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PARCEIRA PÚBLICO-PRIVADA: O CASO DO PORTO “MARAVILHA” NO RIO
DE JANEIRO.
Wellington Nascimento Silva
Rômulo Dante Orrico Filho
Walter Porto Junior Universidade Federal do Rio de Janeiro – Programa de Engenharia de Transportes
COPPE/UFRJ
RESUMO
A pesquisa visa analisar o grau de maturidade e o modelo de planejamento da parceria público-privada (PPP) para
revitalização da região portuária do município do Rio de Janeiro. As características de maturidade e planejamento
participativo foram obtidas por meio de revisão bibliográfica e documental, em portais da internet e na literatura
nacional e internacional. Para análise foram efetuadas comparações entre o referencial teórico e os dados sobre a
participação da população no planejamento. A maturidade foi verificada pelo modo de obtenção de recursos. O
planejamento quanto à participação popular. Constatou-se que o projeto representou uma evolução no país quanto
à maturidade das PPPs para infraestrutura, da fase I para a fase II. Inova na obtenção de receita à partir da criação
de solo novo por meio dos Certificado de Potencial Adicional de Construção (CEPAC), entretanto, a participação
da população no planejamento das transformações urbanísticas, sociais e ambientais foi baixa.
Palavras-Chaves: Parceria Público-Privada; Operação Consorciada; Financiamento de Infraestrutura.
ABSTRACT
The research aims to analyze the degree of maturity and the planning model of public-private partnership (PPP)
for regeneration of the port of the city of Rio de Janeiro. The characteristics of maturity and participatory planning
were obtained through literature review and document, in the internet portals and national and international
literature. Analysis for comparisons between the theoretical framework and the data on public participation in
planning have been made. Maturity was verified by the method of securing resources. The planning and public
participation. It was found that the project represented an evolution in the country as the maturity of PPPs for
infrastructure, from phase I to phase II. Innovates about obtaining takings by the creation of new soil by means of
Aditional Construction Potencial Certificate (CEPAC), however, public participation in urban planning, social and
environmental transformations was low.
Keys-Words: Public-Private Partnership; Operation Consortium; Financing Infrastructure.
1. INTRODUÇÃO
Na esteira dos desafios para adequação da infraestrutura para as Olimpíadas de 2016, a cidade
do Rio de Janeiro tem uma oportunidade de resolver problemas estruturais que a afligem, como
exemplo o transporte público deficiente que apresenta saturação dos modos tradicionais,
mobilidade urbana precária e baixo desenvolvimento de transporte sustentável (Souza, 2010).
A administração pública municipal elaborou o projeto olímpico do Rio de Janeiro, que inclui a
revitalização da área portuária por meio de parceria público-privada (PPP), denominada Projeto
Porto Maravilha e inspirada na revitalização dos portos em cidades como Barcelona, Londres
e Nova York (Schissel, 2012). O projeto implica em investimentos em infraestrutura que
demandam recursos financeiros superiores aos gastos possíveis para o orçamento público, o
qual tem limitações impostas pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
O desenvolvimento de infraestrutura é uma tarefa difícil para o governo isoladamente.
Historicamente seu fornecimento tem sido monopólio da Administração Pública, mas com o
aumento da distância entre as necessidades de infraestrutura e recursos disponíveis para
financiá-la, as Parcerias Público-Privada (PPP) surgiram como um modo preferido de
financiamento, inclusive no Brasil (Kateja, 2012). Em função de suas necessidades, os países
em desenvolvimento se adaptam facilmente ao uso de PPP para ligação entre o governo, setores
da economia e organizações internacionais (Ahmed e Ali, 2004). No caso brasileiro, em um
contexto em que os estados e municípios sofrem uma profunda crise fiscal, a qual é suportada
por trabalhadores e desempregados (Lima, 2008).
A PPP do “Porto Maravilha” é recente e suas características ainda não são totalmente
conhecidas. O problema é que por não estar totalmente compreendida quanto às suas
características de planejamento e grau de maturidade, há uma lacuna sobre este conhecimento.
De acordo com Bel, Brown e Marques (2013) pesquisas devem envidar esforços para conhecer
mais profundamente a diversidade das PPP.
