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Capítulo I Patentes e marcas no mundo e no Brasil 11 “Durante estes sessenta anos eu vivi, respirei, me relacionei e atuei só na Propriedade Industrial. Eu sou um produto da Propriedade Industrial e me orgulho muito disso... Se tivesse que recomeçar, seria em Propriedade Industrial.” CUSTÓDIO DE ALMEIDA

Patentes e marcas no mundo e no Brasil

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Capítulo IPatentes e marcas no mundo e noBrasil

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“Durante estes sessenta anos eu vivi, respirei, me relacionei

e atuei só na Propriedade Industrial. Eu sou um produto da

Propriedade Industrial e me orgulho muito disso... Se tivesse que recomeçar,

seria em Propriedade Industrial.”

CUSTÓDIO DE ALMEIDA

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As marcas e o segredoMarcas encontradas em diversos artefatos pré-históricos sãoa maior evidência do quão antiga é a disposição do homemde identificar a sua própria criação, auferindo o prestígio deladecorrente. Com o surgimento da escrita começaram aaparecer os primeiros registros assinalando o nome dosautores das descobertas científicas e das invenções.1

Apesar do reconhecimento social, até o fim da Idade Médiainventores não puderam contar com nenhum tipo demecanismo que lhes assegurasse privilégio. A únicaproteção era um recurso que ainda hoje tem grandeimportância: o segredo. Descobertas e fórmulas eramconservadas no âmbito do clã. Passavam de pai para filho,dentro de rígida disciplina familiar.

Somente após o surgimento da burguesia comercial é que aquestão do direito comercial sobre a exploração dainvenção começou a ser discutida. O conceito de patentetal como é hoje conhecido foi resultado do extraordináriodesenvolvimento comercial vivido pela Europa a partir doRenascimento Comercial e Urbano, no século XII. Osmecanismos de proteção das patentes evoluíram aindamais com a grande Expansão Comercial e Marítima, quecriou o mercado mundial e permitiu diversas práticascomerciais e financeiras, tais como as letras de câmbio, associedades anônimas e os bancos.

As invenções não podiam mais ficar enclausuradas noâmbito familiar. O acelerado ritmo de desenvolvimento exigiaque os segredos fossem disponibilizados para a sociedade.

Foi na Europa, durante o Renascimento Cultural, que surgiua idéia de que os direitos sobre a invenção deveriam serreservados ao criador. A primeira lei de patentes de que setem notícia foi criada em Veneza em 19 de março de 1474.A cidade era então um grande centro comercial.2 O inventorrecebia um título de privilégio que lhe assegurava aexploração do invento.

Mas foi sob a Revolução Industrial que as leis de patentescomeçaram a ser disseminadas por toda a Europa. Com achegada do capitalismo, invenções tornaram-se partefundamental da sistemática produtiva e comercial.

Nesse sentido, a evolução da indústria de fios e tecidos,nos primeiros anos, é muito ilustrativa. Em 1733, John Kayinventou a lançadeira volante, que aumentava acapacidade do artesão de tecer. Logo começaram a faltarfios, fato que estimulou a busca de máquinas para agilizara sua produção. Em 1776, James Hargreaves criou aSpinning Jenny, que permitia um artesão fiar de oito aoitenta fios de uma só vez. Essa máquina foi seguidamenteaperfeiçoada, provocando novo desequilíbrio na produção.

1. Ver Marcelo Dias Varella,“Propriedade Intelectual de Setores Emergentes”, p. 26.

2. Robert, M. Sherwood,“Propriedade Intelectual eDesenvolvimentoEconômico”, p. 26.

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Novamente se investiu nas máquinas de tecer. Erammáquinas que ainda se valiam da força do trabalhador paraserem movidas.

Em 1785, Edmond Cartwright criou um tear mecânicomovido por rodas-d’água. O invento resolvia o problemamas era inconstante. O grande salto técnico foi dado porJames Watt. Fazia quase um século que o francês Papintinha descrito cientificamente o potencial do vapor comoforça motriz. Watt teve o mérito de utilizar o vapor paramover um êmbolo acoplado a um tear mecânico.

Com força motriz independente e constante surgiu então aprodução em série, permitindo volumes de produtos jamaisvistos. Mais uma vez começaram a faltar fios e o espíritoinventivo e o aporte de capitais foram mobilizados para asuperação do problema. O ciclo havia sido estabelecido.

