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351 Hortic. bras., v. 19, n. 3, nov. 2001. página do horticultor D entre as espécies de interesse eco- nômico, submetidas à forte pres- são extrativista devido ao seu potencial medicinal, destaca-se o guaco (Mikania glomerata Sprenguel) popularmente empregado como anti-séptico, expectorante, anti-asmático, febrífugo, anti-reumático e cicatrizante (Cerri, 1991). Planta trepadeira arbustiva, na- tiva da América do Sul, ocorre esponta- neamente de São Paulo ao Rio Grande do Sul, Argentina, Uruguai e Paraguai (Corrêa et al., 1994). O comércio e industrialização do guaco, assim como da maioria das es- NEGRELLE, R.R.B.; DONI, M.E. Efeito da maturidade dos ramos na formação de mudas de guaco por meio de estaquia. Horticultura Brasileira, Brasília, v. 19, n. 3, p. 219-222, novembro 2.001. Efeito da maturidade dos ramos na formação de mudas de guaco por meio de estaquia. Raquel R. B. Negrelle; Maria Elisabete Doni UFPR, C. Postal 19031, 81.531-970 Curitiba-PR; Email: [email protected] RESUMO Verificou-se a influência da maturidade do ramo no enraizamento, na brotação e no estabelecimento das mudas de guaco (Mikania glomerata Sprenguel). A partir de ramos selecionados conforme a consistência do tecido, foram preparados os tipos de estacas: lenhosas sem folhas com talão (TSF) e sem talão (LSF); semi-lenhosas sem folhas (SLSF) e com folhas (SLCF); herbáceas sem folhas (HSF) e com folhas (HCF) e herbáceas do tipo ponteiro sem folhas (PSF) e com folhas (PCF). Estes tratamentos foram submetidos ao delinea- mento de blocos casualizados (quatro repetições de 10 estacas por tratamento). Após 45 dias do plantio, as estacas foram avaliadas quanto à precocidade, pela ocorrência ou não de brotação e pela medida do comprimento da brotação mais longa. Aos 60 dias, as estacas foram reavaliadas quanto ao estabelecimento das mudas ge- radas, utilizando-se as características presença de brotação, medida do comprimento da brotação mais longa (cm), presença e localiza- ção de raízes adventícias e pesos da matéria seca da parte aérea e da raiz. A análise final considerou também a detecção visual da pre- sença ou ausência de raízes pré-formadas; a avaliação da concentra- ção de amido, através de visualização de intensidade de coloração (alta, média ou baixa) sob efeito do lugol (0,2%) e a presença de fenol, através de visualização de intensidade de coloração (alta, média ou baixa) sob efeito da solução aquosa de cloreto férrico (1%). Hou- ve significativa influência da maturidade do ramo na formação de mudas de guaco. Os ramos semi-lenhosos com folhas mostraram-se ideais para o preparo de estacas, pois favorecem precocidade e esta- belecimento. Palavras chave: Mikania glomerata, planta medicinal, estaquia. ABSTRACT Influence of branch maturity on guaco sprout production by the cutting technique. Guaco (Mikania glomerata Sprenguel) sprout production was studied by the cutting technique using stem cuttings at different developmental phases (phases are defined as hardwood, semi- hardwood, softwood or herbaceous). Developmental phases were separated into a total of eight treatments: two kinds of hardwood cuttings - straight and mallet, both without leaves; semi-hardwood, softwood and herbaceous cuttings were tested with and without leaves. These treatments were organized in random blocks, each with four replicates of 10 cuttings. At 45 days, the cutting precocity was evaluated through the criteria: presence of sprouts; length of longest sprout. At 60 days the cutting establishment was re-evaluated with the additional criteria: presence of adventitious roots; dry weights of above-ground and below-ground portions of cuttings. The following characteristics were also examined, with the same experimental design as described above: presence of pre-formed roots; visual estimate of starch concentration (high, medium, low) after treatment with 0.2% lugol; visual estimate of phenol concentration (high, medium, low) after treatment with aqueous 1.0% ferrous chloride. There were significant treatment effects on sprout production. The semi-hardwood branches with leaves were ideal to prepare cuttings because they favor the precocity of sprouts and their establishment. Keywords: Mikania glomerata, medicinal plants, cutting. (Aceito para publicação em 7 de agosto de 2.001) pécies medicinais é abastecido por ma- téria prima proveniente da atividade extrativista em remanescentes florestais. No entanto, sistemas agro-florestais ou de produção agrícola podem também ser fontes apropriadas destes recursos. Es- tes sistemas são geralmente bem suce- didos quando implantados a partir de conhecimentos auto-ecológicos das es- pécies de interesse, obtidos em ambien- tes naturais. A maior dificuldade reside no fato de que grande parte do conheci- mento sobre espécies vegetais seja ba- seado no que se conhece das espécies tradicionalmente agrícolas ou espécies madeireiras. A facilidade do acesso a áreas intactas e a grande lacuna de in- formação sobre o cultivo sistematizado leva à atividade extrativista. Por sua vez, o desconhecimento da capacidade de manutenção dos estoques naturais e da dinâmica dos ciclos de recomposição, leva freqüentemente à exaustão do re- curso (Drummond, 1995). Apesar de fazer parte da lista de maior interesse para o SINDUSFARMA-SP (Sindicato da In- dústria de Produtos Farmacêuticos do Estado de São Paulo) e ser citada, por várias fontes, como espécie de alto va-

