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Pais Adotivos: Percepção sobre o Processo de Adoção Resumo: A adoção é a mais importante forma de colocação em lar substituto, tendo sua origem cravada nos mais remotos tempos. Porém, apesar da reconhecida importância, tal instituto tem sido visto no Brasil de uma forma limitada, superficial e preconceituosa, fruto da desinformação popular e dos próprios meios de comunicação de massa. Foi nesse contexto que aflorou a presente pesquisa, voltada a conhecer o sentimento, a impressão, a própria vivência de pais adotivos em Palmas-TO. Foram entrevistados 11 (onze) casais que fazem parte do grupo de pais adotivos do Juizado da Infância e Juventude do Município de Palmas, no período de 1997 a 2007, e os resultados revelaram a superação de fantasias e dogmas de existência histórica na sociedade e mesmo entre pais adotivos, como os relativos à carga hereditária, revelação da verdade sobre a adoção e forma de criação e educação do filho adotivo, apontando, portanto, para uma visão menos preconceituosa do profundo significado humano e social da experiência adotiva. O estudo também permitiu verificar a necessidade de se continuar evoluindo e superando os entraves que ainda emperram e dificultam a conclusão do processo de adoção, inviabilizando que tal experiência se aproxime do seu ideal e da sua real finalidade. Palavra Chave: Percepção, pais adotivos.

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Pais Adotivos: Percepção sobre o Processo de Adoção

Resumo: A adoção é a mais importante forma de colocação em lar substituto, tendo sua

origem cravada nos mais remotos tempos. Porém, apesar da reconhecida importância, tal

instituto tem sido visto no Brasil de uma forma limitada, superficial e preconceituosa, fruto

da desinformação popular e dos próprios meios de comunicação de massa. Foi nesse

contexto que aflorou a presente pesquisa, voltada a conhecer o sentimento, a impressão, a

própria vivência de pais adotivos em Palmas-TO. Foram entrevistados 11 (onze) casais que

fazem parte do grupo de pais adotivos do Juizado da Infância e Juventude do Município de

Palmas, no período de 1997 a 2007, e os resultados revelaram a superação de fantasias e

dogmas de existência histórica na sociedade e mesmo entre pais adotivos, como os relativos

à carga hereditária, revelação da verdade sobre a adoção e forma de criação e educação do

filho adotivo, apontando, portanto, para uma visão menos preconceituosa do profundo

significado humano e social da experiência adotiva. O estudo também permitiu verificar a

necessidade de se continuar evoluindo e superando os entraves que ainda emperram e

dificultam a conclusão do processo de adoção, inviabilizando que tal experiência se

aproxime do seu ideal e da sua real finalidade.

Palavra Chave: Percepção, pais adotivos.

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Pais Adotivos: Percepção sobre o Processo de Adoção

Fernanda Maria dos Santos Abreu

Raquel de Moraes Sampaio Araújo

Mestre em Saúde Pública

Professora do curso de psicologia do CEULP/ULBRA – Centro Universitário Luterano de

Palmas.

Coordenadora de Pós-Graduação em Saúde da Secretaria de Estado da Saúde

ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA

Palmas-TO

Email: [email protected]

Professoras Orientadoras: Bárbara Khistine A. Moura C. Camargo.

Juliana Pinto Gorgozinho.

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1. INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA:

A prática da adoção é antiga e várias são as referências à adoção de crianças e bebês ao

longo da história da humanidade. Os escritos bíblicos fazem referência à prática da adoção,

através de algumas passagens, como a conhecida história de Moisés. Aproximadamente

1.250 a.C, a mãe de um pequeno hebreu decidiu colocá-lo dentro de um cesto de vime e

deixá-lo à beira do Rio Nilo, esperando que se salvasse das ordens do Faraó que determinou

afogamento de todos os meninos israelitas que nascessem. Foi encontrado pela filha do

Faraó, que ordenara a matança, decidindo criar o bebê como seu próprio filho (Gen.: 25,

12-6).

Aliás, o próprio Código de Hamurabi (1.686 a.C.), sexto rei da primeira dinastia da

Babilônia (1793-1759 a.C.), atualmente exposto no museu do Louvre, em Paris, e que é

considerado o primeiro texto jurídico da civilização, traz referência às adoções. Dentre os

282 dispositivos de lei que contempla, os artigos 185 e 193 referem-se exclusivamente a

regulamentação de casos de adoção. A leitura de tais artigos revela que já àquela época a

preocupação era garantir a indissolubilidade das adoções ou em casos aparentemente mal

sucedidos, determinar sua anulação.