Basta uma rápida olhada pela história desses últimos doisséculos para vermos a sociedade mergulhada numafrenética busca por novos conhecimentos. Enquanto aciência dava grandes saltos em diversos campos doconhecimento, os inventos se multiplicavam. O foco centraldas pesquisas era a procura de novas forças motrizes paramáquinas cada vez mais complexas. Intercalaram-segrandes descobertas e inventos: energia elétrica, motor decombustão interna, energia solar e nuclear, entre outros,

Projeto de helicóptero deLeonardo da Vinci (início doséc. XVI)

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empurraram nesses dois séculos barcos, locomotivas,carros, tratores, aviões, foguetes e as mais sofisticadasmáquinas industriais.

A revolução tecnológica que hoje impulsiona aglobalização é a expressão mais avançada dessabicentenária dinâmica produtiva que incorporou a invençãocomo parte essencial da produção. Hoje, esta revoluçãoatingiu um ritmo frenético. Basta lembrar que, segundoespecialistas, a cada cinco anos os setores produtivos deponta são completamente reestruturados.

Assim, não é um acaso que os primeiros países a elaborarleis de proteção à propriedade intelectual e industrialtenham sido os pioneiros no desenvolvimento industrial,como a Inglaterra, os Estados Unidos e a França.

Em 1623, o Parlamento inglês reservou à Coroa o direitode dar “cartas patentes” à invenção de novas manufaturas.Os americanos formularam sua lei de patentes apenascatorze anos após a sua Independência, em 1790. Ficouconhecida como “Patent Act”. Em seu artigo primeiro(seção 8) autorizava a criação de “sistema nacional depatentes, a fim de dar aos Escritores e Inventores direitoexclusivo, por tempo limitado, sobre seus respectivosEscritos e Descobertas”. Tinha por objetivo promover o“Progresso da Ciência e das Artes Úteis”.3

3. Citado por FranciscoTeixeira, “Tudo o que Você Queria Saber sobrePatentes mas TinhaVergonha de Perguntar”, p. 21.

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Máquina a vapor construídapor James Watt

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Bartolomeu de Gusmãodemonstra sua invençãosob os olhares atônitos dosmonarcas portugueses(1709)

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O padre voador“Senhor. Diz o licenciado Bartolomeu Lourenço que ele temdescoberto um instrumento para se andar pelo ar, e commuita brevidade, fazendo-lhe muitas vezes 200 léguas emais léguas por dias, no qual instrumentos se poderão levaros avisos de mais importância aos exércitos, e às terrasmuito remotas...” Assim começou o pedido de patente queo jesuíta, nascido em Santos, Bartolomeu Lourenço deGusmão pleiteou ao soberano português Dom João V. Eraum projeto pioneiro, o do balão, primeiro aparelho mais leveque o ar. Corria o ano de 1709 e o monarca, após concedera patente, interessou-se em conhecer o invento. Gusmãolevou um protótipo de sua “Passarola” ao Palácio Real.

O acontecimento foi assim descrito por um cronista daépoca: “com efeito, pôs por obra, não logo o principalinvento, mas uma amostra, a qual era uma barcaça pequenade feitio de uma gamela coberta de lona, e com váriosespíritos, quintas essências, e outros ingredientes, meteu-lhe umas luzes por baixo, e na sala das embaixadas,estando presentes Sua Majestade, muitas mais pessoas, fezvoar a dita barcaça, que a pouca altura deu pelas paredes, edepois em terra e, confundindo-se os materiais, pegou fogo,e na queda em que despenhou queimou uma cortina e tudoo que encontrou foi fazendo o mesmo efeito, e SuaMajestade foi tão benigno que não se escandalizou econservou sua graça”.

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A origem das patentes no Brasil: fomento à indústriaDurante o período colonial, Portugal impôs ao Brasilseveras restrições ao desenvolvimento de qualquerindústria ou lavoura de produtos e gêneros que fossemproduzidos na Europa. Tratava-se de medida estratégicadentro da lógica do sistema colonial mercantilistaestabelecido e foi adotada de forma generalizada pelasmetrópoles européias. A restrição permitia a formação demonopólios comerciais que asseguravam a transferênciadas riquezas das colônias para as metrópoles.

As restrições culminaram com o Alvará da rainha DonaMaria I, de 1785, que proibia drasticamente as fábricas,indústrias e manufaturas na Colônia.

Com a vinda da Família Real e a conseqüente transferênciado centro de decisões do Império Colonial Português para oBrasil, em 1808, a questão das patentes se colocou deimediato.4 Ainda naquele ano foi revogado o Alvará de 1785.5

No ano seguinte, através de outro Alvará, foram adotadasdiversas medidas voltadas para o desenvolvimentoindustrial: isenção de direitos à importação de matérias-primas, isenção de direitos à exportação de produtosmanufaturados e, entre outras, a concessão de privilégiosaos inventores e introdutores de novas máquinas, que teriamo direito exclusivo de explorar a invenção por catorze anos.6

4. Alvará do PríncipeRegente no Brasil, DomJoão VI, de 28 de janeirode 1808, que determinou aabertura dos portos àsnações amigas.