página do horticultor - SciELO · Verificou-se a influência da maturidade do ramo no enraizamento, na brotação e no estabelecimento das mudas de guaco (Mikania glomerata Sprenguel)

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351Hortic. bras., v. 19, n. 3, nov. 2001.

página do horticultor

Dentre as espécies de interesse eco-nômico, submetidas à forte pres-

são extrativista devido ao seu potencialmedicinal, destaca-se o guaco (Mikaniaglomerata Sprenguel) popularmenteempregado como anti-séptico,expectorante, anti-asmático, febrífugo,anti-reumático e cicatrizante (Cerri,1991). Planta trepadeira arbustiva, na-tiva da América do Sul, ocorre esponta-neamente de São Paulo ao Rio Grandedo Sul, Argentina, Uruguai e Paraguai(Corrêa et al., 1994).

O comércio e industrialização doguaco, assim como da maioria das es-

NEGRELLE, R.R.B.; DONI, M.E. Efeito da maturidade dos ramos na formação de mudas de guaco por meio de estaquia. Horticultura Brasileira, Brasília,v. 19, n. 3, p. 219-222, novembro 2.001.

Efeito da maturidade dos ramos na formação de mudas de guaco pormeio de estaquia.Raquel R. B. Negrelle; Maria Elisabete DoniUFPR, C. Postal 19031, 81.531-970 Curitiba-PR; Email: [email protected]

RESUMOVerificou-se a influência da maturidade do ramo no enraizamento,

na brotação e no estabelecimento das mudas de guaco (Mikaniaglomerata Sprenguel). A partir de ramos selecionados conforme aconsistência do tecido, foram preparados os tipos de estacas: lenhosassem folhas com talão (TSF) e sem talão (LSF); semi-lenhosas semfolhas (SLSF) e com folhas (SLCF); herbáceas sem folhas (HSF) ecom folhas (HCF) e herbáceas do tipo ponteiro sem folhas (PSF) ecom folhas (PCF). Estes tratamentos foram submetidos ao delinea-mento de blocos casualizados (quatro repetições de 10 estacas portratamento). Após 45 dias do plantio, as estacas foram avaliadasquanto à precocidade, pela ocorrência ou não de brotação e pelamedida do comprimento da brotação mais longa. Aos 60 dias, asestacas foram reavaliadas quanto ao estabelecimento das mudas ge-radas, utilizando-se as características presença de brotação, medidado comprimento da brotação mais longa (cm), presença e localiza-ção de raízes adventícias e pesos da matéria seca da parte aérea e daraiz. A análise final considerou também a detecção visual da pre-sença ou ausência de raízes pré-formadas; a avaliação da concentra-ção de amido, através de visualização de intensidade de coloração(alta, média ou baixa) sob efeito do lugol (0,2%) e a presença defenol, através de visualização de intensidade de coloração (alta, médiaou baixa) sob efeito da solução aquosa de cloreto férrico (1%). Hou-ve significativa influência da maturidade do ramo na formação demudas de guaco. Os ramos semi-lenhosos com folhas mostraram-seideais para o preparo de estacas, pois favorecem precocidade e esta-belecimento.