O objetivo deste artigo é analisar o grau de maturidade e o modelo de planejamento da parceria
público-privada (PPP) para revitalização da região portuária do município do Rio de Janeiro,
denominada “Porto Maravilha” quanto à participação da população na tomada de decisões na
fase de planejamento do projeto.
Para identificação das características das PPP quanto ao planejamento e grau de maturidade foi
efetuada pesquisa bibliográfica por meio de periódicos disponíveis no portal CAPES. Para
conhecer as características da PPP do Porto Maravilha foram identificadas as normas, valores
do empreendimento e registro da participação da população nas decisões, por meio de debate
público e na estrutura organizacional da empresa criada pela prefeitura do município para gerir
o projeto. Isto foi efetivado com o emprego de pesquisa documental nos portais oficiais da
Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e da
Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro S.A (CDRUP).
Para identificação dos canais de participação da população foi pesquisado o portal da CDRUP
e os registros de audiências públicas promovidas pela Câmara de Vereadores do Município e
pelo Ministério Público. A pesquisa teve caráter exploratório e comparativo.
As análises foram feitas comparando as informações obtidas no referencial teórico com as
informações levantados nos canais de participação e na forma de obtenção de recursos para
financiamento do projeto. Os principais dados obtidos no levantamento do referencial teórico
foram organizados em tabelas para posterior comparação com os dados relacionados à
Operação Consorciada do Porto Maravilha (OCPM).
O grau de maturidade foi analisado quanto à participação do Capital Privado e o modelo de
obtenção de recursos. A participação da população quanto às decisões do projeto foi analisada
quanto à participação: a) diretamente na estrutura organizacional pela empresa gestora da PPP,
b) em canais disponibilizados pela gestora e c) em debates públicos.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
A PPP é uma prática bem estabelecida no Reino Unido, Austrália, Holanda, África do Sul,
Canadá e Japão (Lewis e Grimsey, 2005). Aumentam a produtividade, trazem eficiência de
gestão e habilidades práticas do mundo dos negócios, ao passo que reduzem o envolvimento
dos governos pela participação do setor privado nos serviços públicos (Shen, Platten , Deng,
2006).
O mecanismo financeiro da Parceria Público-Privado possibilita a participação formal do setor
privado em setores sociais a partir do objetivo básico de mobilizar o financiamento privado
para a prestação de serviços públicos e apoiar outras funções governamentais (Zaman e Akbar,
2013). Com base nesta política para reduzir os déficits de infraestrutura, o setor público está
cada vez mais voltado para PPP (Kateja, 2012). Por intermédio desta parceria os governos
poderiam proporcionar aos seus cidadãos bens ou serviços para os quais não tenha capacidade
financeira, técnica ou operacional para produzir por conta própria, mas que são de interesse do
setor privado por serem projetos potencialmente lucrativos em um risco mais baixo do que se
tivessem sido o investidor exclusivo (Bel; Brown e Marques, 2013; Tang, Shen e Cheng,
2010). São consideradas como alternativas à completa privatização, em um modelo no qual o
governo e as empresas privadas assumem co-responsabilidade e co-propriedade para a
prestação de serviços da cidade. Combina-se o dinamismo privado, o acesso ao financiamento,
o conhecimento de tecnologias, eficiência gerencial e espírito empreendedor com a
responsabilidade social, consciência ambiental, conhecimento local, geração de emprego e as
preocupações próprias do setor público (Ahmed e Ali, 2004; Shen, Platten, Deng, 2006.; Athias,
2013).
As economias emergentes, inclusive a brasileira, precisam de financiamento para infraestrutura.
O Brasil foi movido por um longo processo de liberalização nos anos 1990 e foi o que mais
atraiu investimento entre os países em desenvolvimento (período 1990-2010), seguido por
China, Argentina, México e Índia. A maior parte do investimento privado em PPP brasileiras
foi para o setor de telecomunicações (48,9%), seguido pelos setores energético (29,3%), de
transporte (16,9%) e de água e saneamento (4,9 %) (Kateja, 2012).
