluno toca a música que está aprendendo (acordes arpejados e formando acordes). O professor o lembra que a mão deve ficar na posição de concha quando toca com o indicador.

Pulsação e métrica em corda solta com polegar em 4,3,2,1.

Escala: trabalho se volta para a ME pensando nas notas através dos dedos no braço do instrumento e corda solta, além das mudanças de corda.

Afinação das cordas do violão: o aluno toca e fala o nome das cordas 1ª.- mi 2ª.- si 3ª.- sol 4ª.- re 5ª.- la 6ª.- mi

O professor explica que cada corda solta é o princípio da escala naquela corda e a partir dela podemos fazer a escala de DO (ex: si, do, re, mi)

Explica a métrica e pulsação: Diz que a pulsação é um tempo, e este pode ser dividido por 2, depois por 3, depois por 4.

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O aluno lê o ritmo que o professor havia escrito no caderno na última aula.

Leitura de uma partitura: O aluno pergunta o que é uma semínima. O professor diz: Não, são colcheias! O Professor pede que o aluno leia as alturas mostrando ao aluno no violão onde ele deve tocar as notas que estão escritas na partitura. O aluno le a partitura, tocando ao mesmo tempo que fala o nome das notas. São sequências de graus conjuntos que tem início em cada uma das cordas soltas.

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QUADRO 3 : Aula de VIOLÃO - 09 /06/09 Horário: terça-feira, 8hs. Aluno: ISI Idade: 8 anos

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Solfejo: o professor propõe que a ISI comece a ler partituras: escreve no caderno as figuras e as pausas (mínima, semínima e colcheia). Explica que a semínima vale 1, a mínima vale 2 e a colcheia vale a metade. “Essa aqui é a unidade de tempo” diz ao desenhar uma semínima. “Cada pulsação vale uma dessa aqui”, diz o professor e vai escrevendo no cadernos do aluno uma sequencia rítmica sem barras de compassos .

Signos musicais: mínima, semínima e colcheias.

Não há ação física sobre o objeto musical.

Abstração reflexionantes: A ação mental sobre signos musicais pressupõe que a aluna esteja utilizando suas imagens aurais sobre os sons representados pelos signos musicais. No entanto, não se pode afirmar categoricamente que isto esteja ocorrendo, já que o professor não perguntou à aluna sobre o que ela está fazendo.

Pede para ISI solfejar com “tá”. “Vamos lá: Ta-ta-taá, taá, etc.”. O professor fala para a aluna ajudar batendo a pulsação com o pé.

Verbalizações que visam expressar durações com uma e duas pulsações.

Espaço vocal o uso de vocalizações imitam a execução de ritmos.

Ao ler e executar o que lê, vemos o processo de imitação por meio da leitura (imagem representativa – ação correspondente). Ao externar um objeto simbólico ISI inverte o

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processo: ela imita com a voz suas imagens aurais.

O professor passa exercícios para a aluna escrever no caderno em casa.

Não há ação física da aluna sobre o objeto.

Não há ação física da aluna sobre o objeto.

Não há ação a ser analisada.

Exercício só com o polegar (P) 4 vezes em cada corda, cantando ao mesmo tempo o nome da corda.

Acrescenta-se a verbalização do nome da nota.

Espaço auditivo, tátil e vocal:

Os nomes das cordas são significantes do som que IRI ouve ao tocar a corda solta. Além deste, os esquemas motores usados para tocar também se aderem ao som. O nome de cada corda trará consigo o som resultante desta ação.

Exercício de pentacórdio com a ME. (numeração dos dedos: ISI parece querer se lembrar: 1,2,3,...) ISI relaciona o número do dedo com cada uma das cordas e o respectivo nome. Na 5ª corda: Do- quatro vezes; na 4ª corda Ré (quatro vezes) Mi ( ) idem, Fa ( ) idem, Sol ( ) idem.

Pentacórdio maior: estrutura básica para o sistema das escalas tonais.

Coordenação dos dedos das duas mãos: na mão direita eles recebem os nomes: P I M A e na mão esquerda são numerados: 1, 2, 3, 4.

Cada dedo da mão esquerda e sua localização no braço do violão ganha uma significado. Por isso tem uma função esquemática da altura tocada. Ao tocar sem saber o nome da nota, o músico sabe para si o resultado daquela ação. Só é mais difícil trocar

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socialmente este saber. ISI toca a Escala de Do maior na primeira posição: DO: 3º Dedo na corda La RE: corda Ré solta MI : 2° dedo na corda Mi FA : 3° dedo na corda Mi SOL : corda Sol solta LA : 2º Dedo na corda Sol SI : 1º Dedo na corda Si

Escala de Do maior A primeira posição é aquele lugar do braço do violão mais próximo das cravelhas. As alturas da escala são construídas pelas cordas soltas ou marcadas pelos dedos da mão esquerda. Depende do lugar em que a mão esquerda está e da proximidade das posições disponíveis para tocar a sequencia de notas da escala.

Para tocar a escala IRI deve se lembrar da posição responsável por cada som. Esta representação da nota junto com a sua posição vai se tornar um esquema motor, geral, para tocar muitas músicas.

ISI diz: “meu pai pensa que o do-re-mi-fá é só nessa corda”, e mostra uma das cordas. O Professor diz: “é mesmo! Tem todas as notas em todas as cordas!”

Cada corda pode soar em todas as alturas, porque basta dividi-la para produzir outros sons. Porque então o Dó que IRI aprendeu é tocado naquele lugar específico? Por uma questão de proximidade entre as notas do sistema, historicamente a técnica do instrumento foi sendo definida assim: se a mão está mais próxima das cravelhas, todas as notas são buscadas naquela região do instrumento. Caso ela esteja

Espaço visual: IRI vê as posições que o professor mostra sobre o braço do violão

Vemos que o aspecto figurativo do saber é fundamental para a construção do aspecto operativo. A lógica da técnica abrange dados que são muito além dos que IRI domina nesta fase dos estudos do instrumento, mas se ela entendesse melhor a estrutura do instrumento esta questão não seria tão difícil de compreender.

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perto da boca do violão, lá serão buscadas todas as alturas.

Todos os saberes são dados prontos sem que ISI possa construí-los. Por que não deixar que ela descubra as alturas nas diversas cordas? Por que o método lhe dá a técnica com os conceitos de altura sem que ela possa explorar todos eles com um esquema motor geral? Por que o esquema de altura já vem fixado com um Dó apenas?

O Professor pega o violão do outro aluno para afiná-lo, enquanto pede para ISI tocar um acorde de Dó maior (C).

Acorde de Dó maior (Dó, Mi, Dó)

EspaçoTátil, Cinestésico e Auditivo: a mão direita toca em várias cordas ao mesmo tempo e o polegar da mão direita passa rapidamente pelas cordas

Imitação do signo (C) pela repetição de um esquema motor.

A aluna toca a sequencia que aprendeu em aulas anteriores coordenando as duas mãos: C, Am, Dm, G7. Ela usa a ME nas posições e ao mesmo tempo passa o polegar da MD sobre todas as 6 cordas.

Sequencia harmônica de uma música “Sol de todo Dia” de Caetano Veloso.

EspaçoTátil, Cinestésico e Auditivo: a mão direita toca em várias cordas ao mesmo tempo e o polegar da mão direita passa rapidamente pelas cordas

A transformação das harmonias cria um estado mais amplo, que é a música. Enquanto IRI faz estas mudanças lentamente, cada acorde é um estado, e ela mal percebe a

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trasnformação que acontece na passagem de um para o outro. As imagens mentais de cada um são como fotos estáticas. A partir da maior rapidez do pensamento na passagem de um para o outro, estes acordes começam a se relacionar. Estaremos então na presença de uma operação mental que antecipa cada acorde.

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QUADRO 4: Aula de VIOLÃO - 16/06/09 Horário: 8hs Aluna ISI, 8 anos

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Leitura rítmica com pausas Ritmo composto por semínimas, mínimas e pausas de semínima.

Espaço visual, vocal e auditivo.

Os signos musicais são significantes de experiências já vividas pela aluna em outras aulas. É com base na recordação destas ações passadas que ISI constrói os significados para os exercícios novos.

Exercício: do-re-mi-fa-sol 4x em cada nota alternando os dedos IM.

Pentacórdio de Dó maior repetindo cada som quatro vezes.

Espaço tátil, visual e auditivo.

Abstraçào empírica de sons repetidos dentro do pentacórdio maior.

Professor pede que ISI toque perto do traste o Acorde de Do maior (C). Diz que assim se faz menos força e o som sai mais limpo.

Acorde de Dó maior. Espaço tátil e auditivo. Ao mudar o lugar onde toca, ISI realiza um abstraçào empírica da mudança do timbre das cordas.

Harmonia: o professor já havia ensinado os acordes e as cifras com as notas do acorde em mini-pentagramas: C/ Am/ Dm/ G7// Nesta aula o professor escreveu a letra da música

Sequência harmônica a ser tocada no violão: C/ Am/ DM/ G7// Os blocos harmônicos perduram de uma harmonia

Espaço visual (leitura), tátil-cinestésico e auditivo: graças ao movimento dos dedos da mão direita sobre as cordas, os arpejos

Abstração empírica da continuidade harmônica por reiteração rítmica.

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“Todo o dia” no caderno, e ensinou a “levada”. Os alunos apresentaram dificuldade, mas o professor disse que era assim mesmo, e que o mais importante era que eles memorizassem a sequência e re-ocorrência de acordes durante a música. Como exercício para fixar as posições dos acordes propôs que os alunos fizessem quatro repetições de cada um dos acordes.

até a seguinte graças à “levada”, combinação rítmica que organiza o tempo e estabelece um padrão que percorre toda na música. Neste caso, a “levada” é composta de uma subdivisão igualmente distribuída entre as pulsações, com o toque com os seguintes dedos nas cordas de cada acorde: P-I-(MA)-I:||

continuam soando entre uma harmonia e outra. As mudanças de harmonia no entanto são resultado da coordenação dos dedos da mão esquerda, que prendem as cordas, cada vez em espaços diferentes sobre o braço do violão.

Depois ensinou os alunos a cantar a melodia com a letra acompanhando-os com a harmonia.

C AM “Todo o dia o sol levanta Dm G7 e a gente canta o sol C De todo o dia”.

Espaço visual (leitura), Tátil-cinestésico (ME) – mudanças de posição para variar as harmonias, Auditivo –percepção auditiva do resultado sonoro

Abstração pseudo-empírica da sincronia entre melodia e harmonia. Se antes a aluno ouviu o resultado, desta vez é através de sua própria ação que o fenômeno acontece. Esta experiência é muito mais enriquecedora e leva o aluno a outro nível de abstraçào das propriedades do objeto musical.

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QUADRO 5 : Aula de VIOLÃO - 23/06/09 Horário: 8hs Aluna ISI, 8 anos

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos utilizados

pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Leitura de acordes [arpejados] coordenando o toque dos dedos polegar (p), indicador (i) médio (m) e anular (a) sobre as cordas soltas do violão.

Exercícios de técnica de arpejo nas cordas soltas em ritmo com quatro durações iguais (colcheias) 6ª corda – Mi - p 5ª corda – Lá - i 4ª corda – Ré - m 3ª corda – Sol - a

Espaço visual (ao ler a partitura) e tátil-cinestésico: MD utiliza o toque de arpejo sobre os acordes em cordas soltas usando os dedos p, i, m, a.

Abstração empírica da linha melódica ascendente composta pelos sons das cordas soltas cujas notas estão sendo lidas na escrita em arpejo na partitura.

1. O professor escreveu um ritmo no caderno e a seguir pediu que a aluna o lesse, batendo a mão sobre a perna. Perguntou a ela qual era o nome das figuras escritas. Ele pediu então, que ela falasse o ritmo com “Tas”. 2. Escreveu outra seqüência rítmica usando também colcheias.

1. Mínimas e Semínimas pausas de semínimas. 2. Semínimas e colcheias.

Espaço vocal e visual (ao ler a partitura) e Tátil-cinestésico (ao bater o ritmo)

Ao nomear as figuras ISI está adquirindo um vocabulário simbólico importante para poder falar sobre música, mas não está fazendo música. Ao ler o ritmo, está emprestando significado às figuras através de abstrações pseudo-empíricas sobre o resultado sonoro de sua leitura.

Técnica de MD: Sons repetidos da corda Sol. Espaços visual (ao ler a Vemos que através da

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Apoiando o polegar (p) na 6ª. corda (Mi) toca indicador (i) e médio (m) na 3ª. corda (Sol). O professor diz que o importante é a mão relaxada (em concha). Diz “conchinha na mão”, e a aluna reage, arredondando mais o arco interno da palma da mão. O professor também fala o nome das cordas onde a aluna deve tocar.

partitura) e tátil, pois ISI coordena dos dedos indicador (I) e médio (M) para fazer vibrar reiteradamente a corda Sol do violão.

especialização da posição da MD, ISI consegue melhor desempenho e a corda produz um som cada vez mais consistente. Assim, além da abstração empírica de sons repetidos, ISI chega a uma abstraçào pseudo-empírica da qualidade sonora do seu instrumento como resultado de sua própria ação.

Início do ensino da seqüência harmônica da música: “Canto do povo de um lugar” de Caetano Veloso. A seqüência harmônica é trabalhada através da coordenação do canto da melodia com a realização das mudanças de posição da mão esquerda sobre o braço do violão. A mão direita marca a pulsação do compasso (2/4) com o dedo indicador nas seis cordas sobre a seqüência de acordes (C Am Dm e G7), duas batidas para cada acorde, até dominar a mudança dos

Introdução: CCCC/Dm Dm/ G7 C/ Melodia e harmonia: C C C C “Todo o dia o sol Am _ Am _ Dm Dm Levanta, e a gente canta o sol G7 G7-C de todo o di-a”.

Espaço visual (ao ler a partitura e olhar para ação dos dedos das duas mãos) e tátil-cinestésico (coordenando as duas mãos para tocar o violão). A ME pressiona várias cordas simultaneamente e a MD faz as cordas soarem quando passa, com as costas de dedo indicador, sobre as seis cordas, sucessivamente, a cada pulsação. Espaço auditivo: regula o tempo e o resultado da

Vemos que no início, ISI olha para as mudanças de posição da mão numa atitude semelhante à 3º fase do período sensório-motor, em que o bebê só se dá conta dos objetos que pode ver. Assim ISI olha para a corda e a mão que as toca como se o olhar participasse da ação. Os acordes estão

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acordes. Posteriormente será ensinado o arpejo dos acordes, coordenando o dedilhado da MD com as mudanças de posição da ME.

coordenação das mãos. sendo treinados pela abstração empírica do som resultante da ação dos dedos. ISI precisa conhecer os sons dos acordes antes de poder aperfeiçoar o uso dos dedos da MD em arpejos dedilhados.

A aluna toca a Escala de Do maior lendo as notas da partitura e ajustando a ação dos dedos da ME sobre o braço do violão enquanto os da MD dedilham as cordas na altura da boca do violão.

A escala é lida na partitura, cantada pelo nome das notas e tocada no violão.

Cordas usadas: Lá Ré Sol Si

Espaço visual: ISI lê as notas na pauta movimentando seus olhos da esquerda para a direita (para a sucessão dos signos temporais) e de baixo para cima na pauta (para seguir as alturas das notas nas linhas e espaços). Espaço auditivo: ISI ouve o som que resulta do grave para o agudo. Espaço Tátil: ISI pressiona as cordas com os dedos da ME, que “desce” da corda Lá até a corda Si. Ao mesmo tempo, faz vibrar a corda pressionada com os dedos da MD.

Comparando a partitura e o gráfico da movimentação dos dedos, podemos notar a multiplicidade de movimentos dos espaços práticos coordenados por ISI para realizar a escala de Dó lendo a partitura e tocando ao violão. O método de ensino adotado pelo professor prevê a estruturação da técnica do violão apoiada em estruturas musicais como escalas e arpejos. Ao

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serem abstraídas de sua ação, tais estruturas musicais levam ISI a construir imagens mentais: da partitura, da coordenação dos dedos sobre sobre o espaço do instrumento e do resultado sonoro. A partir da representação imagética destas estruturas, torna-se possível a assimilação de outras formas melódicas e harmônicas, já que estas podem ser assimiladas aos esquemas motores de ISI. Portanto, o treino dos dedos através das estruturas musicais como as escalas e os arpejos, são exercícios motores que formam esquemas mentais

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destas estruturas no pensamento de ISI.

O professor escreveu as notas da melodia de “Todo dia” no caderno da aluna e pediu que ela solfejasse. Ela apresentou dificuldade em cantar as notas na pauta pelo nome.

Melodia da musica “Todo Dia” de Caetano Veloso escrita na pauta da clave de Sol.

Ao solfejar ISI coordena os espaços visual (ao ler a partitura) e vocal (cantando).

O problema que se coloca no solfejo das notas da melodia é que ISI tem a representação dos nomes das notas quando estão ordenadas na forma escalar. Já a representação que ela tem da seqüência melódica é apenas auditiva, mas ela ainda não consegue relacionar os dois sistemas com velocidade, por isso, não consegue nomear as notas que lê sem que elas estejam ordenadas na forma escalar. Esta tarefa demanda uma capacidade de reconhecer no signo arbitrário da notação musical um significado ainda em

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construção no desenvolvimento musical da aluna: reconhecimento o signo da nota sua altura e seu nome.

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QUADRO 6 : Aula de VIOLÃO - 30/06/09 Horário: terça feira as 8hs. ISI (8 anos). EPEM 12

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos utilizados pelo

aluno Inferências sobre as representações musicais

1. Afinação do violão precede todas as atividades. ISI só observa e aguarda ouvindo o professor afinando os dois instrumentos.

Mi, Lá, Ré, Sol, Si, Mi. Espaço auditivo e visual:

A imagem auditiva da altura das cordas soltas se formada no nível intuitivo.

2. Técnica de Mão direita: a) Polegar na 6.a corda IM na 3ª. corda, conchinha na mão. “Vamos acordar o dedo. Mão relaxada, e mais redonda”, diz o professor.b) Nas quatro primeiras cordas Mi, Si, Sol, Ré: os dedos I e M, quatro vezes em cada corda sobre a boca do violão. Mão em concha. c) Polegar na três últimas cordas:Mi, Lá e Ré. 4 vezes em cada, mão em concha, falando o nome da corda. d) Concha na mão uma vez cada corda solta: 6ª – p = Mi 4ª – i = Ré 2ª – m = Si

a) Sons repetidos da corda Sol. b) As cordas soltas soam na sua altura fixa: Mi, Si, Sol, Ré. c) Sons repetidos nas alturas Mi, Lá e Ré. d) Um som em cada corda: Mi, Ré Si, Mi.

A coordenação do espaço tátil e auditivo se especializa, já que para ISI fazer melhor este exercício, deve manter sua mão estruturada. Assim, os dedos atuam alternadamente, e ISI pode regular suas ações pelo ouvido sem olhar para a mão. a) ISI coordena os dedos indicador (I) e médio (M) para fazer vibrar reiteradamente a corda Sol do violão.

b) Assim, os dedos IMA se encarregam das cordas mais embaixo:

Vemos que através da especialização da posição da MD, ISI consegue melhor desempenho e a corda produz um som cada vez mais consistente. Assim, além da abstração empírica de sons repetidos, ISI chega a uma abstraçào pseudo-empírica da qualidade sonora do seu instrumento como resultado de sua própria ação.

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1ª – a = Mi

c) o (P) polegar das cordas mais de cima (6a, 5a e 4a).

d) os quarto dedos atuam alternadamente em cordas diferentes.

Ao repetir o toque com os dedos indicador e médio, ISI regula a pulsação e através de abstrações empíricas conhece a distancia entre as cordas, a força necessária para fazer as cordas vibrarem com igualdade , assim como constrói a imagem auditiva das alturas das cordas soltas.

Primeiro tetracórde da Escala Do maior: Quatro vezes cada nota com MD usando o dedilhado:

Escala de Dó Maior dividida: a) Primeiro tetracórde:

O espaço tátil e visual são preponderantes na coordenação desta atividade. a) a MD tem o dedilhado (i) e (m)

As repetições favorecem a conservação da estrutura já que ISI

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indicador (i) e médio (m) em cada corda até Fá. i m - 5ª corda - Do i m - 4a corda - Ré i m - 4a corda - Mi i m - 4a corda - Fa

5ª corda - Dó, Dó, Dó, Dó, (i m) 4ª corda- Ré, Ré, Ré, Ré, (i m) 4ª corda - Mi, Mi,Mi, Mi, (i m) 4ª corda - Fá, Fá, Fá, Fá, (i m)

atuando nas cordas Lá e Ré, construindo uma imagem cinestésica que poderia ser simbolizada da seguinte maneira: MD: 5ª corda - Dó, Dó, (i m) 4ª corda - Ré, Ré, (i m) 4ª corda - Mi, Mi, (i m) 4ª corda - Fá, Fá, (i m)

A ME realiza um desenho independente e as duas mãos se coordenam no tempo de maneira que o posicionamento da ME deve preceder o da MD.

tem um tempo para pensar na próxima posição que fará com a ME, ao mesmo tempo que conserva a posição atual. Vemos uma forma de fazer antecipações com o controle do tempo realizado pelas reiterações dos toques da MD. As pulsações organizam o tempo da ação mental e física de ISI.

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Exercício da Escala Dó maior (na primeira posição) com as duas mãos: MD: alternando os ataques com (i) indicador e (m) médio com repetindo 4 vezes, depois 3 vezes, depois 2 vezes, para finalmente fazer 1 vez em cada nota.

Escala Diatônica de Dó maior: - Quatro vezes cada nota - Três vezes cada nota - Duas vezes cada nota - Uma vez cada nota

MD / ME i - 5ª corda – Do (dedo 3) m- 4ª corda - Ré (corda solta) i - 4ª corda – Mi (dedo 2) m - 4ª corda – Fá (dedo 3) i - 3ª corda – Sol (corda solta) m - 3ª corda - Lá (dedo 2) i - 2ª corda – Si (corda solta) m - 2ª corda – Do (dedo 1)

Nesta atividade ISI treina os esquemas motores com movimentos das duas mãos, porém as repetições favorecem a preparação das mudanças de posição. Há uma centração no construção do desenho contínuo da escala que é composto das descontinuidades das mudanças de posição das duas mãos. A escala é formada no estado final das transformações de alturas do som e estas transformações se realizam pela ação de ISI sobre pontos descontínuos do espaço topológico do violão.

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3. Repertório: A melodia “Havia um pastorzinho” apoiando o polegar na 6ª corda, e i m nas cordas correspondentes às usadas na escala. i - 5ª corda - Do m - 4a corda - Ré i - 4a corda - Mi m- 4a corda - Fa

Do, Ré, Mi, Fá, Fá, Fá. Espaço Tátil é usado de forma semelhante ao exercício de escala, mas com a diferença de que o ritmo da música leva ISI a repetir notas e demorar mais ou menos em cada uma delas. Espaço visual: observa as ações do professo para imitar cada um dos seus movimentos sobre o instrumento. Espaço vocal e auditivo: são coordenados como apoio da ação das mãos, pois a letra que ISI canta lhe informa o nome das notas que são significantes das posições que ela faz.

Agora, a técnica passa a ser utilizada para a expressão de idéias que ISI já tem. Ela conhece a melodia proposta, já tem sua representação pronta no pensamento. Percebemos que a imagem auditiva da melodia está presente em seu pensamento, mas a imagem tátil cinestésica precisa de mais treino para passar do nível intuitivo para o operatório. Será necessário levar em conta as relações de vizinhança das posições, as repetições, e os momentos de espera para realizar as durações. Em todas estas

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regulações, ISI deverá antecipar seu pensamento ao ato que realizará em seguida. Neste caso, como sua representação tátil fragmenta a imagem da melodia em posições desencadeadas, predomina a figuratividade, ou seja, se prende a cada posição em particular, seu pensamento não articula todas elas em grupo, e ISI tem que parar após cada som para procurar a posição de cada mão antes de coordenar a produção do som.

Melodia de “Canto do Povo de um Lugar” de Caetano Veloso. Melodia tocada no tom de Dó Maior, na primeira posição (nas quatro primeiras casas)

Notas da melodia: alturas de La a Sol, em compasso 2/4, usando semínimas e mínimas, ou escritas com colcheias e semínimas.

Espaço Tátil: Coordenação que é precedida pelo posicionamento das mãos - ME pressiona uma corda de cada vez e a MD tange a mesma corda com os dedos: p, i, m, a (iniciais de

ISI é levada a coordenar novas ordenações dos esquemas motores envolvidos na

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p, i, m, a (iniciais de polegar, indicador, médio e anular).

polegar, indicador, médio e anelar). Espaço visual: ISI procura verificar cada novo posicionamento das duas mãos. Espaço auditivo: ISI regula suas ações no tempo graças à audição do resultado de cada ação precedente.

técnica escalar, através de um repertório que utiliza as mesmas alturas da escala de Dó maior, em outra ordem de sucessão e com ritmo particular, mas que são tocadas na primeira posição do instrumento, no mesmo espaço em que ISI aprendeu a tocar as notas da escala.

4. Acordes de “Canto do Povo de um Lugar” de Caetano Veloso. Os acordes foram escritos nos cadernos com os dedos indicados nas respectivas posições, em uma matriz imitando o braço do violão com as cifras correspondentes. Os acordes som a medida que o indicador da mão direita é passado sobre as cordas na marcação da pulsação do

Introdução: CCCC/Dm Dm/ G7 C/ Melodia e harmonia: C C C C “Todo o dia o sol Am _ Am _ Dm Dm Levanta, e a gente canta o sol G7 G7-C de todo o di-a”.

Espaço tátil: MD belisca as cordas escritas na partitura sucessivamente. Espaço auditivo: ISI regula suas ações no tempo graças à audição do resultado de cada ação precedente. Espaço visual: ISI procura verificar cada novo posicionamento da ME

Uma vez que ISI já domina o canto da melodia desta música, os acordes enriquecem seus esquemas auditivos com sons que se harmonizam com a melodia. A imagem mental desta música começa a se tornar mais complexa.

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compasso 2/4. 5.Técnica de acordes arpejados nas cordas soltas: as cordas Mi, Lá, Ré são usadas com polegar Sol com indicador, Si e Mi com médio e anular sucessivamente ou simultaneamente. a) p, i [m-a] – (Intervalo harmônico: de 4ª justa) b) Arpejos ida e volta: p, i [m-a] i, p c) coordenando ME e MD, seqüência de acordes (4) aprendidos. Duas vezes cada acorde, usando o dedilhado da MD: p, i [m-a] i, p p na 4ª. corda; i [m-a] i p na 6ª. corda

Exercícios de técnica de arpejo nas cordas soltas: a) Mi- p Lá- i Ré - m Sol -a b) Mi- p Lá- i Ré - m Sol -a Ré - m Lá- i c) Mi- p Lá- i Ré - m e Sol –a [em bloco] Lá- i

Espaço Tátil: MD utiliza o toque de arpejo sobre os acordes em cordas soltas usando a polpa dos dedos p, i, m, a. Espaço visual: ISI verifica as posições da MD antes de beliscar as cordas Espaço auditivo: O ritmo é em colcheias. Assim ISI ouve a alternância de sons dos acordes arpejados da MD em que os sons só sobem, ou sobem e descem (grave-agudo-grave).

Assim como as escalas são organizadas tecnicamente, os arpejos também são. Os dedos usados pela MD nas cordas soltas vão adquirindo uma especialização motora que será útil no momento de se ajustarem às formas musicais significativas. Por enquanto estes exercícios tem função esquemática.

6. “Todo dia” com acordes (4 vezes em cada acorde).

C C C C “Todo o dia o sol Am _ Am _ Dm Dm Levanta, e a gente canta o sol G7 G7-C

Espaço Tátil: MD utiliza o toque de arpejo sobre os acordes em cordas soltas usando os dedos p, i, [m-a] ME pressiona algumas cordas para mudar as alturas de algumas delas na

Após o exercício motor, o uso da técnica de arpejos é aplicada na sequencia

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de todo o di-a”.

sequencia beliscada pela MD. (Ver desenho abaixo) Espaço visual: ISI verifica as posições da MD antes de beliscar as cordas Espaço auditivo: O ritmo é constantemente em colcheias. Assim ISI ouve a alternância de sons dos acordes arpejados da MD em que os sons sobem e descem (grave-agudo-grave). Espaço vocal: ISI canta a melodia ao mesmo tempo que toca os arpejos.

harmônica já conhecida por ISI na aula anterior. Agora que ela já praticou as mudanças da ME, terá condições de coordenar os dois esquemas numa velocidade maior, como fazem as crianças na 5ª fase do período sensório motor, quando inventam esquemas novos a partir da coordenação dos esquemas anteriores. Tal velocidade só é possível se ISI tiver consolidado a representação dos esquemas da ME, para poder se dedicar mais à coordenação dos esquemas táteis e visuais envolvidos na ação da MD.

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ANEXO 4

ANÁLISE DAS AULAS DE VIOLINO

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QUADRO 1: Aula de VIOLINO - 11/05/09 Horário: segunda-feira 11hs. Alunos: BEA, 7:11 anos e AGA, 8 anos. Alunas da turma de EPEM12.

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

A professora afina os violinos de cada aluno antes das atividades

Relação da tensão das cordas com a afinação de cada corda. Definição das alturas das cordas soltas, que serão referências para todas as relações de alturas do instrumento. Alturas definidas

Espaços visual e auditivo (ao ver a ação da professora e ouvir o resultado da afinação)

Através da percepção do som das cordas afinadas, BEA e AGA vão adquirindo esquemas auditivos da afinação das cordas.

Professora escreve as notas de DO a SOL no quadro negro, depois toca e solfeja a linha melódica de Ode à Alegria de Beethoven e pede que EL escreva as notas da melodia no caderno.

Atividade fora do instrumento. Relacionar as notas da escala ascendente ( Dó, Ré, Mi, Fá, Sol) Com as notas da melodia de Ode a Alegria Mi, Mi, Fá, Sol, Sol, Fa, Mi Re, Dó, Dó, Ré, Mi, Mi, Ré, Ré, etc.

Os espaços auditivo e visual são utilizados ao ouvir, ler e escrever a notação.

Representação do movimento melódico fazendo relação termo a termo entre os sons cantados pela professora e as notas da escala ascendente de DO até SOL, durante a escrita das alturas da melodia através do nome da nota solfejada.

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A professora pinta as notas do caderno que a aluna deve tocar e vai apontando para que ela leia e toque. AGA segura o violino e toca 10 vezes na corda La e Mi em pizzicato.

Intervalo melódico de 5ª justa sendo tocado na Pulsação.

Espaço auditivo ao ouvir o que toca; Tátil ao tanger as cordas em pizzicato; cinestésico no movimento de mudança de cordas no toque pizzicato; visual ao ler as notas na partitura; postural para equilibrar a o corpo na posição de sustentar o instrumento.

Existe uma coordenação global da postura e dos movimentos fisicos necessários para a produção do intervalos melódico na pulsação, que solicita o funcionamento de esquemas mentais para a leitura das notas na pauta e para tanger os dedos da mão direita em momentos exatos e em espaços precisos das cordas, através da reação à visão das notas apontadas pela professora. A imagem mental da melodia que já havia sido tocada e escrita também serve de guia para a ação de AGA.

A professora toca ao piano enquanto as alunas fazem movimentos diferentes usando as cordas La e Mi: BEA toca em pizzicato, enquanto AGA toca os mesmos sons usando o arco.

Usando as cordas soltas La e Mi as alunas tem que manter a pulsação e as duração dos sons da música. Simultaneidade da melodia e harmonia. A métrica dá

Espaços auditivo, táctil e cinestésico. Na ação de BEA: o espaço tátil do dedo indicador da mão direita (para tanger as cordas em pizzicato). Na

Abstraçào empírica: tanto BEA quanto AGA estão encontrando as resistências do instrumento para

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sentido rítmico à melodia que é constituída apenas de dois sons: La e Mi.

ação de AGA: controle da duração do som através do movimento do membro superior direito (no uso do arco)

realizar as mesmas alturas, com durações diferentes. A continuidade do som pelo uso do arco permite a abstraçào pseudo-empírica do som contínuo, e a descontinuidade do pizzicato permite a abstraçào do tempo de espera entre um ataque e outro, ouvindo o som que a colega faz. Além destas abstrações, a audição da melodia tocada pela professora funciona como um espaço sonoro (contínuo) dentro do qual as duas atuam com elementos sonoros descontínuos.

A professora pede que BEA escreva as notas em todas as linhas e espaços e, em seguida, pede que ela preencha as notas La e Mi com cores. A professora escreve os signos destes sons na pauta, solicitando que a aluna relacione tais signos aos sons que ela tocou anteriormente (MI e LA) quando usou apenas cordas soltas.

Estrutura de quatro graus conjuntos – Mi, Fa, Sol, Lá de onde se destacam as notas Lá e Mi a serem tocadas posteriormente nas cordas soltas em pizzicato por BEA.

Espaço visual - os olhos se movimentam da esquerda para a direita para seguir a seqüência das notas e procuram referencias gráficas (Mi é nota de linha e Lá é nota

A identificação das alturas que a BEA tocará induz a representação simbólica do som através da notação musical convencional.

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de espaço). Este significante se apóia na imagem auditiva do que BEA tocou e também no desenho da nota na pauta. Assim, para BEA, o som tocado é o significado para a forma escrita de representação, e ele dá sentido ao que a aluna lê através do ato de tocar violino.

Graus conjuntos La, Si: A professora escreve a nota Si no pentagrama e em seguida pede que BEA pressione o indicador da ME na corda La. A professora ajuda-a para que pressione um lugar preciso do braço do instrumento. Ao mesmo tempo a aluna toca em pizzicato na corda La com o indicador da MD. No violino, os graus conjuntos são descobertos a partir da divisão das cordas através da pressão dos dedos da mão esquerda sobre o braço do violino. Neste caso, acontece um encurtando da corda LA, que, ao ser tangida pelo indicador da MD, vibra, produzindo assim o som Si

Os graus conjuntos aprendidos nesta aula formarão uma linha melódica nas próximas aulas. Solicita-se uma ação que construirá o esquema motor do intervalo entre as notas La e Si

Os esquemas motores articulados na produção dos sons La e Si, são constituídos da posição de segurar o violino, do tanger a corda La com o dedo indicador da ME, e, ao mesmo tempo, da pressão (para o som si) ou retirada do indicador (para o som La) da mão esquerda sobre o braço do violino num lugar determinado da corda La

Vemos a constituição de esquemas visuais auditivos e motores que podem favorecer a representação simbólica do grau conjunto através da notação musical, da imagem auditiva dos sons trabalhados, e da imitação internalizada da ação táctil-cinestésica realizada por BEA.

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QUADRO 2: Aula de VIOLINO - 18/05/2009 Horário: segunda-feira 11hs. Alunos: AB, 7:11 anos e AGA, 8 anos. Alunas da turma de EPEM12.

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

BEA toca Lá e Ré em pizzicato numa métrica quaternária: a)1 2 3 4// Lá Ré Lá Ré // b)1 2 3 4// * Ré *Lá// Enquanto a aluna toca este exercício, a professora toca harmonia no piano usando um ritmo de blue, com o baixo nas notas ||: Ré, Dá Sib, Lá:||

Pulsação, métrica quaternária. Sons descontínuos produzidos nas cordas soltas formando o intervalo melódico de 5ª justa ascendente e descendente: Ré -Lá.

Espaço tátil MD: ponta do indicador fazendo os ataques de cada som ao tanger as cordas ME: sustentação do violino Postural: Cabeça: sustentação do violino Auditivo: confere os resultados da ação, para agir no momento certo fazendo o som ou o silêncio de acordo com os sons que ouve do piano.

Nesta atividade, BEA experimenta algumas estruturas musicais com o mínimo de preocupação com os movimentos do próprio corpo, mas tais movimentos vão sendo aperfeiçoados durante as repetições. São esquemas motores básicos que estão sendo exercitados, não espontaneamente, pois são ensinados pela professora.

BEA toca na corda Lá usando o arco e mantendo a métrica quaternária. Repete esta ação várias vezes.

Exercício de arco com corda solta. Sons contínuos na altura Lá. Métrica quaternária. Intensidade do som constante.

Espaços Postural: Braço e mão esquerdos fazem a sustentação do violino numa posição que permita ao arco deslizar sobre as cordas

Abstraçào pseudo-empírica da continuidade e duração do som. BEA sai desta experiência sabendo que o som resultante de sua ação existe porque

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Cabeça: auxilia a sustentação do violino Tátil-cinestésico: BEA controla a intensidade do som com o dedo indicador da MD segurando o talão do arco de modo a imprimir pressão sobre ele. Assim a crina entra em contato com as cordas. Braço direito: É através do movimento para cima, para baixo do braço, e interrupção do movimento, que o atrito da crina do arco sobre as cordas produz o som contínuo e descontínuo. Visual: controla o movimento do arco olhando para a corda Lá. Auditivo: confere os resultados da ação.

ela o produziu fazendo movimentos específicos. Os esquemas motores primitivos como o de preensão, e também o movimento vertical do braço, estão sendo coordenados com representações de elementos musicais: pulsação, duração e métrica.

A aluna escreve as notas nas linhas e espaços do pentagrama ainda sem se preocupar com as durações.

Escrita musical tradicional: pentagrama, clave de sol, sons definidos representados através de notas nas linhas e espaços.

Mãos na ação de escrever e controle dos espaços do papel usados na escrita através da visão.

Ao escrever os sons que acabou de tocar, a aluna se lembra da ação terminada [através da memória no sentido estrito], e representa-a

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através da escrita. Neste ato de escrever é levada a estabelecer relações entre as notas, entre os espaços e linhas na pauta, utilizando um raciocínio lógico e os esquemas que lhe possibilitaram reter a ação na memória.