Palavras chave: Mikania glomerata, planta medicinal, estaquia.

ABSTRACTInfluence of branch maturity on guaco sprout production

by the cutting technique.

Guaco (Mikania glomerata Sprenguel) sprout production wasstudied by the cutting technique using stem cuttings at differentdevelopmental phases (phases are defined as hardwood, semi-hardwood, softwood or herbaceous). Developmental phases wereseparated into a total of eight treatments: two kinds of hardwoodcuttings - straight and mallet, both without leaves; semi-hardwood,softwood and herbaceous cuttings were tested with and withoutleaves. These treatments were organized in random blocks, each withfour replicates of 10 cuttings. At 45 days, the cutting precocity wasevaluated through the criteria: presence of sprouts; length of longestsprout. At 60 days the cutting establishment was re-evaluated withthe additional criteria: presence of adventitious roots; dry weightsof above-ground and below-ground portions of cuttings. Thefollowing characteristics were also examined, with the sameexperimental design as described above: presence of pre-formedroots; visual estimate of starch concentration (high, medium, low)after treatment with 0.2% lugol; visual estimate of phenolconcentration (high, medium, low) after treatment with aqueous 1.0%ferrous chloride. There were significant treatment effects on sproutproduction. The semi-hardwood branches with leaves were ideal toprepare cuttings because they favor the precocity of sprouts and theirestablishment.

Keywords: Mikania glomerata, medicinal plants, cutting.

(Aceito para publicação em 7 de agosto de 2.001)

pécies medicinais é abastecido por ma-téria prima proveniente da atividadeextrativista em remanescentes florestais.No entanto, sistemas agro-florestais oude produção agrícola podem também serfontes apropriadas destes recursos. Es-tes sistemas são geralmente bem suce-didos quando implantados a partir deconhecimentos auto-ecológicos das es-pécies de interesse, obtidos em ambien-tes naturais. A maior dificuldade resideno fato de que grande parte do conheci-mento sobre espécies vegetais seja ba-seado no que se conhece das espéciestradicionalmente agrícolas ou espécies

madeireiras. A facilidade do acesso aáreas intactas e a grande lacuna de in-formação sobre o cultivo sistematizadoleva à atividade extrativista. Por sua vez,o desconhecimento da capacidade demanutenção dos estoques naturais e dadinâmica dos ciclos de recomposição,leva freqüentemente à exaustão do re-curso (Drummond, 1995).

Apesar de fazer parte da lista demaior interesse para oSINDUSFARMA-SP (Sindicato da In-dústria de Produtos Farmacêuticos doEstado de São Paulo) e ser citada, porvárias fontes, como espécie de alto va-

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lor comercial (Negrelle, 1998), o culti-vo ou atividade extrativista do guaco ca-recem de dados autoecológicos, informa-ções sobre o estoque natural, ciclos natu-rais de produção ou cultivo em ampla es-cala e respostas à extração (Lima, 1994).

A partir de alguns estudos jáefetuados, sabe-se que o guaco é umaplanta que prefere solos com bom teorde argila e bem drenados (Brasil, 1981).As sementes do guaco são muito rudi-mentares (Silva et al., 1994). Assim, suapropagação é feita no viveiro por esta-cas, a partir de segmentos sadios e rela-tivamente grossos de uma planta matriz,os quais devem ser tratados comfungicida e plantados em tubetes e man-tidos em viveiro (Magalhães, 1994).