No caso brasileiro, a criação de PPPs se sujeita às formalidades legais (Lei 11.079/2004),
motivo que leva a contratação a ser precedida de licitação na modalidade de concorrência (Casa
Civil, 2013). O estatuto da cidade (Lei 10.257/01) prevê como instrumento de criação de PPP
a Operação Urbana Consorciada (OUC) definida como ”o conjunto de intervenções e medidas
coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores,
usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área
transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental” (Casa
Civil, 2013). Souza (2010) afirma que a operação urbana consorciada e urbanização
consorciada, consórcio imobiliário, reurbanização consorciada, e operação interligada, formam
um conjunto de instrumentos de planejamento, com conceitos distintos (tabela 1).
Tabela 1: Conjunto de Instrumentos de Planejamento Previsto no Estatuto da Cidade. Operação Urbana Consorciada ,
Urbanização Consorciada e
Reurbanização Consorciada
Permite a parceria entre a iniciativa privada e o poder público para a
realização de obras de infraestrutura que permitam a renovação urbana
em áreas degradadas ou a transformação de uso e a reurbanização.
Consórcio Imobiliário
É a forma de viabilização financeira de planos de urbanização, na qual
o proprietário entrega ao Executivo municipal o seu imóvel e, após a
realização de obras, recebe como pagamento imóvel devidamente
urbanizado.
Operação Interligada Possibilidade de compra de potencial construtivo para um imóvel
acima do regularmente previsto na lei de zoneamento
Souza (2010)
A variedade de PPPs é bastante ampla e depende do grau de transferência de risco e de
envolvimento do setor privado (Bel; Brown e Marques, 2013). Muitas são suas formas e não
há uma definição única. No entanto, é possível afirmar que são relações de trabalho conjunto
em que as partes são independentes, concordam entre si para alcançar um objetivo comum,
criam estruturas organizacionais e processos para alcançar este objetivo, planejam e
implementam um programa conjunto, compartilhando informações relevantes, riscos e
recompensas (Lamie e Ball, 2010, apud SAGER, 2011). O setor público e privado podem
trabalhar em conjunto (Katusiimeh ; Mol e Burger, 2012).
O planejamento de políticas públicas para PPP pode ser físico-territorial ou clássico, que tem
por concepção o planejamento como atividade de elaboração de planos de ordenamento
espacial; pode ser rawlsiano, que concebe como primeira prioridade dos planejadores a
necessidade dos grupos sociais desprivilegiados; e, também pode ser comunicativo ou
colaborativo, que propõe que o futuro das localidades deve ser deliberado e debatido em
público, e as decisões devem ser tomadas em processos democráticos e inclusivos. (Sager,
2011; Souza, 2010).
Carvalho e Fidélis (2013), ao abordarem em sua pesquisa sobre os novos requisitos legais para
áreas estuarinas em Portugal, onde foi criado um instrumento que incorpora um novo conceito
de planejamento para confluência entre o sistema de planejamento de recursos hídricos e o
sistema de planejamento do uso da terra, identificaram que o envolvimento das partes
interessadas no processo de planejamento requer: identificação das principais partes
interessadas que podem afetar ou ser afetados pelo plano; identificação dos interesses das partes
envolvidas e do potencial impacto do plano sobre esses; avaliação da influência das partes
interessadas na elaboração e implementação do plano; e, Definição de uma estratégia de
participação que promova o envolvimento nas diferentes fases de elaboração e implementação
do plano.
Sager (2011) pesquisou a corrente neo-liberal (tabela 2), cujas políticas são baseadas na atração
de pessoas e empresas para a cidade a partir dos pilares: competição, tratamento preferencial
por causa do crescimento econômico e dependência de incentivos econômicos. Afirma que a
mudança da regulação burocrática para o empreendedorismo público teve efeito sobre o
planejamento urbano, gerando maior envolvimento privado na construção e operação de
infraestrutura urbana, base para os instrumentos financeiros das PPPs.
Tabela 2: Políticas Neo-Liberais para Planejamento Urbano.
Marketing da Cidade Visa atrair o tipo de pessoas que se acredita trazer desenvolvimento
urbano.
Desenvolvimento Urbano Exige uma administração da cidade empreendedora apoiando os
candidatos a empresários .
