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Para pensar de outros modos “Mas teremos disponíveis as palavras certas para nomear tantas situações novas?” “Temos de procurar as novas categorias que podem tornar inteligíveis as destruições e subversões, mas também as iniciativas que vivemos.” “As ideias mais difundidas num passado recente já nada nos explicam e soam oco.” UNPA – Educação e transformações UNPA – Educação e transformações contemporâneas contemporâneas

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Para pensar de outros modos

“Mas teremos disponíveis as palavras certas para nomear tantas situações novas?”

“Temos de procurar as novas categorias que podem tornar inteligíveis as destruições e

subversões, mas também as iniciativas que vivemos.”

“As ideias mais difundidas num passado recente já nada nos explicam e soam oco.”

Alain Touraine (Pensar de outro modo)

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Extremo 1

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Extremo 2

Toda manhã, por mais de 200 dias por ano, os alunos chegavam à escola de elite sul-coreana, onde eu

ensinava inglês, às 7:40. Os professores e tutores infantis os esperavam na entrada para verificar seus cabelos (comprimento e estilo; permanente e tintura eram

proibidos) e uniformes (camisetas para dentro, saia na altura dos joelhos e sapatos formais). Depois, eles

subiam as escadas para as suas salas, onde esfregavam o chão, escovavam as mesas, limpavam as janelas e

jogavam o lixo fora. A jornada escolar começava às 8:00 horas, tinham um intervalo de 10 minutos, uma pausa

para o almoço de 50 minutos e 1 hora para o jantar às 17 horas.

(John Rogers, Herald Tribune, 20/3/2012)

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Para pensar de outros modos

“Mas teremos disponíveis as palavras certas para nomear tantas situações novas?”

“Temos de procurar as novas categorias que podem tornar inteligíveis as destruições e

subversões, mas também as iniciativas que vivemos.”

“As ideias mais difundidas num passado recente já nada nos explicam e soam oco.”

Alain Touraine (Pensar de outro modo)

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Mas será que dispomos de novos termos para caracterizar tantas situações novas?

Isso exige de nós um duplo esforço: 1º - tentar formular o mais coerente e claramente possível as formas de

pensamento capazes de nos explicar nossa situação e nossas condutas; 2º - voltar ao passado e criticar as

representações da vida social cuja influência predominante nos impediu, por muito tempo, de fazer penetrar uma

maior clareza nas realidades sociais.

As ideias que, num passado recente, foram as mais difundidas não nos esclarecem mais nada; soam vazias e

nada mais fazem do que alargar o fosso que separa o mundo político e social do mundo intelectual

(Touraine, Alain. Pensar outramente. Petrópolis: Vozes, pp. 9, 12, 13)

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Um roteiro possível- De onde se fala

Em termos filosóficos: Estudos Foucaultianos Em termos sociológicos: Zygmunt Bauman Em termos institucionais: PPG-Edu/UFRGS – GEPCPós/CNPq

- Sobre o que se fala Contemporaneidade e novas subjetividades

- Por que se fala O “estar preparado”

- O caminho desta falaBases conceituais: Sujeito – Modernidade – ContemporaneidadeTopoi: Liquidez – Volatilidade e Descarte – Presentificação – Performatividade – Vazio e Endividamento – Imaterialidade – Precariado – Despolitização/repolitização

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Page 11: Para pensar de outros modos “Mas teremos disponíveis as palavras certas para nomear tantas situações novas?” “Temos de procurar as novas categorias que

Sujeito como invenção moderna

Sujeito a-histórico (desde sempre aí) X sujeito histórico

A relação entre sujeito e objeto como invenção moderna

O sujeito tem sempre uma dimensão reflexiva (o sujeito se faz como um objeto de si mesmo: sub-jectāre – colocar debaixo e colocar para cima)

O sujeito é sempre um duplo, culturalmente construído

Tecnologias de subjetivação (reflexivas: ver-se, narrar-se, julgar-se)

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Page 12: Para pensar de outros modos “Mas teremos disponíveis as palavras certas para nomear tantas situações novas?” “Temos de procurar as novas categorias que

ModernidadeA Modernidade, de modo muito resumido e simplificado, pode ser

entendida menos como um período histórico e mais como uma “forma de vida” marcada pela fé na razão/racionalidade, no progresso e no modelo de Homem e sociedade “inventados” pelo Iluminismo europeu, no século

XVIII.