Na antiguidade greco-romana, a adoção esteve profundamente vinculada às crenças

religiosas. Segundo o historiador francês Fustel de Coulanges (1941), apud, Weber, Pais e

Filhos por Adoção no Brasil (2001), as famílias gregas e romanas foram constituídas com

fundamento em uma religião primitiva que estabeleceu o casamento, fundou a autoridade

paterna, fixou os filhos de parentesco e consagrou o direito de propriedade e sucessão. O

dever de perpetuar o culto doméstico dentro das crenças religiosas desses povos demarcou

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entre os antigos o direito de adoção, recurso utilizado principalmente por aqueles que não

possuíam descendência natural, uma vez que o sentido da adoção era o de evitar a extinção

do culto em determinada família.

Na Idade Média a adoção perdeu força em face ao desinteresse da igreja, que via em tal

prática uma forma de se legalizar filhos tidos fora do casamento, voltando a se reerguer,

porém, com o advento da Revolução Francesa, sendo certo que o abandono e a adoção

sempre estiveram presentes na história da humanidade.

Nos dias atuais, apesar de existirem outras formas de colocação em lar substituto, como a

guarda (forma mais simples de colocação em lar substituto, e acontece nos casos de

separação de fato ou de direito dos pais, ou quando a criança ou adolescente se encontra em

situação irregular, como abandono, maus tratos etc), a tutela (instituto de nítido caráter

assistencial e que visa substituir o pátrio poder em caso de falecimento dos pais, suspensão

ou destituição do poder paternal) e o próprio apadrinhamento, a adoção é aos olhos de

muitos, inclusive do Comitê de Especialistas da Organização Mundial de Saúde (OMS), o

mais adequado e propício modo de reestruturação familiar para as inúmeras crianças e

adolescentes privados hoje do convívio familiar, quando superada, evidentemente, a

possibilidade de permanência no seio da família biológica, já que esta deve sempre ter

prevalência e prioridade sobre as demais.

É desolador o atual quadro vivido por um grande número de crianças e adolescentes em

nosso país. Como se sabe inúmeras delas vivem institucionalizadas, passando quase toda a

infância e adolescência no aguardo de um lar substituto, o que tem chamado a atenção de

autoridades e especialistas para minimizar tal situação.

Diante da preocupação, em 2002 criou-se a Subsecretaria de Promoção dos Direitos da

Criança e do Adolescente, dentro da Secretaria Especial de Direitos Humanos ligada à

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Presidência da República, com o objetivo de dar efetividade ao Estatuto da Criança e do

Adolescente (ECA), garantindo à criança e ao adolescente o direito de ter uma família, o

chamado direito à convivência familiar e comunitária, mudando-se, assim, o quadro da

adoção no país.

Em 2004, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva instituiu, por Decreto, o Plano Nacional de

Convivência Familiar e Comunitária, criando uma Comissão Intersetorial voltada a sua

implementação, coordenada pela Secretaria Especial de Direitos Humanos, e juntamente

com os Ministérios da Educação, Saúde, UNICEF e outras instituições passou-se a

desenvolver políticas públicas direcionadas à família biológica, aos abrigos e, por último, à

família adotiva.

Focado na garantia do direito à convivência familiar e comunitária, tendo presente que a

miserabilidade é fator de desagregação familiar e que determina o afastamento da criança

de seus pais biológicos, o referido Plano tem como ação prioritária a reforma do Sistema

Único de Assistência Social (SUAS), através da criação do Centro de Assistência Social

voltado ao atendimento às famílias necessitadas, bem como a implementação de programas

de transferência de renda, como o Bolsa Família e outros, de sorte a minimizar a pobreza e

a miséria, garantindo-se assim a estruturação e a unidade familiar, mantendo os filhos com

os pais biológicos.

Outra ação prioritária consiste no reordenamento dos abrigos, visto que nem todos são

financiados pelo Governo Federal, existindo uma grande parte deles sustentada pela

população, geralmente por instituições religiosas ou filantrópicas, criando-se uma cultura

equivocada de que no abrigo a criança estará mais bem estruturada do que com a família

biológica, porque esta é pobre e não tem condições de criá-la. O Estado e mesmo as

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entidades não devem substituir a família, e o reordenamento dos abrigos precisa se dar

dentro dessa filosofia.

Por fim, a regulamentação da adoção igualmente firma-se como importante ação do Plano

Nacional de Convivência Familiar e Comunitária, encontrando-se já no Congresso

Nacional um Projeto de Lei (PL n° 1756/2003), de autoria do Deputado João Marques, que

está em discussão junto a outros que procuram modificar a legislação, de sorte a criar, por

exemplo, um Cadastro Nacional de Adoção, hoje inexistente no país, tornando obrigatório

sua alimentação pelos Tribunais de Justiça dos Estados, o que permitirá saber quantas

crianças existem em condições de ser adotadas e também quantas são as famílias

pretendentes, possibilitando assim que um casal de um determinado Estado se candidate à

adoção em qualquer outra Unidade da Federação, inclusive diminuindo o número de

crianças que são levadas para o exterior, o que, aliás, é outro problema a se considerar,

pois, além da ruptura familiar, neste caso ocorre também a ruptura cultural, tornado-se mais

complexa a solução dos conflitos originados.