Incentivos ao
Desenvolvimento
Econômico
Incentivos econômicos são dados quando menos empresas estão
interessados do que o número que o governo considera ideal
Licitação
Relevante quando mais empresas se interessem em um projeto de
investimento ou uma operação de negócio que são necessários para a
tarefa..
Sager (2011)
No Brasil, a Lei 11.079/2004 conceitua PPP como o “contrato administrativo de concessão, na
modalidade patrocinada ou administrativa”. A concessão patrocinada é aquela em que os
serviços públicos ou de obras públicas envolvem tarifa cobrada dos usuários por
contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado, enquanto a concessão
administrativa é aquela em que a Administração Pública é a usuária direta ou indireta, ainda
que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens (Casa Civil, 2013). Para
alcançar os resultados pretendidos e satisfazer a ambas as partes da relação contratual, devem
ser criadas condições para tornar as PPPs bem sucedidas. Tais condições foram pesquisadas por
Ahmed e Ali (2004) e estão apresentadas na tabela 3.
Tabela 3: Condições Necessárias para Formar PPPs Bem Sucedidas.
Cultura Incentivo, liderança e a participação do cidadão. Está relacionada com as preocupações
da comunidade em desenvolvimento de longo prazo.
Visão
Realista entre o setor público, o setor privado e os membros da comunidade. Se baseia
nos pontos fortes e fracos da região, bem como sobre um entendimento comum sobre o
potencial da área.
Participação Organizações interessadas que podem misturar o interesse próprio dos membros com o
interesse mais amplo da comunidade.
Continuidade da
política
Inclui a capacidade de se adaptar a novas circunstâncias e reduzir incertezas para as
empresas e indivíduos que querem assumir riscos econômicos.
Ahmed e Ali (2004)
Kateja (2012) constatou que os governos em estágios iniciais da curva de maturidade de PPP,
como é o caso brasileiro, poderiam se beneficiar da oportunidade de aprender com os pioneiros
que evoluíram para estágios mais avançados. Estes estágios (tabela 4) foram segregados por
fases de evolução das PPP quanto a aspectos políticos, de execução e de obtenção de recursos
no mercado de capitais.
Tabela 4: Fases de Maturidade de PPPs
Fase I Quadro político e legislativo estabelecidos juntamente com um quadro
institucional para orientar a execução de projetos
Brasil, China, África do
Sul, Índia e Rússia.
Fase II
PPPs concentradas em agências, com desenvolvimento de novos de
parcerias. Sua profundidade é expandida para vários projetos e setores. Os
países também alavancam novas fontes de recursos nos mercados de
capitais.
Reino Unido, para
escolas e hospitais;
Austrália e Irlanda para
estradas
Fase
III
Modelos de risco mais sofisticados, com maior foco no ciclo de vida total
dos projetos e desenvolvimento do mercado com infraestrutura avançada e
participação dos fundos de pensão e fundos de private equity.
Austrália e Reino Unido
Kateja (2012)
Observa-se que o Brasil (tabela 4) foi classificado por Kateja (2014) na fase I de maturidade.
2.1. O Caso do Porto do Rio de Janeiro.
A cidade do Rio de Janeiro tem população de 6,3 milhões de habitantes (IBGEa, 2013), seu PIB
a preço de mercado é R$ 190 bilhões (US$ 77,69 bilhões) e o per capita é de R$ 30 mil (US$
12,26 mil) (FEPERJ, 2013). Mesmo considerando a grandeza destes valores, não há como
ignorar a pobreza, ou seja, a desigualdade social refletida pelas favelas (Medeiros e Steinbrink,
2013). A região portuária da cidade apresenta um quadro de isolamento e deterioração e sua
população é composta principalmente pelas camadas mais pobres (Pimentel, 2013). Entre elas
está a população da Providência, estimada em 4.889 habitantes, distribuída em 133.644 m² e
considerada oficialmente a primeira favela do país (GERJ, 2013).