Idade Média

Modernidade

Contemporaneidade

crises novos cenários novos atores

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Contemporâneo / Pós-moderno / Hipermoderno

Talvez tudo o que possamos dizer com algum grau de segurança é o que o pós-moderno não é. Certamente não é um termo que designa uma teoria sistemática ou uma filosofia compreensiva. Nem se refere a um sistema de

ideias ou conceitos no sentido convencional; nem é uma palavra que denota um movimento social ou cultural

unificado. Tudo o que podemos dizer é que ele é complexo e multiforme, que resiste a uma explanação

redutiva e simplista.

(Usher & Edwards, Postmodernism and education, 1994, p. 7)

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Problemas de nomenclatura

Os nomes dados ao momento atual variam em função dos critérios usados para caracterizar o que veio antes - a própria Modernidade

Pós-Modernidade (J.-F. Lyotard)

Hipermodernidade, Era do Vazio (G. Lipovetsky)

Neomodernidade (S. P. Rouanet)

Modernidade Líquida (Z. Bauman)

Modernidade Tardia (A. Giddens)

Modernidade Reflexiva (U. Beck)

Modernidade Avançada

Contemporaneidade – é uma palavra mais temporal e menos comprometida com a caracterização da Modernidade...

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Topoi do Contemporâneo

Liquidez (fluidez, flexibilidade, impermanência)

Volatilidade (descarte, hiperconsumo, comprismo)

Colapso do tempo (presentificação) adultez precoce infância não-realizada

adultez não-realizada

Performatividade (aparência, espetacularização)

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Topoi

Vazio (existencial) e endividamento

Imaterialidade (Ford) (Gates e Job)

Precariado (compulsório ou facultativo)

Vida administrável vida gestionável

Individualismo

Desencanto despolitização ourepolitização

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Novo vocabulário, novas ênfases, novos mitos

Competição: superação, novos desafios

Adaptação: tradução > tradição docilidade flexibilidade, resiliência

MultidãoA massa é uma aparição tão enigmática quanto universal que, de repente, está lá onde antes nada havia. Algumas pessoas podem estar reunidas, cinco, dez ou doze. Nada foi

anunciado, nada esperado. De repente, fica tudo preto de gente. (Elias Canetti. Massa e poder)

Império

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Novo vocabulário, novas ênfases, novos mitos

Novas geometrias:paredes redes

nomadismo e ênfase nos não-lugares disciplina controle (controlatos)

Celebração da diferença: diferentes, sim; porém iguais...

Segurança perigo risco (perigo calculável)

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Novo vocabulário, novas ênfases, novos mitos

assepsia geralpoliticamente correto (de mendigo a cidadão em situação de morador de rua)

Comunitarismosociedade comunidade

Infomaniaequalização entre informação, conhecimento e sabedoria

multiculturalismo (exacerbado)

autoempresariamento

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Alguns autores . . .

Michel Foucault Peter SloterdijkZygmund Bauman Ulrich Beck

Alain Touraine Gianni VattimoAnthony Giddens Charles Lemert

Gilles Deleuze Nikolas RoseCornelius Castoriadis Hanna Arendt

David Harvey Paul VirilioRichard Sennett Michel Wieviorka

Antonio Negri Michael HardtGilles Lipovetsky Octavio Ianni

Jean-François Lyotard Jean BaudrillardGiorgio Agamben Robert Castel

Gert Biesta Paolo Virno

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Para pensar de outros modos

O pensar de outros modos “exige de nós um duplo esforço:

1º - tentar formular o mais coerente e claramente possível as formas de pensamento capazes de nos explicar nossa situação e

nossas condutas;

2º - voltar ao passado e criticar as representações da vida social cuja influência predominante nos impediu, por muito tempo, de fazer

penetrar uma maior clareza nas realidades sociais.”