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QUADRO 3: Aula de VIOLINO - 01/06/2009 Horário: segunda-feira 11hs. Alunos: BEA, 7:11 anos e AGA, 8 anos. Alunas da turma de EPEM12. [FER 11 anos (aluna presente na aula, mas que não faz parte da amostra. Ela faz Epem 1 em outra turma]

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

A professora pede que a BEA escreva notas nas linhas e espaços do caderno de música. BEA escreve e depois a professora corrige pedindo que ela não escreva tão próximas umas das outras para que não fiquem como “cacho de uva...”. Desenha algumas para a aluna e pede que ela faça igual, e fala: “...depois anda mais pra lá, mais pra lá... [e vai escrevendo notas na pauta], pra que fique parecendo uma escadinha.” Enquanto BEA escreve, a professora afina o violino de FER. BEA mostra o que escreveu e a professora pede que ela corrija uma nota que não está bem na linha como deveria estar. BEA refaz e mostra. Agora está bem feito, diz a professora. Ela pede que BEA escreva novamente as notas nas linhas e espaços e faz uma atividade com FER

A técnica da escrita das notas de linha e notas de espaço.

Os espaços práticos envolvidos na ação de escrever são os olhos (visão) e as mãos (destreza manual no uso do lápis sobre a pauta musical).

Neste caso, a internalização da ação de escrever pode estar vazia do significado, uma vez que o ouvido não foi utilizado nesta aula. Temos aí um exemplo de solicitação da memória no sentido estrito - evocação (do som representado pelas figuras) e reconstituição de um significante (as figuras rítmicas), mas não de um som, uma vez que a aluna não tocou na hora da aula.

FER toca na corda LA em pizzicato, mantendo a pulsação. 1. A professora diz que vai ensinar FER como tocar notas que duram um e dois tempos.

1. Durações de uma pulsação e de duas pulsações com a medida das batidas do metrônomo e verbalização

1. A audição é o primeiro espaço prático requisitado nesta ação. A seguir, a fala envolve o

1. O tempo musical esta sendo construído através do esquematismo

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Notas de um tempo: Com o metrônomo ligado, a professora diz que este aparelho serve para marcar a duração das notas e chama-se metrônomo. Enquanto o metrônomo toca a professora fala: “La-a” [enquanto ouvem duas batidas]. Mostra o metrônomo para BEA e diz: “Olha BEA, quando é de um tempo é assim: ‘La, La ,La, La’.” 2. A professora pede que FER toque no violino sons de um tempo enquanto o metrônomo marca as pulsações. A professora também toca ao piano um acompanhamento seguindo a mesma pulsação A professora orienta FER a pinçar o dedo indicador firme e “de ladinho”, sempre “soltinho”. [o dedo indicador tocando na corda com a parte lateral, perto da unha, relaxando o dedo após o ‘pinçar’]. Nota de dois tempos: FER toca sons mais longos e a professora fala para BEA (que continua escrevendo): “Quando a nota dura dois tempos, deixa soando mais longo e fala ‘La-á”, La-á’. 3. Depois de FER repetir algumas vezes, a

das durações 2. Técnica de tocar sons de uma ou duas pulsações ao violino usando a posição correta do dedo para realizar o pizzicato 3. A representação simbólica

uso do espaço bucal, mas é regulada pelo raciocínio: o ouvido manda o modelo de reiteração das batidas do metrônomo para o cérebro, e a aluna fala obedecendo as durações de acordo o modelo das batidas do metrônomo 2. O indicador da mão direita está controlando o ataque do som. Da qualidade deste ato depende a intensidade e a duração da vibração da corda. Para sons de um tempo o relaxamento logo em seguida é fundamental para que o dedo possa fazer novo ataque. Para sons de dois tempos, a força no ataque é outro fator que determina a duração da vibração da corda

inteligente que permite à memória reter o modelo rítmico do metrônomo. A aluna adapta sua fala aos esquemas assimilados construindo esquemas de duração 2. Generalização do esquema rítmico da fala para o esquema rítmico do toque em pizzicato. Esta generalização gera uma acomodação esquemas dos espaços práticos e determina a técnica a ser usada 3. A representação

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professora pede que ela escreva do som através da escrita musical

3. Visão e tato controlam a ação de escrever o ritmo vivido no papel

gráfica através da notação tradicional é mais uma generalização do esquema de duração, agora simbólico

1. A professora corrige as notas que BEA escreveu e diz que ela acertou todas 2. Em seguida, ela pede à BEA que escreva 4 notas no segundo espaço seguidas de duas notas de dois tempos (para tocar na corda lá), depois ela pede que BEA pegue o violino para tocar 3. A professora coloca o caderno com as notas que BEA escreveu na estante de música, liga o metrônomo, e pede que, antes de tocar, BEA leia verbalizando: La,La,La,La,La-a,La-a:|| La,La,La,La|| [a professora corrige a escrita de FER enquanto BEA espera com o violino na mão] 4. A professora resolve pedir que BEA decore as notas que ela mesma escreveu. Descreve o esquema rítmico para BEA: “São 4 vezes notas de um tempo, duas de dois tempos, 4 vezes notas de um tempo, duas de dois tempos, e mais 4 vezes notas de um tempo, e acabou. Decorou?” A aluna abaixa a cabeça afirmativamente. A professora aperta o pedal do piano ao tocar um lá para afinar o violino e antes de BEA tocar o exercício. Enquanto a

Leitura e escrita de um ritmo com semínimas e mínimas. La,La,La,La,La-a,La-a:|| La,La,La,La||

1. espaço visual 2. espaço tátil (para escrever) e espaço visual (para controlar a escrita no papel). 3. Espaço bucal (fala) e visual (leitura)

1. Memória de reconhecimento, e coordenação dos esquemas táteis-cinestésicos, visuais e auditivos. 2. Memorização de um ritmo escrito: A aluna escreveu o ritmo e a professora pede que ela se lembre do que escreveu. É uma memória da representação de sons que ela ainda não tocou nem ouviu 4. A descrição solicita a memória no sentido estrito. Como a aluna já havia tocado junto com o metrônomo em outras aulas, a medida do tempo incorporada às durações das notas são

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professora faz isso, BEA brinca tocando nas teclas brancas do piano

agora acompanhadas de imagens da escrita que a representa. Pensando nas notas, a aluna é capaz de fazer um esquema de ação para tocar o ritmo em seguida. No entanto, a atitude espontânea de BEA é de brincar com o piano, tocando algo não determinado pela professora. A partir do contato espontâneo com o piano, a aluna explora inventando “rabiscos” musicais. Estas explorações são exercícios reflexos dos esquemas simples de apertar teclas, como o no jogo, há predomínio da assimilação. Vemos que a aluna o faz por puro prazer motor.

Afinação do violino: A aluna toca a tecla lá do piano (várias vezes) para dar a referencia para a professora, mas ao sentir que a professora mudou para o Mi, BEA segue explorando as outras

A altura da tecla Lá do piano é a referência para a afinação da corda Lá do violino de BEA

BEA toca com posição fechada e ouve o resultado da ação da professora. Enquanto ela

Memória de reconhecimento: a altura tocada num instrumento é

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teclas. precisa continuar ouvindo o Lá, BEA toca a tecla Lá do piano

reconhecida no outro instrumento. Quando esta altura é abandonada pela professora, a aluna parece se desligar da ação e continua a explorar o instrumento.

1. A professora pede que BEA olhe para a partitura de FER e diga o que está faltando. BEA diz: “Calma aí...deixa eu ver” – e busca a partitura que ela mesma escreveu. A professora a retém, e pede que ela tente se lembrar, e começa a cantar encorajando a aluna a ler o que FER escreveu: “La,La,La,La, etc.” BEA segue a leitura e constata que o resultado é diferente do que ela havia escrito e, portanto, o ritmo escrito por sua colega não está correto. A professora lhe pergunta: “Está faltando de dois ou de um?” Ela reponde: “de um”. A professora se vira para FER e diz: “Exatamente! Está faltando de um”. 2. BEA toca com pizzicati a sequencia de notas Lá, de memória, enquanto a professora toca um acompanhamento no piano que tem o mesmo ritmo na mão direita, mantendo a pulsação na mão esquerda. No final a professora brinca: “Você ia tocar mais ‘de dois’. Vou tocar de novo e não vou falar nada... vou tocar sem parar e

Sequencia rítmica escrita com semínimas e mínimas na altura da nota Lá.

1. Espaço visual e bucal - a fala. 2. Dedo indicador para tocar os pizzicati, e braço esquerdo e cabeça para sustentar o violino; o

Memória de reconstituição de um ritmo escrito pela aluna e evocado posteriormente por ela. A memória aí se apresenta pelo aspecto figurativo do som que a aluna já ouviu ao tocar, e também o aspecto figurativo da escrita que ela própria já realizou antes de tocar. Resta saber se, ao tocar, BEA se lembra da escrita. Representação visual e auditiva.

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você tem que parar onde você achar que tem que parar, ok?” BEA toca a sequencia sem se enganar.

ouvido também participa da ação pois a aluna toca em sincronia com o que ouve a professora tocando no piano.

La, La, La-a:||La,La|| Assim é o ritmo que FER tem que tocar. Ela toca, mas não mantém a pulsação, apesar de o metrônomo estar ligado. A professora pede que BEA diga se entendeu o que ela tocou. BEA nem reponde (está ocupada com a escrita). A professora e FER lêem juntas a verbalização e, em seguida, FER toca, desta vez, dentro da pulsação.

La, La, La-a:||La,La||

1. A professora chama BEA para ver “como é bonito o som do arco” - enquanto ajuda FER a passar o arco sobre a corda Lá puxando o arco de FER para baixo e para cima, e também contando as pulsações (1-2) e as pausas (1-2). Faz este movimento de ida e volta do arco durar 4 pulsações, e, sem orientar FER como deve continuar, vai para o piano para tocar “Atirei o pau no gato” como acompanhamento. FER não mantém a pulsação. Muda a direção do movimento do braço num tempo fora do ritmo. 2. A professora pára, aumenta o andamento do metrônomo “para que a aluna não se canse”, e ajuda novamente FER a passar o arco sobre a corda, só que desta vez pede “notas de dois”.

1 e 2. Uso do Arco para fazer uma sequencia de sons de duas pulsações sempre na corda Lá solta. Este som tem função de Tônica da melodia tocada no piano pela professora (neste caso, a melodia tocada foi ‘Atirei o Pau no Gato’)

1. Em pé, a aluna apóia o violino na mão esquerda e no ombro e cabeça. Já com a mão direita segura o arco. (espaço postural) O movimento para cima e para baixo do arco (espaço cinestésico) é conduzido pela professora que a ajuda a segurar o arco

1. e 2. A falta de autonomia de FER para realizar a ação na pulsação é intrigante. Será que ela não consegue controlar porque não ouve a pulsação do metrônomo? ou será que o movimento é tão cansativo para ela que isso a impede de controlar o tempo do movimento? Devido a ausência de

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Segurando o arco junto com FER, puxa o arco para baixo e fala: “1, 2”. Pára o movimento e fala: “1, 2”. Leva o arco para cima falando: “1, 2”. Pára o movimento e fala: “1, 2”. Deixa FER continuar sozinha, e vai para o piano para tocar “Atirei o pau no gato” como acompanhamento. Mas FER não mantém a pulsação outra vez. 3. A professora diz: “espera!” e continua a tocar, mas muda a estratégia. Ela toca melodias curtas só no momento em que FER está tocando, e no momento da pausa, mantém a mão esquerda tocando enquanto, com a mão direita, faz um gesto para a aluna esperar

3. o acompanhamento abandona a melodia ‘Atirei o pau no Gato’ e improvisa frases mais curtas que acompanham os movimentos do arco (com duas pulsações)

2. FER também não sincroniza o movimento com a contagem da professora quando o andamento é alterado 3. A aluna ouve a fala(espaço auditivo) e olha os gestos da professora (espaço visual) e, obedecendo estes comandos, consegue realizar a ação

autonomia, FER não consegue realizar a ação. 3. A professora percebe que deve simplificar as solicitações e realizar junto com ela a tarefa. FER reage melhor. Sua atitude é de obediência aos comandos visuais e instrucionais da professora

1. A professora pede que BEA pegue o arco, mas BEA quer mostrar um ritmo que escreveu. A aluna quer ouvir o que escreveu. Quer reconstituir um objeto - ainda não completo - que ela mesma está criando. A professora quer dar continuidade ao seu programa de aula e resiste a dar importância a esta iniciativa de BEA. A professora elogia BEA por ela já ter escrito pausas e semínimas. Quer que BEA toque o que escreveu no violino, mas BEA quer terminar de escrever. Depois insiste em tocar o ritmo escrito nas teclas do piano.

1. e 2. Ritmos escritos espontaneamente por BEA no seu caderno contendo semínimas e pausas de semínima

1. BEA usou a mão direita para escrever com o lápis (espaço tátil) e também os olhos para controlar o que escreveu (espaço visual). Mão direita com posição fechada no piano na região aguda, BEA percute o ritmo nas teclas aleatoriamente, realizando o ritmo que escreveu no seu caderno

1.Ao escrever BEA utiliza o pensamento reversível reelaborando através da escrita o que já havia imaginado. A imitação de uma imagem é a representação desta. Esta ação partiu de uma elaboração mental, para só depois vir a ser real. Ao tocar BEA materializou a imagem mental, mesmo que

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2. Pega o arco e toca no violino, e baixa o olhar para a câmera. Parece que a filmagem está interferindo no seu comportamento. [BEA não deixa a professora comandar a aula, quer determinar o que vai fazer. A professora escolhe uma partitura, coloca na estante do piano, mas BEA continua inquieta. Solta o arco na estante e começa a pegar coisas que estão sobre o piano]

2. Som do arco passando sobre a corda Lá.

2. Mão esquerda apoiando o braço do violino, e mão direita segurando o arco. Arco sobre a corda Lá.

esta venha a se dissipar imediatamente, já que ela tocou em teclas tão distantes umas das outras que dificilmente ela poderia repetir a ação da mesma maneira 2. A técnica para tocar o que escreveu no violino é mais conhecida por BEA. Assim, ela se intimida. E pára.

Sons de duas pulsações com o uso do arco: 1. A professora liga o metrônomo, toca ao piano um acompanhamento em ritmo binário com sua mão esquerda e com sua mão direita ajuda BEA a usar o arco para tocar sons de duas pulsações sobre uma corda do violino [levantando e baixando o arco segurando pelo talão]. Estes sons são intercalados por pausas de duas pulsações. 2. Mesmo depois de parar de receber a ajuda da professora no uso do arco, BEA não sai da métrica. Ela começa numa corda depois muda de corda, e a professora concorda. A intenção

1. Exposição do modelo rítmico sobre o qual a aluna fará o exercício com o arco sobre as cordas tocando durações de uma ou duas pulsações com ou sem pausas entre eles. 2. e 3. Durações de uma ou duas pulsações num andamento constante

Espaço auditivo: assimilação do andamento e da métrica Espaço cinestésico: a mão direita puxa e braço direito regula o ângulo para atingir a corda desejada.

1. Assimilação de um novo esquema motor: movimento do braço para o uso do arco com pulsação e durações. 2. e 3. vemos que BEA já conquistou a conservação da pulsação apesar das variações de corda e de duração

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parece ser deixar que BEA conserve a pulsação mesmo que as durações e cordas variem. É o trabalho do arco sobre as cordas na sua particularidade de “controle da duração sobre uma pulsação”. 3. BEA muda de novo, agora tocando sons de uma pulsação. A professora diz: “pode ser”. O interessante é que BEA se enquadra sempre na proporção rítmica. Se compararmos a adaptação da audição com o gesto entre BEA e FER, notamos que a de BEA é mais precisa

Postura e uso do arco: a professora solicita que BEA repita a ação anterior mas sua atenção se volta para dois pontos: 1.Lado esquerdo da aluna � são três pontos de apoio: o peito (espaleira) , a cabeça (apoiada levemente sobre a queixeira), e a mão esquerda segurando o violino. 2. Lado direito da aluna � a professora corrige a maneira de pegar o arco “sem apertar o arco, se não, o som fica duro, feio, ...” e ajuda BEA a sentir a força que deve usar sobre a corda, conduzindo o movimento de seu braço e dizendo: “leve, mais leve,... isso!” 3. BEA começa a tocar sons de uma pulsação e a professora passa a acompanhá-la ao piano. Sem parar de tocar, a professora volta a corrigi-la

Sons com durações de uma pulsação repetidos na corda Lá solta, em sincronia com o acompanhamento do piano

1. Mão esquerda: peito, espaleira e cabeça sustentam o violino. 2. Mão direita: a maneira como segura o arco determina o som. A leveza no deslizar o arco é a principal solicitação nesta ação. 3. O ângulo do braço direito deve manter o arco na corda certa

1. Adaptação do corpo ao violino; 2. Adaptação da mão direita ao arco e do arco ao violino; 3. Diminuindo a variação de ângulos do braço, busca-se o aperfeiçoamento daquele esquema motor. Lilia, aqui temos o uso de operações mentais sim, tendo em vista que a audição está

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quando ela muda de corda. Agora deve tocar sempre na corda lá. Depois de muitas repetições a sustentação do violino afrouxa e ela pára

funcionando junto com o motor

1.A professora vai ditando os comandos e BEA toca ouvindo a voz da professora e o acompanhamento do piano: “pausa- Ré- pausa – Lá, pausa- Ré- pausa – Lá, etc.” A professora elogia BEA pela conquista da “pausa” que ela não havia conseguido fazer na aula anterior. 2. Enquanto BEA escreve no caderno a sequencia que acabou de tocar: pausa- Ré- pausa – Lá, pausa- Ré- pausa – Lá, FER toca o mesmo exercício. No início FER tem dificuldade em esperar a pausa, e toca no tempo forte, depois de corrigida, e obedecendo ao comando gestual e verbal da professora, FER toca corretamente. 3. BEA mostra o que escreveu e a professora corrige escrevendo para ela algumas notas para que a aluna copie

1. Exercício de pizzicato nas cordas La e Ré do violino. 2. Escrita das notas do exercício no caderno. 3. idem

1. Coordenação dos espaços auditivo e tátil: tocando em pizzicato, BEA responde ao comando verbal da professora, sem ler. 2. Coordenando os espaços tátil e visual na ação de representar a ação através da notação musical, BEA revive internamente a ação a cada som que escreve.

1. e 2. A ordenação dos comandos é repetitiva, e assim, forma-se um esquema coordenado de dois sons: Lá- Ré e que pode ser generalizado. Trata-se de um esquema motor, fruto da “imitação” de uma instrução da professora que é generalizado. Vemos isso acontecer logo a seguir quando BEA escreve as notas no caderno. Ela escreve como pensa ser, mesmo sem saber que as notas tem um lugar específico na pauta [sabemos que na aula de EPEM ela ainda não praticou isto]. Nesta atividade podemos perceber o aspecto figurativo do conhecimento. O

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operativo estando potencializado nas transformações que as alunas venham a realizar futuramente com estes conhecimentos.

1. As duas alunas tocam juntas: a professora convida as alunas a tocarem pela primeira vez juntas. Enquanto as duas tocam a professora toca uma sequencia harmônica com o baixo em linha descendente (walking bass) o ritmo que as alunas tocam é igual ao da mão direita no piano. A professora vai falando o que as alunas devem tocar: “pausa-LA-pausa-RE”:|| Depois de elas fazerem várias repetições, a professora pára e as elogia com ênfase: “Muito bem! Nenhuma das duas errou! Deu tudo certo!” 2. Ao repetirem BEA toca a sequencia sem pausa: Lá-Ré-Lá-Ré. A professora convida FER a tocar da mesma maneira. Algumas vezes noto que elas trocam a sequencia fazendo Ré-Lá-Ré-Lá...

1. Sincronia de sons iguais tocados por dois sujeitos 2. Variação nas durações mas permanência da métrica usando as mesmas alturas Ré e Lá. Estas mudanças não são desagradáveis ao ouvido já que estas alturas possuem harmônicos comuns

1 e 2. Espaço auditivo: para controlar os ataques simultâneos; Espaço tátil: o beliscar das cordas; Espaço visual: controle da ação da mão direita

Abstração empírica da métrica, das duraçòes e das alturas tocadas no violino em cordas soltas. Além disso, o estabelecimento de códigos comuns que permite a socialização do fazer musical entre as alunas e a professora é possível pois as alunas compreendem o que lhes é solicitado e sabem como fazê-lo. Isso se dá graças à função simbólica – no caso em questão se traduziu por sons nomeados e localizados no tempo e no espaço- que permite trocas interpessoais.

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QUADRO 4: Aula de VIOLINO - 08 de junho de 2009 Horário: segunda-feira 11hs. Alunos: BEA, 7:11 anos e AGA, 8 anos. Alunas da turma de EPEM12. EL, 8:10 anos [aluno presente na aula, mas que não faz parte da amostra. Ele já toca piano, faz Epem 3]

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Enquanto BEA espera sua vez de tocar, ela conversa com EL e depois fica escrevendo no caderno de música. EL é chamado para tocar. Eu observo BEA. 1. BEA canta: “dim,dim, di-im, tem,tem, te-em”. BEA está criando uma música com o ritmo de duas semínimas e uma mínima. Quando chega sua hora de tocar, a professora pega seu violino para afinar. Olhando para a folha, BEA faz movimentos com o corpo, no ritmo da música que escreveu. A professora, alheia a isto, pega a folha da mão de BEA e diz: Está faltando resina no seu arco, você tem resina não tem? ” “tenho”, “ então pega lá.” BEA vai buscar.

1. Ritmo de duas semínimas e uma mínima escritos através das sílabas que BEA verbaliza.

BEA executa o ritmo que criou usando seu espaço visual ao ler o que escreveu, vocal ao pronunciar as sílabas, e cinestésico ao balançar o corpo no ritmo representado.

A criação de BEA partiu de elementos de duração trabalhados na aula anterior. Concluímos que houve a representação das relações de duração (som curto-som longo) e da métrica (repetição da relação estabelecida sem interrupção), e que nesta ação BEA está num nível de abstração superior ao da aula passada.

1. Neste momento, a professora lê o que estava escrito na folha: “pam,pam,pa-am; tom,tom,to-om; pim,pim, pi-im; chim,chim,chi-im;” Ela pergunta para BEA: “o que é isso?”

1. Elemento rítmico da composição de BEA: o ritmo de duas semínimas e uma mínima

1. Uso dos espaços visual e cinestésico.

1. Coordenando o espaço visual com a imagem aural do que escreveu, BEA se movimenta espressando assim o seu pensamento.

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3. BEA lê: “ Tem, tem, te-em...” - a professora pede que BEA cante para ela. BEA então começa a cantar sua música e a professora, ao ouvir, começa a improvisar um acompanhamento no piano. 4. Como BEA não consegue cantar as alturas da melodia com boa afinação, a professora sugere um desenho melódico para aquele ritmo, usando notas que ela possa tocar no violino. Tocando ao piano algumas possibilidades, a professora toca alguns exemplos e pergunta para BEA se ela gosta. 5. A professora pega o violino e coloca no queixo de BEA que se deixa à disposição da intervenção da professora, mas sem muito entusiasmo. BEA tenta pegar o arco, e a professora diz que ela deve “tocar sem arco ainda, para primeiro pegar as notas”. Pede que BEA toque para definir que notas ela

2. Decodificação da escrita não convencional de BEA pela professora 3.O improviso feito no piano tem compasso binário e harmonia em Lá maior. 4.Exemplos melódicos criados pela professora para o ritmo de BEA: La, mi,mi-i; La, mi,mi-i,... La, mi,mi-i; si, mi,mi-i; Do#, mi,mi-i,; Ré, mi,mi-i;

2. O ritmo que BEA criou está sendo expresso através de alguns espaços: o espaço bucal (pela verbalização das sílabas que escreveu no caderno e é lido pela professora); o espaço cinestésico (pelo balanço do corpo com que BEA dança). 3. Coordenação dos espaços bucal e visual durante a verbalização do ritmo por BEA . 4. A professora utiliza os espaços tátil e visual e aural. BEA utiliza apenas o espaço tátil e visual.

2. A aluna conseguiu representar suas idéias musicais através da escrita do som por letras, a ponto de sugerir à professora o ritmo que imaginou. Solicitando à aluna que explique o que ela escreveu a professora está induzindo BEA a realizar abstrações reflexionantes. 3. Como BEA ainda não consegue explicar, ela reproduz o que fez através da voz e isso possibilita agir ao mesmo tempo que BEA fazendo musica com ela. 4. Ao modificar o objeto criado por BEA a professora o recolocou como objeto a ser assimilado novamente pela aluna. Novos esquemas são criados e coordenados

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vai querer usar. BEA toca: La, mi, mi-i; La, mi, mi-i.

5. A escolha de BEA foi o desenho: La, mi, mi-i; La, mi, mi-i.

5. Ao invés de executar com a voz (espaço bucal), BEA executa as alturas com os dedos (espaço tátil) sobre as cordas do violino usando pizzicato.

com a imagem auditiva do ritmo já conhecido. 5. Ao levar BEA a usar pizzicato a professora está simplificando a ação. Embora o espaço entre os ataques seja respeitado neste tipo de toque, as durações dos sons não são considerados. A atenção de BEA é voltada para o parâmetro de altura.

1. A professora trabalha a posição da mão direita, que deve tocar com o dedo indicador “de lado”. Ela vai mexendo na mão de BEA para ajudá-la a chegar na posição correta. Elogia quando BEA consegue. BEA não mantém a posição e a professora refaz. 2. Com uma caneta pilot colorida, a professora desenha um ponto colorido no lugar do dedo indicador que BEA deve tocar na corda, e em seguida belisca de leve em volta deste ponto para sensibilizá-lo. Pergunta: “Sentiu?” BEA abaixa a cabeça afirmativamente. A professora então pede que BEA toque na corda usando este ponto do dedo que está sentindo.

1. Desenho melódico-ritmico: La, mi, mi-i; La, mi, mi-i, Dentro de um intervalo melódico de 5ª, dois sons curtos e um longo

1.e 2. A importância dada ao espaço tátil se deve ao fato de que o bom uso deste possibilita um melhor domínio das propriedades de intensidade e duração do som. Vemos nesta aula a ação se dar conjuntamente (BEA e a professora) e pela instrução. Aos poucos BEA adquire autonomia e realiza a ação sozinha.

1. acomodação motora tátil à corda do violino. 2. a aluna obedece à instrução sobre o ponto de contato do dedo sobre a corda.

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Neste momento a professora ajuda a colocar o dedo na posição e BEA vai tentando até que a professora diz que está correto.

1. A professora define um uso para as notas La e Mi com o ritmo proposto anteriormente por BEA, porque a aluna queria fazer algo mas não sabia como nem o quê. A professora então pega o violino e diz: “Você vai fazer o que eu vou mostrar para você” - e toca: La, La, La-a, Mi, Mi, Mi-i; La, La, La-a, Mi, Mi,Mi-i; La, Mi, Mi-i; La, Mi, Mi-i; La, Mi, Mi-i; La, Mi, Mi-i. 2. Em seguida a professora toca e canta com o nome das notas. 3. Depois pede que BEA repita cantando com o nome das notas como ela ouviu a professora tocando. Enquanto BEA canta, a professora vai mostrando os dedos da mão numa contagem das frases, e dizendo: “repete”, “agora o misturado”; o que ajuda BEA a identificar os desenhos melódicos, classificando-os de uma maneira intuitiva.

A estrutura musical ganha forma: La, La, La-a, Mi, Mi, Mi-i; La, La, La-a, Mi, Mi,Mi-i; La, Mi, Mi-i; La, Mi, Mi-i; La, Mi, Mi-i; La, Mi, Mi-i. Esta repetição dos elementos e a coordenação rítmica dos dois com uma certa simetria cria um “espaço sonoro” de fácil assimilação. 3. I. La, La, La-a, Mi, Mi, Mi-i; II. La, La, La-a, Mi, Mi,Mi-i; III. La, Mi, Mi-i; La, Mi, Mi-i; IV. La, Mi, Mi-i; La, Mi, Mi-

1.Ao ouvir a professora recriar algo sobre o elemento rítmico criado por BEA a aluna utiliza o espaço visual e auditivo. 2. a professora utiliza o espaço bucal, mas BEA continua utilizando os mesmos espaços visual e auditivo. 3. Ao cantar, BEA coordena os espaços auditivo, bucal e visual.

1. BEA reconhece o ritmo criado por ela e entra em processo de assimilação do desenho melódico que a professora criou. Ao ouvir, e ver a ação da professora, ela está assimilando a maneira de realizar no violino sua idéia rítmica. 2. ouvindo a melodia com os nomes das notas é como se a professora estivesse mandando as instruções de onde ela deve colocar os dedos nas cordas. 3. Os elementos descontínuos de cada frase formam um todo fácil de reconhecer pela ordenação que BEA já constituiu mentalmente.

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4. Depois de BEA fazer isso duas vezes, a professora pede que ela toque no violino (uma vez sentada, e outra vez de pé). 5. Quando a aluna se posiciona para tocar em pé, a professora a ajuda a aperfeiçoar a posição para tirar uma foto. Durante a preparação da foto, a inclinação do dedo indicador, a altura do cotovelo e a inclinação da cabeça são pontos que tanto a professora como a aluna procuram manter na posição correta. Depois de feita a foto, a professora mostra a posição do dedo para a aluna e pede que ela repita a posição para não esquecer.

i. 4. idem 5. Não há estrutura musical sendo trabalhada.

4. Ao passar do canto ao violino, o espaço bucal é substituído pelo espaço tátil, mas o espaço auditivo continua com a função de controlar a ação. 5. Espaço tátil e postural para construir a imagem perfeita da posição de tocar a nota Lá com pizzicato.

As frases estão sendo representadas pela mão da professora que as ordena por sequência: I, II, III, IV. Os gestos funcionam como um código de cada frase aos quais BEA reage cantando corretamente. 4. A coordenação dos espaços práticos adquire uma velocidade maior graças ao exercício e à imagem mental das frases que, ao anteciparem o todo da ação possibilitam ao sujeito planejar a ação. 5. A imagem da posição constitui parte do aspecto figurativo do conhecimento em construção: aprender como fazer música utilizando o violino.

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QUADRO 5: Aula de VIOLINO - 15 de junho de 2009 Alunos: AB, 7:11 anos e AGA, 8 anos. Alunas da turma de EPEM12. [EL, 8:10 anos (aluno presente na aula, mas que não faz parte da amostra. Ele já toca piano, faz Epem 3]

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Preparação do instrumento: a afinação é uma prática a qual os alunos são expostos, mas que neste momento ainda está sob responsabilidade da professora. No entanto, o resultado da ação da professora é testemunhado pelos alunos e é sempre esperado por eles. É diferente dos alunos de piano, que sentam e começam a tocar no teclado. Os batimentos e afinações de cada corda são percebidos por todos. Enquanto a professora se dedica a esta tarefa, BEA se entretém com a colocação da espaleira, atividade na qual ainda está se aperfeiçoando. Ela explora o objeto e vai tentando entender como funciona. A necessidade do uso da espaleira existe porque o violino deve ser adaptado ao corpo, mas deve manter-se um pouco desencostado deste para que não perca a vibração de sua caixa de ressonância. Em seguida, BEA passa resina no arco. Ela faz movimentos com a resina sobre toda a crina do arco. A importância de espalhar bem esta substancia é que ele adere à crina do arco permitindo que o arco não escorregue sobre as cordas. Assim, pelo atrito, ele faz vibrar a corda.

A afinação é fundo na ação de BEA. Ela foca sua atenção no encaixe das garras da espaleira ao corpo do violino. Já FER está atenta à ação da professora. Nas aulas anteriores ela nem pode tocar por que seu violino não mantinha a afinação. No caso da espaleira vemos que os esquemas visuais e táteis que a aluna tem do objeto ainda estão se adaptando ao objeto.

Na ação da professora estão em jogo o tato, a cinestesia (tanger das cordas e regulação das cravelhas) coordenados à audição que avalia o resultado daquela ação. O som do piano é referencia para a afinação das cordas do violino. Ela toca o piano e o violino e vai igualando o som. Assim, os alunos observam (espaço visual) e ouvem (espaço auditivo) uma ação que futuramente farão sozinhos.

Esta experiência, repetida em todas as aulas, torna-se a experiência a ser imitada, primeiro internamente, depois externamente pelo aluno. Por enquanto eles assimilam uma ação e seu resultado através de abstração empírica. Aprendem que é importante afinar o instrumento para ser possível tocar os sons que todos esperam ouvir e também para que o violino e o piano soem afinados um ao outro.

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Após a afinação dos violino, a professora diz que hoje as alunas fariam uma coisa mais difícil que era tocar juntas. BEA se atrapalha pois quer olhar para os dedos e deixa de olhar a partitura. A professora lembra que elas devem aprender a seguir a partitura, pois na orquestra não haverá ninguém para apontar a partitura para elas se acharem. Orienta as alunas que, no caso de se perderem na hora do ensaio, devem se orientar pelos colegas e pelos momentos de pausas dos violinos.

Não há. Elas estão preparando uma peça orquestral “Faz de Conta”. Elas tem que tocar em pizzicato, seguindo a partitura, que tem indicação de dinâmica, (f e p). Os conteúdos são semínimas, pausas de semínimas, que devem ser nas corda Ré solta. Além disso elas tem vários compassos de pausas para contar durante a peça.

Não há. Instrução sobre o funcionamento do ensaio.

1.A professora lembra as alunas que elas estavam fazendo notas de um tempo e de dois tempos. A professora explica que na partitura que elas estarão tocando na orquestra, elas terão a nota Ré, e terão que acompanhar o coral, o piano e os trompetes, tocando “uma nota de um tempo, sempre juntas”. 2. A professora coloca a partitura na estante e mostra para BEA e FER que no início da música tem alguma coisa escrita (o número 4), e que elas tem que entender que é o piano que toca neste começo. Elas tem o número 4 porque terão que esperar 4 compassos antes de começar a tocar. 3. A professora toca a parte do piano, e dá a entrada para as alunas que começam a tocar juntas, em pizzicato, na corda Re [só que BEA toca na corda Sol por engano, a professora

1.Na partitura que elas estão tocando, elas terão a nota Ré, e terão que acompanhar o coral, o piano e os trompetes tocando uma nota de um tempo. 2. Símbolo de pausa de 4 compassos. Há uma introdução durante a qual as alunas têm pausa de quatro compassos: 3. Nos 4 primeiros compassos o piano toca sozinho no agudo. Nos 4 compassos seguintes, os

1. Espaço visual e auditivo 2. Espaço visual – decodificando o signo da pausa. 3. Com o violino colocado no queixo, mão esquerda sob o braço do violino, e dedo indicador

1e 2. Espera-se que as alunas imaginem o que vão fazer no momento do ensaio. Olhar para os signos das pausas, ouvir o piano tocar e aguardar o sinal de entrada dado pela maestrina. 3. Ao ouvirem a parte do piano, as alunas assimilam a melodia total da música

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corrige - elas param e recomeçam]. FER pergunta qual é a corda e a nota Ré. A professora mostra no violino e na partitura. Manter-se em pé nesta posição exige uma resistência física. FER que é mais velha e maior, agüenta ficar mais tempo e melhor nesta postura. BEA no entanto, não tem prontidão para isso. Vejo que ela segura o violino com o cotovelo esquerdo apoiado na própria barriga e algumas vezes sai da posição com um gesto de alívio. 4. FER toca uma vez sozinha. Às vezes cai o andamento e a professora faz gestos mais vigorosos e fala “não atrasa!”. Depois que FER pára, a professora diz: “quando você vai tocar é só soltar o dedo, não precisa... você deixa muito duro o dedo, e acaba atrasando.” Pede para FER tocar de novo e vai apontando as notas. FER não mantém a pulsação e toca fora do tempo. A professora pára e diz: “Não, agora foi antes. Tem que ouvir a música e ‘fazer quando cai’...a aluna toca mais uma vez, e noto que a professora canta mais lentamente para se adaptar à pulsação de FER. 5. A professora propõe que FER compare as duas frases que ela irá tocar pois elas são diferentes:

trompetes (a professora toca a parte destes instrumentos no piano) tocam na região média um desenho diferente do desenho anterior. Depois é a entrada do coral que canta a seguinte letra: “Fazia tudo de conta, fazia tudo de conta, fazia tudo de conta, fazia tudo de conta. Fazia, fazia, fazia tudo de conta. Fazia, fazia, fazia tudo de conta.” A música tem compasso binário, e os violinos tocam a nota Ré repetida a cada pulsação. Depois elas tem alguns compassos em que tocam uma pulsação e fazem pausa na pulsação seguinte, para depois voltar à primeira ação - uma nota para cada pulsação. 4. idem 5.Compassos com duas semínimas e compassos com uma semínima e uma pausa

da mão direita tocando em pizzicato na corda ré solta. 4. Os espaços tátil (pizzicato) e visual (leitura) e auditivo (manter-se na pulsação através da referencia visual da regencia). 5. A aluna ouve a análise da professora. Espaço auditivo e visual.

orquestral, na qual farão apenas uma parte. Parte /todo. Como na aula de EPEM o nome da nota ainda não é trabalhado, estes são símbolos específicos da ação que realizam na aula de violino. Se referem às coordenação que realizam para tocar. 4. O “fazer quando cai” se refere ao movimento da regência que marca o tempo no espaço. A professora usa o recurso visual da regência como uma imagem da simultaneidade temporal da pulsação e do som que FER deve tocar. O andamento constante e a pulsação são os esquemas que a aluna deve conservar em sua ação, mas por problemas de

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Na primeira você toca 1,2|1,2|1,2; e depois tem: “toca, pausa| toca,pausa| toca, pausa”. 6. A professora canta e aponta cada nota ou pausa para FER ler. FER toca na pulsação correta. Elas fazem isso duas vezes.

de semínima, sempre na nota Ré. 6. idem

6. espaço tátil (pizzicato), visual (leitura) e auditivo.

coordenação de esquemas práticos, ela não atinge o objetivo. A coordenação dos esquemas envolve o retorno à posição inicial do dedo logo após pinçar a corda. A reversibilidade do pensamento ainda não atingiu a particularidade desta ação. 5. Vemos neste caso que a professora respondeu pela aluna, mantendo o saber consigo. A aluna ouve e assimila um saber. 6. a aluna reproduz um saber corretamente, mas não sabemos se construiu um conhecimento.