Sem embargo do relevo e importância que se tem dado ao histórico instituto da adoção em

nosso país, sobretudo pelas pessoas e autoridades públicas envolvidas direta ou

indiretamente com o problema da desintegração familiar e seus consectários, pouco se tem

produzido aqui em termos de dados técnicos e científicos, o que tem permitido ao

imaginário popular criar fantasias e mitos acerca da adoção, sobretudo em razão da

desinformação também dos meios de comunicação, sendo esta, assim, tratada

sistematicamente de forma preconceituosa.

Vários são, por exemplo, os mitos criados em torno da adaptação de filhos adotivos,

atribuindo-se todos os desacertos e desencontros à perda inicial dos pais biológicos, o que

reputam irreparável (trauma); aos caracteres hereditários trazidos pelo adotado, quase

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sempre taxados de problemáticos e ingratos, quando na verdade vários problemas

experimentados têm como causa a própria criação, a relação familiar, a educação, a atenção

e o carinho dispensados ao adotado, e muitas vezes a inadequada e tardia revelação sobre a

adoção. A relação familiar e a adaptação de filhos adotivos são complexas e variáveis, não

admitindo, portanto, generalizações. Cada caso é um caso e envolve uma variedade de

fatores que se interligam, não podendo ser vistos isoladamente.

Aliás, infelizmente o preconceito acompanha a adoção desde a sua criação pelos romanos,

quando foi instituída para garantir o poder familiar através da escolha de sucessores, sem

qualquer preocupação com a efetiva proteção da criança, adotando-se, aliás, na maioria das

vezes, pessoas adultas. Na Idade Média, fortemente influenciada pelo cristianismo, a

própria Igreja tinha reservas quanto ao ato de adotar, por entender tratar-se de uma possível

forma de se regularizar filhos adulterinos. Já na Era Moderna, nem mesmo Napoleão, que

buscou legalizar a adoção, afastou-se do histórico preconceito, ao defini-la como “uma

imitação, através da qual a sociedade quer plagiar a natureza”, dando assim especial

relevo aos “laços de sangue”, o que lamentavelmente acompanhou a sociedade até os dias

atuais.

É certo que avanços se tem experimentado nesta área, inclusive no aspecto legislativo. No

Brasil, por exemplo, o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) retrata essa evolução, mas

na verdade continuam impregnados no consciente e inconsciente das pessoas os dogmas

reveladores dessa supervaloração da filiação natural em detrimento da adotiva, o que se

verifica não apenas a partir da opinião e do sentimento da população, da sociedade, mais

precisamente das pessoas que se relacionam com as famílias adotivas, mas também a partir

do comportamento dos próprios pais adotivos e de outros familiares, os quais, mesmo

inconscientemente, engrossam os números do preconceito ao omitirem da sociedade e, por

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vezes, dos adotados sua origem e sua história, sob o argumento de protegê-los e proteger a

si próprios.

É preciso desfazer os dogmas, vencer os preconceitos e superar as adversidades que

permeiam a adoção, o que só se mostra possível através da utilização da “verdade”, que, no

dizer de Weber (2006a), em Aspectos Psicológicos da Adoção, p. 25, “é a primeira ‘regra

ética’ de uma família adotiva”. Enfrentar a verdade pressupõe assumir a adoção e aceita-la

em todos os seus aspectos, bons e maus, favoráveis e desfavoráveis. Noutras palavras, é

preciso que a verdade sobre a adoção seja de logo conhecida pelo filho adotivo e, aliás,

pelos demais membros da família e amigos mais próximos, pois só assim se construirá um

ambiente propício à convivência e relação familiar desejada, sem maiores traumas e

sofrimentos.

Nesse contexto é que se apresenta o presente trabalho, voltado a identificar o sentimento, a

opinião, a impressão, a percepção de um grupo de pais adotivos na cidade de Palmas,

Estado do Tocantins, no período de 1997 a 2007, em relação ao processo de adoção, visto

de uma forma mais ampla, contemplando várias nuances da relação familiar.

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2. PROBLEMA E OBJETIVOS:

No Brasil, a adoção tornou-se uma preocupação nacional, uma vez que o índice de crianças

e adolescentes ingressando e se institucionalizando tem aumentado a cada ano. Os motivos

que levam as famílias a entregarem seus filhos ao aguardo de famílias adotivas têm atraído

à atenção dos governantes, fazendo-os perceber que a questão é complexa e de alto relevo

social, inclusive com reflexo no futuro do país.