Em muitos casos, estas informaçõessão geralmente acrescidas da orientaçãousual para o preparo de qualquer espé-cie pela técnica da estaquia. Porém, qualporção do ramo de guaco deve ser sele-cionada para a produção de mudas?Qual a mais precoce no estabelecimen-to da muda? Quais as expectativas quan-to ao tempo de estabelecimento dasmudas dos demais tipos de ramo? Aausência destas respostas configura-senum hiato de informações importantespara a sistematização do preparo dasmudas cuja correta manipulação é a basede sustentação do cultivo organizado.

Partindo-se do pressuposto que amaturidade do ramo pode influenciar oenraizamento, como já sugerido em al-guns trabalhos científicos (Greenwood,1987; Davis et al. 1989), este estudobuscou avaliar a eficiência na produçãode mudas de guaco a partir de estacasretiradas de partes de ramos representa-tivas de diferentes fases de desenvolvi-mento. Especificamente, procurou-seidentificar a capacidade de resgatarprontamente o poder de enraizamento eda brotação.

MATERIAL E MÉTODOS

Ramos de plantas adultas de guaco(Mikania glomerata Sprenguel) foramcolhidos em trecho remanescente deFloresta Atlântica da Reserva da SPVS(Sociedade de Pesquisa em Vida Selva-gem), localizada no Município deAntonina, Litoral do Estado do Paraná.A partir de ramos selecionados confor-

me a consistência e maturidade do teci-do, foram preparados os seguintes tiposde estacas: lenhosas sem folhas com ta-lão (TSF) e sem talão (LSF); semi-lenhosas sem folhas (SLSF) e com fo-lhas (SLCF); herbáceas sem folhas(HSF) e com folhas (HCF) e herbáceasdo tipo ponteiro sem folhas (PSF) e comfolhas (PCF) (Figura 1). Estacas comtalão são aquelas que apresentam nabase uma porção de madeira mais velha(Hartmann et al. 1990).

O material foi preparado de acordocom a técnica usual da estaquia: duasgemas (estacas lenhosas e semi-lenhosase 10 cm de comprimento nas herbáceas),corte liso em bisel, na extremidade in-ferior e reto na superior segundoHartmann et al. (1990); desinfetadascom fungicida Benlate a 10%, envoltasem jornal úmido e plantadas, no dia se-guinte, em substrato composto por soloda região (areno-argiloso, pH 4,5, pe-neirado e desinfetado com brometo demetila) acondicionado em saco plástico(15x25cm). As embalagens com as es-tacas plantadas foram organizadas emcanteiro, com irrigação periódica, sobsombrite, inicialmente a 70% desombreamento e, após a brotação a 50%,no viveiro de mudas do InstitutoAmbiental do Paraná, no Município deMorretes, de agosto à dezembro de1997.

Os tratamentos foram submetidos aodelineamento de blocos casualizados(quatro repetições de 10 estacas por tra-tamento). Após 45 dias do plantio, asestacas foram avaliadas quanto à pre-cocidade, empregando-se os critérios:ocorrência ou não de brotação e medidado comprimento da brotação mais lon-ga. Aos 60 dias, as estacas foramreavaliadas quanto ao estabelecimentodas mudas geradas, utilizando-se as ca-racterísticas: número de estacas brota-das, medida do comprimento dabrotação mais longa (cm), presença elocalização de raízes adventícias e pesoda matéria seca da parte aérea e da raiz.Os resultados foram analisados atravésdos testes de Qui-Quadrado de Pearsone Comparações Múltiplas de Tukey(HDS), a 1% de probabilidade.