Alain Touraine (Pensar de outro modo)

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Para pensar de outros modos

A radicalização do “pensar de outros modos”

1. colocar-se fora do arco platônico

2. dar as costas às metanarrativas iluministas

3. assumir apenas o a priori histórico

4. afinar-se com o neopragmatismo

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Para pensar de outros modos

1. colocar-se fora do arco platônicoDar as costas à doutrina dual de Platão

Compreender a alegoria da caverna (República e Timeus) como um recurso heurístico e não como uma verdade revelada

“A verdade é deste mundo” (Foucault)

Esquecer a transcendência

Dar outro estatuto à Filosofia“Mas o que é filosofar hoje em dia — quero dizer, a atividade filosófica — senão o trabalho crítico do pensamento sobre o próprio pensamento? [Eu pergunto] se

ela não consiste, ao invés de legitimar aquilo que já se sabe, num empreendimento de saber como e até que ponto seria possível pensar de outro

modo? ” (Foucault)

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2. Dar as costas às metanarrativas iluministasNão se trata tanto de argumentar contra as metanarrativas iluministas, mas sim

de desnaturalizá-las, mostrar seu caráter contingente (são datadas e localizadas, culturalmente inventadas) e deixá-las de lado ou para trás.

Também não se trata de não tomar partido, de não assumir juízos de valor, mas sim de não começarmos nossas análises tomando um juízo como dado e

autodemonstrado.

Praticar a hipercrítica

Minha opinião é que nem tudo é ruim, mas tudo é perigoso, o que não significa exatamente o mesmo que ruim. Se tudo é perigoso, então temos sempre algo a

fazer. Portanto, minha posição não conduz à apatia, mas ao hiperativismo pessimista. (Foucault, Sobre a genealogia da ética).

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3. Assumir apenas o a priori histórico

Todas as forças que, em alguma época, foram consideradas motores da história foram descobertas depois como tendo sido produzidas historicamente,

ou seja, a partir da história.

Todas as minhas análises são contra a ideia de necessidades universais na existência humana. Elas

mostram a arbitrariedade e qual espaço de liberdade podemos ainda desfrutar e como muitas mudanças

podem ainda ser feitas.(Michel Foucault)

O mundo é contingente. “Teima” em não ser nem necessário nem dialético.

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Para pensar de outros modos

4. Afinar-se com o neopragmatismoOs 3 nãos...

não ao fundacionismonão há ganchos no céu nem âncoras na terra;

ex.: multiculturalismo radical

não ao essencialismonão há nada não-relacional;

ex.: a pergunta “que é mesmo isso?” não faz sentido

não ao representacionismo/realismo- a linguagem primordialmente não representa, mas cria/institui aquilo que fala

- não interessa o que estiver fora do entendimento humanoex.: realidade = materialidade + sentido (atribuído pela linguagem)

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4. Afinar-se com o neopragmatismo

O mundo não está à espera de uma descrição; ele se faz na própria descrição que o descreve

mostrar ≠ provarrigidez ≠ rigor ≠ exatidão

noção ≠ conceitoteoria (coisa) ≠ teorização (ação)

Não há leitura isenta (desinteressada ou neutra)

Não há descrição isenta (desinteressada ou neutra)

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dominações...

• PoderNão como “coisa” que se possua, mas como uma ação sobre ações e tão mais

econômico (efetivo, eficaz, eficiente) quanto mais estiver sustentado em “correias” de saber. A vontade de poder/potência está na base da vontade de

saber. O poder tem uma racionalidade interna à sua própria ação. O poder implica consentimento com sentimento, de modo que na sua forma idealizada

não dá lugar à resistência. Ex.: no limite, a sedução.

• ViolênciaTambém pode ser uma ação sobre ações, mas sempre é diretamente sobre um corpo, sem se preocupar com a economia. A violência tem uma racionalidade

externa à sua própria ação; para quem sofre a sua ação, ela é irracional. A violência implica resistência e até mesmo conta com e precisa da resistência. Ex.:

no limite, o estupro.