Segundo constatou pesquisa realizada pela Secretaria de Direitos Humanos ligada à

Presidência da República, existem hoje no país cerca de vinte (20) mil crianças localizadas

somente nos abrigos que recebem recurso do Governo Federal, mas estima-se que esse

número equivale a apenas um sexto (1/6) do total de crianças que se encontram hoje

aguardando doação nos abrigos, ou seja, aproximadamente cento e vinte (120) mil crianças

encontram-se nessa situação, muitas das quais sem apresentar um perfil desejado pelos pais

adotantes (crianças com idade mais avançadas e adolescentes portadores de necessidades

especiais ou com o vírus HIV, crianças afrodescententes, crianças que têm um grupo de

irmãos), o que faz com que essas crianças terminem permanecendo toda uma vida nos

abrigos, sendo privadas do direito a uma família, resultando não só na perda da infância

como também do referencial familiar, uma vez que essas crianças já vêm de uma situação

de ruptura de vínculos.

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2.2.1.Objetivo Geral

• Conhecer a percepção, sobre o processo de adoção de um grupo de pais adotivos na

cidade de Palmas estado do Tocantins no período de 1997 a 2007.

2.2.2. Objetivos Específicos

• Conhecer os motivos que levaram essa família ao processo de adoção;

• Caracterizar os pais adotivos (profissão, nível escolar), dentre outros;

• Conhecer suas fantasias e desejos em relação ao processo de adoção;

• Identificar se houve um planejamento para a adoção;

• Compreender como se dá para esses pais o significado de educar e criar um filho

adotivo;

• Descobrir o que os pais adotivos compreendem sobre a complexidade das relações

humanas entre pais e filhos adotivos;

• Identificar a percepção que esses pais têm sobre a influência da carga hereditária e

do meio social no comportamento do filho adotivo;

• Identificar as maiores dificuldades que ocorrem na relação entre pais e filhos

adotivos;

• Conhecer se os pais adotivos têm padrões pré-estabelecidos para a criança a ser

adotada.

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3. PROCEDIMENTO:

Tendo como propósito levantar dados informativos sobre a convivência entre pais e filhos

adotivos, foi realizada pesquisa qualitativa através de entrevistas semi-estruturadas com 11

(onze) famílias adotivas, de crianças ou adolescentes regularizados ou em processo de

regularização pelo Juizado da Infância e Juventude do Município de Palmas, Estado do

Tocantins, no período de 1997 a 2007,

Foram escolhidas tais famílias em razão de terem procurado, através do Juizado da Infância

e Juventude, obter legalmente um filho adotivo ou regularizar, de acordo com as normas

legais estabelecidas, situações informais eventualmente existentes relativas à adoção.

As entrevistas aconteceram no Juizado da Infância e Juventude e nos locais de trabalho dos

entrevistados, onde o entrevistador se fez presente, tendo sido todas as amostras

aproveitadas em razão de se encaixarem no padrão de inclusão estabelecido.

Os dados foram analisados através da Triangulação Metodológica que abrange um estudo

qualitativo dos depoimentos prestados pelas famílias adotivas, vistos comparativamente

com as fundamentações teóricas de estudiosos do assunto, levando-se em conta, ainda, a

opinião da pesquisadora.

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4. RESULTADOS E DISCUSSÃO:

A pesquisa nos permitiu levantar dados informativos importantes não apenas na

identificação do perfil do público alvo, vale dizer, pais adotivos e crianças ou adolescentes

adotados, membros da chamada família substituta, mas acima de tudo na revelação dos

meandros dessa relação, da convivência familiar existente entre os mesmos, de modo a

compreender qual o sentimento ou percepção dos pais adotivos quanto à adoção, ou seja,

como esta, nos seus mais variados aspectos, é vista por aqueles.

Para melhor entendermos o cenário dos pesquisados, os mesmos apresentam a seguinte

caracterização: predominância (75%) de pais adotivos com idade entre 30 e 45 anos,

mantendo-se o mesmo percentual para os pais com o 3° grau de escolaridade, com renda

mensal variando entre 01 (um) e 26 (vinte e seis) salários mínimos, 64% dos quais

encontrando-se na faixa até 13 salários, repetindo-se o mesmo percentual (64%) para os

adotantes originários de outros estados da Federação e não possuidores de filhos biológicos.

Registraram-se, ainda, 91% de adotantes casados.

Dentre os adotados, verificou-se a prevalência de crianças ou adolescentes do sexo

feminino (75%), com idade atual variando até 13 anos, quase a totalidade delas (91%)

contando com até 01 (um) ano de idade ao tempo da adoção e entrega aos pais adotivos,

sendo 64% com idade inferior a 06 (seis) meses. Tais dados se devem ao fato de que 64%

dos adotantes ou pais adotivos já tinham, antes da adoção, um perfil definido para o

adotando, ou seja, a pessoa a ser adotada, qual seja: criança recém-nascida ou com idade

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mínima possível, do sexo feminino e cor correspondente à dos pais adotivos ou casal

adotante.