Na avaliação final considerou-setambém os resultados de testes comple-mentares, empregados em amostras de

estacas lenhosas, semi-lenhosas e her-báceas, observadas em laboratório soblupa para: a) detecção visual da presen-ça ou ausência de pontos meristemáticosindicativos de inicio de formação deraízes (raízes pré-formadas), através daobservação da base das estacas antes doplantio (Esaú, 1965); b) avaliação daconcentração de carbohidratos, atravésda intensidade de coloração (alta, mé-dia e baixa) obtida quando da imersãode amostras da porção basal dos dife-rentes tipos de estacas (40 de cada tipo)em lugol (iodeto de potássio a 0,2%),seguindo metodologia apresentada emHartmann et al. (1990), e c) avaliaçãoda presença ou ausência de substânciasfenólicas, através de observação visualda intensidade de coloração (alta, mé-dia e baixa) de cortes histológicos dabase de estacas submetidos à imersãoem solução aquosa de cloreto férrico à1%, seguindo metodologia apresentadaem Fadl (1979).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As estacas representativas do trata-mento semi lenhosa com folha foram asque, aos 45 dias, apresentaram melhorresultado quanto à precocidade face àocorrência de brotação (62,5%), diferen-ciando-se significativamente dos demaistratamentos (Qui-Quadrado de Pearson,onde: X2 = 80,035; df = 7; p = 0,0001)(Tabela 1). Este tratamento foi tambémo que apresentou os melhores resulta-dos relativos à qualidade de brotação(mudas produzidas = 50; tamanho mé-dio das brotações = 3,775cm; sd = 4,044;cv = 107,125; var = 16,3538, valor má-ximo = 17 cm; valor mínimo = 0,5 cm),sendo este significativamente diferentedos demais tratamentos (ANOVA com-parações múltiplas (HDS) de Tukey,onde: F = 21,10; df = 7; p = 0,000). Osdemais tratamentos não apresentaramdiferença significativa entre si (Tabela 1).

Aos 60 dias, também foi evidencia-da a associação direta entre brotação etratamento (onde: X2 = 120,37; df = 7; p= 0,0001), porém as proporções não fo-ram as mesmas para todos os tratamen-tos. Todos aumentaram seus valores debrotação, entretanto, novamente as es-tacas semi-lenhosas com folhas desta-caram-se dos demais tratamentos (75%),

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sendo a diferença observada estatistica-mente significativa.

Em relação ao comprimento dabrotação (cm) aos 60 dias, observa-seque houve diferença significativa entreas médias (F=21,95; df=7; p = 0,000)sendo que os tratamentos de melhor re-sultado foram semi lenhosa com folhae talão sem folha. A avaliação das mé-dias relativas ao peso seco da parte aé-rea também mostra uma relação diretaentre a eficiência de produção destescom os outros tratamentos utilizados(F=4,85; df=7; p = 0,016). O tratamen-to semi-lenhosa com folha destacou-sedos demais, à exceção de lenhosa semfolha cuja diferença de resultado não foisignificativa estatisticamente. Na ava-liação do peso seco das raízes não foidetectada diferença significativa relati-va aos diferentes tratamentos (F = 1,05;df = 7; p = 0,4255) (Tabela 1).

Antes do plantio somente obser-vou-se presença de raízes pré-formadasnas estacas semi-lenhosas e nas estacaslenhosas, coincidindo com o que foiapresentado por Greenwood (1987), se-gundo o qual as plantas apresentammudanças progressivas na capacidadede desenvolver gemas e raízes adventí-cias. O resultado obtido enquadra-se nopadrão apresentado por Davis et al.(1989), segundo o qual a quantidade deraízes pré-formadas decresce da basepara o topo do ramo. Para todas as esta-cas consideradas, constatou-se que, apóso plantio, as raízes desenvolveram-se apartir dos nós (gemas), dos entrenós e

da região de formação do calo, na basedas estacas.

A concentração de substânciasfenólicas não foi uma característica di-ferencial, como se supunha. SegundoDonoho (1962), há influência de dife-rentes concentrações de compostosfenólicos na promoção do enraizamento,uma vez que protegem a auxina da des-truição pela enzima indolacéticoacidooxidase. Para a espécie em questão, de-tectou-se a presença de substânciasfenólicas em todos os tipos de estacasutilizadas no ensaio, não registrando-sediferenças na intensidade de coloração.