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Dois conceitos importantes

subjetividade — em termos de como cada um se vê e age como um duplo em si mesmo: como sujeito e como

objeto de si

identidade — em termos de como cada sujeito se identifica ou liga (ou não se identifica ou liga) com os

outros sujeitos e, em função disso, se compreende e atua no interior de uma cada vez mais complexa trama social

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Sujeito como invenção moderna

Sujeito a-histórico (desde sempre aí) X sujeito histórico

A relação entre sujeito e objeto como invenção moderna

O sujeito tem sempre uma dimensão reflexiva (o sujeito se faz como um objeto de si mesmo: sub-jectāre – colocar debaixo e colocar para cima)

O sujeito é sempre um duplo, culturalmente construído

Tecnologias de subjetivação (reflexivas: ver-se, narrar-se, julgar-se)

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Foucault para pensar de outros modos

conduções...

• GovernoGoverno (gouverne, em francês) refere-se a uma instância administrativa,

hierarquizada, quase sempre centralizada e muitas vezes burocrática. Ex.: o governo de uma nação, o lugar (físico e simbólico) ocupado pelo(s)

governante(s).

• GovernamentoGovernamento (gouvernement, em francês) refere-se à ação de governar, isso é,

de um/uns conduzir os outro(s). Aqui, a etimologia revela-se muito útil, na medida em que conduzir deriva de cum + ducĕre = levar com (a aquiescência e

até cooperação do outro). Governa melhor (mais economicamente) o governante que conta com a colaboração do(s) governado(s). Ex.: o governamento que cada

um de nós é capaz de exercer sobre os demais.

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Foucault para pensar de outros modosFoucault para pensar de outros modos

• EducaçãoComo ação ou processo de acolhimento e de condução dos recém-

chegados a uma cultura.

kwel < colligo, colligěre < colher, acolher, cultivar, cultura, cultuar, dar colo, colonizar, colônia, inquilino...

deuk < duco, ducěre < duque, conduzir, introduzir, produzir, traduzir, induzir, educar...

Assim, a educação é uma forma de acolhimento e colonização...

• EscolaComo maquinaria (conjunto de máquinas) educacional de:

- sequestro e governamento- produção e reprodução (material, simbólica, de subjetividades etc.)

Page 33: Para pensar de outros modos “Mas teremos disponíveis as palavras certas para nomear tantas situações novas?” “Temos de procurar as novas categorias que

Na oficina de FoucaultAs ideias e os conceitos não estão num armazém à nossa espera; ambos são invenções do pensamento, para pensar. As noções são ferramentas provisórias. Os conceitos são ferramentas permanentes. Pensar a marteladas.

A “fidelidade infiel” não religiosidade, mas “vontade de verdade”; assim, no lugar do divino/sagrado, apenas o profano.

Ferramentas & atmosfera (éthos)

Num 1º momento, a Modernidade se constituiu num imenso esforço de dessacralização das práticas e do pensamento. Mas, na medida em que a lógica

da soberania precisa do sagrado, logo esse foi contrabandeado de volta e reinstalado, dissimuladamente, na Pedagogia e na Ciência modernas (Segunda

Modernidade). Assim, a Pedagogia nasceu como uma prática inovadora (discursiva e não-discursiva), dentro de um movimento reacionário, em que foi

reposta e ressignificada a articulação do (neo)platonismo com elementos da tradição judaico cristã.

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Na oficina de Foucault

A Pedagogia moderna

neoplatonismo

confluências Pedagogia moderna

trad. judaico-cristãs

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Na oficina de Foucault

As 7 pragas da Pedagogia Moderna

transcendentalismo

finalismo

catastrofismo denuncismo

salvacionismo

prometeísmo metodologismo

prescritivismo reducionismo

messianismo

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Situação da Razão Política no pensamento de Foucault

- A sempre problemática periodização . Mesmo assim. . .