Indagados sobre a motivação, ou seja, o que os levaram a idealizar e decidir pela adoção,

35% dos pais adotivos se viram motivados pelo desejo de ajudar a criança que, de uma

forma ou de outra, encontrava-se em situação irregular, enquanto 10% registraram ter

buscado na adoção uma forma de resolver seu problema de solidão, através da companhia

de uma criança ou adolescente. Por outro lado, 55% dos entrevistados afirmaram que a

impossibilidade de ter filho biológico e a necessidade de satisfazer esse desejo natural de

todo casal foi o que efetivamente determinou a adoção, como se revela nas falas a seguir:

(...) “Tenho vontade de ter filhos, mas tenho limitações a gestação”.

(...) “Decidimos adotar por conta do desejo de termos um filho”.

É importante destacar que, embora 27% tenham planejado a adoção e vivido a expectativa

da espera, 73% dos pais adotivos entrevistados não fizeram um planejamento para a

adoção, ou seja, para receberem a criança ou adolescente, já que, ao contrário de se

submeterem a um processo regular de adoção no Juizado da Infância e Juventude, o que

permitiria um melhor planejamento familiar, efetivaram a adoção através do modelo “à

brasileira”, ou seja, recebendo o adotando diretamente dos pais biológicos ou de terceiros, o

que geralmente implica na materialização repentina da adoção. Aliás, é preciso salientar

que apenas 9% dos pais adotivos entrevistados efetivaram a adoção junto ao Juizado.

Registre-se, por outro lado, que algumas adoções se materializaram por acaso, ou seja, sem

qualquer idealização ou planejamento dos pais adotivos, os quais só se viram adotando

alguém e efetivamente o fizeram após conhecer e conviver com a criança ou adolescente,

muitas vezes deixado provisoriamente aos cuidados daqueles, por vezes até pelos próprios

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pais biológicos, situação que acabou se tornando definitiva por vários motivos, inclusive

pelo não retorno e abandono dos pais que ali o deixaram.

Aspecto interessante é o que envolve a relação e a convivência familiar entre pais e filhos

adotivos, vistos nas suas mais variadas particularidades. Por exemplo, 100% dos

entrevistados afirmaram não haver diferença na criação e educação de filhos adotados e

biológicos, destacando que em ambos os casos a relação deve ser marcada pelo amor,

carinho, amizade, compreensão, dedicação e respeito, sendo necessário não apenas

reconhecer os direitos da criança ou adolescente, mas apontar-lhe os deveres, sem esquecer

da necessidade de se impor limites, conforme se extrai da seguinte manifestação dada:

(...) “Terá as mesmas oportunidades e educação que teria se estivesse

nascido de mim. Não será colocado em uma redoma, não será castigado ou

poupado quando for necessário”.

No que tange à verdade na relação, todos os entrevistados (100%) apontaram a sinceridade

e a franqueza como sendo indispensáveis ao sucesso da adoção, destacando que sem tais

ingredientes não se pode ter, entre pais e filhos adotivos, uma relação harmônica duradoura,

devendo-se trabalhar a história de vida desses filhos de forma autêntica e verdadeira, mas

também com naturalidade, o que equivale dizer que as revelações sobre a condição de

adotado, seu passado e pais biológicos devem se dar dentro de um contexto favorável e no

momento certo, observada a idade e capacidade de compreensão do adotado. Assim, 55%

revelaram já ter informado ao filho sobre sua condição de adotado, enquanto os demais

(45%) aguardam o momento próprio para tal, embora 18% destes tenha receio de que a

revelação possa resultar na rejeição do adotado pela sociedade.

Discorrendo sobre a formação do filho adotivo e os fatores que podem ter reflexo nesse

processo, 73% dos entrevistados disseram não haver qualquer influência da carga

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hereditária na formação da personalidade da criança ou adolescente, entendendo haver

interferência tão somente na definição de traços físicos. Por outro lado, 100% apontaram o

meio social, a convivência com este e com a família como sendo o fator principal na

definição do caráter, da personalidade e do comportamento do filho adotivo. Referindo-se à

carga genética e hereditária, assim pontuaram:

(...) “Posso dizer que considero haver influência fisicamente; quanto à

formação propriamente dita da criança, só dependerá da sua convivência

conosco e com os demais que estão por perto educando”.

(...) “É compreendido que a carga hereditária existe, mas que a convivência é

fundamental para a formação da sua personalidade”.