A tendência de urbanização das favelas é gradual, mas lenta: o programa Favela Bairro
melhorou significativamente as condições de vida de seus moradores (Handzik, 2013); a
pacificação de comunidades controladas pelo tráfico de drogas foi positiva para a população,
embora o Estado ainda está em débito com esta e parece estar sucumbindo às demandas
provocadas pelas dimensões econômicas do território e esquecendo sua função pública
(Lacerda e Brulon, 2013); e no setor de transporte, a implementação do sistema Bus Rapid
Transit (BRT) promovida pelos operadores de transporte, com os corredores TransBrasil,
TransCarioca, TransOlímpica e TransOeste poderá beneficiar a população da metrópole (NTU,
2011).
Com o propósito de revitalizar a região portuária, o governo local criou a Operação Urbana
Porto Maravilha (OCPM) por intermédio da Lei Complementar Municipal (LCM 101/2009).
Para coordenar o processo de implantação criou a Companhia de Desenvolvimento Urbano da
Região do Porto do Rio de Janeiro (CDURP) – uma empresa de economia mista, controlada
pela Prefeitura e que tem por finalidade administrar o projeto por meio de parceiras com o setor
privado (EOM, 2013).
A CDRUP é estruturada de modo organizacional em: Presidência, Consultoria Jurídica,
Superintendência de Desenvolvimento Econômico e Social, Diretoria de Operações, Diretoria
de Administração e Finanças, Conselho de Administração, Conselho Consultivo e Conselho
Fiscal (CDRUP, 2014). De acordo com o disponibilizado no portal da CDRUP (2014), não há
representantes da comunidade no Conselho de Administração e há um representante do
Conselho de Segurança Bairros da Gamboa e da Associação de Moradores e Amigos da
Gamboa no Conselho Consultivo, que é composto por três representantes da prefeitura, um
representante do Instituto dos Arquitetos do Brasil e um representante do setor imobiliário, além
do representante da comunidade.
A área da OCPM é de 5 (cinco) milhões de m2 e inclui a construção de 5 (cinco) km de túneis,
70 km de ruas, 700 km rede de esgoto, água, iluminação pública, drenagem de água pluviais e
gás (EOM, 2013), 17 km de ciclovias, museus, implementação de Veículos Leves sobre Trilhos
(VLT), demolição de parte do elevado da perimetral, construção de teleférico e arranha-céus
para moradia e uso comercial (CDURP, 2013). As obras incluem também: Alças de Ligação do
Viaduto do Gasômetro, Infraestrutura, Museu do Amanhã, Túnel Morro da Saúde, Túnel da
Via Binária , Túnel Avenida Rodrigues Alves (via expressa), Túnel RFFSA (Morro da
Providência) e Urbanização (PRJ, 2013).
A fim de obter recursos para financiamento do Projeto, o município pode emitir Certificados
de Potencial Adicional de Construção (CEPAC) para serem alienados em leilão ou utilizados
diretamente no pagamento das obras necessárias à própria operação (Casa Civil, 2013 e CVM,
2013ª). Este certificado permite o aumento do potencial construtivo na região (com exceção das
áreas de preservação, de patrimônio cultural e arquitetônico, e dos prédios destinados ao serviço
público), sendo que todo o valor arrecadado com a sua venda deve ser obrigatoriamente
investido na melhoria da infraestrutura urbana e em serviços na região (EOM, 2013).
Os CEPAC são títulos livremente negociáveis e conversíveis em direito de construir na área da
OCPM, cujo efeito é similar à criação de solo novo e poderão ser utilizados no pagamento da
área de construção que supere os padrões legais para uso e ocupação do solo (Silva, 2012).
Permite a construção acima do Coeficiente de Aproveitamento Básico, o qual equivale a 1 (uma
vez a área do terreno).
Com o surgimento da OCPM foi criado o Coeficiente de Aproveitamento Médio, equivalente
a 4,06 vezes a área do terreno. O adquirente do CEPAC passa a ter direito a construir acima dos
patamares antes permitidos (AAEA, 2010). A área da OCPM foi dividida em setores e sub-
setores, de A a N, para os quais são aplicados fatores de conversão para os CEPAC (tabela 5).
Nove setores estão sujeitos à aquisição de adicional de construção por CEPACs (CRJ, 2013).
A Administração Pública da cidade obteve em dezembro/2010 o registro da OCPM (nº.