1. É a vez de BEA tocar a mesma partitura. Ela segura a parte do corpo do violino com a mão esquerda, apoiando o cotovelo no corpo. A

“Fazia de conta”: peça orquestral em compasso binário simples. A parte que

Espaços tátil, auditivo e visual: mão esquerda usada para apoiar o

A pulsação se conserva invariante e para isso é necessário que a

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professora não a interrompe neste momento. Na frase com pausas a professora avisa “agora com pausa”, BEA faz a pausa depois da hora e inverte pausa e som. Agora sim, a professora a interrompe dizendo: “está ao contrário”. A professora tem tolerância com os erros de postura pois o objetivo é que BEA acompanhe a leitura da partitura, e faça os pizzicati na corda correta e no tempo certo. A professora encoraja BEA, elogiando-a no que ela faz certo. Ela repete mais duas vezes. Só na terceira vez, a professora fala da mão esquerda: “segura aqui”, corrige mas sem dar muita ênfase para isso. FER toca a mesma coisa e noto que seus movimentos estão mais coordenados.

a aluna toca em pizzicati contém a nota Ré, duas semínimas por compasso, e em alguns deles, uma semínima e pausa de semínima por compasso. Nesta peça temos um padrão ritmico: uma pulsação com som e outra em silencio. Na maioria das vezes o som é no primeiro tempo e o silencio pode aparecer no segundo tempo, exceto no final, quando há inversão desta ordem num dos últimos compassos.

violino. Enquanto os olhos de BEA seguem o desenho melódico da esquerda para a direita, sua mão direita tange a corda Ré (solta) no momento em que ela reconhece a nota Ré (em semínima na 4ª linha da clave de sol). Seu ouvido confere se sua ação está correta e se está sincronizada com a pulsação da melodia e o acompanhamento que a professora faz ao piano.

criança intua uma identidade simples: a semínima e a pausa de semínima tem a mesma duração. Outra invariante é a ordem em que este padrão é apresentado. Quando a ordem das semínima e pausa se inverte, a aluna se confunde e erra. Assim como numa reação circular, o ritmo repetitivo se mantém e a alteração deve ser preparada. Por enquanto, a aluna não tem autonomia para pensar nisso, e a professora faz o papel que futuramente seu raciocínio fará, prevendo esta diferença no comportamento.

1. Em seguida as duas alunas tocam juntas com o acompanhamento do piano e o canto da professora. A professora diz que elas “só não podem se perder no olhar a partitura”. As duas alunas tocam mais uma vez juntas, mas

1. idem

1. Espaços visual e auditivo são coordenados com os esquemas táteis ao tocar em pizzicati. A continuidade do olhar

1. esquema visual de seguir a partitura em sincronia com o canto da professora.

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tocam a peça toda até o final. 2. A novidade desta é que no final elas tem que contar alguns compassos de pausa e no ultimo compasso elas tem pausa no primeiro tempo e tocam no segundo. Isso parece difícil pois a continuidade é interrompida, apesar de haver a pulsação igual, as figuras serem as mesmas. 3. A professora vai contando os compassos de pausa, mas ela dá um comando errado: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, (1-pausa). Houve um erro da professora aí. O comando foi (1 = som e pausa=silencio). Como conseqüência, as alunas erraram. 4. A professora explica que elas tem pausa antes e o som depois. Propõe de elas tocarem desde o 6º compasso de pausa, e elas acompanham a professora que, balançando o braço na pulsação, vai mostrando com os dedos no ar e contando a ordem dos compassos: (6,)(7,)(8,)(9,)(pausa-toca). O comando foi correto e as alunas acertaram. Elas treinam novamente a partir do 7º compasso. Acertam de novo. A professora diz: “ótimo!”

2. A intensidade forte é solicitada pela professora nos últimos compassos. 3. idem. 4. idem.

parece garantir que a decodificação se transforme em reações motoras. 4. espaço visual – acompanhar a regência e a partitura; espaço auditivo – contagem de compassos. O estímulo correto é o gesto e a contagem audível pela professora.

2. idem ao anterior. 3. erro de instrução 4. A resposta é o tocar no tempo certo com os dedos no lugar certo do instrumento. A localização da ação no tempo passa pela classificação e ordenação dos compassos em que a ação é igual até atingir o compasso em que a ação deve ser diferente.

Mais uma repetição da peça toda. Desta vez a professora liga o metrônomo na velocidade de 90 batidas por minuto.

O andamento é agora trabalhado com o uso do metrônomo.

As alunas têm que manter a posição ereta do corpo, tocando em pé,

A centração do sujeito não será somente em relação à sua própria

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Ela recomenda que as alunas que tiverem metrônomo em casa podem treinar nesta velocidade. Ao tocarem a professora tentou apontar para as alunas enquanto tocava ao piano, seguindo pela grade da partitura da orquestra, os temas melódicos dos outros instrumentos. Num dos momentos em que só olhou para a partitura das alunas a professora não reconheceu onde estaria na grade da orquestra. Elas tiveram que parar. As alunas estavam corretas, mas a professora pediu que elas recomeçassem da letra “K” da partitura. Desta vez as alunas atrasaram numa parte em que a professora não cantava. A professora olha e diz para FER não endurecer os dedos. [Será que não foi a ausência de parâmetro rítmico da voz da professora que afetou a pulsação de FER?]

As marcação das seções da partitura, para estudar partes da musica, repetindo da letra “K”, ou da letra “M”, etc., simulando uma situação que elas poderiam viver nos ensaios da orquestra, quando são comuns as interrupções acontecerem. A simultaneidade de sons que acontecem na atuação de uma orquestra está sendo simulado pela professora através do uso do piano e da sua voz. Na aula no entanto, toda a atenção está voltada para a ação das alunas, e elas estão sendo amparadas por gestos exclusivos da professora para o que elas tem que fazer. Se elas atrasam, a professora canta marcando o tempo com a voz, balança os braços, toca no piano as notas que elas estão tocando no violino, enfim, elas não estão sozinhas. Quando estiverem no ensaio da orquestra elas levarão

segurando o instrumento e olhando em direção à partitura. Devem ouvir as interferências de outros instrumentos simulados pelo piano e voz da professora, para se habituarem àqueles sons e não interromperem a própria ação.

ação, mas à do grupo ao qual irá se inserir. Nesta aula estão sendo apresentadas as regras do “jogo do ensaio de orquestra”. Os sujeitos estão assimilando não só a leitura da partitura, mas as ações sempre coletivas às quais terão que se enquadrar, tais como: a contagem a seguir, a pulsação, as paradas, as entradas.

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com elas as lembranças desta experiência que as ajudarão a reagir às regras daquela situação grupal.

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QUADRO 6: Aula de VIOLINO - 22/06/09 Horário: segunda-feira 11hs. Alunos: AB, 7:11 anos e AGA, 8 anos. Alunas da turma de EPEM12. [EL, 8:10 anos (aluno presente na aula, mas que não faz parte da amostra. Ele já toca piano, faz Epem 3]

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

A. Depois de AGA tocar as notas “Lá-Si-Do#-Ré-Mi” a professora lhe fala: “O que você acabou de tocar é [cantando a sequencia ascendente] Lá-Si-Do#-Ré-Mi. Agora o que você vai tocar é assim [e toca ao piano as mesmas notas, só que em movimento descendente].

Pentacórdio de Lá Maior em movimentos ascendente e descendente, a ser tocado na corda Lá do violino.

A. espaço auditivo e visual

A. Assimilação via reconstituição dos esquemas auditivos (reconhecimento auditivo da ação recém acabada). Esta reconstrução vai além da reconstituição pois vai da ordenação dos sons no sentido direto para sua reconstrução no sentido inverso. La�Mi; Mi �Lá

B. A professora ajuda AGA a colocar os dedos na corda LA e pede que ela aperte a corda, ajudando-a a colocar os dedos da mão esquerda no lugar correto para produzir os sons do pentacórdio. 1. Com a mão direita tocando em pizzicato, (solo) e com o acompanhamento de harmonias que a professora toca ao piano;

Pentacórdio de Lá Maior em movimentos ascendente e descendente, a ser tocado na corda Lá do violino.

B. coordenação dos espaços tátil, auditivo e cinestésico. 1. Para tocar em pizzicato, a aluna entra em contato direto com a corda Lá usando os dedos

B. Reconstrução da sequência para exercício dos esquemas motores para a escrita.

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das duas mãos. Os da direita fazem vibrar a corda Lá quando pinçada e os da esquerda definem o comprimento da mesma corda alterando assim a altura do som.

Nesta aula AGA toca apenas o som fundamental do pentacórdio (nota Lá) deslizando o arco na corda Lá; ela concentra sua atenção na posição da mão direita segurando o arco, deslizando-o sobre a corda. A professora ajuda AGA a manter o arco perpendicular às cordas. AGA diz que o braço esquerdo está doendo [de segurar o violino], relaxa um pouco depois continua. Percebo que a professora tenta exercitar a resistência muscular da aluna encorajando-a ao dizer “já está acabando...” Para finalizar o uso do instrumento, AGA toca o pentacordio ascendente e descendente em Pizziccato.

Pentacórdio de Lá Maior em movimentos ascendente e descendente, a ser tocado na corda Lá do violino.

Espaço postural: sustentação do violino com o braço esquerdo permite o ângulo do arco e dos movimentos livres do braço direito Espaço cinestésico: o ângulo do arco em relação às cordas exige uma coordenação espacial realizada pelo braço e pelo tato. Tátil:Para tocar com arco, a mão direita deve dominar o movimento do arco que exercerá o controle da duração do som assim como da sua intensidade.

AGA realiza uma abstração empírica da duração contínuo pelo uso do arco, mas sua atenção está voltada para a ação que ela mesma faz, sem se importar muito com o resultado sonoro. No entanto, todo o seu corpo está construindo esquemas (posturais) que são novos para ela. Podemos sugerir que a dor que o braços esquerdo sente é devido ao inusitado exercício estático que seus músculos começarão a fazer de agora em diante.

A aluna escreve essas notas no caderno. AGA pergunta: “em bolinha, não é?”. A professora

Escrita das notas La, Si, do, Ré, Mi no pentagrama

Espaço visual e tátil, agora para a escrita.

Para AGA a representação dos

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diz: “Sim, bolinha.” Ao terminar de escrever as notas do pentacórdio de La a professora corrige. AGA não sabia onde escrever as notas no pentagrama. A professora lhe diz que elas vão trabalhar isso na próxima aula.

sons La, Si, Do, Ré, Mi está ainda sendo contruída através de ação. A representação escrita deveria ser posterior, pois ela demanda uma reflexão sobre a ação de tocar ou cantar, os esquemas que envolvem estas ações e o código convencionado socialmente como significante. Falta ainda uma reflexão sobre o significado de linhas e espaços e as marcações de símbolos que representam sons práticos.

Após a professora ter afinado os violinos de BEA e FER , elas lêem a partitura da orquestra que tem compasso binário simples, na corda Lá [solta]. A professora toca a parte delas e também canta a melodia do coral. 2. BEA toca sozinha, e a professora corrige sua postura. Principalmente a posição da cabeça, que a aluna sempre desencosta do violino. As contagens dos compassos de pausa já foram memorizados e a aluna sorri ao tocar na hora

A parte das alunas é composta de notas repetidas [sempre a nota Lá]. Elas têm que manter a pulsação, tocando sons de uma pulsação repetidos ou alternando som e silêncio nos dois tempos de cada compasso.

A mão esquerda sustenta o violino enquanto a direita belisca a corda solta. Este gesto é simples e a atenção se volta para a leitura. Os olhos seguem a partitura e o indicador da mão direita simplesmente reage ao estímulo

A decodificação da escrita supõe uma ordenação dos sons, uma classificação rítmica dentro das durações possíveis naquela métrica. A fluência observada nesta aula é resultado do domínio técnico

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certa. No entanto, ao balançar o corpo no ritmo, ela sai da postura correta para tocar.

recebido pela visão da partitura.

sobre o pinçar a corda solta no tempo certo em sincronia com os sons do piano e a voz da professora. Talvez o que leve BEA a sorrir seja o prazer do reconhecimento da melodia e da letra (que a professora está cantando) e da eficácia de seu desempenho.

1. A professora ajuda BEA a colocar os dedos da mão esquerda nos pontos da corda LA e, ao tocar em pizzicato com a mão direita, ouvimos os sons produzidos pela aluna e o modo de tocá-los anunciado pela professora: “Corda solta - La, um dedo - Si, 2 dedos - Do, 3 dedos - Ré, 4 dedos – Mi.” 2. A professora pede que BEA cante usando os nomes das notas [La, Si, Do, Ré, Mi] e diz que está avaliando a aluna, e ela entoa afinado. Pede que ela toque mais uma vez com os dedos nos lugares certos. Primeiro que toque o Lá [ajuda BEA a colocar a mão esquerda].

Construção de graus conjuntos tocados na mesma corda (Lá).

1. Espaços tátil, visual e auditivo. 2. Espaços tátil, visual, auditivo e bucal.

1. Abstração empírica sobre as alturas possíveis de serem tocadas na corda Lá ao usar os dedos vizinhos da mão esquerda. 2. Ao cantar o nome das notas a aluna nomeia cada posição identificando-as e ordenando-as numa sequencia lógica de alturas construídas umas sobre as outras na mesma corda.

1. A professora propõe um jogo: encostando cada um dos dedos no polegar [que representa a corda], ela vai dizendo os nomes das notas

1. Nome das alturas La, Si, Do, Ré, Mi e dedo correspondente para tocá-las

1 e 2. espaço tátil e auditivo

1. A indução do modo de fazer é comandado pela professora. A

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[simulando as posições que as alunas acabaram de tocar]. “Sem dedo nenhum é o Lá, Si [mostra o indicador encostando no polegar], Dó [mostra o dedo médio encostando no polegar], Ré [mostra o dedo anular encostando no polegar] e Mi[mostra o dedo mindinho encostando no polegar].” 2. Depois a professora vai falando o nome das notas aleatoriamente, e as alunas devem encostar o dedo certo no polegar e imaginar que estão fazendo a posição da nota na corda Lá. A professora pergunta para FER se ela acertou todas as posições durante o jogo. FER responde que se enganou no Dó, pois pensou que devia encostar o dedo anular. A professora aponta os dedos de FER e fala os nomes das notas que eles tocam “La”[sem dedo nenhum]-Si-Do-Ré-Mi”.

na corda Lá do violino.

aluna obedece e repetirá (através evocação) a instrução para realizar o jogo. 2. Relacionando o tato ao nome da nota, o que se procura com este exercício é treinar a ação dos dedos ao estímulo do nome das notas, os dedos se tornam significantes das alturas que eles preparam ao tocar na corda Lá.

1. A professora volta a treinar BEA colocando gradativamente os dedos da aluna na corda LA e também vai cantando o nome das notas e corrigindo a posição dos dedos da aluna enquanto BEA toca a corda com a mão direita em pizzicato. 2. A professora tira o instrumento da aluna e pegando a mão esquerda de BEA, colocando a própria palma da mão [simulando a oposição da corda] sob as pontas dos dedos de BEA, mostra-lhe como seus dedos devem ficar arredondados em relação à superfície da corda.

Construção da noção de graus conjuntos tocados na mesma corda (Lá).

1. Espaços tátil, auditivo e visual. 2. Espaço tátil.

1 e 2. A posição dos dedos está sendo moldada. Supomos que a posição aprendida se constitui como modelo [a aluna vê e sente como a professora coloca seu dedo no violino]. Após algumas repetições estará pronto um esquema motor baseado na imagem

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3. Ao repetir a sequencia La-Si-Do-Re- Mi, pede que BEA repita o Mi muitas vezes. Neste momento, BEA relaxa a posição do corpo, encostando-se no piano. A professora pede que ela não encoste no piano e que mantenha a postura. A aluna se esforça e repete o Mi e enquanto isso, a professora leva a mão ao piano e acompanha a aluna com uma harmonia sempre igual, em quaternário.

3. Espaços tátil, auditivo e visual.

mental desta experiência, o que tornará possível sua imitação diferida. 3. Abstração empírica da nota mi. A posição da mão esquerda é mais difícil de realizar. O incomodo da posição e a fadiga podem ter levado BEA a se desconcentrar da ação. Ao acompanhar a aluna com o piano, a professora dá ao som um outro conteúdo – o harmônico – que é percebido e abstraído empiricamente pela aluna.

1. A professora pede que BEA escreva no caderno o que acabou de tocar enquanto trabalha com FER. Ao corrigir o dever, a professora escreve uma vez a seqüência La-Si-Do-Re-Mi ao mesmo tempo que canta cada nota. Em seguida pergunta para BEA com quantos dedos toca o Lá. Ela reponde “nenhum”. “Então a gente escreve “0”. E o si?” BEA fica em silêncio. A professora dá a resposta e escreve no caderno: “Um... e o Dó?”

1e 2. Escrita das notas La-Si-Do-Re-Mi com a indicação do dedilhado sob cada nota.

Visual: os espaços práticos estão servindo de referencia figurativa, estão presentes nas imagens mentais ao serem recordados os dedos utilizados para realizar os dedilhados que ela registra na partitura que está

Abstração reflexionante sobre a ação de tocar as notas La-Si-Do-Re-Mi. Ao perguntar para a aluna como deve tocar cada altura, a professora a leva a explicar a ação “para tocar o Lá não uso nenhum dedo da mão

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BEA diz :“Dois”. “E o Ré?” –pergunta a professora. – “Três” - diz BEA. A professora escreve: “Três”. “E o Mi?” - “Quatro” - responde BEA. A professora continua escrevendo no caderno e vai explicando para BEA, “quando você estava tocando com 4 dedos [escreve a nota Mi – 4 dedos], depois tirou um ficou com três [escreve a nota Ré – três dedos]; depois tirou um ficou com...”dois” – responde BEA; “depois tirou um ficou com...”um”- responde BEA; depois tirou um ficou com...”Zero” – “Zero dedos. É isso que você tocou”- diz a professora e canta em seguida a subida e a descida do pentacordio. 2. BEA vai começar a copiar e a professora ainda recomenda: “É uma nota no espaço e uma nota na linha, tá?” BEA se enganou na escrita da linha descendente trocando notas de linha por notas de espaço.

escrevendo.

esquerda, pra o si, uso um dedo”, etc. 2. Esta instrução leva a aluna a evocar a imagem mental do pentagrama e a organização espacial das notas para que elas sejam “significantes” corretos dos sons que devem representar. Ao construir a linha ascendente a aluna teve mais facilidade, mas na descendente não foi bem. Talvez pela falta de exercício do pensamento reflexivo, ou seja, pensar no som através de sua representação. Outra hipótese é que a reversibilidade ainda é não está muito ativada e o movimento descendente, por ser a inversão do ascendente, exige a reversibilidade, que ainda falha.

A outra aluna escreve e então a professora a O som fundamental do Espaço tátil, auditivo e O uso do arco leva

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chama para tocar com o arco só na corda LA. Enquanto fazem isso, a professora acompanha ao piano 4 1 * * */1 * **// 4 1 [ [ [ / 1 [ [ [ //

pentacórdio de Lá com durações e métrica quaternária.

cinestésico. BEA às abstrações empíricas das durações que produz e das descontinuidades do som “Lá” interrompido por pausas. A coordençào dos espaços práticos se complexifica e BEA mostra que já conserva a pulsação pois consegue se manter na mesma pulsação que o piano.

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ANEXO 5

ANALISE DAS AULAS DE VIOLONCELO

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QUADRO 1: Aula de VIOLONCELO - 14/05/09 Sujeitos: FRA. Idade: 11;8 anos; [CAR, 12 anos; Epem 2; LAR, 12 anos Epem 2; BRE, 11 anos, Epem 2.]

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

1.Afinação do instrumento Vibração das cordas de alturas definidas: (Lá/Ré/Sol/Dó)

Espaço auditivo. A afinação dos sons das cordas soltas vai se tornando a referencia para a construção dos outros sons da escala

Abstração empírica da afinação das cordas soltas do violoncelo

2. A professora solicita à turma o uso do arco: mostra como devem fazer e vai explicando e corrigindo: “só talão, cada vez numa corda (Lá/Ré/Sol/Dó), sempre no mesmo local, arco livre, mais para baixo, perto do cavalete”.

Exploração física das partes do instrumento: vibração das cordas de alturas definidas (Lá/Ré/Sol/Dó); a colocação do arco perto do cavalete o adapta melhor para melhor fazer vibrar as cordas.

Visual: Os alunos olham a ação da professora e imitam Tátil-cinestésico: a mão direita segura o talão e o braço movimenta o arco para fazer vibrar a corda Postural: ao receber instruções para modificar a altura do arco sobre a corda o aluno ajusta a postura Auditivo: o ouvido identifica o resultado sonoro da ação tátil-cinestésica.

Imitação de ações ajudam na assimilação dos esquemas táteis e cinestésicos para as futuras execuções.

3. Nova instrução: “agora vamos para a Ponta” (Lá/Ré/Sol/Dó) “em baixo- em cima”

Vibração das cordas de alturas definidas: (Lá/Ré/Sol/Dó).

Idem. Imitação de ações ajudam na assimilação dos esquemas táteis e cinestésicos para as futuras

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A professora corrige a postura dos alunos, lembrando que eles não devem deixar o braço direito cair.

execuções.

4. A professora escreve as notas desde o dó grave da clave de fá (Do1), passando por todas as notas até o Re 3. Ela marca as notas Dó1; Sol1; Ré2; La2 no quadro, como referência para as cordas soltas do violoncelo.

Notação musical convencional das alturas de Dó1 até Ré3, com realce para as notas que representam os sons das cordas soltas do violoncelo (Lá/Ré/Sol/Dó).

Espaço visual. Após a vivência auditiva do produto de sua ação, os alunos assimilam o código socialmente estabelecido como significante para os sons (significado) que produzirão no instrumento. A escala é a série básica sobre a qual outras combinações de som serão construídas formando objetos musicais. Nesta explicação a professora leva os alunos a identificarem os signos na partitura para os sons das cordas soltas. Estes serão os pontos referenciais sobre os quais eles terão que construir os outros signos.

5. A professora escreve no quadro negro as notas da melodia “Ode à Alegria” de Beethoven. Mostrando aos alunos os pontos de referência da pauta para a mudança de corda no violoncelo.

Notação musical convencional da melodia “Ode a Alegria” de Beethoven Marcando as notas da melodia que são tocadas nas cordas soltas do violoncelo

Espaço visual. Os alunos lêem os signos e imaginam os movimentos que farão ao tocar. Os sons das cordas soltas são pontos de referencia para as mudanças de corda e por isso, na notação estes são pontos de referencia importantes. É graças a eles que FRA e seus colegas podem localizar a ação das suas mãos sobre o instrumento enquanto pensam nas

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transformações do som que a partitura sugere.

6. A professora explica os sinais tradicionalmente simbolizados na notação para violoncelo: “[“ que é “a cara do talão”, vem dos “arcos nobres” e é um sinal que indica que se deve tocar com o talão. Já o “v”( vem de “arcos vis”) indica que se deve tocar com a ponta do arco.

Notação técnica: “[“ – Talão “v” – Ponta

Espaço visual é solicitado para ler e imaginar movimentos dos braços no uso do arco.

O talão e ponta são extremidades do arco. São pontos de ligação entre o início e o fim de uma ação como instrumento. “[“ indica o movimento de abdução; e “v” indica o movimento de adução.

7. Os alunos tocam a melodia trabalhada primeiramente em pizzicato, com a instrução de não olhar para os dedos:

1. individualmente 2. todos juntos

Embora a melodia já seja conhecida, e os alunos pudessem se concentrar na ação sem olhar as notas, a professora enfatiza o olhar para a partitura para estabelecer um hábito.

As alturas da Melodia de Ode a Alegria de Beethoven são tocadas em pizzicato. Assim, embora o ritmo seja assimilado, as durações de cada som não são mantidas já que os sons são todos separados em cada pizzicato.

Espaço tátil-cinestésico e auditivo se voltam para ação e espaço visual para ler a partitura. Tátil- cinestésica:( os dedos da ME definindo o comprimento das cordas e o movimento dos dedo da MD em pizzicato), auditivo regula todos os outros a partir dos resultados.

O desafio cognitivo que se apresenta aqui é o da coordenação dos espaços práticos. Uma vez que a visão deve se ocupar da decodificação da notação musical, o sujeito deve coordenar esta com as representações dos espaços práticos já que não pode olhar para sua ação. A representação auditiva da melodia também é importante para a fluência das regulações táteis-cinestésicas exigidas pelo tempo métrico estabelecido na pulsação.

8. Os alunos tocam novamente, agora usando o arco, obedecendo as indicações de talão e ponta escritas na partitura. A professora corrige o braço de FRA: (deve deixar o cotovelo mais para baixo)

Melodia de Ode a Alegria de Beethoven tocada em detaché. Ao introduzir o uso do arco, o parâmetro de duração passa a ser vivenciado como deve ser.

Auditivo, visual e Tátil- cinestésica: os dedos da ME definem o comprimento das cordas e o movimento dos dedo da MD e do braço direito no uso do arco.

Ao centralizar a atenção ao movimento do braço e no deslizar do arco sobre as cordas, há possibilidade de abstrações empíricas sobreas durações. No entanto, a professora não questiona nem leva FRA a tomada de consciências sobre estas abstrações.

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QUADRO 3: Aula de VIOLONCELO - 28/05/09 Sujeitos: FRA; Idade: 11;8 anos ; [outros sujeitos que não são da amostra: CAR, 12 anos; Epem 2; LAR, 12 anos Epem 2; BRE, 11 anos, Epem 2.]

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

1. Trabalho Postural: Em pé, pés afastados, o instrumento em frente ao corpo, sentar com o cello entre as pernas.

Técnica instrumental: posição do corpo frente ao instrumento.

Espaço postural: pés afastados, postura das costas bem apoiada sobre os ísquios.

Representação espacial do instrumento em adaptação ao corpo. O corpo todo se mobiliza nesta adaptação. Ao sentar-se com os pés afastados, o violoncelo se encaixa facilmente entre as pernas. O espigão deve estar apoiado no chão a uma distância adequada para que a parte de cima da caixa de ressonância seja apoiada no peito do instrumentista.

Exercício de arco e as metáforas para os movimentos. 1. Sem som: A professora pede e os alunos coloquem o arco na posição de ponta ou talão na 4ª pulsação da contagem, mas ao sair da corda, fazer um movimento que ela chama de “limpador de pára-brisas” com o

1. 4 Pulsações e preparação do arco. 2. Som de duas pulsações na corda Sol solta e uma pulsação de pausa para preparar o arco no mesmo lugar do início (talão ou meio).

1.Espaço auditivo e cinestésico. O braço direito deve estar de ter prontidão para, na quarta pulsação trazer o arco e posicioná-lo com o talão sobre a corda determinada. 2. Espaço cinestésico:

Nesta atividade vemos a coordenação dos movimentos situados no tempo objetivo da métrica quaternária. Assim, FRA é levada a estabelecer uma relação termo a termo entre o nome das cordas (Lá/Ré/Sol/Dó) e a posição

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arco. 2. Com som: Colocando o meio (ou o talão) do arco sobre a corda anunciada e deslizá-lo sobre a corda em direção à ponta (quando vem do meio), ou até o meio (quando vem do talão), fazendo soar a corda. Tirar o arco da corda fazendo um semi-círculo e recolocar o meio do arco (meio ou talão) na mesma corda anunciada (Sol). Com este movimento a mão faz um desenho imaginário no ar que a professora chama de “casco da tartaruga”.

abdução e adução do antebraço direito, e pronoção-supinação da mão sobre o talão.

do arco (talão ou ponta). A metáfora usada leva FRA a criar uma imagem mental do movimento do arco tomando como modelo um esquema visual já conhecido (limpador de pára-brisas).

A ação pedida é de tocar as notas da escala de Sol Maior 1. Entrando e saindo com o arco da corda, fazendo um semi-circulo, “meia-lua” com o arco no ar.

1. Mantendo a Pulsação, os sons da escala de Sol Maior são tocados em de dois tempos ao deslizar o arco sobre as cordas e um tempo para sair da corda e recolocar o arco (no talão ou no meio) para o ataque do som seguinte.

Espaço tátil-cinestésico: ME pressiona as cordas nos pontos da escala de Lá na primeira posição. Ao segurar o arco, a MD faz movimentos e

Durante a ação as abstrações que FRA pode realizar são empíricas: como segurar o arco, como fazer vibrar a corda. Mas ao ouvir o resultado sonoro, a audição

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A professora toca junto com os alunos, servindo de modelo para a imitação dos gestos, mas também orienta falando: ela conta 1,2,e; 1,2,e; etc; corrige a posição dos alunos; vai falando ou cantando o nome das notas no momento exato da preparação do arco. Estas instruções alertam os alunos para as transformações que eles têm que fazer naquele espaço de tempo: ajuste da posição dos dedos da ME e posicionamento do meio do arco na corda certa. Na primeira execução houve muita desafinação. A professora pediu que FRA corrigisse a posição da ME, seu polegar estava aparecendo e desestabilizando a posição da mão toda.

2ª.Corda – Ré 3ª.Corda – Sol Dedilhado Sons Dedilhado Sons 0 Ré 0 Sol 1 Mi 1 Lá 2-3 Fá# 2-3 Si 4 Sol 4 Dó

pronoção-supinação da mão sobre o talão e os movimentos de abdução e adução do antebraço direito levam o arco a deslizar sobre as cordas. Espaço visual: há tendência de conferir as cordas antes de pressionar os dedos da ME através do olhar. Espaço auditivo: Quando o resultado sonoro não é atingido, o ouvido acusa a não correspondência do som ao esperado. As falhas nos movimentos táteis-cinestésicos são então buscados.

acusa os desajustes de afinação com base na imagem auditiva que ela tem da escala maior. Há uma tomada de consciência de que a desafinação tem uma causa: ou ela errou a corda ou pressionou o dedo da ME no ponto errado, etc. Neste momento a professora pode dar o diagnóstico, mas podemos dizer que acontece uma abstração pseudo-empírica por FRA de que suas ações são a causa da afinação ou desafinação. Com base nesta abstração pseudo-empírica e na reversibilidade do pensamento operatório é possível ao sujeito rever seu percurso e corrigir o que não foi bem feito.

A ação é semelhante à do quadro anterior, mas a escala é tocada com o arco todo indo até a ponta com um som e voltando para o talão no som seguinte da escala (ascendente e descendente)

A escala de Sol Maior é tocada em detaché ligando os sons através do uso do arco do talão até a ponta em sons de duas pulsações a cada arcada. Sol, Lá, Si, Dó, Ré, Mi, Fá#, Sol (ascendente e descendente)

Há uma continuidade sonora

Abstração empírica da duração do som enquanto vai e volta com o arco e das transformações de alturas pela mudança do dedilhado e da posição do arco sobre as cordas.

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Dividindo o grupo em 3 vozes, a professora pede que cada grupo comece depois de o anterior ter tocado dois sons. Ela ajuda dando as entradas e cantando a nota inicial da escala com cada grupo. Ao executarem a escala em cânone, o resultado sonoro é formado por tríades.

Escala de Sol Maior em três vozes resultando nas tríades presentes na tonalidade de Sol Maior. Sol, Lá, Si, Dó, Ré, Mi,Fá#,Sol, Fá#... Sol, Lá, Si, Dó, Ré, Mi, Fá#,... Sol, Lá, Si, Dó, Ré...

Os espaços tátil e cinestésicos são utilizados da mesma maneira que na atividade anterior, mas o espaço auditivo vive outra experiência já que os sons produzidos por cada grupo de alunos é diferente.

A abstração empírica vivida é de sons que resultam sincronicamente diferentes. Como são harmonias tonais, podemos inferir que as regulações internas do sujeito o induzem a um ajuste motor que atenda à representação auditiva tonal já construída inconscientemente pelo sujeito.

6. A escala é tocada com o arco todo indo até a ponta com um som e voltando para o talão no som seguinte da escala (ascendente e descendente), mas o grupo é dividido em duas vozes, e a professora pede que cada grupo comece depois de o anterior ter tocado dois sons. Ela dá as entradas e canta a nota inicial da escala com cada grupo. A professora pergunta para os alunos se eles perceberam qual dos sons eles tocam todos ao mesmo tempo. Ninguém responde. Ela diz: “O Fá# é igual. Temos que ouvir o uníssono do Fá# e tocar como se fosse um só

Os sons da escala de Sol Maior em duas vozes resultam em intervalos harmônicos de terças da tonalidade de Sol Maior. Sol, Lá, Si, Dó, Ré, Mi,Fá#,Sol, Fá#, Mi, Ré, Do, Si, ... Sol, Lá, Si, Dó, Ré, Mi, Fá#, Sol, Fá#, Mi, Ré,...

Idem ao anterior Semelhante ao anterior, mas as harmonias, sendo mais simples são mais fáceis de assimilar.

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violoncelo”. Escala de Sol Maior tocada em terças (dois grupos) com subdivisões em detaché indo e voltando com a parte central do arco sobre a corda. 1. Quatro arcadas para cada som. 2. Três arcadas para cada som. 3. Duas arcadas para cada som. 4. Uma arcada para cada som.

Escala de Sol Maior ascendente e descendente em terças com subdivisão em 4,3,2,e 1 1. Sol, Sol, Sol, Sol,/ Lá, Lá, Lá, Lá,/ Si, Si, Si, Si, etc.

2. Sol, Sol, Sol, Lá, Lá, Lá, Si, Si, Si, etc

3. Sol,Sol, Lá, Lá, Si, Si, etc.

4. Sol, Lá, Si, Dó, Ré, Mi,Fá#,Sol, Fá#, Mi, Ré, Do, ...

Abstração empírica de agrupamentos de sons quantitativamente simétricos e qualitativamente assimétricos. Ou seja, a cada item desta atividade os agrupamentos de notas repetidas obedecem uma classificação quantitativa própria. Por outro lado, a própria escala é resultado de um agrupamento assimétrico de sons cada vez mais agudos para retornar aos sons cada vez mais graves, o que constitui uma série.

A professora propõe repetir a escala uníssono com notas repetidas unindo todas as variações sem parar. Durante a experiência ela tocava ao mesmo tempo que olhava para a ação dos alunos, dava entradas das mudanças de divisão, mostrava a mão esquerda soltando a corda no Ré. No final ela perguntou se os alunos entenderam e convidou-os

Escala de Sol Maior Ascendente e descendente em uníssono com subdivisão em 4,3,2,e 1 sem interrupção. Sol, Sol, Sol, Sol,/ Lá, Lá, Lá, Lá,/ Si, Si, Si, Si, etc./ Sol, Sol, Sol, Lá, Lá, Lá, Si, Si, Si, etc/ Sol,Sol, Lá, Lá, Si, Si, etc./ Sol, Lá, Si, Dó, Ré, Mi,Fá#,Sol, Fá#, Mi, Ré, Do, Si, Lá, Sol.

Espaço tátil-cinestésico, e auditivo. MD faz um movimento de ida e volta (com o arco) ME muda o dedilhado seguindo a série de sons da escala de Sol Maior. A cada escala completa diminui uma repetição de cada nota.

Do ponto de vista do pensamento lógico matemático, temos agrupamentos de notas repetidas que obedecem uma classificação diferente a cada repetição da escala e isso forma uma série longa assimétrica. São estabelecidas relações quantitativas de quatro arcadas com a MD para cada

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a repetir. Explicou também que o segredo era manter o movimento de ida e volta da MD (com o arco) e a cada série contar uma repetição a menos das notas no momento de mudar o dedilhado da ME.

troca de dedo da ME na primeira escala, depois de três arcadas para cada troca na segunda escala, em seguida de duas arcadas e finalmente de uma arcada para cada dedo da ME. O pensamento infralógico, administra a constituição de uma continuidade formada pela série de sons dentro da primeira posição do instrumento através das descontinuidades agrupadas dos diversos sons da escala.

Como introdução para o problema técnico que a próxima peça apresenta, a professora propõe o exercício das arcadas: detaché e martelé. Ela toca para mostrar o funcionamento de cada uma delas e convida os alunos a imitarem suas ações logo em seguida. Para tocar o martelé o arco desliza mais rapidamente em direção à ponta e interrompe o som. Para tocar o detaché, o arco é puxado e levado sem desgrudar da corda.

A arcada detaché na corda Lá será usada nas frases de colcheias ligadas, e a arcada martelé na corda Lá nos sons curtos seguidos de pausas.

Espaço visual é solicitado para observar a ação da professora. O espaço tátil cinestésico imita a ação deslizando o arco sobre a corda Lá. No martelé o braço faz um movimento de abdução mais rápido e pára depois adução rápido e pára. No detaché o braço faz os mesmos movimentos de abdução e adução, porém eles são mais

A diferenciação de sons ligados e desligados tem uma função importante na expressão musical. Do ponto de vista lógico as qualidades são construídas pelas quantificações que se estabelecem nas relações entre os sons. Pouco a pouco os alunos vão classificando estas qualidades. No caso das arcadas, elas permitem vivenciar qualidades de som que quanto mais curtos e separados uns dos outros,

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FRA pergunta se o martelé é o staccato. A professora diz que ela deve observar, mas depois concorda que o som do martelé é curto como um staccato.

lentos e sem interrupção entre eles.

mais serão identificados como staccato (como percebeu FRA durante a explicação da professora), e quanto mais a duração for estendido e ligada aos outros sons mais denominaremos estes de legato (como na arcada em detaché).

Melodia do livro “Suzuki”: Depois de ouvir, a professora lembra que FRA deve cuidar do ângulo do braço ao tocar a corda “Lá” para não “sujar” o som encostando o arco em outras cordas. Ao trabalhar com todos os alunos a professora fala da forma da música que tem uma parte inicial com caráter masculino, depois uma parte em detaché com caráter mais feminino, e retoma a parte inicial mantendo o mesmo caráter anterior.