Por fim, questionados sobre quais seriam as maiores dificuldades encontradas na relação

pais e filhos adotivos, 73% afirmaram não haver dificuldades especiais ou particulares

nessa relação, destacando que as dificuldades existentes são as mesmas havidas na relação

entre pais e filhos biológicos. A adoção em si, segundo ressaltaram, não pressupõe a

existência de dificuldades numa relação entre pais e filhos. Entre os que pensam diferente

(27%), há aqueles que apontam a revelação ao filho, de sua condição de adotado, como

sendo a maior dificuldade, o momento de maior expectativa e preocupação da relação (9%),

existindo ainda os pais adotivos que vêem na adaptação a maior dificuldade, o fator de

maior complexidade, tanto a adaptação do adotado à nova família (9%), como a

adaptação/aceitação dos familiares dos pais adotivos em relação àquele (9%). Vejamos, a

respeito, alguns pronunciamentos:

(...) “Não ocorre nenhuma dificuldade na relação, somos uma família

comunicativa”.

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(...) “Em relação aos pais e filhos, nenhuma dificuldade. Com a sociedade,

sim, há dificuldades porque o preconceito e a maldade existem”.

(...) “A maior dificuldade foi a de revelar a verdade da sua vida. Hoje já é

passado, a relação é tranqüila, com muito amor, e ela quando fala da sua

família para alguém diz que é muito boa, diz ser algo de bom, antes tinha

algo escuro na sua vida”.

(...) “A principal dificuldade foi a adaptação da criança ao seu novo lar, com

mudança de rotina, alimentação. Todas já foram superadas e hoje ela está

totalmente adaptada e inserida em nossa casa”.

Ao analisar a caracterização da demanda, foi visto que embora não haja um perfil definido

para os adotantes, a grande maioria deles se encontra entre as pessoas com idade média de

40 anos, casadas, nível superior de escolaridade, razoável situação econômica e, sobretudo,

que não possuem filhos biológicos. Embora não faça referência ao aspecto da escolaridade,

CAMARGO (2006), citando pesquisa realizada por WEBER (1996) sobre a cultura da

adoção atuante na sociedade brasileira, confirma a situação acima ao apontar uma

prevalência no que se refere a pais adotivos casados e sem filhos naturais, pertencentes à

classe social de melhores condições econômicas e na faixa etária nominal de 40 a 55 anos.

No que se refere especificamente à prevalência de casais sem filhos biológicos, tal se

explica pelo fato de que, conforme afirma LEVINZON (2005), um dos principais fatores

motivadores da adoção é a verificação da esterilidade e a impossibilidade do casal adotivo

de ter filhos biológicos, tanto que na presente pesquisa se verificou um índice de 65% de

casais que adotaram em virtude de tal motivação, o que acaba por revelar que grande parte

dos adotantes ou pais adotivos, apesar de reflexamente atender aos interesses do adotado,

na medida em que lhe possibilita ter um lar e uma família substituta, o que realmente

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buscam é satisfazer seus próprios interesses, solucionando carências e desejos, embora

existam aqueles que diretamente desejam ajudar a criança que, de uma forma ou de outra,

encontrava-se em situação irregular.

No que se refere ao perfil do adotado, pode-se concluir que as adoções recaem mais sobre

crianças do sexo feminino e recém-nascidos ou de menor idade possível. Segundo

HAMAD (2002), as meninas são consideradas consciente ou inconscientemente “de mais

fácil criação” pelos pais adotivos, enquanto LEVINZON (2005) destaca que o ideal é que a

adoção recaia sobre crianças com a idade mais baixa possível, evitando-se a vivência de

abandono e sofrimento que quase sempre acompanham o adotando institucionalizado e sem

lar. Para CAMARGO (2006), referindo-se a pesquisa de WEBER (1996), há uma

preferência por bebês com até 3 meses de idade e do sexo feminino, com estado de saúde

saudável e cor de pele clara. Corroborando esse entendimento, a presente pesquisa revelou

ainda que 64% dos adotantes ou pais adotivos já tinham, antes da adoção, um perfil

definido para o adotando, ou seja, a pessoa a ser adotada, qual seja: criança recém-nascida

ou com idade mínima possível, do sexo feminino e cor correspondente à dos pais adotivos

ou casal adotante, como caracterizado na fala abaixo:

(...) “Sim, havia. Cor clara, do sexo feminino, recém-nascido e de outro

estado”.

Constatação preocupante é a que revela que quase a totalidade das adoções se deu “à

brasileira” (91%), ou seja, sem a finalização do processo de homologação junto ao Juizado

da Infância e Juventude, o que significa dizer que existem entraves que acabam por

determinar a indesejada demora na finalização do processo de adoção, fazendo com que os

adotantes ou pais adotivos busquem outras alternativas que possibilitem uma maior

agilidade na materialização da esperada adoção, o que acaba por impedi-los de planejar a

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adoção, preparando-se adequadamente para receber a criança ou adolescente. Tal

constatação sintetiza-se nas falas a seguir:

(...) “A demora na finalização do processo muitas vezes faz com que

interessados não procurem crianças nos juizados, peguem quando surge

oportunidade”.