2010/01) junto à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) – órgão normatizador do mercado
mobiliário brasileiro, cujo paralelo americano é a Security Exchange Commission (SEC)
(CVM, 2013) e emitiu 6.436.725 (seis milhões, quatrocentos e trinta e seis mil, setecentos e
vinte e cinco) CEPAC (tabela 5), pelo valor de R$ 545,00 (quinhentos e quarenta e cinco reais)
cada, com vistas a financiar a OCPM e as Intervenções nela previstas (Bocater, 2013).
Tabela 5: Fator de Conversão para CEPAC por Área da OUCPRJ de acordo com Lei
Complementar 125/2013. SETOR FAIXA
DE
EQUIVA-
LÊNCIA
ÁREA NÃO
RESIDENCIAL
CONST./CEPAC
(m²)
ÁREA
RESIDENCIAL
CONST./CEPAC
(m²)
ÁREA
ADICIONAL
/ SETOR
(m²)
QUANTIDADE
DE CEPAC
A A1 0,4 0,8 288.020 648.046
B
B1 0,5 0,8 174.411 257.257
B2 0,7 1 63.371 71.519
B3 0,8 1,2 54.900 48.038
C
C1 0,4 0,8 333.039 666.078
C2 0,6 1 423.775 565.034
C3 0,8 1,4 52.644 40.423
D
D1 0,5 0,8 296.672 526.594
D2 0,6 1 319.543 426.057
D3 0,7 1,2 150.537 134.408
D4 1 1,4 50.957 36.398
E E1 0,4 1,2 648.308 1.080.514
F F1 1 1,4 4.022 2.873
I I1 1 1,2 33.041 28.085
J J1 0,9 1 16.156 17.233
M M1 0,4 1 1.180.105 1.888.168
Total 6.436.725
CRJ (2013).
O número de CEPAC necessário para a construção é obtido através da relação entre a diferença
do CAM e CAB multiplicados pela área do terreno e posteriormente dividido pelo fator de
coeficiente do setor onde está localizado o terreno (AAEA, 2010), conforme fórmula a seguir:
A CVM (2013a) estabelece que a cidade do Rio de Janeiro deve apresentar: a) Relatório
informando o andamento da operação e das respectivas intervenções; b) Relatório da instituição
fiscalizadora o emprego dos recursos obtidos com a distribuição pública de CEPAC; c)
Discriminação da quantidade de CEPAC utilizados, a área disponível para a utilização dos
CEPAC, e o estoque remanescente desses certificados; d) Comunicação imediatamente à CVM
Nº CEPAC = AAC
FC
Onde:
AAC= Adicional de Área Construída = (CAM – CAF)*Área do Terreno
CAM= Coeficiente de Aproveitamento Médio
CAF= Coeficiente de Aproveitamento Básico
FC = Fator de conversão (ver tabela 8)
e ao mercado a existência de estudos, projetos de lei ou quaisquer iniciativas que possam
modificar o plano diretor ou aspectos da OPERAÇÃO; e) Divulgação ampla e imediatamente
de qualquer ato ou fato relevante relativo às operações dos CEPAC de modo a garantir aos
investidores acesso a informações; e que o prefeito deverá atribuir a algum órgão da Prefeitura,
a responsabilidade pela análise e acompanhamento de todos os aspectos da Operação e pelo
atendimento e prestação de esclarecimentos técnicos às instituições contratadas.
Embora haja um grande número de participantes a OCPM não foi capaz de formar uma esfera
pública em um espaço gerencial deliberativo; há uma única instância de participação
institucionalizada que é o Conselho Consultivo da OCPM. A população se mobiliza por meio
dos atores locais e os futuros proprietários, adquirentes dos CEPACs não estão envolvidos nas
instâncias participativas e nem em parcerias com o Poder Público (TOLEDO, 2012).