Ré *Ré* Lá* Lá* si do ré si Lá* Lá*| Sol* Sol* Fá#* Fá#* mi re mi fá# Ré:||Fine Si, Si Lá Ré Si Si Lá Ré| Si Do Ré Si La Fa# Mi|| DC al Fine.

Espaço tátil-cinestésico dos braços e dedos das mãos, espaço auditivo ao regular os acertos e erros destas ações pela audição. Espaço visual para imitar os gestos da professora que está sempre tocando junto com os alunos.

A diferenciação do caráter das partes contrastantes da peça pode ser assimilada pelos alunos quanto mais eles observarem os tipos de arcada que eles usam em uma e na outra parte. Por isso a professora preparou a turma para executar as arcadas separadamente, e a partir da vivencia destas particularidades os alunos poderão diferenciar cada vez melhor tais objetos dentro da forma.

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QUADRO 4: Aula de VIOLONCELO 18/06/09 Sujeiros: FRA; Idade: 11;8 anos ; [CAR, Idade: 12 anos; LAR, Idade: 12 anos; BRE, Idade: 11 anos].

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos utilizados

pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Afinação e conversa: 5 minutos A professora pergunta sobre o ensaio da orquestra onde as alunas mais adiantadas estão tocando. Elas dizem que foi legal. FRA pede ajuda para a afinação do seu instrumento

Afinação do violoncelo é feita em intervalos de 5ª.

Espaços visual e auditivo: Enquanto acontece a ação os alunos conversam e ouvem ao fundo o som das cordas sendo afinadas

De tanto ouvirem os sons das cordas sendo afinadas o padrão intervalar vai sendo assimilado como se fosse uma melodia. Ele faz parte da memória auditiva, como um esquema mental.

Trabalho com o ARCO: O método Suzuki, no Brasil adota frases verbalizadas durante a execução da música “Twinkle- twinkle”, o que ajuda a memorizar os ritmos das variações. Todas as variações apresentam ritmos diferentes com os quais repetem cada nota da melodia. a) Os alunos tocam a variação “Laranjada doce” usando só o talão. b) Pula Cachorro, cachorro... Inicia cada vez com um lado do arco (ponta ou talão). c) Trenzinho rápido (cada palavra começa com um lado do arco) na colcheia mais extensão do arco desliza sobre a corda. Já nas semicolcheias a

A melodia “Twinkle- twinkle” é composta sobre 6 alturas diferentes. As variações rítmicas são: a) “Laranjada doce”: Quatro semicolcheias e 2 colcheias em cada altura da melodia.

b) “Pula Cachorro”: Duas colcheias, uma pausa de colcheia e outra colcheia em cada altura da melodia.

Espaço tátil-cinestésico: o movimento de abdução e adução do antebraço direito leva e traz o arco que desliza sobre as cordas. A MD pressiona com o do indicador graças ao movimento de pronação sobre o arco. Isso mantém o arco no ângulo correto e permite o contato da crina com as cordas. Espaço visual: a ação é controlada especialmente pela visão. O arco deve ficar perpendicular às cordas. Espaço auditivo: para ouvir as instruções da professora e o

A naturalidade com que as crianças acentuam as palavras vem da organicidade do uso das palavras na linguagem. Ao aproximar linguagem falada da musical, o método cria uma metáfora que leva a uma eficácia rítmica no aspecto da métrica, com o apoio no tempo forte do compasso. No entanto estamos no nível intuitivo da atividade inteligente. FRA assimila estes conteúdos por meio de abstrações empíricas.

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extensão do arco usada é menor . d) “Chocolate saboroso”

c) “Trenzinho rápido”: Colcheia, duas semicolcheias, duas colcheias em cada altura da melodia.

d) “Chocolate saboroso”: Dois grupos de quatro semicolcheias em cada altura da melodia.

resultado sonoro das ações sobre o violoncelo.

1. Depois de falar cada frase-ritmo, a professora propõe que elas toquem todos eles seguidos um do outro. 2. A professora estava explicando a ação sobre o arco, sua preocupação é

A palavra Cachorro é paroxítona e ajuda a dar o apoio métrico na sílaba “cho”. A sílaba “Ca” fica sendo uma anacruze dentro da métrica binária. Existe aí uma ilusão de divisão ternária dado

As correções feitas envolvem o controle tátil-cinestésico.

Quando a professora propõe a soma dos ritmos, FRA demonstra o interesse em analisar a forma através da pergunta sobre o número de repetições.

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técnica: “na hora da pausa, ...FRA interrompe perguntando: “quantas vezes é o cachoro?” A professora continua o que estava falando: “... a gente não vai tirar o arco da corda. Nós vamos descansar o arco na corda.” FRA volta a pergunta: “quantas vezes é o cachoro?” A professora diz: “quatro vezes.” Em seguida a professora repete as palavras dentro do ritmo para que os alunos gravem a seqüência na memória: |Pula, Ca|-choro, Ca|-choro, Ca|-choro, Ca|-Tren-zinho rá-pido, | Tren-zinho rá-pido... FRA intervém dizendo: “o Ca é no quarto?” A professora não dá atenção e continua a falar o ritmo com palavras. CAR começa a tocar o ritmo e a professora a interrompe enquanto continua a “declamar” o ritmo para que eles gravem a seqüência.

que o movimento é dividido em três arcadas.

2. A soma dos ritmos gera novas combinações que não se encaixam perfeitamente e resultam numa “quebra” da prosódia: |Pula, Ca|-choro, Ca|-choro, Ca|-choro, Ca|-Tren-zinho rá-pido, | Tren-zinho rá-pido...

Mesmo assim, as intervenções da professora se referem ao aperfeiçoamento do aspecto técnico e deixam de lado as questões sobre a compreensão do objeto musical.

1. A professora pergunta: E o “Trenzinho rápido” como vai ser? Sem esperar a resposta, começa a tocar. As alunas observam sua ação. 2. As alunas começam a praticar o ritmo do “trenzinho rápido”, imitando a

“Trenzinho rápido”: Colcheia, duas semicolcheias, duas colcheias em cada altura da melodia.

1. Espaço visual e auditivo: Os alunos vêem a ação e ouvem o som resultante. 2. Espaço tátil-cinestésico e visual e auditivo: As alunas tocam imitando a

1. ao olharem as alunas constroem a imagem da ação que irão imitar. 2. Ao ouvirem as instruções as imperfeições vão sendo corrigidas pelos

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ação da professora que continua a tocar e dá instruções ao mesmo tempo: “É na corda Ré! Essa é a corda Sol”. 3. Depois de algumas repetições a professora interrompe o grupo e corrige o que FRA está fazendo: “Lembre-se que o quadrado do braço se desfaz quando a gente vai pra ponta, e fica reto. Não mantém o quadrado! Se você mantiver o quadrado do arco, acaba que você vai trazendo o cotovelo para traz do corpo. O braço fica sempre pra frente do corpo.” Ela desliza o arco para a ponta esticando o braço e diz: “Ponta, e esticou.” 4. Outro lembrete da professora sobre a técnica:“Mais uma coisa: Na hora que fizer o ‘zinho’ do ‘trenzinho’, aperta o arco na corda, ta? quando a gente vai pra ponta tem que pressionar o arco sobre a corda com um movimento do indicador - o movimento de pronação – [gesticula com a mão] é este movimento aqui, como se estivesse fechando a chave da porta.” 5. Ao repetirem, a professora chama a atençào para a postura do corpo: “põe o pezinho no chão!” e continuam o mesmo ritmo.

Tren-zinho rá-pido, | Tren-zinho rá-pido...

ação da professora mas sem se preocupar com o resultado sonoro. Só depois de ouvirem o nome da corda algumas corrigem. 3. Espaço visual e auditivo: FRA ouve a crítica da professora e imita internamente a imagem do movimento que vê. 4. Espaço visual e auditivo: FRA ouve a crítica da professora e imita internamente a imagem do movimento que vê.

critérios estipulados pela professora. 3. Ao ver a ação da professora FRA cria uma imagem do quadrado que seu braço forma ao segurar o arco, e como ele se estica ao trazer o arco para a ponta. 4. Assim como no exmplo anterior, o fato de a professora falar e não fazer o aluno repetir em seguida, não permite que haja abstração pseudo-empírica. Fica sendo a assimilação de uma opinião da professora, mas sem prática não há assimilação aos esquemas motores.

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1. Mudam para o ritmo de “chocolate saboroso”.

O ritmo de “chocolate saboroso”

3. Exercício dos ritmos repetindo cada um deles 4 vezes em cada corda (Re e Lá). A professora ajuda a planejar o uso do arco na série dos quatro ritmos:

• Laranjada doce: talão • Pula cachoro: meio do arco • Trenzinho Rápido: arco inteiro • Chocolate saboroso: talão

Observo FRA e percebo que ela não reage por si às mudanças de ritmo. Ela só muda depois de perceber, pela visão e pela audição, a mudança na ação da professora. Seu arco está mal posicionado e seu braço direito continua “quadrado”. A professora, por sua vez, não pára de tocar, e vai falando para os alunos as correções que devem fazer.

A verbalização é a seguinte: Laranjada do-ce| Laranjada do-ce| Laranjada do-ce| Laranjada do-ce| Pu-la * Ca|-cho-ro * Ca| -cho-ro * Ca|-cho-ro * Ca| Tren-zinho Rá-pido| Tren-zinho Rá-pido| Tren-zinho Rá-pido| Tren-zinho Rá-pido|Chocolate saboroso| Chocolate saboroso| Chocolate saboroso| Chocolate saboroso||

Espaço postural: o movimento do braço de FRA não se adapta às transformações necessárias.

Ela fixa sua atenção na pressão dos dedos da ME sobre as cordas e no contato da crina sobre a corda, mas não leva em conta os movimentos do seu braço que resultam neste contato. São as transformações realizadas pelo braço que permite o controle do som. Por isso, podemos dizer que do ponto de vista técnico, a falta da visibilidade de seus próprios movimentos não favorecem a representação operativa deles. Sua representação é figurativa, daí a falta de flexibilidade necessária à adaptação dos movimentos do braço direito.

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Trabalho com as alturas: a Melodia “Twinkle, Twinkle” realizada pela ME em pizzicato pela MD. A professora toca e canta com o nome das notas a melodia com sons longos. Repete duas vezes. Ré, Lá, Si, Lá, Sol, Fá(#), Mi, Ré. 1. Depois os alunos, olhando para as posições da professora, imitam sua ação. Professora comenta o volume do som: “Parece uma pipoca numa panelinha pequena, vamos pro gongo chinês agora!” Depois de tocarem uma vez, a professora pede que FRA coloque sua ME posicionando os dedos sobre as linhas coloridas e pede que todos repitam novamente. 2. FRA se posiciona, mas se perde no primeiro tema. Ela para e pergunta: “peraí, em que corda a gente está?” A professora continua dirigindo a turma cantando a melodia com o nome das notas e os outros alunos conseguem tocar, inclusive na continuação da melodia. Ré, Lá, Si, Lá, Sol, Fá(#), Mi, Ré. Lá, Sol, Fá(#), Mi, Lá, Sol, Fá(#), Mi

Com sons longos: Ré, Lá, Si, Lá, Sol, Fá(#), Mi, Ré Lá, Sol, Fá(#), Mi, Lá, Sol, Fá(#), Mi, Ré, Lá, Si, Lá, Sol, Fá(#), Mi, Ré Se grafarmos os nomes das notas com cores de acordo com as cordas usadas, teremos a seguinte disposição: Ré, Lá, Si, Lá, Sol, Fá(#), Mi, Ré Lá, Sol, Fá(#), Mi, Lá, Sol, Fá(#), Mi, Ré, Lá, Si, Lá, Sol, Fá(#), Mi, Ré Se pensarmos na forma descrita pela professora podemos visualizar as notas segundo a disposição de um “sanduíche”

Espaço postural: O arco é colocado sobre o colo e a ME assume a primeira posição sobre as cordas. A MD toca em pizzicato. Espaço visual: os olhos seguem a linha azul do gráfico abaixo: A melodia começa a ser tocada na corda Ré (solta). Ponto de partida do 1º tema direita � esquerda Ponto de partida do 2º tema direita � esquerda

2ª.Corda– Ré

1ª.Corda – Lá

Dedos Dedos 0 Ré 0 Lá 1 Mi 1 Si 2-3 Fá# 2-3 Dó# 4 Sol 4 Ré

1 e 2. FRA observa e, por abstração empírica se informa das posições dos dedos da ME para fazer as alturas. Notamos que a primeira preocupação de FRA é definir o espaço de atuação de seus dedos. Portanto, o primeiro contraste que representamos -diferenciando as cordas- parece ser a primeira abstração pseudo-empírica realizada pela aluna. Quando FRA pergunta sobre esta dificuldade espacial, a professora faz, logo em seguida, uma análise onde diferencia a forma por padrões melódicos que se repetem. Para que FRA consiga realizar a ação, seria importante que ela identificasse os espaços de atuação dos dedos. Posteriormente a forma musical seria assimilada a partir da diferenciação

2ª.Corda Ré

1ª.Corda Lá

0 Ré 0 Lá 1 Mi 1 Si 2-3 Fá# 2-3 Dó# 4 Sol 4 Ré

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Ré, Lá, Si, Lá, Sol, Fá(#), Mi, Ré Quando pára, a professora faz uma pequena análise da peça: “Na realidade você tem dois temas, tem ‘dois pãezinhos’ assim, e tem um ‘recheio’ que se repete”. FRA fica sem resposta sobre o espaço onde deve tocar, mas ela observa e, por imitação, acerta os movimentos em seguida.

como ela mesma sugeriu: Representação da forma em “sanduíche”: Ré, Lá, Si, Lá, Sol, Fá(#), Mi, Ré Lá, Sol, Fá(#), Mi, Lá, Sol, Fá(#), Mi, Ré, Lá, Si, Lá, Sol, Fá(#), Mi, Ré

Espaço Tátil: FRA olha para a própria ME antes de colocá-la sobre as linhas coloridas coladas sobre o braço do violoncelo. A MD funciona com mais independência da visão. Espaço auditivo: o fato de todos os alunos tocarem sempre ao mesmo tempo, não ajuda FRA a tomar consciência de seus erros pelo resultado sonoro de suas ações, pois ela ouve o som do conjunto, o que confunde a coordenação de seus esquemas práticos.

auditiva dos padrões melódicos construídos pela continuidade das transformações da ME & MD. Nos parece que a programação didática da professora não é adequada às necessidades de FRA.

Duração e altura: A professora instrui a turma a manter os dedos da ME pressionando a corda Ré para permanecer na altura até o fim da duração da nota. Caso contrário, ao usar o arco, se tirarem os dedos da ME antes da hora, a corda soará na altura da corda solta.

A seqüência de sons Sol, Fá(#), Mi é feita com os dedos da ME sobre a corda Ré. Se os dedos soltarem a corda antes do final da duração, ouvir-se-há o som Ré da corda solta.

Espaço visual e auditivo: Os alunos vêem a ação dos dedos da professora, mas ela não realiza o exemplo que dá.

A conservação da duração numa altura depende da ação das duas mãos neste instrumento: arco fazendo vibrar a corda e dedo da ME pressionando o ponto que define o comprimento da mesma. Os alunos compreenderiam melhor a explicação se pudessem ver e ouvir o resultado da ação, mas a professora imita somente os sons com a voz, o que não permite

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uma abstração empírica. Uso do ARCO e da ME: Trabalho com as alturas da Melodia “Twinkle, Twinkle” realizadas pela ME com os ritmos das variações. 1ª vez - FRA afirma não ter ainda decorado o tema. A professora canta a sequencia mas FRA não tem chance de tocar sozinha nem uma vez. 2ª vez – eu observo BRE. Ele olha sempre para a ME no momento de colocar os dedos sobre a corda Ré para tocar o SOL. Esta posição é difícil pois os dedos devem estar separados e dela derivam as subseqüentes. Ao final, a professora lamenta que FRA esteja tão “desarticulada”. E imita as arcadas desajeitadas. “são três semanas sem pegar no violoncelo, não é? A gente sente isso” diz a professora. “a mão está ‘fora’ e o arco [ imita com um movimento desordenado do arco] ”. Neste momento o cavalete do violoncelo da professora sai do lugar. FRA diz: “quem mandou querer me imitar? Bah...” Eles tocam a variação do “Laranjada doce”.

“Laranjada doce”: Quatro semicolcheias e 2 colcheias em cada altura da melodia.

Espaço tátil-visual: os alunos conferem os pontos a serem pressionados na corda antes de cada nota. Espaço auditivo: a audição interna é menos ativada, já que o modelo visual da professora é muito presente, e os alunos não são expostos a se ouvir tocando sem outros colegas estarem tocando ao mesmo tempo.

O que significa não se lembrar do tema? Caso o insucesso da aluna seja pelo fato de ela não ter praticado, bastará que ela pratique para conseguir realizar bem na próxima vez. Caso seja por ela não ter aprendido as posições, a professora deveria aproveitar a presença da aluna e relembrar com todos os movimentos, fazendo-a tocar sozinha. Ao mesmo tempo que ela tocasse e se ouvisse ela realizaria abstrações pseudo-empíricas através das regulaçòes entre ação tátil-cinestésica e auditiva, seguidas de tomadas de consciência do resultado de suas ações.

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Tocam a partir da variação “Trenzinho rápido”. A professora para e alerta para os problemas: “Ninguém vai mais esbarrar na corda Ré quando estiver tocando a corda Lá.” Os problemas técnicos que a professora trabalhou:

1. esquecer as posições da ME uso do arco: controle da região de atrito do arco sobre as cordas

Espaço visual: FRA olha atentamente para a professora para receber instruções para suas ações ( por imitação ou pela instrução do nome das notas a serem tocadas). Espaço auditivo: FRA não antecipa o que quer ouvir. Ela fica atenta e muda de posição só depois de ouvir os outros. Espaço tátil-cinestésico: as respostas táteis de FRA são atrasadas, pois antes de mudar a posição dos dedos ela olha para a mudança feita pela professora, em seguida olha para o lugar onde seus dedos devem ir, e só então age. Suas arcadas acontecem sem sincronia com a ME.

Em nossa análise, FRA não atinge a representação pois suas abstrações são empíricas apenas. Falta um questionamento por parte da professora para suas ações. Por este motivo, ela não representa um plano para suas ações antes de elas acontecerem.

A professora quer que o grupo todo trabalhe a sincronia das oito semicolcheias com o movimento dos arcos de todos ao mesmo tempo. Para isso ela verbaliza o “chocolate saboroso” valorizando as ultimas sílabas. No entanto não aguardo que todos estejam prontos para o ataque. Assim, FRA repetiu muitas vezes até corrigir a ação.

O ritmo de “chocolate saboroso”

Espaço postural: o inicio sincronizado do grupo depende da conservação da postura de todos. Vemos que a cada final, FRA desmonta a postura, pois para ela o natural não é estar tocando. Assim a cada início, das repetições ela não está pronta para recomeçar e atrasa.

Ao relacionar a ação entre as mãos vemos a ausência de um plano que leve em conta as conservações dos sons (oito repetições com idas e vindas do arco).

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QUADRO 5: Aula de VIOLONCELO - 25/06/09 Sujeitos: FRA; Idade: 11;8 anos ; [outros sujeitos que não são da amostra: CAR, 12 anos; Epem 2; LAR, 12 anos Epem 2; BRE, 11 anos, Epem 2.]

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

“Pescaria” – atividade para o uso do arco: 1. Ponta ou talão são pedidos e os alunos

tem que reagir com prontidão. 2. o mesmo exercício com contagem entre

um pedido e outro 1234 (ponta), 1234 (talão)

1 e 2. Contagem da métrica quaternária e mudança de poisçào no primeiro tempo do compasso seguinte.

Espaço postural: a postura do corpo prepara a ação, deixando o arco disponível ao toque nas cordas Espaço tátil: a precisão do ataque é dada pelo ângulo com que os dedos da MD preparam a posição do arco cinestésico: Espaço auditivo: Espaço visual:

Estes movimentos são exercícios motores exercidos pela instrução da professora. A prontidão exige uma

Variações Suzuki 1. Verbalizando sem tocar a seqüência toda. 2. A professora faz o gesto de quais

números deveriam ser falados (da seqüência das variações) a professora desperta a atenção dos alunos

3. Todos tocam a seqüência toda 4. ME. A professora escreveu no quadro

A verbalização é organizada por números: I. Laranjada do-ce| Laranjada do-ce| Laranjada do-ce| Laranjada do-ce| II. Pu-la * Ca|-cho-ro * Ca| -cho-ro

1. Espaço vocal: A vocalização das palavras é feita obedecendo o ritmo 2. Tátil-cinestésico e visual: para seguir a ordem e as mudanças de ritmo,

A vocalização das palavras é uma estratégia para que o ritmo seja assimilado pela ação de FRA . Ao falar, ela internaliza a ação, memoriza as duraçòes do som pela

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negro, as notas da clave de fá. 1ª. e 2ª. frase: uma em cada.

* Ca|-cho-ro * Ca| III. Tren-zinho Rá-pido| Tren-zinho Rá-pido| Tren-zinho Rá-pido| Tren-zinho Rá-pido| IV. Chocolate saboroso| Chocolate saboroso| Chocolate saboroso| Chocolate saboroso||

própria ação e pelo resultado sonoro, sem ter que se preocupar com os problemas técnicos. É uma forma de dissociar os elementos (ritmo e técnica) para depois associá-los novamente tocando. Por fim, a escrita no quadro negro funciona como uma representação da música, dentro da forma trabalhada.

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ANEXO 6

ANÁLISE DAS AULAS DE PIANO

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QUADRO 1: Aula de PIANO- 20/05/09 Horário: 4ª. feira 8hs - Aluna ISA, 7;8 anos. 9 hs: Aluna: JEN. 8;0 anos.

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

A professora pede que ISA toque sua composição. A aluna toca e a professora pede que ela repita. A prof diz que teve impressão que estava um pouco diferente da 1ª. vez. Pede que repita mais uma vez . Em seguida a prof tenta descrever para a aluna a direção dos sons da melodia da aluna, e pede que ela repita mais uma vez.

Melodia já composta na aula anterior. A bolha de sabão Do, Ré, Mi, Mi Ré Do, Do, Ré, Mi, Fá. A bolha de sabão, ela flutua!

Do, Ré Mi, Mi, Re, Do,Do, Ré, Mi, Fá, Mi, Fá, Mi. A bolha de sabão. Ela flutua no ar!

Espaço auditivo, tátil, cinestésico e visual: A mão direita em posição fechada, atua sobre as teclas escolhidas (pontos descontínuos no contínuo do teclado) para compor no teclado os sons (descontínuo) da melodia (contínuo).

Figurativo: (Memória no sentido estrito) coordenação de elementos memorizados da melodia criada pela aluna. Pode-se dizer que a aluna tem uma imagem mental da melodia, cuja memória do desenho melódico é constituída pelos esquemas auditivos que ela conservou, assim como a letra que ela inventou e que por sua vez estabeleceu um ritmo com o qual ela canta. Operativo: A representação figurativa se apóia, por sua vez, nos esquemas táteis (A Posição

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Fechada da mão para pressionar as teclas), cinestésicos (movimentos da mão para a direita e esquerda no teclado), e auditivos para a produção de sons que sobem para o agudo, que descem para o grave e que se repetem. A partir desta imagem ela pode realizar a imitação diferida da melodia.

Em seguida a prof pergunta: “o que você usou nesta música? Imagine que você fosse contar para uma amiga como foi sua aula de piano e tivesse que explicar a música que você fez, como você explicaria para ela sem ter o piano?” A aluna diz: “Cantando!”. A prof pergunta: como você cantaria? A aluna então começa a cantar com uma letra: “A bolha de sabão, ela flutua. A bolha de sabão, ela flutua no ar!” A professora fica admirada de saber que a aluna havia feito a música e uma letra. Propõe para a aluna de escrever a letra da música no caderno.

A melodia é cantada com a letra: A bolha de sabão, ela flutua!

A bolha de sabão. Ela flutua no ar!

Espaço vocal: O canto e a fala se confundem na concepção de música da criança.

A professora está solicitando uma descrição da composição, com finalidade de saber se a aluna consegue identificar os elementos musicais utilizados em sua criação. ISA, ao invés disso, propõe uma imitação do que tocou no piano, agora pela voz. Ela tem presente a imagem auditiva da

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melodia e a reproduz pelo canto. Como a representação é figurativa, a aluna não pode sintetizar verbalmente os elementos que a constituem pois isso exigiria que seu pensamento classificasse os elementos rítmicos, melódicos, ou qualquer outro parâmetro.

Depois disso a professora pede que a aluna toque e cante a letra ao mesmo tempo. Ao tocar e cantar a aluna às vezes tem dúvida sobre a direção do som e se deve ou não repetir alguma tecla. A professora comenta que para conseguir tocar e cantar com todas as sílabas a aluna precisou de mais notas na melodia.

A bolha de sabão, ela flutua!

A bolha de sabão. Ela flutua no ar!

Espaço tátil: ao trazer para o tato a ação realizada vocalmente, ISA enfrenta a resistência do instrumento. Se não repetir o movimento da mão, o som não acontece.

Abstração empírica do funcionamento do instrumento. Uma vez que a melodia foi representada através do canto, para reproduzi-la (imitação) no teclado do piano, ISA explora novas resistências. Tem que adaptar seus esquemas auditivos ao plano horizontal do instrumento.

Em seguida a professora pede para aprender a Repetição da melodia no piano Espaço auditivo e visual. Ao ouvir sua

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tocar a música. “as vezes você usou a posição fechada, às vezes usou posição aberta. Qual posição você quer usar?” ISA: “posição fechada”. A prof então começa a tocar com a posição fechada e nos momentos em que tem dúvida do desenho melódico, a professora pede que a aluna diga o que deve ser feito: repetir, subir ou descer.

(tocado pela professora) A bolha de sabão, ela flutua!

A bolha de sabão. Ela flutua no ar!

professora reproduzindo sua composição, ISA é levada a pensar nas transformações de uma nota para a outra e precisa tomar decisões sobre sua própria composição: Se o som repete, sobe ou desce. Assim, estará representando operativamente o que havia feito figurativamente. Suas ações se transformam em operações.

Depois que a professora toca a peça toda, ela pede que ISA toque de novo e acompanha a aluna cantando. Como a melodia acaba na nota mais aguda da melodia a professora faz um gesto com a mão direita imitando o desenho que a bolha faria no ar. Diz: “parece que a bolha está flutuando no ar, não é? Vamos fazer bolhinhas de sabão que flutuam no ar assim pelo piano? Como a gente pode fazer isso?”. A aluna para, pensa. A professora faz gestos com as mãos no ar abrindo os dedos e diz: “Vamos tentar fazer este efeito do som da bolha? Como a gente pode fazer?”

A bolha de sabão, ela flutua!

A bolha de sabão. Ela flutua no ar!

Ploft!

1. Espaços auditivo e visual. 2. Tátil, visual e

1. O simbolismo solicitado pela professora é sugerido pelos gestos que faz com os dedos das mãos no ar. 2. Parece que a

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2. A aluna leva a mão fechada ao piano e de repente toca uma tecla em staccato. A professora ri e diz: “A bolha explodiu!” A aluna ri. A professora pergunta se ela quer tocar mais uma vez antes de fazer outra atividade. A aluna diz que sim e, ao tocar, se confunde no desenho final da melodia. A professora pede que ISA repita. Ela o faz mas se confunde outra vez. 3. A professora pergunta se ela quer repetir a nota de “flu-tu- a”( o “a” indo para o agudo). A aluna gesticula que quer ir para cima. A professora lhe diz que, então, ela tem que se lembrar de repetir uma tecla antes de ir pro agudo. Mas a aluna está cansada e acaba tocando um movimento diferente. Porém, não se esquece do staccato final.

auditivo: Posição fechada para pressionar as teclas e imitar o som através do piano.

atenção de ISA está centrada no efeito criado para a bolha que estoura. Todo o resto estava centrado num caminhar pelas teclas sem estabelecer um simbolismo do real através da música. Agora, o som que se apresenta como significante é naturalmente mais vivo em sua memória. Os outros, parecem perder força significativa.

Músicas do Livro 1- Natal. Leitura de semínimas e mínimas usando as duas mãos para tocar uma melodia escrita sem pauta, mas com alturas acompanhando o desenho melódico a ser tocado apenas nas teclas pretas do piano com posição fechada. Fica estabelecido que cada mão atua só em um grupo (MD no grupo de três e ME no de duas teclas pretas). Antes de ISA tocar ela fica hesitante e a

Melodia para ser tocada na extensão de dois grupos de teclas pretas do piano. A linha melódica apresenta quatro frases (A,B,C, D). O ponto de partida (primeiro som) é tocado na terceira tecla do grupo de três. A- a primeira frase começa sendo tocada pela MD (em azul), segue sendo tocada pela ME (em

Nota-se um apelo tátil e também visual para a realização desta execução. O aluno se guia pela cor das teclas e pela vizinhança entre elas. A alternância de mãos que a professora usa para apontar as notas da partitura induz a aluna a se lembrar da

A assimilação da peça é feita através da leitura da partitura, que a aluna decodifica, e realiza tocando cada som que lê. A construção da continuidade da linha melódica é gradativa. A abstração empírica que ela faz é

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professora lhe pergunta se ela esqueceu. Ela diz que esqueceu. Então a professora mostra o diagrama do teclado presente na partitura que indica as teclas onde ela inicia a ação de cada mão. Ela diz: “Veja lá: qual o ponto de partida da mão direita e da mão esquerda, em que teclas?”. A aluna olha o diagrama e olha para o teclado e as mãos procuram a distância das teclas, mas nas teclas brancas. De repente ela se dá conta que deve colocar as mãos sobre as teclas pretas. A professora diz que a posição fechada está cada vez mais mal cuidada. “vamos fazer ela bem bonita? Olha!” (e coloca o polegar sobre o indicador da mão direita, montando a posição na própria mão para a aluna imitar). A aluna toca e a professora aponta cada nota da música usando a mão correspondente para a aluna se lembrar de trocar de mão na hora certa. A aluna alterna o olhar entre a direção dos sons na partitura e o movimento que as mãos fazem sobre as teclas.

vermelho) até a primeira do grupo de dois, com sons repetidos; B- a segunda frase começa pela ME na segunda tecla do grupo de dois, sobe até a ultima do grupo de três e termina pela MD com sons repetidos na segunda do grupo de três;

C- a terceira frase é igual à primeira frase; D- a quarta frase começa igual à segunda mas termina com um salto de terça descendente.

alternância das mãos que ela deve usar para tocar. O espaço auditivo regula o resultado contínuo da linha melódica composta de sons descontínuos realizados com posição fechada nas duas mãos (espaço tátil).

primeiramente tátil, cinestésica e auditiva. O resultado sonoro vai sendo reconhecido aos poucos. A professora está centrada no aspecto técnico: posição das mãos, movimentação adequada dos olhos sobre a partitura e reação motora à leitura do código.

A música Natal é trabalhada agora com a interferência de outra voz que repete sempre o mesmo ritmo (duas semínimas seguidas de uma mínima) num desenho melódico com duas alturas diferentes (vai e volta), na região

A aluna toca a melodia Natal e uma segunda voz é acrescentada pela professora. Trata-se de um ostinato tocado nas primeiras de cada grupo de teclas pretas e tem

O espaço auditivo regula a velocidade dos gestos da aluna para que o resultado soe sincronizado como o

Enquanto a aluna toca, ela ouve sons de durações e alturas diferentes dos que ela produz. A assimilação

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aguda, tocada pela professora. ISA tem que se concentrar ainda mais no que está fazendo e não variar a pulsação, que deve ser igual à da professora. Ela faz isso muito bem.

letra cantada: Em Belém | Em Belém:|| *| *| 0| | *| *| 0| :||

O ritmo das duas partes são correspondentes mas apresentam momentos de sons longos sincronizados com sons curtos.

ostinato tocado pela professora.

de sons diferentes ao mesmo tempo que toca sons curtos, favorece a capacidade de classificação das durações dos sons. A abstração empírica da inclusão dos sons curtos nos longos, e a correspondência entre eles é necessária para que a aluna toque em sincronia com a professora.

A Chuva caindo é trabalhada em seguida. A professora pergunta se é pra tocar sentada ou em pé e a aluna lembra que é em pé. A professora pergunta quantos grupos de 2 ela vai precisar para tocar. “Quatro”. Em seguida ela escolhe começar no grupo de 2 mais grave. ISA esquece como é. A professora cobre parte da partitura com a mão deixando o desenho incial à mostra. Diz: “vamos ver uma coisa de cada vez”. ISA não lembra nem como colocar as mãos, e a Professora tem que ajudá-la a organizar sua ação: MD na tecla x ME na tecla y...

A peça é feita para ser tocada em quatro grupos de duas teclas pretas. Constituída de quatro frases curtas com desenhos melódicos idênticos que se repetem cada vez num grupo de duas teclas pretas mais agudo. As teclas são distribuídas: MD (em azul) na segunda tecla do grupo de duas pretas, e a ME (em vermelho) na primeira tecla do grupo de duas pretas. O ponto de partida é feito pela MD, que toca duas vezes, em seguida a ME toca duas vezes na

Espaço visual: identificação das teclas a serem usadas e do numero de grupos de dois, é feito através da contagem dos desenhos iguais que a partitura apresenta. Cinestésico: Para poder tocar em quatro grupos de dois diferentes, a aluna toca em pé e se movimenta para o lado direito do teclado. Tátil: controle do toque

A pergunta da professora favorece que a aluna classifique do conjunto de teclas, as do grupo de duas pretas, e estabeleça visualmente o espaço do piano que irá utilizar. Ao cobrir parte da partitura, a professora faz com que a aluna centralize sua atenção no desenho melódico padrão. Após a

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tecla preta de baixo. Depois a MD toca um som longo, e a ME outro som longo. O desenho melódico é:

“Toca-repete, (MD) *| *| Desce-repete, (ME) *| *| sobe, desce.” (MD) 0| ME 0|

de sons curtos e longos, em teclas repetidas com a mesma mão, em posição fechada, e em teclas alternadas com mãos diferentes. Auditivo: a aluna ouve o resultado de sua ação o que lhe permite conferir a eficácia de sua ação.

assimilação deste desenho, a aluna só precisará imitá-lo nas outras regiões do teclado.

Repetição cantando a letra. A pulsação fica mais regular enquanto a aluna canta.

Acrescenta-se a letra: A chuva caindo, Numa noite fria. A chuva caindo, Numa noite fria.

Espaço vocal: ao cantar é necessário o controle do ar, que ajuda a regularizar o tempo e, por conseqüência, a aluna chega a uma fluência rítmica natural

O canto da melodia com letra leva a uma maior fluência já que os sons passam a apresentar relação com a semântica do texto. Os sons se ligam na melodia assim como as letras às palavras. A melodia é assimilada ao padrão rítmico da frase.

O dever escrito: numerar os dedos no desenho da mão que tem no livro. Faz na hora e acerta.

Técnica: numeração dos dedos. Espaço visual. Reconhecimento da imagem da mão e identificação da ordenação dos dedos.

Bater com palmas uma sequencia em f, em Leitura rítmica de sons curtos e Espaço visual reconhece O movimento dos

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seguida outra sequência em p. leitura de clusters com as duas mãos.

longos em forte e suave. o signo de sons curtos e longos e a aluna reage corporalmente à leitura batendo o ritmo com palmas (espaço tátil).

olhos se direciona da esquerda para a direita acompanhando os desenhos das notas e a aluna necessita fazer uma abstração refletida reagindo sobre o significante-notação executando o ritmo (significado da notação).

Melodias de várias terras: todas essas músicas são compostas de modo a serem tocadas no grupo de três teclas pretas. Pão Quentinho : “Em qual das três que a gente começa?”. Qual é o ponto de partida dela? ISA mostra: “É essa daqui”. A profa. refaz a pergunta: “Vamos dizer que eu sou ceguinha e eu não sei qual é essa daí. Como você vai me dizer: é a 1ª, 2ª, ou 3ª do grupo de três?”. ISA diz: “3ª ”. Combina com a aluna que o ponto de partida deve ser identificado pela localização das teclas (1.a, 2ª. ou 3ª. do grupo de 3 , por exemplo).

A melodia Pão Quentinho tem três alturas tocadas no grupo de três das teclas pretas, com a mão direita. 1ª. frase tem 4 mínimas, começa no som mais agudo e desce. Repete o mais grave. 2ª. frase é uma repetição da primeira, 3ª. frase é composta de 8 semínimas, 4 repetições no som mais grave, 4 no som intermediário, 4ª. frase é a repetição da primeira frase.

Espaço visual: a aluna responde a pergunta mostrando a tecla, porque entende que se a professora está olhando para o teclado, é porque quer ver a tecla.

Ao perguntar sobre a ordenação das teclas, a professora solicita uma abstração pseudo-empírica. ISA é levada as pensar, e, através dos esquemas de ordenação, localiza a tecla e responde que o ponto de partida é na 3ª tecla.