(...) “A criança foi oferecida por uma amiga antes do juizado chamar”.

PAIVA (2004) pontua que: “Há pretendentes que procuram o Judiciário para solicitar a

adoção de uma criança ou de um bebê específicos; em geral, acompanhados e com a

anuência e manifestação dos pais biológicos. Nessas adoções ‘prontas’, por vezes os

interessados já convivem com a criança há algum tempo e apenas pretendem legalizar a

condição existente”. Para o citado autor, tal situação é chamada “adoção intuitu personae”.

O resultado da pesquisa acompanha o pensamento doutrinário também no que se refere à

relação ente pais e filhos adotivos, a convivência familiar e os fatores que influenciam na

criação e formação do filho adotivo. Segundo entendem os pais entrevistados (100%), a

sinceridade e a franqueza devem permear a relação, não devendo haver ocultações ou

mentiras sobretudo em relação à condição de adotado da criança ou adolescente e sua

história de vida. Vejamos algumas falas:

(...) “A verdade foi trabalhada desde o início, com informações à medida da

sua compreensão”.

(...) “Fomos contando a verdade dentro da palavra de Deus, para que ela não

criasse raízes de amargura e revolta da mãe biológica”.

LEVINZON (2005) destaca que “é senso comum entre os estudiosos e profissionais da

adoção de que é imprescindível que a criança tenha acesso às informações sobre sua

origem”, ressaltando que “ter revelado um fato que está marcado inconscientemente na

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criança ajuda-a a desfazer a confusão entre o que sente e aquilo que sabe”. Para WEBER

(2006), “a primeira ‘regra ética’ de uma família adotiva é a verdade. Todo ser humano tem

direito à sua identidade e conhecer as suas raízes faz parte deste direito. O filho adotivo

deve saber, ‘desde sempre’ desta sua condição”. Portando, parece-nos claro e indiscutível

que esta relação deve ser aberta, clara e sem subterfúgios, admitindo com todas as letras a

adoção e a verdadeira identidade do adotado, observando-se, evidentemente, o

desenvolvimento, a capacidade de discernimento da criança.

O relacionamento, a convivência social e familiar revelam-se, para 100% dos entrevistados,

os maiores definidores da personalidade e do caráter da criança adotada, influindo

diretamente na sua formação, enquanto 73% entendem não haver nenhuma influência da

carga hereditária nesse particular, tendo relevo apenas na definição de traços físicos. Para

FERREIRA (1988), pode-se herdar traços físicos, temperamentos e até doenças, mas os

valores que passam a fazer parte de cada pessoa não se herda, como não se herda o modo

de pensar e agir. Parece-nos, assim, que, embora deva se ter presente a questão da

hereditariedade como um fator de preocupação de alguns pais adotivos, o que efetivamente

influencia na formação da personalidade da criança é a vivência social, a relação familiar,

os valores que lhe são passados ao longo de sua existência, como revelam as falas abaixo

transcritas:

(...) “Não achamos que a carga hereditária de nossa filha seja um problema

em nosso relacionamento com ela, o meio social com certeza”.

(...) “Fisicamente sim, mas o que faz a formação da criança é a convivência”.

(...) “É compreendido que a carga hereditária existe, mas que a convivência é

fundamental para a formação da sua personalidade”.

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Por fim, os dados coletados apontam que 73% entendem não haver dificuldades especiais

ou particulares na relação entre pais e filhos adotivos, o que encontra respaldo na opinião

de autores envolvidos com o tema. LEVINZON (2005) afirma que, embora seja comum

escutar na vida cotidiana informações que apontem que os filhos adotivos dão mais

trabalho ou sempre dão problema, tal pensamento não encontra respaldo em trabalhos

científicos. Há autores, porém, segundo o mesmo LIVINZON (2005), que apontam os

danos que a adoção provoca ao desenvolvimento da criança, e acreditam que ela tem uma

tendência maior do que outras a apresentar problemas psicológicos ou de inadaptação

social, escolar e familiar (NICKMAN, 1985 e WIEDER, 1977). Ao meu sentir, embora

afirmem não haver dificuldades específicas na relação entre pais e filhos adotivos, é preciso

reconhecer que o próprio fato de se ter que revelar à criança a sua condição de adotada,

enfrentando esta realidade num contexto social de preconceito em relação à doação, revela

a existência de dificuldades e particularidades próprias desta relação. Essa negação das

dificuldades parece ter relação com um processo de idealização para com essa nova

formação familiar, onde é projetada na criança toda a fantasias de reconstrução familiar,

projeção essa que pode ser extremamente maléfica para a relação.