- Os 3 domínios:

ser-saber – HL (1961), NC, PC, AS

arqueologia

ser-poder – HL, OD (1970), VP (1975) Cursos no Col. de France

genealogia

ser-consigo – HL, HS (1976 a 1984) Cursos no Col. de France

arqueogenealogia, anarqueologia

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Os cursos de Foucault no Collège de France

Questões a observar:

Caráter dos CursosO exercício de prestação de contas

Cursos como pensamento em movimento

Variedade e profundidade das fontes trabalhadas

Clareza e logicidade das exposiçõesA constante preocupação didática

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Os cursos de Foucault no Collège de France

Grupo 1Núcleo: história moderna das disciplinas, da norma e do biopoder

1970-1971 (Vontade de saber) até 1974-1975 (Os anormais)

Grupo 2Núcleo: Política, biopolítica, governamentalidade

1975-1976 (Em defesa da sociedade) até 1979-1980 (Do governo dos vivos)

Grupo 3Núcleo: governamento de si e dos outros, ética e subjetivação

1980-1981 (Subjetividade e verdade) até 1983-1984 (A coragem da verdade)

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ano

curso

f

e

p

obs.

1971

A vontade de saber

x

x

1972

Teorias e instituições penais

1973

A sociedade punitiva

X

1974

O poder psiquiátrico X

X

X

1975

Os anormais

X

X

X

1976

Em defesa da sociedade

x

x

x

Título original:É preciso defen der a

sociedade

1977

1978

Segurança, território e população

x

x

x

1979

Nascimento da biopolítica

x

x

x

1980

Do governo dos vivos

x

x

Excertos. Edição organizada por Nildo

Avelino

1981

Subjetividade e verdade

x

1982

Hermenêutica do sujeito

x

x

x

1983

O governo de si e dos outros

x

x

x

Conhe cido como O go verno de si e dos

outros I

1984

A coragem da verdade

x

x

x

conhe cido como O go verno de si e dos

outros II

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Governamentalidade, Biopolítica e EducaçãoGovernamentalidade, Biopolítica e Educação

Soberania e governamentalidade

A questão política central sempre é como governar os homensNuma perspectiva histórica do Ocidente, essa questão mostra-se em 3

fases que seguem 3 “modelos” distintos:

Modelo da Soberania Estado de Justiça (I. Média até séc. XVI), baseado num sistema de

código legal

Modelo da Disciplina Estado Administrativo (séc. XVII e XVIII), baseado em tecn. Disciplinares. As disciplinas regulam e têm, no seu horizonte, a autorregulação.

Modelo da Segurança Estado de Governo (séc. XIX e XX), baseado em dispos. de segurança

O Estado de Governo requer o atingimento da autorregulação.

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Governamentalidade, Biopolítica e EducaçãoGovernamentalidade, Biopolítica e Educação

A governamentalidade

Para compreender o conceito de governamentalidade, é preciso conhecer sua gênese a partir da pastoral cristã medieval e do esgotamento do

“modelo príncipe” (cuja função primordial sempre foi a de conservar o território).

Pastorado cristãoNa tradição oriental hebraica, o pastor não se ocupa do território, mas de suas ovelhas, as conduzindo, alimentando e protegendo, conhecendo cada uma em

sua individualidade (omnes et singulatim), vigiando-as e salvando-as. O pastorado hebraico é de caráter nômade. Na tradição cristã, essas tarefas se mantêm, mas

se sedentarizam e se institucionalizam (na Igreja: ekklēsia = a assembleia ou reunião dos pastores + ovelhas).

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A governamentalidade

Deslocamento do pastorado e articulação com o declínio do “modelo príncipe”

No séc. XVIII, o pastorado cristão se articula com o declínio da lógica principesca (que se tornou cada vez menos econômica frente às explosões e

dispersões populacionais) e se expande para o campo político. Nessa articulação, a ênfase no território dá lugar à ênfase nos indivíduos. O Imperial dá lugar ao

Estatal: “Roma, enfim, desaparece” (Foucault, STP). O grande problema político deixa de ser a legitimidade do soberano e passa a

ser o conhecimento e o desenvolvimento das forças do Estado. Isso implica a criação de um novo ente (a população) e de um novo saber acerca desse novo ente (a Estatística). Essas são as condições de possibilidade para a criação da

Economia Política, um tipo de saber que é capaz de sustentar as intervenções no campo da Economia e das populações.

O soberano é mandado para casa, mas permanece a lógica da soberania, agora deslocada para um novo registro: o Estado Moderno.