Uma característica que auxiliou noesclarecimento dos resultados foi a va-riação da concentração de carbohidratosna base das estacas, uma vez que estafoi bastante representativa do grau dematuridade do ramo. Assim, as estacaslenhosas apresentaram alta concentra-ção de carbohidratos, as semi-lenhosasconcentração mediana e as herbáceasbaixa concentração. Segundo Altman &Wareing (1975), há sempre acúmulo decarbohidratos na base das estacas pron-tas para enraizar.

Além de brotar antes das demais, oque caracterizou a precocidade da esta-ca semi-lenhosa com folha, esta foi tam-bém a de maior qualidade. Seu cresci-mento foi mais rápido e constante, man-tendo esta diferença em relação aos de-mais tratamentos até o final do experi-mento, o que demonstrou a sua superio-ridade. Em segundo lugar, quanto aocomprimento da brotação (cm) aos 60

dias, destacou-se o tipo talão sem folha,facilitado provavelmente pela presençade raízes iniciais pré formadas, obser-vadas na base do tecido lenhoso.

As estacas semi-lenhosas com folhasbrotaram antes e com mais eficiênciaque as lenhosas, fato que pode ser devi-do à sua condição de maior juvenilidadeem relação às lenhosas. Estas apresen-taram raízes pré-formadas e maior re-serva de amido. Entretanto, a menor efi-ciência na rapidez de brotação, em rela-ção às semi-lenhosas deve-se provavel-mente à dificuldade das suas célulasretornarem à condição meristemática.No resultado surpreendente apresenta-do pelas estacas semi-lenhosas, prontaspara o plantio aos 45 dias, tem que serdestacado o benefício da presença dasfolhas, levando a superar o resultado daslenhosas e das herbáceas.

Discutindo este tema, Hartmann etal. (1990) salientam que partes jovensnão enraízam ou enraízam com dificul-dade. Ferri (1979) sugere que isto ocor-re devido à insuficiência de reservas ede substâncias promotoras de cresci-mento. Por outro lado, segundo Esaú(1965), as partes maduras do ramo nãoenraízam com facilidade, devido à difi-culdade para a desdiferenciação, restan-do às semi-lenhosas, teoricamente, amelhor condição para reagir prontamen-te ao processo da formação de mudas.

Comparando-se o resultado doenraizamento das semi-lenhosas com odas herbáceas, poderia se inferir que a

sacatsE 1)%(sodatorbsoudívidnI

adoidémotnemirpmoC)mc(agnolsiamoãçatorb

ocesosepodoidémrolaV)gm(

said54 said06 said54 said06 ZIAR ELUACFCP 05,73 57,86 a189,0 cb04,4 a526,0 ba773,0FSP 00,52 52,13 a651,0 dc018,0 a281,0 b542,0FCH 52,13 00,07 a399,0 cb684,4 a575,0 b282,0FSH 00,51 05,71 a391,0 d795,0 a011,0 b542,0FCLS 05,26 00,57 b577,3 a656,31 a021,0 a729,0FSLS 00,51 57,33 a61,1 cb703,4 a579,0 ba754,0FST 05,72 57,34 a80,1 b090,6 a072,0 ba036,0FSL 57,8 52,12 a23,0 dcb570,4 a572,0 a278,0

Tabela 1. Resultados obtidos no enraizamento de ramos (aos 45 e 60 dias após o plantio) na formação de mudas de guaco (Mikaniaglomerata Sprengel) por meio de estaquia. Morretes, UFPR, 1997.

1 = lenhosas sem folhas com talão (TSF) e sem talão (LSF); semi-lenhosas sem folhas (SLSF) e com folhas (SLCF); herbáceas sem folhas(HSF) e com folhas (HCF) e herbáceas do tipo ponteiro sem folhas (PSF) e com folhas (PCF).Valores seguidos de letras iguais em uma mesma coluna não apresentam diferença significativa entre si.

Efeito da maturidade dos ramos na formação de mudas de guaco por meio de estaquia.