5. Alvará de 1 abril de 1808.

6. Alvará de 28 de janeirode 1809.

Alvará de 1785 de Maria Ide Portugal

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Segundo o Alvará, os interessados deveriam apresentar oseu “plano de invenção” à Real Junta do Comércio, órgãocriado no ano anterior. Caso o invento fosse reconhecido,era concedido o privilégio por catorze anos.7

Ainda visando estimular o desenvolvimento industrial, outroAlvará dotou de recursos a Real Junta do Comércio paraconferir prêmios e incentivar as invenções.8 Medidasemelhante foi adotada pela Sociedade de Encorajamento àIndústria e à Mecânica, entidade criada em 1809.

Como pode ser observado nesta seqüência de leis, apatente foi introduzida no Brasil dentro de uma política defomento à indústria. Não se tratava de uma questão deprincípio, ou seja, o reconhecimento do direito àpropriedade intelectual tal como concebemos hoje: o direitoque qualquer cidadão, empresa ou instituição tem sobretudo o que resulta de sua inteligência ou criatividade. Eraantes de tudo um recurso importante dentro das políticasde fomento da época. A Revolução Industrial tinha seiniciado havia cerca de cinqüenta anos e eram poucos ospaíses que garantiam a patente em sua legislação.

7. A Real Junta doComércio foi criada em 23 de agosto de 1808.

8. Alvará de 15 de julho de 1809.

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O Alvará de 1809 que tratou das patentes“Sendo o meio mais conveniente para promover a indústriade qualquer ramo nascente, e que vai tomando maioraugmento pela introdução de novas machinas dispendiosas,porém utilíssimas, o conferir-se-lhe algum cabedal queanima o capitalista que emprehende promover semelhantefábrica, vindo a ser esta concessão um Dom gratuito quelhe faz o Estado: sou servido ordenar, que da LoteriaNacional do Estado, que anualmente quero se estabeleça,se tire em cada anno uma soma de sessenta mil cruzados(...) a favor daquellas manufacturas e artes, particularmentedas de lãs, algodão, seda e fábricas de ferro e aço. E as quereceberem (...) não terão obrigação de o restituir... sendomuito conveniente que os inventores e introductores dealguma nova machina, e invenção nas artes, gozem doprivilégio exclusivo além do direito que possam ter ao favorpecuniário, que sou servido estabelecer em benefício daindústria e das artes; ordeno que todas as pessoas queestiverem neste caso apresentem o plano de seu novoinvento à Real Junta do Commercio; e que esta,reconhecendo a verdade, e fundamento delle, lhes concedao privilégio exclusivo por quatorze annos, ficando obrigadosa publica-lo depois, para que no fim desse prazo, toda aNação goze do fructo dessa invenção...”

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A primeira patenteEm julho de 1822, Luiz Louvain e Simão Clothe, amparadospelo Alvará de 1809, requereram à Real Junta do Comércio oprivilégio de cinco anos para o seu invento, uma “machinapara descascar café, a qual além de ser inteiramente própriada invenção dos suplicantes produz todo o bom resultado (...)pela perfeição com que descasca o café sem lhe quebrar ogrão, ou seja, pela brevidade, e economia, e simplicidade dotrabalho (...) que se bem está construída para ser trabalhadapor hum homem, he suscetível de machinismo próprio paraser movida ou por hum animal, ou por ágoa”.9

9. Apud. Luiz Cláudio Ribeiro,“Ofício Criador: Invento ePatente de Máquina deBeneficiar Café no Brasil”(1870-1910).

Pedido de privilégioindustrial para máquina dedescascar e brunir café(1881)

Terreiro de café em SãoPaulo (final do séc. XIX)

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A primeira lei brasileira de patentesApós a Independência, a questão da patente se colocou nostrabalhos de preparação da primeira Carta Magna do Brasil.A Constituição, outorgada em 1824, trouxe o princípio da“propriedade do inventor”. Também tratou da questão daremuneração, “em caso de vulgarização do invento”.