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A governamentalidade

Não há substituições tout court, mas de uma articulação triangular:

disciplinas

população

governamento soberania

“Devemos compreender as coisas não em termos de substituição de uma sociedade de soberania por uma sociedade disciplinar e desta por uma sociedade

de governo. Trata-se de um triângulo: soberania—disciplina—gestão governamental, que tem na população seu alvo principal e nos dispositivos de

segurança seus mecanismos essenciais.” (Foucault, A governamentalidade)

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A governamentalidade

Com esse neologismo, Foucault designa 3 “coisas”:

1. Conjunto de práticas, instituições, saberes, que tem por alvo a população, como principal saber a Economia Política e como instrumento principal os

dispositivos de segurança.

2. Uma determinada disposição política em que um novo tipo de poder (de governamento) se sobressai acima das disciplinas e da soberania e que levou ao desenvolvimento de uma série de aparelhos específicos de governamento e de

um conjunto de novos saberes.

3. O resultado de um processo histórico, ao longo do qual o Estado de Justiça medieval (passando pelo Estado Administrativo dos séculos XV a XVII) foi pouco a

pouco governamentalizado.

Mais tarde, nas Conferências de Vermont:“Governamentalidade é o encontro entre as técnicas de dominação

exercidas sobre os outros e as técnicas de si. (Foucault, Tecnologias do eu)”

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Governamentalidade, Biopolítica e EducaçãoGovernamentalidade, Biopolítica e Educação

A governamentalidade

“Governamentalidade é o encontro entre as técnicas de dominação exercidas sobre os outros e as técnicas de si. (Foucault, Tecnologias do eu)”

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Governamentalidade, Biopolítica e EducaçãoGovernamentalidade, Biopolítica e Educação

Governamentalidade e Estado Moderno

O Estado Moderno “não é simplesmente uma das formas ou um dos lugares — ainda que seja o mais importante — de exercício do poder, mas que, de um certo modo, todos os outros tipos de relações de poder a ele se referem. Porém, não porque cada um dele derive. Mas, antes, porque se produziu uma estatização contínua das relações de poder. Poderíamos dizer que as relações de poder

foram progressivamente governamentalizadas”. (Foucault, O sujeito e o poder)

Assim, o Estado é o grande locus que, na Modernidade, enfeixa os fluxos sociais de dominação, por onde passam praticamente todas as relações de poder.

Se o Estado é hoje o que é, é graças a essa governamentalidade, ao mesmo tempo interior e exterior ao Estado. São as táticas de governo que permitem

definir, a cada instante, o que deve ou não competir ao Estado, o que é público ou privado, o que é ou não estatal. (Foucault, A governamentalidade)

Governamentalidade, Estado Moderno & Educação

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Governamentalidade, Biopolítica e EducaçãoGovernamentalidade, Biopolítica e Educação

PPG-Educação/UFRGS – 2014-1

Programa e cronograma:

– Introdução. Contemporaneidade. Dia 7 de abril

— Para pensar de outros modos. Na oficina de Michel Foucault. Situação da Razão Política nos Estudos Foucaultianos. Dias 7 e 8 de abril

— Lógica da soberania, lógica da governamentalidade e nascimento dos Estados Modernos. O papel da educação escolar: universalização e obrigatoriedade; igualdade e

estratificação. Dia 8 de abril

— Breve histórico dos conceitos de biopoder e biopolítica. População, biopolítica e normalização. A governamentalidade como grade de inteligibilidade da segurança, do

liberalismo e dos neoliberalismos. Do imperativo do consumo e horror stati dos liberais ao imperativo da competição e servĭtus stati dos neoliberais. Dia 9 de abril

— A Educação como braço do Estado a serviço do neoliberalismo no Brasil contemporâneo. O novo vocabulário: diferença, inclusão, competição, avaliação,

volatilidade, flexibilização, performatividade, virtuosismo, endividamento, incompletude e inacabamento, presentificação, precariedade e precariado. Dispositivos e processos

contemporâneos de subjetivação. Dias 10 e 11 de abril

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Biopolítica

Com essa palavra, Foucault designa os modos pelos quais se tenta, desde o séc. XVIII, racionalizar os problemas da prática governamental, a partir dos

fenômenos que se dão nos seres vivos quando tomados em seu conjunto populacional: saúde, natalidade, mortalidade, dinâmica espacial, higiene, etc.