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proximidade do sítio de auxinas (pre-sença das folhas) não foi suficiente parasuportar a condição de menor concen-tração de reservas (Ferri, 1979), resul-tando na condição de menor sucessopara a produção de mudas de guaco.

Conclusivamente pode-se dizer que,no caso do guaco, a maturidade do ramoinfluenciou a produção de mudas e queos ramos semi-lenhosos com folha fo-ram os ideais para o preparo das mudaspor estaquia, favorecendo a precocida-de e o seu estabelecimento.

Durante o transcorrer do ensaio fo-ram feitas algumas observações adicio-nais que acredita-se serem interessan-tes e complementarem os dados obtidos:1. Nos indivíduos selecionados na matapara a coleta de ramos foi detectada apresença de raízes adventícias. Estas,quando presentes, em torno de 4 a 9raízes com mais ou menos 10 centíme-tros de comprimento, situavam-se naporção semi-lenhosa e lenhosa dos ra-mos, nos espaços entre nós (gemas). Istopode ser considerado como umindicativo da possibilidade da propaga-ção vegetativa por mergulhia. 2. Durantea colheita e preparo das estacas semi-lenhosas e lenhosas, notou-se que a sim-ples determinação do comprimento emcentímetros, como recomendam algunsautores que tratam de formação de mu-das, não foi pertinente. Esta medida deveconsiderar um número mínimo de ge-mas por estaca. O espaço entre gemas éresultante do desenvolvimento da plan-ta e portanto, variável da base para oápice, impossibilitando um comprimen-to padrão para todos os tipos. 3. Quantoà necessidade, ou não, deenviveiramento na produção de mudasde guaco, expressa em Scheffer (1992),considerou-se que, por ser uma espécienativa da Floresta Atlântica, de bordosdas clareiras, haveria necessidade decontrole da luminosidade durante o pro-cesso de formação das mudas no vivei-ro, evitando-se o plantio direto. 4. Mes-mo sem o tratamento hormonal propos-to por Scheffer (1992) obteve-seenraizamento abundante e precoce nasestacas semi-lenhosas com folhas. Es-tas, aos 45 dias já apresentavam raízesdo lado de fora do recipiente, o que po-

deria ser considerado como indício deestarem prontas para o plantio no cam-po. 5. A planta matriz adulta foi a quepossibilitou a colheita de maior númerode estacas semi-lenhosas, o tipo queapresentou resposta imediata aoenraizamento. Esta informação parecevaliosa tendo em vista o hábito da sele-ção de plantas jovens para a coleta dematerial vegetativo dada a dificuldadede coleta de plantas adultas, que normal-mente apoiam-se na copa de árvores al-tas. 6. Para obtenção de 985 estacas, dasquais foram selecionadas as 640 empre-gadas neste ensaio, foram necessáriastrês plantas adultas. 7. Observou-se queas estacas herbáceas apresentaram evi-dências de estresse hídrico entre colheitae enviveiramento. Provavelmente neces-sitem de rehidratação antes do plantio,como sugerem Scheffer et al. (1997).Por este motivo, não se recomenda estetipo de estaca para a produção intensivade mudas.

AGRADECIMENTOS

As autoras agradecem ao NIMADpela possibilidade de realizar este tra-balho com apoio financeiro do PADCT-CIAMB; ao Programa RHAE pela bol-sa de pesquisador visitante cedida à Dra.Maria Elisabete Doni; ao Dr. LuizGonzaga Calefe (Dep. Estatística/UFPR) pela orientação na análise esta-tística; ao Dr. James Roper pelo auxiliona elaboração do abstract; ao InstitutoAmbiental do Paraná por permitir o usode suas instalações de viveiro na Esta-ção Experimental do IAPAR emMorretes; à Sociedade de Pesquisa emVida Selvagem, por permitir a coleta domaterial vegetal utilizado no ensaio nasua reserva de Antonina/ PR.

LITERATURA CITADA

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Efeito da maturidade dos ramos na formação de mudas de guaco por meio de estaquia.