Seis anos após, em 1830, surgiu a primeira lei brasileira queabordou a proteção aos inventores, a nossa primeira lei depatentes.10 Novamente tratou-se de uma política mais amplade fomento à indústria. A proteção aos inventores estavaassociada a prêmio para quem trouxesse indústria para oBrasil: “concede privilégio ao que descobrir, inventar oumelhorar uma indústria útil e um prêmio ao que introduziruma indústria estrangeira, e regula a concessão”.11

A lei protegia os inventores, assegurando-lhes o uso exclusivoda descoberta por período de cinco a vinte anos. O inventordeveria depositar no Arquivo Público a descrição, planos,desenhos e modelos úteis. A lei assegurava os mesmosdireitos de autor aos que aperfeiçoassem as invenções. Adescrição do invento era publicada ao final do prazo, ouquando o Governo adquirisse o invento. As patentes eramgratuitas, o interessado pagava apenas o selo e o feitio.

Passaram-se trinta anos sem que houvesse qualqueralteração na legislação. Em 1860, um breve decreto alterouapenas o critério utilizado para marcar o início da validadedo privilégio. Antes era considerada a data de expedição dopedido da patente. Com o decreto, passou a ser contada apartir da data de assinatura da concessão da patente.Provavelmente já havia uma certa morosidade natramitação dos pedidos de patentes.12

10. Lei de 28 de agosto de1830. A lei que tratou daregulamentação daspatentes não possuinúmero. Foi referida apenaspela data em que foisancionada. Cf. “Collecçãodas Leis do Império doBrazil de 1830”. R.J.Typographia Nacional, 1876.

11. Lei de 28 de agosto de1830.

12. Decreto nº 2.712, de 22de dezembro de 1860.

Pedido de privilégio do“Balão Brasil” (1873)

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A primeira lei brasileira de patentesLei de 28 de agosto de 1830 - (...) Privilégio ao quedescobrir, inventar ou melhorar uma indústria útil e umprêmio ao que introduzir uma indústria estrangeira, e regulasua concessão.

ARTIGO 1º - A lei assegura ao descobridor, ou inventor deuma indústria útil a propriedade e o uso exclusivo da suadescoberta, ou invenção.

ARTIGO 2º - O que melhorar uma descoberta, ou invenção,tem no melhoramento o direito de descobridor, ou inventor.

ARTIGO 3º - Ao introductor de uma indústria estrangeira sedará um prêmio proporcionado à utilidade e dificuldade daintroducção (...)

ARTIGO 7º - O infractor do direito de patente perderá osinstrumentos e productos, e pagará além disso uma multaigual à décima parte do valor dos productos fabricados e ascustas, ficando sempre sujeito à indenização de perdas edannos. Os instrumentos, e productos e a multa, serãoapplicados ao dono da patente.

ARTIGO 8º - O que tiver uma patente poderá dispor della,como bem lhe parecer, usando elle mesmo, ou cedendo-a aum, ou a mais.

ARTIGO 9º - No caso de se encontrarem dous, ou mais, nosmeios, por que tenham conseguido qualquer fim, ecoincidindo ao mesmo tempo em pedir a patente, esta seconcederá a todos.

ARTIGO 10º - Toda a patente cessa, e é nenhuma:

1. Provando-se que o agraciado faltou à verdade, ou foidiminuto, ocultando material essencial na exposição, oudeclaração, que fez para obter a patente.

2. Provando-se ao que se diz inventor, ou descobridor, quea invenção, ou descoberta se acha impressa, e descripta talque elle a apresentou, como sua.

3. Se o agraciado não puzer em prática a invenção, oudescoberta, dentro de dous annos depois de concedida apatente.

Se o descobridor, ou inventor, obteve pela descoberta, ouinvenção, patente em paiz estrangeiro. Neste caso porémterá, como introductor, direito ao prêmio estabelecido noartigo 3.

Se o gênero manufacturado, ou fabricado, fôr reconhecidonocivo ao público, ou contrário às leis.

Cessa também o direito de patente para aquelles que antes daconcessão della usavam do mesmo invento, ou descoberta.

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Os primeiros passos da industrialização no BrasilApesar de as legislações de 1809 e 1830 estarem voltadaspara o fomento à industrialização do Brasil, elas nãoobtiveram os resultados esperados. Os pesquisadoressituam os primeiros passos da industrialização no Brasil nadécada de 1840, sobretudo após a edição da polêmicaTarifa Alves Branco. O então ministro da Fazenda AlvesBranco baixou severas tarifas alfandegárias visando iniciaro desenvolvimento da indústria nacional. O recurso eramuito utilizado na Europa daquela época.

Embora tivesse curta duração, a Tarifa Alves Branco deuorigem a pequenas manufaturas, sem maior importância nocontexto econômico do país. A indústria continuou bemmodesta até o início da República.