A noção de biopoder já está presente no poder disciplinar. Mas o conceito de biopolítica só vai surgir com a emergência da população (séc. XVIII).

Biopolítica e população são correlatos.

É com a emergência da biopolítica que, no século XVIII, se inverte a lógica do “deixar viver, fazer morrer” para a lógica do “fazer viver, deixar morrer”. É nessa

chave que Foucault compreende o “racismo de Estado” como uma forma negativa de promover a vida de um grupo, às custas dos outros.

Biopolítica é o conjunto de disposições racionais do biopoder, cujo objetivo é a segurança da população, em termos de sua distribuição e existência.

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População, biopolítica, normalização

É no século XVIII que se dá a “invenção” da população, da biopolítica e do liberalismo, tendo o Estado como elemento aglutinador e organizador.

A população deslocou o modelo familiar que pautava o governamento e levou a uma nova definição de economia: não mais como um conjunto racional de medidas da casa (oikos), mas da população. Daí, o surgimento da Economia

Política como um novo conjunto de saberes.

O conceito de população tem 2 faces: a) espacial: densidade demográfica, distribuição territorial etc.

b) existencial: condições e relações de coexistência, taxas populacionais

População & Educação . . .

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População, biopolítica, normalização

A “invenção” da norma trouxe todo um conjunto de práticas e saberes que permitiram o conhecimento da população em níveis cada vez mais acurados, microfísicos, de modo a facilitar a intervenção e aumentar a segurança do/no

Estado.

Para compreender o poder na Contemporaneidade, é preciso abandonar os registros da soberania e da lei e examinar como e em que níveis atua o poder.

Foucault argumenta que atualmente é pela norma que o poder atua mais incisiva e economicamente. E, ao invés de reprimir uma suposta natureza individual já

dada, o poder da norma constitui, forma, modela nossos eus.

Na Modernidade:

Disciplina – biopoder sobre os indivíduos (individualizante)norma

Biopolítica – biopoder sobre a população (coletivizante)

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Norma, normatização, normalização, normação

A norma engloba os normais e os anormais, ou seja, todos estão (ou estão colocados) na norma, sob o domínio da norma. O anormal está na norma.

A norma regula a vida dos indivíduos e, ao mesmo tempo, das populações. Assim, vivemos numa sociedade normatizada e de normalização (mas não

normalizada).Normatizar – estabelecer normasNormalizar – proceder a medidas de colocar todos nas faixas de normalidade, definida a partir da própria população. Típica das sociedades de segurança. Assim, no sentido foucaultiano, a Filosofia é uma longa luta contra a norma, de antinormalização.Normação – típica das sociedades disciplinares, em que a norma é pré-definida.As sociedades de normalização são, cada vez mais, sociedades medicalizadas. Eugenismo/racismo de Estado e psicanálise são as duas faces de uma mesma moeda.lei ≠ norma

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O novo vocabulário

Diferença- O pós-moderno “descobriu” que tudo é diferença. A diferença é; tudo é diferença.- O que chamamos de igualdade ou mesmidade são invenções epistemológicas que contornam ou diminuem a dispersão e possibilitam pensar. Assim, inventamos critérios de semelhança e agrupamos os semelhantes, a fim de fugirmos da dispersão e facilitarmos a memória.- A escola moderna inventou o currículo como o grande artefato que coloca ordem na diferença: seleciona, agrupa, hierarquiza, normatiza, compara e avalia.

Diversidade- Diversidade é o nome ou atributo que se dá para uma realidade em que tudo se mostra como diferença.- Para a Modernidade, a diversidade é um ruído que atrapalha o ideal de pureza; ela se manifesta como curiosidade, exotismo, carnavalização.- Para o pós-moderno, a diversidade é a manifestação de uma materialidade que é pura diferença.