1. Em seguida a professora pede que ISA diga como é o desenho melódico de Pão Quentinho. Vai falando e pede para ISA

Gráfico do desenho melódico da música Pão Quentinho:

1.Espaço visual e vocal: Para ler os olhos acompanham os eixos

1.Ao descrever o desenho melódico a aluna é levada a

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continuar: toca, desce, repete, etc...A aluna fala o que está acontecendo na partitura, sem tocar, apenas olhando para a partitura. 2. A professora pede que ela toque, pensando como fez enquanto falava, só que agora ela vai “mandar o dedo fazer”. Ao tocar, a aluna sempre reveza o olhar entre a partitura e as teclas. ISA esquece de repetir uma tecla. A mão vai para uma tecla diferente. A professora a corrige alertando para o fato de a nota estar escrita ao lado da anterior mas na mesma altura. Em todas as mudanças de altura ISA hesita e a professora canta o desenho melódico ao mesmo tempo que faz gestos com a mão nas direções que a mão deve se movimentar para alcançar as teclas (contrário ao movimento dos olhos): Sobe, desce, desce, repete

3. A professora a elogia sua execução e

Toca, desce, desce, repete

Salto acima, desce, desce, repete

Repete, repete, repete, repete

Sobe, repete, repete, repete

Sobe, desce, desce, repete

horizontal e vertical, e a voz apenas verbaliza a leitura destes eixos sem emitir o resultado sonoro das alturas 2. Espaço visual e auditivo e tátil Vemos uma especialização de cada espaço prático: ao ler, os olhos se movimentam no eixo horizontal da esquerda para a direita obedecendo a ordenação dos sons, e no eixo vertical para as alturas. O tato se dedica a identificar a tecla antes de pressioná-la, a memória auditiva dá a previsão do som que deve ser ouvido e o espaço auditivo confere se o resultado é correto.

pensar nas transformações dos sons pelos parâmetros de altura e duração através de abstrações refletidas. É a partir da representação - notação do som – que ela descreve o movimento sonoro. Como não há um resultado audível, não há abstração empírica do som. É puro treino do movimento dos olhos sobre os eixos da notação que representa o som. 2. Ao tocar o espaço auditivo também entra em ação e ajuda ISA a corrigir erros do movimento lateral. Vemos aí uma abstração pseudo-empírica, pois parece que a aluna sabe que a altura do som é efeito do movimento lateral que ela faz com a mão

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pergunta se ela tocou Forte ou Suave. “Forte”- diz ISA. A professora pede que ela toque mais forte e diz: “Essa música é bem animada”. E faz uma movimento com o corpo como se estivesse dançando. A aluna entende aquele movimento como sendo da duração dos sons e começa no dobro do andamento.

sobre as teclas. 3. Vemos nova centração no parâmetro errado. Para executar a intensidade mais forte, a aluna toca as durações mais curtas.

A professora corrige o erro do andamento e pede para ISA repetir cantando com “Ta”, ou “Taás”, mas ir sentindo as teclas sem olhar para elas. Usa um livro sobre a mão da aluna e vai apontando as notas na partitura, cantando a melodia com “tas” e a orienta quando ISA toca a tecla errada, sem contudo deixá-la ver a ação da mão sobre o teclado. Quando ela acaba diz: “No piano as teclas estão lá, e a gente tem que mudar a mão de lugar. Esta é a dificuldade do piano. Quando a gente muda a mão de lugar, se não muda para o lugar certo, toca a tecla errada, aí a música não fica aquilo que a gente queria, fica outra coisa.”

1. Táa Táa, Táa , Táa

Táa Táa, Táa , Táa

Ta, Tá, Tá, Tá

Ta, Tá, Tá, Tá

Táa Táa, Táa, Táa

Ao coordenar os espaços tátil, visual, vocal e auditivo, a aluna centraliza seu espaço visual na partitura, o tátil na topografia do teclado, que lhe permite acertar o lugar onde toca. No entanto, seus olhos tendem a verificar as teclas antes de tocar. Ao verbalizar as durações, percebemos que o parâmetro das alturas é esquecido e por isso ISA erra a tecla.

Os esquemas táteis assim como os vocais de ISA deveriam dar respostas executando pela coordenação cinestésicas os conteúdos da notação sobre o teclado. No entanto, na coordenação destes esquemas às vezes acontece uma diacronia. Nota-se que ISA ainda não representou auditivamente as transformações do som para executá-las sobre as teclas. Para se centrar no parâmetro das alturas (movimentos laterais)

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ela deveria ter uma representação auditiva geral da peça que lhe servisse de plano para a seqüência dos movimentos. Os erros de teclas parecem ser resultado da ausência de uma representação geral da melodia que favoreça as compensações necessárias para coordenar os movimentos em todos os eixos. Ao ser solicitada a verbalizar as durações, ISA centraliza sua atenção neste parâmetro e erra o movimento lateral referente às alturas.

Ao pedir que ISA faça a letra, a professora a induz a cantar, sem tocar. Em seguida ISA toca toda a música cantando.

Gráfico do desenho melódico da música Pão quen- ti- nho

Pão quen- ti- nho

O espaço visual se liberta ainda mais do controle das mãos sobre as teclas, já que deve decodificar dois signos concomitantemente: a linha melódica e a letra.

ISA se utiliza cada vez mais da representação auditiva da peça e vai coordenando todos os esquemas envolvidos na execução a partir dela: o visual, tátil e cinestésico. A

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um cru- za- do

Dois, cru- za- dos

Pão quen- ti- nho

representação dos esqumas práticos permite uma maior velocidade de pensamento.

Leitura rítmica de Pássaro Azul:

Gráfico do desenho melódico da música Pássaro Azul: Pás-sa-ro A-zul Ta Ta Ta Táa

Meu Pás-sa-ro A-zul Ta Ta Ta Ta Táa

Não fo-ge, fu-giu Ta Ta Ta Ta Táa

Espaço visual e tátil-cinestésico para ler e bater a palma esquerda sobre a perna esquerda.

Ao usar o lado esquerdo do corpo ISA exercita o condicionamento da leitura das hastes para baixo que correspondem ao toque com a mão esquerda.

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ISA está desconcentrada. Elas fazem um alongamento, andam um pouco, e, em pé, executam o ritmo da próxima peça (a mão esquerda na perna esquerda). Conversam sobre os índios do Brasil, suas armas, língua, e sobre os pássaros, uma vez que a letra fala do pássaro azul. A professora comenta que a ISA esta vestida com as cores do pássaro azul!

Idem ao anterior. Alongamento: Contextualização do tema da música: sons dos pássaros da floresta onde os índios vivem.

Espaço postural no alongamento. Na comunicação a aluna percebe - espaço auditivo e visual - a expressão da professora

A professora busca diversificar a atividade da aluna convidando-a ao movimento global do corpo. Através da fala busca inspirar na aluna a criação de significados para a experiência musical com imagens (índios, a cor do pássaro mencionado na letra da música) que fazem parte do sistema conceitual da aluna.

Para tocar Pássaro azul a professora pergunta: “em que tecla fica o ponto de partida?”. “Na segunda do grupo de três”. “E com que mãos ela tem que tocar?” - pergunta a professora. “Com a esquerda”, diz ISA. Depois a professora pede que a aluna diga o desenho das notas: “Toca, desce, salto acima....”. Desta maneira a aluna vai verbalizando as transformações de altura e duração que aparecem na melodia.

Gráfico do desenho melódico da música Pássaro Azul: Pás-sa-ro A-zul

Meu Pás-sa-ro A-zul

Para ler, os olhos de ISA acompanham os eixos horizontal e vertical, e a voz apenas verbaliza a leitura destes eixos sem emitir o resultado sonoro das alturas

1. Novamente ISA exercita seus esquemas visuais para descrever o desenho melódico e pensar nas transformações dos sons pelos parâmetros de altura e duração através de abstrações refletidas. Não há abstração empírica do som. É puro treino do

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Não fo-ge, fu-giu

movimento dos olhos sobre os eixos da notação que representa o som.

A música Cai Cai Balão foi ensinada pelo método de imitação sem o uso de partitura: Nesta aula vemos a aluna tocar com fluência, porém sua mão estava literalmente “fechada”, abaixo do teclado e o indicador esticado. Quando a professora perguntou se a posição estava bem feita, ela corrigiu, mas perdeu a fluência na música passando a se preocupar com a adaptação da mão ao teclado. A professora então solicitou uma novidade: experimentar tocar a mesma música com a ME.

Cai Cai Balão

Cai Cai Balão

Aqui na minha mão

Não cai não, Não cai não, Não cai não,

Espaço auditivo, tátil, cinestésico e visual. ISA olha para a ação das mãos enquanto toca. Como conhece bem a melodia, tem perfeito controle sobre o que espera que sua mão toque.

A posição fechada de ISA estava adaptada aos seus esquemas anteriores sem contudo atingir o grau de exatidão esperado pela professora. Ao recordar da posição que a professora lhe ensinou, ISA parece estar aprendendo uma posição nova com a qual não se adaptada perfeitamente ao instrumento. Na primeira vez, vemos uma interação de ISA com o objeto musical, e a técnica, apesar de imprecisa, atende às suas necessidades de adaptação ao objeto musical. Na segunda vez, a técnica passa a ser o objeto com o qual ISA interage,

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Cai na Rua do Sabão.

enquanto a música toma um plano secundário em sua atenção.

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QUADRO 2: Aula de PIANO - 27 /05/09 Horário: 4ª. feira 8:00hs Aluna ISA e JEN

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Composição: A professora pede que ISA toque a sua peça: “A Bolha de sabão”. Ela leva um tempo e começa a tocar. Coloca a mão em posição aberta mas logo se lembra da escolha da aula anterior e muda para posição fechada.

A Bolha de sabão Melodia em quatro graus conjuntos. Partindo do 1º grau, uma linha melódica ascendente para no 3º grau, repete esta nota e volta ao ponto de partida. Repetição da linha ascendente parando agora no 4º grau (parte A). Nova linha ascendente até o 3º grau com retorno ao 1º grau e volta ao 4º grau, sempre em graus conjuntos, terminando num “vai-e-volta” entre o 3º, e 4º graus, mas resolvendo no 3º. grau (parte B). As durações variam entre figuras de uma, duas ou quatro pulsações.

Espaço tátil cinestésico: MD na posição fechada faz movimentos laterais que envolvem o braço todo, estabelecendo uma relação causal desta lateralidade com o movimento melódico (agudo-grave).

Coordenações físicas para realizar as transformações sonoras necessárias à música: A. direção do som: 1. Movimento para a direita: som indo para o agudo. 2. Mão permanecendo sobre a mesma tecla: repetição de sons. 3. Movimento para a esquerda: som indo para o grave. B. duração do som: 1. Maior permanência do dedo no fundo da tecla: som mais longo. 2. Menor permanência do dedo no fundo da tecla: som mais curto.

A professora pede que a aluna repita algumas vezes e vai tocando (o que consegue entender) ao mesmo tempo que analisa o que a aluna faz. Se o ritmo não está bem claro pede que ISA bata o ritmo para centrar-se somente neste parâmetro, em seguida

A Bolha de sabão A primeira parte da música começa na Tônica e acaba na subdominante depois de uma repetição da mediante e terminação feminina. A segunda parte acaba na

Espaço tátil cinestésico e auditivo ao tocar. Auditivo e visual ao ouvir a professora. Tátil cinestésico e auditivo ao bater palmas.

Vemos que as solicitações da professora vão levando ISA a tomar consciência das suas escolhas musicais e, mesmo sem verbalizá-las, ela as confirma ao tocar. Ao comparar as partes da música

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pede que ela toque. Se não consegue repetir o desenho melódico, pede que a aluna explique como é: este som é repetido? Demora mais neste? A primeira parte é assim e a segunda parte, é diferente? Como é? A aluna “responde” sempre tocando. A professora recomenda à aluna que ela toque sempre sua música em casa para não se esquecer.

mediante. Graças ao movimento de ida e volta.

ISA agrupa os sons por semelhanças e diferenças através de abstrações pseudo-empíricas sobre a forma da sua música.

1. Atividades de leitura: pg 64 do livro: Pão Quentinho. Antes de continuar a tocar, a professora percebe que o banco esta um pouco baixo e explica à ISA que ela deve ajustar a altura do banco para que seu braço fique paralelo ao teclado. Recomenda que em casa, ela ajuste a altura do seu teclado eletrônico e o banco que ela usa e, caso ela não tenha deve usar almofadas. A professora mostra os teclados que estão na sala comparando as suas alturas e recomendando que a aluna ajuste o da sua casa para a posição mais baixa. Em seguida, ao se posicionar para tocar, ISA coloca a mão nas teclas brancas. A professora pergunta: “qual é o grupo de teclas que você tem que

Pão Quentinho Espaço postural Ao sentar-se frente ao instrumento ISA o faz como costuma sentar-se para qualquer outra atividade. O que a professora faz é lhe mostrar os detalhes da técnica, do que é necessário que ela saiba para melhor usufruir de seu corpo no seu fazer musical com o piano.

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usar?” Imediatamente a aluna coloca a mão nas teclas pretas. É notável como as respostas da aluna se dão através do tocar e não através de palavras. A aluna toca lendo o desenho melódico a apresenta os seguintes problemas: 1. Ao se deparar com uma nota repetida não sabe o que tocar. A professora pede que ela recomece, e o mesmo problema acontece. Então a professora toca para que ela observe e pergunta: “aqui nós não temos a mesma altura?” a aluna acena afirmativamente. “depois eu volto para a mesma altura em que eu comecei a música” diz a professora. 2. Ela não mantém a pulsação e isso parece estar interferindo na identificação da duração das notas. 3. Ao terminar a primeira frase, não continua. 4. quando tem semínimas repetidas na mesma altura, não conta, ou não acompanha a sequência com o olhar. É como se ela identificasse o grupo de notas sem analisá-lo. Mas quando a professora lhe pergunta:“Quantas notas repetidas tem aqui? ”ela pensa e

Pão Quentinho Gráfico do desenho melódico da música Pão Quentinho: Toca, desce, desce, repete

Salto acima, desce, desce, repete

Repete, repete, repete, repete

Sobe, repete, repete, repete

Sobe, desce, desce, repete

Espaço visual: leitura. Espaço tátil-cinestésico: Pressiona as teclas pretas seguindo o desenho melódico com movimentos para a direita ou esquerda ou repetindo a mesma tecla. Espaço auditivo: Deveria regular os resultados de acordo com a representação conservada da melodia, mas neste caso este controle ainda não foi construído por ISA.

Se o espaço visual está destinado à leitura e decodificaçào dos signos musicais, outros espaços práticos devem dominar os movimentos destinados à produção do som, como o espaço tátil e cinestésico regulados sempre pelo auditivo. Neste caso, ISA parece manter o espaço visual atrelado ao tátil-cinestésico, e não parece ter conservado o significado dos códigos ainda. Por isso, não sabe o que fazer.

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responde: “Quatro”.

Como ISA apresentou dificuldade em executar as durações das notas da música Pão Quentinho, a professora pediu que ISA se lembrasse do exercício do Passo da aula de EPEM, e pergunta “Quantos passos eu terei que dar para a duração da mínima?” . “Dois” reponde ISA. As duas realizam o exercício para compreender o ritmo da música “Pão Quentinho”. Assim, através do movimento natural de andar, ISA distribui as notas da música com regularidade e sem parar a cada mudança de desenho. A música se integra assim ao movimento global do corpo. A aluna observa a professora e, ao mesmo tempo, lê a partitura. Será que ela faria sem o estímulo visual?

Pão Quentinho Táa Táa, Táa Táa

Táa Táa, Táa , Táa

Ta, Tá, Tá, Tá

Ta, Tá, Tá, Tá

Táa Táa, Táa, Táa

Espaço visual: leitura. Espaço tátil-cinestésico: para andar para frente e para trás dentro da pulsação. Espaço vocal: para falar com Tá e Táas as durações de cada som da partitura de Pão Quentinho.

Abstração pseudo-empírica: Ao pensar no movimento que faz na aula de EPEM, ISA reconhece no signo sua duração. Ao fazer os movimentos acompanhando a leitura da peça toma consciência das durações dentro do contexto daquela peça e cria uma imagem cinestésica para a seqüência das durações.

A professora explica então que ISA deve prestar atenção nas durações como ela fez com o passo, e também que o lugar de tocar é indicado pelo

Pão Quentinho Táa Táa, Táa Táa

Espaço visual: leitura. Espaço tátil-cinestésico: Pressiona as teclas

Através da instrução, a professora quer que a aluna compreenda que deve conservar o ritmo enquanto

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desenho das notas para cima ou para baixo no papel. Ela deve coordenar estas duas informações que a partitura dá enquanto toca. A aluna faz mais uma vez e atinge estes dois objetivos, mas a posição do seu dedo não está boa.

Táa Táa, Táa , Táa

Ta, Tá, Tá, Tá

Ta, Tá, Tá, Tá

Táa Táa, Táa, Táa

pretas seguindo o desenho melódico com movimentos para a direita ou esquerda ou repetindo a mesma tecla. Espaço auditivo: Desta vez o ouvido regula a coordenação dos espaços práticos de acordo com a representação conservada da melodia.

centra sua atenção às transformações de alturas.

A professora diz que agora que ela já conseguiu fazer bem a leitura das durações e alturas, ela deve prestar atenção na posição fechada. Imita a má posição de ISA e, em seguida, mostra como é a posição correta. A aluna então toca novamente com os três aspectos corrigidos.

Pão Quentinho Táa Táa, Táa Táa

Táa Táa, Táa , Táa

Ta, Tá, Tá, Tá

Especialização do tato com finalidade de atender à expectativa da professora.

?

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Ta, Tá, Tá, Tá

Táa Táa, Táa, Táa

2. Leitura da peça Pássaro azul: A peça é para ser tocada com a mão esquerda. Novamente a aluna parece perdida para encontrar o ponto de partida. A professora pergunta: onde começa? Na 1ª, 2ª. ou 3ª. do grupo de 3? “na 2ª.” diz ISA. Assim que a aluna começa a tocar a professora corrige sua posição fechada. ISA começa a tocar mas esquece de prolongar o som da mínima. A professora a lembra que deve pensar nos dois passos que ela fez no exercício da música anterior. A seguir, ISA toca corretamente.

Pássaro azul Pás-sa-ro A-zul Ta Ta Ta Táa

Meu Pás-sa-ro A-zul Ta Ta Ta Ta Táa

Não fo-ge, fu-giu Ta Ta Ta Ta Táa

Espaço visual: o controle dos eixos presentes na partitura e na

A partitura mistura conteúdos das formas significantes: as figuras (durações) são dispostas nos eixos vertical (alturas) e horizontal (sucessão) e assim, dão conta de três aspectos do som: as durações, as altura e a sucessão dos ataques de cada som. Como a aluna se centra em apenas um dos aspectos da representação do som na partitura, podemos dizer que sua representação é figurativa: no caso ela pensa nas teclas que deve tocar a cada signo que lê no desenho melódico (alturas), mas as durações lhe escapam, pois a representação da sistema total da melodia ainda não foi representado por

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ISA. 3. Localização das teclas brancas: O livro propõe que a aluna responda qual é a localização das teclas brancas em relação às pretas. Ela deve assinalar nos teclados qual é a tecla pedida. “antes da primeira do grupo de 2 teclas pretas”. Na segunda parte do exercício, ISA deve completar as frases dizendo qual tecla já está assinalada no teclado proposto. A professora vai explicando os enunciados e ISA consegue preencher todos os espaços em branco. Para acabar a aluna deve dizer qual tecla não foi marcada. Professora e ISA vão baixando no teclado real todas as teclas marcadas nos desenhos de teclados do livro até encontrar qual não foi baixada.

Exercício escrito de localização das teclas brancas em relação às teclas pretas. No grupo de duas e três teclas pretas temos a primeira e a segunda do grupo de duas pretas, assim como a primeira, segunda e terceira do grupo de três pretas. Na frente delas, temos a localização das teclas brancas que são ordenadas também da esquerda para a direita e podem ser localizadas em relação às pretas. Assim, temos a tecla branca que fica antes da primeira do grupo de duas; a que fica entre a primeira e a segunda tecla preta do grupo de duas; e a que fica depois da segunda do grupo de duas. Este esquema de organização espacial se repete nas que ficam na frente do grupo de três teclas pretas.

Espaço visual. Esta atividade parte da idéia do teclado como objeto e suas propriedades infralógicas se caracterizam por relações de vizinhança e de ordem.

Posição de arco 1. A professora diz que é fácil fazer a posição de arco quando a gente sabe fazer bem a posição de cluster. Por isso, a professora pede que ISA siga a sequência proposta pelo livro: tocar cluster nas pretas; depois cluster nas

1. Posição de cluster: no grupo de três teclas pretas, escorrega para as teclas brancas. Abre os dedos, um em cada tecla( de Fá, Sol, Lá Si e Dó) e pressiona todas elas juntas. 2. Posição de arco: Toca as teclas Fá e Dó ao mesmo tempo com 1º e

Espaço visual coordenado ao espaço tátil: O esquema motor trabalhado nesta lição é uma adaptação da posição de cluster

Se a sucessividade e a simultaneidade de sons têm sido vivenciadas pelas alunas desde o início do livro, através do estabelecimento do uso das mãos – “posição fechada” e posição de cluster”; depois

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brancas; depois cluster abrindo os dedos - com os 5 dedos ao mesmo tempo, cada um numa tecla vizinha; e em seguida com 1º e 5º dedos ao mesmo tempo. 2. A professora então pergunta à ISA se ela tem alguma idéia do porquê esta posição se chama “posição de arco”. Como a aluna observou sua própria mão e notou que o polegar estava fazendo uma curva. Mostrou isso para a professora, que então pediu que ela tirasse a mão das teclas sem desmanchar a posição. Mostrou que a mão formava o desenho de um arco, e que por isso, se chamava posição de arco.

5º dedos, deixando os 2º 3º e 4º dedos suspensos. Ensino de uma nova posição que dará origem aos acordes e também à noção de harmonia.

1º 5º Os intervalos de 5ª dão inicio à experiência da simultaneidade de sons tonais e trazem a vivência do espectro harmônico de cada som sendo a base para a compreensão dos acordes tonais.

(onde a mão toca com todos os dedos da mão ao mesmo tempo) ao uso de dois dedos apenas (1º e 5º).

mãos “alternadas” ou “juntas”; além da prática constante de melodias acompanhadas; a grande diferença aqui é o estabelecimento de um esquema motor que poderá ser usado como base para os acordes tonais.

20:30 Exercício técnico: João teimoso. MD. Este exercício trabalha a flexibilidade do pulso utilizando para isso a alternância da posição de arco e o toque com o 3º. dedo. A imagem do “João Teimoso” vem para ajudar o aluno a imitar a alternância de duas posições contrárias que potencializam-se mutuamente: a do pulso baixo e pulso alto assim como

Alternância de intervalos de 5ª justa e a terça do acorde maior, uma vez cada seguida de repetições da 5ª justa.

Espaço tátil: os dedos são apoiados cada um sobre uma tecla branca e o 1º e 5º dedos tocam simultaneamente produzindo um intervalo de 5ª justa. A alternância da posição de arco e do 3º dedo sozinho é nova

Observando o movimento feito pela professora e imaginando o movimento de um boneco sendo empurrado e voltando, ISA imitam e vivem uma abstração empírica do intervalo de 5ª justa. Ao tocar, ouvem o resultado do intervalo harmônico alternado com o som isolado da 3ª do acorde

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toda a gama existente entre as duas alturas do pulso. Enquanto toca o exercício com a MD, a professora conta que o João teimoso é um boneco que a gente empurra e ele volta sozinho à posição inicial. Depois explica que a notação para o arco é diferente as notações usadas até agora no livro. Mostra os símbolos escritos para representar as posições usadas para fazer a sequência de três alturas do pulso para o exercício: (arco) - pulso baixo, (3º dedo) - pulso alto, e no final, (arco) com o pulso na altura média entre as outras duas.

1º 3º 5º

esta atividade se compara a um exercício reflexo. Espaço cinestésico: A articulação do pulso também é novidade e está sendo exercitada dentro da atividade global da mão. Espaço auditivo: audição do intervalo de 5ª justa alternando com a 3ª do acorde maior.

perfeito maior.

27:39. ME. O mesmo exercício é proposto para ser feito com a ME. Com esta mão a aluna apresenta dificuldade na prontidão da posição de cluster. A professora pede que ela sinta as pontas de todos os dedos encostadas umas nas outras e que apóie a mão na madeira do piano, assim como no dorso da mão direita. Quando ela pede que a aluna abra os dedos ela vai colocando cada dedo separadamente nas teclas. A professora diz que ela deve abrir a mão partindo da posição de cluster, e

Alternância de intervalos de 5ª justa e a terça do acorde maior, uma vez cada seguida de repetições da 5ª justa. O dedilhado é contrário, o que causa um certo desequilíbrio cognitivo em ISA.

Espaço tátil: a posição da mão (em arco) foi aprendida por ISA por imitação e agora ela faz uma imitação diferida com a ME. Ela está ainda adaptando a experiência anterior a ela, mas seus esquemas ainda se fixam no padrão anterior (de cluster) que é de manter os dedos mais

Notamos uma dificuldade motora pelo fato de o uso comum da ME assumir um papel diferente do da MD. No piano a ME deve ser treinada até conquistar uma igualdade em relação às respostas musculares da MD. Quando as duas mãos tocam as teclas iguais, há uma inversão de dedilhados que exige uma dissociação tecla-dedo. Enquanto a MD toca a tecla mais grave com o 1º dedo, a

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lembrando dessa posição. Ao realizar o exercício, a ME de ISA vai aos poucos fechando e ela começa a esbarrar. A professora explica que o som ficou esquisito porque o dedo saiu do lugar. Pede que ISA observe a posição da mão para que cada dedo tenha uma tecla. ISA realiza o exercício com êxito.

5º 3º 1º

próximos. A partir de agora a abertura dos dedos deverá obedecer ao padrão da distancia entre as teclas pois é uma adaptação espacial da mão ao uso das teclas brancas.

ME a toca com o 5º dedo.

Repertório com arco: A peça é tocada com mãos alternadas e por isso a professora recorda uma das primeiras peças do livro em que este modo de uso das mãos é apresentado. Faz uma linha pontilhada no início da partitura para que o olhar de ISA se desloque de uma região para outra no papel (agudo em cima, grave em baixo). 1. batem o ritmo dizendo a mão que toca 2. A professora aponta para as orientações do caderno que indicam, através de um diagrama do teclado, quais teclas estão envolvidas para tocar a posição de arco com cada uma das mãos. Em seguida, ISA coloca as mãos nos pontos de partida para começar a tocar ao Piano. A nota mais grave de cada arco é a primeira

Adivinhação: A peça é composta por arcos a serem tocados por mãos alternadas (MD ou ME) e juntas no arco de Ré (o Ré é a nota mais grave das formas dos arcos tocados pelas duas mãos).

Espaço visual: direcionado para a leitura. O olhar de ISA acompanha a linha pontilhada. Espaço vocal e cinestésico: As coordenação da palmas com o comando vocal favorecem a vivencia da lateralidade levam a um resultado sonoro isolado do parâmetro de duração (ritmo). Espaço Tátil: a aluna vai adaptando seus esquemas à forma do arco. Os dedos intermediários ficam ainda esticados para não abaixarem as

Abstração empírica de intervalos harmônicos de 5ª Justa sendo tocados alternadamente pelas duas mãos. Como as teclas onde são tocados os sons mais graves são as referencias para a localização da posição da mão no teclado conclui-se que o teclado passa a ser classificado através de novos agrupamentos. Antes havia teclas brancas e pretas. Depois as pretas de grupos de dois e três e as brancas na frente de cada um destes grupos. Agora, as teclas brancas ganham mais identidade e cada

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referencia para encontrar a posição. Enquanto aponta para o diagrama a Professora pergunta pela relação das teclas brancas a serem usadas com as teclas pretas mais próximas. A aluna vai respondendo. 3. A aluna toca a peça enquanto a professora aponta cada nota e fala o nome da mão que deve tocar. 4. A professora pede que a aluna leia a letra e aponta a letra enquanto lê com ISA em voz alta. 5. Pede que a aluna toque ao mesmo tempo que lê a letra, mas faz ao mesmo tempo que a aluna e Isa entoa não fala a letra. A professora pede que ela repita falando desta vez, sozinha. 6. a aluna faz bem as duas ações, mas a posição de arco se descuida. A Professora pede que ela preste atenção a isso, e a faz lembrar do arco dentro da palma da mão e que os dedos que não tocam devem ser direcionados para as teclas e não para o alto como ela está fazendo. 7. a aluna repete a música e a professora repete a observação sobre a direção da ponta dos dedos para que depois ela tenha os dedos à

teclas, e o pulso ainda fica muito alto.

uma delas possui um par para formar o arco. Através do esquema motor do arco ISA pode experimentar os arcos por todo o teclado.

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disposição de tocar nas teclas onde estão apoiados. Mudança de arco: a próxima peça “Mourão”, deve ser tocada em outro arco. Para situar-se ISA deve procurar o lugar da nota mais grave do arco. Depois bate o ritmo nas pernas usando a mão correta e dizendo qual a mão que toca. Depois faz o mesmo falando a letra. Depois toca com os arcos novos. ISA se descuida da forma e a professora a corrige constantemente dizendo que ela deve “se lembrar da posição de arco por dentro da mão”. Depois de algumas vezes agindo para encorajar a aluna, a professora deixa que ela faça todo o processo sozinha: achar o lugar para tocar, tocar seguindo a partitura e cantando a letra.

Mourão: A peça é composta por arcos de Mi a serem tocados por mãos alternadas e juntas. Inicia-se pela ME e alguns dos arcos na linha da MD são repetidos.

Espaço visual: a escrita apresenta-se em dois planos horizontais para a leitura, portanto os olhos se orientam da esquerda para a direita e de baixo para cima. A letra da música é mais uma linha a ser dominada pela visão, o que torna a interação sujeito-objeto ainda mais complexa. Espaço tátil: a forma do arco é visualizada por ISA na mão da professora, que tira a mão das teclas e mostra para a aluna sem desmanchar a forma. Espaço auditivo: o resultado de sua ação alimenta a continuidade do seu raciocínio.

A quantidade de informação é dosada pela professora: lateralidade das mãos ao mesmo tempo que as durações são verbalizadas, mas aos poucos ISA vai adquirindo confiança para assumir o controle de todas as variáveis. O exercício vai permitindo a conservação de alguns esquemas táteis e as respostas de suas mãos acontecem sem que ela tenha que desviar tanto o olhar da partitura para o teclado. A abstração pseudo-empírica é evidenciada pelo esforço em controlar as variáveis com fins na eficácia da ação. ISA sabe que esta eficácia depende da muitos cuidados que ela mesma tem que tomar durante sua execução.

A nova composição. “As princesas do mar”. A professora dá as regras: usar as três posições – cluster, fechada e arco e imaginar uma estória

Os elementos da composição são: as três posições – cluster, fechada e arco. A imagem visual da estória a ser inventada por ISA poderão

Não há. Não há.

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de desenho animado e que ISA está fazendo a trilha sonora dela. A condição é não usar palavras para contar a estória, somente sons. Sugere alguns exemplos ao piano e anota a proposta no caderno.

trazer sugestões para movimentos, para sons, ou desenhos melódicos.

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QUADRO 3: Aula de PIANO - 03/06/09 Horário: 4ª. feira 8hs - Aluna ISA, 7;8 anos. 9 hs: Aluna: JEN. 8;0 anos.

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

É a primeira aula da dupla ISA e JEN. Elas estão se conhecendo e a professora procura dar oportunidade para as duas alunas mostrarem o que estavam trabalhando até esta aula. Como JEN está mais adiantada nas atividades do livro I da série EMaT, a professora programa atividades nas quais JEN possa apoiar as atividades de ISA, revendo conteúdos. ISA está aprendendo a posição de Arco que JEN já aprendeu. ISA começará tocando as peças que está estudando, depois JEN fará uma leitura melódica nova. Elas combinam que JEN vai ajudar ISA a aprender a parte harmônica de uma peça que ambas conhecem. :“pão quentinho”, melodia inglesa, do livro I da série EMaT e também a aprender as cifras, que JEN já aprendeu.

Nada Nada Identificação dos conteúdos já trabalhados pelas alunas. Antecipação das ações em aula.

ISA toca uma música que “compôs”. Na verdade, ela aprendeu esta música por imitação em aulas do primeiro bimestre, mas quando lhe foi requisitado que compusesse uma música, ela inventou uma letra própria para esta música (do livro Palitos Chinos de Violeta de Gainza). Ela toca usando as teclas pretas da região central

Ritmo pontuado para as mãos alternadas nas teclas do grupo de dois, e semínimas para mãos juntas nas teclas dos grupos de três.

Melodia a ser tocada com posição fechada, nas teclas pretas, usando mãos alternadas e juntas. A extensão envolve dois grupos de três em torno de um grupo de dois.

A imitação é ainda tão forte no pensamento musical de ISA que ela acredita realmente que a música é sua. É como se fosse sua invenção. Noto também que a

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do piano, alternando uso de mãos alternadas e mãos juntas. O pontos de partida são na 2ª do grupo de dois com a mão direita, e na 1ª do grupo de dois com a mão esquerda.

aluna concebe uma composição como texto – linguagem. Talvez para ela, a criação da letra sobre uma melodia conhecida já é uma “composição”. Podemos supor que para ISA, a música ainda não é ainda considerada como uma linguagem.

Melodia Pão Quentinho: A professora pede que ISA toque a melodia de Pão quentinho na região aguda. Pergunta se ela sabe tocar por leitura. ISA diz que sim. Depois pergunta em que grupo de teclas devemos tocar essa música. ISA responde: “de três”. “Isso mesmo! Vamos lá...” incentiva a professora. ISA começa a tocar e é interrompida. A professora lembra que a música tem uma parte para ser tocada e outra para ser cantada. Pede que ISA toque e JEN cante. Ao dar entrada para começarem ISA erra. A professora recomenda que ela deixe os dedinho bem em cima da tecla que é o ponto de partida para acertar. Ela toca bem. A professora então convida JEN para tocar junto, se posicionando na região grave do piano. Ao iniciar, a professora interrompe as alunas para que elas recomecem com mais atenção ao

Melodia com três sons tocados no grupo de três das teclas pretas, com a mão direita. 1ª. frase tem 4 mínimas, começa no som mais agudo e desce. Repete o mais grave. 2ª. frase é uma repetição da primeira, 3ª. frase é composta de 8 semínimas, 4 repetições no som mais grave, 4 no som intermediário, 4ª. frase é a repetição da primeira frase.

O cantar e tocar, exige a coordenação da voz e das mãos para realizar uma mesma representação sonora. O uso da mão direita com posição fechada nas teclas pretas. A dificuldade ao usar esta posição é manter a mão compacta e próxima às teclas, pois somente um dedo (o indicador) toca. Isso possibilita fazer deslocamentos em espaços variados com firmeza, e assim, baixar as teclas com o controle

Assimilação da leitura com todos os signos que a compõe. Notas, letra, localização para tocar. Esta coordenação de leitura e reação do sujeito ao resultado de sua ação.

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ataque. Devem olhar uma para a mão da outra, sentir o tempo e baixar a mão ao mesmo tempo. ISA toca as três semínimas e esquece de repetir. Elas começam de novo e fazem bem.

da energia usada desde o braço até o dedo. Por outro lado, muitas outras atividades podem ser feitas ao mesmo tempo, tais como cantar, sem prejuízo para a atenção, que terá apenas a posição em bloco para ser conservada.

Pássaro Azul: A professora estimula as duas alunas a se prepararem: “Vamos ver quem coloca a mão no ponto de partida primeiro!”. Logo que as alunas se posicionam a professora chama a atenção para o uso das mãos. “Uma está com a mão direita e a outra com a esquerda...?” Imediatamente, JEN corrige o uso da mão. A professora pede que JEN melhore também a posição fechada, que está com os dedos voltados para dentro da palma. Explica que o polegar deve apoiar o indicador, e os outros dedos devem ajudá-lo nesta tarefa. Quando ISA toca junto com JEN ela não segue bem a leitura, parece querer imitar a colega, mas como não há tempo para ver e tocar depois, ela erra. Tocando sozinha, ela lê e acerta (mesmo que ainda alterne o olhar entre partitura e teclas). Quando ISA acaba, a professora pergunta para JEN o que ela achou da posição de ISA. “É...” e balança a cabeça afirmativamente. A professora

Melodia composta com três sons, ritmo ternário, tem letra com três frases: Primeira frase: Pássaro azul - som do meio, desce, salto acima e desce. Segunda frase: Meu pássaro azul - igual a primeira frase mas repete o primeiro som. Terceira frase: Não foge, fugiu! - Toca repete, passo abaixo, passo acima.

Peça para tocar com a mão esquerda em posição fechada no grupo de três teclas pretas, em graus conjuntos e alguns saltos. A posição fechada prepara a conscientização para o uso do dedo na forma arredondada, e direcionando a energia da ação para a ponta do dedo contra a tecla sem, contudo, que o dedo “quebre” (se dobre de fora para dentro da palma).

1. Solicita-se o reconhecimento da tecla marcada na representação gráfica do teclado no livro e sua correspondente no teclado. 2. a ação solicitada a seguir é de tocar o que está escrito na partitura, e isso exige a decodificação do signo e o movimento da mão sobre o instrumento. ISA não decodifica com tanta velocidade, e tenta usar a ação da colega como modelo para imitar. Com isso não se concentra em si,

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diz que percebeu que ISA estava com o indicador sem apoio (mostra como lhe pareceu a posição de ISA). Diz que isso é importante para que elas já vão adquirindo a “posição de concha” para tocar bem no futuro. Depois disso as duas alunas tocam juntas a melodia com boa posição e sem erros de leitura.

mas na ação da colega 3. Quando repete a ação, ISA centra sua atenção na leitura e na posição de sua própria mão e obtém sucesso.

Acompanhamento de Pássaro Azul – 1. A professora se posiciona para tocar no outro piano da sala e diz: “essa é uma música indígena”, e começa a tocar o acompanhamento com as duas mãos juntas em posição fechada. Toca com interesse, mexendo um pouco o corpo como se estivesse dançando, e em seguida pergunta o que elas acham que é aquilo que está tocando (quer que elas identifiquem tambores indígenas nas batidas) mas JEN ao contrário, se mobiliza para imitá-la. 2. Sem parar de tocar, a professora pergunta se ela quer tocar. Ela diz que sim e então, a professora pede que elas batam palmas repetindo exatamente o mesmo ritmo que ela está tocando. Toca e verbaliza: taá-ta-ta-taá... Enquanto isso, as alunas batem o ritmo com palmas. 3. Assim que param, JEN tenta imitar o que a professora tocou, mas erra a tecla de uma das mãos. A professora vai até o piano delas e mostra em que teclas elas devem tocar. Coloca a mão no lugar e pede que elas completem sua

O acompanhamento em ritmo ostinato apresenta notas repetidas (nas teclas fá# e dó#) com o ritmo semínima, duas colcheias e desce para (ré# lá #) em semínima. Se mantendo durante toda a apresentação da melodia, sugere o som de tambores indígenas, sempre constantes. No final, o acompanhador uma sequencia de quintas ascendentes pelas teclas pretas, sugerindo agora o movimento ascendente de um pássaro levantando vôo.