Foi a agricultura do café que estimulou a industrializaçãobrasileira no século XIX. Primeiro foram produtos ligados àsua manipulação: descaroçadoras, manufaturas de sacosetc. Mais tarde, com o decorrente aumento da população ea urbanização, surgiram estimulantes mercados para asindústrias de tecidos e alimentos.

Os registros de patentes concedidas no período confirmamesse quadro. A maior parte deles estava associada à produçãocafeeira e à indústria de roupas e alimentos. Misturavam-secom curiosos inventos, como uma fórmula química queprometia eliminar o potencial explosivo do querosene.

Pedido de privilégio industrialdo “Guarda-chuva” (1909)

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A primeira lei que tratou das marcasUm rumoroso caso de falsificação de marcas conhecido como“Caso Moreira & Cia. x Meuron & Cia.” marcou, em 1874, oinício da discussão sobre a regulamentação das marcas noBrasil. A Moreira & Cia lançou no mercado o Rapé Areia Parda,muito semelhante ao consagrado Rapé Areia Preta produzidopor Meuron & Cia. O jovem advogado Rui Barbosa atuou emfavor desta última. Apesar de todas as evidências favoráveis àMeuron & Cia., o processo foi anulado. Não havia qualquerlegislação que permitisse qualificar o caso como delito.

Foi a gota de água que faltava. No ano seguinte surgiu aprimeira lei que regulou as marcas de fábrica no Brasil:Decreto nº 2.682, de 1875. Veio com 35 anos de atraso emrelação à lei de patentes.

Dentro da característica monárquica, o Decreto nº 2.682assim tinha início: “Hei por bem Sanccionar e Mandar quese execute a seguinte Resolução da Assembléa Geral: éreconhecido a qualquer fabricante e negociante o direito demarcar os produtos de sua manufactura e de seucommercio com signaes que os tornem distinctos dos dequalquer outra procedencia...”.

A lei previa que o interessado podia ser representado pormandatário especial, também denominado como procurador.

A indústria do fumoproliferava no Brasil semlegislação que amparasseas marcas (final do séc. XIX)

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Os acordos internacionaisNa segunda metade do século XIX vivia-se a chamadaSegunda Revolução Industrial, que, impulsionada pelosbarcos e ferrovias a vapor, revolucionava os transportes e ocomércio mundial. A industrialização deslanchava empaíses como Itália, Alemanha e Japão, agora sob a égidedas grandes empresas monopolistas que promoviam oneocolonialismo e remodelavam o mapa-múndi. Surgiamnovos grandes impérios coloniais.

Nesse contexto, sob o reinado de Dom Pedro II - ummonarca sempre atento às inovações e aodesenvolvimento tecnológico de seu tempo,especialmente no que se referia à fotografia -, o Brasilcomeçou a manifestar precoce preocupação com aspatentes no plano internacional. Essa posição sematerializou em diversos acordos bilaterais assinados coma França, a Alemanha, a Itália, os Estados Unidos,Portugal e a Dinamarca, todos no período de 1876 a 1884.

A primeira convenção internacional sobre marcas epatentes, a Convenção de Paris, em 1883, sistematizou asnormas de proteção às marcas, patentes, desenhosindustriais etc. A partir daí, todas as convenções ficaramconhecidas pelo nome da cidade sede do evento. O Brasilfoi o único país da América do Sul signatário do documentooriginal da convenção.

O país marcou sua presença na Convenção de Berna,realizada em 1900, a principal convenção transnacionalespecificamente voltada para os direitos autorais, queestabeleceu normas mínimas para os países signatários. Aproteção dos direitos autorais passou a ser automática emtodos os países membros.

Alexandre Graham Bell na primeira conversatelefônica (1876)

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Devido ao contínuo surgimento de novas tecnologias evisando bases seguras para a sua disseminação, asconvenções se sucederam ao longo do século XX: 1911,em Washington; 1925, em Haia; 1934, em Londres; 1958,em Lisboa; 1967, em Estocolmo; e o último, o TradeRelated Intellectual Property Rights, conhecido comoTRIPS, realizado em 1994. O Brasil assinou imediatamentetodos os documentos, menos o de Estocolmo, que só foireconhecido em 1990.

No princípio do século XX teve início uma série deconvenções interamericanas. A primeira foi realizada no Riode Janeiro, de 23 a 27 de julho de 1906, ocasião em que foifirmada a Convenção da União das Américas. Estabeleceu-se no encontro a criação de duas secretarias, uma emHavana e outra no Rio de Janeiro, com a função decentralizar o registro de obras literárias e artísticas,patentes, marcas, desenhos e modelos, assegurando aproteção da propriedade intelectual e industrial.

Revista “Rions!” (1908)

Pedido de privilégio industrialdo “Barco Vélez” (1896)

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