Há quatro possibilidades de consulta para obtenção de informação sobre o projeto no portal da
CDRUP (2014): a) sobre a Operação Urbana, com a apresentação do projeto, projeto básico e
mobilidade urbana; b) Canal do Investidor, com informações sobre legislações, instruções e
incentivos, prospecto, mapa potencial construtivo, calculadora de consumo de Cepac, estudo
de viabilidade econômica da operação consorciada, despesas reembolsáveis da operação –
contratos, suplemento definitivo e edital do leilão; c) Serviços e Obras, com informações sobre
o cronograma de obras e a substituição da perimetral; e, d) Canal Social, com informações sobre
mapa das instalações e equipamentos comunitários, mapa do patrimônio histórico, programa
cultural, programa cidadão, cursos gratuitos, prémio cultural. Foi observado que não há um
canal para o cidadão, de modo a permitir-lhe participar direta e deliberativamente. O canal
social é basicamente informativo.
3. ANÁLISE
Quanto ao grau de maturidade a participação do Capital Privado e o modelo de obtenção de
recursos pode ser um indício do estágio de evolução da PPP. No caso da OCPM, os recursos
podem ser obtidos por operações financeiras no mercado de capital, por meio da livre
negociação de títulos. Está operação é fiscalizada pela Comissão de Valores Mobiliários
(CVM), que por objetivo dar confiabilidade e transparência para o investidor, de modo a tornar
o mercado confiável. Ao confrontar-se o modelo de operação da PPP – OCPM com a
negociação de título do mercado mobiliário (CEPAC) com as características das fases da
pesquisa de Kateja (2014), observa-se que a PPP pode ser classificada na fase II. Isto poderia
representar uma evolução para as PPP no cenário internacional, da fase I para a fase II quanto
ao grau de maturidade desta política.
Ao levantar a participação da população na estrutura organizacional da gestora do projeto,
observa-se haver apenas um representante da comunidade no conselho consultivo e nenhum no
restante da estrutura. Isto é um indício do pouco espaço conferido à participação popular no
planejamento. Outro indício no mesmo sentido é o fato de não haver no portal da empresa
gestora um canal disponível para o cidadão debater e propor sugestões. Há um canal do
investidor e um canal social, de caráter informativo.
Na ótica do debate público há registros da ata da audiência pública realizada em setembro de
2009 pela Câmara de Vereadores do Município do Rio de Janeiro, que apontam para o nível de
participação da comunidade no processo de planejamento para implantação da OCPM. O
representante da Comunidade da Pedra do Sal-Saúde verbalizou: “Eu queria saber que reuniões
são essas, quais os locais em que ocorreram e quais foram os participantes. Acho interessante
se a Prefeitura disponibilizasse a lista de presença dessas reuniões, porque nós, da comunidade
remanescente do Quilombo Pedra do Sal, não tivemos nenhuma informações quanto à
realização dessas reuniões sobre o Porto Maravilha” (CRJ, 2014). Após, o representante da
Associação do Moradores da região da Gamboa afirmou: “.... esse modelo que está sendo
colocado, dessa forma que está sendo colocado, não é uma forma adequada. A forma adequada
seria que as populações que vão ser afetadas pudessem participar, que fossem consultadas...
sinceramente as pessoas não sabem exatamente o que vai acontecer com a gente ali... E a gente
não sabe o que vai acontecer conosco, nem conosco e nem nas outras ocupações, que dizer, na
área do Cais do Porto, que é o Quilombo das Guerreiras. Na Venezuela, 53, que é o Zumbi dos
Palmares. Não sabemos o que vai acontecer com estas ocupações. A gente quer saber se isto
vai nos afetar.”
Outra audiência pública que discutiu os impactos da OCPM sob a ótica da mobilidade foi
promovida pelo Grupo de Atuação Especializada em Meio Ambiente (GAEMA) e pela
Promotoria de Justiça de Urbanismo da Capital, do Ministério Público do Rio de Janeiro
(PET/COPPE, 2013).
O primeiro caso aponta para falta de participação popular e no outro caso para a necessidade de
promoção do debate por pessoas não ligadas diretamente à condução do planejamento, mas por
um órgão público de fiscalização de direitos, como é o caso da Ministério Público.