O acompanhamento em ritmo ostinato (semínima, duas colcheias e semínima) e 5ª vazias, está sendo tocado pela professora com posição fechada e mãos juntas. 2.

1. Partindo da imitação do movimento, JEN apreende o ritmo, a posição de tocar, mas não acerta o lugar, pois sua visão não alcança este dado (ela está longe do piano da professora). 2. Ao pedir que as alunas batam o ritmo, a professora está solicitando a imitação diferida de uma ação, que ajudará a formar esquemas rítmicos a serem internalizados posteriormente. 3. Ao mostrar o lugar em que as alunas devem tocar, a professora está fornecendo dados

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fala: “Mão esquerda na 1ª do grupo de? ...” – Elas dizem: “ 3”; e a “Mão direita na 1ª do grupo de?”...“2” - dizem elas. 4. ISA toca e erra a mão esquerda. A professora pede que ela repita, e o mesmo acontece. A professora realça que ISA está fazendo bem o movimento da direita, que é de uma tecla preta para sua vizinha de baixo, e que a mão esquerda tem que fazer o mesmo movimento só que em teclas vizinhas diferentes. Pede que ela toque só a mão esquerda. Ela toca e percebe que o movimento está preso. A professora pede que ela repita. Ela toca melhor. 5.Depois disso, ISA e JEN tocam o acompanhamento juntas.

figurativos do instrumento sobre os quais se dará a ação. Ao solicitar o nome da tecla, a professora está promovendo que elas identifiquem os pontos de partida e este é o início para a classificação das notas do conjunto de notas usadas nesta peça. Esta solicitação promove a operatividade. 4. Me parece que ISA centra sua atenção no movimento da mão direita e a coordenação do movimento paralelo entre as duas mãos ainda não está disponível. Ao fazer o movimento com a mão esquerda, JEN fortalece um esquema motor que será importante para a coordenação que deve alcançar. 5. Depois das experiências anteriores,

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a representação auditiva ajuda a acomodar a simultaneidade da ação das duas alunas, e os esquemas motores já funcionam com mais desenvoltura.

Lendo a melodia de Pássaro Azul: Uma vez aprendido o motivo do ostinato, a professora toca o acompanhamento e pede que elas toquem a melodia. Sua intenção é que enquanto ISA e JEN tocam a melodia, elas ouçam, com mais consciência, a presença do ostinato. Todas tocam juntas a melodia para recordar. 1. Ao perceber que ISA está dispersa, a professora pede que ela diga qual é a tecla do ponto de partida. Ela coloca a mão no lugar mas não fala. A professora pede que ela diga, e ela diz corretamente: “2ª do grupo de três”. ISA é solicitada a tocar novamente enquanto JEN aponta as notas escritas no livro. O objetivo é manter as duas alunas concentradas no ler-tocar - Uma aponta (lendo) e a outra toca (lendo). ISA toca perfeitamente. A professora a elogia nota-se que ISA fica contente. Depois disso, elas tocam juntas mas JEN se engana nas teclas e a professora pede que ISA

1. No método usado, a denominação das teclas é feita primeiramente pela sua localização no teclado. Saber a localização do ponto de partida do desenho melódico ajuda na concentração da aluna no ato de leitura.

1. Decodificação dos signos musicais e para tocar com a mão esquerda, na posição fechada, fazendo movimentos de repetir o toque em algumas teclas, ou passar de uma tecla para a tecla da direita/esquerda, ou saltar alguma tecla vizinha para alcançar a seguinte.

1. Na ação de tocar saber onde colocar os dedos é tão importante, que a questão “qual é a tecla? ” tem o mesmo sentido de “onde fica?”. Esquemas de ação estão se constituindo para a localização das teclas. Os esquemas elementares levam os olhos a vasculharem todos os movimentos das mãos. Ao tocar um instrumento de teclado, o movimento dos olhos do sujeito deve ser controlado por suas estruturas operatórias, que coordenam o que

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aponte as notas para JEN seguir a leitura. JEN para de tocar e a professora explica que é importante elas não desviarem o olhar da partitura. Pergunta se elas sabem quem manda o dedo tocar. Elas ficam quietas e a professora conta: “É o cérebro! Só que o cérebro não sabe ainda onde tem que mandar o dedo tocar, quem conta para o cérebro são os olhos. Se a gente não olha a partitura enquanto está aprendendo a música, como o cérebro vai mandar a mensagem para o dedo? Depois que a gente já sabe, a gente não precisa mais olhar a partitura. Pode olhar só para o teclado”.

ele entende do código ao tato e à audição. Os olhos têm a função de receber os signos (notação) enquanto as pontas dos dedos tem a função de sentir a localização das teclas. A audição controla os resultados. Mas é o sujeito que utiliza suas estruturas operatórias para reagir às estruturas perceptivas.

Decorando a melodia de Pássaro Azul : Pergunta para elas se elas já sabem esta música décor. JEN diz que sabe. A professora pede que ISA tire a partitura para JEN tocar décor. JEN começa a tocar mas se engana no desenho melódico e pára. A professora então pergunta: “O que tem ali? Olhe lá na partitura.” Ao olhar, JEN vê que tem uma nota repetida que ela havia esquecido. A seguir JEN vai tocando a peça toda enquanto a professora vai descrevendo o desenho melódico junto com JEN.

Repetindo a estrutura já citada: Melodia composta com três sons, ritmo ternário, tem letra com três frases: Primeira frase: Pássaro azul - som do meio, desce, salto acima e desce. Segunda frase: Meu pássaro azul - igual a primeira frase mas repete o primeiro som. Terceira frase: Não foge, fugiu! - Toca repete, passo abaixo, passo acima.

Coordenação dos espaços: visual; tátil e auditivo.

2. Através da descrição do desenho melódico, a professora quer trabalhar a memória de reconstituição de uma partitura que as alunas já conhecem.

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A música como significante: 1. Uma vez recordada a melodia, a professora começa a tocar o acompanhamento e pergunta novamente se elas sabem o que aquele acompanhamento parece. JEN diz: “Música de terror!” a professora ri... e diz: “Se é um canto indígena, o que pode ser isso?” JEN diz que se ela estivesse ouvindo isso e aparecesse um pássaro ela acharia que era filme de terror... A professora pergunta para ISA o que ela acha que é aquilo [toca o ostinato] e lembra: “é uma música indígena, lembra alguma coisa pra você?” ISA diz: “um pássaro azul”. A professora aceita a resposta e ainda pergunta: ele anda assim? ele voa assim? [e faz movimentos com as mãos]. 2. A seguir a professora explica que ela vai tocar duas vezes o ritmo “Taa –ta-ta –taa”, e que só então elas devem começar a melodia. Toca o ostinato e canta a melodia para que as alunas tenham uma idéia da simultaneidade das duas partes. 3. As alunas ouvem e tentam se encaixar tocando a melodia enquanto a professora toca o acompanhamento. Na primeira vez, ISA até conseguiu acertar alguma coisa, mas JEN parou de tentar. 4. Elas repetem a experiência e as duas conseguem tocar mais.

1. A partir da audição de um ritmo ostinato do acompanhamento criado pela autora do livro, a professora quer saber se as alunas emprestam algum significado àquilo que ouvem. Um acompanhamento para uma música indígena, em ostinato: tambores indígenas parecia ser óbvio para a professora! Mas para as alunas não há ainda nenhuma relação direta do som de tambores com o som do piano. A música ainda não está constituída para as alunas como um “significante”? 2. Apresentação do modelo de melodia com harmonia acrescentada que simula o que as alunas tocarão a seguir. 3. melodia tocada pelas alunas com o acompanhamento feito pela professora.

1. Espaço auditivo. 2. Espaço auditivo. 3. coordenação do espaço auditivo com o espaço tátil e visual para localizar a mão no teclado. 4. idem ao 3.

1. Ao solicitar a imaginação das alunas nota-se uma decalagem entre as alunas. JEN relaciona o que ouve com suas experiências anteriores (música de filme de terror), mas ISA se prende ao título da peça como única possibilidade para definir o significado da música. Conservação de uma melodia ao ouvir uma harmonia concomitante. Desta vez as alunas deram uma resposta com conteúdo simbólico. JEN expressou sua sensação ao ouvir o ostinato, e ISA expressou qual imagem mental lhe vem quando ouve a mesma coisa.

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5. Depois do final da melodia, o acompanhamento apresenta um movimento paralelo ascendente em quintas. JEN imediatamente começa a imitar o que a professora fez. Esta a incentiva: vai até o piano das alunas para mostrar como fez: “A gente vai andando de tecla em tecla, deixando sempre duas no meio”. [Mostra quais são os pontos de partida de cada mão, e explica que as duas mãos tocam sons vizinhos e as duas sobem para o agudo ao mesmo tempo]. 6. Por fim a professora pergunta: “O pássaro fugiu pra onde?” JEN responde: “para algum lugar!” A professora complementa: “para o agudo!?” 7. Quando a professora pergunta se elas querem fazer mais uma vez e ISA diz: “não”.

5. Quintas paralelas em linha ascendente (significando o vôo do pássaro azul).

5. coordenação do espaço auditivo, tátil (duas mãos em posição fechada) e visual para a imitação da professora e para a localização nas teclas pretas.

6. Solicitação da professora de imagem extra-musical (significado) para um elemento da música (5as ascendentes).

ONDAS: JEN toca a música ONDAS do livro Divertimentos de Laura Longo. A aluna tocou uma vez a música toda, mas não manteve a pulsação. Depois que ela parou e elas conversaram um pouco sobre vários assuntos. Ao retornar para a peça, a professora recordou o que era pulsação, e propôs que ISA acompanhasse JEN com palmas para que ela percebesse bem a pulsação da música. Quando JEN tocava a parte A, a professora a interrompeu e pediu que ela passasse a tocar a parte B. JEN começou a tocar em outro andamento. A professora a interrompeu novamente e pediu que

Peça em forma ABA. Apesar das diferenças entre as partes, deve se conservar a mesma pulsação durante a peça toda. A parte A é essencialmente harmônica, e a extensão usada é de três oitavas (Sequência de clusters em três grupos de três teclas pretas, seguida de outra sequência nos grupos de duas teclas pretas). O efeito que se

Espaço Tátil/cinestésico: vemos o uso de posições diferentes para cada seção da música. Na parte A, o uso de mãos alternadas em posição de cluster e mudanças de registro (cruzamentos dos braços) numa extensão de duas oitavas (dois grupos de dois e dois de três). Na parte B, o uso

O uso do pedal é fundamental para caracterizar a continuidade do som, fazendo uma analogia desta continuidade com a imagem mental que temos da água. Esta pode ser caracterizada como uma representação simbólica. Na primeira vez que

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ela recomeçasse a parte A. A aluna notou que tocava mais lentamente a parte A. Portanto, quando ela pediu que JEN refizesse a parte B prestando mais atenção às batidas que ela e ISA estavam fazendo, JEN percebeu que precisava tocar mais lento do que estava acostumada a tocar. Aos poucos se acomodou ao andamento correto. Repetiu a peça toda usando pedal, e manteve o andamento constante.

busca é de uma massa sonora harmônica, densa, apesar de suave (p). Já na parte B, de caráter melódico, a extensão usada é de uma nona (um grupo de três e um grupo de duas teclas pretas). Pode-se dizer que a forma expressa a imagem sugerida pelo título da música: “ondas”. Na parte A, com uma densidade maior e a parte B, uma densidade menor.

de posição fechada, e melodia dividida entre as duas mãos na extensão de um grupo de três e um de dois. Cada mão responsável por um dos grupos de teclas pretas. Em alguns momentos da parte B as mãos tocam juntas mas ela se diferencia da parte A por ser melódica. O uso do pedal exige uma coordenação do pé direito com a entrada e saída das mãos das teclas quando acontece a mudança de harmonia (parte A) - nesta peça é identificado pela mudança dos grupos de teclas pretas usados - ou quando há mudança de frase melódica (parte B).

JEN tocou, não manteve a pulsação. Depois da comparação entre o andamento que ela estava fazendo na parte A e na parte B, através da intervenção da professora e da colega (que bateram palmas), houve a tomada de consciência da falta de conservação de pulsação

Forma do Arco e posição aberta: Leitura do exercício “João Teimoso” da série EMaT. ISA começa antes. Ela está aprendendo a mudar a forma da mão. Passa da posição de cluster nas teclas pretas para as teclas brancas e depois, abrindo os dedos sobre cada uma das teclas

Sequência de quintas vazias ( [ ) e som isolado ( | ) em mínimas. Resulta numa voz superior e outra inferior:

Espaço tátil:Posição de Arco e som isolado para o 3º dedo. Cinestésico: Movimento flexível do pulso para baixo e para cima,

A dificuldade técnica apresentada nesta açào é manter a posição dos dedos na direção das teclas de modo a trabalhar a flexibilidade

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brancas, transforma a posição de cluster em posição aberta. Por fim, toca a forma do arco (uso simultâneo do primeiro e quinto dedos) e, fazendo o movimento com o pulso para cima e para baixo toca o exercício proposto. [JEN não quis fazer este exercício. A professora propôs que ISA tocasse sozinha e depois JEN tocaria uma última música antes de ir pra casa.]

Dó, Lá, Dó, Lá, Dó, Dó. [ | [ | [ [ Fá, Lá, Fá, Lá, Fá, Fá,

finalizando com o pulso na posição média, relaxada. Auditivo: ao ouvir a alternância de intervalo harmônico e melódico

do pulso. A conservação da forma é fundamental para que a mão possa estar disponível para tocar com os dedos em todas as teclas do piano, abrindo e fechando a mão sabendo voltar ao padrão de 5 dedos sobre 5 teclas. Esta conservação depende da adaptação da estrutura “mão” à estrutura “5 teclas” que solicita a acomodação de esquemas táteis. Sincronicamente a desta acomodação, o sujeito constrói o esquema auditivo a partir do resultado sonoro da 5ª justa tocada e dos intervalos melódicos resultantes da sucessão de toques de arco e 3º dedo.

Adivinhação: as alunas posicionam as mãos para começar. JEN resolve tocar esta música. ISA esta aprendendo a colocar a mão na forma

A localização das teclas de cada arco. O intervalo de quinta é correspondente à

Peça escrita em posição de arcos para o uso de mãos alternadas e juntas

Conservar a mão sobre as mesmas teclas do começo ao fim

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de arco e para isso a professora a ajuda a encontrar a nota mais grave do intervalo de quinta. Mostra a tecla mais grave no diagrama do teclado impresso no livro assim como a tecla correspondente no teclado real. Pega o dedo mínimo da mão esquerda de ISA e leva-o até a tecla correta mantendo a posição da mão da aluna aberta.

distribuição dos 5 sons que o compõe assim como dos 5 dedos das mãos. A peça tem forma AB. A primeira parte começa com a mão direita, e a segunda parte com a mão esquerda.

no som final. lembrando-se de iniciar a segunda parte com a mão esquerda e terminar com as mãos juntas. Além disso, a leitura em dois planos (grave para a mão esquerda e agudo para a mão direita) exige a coordenação dos espaços físicos do teclado dominados pelo movimento das mãos, e do espaço representativo da partitura coordenados pela visão.

Mourão: a professora desafia as alunas perguntando quem conseguirá colocar antes a mão no lugar indicado pelo livro para começar a música Mourão. JEN colocou as duas mãos no lugar certo e, com ajuda, ISA também consegue. A professora pergunta para ISA com que mão se deve começar a tocar e ISA responde errado. A professora chama sua atenção cobrindo todas as notas da partitura, menos a primeira. Pergunta novamente e ela responde corretamente. Elas começam mas uma erra a mão a outra erra a duração.

A peça é composta de frases curtas que acompanham palavras. As durações, de semínimas e mínimas, formam métricas ternária e quaternária, dependendo das palavras usadas, mas sem divisão de compassos. A primeira palavra MOURÃO tem três pulsações. Ela é repetida três vezes. A seguir aparece uma frase maior

Posição de arco, mãos alternadas com algumas repetições de mão. No final, as duas mãos tocam juntas.

A solicitação da conservação da posição de arco coordenado ao reconhecimento do lugar onde tocar no piano (este sendo referente ao lugar representado no diagrama do teclado grafado no livro). Além disso, solicita-se a

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A professora relembra que a haste para baixo na nota é uma aviso para o uso da mão esquerda. Mostra isso cobrindo as notas com a mão e deixando à vista somente a nota que é ponto de partida da música e perguntando à aluna qual é a mão solicitada. Recomeçam. As duas erram a duração. A professora encosta a mão no braço de ISA para que ela sinta qual é a lateralidade e a duração. Explica que a nota do ponto de partida é semínima (preta) mas a nota da mão direita é uma mínima (branca), portanto, mais longa. As alunas tocam e a professora aponta no caderno de ISA para ajudá-la na coordenação de lateralidade e duração.

cujas palavras formam uma métrica quaternária: PE-E-GA-ESTE/-DE-ENTE,ME/ DÁ-ÁOUTRO/SÃÃO!

coordenação do reconhecimento dos signos convencionados para as durações e para a lateralidade.

Carnaval: as alunas procuram o lugar no teclado onde tem que colocar a mão (indicado pelo diagrama do teclado no livro). JEN, fala o nome da cifra, que ela já conhece. Antes de começar a professora pergunta à ISA qual é a mão que será usada no início da música e ela responde corretamente. A professora pede que JEN toque e que ISA bata palmas nas pernas dizendo a mão que toca. ISA tocou o cluster com a posição aberta e a professora mostra para ISA que isso é certo. Diz que é uma outra maneira de fazer esta posição. A professora pede que elas observem as indicações de dinâmica. As alunas não se lembram o que é dinâmica e a professora mostra

Peça para tocar usando os arcos de Fá na ME e na MD. As frases (f) CARNAVAL! (p) Carnaval! (f) VOU BRINCAR NO CAR- NA -(muito f) - VAL! A sílaba VAL corresponde ao cluster tocado com as duas mãos em muito f .

Posição de arco em fá, sons repetidos para uma das mãos depois para outra mão, e com mãos juntas e posição de cluster no final. O controle da força muscular é requisitado para alternar f e p.

Reconhecimento dos signos de intensidade. Coordenação das conservações de duração e de intensidade em sons repetidos. A imagem mental do eco é utilizada para realizar uma imitação reprodutora no instrumento. As alunas vão se conscientizando de que o resultado sonoro

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os sinais (f e p) e pergunta para elas o que são estas letras. As alunas respondem corretamente. A professora sugere então a imagem de um salão vazio, e diz: “quando se fala muito forte num salão assim, pode-se ouvir um eco como resposta”. Fala bem forte: “CARNAVAL”, e em seguida: “CARNAVAL” em p. Explica que o eco é sempre mais fraco que o som original. Solicita que as alunas toquem bem forte com a MD e depois bem p com a ME imitando dessa maneira o efeito de um “eco”. Fala com intensidades diferentes as palavras da música ajudando as alunas a planejarem as intensidades que usarão na execução. ISA toca sozinha, depois com JEN. A professora só pede que elas toquem muito forte o último som. As alunas fazem e se divertem com isso.

depende da ação delas, ou seja, esta é a causa daquele.

Pour Elise: 1. A professora pede que JEN toque a melodia de Beethoven que ela havia aprendido nas outras aulas. A aluna toca e a professora interfere durante a execução pois JEN não manteve a pulsação. 2. Especialmente na parte das oitavas com mãos alternadas, que é mais difícil, a aluna perdeu a contagem e fez muito mais lento. A professora então tocou e pediu que as alunas contassem a cada alternância de mãos que ela fizesse tocando. As alunas erraram e a professora pediu que desta

1. A melodia de Pour Elise de Beethoven é tocada de modo simplificado, dividindo a melodia entre as duas mãos. 2. a alternancia de mãos em posição muito aberta (em oitavas) está interferindo na totalidade da apreensão da forma desta parte da música

JEN e ISA têm que identificar um conjunto de sons repetidos tocados em oitavas e mãos alternadas. Quando a professora conta junto com elas, vemos que elas se concentram na repetição da forma e conseguem identificar a estrutura musical daquele trecho.

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vez elas mostrassem um novo dedo a cada alternância de mãos que ela fizesse e repetiu e contando junto.

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QUADRO 4: Aula de PIANO- 10/06/09 Horário: 4ª. feira 8hs - Aluna ISA, 7;8 anos. (FALTOU) 9 hs: Aluna: JEN. 8;0 anos.

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Ondas de Laura Longo: a professora de piano alerta que a aluna deve mostre se consegue manter a pulsação nesta música. Relembra que a segunda parte da música deve manter o mesmo pulso que ela usa para tocar a primeira parte. A aluna toca conservando bem a pulsação e trocando os pedais nos momentos de mudança de harmonia.

Ondas de Laura Longo. A peça tem a forma ABA. Apesar das diferenças entre as partes, a mesma pulsação deve ser mantida durante a peça toda. A parte A é essencialmente harmônica, e a extensão usada é de três oitavas (seqüência de clusters em três grupos de três teclas pretas, seguida de outra seqüência nos grupos de duas teclas pretas). O efeito que se busca é de uma massa sonora harmônica, densa, apesar de suave (p). Já na parte B, de caráter melódico, a extensão usada é de uma nona (um grupo de três e um grupo de duas teclas pretas).

Espaço tátil/auditivo - o uso do pedal acompanhou as cesuras das frases na parte B. Este movimento exige uma coordenação de baixar o pé depois que a mão toca, favorecendo a reverberação de todas as cordas do instrumento, assim como tirar o pé do pedal só depois da troca de harmonia por parte das mãos, para que a reverberação não seja interrompida pelos abafadores. Estes movimentos não são concomitantes à pulsação, e devem ser controlados pelo ouvido a cada resultado sonoro da coordenação das

Pode-se dizer que a diferença de textura e de extensão da tessitura encontradas nas partes A e B expressa um conteúdo imagético extramusical sugerido no título da música –“ondas”- na parte A, de ondas com um volume de água maior e a parte B, menor. Analisando a ação de JEN nota-se que houve melhora na conservação da métrica e da pulsação. O uso do pedal é coordenado com as cesuras das frases musicais. Portanto, as antecipações e retardos necessários para o uso

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ações. do pedal denotam uma pluralidade de esquemas em jogo a serviço da forma musical já internalizada. Ao reproduzi-la JEN controla os esquemas táteis, cinestésicos a partir da representação auditiva que antecipa a preparação de suas ações já que a velocidade da representação é maior.

Ode a alegria: uma das três músicas de Beethoven que a aluna quis tocar. A professora solicita à aluna que ela toque esta música de memória. Ela irá tocar em público em poucas semanas, e é desejável que ela toque as notas corretamente, mas, sobretudo, que ela faça o ouvinte perceber as partes da forma melódica, que é constituída de alturas e durações formando frases que agrupam estes elementos dando-lhes sentido. A aluna apresenta a melodia sem cortes nos finais de algumas frases. A última nota é mantida ao mesmo tempo que JEN olha para a professora, como se a música tivesse acabado. Esta ação é comentada pela professora, que já havia falado

Melodia composta de 5 sons vizinhos (descontinuidades no sentido vertical) e organizada em frases (descontinuidades no sentido horizontal). O acompanhamento em 5ªs vazias é tocado pela mão esquerda nos tons da Tônica e da Dominante. A forma é AA’BAA’.

A organização em frases é evidenciada pelos ataques e saídas da mão das teclas nos inícios e finais das frases musicais. A melodia é tocada pela aluna usando a posição aberta da mão direita e o acompanhamento com posição em arco na mão esquerda. Os deslocamentos da mão esquerda apresentam uma dificuldade pela

A melodia conservada no sentido topológico, ou seja, tendo suas partes constituintes (alturas e frases). Nota-se que JEN assimilou bem o sentido vertical da melodia, mas ainda tem uma representação intermediária de sua organização horizontal visto que a ação de retirada da mão não é feita nos momentos precisos.

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sobre isso na aula anterior. A professora diz que do mesmo modo como temos que colocar a mão com o dedo sobre as teclas que serão o ponto de partida, antes de começar a música, devemos ter cuidado na hora de tirar a mão da tecla, caso contrário o som não acaba.

coordenação de duas ações independentes mas simultâneas, que só tem razão de ser pelo resultado sonoro

Melodia da 5ª sinfonia de Beethoven (primeiro tema do primeiro movimento). A professora solicita que JEN toque a melodia, apenas evocando-a numa reprodução do que conservou na memória. No entanto, não houve solicitação da conservação da métrica, ainda ausente na execução da aluna.

Em ritmo anacrústico, esta melodia em dó menor, apresenta um motivo com três notas curtas repetidas que resolvem numa nota longa uma terça abaixo. A primeira apresentação do motivo se dá começando no 5º grau e depois ele se repete em vários graus da escala

Tocada com a mão na posição aberta, esta melodia exige a adaptação da mão às diferentes teclas brancas e pretas, pois a extensão da melodia exige alguns deslocamentos, mudança de dedilhado para melhor adaptação dos comprimentos destes e no uso das diferentes teclas. Além disso, o ritmo exige uma reação muscular rápida para realizar as notas repetidas do ritmo anacrústico.

Memória de evocação e reprodução de uma estrutura melódico-ritmica. A memória visual da relação entre teclas pretas e brancas parece ser muito importante para criar referências de onde começar a cada deslocamento da mão. Devido a tantas coordenações mão-teclado, esta é uma melodia mais complexa, e pode-se Perceber que, apesar de boa reprodução do sentido vertical da melodia (alturas), o sentido horizontal, que envolve o ritmo, suas durações, entradas e

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saídas das frases, foi menos preciso.

Pour Elise (melodia da primeira seção): quando a professora pergunta se JEN toca esta peça com as duas mãos a aluna diz que não, mas logo em seguida se lembra e começa a tocar a parte em que divide a melodia entre as duas mãos. JEN manifesta enfaticamente que quer tocar o acompanhamento (harmonia). Ela já conhece a peça toda de ouvir a professora tocar, e já tem a imagem aural da peça com a harmonia. A parte inicial (das segundas) é tocada numa pulsação mais lenta, e a parte em que há divisão da melodia em duas mãos é tocada mais rapidamente. No entanto, nesta aula, a professora não solicitou nada que a fizesse pensar na pulsação. Apenas enfatizou a finalização do último som da melodia com a retirada do dedo da tecla.

Em lá menor e ritmo anacrústico, um dos desenhos melódicos mais marcantes desta melodia é uma sequencia de intervalos de segunda menor, em desenho do tipo “vai e volta” com as notas mi e re#. A forma é AA’BAA’ sendo que entre B e a reprise de A existe uma ponte constituída de oitavas que vão do mi grave até o mi agudo (na nota da dominante).

JEN toca a melodia distribuindo suas notas pelas duas mãos. Assim, na parte A, a mão direita toca os sons mais agudos se posicionando da tecla La3 à tecla Mi4, enquanto a mão esquerda toca os sons mais graves se posicionando de dó3 até sol#3. As duas mãos permanecem nesta posição e cada dedo tem a função de tocar a tecla sobre a qual está posicionado. Na parte B, a mão direita se desloca uma segunda acima para alcançar o fá na sequencia de sétimas que caracterizam esta parte, sendo que a mão esquerda toca as notas mais graves destes intervalos seguidas pela mão direita que toca as três notas em segundas descendentes. Última

Parece que a aluna ainda não tem a conservação da pulsação. Sua memória está muito centrada na localização figurativa das teclas, dos pontos descontínuos das continuidade melódica (alturas) sem coordenar estas com a continuidade rítmica.

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nota desta sequencia, é sucedida pelas oitavas quebradas da nota mi, feitas alternadamente pela mão esquerda e mão direita. Para tocar a parte A, a mão direita volta à localização das mãos em A, que é re-exposta exatamente igual à primeira vez.

Lendo e tocando intervalos de 3ª- exercício técnico: A professora ajusta o banco da aluna, e, sentando-se ao lado de JEN, vai apontando os conteúdos do livro que devem ser observados pela aluna. Apesar de a aluna parecer inquieta para começar a tocar a professora a instrui sobre as regras do exercício lendo as instruções do livro: o desenho melódico “vai-e-volta” neste exercício deve ser tocado nas teclas dentro do arco marcado, começando pelo polegar de cada mão (ponto de partida). Os sons devem ser ligados uns aos outros (toque legato). As posições de sentar e da colocação da mão na forma são corrigidas antes de a aluna começar a tocar. A aluna toca corretamente , mas no ultimo grupo de dedos (3-1-3) da mão direita ela erra (3-1-2). A professora lembra que sempre tem que “pular” um dedo neste exercício.

Exercício técnico para treino de leitura e de adequação do uso dos dedos em intervalos de terça dentro da extensão de 5 teclas. Algumas regras estabelecidas anteriormente organizam o processo de identificação das partes da escrita (por exemplo: desenho melódico, ponto de partida, toque legato).

O livro apresenta o desenho do teclado com marcações da extensão das teclas usadas no exercício (forma de arco como base de atuação da mão). A verbalização “vai-e-volta”, usada pela autora do livro como esquema visual desde os primeiros exercícios de escrita com “clusters” para leitura direcional (para as três regiões do piano –grave média e aguda), são aí usadas para o movimento de terças ascendentes-descendentes e vice-versa

Através de representação cinestésica adquirida anteriormente a decodificação da escrita musical é feita com o objetivo de adaptar um esquema já conhecido com o uso de clusters: “tocar-ir-e voltar ao mesmo lugar”, para um novo esquema motor, agora com a posição aberta, com o uso dos dedos em correspondência termo a termo (tecla marcada-número do dedo).

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Ao tocar com a mão esquerda, a aluna tem a forma da mão novamente corrigida pela professora, que brinca com o 5º dedo da aluna como se ele estivesse dando “tchau” para as pessoas, já que ele não está voltado para as teclas como deveria. Ela pede que a aluna feche a mão direita e a envolva com a mão esquerda. Depois pede que ela tire e leve a mão na mesma “forma” para o teclado. Elogia e aponta a posição correta do 5º dedo da aluna. Ajuda a aluna a arredondar a palma da mão enquanto os dedos estão pousados no teclado. Ao tocar com a mão esquerda os dedos 3-5-3, o 4º dedo toca também, e elas conversam sobre o 4º dedo que “sempre quer tocar mesmo na hora que não pode!”. A professora propõe o desafio, e a aluna aceita, de finalizar o exercício tocando com as duas mãos juntas (em movimento contrário).

com o uso da posição aberta da mão. Assim, o uso dos dedos é determinado com precisão e se transformará a partir daqui como um esquema motor para leitura de terças no resto do livro.

Conversa sobre a leitura-escrita de terças na pauta - de linha para linha e de espaço para espaço: A professora recorda outras folhas do livro para mostrar a escrita dos intervalos de terça que até então é denominado pela autora do livro como “salto”. Quando a nota é escrita numa linha, o “salto” acima deverá estar escrito na linha de cima. A professora pergunta: se a nota estiver escrita no espaço, para fazer um salto, devo escrever a outra no outro espaço. O que tem entre os dois?

Representação gráfica de um intervalo de terça na pauta musical.

Neste momento a aluna não toca, mas está refletindo sobre a ação, através das abstrações reflexionantes sobre as experiências com o uso do teclado

Abstração refletida: Pensamento reversível centrado na representação gráfica da escrita musical sobre a pauta. Se até então o pensamento de JEN se apoiava sempre no teclado, agora ele é transposto para uma representação abstrada

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JEN responde: “uma nota”. A professora pergunta: “Onde esta nota seria escrita, já que eu estou pulando ela?” JEN: “no meio”. A professora pergunta: “o que tem no meio entre os dois espaços?” JEN pensa um pouco e diz: “uma linha?” A professora festeja: “isso mesmo! Uma linha!”

da organização sonora que é a notação na pauta (com linhas e espaços).

Melodia da montanha: o processo de leitura é dividido em etapas que desmembram os parâmetros do som. 1. Ritmo: bate as mãos na perna com ritmo e fala ta e taá. 2. Alturas: narra o movimento dos saltos para cima ou para baixo, e ao mesmo tempo, conserva as durações: ao falar o desenho melódico da música estudada, a aluna alonga o som para os sons grafados com mínima e fala dentro da pulsação os grafados em semínima. 3. Em seguida a professora solicita o posicionamento do dedo correto no ponto de partida. A aluna coloca a mão nas teclas, mas corrige para colocar o dedo correto no ponto de partida. A professora pergunta qual é o nome da tecla que vai ser o ponto de partida. A aluna toca a tecla e diz: “mi”. 4. A seguir a professora pede que JEN toque sozinha o que está escrito na pauta. A aluna toca

Melodia escrita na pauta gradativa usando no tas de espaço para espaço

1. Bate a palma da mão direita sobre a perna direita. 2. Lê e fala o desenho melódico 3. Toca o desenho melódico a partir de uma localização precisa no teclado real com base no diagrama representado na partitura.

1. Decodificação do signo que indica o uso da mão direita (haste para baixo) 2. Uso da representação visual da leitura e resposta verbal desta decodificação 3. Identificação de um ponto de partida 4. Ao tocar lendo a partitura, JEN reproduz, através de ações, as operações realizadas no nível da representação simbólica (um elemento sonoro de cada vez). 5. Ao tocar e cantar ao mesmo tempo JEN realiza duas ações simultâneas que

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corretamente. 5. A professora pede que ela corrija a posição de sentar e toque cantando a letra ao mesmo tempo. Ao começar a cantar, a aluna nem se dá conta de que está tocando um intervalo de segunda. A professora chama sua atenção e diz que ela tem que prestar atenção nas duas coisas ao mesmo tempo. Aponta no papel o sentido que os olhos da aluna devem seguir da letra para a pauta bem rapidamente. A aluna diz que “não dá”. A professora explica que os olhos tem que se movimentar muito rapidamente para ler as duas coisas sempre pensando no que vem depois. Ela então canta e toca, mas o quarto dedo falha, como se a atenção tivesse ainda mal distribuída.

exigem a coordenação de decodificação de dois elementos distintos: ler sons não verbais e ler sons verbais, numa atividade complexa que envolve várias conservações: de duração, de alturas, de sentido das frases. Sua atenção parece ainda querer controlar todos os elementos da ação, e ela deverá ainda automatizar alguns para se central em outros.

19:16 -Verde mar: foi obedecido o mesmo método de decodificação da notação usado na peça anterior: leitura rítmica com “ta” e “taás”, leitura do desenho melódico através da verbalização do movimento de saltos conservando as durações, porém sem tocar; e por ultimo, tocar cantando a letra e, ao mesmo tempo, conservar todas as qualidades do som grafadas na notação musical. No início, a aluna se enganou no ponto de partida, uma vez que não observou nem a indicação (através de uma seta) feita pela autora do livro no diagrama do teclado, e também não comparou a altura da primeira nota e da segunda

Melodia escrita na pauta gradativa com saltos de espaço para espaço.

Espaço visual: os olhos seguem a leitura da esquerda para a direita. Tátil: a mão esquerda toca com 2º e 4º dedos nas teclas brancas. O controle do quarto dedo é mais difícil, pois este dedo em geral acompanha os movimentos do 5º e 3º dedos. Auditivo: o ouvido controla o resultado

Conservações físicas: O método solicita a separação dos parâmetros para realizar a leitura. No entanto, ao ouvi-los todos juntos na voz da professora, JEN percebe que houve uma mudança (f e p), mas oscila na diferenciação dos parâmetros de intensidade e altura. Abstrações empíricas

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nota, escritas no espaço de cima e no espaço de baixo, respectivamente. A professora explica, então, que JEN deve observar estes dois aspectos para acertar o ponto de partida. Obedecendo a dinâmica, a professora canta a melodia: primeira frase p e a segunda frase f, e pergunta para a aluna: “o que eu fiz de diferente na primeira frase e na segunda?” A aluna pensa e responde: “essa aqui é mais aguda e...” “Aguda?” Diz a professora e começa a cantar uma oitava mais aguda. “Não! Essa aqui é mais piano e essa aqui é mais forte.” E depois acrescenta: “Olha! está até escrito aqui!” “Isso mesmo” - diz a professora - “quando eu cantei eu fiz p e f, mas quando a gente toca também tem um jeito de fazer p e f, vamos tentar fazer?” “Ah, tá!” - diz JEN. Ao fazer a primeira frase, foi tudo bem. Na segunda, a aluna ia continuar sem mudar nada, e a professora quis ajudar cantando forte. A aluna quis então tocar mais forte, mas errou a tecla. Pede para fazer de novo. “O canto faz parte” - diz a professora. A aluna toca de novo, e desta vez consegue coordenar alturas e intensidades, embora as durações tenham sido um pouco afetadas, pois

sonoro e é através dele pode responder às perguntas diferenciando as intensidades do som.

informam a mudança, mas as abstrações reflexionantes levam JEN a pensar num plano das operações de classificação, qual é a classe da mudança operada na voz da professora. Para isso tem que utilizar a reversibilidade do pensamento e ouvir mentalmente e conferir com seus conceitos. Mesmo diminuindo a velocidade das ações, JEN regula as diferenciações dos parâmetros ao executar todos os eles durante a leitura.

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ela teve que ralentar um pouco para pensar na sua ação nos momentos de mudança (de p para f). O Leão. A professora pergunta para JEN quais novidades ela percebe nesta música. JEN está pensativa. A professora então pega o livro, mostra a música anterior e pergunta: “quantas linhas tem nesta pauta?” JEN olha e diz: “três linhas e dois espaços.” Elas olham várias outras e retomam a parte do Leão, e JEN percebe que aí tem 5 linhas. A professora lembra que é igual ao caderno que JEN usa na aula de EPEM (caderno especial para crianças, chamado Pautando as Sete). Outra novidade que ela descobre é que nesta música as duas mãos tocam. JEN pergunta: “Como é que eu vou saber a hora de mudar?”. A professora sugere que elas batam o ritmo da música usando as mãos sobre cada uma das pernas, para treinar o uso das mãos com a leitura do ritmo, e só depois toquem. “Com qual mão você começa?” Pergunta a professora. A aluna mostra a mão direita. Elas começam, mas a aluna fica indecisa se olha a partitura ou a mão da professora. A professora a orienta que olhe para a partitura, e acrescenta: “é você que vai fazer!”. No final, na hora do cluster, a aluna não leu e não fez. A professora apontou a figura e pediu pra ela bater na perna falando “Lon-go”.