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5. CONCLUSÃO:

Os resultados alcançados no presente trabalho se mostraram de um modo geral satisfatórios

e, vistos comparativamente com os ensinamentos de estudiosos envolvidos com o tema

proposto, nos permitem concluir, dentro da proposta inicialmente apresentada, que, embora

persistam alguns dogmas e mitos em relação à adoção, avanços significativos se tem

alcançado, e tal se revela pelo próprio pensamento dos pais adotivos em relação ao tema.

É que, contrariando mitos existentes em relação, por exemplo, à carga genética, vista como

fator primordial na formação da personalidade da criança, os entrevistados foram unânimes

em refutar tal entendimento, destacando ser a relação social, a convivência familiar o que

efetivamente determina o desenvolvimento psicosocial do ser humano.

De igual modo, sendo questionados sobre como se deve trabalhar a verdade na relação com

os filhos adotivos, os pais foram igualmente unânimes em destacar que a sinceridade e a

franqueza são indispensáveis para o sucesso da adoção, devendo-se ter como prioridade a

revelação ao filho de sua condição de adotado, sem se esquecer de outras informações

sobre sua história, igualmente importantes para a formação de sua identidade, o que

também revela uma visão isenta de preconceito em relação ao tema.

Em que pese a evolução verificada na percepção dos pais adotivos em relação à adoção, é

preciso reconhecer a necessidade de se evoluir ainda mais, de modo a fazer com que o

apontado instituto possa atingir cada vez mais a sua finalidade, propiciando dias melhores

às inúmeras crianças e adolescentes hoje institucionalizados, revelando-se indispensável,

neste particular, que as instituições envolvidas na formalização do processo de adoção

(homologação) se aprimorem, de modo a afastar os entraves que hoje impedem uma maior

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agilidade na efetivação da adoção, permitindo que as inúmeras crianças institucionalizadas

e que aguardam a colocação em lares substitutos tenham suas situações resolvidas.

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6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BORGUI, H. A nova adoção no Direito Civil Brasileiro. Revista dos Tribunais, 661, 242-246, 1990.

CAMARGO, Mário Lázaro. Adoção Tardia: Mitos, Medos e Expectativas. Bauru: Edusc, 2006.

ELDRIDGE, Sherrie. Vinte coisas que filhos adotivos gostariam que seus pais adotivos soubessem. São Paulo: Globo, 2004.

ECA. Estatuto da Criança e do Adolescente / Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Ministério da Educação, Assessoria de Comunicação Social – Brasília: MEC, ACS, 2005.

FERREIRA, M.C. Como se vive la adopción. Buenos Aires: Corregidor, 1988.

HAMAD, Nazir. A criança adotiva e suas famílias. Rio de Janeiro: Campanha de Freud, 2002.

LEVINZON, Gina Khafif. Adoção. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2005.

PAIVA, Leila Dutra de. Adoção: significados e possibilidades. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004.

REIS, Alexandre. 2006. Disponível em www.painelbrasil.tv/jornal/06_03_14.html-22k-.

WEBER, Lídia Natalia Dobrianskyj. Pais e Filhos por Adoção no Brasil, “Características, Expectativas e Sentimentos”. Curitiba: Jaruá, 2006a.

WEBER, Lídia Natalia Dobrianskyj. Aspectos Psicológicos da Adoção. Curitiba: Jaruá, 2006b.

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PEQUENO MEMORIAL NO QUAL O AUTOR DISCORRERÁ SOBRE O

MOTIVO QUE O FEZ ESCOLHER O TEMA A PARTIR DE SUA TRAJETÓRIA

COMO ALUNO:

Ao longo dos anos, mais precisamente nas últimas décadas, muito progresso se alcançou no

Brasil em termos de legislação relativa á criança e ao adolescente. A Constituição Federal

de 1988, a chamada Constituição Cidadã, e o atual Estatuto da Criança e do Adolescente

são provas vivas do nível que se atingiu no país em termos de legislação menorista.

Sem embargo disto, grande parte de nossas crianças e adolescentes ainda vivem privadas

dos mais elementares direitos, subjugadas a um sistema perverso e impelidas a uma

realidade desoladora, onde se nega até mesmo o direito básico de se ter uma família e viver

no aconchego de um lar.

Esta dualidade e contradição experimentada e vivenciada ao longo da vida acadêmica,

sobretudo durante o estágio realizado no CIACA – Centro Integrado de Atendimento à

Criança e ao Adolescente, foi o que me impulsionou a questionar e procurar compreender o

atual quadro vivido por uma grande parte de nossas meninas e meninos, sob o enfoque e

com ênfase para a adoção em suas mais variadas nuances.