A reurbanização do Porto Maravilha se caracteriza como físico-territorial e se afasta dos
conceitos Rawlsiano e Comunicativo, na medida em que não estabelece como prioridade os
desprivilegiados nem adota um planejamento colaborativo ou participativo. Isto pode ser
observado pela superposição dos indícios de baixa participação da população e pelo modelo de
reurbanização espacial aos conceitos trazidos ao referencial teórico de Sager (2011) e Souza
(2010). A OCPM não apresenta as características de planejamento identificadas por Carvalho
e Fidélis (2013) para o planejamento de áreas estuarinas em Portugal, pois não envolveu a
comunidade em suas diferentes fases. Apesar do número de pessoas envolvidas estas não
representam a possibilidade de deliberação dos interessados, conforme pesquisa de Toledo
(2012).
A partir da pesquisa de Ahmed e Ali (2004) (tabela 3) é possível analisar a OCPM quanto à
perspectiva de sucesso na satisfação dos atores sociais. No caso específico, não é identificado
envolvimento da comunidade local, não desenvolvendo-se as condições Cultura, Visão e
Participação para este ator. O modelo de política para planejamento urbano tende ao neo-liberal
(tabela 2) se confrontado o modelo de captação de recursos e participação da população no
projeto com os aspectos do Marketing da Cidade, do Desenvolvimento Urbano e da Licitação
apresentado por Sager (2011). Contudo há ênfase para a condição de Continuidade Política. E,
por outro lado, as condições Visão e Participação são bastante desenvolvidas para os
investidores, que tem na legislação imposta pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), uma
perspectiva de transparência e confiabilidade do investimento. Comparando
4. CONCLUSÃO
O projeto do Porto Maravilha (OCPM) representa uma evolução quanto à maturidade para as
PPP no país (da fase I para fase II), no entanto, seus resultados poderão não atender
concomitantemente as necessidades próprias do evento de 2016, da geração de
desenvolvimento e da população local, pois há indícios de que a participação da população foi
baixa.
O Estatuto da Cidade impõe à OCPM a participação dos proprietários, moradores, usuários
permanentes no conjunto de intervenções e medidas para transformação urbanísticas, sociais e
ambientais, entretanto, na pesquisa foi verificado a baixa participação da população no projeto.
Isto é um indício de que a empresa gestora do projeto poderia empreender esforços para
promover a criação de mecanismos que possibilitem está participação no processo de
planejamento e decisório, com maior fluidez. O modelo da OCPM quanto aos aspectos
colaborativos e comunicativos poderia evoluir quanto à participação das populações de suas
áreas.
A reurbanização da OCPM permitirá a recuperação da área Portuário do Rio de Janeiro e de
seu entorno, entretanto pode ter gerado incertezas para as populações das áreas mais carentes.
Poderá prestar poucos serviços para esta população diante da tendência de valorização do
espaço imobiliário, que terá maiores exigências de poder aquisitivo e, consequentemente,
causar exclusão social para os mais pobres, inclusive com seu deslocamento para outras
periferias.
A criação de solo novo possibilitará a construção de maior número de unidades habitacionais e
comerciais, que poderá aumentar a densidade populacional. Isto poderá acarretar consequências
para o espaço urbano, principalmente trânsito e meio ambiente. Os problemas de trânsito
poderão continuar a existir devido à expansão urbana no local da OCPM e o maior número de
veículos particulares a disposição das pessoas de maior nível de renda que poderão migrar para
a área reurbanizada.
Pela multiplicação entre a quantidade e o valor de cada CEPAC (tabela 5) pelo valor unitário
de R$ 545,00, obtém-se o valor de R$ 3.508.015.125,00. Os valores envolvidos na operação
são expressivos, bem como de interesse público. Isto aponta para a necessidade de
procedimentos de controle e transparência sobre a captação e emprego destes recursos, com
ampla divulgação para a população. Por exemplo, além dos órgãos públicos de fiscalização e
de prestação de contas, poderiam ser aplicados os mecanismos de auditorias externas de âmbito
privado. A lei poderia prever que entidades integrantes de operações consorciada publicassem
demonstrações financeiras em veículos de informação de grande circulação. Isto poderia
permitir a participação contínua da população na gestão das transformações urbanísticas,
sociais e ambientais.
Como sugestão para outras pesquisas é importante: a) conhecer o efeito da ausência da
população no processo de planejamento, b) quais medidas compensatórias poderiam ser criadas
para evitar exclusão social e c) quais os impactos da implantação da OCPM sobre as populações
carentes.
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