Peça com extensão de um intervalo de 6ª, com duas frases. - A primeira frase (Venha ver o Leão!) começa pela nota mais aguda, “salto abaixo”, e “repete”, continua com a mão esquerda, começando na nota mais grave, “salto acima” e “repete”. - A segunda frase (Vai rugir assim!) começa pela mão direita na nota mais grave, “salto acima”, “repete”, “repete” e termina num cluster na região grave, imitando o som do rugido de um Leão. - O acompanhamento trará novos desafios, pois seu andamento é rápido e isso exigirá o aumento da velocidade da melodia. O caráter é alegre e lembra uma música de circo.

Espaço visual coordenado com o espaço tátil: alternância do uso das duas mãos para a completar a linha melódica. O ponto de partida da mão direita é um dó (escrito no terceiro espaço) e a mão esquerda começa num mi (escrito na primeira linha). A mão esquerda continua a melodia que a mão direita começou, e em seguida a mão direita retoma a melodia, mas o ponto de partida desta retomada é um lá (segundo espaço). No final há um deslocamento da mão esquerda para a região mais grave do piano no momento do cluster final.

A leitura passa pela conservação dos parâmetros sonoros, que são representados em eixos interligados dentro do sistema de notação. O uso das duas mãos representadas pelas hastes para cima (MD) e para baixo (ME) são descontinuidades que se unem na formação do objeto melódico contínuo.

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Pergunto então para JEN se ela achava que LONGO era igual ao TAÁ. Ela pensou e disse que sim. A professora comentou que agora que elas se preocupavam com a pulsação, todos os tempos se enquadravam numa batida constante, e o LONGO ficava igual ao TAÁ. A leitura do desenho melódico juntou a informação da mão que toca e dos intervalos entre os sons (alturas). Assim podíamos ouvir: “Mão direita, salto abaixo, repete, etc.” Depois disso, a indicação de dinâmica foi então realçada pela professora, que reviu com a aluna todas as indicações da partitura. Antes de JEN tocar, a professora explica que existem dois pontos de partida: um da mão direita e outro da mão esquerda. Quando a professora pergunta qual é o nome da tecla de cada ponto de partida, vemos JEN tocar as teclas e só então dizer seu nome (do e mi). JEN toca bem obedecendo todas as mudanças e conservando a pulsação. Depois disso JEN toca cantando a letra. A professora pergunta a ela o que ela acha que é aquele cluster no grave. JEN pensa um pouco e diz: “É o Leão rugindo”. A professora diz: “então não pode ser muito suave, se não o público vai pensar que este Leão “está com gripe”, ou está rouco de tanto torcer para o time dele...”. Elas riem. Depois de JEN tocar e cantar a professora pede

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que ela toque a melodia na região mais aguda para que o contraste seja mais perceptível. Ela vai aos poucos dominando a peça e o instrumento todo. Ao tocar o cluster final ela até se levanta para ter mais força. Dever escrito: vários saltos escritos em pequenas pautas devem ser envolvidos por JEN através do critério de saltos de espaço para espaço ou de linha para linha. Depois de levar um tempo para entender o enunciado, JEN envolve um dos saltos de espaços. Mas deixa alguns sem fazer. A professora mostra que a nota de linha é aquela em que a linha corta a nota. JEN parece ainda não compreender bem este conceito. A professora explica esta questão de escrita através da partitura de Hei companheiro! que a aluna deverá tocar sozinha em casa. Nesta partitura a sequencia das notas passa de notas de linha para notas de espaço e esta continuidade deve ser compreendida pelo uso do teclado. A professora compara a igualdade dos sons de linha para linha e espaço para espaço à igualdade existente entre sons de teclas pretas e brancas. A professora pergunta para JEN se ela acha que tem alguma diferença dentro do piano para justificar a diferença que existe entre as teclas do piano (teclas brancas e pretas). JEN diz que acha que sim. Para comprovar que as diferenças entre brancas e

Saltos representados através de notas nas linhas ou espaços.

Espaço visual: os olhos lêem cada intervalo da direita para a esquerda.

As operações são feitas no nível representativo, sem vivencia sonora. O pensamento lógico matemático funciona através de abstrações reflexiva sobre os códigos da notação. Uma vez compreendido o enunciado, a aluna identifica entre os trechos escritos aquele que corresponde às características de cada grupo fazendo portanto, classificações.

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pretas não se observa dentro da máquina do instrumento a professora abre a tampa e JEN olha e comprova que as diferenças das teclas não correspondem à alguma diferença aparente no mecanismo interno do instrumento. A professora explica que a única diferença é a que quanto mais para a direita no teclado o som fica mais agudo porque comprimento das cordas dentro do instrumento fica mais curto. Voltando à escrita, a professora explica que as teclas vizinhas correspondem às notas escritas de linha para espaço e assim por diante.

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QUADRO 5: Aula de PIANO- 17/06/09 Horário: 4ª. feira 8hs - Aluna ISA, 7;8 anos. 9 hs: Aluna: JEN. 8;0 anos.

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

“Ondas” de Laura Longo: a professora pede que JEN toque a peça. 1. Ela começa a tocar numa região mais grave do que a escrita, mas ela só se dá conta quando toca a segunda frase da música, que é mais grave que a primeira. Neste momento ela para e fala que “errou”. A professora pergunta se ela tocou muito grave, ou se o banco dela está muito para a esquerda. Ela responde que ela colocou a mão no lugar errado e recomeça a tocar novamente, agora na região correta. 2. Depois de JEN tocar a peça toda, a professora elogia dizendo que a pulsação está mais constante do que nas outras aulas, mas que o pedal pode ser usado com mais cuidado. Pergunta se JEN havia percebido que às vezes ele “sujou”. 3. JEN diz que percebeu, e que também sabe que errou no uso das mãos na parte B. A professora relembrou que a música só acaba depois que a aluna tira a mão das teclas no final, e que ela não deve olhar para o público antes de fazer este final, pois o mais importante é o

A partitura de “Ondas” é escrita pela notação tradicional, que a aluna ainda não domina. No entanto, a partitura foi usada neste processo de ensino-aprendizagem como um guia: a diferença entre o desenho dos “blocos” de notas simultâneas da parte A e o desenho das notas únicas que compõe a melodia da parte B, foi usada para formar uma representação gráfica das diferenças entre as partes, funcionando como um “esboço” para a memória da aluna, mesmo sem ela realizar a decodificação precisa de todas as notas.

Espaço visual, Tátil-cinestésico e auditivo. 3. O uso das mãos na parte B foi definido no momento da assimilação da peça: (mão esquerda nas teclas do grupo de duas teclas pretas e mão

O processo de aprendizagem desta peça foi feita a partir da imitação da professora, com base nos recursos figurativos do teclado assim como da memória . Como os grupos de três teclas pretas se repetem por todo o teclado, vemos que o espaço desta parte (o grupo de três que é ponto de partida da peça) não foi definido em relação com o todo da figura (teclado). No entanto, a representação auditiva (esquema operativo) que a aluna tem da peça entrou em conflito com o que ela ouviu no momento da percepção

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publico “ouvir a música”. Só depois de acabar a música é que ela deve olhar para o público. A aluna diz: “mas o público vai estar aqui na frente!” A professora explica que o público estará do lado, olhando para ela, e que ele quer ver como ela faz a música, e não só ela. 3. Ela toca novamente e a pulsação agora sofre alteração na reprise da parte A. A professoa intervém no momento em que isto acontece, sem que a aluna pare de tocar, pede que ela não atrase. A aluna então vai voltando à pulsação com base nos estalos de dedos da professora.

direita no grupo de três teclas pretas).

atualizada. Ela então se deu conta de que estava tocando no lugar errado. 3. O erro do uso dos dedos pela aluna pode ser justificado por uma operação de relação de equivalência do desenho da segunda frase que se apóia no seguinte esquema motor: primeira nota na mão esquerda (na segunda do grupo de dois) seguida por três notas na mão direita (nas três teclas do grupo de três) formam uma linha melódica ascendente equivalente à anterior. Nos parece e evidente que a aluna quis usar na primeira frase o mesmo esquema motor que apóia a sua memória na segunda frase.

Salto –“o que é o salto, mesmo?” JEN coloca a mão no teclado e diz: “salto pra cima” ao

Explicação da aluna sobre o intervalo melódico de terça

Para JEN, mais fácil do que falar sobre os

As explicações da JEN partem das ações que

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mesmo tempo que toca uma terça ascendente no teclado. “O salto só pode ser pra cima?” - pergunta a professora. A professora pede que JEN imagine como explicaria para ISA, o que é o salto. JEN acha difícil explicar. A professora insiste: “Treina comigo: se você estiver tocando uma tecla, pra fazer o salto, o que você terá que fazer lá no teclado?” JEN diz: “ah! Tenho que pular uma.” “Pular o que?”- pergunta a professora. “Uma tecla” – diz JEN. “Qualquer tecla?- pergunta a professora. JEN toca saltos e vai pensando e diz: “a que estiver do lado”. A professora toca um semitom (de uma tecla branca para uma tecla preta) e diz: “esta tecla está do lado desta, se eu pular esta eu faço um salto?” JEN responde: “tem que ser tecla branca”. A professora então diz: “se eu estou numa tecla branca salto uma branca e vou para outra branca, eu faço um salto. Muito bem. E o dedo? ” JEN não se lembrava. A professora coloca a mão sobre as teclas e vai dizendo: “se você toca uma tecla com um dedo, pra fazer o salto você vai saltar uma tecla branca, e em cima dessa tecla que você saltou tem um dedo! Então você vai saltar tanto a tecla, quando vai saltar o dedo!”

quando usamos as teclas brancas do piano

intervalos, é tocá-los. Este saber é figurativo, parte da percepção (táctil-visual) sobre a experiência de tocar.

ela faz no teclado, estabelecendo relações da estrutura da mão (uso dos dedos) com a estrutura das teclas (brancas). As operações infralógicas sobre cada uma destas estruturas são subjacentes às operações lógicas que se busca estabelecer entre elas.

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Melodia da montanha: a professora pergunta: “Na melodia da montanha, o compositor escreveu a primeira nota no espaço. O que ele pulou na pauta pra chegar no salto acima?” JEN responde: “ele pulou uma linha”. A professora resume: “Então, para fazer o salto tem que prestar atenção que no teclado, eu pulo um tecla; na mão, eu pulo um dedo, e na partitura eu pulo uma linha ou um espaço.” A aluna toca a peça e a professora corrige sua postura. Lembra que “todo o corpo toca junto com os dedos.”

Escrita dos sons nas linhas e espaços. Dinâmica: forte.

Espaço visual (partitura) coordenado às representações táteis (uso dos dedos) e visuais (numero de teclas)

Para responder a pergunta sobre a escrita musical, a aluna faz uma abstração reflexionante sobre a experiência dedo-tecla e sua representação na nota de linha e nota de espaço.

Verde Mar: A aluna começa a tocar e a professora corrige o uso da mão. Ela tocou com a direita e a notação pede mão esquerda. Ao trocar de mão, a aluna apóia o braço esquerdo sobre o direito. A professora então lembra que os braços devem ficar suspensos. A aluna toca, mas sua mão não está perfeitamente colocada. A professora mexe na mão da aluna arredondando a forma da sua mão, e relembra que a forma do arco deve ser a base da posição para tocar com a posição aberta. O último som também é esquecido e a professora fala novamente que ela deve se lembra de tirar o dedo da tecla.

Melodia escrita na pauta gradativa com notas de espaço para espaço para a mão esquerda tocar (as hastes são para baixo). As durações: semínimas e mínimas. Dinâmica: piano

Temos a coordenação dos espaços visual (partitura e desenho do teclado) com os espaços tátil (ME) e auditivo. Ao baixar e levantar os dedos JEN deve voltar sua atenção para o resultado da ação (som e silêncio).

Ao errar o uso da mão vemos que a representação simbólica do uso da mão pela escrita ainda não se efetivou. JEN olha as cabeças das notas e se centra no desenho do som. O aspecto técnico lhe chama menos atenção. Também o esquema postural da mão ainda está se adaptando ao uso da técnica.

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O Leão: a aluna apresentou dois erros ao tocar: ao retomar a melodia com a mão direita ela tocou o Dó confundindo a nota Lá com o ponto de partida da mão direita no inicio da peça. JEN também não deslocou a mão esquerda para a região grave ao tocar o cluster do final, mas sim tocou com as duas mãos no mesmo lugar em que elas estavam posicionadas. Depois que JEN acabou de tocar, a professora apontou a partitura desde o ponto de partida e disse: “aqui você estava no terceiro espaço, não é?” e lhe perguntou: “em que tecla?” JEN responde que é uma mínima. A professora diz: “não, qual é o nome da tecla, não da figura!”. JEN responde: “dó”. A professora diz: “então o dó fica no terceiro espaço. Agora veja aqui – [e aponta a nota em que mão direita volta a tocar] - ela está escrita no terceiro espaço? - “Não.” reponde JEN . A professora diz: “Está um salto abaixo de dó, vamos contar [e aponta as teclas no piano] dó, si, e...? “Lá” - reponde JEN . A professora então canta o nome das notas que JEN havia tocado e pede que ela cante com o nome das notas corretos, enquanto vai apontando o caminho que os olhos seguem na partitura. JEN canta corretamente. Depois, a professora circula o cluster e as palavras que indicam a região onde deve ser tocado. JEN então leva a mào para o lugar certo e toca um cluster.

Melodia escrita numa pauta com cinco linhas. Apresenta saltos para as duas mãos. Figuras: semínimas, mínimas e uma figura de cluster Longo no final. Desenho melódico: terças ascendentes e descendentes assim como notas repetidas. Dinâmica: forte e muito forte.

Alternância do uso das duas mãos para a completar a linha da melodia. O ponto de partida da mão direita é um dó (escrito no terceiro espaço) e a mão esquerda começa num mi (escrito na primeira linha). A mão esquerda continua a melodia que a mão direita começou, e em seguida a mão direita retoma a melodia, mas o ponto de partida desta retomada é um lá (segundo espaço). No final há um deslocamento da mão esquerda para a região mais grave do piano no momento do cluster final.

Esta é a primeira vez que a aluna apresenta esta música em aula. Vemos que a melodia ainda não foi fixada na memória auditiva, já que a aluna errou uma nota e nem percebeu. Supomos que as falhas foram causadas por falta de atenção no momento da leitura, mas também que a memória talvez tenha se fixado na simbologia usada pela letra, e foi menos centrada nas relações infralógicas da melodia, mesmo com o esforço da professora no sentido de explicar estas relações na aula anterior. Desta vez, a professora pergunta mais para a JEN, e assim, ela é obrigada a raciocinar sobre o movimento direcional do som identificando cada

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A professora pede que ela toque tudo novamente, e canta junto com JEN. No momento de tocar o lá, JEN demora uma pouco, pensa e toca certo, talvez por que a voz da professora tenha ajudado sua memória, que aquela nota era La.

ponto de partida.

Pao quentinho: ISA e JEN tocam a melodia. JEN erra a leitura, e elas têm que recomeçar. O som final ainda não é retirado no momento exato.

Melodia já descrita no quadro 3 da mesma turma.

Adaptação já descrita no quadro 3 da mesma turma.

Exercício de memória: esquemas sensório-motores são controlados por operações e significações da melodia, que estão se consolidando: leitura de três sons, obedecendo a ordenação dos sons na escrita e conservando suas durações nas alturas determinadas.

Pássaro Azul: 1. ISA e JEN tocam a melodia. ISA tocou corretamente mas JEN não terminou a descida da melodia e repetiu o som da segunda do grupo de três. A professora perguntou para JEN “onde os seus olhos foram?” Ela riu. [Foi distração]. 2. A professora pergunta quem se lembra como se toca o acompanhamento. Começa a tocar no outro piano e JEN reage rapidamente e toca nas teclas corretas, com ritmo correto assim como a pulsação correta.

1. Melodia composta com três sons, ritmo ternário, tem letra com três frases: Primeira frase: Pássaro azul - som do meio, desce, salto acima e desce. Segunda frase: Meu pássaro azul - igual a primeira frase mas repete o primeiro som. Terceira frase: Não foge, fugiu! - Toca repete, passo

1. Mão esquerda em posição fechada 2.Posição fechada nas teclas pretas. Os pontos de partida são: ME primeira do grupo de três, e MD primeira do grupo de dois. As mãos tocam juntas em movimento paralelo um ritmo ostinato.

1. leitura; vemos que a memória também é solicitada na leitura: lembrar-se do código aprendido para reagir a ele; para corrigir possíveis falhas, lembrar-se do que já ouviu em outras vezes que leu a mesma música. Neste caso, a

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ISA espera um pouco e começa depois, mas ela troca o uso das teclas, embora tenha conservado o ritmo e o sentido do movimento das mãos [descendente]. Para corrigir ISA, a professora vem até o piano das alunas e coloca as mãos nos pontos de partida dizendo: “primeira do grupo de três e primeira do grupo de dois. A de três é a mais grave e a de dois é a mais aguda”. Ela apresenta o ostinato e as duas alunas assistem. Ao pedir que elas imitem, ISA coloca a mão direita na segunda do grupo de dois. Após correção da professora, as alunas recomeçam, mas desta vez é a pulsação que fica instável. A professora expõe o ostinato exagerando a espera entre uma vez e outra. Pede então que as alunas não deixem de pensar na pulsação o tempo todo. Ao repetirem elas a mantém, mas a professora ouve um som diferente: é que ISA tocou o ponto de partida das mãos. A professora pega suas mãos e coloca no lugar certo e pergunta: “a mais grave é no grupo de?” “Três”- diz ISA; “e a mais aguda é no grupo de?” “Dois – diz ISA. “lembrou?” ISA balança a cabeça afirmativamente.

abaixo, passo acima. 2. O ritmo ternário é composto por uma longa duas curtas e uma longa. O desenho melódico do ostinato: toca, repete, repete, desce.

aluna não está concentrada neste aspecto, e talvez não se lembre do que deve ouvir. Erra mais de uma vez. Nesta fase de aprendizagem da leitura pode ser falta do controle do olhar. Por isso a professora pede que ela fixe os olhos no papel para não se perder. 2. Memória do acompanhamento: JEN consegue tocar o acompanhamento com facilidade, mas ISA parece não se localizar. Quando a professora fala que os pontos de partida são as primeiras de cada grupo, parece que ela não sabe que isso se refere à localização à esquerda. Ela coloca as mãos nos lugares que ela intui que sejam corretos, mas não tem um

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raciocínio que a guie. Assim, até mesmo o aspecto figurativo do pensamento é ainda frágil para a eficácia de ação.

Tocando melodia e acompanhamento: 1. Metáfora: A professora propõe que elas toquem “os tambores dos índios” enquanto ela (professora) toca a melodia de Pássaro Azul. JEN começa a bater com as pontas dos dedos na madeira do piano, e a professora imita, só que bate o ritmo do ostinato. As alunas se adaptam ao ritmo do ostinato continuando a bater na madeira do instrumento. Como não percebiam que era só uma “alusão” ao ostinato tocado nas teclas a professora teve que pedir que elas transferissem aqueles tambores para as teclas pretas. 2. As três começam a tocar e depois da segunda repetição a professora passa a tocar a melodia. As alunas continuam o ostinato, agora nas teclas pretas. 3. Metáfora: As alunas tocaram a melodia e a professora tocou o acompanhamento: as alunas mantiveram-se no ritmo, embora não se ouvisse a melodia com a mesma intensidade. Ao fim da melodia, a professora tocou o “voo do pássaro”. Após a execução a professora fez perguntas: “o que eu fiz? JEN se pôs a imitar o “vôo”. A

Ostinato descrito em Pássaro Azul [Ta-a, Ta, Ta, Tá-a] Mínima, semínima, semínima, Mínima. Nas primeiras teclas do grupo de tres (ME) e dois (MD). 3. Intervalos harmônicos de 5ª tocados nas teclas pretas do piano numa linha ascendente na pulsação da música.

Mãos batendo na madeira do piano, e em seguida nas teclas pretas como descrito em acompanhamento de Pássaro Azul. 3. Espaço tátil-cinestésico: movimento ascendente é realizado em direção à direita do teclado.

A forma simbólica dos tambores indígenas transposto ao acompanhamento, que vinha sendo sugerida há algumas aulas é finalmente compreendida através deste “jogo”. As alunas estavam tão imersas na imagem, que não se deram conta de que era apenas uma brincadeira. A professora teve que “acordá-las” do “sonho” pedindo que tocassem nas teclas pretas. Acreditamos que este ostinato passou a ser um “significante” correspondendo esta imagem que finalmente

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professora comentou: “minhas mãos foram caminhando pelas pretas”. 4. signo para a lateralidade: Em seguida perguntou para JEN: que mão você usou para tocar JEN? - “Direita” respondeu JEN rindo, e completou: “a direita é a minha favorita”. A professora então argumenta: “olha lá, pra que lado estão as hastes?” – Para o lado esquerdo” . “Para cima ou para baixo?” - perguntou a professora. – “Para baixo” diz JEN. A professora então repete – “A gente tinha combinado que quando é para baixo é a mão?” –“Esquerda” completa JEN. A professora elogia ISA e pede que repitam a mesma coisa.

4. Idem

4. espaço visual: o signo sobre a lateralidade das mãos usadas é decodificado pelos aspectos visuais: haste para baixo – ME.

as alunas construiram. 3. Mais uma vez, a metáfora usada para representar o vôo do pássaro dá apoio à representação da linha ascendente da linha melódica. As alunas imitam a ação da professora, mas com base também na imagem sugerida. 4. A aluna se esquece do signo determinado para o uso das mãos: a complexidade da notação musical é

As duas alunas tocam melodia e acompanhamento: a professora prepara ISA falando que ela deve tocar duas vezes o ostinato (bate o ritmo com as mãos sobre a perna) e depois JEN começa a melodia e ISA continua no que estava fazendo. Quando ISA coloca a mão nas teclas a professora fala novamente a ordem da colocação. JEN não espera a duração de uma mínima e as duas se desencontram. A professora fala para JEN: “JEN,você tem que esperar os longos” – e canta: Pássaro azul (com a duração bem pronunciada). “você não esperou então

Ostinato: O ritmo ternário é composto por uma longa duas curtas e uma longa. O desenho melódico do ostinato: toca, repete, repete, desce.

As alunas tocam (espaço tátil e auditivo) com os olhos seguindo a partitura e também o movimento das mãos sobre as teclas (tátil e visual).

A conservação da pulsação é fundamental para que as alunas toquem no mesmo andamento. Vemos que JEN não coordenou alturas e durações. Seu pensamento é figurativo. Ela se fixou no desenho das alturas, mas não nas durações. Por isso, não esperou a

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descarrilhou o trem” - diz a professora. Ela explica que para o trem não descarrilhar todas as rodas devem rodar na mesma velocidade. Assim, as duas alunas devem manter a mesma velocidade para não se desencontrarem. As alunas repetem. ISA toca muito devagar para poder pensar nas suas coordenações. JEN tende a não esperar a colega, já que tem a representação da melodia num andamento mais rápido. Com a ajuda do canto da professora ela não se perde e as duas vão entrando em sincronia e chegam juntas no final. No momento de fazer o vôo (série de intervalos harmônicos ascendentes) a professora pega a mão de ISA e coloca na posição, para que ela comece a subida.

hora certa da sua entrada. Os movimentos que cada uma tinha que fazer foram conservados, mas para tocar juntas elas teriam que manter a mesma pulsação, conservando andamentos iguais. Para levá-las a isso a professora enfatiza a pulsação para que ambas realizem o mesmo andamento.

Au Clair de La Lune: a leitura é feita primeiramente pelo ritmo - as alunas batem palmas sobre a perna. Depois elas lêem o desenho melódico dizendo se o som sobe, desce, ou fica no mesmo lugar. Por ultimo elas tocam usando a posição fechada e falando o desenho melódico ao mesmo tempo. ISA se enganou no momento do salto. Na segunda vez que tocaram juntas (ISA e JEN), ambas obtiveram sucesso na leitura.

Melodia tradicional francesa composta de três alturas, em graus conjuntos. A partitura é feita numa escrita sem pauta, mas obedecendo o sistema de direção das alturas pela verticalidade e de sucessão dos sons pela horizontalidade. As durações são representadas por mínimas -notas brancas (longas) e semínimas – notas pretas

A melodia é tocada em posição fechada sendo que a primeira frase é tocada pela mão esquerda e a segunda frase pela direita.

A maior dificuldade nesta peça é conservar durações ao mesmo tempo que as alturas. É por isso que ouve erro no intervalo de terça, e também nas mínimas no final da primeira frase. A conservação das durações vai sofrendo interferências dos outros parâmetros sonoros, mas como o

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(curtas). O intervalo de terça é identificável pela diferença de altura entre uma nota e outra, pulando o espaço (no sentido vertical) que seria ocupado pela altura do meio.

método de leitura usado separa os parâmetros, notamos que as alunas prepararam estas aquisições aos poucos não apresentando muita dificuldade.

Aprendendo o nome das teclas: A partir do diagrama do teclado impresso no livro, a professora solicita à ISA que nomeie cada uma das teclas. ISA já conhece a sequência das notas da escala e reponde prontamente à tarefa. Depois a professora a convida a conhecer como está escrito o nome das teclas no livro americano da coleção Hall Leonard. No lugar de Do-Re-Mi, no diagrama do teclado daquele livro lê-se as letras C-D-E. A professora pede que ISA toque e diga o nome das teclas brancas Do-Re-Mi que ficam na frente dos grupos de duas pretas por todo o teclado e, enquanto ISA toca isso, a professora toca um acompanhamento sugerido por este livro. Depois de tocarem os Do-Re-Mi, a professora pergunta: “Como se chamam as teclas que ficam na frente dos grupos de três pretas? ISA pensa um pouco e responde: Fa, Sol, La e Si. A professora mostra como estão escritas estas notas no livro americano: F-G-A-B e explica que

Neste método o nome das teclas é dado primeiro pela sua localização (etapa já vivenciada anteriormente pelas alunas desta turma) e em seguida, pelo nome das notas que as teclas fazem soar. A correspondência dos nomes das notas e com a notação alfabética, está sendo apresentada como etapa preparatória para o conhecimento das cifras, que neste método, será ensinada como “os nomes dos arcos” (intervalo harmônico de 5ª).

A aluna toca todas as teclas Do-Re-Mi do teclado com a posição fechada usando a mão direita.

O processo de nomeação das teclas parte da sua localização no espaço físico do instrumento (espaço topológico utilizando operações infralógicas) para os nomes das alturas (ou seja, seus símbolos – Do, Re, Mi, etc.). Portanto, a gênese do nome das notas parte da imagem mental (aspecto figurativo) para o símbolo arbitrário (conceito) construído a partir de relações de identificação e seriação: dó é mais grave que Ré, que é mais grave que mi, etc.

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lá nos EUA é assim que os americanos chamam estas notas. Depois elas tocam as teclas Fa, Sol, La e Si por todo o teclado enquanto a professora toca um acompanhamento com ritmo de blues. A professora pede que ISA envolva os grupos de dois no diagrama do teclado do livro brasileiro. Depois pede que ela escreva os nomes das teclas Do-Re-Mi que estão neste diagrama e diga quantos são.

Improvisação: As regras do uso das mãos no teclado são determinadas antes do início da improvisação. As alunas devem tocar com posição fechada nas teclas Do-Re-Mi. Sentir a música e “deixar a mão tocar”. A professora toca o acompanhamento em Lá menor e JEN toca com nas teclas Do-Re-Mi com o desafio de criar alguma coisa nova nos sons que toca, mantendo-se junto com o acompanhamento da professora. 1. JEN começou igual (usando Do-Re-Mi), mas logo repetiu um Mi, fazendo uma nota mais longa. Depois foi repetiu na mesma região, e depois subiu para a região mais aguda. No entanto, manteve a pulsação, de forma que estava integrada à ação da professora. 2. ISA fez a improvisação sem manter a pulsação, mas tentou variar o uso das teclas e manteve-se nas teclas determinadas Do-Re-Mi.

As variações possíveis dos três sons mantendo a métrica possibilita à criança ouvir-se e inventar intuitivamente. Parece que esta atividade leva a uma integração muito forte entre a estrutura musical e a adaptação motora ao instrumento.

Espaço tátil: para tocar nas teclas sem se preocupar com a eficiência das articulações, a posição fechada dá mobilidade à mão nos deslocamentos de tecla. Espaço auditivo: para se localizar no tempo métrico do acompanhamento, a audição tem que estar atenta, e ação tátil deve ser coordenada a aquela.

As variações possíveis dos três sons mantendo a métrica possibilita à criança ouvir-se e inventar intuitivamente. Parece que esta atividade leva a uma integração muito forte entre a estrutura musical e a adaptação motora ao instrumento. 1. JEN usou a intuição para escolher as teclas, sem precisar raciocinar antes. 2. Parece que ISA se preocupou um pouco com o ritmo e o desenho que deveria

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fazer, e isso tirou sua atenção da pulsação e da audição da integração que ela deveria procurar fazer entre sua ação e a da professora.

Adivinhação: ISA toca bem com a posição de arco, mas antes de começar, a sua mão chega às teclas sem a forma. A professora pede que ela feche uma das mãos e coloque a outra por cima, para sentir a forma de uma mão sobre a outra. Depois pede que ela mantenha esta forma quando aproxima a mão do teclado. ISA desfaz a posição e a professora toca em seu polegar mostrando que ele está fora das teclas. A professora explica que antigamente não se usava o polegar para tocar, mas já faz muitos séculos que isso mudou e, portanto, temos que aprender a colocar a mão inteira sobre as teclas. Ajusta o banco que estava baixo.

A peça é composta de duas frases que acompanham palavras, com uso de mínimas e semínimas.

Espaço Tátil: Após adequar as mãos ao arco marcado no diagrama do teclado, o uso de mãos alternadas com forma de arco permanecem nas teclas definidas no inicio da peça até o final. Nas duas frases é a mão direita que começa. Somente no final, as mãos tocam juntas. A cada nova peça deste capítulo, a professora lhe ensina a conservar a forma da mão em “arco” e a se localizar nas teclas marcadas.

Quando variamos as teclas com posição de arco é necessária a conservação do esquema motor da forma de arco e é isto que ISA está construindo aos poucos nas peças deste capítulo. Trata-se de uma acomodação seus esquemas de uso das mãos anteriores. A construção da simultaneidade dos sons, vem sendo vivenciada pelas alunas, desde os primeiros acompanhamentos das melodias com três sons, passando pelas harmonias das

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improvisações em todas as teclas, e através da forma arco.

Mourão: Ao tocar ISA não tirou uma das mãos para tocar a outra, a professora então explica que a duração do arco anterior acaba quando o outro começa nesta música. Diz que, por isso, quando ISA toca o “Taá” da mão direita, a mão esquerda tem que sair da tecla. Em seguida, a professora toca para mostrar para a aluna como fazer. Depois pede que ela repita. A aluna toca e a professora aponta as notas alternando o uso das mãos nesta ação para apoiar a alternância com exagero. Apesar de ISA ter se centrado nas saídas e entradas das mãos das teclas, suas mãos não conservaram a forma do arco, e ela esbarrou nas teclas vizinhas. A professora colocou a mão sobre a de ISA para corrigir a posição dos dedos e falou: “Muito bem, só que não pode deixar desmontar a mão. Mas eu gostei! Estava bem mais firme!”

A peça é composta de frases curtas que acompanham palavras. As durações, de semínimas e mínimas, formam métricas ternária e quaternária, dependendo das palavras usadas, mas sem divisão de compassos. A parlenda, fio condutor para a continuidade da música, que é essencialmente rítmica, vai acompanhando a alternância do uso das mãos. A primeira palavra MOURÃO tem três pulsações. Ela é repetida três vezes. A seguir aparece uma frase maior cujas palavras formam uma métrica quaternária: PE-E-GAESTE/-DE-ENTEME/ DÁ-ÁOUTRO/SÃÃO!

Com o uso da posição de arco e as mãos alternadas, com algumas repetições de mão. No final, as duas mãos tocam juntas.

A continuidade da música é formada por descontinuidades interligadas. Um som não deve durar mais para não ser simultâneo ao seguinte. Além desta coordenação, a alternância das mãos exige a conservação do esquema motor do arco, para que os dedos não toquem notas erradas a cada vez que voltam às teclas.

Carnaval: 1. ISA coloca a mão nas teclas mas é corrigida: A professora diz que ela colocou “depois da primeira do grupo de três, mas deveria colocar antes da primeira do grupo de três”.

O foco didático desta peça recai sobre o parâmetro de intensidade. As frases (f) CARNAVAL! (p) Carnaval! (f) VOU BRINCAR NO

Espaço Tátil: mãos alternadas na posição de arco em Fá, e juntas na posição de cluster no final.

A localização da mão sobre o teclado demanda uma identificação de espaço controlada tátil e

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A professora pede que ela abra os dedos, um para cada tecla, e que prepare a mão direita também, colocando-a na posição. Em seguida, pergunta com que mão ISA vai começar. Ela reponde: “com a direita”.

ISA toca e percebe-se que ela se empenha em realizar a dinâmica (f e p). A professora elogia, e em seguida pede que ISA feche a posição dos dedos para fazer o cluster final, bem forte e com firmeza. Além disso, ela recomenda que ISA não tire demais a mão para que os dedos não se mexam muito. Enquanto toca mostrando à aluna como se faz, a professora diz que, por enquanto, a mão ainda está “aprendendo” a ficar na posição e por isso, ela deve ficar mais perto das teclas para evitar que a mão saia da posição. Basta que ela abaixe as teclas e levante a mão para parar o som. A professora toca a música inteira no grave e pede que ISA toque em seguida.

A aluna toca mas ainda apresenta algum descontrole da posição. A professora recomenda que ela pratique em casa para melhorar.

CAR- NA -(muito f) - VAL! A sílaba VAL corresponde ao cluster tocado com as duas mãos em muito f .

O controle da força muscular é requisitado para alternar f e p.

visualmente sobre a ordenação das teclas, diferenciadas através dos grupos de duas e três teclas pretas.

Cifras: 1.Continuando a aula em que a aluna viu todos os arcos marcados num diagrama do teclado impresso no livro, a professora explica que no Brasil nós também usamos as letras do alfabeto em música. [neste momento, a professora

1 e 2 . A correspondência entre as notas e as cifras inclui a ordem das notas e das letras, mas há um desencontro entre o uso habitual que se faz de cada

Cada arco tem dois sons: cada um tocado pelos dedos das extremindades da mão: 5 e 1 na mão esquerda; 1 e 5 na mão direita. Assim, o arco de

1 e 2. Vemos a construção do conceito de cifra através de uma operação lógico-matemática de correspondência termo

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escreve horizontalmente as letras maiúsculas de A a G na mesma folha do livro onde se encontra o diagrama com os arcos marcados]. A professora pede que a aluna conte quantas letras ela escreveu. A aluna conta e diz: “Sete!” A professora diz: “Sete! Igual ao número das notas. Quais são as notas, mesmo?” A aluna fala os nomes das notas de Do a Si. 2. A professora explica no Brasil a gente usa as letras quando quer que alguém toque um arco. “Cada arco tem um nome. O nome de cada arco é dado pelo nome da tecla mais grave dele.” E dá o exemplo: “O arco que tem o dó na nota mais grave se chama Arco de Dó”. Depois conta que a letra A é a letra que representa a nota Lá. Em seguida faz a relação de cada letra com a nota correspondente, começando pelo A (Lá); B (Si); etc. 3. Depois pede que a aluna escreva o nome da nota mais grave da cada arco na parte de cima do diagrama do teclado. Em seguida, pede que ISA escreva a “cifra” (letra do alfabeto) correspondente ao nome do arco, na parte de baixo do diagrama, em baixo de cada arco correspondente.

uma destas séries. DO RE MI FA SOL LA SI | | | | | | | C D E F G A B Os arcos são ordenados no livro pela seqüência dos nomes das notas em português, e a professora acrescentou o conteúdo das letras do alfabeto tomando por base a ordenação que a aluna faz no uso habitual destas. 3. A nota mais grave do arco vem a ser a nota base de uma série harmônica e a 5ª, que se soma a ela, vem reforçar a função da primeira. A nota mais grave do arco passa a trazer consigo um espectro harmônico do som fundamental.

Dó é tocado pela ME [nas teclas Dó-Sol] com os dedos 5 e 1; e na MD [os mesmos Dó-Sol] são tocados pelos dedos 1 e 5.

a termo entre os nomes das alturas que ISA já conhece e as letras (A,B,C, etc.) que, a partir de agora, representam os sons que são tocados juntos. Existem aí duas invariantes: o número de termos e o significado comum (a nota que dá nome aos termos). 3. Ao nomear o arco pela nota mais grave, esta nota passa a ser um significante da posição de arco quando do momento da leitura de cifras. Este esquema representativo será muito útil na conservação de harmonias em etapas posteriores.

Acompanhamento de Pão Quentinho: 1. A professora volta uma página do livro onde estava escrita a partitura do acompanhamento para a melodia de Pão Quentinho e pede que ISA

No diagrama encontram-se marcadas as teclas referentes à posição de arco de “Dó”. A partitura apresenta dois

Espaço Tátil: As duas mãos tocam posição de arco, e a dinâmica é distribuída pelas frases.