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Liberalismo e neoliberalismo

Economia sob a “lógica da equivalência”:Liberais do séc XVIII – liberdade de intercâmbio, pois a verdade é o (ou está no) mercado. Por isso, o horror ao Estado (horror stati) – Adam SmithLiberais do séc. XX – liberdade de intercâmbio, pois a verdade é o (ou está no) consumo. Ainda o horror stati.

Economia soba a “lógica da desigualdade”Neoliberais do séc. XX – liberdade de concorrência, pois a verdade é a (ou está na) competição. Por isso, não mais o horror stati, mas a servidão do Estado ao mercado (servĭtus stati). Dado que a competição será tão mais efetiva quanto mais livre for e quanto mais gente dela participar, todos são bem-vindos: é preciso que todos participem do “jogo”. Para isso, o Estado se faz necessário: incluindo e registrando os jogadores, organizando os cenários do jogo. “O mercado, ou antes, a concorrência pura (que é a própria essência do mercado) só pode aparecer se for produzida; e produzida por uma governamentalidade ativa”. (Foucault, NB, p. 164-165)

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Liberalismo e neoliberalismo

Se, para os liberais, o ambiente sociocultural deve ser livre e espontâneo, exterior às ações dos governos e ao Estado (laissez-faire), para os neoliberais tal ambiente deve ser dirigido e modelado pelos governos e pelo Estado, aos quais caberá produzir a liberdade. Por isso, “o neoliberalismo constantemente produz e consome liberdade. A própria liberdade transforma-se em mais um objeto de consumo” (Veiga-Neto, GNE-FFP, p. 39)

E, na medida em que cabe ao Estado dirigir e modelar os cenários, será preciso lançar mão de práticas e instituições que executem tal tarefa. A maquinaria escolar mais uma vez é convocada para dar conta das demandas do Estado: caberá à Educação (especialmente escolarizada, mas também no âmbito das pedagogias culturais) tanto colocar cada vez mais jogadores no jogo quanto ensinar todos a jogar (segundo suas competências, interesses etc., mas de modo ainda e sempre estratificado). Trata-se de um jogo no qual todos perdem (econômica ou existencialmente).

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Liberalismo e neoliberalismo

Neoliberalismo alemãoNa reconstrução da Alemanha pós-guerra (1948), a Economia não deve combater o Estado, mas orientá-lo, dirigi-lo, a fim de evitar os erros que ele pode cometer (e cometeu, na Alemanha nazista, por exemplo). Em termos da Filosofia Política, a Economia coloca-se acima do Estado, para que possa subjugá-lo e, por fim, colocá-lo a serviço dos interesses dela mesma (assumindo, dissimuladamente, a transcendentalidade do mercado).

Neoliberalismo norte-americano/estadounidense anarcoliberalismoNasce como oposição ao Estado de Bem-Estar Social, aos perigos do socialismo/socialização, do militarismo norte-americano e ao keynesianismo. O neoliberalismo norte-americano é mais do que uma forma de a Economia se conduzir frente ao Estado (e vice-versa): é uma forma de vida, uma forma de a Economia se relacionar com o Estado e seus cidadãos, que “está na alma” de todos e de cada um em particular, tendo a liberdade como imperativo maior.

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Um paradoxo e a sua tensão

Ideal da homogeneidade (estratificada)Para a escola numa episteme que assume a mesmidade, a diferença e o diferente

são o problema

X tensãoIdeal da heterogeneidade

Para a escola numa episteme que assume a radicalidade da diferença, a mesmidade e o mesmo são o problema

O paradoxo: Como conciliar/transferir o ideal de uma episteme para uma outra episteme que lhe é contrária (justamente nessa

idealização)?

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A tensão essencial da Pedagogia Contemporânea

Na escola moderna, a dominação é verticalizada, em nome do contrato social. A inclusão é conformadora, mesmo que feita em

nome do Humanismo; a inclusão nivela e homogeneiza (ainda que em estratos diferentes), promovendo a fusão cultural.

XNa escola contemporânea, as dominações são horizontalizadas,

entre grupos que querem marcar suas diferenças (tribos, comunidades etc.). A inclusão é a garantia de um espaço de trocas

que permitam a manutenção da diversidade, sem querer promover a fusão cultural.