Vemos que nesta aula a aluna tomou consciência da inversão de ordenação do uso

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coloque a mão no lugar marcado. Quando a aluna posicionou a mão esquerda no lugar correto, tendo como base o diagrama do teclado, a professora pediu que ela dissesse o nome do arco. ISA pensou, e disse: “Arco”. A professora perguntou: “Qual é o nome da tecla mais grave deste arco?” ISA olhou e respondeu: “Dó” A professora disse: “Então, este é o arco de Dó”. 2. A leitura da partitura foi feita a seguir, tendo ISA tocado falando “ta”e taás” para controlar o ritmo, obedecendo o uso alternado ou simultâneo das mãos. A professora apontou a partitura usando também a alternância das mãos nesta ação. 3. A professora combinou que ISA tocaria na próxima semana com JEN este acompanhamento da melodia “Pão Quentinho”. A professora propôs cantar a melodia enquanto ISA tocava o acompanhamento. 4. A professora explicou que na posição de arco temos a nota mais grave sempre igual, mas que o dedo que toca esta nota em cada mão é diferente: 5º dedo na mão esquerda, e 1º dedo na mão direita. 5. A professora fez alguns gestos durante a execução de ISA: no momento em que haveria diferença de ritmo para as partes, (som longo para o acompanhamento) a professora colocou a

planos: um acima –representando a região aguda, para a mào direita, e outro abaixo representando a região grave para a mão esquerda. 3. A prática de tocar em conjunto requer que cada participante saiba a sua parte e acompanhe a parte do seu companheiro, pois ao ouvir outra coisa sendo tocada ao mesmo tempo, cada um deve permanecer fazendo a sua parte sem se atrapalhar com a parte do outro.

A mão direita deve tocar f na primeira frase e a mão esquerda em p na repetição desta frase. 4. A ordenação dos dedos das mãos é igual caso procedamos pelo espelhamento de uma mão com a outra. Mas se colocamos as duas mãos tocando da esquerda para a direita, a ordenação dos dedos de uma mão estará no sentido inverso da outra: MD: 1, 2, 3, 4, 5. ME: 5, 4, 3, 2, 1. Por isso, no arco tocado pela mão direita a nota mais grave é tocada com O 1º dedo; já no arco da mão esquerda a nota mais grave é tocada pelo 5º dedo.

dos dedos quando tocamos arcos. Nas experiências sobre o espaço topológico, Piaget diz que é a partir de 6-7 anos que a criança consegue fazer correspondências com a inversão da ordem de uma série, porque estas demandam a reversibilidade do pensamento. “a noçào de ordem constitui a terceira intuiçào topológica ...” (Dolle, 1978, p.152). No caso da ISA, estas relações estão sendo solicitados a partir de sua atividade perceptiva (tato e visão), mas ao mesmo tempo, com controle de operações concretas. Ao ser solicitada numa a representação destas relações espaciais, ela deverá reagir ao símbolo dos arcos,

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mão sobre a mão de ISA para que ela esperasse a duração escrita na partitura, e no momento em que a melodia mantinha o som longo e o acompanhamento tocava sons repetidos, a professora fez gestos batendo as mãos sobre as pernas. Depois de acabado a professora chama a atenção de ISA para estas diferenças e explica que quando JEN estiver tocando com ela, às vezes vai acontecer de a colega tocar mais vezes na hora que ISA tem sons longos, e que ela deve manter, e vice versa.

procurando a nota mais grave com os dedos corretos em cada uma das mãos. 5. A intervenção da professora aconteceu nos momentos em que ISA teria que conservar a altura apesar da transformação da duração do som que ocorre na melodia que será tocada pela companheira. Os gestos e o canto da professora serviram para alertá-la.

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QUADRO 6: Aula de PIANO 24/06/09 Horário: 4ª. feira 8hs - Aluna ISA, 7;8 anos. 9 hs: Aluna: JEN. 8;0 anos.

INTEGRAÇÃO DA ATIVIDADE PERCEPTIVA À REPRESENTAÇÃO MUSICAL Ação Objeto Musical Espaços práticos

utilizados pelo aluno Inferências sobre as representações musicais

Ondas: a JEN toca usando o pedal com boa sonoridade, e nota-se que se preocupa com o controle da pulsação. A aluna manteve a concentração. A professora elogiou o uso do pedal e sublinhou que JEN não tem o pedal em casa para treinar.

Peça em forma ABA. A parte A é essencialmente harmônica, e a extensão usada é de três oitavas (Sequência de clusters em três grupos de três teclas pretas, seguida de outra sequência nos grupos de duas teclas pretas). O efeito que se busca é de uma massa sonora harmônica, densa, apesar de suave (p). Já na parte B, de caráter melódico, a extensão usada é de uma nona (um grupo de três e um grupo de duas teclas pretas). Pode-se dizer que a forma expressa a imagem sugerida pelo título da música: “ondas”. Na parte A, com uma densidade maior e a parte B, uma densidade menor.

Espaço visual, Tátil/cinestésico: JEN observa atentamente os grupos de teclas que utiliza e seus pés agem sobre o pedal direito em coordenação com as trocas de grupos de teclas pretas pelas mãos, assim como das divisões das frases que ouve. Na parte A, o uso de mãos alternadas em posição de cluster e mudanças de registro (cruzamentos dos braços) numa extensão de duas oitavas (dois grupos de dois e dois de três). Na parte B, o uso de posição fechada, e melodia dividida entre as duas mãos na extensão de um grupo de três e um de

Aprendizagem da peça é baseada na memória específica. É o aspecto figurativo do pensamento que está em jogo. A significação que JEN dá ao título da peça (Ondas) leva-a a valorizar o uso do pedal como um dos aspectos técnicos importantes para o resultado sonoro desejado. Assim, notamos uma melhora significativa desta habilidade, mesmo sendo pequena a freqüência do treino do deste recurso (apenas uma vez por semana).

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dois. Cada mão responsável por um dos grupos de teclas pretas. Em alguns momentos da parte B as mãos tocam juntas mas ela se diferencia da parte A por ser melódica. O uso do pedal exige uma coordenação do pé direito com a entrada e saída das mãos das teclas quando acontece a mudança de harmonia (parte A) - nesta peça é identificado pela mudança dos grupos de teclas pretas usados - ou quando há mudança de frase melódica (parte B).

A Montanha Azul: a aluna toca lendo a partitura que leu pela primeira vez há duas aulas atrás. A professora pede que JEN pense numa mão dentro da outra [mostra para JEN fazendo este gesto com as próprias mãos]. JEN faz o mesmo e ao colocar a mão sobre o teclado, vê-se que está bem estruturada. Mesmo assim, JEN apresenta um hábito indesejado: ao tocar apóia o cotovelo sobre a mão do outro braço.

Melodia escrita em pauta gradativa com intervalos de terça escritos de espaço para espaço. As durações são mínimas e semínimas, e a intensidade é forte.

Os espaços práticos envolvidos são: visual, tactil, auditivo. Solicita-se e coordenação da leitura com a ação dos dedos da mão esquerda sobre as teclas brancas, seguindo a transformação de alturas grafadas na pauta de um espaço ao

Esta peça é um exercício para os esquemas de intervalo de terças. Deve haver uma coordenação “dedo-tecla-espaço”, e “dedo-tecla-linha”. Esta coordenação durante a decodificação dos signos da escrita

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JEN apresenta facilidade na leitura, mas a “boa forma” de sua mão ainda está sendo construída de maneira a facilitar atividades futuras.

outro saltando uma linha. A estrutura “mão” deve tocar intervalos de terça, sem deslocamentos da mão. Neste caso, há um movimento coordenado entre dedos intercalados. Após o primeiro dedo tocar, seu vizinho não toca e o dedo seguinte toca. A conservação da “boa forma” da mão é fundamental para o equilíbrio da coordenação dos movimentos.

musical envolve a coordenação das ações dos dedos com base em ordenações arbitrárias estipuladas pela instrução: das notas da pauta (cada altura tem um lugar específico na ordenação das linhas e espaços) das teclas do teclado e dos dedos da mão. As linhas e espaços assim como as notas são organizadas em ordem crescente do grave para o agudo (1º grau, 2º grau, etc). As teclas são organizadas numericamente da esquerda para a direita, ou seja, do grave para o agudo. Os dedos são organizados do centro do corpo para as extremidades (1º dedo, 2º dedo, etc). Apesar desta organização arbitrária, sabemos que todas as estruturas em jogo têm

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relações espaciais que Apresentam relações topológicas e projetivas do teclado: as teclas são vizinhas ou não, estão situadas mais à direita ou à esquerda em relação umas às outras. Portanto, vemos que a aprendizagem do instrumento envolve uma construção do espaço topológico e projetivo das teclas e ao tocar lendo uma partitura, o sujeito estabelece uma relação termo a termo entre cada um dos signos musicais, seus dedos e as teclas que utiliza.

A melodia do Mar: simples exercício de leitura coordenada à ação da mão direita, esta peça é tocada sem problemas pela aluna

Melodia escrita em pauta gradativa, com intervalos de terça de espaço para espaço com durações de mínimas e semínimas, e intensidade forte.

Solicita-se e coordenação da ação dos dedos da mão esquerda sobre as teclas brancas.

A generalização dos esquemas de terças é solicidada agora para a mão direita.

O Leão: 1. Enquanto JEN se prepara, a professora chama sua atenção para o diagrama do teclado: lá JEN

Peça descrita no quadro 4 desta turma.

1.As duas mãos em posição aberta se distribuem uma dando

1. Representação do teclado real pelo desenho. O livro adota

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pode ver as indicações das teclas onde deve colocar os dedos para tocar as primeiras notas da música (pontos de partida para cada mão) e, no caso desta música, a posição dos dois polegares é um ao lado do outro em teclas vizinhas. 2. Os pontos de partida são tocados pelos terceiros dedos de cada mão. JEN demora um pouco para fazer a correspondência do diagrama para o teclado real. A professora precisou ajudá-la. Diz: “o terceiro dedo da mão direita tem que tocar antes da primeira do grupo de dois” [e faz um gesto pedindo que a aluna leve a mão para a região mais grave] “antes” ...é mais para a esquerda, mais para o grave”. 3. Depois de localizar-se no teclado, JEN toca lendo a melodia e tudo vai bem até que ela se engana na segunda entrada da mão direita. Toca o mesmo ponto de partida do inicio, sendo que deveria começar pela nota mais grave e “saltar para cima”. A professora lhe pede que antes de tocar, pense naquele ponto de partida diferente. 4. A professora analisa com a aluna as notas dos dois pontos de partida que são escritos em alturas diferentes da pauta e partindo para direções opostas (salto acima ou salto abaixo).

continuidade à outra de forma que ocupam 10 teclas consecutivas. 2. Ponto de partida é a primeira tecla a ser tocada numa música ou parte dela. A segunda frase (Vai rugir assim!) começa pela mão direita na nota mais grave das teclas selecionadas para esta mão.

a representação figurativa do teclado como meio de criar referencias para a localização da ação do sujeito. Em livros tradicionais isso é feito através de símbolos arbitrários (tais como as claves de sol e de fá, por exemplo). 2. Parece que a ordenação das teclas só faz sentido para JEN quando sua professora explica. 3. pensar antes de tocar requer antecipar a imagem da tecla que será tocada no meio da música, ou seja, projetar a imagem de uma ação. Temos aqui uma representação figurativa. 4. Nova generalização do intervalo de terça, que agora é feito descendentemente.

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Ao extrair do objeto suas leis de funcionamento, a aluna está realizando uma abstração reflexionante.

Tocando “O Leão” com acompanhamento: 1. Enquanto a professora toca (lentamente) a introdução do acompanhamento, ela pede que JEN bata palmas marcando a pulsação. No momento certo, a professora canta a parte melódica que será tocada pela aluna. 2. Repetição da introdução pela professora e desta vez, a aluna toca a melodia. Ela erra, começando a música com a mão esquerda. A professora pára, a corrige dizendo que ela não deve começar pela segunda frase e pergunta: “quem entra primeiro, a mão direita ou a esquerda? JEN responde através de uma ação: toca o ponto de partida com a mão direita usando a tecla correta. 3. As duas tocam a partir da entrada de JEN e tudo vai bem.

O acompanhamento apresenta uma longa introdução em ritmo de marcha (quaternário). Apresenta um baixo em semínimas que marcam os graus (T ou D) em oitavas e quintas quebradas. A mão direita tem linhas cromáticas descendentes em semínimas com bordaduras em colcheias nos últimos tempos, lembrando o trilo de uma flauta. O andamento da introdução deve ser incorporado ao da melodia tocada pela aluna.

Dois tipos de movimento são evidentemente complementares na construção da conservação de pulsação da aluna: palmas e tocar o instrumento. Quando ela bate palmas para se preparar, ela entra na pulsação correta.

1.Solicita-se à aluna, uma reação motora (bater palmas) que remonta a uma reação circular aplicada à reiteração de uma unidade de tempo através de um movimento corporal sempre igual. As palmas simplesmente repetem este esquema elementar. 2.Esta nova solicitação requer, além da reação motora à pulsação, coordenações diferentes e também mais complexas: uso de uma mão só, uso da posição aberta da mão, leitura de parâmetros de altura, durações e direção do som.

Mudança do andamento: Espaço auditivo: JEN A variação de

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4. Em uma nova execução, a professora pede que JEN bata a pulsação e, quando for a hora, toque a melodia. Diz: “veja como vou fazer a pulsação!” Desta vez a professora toca a introdução numa velocidade maior. JEN bate a pulsação corretamente. Noto que está numa posição ruim, com os pés cruzados sob o banco. No entanto, ao começar a tocar, sua posição melhora, e JEN entra no ponto de partida correto o mantendo a mesma pulsação usada na introdução pela professora. 5. Nova execução ainda mais rápida. JEN acompanha a mudança novamente.

ouve enquanto a professora toca a introdução abstraindo o andamento da melodia. Espaço tátil-cinestésico: A aluna manifesta o andamento através das batidas de palmas antes da sua entrada e dá continuidade à pulsação quando toca sua parte melódica.

andamentos solicita da aluna a conservação da pulsação, da melodia e do ritmo, apesar da transformação da velocidade da música. Esta experiência leva a uma abstraçào pseudo-empírica do andamento com a tomada de consciência das mudanças e constâncias na música.

Conversando sobre o andamento. 6. A professora então pergunta se ela sabe como se chama esta mudança que elas fizeram. JEN não sabia. A professora explica que esta mudança se chama “andamento” da música. Diz: “Se eu ando devagar estou no andamento...? - a professora anda devagar pela sala, e para responder, JEN toca no piano algumas notas no mesmo andamento que a professora estava andando – o que? – “lento” diz JEN. “Se ando assim [diz a professora e muda a velocidade do andar] eu estou num andamento mais...?” [e JEN toca escalas rápidas no piano] diz: “Rápido”. A professora pergunta para JEN: “existe nota

Diálogo sobre o conceito de andamento.

Espaço auditivo e vocal, durante a conversa. Espaço tátil-cinestésico ao responder musicalmente às questões da professora.

Conceitualização da experiência anterior. Noto que a aluna prefere se manifestar através da ação para demonstrar que está compreendendo o que a professora fala.

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lenta e nota rápida?” JEN pensa um pouco e responde: não. “O que existe?” JEN diz: “Agudo e grave”. A professora então diz que JEN estaria certa se estivessem falando das alturas, mas naquela hora ela estava falando do tempo na música. E diz: “existem notas longas e curtas e também tem música rápida e lenta.” JEN toca muito rapidamente uma escala de 5 sons subindo e descendo. Depois diz: mas também pode ser assim: [ JEN toca os sons subindo bem devagar, e desce rápido]. A professora então diz: “que bom, você já entendeu bem isso, porque tem gente que diz: ‘essa nota é mais rápida’. Na verdade a nota é curta! Mas quando eu mudo a música inteira, o jeito de tocar, aí digo que estou tocando mais lento ou mais rápido, entendeu?” JEN baixou afirmativamente a cabeça. 7. A professora propõe de elas tocarem mais rápido a música “O Leão”, só que desta vez ela diz que JEN não precisa bater palmas na pulsação, deixando as mãos preparadas sobre as teclas. A velocidade era muito maior desta vez, e JEN não conseguiu acompanhar. Tocou completamente fora do andamento. A professora não parou de tocar, e ao acabar sua parte antes de JEN, avisou: “Já foi!”

Na primeira vez, JEN ouve a introdução e aguarda sua vez de tocar envolvendo os espaços auditivo, tátil e visual. Na segunda vez, ao bater as pulsações o corpo de JEN entra em ação antes de tocar envolvendo um espaço cinestésico.

Ao aumentar as relações espaciais envolvidas num movimento de maior amplitude JEN ativa esquemas motores mais simples e mais desenvolvidos do que os movimentos sutis usados para “tocar”

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8. Elas repetem mais uma vez, e JEN bate a pulsação. Desta vez ela se aproximou da velocidade da introdução mas houve inconstância nas durações. JEN estava agitada com a estimulação da atividade. A professora pede que ela estude em casa para melhorar o domínio da atividade.

piano. O ritmo exercido nos movimentos de “bater palmas” são transferidos imediatamente para o toque das teclas. Além disso, a continuidade na participação leva a uma continuidade no pensamento representativo que dá suporte à ação de JEN.

ISA toca Mourão: Antes de ISA começar a tocar, a professora ajusta a altura do banco para a aluna. 1. Logo no inicio da peça, ISA toca usando a mão errada. A professora aponta a partitura mostrando que a mão direita só entra depois. Pergunta: “É para começar mão direita e depois a esquerda, ou é para começar com a esquerda e depois direita?” ISA reponde “É esquerda depois direita”. Na segunda frase musical ISA errou novamente o uso da mão. A professora novamente apontou para a partitura.

Peça descrita no quadro 3 desta turma. A notação não convencional para instrumentos de teclado e a questão da lateralidade: A representação gráfica da lateralidade na notação musical é um dos primeiros sinais estabelecidos na escrita usada neste método: haste para baixo – mão esquerda; haste para cima - mão direita. Além disso, quando há uso das duas mãos na mesma peça, adotou-se o padrão convencional de dois

1. Espaço visual: Como a esquerda toca mais facilmente do lado esquerdo do teclado que é onde ficam os sons graves, naturalmente o plano de baixo é tocado pela mão esquerda. Já os sons agudos, que ficam do lado direito do teclado, são geralmente tocados pela mão direita.

1. Ao apontar para a partitura, a professora está solicitando que a representação gráfica (sinais para o uso das mãos e das regiões do teclado) seja relembrada e decodificada pela aluna. Além desta decodificação solicita-se uma reação motora a estes sinais no intuito de favorecer a construção de esquemas de lateralidade.

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planos: o de baixo no papel para os sons graves e o de cima para os sons agudos.

Estes esquemas ainda estão em fase de acomodação, sendo ainda necessário mais exercício para sua eficiência.

Au Clair de La Lune: 1. ISA toca a melodia e faz corretamente o

desenho melódico. Só não prolongou o som das mínimas no final da primeira frase. A professora elogia seus acertos e pede que ela prolongue mais aquelas figuras.

2. para corrigir a posição fechada e levar a aluna a exercitá-la, a professora pede que ela repita algumas vezes.

3. A professora faz um acompanhamento tocando com posição fechada, e este acompanhamento serve de apoio à atenção de ISA para a pulsação. A mão direita deve estar pronta no momento de seu ataque.

Melodia francesa composta sobre três sons. A partitura representa as durações por notas redondas (semínimas e mínimas) escritas sobre os planos horizontal (sucessão) e vertical (alturas) mas sem linhas e espaços.

Uso das duas mãos em posição fechada nos grupos de três teclas pretas.

A duração das mínimas precisam ser feitas com base na memória do significado de um signo: a figura rítmica. Já o movimento melódico faz uma analogia do subir e descer, que envolve um movimento dos olhos e com a direção da ação da mão sobre o teclado. Portanto, vemos que esquemas de ação dão base à representação dos conceitos presentes na melodia: sons vizinhos, teclas vizinhas. Sons que saltam supõe o salto de uma tecla. O sons que caminham para o agudo são tocados indo da esquerda para a direita.

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Já os sons que caminham para o grave são tocados indo da direita para a esquerda.

Cifras: 1. A professora aponta para os desenhos dos

arcos no diagrama do teclado impresso no livro e pede que ISA vá dizendo o nome de cada arco apontado, falando o nome deles em português: Do, Re, Mi, etc.

2. A professora esconde o livro e pede que ISA fale o nome das cifras (letra do alfabeto referentes à nota mais grave de cada arco, usada para representá-lo). Assim foram fazendo as correspondências verbalmente: “letra A” – “Lá”, “letra B” – “Si”, etc.

A série dos arcos é grafada utilizando cada oitava do diagrama do teclado para um arco diferente.

Espaço visual: ISA olha pra o diagrama do teclado e identifica a tecla mais grave de cada arco apontado.

Pela localização das teclas, ISA pode identificar e nomear os arcos pois a imagem das teclas é um significante visual para nomeá-las. Ao ter que nomear os arcos pelas cifras, ISA busca em sua memória o conteúdo deste novo significante. Não podemos afirmar que sua memória utilize a imagem da tecla ou apenas relacione o nome de tecla com letra. Ela terá que recorrer à imagem das teclas do arco somente no momento de tocá-las.

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Melodia Cai Cai Balão: 1. ISA já havia aprendido a tocar esta melodia por imitação. Depois de algumas aulas sem tocá-la, a professora pede a ISA que toque para recordá-la e, vendo que ISA tocou bem, a professora a elogia. 2. A professora, então, escreve a letra no caderno de ISA e explica que vai tocar arcos e cantar a letra. Os primeiros arcos (de Dó = cifra C) já foram escritos no caderno pela professora, para que ISA siga o mesmo padrão. Ela pede que ISA sublinhe no seu caderno, cada sílaba correspondente ao ataque dos arcos que a professora tocará enquanto estiver cantando a melodia. 3. A professora vai ao piano e toca os arcos enquanto canta a melodia. ISA presta atenção à letra que ela ouve e lê no seu caderno. Esta ação é repetida três vezes com a música inteira, além de outras repetições de alguns trechos específicos que a aluna não tinha conseguido escrever.

Melodia tradicional brasileira, em Dó maior, começando na Dominante e terminando na Tônica, cuja extensão é de um intervalo de sexta. Como foi apreendida tátil e auditivamente pela aluna, não é grafada em partitura, mas é representada pela letra da música no papel. Seus intervalos melódicos se mantém em segundas ou terças formando um desenho melódico quem favorece o raciocínio sobre seqüência de sons repetidos e também sobre a repetição de séries de sons. A harmonia é escrita através de cifras obedecendo o padrão usado na música popular: localiza-se sobre as sílabas da letra da música nos momentos em que o “arco” é tocado. As cifras são grafadas com letras maiúsculas.

1. Espaço visual, tátil e auditivo: ao tocar a melodia, ISA olha para a ação da MD sobre as teclas brancas. A melodia tocada nas teclas brancas, com posição fechada. 2. ISA ouve a explicação da atividade. 3. Os espaços auditivo e visual estão voltados para o aspecto temporal. Ela identifica a sincronia dos ataques da ME tocados com as sílabas da letra da música pronunciadas pela professora.

1. Sua ação é guiada pela representação tátil, cinestésica da sequencia de teclas a serem tocadas e pela memória auditiva que tem da melodia. 3. Nesta ação temos um exemplo de correspondência do pensamento infralógico e lógico matemático. O esquema motor formaliza-se numa estrutura pela “posição de arco” que apresenta uma extensão contínua que se adéqua ao instrumento musical a cada descontinuidade do objeto sonoro. Esta interação de estruturas

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C Cai Cai Balão, C Cai Cai Balão, C G Aqui na minha mão, G G

Não cai não, não cai não, não G

cai não, G C

Cai na Rua do Sabão.

físicas (corpo –instrumento – sons simultâneos) é atualizada a cada transformação do objeto musical, em reiterações de ataques da ME da professora observados por ISA.

Depois de sublinhar as sílabas, ISA observa o lugar onde a professora toca o arco no piano e escreve o nome da cifra em cima da sílaba sublinhada. Ao tocar um arco diferente do primeiro (de Sol = cifra G), a professora pergunta o nome dele para ISA. Ela responde “Ré”. A professora então toca o verdadeiro arco de Ré (cifra D) e pergunta: “Foi aqui que eu toquei? No arco de Ré a tecla mais grave é um Ré” - e repete a seqüência de arcos de Dó e de Sol ( C e G). Depois repete o arco de Sol e pergunta: a. “Qual é a nota mais grave do arco de sol?” Como ISA não sabia responder, a professora pede que ela fale o nome das teclas entre o Sol e o Ré. b. Com a mão esquerda tocando o arco de sol, a professora vai apontando as teclas com sua mão

C Cai Cai Balão, C Cai Cai Balão, C G Aqui na minha mão, G G

Não cai não, não cai não, não G cai não, G C

Cai na Rua do Sabão.

Apesar de estar ouvindo o resultado sonoro das ações em jogo, o espaço visual é que predomina localizando os espaços utilizados no piano pela professora para realizar as harmonias. Esta dominância leva ISA a identificar os arcos pela localização do 5º dedo da ME sobre as teclas.

Vemos que nesta atividade ISA hesita entre os nomes das teclas e com isso não consegue responder às perguntas com sucesso. a. Como o arco de Sol é composto de Sol e Ré (uma 5ª justa), a aluna parece se centrar no aspecto figurativo das teclas em jogo sem relacioná-las com o conceito de “arco”, cujo nome é dado pela tecla mais grave. Ela dá o nome da tecla mais aguda do arco, e erra.

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direita - do grupo de três teclas pretas e em seguida as teclas brancas que estão entre as três pretas – mantendo a mão no arco e apontando a tecla fá, pergunta: “Esta tecla é o Fá, e esta aqui, qual é? (e vai apontando as teclas vizinhas). ISA responde “Sol”, depois “Lá”, e depois “Si”. 2. A professora toca o arco de Sol outra vez e pergunta: “Este arco é qual?” ISA responde: “Si”. A professora toca então o arco de Si. Imediatamente ISA diz: “Não, era de Sol!” A professora então toca o arco de Sol e elogia a aluna.

b. A professora então, refaz o processo de reconhecimento e nomeação das teclas favorecendo a memória de reconstituição pois vai agindo sobre cada tecla e solicitando seu nome. Ao perguntar o nome da tecla mais grave de cada arco, a professora leva ISA a nomear os arcos através deste índice. Estas teclas passam a ser significantes de cada intervalo harmônico em jogo. “Ao relacionar os aspectos figurativos do conhecimento com a função semiótica, Piaget diz que há uma relação de interseção entre eles. Primeiramente, existem os aspectos figurativos que não participam da função semiótica. Depois, existem os que são simultaneamente figurativos e semióticos, a saber, a imagem mental, o jogo simbólico, a imitação

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diferida, a linguagem por gestos, etc. Finalmente, existem os instrumentos semióticos, que não são por si mesmos figurativos, mas sim, sistemas de signos.” (ver capitulo 1 da tese)

6. Para escrever os arcos da última frase (G e C) a aluna novamente se enganou. A cada vez, a professora toca os arcos certos ou errados, seguindo as respostas de ISA. A aluna reconhece auditivamente seus erros e acertos e pensa numa nova resposta até acertar.

G C

Cai na Rua do Sabão. Espaço auditivo e visual. Os esquemas auditivos

da 5ª justa são uma referencia para a memória de reconhecimento de ISA. Ao responder, ela pensa nas teclas (índices significantes) mas, ao ouvir, age sobre o objeto sonoro através da memória de reconstituição, que se apóia nos esquemas auditivos.

Exercício escrito no livro: a correspondência das cifras e o nome das notas foi escrito pela aluna na pagina do livro onde ela havia aprendido as cifras na aula anterior.

DO RE MI FA SOL LA SI | | | | | | | C D E F G A B

Espaço visual Neste caso temos uma relação termo a termo baseada em signos equivalentes. É um exercício que utiliza a memória no sentido estrito, mas não deixa de se referir aos significados que supõe imagens e evocações

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mnêmicas dos arcos. Tocando as cifras e melodia de Cai Cai Balão: ISA está no piano e a professora vai ensinando-a a deslocar-se nas teclas com a posição de arco. O arco de Dó (C) é composto das teclas Dó e Sol tocadas pelos 5º e 1º dedos da mão esquerda. Assim, quando ISA tocar com a ME, deverá prestar atenção na tecla ocupada pelo 1º dedo no arco de Dó (tecla Sol), pois ao transferir a ME para o arco de Sol (G), que é composto pelas teclas Sol-Ré, a tecla Sol deverá ser o ponto de referencia para posicionar o 5º dedo da ME. Para que este deslocamento funcione bem, é essencial “não modificar a posição da mão” diz a professora para ISA.

Diagrama do teclado com as localizações das teclas e dos dedos nos arcos de Dó (C) e de Sol (G)

Coordenação dos espaços visual, auditivo e tátil: ISA olha para as cifras e busca os arcos no teclado mantendo a posição da ME em arco para localizar o espaço do teclado onde colocará o 5º dedo.

A forma da mão em arco é uma unidade de medida espacial que ISA usará para deslocar a ME sobre o teclado e realizar a estrutura do intervalo harmônico de 5ª .

Harmonia e melodia: coordenação de duas ações diferentes com uma mão e voz 1. Mão esquerda: Após a explicação, ISA toca as cifras e canta a melodia. Seu único erro foi no último arco. A professora a elogia e pede que repita. 2. Mão direita: ISA relembra a melodia com a mão direita, que toca com facilidade.

C Cai Cai Balão, C Cai Cai Balão, C G Aqui na minha mão, G G

Não cai não, não cai não, não G cai não, G C

Cai na Rua do Sabão.

Espaço vocal: para o canto Espaço Tátil-cinestésico: para o movimento lateral da ME que lleva os dedos às teclas certas para tocar os arcos de C e G, e em seguida toca a melodia com a MD

1. Esta coordenação exigiu o uso da mão e da voz o que supõe que a representação auditiva e vocal da melodia já pode ser coordenada com o movimento da harmonia realizado pela ME.

Harmonia e melodia: coordenação de duas ações diferentes com as duas mãos juntas. Ao começar a tocar com as duas mãos juntas ISA

C

Cai Cai Balão, Espaços visual, tátil e cinestésico

Na primeira ação, ISA centrou-se nos espaços tátil e cinestésico.

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apresenta dificuldade para tocar simultaneamente. Se toca a esquerda, não toca a direita (é como se sentisse a ação da esquerda como a continuação da ação da direita). A professora a interrompe para mostrar e explicar como fazer: “a mão direita toca o primeiro som e as duas tocam o segundo som ao mesmo tempo” diz. Pede que ISA faça apenas esta parte. Ela faz e consegue. 3.2. ISA continua mas repete três vezes ao invés de duas o sol inicial da melodia. A professora canta como seria se a letra fosse igual o que ISA tocou: Cai cai cai balão. ISA ri e repete a ação, agora sem o erro. A professora elogia: “Muito bem! Ótimo!”

Na segunda vez, centrou-se na representação auditiva que deve regular a coordenação dos movimentos das duas mãos. Ao ouvir o resultado de sua ação na voz da professora, ISA compara, através da reversibilidade do pensamento operatório, o modelo representado que tentou imitar e o modelo atualizado pela professora. Assim toma consciência de seu erro e corrige sua ação.

Depois de tocar este início, ISA enfrenta a mudança na linha melódica e mudança de harmonia na mesma frase. Ela tenta, mas repete a mesma ação que fez na primeira frase. A professora, então, toca ao mesmo tempo que solicita a explicação de ISA. A professora lhe pergunta: “eu mudei o lugar da mão?” Como ISA não respondia, ela fez mais duas vezes e então explicou:

ME:

Coordenação do espaço visual com espaço tátil controlando o espaço topológico por cima do qual a ME se desloca com a posição de arco, e a MD com a posição fechada. Espaço auditivo controla a sincronia e diacronia das linhas melódicas e

Na coordenação dos movimentos das duas mãos podemos acompanhar a dialética do pensamento de ISA que apresenta momentos de sincronia e de diacronia para realizar uma linha melódica contínua que sofre interferência das

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“A mão direita sai do Sol e vai para o?” - “Lá” responde ISA. “E a mão esquerda continuou no Dó (arco de Dó) está vendo?” – diz a professora, que repete com as duas mãos: “A-qui”. Mais uma vez: “A-qui”. E segue: “Aqui na minha mão”. Ao tocar a frase inteira a professora explica que tem mudança de movimento tanto na direita quanto na esquerda. “Eu começo no Dó e no final aqui vou para o Sol” diz e toca com a mão esquerda. Pede que ISA toque só a mão esquerda e toca a melodia da mão direita com a aluna, somente este trecho. Como ISA não esperou, a professora explicou: “Você só toca o arco de Dó quando eu tocar o Lá”. ISA continua tentando mas não mantém a mão esquerda na posição. “Deixa aquela mão quieta”, diz a professora. “Ela quer mexer junto com essa, mas são duas mãos, é como se fossem duas pessoas”.” ISA continua tentando, mas erra o Arco de Sol. A professora pede que ela treine em casa e explica: “O movimento das mãos são diferentes: a mão direita vai descendo devagarinho, [mostra a mão passando de tecla em tecla], mas a mão esquerda sobe tudo de uma vez [mostra o movimento da esquerda sendo feito mais rapidamente]”. ISA treina o movimento da esquerda e ouve a

MD: C G Aqui na minha mão,

hamônicas usando a letra da música como referencia temporal para realizar os ataques dos arcos nos momentos exatos.

continuidades e descontinuidades harmônicas. No “A-qui”, a mão direita sai do Sol e vai para o Lá. A mão esquerda permanece repetindo o arco de Dó (C).

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professora lhe mostrando o movimento e explicando ainda: “Veja [toca C-G] eu chego no lugar um pouquinho antes.” ISA ouve as explicações da professora e acompanha na escrita das palavras os lugares que deve estar atenta para tocar os arcos: “Quando você chega no segundo “não” de “não cai não”, você toca o arco de Sol na mão esquerda junto com a tecla Fá na mão direita”. ISA faz bem, mas na última repetição esbarra o arco de sol.

G G

Não cai não, não cai não, não G

cai não,

Espaço auditivo e visual No momento da instrução para a ação ISA se apóia na imagem auditiva da melodia e faz um plano com os detalhes temporais para cada ação através das significações da escrita das cifras sobre as palavras.

Mesmo com tateamentos nos momentos de novidades, caso do desenho “vai e volta” do início da melodia [Cai na Ru-a], e na coordenação do Arco de Dó com a tecla Dó na mão direita, ISA toca com as duas mãos juntas até o final.

G C

Cai na Rua do Sabão. Coordenação dos espaços visual e tátil: ISA olha pra o teclado e coordena movimentos das duas mãos seus olhos caminham de uma região a outra do teclado para localizar as teclas a tocar. Espaço auditivo: Pela audição ISA regula o tempo exato das simultaneidades.

Agora que já entendeu o funcionamento da coordenação, ISA não depende tanto do modelo da professora para imitar. Nota-se que já construiu um plano de ação a partir da imagem das teclas, pode se localizar no espaço e imprimir sobre este as estruturas táteis na forma de arcos e pontos da sequencia melódica. Espaço e

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tempo são regulados, portanto, pela ação dos olhos e dos ouvidos.

A professora faz então uma revisão e pergunta: “O movimento dos arcos nesta música é de C para G, repetições no G, depois retorno de G para C. Então me diga agora: quais arcos você toca nesta música?” “Dó e Sol” diz ISA.

Reflexão sobre os signos musicais que representam os intervalos harmônicos de 5ª justa.

Espaço visual: ao olhar a partitura e o teclado.

Imagem mental da ação realizada anteriormente: Arcos de Dó e Sol.

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ANEXO 7

FLUXOGRAMA DA OBSERVAÇÀO E ANÁLISE DAS AULAS

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Fluxograma das AULAS OBSERVADAS NO PRIMEIRO SEMESTRE descritas*/revistas**/analisadas ***/ análise em desenvolvimento***|| UM DOS SUJEITOS FALTOU **** AULAS Semana 1 Semana 2 Semana 3 Semana 4 Semana 5 Semana 6 EPEM 1.2 19/05 *** 26/05 *** 02/06 *** 09/06 *** 16/06 *** 23/06 *** VIOLÃO 19/05 **** 26/05 *** 02/06 **** 09/06 *** 16/06 *** 23/06 *** VIOLINO 11/05 *** 18/05 *** 01/06 *** 08/06 *** 15/06 *** 22/06 *** VIOLONCELO 14/05 *** 21/05 **** 28/05 *** 04/06 **** 18/06 *** 25/06 **** PIANO 20/05 *** 27/05 *** 03/06 *** 10/06 *** 17/06 *** 24/06 *** Fluxograma das AULAS OBSERVADAS NO SEGUNDO SEMESTRE descritas*/revistas**/analisadas ***/ análise em desenvolvimento***|| UM DOS SUJEITOS FALTOU **** AULAS Semana 1 Semana 2 Semana 3 Semana 4 Semana 5 Semana 6 EPEM 1.2 03/11 * 10/11 * 17/11 24/11 01/12 AVA 08/12 VIOLÃO 03/11 * 10/11 **** 17/11 **** 24/11 **** 01/12 *** 08/12 **** VIOLINO 09/11 16/11 22/11 30/11 07/12 **** VIOLONCELO 05/11 **** 12/11 *** 19/11 26/11 03/12 10/12 PIANO 04/11 11/11 18/11 25/11 02/12 09/12 Fluxograma das ESTREVISTAS COM PROFESSORES/ transcritas*/analisadas *** PROFESSORES EPEM 12 *** VIOLÃO *** VIOLINO *** VIOLONCELO *** PIANO ***

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SUJEITOS DA AMOSTRA NO PRIMEIRO SEMESTRE AULAS SUJEITOS IDADES DAS Crianças EPEM 1.2 PROF. (DEN) ISI, BEA, AGA, ISA E JEN/

+ LAU, MA, DIO, VINI, HEN 7;8 a 9;0 anos

VIOLÃO PROF. (LU) ISI 8;5 BEA 8;0 VIOLINO PROF. (NO) AGA 8;9

VIOLONCELO PROF. (NE) FRA 11; 8 (EPEM 1.6) ISA 7;8 PIANO PROF. (LI) JEN 9;0